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ASSUMPÇÃO
CAMINHOS DA APRENDIZAGEM
HISTÓRICA: ENSINO DE PRÉ-
HISTÓRIA E ANTIGUIDADE
Reitor:
Prof. Dr. Marcelo Augusto Santos Turine - UFMS
Vice-Reitora:
Profa. Dra. Camila Celeste Brandão Ferreira Ítavo
Pró-Reitoria de Extensão, Cultura e Esporte:
Prof. Dr. Marcelo Fernandes.
Direção da Faculdade de Ciências Humanas: 2
Profa. Dra. Vivina Dias Sol Queiroz
Coordenação do Curso de História:
Prof. Dr. Cleverson Rodrigues
Rede:
www.revistasobreontes.site
Rede: https://www.atrivmufms.com/
Ficha Catalográfica
Assumpção, Luis Filipe Bantim; Campos, Carlos Eduardo Costa (org.)
Caminhos da Aprendizagem Histórica: Ensino de Pré-História e
Antiguidade. 1ª Ed. Rio de Janeiro: Sobre Ontens/UFMS, 2021. ISBN:
978-65-00-24349-9
Ensino de História; Pré-História; Antiguidade; Arqueologia
Sumário
CONSIDERAÇÕES SOBRE O ENSINO DE PRÉ-HISTÓRIA E ANTIGUIDADE....................................... 6
CONFERÊNCIAS
3
O uso de recursos visuais, como vídeos, fotos, filmes, entre outros, tem sido
fartamente utilizado para o ensino de História (e pré-História). Utilizamos as
maquetes como modelos hipotéticos em escala para, a partir do apelo visual,
questionar aos educandos, o que eles observam na maquete. Como as mesmas
são construções com um grande número de informações, permitimos sempre
que as colocações dos educandos venham antes das explicações,
oportunizando assim um diálogo entre a dúvida, que denuncia o espírito
investigativo, e o saber científico sistematizado de acordo com o público alvo do
momento de utilização da maquete. Como as maquetes geralmente são
acompanhadas de réplicas da cultura material de cada uma das sociedades
apresentadas, os educandos podem manipular as reproduções sem risco ao
patrimônio arqueológico. Em contrapartida, somente a cultura material sem uma
percepção espacial do sítio arqueológico, fica um tanto quanto limitada. Isso
porque quando mostramos a paisagem atual as sociedades não aparecem, e
quando olhamos reconstruções em desenhos a percepção espacial também fica
prejudicada. Assim, a maquete, que são construções sobre um suporte de feito
de placa de esferovite (isopor) em dimensões de 50 x 50 cm, tem alturas
variantes de acordo com o espaço retratado.
Referências bibliográficas
ROCKENBACH, Denise; MARQUETI, Elza; ALVES, Glória; CUSTÓDIO, 17
Vanderli. Série Link do Espaço. Suplemento do Professor. São Paulo: Moderna,
2002.
SOARES, André Luis Ramos; ROSA, Andrielli Matos da; VEDOIN, Carolina
Bevilacqua; CORREA, Thaise Vanise. Dinamicidade no Ensino Formal: Resgate
Histórico através de Maquetes. História e Diversidade [Recurso eletrônico]
Dossiê: Ensino de História e História da Educação: caminhos de pesquisa (Parte
II) - [2014/II]. Revista do Departamento de História. Cáceres, UNEMAT, vol. 5, nº
2 (2014) Disponível em:
https://periodicos.unemat.br/index.php/historiaediversidade/article/view/223/21,
último acesso 10/11/2019. Pg. 53-69.
“Quem disse que você não pode levar isso com você?
Muito sobre o que sabemos a respeito da Idade Média vem dos achados das
sepulturas. Quando os mortos foram escondidos na terra, eles foram enterrados
com muitos dos itens que podem ter sido utilizados na sua vida cotidiana.
Enquanto essa tradição morreu após a cristianização, nossos membros se
divertiram imaginando que tipo de coisas do dia a dia eles levariam consigo para
a vida após a morte. Alguns dos nossos animais de estimação precisam de mais
prática para se fingir de mortos” (Tradução nossa).
Não nos cabe – nem há espaço aqui neste texto – esmiuçar todas as
possibilidades de análise que podemos realizar, argumentos e hipóteses
interpretativas que podemos levantar por meio da comparação entre as fotos.
Nosso objetivo é enfatizar que tal atividade possui uma aplicabilidade didática
prática em demonstrar de forma explícita as relações entre os vivos e os mortos
(D’AGOSTINO, 1985; PEARSON, 1993).
A morte constitui um fato biológico, social e cultural (SOUZA, 2011, 2018, 2019,
2020a). Enquanto fato biológico, o encerramento das atividades vitais do
indivíduo gera vestígios físicos que correspondem às transformações e
redefinições do corpo humano com o processo inevitável de decomposição.
Enquanto fato social, há necessariamente uma transformação dos papéis que
os indivíduos possuem na sociedade a partir do momento em que ocorre a morte
biológica. Por exemplo, o morto não irá mais atuar como homem, marido, pai,
filho, tio, professor, coordenador etc. Suas identidades sociais são modificadas
e seus papéis redefinidos enquanto morto. Finalmente, enquanto fato cultural,
os vestígios biológicos da morte (o corpo do morto) e os papéis sociais dos
indivíduos em vida são apropriados e processados culturalmente pelos vivos e
essas apropriações podem-se adquirir formas simbólicas de poder e valores
sociais e podem também constituir vetores de ações rituais que integram um
corpo de crenças formativo da cosmogonia das sociedades (BELL, 2009;
MORRIS, 1987, 1992).
Isto significa dizer que, na verdade, os significados dos vestígios materiais das
práticas funerárias são atribuições dos vivos, possuem usos, funções e são
“lidas”, decodificadas por aqueles que visualizam, compartilham e vivenciam os
mesmos códigos culturais em uma sociedade. As práticas funerárias servem,
atuam e interagem com o mundo dos vivos.
Poderíamos dizer, até mesmo, que o estudo das práticas mortuárias possui uma
responsabilidade social maior enquanto campo acadêmico-científico no
processo de conscientização da atuação e integração política dos diversos 24
grupos sociais – tema, aliás, tão importante no cenário histórico atual. Além
disso, o estudo do passado promove a também a conscientização da herança e
do patrimônio histórico vernacular e, consequentemente, da conscientização da
história e da memória de grupos minoritários e marginalizados da sociedade.
Referências biográficas
Camila Diogo de Souza possui bacharelado em História pela Faculdade de
Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo
(FFLCH/USP), mestrado, doutorado e pós-doutorado em Arqueologia do
Mediterrâneo Antigo pelo Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de
São Paulo (MAE–USP), pós-doutorado em Proto-histoire Égéenne na Maison
René Ginouvès (Archéologie et Ethnologie) da Université Paris-Nanterre,
França. Foi Professora Visitante do Centro de Antropologia e Arqueologia
Forense da Universidade Federal de São Paulo (CAAF/UNIFESP) (2017-2019)
e Pesquisadora Visitante com Pós-doutorado Sênior do Instituto de História da
Universidade Federal Fluminense (UFF) (2019-2020). É pesquisadora da École
Française d’Athènes (EfA) e coordenadora do Grupo de Pesquisas em Práticas
Mortuárias no Mediterrâneo Antigo (TAPHOS-CNPq), do Laboratório de Estudos
sobre a Cerâmica Antiga da Universidade Federal de Pelotas (LECA-UFPel) e
do Núcleo de Ensino e Pesquisa em Arqueologia e Antropologia Forense
(NEPAAF) do Laboratório de Estudos Arqueológicos (LEA) da Universidade
Federal de São Paulo (UNIFESP).
Referências bibliográficas
AXARLIS, N. Plague Victims Found: Mass Burial in Athens. Archaeology, online
News, April 15, 1998. Disponível em:
https://archive.archaeology.org/online/news/kerameikos.html
28
BELL, C. Ritual Theory, Ritual Practice. Oxford: Oxford University Press, 1991.
BINFORD, L.R. Mortuary Practices: their study and their potential. In: Memoirs of
the Society for the American Archaeology. No. 25, Brown, J. Approaches to the
social dimension of mortuary practices. American Antiquity (36), 1971, p. 6-29.
D'AGOSTINO, B. Società dei vivi, comunità dei morti: un rapporto difficile. DA,
3(1), 1985, p. 47-58.
MORRIS, I. Burial and Ancient Society. The rise of the Greek city-state.
Cambridge: Cambridge University Press, 1987.
_____. The Archaeology of Death and Burial. Texas A&M University Press, 3rd
print, 2002.
SHAPIRO, B. RAMBAUT, A.; GILBERT, M.; THOMAS P.; et al. No proof that
typhoid caused the Plague of Athens (a reply to Papagrigorakis et al.).
International Journal of Infectious Diseases. 10 (4), 2006, p. 334–335.
_____. “Ser ou não ser grego: morte e identidade na Grécia Antiga”. In: COSTA,
P.F.; BAREL, A.B.D.; COSTA, A.C. (orgs.). Cadernos da Casa-Museu Ema
Klabin. São Paulo: Fundação Ema Klabin, p. 183-195, 2020b.
Em nossa sociedade, grande parte dos Museus são vistos como ambientes
destinados ao prazer intelectual, os quais as “pessoas comuns” se direcionam
uma ou duas vezes ao ano para satisfazerem as suas curiosidades acerca do
passado. Do mesmo modo, verificamos que a maioria dos sujeitos, provenientes
das classes média e baixa, não geram uma relação de proximidade com os
Museus e tão pouco com os elementos que o compõe. Esta perspectiva acaba
se difundindo entre as gerações, em medida que boa parte da população apenas
vai ao Museu em excursões promovidas pelas escolas, sem que o valor real
deste local seja construído na prática cotidiana e no ensino-aprendizagem.
Questões essas que se tornaram pauta nos debates da museologia, da história,
da pedagogia, bem como da educação museal e patrimonial.
Maria Angélica Zubaran frisa que os Museus não se constituem apenas como
um espaço destinado a visitação ou preservação de memórias oficiais, pois esse
espaço congrega múltiplas faces da sociedade (ZUBARAN, 2013, p. 3). Esta
tendência defendida por Zubaran visa romper com o elitismo e desconexão
social com o qual os Museus foram desenvolvidos no cenário brasileiro, assim
procurando ampliar o seu público. Nota-se, nas últimas décadas, uma
diversificação do próprio acervo e exposições que passaram a valorizar os
grupos sociais, étnicos e culturais que eram, inúmeras vezes, invisibilizados.
Sendo assim, compreendemos os Museus como lugares de construção de
memória e identidade socioculturais, bem como de ações educativas, combate
às desigualdades e de salvaguarda do patrimônio histórico-cultural. Nesse
sentido, o Museu de Arqueologia da UFMS (MuArq) ocupa um espaço importante
no cenário científico e social brasileiro, pois coaduna com as perspectivas
renovadas de Museu. Tanto que o MuArq configura nas publicações
arqueológicas, museais e patrimoniais brasileiras, além das internacionais
(SILVA, GASQUES, CAMPOS, 2020; PROUS, 2019; KASHIMOTO, MARTINS,
2019; VIALOU, 2009).
Vale mencionar que o MuArq é caracterizado como uma unidade de apoio na
UFMS, o qual se vincula ao gabinete da Pró-Reitoria de Extensão, Cultura e
Esporte – PROECE. Atualmente, ele se encontra alojado no Memorial da
Cidadania e Cultura Apolônio de Carvalho, no Centro de Campo Grande, Mato
Grosso do Sul. Destacamos que ele foi fundado em 2008, mediante os esforços
do Prof. Dr. Gilson Rodolfo Martins – UFMS. Após a aposentadoria do referido 32
docente, o museu passou a ser coordenado pela Prof. Dra. Emília Kashimoto –
UFMS, até 2019, momento da aposentadoria da docente citada. Nos dias atuais,
o MuArq é coordenado pela arqueóloga Lia Raquel Toledo Brambilla Gasques
(Técnica Lab. de Arqueologia – UFMS), tendo o setor educativo coordenado
pela antropóloga Laura Roseli Pael Duarte (Técnica Lab. de Arqueologia –
UFMS), assim como o Prof. Dr. Carlos Eduardo da Costa Campos (docente –
UFMS / FACH) atua como responsável pelo setor de pesquisa e extensão.
Com isso, produzimos dados sobre tais objetos arqueológicos que permitem
compreender a relação do homem com o seu meio ao longo do tempo, no
território de MS. Assim, ao catalogarmos e descrevermos tais peças do MuArq,
abrimos possibilidade para o conhecimento de evidências materiais do passado
Pré-Histórico, os quais podem ser objeto de estudo na rede básica de educação.
Afinal, a BNCC do Ensino Fundamental apresenta uma reflexão sobre como
devemos fazer uso de diferentes fontes e tipos de documento (escritos,
iconográficos, materiais, imateriais) capazes de facilitar a compreensão da
relação tempo e espaço e das relações sociais que os geraram. Fato esse que
auxilia aos professores na reflexão do patrimônio junto aos conteúdos
(ASSUMPÇÃO, CAMPOS, 2020, p. 30-31). Desse modo, a BNCC enfatiza que
os estudos documentos materiais revelam expressões humanas, o contexto de
produção, consumo e circulação desses objetos. Logo, “(...) o objeto histórico
transforma-se em exercício, em laboratório da memória voltado para a produção
de um saber próprio da história” (BNCC, 2017, p. 398). Assim, colocamos nossos
alunos discentes da UFMS numa postura reflexiva que toma a cultura material
como ponto de partida para a construção do conhecimento, assim valorizando a
própria consciência histórica (ASSUMPÇÃO, CAMPOS, 2020, p.30-31). Dessa
maneira, em nossa visão o projeto desenvolvido no MuArq com emprego da
cultura material proporciona aos licenciados conhecimento sobre temas que
terão de lecionar para a rede básica de ensino, a qual alinhada com a BNCC
prevê o estudo de processos de identificação, comparação, contextualização,
interpretação e análise de um objeto estimulam o pensamento (BNCC, 2017, p.
398). Para conhecer nossos materiais já catalogados e da exposição do MuArq,
acesse: https://muarq.ufms.br/sobre-o-muarq/
Outra medida que tomamos no MuArq foi a elaboração do Momento MuArq, no
Canal MuArq, no Youtube. O Momento MuArq consiste em uma série de vídeos-
explicativos, de curta duração, sobre a trajetória do nosso museu, bem como das
peças na exposição. Logo, possibilitamos o acesso aos nossos materiais de
forma descontraída, online e com uma linguagem que pode ser utilizada para os
discentes da rede básica de ensino. O primeiro vídeo foi lançado em agosto de 35
2020 e faz uma panorâmica sobre os espaços do museu e sua equipe. O
segundo vídeo, Momento MuArq 1, foi lançado no final de agosto de 2020 e conta
com o Prof. Dr. Gilson R. Martins, fundador do MuArq, falando sobre o
desenvolvimento das pesquisas arqueológicas em MS. O terceiro vídeo foi
gravado em 2020 e lançado em março de 2021, assim dando continuidade à
apresentação de Martins e abordando a trajetória do MuArq. Os vídeos
continuam sendo produzidos e podem ser acessados através do endereço
eletrônico: https://www.youtube.com/channel/UC_-w48hQoFJ72oNaAF6-ryQ
Por fim, destacamos que nossa participação na 18ª Semana Nacional de Museus
(2020), em parceria com a Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul, resultou
na elaboração de um projeto editorial intitulado: Museus e patrimônio cultural
em Mato Grosso do Sul: pesquisa, cultura, educação e identidade (Vol. 1),
sob coordenação de Douglas Alves da Silva, Lia Raquel Toledo Brambilla
Gasques e Carlos Eduardo da Costa Campos. Além das temáticas abordadas
sobre Pré-História na coletânea, também é possível observar propostas que
versam sobre Arqueologia, Arquitetura, Educação Ambiental e Museologia, 36
Educação patrimonial. O intuito é disponibilizar o estado atual de pesquisas para
a rede básica de ensino e público leigo interessado sobre Museus e Patrimônio.
O ebook foi financiado pela FAPEC e pode ser acessado, gratuitamente, pelo
site: http://www.desalinhopublicacoes.com.br/pd-7fba25-museus-e-patrimonio-
cultural-em-mato-grosso-do-sul.html?ct=&p=1&s=1
Considerações Finais
A definição de Museu do Conselho Internacional de Museus - ICOM (16ª em
1989 e 20ª Assembleia em 2001) interpreta o Museu como uma instituição
permanente, sem fins lucrativos, a serviço da sociedade e de seu
desenvolvimento, aberta ao público e que adquire, preserva, pesquisa e expõe
os testemunhos materiais do homem e de seu meio ambiente, para educação e
entretenimento do público. Desse modo, tal definição do ICOM coaduna-se com
o pilar universitário desenvolvido na UFMS: ensino, pesquisa e extensão. Logo,
através de nossas ações, buscamos contribuir com o processo de ensino-
aprendizagem de Pré-História, bem como de Patrimônio Cultural a partir do
acervo museológico do MuArq, assim visando formar profissionais, na área de
História, que ampliem o seu horizonte de trabalho e compreendam o museu
como um espaço de construção do conhecimento científico, histórico escolar e
de reflexão social. Essa proposta se vincula as premissas da BNCC e impacta
na sala de aula.
Referência biográfica
Carlos Eduardo da Costa Campos é mestre e doutor em História pela UERJ,
atua como Professor Adjunto de Pré-História e Antiguidade da Faculdade
Ciências Humanas da UFMS. Campos é membro do Museu de Arqueologia da
UFMS e integra sua comissão de pesquisa e extensão. Ademais, Campos é
coordenador do grupo de pesquisa ATRIVM / UFMS, do PIBID – HIST – FACH /
UFMS e docente do Mestrado Profissional em Ensino de História da UEMS.
Referências bibliográficas
BRASIL, MEC. BNCC – Base Nacional Comum Curricular. Brasília: SEE, 2017.
Disponível em: <http://basenacionalcomum.mec.gov.br/download-da-bncc>
Acesso em: 08 abril. 2020.
SILVA, Douglas Alves da; GASQUES, Lia Raquel Toledo Brambilla; CAMPOS,
Carlos Eduardo da Costa. Museus e patrimônio cultural em Mato Grosso do Sul:
pesquisa, cultura, educação e identidade – 1. ed. – São João de Meriti, RJ:
Desalinho, 2020.
As aulas de História também incomodam quem não está inclinado a indagar suas
próprias crenças/convicções, provavelmente porque tais narrativas beneficiam
os grupos que as alimentam e disseminam.
O credo niceno, reconhecido como ‘ortodoxo’ pelo poder imperial e que, portanto,
tornou-se hegemônico, desde Teodósio, defende que o Filho é consubstancial
ao Pai, ou seja, da mesma substância divina. Dessa forma, os bispos nicenos
apoiavam-se na ideia de consubstancialidade entre Pai, Filho e Espírito Santo,
o que será posteriormente chamado de dogma trinitário por meio do qual se
entende que tais entes divinos compartilham a mesma substância, mas
manifestam-se (hipóstase) de três formas distintas, o que corroborava com a
fórmula ‘um imperador, um deus e uma igreja’, motivo pelo qual, para muitos
historiadores, tenha sido esta a fórmula de fé que mais atraiu a atenção de 41
imperadores como Constantino e Teodósio, preocupados com a manutenção da
unidade político-administrativa do Império (FARIAS JUNIOR, 2020, p. 67).
Isso quer dizer que as fontes estão encobertas por ‘camadas de interpretação’
que foram depositadas ao longo dos anos por diferentes sujeitos,
intencionalidades e objetivos. Reconhecer que as fontes estão encobertas por
diferentes interpretações que se estabeleceram ao longo do tempo é o primeiro
passo para entender que nosso ‘olhar’ e nossa ‘forma de pensar’ é produto do
tempo em que vivemos. Essa reflexão orienta-nos a pensar sobre a historicidade
dos objetos/ideias/experiências no âmbito da relação espaço-temporal.
Alguns críticos diriam (ou já disseram) que nosso propósito analítico está fadado
ao fracasso, porque os LDs não objetivariam incluir as diferentes vertentes,
movimentos e acontecimentos históricos, como se fosse um grande repositório
de dados históricos. Mas, se considerarmos que o estudo da História, na
Educação Básica, está comprometido com a ampliação de nosso olhar sobre o
presente, com o intuito de formar cidadãos críticos, participativos e atuantes em
diferentes espaços sociais, o estudo do cristianismo (ou da religião) se torna,
convenhamos, um tema central.
Isso explica, pelo menos em parte, a dificuldade de muitos alunos que ingressam
no ensino superior, logo após a Educação Básica. Enquanto, na escola, os LDs,
mas sobretudo o professor, é visto como um especialista que fornece
informações ‘verdadeiras’, para que sejam reproduzidas em avaliações; na
universidade, eles encontram tais ‘informações’, no entanto, em vez de
memorizá-las, elas são postas ao debate, o que requer o posicionamento dos
estudantes frente a discussões historiográficas. Neste nível educacional, os
docentes universitários portam-se mais como condutores dos debates do que
como ‘autoridade’ detentora de ‘respostas certas’.
Referência biográfica
Dr. José Petrúcio de Farias Junior, professor da Universidade Federal do Piauí,
campus de Picos, e colaborador junto ao Programa de Pós-Graduação em
História do Brasil (PPGHB/UFPI).
Referências bibliográficas
CERRI, Luis Fernando. Ensino de história e consciência histórica: implicações
didáticas de uma discussão contemporânea. RJ: Editora FGV, 2011.
FARIAS JÚNIOR, José Petrúcio de. A teoria da história de Jörn Rüsen: estudos
introdutórios e chaves de leitura. In: NASCIMENTO, Francisco de Assis de
Sousa; SILVA, Jaison Castro; CHAVES, Reginaldo Sousa (Org.). A forja do
tempo: artes e vanguardas diante do contemporâneo. Teresina: EDUFPI, 2016.
RÜSEN, Jörn. Kann gestern besser werden? Zum Bedenken der Geschichte.
Berlin: Kulturverlag Kadmos, 2002.
O QUE ENSINAR EM HISTÓRIA ANTIGA?
Leandro Hecko
Lançadas essas ideias, dou início a questão maior que desejo aqui
problematizar, provocar: se a ideia de "História Antiga" já nos traz inúmeros
desdobramentos, o que dizer então, na posição de professor da Educação
Básica ou do Ensino Superior, sobre a indagação "O que ensinar em História
Antiga?". Partir, para o Ensino com base nas experiências já mapeadas junto
aos educandos, provavelmente se configure em uma boa estratégia. E aqui, o
que desejo é abrir possibilidades de diálogo com professores de todos os níveis
de ensino e professores em formação, para discussão e aprofundamento e
mapeamento de mais ideias.
Uma primeira questão a ser levantada se refere ao fato de que pelo menos a
perspectiva base para o ensino de História Antiga parece ter mudado e avançado
um pouco para além do tradicional factual. Existe a construção de uma História
Antiga mais problematizada e preocupada em compreender do que
explicar/expor (SILVA, 2007, p.9), tentando sair do factual e compreender o
conhecimento histórico em sua construção a partir de fontes, escrita e
intencionalidades.
Nesta perspectiva de uma História Antiga mais problematizada, talvez seja
importante considerar a questão dos usos do passado (HECKO, 2019, p.7-9),
que põe o professor diante de possibilidades reflexivas acerca do tempo passado
(Antigo) e presente (contemporâneo aos alunos), criando possibilidades
didáticas que dialoguem com temas de interesse dos estudantes.
46
Temos, neste caminho, uma História Antiga, que dialoga com diversas
temporalidades por onde transita o conhecimento histórico sobre as
Antiguidades que possibilita uma forma diferente de ensinar. Não obstante,
claramente, ainda nos são apresentados certos limites a serem considerados.
Seguindo este caminho, quero indagar acerca do que se ensina sobre História
Antiga na Educação Básica. O que dita a forma e os conteúdos a serem
abordados pelos professores? Percorramos o seguinte caminho: o estudante
que entra em um curso de graduação em História, passará por uma formação de
professor com disciplinas específicas sobre o conhecimento histórico, disciplinas
de didática e prática de ensino, terá contato com a Educação Básica por meio
de estágios obrigatórios (onde sofrerá influência daquilo que acontece já no
funcionamento da escola e do ensino) e, formado, estará "apto" a iniciar seu
trabalho como profissional da Educação.
Quando o professor chega na escola, pública ou privada, por sua vez, terá que
lidar com certas situações, rotinas já previstas do funcionamento das instituições
de ensino. Em linhas gerais, o que se encontra? Uma escola funcionando com
uma estrutura hierárquica, com base em políticas educacionais federais,
estaduais ou municipais; uma escola com um Projeto Político-Pedagógico e uma
Proposta Curricular, que por sua vez se ampara nas referidas políticas
educacionais; a escola já terá, provavelmente, materiais didáticos com os quais
basicamente o professor deverá lidar, materiais estes também amparados nas
referidas políticas educacionais que, na sua origem são federais. Portanto,
temos em relação ao professor alguns cerceamentos. Porém, objetivamente
queremos considerar a iniciativa e criatividade do professor em lidar com todos
esses grilhões.
47
Pensando sobre este contexto onde o professor se insere e sobre os grilhões
que encontra, queremos destacar um item, que representa as referidas políticas
educacionais e que gerou polêmica nos últimos anos, desde a sua construção
até a publicação oficial: trata-se da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) de
2018. A BNCC chega às escolas e influencia um contexto bastante amplo no que
diz respeito à constituição de manuais didáticos, passando a servir de base para
a escolha dos manuais didáticos que chegarão às escolas públicas do país junto
ao Programa Nacional do Livro de do Material Didático (PNLD). O livro didático,
portanto, em sua construção e antes de chegar à escola, passa por um processo
avaliativo que, resumidamente considera se o material está ou não de acordo
com a BNCC.
Um outro ponto a se considerar, que possui relação com o que se ensina numa
licenciatura em História, é a questão da especialização do
professor/pesquisador. No ensino superior, a realidade é a de professores que
entre a graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado se especializaram em
determinadas áreas a ponto de, embora tenham conhecimento até amplo sobre
a Antiguidade como um todo (mas isso não é a regra) não necessariamente são
capazes ou possuem interesse em ensinar sobre áreas que não tenham domínio
mais aprofundado. Falando em termos gerais, um especialista em algum tema
sobre Grécia antiga terá mais confiança ao tratar temas relacionados ao mundo
grego, numa perspectiva melhor de Antiguidade Clássica do que ensinar sobre
China ou Índia antigas, por exemplo, e vice-versa.
-O ensino de História Antiga possui uma relação direta com aquilo que se
compreende por Antiguidade, que pode afirmar amplitude ou recorte a depender
da percepção do conceito de História Antiga;
-O ensino de História Antiga tem sido problematizado de forma a atualizar a
forma como se entende a História Antiga no tocante a possíveis relações entre
passado e presente, observando-se formas de uso desse passado antigo em
outras temporalidades;
-A forma como o professor na Educação Básica trabalha com a História Antiga
possui diversos fatores de influência, que por vezes fogem ao seu controle,
todavia, a depender de sua formação e criatividade ele pode ensinar História
Antiga de forma a incentivar este conhecimento;
-Entre a Educação Básica e o Ensino Superior deve existir diálogo e pesquisa,
para que seja possível um melhor ensino de História Antiga, que considere
sempre as realidades diversas em que cada professor está inserido;
-A forma como o professor no Ensino Superior ensina a História Antiga também
possui determinantes e estes têm relação com a especialidade do professor que
pode fazer determinadas opções por áreas de interesse ou não.
Para concluir, cabe afirmar que, sobre o Ensino de História Antiga os professores
entre Educação Básica e Superior são os verdadeiros construtores da área, 50
incentivadores ou não do seu desenvolvimento e valorização social. Desta
forma, cabe a quem forma os professores o engajamento para que se construa
uma História Antiga engajada em valorizá-la e fomentar os estudos de temas a
ela relacionados, de forma a fazer crescer em importância esta ampla área e
com temas tão instigantes e relevantes em nosso presente, para a compreensão
do mundo em que vivemos.
Referências biográficas
Dr. Leandro Hecko, professor de História Antiga, da Universidade Federal de
Mato Grosso do Sul, campus de Três Lagoas – MS. E-mail:
leandro.hecko@ufms.br
Referências bibliográficas
ASSUMPÇÂO, Luis Filipe Bantim de; CAMPOS, Carlos Eduardo da Costa. O
livro didático e o Ensino de História Antiga – desafios no presente e problemas
do passado. Perspectivas e Diálogos: Revista de História Social e Práticas de
Ensino, v. 2, n. 6, p. 66-87, jul./dez. 2020.
Por mais que o Brasil tenha avançado em políticas públicas para a EJA, os
sujeitos que comungam desta modalidade ainda são percebidos pelo poder
público, pela mídia, pelo capital empresarial e por parte da sociedade civil
organizada dentro uma visão elitista, de tendência neoliberal, como indivíduos
que, por possuírem suas especificidades, acabam marginalizados ou veem seu
processo educativo aproximado de um assistencialismo (FÁVERO, 2011, p 34).
Mas também pelo que nos alertou Pedro Paulo Funari, para o fato de que as
escolas privadas e da elite não deixariam de estudar História Antiga – e, traçando
um paralelo, o acesso desta elite a museus, viagens e aparatos culturais a
colocaria em contato, de uma forma privilegiada, com o Mundo Antigo –
enquanto as classes menos favorecidas não seriam contempladas com este
repertório múltiplo do ponto de vista étnico, cultural, político e sociorreligioso:
“(...) em um mundo globalizado e em um Brasil multiétnico, estudar as
sociedades antigas é introduzir no sistema educacional do país comparativos de
diversidade e igualdade (FUNARI, 2016, p. 2)”.
Nossa intenção é perceber como três pilares que balizam o Ensino de História
na EJA – cultura, tempo e trabalho – além da questão da consciência histórica,
fundamental ao Ensino de História (AYRES; CAINELLI, 2014, p. 3), aparecem
nos estudos da Antiguidade e qual diálogo estabelecem com os sujeitos que
passam por este processo particularizado de aprendizagem.
Concordamos com o método proposto por Ivonir Ayres e Marlene Cainelli porque
entendemos que estes pilares, atrelados à consciência histórica, são essenciais
para emancipar o aluno/trabalhador e colocá-lo dentro de uma sociedade que é
plural, mas que temos de ter consciência que capitalista e desigual.
Não se trata de inserir o educando passivamente nesta realidade, mas fazer com
que ele a compreenda e, a partir do conhecimento histórico, crie alternativas para
enfrentá-la e se emancipar. Na certeza de que a EJA deve agir por estas
epistemologias próprias, e não como uma cópia ou “irmã menor” do Ensino
Fundamental I e II ou do Ensino Médio, o referencial histórico deve ser debatido
dentro da realidade da modalidade, em consonância com as demais, mas nunca
em posição de subjugo:
FASE INTERMEDIÁRIA
Unidades Temáticas Objeto do Habilidades indicadas
Conhecimento da
Fase Inicial II
prioritários
Tempo e espaço: A questão do tempo, (CG.EJA.FINT.EF06HI01.s)
fontes e sincronias e Identificar diferentes
formas de diacronias: reflexões formas de compreensão da
representação. sobre o sentido das noção de tempo e de
cronologias. periodização dos
Formas de registro da processos históricos
história e da produção (continuidades e rupturas).
do conhecimento
histórico.
Cidadania, direitos As formas de (CG.EJA.FINT.EF07HI15.s)
humanos e organização Discutir o conceito de
movimentos sociais. das sociedades escravidão moderna e suas
ameríndias. distinções em relação ao
A escravidão moderna escravismo antigo e à
eo servidão medieval.
tráfico de
escravizados.
A emergência do
capitalismo
Relações de trabalho, Senhores e servos no (CG.EJA.FINT.EF06HI16.s)
produção e circulação. mundo antigo e no Caracterizar e comparar as
medieval dinâmicas de
abastecimento e as formas
de organização do trabalho
e da vida social em
diferentes sociedades e
períodos, com destaque
para as relações entre
senhores e servos.
Tabela baseada no Referencial Curricular Circunstancial de 2021 – EJA, da 56
REME-Campo Grande/MS
Referências Biográficas:
Dr. Leandro Mendonça Barbosa. Graduado em História pela Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul, Mestre em História pela Universidade Federal
de Goiás e Doutor em História Antiga pela Universidade de Lisboa-Portugal. Foi
Docente Temporário da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul/CPTL e
Docente da Universidade Católica Dom Bosco. É Docente efetivo da Secretaria
Municipal de Educação de Campo Grande – Setorial Educação de Jovens e
Adultos – e Pós-Doutorando em Estudos Culturais pela Universidade Federal de
Mato Grosso do Sul
Referências Bibliográficas
AYRES, Ivonir R.; CAINELLI, Marlene R. Diálogos Curriculares com o Ensino de
História na EJA. In: Os Desafios da Escola Pública Paranaense na Perspectiva
do Professor, vol. 1, 2014, p. 02-21.
58
ARAÚJO, Gilvan C. C; SILVA, Leda R. B; SENA, Lilian C. P. S. A Educação de
Jovens e Adultos e a BNCC do Ensino Fundamental. Linhas Críticas, nº 26, 2020,
p. 1-25.
FUNARI, Pedro Paulo A. Parecer para o MEC sobre a Base Nacional Comum
Curricular: a história em sua integridade, 2016. Disponível em:
<http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/relatorios-
analiticos/Pedro_Paulo_A_Funari.pdf>
Tal assertiva destaca que a História, seja a disciplina seja a ciência, é uma
construção na qual utilizamos o passado como objeto para elaborarmos um dito
conhecimento histórico. Portanto, a escrita e a pesquisa históricas não são
imparciais, sendo a nossa leitura dos indícios do passado condicionada pela
natureza dos documentos e o nosso contexto social (GUARINELLO, 2003, p.
43). Nesse sentido, somos facilmente levados a refutar a máxima de que “contra
fatos não há argumentos”, visto que os “fatos”/acontecimentos históricos são
interpretações que criamos daquilo que passou (ALBUQUERQUE JR., 2007, p.
72-73). É justamente essa característica, por vezes, fugidia que torna a História
interessante e digna de pesquisa, uma vez que concatenar ideias oriundas de
diferentes documentos se assemelha a uma investigação típica de filmes de
espionagem. Esse tipo de equiparação pode incomodar aos pares, mas
aproxima os estudantes do Ensino Básico do conhecimento histórico.
Contudo, ainda hoje, é muito comum que os jovens mostrem desinteresse pela
História, chegando a questionar a utilidade desta disciplina (SOUSA, 2020, p.
81). Isso ocorre porque o “pseudo-pragmatismo” que vivenciamos no ambiente
escolar, desde a juventude, parece herdeiro do tecnicismo que vigorou no Brasil,
sobretudo, entre as décadas de 1970 e 1990. Assim, existe a tendência entre os
jovens e os adultos, nos mais variados segmentos de Ensino, de se interessarem
por coisas que sejam “úteis” às suas vidas, fazendo com que a História não se
enquadre nessa categoria. No entanto, diante do que comentamos
anteriormente, seria o conhecimento histórico algo sem utilidade?
Logo, toda uma geração foi educada por métodos de ensino-aprendizagem que
reforçavam o civismo, através dos feitos dos grandes homens da pátria. José
Antônio Vasconcelos (2012, p. 48-50) expõe que essa seria uma História
Tradicional, marcada pela influência de Leopold von Ranke, da Escola Metódica
e do pensamento positivista, a qual fomentou uma análise histórica elitista.
Conjeturando Borja Antela-Bernárdez (2020, p. 62-93) e José Antônio
Vasconcelos, verificamos que a implementação dos Estudos Sociais no Brasil,
na década de 1970, reforçou os paradigmas de uma História oficial vista de cima
e desenvolvida pelo poder político hegemônico, não cabendo aos estudantes
pensarem sobre o que passou e aceitarem o que viviam. Com isso, os pais e
responsáveis dos nossos estudantes de hoje em dia, ainda acreditam que o
conteúdo de um livro didático é correto e não pode ser refutado, tornando a
História sinônimo de passado e verdade.
Novamente, a Grécia é tomada como uma unidade, cuja organização política foi
idêntica em todas as póleis, por meio da argumentação e da discussão dos
interesses da maioria dos cidadãos. Essa é uma premissa “atenocêntrica” que
considera a democracia como forma majoritária de governo na Antiguidade
grega/helênica. Tal postura não coaduna os indícios literários antigos, visto que
a democracia foi criticada por diversos pensadores – como o “Velho Oligarca”,
Xenofonte, Platão, Antístenes etc. – e esteve longe de ser hegemônica entre as
póleis.
Por fim, os autores se utilizam de um posicionamento solucionista para endossar
o aprendizado da democracia pelos estudantes do Ensino Médio:
Considerações parciais
Como as discussões deste texto pretendem iniciar análises, muitas questões
ainda merecem ser discutidas. Ainda assim, o estudo desenvolvido nos ajuda a
perceber que os desafios para com a educação se iniciam na sala de aula, mas
não serão resolvidos unicamente nela. Do mesmo modo, verificamos a
discrepância entre o discurso da BNCC – que pretende fomentar a percepção
crítica da realidade, além do respeito à diversidade e o combate às injustiças –
e a maneira como os seus conteúdos foram sistematizados – ou seja, de modo
generalista, taxativo e Ocidental. Nesse sentido, a tecnologia se tornou uma
“muleta” na qual devemos nos apoiar para fomentar uma educação de qualidade,
porém, esta é um instrumento que está longe de nos fornecer soluções para os
problemas que existem em nosso sistema educacional. Observamos também
que, na maioria dos casos, os autores adotaram posturas solucionistas, as quais
sugerem mecanismos para sanar uma limitação, mas não se preocupam em
resolver o problema em sua essência. Entretanto, devemos recordar que a
BNCC fornece parâmetros para se pensar o currículo, algo que não inviabiliza
uma postura distinta do professor em sala de aula, dotado de um planejamento
contundente, em função das características de suas turmas e escolas.
Referência biográfica
Dr. Luis Filipe Bantim de Assumpção é Professor Adjunto I da Universidade de
Vassouras, campus de Maricá, no curso de Pedagogia, Coordenador de
Doutorado Local em História na Universidade de Vassouras, em parceria com a
UNISINOS e possui Pós-doutorado em Letras Clássicas pelo PPGLC-UFRJ.
Assumpção também é Professor da Educação Básica na rede particular de
ensino no Município do Rio de Janeiro.
Referências bibliográficas
ALBUQUERQUE JR., D. M. de. História – A Arte de Inventar o Passado. Curitiba:
Appris, 2007. 67
La tarea pasa por el modelo del reconocimiento. Poder ver al otro, escuchar su
palabra, atender su reclamo, confiar en sus posibilidades poiéticas, que siempre
son posibilidades resistenciales. En un tiempo de aparente visibilidad y
transparencia de los cuerpos, el otro en cuanto persona queda invisibilizado y
silenciado desde su alteridad antropológica. El primer gesto es la propia mirada
de quienes sostenemos el ejercicio docente. Solo quien visibiliza desde su
instalación de enseñanza genera espacios de visibilidad.
Recordemos cuáles son los cuatro orígenes que Jaspers postula para ver en qué
medida guardan relación con el escenario precedente, a partir de la apropiación
antropológica que proponemos de los mismos. 74
Asombro
En primer lugar, pensemos en el asombro. Si en el marco textual el asombro
representaba el pathos frente a la vastedad de lo real, ahora retorna en el desafío
de recuperar la capacidad de asombro frente a la actual situación provocada por
el Covid-19. Θαυμάξω significa admirar, mirar hacia, extrañarse, mirar con
sorpresa, preguntarse con admiración o curiosidad. Sabemos que así nació la
filosofía griega, que esa capacidad de asombro ha sido el páthos del
pensamiento griego, y de ella tenemos que aprender. El asombro es fuente de
pensamiento cuando se enfrenta a aquello que, como sostiene Deleuze (2009,
p. 214) nos fuerza a pensar. Para los jónicos fue la multiplicidad y la mutabilidad
de ta panta, de lo real, en tanto experiencia inquietante; para nosotros, la
experiencia de que el cuidado de sí y el cuidado del otro forman parte de una
misma estructura común. El asombro es el encuentro con lo inquietante, como
cuando Platón dice en República (523 b): “entre los objetos sensibles hay unos
que nos animan [παρακαλοῦντα] la inteligencia a examinarlos, porque para su
examen bastan los sentidos, en tanto que otros reclaman ese examen con
urgencia porque los sentidos no consiguen de ellos nada válido”. Según Deleuze
(2009, p. 214), este pasaje distingue entre dos tipos de cosas, “las que dejan el
pensamiento tranquilo, y las que fuerzan a pensar”. El verbo parakaleô define el
páthos del encuentro con aquello que nos fuerza a pensar: convocar, llamar,
excitar, animar. Lo que a Platón le da que pensar es la experiencia de una
sensación que es al mismo tiempo sensación de algo duro y de algo blando, de
algo mayor y algo menor, como cuando miramos nuestros dedos: cada uno en
sí mismo no nos provoca nada, pero cuando los ponemos juntos, un mismo dedo
es mayor y menor, y allí se produce, entonces, el encuentro con una sensación
contraria que nos invita a pensar.
Solo algunos hitos de un paisaje antropológico que pasa por habitual, natural,
familiar y consensuado desde la mirada y la complicidad. Por supuesto que no
anima al presente análisis la melancolía de un tiempo perdido, óptimo y
fatalmente perecido. Nada de eso; pero sí la mirada de un tiempo histórico de
una profunda conmoción antropológica, que no añora lo pasado, sino que mira
lo por venir con medida expectativa como el lugar donde lo nuevo puede surgir.
La enseñanza de la filosofía antigua es el territorio que es capaz liderar el
protagonismo del asombro en el sentido aludido.
Duda
En segundo lugar, pensemos en la duda. Si en el texto de Jaspers la duda
representaba el espíritu crítico frente a la totalidad de lo conocido, ahora retorna
en el desafío de recuperar la capacidad de dudar. El intento está directamente
relacionado con el apartado anterior, ya que dudar es poner en clave
interrogativa las certezas que otorgan la habitud de las cosas y las situaciones.
La duda, al generar la pregunta, rompe el tópos sosegante de la certeza y abre
un nuevo espacio a transitar.
La duda provoca al pensamiento, como bien lo sabían los griegos, al hacer del
lógos una palabra político-filosófica: el Ágora y la Asamblea como dos caras de
la misma experiencia de un pensamiento despierto, crítico, vital y perturbador.
Filosofía y Democracia crecen en el nervio del Cuestionamiento. Interrogar las
representaciones hegemónicas que quieren anestesiarnos, cuestionar el orden
social que quiere encerrarnos en nuestras intereses privados. Poner en duda es
desnaturalizar y criticar, en el sentido heracliteano, nietzscheano y marxiano de
mostrar las condiciones de producción de los modos de existencia, esto es, el
fondo común y en relación del cual surge la realidad.
Situaciones límites
En tercer lugar, pensemos en las situaciones límites. Si en el texto de Jaspers
representaban aquellas situaciones de las cuales el hombre no podía evadirse
porque constituían el corazón de su condición humana, ahora el tema retorna en
el desafío de recuperar la capacidad de hacerse cargo de sí para devenir un
sujeto responsable.
Quizá sean las situaciones límites las que impactan más directamente en el
universo antropológico. Si el asombro y la duda parecen estar ligadas al mundo
exterior, más allá de que convoquen a una disponibilidad por parte del sujeto en
una nueva forma de mirar, las situaciones límites impactan sobre el mundo
interno del sujeto. En este punto el sujeto se mira a sí mismo como nudo
problemático.
Tal vez sea el ejercicio docente una buena excusa para introducir a los griegos
desde un horizonte de absoluta vigencia (FOUCAULT, 1996). En ese marco se
imponen dos conceptos: el de epimeleia y el de epistrophe. Ambos términos se
complementan con la expresión eis heautou, la cual da cuenta del “hacia sí
mismo”. Epimeleia, tal como anticipamos, se refiere al cuidado, y el verbo en su
forma media, epimeléomai, significa cuidarse, preocuparse, cuidar de.
Epistrophe, por otra parte, como noción complementaria, es la acción de volverse
o tornarse, solicitud, atención. Suficiente marco para comprender una fuerte
acción del sujeto sobre sí mismo como modo de volver la mirada sobre su propia
finitud. Si con anterioridad habíamos pensado la dirección de la mirada sobre lo
nuevo, lo que asombra y lo que genera duda, ahora el ejercicio de la mirada se
direcciona sobre cada uno como espacio ético-antropológico. El virus también
revela nuestra precariedad ontológica y nos obliga a comprometernos con ella
apartándonos del falso sentimiento de inmortalidad que nos ofrece el
entumecimiento necio [axynetos].
Conclusiones
El presente trabajo ha intentado pensar el ejercicio docente desde un juego de
intersecciones posibles. En primer lugar, le dimos al ejercicio un marco
antropológico para solidarizar dos nociones indisolubles: antropología y
educación, maridaje por fuera del cual no concebimos el hecho educativo.
Referências Biográficas
Dr.ª María Cecilia Colombani é Professora na Facultad de Filosofía, Ciencias
de la Educación y Humanidades da Universidad de Morón e na Facultad de
Humanidades. Universidad Nacional de Mar del Plata.
mcolombani@unimoron.edu.ar
Dr. Guido Fernández Parmo é Professor na Facultad de Filosofía, Ciencias de
la Educación y Humanidades da Universidad de Morón e no Instituto Superior
de Formación Docente nº 21 “Dr. Ricardo Rojas”
guidofernandezparmo@gmailcom
Referências bibliográficas
ARISTÓTELES. Ética a Nicómaco. Madrid: Centro de Estudios Políticos y
Constitucionales, 1999
Eis que, diante do cenário exposto, podemos retornar ao ponto de partida deste
texto. Apesar de todas as adversidades encontradas, há uma perspectiva
animadora no horizonte. O ensino da antiguidade tem se mostrado dinâmico,
plural, consciente e, mais do que nunca, relevante aos temas, desafios e
questões caras à sociedade brasileira dos dias de hoje. Tem provado, em
especial, que a área possui muito a oferecer não só para o enriquecimento de
nossas compreensões sobre o passado, mas, também, sobre nossa(s) própria(s)
realidade(s), pois, afinal de contas, como já nos alertava o historiador francês
Lucien Febvre, qualquer que seja ela, a história é sempre filha de seu tempo:
Temos, aqui, portanto, uma base sólida, que combina reflexões produzidas em
contextos internacionais e brasileiros à realidade em sala de aula atual: no caso
do trabalho de Assumpção, aliás, um contexto escolar brasileiro durante a
pandemia de Covid-19 e os desafios do ensino à distância. A essa base
podemos acrescentar outras contribuições historiográficas que possuem uma
coisa em comum: um intuito crítico em sublinhar não apenas o caráter
atenocêntrico de boa parte da documentação textual antiga, mas, ainda, o
objetivo de demonstrar como construções discursivas já estavam sendo criadas
sobre os espartanos na própria Antiguidade, em contextos arcaicos, clássicos,
helenísticos e romanos (ASSUMPÇÃO, 2019; BRUNHARA, 2019; FIGUEIREDO
& CÂNDIDO, 2019; GARRAFFONI, 2019; LESSA & ASSUMPÇÃO, 2017;
SILVA, 2019). Dessa forma, podemos atentar também em sala de aula como
trazer à luz diferentes mecanismos e recursos empregados por autores antigos
para transmitir mensagens particulares a suas audiências, com base em
narrativas criadas sobre qualquer que seja o tema: nesse caso, Esparta.
Em essência, acredito ser esse um exercício frutífero que nos permite questionar
e realçar a historicidade das construções discursivas de certos objetos por
determinados agentes, sejam eles soviéticos, bolsonaristas ou escritores áticos
antigos. Em minhas experiências didáticas venho buscando concretizar tais
esforços, especialmente, a partir do ensino de populações frequentemente ainda
negligenciadas pelo ensino da Antiguidade, como as populações da Idade do
Ferro europeia comumente denominadas como “celtas”. Cito um exemplo
recente.
Enquanto professor, meu intuito não é, como ressaltei aos alunos, o de descobrir
uma essência supostamente “celta” nos relatos ou casos abordados. Ao
contrário, o objetivo era construir um espaço em sala de aula para examinar
esses vestígios textuais e materiais do passado, e as visões historiográficas
formuladas a seu respeito, e compará-los de modo a perceber múltiplas formas
de como pensar a construção das mulheres “celtas” como objeto e fenômeno
discursivo: da Antiguidade aos dias atuais. Afinal, entender como determinadas
categorias, temas, e objetos são operacionalizados em múltiplos contextos,
ontem e hoje, é um esforço importante. Aliás, considerando-se os perigos
diversos que observamos na atualidade, poderíamos dizer mesmo: necessário.
Agradecimento
O autor gostaria de agradecer ao financiamento recebido da CAPES durante seu
período de estadia a nível de Pós-Doutorado no Programa de Pós-Graduação
em História Comparada (PPGHC) da UFRJ, onde desde 2018 vem
desenvolvendo atividades didáticas e de pesquisa.
Referência biográfica
Pedro Vieira da Silva Peixoto é Doutor em História pela Universidade Federal
Fluminense, com “período sanduíche” de um ano em Arqueologia na
Universidade de Manchester (Reino Unido). Atualmente, com o apoio da
CAPES, realiza um Pós-Doutorado no Programa de Pós-Graduação em História
Comparada da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Referências bibliográficas
ASSUMPÇÃO, Luis Filipe Bantim de. A HQ "Os 300 de Esparta" e o Ensino de
História - Considerações, Ideias e Alternativas. In: BUENO, A.; CAMPOS,
C.E.C.; BORGES, A. (Org.). Ensino de História Antiga. Rio de Janeiro: Sobre
Ontens/UFMS, 2020, p. 50-61.
LIMA, Samuel C.; MENDES, Eliziane de Sousa Sampaio. Whatsapp e fake news
no ensino de língua inglesa em uma escola pública do interior do estado do
Ceará. Texto Livre: Linguagem e Tecnologia, v. 13, n. 2, 2020, p. 182-200.
PINSKY, Jaime. Sobre História e “narrativas”. In: Blog da Editora Contexto, São
Paulo, 2020. Disponível em: http://blog.editoracontexto.com.br/sobre-historia-e-
narrativas-jaime-pinsky-e-carla-bassanezi-pinsky/ (Último acesso, 2 de maio de
2021).
_____; PINSKY, Carla (Orgs.). Novos combates pela história: desafios – ensino.
São Paulo: Contexto, 2021.
_____. História Antiga no livro didático: uma parceria nem sempre harmoniosa.
Dimensões – Revista de História da UFES, Vitória, n. 11, p. 231-238, ju./dez.
2000.
SILVA, Érica C.; SILVA, Gilvan Ventura da; SILVA, Roberta A. (Orgs.) O Império
Romano e sua diversidade religiosa. Vitória: EdUFES, 2019.
SILVA, Uiran Gebara da. Introdução ao Dossiê "História Antiga no Brasil: Ensino
e Pesquisa": Uma Antiguidade Fora do Lugar? Mare Nostrum, 8(8), 1-12, 2017.
Essa temporalidade da História, e que é mantida ainda hoje na maior parte dos
currículos das licenciaturas, tem seu modelo discutido pelos pesquisadores da
área, porém, na prática mantém-se os paradigmas do modelo quatripartície.
Pensando nesse contexto da temporalidade, uma das críticas se dá pela forma
linear como a História acaba sendo discutida, sem aprofundar nas
particularidades históricas e sociais de cada grupo. E neste caso acabamos
tendo uma contradição entre a discussão teórica e a prática. Se no campo
teórico, sabemos que a periodização é apenas é uma ferramenta didática para
organizar o conhecimento histórico, na prática pode reforçar uma posição linear
e progressiva do desenvolvimento humano, no qual o ápice é a atualidade.
Portanto, há o risco dos cursos não preparem de maneira eficaz os novos
docentes para atuarem de acordo com as propostas da BNCC, e até mesmo com
a habilidade de criticá-la nas suas fragilidades.
É fato que trabalhar com as disciplinas de Pré-história e História Antiga logo nos
semestres iniciais dos cursos de licenciatura em História aumenta o desafio e a
responsabilidade do docente na graduação. Nesse sentido, nossa preocupação 92
enquanto professor é trabalhar com conteúdos que usualmente não são
próximos dos alunos, visto que, por exemplo, a grande maioria não estudou Pré-
História no Ensino Médio, e os conceitos sobre a Antiguidade são bastante
generalizadas e com altas doses de anacronismos. Deste modo, o que temos
buscado, enquanto docentes, com uma integração interdisciplinar, é um
despertar para a especificidade de cada área de estudo, e como adotar tal
conhecimento na prática docente, incorporando sempre nessa prática a
pesquisa historiográfica.
A discussão sobre a origem do homem segue para os alunos do 6o. Ano, e aqui
se adentra aos debates sobre "as hipóteses científicas sobre o surgimento da
espécie humana e sua historicidade e analisar os significados dos mitos de
fundação" e em seguida parte para as questões que tratam da "invenção do
mundo clássico e o contraponto com outras sociedades". Neste último, deve-se
introduzir percepções sobre as culturas africanas, orientais e americanas. Mas é
a partir do tema sobre as culturas ocidentais, que se insere o conceito de
Antiguidade Clássica, seu alcance e limite na tradição ocidental, assim como os
impactos sobre outras sociedades e culturas (BRASIL, 2017, p. 421). Essa
abordagem recebeu inúmeras críticas, entre elas, a valorização de uma
perspectiva eurocêntrica, uma vez que África, Oriente e as Américas aparecem
apenas como um contraponto, não destacando o processo de integração entre
as sociedades, nem mesmo o potencial do reconhecimento da alteridade no
ensino de História Antiga (SANTOS, 2019; LEITE, 2020). Dessa maneira, se o
docente não tiver um olhar atento, corre-se o risco de que o ensino de História
Antiga fique restrito a uma visão eurocêntrica e à erudição vazia, distante, assim, 94
da realidade do aluno.
Deste modo, a BNCC propõe que, para essa fase, deve-se trabalhar as ciências
humanas de forma ampliada, defendendo que conceitos de tempo e espaço não
sejam exclusivos da História e da Geografia, respectivamente, mas se
interrelacionam. Assim, o documento afirma que
O modelo proposto pela BNCC para o ensino de História na rede básica parece
inovador, e podemos até dizer promissor, se não fosse uma conjuntura maior
que envolve desde a própria formulação da Base Curricular até chegar à
formação docente. Sem adentrar no debate deste documento, o que se percebe
é que sua proposta de estrutura curricular diz muito sobre “o quê fazer”, mas o
“como fazer” fica totalmente a cargo da autonomia dos professores. Portanto,
para a melhor execução dessa tarefa é imprescindível que os cursos de
formação tenham um olhar atento a Base Curricular, bem como garantir espaços
para a formação continuada dos docentes, em particular, aqueles que
possibilitem a construção de suas próprias ferramentas pedagógicas envolvendo
o uso consciente e crítico das tecnologias.
A atividade foi dividida em duas partes. A primeira parte consistiu em uma análise
de um livro didático, por meio de um roteiro de 7 perguntas, a fim de observar
como esse tema é tratado na educação básica. Solicitou-se que os discentes
prestassem atenção ao texto, às imagens, aos documentos e às atividades
propostas. A segunda parte era o desenvolvimento de um material didático que
fizesse uso de uma tecnologia digital e complementasse o livro didático
analisado. Assim, poderia ser criado podcast, videoaula, jogo etc.
Para essa atividade, a sala foi dividida em grupos. Foi unânime a percepção dos
alunos de que a Pré-História e Antiguidade são colocadas de maneiras
completamente distintas e separadas, com uma divisão abrupta entre o atraso
(Pré-História) e o início da civilização (História Antiga). Milhares de anos de
avanço tecnológico são reduzidos a parcas linhas, e há pouca ênfase para a Pré-
História americana, especialmente a brasileira.
Considerações Finais
Incorporar atividades relacionadas à prática do ensino nas disciplinas de
conteúdo formativo é uma excelente estratégia para pensar sobre a formação do
professor-pesquisador, bem como incentivar os discentes, futuros professores,
a diversificarem suas práticas.
Referências biográficas
Dra. Cláudia Cristina do Lago Borges é professora do Departamento de História
da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Líder do grupo de pesquisa
Humanizarte.
Referências bibliográficas
BORGES, Cláudia C. do Lago; RODRIGUES, Katharine S. do N. Teoria,
método e produção didático-pedagógica no ensino de pré-história. Anais do
XXVII Simpósio Nacional de História, 2013.
LE GOFF, Jacques. A história deve ser dividida em pedaços? São Paulo: Editora
Unesp, 2015.
Jaeger (1995, p. 19) ainda elucida que “A história da educação grega coincide
substancialmente com a da literatura”, uma vez que faltam fontes escritas dos
séculos anteriores à idade clássica “além do que nos resta dos seus poemas”.
Os gregos viam neles a base de sua educação e o ponto de partida de todas as
suas reflexões e traziam, além disso, valores culturais, regras transmitidas de
geração a geração. Além do mais, o poeta figurava para os gregos como um
educador do seu povo, numa concepção familiar e de grande importância para
a formação do homem. É preciso certa cautela ao considerar a Ilíada e Odisseia
como testemunho autêntico de um período na história dos gregos, mas, com as
devidas ressalvas, são os poemas homéricos que indicam um caminho para o
conhecimento literário e histórico de uma época. No que concerne ao processo
de formação do homem grego, os estudos realizados se pautam, não poderia
ser diferente, nos registros deixados justamente pelos poemas homéricos. Assim 102
revela o próprio historiador já citado “a história determinou que só isto ficasse da
existência inteira do Homem. Não podemos traçar o processo de formação dos
Gregos daquele tempo senão a partir do ideal de Homem que forjaram”
(JAEGER, 1995).
“Os heróis da Ilíada, que se revelam no seu gosto pela guerra e na sua aspiração
à honra como autênticos representantes da sua classe, são, todavia, quanto ao
resto da sua conduta, acima de tudo grandes senhores, com todas as suas
excelências, mas também com todas as suas imprescindíveis debilidades. É
impossível imaginá-los vivendo em paz: pertencem ao campo de batalha. Fora
dele só os vemos nas pausas do combate, nas suas refeições, nos seus
sacrifícios, nos seus conselhos.” (JAEGER, 1995, p. 41)
É possível afirmar que os heróis homéricos são heróis da alta classe, eles
representam, pois, o ideal de vida alicerçado na nobreza. Os poemas homéricos
tornaram-se por muito tempo um modelo de vida e de conduta para uma
aristocracia. Convém mencionar que, na Grécia primitiva, Homero, por
excelência, era a fonte de transmissão de exemplos de um ideal de conduta
nobre, pois, para os gregos, era inconcebível um ideal de formação eficaz sem
que se oferecesse ao indivíduo um modelo, ou seja, “uma imagem do homem tal
como ele deve ser”, afirma Jaeger. Se na Grécia primitiva, Homero era
considerado modelo para educação e formação do homem grego, na literatura,
o herói por ele forjado representa o primeiro arquétipo na construção de
personagens heroicos, o que resulta em uma tradição literária que apresenta um 104
herói também nascido da elite. Nesse contexto, não causa estranheza que as
primeiras manifestações literárias reflitam heróis forjados por e para os nobres;
a própria história da formação grega começa no mundo aristocrático da Grécia
primitiva. Esse ideal de formação era justamente o que diferenciava o homem
nobre, regido por normas de conduta; do homem comum, alheio a essas normas.
Nesse sentido, a Ilíada é o testemunho da elevada consciência educadora da
nobreza grega primitiva, representando as tradições vivas da aristocracia de seu
tempo.
Ulisses chega mesmo a declarar que haverá entre eles uma relação familiar, em
virtude do grande auxílio que lhe ofereceram no embate contra seus inimigos:
“Darei a cada um de vós uma mulher, bens e uma boa casa perto da minha; eu
vos tratarei como parentes e irmãos de Telêmaco” (Odisseia, XXI, 214-215). É
importante lembrar que, na Odisseia, as personagens, inclusive o herói,
destacam-se não necessariamente por virtudes heroicas, mas, sobretudo, pelas
virtudes espirituais e sociais. Dispensar um tratamento mais digno para com as
pessoas é o que se esperaria de um herói com qualidades mais humanas. De
fato, é notória a benevolência dele para com aqueles de condição inferior, desde
que demonstrem a devida fidelidade e submissão ao senhorio dos nobres.
Convém lembrar que as servas infiéis, que se haviam deitado com os
pretendentes de Penélope, tiveram um destino funesto, sendo enforcadas no
pátio do palácio sob a supervisão do próprio Telêmaco.
Mas o herói não é reconhecido como tal apenas quando dá ciência de sua
genealogia, ele é herdeiro também de uma nobreza que lhe parece inerente.
Assim, eles são dotados de qualidades excepcionais que reúnem beleza,
inteligência, força, eloquência, coragem; tais atributos os tornam detentores de
um porte inigualável, fazendo com que sejam reconhecidos como nobres mesmo
em meio a uma multidão. Quando Ulisses se depara com seu pai Laertes,
trabalhando em situação deplorável – “ele usava um casaco sujo, vagabundo e
remendado” – comenta “Não há nada em ti que denote um escravo, nem a
estatura nem o aspecto: tens mais o ar de um rei”. Para acentuar a ascendência
nobre do herói, é comum o nome vir acompanhado de um aposto, que indique a
sua procedência paterna, detalhe importantíssimo para o reconhecimento de sua
ilustre genealogia. É importante ressaltar que, mesmo o herói sendo filho de uma
deusa, a predileção é sempre atribuída ao nome do pai mortal: Aquiles, filho de
Peleu ou ainda pélida Aquiles; Agamêmnon, filho de Atreu ou o átrida; Eneias,
filho de Anquises – os heróis de Homero têm a paternidade revelada com
distinção. Somente a Tersites, na Ilíada, não é dado saber o nome do pai, o que
é um sinal característico, revelando que, de fato, não pertencia ao grupo de
guerreiros aristocratas. Para Vidal-Naquet (2002), Tersites “é o eco,
desfavorável, da existência, diante dos áristoi, de classes sociais menos 106
gloriosas”.
Referências biográficas
Aldinéia Cardoso Arantes, doutoranda em História pela Universidade Estadual
de Maringá.
Referências bibliográficas
AGUIAR E SILVA, Vitor Manuel. Teoria e Metodologia Literárias. Lisboa:
Universidade Aberta, 1990.
MOSSÉ, Claude. A Grécia Arcaica de Homero a Ésquilo. Lisboa: Edições 70, 107
1984.
“Assim como a Sabedoria é melhor do que as joias (Provérbios 8), assim uma
mulher forte vale também mais do que pérolas. (...). Essa mulher forte faz o que
o bom israelita [o homem] deve fazer: reparte generosamente com os pobres e
necessitados. Fala com sabedoria e com bondade. É inteligente, prudente, e
sabe julgar [o julgamento cabe ao universo masculino, quando se assenta às
portas da cidade, ou quando precisa tomar uma decisão para o beneficiamento
de sua família, pois ele é o cabeça], mulher que possui bom senso para os
negócios [lembremos das mulheres egípcias, que vão aos mercados, assim
como veremos essa mulher no trato com os homens, os mercadores], que
merece o respeito não só da família mas também dos oficiais da cidade”
(LAFFEY, 1994, p. 279-280).
Vale destacar que na LXX, na Versão dos Setenta, isto é, na tradução da TaNaK
para o grego koiné do período helenístico, para compor a Biblioteca de
Alexandria, o texto grego conserva o campo semântico do hebraico e utiliza para
a mulher (gynaika) o adjetivo grego andreian, o qual significa valente, corajosa,
forte, viril (BAILLY, 2000, p. 148-149), isto é, elementos pertencentes ao universo
masculino, pois o próprio adjetivo aqui se torna uma espécie de trocadilho grego,
pois andreian deriva do substantivo anér, cujo genitivo é andrós relativo ao
campo semântico do homem, no sentido de macho, varão, aquele que possui
virilidade e força. Não está no campo do ánthropos, o homem no sentido de
humanidade que, como coletivo, também pode servir para a mulher, quando
citada como espécie humana. A mulher “virtuosa” do texto da LXX também é a
mulher viril. No mínimo interessante para iniciar uma discussão e boas reflexões,
não? Vejamos mais duas mulheres do texto bíblico que podem suscitar boas
conversas em sala sobre o respeito à diversidade, ao outro que é diferente de
mim, que está fora das categorias “dentro da caixinha”.
De onde surgiu Agar? É uma escrava que provavelmente foi dada a Sara como
na ocasião em que o Faraó a tomou para o seu harém quando Abraão teve medo
de dizer que era marido dela e mentiu. Ou Agar foi dada a Abraão como presente
do Faraó por este ter ficado com Sara no harém (Gênesis 12,10-20). Aqui já
temos uma denúncia de um erro grave e o texto não faz nenhuma questão de
encobrir os fatos que envolveram essa família. E lá está a estrangeira, egípcia,
escrava, que a nada tem direito. Vamos aos textos referentes a Agar (e também
a Abraão) e às surpresas que eles nos revelam.
“Ora Sarai, mulher de Abrão, não lhe dava filhos, e ele tinha uma serva egípcia,
cujo nome era Agar. E disse Sarai a Abrão: Eis que o Senhor me tem impedido
de dar à luz; toma, pois, a minha serva; porventura terei filhos dela. E ouviu
Abrão a voz de Sarai. Assim tomou Sarai, mulher de Abrão, a Agar egípcia, sua
serva, e deu-a por mulher a Abrão seu marido, ao fim de dez anos que Abrão
habitara na terra de Canaã. E ele possuiu a Agar, e ela concebeu; e vendo ela
que concebera, foi sua senhora desprezada aos seus olhos. Então disse Sarai
a Abrão: Meu agravo seja sobre ti; minha serva pus eu em teu regaço; vendo
ela agora que concebeu, sou menosprezada aos seus olhos; o Senhor julgue
entre mim e ti. E disse Abrão a Sarai: Eis que tua serva está na tua mão; faze-
lhe o que bom é aos teus olhos. E afligiu-a Sarai, e ela fugiu de sua face.
E o anjo do Senhor a achou junto a uma fonte de água no deserto, junto à fonte
no caminho de Sur. E disse: Agar, serva de Sarai, donde vens, e para onde
vais? E ela disse: Venho fugida da face de Sarai minha senhora. Então lhe
disse o anjo do SENHOR: Torna-te para tua senhora, e humilha-te debaixo
de suas mãos. Disse-lhe mais o anjo do Senhor: Multiplicarei sobremaneira
a tua descendência, que não será contada, por numerosa que será. Disse-
lhe também o anjo do Senhor: Eis que concebeste, e darás à luz um filho, e
chamarás o seu nome Ismael; porquanto o Senhor ouviu a tua aflição. E
ele será homem feroz, e a sua mão será contra todos, e a mão de todos contra
ele; e habitará diante da face de todos os seus irmãos.
E ela chamou o nome do Senhor, que com ela falava: Tu és Deus que me
vê; porque disse: Não olhei eu também para aquele que me vê? Por isso
se chama aquele poço de Beer-Laai-Rói; eis que está entre Cades e Berede.
E Agar deu à luz um filho a Abrão; e Abrão chamou o nome do seu filho que
Agar tivera, Ismael. E era Abrão da idade de oitenta e seis anos, quando Agar
deu à luz Ismael” (Gênesis 16,1-16): 112
“E o SENHOR visitou a Sara, como tinha dito; e fez o SENHOR a Sara como
tinha prometido. E concebeu Sara, e deu a Abraão um filho na sua velhice, ao
tempo determinado, que Deus lhe tinha falado. E Abraão pôs no filho que lhe
nascera, que Sara lhe dera, o nome de Isaque. E Abraão circuncidou o seu filho
Isaque, quando era da idade de oito dias, como Deus lhe tinha ordenado. E era
Abraão da idade de cem anos, quando lhe nasceu Isaque seu filho. E disse
Sara: Deus me tem feito riso; todo aquele que o ouvir se rirá comigo. Disse
mais: Quem diria a Abraão que Sara daria de mamar a filhos? Pois lhe dei um
filho na sua velhice.
E cresceu o menino, e foi desmamado; então Abraão fez um grande banquete
no dia em que Isaque foi desmamado. E viu Sara que o filho de Agar, a egípcia,
o qual tinha dado a Abraão, zombava.
E disse a Abraão: Ponha fora esta serva e o seu filho; porque o filho desta serva
não herdará com Isaque, meu filho. E pareceu esta palavra muito má aos olhos
de Abraão, por causa de seu filho. Porém Deus disse a Abraão: Não te pareça
mal aos teus olhos acerca do moço e acerca da tua serva; em tudo o que Sara
te diz, ouve a sua voz; porque em Isaque será chamada a tua descendência.
Mas também do filho desta serva farei uma nação, porquanto é tua
descendência.
Então se levantou Abraão pela manhã de madrugada, e tomou pão e um odre
de água e os deu a Agar, pondo-os sobre o seu ombro; também lhe deu o
menino e despediu-a; e ela partiu, andando errante no deserto de Berseba.
E consumida a água do odre, lançou o menino debaixo de uma das árvores. E
foi assentar-se em frente, afastando-se à distância de um tiro de arco; porque
dizia: Que eu não veja morrer o menino. E assentou-se em frente, e levantou a
sua voz, e chorou. E ouviu Deus a voz do menino, e bradou o anjo de Deus
a Agar desde os céus, e disse-lhe: Que tens, Agar? Não temas, porque
Deus ouviu a voz do menino desde o lugar onde está. Ergue-te, levanta o
menino e pega-lhe pela mão, porque dele farei uma grande nação. E abriu-
lhe Deus os olhos, e viu um poço de água; e foi encher o odre de água, e
deu de beber ao menino. E era Deus com o menino, que cresceu; e habitou
no deserto, e foi flecheiro. E habitou no deserto de Parã; e sua mãe tomou-
lhe mulher da terra do Egito” (Gênesis 21,9-21).
“E aconteceu no mesmo tempo que Judá desceu de entre seus irmãos e entrou
na casa de um homem de Adulão, cujo nome era Hira, E viu Judá ali a filha
de um homem cananeu, cujo nome era Sua; e tomou-a por mulher, e a possuiu.
E ela concebeu e deu à luz um filho, e chamou-lhe Her. E tornou a conceber e
deu à luz um filho, e chamou-lhe Onã. E continuou ainda e deu à luz um filho, e
chamou-lhe Selá; e Judá estava em Quezibe, quando ela o deu à luz.
Judá tomou uma mulher para Her, o seu primogênito, e o seu nome era Tamar.
Her, porém, o primogênito de Judá, era mau aos olhos do SENHOR, por isso o
SENHOR o matou. Então disse Judá a Onã: Toma a mulher do teu irmão, e casa-
te com ela, e suscita descendência a teu irmão. Onã, porém, soube que esta
descendência não havia de ser para ele; e aconteceu que, quando possuía a
mulher de seu irmão, derramava o sêmen na terra, para não dar descendência
a seu irmão. E o que fazia era mau aos olhos do SENHOR, pelo que também o
matou.
Então disse Judá a Tamar sua nora: Fica-te viúva na casa de teu pai, até que
Selá, meu filho, seja grande. Porquanto disse: Para que porventura não morra
também este, como seus irmãos. Assim se foi Tamar e ficou na casa de seu pai.
Passando-se pois muitos dias, morreu a filha de Sua, mulher de Judá; e depois
de consolado, Judá subiu aos tosquiadores das suas ovelhas em Timna, ele
e Hira, seu amigo, o adulamita. E deram aviso a Tamar, dizendo: Eis que o teu
sogro sobe a Timna, a tosquiar as suas ovelhas. Então ela tirou de sobre si os
vestidos da sua viuvez e cobriu-se com o véu, e envolveu-se, e assentou-
se à entrada das duas fontes que estão no caminho de Timna, porque via
que Selá já era grande, e ela não lhe fora dada por mulher. E vendo-a Judá, teve-
a por uma prostituta, porque ela tinha coberto o seu rosto. E dirigiu-se a ela no
caminho, e disse: Vem, peço-te, deixa-me possuir-te. Porquanto não sabia que
era sua nora. E ela disse: Que darás, para que possuas a mim? E ele disse: Eu
te enviarei um cabrito do rebanho. E ela disse: Dar-me-ás penhor até que o
envies? Então ele disse: Que penhor é que te darei? E ela disse: O teu selo, e o
teu cordão, e o cajado que está em tua mão. O que ele lhe deu, e possuiu-a, e
ela concebeu dele.
E ela se levantou, e se foi e tirou de sobre si o seu véu, e vestiu os vestidos da
sua viuvez. E Judá enviou o cabrito por mão do seu amigo, o adulamita, para
tomar o penhor da mão da mulher; porém não a achou. E perguntou aos homens
daquele lugar, dizendo: Onde está a prostituta que estava no caminho junto às
duas fontes? E disseram: Aqui não esteve prostituta alguma. E tornou-se a Judá
e disse: Não a achei; e também disseram os homens daquele lugar: Aqui não
esteve prostituta. Então disse Judá: Deixa-a ficar com o penhor, para que
porventura não caiamos em desprezo; eis que tenho enviado este cabrito; mas
tu não a achaste. 115
E aconteceu que, quase três meses depois, deram aviso a Judá, dizendo: Tamar,
tua nora, adulterou, e eis que está grávida do adultério. Então disse Judá: Tirai-
a fora para que seja queimada. E tirando-a fora, ela mandou dizer a seu sogro:
Do homem de quem são estas coisas eu concebi. E ela disse mais: Conhece,
peço-te, de quem é este selo, e este cordão, e este cajado. E conheceu-os Judá
e disse: Mais justa é ela do que eu, porquanto não a tenho dado a Selá meu
filho. E nunca mais a conheceu [= deitou-se com ela]” (Gênesis 38,1-26).
O texto é bastante claro e nos mostra que Tamar seduz o homem a quem ela
escolhe para dar um herdeiro, sob o rigor da lei do levirato, cumprida pelos
hebreus – rito no qual o irmão (na falta deste um parente próximo) do morto
precisa ter relações com a viúva para suscitar descendência ao nome do morto.
Uma vez que Selá está vivo e não realiza o rito, Tamar permanece presa à família
de Judá pela lei. Por isso, ela age com o objetivo de tornar-se mãe. O que essa
mulher faz é usar as amarras patriarcais em seu próprio favor e ser ancestral
tanto da dinastia do rei David, quanto de Jesus. A originalidade subversiva que
ela demonstra ao enfrentar uma situação de sobrevivência é tanto respeitada
pelos homens que temem ao Deus de Israel, quanto abençoada pelo próprio
Deus (BRENNER, 2002, p. 172) e colocada como modelo de obediência na fala
do homem da cena, Judá (um detalhe: ele é bisneto de Abraão): “Mais justa é
ela do que eu...”. Este é mais um relato que nos desafia para repensarmos como
vemos a Antiguidade e os textos que nela eram produzidos, primeiro como
literatura oral, depois como registro escrito e arcabouço cultural de um povo.
Vamos encerrar por ora com mais um texto antigo. Platão, na República,
demonstra-nos Sócrates (ou será a própria opinião de Platão?) falando do trato
e do respeito que deve ser dispensado às mulheres pelos homens. O filósofo
utiliza-se de seu argumento dos contrários, comparando tal tratamento aos
dispensados aos animais, colocando estes – machos e fêmeas – em posição de
igualdade, para que Glauco [o interlocutor do diálogo] reflita sobre a posição das
mulheres como seres iguais. Para tanto, indaga-lhe Sócrates:
Referências bibliográficas
ALONSO SCHÖKEL, L. Dicionário bíblico hebraico-português. Trad.: Ivo
Storniolo, José Bortolini. São Paulo: Paulus, 1997.
Outro fator determinante para tais transformações e que não deve ser
negligenciado é a construção da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que
de certa maneira envolveu parte da sociedade brasileira em seus debates. Tal
processo poderia ter sido mais amplamente discutido e contado com uma parte
maior de agentes ligados ao ensino de História, mas ao longo de sua construção
ficou evidenciado um verdadeiro embate entre forças representantes de
diferentes projetos para a educação nacional. Ao final, foi costurado um
documento que reafirmou a presença da História Antiga no currículo da
Educação Básica, mas que tem sido alvo de constantes questionamentos.
Antes de mais nada, devemos compreender que didático é o livro escrito, editado
e vendido, tendo em vista a utilização escolar e sistemática (LAJOLO, 1996), um
material que se apresenta de maneira universal e onipresente (CHOPPIN, 2002),
esta definição longe de simplificar as coisas, abre caminho para
compreendermos os materiais didáticos como um instrumento complexo e
multifacetado transpassado por aspectos culturais e mercadológicos.
Outra variante importante destes materiais é que estes são produtos culturais,
que inseridos em uma sociedade capitalista devem ser compreendidos como
uma mercadoria, mas que diferente das demais não precisa ser colocada no
mercado à espera de consumidores, uma vez que sua produção e distribuição é
em muitos casos reguladas pelo Estado (MUNAKATA, 2012). Logo, devemos
compreender o livro didático como um produto de consumo que se apresenta
como recurso didático, mas que desemprenha um papel importante na
dominação cultural (MATOS, 2012).
Outro fator que se repete nos livros didáticos e nas salas de aula é a hipótese
causal hidráulica que teria sido responsável pelo desenvolvimento das
civilizações asiáticas. Tal hipótese, já foi superada e mesmo assim permanece
como válida em muitos manuais (GONÇALVES, 2001). Ainda na mesma linha,
podemos citar como exemplo a escravidão no Egito Antigo, erroneamente
associada a construção das pirâmides e outros monumentos, mesmo com
diversas pesquisas apresentando que alguns grupos sociais prestavam
trabalhos forçados para o Estado.
Por fim, chama nossa atenção a existência de um maior destaque alcançado por
civilizações antes relegadas aos boxes ou leituras complementares e que agora
ocupam capítulos próprios. Porém, apesar deste avanço, os livros didáticos
ainda passam a impressão de estanqueidade, levando ao leitor pouca
compreensão da sincronia existente entre muitos eventos narrados pelos
diversos capítulos.
Referências biográficas
Bruno da Silva Ogeda, aluno do Mestrado Profissional em Ensino de História da
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (PROFHistória/UFRRJ).
Referências bibliográficas
BEARD, M. SPQR: Uma história da Roma antiga. Tradução de Luís Reyes Gil.
1ª ed. São Paulo: Planeta. 2017. 124
SILVA, G. V. da. História Antiga e livro didático: uma parceria nem sempre
harmoniosa. Dimensões, Vitória, v.11, jul-dez, p. 231-238, 2000.
Introdução
O ensino de História Antiga, por muito tempo apresentado apenas no Ensino
Fundamental II, foi antecipado pela Editora Educacional da Rede Pitágoras, a
partir de sua coleção de materiais didáticos de 2015, surgindo no livro 2 do 3º
ano do Ensino Fundamental. De forma breve, simples e lúdica, a temática do
Egito Antigo surge em dois momentos: numa breve comparação com outras
sociedades do chamado “Crescente Fértil”, e numa apresentação mais detalhada
da sociedade egípcia antiga, com as principais características de sua cultura.
“Cultura material, então, não é algo para ser contemplado nostalgicamente, mas
indício de práticas humanas e suas variações, entre a prescrição e as
apropriações. No caso aqui abordado a cultura material escolar interessa na
medida em que ali estão inscritas as possibilidades de práticas, de usos dos
objetos, com fins educativos, o que permite averiguar os conteúdos disciplinares
ministrados, a metodologia empregada, as atividades realizadas etc.”
(MUNAKATA, 2016, p. 134).
De acordo com o historiador francês Alain Choppin (2000, p. 30) "em um livro
didático, tipografia e composição da página estão estreitamente relacionados
ao discurso didático: desenvolvem um código com coerência, mas um código
próprio dessa ferramenta e exclusiva dela." De fato, o uso de cores, de ícones,
de elementos têm funções específicas que se repetem ao longo da obra.
Principalmente nas obras direcionadas aos estudantes do Ensino Fundamental
I, o conteúdo do manual não tem apenas um texto único e sim uma série de
textos, fotos, esquemas e gráficos, para simplificar a compreensão e torná-la
mais dinâmica.
“Nesse sentido, é importante que o professor crie situações rotineiras, nas suas
aulas, de atitudes questionadoras diante dos acontecimentos e das ações dos
sujeitos históricos, possibilitando que sejam interpretados e compreendidos a 128
partir das relações (de contradições ou de identidade) que estabelecem com
outros sujeitos e outros acontecimentos do seu próprio tempo e de outros
tempos e outros lugares, isto é, relações que estabelecem por suas
semelhanças, suas diferenças, suas proximidades, suas dependências, suas
continuidades. As explicações dos alunos para os questionamentos devem
considerar, assim, uma multiplicidade de entendimentos, de abrangências, de
confrontamentos e de relações, revelando tramas conflituosas para a história
estudada.” (BRASIL, 1997, p. 54).
"O Guia do livro didático, organizado pelo MEC para auxiliar o professor na
seleção e escolha dos livros a ser adotados, refere-se sempre a esse material
como subsídio, suporte ou instrumento de apoio às aulas [...] um referencial e
não como um texto exclusivo, depositário único do conhecimento escolar"
(BITTENCOURT, 1997, p. 219).
Após algumas atividades, o box Você Sabia? articula o texto bíblico como
referência para abordar dois contatos entre povos dessa região: o cativeiro da
Babilônia (2Rs 25.8-12), quando o povo hebreu esteve sob o domínio do Império
Babilônico, fato histórico comprovado por outras fontes; e a escravidão dos
hebreus no Egito (Ex 1. 8-14), que não foi comprovada por demais fontes. Ambas
as temáticas foram tratadas de forma similar na escrita do livro didático, sem que
a informação de que uma delas não apresenta evidências externas à narrativa
bíblica fosse sequer citada.
Considerações finais
A temática do Egito Antigo foi privilegiada nessa obra, talvez pelas inúmeras
referências a essa sociedade que se tem em filmes e na cultura pop atual. Os
métodos pedagógicos e as concepções historiográficas se mostram em
sintonia com as propostas dos Parâmetros Curriculares Nacionais. A linguagem
utilizada é acessível ao público infantil, mas com algumas poucas
inconsistências na simplificação dos assuntos. As poucas referências do
contexto de produção de algumas imagens pode dificultar um trabalho mais
efetivo com o vestígio. Por sua vez, a forma lúdica, com muitas imagens e
exercício da imaginação ajudam no entendimento dos conteúdos.
Referência Biográfica
Clivya da Silveira Nobre é mestranda no Programa de Pós-Graduação em
História da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (PPGH-UFRN) e
bolsista remunerada CAPES. É graduada em História (Licenciatura) pela
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
Referências Bibliográficas
A BÍBLIA sagrada: edição pastoral. São Paulo: Paulus, 2012.
MUNAKATA, Kazumi. Livro didático como indício da cultura escolar. Hist. Educ.
(Online), Porto Alegre, v. 20, n. 50, Set./dez., 2016, p. 119-138.
A LISÍSTRATA DE ARISTÓFANES E O PAPEL SOCIAL
DA MULHER NA GRÉCIA DO SÉC. V AEC
Dalgomir Fragoso Siqueira
134
Dadas as distâncias espacial e temporal que separam os alunos dos temas
abordados nas aulas de História, sobretudo de Antiguidade Clássica, faz-se
necessário um empreendimento maior do professor a fim de despertar o
interesse dos educandos pelo assunto. Nesse sentido, devemos atentar para o
fato de que “a construção do conhecimento histórico, bem o sabemos, requer
contextualização (SOUZA NETO, 2014, p. 3)”, o que denota a necessidade de
inserir no universo dos educandos fontes alternativas, para além do material
didático, como obras e expressões culturais que os envolvam e aproximem do
tema estudado. Tendo isso em mente, o teatro grego configura uma valiosa fonte
para o ensino de História Antiga, uma vez que:
A missão mais importante que competia à mulher grega era justamente a de mãe
de família. Para os antigos gregos, o casamento não tinha o significado de
sacramento, típico da cultura judaico-cristã em que vivemos, e a principal razão
que justificava o matrimônio para aquela sociedade era o dever de perpetuar a
raça. “Sobre a mulher pesava, com a força de uma ameaça, a obrigação de dar
ao marido descendência, e sobretudo um filho varão, que herdasse o dever de
perpetuar a raça e o patrimônio e manter vivo o culto dos antepassados (SILVA,
1980, p. 102)”. Por esses motivos, era incomum haver sentimentos profundos
entre marido e mulher na Grécia Antiga, o que dentre outros fatores, limitava
consideravelmente as relações conjugais.
Uma questão presente na obra que pode ser problematizada está relacionada à
sexualidade, visto que não faria sentido uma greve de sexo numa sociedade
onde havia diversas opções alternativas de relações fora do casamento.
Entretanto, através das queixas do personagem Cinésias, percebemos que os
homens perderam suas esposas não só sexualmente, mas também as
perderam, por exemplo, no que tange aos cuidados dos filhos:
“CINÉSIAS - (para sua esposa, Mirrina) Está ouvindo? Não tem pena do pobre
garotinho? Há seis dias que não se lava, nem come direito.
MIRRINA - Claro que tenho pena, pobre filho. Um pai tão negligente.
CINÉSIAS - Desce, querida, vem cuidar dele um pouco.” (ARISTÓFANES, 2003,
p. 38, Trad.: Millôr Fernandes).
“CINÉSIAS - ... A vida não tem mais encantos para mim desde que ela
abandonou meu lar. Entro em casa com o rosto em pranto, tudo me parece tão
vazio, até meus alimentos já não têm sabor [...]” (ARISTÓFANES, 2003, p. 38, 138
Trad.: Millôr Fernandes).
Considerações Finais
A utilização de fontes diversas em aulas de história, como elucidado no início
desse trabalho, pode contribuir para uma aproximação dos educandos com o
tema, tornando a experiência da aprendizagem mais interessante para eles.
Cabe ao professor ter o conhecimento sobre como utilizar, da melhor forma
possível, cada tipo de fonte, levando em consideração as especificidades de
seus alunos e do tema abordado. Nesse sentido, usar o teatro grego como fonte
pode requerer um maior esforço do educador, o que implicaria empreender
pesquisas mais aprofundadas sobre as obras. Tal esforço, contudo, tende a
render bons resultados, como quando se busca despertar o interesse dos alunos
pelo papel social feminino na Antiguidade, um dos muitos temas que podem ser
trabalhados a partir da Lisístrata de Aristófanes.
Referências biográficas
Dalgomir Fragoso Siqueira é Graduando em Licenciatura em História pela UPE
– Campus Mata Norte.
Referências bibliográficas
ANDRADE, Marta Méga de. Aristófanes e o Tema da Participação (Política) da
Mulher em Atenas. PHOÎNIX, p. 263-280, 1999.
MATA, Giselle Moreira da. “Entre risos e lágrimas”: uma análise das 139
personagens femininas atenienses na obra de Aristófanes (séculos VI a IV a.C.).
Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de Goiás, Faculdade de História,
2009.
Introdução
Ao longo do ano letivo de 2019, ocorreu a Oficina de Jogos Filosóficos, na Escola
Estadual Desembargador Floriano Cavalcanti (FLOCA), localizada no bairro de
Capim Macio na zona sul de Natal, capital potiguar. O projeto transdisciplinar foi
direcionado aos discentes de todo Ensino Médio e realizado em parceria com o
Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) de Filosofia.
Os encontros da Oficina de Jogos Filosóficos ocorreram semanalmente, todas
as quartas-feiras e sextas-feiras, durante o horário do intervalo, com objetivo de
estudar sobre conceitos filosóficos e contexto histórico da mulher na Antiguidade
a partir do jogo Salve Hipátia!, elaborado pelo professor de Filosofia e de História,
Douglas André Gonçalves Cavalheiro.
E, inspirado pela premissa histórica verificável e correta, de que Hipátia foi uma
mulher, filósofa, cientista, inventora do densímetro e vítima de uma perseguição
religiosa na Antiguidade Tardia foi criado o jogo “Salve Hipátia!”. A partir desse
contexto histórico, inserindo a premissa contemporânea dos filmes de ficção
científica sobre viagem no tempo, optou-se por criar o principal objetivo do jogo,
“Salve Hipátia!, que é centrado em uma viagem ao tempo para resgatar o projeto
do densímetro e trazê-lo de volta ao tempo-presente para salvar o planeta terra
da destruição. Porém, a viajem no tempo é falha, pois os participantes acabam
sendo inseridos em diversas temporalidades distintas da Antiguidade e apenas
um único participante poderá retornar ao tempo-presente. Por isso, é necessário
que os jogadores utilizem os conceitos filosóficos de diversos pensadores que
encontraram em sua viagem no tempo, desde os pré-socráticos aos helenistas,
para que possam trazer o densímetro e salvar o mundo. Porém, como apenas
um pode retornar ao tempo-presente, os participantes deverão confrontar-se
num duelo de conceitos filosóficos.
Modo de Jogar
Nesse jogo são permitidos entre 2 a 4 pessoas. Primeiro, uma carta é distribuída
para cada pessoa e uma é descartada com a face para baixo da rodada
(portanto, o processo de eliminação não pode ser usado para provar quais cartas
restam) e o restante é depositado com a face para baixo em um baralho no meio.
Durante o turno de cada jogador, ele ou ela compra uma carta do baralho e joga
essa carta ou a carta que eles já tinham. Após processar o efeito descrito na
carta descartada, o próximo jogador recebe um turno. Isso é repetido até que o
baralho desapareça; nesse caso, o jogador que tiver a carta mais alta vence a
rodada ou até que todos os jogadores, exceto um, sejam eliminados; nesse caso,
o jogador restante vence a rodada. O baralho (incluindo a carta descartada) é
embaralhado e o jogo começa novamente. O vencedor de quatro turnos vence
o jogo. A duração média é entre 20 a 30 minutos.
146
Considerações Finais
Ao refletir sobre as disposições dos conteúdos inseridos nas estruturas
curriculares é perceptível que essa forma de organizar o conhecimento não
soluciona adequadamente os novos questionamentos impostos sobre as
relações de gênero, em especial, sobre a presença feminina sempre
representada apenas como personagens secundários e reservados aos valores
da maternidade. Mesmo com a recente inclusão da história do movimento
feminista ao longo dos estudos das ciências humanas, inserindo também a
colaboração de importantes mulheres nas descobertas científicas, esses
conteúdos encontram-se sempre nos momentos temporais contemporâneos,
algo que ocasiona na consolidação da imagem de que o patriarcalismo era
triunfante nos demais períodos históricos anteriores.
Referências biográficas
Douglas André Gonçalves Cavalheiro é professor de Filosofia da Secretaria
Estadual de Educação e Cultura do Rio Grande do Norte (SEEC-RN). Mestre em
Filosofia pela UFRN (2014). Licenciado em História (2018) pela UFRN e
atualmente é mestrando pela mesma universidade.
Referências bibliográficas
ÁGORA. Direção: Alejandro Almenábar. Produção: Fernando Bovaira, Álvaro
Augustin. Elenco: Rachel Weisz, Max Mingnella, Oscar Isaac, Rupert Evans.
Roteiro: Alejandro Almenábar. Focus Features, 2009, 126 minutos.
ALVES, Lynn Rosalina Gama, MINHO, Marcelle Rose da Silva, DINIZ, Marcelo
Vera Cruz. Gamificação: diálogos com a educação. In: BATISTA, Claudia
Regina. et al. (Org.) Gamificação na Educação. São Paulo: Pimenta Cultural,
2014. p. 75 – 97.
KANAI, Seiji. Love Letter. Kanai Factory Edition: Alderac Entertainment Group,
California, USA. 2013. (cardgame)
PAVIANI, Jayme. Interdisciplinaridade: conceitos e distinções. 2ª ver. Caxias do
Sul, RS: Edcus, 2008.
Para o autor, além dessa abordagem que influenciou a escrita da história antiga
no século XIX, houve ainda duas outras noções que determinaram e
influenciaram as formas da escrita da História Antiga: as noções de civilização e
de progresso.
Dentro desse debate, a obra de Gustave Glotz (1980), aborda a Grécia antiga,
com destaque para Atenas e Esparta, no interior da qual as experiências político-
culturais espartanas são compreendidas como antimodelo à ateniense.
Notamos, desde o início, uma escolha clara pelo modelo político-cultural
ateniense em oposição ao espartano, o primeiro constituído como o futuro e o
segundo como o passado; um passado que se tornou obsoleto, ultrapassado.
Percebemos, na obra de Glotz, uma simpatia ao modelo democrático pensado
por Aristóteles, visto que o autor corrobora com o argumento de que o povo é
formado por uma maioria que nem sempre sabe o que é melhor para a cidade.
Portanto, a democracia não funcionava, de modo eficiente, como forma de
governo pois defendia a igualdade entre desiguais, o que pressupõe que apenas 151
determinadas categorias sociais estivessem à frente das decisões políticas da
comunidade. Segundo Aristóteles, a participação popular (camponeses,
artesãos, comerciantes) deveria ser desestimulada. Esse modelo de
pensamento foi bastante difundido no século XIX.
O autor aborda a história da Grécia em pontos que, ora são abordados de forma
semelhante a Justiniano Jose da Rocha e Victor Duruy, ora se diferem, como
poderemos perceber ao longo desse escrito. Em relação à democracia
ateniense, lemos:
Referências bibliográficas
ARISTÓTELES. Constituição de Atenas. Tradução de Francisco Murari Pires.
Ed. Bilíngue, São Paulo: Editora Hucitec,1995. 157
GLOTZ, Gustave. A cidade Grega. Rio de Janeiro: DIFEL difusão editorial S.A.
1980.
É importante salientar que nesse momento muitos grupos fizeram uso das fontes
visuais, anotando as cores que observavam nas imagens, copiando modelos das 162
roupas e observando o formato dos cabelos e acessórios que costumavam
utilizar desenhando nos cadernos o que observavam.
Uma das grandes questões dessa turma era o baixo nível de alfabetização.
Dessa forma, a utilização das imagens, expressões artísticas e vídeos foram
amplamente trabalhados com os alunos no intuito de não ficar preso apenas ao
uso das fontes escritas. Corroboramos com Knauss (2012, p.47) quando afirma
que “No caso da história, ler não implica apenas textos narrativos, mas
igualmente outros tantos testemunhos da época, como mapas, iconografia e
expressões artísticas em geral” e um dos objetivos traçados para esse conteúdo
foi exatamente nesse sentido, de trabalhar com diversas fontes historiográficas
para que o aluno não se restringisse apenas às fontes tradicionais de ensino.
Na terceira aula da semana, cada grupo apresentou o que tinha pesquisado para
a turma e uma aluna levantou a questão de Cleópatra não ser preta como a
imagem abordada no exercício da primeira semana. De acordo com a análise
feita pela aluna, com a miscigenação de Cleópatra ela concluiu que a rainha
seria considerada “morena” no nosso tempo. Essa fala da aluna gerou um debate
sobre o que é ser preto, pardo, negro e um reconhecimento e pertencimento nos
próprios alunos da sua etnia.
As últimas aulas sobre o tema foram reservadas a trabalhar alguns pontos que
deveriam ser esclarecidos com os alunos. A primeira aula da semana foi
dedicada à vestimenta dos egípcios, alguns alunos tinham desenhado em seus
cadernos como eram as roupas e tinham anotado o tecido que era usado. Como
muitos não conheciam um tecido natural de linho a docente levou uma blusa de
linho e uma de seda para eles visualizarem um tecido totalmente feito com fios
naturais. Ela pediu para os alunos encostarem nos tecidos, que percebessem a
diferença dos dois e que devido ao linho ser um tecido muito caro por ser natural,
as roupas do dia a dia eram confeccionadas em tecidos diferente por serem mais
baratos que o linho, mas lembrou que naquela época eles não tinham essa
opção por ainda não ter sido inventado o poliéster, material sintético que
compunha seus uniformes escolares “Como percebemos a vestimenta também
possibilita o conhecimento histórico, pois os objetos são em muitas culturas uma
extensão do próprio corpo e trazem consigo uma teia de significados e
representações sociais, econômicas, políticas e culturais. Sendo assim, é de
grande relevância o aluno perceber a historicidade presente nos objetos,
cenários e roupas históricas, pois são a representação de sociedades do 164
passado dotadas de sentimentos e significados históricos e isso permite ao aluno
um maior contato com o fato histórico” (GROCHOSKI; STRONA, 2020, p.107)
Conclusão
O trabalho aqui descrito teve o intuito de apresentar como a disciplina de história
trabalhou o tema Egito Antigo em consonância com os PCNs e com as novas
pesquisas referentes ao ensino de História. Apesar de muitos pontos ainda terem
permanecido enevoados e alguns estereótipos terem sido mantidos, muitos
avanços nas discussões referentes à lei 10.639/2003 puderam ser trazidos e
trabalhados em sala de aula. Podemos afirmar que o trabalho em equipe dos
alunos gerou uma aproximação e pertencimento da turma com a disciplina e,
utilizando do conceito de Luckesi (2014), que enxerga a avaliação como uma
parceira para analisar se os objetivos traçados foram alcançados, podemos
perceber resultados satisfatórios. Os alunos que não tiveram um bom
desempenho durante o ano, nesse momento tiveram seus saberes e
competências valorizados validando a importância da diversificação dos
instrumentos avaliativos.
Referência biográfica
Jayza Monteiro Almeida é mestra em Ensino na Educação Básica pela
Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Professora EBTT-História do 165
IFPA campus Altamira. Integrante do grupo de pesquisa Tecnologia e Educação
no Xingu e Região da Transamazônica.
Referências bibliográficas
ABUD, Katia Maria. A História nossa de cada dia: Saber escolar e Saber
acadêmico na sala de aula. In: MONTEIRO, Ana Maria; GASPARELLO, Arlette
Medeiros; MAGALHÃES, Marcelo de Souza. (org.). Ensino de História: sujeitos,
saberes e práticas. 1. ed. Rio de Janeiro: Mauad X, 2007. p. 25-72.
COSTA, Carolina Lima. A História Antiga presente no Livro Didático. In: BUENO,
André.; CAMPOS, Carlos Eduardo; BORGES, Airan. (org.). Ensino de História
Antiga. 1. ed. Rio de Janeiro: Sobre Ontens/UFMS, 2020. p. 98-103.
FREIRE, Paulo. À sombra desta Mangueira. 11. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
2013. 256 p.
Outro problema desse modelo, é que tende para uma linearidade dispersa de
grupos que sucederam outros conquistados: sumérios, acádios, gútios, amoritas
etc. Isso condiciona à estrutura mesopotâmica em um sistema de “ilhas”, onde
existe uma confusa justaposição de civilizações que supostamente tiveram sua
primazia histórica, desempenhando um papel de liderança sobre as derrotadas.
Essa sequência leva a uma contínua sucessão de reinos, que pode muito bem
cimentar à ideia de populações desordenadas em uma temporalidade um tanto
quanto exótica e alheia.
171
Philippe Beaujard (2016, p. 31) reforça essa ideia comentando que esses centros
desenvolveram inovações tecnológicas que junto ao poderia militar e ideológico,
permitiram-lhes construir um setor produtivo e eficiente, com redes de
intercâmbio onde eram globalmente dominantes. A vantagem demográfica
também contribuiu em grande parte para a supremacia dos núcleos, permitindo
importantes inversões na agricultura, na mobilização de tropas e manufaturas.
Trocas assimétricas foram estabelecidas com as semi-periferias e periferias
mediante uma relação de “atração” dos produtos manufaturados (principalmente
têxtil), na qual eram trocados por matérias-primas (ou semi-processadas) e
escravos.
Reforçando essa ideia de demarcações, Michael Roaf (1990, p. 19) ressalta que
o desenvolvimento alimentício é um requerimento básico para a instalação
populacional, dependendo do ambiente e lugar. O Antigo Oriente Próximo era
conhecido como terra dos cinco mares, circulado pelo Mediterrâneo, Negro,
Cáspio, o golfo e o mar Vermelho. As empreitadas marítimas, de certa forma,
tiveram menos importância que as vias terrestres no estabelecimento humano.
As paisagens resumem-se em: pântanos no Sul do Iraque, passando por
desertos de basalto na Jordânia e Síria, até montanhas cobertas de neve no Irã.
Cada ecossistema é distinto por sua diversidade na vegetação, também impondo
métodos de subsistência em seus habitantes. Uma das poucas semelhanças
compartilhadas da área é a falta de chuvas nos meses de verão. A variedade
dos hábitos em proximidade possibilitou diferentes modos de vida coexistindo
em incessantes inter-relações, um fator que pode ter levado a uma mistura de
ideias e estimulado tecnologias, ciência e avanços sociais no Oriente Próximo.
Jean-Claude Margueron (2013, p. 21) comenta que não é fácil delimitar a
precisão da entidade mesopotâmica, pois ali nunca houve limites claramente
definidos. Nossos atuais conceitos de fronteira são demasiados modernos,
portanto, inválidos para tal temporalidade. Assim, a bacia hidrográfica constituiu
um caráter físico essencial, que nos permite explicar a gênesis e a evolução
daquele setor. Foi o que proporcionou o verdadeiro fator de unificação,
viabilizando a instalação de pessoas, sem as quais ali seria apenas um deserto
(MARGUERON, 2013, p. 21).
A ambiência mesopotâmica foi propícia para tais interações, sendo ditada pela
dinâmica dos rios que praticamente facilitavam esses vínculos em todas as
direções. A geografia local ajudou a modelar a própria concepção de realeza,
como explica Joaquín Sanmartín (1998, p. 11), a ideia universal de poder
aparece inerente no meio político mesopotâmico, desde suas primeiras
manifestações conscientemente estatais, quando os monarcas adotaram o título 173
de “reis das quatro regiões”. Jean-Claude Margueron (2003, p. 26) elucida que
o nome “meso potamos” não se aplicou sempre a mesma extensão, e que no
período helenístico, essa terminologia estava relacionada a porção setentrional
da bacia, sendo mais recente o uso que inclui o território babilônico e sumério, e
também outras faixas limítrofes a essa expressão topográfica. Tal modificação
semântica (da designação do todo por uma de suas partes), levou a mascarar
um traço fundamental na realidade geográfica, a divisão regional que os
especialistas classificam como norte e sul, sendo que as condições humanas
nessas localidades variam muito.
Seria praticamente uma tarefa hercúlea buscar uma nova interpretação dessas
instituições seguindo a cosmovisão das sociedades do Oriente Próximo, não
obstante, procurar enxergar por outra ótica como esses povos entendiam as
suas estruturas organizacionais, pode ser uma maneira de evitarmos um pouco
o pensamento estatal na alçada moderna. Como explica Marcelo Rede (2009, p.
137), a noção de Kittum consegue ser interpretada em um nível abstrato, com
origem em uma raiz que significa “ser/tornar estável”, também podendo ser
traduzido por verdade, justiça, correção e equilíbrio. Isso indica um atributo mais
geral do soberano enquanto responsável pela ordem social, exercendo essas
pujanças pelo zelo contínuo, combatendo todas as manifestações caóticas. Por
motivos de forças maiores, como por tradição historiográfica e por não existir um
empenho acadêmico rigoroso para uma compreensão mais apurada e
conceitualizada, seguimos utilizando as terminologias conhecidas como Antigo
Oriente Próximo e Mesopotâmia, no entanto, é necessário mantermos atenção
para outros tipos de nomeações.
176
Essas noções precisam ser repensadas no intuito de evitar certos erros teóricos
que ainda persistem nos livros didáticos, levando a interpretações no mínimo
ultrapassadas sobre a Mesopotâmia. Por muitas vezes essas sociedades são
vilipendiadas, descritas com déspotas que oprimiam seu povo através da força
e com impostos abusivos (uma velha herança de um marxismo ortodoxo
baseado no modo de produção asiático). Pelo despotismo também eram
conquistados outros reinos, esboçando um cenário de total carnificina. A guerra
fora um fator muitas vezes ideológico no Oriente Próximo, mas a questão dos
extremos coopera com uma visão negativa e pessimista sobre o tema. Pode-se
observar uma certa dicotomia nesse aspecto entre a Antiguidade Oriental e a
Clássica, onde esses valores muitas vezes são opostos, sendo a última vista
com bons olhos e berço de todas as nossas tradições culturais.
Essa visão está em cotejo com o que Robin Osborne (2002, p. 9-10) entendeu
como um “ícone” e um “enigma” da cultura clássica grega. Ícone por sua herança
arquitetônica ser referência para o mundo ocidental, colocando a arte figurativa
no centro a exploração e a sensualidade do corpo, os dilemas e as crises que
assediam o indivíduo e a comunidade, desdobrando-se com matizes na tragédia,
na filosofia, no conceito de política como uma soma de ações determinadas
através de uma assembleia popular. Um enigma porque as cidades gregas
cresceram diferentes daquelas do Antigo Oriente; menores, mais ou menos 177
independentes, com falta de recursos básicos, fazendo os gregos se
dispersarem por todo o Egeu e Mediterrâneo, muitas vezes lutando entre si. Com
os eventos das guerras médicas em meados do século V a.C., houve uma união
da Hélade com características suficientes para os próprios gregos encontrarem
similaridades em sua cultura, diferenciando-os dos persas.
É inevitável que esse problema de dispersão exista, até porque essa questão de
tentarmos entender de maneira conjunta é metódica, e mesmo que os
documentos sobre os povos mesopotâmicos sejam abundantes, está separado
por intervalos de tempo em uma grande extensão territorial. Dominique Charpin
(1995, p. 807) comenta que os historiadores que fazem um levantamento
sintético da história dos sumérios e acádios, se deparam com a dificuldade da
divisão periódica. Apesar de existir um certo consenso sobre a organização em
períodos dos três milênios que separam o surgimento da escrita na Suméria com
a chegada de Alexandre Magno. Ainda que válido, esse sistema é questionado
por privilegiar épocas que os recursos textuais são mais abundantes, separando-
as assim da “idade das trevas”, fases essas que não duraram mais que um
século e interromperam o desenvolvimento das “civilizações mais ilustres”.
Marc Van de Mieroop (1997, p. 6-7) argumenta que esse quadro de periodização
levou a história da Mesopotâmia a destacar com mais ênfase eventos políticos
e militares, em razão de serem considerados os acontecimentos mais
importantes. Essas atividades eram apenas duas dimensões da vida
mesopotâmica, e mesmo que de fato as fontes históricas mostrem evidências de
mudanças ao longo da histórica local, elas são exageradas, dado que os livros
descrevem em detalhes sucessões reais e guerras, dentro e fora do escopo
regional. Mieroop segue a ideia de que esse modelo tradicional dos estudos
mesopotâmicos leva a uma história de eventos e factual (histoire 179
événementielle). Assim temos uma longa lista dinástica baseada em tradições
nativas e em classificações modernas. As dinastias que são proeminentes nos
registros textuais receberam seu próprio período (Terceira dinastia de Ur,
Babilônica, Neo-Assíria). Outras menos documentadas foram classificadas
como: Isin-Larsa, Pós-Cassita etc. Quando o centro de poder político muda da
Acádia para Ur, ou dessa para Isin, ou um soberano persa substituiu um rei
caldeu, estabelecemos limites intransponíveis nas relações históricas.
Consequentemente não é investigado se essas transições de controle dinástico
foram de crucial importância. A prática de caracterizar os estudos econômicos,
legais, sociais, literários e religiosos dentro de um quadro temporal da realeza,
aumentou ainda mais a importância dos eventos políticos. Assim a sociedade
acádia, por exemplo, é investigada isoladamente de situações que a sucederam
ou a precederam. O resultado da periodização é falho, ao invés de reconhecer
padrões de continuidade, ele designa instabilidade e mudança. E essa
fragmentação se torna ainda mais errônea quando aspectos da Mesopotâmia
não diretamente dependentes da sorte da Casa Real são estudados.
(MIEROOP, 1997, p. 7).
Referência biográfica
Leonardo Candido Batista, Mestre em História Social pela UEL.
Referências bibliográficas
ALGAZE, Guillermo. Ancient Mesopotamia at the Dawn of Civilization. The
Evolution of an Urban Landscape. Chicago. The University of Chicago Press,
2008.
MAIER, John. The Ancient Near East in Modern Thought. In: SASSON, J.
(org.). Civilizations of the Ancient Near East, vol 1. New York: Simon and
Schuster Macmillan, 1995.
MILANO, Luciano. Il Vicino Oriente Antico: Dalle Origini ad Alessandro Magno. 181
Milano: Encyclomedia Publishers, 2012.
ROAF, Michael. Cultural Atlas of Mesopotamia and Ancient Near East. New
York: Facts on File, 1990.
Neste ano, 2021, o debate para a definição de museu elaborada pelo ICOM
(Conselho Internacional de Museus) está em revisão. Espelhos e laboratórios do
nosso contexto social, os museus e locais patrimoniais devem estar atentos às
principais características da sociedade do século XXI definidas por Anico (2005,
p. 84) como uma sociedade plural, multivocal, fragmentada, consequência de um
conjunto de fatores que englobam os processos de descolonização, a criação de
blocos supranacionais, o crescimento do turismo e o desenvolvimento de um
sistema econômico à escala global, entre outros, um contexto que proporciona
uma multiplicidade de possibilidades para a sua adaptação, transformação e
imaginação.
É notório que o museu tem o papel de informar e educar por meio de exposições
permanentes, atividades recreativas, multimídias, teatro, vídeo e laboratórios. É
o espaço ideal para despertar a curiosidade, estimular a reflexão e o debate,
promover a socialização e os princípios da cidadania, e colaborar para a
sustentabilidade das transformações culturais. Mas, em tempos de pandemia
como cumprir sua função?
Nossa primeira ação foi intensificar a coleta de dados para alimentação na Base
de dados Samburá (2020), que foi desenvolvido por Lia Raquel Toledo
Brambilla Gasques e Ricardo Brambilla Gasques e alimentado pelos dados
obtidos pelos projetos de nossa equipe. Afinal, tal suporte de informação pode
ser entendido como o registro de informações em materiais, com as ações,
rotinas e conhecimentos do homem criados desde seus primórdios. Esses
suportes são produzidos com o objetivo de transmitir os pensamentos,
expressões do indivíduo para as futuras gerações. Nesse contexto destaca-se a
função relevante dos vestígios arqueológicos no resgate da memória social e
sua utilização no ensino de Pré-História. Para esse fim, o MuArq criou um
sistema de informação que permite integrar todo o processo de pesquisa
arqueológica, realizada pela equipe do MuArq, obtida no Mato Grosso do Sul e
a disponibilização destes dados para escolas, academia, profissionais liberais e 184
órgãos do governo municipal, estadual e federal auxiliando os trabalhos e
pesquisas destes e no ensino de Pré-História. A Base de dados Samburá
permitirá o registro, armazenamento e exploração de informações
arqueológicas, bem como seu cruzamento, proporcionará uma direta conexão
com a cartografia, a fim de facilitar a posterior interpretação e publicação dos
resultados. A visualização do cenário de ocupação arqueológica em Mato
Grosso do Sul, ficará cada vez mais visível e para que este sistema de
informação seja consistente. Como são muitos dados e mais de 250 mil peças
armazenadas na reserva técnica deste museu, a equipe, contando com
estagiários da Geografia e História, fizeram o tratamento, processamento e
cadastro de parte dos dados arqueológicos de nossa reserva, no ano de 2020.
Ainda que os avanços tecnológicos permitam cada vez mais acesso a recursos
como descrição por áudio, a difusão do Braile revolucionou a vida de quem não
enxerga, pois abriu caminho para a inclusão e a compreensão do mundo. O
MuArq pensando em deixar a exposição mais acessível, buscou elaborar folhas
de explicação das vitrines em Braile, cujas 12 folhas, que foram impressas pela
biblioteca Estadual Isaías Paim e escritas pelo professor do método, João
Tavares, fornecem acessibilidade sobre nossas legendas para pessoas com
deficiência visual. Além deste material, foi criada uma caixa com 5 peças lito-
cerâmicas para que as pessoas possam ter uma experiência tátil, sentindo as
marcas de lascamento e polimento das peças líticas e texturas das cerâmicas
pré-históricas.
187
Referências biográficas
Lia Raquel Toledo Brambilla Gasques é mestra e doutoranda em Arqueologia
Pré-Histórica pela Universidade de Barcelona – Espanha. Coordenadora e
Técnica lab. de Arqueologia do MuArq / UFMS.
Introdução
O objetivo deste estudo está em fazer uma análise do desenvolvimento
comercial romano, ao ter por base a visão do jurista Cícero (romano) tendo em
vista que, paralelamente, houve a diminuição de um contingente armado
valorizado por este advogado, conhecido por soldado cidadão, que, embora não
fizesse parte de um exército regular, este personagem atuava em momentos de
crise, com o intuito de defender as fronteiras de Roma, tendo por recompensa o
espólio obtido junto aos povos vencidos. Um fato que tornava esse personagem
mais leal ao seu general que permitiu tal ação do que ao próprio Senado
Romano. Conforme afirma Kenneth Minogue:
“Os romanos pensavam na sua cidade como uma família e no seu fundador
Rômulo como o ancestral comum a todos. [...] Enquanto os gregos foram teóricos
brilhantes, inovadores, os romanos foram agricultores-guerreiros sérios e
prudentes [...]” (MINOGUE, 2008, p. 29-30).
Para tornar este estudo possível também foram utilizadas análises do já falecido
historiador Moses I. Finley, estabelecendo um contraponto com o conhecimento
divulgado na obra didática: “Projeto História Araribá – 5ª série”. Trata-se de uma
obra que compõe um conjunto de quatro livros escolares, produzidos com
utilização de dinheiro público, com intuito de atender as diretrizes do Programa
Nacional do Livro Didático (PNLD: 2008, 2009, 2010), contudo, o material voltado
à quinta série foi o escolhido como fonte de análise por trabalhar a Antiguidade
Clássica no processo de ensino e aprendizagem de História.
Este trabalho tem por objetivo refletir sobre a seguinte inquirição: -Por que
Cícero faz um contraponto entre os lados bom e ruim do comércio?
Este autor faz uma crítica aos negócios marítimos, devido ao desejo de
enriquecimento dos cidadãos romanos, lembrando que estes passaram a deixar
de lado a preocupação de defender a cidade contra qualquer invasão. Desse
modo, a imagem do soldado cidadão passou a perder força, assim como a
necessidade de cultivar os campos. Com base na defesa, realizada por este
político, justificando a importância da existência do soldado cidadão, torna-se
imperativo lembrar que Cícero foi influenciado intelectualmente por Políbio
(historiador grego que viveu entre 203 a.C. - 120 a.C.), sendo que este expôs
em sua obra: “História”, a importância desse comprometimento do homem de
Roma, em tempos de guerra, estabelecendo um contraponto entre as tropas
cartaginesas, compostas por mercenários e as romanas, constituídas por nativos
da cidade. Enquanto estas lutavam com tremenda determinação para expulsar
o inimigo, aquelas se comportavam de forma contrária:
“Naqueles tempos iniciais, predominava o amor pela pátria, mas aos poucos o
sucesso e a riqueza começaram a corromper os romanos, que então caíram sob
o domínio de formas despóticas de ordem que antes achavam repugnantes. A
virtude e a liberdade declinaram juntas. Foi a literatura romana, especialmente a
obra de Cícero, que persuadiu posteriormente os europeus de que a virtude era
a condição da liberdade” (MINOGUE, 2008, p. 34).
Marco Túlio Cícero expõe seu descontentamento com a decisão tomada pelo
governo de Roma de extinguir a figura do soldado cidadão, ao mesmo tempo em
que este jurista enfatiza que o comércio levava as pessoas à preguiça, todavia,
Cícero também deixa explícita a ocorrência de certo dinamismo na cidade, por
apresentar a importância da importação e da exportação, utilizando Rômulo
como exemplo, que fundou Roma junto ao rio Tibre. Desse modo, a posição
geográfica da cidade de Roma surge como um forte estimulante às trocas pelo
mar, como podemos constatar na citação abaixo:
“Que pôde fazer, pois, que Rômulo aproveitasse todas as vantagens das cidades
marítimas, evitando ao mesmo tempo seus perigos? Construiu sua cidade nas
margens de um rio cujas águas profundas se esparramam no mar por uma larga
desembocadura, procurando assim uma comunicação fácil no curso do rio Tibre,
não só para proporcionar ao novo povo tudo quanto necessitava, como também
para levar para longe o que tivesse de mais; uma rota natural para tirar do
Oceano todos os objetos necessários ou agradáveis à vista e fazê-los chegar às
regiões mais afastadas” (CÍCERO, Da República, II, 5).
Embora Roma tivesse sido fundada nas proximidades do rio Tibre, era preciso
que houvesse o controle do comércio através do mar Mediterrâneo. Fato que
culminou no conflito bélico entre Roma e Cartago, cidade fundada por Fenícios.
Mesmo este episódio sendo primordial, por marcar a vitória romana e o grande
expansionismo desse Estado, ele é mencionado de forma resumida, ocupando
apenas uma página no livro didático analisado, o que pode diminuir sua
importância perante o aluno menos atento (PROJETO ARARIBÁ HISTÓRIA,
2006, p. 188). 192
“O Império Romano foi uma das sociedades antigas onde a utilização da mão de
obra escrava teve sua mais significativa importância. Em geral, os escravos
trabalhavam nas propriedades dos patrícios, grupo social romano que detinha o
controle da maior parte das terras cultiváveis do império. Assim como em Atenas,
o escravo romano também poderia exercer diferentes funções ou adquirir a sua
própria liberdade. A única restrição jurídica contra um ex-escravo impedia-o de
exercer qualquer cargo público” (SOUSA, S/D).
Considerações finais
Como um pensador político, é possível perceber que Cícero compreendia muito
bem o papel estratégico ocupado pelas trocas marítimas, contudo, essas
vantagens não poderiam superar as tradições que prendiam o cidadão romano
ao compromisso, tanto de trabalhar no campo quanto na defesa da cidade, pois,
ao ter como referência Políbio, é possível notar o papel estratégico realizado pelo
soldado cidadão, que não agia movido pela ganância, mas pelo desejo de
defender sua família ou seus semelhantes.
Referências biográficas
Luciano Araujo Monteiro é aluno, vinculado ao programa de mestrado
acadêmico, pelo Departamento de História da UNIFESP. Graduado em História,
com certificação em Patrimônio e pós-graduado em Gestão Pública pela mesma
universidade. É autor do livro: “As múltiplas visões de um historiador”. Contatos:
lucianoaraujomonteiro@yahoo.com.br; lucianoaraujomonteiro@gmail.com.
Referências bibliográficas
BRASIL. Projeto Araribá História (5ª série). São Paulo: Editora Moderna, 2006.
195
ENSINO DE PRÉ-HISTÓRIA: SINGULARIDES E
ASPECTOS FUNDAMENTAIS
Luciano Marcos Curi e Ana Carolina Pires das Dôres
196
Existem algumas características assumidas pela Academia, o mundo
universitário ou Mundo Acadêmico para ser mais exato, que não coadunam com
o que ocorre no Universo Escolar, nas escolas de Educação Básica, como se
refere, a atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Academia e
Escola são instituições de formação humana, mas, indiscutivelmente, possuem
histórias, objetivos e mesmo finalidades diferentes, tanto no passado, quanto na
atualidade.
Mas dito isto coloca-se então outra questão fundamental para aqueles que lidam
na Educação Básica, nas Escolas, e precisam, todos os anos, lecionar o
conteúdo referente a Primeira História Humana, a Época Primordial, mais
conhecida como pré-história. Quais são os cuidados, os conceitos e os aspectos
fundamentais que não podem faltar quando este importante período da história
humana é abordado?
Assim, conforme já se abordou noutro estudo (CURI, 2021), para dar início, e
tentar esboçar e já formalizar para os professores de história da Educação
Básica, aspectos fundamentais sobre o Ensino de pré-história, ou seja, achados
científicos já consolidados sobre o período pré-histórico, elencamos alguns deles
que são imprescindíveis para uma abordagem adequada deste importante
período da história humana. Elencamos doze abordagens.
Como ensinar aquilo que não se aprendeu? Sabemos que nenhum curso de
graduação é capaz de cobrir toda área de atuação de nenhuma profissão. Mas
daí ignorar a pré-história também não seria um exagero? Essa é uma questão
que todos os envolvidos na formação de professores de história e estudiosos do
Ensino de História precisam ajudar a refletir, pesquisar e, é claro,
providenciarmos soluções.
Por fim, se quisermos que o futuro seja realmente diferente e melhor e não
apenas um prolongamento do que já temos no presente temos que rever toda a
experiência humana com zelo, ética e compromisso com dias melhores. Isso
inclui o Ensino de pré-história.
Referências biográficas
Doutor Luciano Marcos Curi, professor do Mestrado Profissional em Educação
Tecnológica do IFTM – Câmpus Uberaba e do Mestrado Profissional em
Educação Tecnológica ofertado em Rede Nacional (PROFEPT) do IFTM-
Câmpus Uberaba Parque Tecnológico.
Referências bibliográficas
CURI, L M. Compreender a Pré-história: para quê? Jornal InterAção
(Semanário de Notícias). Ano 18, nº 933, 09/04/2021 p. 02.
A segunda é a distinção que cada vez fica mais clara para a comunidade dos
historiadores entre Ensino de História na Academia e nas Escolas, ou
Conhecimento Histórico Acadêmico, ou disciplina de referência, e Conhecimento
Histórico Escolar, notadamente, na Educação Básica. Essa é uma questão
chave que o Ensino de História precisa aprofundar e deixar cada vez mais
evidente e translúcido para todos que militam nessa área. A diferença entre
Academia e Escolas, genericamente, entre Ensino Superior e Educação Básica.
Enfim, Academia e Escola, são instituições diferentes, com finalidades diferentes
que lidam e preparam pessoas para vivências diferentes. A Academia forma
profissionais, os historiadores, já as Escolas de Educação Básica, formam
cidadãos para a sociedade. Os dois públicos estudam o passado, mas de
maneira diferente e para finalidades diferentes. Por fim, são faixa etárias, tipos 204
de escolas, formatos didáticos que são díspares. As Escolas não formam
pequenos historiadores, ou mini historiadores, e sim cidadãos, que inclusive,
precisam aprender outros conteúdos e outras ciências além da História.
Sem uma compreensão muito clara dos tipos escolares, etapas escolares,
públicos envolvidos as chances de se construir um Ensino de História que atenda
as demandas das pessoas e lhes permitam utilizar deste conteúdo, deste saber,
para suas vidas pessoais ou profissionais fica difícil imaginar o melhor caminho
metodológico, melhores materiais, melhores abordagens de ensino, entre outros
tantos temas tão importantes.
Mas isso não é tudo. Existem também certos períodos históricos que também
que são menos abordados, ficam menos privilegiados e contemplados, isso,
tanto na Academia quanto nas Escolas, reproduzindo certas limitações das
Ciências Históricas e mesmo reproduzindo certos preconceitos sociais. Um
desses períodos é a chamada Pré-história, esse extenso período inicial da
História Humana, também chamado de Época Primitiva, Época Primordial,
Primeira História do Homem ou História Primeva.
A chamada pré-história é, por assim dizer foi planetária, já que o homem sapiens 207
sapiens logrou-se capaz de espalhar-se por todo globo, e ocupar-lhe em
sucessivas levas migratórias; a chamada Conquista da Terra. A Educação
Histórica consistente precisamente em oferecer aos estudantes um quadro, uma
imagem, o mais precisa possível, de acordo com os estudos pré-históricos
acadêmicos mais atualizados, e não sumariamente recortada, de como nossa
espécie chegou ao seu estado atual; cultural, social, geográfico, biológico,
político e econômico e até psicológico.
Referências biográficas
Pós-Doutor. Luciano Marcos Curi, professor do Mestrado Profissional em
Educação Tecnológica do IFTM – Câmpus Uberaba e do Mestrado Profissional
em Educação Tecnológica ofertado em Rede Nacional (PROFEPT) do IFTM-
Câmpus Uberaba Parque Tecnológico.
Referências bibliográficas
BURGUIÈRE, André (Org.). Dicionário das Ciências Históricas. Rio de Janeiro:
Imago,1993.
LE GOFF, Jacques. A história deve ser dividida em pedaços? São Paulo: Unesp,
2015.
Ocorre que desde o século VII EC o império romano oriental cristão tentara fazer
frente ao mundo árabe muçulmano crescente, contudo ao final do século XII EC
os árabes tomaram o norte da África, enclausurando ainda mais os reinos
cristãos da Europa, visto que também haviam ocupavado todo o território oriental
do mediterrâneo que fazia fronteiras com o Império Bizantino, ou seja, tinham
conquistado o Marrocos, a Mesopotâmia, o Império Mongol do norte da Índia, os
reinos mercantis de Malaka, até a ilha Mindanao nas Filipinas. As cruzadas foram
tentativas, muitas vezes falhas, onde a Europa tentou subverter sua situação de
cultura periférica, secundária e ilhada pelo mar do poder e da cultura muçulmana
(DUSSEL, 1993, p. 43). 211
Após Constantinopla ter perdido sua proeminência política em 1453 EC, restara
aos teóricos do mundo renascentista italiano contar a história de uma maneira
que escondesse a posição periférica da Europa durante a antiguidade e
principalmente durante o medievo, época em que se tornara apêndice do Mundo
Turco e Mundo Muçulmano. Neste sentido a cunhagem do termo Idade das
Trevas para o medievo é a resposta para um período de hegemonia e
desenvolvimento muçulmano, onde toda a cultura e desenvolvimento estava
ligado ao mundo da Ásia e da África, ou seja, o Mundo Árabe (DUSSEL, 2008,
p. 157). Não se trata de um termo que visa fazer frente à religiosidade medieval,
bastaria que se olhasse para os grandes expoentes da arte e cultura
renascentista para perceber o forte viés cristão da cultura renascentista. Tratou-
se de um apagamento epistêmico que visou retirar da história a origem
helenístico-bizantina do mundo muçulmano, onde criou-se a noção de Ocidente
que nortearia a produção de saberes históricos na modernidade, e que em
alguns espaços persiste até hoje.
QUADRO 1
“A influência grega não é direta na Europa latino-ocidental (passa por a e b). A
sequência c da Europa moderna não se liga à Grécia, nem tão pouco
diretamente com o mundo bizantino (flecha d), e menos ainda com o mundo
latino romano ocidental cristianizado” (DUSSEL, 1993, p. 42).
212
QUADRO 2
Esta noção de Ocidente, tão cara ao romantismo alemão, foi essencial durante
o período de consolidação da História Antiga como campo da História científica.
Contudo, para tal, seria necessário a adição de dois elementos centrais: o
eurocentrismo morfológico e o internalismo metodológico (MORALES; SILVA,
2000, 126-130). A morfologia eurocêntrica diz respeito ao modo como o grande
contexto da “Idade Antiga” foi reformulado no século XIX em função dos critérios
europeus de civilização, privilegiando períodos e recortes em função de
possíveis contribuições, como uma somatória, em linha reta e sem interferências
externas, como se cada herança do passado fosse transmitida em linha reta. Por
sua vez, o internalismo metodológico diz respeito ao pressuposto teleológico de
análise historiográfica que dá ênfase aos movimentos internos como modulares
da experiência da civilização europeia moderna, onde se busca “as raízes do
Estado”, “as origens das nações”, a história dos impérios, etnias e religiões, de
maneira teleológica que legitimam conexões identitárias entre os europeus e os
habitantes da Europa Antiga, ou, aquilo que se imagina Europa Antiga e seus
habitantes.
Este é o primeiro ponto que queremos ressaltar enquanto uma prática decolonial
do Ensino de História, a necessidade do acesso às fontes para um conhecimento 215
da questão em si, e não “sei por ouvir dizer”. Este acesso possibilita um
movimento de apropriação dos clássicos, assim como de afronta aos mesmos,
rompendo com o eurocentrismo morfológico e o internalismo metodológico.
Contudo, difere no que diz respeito à doutrina. A filosofia egípcia estava ligada
ao pensamento religioso sacerdotal, fator que talvez possa explicar a ausência
de referência a filósofos egípcios nas fontes gregas, pois estes eram vistos pelos
gregos como sacerdotes. Assim sendo, a inovação grega não é a invenção da
filosofia, mas a invenção do filósofo, indivíduo pensante que ordena uma doutrina
e a transmite.
Referências biográficas
Luiz Henrique Silva Moreira, Licenciado em História pela Universidade Estadual
do Paraná (2015-2018) e Mestre em História Antiga pela Universidade Federal
do Paraná (2019-2021), nesta mesma instituição atualmente é aluno do Curso
de Doutorado em História (PPGHIS/UFPR).
Referências bibliográficas
ARIAS, María Isabel; PEDROZO CONEDO, Zaira Esther; ORTIZ OCAÑA,
Alexander. Decolonialidad de la educación: emergencia/urgencia de una
pedagogía decolonial. Santa Marta, Colombia: Editorial Unimagdalena, 2018.
MORALES, Fabio Augusto; SILVA, Uiran Gebara da. História Antiga e História
Global: afluentes e confluências. Revista Brasileira de História, São Paulo. v.
40, n. 83, p. 125-150, 2000.
O ÚLTIMO OLHAR: MÁSCARAS FUNERÁRIAS
EGÍPCIAS COMO INSTRUMENTO PEDAGÓGICO
Maura Regina Petruski e Marco Antonio Stancik
219
A elaboração de novas metodologias e estratégias para serem aplicadas no
ensino de história se tornaram uma preocupação mais frequente entre
educadores e especialistas da área, visto que lhes é cabido pelas próprias
diretrizes curriculares a tarefa de promover o desenvolvimento de habilidades e
competências dos educandos.
O metal também foi outra opção para sua produção, mas passou a ser utilizado
durante o novo império, mas isso não quer dizer que os materiais utilizados
anteriormente foram deixados de lado em sua fabricação, pois continuaram se
fazendo presentes. Durante esse período, as explorações arqueológicas
evidenciaram a presença de peças de tamanho infantil, embora
proporcionalmente fossem bem menor em número se comparadas com as
adultas, e juntamente com a incorporação desse novo material veio a adoção e
prevalência da cor dourada como padrão de referência.
Tendo em conta que, ao se trazer esse objeto para o centro da discussão ele
não seria uma referência meramente ilustrativa e apresentado como algo
confirmatório do que está apontado no livro didático ou na fala do professor, ou
seja, não lhe é concedido uma espécie de carimbo de autenticidade de uma
história que leva a ideia de se colocar um ponto final no que foi enunciado, muito
pelo contrário, é que a partir dele novos questionamentos suscitem e que cada
vez mais se busque conhecer referências que estão em seu entorno.
Acrescenta-se ainda que, quando se toma a imagem das máscaras como ponto
central de análise, constata-se a superação da marginalização do que se
entende por fonte e documento histórico, campos que ampliaram seus domínios
no decorrer do século XX. Exemplificando tal afirmação, é possível de se
perceber por intermédio das máscaras a força da cultura egípcia perante outras
sociedades, fazendo com que povos que até então chegaram a esse território
através de uma política de dominação e impuseram sua autoridade foram
tombados diante de uma cultura milenar, incorporando referenciais das crenças
egípcias adotando alguns dos costumes, entre eles está a utilização das
máscaras funerárias como componente do equipamento funerário.
Por fim, vale dizer que a difusão do saber pode ser construído por diferentes
caminhos, e o que foi apresentado acima é apenas um deles.
Referências biográficas
Dr.ª Maura Regina Petruski, professora da Universidade Estadual de Ponta
Grossa.
Dr. Marco Antonio Stancik, professor da Universidade Estadual de Ponta Grossa.
Referências bibliográficas
KLEIN, Robert. A forma inteligível. São Paulo: EDUSP, 1998.
MENESES, Ulpiano T. Bezerra de. Fontes visuais, cultura visual, História visual:
Balanço provisório, propostas cautelares. Revista Brasileira de História, São
Paulo, v.23, n. 45, 2003.
PANOFSKY, Erwin. Significado nas artes visuais. São Paulo: Perspectiva, 1976.
PESAVENTO, Sandra Jatahy. História & História Cultural. 2. ed. Belo Horizonte:
Autêntica, 2004.
A partir do livro, elaboramos planos de aula para serem aplicados nas escolas
de ensino básico. O primeiro plano de aula intitulado: “Heródoto: formas de
governo”, foi aplicado entre os anos de 2018 e 2019, nas escolas da rede pública
de ensino de João Pessoa, nos seguintes níveis: 6º ano do Ensino Fundamental,
9º ano do Ensino Fundamental e 1ª série do Ensino Médio. A aula era composta
pela explicação do contexto histórico do autor; a apresentação das formas de
governo: de um só (monarquia, tirania), de poucos (aristocracia e oligarquia), de
muitos (democracia); leitura de trechos em grego; dinâmica e atividade de
fixação. Foram experiências muito ricas para a nossa formação, nos
incentivando a elaborar novos materiais e buscar um ensino de História Antiga
mais dinâmico e comprometido com reflexões da prática cidadã (CARMO,
SILVA, 2019).
O mundo antigo é rico não apenas por sua herança cultural, mas também pela
capacidade de nos levar a refletir sobre muitos conceitos que fazem parte do
nosso cotidiano e questionar as estruturas vigentes. Colocar o aluno em contato
com a História Antiga é de fundamental importância para criar pontes entre o
passado e o presente, levando-o a pensar a sociedade da qual faz parte.
Referências biográficas
Laryssa Alves da Silva, estudante de História – Licenciatura Plena, pela
Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
Referências bibliográficas
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O trabalho de ensinar. In: BRANDÃO, Carlos
Rodrigues. A educação popular na escola cidadã. Petrópolis, Rio de Janeiro:
Vozes, 2002, pp. 185-229.
SILVA, Laryssa Alves da; CARMO, Millena Luzia Carvalho do. O ensino dos
regimes políticos em História Antiga: uma proposta a partir do projeto Prolicen.
In: ASSUMPÇÃO, Luis F. Bantim de; BUENO, André; CAMPOS, Carlos E.;
CREMA, Everton; NETO, José Maria de Sousa. Aprendendo História:
Experiências. União da Vitória: Sobre Ontens, 2019.
POSSÍVEIS AÇÕES DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL
PARA OS SÍTIOS PRÉ-HISTÓRICOS DE CORGUINHO E
AQUIDAUANA COM BASE NO MODELO DO DISTRITO
DE PORTO CAIUÁ – NAVIRAÍ – MS
231
Pedro Leandro Batista de Souza
Com a Lei Federal n°3.924 de 26 de julho de 1961, que já nesse período de voga
do pensamento no que tange a reafirmação dos objetos ligado a cultura nacional
que irão dar ênfase aos monumentos arqueológicos e pré-históricos, e sobre
essa normativa irá regulamentar a guarda e a proteção dos bens. Nessa
conjuntura o estudo arqueológico começa a se projetar em relação ao
patrimônio.
“Por enquanto, em nosso país, não se pode divorciar cultura e educação, mas
muito ao contrário, é necessário incentivar o estreitamento das relações entre as
duas áreas, em virtude do papel primordial que o processo cultural desempenha 232
no educacional, na medida em que uma educação desprovida do seu contexto
sociocultural não passa de mera técnica sem grande utilidade ou a serviço da
progressiva perda de identidade nacional. Não há desenvolvimento harmonioso
e nem se faz uma nação forte se, na elaboração das políticas econômicas do
país, não são levadas em consideração as variáveis culturais e o papel que aí
desempenha o sistema educacional”. (MAGALHÃES,1981, p.2).
Então a partir de Horta (1999), verifica-se que essa metodologia incita aos
professores a utilizar os próprios objetos culturais, como “Fonte de informação
sobre a rede de relações sociais e o contexto em que foi produzido”. Logo as
ações a serem desempenhadas nos locais onde se encontraram tais achados
se misturam na amalgama dos objetos culturais nesse caso a arqueologia que
resgata não somente o passado, mas também projeta as problemáticas da
afirmação do patrimônio a aqueles que são também estão inclusos nos contextos
históricos, (comunidades, escolas, municípios, prefeituras).
A cultura patrimonial não está somente para elucidar o objeto e nem somente
sua apresentação. Ela se insere ao público onde esse estão também
aprendendo e adquirindo habilidades relacionadas a salva guarda do patrimônio.
Como conceitua Silva (2007), a Educação Patrimonial não empreende de uma
simples atividade pedagógica e também não se assemelha a uma disciplina no
curriculo escolar. Em sua abrangêcia detém de uma índole interdisciplinar 233
integrada a várias areas de conhecimento. E um dos metódos em que a
educação patrimonial está inerentemente ligada à Arqueologia.
Das diversas etapas desse trabalho, será apresentado aqui as ações de cultura
patrimonial que foram desempenhadas em conjunto a comunidade residente ao
entorno do sítio INVINHEMA 1(VN1), e que poderão também ser aplicados nos
municípios de Corguinho e Aquidauana. As etapas que se sucederam no projeto
do Distrito Porto Caiuá, se observou as ações de aplicação da cultura
patrimonial. A primeira etapa dessas ações, consistiram em pesquisas
preliminares sobre as características dos moradores locais. Foram aplicados
questionários simples de forma informal, como conversas descontraídas sobre a
disposição dos vestígios arqueológicos, como também se observou o cotidiano
da comunidade durante o trâmite do projeto.
Dos recursos para essa atividade poderão ser usadas fotos dos Sítios de
Corguinho / Aquidauana através de um quebra-cabeças, o qual poderá ser
elaborado com o banco de fotografias do projeto de pesquisa. O exercício em
questão objetiva o estímulo e o respeito coletivo, como também das qualidades
de cada aluno.
Referências biográfica
Pedro Leandro Batista de Souza é licenciado em História pela Faculdade de
Ciências Humanas da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
Referências bibliográficas
BRASIL. Lei Federal n°3.924 de 26 de julho de 1961. disponível em:
https://legis.senado.leg.br/norma/545756. Acessado em 12/11/2019.
BRASIL. Decreto nº 3.552, de 4 de agosto de 2000 - Publicação Original,
disponível em:https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/2000/decreto-3551-
4-agosto-2000-359378-publicacaooriginal-1-pe.html. Acessado em 12/11/2019.
Introdução
Na prática de ensino de História, a depender da carga de assuntos e da etapa
da educação no Brasil, o tempo parece correr em demasia. A professora e/ou o
professor se deparam com um exercício pedagógico exaustivo e denso,
tornando o material didático e suas conexões a própria rede de apoio no seu
exercício de ensino. Confiar neste material é um risco amenizado pelas
constantes vigilâncias dos pares, compartilhando as críticas pertinentes e
qualificando esse ensino. Entretanto, essa dinâmica nem sempre é estabelecida
em tempo hábil, permitindo que alguns temas continuem a existir através de
reduções discursivas que empobrecem a sua utilidade para as novas demandas
educacionais.
Este texto sintetiza pesquisa que vem sendo produzida sobre o tema “Pré-
História” e a possibilidade de revisão e atualização. Como fruto de trabalho de
sala de aula ocorrido em 2019, gerou dois artigos que foram publicados em
eventos de História em 2020, que são as bases estruturais do diálogo aqui
proposto. O primeiro dos artigos foi publicado nos anais da ANPUH-BA com o
título “Assim Caminha a Humanidade: A ‘Pré-História’ no Livro Didático e a
Crítica Atualizada sobre Paleo-História e Paleoantropologia”; o segundo foi
publicado nos anais da ANPUH-PR com o título “Paleoarqueologia e Educação
no Brasil: Riscos e Descasos da Atualidade no Ensino da “Pré-História” no
Brasil”. Ambos os artigos, publicados e acessíveis, tratam das muitas temáticas
que perpassam demandas e saberes da contemporaneidade, através do uso das
renovações analíticas e discursivas da área.
Conclusão
Todos os debates possíveis que cruzam os temas transversais aqui eleitos, raça
e gênero, contribuem para a desconstrução das suas específicas opressões,
racismo e machismo. Dentre a miríade de ações afirmativas no ambiente
educacional, da pontualidade seletiva da disciplina de História, ainda podemos
elaborar amplitudes inteligentes nos conectivos entre os temas, ainda que a
convenção histórica escolhida pareça, numa primeira e rápida impressão,
distante de assuntos tão contemporâneos. Como ponto inicial, já deslegitimamos
a naturalização dessas ausências.
Referências biográficas
Me. Savio Queiroz Lima, pesquisador do Laboratório de Estudos sobre a
Transmissão e História Textual na Antiguidade e no Medievo (LETHAM-UFBA).
Referências bibliográficas
ADOVASIO, James M.; PAGE, Jake. Os Primeiros Americanos – Em Busca do
Maior Mistério da Arqueologia. Rio de Janeiro: Editora Record, 2011.
ALMEIDA, Silvio Luiz de. O que é racismo estrutural?. Belo Horizonte: Editora
Letramento, 2018.
RESISTINDO!