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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE TEOLOGIA E CIÊNCIAS HUMANAS


DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA

HISTÓRIA DA
PSICOLOGIA
MODERNA

PROF. RICARDO TORRI DE ARAÚJO

RIO DE JANEIRO – RJ
2º SEMESTRE DE 2021
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio)
Centro de Teologia e Ciências Humanas (CTCH)
Departamento de Psicologia

PSI 1100: História da Psicologia Moderna


Prof. Ricardo Torri de Araújo

Unidade I
Introdução à psicologia

I.1 - A psicologia:

[1] O termo “psicologia” foi usado pela primeira vez em


1530, por Philipp Schwarzerd (1497-1560), também
chamado Melanchthon. Em sua acepção moderna, a
expressão surgiu no século XVIII, com o filósofo alemão
Christian Wolff (1679-1754).
[2] Etimologicamente, a palavra “psicologia” deriva de
dois radicais gregos: “psyché” (alma) e “logos” (estudo),
significando: o estudo da alma.
[3] Na mitologia grega, Psyché é representada como uma
borboleta. Ela é a esposa de Eros, o deus do amor.
[4] A letra grega Ψ é o símbolo internacional da psicologia.
[5] No Brasil, o dia do/a psicólogo/a é 27 de agosto.
[6] Mas, o que é a psicologia? Não há uma resposta unânime para essa pergunta. Uma
definição eclética, bastante inclusiva, consiste em dizer que a psicologia é a ciência dos
processos mentais e do comportamento do ser humano e dos animais.
[7] A psicologia tem quatro objetivos principais: a descrição, a explicação, a predição e o
controle do comportamento e do funcionamento mental.
[8] A psicologia é uma ciência. Entre os princípios que regem a atividade científica, estão: a
precisão, a objetividade, o empirismo, o determinismo, a parcimônia e a tentatividade.
[9] São cinco, por sua vez, os métodos científicos de que dispõe o psicólogo: a
experimentação, a observação direta, o estudo de caso, a pesquisa e o estudo de correlação.
[10] O vasto campo da psicologia compreende uma grande diversidade de áreas e
especializações. Entre elas: a psicologia experimental, a psicologia do desenvolvimento, a
psicologia da educação, a psicologia escolar, a psicologia da personalidade, a psicometria, a
psicologia diferencial, a psicologia clínica, o aconselhamento psicológico, a orientação
vocacional, a psicologia da saúde, a psicologia social, a psicologia comunitária, a psicologia
política, a psicologia populacional, a psicologia industrial-organizacional (I-O), a psicologia
empresarial ou econômica, a psicologia do trabalho, a psicologia da publicidade, a
psicologia da engenharia ou ergonomia, a psicologia militar, a psicologia animal, a
psicologia comparada, a psicologia cognitiva, a neuropsicologia, a psicologia ambiental, a
psicologia forense, a psicologia esportiva e a psicologia da religião.
[11] A psicologia contemporânea não se constitui num corpo de conhecimentos completo e
tampouco unificado; o saber psicológico hoje disponível é parcial e fragmentado. O/A
estudante de psicologia não deve, pois, esperar respostas para todos os problemas ou
mesmo uma abordagem única, universalmente aceita, desses problemas.
[12] Adotando-se a terminologia de Thomas Kuhn (1922-1996), talvez se possa dizer que a
psicologia é uma ciência que se encontra num estágio “pré-paradigmático” de
desenvolvimento. Dividida em escolas de pensamento rivais entre si, ela não se configura
como uma ciência madura, unificada por um paradigma universalmente aceito.

1
[13] O que dizer da relação entre o psicólogo, o psicanalista e o psiquiatra? Todos os três
podem trabalhar no campo da saúde mental diagnosticando e tratando de pessoas com
problemas psicológicos de gravidade variável. Mas há, entre eles, algumas diferenças
importantes.
[14] O psicólogo tem uma formação universitária em psicologia; o psicanalista é formado
em associações de psicanálise independentes do meio universitário; o psiquiatra forma-se
em medicina, especializando-se no tratamento de doenças mentais.
[15] O psicólogo estuda os comportamentos humanos, sejam eles normais ou anormais; o
psicanalista e o psiquiatra estão especialmente interessados no comportamento anormal.
[16] Em sua compreensão da enfermidade mental, o psicólogo e o psicanalista costumam
privilegiar elementos da história de vida da pessoa; já a abordagem psiquiátrica tende a
enfatizar elementos orgânicos.
[17] O psiquiatra prescreve medicamentos aos seus pacientes; o psicólogo e o psicanalista
não estão autorizados a fazê-lo.
[18] Acrescente-se, por fim, que a relação da psicanálise para com a psicologia é, ao mesmo
tempo, uma relação de pertença e estranhamento. A psicanálise pode ser encarada como
uma escola da psicologia; mas há quem prefira tomá-la como uma ciência autônoma,
distinta da psicologia, dotada de um objeto próprio, o inconsciente.

I.2 - A história da psicologia:

[19] A história da psicologia pode ser dividida em dois períodos: a história da psicologia
pré-científica (psicologia filosófica ou filosofia mental) e a história da psicologia científica.
A história da psicologia pré-científica – ou a pré-história filosófica da psicologia científica
– começa no século V a.C.; a história da psicologia científica, no último quartel do século
XIX. Neste curso, vamos tratar apenas do segundo desses dois períodos1.
1Sobre a pré-história filosófica da psicologia científica, pode-se consultar: BRETT, George S. Historia de la
psicología. Buenos Aires: Paidós, 1963. 688p. (Biblioteca de historia de la psicología; 1.); MUELLER,
Fernand-Lucien. História da psicologia; da antigüidade aos nossos dias. São Paulo: Companhia Editora
Nacional, 1968. 444p. (Atualidades pedagógicas; 89.); PENNA, Antonio Gomes. História das idéias
psicológicas. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1981. 152p. (Psyche.); ROBINSON, Daniel N. Historia crítica
de la psicología. Barcelona: Salvat, 1982. 396p.
2
[20] Em se fazendo a história da psicologia, é importante trabalhar numa perspectiva
historicista, evitando, quanto possível, o presentismo. Também chamado “anacronismo”, o
presentismo consiste em julgar o passado com base nos conhecimentos e valores atuais. O
historicismo, por sua vez, procura situar os fatos passados nos contextos históricos em que
aconteceram.
[21] Ao escrever a história da psicologia, há autores que valorizam especialmente o
Zeitgeist, isto é, o espírito do tempo; outros, por sua vez, preferem trabalhar na perspectiva
do “Grande Homem”. Uma história equilibrada é capaz de dar a devida importância tanto
ao ambiente quanto aos indivíduos, sem sobrevalorizar nenhum dos dois.
[22] Como se verá, a história da psicologia é atravessada, “de fio a pavio”, por questões que
parecem eternas. Entre elas: inato versus adquirido, determinismo versus livre arbítrio,
elementarismo versus holismo, ciência pura versus ciência aplicada etc.
[23] Por fim, já que estamos por fazê-lo, cabe a pergunta: “Mas... por que estudar a história
da psicologia?”. Motivos não faltam...
[24] Para aprender com o passado, evitando, talvez, a repetição de erros.
[25] Para compreender o presente.
[26] Para prever, talvez, o futuro.
[27] Porque estudar a história da psicologia oferece uma visão de conjunto do vasto e
variegado campo dessa disciplina.
[28] Porque grande parte das questões de que se trata na história da psicologia conservam
toda a sua atualidade.
[29] Por fim, porque é uma boa estória. Povoada de grandes personagens, repleta de ideias
geniais, marcada por uma série de viradas, atravessada por questões apaixonantes, a
história da psicologia é, de fato, muito interessante. É um prazer – quase um
entretenimento! – ler sobre os 142 anos de existência da psicologia moderna.

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I.3 - Cronologia geral:

[30] Para se ter uma visão panorâmica da história da psicologia, algumas datas podem ser
indicadas desde já.

1832 DARWIN visita o Rio de Janeiro.


1859 DARWIN publica “A origem das espécies”.
1860 FECHNER lança os dois volumes de “Elementos de psicofísica”.
1865 JAMES visita o Rio de Janeiro.
1879 WUNDT cria o primeiro laboratório de psicologia do mundo na Universidade de
Leipzig, na Alemanha, fundando, assim, a psicologia experimental.
1889 FREUD abandona a hipnose e adota o método da associação livre, marco de fundação
da psicanálise.
1890 JAMES publica o manual “Princípios de psicologia”.
1892 TITCHENER chega aos Estados Unidos da América, onde começa a desenvolver a sua
versão da psicologia de WUNDT: o estruturalismo.
1896 DEWEY publica o artigo sobre o arco reflexo com que tem início o funcionalismo.
1898 THORNDIKE publica os resultados da sua pesquisa com gatos em caixas-problema e
apresenta a sua teoria da aprendizagem: o conexionismo.
1901 PAVLOV publica um artigo sobre o reflexo condicionado, principal contribuição da
reflexologia para a psicologia.
1902 JAMES publica “As variedades da experiência religiosa”, inaugurando o campo da
psicologia da religião.
1909 A convite de HALL, FREUD e JUNG visitam a Universidade Clark, nos Estados Unidos.
JAMES e TITCHENER, entre outros, também comparecem. Encontram-se, pela
primeira vez, as tradições da psicologia experimental e da psicanálise.
1912 WERTHEIMER publica o artigo sobre o movimento aparente que origina o
gestaltismo.
1913 WATSON publica o manifesto que dá partida ao behaviorismo.
FREUD e JUNG rompem relações.
1938 SKINNER publica o seu primeiro livro: “O comportamento dos organismos”.
1953 Hans LIPPMANN funda o Instituto de Psicologia Aplicada (IPA) da PUC-Rio.
Acontece a primeira cisão do movimento psicanalítico francês. LACAN inicia os seus
seminários, colocando o seu ensino sob a bandeira do “retorno a FREUD”.
1961 ROGERS publica “Tornar-se pessoa”, um dos livros mais representativos da
psicologia humanista.
1967 NEISSER publica “Psicologia cognitiva”, obra que dá nome a um novo movimento em
psicologia: o cognitivismo.

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Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio)
Centro de Teologia e Ciências Humanas (CTCH)
Departamento de Psicologia

PSI 1100: História da Psicologia Moderna


Prof. Ricardo Torri de Araújo

Unidade II
Os primórdios da psicologia

[31] A psicologia tem antecedentes de dois tipos: filosóficos e científicos. Ela foi precedida
pelo tratamento filosófico de questões psicológicas e por pesquisas realizadas em outros
campos da ciência – nomeadamente, pela fisiologia dos órgãos dos sentidos, pela
neurofisiologia e pela psicofísica.
[32] A psicologia é, pois, resultado do encontro entre a filosofia, de um lado, e a fisiologia e
a psicofísica, de outra parte: da filosofia, a psicologia herdou o tema; da fisiologia e da
psicofísica, o método.

II.1 - Antecedentes científicos imediatos do surgimento da psicologia


moderna:

a) Weber e Fechner:

[33] Ernst Heinrich Weber (1795-1878) foi


um fisiologista. A sua principal área de
pesquisa foi o sentido do tato.
[34] Weber realizou experiências sobre o
problema da diferença mínima perceptível
(DMP). A DMP foi por ele investigada nas
sensações cutâneas e musculares.
[35] Ao pesquisar a DMP das sensações
cutâneas, Weber mediu o afastamento
mínimo entre duas pontas de um
compasso aplicado sobre a pele para que
duas pressões simultâneas fossem
sentidas distintamente. A isso, chamou o “limiar de dois pontos”.
[36] Weber descobriu que a sensibilidade cutânea é diferente conforme a parte do corpo.
[37] Weber supôs, então, que a pele consistia num mosaico de círculos sensoriais, cada
qual conectado a um feixe de fibras ramificadas a partir de um único nervo tátil. Nas áreas
mais sensíveis, esses círculos seriam menores; nas menos sensíveis, maiores.
[38] Ao estudar a DMP das sensações musculares, Weber pesquisou a capacidade das
pessoas para discriminar entre dois pesos. E investigou o quanto um peso devia ser
aumentado para que a pessoa percebesse que houve o aumento.
[39] Weber descobriu que a capacidade de discriminar entre dois pesos não depende da
diferença absoluta entre eles, mas da diferença relativa – isto é, da proporção – entre o
peso padrão e o peso de comparação. A DMP é proporcional ao peso padrão.
[40] Na manhã do dia 22 de outubro de 1850, Gustav Theodor Fechner (1801-1887), teve
um insight. Ao despertar, ocorreu-lhe uma ideia sobre a ligação entre o corpo e a mente.
Veio-lhe o pensamento de que as relações entre os mundos físico e psicológico era
matemática, podendo ser mensurada no estudo da relação entre o estímulo material e a
sensação mental.

5
[41] Fechner começou, assim, as suas pesquisas. Em seguida, tomou conhecimento dos
experimentos de Weber. Fechner, então, aprofundou e formalizou os resultados do
trabalho de Weber.
[42] Fechner transformou a descoberta de Weber numa equação matemática e chamou-a
de “Lei de Weber” – ou “Lei de Weber-Fechner”.
[43] A referida lei pode escrever-se assim: S/S = K, onde: S é o peso de comparação; S, o
peso padrão; e K, uma razão constante. Ou então: DMP/EP = K, onde: DMP é a diferença
mínima perceptível; EP, o estímulo padrão; e K, de novo, uma razão constante.
[44] Fechner elaborou também uma versão logarítmica da fórmula: S = K log R, onde: S é a
magnitude do estímulo percebido; K, uma constante; e R, o valor físico real do estímulo.
[45] Como se vê, a Lei de Weber estabelece uma relação matemática entre um estímulo
físico e a sua sensação psicológica – ou seja, entre os mundos material e psíquico. Há, pois,
uma relação numérica entre o corpo e a mente. Essa é a grande contribuição das pesquisas
de Weber e Fechner para o surgimento da ciência da psicologia.
[46] Além da formulação da Lei de Weber, Fechner fez também uma contribuição
metodológica para o nascimento da psicologia. Ele desenvolveu técnicas precisas de
medição de fenômenos psicológicos: os métodos psicofísicos. Em suma, Fechner
demonstrou ser possível utilizar métodos científicos – procedimentos experimentais e
quantitativos – no estudo de processos mentais.
[47] Em 1860, Fechner publicou o seu principal trabalho: os dois volumes dos “Elementos
de psicofísica”, com a demonstração pioneira do modo de efetuar medições exatas de
acontecimentos psíquicos2.

b) Helmholtz:

[48] Hermann Ludwig von Helmholtz (1821-1894) foi


assistente de Fechner por 20 anos.
[49] Uma das grandes realizações de Helmholtz foi a
medição da velocidade do impulso nervoso.
[50] Em 1844, Johannes Müller (1801-1858) asseverou que
a velocidade da condução neural era alta demais para que
fosse mensurável. Müller acreditava que a velocidade da
condutância nervosa excedia a velocidade da luz e,
provavelmente, jamais poderia ser estabelecida. Em 1850,
Helmholtz, aluno de Müller, conseguiu medi-la graças a um
engenhoso experimento.
[51] Ele dissecou, na pata de uma rã, o nervo motor e o
músculo correspondente. Quando o nervo era estimulado eletricamente, seguia-se uma
contração muscular. Estimulando este nervo em pontos distintos, mais ou menos distantes
da junção com o músculo, e medindo os tempos entre a estimulação e a contração, ele pôde
calcular a velocidade do impulso nervoso.
[52] Helmholtz apurou uma velocidade surpreendentemente lenta: 27,5 metros por
segundo ou 95 quilômetros por hora.
[53] Em 1801, Thomas Young (1773-1829) sugeriu que a visão das cores baseava-se em três
diferentes tipos de fibras nervosas, que corresponderiam às três cores primárias de Isaac

2
Freud conhecia e admirava o trabalho de Fechner. Ao longo de sua obra, Freud citou Fechner várias vezes.
Assim, em “Um estudo autobiográfico” (1925), Freud pôde afirmar: “Sempre me mostrei receptivo às ideias
de G. T. Fechner e segui esse pensador em muitos pontos importantes” [FREUD, Sigmund. Um estudo
autobiográfico. In: _______. Um estudo autobiográfico, Inibições, sintomas e ansiedade, A questão da
análise leiga e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1976. p.75. (Edição standard brasileira das obras
psicológicas completas de Sigmund Freud; 20.)]
6
Newton (1643-1727): o vermelho, o verde e o azul. Nos anos 1850, Helmholtz testou
experimentalmente a hipótese de Young.
[54] Realizando estudos sobre a vista e também sobre a audição, Helmholtz aplicou os
métodos experimentais e quantitativos da fisiologia ao estudo dos processos psicológicos
da sensação e da percepção. Com isso, ele demonstrou ser possível tratar de maneira
científica um material psicológico. Essa foi a sua grande contribuição para o surgimento da
psicologia científica3.

II.2 - O nascimento da psicologia experimental na Alemanha:

a) Wundt e a fundação da psicologia como


ciência:

[55] Qual é a “data de nascimento” da psicologia? Três


ou quatro propostas já foram consideradas: o dia 22 de
outubro de 1850, com o insight matutino de Fechner;
1860, o ano em que o mesmo Fechner publicou os
“Elementos de psicofísica”; 1875, ocasião da abertura
de um laboratório de demonstrações em psicologia por
William James (1842-1910) na Universidade de
Harvard, nos Estados Unidos da América.
[56] Hoje em dia, porém, é praticamente unânime a
indicação de uma data: 1879, o ano do estabelecimento
do laboratório de pesquisa em psicologia por Wundt
na Universidade de Leipzig, na Alemanha.
[57] Quando jovem, Wilhelm Maximilian Wundt4
(1832-1920) foi assistente de Johannes Müller, por um breve período, e de Helmholtz, em
seu laboratório de fisiologia em Heidelberg, de 1858 a 1864.
[58] Em 1875, Wundt se tornou professor da Universidade de Leipzig e, logo, requisitou
espaço para a montagem de um laboratório de pesquisa em psicologia. Em 1879, ele
instalou o seu laboratório, ao qual deu o nome de “Instituto de Psicologia”.
[59] O laboratório consistiu, inicialmente, em apenas uma sala. Em 1897, porém, chegou a
ocupar um prédio inteiro.
[60] O laboratório foi também equipado de uma série de instrumentos: o taquitoscópio, o
cronoscópio, os estimuladores elétricos, os pêndulos, os cronômetros, os instrumentos de
mapeamento sensorial etc.
[61] Com isso, Leipzig tornou-se a capital mundial da psicologia, a “Meca” dos estudantes
que desejavam aprender a nova ciência. Aí estudaram: Emil Kraepelin (1856-1926),
Oswald Külpe (1862-1915), Hugo Münsterberg (1863-1916), Edward Titchener (1867-
1927), James Cattell (1860-1944), Stanley Hall (1844-1924), James Angell (1869-1949),
Vladimir Bekhterev (1857-1927), entre outros.
[62] Tomando o laboratório de Leipzig como modelo, os alunos de Wundt fundaram
laboratórios na Alemanha, nos Estados Unidos, na Rússia, na Itália e no Japão.
[63] As atividades do laboratório de Wundt foram interrompidas em 1914 com a Primeira
Grande Guerra.
[64] O prédio do laboratório foi destruído em um bombardeio dos Aliados na noite do dia
4 de dezembro de 1943.
3Freud tinha grande apreço por Helmholtz. Referindo-se ao fisiologista: “Freud chegou a dizer: ‘Ele é um de
meus ídolos’” (JONES, Ernest. A vida e a obra de Sigmund Freud; volume 1: os anos de formação e as grandes
descobertas, 1856-1900. Rio de Janeiro: Imago, 1989. p.54). Além disso, Freud foi aluno de Ernst Wilhelm
von Brücke (1819-1892), que, por sua vez, foi membro eminente da escola fisiológica de Helmholtz.
4 Pronuncia-se: “Vunt” [cf. BENSON, Nigel C. Entendendo: psicologia. São Paulo: LeYa, 2013. p.25.

(Entendendo.)].
7
[65] Além do laboratório, Wundt também fundou, em 1881, a primeira revista de
psicologia experimental, o periódico: “Estudos filosóficos”. Em 1906, a revista passou a se
chamar: “Estudos psicológicos”.

b) Outros psicólogos alemães contemporâneos de Wundt:

[66] Fundada por Wundt, a psicologia experimental espalhou-se rapidamente por outras
universidades da Alemanha. As psicologias desenvolvidas nesses outros centros não
tardaram, porém, a ganhar feições próprias, diferindo daquela desenvolvida por Wundt.
[67] Entre os psicólogos alemães contemporâneos de Wundt, pode-se citar: Franz
Brentano (1838-1917), Carl Stumpf (1848-1936), Hermann Ebbinghaus (1850-1909),
Georg Elias Müller (1850-1934) e Oswald Külpe (1862-1915).
[68] Os trabalhos de Ebbinghaus são especialmente “memoráveis”...

[69] Em meados da década de 1870, Ebbinghaus leu os


dois volumes dos “Elementos de psicofísica” (1860), de
Fechner, descobertos num sebo de Paris. Interessou-se
pelo tratamento matemático dado por Fechner a
fenômenos psicológicos. Influenciado por essa leitura,
propôs-se aplicar a medição aos processos mentais
superiores.
[70] A contribuição mais significativa de Ebbinghaus é a
sua pesquisa sobre a memória, iniciada em 1879.
Primeiramente, Ebbinghaus criou as chamadas “sílabas
sem sentido”. Por exemplo: XEP, CIH, BEQ, LEF, BOK,
YAT, WOY, XAM, PIR etc. Em seguida, elaborou listas
com essas sílabas e pôs-se a memorizá-las. Feito isso,
estudou experimentalmente diversas questões: qual é a
relação entre a quantidade de material a memorizar e o
tempo necessário para aprendê-lo? Quais são os efeitos da passagem do tempo sobre a
memória? Tendo aprendido uma lista de sílabas uma vez e tendo, em seguida, esquecido o
aprendido, o tempo necessário para reaprendê-la é menor? Aprender material sem sentido
é mais difícil do que aprender material dotado de sentido? Em que caso o desempenho é
melhor? Quando se tenta memorizar tudo de uma vez ou quando se distribui ao longo do
tempo o material a ser memorizado? Memorizar uma lista de sílabas e ir dormir aumenta a
taxa de retenção da aprendizagem?
[71] Entre os resultados de Ebbinghaus, é especialmente famosa a chamada “curva do
esquecimento”. Tendo aprendido uma lista de sílabas, a taxa inicial de esquecimento é
grande, mas, depois, ela se suaviza.
[72] A pesquisa de Ebbinghaus aconteceu em dois períodos de um ano cada: 1879-1880 e
1883-1884. Os seus resultados foram publicados em 1885, em uma monografia intitulada
“Sobre a memória”. Em 1902, Ebbinghaus publicou “Fundamentos da psicologia”. Dedicou
a obra a Fechner: “eu devo tudo a você”5.
[73] Segundo Wundt, o método experimental era aplicável somente a processos
psicológicos simples como a sensação e a percepção. Ebbinghaus demonstrou que era
possível submeter a memória – um processo psicológico superior – a um tratamento
quantitativo. Esta foi a primeira vez que a aprendizagem e a memória foram estudadas de
forma experimental e quantitativa.

5 HOTHERSALL, David. História da psicologia. 4.ed. São Paulo: McGraw-Hill, 2006. p.161.
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Os primórdios da psicologia

III - Os pioneiros da psicologia científica nos Estados Unidos da América:

[74] Nascida na Alemanha, no final do século XIX, a psicologia emigrou da Europa para os
Estados Unidos da América nas primeiras décadas do século seguinte, instalando aí a sua
principal residência.
[75] A Primeira Guerra Mundial interrompeu a tradição de pesquisa em psicologia iniciada
na Alemanha.
[76] A psicologia alemã sofreu ainda um duro golpe depois que o regime nazista expulsou
do país os psicólogos judeus.
[77] Do outro lado do Atlântico, os Estados Unidos receberam de braços abertos a nova
ciência. James e Hall estiveram justamente entre os primeiros a lhe dar as boas-vindas.

a) James:

[78] Não poucos historiadores apontam


William James (1842-1910) como o
maior psicólogo estadunidense que já
existiu.
[79] Originário de uma família abastada
e culta, nascido em Nova Iorque, James
formou-se em medicina pela
Universidade de Harvard em 1869,
vindo a se tornar professor dessa mesma
instituição de ensino.
[80] Autodidata em matéria de
psicologia, James ministrou, entre 1875
e 1876, em Harvard, o primeiro curso de
psicologia acontecido nos Estados
Unidos.
[81] Para esse curso, montou, em 1875,
um laboratório de demonstração.
[82] A grande contribuição de James
para a nova ciência foram os “Princípios de psicologia”, publicados em 1890, depois de 12
anos de trabalho.
[83] Os “Princípios...” inspiraram toda uma geração de psicólogos. Não poucos entre os
grandes nomes da história da psicologia decidiram tornar-se psicólogos ao lerem o manual
de James.
[84] Composta de dois volumes, a obra tem 1.393 páginas. Trata-se de uma espécie de
versão norte-americana dos “Princípios de psicologia fisiológica” (1873-1874) de Wundt. O
livro abrange todo o conhecimento psicológico da época analisado, debatido e enriquecido
com contribuições originais do próprio James.

9
[85] Em 1892, James publicou uma versão condensada dos “Princípios...”: “Psicologia, um
curso abreviado”, com 478 páginas. Os estudantes de Harvard passaram a se referir aos
monumentais dois volumes como “o James” e à sua versão resumida como “o Jimmy”.
[86] A primeira frase dos “Princípios...” é: “A psicologia é a ciência da vida mental, tanto
em seus fenômenos quanto em suas condições”6.
[87] Segundo James, a psicologia abrange o estudo dos animais, das crianças e também
das pessoas enfermas.
[88] Metodologicamente, James sempre se mostrou um eclético: admitia qualquer método
que pudesse lançar luz sobre a vida mental. Inclusive, a introspecção. Não, porém, o tipo
de introspecção preconizado por Titchener. Para James, a introspecção era algo
espontâneo, natural, não algo que exigisse um treinamento exaustivo e rigoroso.
[89] O capítulo dos “Princípios...” sobre a consciência é um dos mais importantes. Para
James, o objeto da psicologia é a corrente da consciência ou o fluxo do pensamento. A
consciência não é um conjunto de unidades interconectadas, não resulta da somatória de
pequenos elementos, não existe em partículas separadas, mas constitui-se numa corrente,
uma cadeia, a fluir constantemente, sendo, pois, comparável a um rio ou a um curso
d’água. Esse modo de representar a consciência opõe-se a uma concepção analítica,
elementarista, atomista ou molecular da mesma.
[90] A consciência tem cinco características principais: [a] a pessoalidade, [b] a
mutabilidade, [c] a continuidade, [d] a objetividade e [e] a seletividade.
[91] Qual é a função da consciência? A consciência tem por função ajudar as pessoas a se
adaptarem ao meio ambiente. Por serem dotados de consciência, os seres humanos
aprendem rapidamente coisas novas e resolvem com mais facilidade os novos problemas
que se apresentam.
[92] Outro capítulo célebre dos “Princípios...” é aquele dedicado à emoção. A esse respeito,
James propôs uma teoria original, que gerou muito debate. Segundo a concepção corrente,
a emoção costuma ser despertada por alguma situação; as alterações físicas, por sua vez,
são desencadeadas pela emoção. A ordem dos fatos é, pois: percepção, emoção e sintomas
corporais. Segundo a teoria de James, as modificações corporais são despertadas
instintivamente pela situação; a emoção é apenas a consciência desse estado físico. A
ordem, então, é: percepção, sintomas corporais e emoção. A emoção nada mais é que a
sensação das alterações corporais despertadas por via reflexa por determinadas
circunstâncias estimulantes. Sem a alteração dos estados corpóreos, não haveria emoção.
[93] James não fundou nenhum sistema formal de psicologia. Mas influenciou a escola do
funcionalismo. Há quem o tome como primeiro psicólogo funcionalista. Outros preferem
vê-lo como o principal precursor da psicologia funcional.
[94] Em 1902, James publicou “As variedades da experiência religiosa”. Esse livro é
considerado o marco de fundação do campo da psicologia da religião.
[95] Além de psicólogo, James foi também um filósofo. Nos últimos anos de vida, ele se
distanciou da psicologia, preferindo ser apresentado como filósofo. A filosofia de James é o
pragmatismo. O lema do pragmatismo é: “Se funcionar, é verdadeiro”. A verdade de uma
crença pode, pois, ser avaliada pela sua utilidade.
[96] Em 1865, aos 23 anos de idade, James esteve no Brasil por oito meses, como membro
da expedição Thayer.
[97] Liderada por Louis Agassiz, um naturalista suíço, o objetivo da expedição era explorar
a bacia amazônica.
[98] A expedição partiu de Nova Iorque no dia 1o de abril de 1865 e aportou no Rio de
Janeiro, sede da corte imperial, no dia 22. Os três meses seguintes foram passados na
capital brasileira e arredores.
[99] No dia 25 de julho, o grupo seguiu para Belém do Pará, passando, entre outras
cidades, por Salvador e Maceió. Por fim, adentrou a bacia amazônica, passando por

6 HEIDBREDER, Edna. Psicologias do século XX. 5.ed. São Paulo: Mestre Jou, 1981. p.150.
10
Santarém, Manaus e outras cidades mais. Durante a viagem, James trabalhou como coletor
de peixes.
[100] Acredita-se que a metáfora do fluxo da consciência, de importância fundamental nos
“Princípios...”, remonte ao que James presenciou em suas navegações pelos rios
amazônicos.
[101] A expedição Thayer retornou ao Rio de Janeiro e, por fim, embarcou para os Estados
Unidos em dois de julho de 1866. James, porém, voltou para Nova Iorque em dezembro de
1865, sete meses antes do fim da expedição.

b) Hall:

[102] Primeiro psicólogo a doutorar-se em


psicologia nos Estados Unidos e primeiro aluno
norte-americano de Wundt, Granville Stanley
Hall (1844-1924) foi um enérgico promotor da
nova disciplina em solo norte-americano. Ele
fundou o primeiro laboratório, a primeira
revista e a primeira organização de psicologia
dos Estados Unidos.
[103] Em 1883, Hall fundou o primeiro
laboratório de pesquisa em psicologia
experimental dos Estados Unidos, na
Universidade Johns Hopkins, em Baltimore,
Maryland.
[104] Em 1887, Hall fundou a primeira revista
estadunidense de psicologia: a American
Journal of Psychology.
[105] No ano seguinte, Hall se tornou o
primeiro reitor da Universidade Clark, em Worcester, Massachusetts. Fundada em 1887, a
nova universidade abriu as portas em 1889.
[106] A American Psychological Association [Associação Americana de Psicologia] (APA)
foi fundada no dia 8 de julho de 1892 na casa de Hall, sob a sua liderança.
[107] Além dessas iniciativas de caráter mais organizacional, Hall também escreveu o seu
nome na história da psicologia como o fundador do campo da psicologia do
desenvolvimento. Em 1904, ele publicou “Adolescência”, o primeiro livro dedicado ao
tema; e, em 1922, “Senescência”, também uma obra pioneira.
[108] Hall ainda se notabilizou pela aplicação da psicologia à educação e pelas
contribuições que fez ao campo da psicologia da religião – por exemplo, com a publicação,
em 1917, de “Jesus Cristo à luz da psicologia”.
[109] Um dos feitos mais memoráveis de Hall foi, contudo, um congresso que ele
organizou enquanto presidente da Universidade Clark.
[110] Em 1909, a Universidade Clark completou 20 anos de funcionamento. Hall decidiu,
então, promover uma série de palestras públicas ministradas por eminentes psicólogos.
[111] As conferências aconteceram entre os dias seis e 10 de setembro daquele ano. Hall
convidou Freud e Jung para falarem. Ferenczi, Jones e Brill, psicanalistas, também
compareceram. Hall convidou também Wundt, mas este não pôde aceitar. Com a recusa de
Wundt, Ebbinghaus foi, então, chamado. Aceitou o convite, pretendia comparecer, mas
morreu meses antes do evento. Então, Hall convidou Stern. E a “fina flor” da psicologia
ianque também se fez presente: James, Titchener e Cattell, entre outros, estavam lá.
[112] Essa foi uma das realizações mais notáveis de Hall. O evento significou um encontro
histórico entre duas grandes vertentes do mundo da psicologia: a tradição da psicologia
experimental e a tradição da psicanálise. James, Titchener e Cattell, Freud, Jung e

11
Ferenczi, entre outros, juntos! A história da psicologia nunca mais viu algo assim
acontecer.
[113] Freud e Jung ficaram ambos hospedados na residência de Hall. James também se
instalou na casa do reitor.
[114] Freud falou todos os dias; fez cinco conferências introdutórias sobre psicanálise 7.
Jung proferiu três palestras, duas delas sobre a sua técnica de associação de palavras.
[115] Consta que Titchener abandonou uma conferência de Freud antes que ela
terminasse8. James assistiu a apenas uma das cinco palestras de Freud. “Quero ver como
Freud é”9, ele teria dito. Freud e James fizeram uma caminhada juntos; James teve um
ataque de angina pectoris durante esse passeio; Freud ficou admirado com a maneira
serena com que James reagiu a esse incidente10 – ele morreu um ano depois de um ataque
cardíaco. Passado o congresso, James escreveu a um amigo que Freud havia lhe deixado a
impressão de ser um “homem obcecado com ideias fixas”11.
[116] Terminadas as conferências, a Universidade Clark conferiu a Freud e a Jung o título
de doutor honoris causa. Como resultado desse evento, a psicanálise desfrutou de um
grande crescimento nos Estados Unidos a partir da década seguinte.
[117] Quase um século depois, em 1999, fazendo memória desse acontecimento, foi
instalada uma escultura de bronze de Freud no campus da Universidade Clark.

7 Cf. FREUD, Sigmund. Cinco lições de psicanálise. In: _______. Cinco lições de psicanálise, Leonardo da
Vinci e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1970. p.3-51. (Edição standard brasileira das obras
psicológicas completas de Sigmund Freud; 11.)
8 Cf. HOTHERSALL, David. História da psicologia. 4.ed. São Paulo: McGraw-Hill, 2006. p.326.
9 HOTHERSALL, David. História da psicologia. 4.ed. São Paulo: McGraw-Hill, 2006. p.326.
10 Cf. FREUD, Sigmund. Um estudo autobiográfico. In: _______. Um estudo autobiográfico, Inibições,

sintomas e ansiedade, A questão da análise leiga e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1970. p.67.
(Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 20.)
11 Cf. HOTHERSALL, David. História da psicologia. 4.ed. São Paulo: McGraw-Hill, 2006. p.326.

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As grandes escolas de psicologia

1 - O voluntarismo de Wundt:

[118] Fundador da psicologia científica como tal,


Wilhelm Maximilian Wundt (1832-1920) é também o
“pai” da primeira escola de psicologia, o voluntarismo.
[119] A sua obra prima são os dois volumes dos
“Princípios de psicologia fisiológica” (1873-1874).
[120] Nesse livro, Wundt propõe que a psicologia seja
tratada como uma ciência laboratorial independente.
[121] Para Wundt, a psicologia é uma ciência pura,
estritamente acadêmica, não interessada na sua
aplicação a questões práticas, como na solução de
problemas da vida cotidiana.
[122] Segundo Wundt, a psicologia é a ciência da
consciência; o seu objeto são os conteúdos mentais.
[123] O objeto da psicologia é a experiência imediata,
isto é, a experiência tal como diretamente vivenciada
pelo sujeito.
[124] Concretamente falando, quase a metade dos estudos publicados nos primeiros 20
anos do laboratório de Wundt teve por objeto a sensação e a percepção. Outros temas,
contudo, também foram investigados – tais como: a atenção, os tempos de reação, a
associação de palavras etc.
[125] O principal método da psicologia voluntarista de Wundt é a auto-observação
experimental, também chamada “percepção interna”.
[126] Os objetivos da psicologia wundtiniana são analisar os fenômenos mentais,
reduzindo-os aos elementos que os constituem, e descobrir como esses elementos se
relacionam entre si, determinando as leis dessa articulação.
[127] De acordo com Wundt, os elementos da experiência psicológica humana são as
sensações e os afetos.
[128] Combinadas entre si, as sensações constituem as percepções, e os afetos, as emoções.
[129] A chamada “apercepção” é justamente o processo pelo qual os elementos mentais são
sintetizados, formando uma unidade.
[130] O processo aperceptivo consiste numa síntese criativa, isto é, uma síntese que cria
novas propriedades mediante a combinação dos elementos.
[131] Essa organização dos elementos mentais pela apercepção tem um caráter dinâmico,
ativo, voluntário – donde o nome da psicologia de Wundt: “voluntarismo”.
[132] O sistema do voluntarismo acima esboçado é, porém, apenas um dos aspectos da
psicologia de Wundt.
[133] A psicologia wundtiniana tem, na verdade, dois ramos: uma psicologia de
laboratório, experimental: o voluntarismo, e uma psicologia social, não-experimental: a
psicologia dos povos.

13
[134] A primeira tem por objeto as funções mentais mais simples, como a sensação e a
percepção; a segunda, os processos mentais superiores.
[135] A psicologia dos povos se interessa por uma série de fenômenos, tais como: a
mitologia, a religião, a arte, a estética, a linguagem, os costumes sociais, a ética, a moral, o
direito – a cultura, enfim.
[136] Wundt dedicou as duas últimas décadas da sua vida ao estudo desses temas. Entre
1900 e 1920, ele publicou a monumental obra “Psicologia dos povos”, a qual compreende
uma dezena de grossos volumes12.

2 - O estruturalismo de Titchener:

[137] Nascido na Inglaterra, Edward Bradford Titchener (1867-1927) estudou filosofia em


Oxford e doutorou-se em psicologia em Leipzig, na Alemanha, sob a orientação de Wundt.
[138] Em 1892, após dois anos de estudos com Wundt, mudou-se para os Estados Unidos
da América, a fim de dirigir o laboratório da Universidade de Cornell, em Ithaca, Nova
Iorque.
[139] Consigo, Titchener trouxe a psicologia de Wundt – ou melhor: a sua versão da
psicologia wundtiniana.
[140] O seu livro mais importante foi um guia para o trabalho de laboratório: os dois
volumes de “Psicologia experimental: um manual de prática laboratorial” (1901-1905). Em
1909-1910, Titchener publicou também o seu “Compêndio de psicologia”, onde se encontra
a exposição mais completa e sistemática do seu pensamento.
[141] O estruturalismo é a psicologia de Titchener, também chamada “psicologia
introspectiva” ou “titchenerismo”.
[142] Para Titchener, a psicologia é uma ciência pura, desinteressada, não uma ciência
aplicada.
[143] O seu objeto é a mente ou a consciência humana.
[144] Mais exatamente, trata-se da mente ou da consciência humana, adulta e normal.
[145] Acrescente-se que a psicologia está interessada na mente humana em geral, não nas
diferenças individuais, isto é, na mente generalizada, não na mente individual.
[146] Pode-se também afirmar que o objeto da psicologia é a experiência enquanto
dependente de um sujeito que a vivencia.
[147] Concretamente, a psicologia titcheneriana se debruçou sobre dois fenômenos
psicológicos principalmente: a sensação e a percepção.
[148] O método da psicologia é a introspecção sistemática.
[149] Por meio da introspecção sistemática, um experimentador apresenta, por exemplo,
um determinado evento sensorial a um observador altamente treinado e lhe pede que
descreva as suas experiências psicológicas.
[150] O observador, por sua vez, deve descrever a sua experiência em termos elementares,
evitando interpretá-la – o chamado “erro de estímulo”.
[151] A psicologia possui três tarefas: [a] analisar a mente, reduzindo-a aos seus elementos
estruturais, [b] descobrir como esses elementos se articulam entre si, determinando as leis

12Freud citou Wundt várias vezes em seus escritos. Mencionou, por exemplo, as ideias de Wundt sobre os
lapsos de língua, bem como o experimento por ele realizado de associação de palavras. Referiu-se também à
concepção wundtiniana de que tudo o que é mental é passível de se tornar consciente. Entretanto, o texto em
que Freud citou Wundt mais vezes foi “Totem e tabu”. Então, Freud tinha em vista, sobretudo, a obra
“Psicologia dos povos”. Referiu-se, por exemplo, aos pontos de vista de Wundt sobre o tabu. E revelou que foi
estimulado a escrever sobre o totemismo pelas obras de Wundt e Jung: “Apresso-me em confessar que foi
dessas duas fontes que recebi o primeiro estímulo para os meus próprios ensaios” [FREUD, Sigmund. Totem e
tabu. In: _______. Totem e tabu e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1974. p.17. (Edição standard
brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 13.)] Ao citar Wundt, Freud, na maioria das
vezes, assumiu um ponto de vista divergente. Em todo caso, ele deu mostras de conhecê-lo e respeitá-lo.
14
que regem a sua combinação, e [c] compreender de que modo o sistema nervoso produz os
vários fenômenos sensoriais, perceptuais e cognitivos.
[152] Na prática, Titchener dedicou-se, sobretudo, ao primeiro desses três objetivos:
determinar a estrutura da consciência mediante a identificação das suas partes
componentes.
[153] Resumindo, para o estruturalismo, a psicologia é o estudo analítico da estrutura da
mente humana, adulta, normal e generalizada que se realiza mediante a introspecção.

[154] Ao analisar a mente, reduzindo-a aos seus


elementos mais simples, a psicologia procede como
a química: assim como esta última identifica os
elementos fundamentais da matéria, a psicologia –
“química da mente” – identifica os elementos
fundamentais da consciência. Trata-se, pois, de
estabelecer uma espécie de “tabela periódica” do
psiquismo.
[155] São três os elementos básicos a que a
consciência, uma vez analisada, pode ser reduzida:
as sensações, as imagens e os afetos.
[156] As sensações são os elementos da percepção;
as imagens, do pensamento; os afetos, da emoção.
[157] Esses elementos são básicos, isto é, incapazes
de ulterior redução analítica – são os “átomos”
mentais.
[158] Embora não possam ser ainda mais
subdivididos, os elementos possuem atributos.
[159] Os quatro atributos primários dos elementos básicos da mente são a qualidade, a
intensidade, a duração e a nitidez.
[160] Os elementos e os seus atributos são, pois, as unidades com as quais é formada toda
a estrutura do psiquismo.
[161] O laboratório de Titchener na Universidade de Cornell tornou-se o “quartel-general”
da psicologia estrutural. Porém, o titchenerismo não teve grande penetração em outras
universidades. O movimento do estruturalismo não sobreviveu ao próprio fundador:
morreu com Titchener.
[162] Um dos pontos mais fracos do estruturalismo foi o seu método. Na prática da
introspecção, havia muita discordância; observadores de laboratórios diferentes
produziam resultados muito díspares. Esse foi um dos motivos pelos quais surgiu o
behaviorismo.
[163] Não apenas o behaviorismo, mas também o funcionalismo, antes dele, surgiu como
protesto contra o limitado horizonte da psicologia estrutural.
[164] Para concluir, observe-se que, por muito tempo, ensinou-se que a psicologia de
Titchener era a psicologia de Wundt transplantada pelo primeiro para os Estados Unidos.
Pelo que ficou dito acima, percebe-se que, embora tenham muito em comum, há diferenças
importantes entre as duas psicologias. A psicologia de Titchener é a psicologia de Wundt
com certas ênfases, acréscimos e supressões, ou seja, é a interpretação de Titchener da
psicologia de Wundt.
[165] Wundt valoriza sobretudo a síntese; Titchener, a análise. O método da percepção
interna de Wundt é informal; a introspecção de Titchener, altamente sistemática. Wundt
inclui a psicologia social em sua psicologia; Titchener exclui. Eis algumas das diferenças
entre os dois.

15
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3 - O funcionalismo:

a) A escola de Chicago: Dewey, Angell e


Carr

[166] O funcionalismo foi a primeira escola de


psicologia nascida nos Estados Unidos da
América.
[167] A escola funcional de psicologia surgiu
como um protesto contra o voluntarismo de
Wundt e, sobretudo, contra a psicologia
estrutural de Titchener.
[168] O funcionalismo floresceu, inicialmente,
em duas importantes universidades norte-
americanas: Chicago e Columbia. Em Chicago,
teve como principais representantes: John
Dewey (1859-1952), James Rowland Angell
(1869-1949) e Harvey A. Carr (1873-1954).
[169] O funcionalismo sofreu influências
diversas. O pragmatismo da cultura norte-
americana, a teoria da evolução de Darwin, o
estudo das diferenças individuais por Galton e a
psicologia de James, entre outros fatores, exerceram uma grande influência sobre a escola
funcional de psicologia.
[170] Darwin merece ser mencionado separadamente. A sua teoria evolucionista teve um
grande impacto sobre a psicologia e, em particular, sobre o funcionalismo. Ao valorizar a
ideia da adaptação dos organismos vivos às condições ambientais, Darwin encorajou o
estudo da mente humana em suas funções adaptativas. Ao enfatizar a variabilidade entre
as espécies animais, ele estimulou, por extensão, o estudo e a medição das diferenças
individuais em psicologia. Ao estabelecer uma continuidade entre o ser humano e os
animais inferiores, Darwin justificou o estudo do comportamento animal com fins de
compreensão do comportamento humano. O darwinismo favoreceu, portanto: o estudo das
funções adaptativas da consciência, a psicologia diferencial e a mensuração das variações
individuais por meio de testes psicológicos, a psicologia animal e a psicologia comparada.
[171] O marco de fundação do funcionalismo é a publicação, por Dewey, na Psychological
review, em 1896, do artigo: “O conceito do arco reflexo na psicologia”. Nesse artigo, Dewey
critica a abordagem elementarista – entenda-se: titcheneriana – do arco reflexo e propõe
que o mesmo seja estudado em sua função adaptativa, isto é, em sua utilidade no
ajustamento do organismo ao meio ambiente.
[172] Talvez, a melhor e mais sistemática apresentação do funcionalismo seja o manual
“Psicologia, um estudo da atividade mental”, de Carr, publicado em 1925.

16
[173] Para o funcionalismo, a psicologia tem por objeto as operações mentais. Estas, por
sua vez, devem ser estudadas do ponto de vista das funções que desempenham, isto é, da
sua utilidade. Como funcionam? Qual é o seu modus operandi? Para que servem? Que
funções têm? A que fins práticos atendem? – eis as perguntas que o psicólogo funcionalista
considera pertinentes.
[174] O principal conceito do funcionalismo é “função”. A palavra “função” é ambígua.
“Função” pode significar uma atividade e também a utilidade de uma atividade. O conceito
de “função” é importante para o funcionalismo nos dois sentidos. Ele está interessado nos
processos psicológicos como atividades dotadas de utilidades.
[175] Influenciados por Darwin, os funcionalistas consideram que as operações mentais
são úteis à sobrevivência do organismo em sua adaptação ao meio ambiente. A consciência
constitui-se, assim, numa vantagem adaptativa.
[176] Os funcionalistas se interessam por uma grande diversidade de temas: sensação,
percepção, inteligência, aprendizagem, desenvolvimento, diferenças de sexo, motivação,
personalidade etc.
[177] A população estudada pelos funcionalistas abarca tanto seres humanos como
animais, adultos como crianças, pessoas saudáveis como indivíduos com problemas
psicológicos.
[178] O funcionalismo preza o estudo das diferenças individuais; não se ocupa apenas da
mente generalizada.
[179] O funcionalismo reconhece vários métodos como válidos. Admite, inclusive, o valor
da introspecção, embora se trate, então, de uma introspecção informal. Além da
introspecção, pode-se ainda citar: a observação, a experimentação, os questionários, os
testes mentais, os métodos psicofísicos, o estudo dos produtos sociais etc.
[180] A psicologia funcional é uma psicologia eminentemente aplicada; a aplicação da
psicologia aos problemas práticos da vida cotidiana é um elemento central do
funcionalismo. Os funcionalistas levaram a psicologia para muito além do laboratório,
aplicando-a às mais diversas situações: os testes mentais, a escola, a clínica, os negócios, a
seleção de pessoal, a propaganda, o direito etc.
[181] Recolhendo os dados acima enumerados, desenha-se, por fim, um forte contraste
entre as psicologias estrutural e funcionalista.

Estruturalismo Funcionalismo
Os conteúdos mentais As operações mentais
A estrutura ou a composição da mente A função da mente, a sua utilidade, a sua
vantagem adaptativa
O que é a mente? Como funciona a mente? Para que serve?
A mente como mosaico de pequenas partes A mente como um todo contínuo
Foco na sensação e na percepção Estudo de uma grande diversidade de
temas
O ser humano adulto normal Também os animais, as crianças e os
mentalmente enfermos
A mente humana generalizada As diferenças individuais
Introspecção sistemática Introspecção informal e vários outros
métodos
Psicologia pura Psicologia aplicada

[182] Nascido no final do século XIX, passados 30 anos, o funcionalismo já não existia
como escola formal de psicologia – se é que, um dia, ele o foi. O funcionalismo
desapareceu, mas porque se diluiu. Num certo sentido, todos os psicólogos – ou quase
todos – se tornaram – e ainda o são – funcionalistas.

17
[183] Pode-se também afirmar que o funcionalismo serviu de ponte entre o estruturalismo
de Titchener e o behaviorismo de Watson, como passagem de uma coisa a outra.

b) A escola de Columbia:

[184] James McKeen Cattell (1860-1944), Robert Sessions Woodworth (1869-1962) e


Edward Lee Thorndike (1874-1949) representam a escola de Columbia do funcionalismo.
Examinemos mais de perto as contribuições dos dois últimos.

A psicologia dinâmica de Woodworth:

[185] Há quem considere a psicologia de Woodworth uma escola independente de


psicologia. O mais comum, porém, é classificá-la como um ramo do funcionalismo.
[186] A psicologia dinâmica de Woodworth é uma psicologia da motivação – uma
“motivologia”.
[187] Essa psicologia não se constitui num sistema com contornos nitidamente marcados.
Woodworth assumiu, na verdade, uma posição eclética em psicologia, procurando
aproveitar contribuições de diferentes escolas.
[188] Assim, por exemplo, em 1932, ele publicou um livro de história da psicologia:
“Escolas contemporâneas de psicologia”. Apresentou, então, os diferentes sistemas como
sendo complementares entre si, não excludentes.
[189] Considerou que o objeto da psicologia não é nem a consciência somente, nem o
comportamento apenas, mas ambos: a consciência e o comportamento.
[190] Propôs que fosse inserido o organismo (O) na fórmula behaviorista estímulo-
resposta (E-R), reescrevendo-a, então, como: E-O-R.
[191] Reconheceu como métodos válidos tanto a introspecção quanto a observação e os
métodos experimentais, entre outros.
[192] Tudo isso ilustra o caráter conciliador da sua maneira de encarar a psicologia.
[193] Mais especificamente, uma das maiores contribuições de Woodworth foi a
publicação, em 1938, da obra “Psicologia experimental”. Esse livro ficou conhecido como a
“Bíblia de Columbia”. Gerações sucessivas de alunos aprenderam como fazer psicologia
laboratorial seguindo esse manual.

O conexionismo de Thorndike

[194] Nos anos de 1896 e 1897, Thorndike


dedicou-se ao estudo da inteligência animal por
meio de experimentos com pintinhos em
labirintos e gatos em caixas-problema.
[195] A teoria da aprendizagem de Thorndike é o
conexionismo. Para ele, aprender é estabelecer
conexões.
[196] Os experimentos com pintinhos foram
feitos quando Thorndike se encontrava ainda na
Universidade de Harvard. No seu próprio quarto,
colocando livros de pé em fileiras, ele construiu
um cercado e ali colocou um pintinho. O labirinto
possuía uma saída para um lugar onde havia
comida, água e onde estavam os outros
pintinhos. Thorndike observou, então, o
comportamento do seu sujeito experimental. Ao
ser colocado no labirinto, o pintinho corria de um lado para o outro, piando alto. Depois de
várias tentativas mal sucedidas, ele finalmente encontrava a saída. Sendo recolocado
18
dentro do cercado repetidamente, o pintinho encontrava a saída cada vez mais
rapidamente. Ele havia aprendido como sair do labirinto.
[197] Tendo se transferido para Universidade de Columbia, Thorndike passou a estudar a
inteligência animal em gatos. Basicamente, o experimento consistia em colocar um gato
faminto dentro de uma caixa-problema e, fora dela, algum alimento. Para sair, era
necessário que o gato emitisse uma resposta específica, tal como acionar um pedal ou
puxar um laço.
[198] Ao serem colocados dentro das caixas pela primeira vez, os gatos faziam tentativas ao
acaso. Thorndike chamou a esse comportamento de “tentativa e erro” – ou melhor:
“tentativa e êxito acidental”.
[199] Tendo feito tentativas diversas, os gatos acabavam emitindo a resposta correta,
escapavam da gaiola e podiam, então, se alimentar. Repetindo-se o experimento várias
vezes, as respostas ineficazes iam sendo abandonadas, ao passo que a resposta bem-
sucedida passava a ocorrer cada vez mais prontamente.
[200] Thorndike concluiu que a aprendizagem havia sido determinada pelo que chamou de
“lei do efeito”. Em “Elementos de psicologia” (1905), ele enunciou formalmente essa lei
como se segue: “Todo e qualquer ato que, numa dada situação, produz satisfação, associa-
se a essa situação, de modo que, quando a situação se reproduz, a probabilidade de uma
repetição do ato é maior do que antes. Inversamente, todo e qualquer ato que, numa
situação dada, produz desagrado, dissocia-se da situação, de modo que, quando a situação
reaparece, a probabilidade de repetição do ato é menor do que antes”13.
[201] Segundo Thorndike, o animal aprende a estabelecer conexões entre os estímulos
presentes nas gaiolas e as respostas bem-sucedidas. Dentro da caixa-problema, os gatos
emitem várias respostas. Algumas resultam em satisfações. Quando isso acontece, a
conexão entre essas respostas e a situação de estímulo se fortalece: é gravada. A maior
parte das respostas, porém, não resulta em nenhuma consequência agradável. Nesse caso,
a associação entre a situação de estímulo e as respostas se enfraquece: é apagada.
[202] No início da década de 1930, Thorndike procedeu a uma revisão da lei do efeito, com
a eliminação da segunda parte da lei. Ele concluiu que o papel negativo do desconforto não
é comparável ao papel positivo da satisfação na aprendizagem.
[203] Thorndike foi um dos primeiros psicólogos a enfatizar o fato de que as
consequências são importantes para a aprendizagem. A teoria do reforço de Skinner, aliás,
é muito parecida com a lei do efeito de Thorndike. A principal diferença entre as duas
reside no fato de que Thorndike faça referência a estados internos, coisa que Skinner, por
sua vez, evita.
[204] Além da lei do efeito, Thorndike formulou também a lei do exercício. Esta estabelece
simplesmente que a conexão entre o estímulo e a resposta é fortalecida pela prática.
[205] Thorndike tirou ainda outras conclusões do seu experimento: observou, por
exemplo, o fato da transferência da aprendizagem; constatou o fenômeno da irradiação;
testou e não constatou a aprendizagem por observação; testou e não verificou igualmente a
aprendizagem por instrução indireta etc.
[206] Os resultados das pesquisas de Thorndike com gatos foram publicados na revista
Science, em 1898, num artigo intitulado: “Alguns experimentos com inteligência animal”.
A sua tese, “Inteligência animal: um estudo experimental dos processos associativos em
animais”, foi publicada como monografia no mesmo ano em Psychological review. Em
1911, Thorndike publicou ainda: “Inteligência animal: estudos experimentais”, incluindo a
monografia de 1898 e novos capítulos escritos desde então.

13MARX, Melvin H.; HILLIX, William A. Sistemas e teorias em psicologia. 18.ed. São Paulo: Cultrix, 2008.
p.139.
19
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4 - A reflexologia de Pavlov:

[207] A escola russa de reflexologia floresceu entre o


final do século XIX e o começo do século passado.
[208] A reflexologia consiste no estudo da fisiologia
dos reflexos. Reflexos são reações involuntárias, não
aprendidas, desencadeadas pelos eventos que lhes
são imediatamente anteriores. Os reflexos estão a
serviço da sobrevivência do organismo.
[209] Ivan Mikhaillovich Sechenov (1829-1905),
Vladimir Mikhaillovich Bekhterev (1857-1927) e Ivan
Petrovich Pavlov (1849-1936) são os principais
representantes dessa escola.
[210] Embora não seja o fundador da reflexologia,
Pavlov é o mais célebre membro dessa escola e aquele
que teve um maior impacto sobre a psicologia –
nomeadamente, sobre o behaviorismo.
[211] Pavlov foi um eminente fisiologista russo. De
1890 até o ano da sua morte, dirigiu o laboratório de
fisiologia do Instituto de Medicina Experimental de São Petersburgo (Leningrado).
[212] Pavlov dedicou-se ao estudo da fisiologia da digestão. Mais exatamente, interessou-
se pela pesquisa das secreções das glândulas digestivas. Para tanto, utilizou cães como
sujeitos experimentais.
[213] Em seus estudos das secreções gástricas, Pavlov conseguiu isolar cirurgicamente uma
pequena parte do estômago e reestruturá-la de modo que funcionasse como um estômago
em miniatura – a chamada “bolsa de Pavlov”. Esse procedimento permitia observar a
atividade glandular do estômago sem a mistura com o alimento que estava sendo digerido.
Esse feito valeu-lhe o Prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina de 1904.
[214] Certo dia, Pavlov deparou-se com um contratempo. Ao estudar as secreções salivares
em cães, constatou que os animais salivavam antes de a comida lhes ser oferecida – por
exemplo, ao ouvirem os passos do experimentador que se aproximava ou ao verem a
refeição ser preparada. O fato impedia a medição do volume exato de saliva produzido para
cada quantidade ou tipo de comida.
[215] Pavlov decidiu, então, estudar o fenômeno imprevisto. Essa pesquisa tornou-se o
trabalho da sua vida.
[216] Pavlov passou a reproduzir experimentalmente o fato casualmente constatado. A
experiência consistia em tomar alguma coisa que, de início, não desencadeava a salivação,
fazendo-a anteceder imediatamente a apresentação do alimento, que, por sua vez, sempre
despertava o reflexo salivar. Pavlov constatou que, após certo número de
emparelhamentos, diversos estímulos eram capazes de produzir a resposta da salivação.

20
[217] Para isolar os seus animais de todos os estímulos, exceto aqueles que estavam sendo
estudados, Pavlov projetou um prédio de três andares que ficou conhecido como a “Torre
do Silêncio”.
[218] E, para coletar a saliva, criou um aparelho: um pequeno tubo diretamente ligado ao
canal salivar do cachorro e inserido, através de uma fístula, numa das bochechas do
animal. A saliva fluía por esse tubo, o que permitia a sua coleta e medição.
[219] Pavlov descreveu, então, o fenômeno nos seguintes termos. Antes do
condicionamento, chamado “respondente”, há um reflexo incondicional, no qual um
estímulo incondicional (alimento) elicia uma resposta incondicional (salivação). Nessa
fase, o estímulo neutro (sinal sonoro) que vai ser condicionado não elicia resposta
nenhuma. Durante o condicionamento, o estímulo neutro (sinal sonoro) é emparelhado
com o estímulo incondicional (alimento), o qual, por sua vez, elicia uma resposta
incondicional (salivação). Por fim, após o condicionamento, o estímulo neutro (sinal
sonoro) converte-se num estímulo condicional (sinal sonoro), passando a eliciar uma
resposta condicional (salivação).

[220] Pavlov estudou ainda uma série de fenômenos associados ao condicionamento


respondente, tais como: a aquisição, a extinção, a recuperação espontânea, a generalização,
a diferenciação, o condicionamento de 2o grau, a neurose experimental etc.
[221] A aquisição é o resultado do condicionamento: o sujeito experimental adquire um
reflexo condicional que antes não tinha.
[222] A extinção é o contrário da aquisição; nela, o efeito do condicionamento se perde.
Isso tende a acontecer gradualmente quando o estímulo condicional deixa de ser reforçado
pela associação ao estímulo incondicional.
[223] A recuperação espontânea é o reaparecimento de uma resposta condicional
anteriormente extinta, passado um período de descanso.
[224] A generalização é a extensão de uma resposta condicional a eventos semelhantes ao
estímulo condicional e a aspectos da situação em que a resposta foi inicialmente
condicionada.

21
[225] A diferenciação acontece quando um estímulo distinto do original não elicia a
mesma resposta.
[226] O condicionamento de 2o grau – ou de ordem superior – consiste no
condicionamento que envolve o emparelhamento de um estímulo neutro com um estímulo
condicional, ao invés de incondicional.
[227] Por fim, a neurose experimental – ou de laboratório – é um fenômeno que resulta de
um colapso da capacidade de fazer diferenciações, decorrendo da suspensão da capacidade
de distinguir entre dois estímulos.
[228] Em 1901, Pavlov publicou um artigo em que descreve, pela primeira vez, os seus
estudos sobre os reflexos condicionados. Em 1924, ele fez uma série de palestras
resumindo os seus 25 anos de trabalho, aproximadamente, sobre o condicionamento.
Publicadas em russo, foram traduzidas para o inglês em 1927 sob o título: “Reflexos
condicionados: uma investigação da atividade psicológica do córtex cerebral”. Em 1926,
Pavlov publicou “Os reflexos condicionados”.
[229] Inicialmente, Pavlov fez oposição ao governo comunista da União Soviética. Os
bolchevistas, não obstante, deram amplo apoio ao seu trabalho. Proibiram o exercício da
psicanálise, mas apoiaram a psicologia pavloviana, considerada uma teoria marxista do
psiquismo humano. No final de sua vida, Pavlov mudou de atitude e passou a apoiar o
governo comunista. Quando morreu, ele foi tratado como um herói nacional. Em
Leningrado (São Petersburgo), um monumento foi erigido em sua homenagem.
[230] A pesquisa de Pavlov sobre o condicionamento respondente exerceu uma profunda
influência sobre o behaviorismo de Watson. Os norte-americanos, porém, só
“descobriram” Pavlov nos anos 1920, quando boa parte do seu trabalho foi traduzida para
o inglês. Ele esteve pessoalmente nos Estados Unidos em 1923 e em 1929. Skinner assistiu
à palestra que ele ministrou em 1929. Os discípulos de Pavlov, no entanto, não reconhecem
o menor parentesco entre a reflexologia pavloviana e o behaviorismo ianque.
[231] Nos jardins do Instituto de Medicina Experimental, Pavlov mandou erguer uma
estátua de um cachorro sentado em um pedestal. Dizia ele: “os cães significam tudo”14.

14 HOTHERSALL, David. História da psicologia. 4.ed. São Paulo: McGraw-Hill, 2006. p.415.
22
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio)
Centro de Teologia e Ciências Humanas (CTCH)
Departamento de Psicologia

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As grandes escolas de psicologia

5 - O behaviorismo de Watson:

[232] O behaviorismo, a maior escola de psicologia da


história dos Estados Unidos, foi criado por John
Broadus Watson (1878-1958).
[233] Watson doutorou-se em psicologia em 1903, pela
Universidade de Chicago, o “berço” do funcionalismo.
Na “Cidade dos Ventos”, foi aluno de Dewey e Angell.
[234] Em 1904, Watson casou-se com Mary Ickes, com
quem teve dois filhos.
[235] Em 1908, tornou-se professor de psicologia da
Universidade Johns Hopkins, em Baltimore, Maryland.
[236] No ano seguinte, Watson tornou-se chefe do
departamento de psicologia da mesma universidade,
sucedendo a James Mark Baldwin (1861-1934).
[237] Em 1915, foi eleito presidente da American
Psychological Association (APA).
[238] Em 1920, um escândalo amoroso encerrou
prematuramente a carreira acadêmica de Watson.
Descobriu-se que ele tinha um caso com uma
estudante de pós-graduação e assistente de pesquisa,
Rosalie Rayner. O fato teve uma grande repercussão, com ampla divulgação na imprensa.
Retratado como o professor que seduzira uma aluna, traindo esposa e filhos, Watson foi
obrigado a abandonar a Johns Hopkins.
[239] A maioria dos amigos e colegas de Watson o abandonou por ocasião do lamentável
episódio. Titchener foi um dos poucos psicólogos que o apoiaram publicamente.
[240] Em 1921, Watson divorciou-se de Ickes e, logo em seguida, casou-se com Rayner,
com quem veio a ter outros dois filhos.
[241] Watson mudou-se, então, para Nova Iorque, entrou no mundo dos negócios e
dedicou-se à publicidade, onde foi muito bem sucedido: ficou milionário.
[242] Até 1930, Watson ainda manteve algum contato com a psicologia: escreveu dois
livros – “Behaviorismo” (1925) e “O cuidado psicológico do bebê e da criança” (1928), este
último, com a colaboração da senhora Rayner –, ministrou palestras sobre psicologia para
o público em geral, deu entrevistas em rádios e publicou artigos em revistas populares.
[243] Depois de 1930, porém, Watson envolveu-se muito pouco com a psicologia.
[244] Em 1935, Rayner morreu subitamente. Watson nunca se recuperou dessa perda.
[245] Em 1957, por fim, o “pai” do behaviorismo recebeu a medalha de ouro da APA por
suas contribuições à psicologia.
[246] Também chamado de “comportamentalismo”, “comportamentismo” ou
“condutismo”, o behaviorismo rivaliza com o funcionalismo na disputa pelo título de “a
mais norte-americana” de todas as escolas de psicologia.

23
[247] O marco de fundação do behaviorismo é uma palestra feita por Watson em fevereiro
de 1913 na Universidade de Columbia. Esse discurso ficou conhecido como o “manifesto”
behaviorista. Um mês depois, a sua fala foi publicada na forma de artigo na Psychological
review sob o título: “A psicologia tal como o behaviorista a vê”. Passados alguns anos, em
1919, com a colaboração de Rayner, Watson transformou o referido artigo num livro: “A
psicologia do ponto de vista de um behaviorista”, sendo essa a exposição mais elaborada do
seu pensamento.
[248] Tendo se configurado como escola na Universidade Johns Hopkins, o behaviorismo
difundiu-se, em seguida, por todo o país. Após um período de ascensão gradual, o
comportamentalismo chegou a dominar completamente o cenário da psicologia
estadunidense por, pelo menos, três décadas, de 1930 a 1960, aproximadamente.
[249] Eis o primeiro parágrafo do manifesto de 1913: “A psicologia, na visão do
behaviorista, é um ramo experimental puramente objetivo da ciência natural. Seu objetivo
teórico é a previsão e o controle do comportamento. A introspecção não faz parte essencial
dos seus métodos, nem o valor científico dos seus dados depende da prontidão com que se
prestam à interpretação em função da consciência. O behaviorista, em um esforço para
obter um projeto unitário de resposta animal, reconhece não haver linha divisória entre o
homem e o animal. O comportamento do homem, com todo o seu refinamento e a sua
complexidade, forma apenas uma parte do projeto total de investigação do behaviorista” 15.
O parágrafo terceiro, por sua vez, começa assim: “Chegou a hora de a psicologia descartar
toda referência à consciência; de ela não mais se iludir pensando que pode fazer dos
estados mentais objeto de observação”16.
[250] Como se vê, o discurso de Watson foi mesmo programático. Percorramos, um a um,
os diversos elementos do seu modo de entender a psicologia.
[251] Para Watson, a psicologia é uma ciência da natureza. O behaviorismo,
nomeadamente, é uma psicologia decidida a ser científica. O seu princípio fundamental é o
da objetividade.
[252] O objeto da psicologia é o comportamento humano e animal. São os atos
comportamentais observáveis, direta ou indiretamente, e passíveis de descrição objetiva.
[253] Tomemos como exemplo o pensamento. Segundo a concepção corrente, o
pensamento é um fenômeno mental, um processo que não está sujeito à observação.
Watson, porém, argumentou que o pensamento é, ele também, um comportamento
objetivo passível de ser observado. De que modo? Pensar é falar para si mesmo sem emitir
som. Essa fala subvocal, por sua vez, é acompanhada de leves movimentos da língua, boca
e laringe, contrações passíveis de serem captadas e medidas por meio de instrumentos. O
pensamento, portanto, é um comportamento laríngeo que pode ser observado
indiretamente.
[254] A alma, a mente, a consciência, o psiquismo, a interioridade do sujeito e fenômenos
semelhantes não se constituem no objeto de estudo da psicologia.
[255] Pode-se falar em dois tipos de behaviorismo: um metodológico, também chamado
“empírico”, outro metafísico, também chamado “radical”. O behaviorismo metodológico é
o behaviorismo da “caixa fechada”: a mente existe, mas não se tem acesso ao interior dela;
tudo o que se pode conhecer é o que entra e o que sai; por razões metodológicas, portanto,
a mente deve ser descartada pela psicologia. O behaviorismo metafísico é o behaviorismo
da “caixa vazia”: a mente não existe; não interessa como objeto de estudo simplesmente
porque não há o que estudar.
[256] Watson oscilou entre uma forma e outra de behaviorismo. Parece ter evoluído de
behaviorista metodológico a behaviorista metafísico.

15 SCHULTZ, Duane P.; SCHULTZ, Sydney Ellen. História da psicologia moderna. São Paulo: Cengage
Learning, 2013. p.264.
16 BENJAMIN, JR., Ludy T. Uma breve história da psicologia moderna. Rio de Janeiro: LTC, 2009. p.60.

24
[257] Os objetivos da psicologia são a predição e o controle do comportamento. Dado um
estímulo, compete a ela prever a respectiva resposta; dada uma resposta, estabelecer que
estímulo a desencadeou. Controlar o comportamento, por sua vez, é o mesmo que
modificá-lo.
[258] A introspecção não se constitui num método cientificamente válido para a psicologia.
O behaviorismo propõe que apenas métodos objetivos sejam usados – tais como:
observações, estudos experimentais em laboratório, alguns testes psicológicos, os métodos
do tempo de reação, as técnicas da caixa-problema de Thorndike, o método do
condicionamento pavloviano etc.
[259] Como se vê, o behaviorismo está em radical descontinuidade com a psicologia
mentalista e introspeccionista que o antecedeu, seja em sua configuração estruturalista,
seja em sua versão funcionalista. Pode-se mesmo falar numa “revolução behaviorista”. De
fato, o comportamentalismo propôs um novo objeto e um novo método para a psicologia.
Ou seja, uma revisão completa da ciência da psicologia.
[260] A “pedra angular” da psicologia behaviorista é o esquema estímulo-resposta (E-R).
Todo comportamento é passível de ser explicado em termos de estímulo e resposta.
[261] A “chave” para a compreensão do comportamento é o condicionamento. Segundo o
behaviorismo, há dois tipos de condicionamento: um respondente, também chamado
“clássico” ou “pavloviano”, outro operante, também chamado “instrumental” ou
“skinneriano”. O condicionamento respondente é o condicionamento E-R: nele, um
estímulo desencadeia uma resposta. O condicionamento operante é o condicionamento R-
E: nele, um estímulo segue-se a uma resposta. O comportamento respondente é controlado
pelos seus antecedentes; o comportamento operante, pelas suas consequências. O primeiro
interessou mais a Watson; o segundo, a Skinner.
[262] O behaviorismo concede grande importância ao estudo da aprendizagem. Para a
psicologia comportamental, tudo – ou quase tudo – é aprendido. Em meados da década de
1920, Watson formulou um desafio que ficou famoso: “Deem-me uma dúzia de bebês
saudáveis e bem formados e ponham-nos num mundo criado segundo as minhas
especificações e eu lhes garantirei que posso selecionar qualquer um, aleatoriamente, e
treiná-lo para tornar-se o especialista que eu quiser: médico, advogado, artista,
comerciante e, sim, até mesmo mendigo e ladrão, independentemente de seus talentos,
propensões, tendências, aptidões e vocações e da raça de seus ancestrais”17.
[263] Face ao binômio “nature versus nurture” – “inato versus adquirido” –, o
behaviorismo privilegia decididamente o que é adquirido pela aprendizagem. Watson é um
ambientalista radical, um arquiambientalista.

[264] A infância se reveste, assim, de


uma grande importância para o
behaviorismo; trata-se do período de
formação mais importante da vida
humana. Watson estudou mais de
500 bebês na Clínica Psiquiátrica
Henry Phipps, em Baltimore.
[265] Estudando bebês, Watson
constatou que há apenas três reações
emocionais inatas, as quais podem
ser despertadas no bebê antes da
aprendizagem, bastando, para isso, o
estímulo apropriado. São elas: o medo, a raiva e o amor. Os bebês não têm medo do escuro,
do fogo, de ratos, cobras ou cachorros. Mas as crianças maiores frequentemente
apresentam esses medos. Por que razão? Segundo Watson, porque foram condicionadas;

17 GOODWIN, C. James. História da psicologia moderna. 4.ed. São Paulo: Cultrix, 2010. p.361.
25
as reações emocionais são, em grande medida, respostas aprendidas. Watson se propôs,
então, a demonstrar essa tese experimentalmente.
[266] O experimento aconteceu em 1919. O sujeito foi um bebê de 11 meses, filho de uma
das enfermeiras do hospital, o “Pequeno Albert”. Com a ajuda de Rayner, Watson
condicionou o pequerrucho a ter medo de ratos usando a técnica do condicionamento
respondente. O procedimento consistiu em bater com violência numa barra metálica atrás
de Albert toda vez que um rato lhe era apresentado. Depois de sete seções de
emparelhamento, o bebê passou a ter medo de ratos. Verificou-se também que a resposta
do medo generalizou-se para outros estímulos semelhantes. Os resultados foram
publicados em 1920, no Journal of experimental psychology, num artigo escrito a quatro
mãos, intitulado: “Respostas emocionais condicionadas”.
[267] Além da psicologia infantil, também a psicologia animal ocupa um lugar eminente na
escola comportamental de psicologia. Pode-se mesmo afirmar que, para o behaviorismo, a
psicologia animal é a psicologia modelo. O ser humano, aos olhos do condutismo, é um
animal, uma espécie animal entre muitas outras, não um caso especial.
[268] A exemplo do funcionalismo, o behaviorismo entende a psicologia como uma ciência
aplicada.
[269] Tendo deixado a universidade, o próprio Watson teve a oportunidade de aplicar ao
campo da publicidade, por exemplo, os princípios da psicologia comportamental. De fato,
os condicionamentos respondente e operante podem muito bem ser utilizados na venda de
mercadorias.
[270] Watson também fez recomendações práticas quanto ao modo correto de educar as
crianças, conforme vimos, num livro que escreveu com a sua segunda mulher.
[271] A psicoterapia, por fim, revelou-se um campo muito fecundo de aplicação da teoria
behaviorista da aprendizagem.
[272] Para o behaviorismo, o sintoma não é sinal de alguma outra coisa; não é a
manifestação externa de uma problemática subjacente. O sintoma é a própria doença.
Tratar a doença significa, pois, eliminar o sintoma, não mais do que isso.
[273] Para o behaviorismo, as doenças mentais são comportamentos aprendidos por
condicionamento. A terapia comportamental consiste, então, em desaprender
comportamentos indesejáveis e aprender comportamentos preferíveis. Noutras palavras,
trata-se de um descondicionamento e, em seguida, de um recondicionamento. Trata-se,
enfim, de uma reeducação.
[274] Para essa reaprendizagem, há várias técnicas de terapia comportamental.
[275] A técnica da dessensibilização sistemática é indicada para o tratamento de fobias.
Consiste em introduzir o estímulo que causa ansiedade de uma forma progressiva, levando
o paciente, ao mesmo tempo, a manter-se relaxado.
[276] Essa técnica foi utilizada pela primeira vez em 1924 por Mary Cover Jones (1896-
1987), colega de Rayner. Baseando-se em sugestões feitas por Watson e Rayner sobre o
modo como o medo poderia ser desaprendido, ela descondicionou o medo de coelhos num
garotinho de três anos chamado “Peter”.
[277] O condicionamento aversivo consiste em associar um estímulo que causa prazer a
alguma coisa desagradável. Essa técnica pode ser usada no tratamento do alcoolismo, do
tabagismo, de certos desvios sexuais – por exemplo, o fetichismo –, do excesso no comer
etc.
[278] A técnica da inundação consiste em confrontar o paciente massivamente com o
estímulo que lhe causa medo ou aversão de modo a esvaziá-lo.
[279] A enurese pode ser tratada fazendo com que uma campainha desperte a criança ao
primeiro sinal de umedecimento das fraldas. E assim por diante.

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As grandes escolas de psicologia

6 - O behaviorismo radical de Skinner:

[280] Fundado por John Broadus Watson (1878-


1958), em 1913, o behaviorismo foi abraçado, nas
décadas que se seguiram, por inúmeros psicólogos
norte-americanos. Entre eles, sobressaem os
neobehavioristas Clark Leonard Hull (1884-1952),
Edward Chace Tolman (1886-1959), Edwin Ray
Guthrie (1886-1959) e Burrhus Frederick Skinner
(1904- 1990).
[281] Skinner é, sem dúvida, o principal behaviorista
da segunda metade do século passado.
“Behaviorismo radical” é o nome que ele mesmo
conferiu à sua abordagem em psicologia.
“Arquibehaviorista”, eis como ele foi chamado.
[282] Skinner estudou psicologia na Universidade de
Harvard. Ali, fez também a sua pós-graduação e,
depois, tornou-se professor.
[283] Ao longo da sua vida, publicou diversos livros.
Entre eles: “O comportamento dos organismos: uma
análise experimental” (1938), “Walden II” (1948),
“Como ensinar animais” (1951), “Ciência e comportamento humano” (1953),
“Comportamento verbal” (1957), “Esquemas de reforço” (1957), com Charles B. Ferster, “A
tecnologia do ensino” (1968), “Para além da liberdade e da dignidade” (1971), “Sobre o
behaviorismo” (1974) e “Viva bem a velhice” (1983), com Margareth Vaughan.
[284] O condicionamento operante é o principal conceito da psicologia skinneriana. O
operante é um comportamento que decorre da iniciativa do organismo e que atua sobre o
ambiente. O operante é também um comportamento grandemente influenciado pelas suas
consequências.
[285] As consequências que se seguem a um operante podem aumentar ou diminuir a
probabilidade de que, em condições semelhantes, ele seja de novo emitido. No primeiro
caso, temos o reforço; no segundo, a punição.
[286] Há dois tipos de reforço: positivo e negativo. Há também dois tipos de punição:
positiva e negativa. Vejamos tudo isso, passo a passo.

Aumenta a frequência do Diminui a frequência do


operante operante
Apresenta um estímulo REFORÇO POSITIVO PUNIÇÃO POSITIVA
(estímulo reforçador) (estímulo aversivo)
Suprime um estímulo REFORÇO NEGATIVO PUNIÇÃO NEGATIVA
(estímulo aversivo) (estímulo reforçador)
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[287] O reforço é aquilo que aumenta a probabilidade de ocorrência do operante. No
reforço positivo, o operante tem a sua frequência aumentada pela apresentação de um
estímulo reforçador. No reforço negativo, o operante tem a sua frequência aumentada pela
supressão de um estímulo aversivo.
[288] Um reforço pode ser descrito como “intrínseco” ou “extrínseco”. Ele é intrínseco
quando faz parte do comportamento em si, acompanhando-o automaticamente. Ele é
extrínseco quando não é inerente ao comportamento em questão, mas ministrado de
alguma maneira.
[289] Há ainda os reforços primários e os reforços secundários. Os primeiros são
recompensas físicas diretas; os segundos são estímulos neutros que foram associados a
reforços primários de modo a se tornarem estímulos condicionais.
[290] A punição é aquilo que diminui a probabilidade de ocorrência do operante. Na
punição positiva, o operante tem a sua frequência diminuída pela apresentação de um
estímulo aversivo. Na punição negativa, o operante tem a sua frequência diminuída pela
supressão de um estímulo reforçador.
[291] Há também punidores intrínsecos e extrínsecos, primários e secundários.
[292] Skinner era contrário ao uso da punição como método de controle do
comportamento. Para tanto, o seu método preferido era o reforço positivo.
[293] A punição é desaconselhável por várias razões: [a] porque não ensina a resposta
desejável; [b] porque o seu efeito é temporário; [c] porque reforça negativamente a pessoa
que pune, mas não reforça a pessoa que é punida; [d] porque pode reforçar negativamente
comportamentos de evitação na pessoa punida; [e] porque, via condicionamento
pavloviano, tende a fazer do agente punidor um estímulo condicional aversivo; e [f] porque
pode estimular um contra-ataque agressivo.
[294] Em se tratando de ministrar um estímulo reforçador, é possível fazê-lo de várias
maneiras. Um operante pode ser reforçado por intervalo de tempo ou por número de
respostas (razão). O intervalo de tempo e a razão, por sua vez, podem ser fixos ou variáveis.
Temos, então, quatro possibilidades: intervalo fixo, intervalo variável, razão fixa, razão
variável.

Intervalo de tempo Número de respostas


Fixo INTERVALO FIXO RAZÃO FIXA
Variável INTERVALO VARIÁVEL RAZÃO VARIÁVEL

[295] Skinner testou diversos programas de reforço e constatou que os padrões de


comportamento variam conforme o esquema adotado. Eis algumas das suas conclusões:
[a] o indivíduo reforçado num esquema de intervalo fixo geralmente faz uma pausa logo
após o reforço antes de, pouco a pouco, aumentar novamente a taxa de respostas; [b]
organismos reforçados num programa de razão fixa emitem mais respostas do que aqueles
que são reforçados num regime de intervalo fixo; [c] o esquema de reforçamento por razão
variável produz um número de respostas mais elevado do que o programa de razão fixa; [d]
para se condicionar inicialmente o comportamento, estabelecendo-se a resposta desejada,
o modo mais eficaz de fazê-lo é reforçar todas as respostas; uma vez, porém, estabelecida a
resposta, para torná-la resistente à extinção, o mais indicado é o reforço intermitente.
[296] O condicionamento operante pode explicar o comportamento supersticioso. Numa
dada ocasião, uma resposta é seguida de um estímulo reforçador sem que haja nenhuma
conexão causal entre uma coisa e outra. O indivíduo atribui, porém, o reforço recebido ao
comportamento executado. Passa, então, a emitir a mesma resposta em situações
semelhantes. Esta, por sua vez, é reforçada de maneira intermitente, o que é suficiente
para mantê-la, sendo ainda o regime ideal de reforço para tornar o comportamento em

28
questão altamente resistente à extinção. Em suma, o comportamento supersticioso é uma
resposta seguida de reforço acidentalmente e, em seguida, reforçada de forma parcial.
[297] O condicionamento operante envolve ainda vários outros fenômenos, tais como: a
extinção, a recuperação espontânea, a generalização, a discriminação, a modelagem, o
auto-condicionamento, o condicionamento recíproco etc.
[298] Quando não são mais reforçados, os operantes declinam gradualmente em
frequência até desaparecerem – isso é a extinção.
[299] Uma vez extinto por falta de reforçamento, um operante pode reaparecer
gratuitamente – a isso, chama-se “recuperação espontânea”.
[300] Um operante reforçado dentro de um conjunto de circunstâncias tende a ocorrer em
situações semelhantes àquela em que foi reforçado – ou seja, tende a generalizar-se.
[301] A discriminação, por sua vez, é a capacidade de perceber que um operante reforçado
numa dada situação provavelmente não será reforçado numa situação diferente.
[302] A modelagem é o procedimento pelo qual um sujeito é gradativamente condicionado
a emitir uma resposta específica. Consiste em reforçar positivamente um indivíduo de
modo que ele se aproxime passo a passo do comportamento que dele se espera.
[303] O auto-condicionamento consiste em ministrar reforços e/ou punições a si mesmo.
[304] Nas interações sociais, o subordinado não apenas é condicionado pelo superior, mas
também o condiciona – a isso, chama-se “condicionamento recíproco”.

[305] Para estudar o condicionamento


operante, Skinner concebeu um
dispositivo que se tornou célebre: a
câmara operante, mais conhecida como
“caixa de Skinner”.
[306] O dispositivo é à prova de som e
tem a iluminação e a temperatura
internas controladas. A câmara operante
contém: uma pequena barra que pode
ser pressionada – no caso da gaiola para
ratos – ou um disco circular que pode
ser bicado – no caso da gaiola para
pombos –, um pequeno recipiente para
alimento, dispositivos para a
apresentação de estímulos auditivos e
visuais, uma série de barras paralelas, no piso, que permitem a passagem de uma corrente
elétrica e um gravador cumulativo, o qual registra o tempo e a taxa de respostas. Quando a
alavanca é pressionada ou o disco tocado com o bico, uma bolinha de ração é
automaticamente liberada, de acordo com o programa de reforço selecionado, ou a
administração de um choque elétrico é interrompida.
[307] Uma das características da metodologia da pesquisa de Skinner é o uso de poucos
sujeitos experimentais. Ele sempre preferiu trabalhar exaustivamente com uns poucos
organismos ao invés de estudar grandes populações de indivíduos.
[308] A atitude não-teorética é também uma nota importante da abordagem de Skinner.
Em sua opinião, a psicologia deve descrever sem teorizar – ou teorizar parcimoniosamente
e com estrita adesão aos dados coletados.
[309] Aos seus olhos, boa parte das explicações em psicologia são apenas “ficções
explanatórias”, isto é, fatores hipotéticos, quase sempre, não observáveis, com os quais se
pretende explicar o comportamento humano, mas que, na verdade, não explicam coisa
alguma, apenas conferem um rótulo ao problema. Exemplos: o self, a personalidade, o livre
arbítrio, a criatividade, o desejo recalcado, o conflito entre o eu e o supereu etc.
[310] Skinner foi um determinista radical. Para ele, a liberdade é uma grande ilusão. Todo
comportamento é determinado. E o que determina as ações humanas não são fatores
29
internos, mas o ambiente. Nomeadamente, o reforço e a punição, eis o que decide se um
comportamento será frequente ou não.
[311] Por fim, uma última característica da psicologia skinneriana: a aplicação. O
behaviorismo é uma psicologia decididamente aplicada. Ao longo da sua carreira, Skinner
aplicou a sua ciência aos mais diversos problemas da vida cotidiana.
[312] Durante a Segunda Guerra Mundial, ele desenvolveu um sistema de orientação de
mísseis por meio de pombos: o projeto ORCON (Organic control).
[313] Skinner colaborou no adestramento de animais utilizados pelo programa espacial
norte-americano. Em 1961, dois chimpanzés – Ham e, em seguida, Enos – viajaram ao
espaço tendo sido treinados com base nas técnicas do condicionamento operante.
[314] Lançando mão da modelagem, Skinner ensinou um rato a jogar basquete e dois
pombos a jogarem pingue-pongue.
[315] Skinner criou um dispositivo automático para cuidar de bebês, o chamado “baby
tender” – “berço automático” ou “caixa do bebê”.
[316] Skinner criou as máquinas de ensinar, um sistema de ensino baseado nos princípios
do condicionamento operante.
[317] Esses mesmos princípios revelaram-se ainda aplicáveis ao campo da saúde mental.
De fato, pacientes psiquiátricos podem ter comportamentos desejáveis reforçados por meio
de fichas de plástico passíveis de serem trocadas por prêmios ou privilégios.
[318] Até mesmo uma comunidade ideal, baseada nos princípios do condicionamento
operante, foi concebida por Skinner em 1948, em seu romance “Walden II”. Nos anos
1960, o livro de Skinner chegou a inspirar uma comunidade verdadeira, em Louisa,
Virgínia, a Twin Oaks Community.
[319] Skinner teve um grande número de seguidores entusiásticos. Ele chegou a ser o mais
influente psicólogo dos Estados Unidos da América. Nas décadas de 1960 e 1970, em
particular, ele conheceu o auge da sua popularidade.
[320] Skinner viu nascer e combateu o cognitivismo. No dia oito de outubro de 1990, oito
dias antes da sua morte, ele fez o discurso de abertura da reunião anual da American
Psychological Association, em Boston. A sua fala foi publicada posteriormente com o
título: “Pode a psicologia ser uma ciência da mente?”. A resposta de Skinner é,
evidentemente, negativa. O seu último texto é, pois, um ataque ao mentalismo da
psicologia cognitiva.

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7 - A psicologia da Gestalt: Wertheimer, Köhler e Koffka

[321] “Gestalt” é uma palavra alemã que significa,


aproximadamente, o mesmo que “forma”, “contorno”
ou “configuração”.
[322] A psicologia da Gestalt é também conhecida
como “psicologia da forma” ou “gestaltopsicologia”.
[323] Os três principais representantes do gestaltismo
são Max Wertheimer (1880-1943) – o fundador –,
Wolfgang Köhler (1887-1967) e Kurt Koffka (1886-
1941). Um pouco posterior aos outros três, Kurt Lewin
(1890-1947) é o quarto nome do movimento.
[324] Na década de 1920, a psicologia da Gestalt
chegou a ser a principal escola alemã de psicologia.
Nos anos 1930, contudo, todos os principais
representantes do gestaltismo emigraram para os
Estados Unidos: Koffka, já em 1927; Wertheimer e
Lewin, em 1933; e Köhler, em 1935.
[325] Wertheimer, Koffka e Lewin eram judeus;
Köhler, um intrépido opositor do nazismo.
[326] Chegando à América, Wertheimer, Köhler e
Koffka instalaram-se em pequenas universidades do Oeste estadunidense. Exceção feita a
Köhler, que faleceu em 1967, os psicólogos da Gestalt tiveram uma carreira acadêmica
curta nos Estados Unidos: Koffka morreu em 1941; Wertheimer, em 1943; Lewin, em 1947.
[327] A psicologia da Gestalt é uma psicologia holística, não atomista – molar, não
molecular, global, não elementarista. Para o gestaltismo, a realidade primária não são os
elementos, é o todo. O todo determina as partes, não o contrário.
[328] Os elementos são o resultado de um procedimento artificial, a análise. Ocorre que a
análise destrói o objeto analisado. Uma Gestalt é, justamente, um fenômeno irredutível;
ela desaparece quando o todo é fragmentado em seus componentes.
[329] “O todo é mais do que a soma das suas partes”, diz o lema do gestaltismo. Ou ainda:
“O todo é diferente da soma das suas partes”.
[330] O marco de fundação da psicologia da Gestalt é a publicação, em 1912, por
Wertheimer, na Alemanha, de um artigo sobre o movimento aparente intitulado: “Estudos
experimentais sobre a percepção do movimento”.
[331] A questão se colocou para Wertheimer quando ele fazia uma viagem de trem, em
1910. Olhando pela janela, ele teve a impressão de que os postes, cercas, casas e mesmo
colinas e montanhas distantes se moviam, corriam juntamente com o trem. Ao descer em
Frankfurt, ele comprou um estroboscópio em uma loja de brinquedos e começou a fazer
experiências em um quarto de hotel.

31
[332] Como um estímulo visual estático pode produzir a percepção de algo em
movimento? Como um estímulo visual descontínuo pode resultar na percepção de algo
contínuo? Wertheimer ficou fascinado pelo problema perceptual do movimento aparente.
Ele conferiu ao fato o nome de “fenômeno phi”.
[333] Wertheimer levou o problema a Friedrich Schumann (1863-1940). Schumann
colocou à sua disposição o laboratório do Instituto de Psicologia da Universidade de
Frankfurt e apresentou-lhe Köhler e Koffka. Wertheimer concebeu, então, alguns
experimentos. Köhler, Koffka e a sua esposa participaram como sujeitos experimentais.
[334] Numa sala escura, Wertheimer fez reluzir, em rápida sucessão, dois pontos de luz
próximos um do outro, variando os intervalos de tempo entre os clarões. Quando o
intervalo entre os clarões era menor que 0,03 segundos, as duas luzes pareciam estar
continuamente acesas. Quando o intervalo era de 0,06 segundos, os observadores diziam
ver o clarão mover-se do primeiro ponto para o segundo. Quando o intervalo era igual ou
maior do que 0,20 segundos, os pontos de luz eram percebidos como dois clarões de luz
separados.
[335] Duas linhas negras – uma vertical, outra horizontal, num ângulo reto – foram
projetadas contra um fundo branco. O intervalo entre o aparecimento das linhas variava.
Sendo de 0,06 segundos, o observador via uma única linha mover-se da posição vertical
para a posição horizontal, parecendo deitar-se. Aumentando-se o intervalo, o observador
via duas linhas aparecendo sucessivamente. Diminuindo-se o intervalo, o observador via as
duas linhas sobrepostas.
[336] Feitos esses – e outros – experimentos, Wertheimer chegou à seguinte conclusão. O
fenômeno phi é um todo inanalisável. O movimento não está em nenhum dos elementos a
que o fenômeno pode ser reduzido. Não se encontrando nas partes, o movimento está no
todo. O fenômeno phi demonstra, pois, que a percepção é gestáltica.
[337] Com efeito, segundo a psicologia da forma, a percepção tem um caráter ativo e
gestáltico. Não somos apenas receptores passivos de estímulos sensoriais. A mente é ativa;
ela está constantemente à procura de totalidades significativas. Ao olharmos para o
mundo, não captamos aglomerados de sensações, mas vemos logo unidades completas.
Vemos Gestalten dotadas de sentido; organizamos e interpretamos o que vemos.
[338] Em 1923, num artigo intitulado: “Leis de organização em formas perceptuais”,
Wertheimer sistematizou os princípios que regem a percepção.
[339] Eis alguns desses princípios: proximidade: objetos próximos tendem a ser
agrupados; similaridade: objetos semelhantes tendem a ser agrupados; continuidade:
elementos orientados numa mesma direção tendem a ser percebidos como contínuos;
fechamento: figuras incompletas tendem a ser vistas como completas etc.
[340] Um dos princípios da percepção reconhecidos pela psicologia da Gestalt é a
tendência a organizar o que percebemos em figura e fundo. Segundo Edgar Rubin (1886-
1951), dado um campo perceptual, focalizamos a atenção em um estímulo-alvo, que se
torna a figura, contra o resto do campo, que funciona, então, como fundo. A figura é a
parte da configuração total do estímulo que se destaca; o fundo é amorfo, jazendo em
segundo plano.
[341] Em alguns padrões, a figura e o fundo são reversíveis. E, muitas vezes, o efeito global
é muito diferente quando a figura e o fundo são intercambiados. As Kippfiguren são,
justamente, figuras que contêm formas embutidas – ou seja, duas figuras numa só –.
Exemplo: o vaso de Rubin e os perfis de Pedro e Paulo de Rubin.
[342] A psicologia da Gestalt é uma psicologia experimental. O gestaltismo, porém, nunca
deu grandes mostras de apreço pela quantificação, parecendo preferir os resultados
qualitativos. Boa parte dos dados utilizados pela psicologia da forma foi obtida pelo
método da introspecção ingênua.
[343] Em matéria de aplicação da psicologia – ponto forte do funcionalismo e do
behaviorismo –, a psicologia da Gestalt revelou-se fraca.

32
[344] No que concerne aos temas investigados, de início, a gestaltopsicologia se
concentrou no estudo da percepção – nomeadamente, da percepção visual.
Posteriormente, ampliou as suas pesquisas de modo a incluir também a resolução de
problemas, a aprendizagem, o pensamento, a memória etc.

[345] A maior contribuição de Köhler, por exemplo, foi


o seu estudo da solução de problemas por chimpanzés.
[346] Köhler realizou a sua pesquisa em Tenerife, a
maior das Ilhas Canárias, onde ficou retido, pela
Primeira Grande Guerra, de 1913 a 1920.
[347] Köhler realizou dezenas de experimentos. A sua
estratégia consistia em criar situações-problema para
os animais e observar como eles conseguiam resolvê-
las. Por exemplo: suspender uma banana no topo da
jaula, fora do alcance dos chimpanzés, ou colocar a
banana do lado de fora das grades. A solução poderia
ser empilhar algumas caixas, que estavam à disposição,
debaixo da banana dependurada, ou ainda encaixar
duas varas ocas de bambu, inserindo a ponta de uma
dentro da extremidade da outra, de modo a obter uma
vara suficientemente longa para alcançar a banana.
[348] Köhler constatou que a descoberta da solução do
problema se dava de forma repentina. Subitamente, a
resposta surgia de uma forma completa. Chamou a isso
de “Einsicht” – em inglês, “insight”; em português, “introvisão”.
[349] Köhler observou também que o insight tem uma natureza gestáltica. De fato, a
solução de um problema acontece quando os elementos que estão em jogo se encaixam
entre si, formando uma Gestalt.
[350] Com o final da guerra, Köhler retornou a Berlim e relatou os resultados da sua
pesquisa num livro em alemão intitulado: “A mentalidade dos macacos” (1921). Em 1925, a
obra foi traduzida para o inglês.
[351] Nos Estados Unidos, a psicologia da Gestalt insurgiu-se contra o elementarismo da
psicologia estrutural de Titchener e da psicologia comportamental de Watson.
[352] A psicologia da Gestalt não chegou, porém, jamais a se tornar a força dominante da
psicologia norte-americana. Já em meados do século passado, o gestaltismo deixou de
existir como escola. Há, contudo, presentemente, duas escolas de psicologia especialmente
marcadas pela influência da psicologia da forma: o humanismo – com a Gestalt-terapia, de
Friedrich Perls (1893-1970) – e o cognitivismo.

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8 - A psicanálise de Freud:

Considerações gerais

[353] A psicanálise é uma criação de Sigmund


Freud (1856-1939) (cf. HMP, 16, 17, 75).
[354] Segundo Freud, a psicanálise é uma
disciplina científica (cf. BDP, 253; DVE, 287; EA,
62, 74, 89; HMP, 57, 74; NCIP, 194, 220; SP,
265), uma ciência da mente (cf. BDP, 249; EA,
62), um ramo da psicologia (cf. NCIP, 194) ou
uma nova psicologia (cf. BDP, 249, 255): “A
psicanálise constitui uma parte da ciência mental
da psicologia” (ALEP, 316). O fato, porém, é que
“...o mental não coincide com o consciente...”
(BDP, 246); longe disso, é grandemente
inconsciente (cf. ALEP, 317-321). A psicanálise é,
pois, mais exatamente, a ciência do inconsciente
(cf. DVE, 303, 304, 305; EA, 87; P, 302, 303),
dos processos mentais profundos (cf. BDP, 255;
EA, 62; P, 307), podendo ser apropriadamente
chamada de “psicologia profunda” (cf. ALEP,
316; BDP, 255, 256; DVE, 304, 306; EA, 66, 71;
HMP, 54; NCIP, 194; P, 302, 303), “psicologia do inconsciente” (cf. NCIP, 194) ou
“psicologia do isso (id)” (cf. BDP, 259). A psicanálise é também um método terapêutico
indicado para o tratamento de distúrbios neuróticos (cf. BDP, 249; CLP, 13, 18; DVE, 287,
303; EA, 87, 91; P, 302, 303; SP, 265).
[355] Embora não seja experimental, a psicanálise é uma ciência empírica (cf. CIP, 290;
DVE, 307), baseada na observação clínica de pacientes (cf. CIP, 290; EA, 74, 75): “...a
psicanálise não é fruto da especulação, mas sim o resultado da experiência...” (SP, 265);
“...ela se atém aos fatos de seu campo de estudo, procura resolver os problemas imediatos
da observação, sonda o caminho à frente com o auxílio da experiência...” (DVE, 307). A
psicanálise, garante Freud, “...está firmemente alicerçada na observação dos fatos da vida
mental...” (P, 305). Os seus ensinamentos “...baseiam-se em um número incalculável de
observações e experiências...” (EP, 168).
[356] O método da psicanálise é o estudo de caso. A obra de Freud pode ser dividida em
seis blocos principais: introduções, casos clínicos, formações do inconsciente, técnica,
metapsicologia e psicanálise aplicada. O bloco dos casos clínicos abrange cinco estudos de
caso: o caso Dora (Ida Bauer), em “Fragmento da análise de um caso de histeria” (1905), o
caso do Pequeno Hans (Herbert Graf), em “Análise de uma fobia em um menino de cinco
anos” (1909), o caso do Homem dos Ratos (Ernst Lanzer), em “Notas sobre um caso de

34
neurose obsessiva” (1909), o caso Schreber (Daniel Paul Schreber), em “Notas
psicanalíticas sobre um relato autobiográfico de um caso de paranóia (Dementia
paranoides)” (1911) e o caso do Homem dos Lobos (Serguei Constantinovitch Pankejeff),
em “História de uma neurose infantil” (1918). Alguns autores incluem também o caso da
Jovem Homossexual, em “A psicogênese de um caso de homossexualismo numa mulher”
(1920). E, por fim, pode-se ainda mencionar a autoanálise de Freud.
[357] Sendo uma ciência empírica, a teoria psicanalítica sempre foi encarada como algo
provisório e sujeito a reformulações. Ao longo de toda a vida de Freud, ela sofreu
modificações. A década de 1920, em particular, assistiu a uma série de revisões, com a
emergência de uma nova teoria das pulsões, em “Além do princípio de prazer” (1920), uma
nova teoria do aparelho psíquico, em “O ego e o id” (1923), uma nova visão sobre o
complexo edipiano da mulher, em “A dissolução do complexo de Édipo” (1924), e uma
nova teoria da angústia, em “Inibições, sintomas e ansiedade” (1926). Todas essas
mudanças decorreram do esforço de Freud de ajustar a teoria psicanalítica aos dados
empíricos que constituem o seu fundamento18.

Primórdios da psicanálise

[358] A pré-história da psicanálise remonta ao período de 1880 a 1882, com a utilização do


método catártico por Joseph Breuer (1842-1925) no tratamento de Anna O. (Berta
Pappenheim), uma jovem de 21 anos que sofria de histeria. Anna O. cuidava do pai
enfermo, a quem era muito afeiçoada, quando se viu, ela mesma, acometida de uma série
de perturbações físicas e psicológicas. Breuer conseguiu curá-la fazendo-a recordar, em
estado hipnótico, do acontecimento que ocasionou o surgimento de cada um dos seus
sintomas, sendo essa recordação acompanhada de uma intensa exteriorização de afeto.
[359] Em 1881, Freud se formou em medicina. No ano seguinte, ingressou no Hospital
Geral de Viena. Em sua prática médica, voltou-se para as doenças nervosas, interessando-
se, em particular, pela histeria. A fim de qualificar-se melhor, durante o inverno de 1885-
1886, Freud passou quatro meses e meio em Paris, onde estudou sob a orientação de Jean
Martin Charcot (1825-1893), no Hospital Salpêtrière. Em 1889, fez a sua segunda viagem à
França: desta vez, a Nancy, onde estudou, por algumas semanas, com Ambrose-Auguste
Liébeault (1823-1904) e Hippolyte Bernheim (1840-1919).
[360] Em fins de 1882, Breuer relatou o caso de Anna O. a Freud, e os dois médicos
passaram a colaborar. Chegaram, então, à seguinte interpretação da histeria. Mecanismo
do adoecimento: os sintomas histéricos são reminiscências de traumas psicológicos. Os
traumas são experiências em que, por algum motivo, a emoção correspondente não pôde
ser descarregada. Inibido em sua exteriorização, o afeto é, então, desviado para uma
inervação somática, ocasionando a conversão histérica. Mecanismo do restabelecimento:
em estado hipnótico, as cenas patogênicas são evocadas, trazidas à memória, revividas, a
emoção correspondente é liberada – acontece, assim, uma ab-reação – e, feita a catarse, os
sintomas desaparecem.
[361] Ao lado de outros casos clínicos, o caso Anna O. foi relatado em “Estudos sobre a
histeria” (1895), obra que Freud e Breuer publicaram a quatro mãos. Depois disso, porém,
Breuer desinteressou-se pelo método que criara, enquanto que Freud levou adiante a
pesquisa iniciada.
[362] A histeria revelava a importância de fatores de natureza inconsciente na causação da
neurose: as cenas patogênicas haviam sido esquecidas; era preciso recorrer à hipnose para
trazê-las à tona. Freud explicou a amnésia histérica com a teoria do recalque: haveria um
conflito entre um desejo e as aspirações morais da personalidade, e o desfecho desse
conflito seria o recalcamento do impulso censurado pelo eu. Ou seja, a lacuna da memória

18Não obstante essas considerações, registre-se que, atualmente, o status científico da psicanálise e a sua
pertença ao campo epistemológico da psicologia constituem-se em objeto de discussão.
35
de que padecem as pessoas histéricas seria o resultado de uma luta entre forças mentais
opostas entre si.
[363] Por algum tempo, Freud se tornou um praticante do método catártico de Breuer.
Não tardou, porém, a abandonar a hipnose. Feito isso, utilizou, por um breve período, a
técnica da pressão. Por fim, Freud adotou o método da associação livre, que veio a se
tornar a regra fundamental da psicanálise. Segundo essa técnica, o paciente é convidado a
entregar-se com toda a liberdade ao fluxo dos seus pensamentos, isto é, a dizer tudo o que
lhe vem à cabeça, abrindo mão de toda autocrítica, mesmo que as suas ideias pareçam
absurdas, sem importância ou destituídas de sentido e ainda que seja desagradável revelá-
las – aliás, especialmente, se isso for desconfortável ou constrangedor –.

Data de nascimento

[364] A psicanálise surgiu, pois, no final do século XIX, mas é difícil precisar exatamente
quando. Segundo Freud, a psicanálise começou quando, tendo abandonado a hipnose, ele
passou a usar o método da associação livre (cf. BDP, 246; CIP, 344; HMP, 17, 26).
[365] Alguns estudiosos fazem a técnica da associação livre remontar a uma fala de Emmy
von N., uma paciente de Freud, no dia 12 de maio de 1889: “Disse-me então, num tom de
queixa claro, que eu não devia continuar a perguntar-lhe de onde provinha isto ou aquilo,
mas que a deixasse contar-me o que tinha a dizer-me”19.
[366] Segundo Ernest Jones, o biógrafo oficial de Freud, o método da associação livre “...se
desenvolveu pouco a pouco, entre 1892 e 1895...”20.
[367] Para alguns historiadores, o marco de fundação da psicanálise é a publicação, em
1895, de “Estudos sobre a histeria”, o primeiro livro de Freud, escrito com a colaboração de
Breuer.
[368] Outros, porém, preferem a data de 1896, ano em que Freud usou o termo
“psicanálise” pela primeira vez21.
[369] Por fim, a última possibilidade: 1900, o ano da publicação de “A interpretação de
sonhos”. Movido, talvez, pelo desejo de fazer a psicanálise pertencer ao novo século, o
próprio Freud, certa vez, escreveu: “Pode-se dizer que a psicanálise nasceu com o século
XX, pois a publicação em que ela emergiu perante o mundo como algo novo – A
Interpretação de Sonhos – traz a data ‘1900’” (BDP, 239).

Relação com outras escolas de psicologia

[370] Seja como for, pode-se dizer que a psicanálise é posterior à fundação da psicologia
científica por Wundt (1879) e contemporânea do surgimento do estruturalismo de
Titchener (1892) e do funcionalismo de Dewey (1896). Diferentemente, porém, das
psicologias de Wundt, Titchener e Dewey – assim como do gestaltismo de Wertheimer
(1912) e do behaviorismo de Watson (1913) – a psicanálise não nasceu em ambiente
acadêmico, não floresceu no campo da psicologia experimental e não se interessou por
temas como sensação, percepção ou aprendizagem.
[371] Disse Freud: “...eu não partia [...] de experiências de laboratório e sim do trabalho
terapêutico” (CLP, 24). A psicanálise surgiu, pois, no campo da medicina; focalizou,
sobretudo, o comportamento anormal; e formulou, por conseguinte, questões muito

19 FREUD, Sigmund. Estudos sobre a histeria; Breuer e Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1974. p.107. (Edição
standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 2.)
20 JONES, Ernest. A vida e a obra de Sigmund Freud; volume 1: Os anos de formação e as grandes

descobertas (1856-1900). Rio de Janeiro: Imago, 1989. p.248.


21 Cf. FREUD, Sigmund. Hereditariedade e a etiologia das neuroses. In: _______. Primeiras publicações

psicanalíticas. Rio de Janeiro: Imago, 1976. p.174. (Edição standard brasileira das obras psicológicas
completas de Sigmund Freud; 3.).
36
diferentes daquelas que as demais escolas procuraram responder. A psicanálise, enfim, é
uma outra história...

Conceitos fundamentais

[372] Por quatro vezes, pelos menos, Freud enumerou os conceitos fundamentais da teoria
psicanalítica (cf. DVE, 300; EA, 54; P, 305; SP, 268). Elaboradas em momentos distintos,
as listas nem sempre são exatamente as mesmas. Duas noções, contudo, sobressaem: os
conceitos de inconsciente e sexualidade. Talvez, se possa dizer que as duas principais
descobertas de Freud são as seguintes: que o psiquismo é dividido pelo mecanismo do
recalque, havendo, portanto, processos mentais inconscientes; e que a sexualidade,
presente desde a infância, desempenha um papel de primeira grandeza na psicologia
humana e, em particular, na etiologia das neuroses.

Bloco do inconsciente

[373] A especificidade do inconsciente freudiano está em que ele é o produto do conflito


psíquico e do mecanismo do recalque. O conceito de recalque é a “pedra angular” da
psicanálise (cf. BDP, 245; EA, 43; HMP, 26). O recalque é a operação que expulsa da
consciência, impelindo para o inconsciente, o material patogênico. A resistência, por sua
vez, é aquilo que deve ser superado para que o conteúdo inconsciente seja trazido à tona.
[374] Freud sondou o inconsciente a partir das suas produções. As formações do
inconsciente podem ser subdivididas em quatro grupos: sintomas, sonhos, parapraxias e
chistes. Nos primórdios da psicanálise, Freud se ocupou sucessivamente desses
fenômenos. Já em 1895, em parceria com Breuer, debruçou-se sobre o sintoma histérico
em “Estudos sobre a histeria”. Em seguida, publicou: “A interpretação de sonhos” (1900),
“A psicopatologia da vida cotidiana” (1901) e “Os chistes e sua relação com o inconsciente”
(1905).
[375] As formações do inconsciente são soluções de compromisso entre o desejo e a
censura. Tomemos, por exemplo, os sonhos, pelos quais Freud tinha um apreço especial.
Os sonhos, segundo ele, são realizações disfarçadas de desejos recalcados. Realizações,
sim; mas, disfarçadas... Desejo e censura, portanto. Conflito psíquico em ação.
[376] Qual descobridor do “sexto continente”, tendo se aventurado na exploração das
porções mais recônditas do inconsciente, Freud ofereceu, por duas vezes, um mapa do
aparelho psíquico humano. Em sua primeira descrição da mente, ele a subdividiu em três
sistemas: consciente, pré-consciente e inconsciente.
[377] Em seu segundo mapeamento do psiquismo – a chamada “segunda tópica” –, Freud
identificou outros três sistemas: o isso (id), o eu (ego) e o supereu (superego). O isso é a
parte mais antiga do aparelho psíquico, é a matriz a partir da qual os outros dois sistemas
se constituem. Ele contém tudo o que é herdado, o inato, nomeadamente, as pulsões, das
quais é a sede, constituindo-se, desse modo, no reservatório primário de toda a energia
psíquica. O eu, por sua vez, desenvolve-se a partir do isso pelo contato com a realidade
externa. Ele tem por funções garantir a autopreservação e atender às exigências pulsionais
do isso levando em consideração as condições objetivas do meio ambiente. Para tanto, o eu
dispõe do controle sobre os processos mentais superiores e o movimento voluntário. Por
fim, o supereu, o último sistema psíquico a se desenvolver, diferencia-se a partir do eu. A
sua formação se dá em decorrência da introjeção das normas e valores sociais por meio da
identificação da criança à autoridade externa. Herdeiro da tradição, guardião da moral e
depósito dos ideais culturais, o supereu atua como uma espécie de censor das atividades do
eu. O isso é inteiramente inconsciente; o supereu, grandemente inconsciente; o eu, em
parte, inconsciente.

37
Bloco da sexualidade

[378] Além do inconsciente, outro fator da psicologia humana que a psicanálise encarece é
a sexualidade. De acordo com Freud, os impulsos sexuais desempenham um “enorme
papel” na vida mental dos seres humanos (cf. BDP, 246).
[379] Mais especificamente, em se perguntando sobre as causas das doenças nervosas, a
psicanálise concluiu que “...a origem das forças impulsionadoras da neurose está na vida
sexual” (HMP, 22). Diz Freud: “Aprendi então por experiência própria, a qual aumentava
rapidamente, que não era qualquer espécie de excitação emocional que estava em ação por
trás dos fenômenos da neurose, mas habitualmente uma excitação de natureza sexual...”
(EA, 36).
[380] Freud, porém, quando fala em “sexualidade”, confere a essa palavra um sentido
extenso. Sexual, para a psicanálise, não significa genital; sexual tampouco quer dizer
reprodutivo; a meta da sexualidade, segundo Freud, é o prazer, não a procriação.
[381] A concepção freudiana de sexualidade é ampliada temporal e espacialmente. No
espaço – na medida em que se espraia pelo corpo humano, para além dos órgãos genitais,
concentrando-se, em particular nas zonas erógenas: a boca, o ânus e outras superfícies
sensoriais. No tempo – na medida em que recua até a primeira infância, para aquém da
puberdade, não se podendo mais sustentar o mito da pureza infantil. Em suma, a
concepção freudiana de sexualidade é aquela suficientemente ampla para incluir as
sexualidades do perverso e da criança.
[382] Aos olhos de Freud, a infância é um período da vida humana que se reveste da maior
importância, pois muita coisa se decide aí. Os fatos e as impressões da tenra infância têm
um papel “importantíssimo”, “nunca [antes] imaginado”, no desenvolvimento humano (cf.
CLP, 34). Para dizê-lo com o poeta inglês William Wordsworth (1770-1850): “The child is
father of the man” [“A criança é o pai do homem”]. Mais do que uma pressuposição, esse
apreço pela infância é algo que se impôs a Freud. Em sua pesquisa das causas do
adoecimento psíquico, ele relata: “Fomos puxados cada vez mais para o passado;
esperávamos poder parar na puberdade [...]. Mas em vão; as pistas conduziam ainda mais
para trás, à infância e aos seus primeiros anos” (HMP, 27). A psicanálise tem, pois, uma
orientação arqueológica, regressiva, voltada para o passado.
[383] Em se debruçando sobre a sexualidade infantil, Freud constatou que há um longo
percurso – repleto de armadilhas – a ser percorrido desde o nascimento até a idade adulta.
A evolução psicossexual atravessa fases sucessivas: oral, anal e fálica – onde tem lugar o
complexo de Édipo –. Neste, a criança toma o progenitor do sexo oposto como objeto
amoroso e estabelece uma relação de rivalidade com o progenitor do próprio sexo.
Seguem-se o período de latência e a fase genital.
[384] A sexualidade não é, porém, a única força em ação no psiquismo humano. Se tudo
fosse sexual, não haveria conflito e tampouco inconsciente. Ao longo da sua carreira, Freud
elaborou três teorias do dualismo pulsional. A primeira, formulada em “A concepção
psicanalítica da perturbação psicogênica da visão” (1910), estabelece uma oposição entre as
pulsões do eu (autoconservação) e as pulsões sexuais (libidinais). A segunda, concebida em
“Sobre o narcisismo: uma introdução” (1914), sugere um antagonismo entre a libido
narcísica e a libido objetal. Por fim, a terceira, estabelecida em “Além do princípio de
prazer” (1920), propõe um conflito entre as pulsões de vida (Eros) e as pulsões de morte
(Tanatos).
[385] As pulsões de vida têm por meta unir, estabelecer agrupamentos cada vez mais
vastos e preservá-los. A libido é a energia das pulsões de vida. Já as pulsões de morte têm
por objetivo fragmentar, desfazer conexões, destruir. Em princípio, elas operam
internamente, em silêncio, até que, inexoravelmente, alcancem a sua meta: fazer todo
organismo vivo retornar ao estado inorgânico. Quando, porém, as pulsões de morte são
externalizadas, elas se manifestam como agressividade.

38
[386] Uma série de fenômenos clínicos levou Freud a formular o conceito de pulsões de
morte, entre eles: a compulsão à repetição, a neurose transferencial, a neurose de guerra, a
neurose de destino, o sadismo, o masoquismo, a ambivalência afetiva, a transferência
negativa, a resistência à cura, o sentimento de culpa, a melancolia etc.

Conclusão

[387] Para concluir, quatro afirmações sobre a psicanálise, todas elas decorrentes daquele
que é o seu conceito fundamental: o inconsciente.
[388] A psicanálise é a arte da suspeita: as coisas raramente são o que parecem ser.
[389] A psicanálise é a ciência do avesso; ela sempre se interessa pelo outro lado das
coisas.
[390] A psicanálise, escreveu Freud, “...traz à tona o que há de pior nas pessoas” (HMP,
51).
[391] A psicanálise, por fim, incomoda. Certa vez, Freud se descreveu como um daqueles
que “perturbaram o sono do mundo” (HMP, 32). Ele também declarou: “...provocar
oposição e despertar rancor é o destino inevitável da psicanálise...” (HMP, 17).

Tabela de siglas

ALEP FREUD, Sigmund. Algumas lições elementares de psicanálise. In: _______. Moisés e o
monoteísmo, Esboço de psicanálise e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1975. p.313-321.
(Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 23.)
BDP FREUD, Sigmund. Uma breve descrição da psicanálise. In: _______. O ego e o id e outros
trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1976. p.235-260. (Edição standard brasileira das obras
psicológicas completas de Sigmund Freud; 19.)
CIP FREUD, Sigmund. Conferências introdutórias sobre psicanálise; parte III. Rio de Janeiro: Imago,
1976. p.287-574. (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud;
16.)
CLP FREUD, Sigmund. Cinco lições de psicanálise. In: _______. Cinco lições de psicanálise,
Leonardo da Vinci e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1970. p.3-52. (Edição standard
brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 11.)
DVE FREUD, Sigmund. Dois verbetes de enciclopédia. In: _______. Além do princípio de prazer,
Psicologia de grupo e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1976. p.283-312. (Edição standard
brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 18.)
EA FREUD, Sigmund. Um estudo autobiográfico. In: _______. Um estudo autobiográfico, Inibições,
sintomas e ansiedade, A questão da análise leiga e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1976.
p.13-92. (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 20.)
EP FREUD, Sigmund. Esboço de psicanálise. In: _______. Moisés e o monoteísmo, Esboço de
psicanálise e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1975. p.163-238. (Edição standard
brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 23.)
HMP FREUD, Sigmund. A história do movimento psicanalítico. In: _______. A história do movimento
psicanalítico, Artigos sobre metapsicologia e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1974. p.11-
82. (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 14.)
NCIP FREUD, Sigmund. Novas conferências introdutórias sobre psicanálise. In: _______. Novas
conferências introdutórias sobre psicanálise e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1976. p.11-
220. (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 22.)
P FREUD, Sigmund. Psicanálise. In: _______. Um estudo autobiográfico, Inibições, sintomas e
ansiedade, A questão da análise leiga e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1976. p.295-309.
(Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 20.)
QAL FREUD, Sigmund. A questão da análise leiga. In: _______. Um estudo autobiográfico, Inibições,
sintomas e ansiedade, A questão da análise leiga e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1976.
p.203-293. (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 20.)
SP FREUD, Sigmund. Sobre a psicanálise. In: _______. O caso de Schreber, Artigos sobre técnica e
outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, s.d.. p.261-270. (Edição standard brasileira das obras
psicológicas completas de Sigmund Freud; 12.)

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Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio)
Centro de Teologia e Ciências Humanas (CTCH)
Departamento de Psicologia

PSI 1100: História da Psicologia Moderna


Prof. Ricardo Torri de Araújo

Unidade III
As grandes escolas de psicologia

9 - A psicologia humanista:

[392] A psicologia humanista surgiu nos Estados Unidos da América em meados do século
passado, tendo desfrutado de enorme popularidade nas décadas de 1960 e 1970.
[393] A expressão “psicologia humanista” foi consagrada pela criação, em 1961, do
periódico Journal of humanistic psychology [Revista de psicologia humanista].
[394] A psicologia humanista é chamada de a “terceira força” em psicologia, constituindo-
se o behaviorismo e a psicanálise nas outras duas.
[395] Como o seu nome já o sugere, a psicologia humanista caracteriza-se por fazer da
pessoa humana o centro das suas atenções. Mais do que isso, a abordagem humanista em
psicologia distingue-se por não concordar com os retratos desumanizados do ser humano
oferecidos pelo behaviorismo e pela psicanálise. O homem não é apenas um animal ou uma
máquina! Tampouco é uma criatura perversa e destrutiva! – protestam os psicólogos
humanistas.
[396] A psicologia humanista não se constitui num sistema unitário, mas numa coleção de
várias abordagens afins. Entre os seus representantes, pode-se mencionar: Kurt Goldstein
(1878-1965), Ludwig Binswanger (1881-1966), Kurt Lewin (1892-1947), Friedrich Perls
(1893-1970), Gordon Allport (1897-1967), Carl Rogers (1902-1987), Viktor Frankl (1905-
1997), Abraham Maslow (1908-1970) e Rollo May (1909-1994). É possível citar também,
como precursores, vários dos neofreudianos revisionistas, tais como: Alfred Adler (1870-
1937), Carl Gustav Jung (1875-1961), Otto Rank (1884-1939), Karen Horney (1885-1952),
Erich Fromm (1900-1980) e Erik Erikson (1902-1994).
[397] A principal característica da psicologia humanista é a sua visão positiva da natureza
humana. O ser humano é bom e digno de confiança – eis o pressuposto fundamental da
abordagem humanista em psicologia.
[398] O humanismo observa que, historicamente, a psicologia focalizou muito mais os
aspectos mórbidos da vida mental do que o seu funcionamento saudável. Considera, pois,
necessário mudar de foco. A saúde, não a doença; o indivíduo plenamente realizado, não o
enfermo; os aspectos mais nobres do homem, não as suas debilidades – eis o que a
psicologia humanista enfatiza.
[399] Para o humanismo, a pessoa humana é concebida como fundamentalmente livre. O
indivíduo não é controlado pelo condicionamento nem determinado pelo inconsciente. O
homem é livre!
[400] A abordagem humanista em psicologia foi grandemente influenciada pela psicologia
da Gestalt, tendo, assim, uma orientação holística, não atomista. Trata-se, pois, no
humanismo, do homem total, da pessoa humana em sua totalidade.
[401] Os psicólogos humanistas costumam reconhecer a tendência para a individuação –
autorrealização ou autoatualização – como o fator motivacional fundamental.
[402] Outra ênfase distintiva dessa orientação em psicologia reside na maior importância
concedida ao presente do que ao passado. Para o psicólogo humanista, o indivíduo vive no

40
presente, na esperança de uma realização mais plena no futuro. A psicologia humanista
privilegia, pois, o “aqui e agora”, não a história de vida pretérita.
[403] Também a vida mental consciente recebe mais atenção do que a inconsciente.
Embora não negue a existência do inconsciente, a psicologia humanista privilegia a
experiência banhada pela luz da consciência. Supõe-se que o indivíduo é
fundamentalmente um ser consciente, capaz de tomar consciência de todos os fenômenos
que ocorrem em seu psiquismo.
[404] Por fim, a fim de concluirmos essa caracterização geral da psicologia humanista, vale
acrescentar que a sua abordagem é idiográfica, não nomotética; ou seja, o humanismo
considera a pessoa em sua unicidade, ao invés tomá-la genericamente.
[405] O sobredito nos permite traçar este quadro:

O ser humano é bom, não é mau.


A saúde, não a doença.
Liberdade, não determinismo.
Holismo, não atomismo.
O presente, não o passado.
A consciência, não o inconsciente.
Abordagem idiográfica, não nomotética.

a) A terapia centrada no cliente de Rogers:


“Se eu deixar de me impor às pessoas,
elas se tornam elas mesmas” (Lao-Tsé).

“Gosto de viver e deixar que vivam” (Rogers).

[406] Carl Ransom Rogers (1902-1987) é um dos


fundadores da psicologia humanista.
[407] Antes de desenvolver a própria abordagem em
psicologia, Rogers foi influenciado, ao longo da sua
formação, tanto pelo behaviorismo quanto pela
psicanálise.
[408] Estudou na Universidade de Wisconsin, no
Union Theological Seminary e no Teachers College da
Universidade de Columbia.
[409] Como psicoterapeuta, trabalhou no Instituto de
Orientação Infantil, no Centro de Orientação
Rochester – ambos em Nova Iorque –, no Centro de
Aconselhamento da Universidade de Chicago e no
Centro de Estudos da Pessoa, em La Jolla, na
Califórnia.
[410] Lecionou em diversas universidades: foi
professor da Universidade de Columbia, da
Universidade de Rochester, da Universidade Estadual
de Ohio, da Universidade de Chicago, da Universidade
de Wisconsin e da Universidade Internacional dos Estados Unidos, em San Diego, na
Califórnia. Foi também professor-visitante em renomadas universidades estadunidenses.
[411] Foi presidente da American Psychological Association (APA) de 1946 a 1947. Duas
décadas mais tarde, em 1977, esteve no Brasil, visitando a cidade de São Paulo.
[412] Entre os principais livros de Rogers, estão: “O tratamento clínico da criança-
problema” (1939), “Aconselhamento e psicoterapia” (1942), “Terapia centrada no cliente”
(1951), “Tornar-se pessoa” (1961), “Psicoterapia e relações humanas” (1962) – em
41
colaboração com G. Marian Kinget –, “O relacionamento terapêutico e o seu impacto: um
estudo da psicoterapia com esquizofrênicos” (1967) – em colaboração com E. T. Gendlin,
D. J. Kiesler e C. B. Truax –, “O homem e a ciência do homem” (1968) – em colaboração
com William R. Coulson –, “Liberdade para aprender” (1969), “Grupos de encontro”
(1970), “Novas formas de amor” (1972), “A pessoa como centro” – em colaboração com
Rachel L. Rosenberg –, “Sobre o poder pessoal” (1977) e “Um modo de ser” (1980).
[413] O pensamento de Rogers pode ser dividido em duas partes: uma teoria da
personalidade e uma teoria da psicoterapia. Comecemos pela primeira.
[414] O organismo, o self, a tendência realizadora – que inclui a tendência para a
autorrealização – e a necessidade de consideração positiva são os elementos fundamentais
da teoria rogeriana da personalidade.
[415] O organismo é o locus de toda experiência subjetiva. A experiência inclui tudo o que
acontece dentro do organismo e que pode se tornar consciente. O campo fenomenal
compreende a totalidade da experiência. O campo fenomenal não é, porém, idêntico ao
campo da consciência. A consciência abarca aquelas experiências que são simbolizadas. O
campo fenomenal compreende, pois, experiências conscientes (simbolizadas) e
inconscientes (não-simbolizadas). O organismo pode discriminar e reagir a uma
experiência inconsciente (não-simbolizada) por meio do mecanismo da subcepção.
[416] O self é uma porção diferenciada do campo fenomenal. O self é a ideia ou a imagem
que o indivíduo faz de si mesmo – o autoconceito ou a autoimagem. O self regula o
comportamento: o indivíduo tende a comportar-se em conformidade com o seu self. Pode-
se distinguir entre o self propriamente dito e o self ideal: o self é aquilo que a pessoa
considera ser; o self ideal, por sua vez, o que ela gostaria de ser.
[417] A tendência realizadora é a motivação fundamental do organismo. É a tendência que
o organismo tem de expandir-se, estender-se, diferenciar-se, enriquecer-se, aperfeiçoar-se.
É a tendência que leva o organismo ao crescimento, à atualização, ao amadurecimento, à
realização, ao desenvolvimento. Trata-se de uma tendência direcional positiva para
avançar, ir para frente. Trata-se de uma tendência para a realização de todas as
capacidades, potencialidades, talentos, habilidades e virtualidades do organismo. Trata-se,
enfim, da tendência que o organismo tem de concretizar a sua natureza: vir a ser o que ele
pode ser.
[418] A tendência realizadora tem uma base biológica; é uma tendência inata, inerente a
todo processo de crescimento orgânico. A tendência realizadora não é, porém, irresistível.
Longe disso, ela depende de condições favoráveis para prevalecer; trata-se de um impulso
que facilmente pode ser abafado.
[419] A tendência para a autorrealização, por sua vez, é uma expressão particular da
tendência realizadora. Trata-se da tendência para realizar aqueles aspectos da experiência
que são simbolizados como parte do self. A tendência para a autorrealização é, assim, a
tendência de realizar o self.
[420] Por fim, a necessidade de consideração positiva é uma necessidade inata, universal.
De fato, todos nós temos necessidade de ser amados pelos outros, sobretudo, por certas
pessoas, especialmente significativas, as pessoas-critério.
[421] Postas as peças no tabuleiro, temos, então, duas possibilidades fundamentais: a
congruência e a incongruência.
[422] Congruência. Quando as condições são favoráveis, isto é, quando a pessoa é
considerada positivamente de forma incondicional por parte das pessoas significativas
para ela, não há condições de valor; o indivíduo é amado como é. Então: o organismo faz
uma experiência  procede a uma autoavaliação dessa experiência  aceita a experiência
feita  simboliza corretamente a experiência  a experiência é conscientizada  a
experiência é incorporada à Gestalt do self da pessoa  estabelece-se uma congruência
entre o organismo e o self, a experiência e o autoconceito  a tendência realizadora e a

42
tendência para a autorrealização operam em harmonia. Esse é o modelo da saúde psíquica.
A pessoa é ela mesma.
[423] Incongruência. Quando as condições são desfavoráveis, isto é, quando o indivíduo se
depara com a consideração positiva condicional por parte de pessoas significativas para
ele, o indivíduo introjeta no próprio self as condições de valor ditadas pelos outros. Então:
o organismo faz uma experiência  avalia a experiência a partir das condições de valor
introjetadas  experimenta algumas experiências (aquelas que estão em contradição com
o autoconceito) como uma ameaça ao próprio self  sente ansiedade  defende-se 
negando a experiência, isto é, não a simbolizando  ou distorcendo a experiência, isto é,
deformando-a  a experiência não é conscientizada  a experiência não é assimilada à
Gestalt do self da pessoa, mas é excluída  estabelece-se uma incongruência entre o
organismo e o self, a experiência e o autoconceito  a tendência realizadora e a tendência
para autorrealização ficam dissociadas. Esse é o quadro do adoecimento psíquico, o
modelo de toda patologia psicológica. A pessoa tenta ser o que as outras pessoas gostariam
que ela fosse.
[424] A incongruência pode estar entre a experiência e a conscientização ou entre a
conscientização e a comunicação. No primeiro caso, a incongruência decorre da repressão;
no segundo, da inautenticidade.
[425] Pode-se também falar em congruência e incongruência entre o self e o self ideal. A
congruência entre o self e o self ideal traduz-se em alta autoestima: “eu sou o que gostaria
de ser”. A incongruência entre o self e o self ideal traduz-se em baixa autoestima: “eu não
sou o que gostaria de ser”.
[426] Relações precoces – frequentemente, com os pais – podem fomentar a
incongruência. Mas relacionamentos posteriores – com um psicoterapeuta, por exemplo –
podem restaurar a congruência. Passemos, pois, ao segundo bloco do pensamento
rogeriano: a sua teoria da psicoterapia.
[427] A terapia rogeriana é chamada de terapia “não-diretiva”, “centrada no cliente” ou “de
pessoa para pessoa”.
[428] Ela é não-diretiva porque o terapeuta não dirige o cliente; é o próprio cliente quem
dirige o tratamento.
[429] Ela é centrada no cliente – e não no terapeuta –, na medida em que se acredita que o
cliente é o principal responsável pela própria recuperação. Por isso mesmo, ele é chamado
de “cliente”, não de “paciente”.
[430] Ela é de pessoa para pessoa porque se trata de um relacionamento pessoal. A
psicoterapia, segundo Rogers, é apenas um caso de relação interpessoal construtiva.
[431] O objetivo da terapia é proporcionar ao cliente um estado de congruência entre o seu
self e as suas experiências organísmicas.
[432] A função do terapeuta, por sua vez, é criar uma atmosfera propícia ao pleno
desenvolvimento das potencialidades do cliente.
[433] Para tanto, Rogers não preconiza técnicas, mas atitudes terapêuticas. A saber: a
congruência, a consideração positiva incondicional e a compreensão empática.
[434] O terapeuta deve ser congruente: isto é, aquilo que o terapeuta experimenta em seu
organismo deve estar claramente presente em sua consciência e disponível para ser
comunicado ao cliente quando for conveniente. O terapeuta não deve se esconder por trás
da máscara de psicólogo profissional, mas ser autêntico, genuíno, transparente, natural,
verdadeiro. Nessa medida, o terapeuta funciona como um modelo de pessoa saudável para
o cliente.
[435] O terapeuta deve tratar o cliente com consideração positiva incondicional: ou seja,
deve acolhê-lo sem nenhuma condição de valor; deve aceitá-lo como é. Tratado dessa
maneira, o cliente sente-se encorajado a revelar-se por inteiro e a explorar porções ainda
não assimiladas de si mesmo.

43
[436] O terapeuta deve compreender o cliente empaticamente: isto é, deve colocar-se no
lugar do cliente e ver o mundo com os olhos dele; deve entrar no campo experiencial do
cliente e sentir em si mesmo o que ele sente. Mais do que isso, o terapeuta deve tentar
captar mesmo aquilo de que o cliente não está de todo consciente, mas que está no limiar
da sua consciência. E, tendo compreendido o cliente dessa maneira, deve comunicar a ele
essa compreensão.
[437] Essas três atitudes terapêuticas concorrem para que o cliente alcance um estado de
congruência, saúde mental e crescimento psicológico.
[438] A pessoa madura, em estado de funcionamento ótimo, pode ser assim caracterizada:
total abertura à experiência, autoavaliação das próprias experiências, atitude não-
defensiva, congruência entre o self e o organismo, self em estado contínuo de mudança,
autoaceitação e, consequentemente, aceitação dos outros, capacidade de estabelecer
relações profundas, compromisso com o presente e criatividade.
[439] Rogers atuou como terapeuta durante toda a sua carreira profissional. As teorias
rogerianas da personalidade e da psicoterapia baseiam-se em milhares de horas de
observações clínicas. Embora não tenha sido um psicólogo experimental, Rogers
empenhou-se em demonstrar cientificamente a eficácia da sua abordagem terapêutica.
Procedeu a gravações sistemáticas de terapias completas por meio do registro sonoro das
mesmas, de transcrições integrais das sessões e mesmo da documentação cinematográfica.
Comparou os clientes que estavam em tratamento com um grupo de controle constituído
por pessoas que estavam em listas de espera. E conseguiu demonstrar que a terapia
centrada no cliente promovia mudanças positivas mensuráveis nas vidas das pessoas. Em
suma, como toda a psicologia humanista, a psicologia de Rogers não é uma psicologia de
laboratório, mas se pretende empiricamente fundada.
[440] A abordagem centrada na pessoa revelou-se aplicável a várias outras atividades além
da psicoterapia. Por exemplo, à educação. Em “Liberdade para aprender” (1969), Rogers
preconizou um novo método de ensino e aprendizagem: um método não-diretivo, centrado
no aluno; uma aprendizagem ativa, participada, criativa, espontânea, responsável e
personalizada.
[441] Todas as pessoas têm o desejo e a capacidade de aprender. Tudo o que cada um
necessita é de condições favoráveis. O professor é, portanto, apenas um facilitador do
processo. A sua função é criar um ambiente propício. A ele, cabe colocar à disposição dos
alunos recursos de aprendizagem, entre os quais os estudantes fariam as suas escolhas.
Tendo cercado os alunos de oportunidades, cabe ao professor dar-lhes liberdade,
encorajando-os a serem criativos. É preciso, pois, permitir aos estudantes aprofundarem o
que quiserem, segundo os seus interesses e no seu próprio ritmo. Segundo Rogers, o
professor deve abrir mão de todo mecanismo de coação. Ao invés de os alunos serem
avaliados pelo professor, os próprios estudantes avaliariam o seu rendimento.

b) A teoria da autorrealização de Maslow:


“O que um homem pode ser,
ele deve ser” (Maslow).

[442] Ao lado de Rogers, Abraham Harold Maslow (1908-1970) é um dos “pais” da


psicologia humanista.
[443] Ao longo da sua formação em psicologia, ele teve contato com o estruturalismo, o
behaviorismo, a psicanálise e a psicologia da Gestalt.
[444] Lecionou psicologia no Brooklin College, em Nova Iorque, na Universidade de
Brandeis, em Massachusetts, e na Fundação Laughlin, na Califórnia. De 1967 a 1968, foi
presidente da American Psychological Association (APA).
[445] As suas principais obras são: “Motivação e personalidade” (1954/1970), “Religiões,
valores e experiências-pico” (1964), “Introdução à psicologia do ser” (1968) e “Os grandes
feitos da natureza humana” (1971).
44
[446] Segundo Maslow, o ser humano é movido
por necessidades. Estas, por sua vez, estão
hierarquicamente organizadas. Nesta ordem: [1]
necessidades fisiológicas, [2] necessidades de
segurança, [3] necessidades de amor e pertença, [4]
necessidades de estima e, por fim, [5] necessidades
de autorrealização.
[447] A hierarquia das necessidades de Maslow
está ordenada em grau decrescente de controle
instintóide e de prepotência.
[448] As quatro primeiras necessidades são
deficitárias: são acionadas por uma carência. A
necessidade de autorrealização é de outra ordem:
ela não pretende suprir um déficit, mas almeja o
crescimento.
[449] A gratificação das necessidades tende a
acontecer de uma maneira progressiva, uma após a
outra, na ordem acima estabelecida.
[450] Quanto mais degraus na hierarquia das
necessidades uma pessoa subir, maior o seu grau de saúde psicológica e humanização.
[451] No topo da pirâmide de Maslow, está a tendência para a autorrealização. Trata-se de
uma propensão inata, de tipo instintóide. Trata-se do motivo soberano da psicologia
humana. Trata-se, enfim, da tendência que o indivíduo tem de crescer, desenvolver-se e
realizar plenamente o seu potencial.
[452] Maslow interessou-se pelo estudo da personalidade das pessoas maduras, chamadas
“autorrealizadoras”. Segundo ele, até o surgimento do humanismo, a psicologia –
nomeadamente, a psicanálise – havia focalizado mais a enfermidade do que a saúde
mental. Freud havia, por assim dizer, fornecido a metade negativa da psicologia; tratava-
se, agora, de voltar-se para o outro lado. Foi o que Maslow se propôs a fazer: uma
psicologia da saúde.
[453] Maslow traçou o perfil psicológico das pessoas autorrealizadoras: percebem a
realidade de modo objetivo; têm um profundo conhecimento de si mesmas e se acolhem
como são; dedicam-se a algum trabalho particular; são produtivas; no trato com os outros,
são simples, naturais e espontâneas; cultivam relacionamentos profundos; são afetuosas;
são autônomas e independentes; apreciam a privacidade; amam a espécie humana; não
são conformistas; são democráticas; têm grande interesse social; são altamente éticas; são
criativas; e têm experiências-pico intensas.
[454] Desfrutar frequente e profundamente de experiências-pico é uma das características
das pessoas autorrealizadoras. Maslow interessou-se por esse fenômeno de uma forma
particular. Uma experiência culminante é a experiência suprema que um ser humano pode
fazer. Via de regra, é fugaz. Costuma ser acompanhada da sensação de êxtase e plena
realização. Por um momento, a pessoa transcende o seu self e sente-se em perfeita
harmonia consigo mesma, com os outros e com o todo circundante. A localização da pessoa
no tempo e no espaço se perde. A experiência pode ser desencadeada pela contemplação de
alguma beleza natural, pela exposição a uma obra de arte, pela audição de uma música ou
por uma experiência amorosa. Pode ou não ter um caráter religioso.
[455] O humanismo trouxe uma grande contribuição para o campo da psicologia. A
chamada “psicologia positiva” é um movimento nascido na década de 1990 que tem dado
continuidade à abordagem humanista, privilegiando o estudo dos aspectos positivos da
personalidade humana.

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Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio)
Centro de Teologia e Ciências Humanas (CTCH)
Departamento de Psicologia

PSI 1100: História da Psicologia Moderna


Prof. Ricardo Torri de Araújo

Unidade III
As grandes escolas de psicologia

10 - A psicologia cognitiva:

[456] A psicologia cognitiva surgiu nos Estados


Unidos da América em meados do século passado,
constituindo-se, atualmente, no modelo
dominante em psicologia experimental.
[457] Quando o cognitivismo surgiu, as duas
escolas mais influentes em psicologia eram o
behaviorismo e a psicanálise. A psicologia
cognitiva insurgiu-se particularmente contra o
behaviorismo, que dominava o campo da
psicologia experimental desde os anos 1930. Ulric
Neisser (1928-2012) reivindicou para o
cognitivismo o título de “terceira força” em
psicologia.
[458] É difícil identificar o fundador e a data de
fundação da psicologia cognitiva. Uma possível
data de fundação é o dia 11 de setembro de 1956.
Nesse dia, no Massachusetts Institute of
Technology (MIT), houve um simpósio de teoria
da informação onde aconteceram, entre outras, as
conferências de George Miller (1920-2012) sobre
a memória de curto prazo e de Noam Chomsky
(1928- ) sobre a linguagem. Outra data
significativa é a publicação, em 1967, por Neisser,
de “Psicologia cognitiva”, livro que se constitui
numa primeira grande síntese da pesquisa de
laboratório do cognitivismo e que deu nome ao movimento. Miller e Neisser são lembrados
como fundadores.
[459] A psicologia cognitiva combina aspectos do funcionalismo, da psicologia da Gestalt e
mesmo do behaviorismo.
[460] O cognitivismo tem também mostrado interesse pelas atividades cognitivas
inconscientes. O inconsciente da psicologia cognitiva, porém, nada tem a ver com o
inconsciente freudiano.
[461] Vários autores que antecederam o surgimento do behaviorismo – ou que não foram
devidamente reconhecidos nos Estados Unidos enquanto durou a hegemonia da psicologia
comportamental – têm sido redescobertos e revalorizados pelo cognitivismo. Por exemplo:
Wilhelm Wundt (1832-1920), Franz Brentano (1838-1917), William James (1842-1910),
Carl Stumpf (1848-1936), Hermann Ebbinghaus (1850-1909), Alfred Binet (1857-1911),
Oswald Külpe (1862-1915), Edward Tolman (1886-1959) e Jean Piaget (1896-1980).

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[462] A principal característica da psicologia cognitiva é o retorno ao estudo dos processos
mentais. O behaviorismo expulsou a mente, a consciência e a cognição do campo da
psicologia. Passadas, porém, algumas décadas, com o cognitivismo, a psicologia readmitiu
o que fora banido. A mente está de volta! – eis o grito de guerra da revolução cognitiva.
[463] Um dos slogans de B. F. Skinner (1904-1990) era: Neither mind, nor neurons [Nem
a mente, nem os neurônios]. A psicologia cognitiva contemporânea e a neurociência têm se
interessado justamente pela mente e pelos neurônios.

[464] O cognitivismo elegeu o computador –


particularmente, o programa do computador
(software), não o computador em si (hardware) –
como metáfora para pensar o funcionamento da
mente humana. O computador é essencialmente um
dispositivo que recebe informações do ambiente,
processa-as internamente e gera um produto. A
cognição seria comparável a esse tratamento da
informação. Input, output, processamento,
armazenamento – eis alguns dos termos usados
metaforicamente pelos psicólogos cognitivos para
descrever os fenômenos mentais. O cognitivismo
pode, assim, ser qualificado de “computacionismo”.
[465] A psicologia cognitiva estuda
preferencialmente pessoas humanas, mas não
descarta o estudo da psicologia dos animais
inferiores. Para o cognitivismo, os animais são
dotados de consciência, têm personalidade e
desempenham uma série de funções cognitivas.
[466] Entre os temas estudados pela psicologia
cognitiva, estão: a sensação, a percepção, a atenção,
a formação de imagens, o pensamento, a solução de
problemas, a memória, a retenção, a recordação, a
linguagem, a psicologia do desenvolvimento etc.
[467] Enfim, o cognitivismo tem se configurado
como uma grande síntese do vasto campo da psicologia – sobretudo, em sua tradição
experimental. O voluntarismo, o estruturalismo, o funcionalismo e o gestaltismo
interessaram-se pelos processos mentais; o behaviorismo, pelo comportamento; a
psicologia cognitiva, por sua vez, tem se interessado pelos processos mentais e pelo
comportamento. O cognitivismo parece, pois, fazer uma síntese de boa parte das escolas de
psicologia que o precederam.

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