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HISTÓRIA DA
PSICOLOGIA
MODERNA
RIO DE JANEIRO – RJ
2º SEMESTRE DE 2021
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio)
Centro de Teologia e Ciências Humanas (CTCH)
Departamento de Psicologia
Unidade I
Introdução à psicologia
I.1 - A psicologia:
1
[13] O que dizer da relação entre o psicólogo, o psicanalista e o psiquiatra? Todos os três
podem trabalhar no campo da saúde mental diagnosticando e tratando de pessoas com
problemas psicológicos de gravidade variável. Mas há, entre eles, algumas diferenças
importantes.
[14] O psicólogo tem uma formação universitária em psicologia; o psicanalista é formado
em associações de psicanálise independentes do meio universitário; o psiquiatra forma-se
em medicina, especializando-se no tratamento de doenças mentais.
[15] O psicólogo estuda os comportamentos humanos, sejam eles normais ou anormais; o
psicanalista e o psiquiatra estão especialmente interessados no comportamento anormal.
[16] Em sua compreensão da enfermidade mental, o psicólogo e o psicanalista costumam
privilegiar elementos da história de vida da pessoa; já a abordagem psiquiátrica tende a
enfatizar elementos orgânicos.
[17] O psiquiatra prescreve medicamentos aos seus pacientes; o psicólogo e o psicanalista
não estão autorizados a fazê-lo.
[18] Acrescente-se, por fim, que a relação da psicanálise para com a psicologia é, ao mesmo
tempo, uma relação de pertença e estranhamento. A psicanálise pode ser encarada como
uma escola da psicologia; mas há quem prefira tomá-la como uma ciência autônoma,
distinta da psicologia, dotada de um objeto próprio, o inconsciente.
[19] A história da psicologia pode ser dividida em dois períodos: a história da psicologia
pré-científica (psicologia filosófica ou filosofia mental) e a história da psicologia científica.
A história da psicologia pré-científica – ou a pré-história filosófica da psicologia científica
– começa no século V a.C.; a história da psicologia científica, no último quartel do século
XIX. Neste curso, vamos tratar apenas do segundo desses dois períodos1.
1Sobre a pré-história filosófica da psicologia científica, pode-se consultar: BRETT, George S. Historia de la
psicología. Buenos Aires: Paidós, 1963. 688p. (Biblioteca de historia de la psicología; 1.); MUELLER,
Fernand-Lucien. História da psicologia; da antigüidade aos nossos dias. São Paulo: Companhia Editora
Nacional, 1968. 444p. (Atualidades pedagógicas; 89.); PENNA, Antonio Gomes. História das idéias
psicológicas. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1981. 152p. (Psyche.); ROBINSON, Daniel N. Historia crítica
de la psicología. Barcelona: Salvat, 1982. 396p.
2
[20] Em se fazendo a história da psicologia, é importante trabalhar numa perspectiva
historicista, evitando, quanto possível, o presentismo. Também chamado “anacronismo”, o
presentismo consiste em julgar o passado com base nos conhecimentos e valores atuais. O
historicismo, por sua vez, procura situar os fatos passados nos contextos históricos em que
aconteceram.
[21] Ao escrever a história da psicologia, há autores que valorizam especialmente o
Zeitgeist, isto é, o espírito do tempo; outros, por sua vez, preferem trabalhar na perspectiva
do “Grande Homem”. Uma história equilibrada é capaz de dar a devida importância tanto
ao ambiente quanto aos indivíduos, sem sobrevalorizar nenhum dos dois.
[22] Como se verá, a história da psicologia é atravessada, “de fio a pavio”, por questões que
parecem eternas. Entre elas: inato versus adquirido, determinismo versus livre arbítrio,
elementarismo versus holismo, ciência pura versus ciência aplicada etc.
[23] Por fim, já que estamos por fazê-lo, cabe a pergunta: “Mas... por que estudar a história
da psicologia?”. Motivos não faltam...
[24] Para aprender com o passado, evitando, talvez, a repetição de erros.
[25] Para compreender o presente.
[26] Para prever, talvez, o futuro.
[27] Porque estudar a história da psicologia oferece uma visão de conjunto do vasto e
variegado campo dessa disciplina.
[28] Porque grande parte das questões de que se trata na história da psicologia conservam
toda a sua atualidade.
[29] Por fim, porque é uma boa estória. Povoada de grandes personagens, repleta de ideias
geniais, marcada por uma série de viradas, atravessada por questões apaixonantes, a
história da psicologia é, de fato, muito interessante. É um prazer – quase um
entretenimento! – ler sobre os 142 anos de existência da psicologia moderna.
3
I.3 - Cronologia geral:
[30] Para se ter uma visão panorâmica da história da psicologia, algumas datas podem ser
indicadas desde já.
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Unidade II
Os primórdios da psicologia
[31] A psicologia tem antecedentes de dois tipos: filosóficos e científicos. Ela foi precedida
pelo tratamento filosófico de questões psicológicas e por pesquisas realizadas em outros
campos da ciência – nomeadamente, pela fisiologia dos órgãos dos sentidos, pela
neurofisiologia e pela psicofísica.
[32] A psicologia é, pois, resultado do encontro entre a filosofia, de um lado, e a fisiologia e
a psicofísica, de outra parte: da filosofia, a psicologia herdou o tema; da fisiologia e da
psicofísica, o método.
a) Weber e Fechner:
5
[41] Fechner começou, assim, as suas pesquisas. Em seguida, tomou conhecimento dos
experimentos de Weber. Fechner, então, aprofundou e formalizou os resultados do
trabalho de Weber.
[42] Fechner transformou a descoberta de Weber numa equação matemática e chamou-a
de “Lei de Weber” – ou “Lei de Weber-Fechner”.
[43] A referida lei pode escrever-se assim: S/S = K, onde: S é o peso de comparação; S, o
peso padrão; e K, uma razão constante. Ou então: DMP/EP = K, onde: DMP é a diferença
mínima perceptível; EP, o estímulo padrão; e K, de novo, uma razão constante.
[44] Fechner elaborou também uma versão logarítmica da fórmula: S = K log R, onde: S é a
magnitude do estímulo percebido; K, uma constante; e R, o valor físico real do estímulo.
[45] Como se vê, a Lei de Weber estabelece uma relação matemática entre um estímulo
físico e a sua sensação psicológica – ou seja, entre os mundos material e psíquico. Há, pois,
uma relação numérica entre o corpo e a mente. Essa é a grande contribuição das pesquisas
de Weber e Fechner para o surgimento da ciência da psicologia.
[46] Além da formulação da Lei de Weber, Fechner fez também uma contribuição
metodológica para o nascimento da psicologia. Ele desenvolveu técnicas precisas de
medição de fenômenos psicológicos: os métodos psicofísicos. Em suma, Fechner
demonstrou ser possível utilizar métodos científicos – procedimentos experimentais e
quantitativos – no estudo de processos mentais.
[47] Em 1860, Fechner publicou o seu principal trabalho: os dois volumes dos “Elementos
de psicofísica”, com a demonstração pioneira do modo de efetuar medições exatas de
acontecimentos psíquicos2.
b) Helmholtz:
2
Freud conhecia e admirava o trabalho de Fechner. Ao longo de sua obra, Freud citou Fechner várias vezes.
Assim, em “Um estudo autobiográfico” (1925), Freud pôde afirmar: “Sempre me mostrei receptivo às ideias
de G. T. Fechner e segui esse pensador em muitos pontos importantes” [FREUD, Sigmund. Um estudo
autobiográfico. In: _______. Um estudo autobiográfico, Inibições, sintomas e ansiedade, A questão da
análise leiga e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1976. p.75. (Edição standard brasileira das obras
psicológicas completas de Sigmund Freud; 20.)]
6
Newton (1643-1727): o vermelho, o verde e o azul. Nos anos 1850, Helmholtz testou
experimentalmente a hipótese de Young.
[54] Realizando estudos sobre a vista e também sobre a audição, Helmholtz aplicou os
métodos experimentais e quantitativos da fisiologia ao estudo dos processos psicológicos
da sensação e da percepção. Com isso, ele demonstrou ser possível tratar de maneira
científica um material psicológico. Essa foi a sua grande contribuição para o surgimento da
psicologia científica3.
(Entendendo.)].
7
[65] Além do laboratório, Wundt também fundou, em 1881, a primeira revista de
psicologia experimental, o periódico: “Estudos filosóficos”. Em 1906, a revista passou a se
chamar: “Estudos psicológicos”.
[66] Fundada por Wundt, a psicologia experimental espalhou-se rapidamente por outras
universidades da Alemanha. As psicologias desenvolvidas nesses outros centros não
tardaram, porém, a ganhar feições próprias, diferindo daquela desenvolvida por Wundt.
[67] Entre os psicólogos alemães contemporâneos de Wundt, pode-se citar: Franz
Brentano (1838-1917), Carl Stumpf (1848-1936), Hermann Ebbinghaus (1850-1909),
Georg Elias Müller (1850-1934) e Oswald Külpe (1862-1915).
[68] Os trabalhos de Ebbinghaus são especialmente “memoráveis”...
5 HOTHERSALL, David. História da psicologia. 4.ed. São Paulo: McGraw-Hill, 2006. p.161.
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Unidade II
Os primórdios da psicologia
[74] Nascida na Alemanha, no final do século XIX, a psicologia emigrou da Europa para os
Estados Unidos da América nas primeiras décadas do século seguinte, instalando aí a sua
principal residência.
[75] A Primeira Guerra Mundial interrompeu a tradição de pesquisa em psicologia iniciada
na Alemanha.
[76] A psicologia alemã sofreu ainda um duro golpe depois que o regime nazista expulsou
do país os psicólogos judeus.
[77] Do outro lado do Atlântico, os Estados Unidos receberam de braços abertos a nova
ciência. James e Hall estiveram justamente entre os primeiros a lhe dar as boas-vindas.
a) James:
9
[85] Em 1892, James publicou uma versão condensada dos “Princípios...”: “Psicologia, um
curso abreviado”, com 478 páginas. Os estudantes de Harvard passaram a se referir aos
monumentais dois volumes como “o James” e à sua versão resumida como “o Jimmy”.
[86] A primeira frase dos “Princípios...” é: “A psicologia é a ciência da vida mental, tanto
em seus fenômenos quanto em suas condições”6.
[87] Segundo James, a psicologia abrange o estudo dos animais, das crianças e também
das pessoas enfermas.
[88] Metodologicamente, James sempre se mostrou um eclético: admitia qualquer método
que pudesse lançar luz sobre a vida mental. Inclusive, a introspecção. Não, porém, o tipo
de introspecção preconizado por Titchener. Para James, a introspecção era algo
espontâneo, natural, não algo que exigisse um treinamento exaustivo e rigoroso.
[89] O capítulo dos “Princípios...” sobre a consciência é um dos mais importantes. Para
James, o objeto da psicologia é a corrente da consciência ou o fluxo do pensamento. A
consciência não é um conjunto de unidades interconectadas, não resulta da somatória de
pequenos elementos, não existe em partículas separadas, mas constitui-se numa corrente,
uma cadeia, a fluir constantemente, sendo, pois, comparável a um rio ou a um curso
d’água. Esse modo de representar a consciência opõe-se a uma concepção analítica,
elementarista, atomista ou molecular da mesma.
[90] A consciência tem cinco características principais: [a] a pessoalidade, [b] a
mutabilidade, [c] a continuidade, [d] a objetividade e [e] a seletividade.
[91] Qual é a função da consciência? A consciência tem por função ajudar as pessoas a se
adaptarem ao meio ambiente. Por serem dotados de consciência, os seres humanos
aprendem rapidamente coisas novas e resolvem com mais facilidade os novos problemas
que se apresentam.
[92] Outro capítulo célebre dos “Princípios...” é aquele dedicado à emoção. A esse respeito,
James propôs uma teoria original, que gerou muito debate. Segundo a concepção corrente,
a emoção costuma ser despertada por alguma situação; as alterações físicas, por sua vez,
são desencadeadas pela emoção. A ordem dos fatos é, pois: percepção, emoção e sintomas
corporais. Segundo a teoria de James, as modificações corporais são despertadas
instintivamente pela situação; a emoção é apenas a consciência desse estado físico. A
ordem, então, é: percepção, sintomas corporais e emoção. A emoção nada mais é que a
sensação das alterações corporais despertadas por via reflexa por determinadas
circunstâncias estimulantes. Sem a alteração dos estados corpóreos, não haveria emoção.
[93] James não fundou nenhum sistema formal de psicologia. Mas influenciou a escola do
funcionalismo. Há quem o tome como primeiro psicólogo funcionalista. Outros preferem
vê-lo como o principal precursor da psicologia funcional.
[94] Em 1902, James publicou “As variedades da experiência religiosa”. Esse livro é
considerado o marco de fundação do campo da psicologia da religião.
[95] Além de psicólogo, James foi também um filósofo. Nos últimos anos de vida, ele se
distanciou da psicologia, preferindo ser apresentado como filósofo. A filosofia de James é o
pragmatismo. O lema do pragmatismo é: “Se funcionar, é verdadeiro”. A verdade de uma
crença pode, pois, ser avaliada pela sua utilidade.
[96] Em 1865, aos 23 anos de idade, James esteve no Brasil por oito meses, como membro
da expedição Thayer.
[97] Liderada por Louis Agassiz, um naturalista suíço, o objetivo da expedição era explorar
a bacia amazônica.
[98] A expedição partiu de Nova Iorque no dia 1o de abril de 1865 e aportou no Rio de
Janeiro, sede da corte imperial, no dia 22. Os três meses seguintes foram passados na
capital brasileira e arredores.
[99] No dia 25 de julho, o grupo seguiu para Belém do Pará, passando, entre outras
cidades, por Salvador e Maceió. Por fim, adentrou a bacia amazônica, passando por
6 HEIDBREDER, Edna. Psicologias do século XX. 5.ed. São Paulo: Mestre Jou, 1981. p.150.
10
Santarém, Manaus e outras cidades mais. Durante a viagem, James trabalhou como coletor
de peixes.
[100] Acredita-se que a metáfora do fluxo da consciência, de importância fundamental nos
“Princípios...”, remonte ao que James presenciou em suas navegações pelos rios
amazônicos.
[101] A expedição Thayer retornou ao Rio de Janeiro e, por fim, embarcou para os Estados
Unidos em dois de julho de 1866. James, porém, voltou para Nova Iorque em dezembro de
1865, sete meses antes do fim da expedição.
b) Hall:
11
Ferenczi, entre outros, juntos! A história da psicologia nunca mais viu algo assim
acontecer.
[113] Freud e Jung ficaram ambos hospedados na residência de Hall. James também se
instalou na casa do reitor.
[114] Freud falou todos os dias; fez cinco conferências introdutórias sobre psicanálise 7.
Jung proferiu três palestras, duas delas sobre a sua técnica de associação de palavras.
[115] Consta que Titchener abandonou uma conferência de Freud antes que ela
terminasse8. James assistiu a apenas uma das cinco palestras de Freud. “Quero ver como
Freud é”9, ele teria dito. Freud e James fizeram uma caminhada juntos; James teve um
ataque de angina pectoris durante esse passeio; Freud ficou admirado com a maneira
serena com que James reagiu a esse incidente10 – ele morreu um ano depois de um ataque
cardíaco. Passado o congresso, James escreveu a um amigo que Freud havia lhe deixado a
impressão de ser um “homem obcecado com ideias fixas”11.
[116] Terminadas as conferências, a Universidade Clark conferiu a Freud e a Jung o título
de doutor honoris causa. Como resultado desse evento, a psicanálise desfrutou de um
grande crescimento nos Estados Unidos a partir da década seguinte.
[117] Quase um século depois, em 1999, fazendo memória desse acontecimento, foi
instalada uma escultura de bronze de Freud no campus da Universidade Clark.
7 Cf. FREUD, Sigmund. Cinco lições de psicanálise. In: _______. Cinco lições de psicanálise, Leonardo da
Vinci e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1970. p.3-51. (Edição standard brasileira das obras
psicológicas completas de Sigmund Freud; 11.)
8 Cf. HOTHERSALL, David. História da psicologia. 4.ed. São Paulo: McGraw-Hill, 2006. p.326.
9 HOTHERSALL, David. História da psicologia. 4.ed. São Paulo: McGraw-Hill, 2006. p.326.
10 Cf. FREUD, Sigmund. Um estudo autobiográfico. In: _______. Um estudo autobiográfico, Inibições,
sintomas e ansiedade, A questão da análise leiga e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1970. p.67.
(Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 20.)
11 Cf. HOTHERSALL, David. História da psicologia. 4.ed. São Paulo: McGraw-Hill, 2006. p.326.
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1 - O voluntarismo de Wundt:
13
[134] A primeira tem por objeto as funções mentais mais simples, como a sensação e a
percepção; a segunda, os processos mentais superiores.
[135] A psicologia dos povos se interessa por uma série de fenômenos, tais como: a
mitologia, a religião, a arte, a estética, a linguagem, os costumes sociais, a ética, a moral, o
direito – a cultura, enfim.
[136] Wundt dedicou as duas últimas décadas da sua vida ao estudo desses temas. Entre
1900 e 1920, ele publicou a monumental obra “Psicologia dos povos”, a qual compreende
uma dezena de grossos volumes12.
2 - O estruturalismo de Titchener:
12Freud citou Wundt várias vezes em seus escritos. Mencionou, por exemplo, as ideias de Wundt sobre os
lapsos de língua, bem como o experimento por ele realizado de associação de palavras. Referiu-se também à
concepção wundtiniana de que tudo o que é mental é passível de se tornar consciente. Entretanto, o texto em
que Freud citou Wundt mais vezes foi “Totem e tabu”. Então, Freud tinha em vista, sobretudo, a obra
“Psicologia dos povos”. Referiu-se, por exemplo, aos pontos de vista de Wundt sobre o tabu. E revelou que foi
estimulado a escrever sobre o totemismo pelas obras de Wundt e Jung: “Apresso-me em confessar que foi
dessas duas fontes que recebi o primeiro estímulo para os meus próprios ensaios” [FREUD, Sigmund. Totem e
tabu. In: _______. Totem e tabu e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1974. p.17. (Edição standard
brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 13.)] Ao citar Wundt, Freud, na maioria das
vezes, assumiu um ponto de vista divergente. Em todo caso, ele deu mostras de conhecê-lo e respeitá-lo.
14
que regem a sua combinação, e [c] compreender de que modo o sistema nervoso produz os
vários fenômenos sensoriais, perceptuais e cognitivos.
[152] Na prática, Titchener dedicou-se, sobretudo, ao primeiro desses três objetivos:
determinar a estrutura da consciência mediante a identificação das suas partes
componentes.
[153] Resumindo, para o estruturalismo, a psicologia é o estudo analítico da estrutura da
mente humana, adulta, normal e generalizada que se realiza mediante a introspecção.
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3 - O funcionalismo:
16
[173] Para o funcionalismo, a psicologia tem por objeto as operações mentais. Estas, por
sua vez, devem ser estudadas do ponto de vista das funções que desempenham, isto é, da
sua utilidade. Como funcionam? Qual é o seu modus operandi? Para que servem? Que
funções têm? A que fins práticos atendem? – eis as perguntas que o psicólogo funcionalista
considera pertinentes.
[174] O principal conceito do funcionalismo é “função”. A palavra “função” é ambígua.
“Função” pode significar uma atividade e também a utilidade de uma atividade. O conceito
de “função” é importante para o funcionalismo nos dois sentidos. Ele está interessado nos
processos psicológicos como atividades dotadas de utilidades.
[175] Influenciados por Darwin, os funcionalistas consideram que as operações mentais
são úteis à sobrevivência do organismo em sua adaptação ao meio ambiente. A consciência
constitui-se, assim, numa vantagem adaptativa.
[176] Os funcionalistas se interessam por uma grande diversidade de temas: sensação,
percepção, inteligência, aprendizagem, desenvolvimento, diferenças de sexo, motivação,
personalidade etc.
[177] A população estudada pelos funcionalistas abarca tanto seres humanos como
animais, adultos como crianças, pessoas saudáveis como indivíduos com problemas
psicológicos.
[178] O funcionalismo preza o estudo das diferenças individuais; não se ocupa apenas da
mente generalizada.
[179] O funcionalismo reconhece vários métodos como válidos. Admite, inclusive, o valor
da introspecção, embora se trate, então, de uma introspecção informal. Além da
introspecção, pode-se ainda citar: a observação, a experimentação, os questionários, os
testes mentais, os métodos psicofísicos, o estudo dos produtos sociais etc.
[180] A psicologia funcional é uma psicologia eminentemente aplicada; a aplicação da
psicologia aos problemas práticos da vida cotidiana é um elemento central do
funcionalismo. Os funcionalistas levaram a psicologia para muito além do laboratório,
aplicando-a às mais diversas situações: os testes mentais, a escola, a clínica, os negócios, a
seleção de pessoal, a propaganda, o direito etc.
[181] Recolhendo os dados acima enumerados, desenha-se, por fim, um forte contraste
entre as psicologias estrutural e funcionalista.
Estruturalismo Funcionalismo
Os conteúdos mentais As operações mentais
A estrutura ou a composição da mente A função da mente, a sua utilidade, a sua
vantagem adaptativa
O que é a mente? Como funciona a mente? Para que serve?
A mente como mosaico de pequenas partes A mente como um todo contínuo
Foco na sensação e na percepção Estudo de uma grande diversidade de
temas
O ser humano adulto normal Também os animais, as crianças e os
mentalmente enfermos
A mente humana generalizada As diferenças individuais
Introspecção sistemática Introspecção informal e vários outros
métodos
Psicologia pura Psicologia aplicada
[182] Nascido no final do século XIX, passados 30 anos, o funcionalismo já não existia
como escola formal de psicologia – se é que, um dia, ele o foi. O funcionalismo
desapareceu, mas porque se diluiu. Num certo sentido, todos os psicólogos – ou quase
todos – se tornaram – e ainda o são – funcionalistas.
17
[183] Pode-se também afirmar que o funcionalismo serviu de ponte entre o estruturalismo
de Titchener e o behaviorismo de Watson, como passagem de uma coisa a outra.
b) A escola de Columbia:
O conexionismo de Thorndike
13MARX, Melvin H.; HILLIX, William A. Sistemas e teorias em psicologia. 18.ed. São Paulo: Cultrix, 2008.
p.139.
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4 - A reflexologia de Pavlov:
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[217] Para isolar os seus animais de todos os estímulos, exceto aqueles que estavam sendo
estudados, Pavlov projetou um prédio de três andares que ficou conhecido como a “Torre
do Silêncio”.
[218] E, para coletar a saliva, criou um aparelho: um pequeno tubo diretamente ligado ao
canal salivar do cachorro e inserido, através de uma fístula, numa das bochechas do
animal. A saliva fluía por esse tubo, o que permitia a sua coleta e medição.
[219] Pavlov descreveu, então, o fenômeno nos seguintes termos. Antes do
condicionamento, chamado “respondente”, há um reflexo incondicional, no qual um
estímulo incondicional (alimento) elicia uma resposta incondicional (salivação). Nessa
fase, o estímulo neutro (sinal sonoro) que vai ser condicionado não elicia resposta
nenhuma. Durante o condicionamento, o estímulo neutro (sinal sonoro) é emparelhado
com o estímulo incondicional (alimento), o qual, por sua vez, elicia uma resposta
incondicional (salivação). Por fim, após o condicionamento, o estímulo neutro (sinal
sonoro) converte-se num estímulo condicional (sinal sonoro), passando a eliciar uma
resposta condicional (salivação).
21
[225] A diferenciação acontece quando um estímulo distinto do original não elicia a
mesma resposta.
[226] O condicionamento de 2o grau – ou de ordem superior – consiste no
condicionamento que envolve o emparelhamento de um estímulo neutro com um estímulo
condicional, ao invés de incondicional.
[227] Por fim, a neurose experimental – ou de laboratório – é um fenômeno que resulta de
um colapso da capacidade de fazer diferenciações, decorrendo da suspensão da capacidade
de distinguir entre dois estímulos.
[228] Em 1901, Pavlov publicou um artigo em que descreve, pela primeira vez, os seus
estudos sobre os reflexos condicionados. Em 1924, ele fez uma série de palestras
resumindo os seus 25 anos de trabalho, aproximadamente, sobre o condicionamento.
Publicadas em russo, foram traduzidas para o inglês em 1927 sob o título: “Reflexos
condicionados: uma investigação da atividade psicológica do córtex cerebral”. Em 1926,
Pavlov publicou “Os reflexos condicionados”.
[229] Inicialmente, Pavlov fez oposição ao governo comunista da União Soviética. Os
bolchevistas, não obstante, deram amplo apoio ao seu trabalho. Proibiram o exercício da
psicanálise, mas apoiaram a psicologia pavloviana, considerada uma teoria marxista do
psiquismo humano. No final de sua vida, Pavlov mudou de atitude e passou a apoiar o
governo comunista. Quando morreu, ele foi tratado como um herói nacional. Em
Leningrado (São Petersburgo), um monumento foi erigido em sua homenagem.
[230] A pesquisa de Pavlov sobre o condicionamento respondente exerceu uma profunda
influência sobre o behaviorismo de Watson. Os norte-americanos, porém, só
“descobriram” Pavlov nos anos 1920, quando boa parte do seu trabalho foi traduzida para
o inglês. Ele esteve pessoalmente nos Estados Unidos em 1923 e em 1929. Skinner assistiu
à palestra que ele ministrou em 1929. Os discípulos de Pavlov, no entanto, não reconhecem
o menor parentesco entre a reflexologia pavloviana e o behaviorismo ianque.
[231] Nos jardins do Instituto de Medicina Experimental, Pavlov mandou erguer uma
estátua de um cachorro sentado em um pedestal. Dizia ele: “os cães significam tudo”14.
14 HOTHERSALL, David. História da psicologia. 4.ed. São Paulo: McGraw-Hill, 2006. p.415.
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5 - O behaviorismo de Watson:
23
[247] O marco de fundação do behaviorismo é uma palestra feita por Watson em fevereiro
de 1913 na Universidade de Columbia. Esse discurso ficou conhecido como o “manifesto”
behaviorista. Um mês depois, a sua fala foi publicada na forma de artigo na Psychological
review sob o título: “A psicologia tal como o behaviorista a vê”. Passados alguns anos, em
1919, com a colaboração de Rayner, Watson transformou o referido artigo num livro: “A
psicologia do ponto de vista de um behaviorista”, sendo essa a exposição mais elaborada do
seu pensamento.
[248] Tendo se configurado como escola na Universidade Johns Hopkins, o behaviorismo
difundiu-se, em seguida, por todo o país. Após um período de ascensão gradual, o
comportamentalismo chegou a dominar completamente o cenário da psicologia
estadunidense por, pelo menos, três décadas, de 1930 a 1960, aproximadamente.
[249] Eis o primeiro parágrafo do manifesto de 1913: “A psicologia, na visão do
behaviorista, é um ramo experimental puramente objetivo da ciência natural. Seu objetivo
teórico é a previsão e o controle do comportamento. A introspecção não faz parte essencial
dos seus métodos, nem o valor científico dos seus dados depende da prontidão com que se
prestam à interpretação em função da consciência. O behaviorista, em um esforço para
obter um projeto unitário de resposta animal, reconhece não haver linha divisória entre o
homem e o animal. O comportamento do homem, com todo o seu refinamento e a sua
complexidade, forma apenas uma parte do projeto total de investigação do behaviorista” 15.
O parágrafo terceiro, por sua vez, começa assim: “Chegou a hora de a psicologia descartar
toda referência à consciência; de ela não mais se iludir pensando que pode fazer dos
estados mentais objeto de observação”16.
[250] Como se vê, o discurso de Watson foi mesmo programático. Percorramos, um a um,
os diversos elementos do seu modo de entender a psicologia.
[251] Para Watson, a psicologia é uma ciência da natureza. O behaviorismo,
nomeadamente, é uma psicologia decidida a ser científica. O seu princípio fundamental é o
da objetividade.
[252] O objeto da psicologia é o comportamento humano e animal. São os atos
comportamentais observáveis, direta ou indiretamente, e passíveis de descrição objetiva.
[253] Tomemos como exemplo o pensamento. Segundo a concepção corrente, o
pensamento é um fenômeno mental, um processo que não está sujeito à observação.
Watson, porém, argumentou que o pensamento é, ele também, um comportamento
objetivo passível de ser observado. De que modo? Pensar é falar para si mesmo sem emitir
som. Essa fala subvocal, por sua vez, é acompanhada de leves movimentos da língua, boca
e laringe, contrações passíveis de serem captadas e medidas por meio de instrumentos. O
pensamento, portanto, é um comportamento laríngeo que pode ser observado
indiretamente.
[254] A alma, a mente, a consciência, o psiquismo, a interioridade do sujeito e fenômenos
semelhantes não se constituem no objeto de estudo da psicologia.
[255] Pode-se falar em dois tipos de behaviorismo: um metodológico, também chamado
“empírico”, outro metafísico, também chamado “radical”. O behaviorismo metodológico é
o behaviorismo da “caixa fechada”: a mente existe, mas não se tem acesso ao interior dela;
tudo o que se pode conhecer é o que entra e o que sai; por razões metodológicas, portanto,
a mente deve ser descartada pela psicologia. O behaviorismo metafísico é o behaviorismo
da “caixa vazia”: a mente não existe; não interessa como objeto de estudo simplesmente
porque não há o que estudar.
[256] Watson oscilou entre uma forma e outra de behaviorismo. Parece ter evoluído de
behaviorista metodológico a behaviorista metafísico.
15 SCHULTZ, Duane P.; SCHULTZ, Sydney Ellen. História da psicologia moderna. São Paulo: Cengage
Learning, 2013. p.264.
16 BENJAMIN, JR., Ludy T. Uma breve história da psicologia moderna. Rio de Janeiro: LTC, 2009. p.60.
24
[257] Os objetivos da psicologia são a predição e o controle do comportamento. Dado um
estímulo, compete a ela prever a respectiva resposta; dada uma resposta, estabelecer que
estímulo a desencadeou. Controlar o comportamento, por sua vez, é o mesmo que
modificá-lo.
[258] A introspecção não se constitui num método cientificamente válido para a psicologia.
O behaviorismo propõe que apenas métodos objetivos sejam usados – tais como:
observações, estudos experimentais em laboratório, alguns testes psicológicos, os métodos
do tempo de reação, as técnicas da caixa-problema de Thorndike, o método do
condicionamento pavloviano etc.
[259] Como se vê, o behaviorismo está em radical descontinuidade com a psicologia
mentalista e introspeccionista que o antecedeu, seja em sua configuração estruturalista,
seja em sua versão funcionalista. Pode-se mesmo falar numa “revolução behaviorista”. De
fato, o comportamentalismo propôs um novo objeto e um novo método para a psicologia.
Ou seja, uma revisão completa da ciência da psicologia.
[260] A “pedra angular” da psicologia behaviorista é o esquema estímulo-resposta (E-R).
Todo comportamento é passível de ser explicado em termos de estímulo e resposta.
[261] A “chave” para a compreensão do comportamento é o condicionamento. Segundo o
behaviorismo, há dois tipos de condicionamento: um respondente, também chamado
“clássico” ou “pavloviano”, outro operante, também chamado “instrumental” ou
“skinneriano”. O condicionamento respondente é o condicionamento E-R: nele, um
estímulo desencadeia uma resposta. O condicionamento operante é o condicionamento R-
E: nele, um estímulo segue-se a uma resposta. O comportamento respondente é controlado
pelos seus antecedentes; o comportamento operante, pelas suas consequências. O primeiro
interessou mais a Watson; o segundo, a Skinner.
[262] O behaviorismo concede grande importância ao estudo da aprendizagem. Para a
psicologia comportamental, tudo – ou quase tudo – é aprendido. Em meados da década de
1920, Watson formulou um desafio que ficou famoso: “Deem-me uma dúzia de bebês
saudáveis e bem formados e ponham-nos num mundo criado segundo as minhas
especificações e eu lhes garantirei que posso selecionar qualquer um, aleatoriamente, e
treiná-lo para tornar-se o especialista que eu quiser: médico, advogado, artista,
comerciante e, sim, até mesmo mendigo e ladrão, independentemente de seus talentos,
propensões, tendências, aptidões e vocações e da raça de seus ancestrais”17.
[263] Face ao binômio “nature versus nurture” – “inato versus adquirido” –, o
behaviorismo privilegia decididamente o que é adquirido pela aprendizagem. Watson é um
ambientalista radical, um arquiambientalista.
17 GOODWIN, C. James. História da psicologia moderna. 4.ed. São Paulo: Cultrix, 2010. p.361.
25
as reações emocionais são, em grande medida, respostas aprendidas. Watson se propôs,
então, a demonstrar essa tese experimentalmente.
[266] O experimento aconteceu em 1919. O sujeito foi um bebê de 11 meses, filho de uma
das enfermeiras do hospital, o “Pequeno Albert”. Com a ajuda de Rayner, Watson
condicionou o pequerrucho a ter medo de ratos usando a técnica do condicionamento
respondente. O procedimento consistiu em bater com violência numa barra metálica atrás
de Albert toda vez que um rato lhe era apresentado. Depois de sete seções de
emparelhamento, o bebê passou a ter medo de ratos. Verificou-se também que a resposta
do medo generalizou-se para outros estímulos semelhantes. Os resultados foram
publicados em 1920, no Journal of experimental psychology, num artigo escrito a quatro
mãos, intitulado: “Respostas emocionais condicionadas”.
[267] Além da psicologia infantil, também a psicologia animal ocupa um lugar eminente na
escola comportamental de psicologia. Pode-se mesmo afirmar que, para o behaviorismo, a
psicologia animal é a psicologia modelo. O ser humano, aos olhos do condutismo, é um
animal, uma espécie animal entre muitas outras, não um caso especial.
[268] A exemplo do funcionalismo, o behaviorismo entende a psicologia como uma ciência
aplicada.
[269] Tendo deixado a universidade, o próprio Watson teve a oportunidade de aplicar ao
campo da publicidade, por exemplo, os princípios da psicologia comportamental. De fato,
os condicionamentos respondente e operante podem muito bem ser utilizados na venda de
mercadorias.
[270] Watson também fez recomendações práticas quanto ao modo correto de educar as
crianças, conforme vimos, num livro que escreveu com a sua segunda mulher.
[271] A psicoterapia, por fim, revelou-se um campo muito fecundo de aplicação da teoria
behaviorista da aprendizagem.
[272] Para o behaviorismo, o sintoma não é sinal de alguma outra coisa; não é a
manifestação externa de uma problemática subjacente. O sintoma é a própria doença.
Tratar a doença significa, pois, eliminar o sintoma, não mais do que isso.
[273] Para o behaviorismo, as doenças mentais são comportamentos aprendidos por
condicionamento. A terapia comportamental consiste, então, em desaprender
comportamentos indesejáveis e aprender comportamentos preferíveis. Noutras palavras,
trata-se de um descondicionamento e, em seguida, de um recondicionamento. Trata-se,
enfim, de uma reeducação.
[274] Para essa reaprendizagem, há várias técnicas de terapia comportamental.
[275] A técnica da dessensibilização sistemática é indicada para o tratamento de fobias.
Consiste em introduzir o estímulo que causa ansiedade de uma forma progressiva, levando
o paciente, ao mesmo tempo, a manter-se relaxado.
[276] Essa técnica foi utilizada pela primeira vez em 1924 por Mary Cover Jones (1896-
1987), colega de Rayner. Baseando-se em sugestões feitas por Watson e Rayner sobre o
modo como o medo poderia ser desaprendido, ela descondicionou o medo de coelhos num
garotinho de três anos chamado “Peter”.
[277] O condicionamento aversivo consiste em associar um estímulo que causa prazer a
alguma coisa desagradável. Essa técnica pode ser usada no tratamento do alcoolismo, do
tabagismo, de certos desvios sexuais – por exemplo, o fetichismo –, do excesso no comer
etc.
[278] A técnica da inundação consiste em confrontar o paciente massivamente com o
estímulo que lhe causa medo ou aversão de modo a esvaziá-lo.
[279] A enurese pode ser tratada fazendo com que uma campainha desperte a criança ao
primeiro sinal de umedecimento das fraldas. E assim por diante.
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questão altamente resistente à extinção. Em suma, o comportamento supersticioso é uma
resposta seguida de reforço acidentalmente e, em seguida, reforçada de forma parcial.
[297] O condicionamento operante envolve ainda vários outros fenômenos, tais como: a
extinção, a recuperação espontânea, a generalização, a discriminação, a modelagem, o
auto-condicionamento, o condicionamento recíproco etc.
[298] Quando não são mais reforçados, os operantes declinam gradualmente em
frequência até desaparecerem – isso é a extinção.
[299] Uma vez extinto por falta de reforçamento, um operante pode reaparecer
gratuitamente – a isso, chama-se “recuperação espontânea”.
[300] Um operante reforçado dentro de um conjunto de circunstâncias tende a ocorrer em
situações semelhantes àquela em que foi reforçado – ou seja, tende a generalizar-se.
[301] A discriminação, por sua vez, é a capacidade de perceber que um operante reforçado
numa dada situação provavelmente não será reforçado numa situação diferente.
[302] A modelagem é o procedimento pelo qual um sujeito é gradativamente condicionado
a emitir uma resposta específica. Consiste em reforçar positivamente um indivíduo de
modo que ele se aproxime passo a passo do comportamento que dele se espera.
[303] O auto-condicionamento consiste em ministrar reforços e/ou punições a si mesmo.
[304] Nas interações sociais, o subordinado não apenas é condicionado pelo superior, mas
também o condiciona – a isso, chama-se “condicionamento recíproco”.
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[332] Como um estímulo visual estático pode produzir a percepção de algo em
movimento? Como um estímulo visual descontínuo pode resultar na percepção de algo
contínuo? Wertheimer ficou fascinado pelo problema perceptual do movimento aparente.
Ele conferiu ao fato o nome de “fenômeno phi”.
[333] Wertheimer levou o problema a Friedrich Schumann (1863-1940). Schumann
colocou à sua disposição o laboratório do Instituto de Psicologia da Universidade de
Frankfurt e apresentou-lhe Köhler e Koffka. Wertheimer concebeu, então, alguns
experimentos. Köhler, Koffka e a sua esposa participaram como sujeitos experimentais.
[334] Numa sala escura, Wertheimer fez reluzir, em rápida sucessão, dois pontos de luz
próximos um do outro, variando os intervalos de tempo entre os clarões. Quando o
intervalo entre os clarões era menor que 0,03 segundos, as duas luzes pareciam estar
continuamente acesas. Quando o intervalo era de 0,06 segundos, os observadores diziam
ver o clarão mover-se do primeiro ponto para o segundo. Quando o intervalo era igual ou
maior do que 0,20 segundos, os pontos de luz eram percebidos como dois clarões de luz
separados.
[335] Duas linhas negras – uma vertical, outra horizontal, num ângulo reto – foram
projetadas contra um fundo branco. O intervalo entre o aparecimento das linhas variava.
Sendo de 0,06 segundos, o observador via uma única linha mover-se da posição vertical
para a posição horizontal, parecendo deitar-se. Aumentando-se o intervalo, o observador
via duas linhas aparecendo sucessivamente. Diminuindo-se o intervalo, o observador via as
duas linhas sobrepostas.
[336] Feitos esses – e outros – experimentos, Wertheimer chegou à seguinte conclusão. O
fenômeno phi é um todo inanalisável. O movimento não está em nenhum dos elementos a
que o fenômeno pode ser reduzido. Não se encontrando nas partes, o movimento está no
todo. O fenômeno phi demonstra, pois, que a percepção é gestáltica.
[337] Com efeito, segundo a psicologia da forma, a percepção tem um caráter ativo e
gestáltico. Não somos apenas receptores passivos de estímulos sensoriais. A mente é ativa;
ela está constantemente à procura de totalidades significativas. Ao olharmos para o
mundo, não captamos aglomerados de sensações, mas vemos logo unidades completas.
Vemos Gestalten dotadas de sentido; organizamos e interpretamos o que vemos.
[338] Em 1923, num artigo intitulado: “Leis de organização em formas perceptuais”,
Wertheimer sistematizou os princípios que regem a percepção.
[339] Eis alguns desses princípios: proximidade: objetos próximos tendem a ser
agrupados; similaridade: objetos semelhantes tendem a ser agrupados; continuidade:
elementos orientados numa mesma direção tendem a ser percebidos como contínuos;
fechamento: figuras incompletas tendem a ser vistas como completas etc.
[340] Um dos princípios da percepção reconhecidos pela psicologia da Gestalt é a
tendência a organizar o que percebemos em figura e fundo. Segundo Edgar Rubin (1886-
1951), dado um campo perceptual, focalizamos a atenção em um estímulo-alvo, que se
torna a figura, contra o resto do campo, que funciona, então, como fundo. A figura é a
parte da configuração total do estímulo que se destaca; o fundo é amorfo, jazendo em
segundo plano.
[341] Em alguns padrões, a figura e o fundo são reversíveis. E, muitas vezes, o efeito global
é muito diferente quando a figura e o fundo são intercambiados. As Kippfiguren são,
justamente, figuras que contêm formas embutidas – ou seja, duas figuras numa só –.
Exemplo: o vaso de Rubin e os perfis de Pedro e Paulo de Rubin.
[342] A psicologia da Gestalt é uma psicologia experimental. O gestaltismo, porém, nunca
deu grandes mostras de apreço pela quantificação, parecendo preferir os resultados
qualitativos. Boa parte dos dados utilizados pela psicologia da forma foi obtida pelo
método da introspecção ingênua.
[343] Em matéria de aplicação da psicologia – ponto forte do funcionalismo e do
behaviorismo –, a psicologia da Gestalt revelou-se fraca.
32
[344] No que concerne aos temas investigados, de início, a gestaltopsicologia se
concentrou no estudo da percepção – nomeadamente, da percepção visual.
Posteriormente, ampliou as suas pesquisas de modo a incluir também a resolução de
problemas, a aprendizagem, o pensamento, a memória etc.
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As grandes escolas de psicologia
8 - A psicanálise de Freud:
Considerações gerais
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neurose obsessiva” (1909), o caso Schreber (Daniel Paul Schreber), em “Notas
psicanalíticas sobre um relato autobiográfico de um caso de paranóia (Dementia
paranoides)” (1911) e o caso do Homem dos Lobos (Serguei Constantinovitch Pankejeff),
em “História de uma neurose infantil” (1918). Alguns autores incluem também o caso da
Jovem Homossexual, em “A psicogênese de um caso de homossexualismo numa mulher”
(1920). E, por fim, pode-se ainda mencionar a autoanálise de Freud.
[357] Sendo uma ciência empírica, a teoria psicanalítica sempre foi encarada como algo
provisório e sujeito a reformulações. Ao longo de toda a vida de Freud, ela sofreu
modificações. A década de 1920, em particular, assistiu a uma série de revisões, com a
emergência de uma nova teoria das pulsões, em “Além do princípio de prazer” (1920), uma
nova teoria do aparelho psíquico, em “O ego e o id” (1923), uma nova visão sobre o
complexo edipiano da mulher, em “A dissolução do complexo de Édipo” (1924), e uma
nova teoria da angústia, em “Inibições, sintomas e ansiedade” (1926). Todas essas
mudanças decorreram do esforço de Freud de ajustar a teoria psicanalítica aos dados
empíricos que constituem o seu fundamento18.
Primórdios da psicanálise
18Não obstante essas considerações, registre-se que, atualmente, o status científico da psicanálise e a sua
pertença ao campo epistemológico da psicologia constituem-se em objeto de discussão.
35
de que padecem as pessoas histéricas seria o resultado de uma luta entre forças mentais
opostas entre si.
[363] Por algum tempo, Freud se tornou um praticante do método catártico de Breuer.
Não tardou, porém, a abandonar a hipnose. Feito isso, utilizou, por um breve período, a
técnica da pressão. Por fim, Freud adotou o método da associação livre, que veio a se
tornar a regra fundamental da psicanálise. Segundo essa técnica, o paciente é convidado a
entregar-se com toda a liberdade ao fluxo dos seus pensamentos, isto é, a dizer tudo o que
lhe vem à cabeça, abrindo mão de toda autocrítica, mesmo que as suas ideias pareçam
absurdas, sem importância ou destituídas de sentido e ainda que seja desagradável revelá-
las – aliás, especialmente, se isso for desconfortável ou constrangedor –.
Data de nascimento
[364] A psicanálise surgiu, pois, no final do século XIX, mas é difícil precisar exatamente
quando. Segundo Freud, a psicanálise começou quando, tendo abandonado a hipnose, ele
passou a usar o método da associação livre (cf. BDP, 246; CIP, 344; HMP, 17, 26).
[365] Alguns estudiosos fazem a técnica da associação livre remontar a uma fala de Emmy
von N., uma paciente de Freud, no dia 12 de maio de 1889: “Disse-me então, num tom de
queixa claro, que eu não devia continuar a perguntar-lhe de onde provinha isto ou aquilo,
mas que a deixasse contar-me o que tinha a dizer-me”19.
[366] Segundo Ernest Jones, o biógrafo oficial de Freud, o método da associação livre “...se
desenvolveu pouco a pouco, entre 1892 e 1895...”20.
[367] Para alguns historiadores, o marco de fundação da psicanálise é a publicação, em
1895, de “Estudos sobre a histeria”, o primeiro livro de Freud, escrito com a colaboração de
Breuer.
[368] Outros, porém, preferem a data de 1896, ano em que Freud usou o termo
“psicanálise” pela primeira vez21.
[369] Por fim, a última possibilidade: 1900, o ano da publicação de “A interpretação de
sonhos”. Movido, talvez, pelo desejo de fazer a psicanálise pertencer ao novo século, o
próprio Freud, certa vez, escreveu: “Pode-se dizer que a psicanálise nasceu com o século
XX, pois a publicação em que ela emergiu perante o mundo como algo novo – A
Interpretação de Sonhos – traz a data ‘1900’” (BDP, 239).
[370] Seja como for, pode-se dizer que a psicanálise é posterior à fundação da psicologia
científica por Wundt (1879) e contemporânea do surgimento do estruturalismo de
Titchener (1892) e do funcionalismo de Dewey (1896). Diferentemente, porém, das
psicologias de Wundt, Titchener e Dewey – assim como do gestaltismo de Wertheimer
(1912) e do behaviorismo de Watson (1913) – a psicanálise não nasceu em ambiente
acadêmico, não floresceu no campo da psicologia experimental e não se interessou por
temas como sensação, percepção ou aprendizagem.
[371] Disse Freud: “...eu não partia [...] de experiências de laboratório e sim do trabalho
terapêutico” (CLP, 24). A psicanálise surgiu, pois, no campo da medicina; focalizou,
sobretudo, o comportamento anormal; e formulou, por conseguinte, questões muito
19 FREUD, Sigmund. Estudos sobre a histeria; Breuer e Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1974. p.107. (Edição
standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 2.)
20 JONES, Ernest. A vida e a obra de Sigmund Freud; volume 1: Os anos de formação e as grandes
psicanalíticas. Rio de Janeiro: Imago, 1976. p.174. (Edição standard brasileira das obras psicológicas
completas de Sigmund Freud; 3.).
36
diferentes daquelas que as demais escolas procuraram responder. A psicanálise, enfim, é
uma outra história...
Conceitos fundamentais
[372] Por quatro vezes, pelos menos, Freud enumerou os conceitos fundamentais da teoria
psicanalítica (cf. DVE, 300; EA, 54; P, 305; SP, 268). Elaboradas em momentos distintos,
as listas nem sempre são exatamente as mesmas. Duas noções, contudo, sobressaem: os
conceitos de inconsciente e sexualidade. Talvez, se possa dizer que as duas principais
descobertas de Freud são as seguintes: que o psiquismo é dividido pelo mecanismo do
recalque, havendo, portanto, processos mentais inconscientes; e que a sexualidade,
presente desde a infância, desempenha um papel de primeira grandeza na psicologia
humana e, em particular, na etiologia das neuroses.
Bloco do inconsciente
37
Bloco da sexualidade
[378] Além do inconsciente, outro fator da psicologia humana que a psicanálise encarece é
a sexualidade. De acordo com Freud, os impulsos sexuais desempenham um “enorme
papel” na vida mental dos seres humanos (cf. BDP, 246).
[379] Mais especificamente, em se perguntando sobre as causas das doenças nervosas, a
psicanálise concluiu que “...a origem das forças impulsionadoras da neurose está na vida
sexual” (HMP, 22). Diz Freud: “Aprendi então por experiência própria, a qual aumentava
rapidamente, que não era qualquer espécie de excitação emocional que estava em ação por
trás dos fenômenos da neurose, mas habitualmente uma excitação de natureza sexual...”
(EA, 36).
[380] Freud, porém, quando fala em “sexualidade”, confere a essa palavra um sentido
extenso. Sexual, para a psicanálise, não significa genital; sexual tampouco quer dizer
reprodutivo; a meta da sexualidade, segundo Freud, é o prazer, não a procriação.
[381] A concepção freudiana de sexualidade é ampliada temporal e espacialmente. No
espaço – na medida em que se espraia pelo corpo humano, para além dos órgãos genitais,
concentrando-se, em particular nas zonas erógenas: a boca, o ânus e outras superfícies
sensoriais. No tempo – na medida em que recua até a primeira infância, para aquém da
puberdade, não se podendo mais sustentar o mito da pureza infantil. Em suma, a
concepção freudiana de sexualidade é aquela suficientemente ampla para incluir as
sexualidades do perverso e da criança.
[382] Aos olhos de Freud, a infância é um período da vida humana que se reveste da maior
importância, pois muita coisa se decide aí. Os fatos e as impressões da tenra infância têm
um papel “importantíssimo”, “nunca [antes] imaginado”, no desenvolvimento humano (cf.
CLP, 34). Para dizê-lo com o poeta inglês William Wordsworth (1770-1850): “The child is
father of the man” [“A criança é o pai do homem”]. Mais do que uma pressuposição, esse
apreço pela infância é algo que se impôs a Freud. Em sua pesquisa das causas do
adoecimento psíquico, ele relata: “Fomos puxados cada vez mais para o passado;
esperávamos poder parar na puberdade [...]. Mas em vão; as pistas conduziam ainda mais
para trás, à infância e aos seus primeiros anos” (HMP, 27). A psicanálise tem, pois, uma
orientação arqueológica, regressiva, voltada para o passado.
[383] Em se debruçando sobre a sexualidade infantil, Freud constatou que há um longo
percurso – repleto de armadilhas – a ser percorrido desde o nascimento até a idade adulta.
A evolução psicossexual atravessa fases sucessivas: oral, anal e fálica – onde tem lugar o
complexo de Édipo –. Neste, a criança toma o progenitor do sexo oposto como objeto
amoroso e estabelece uma relação de rivalidade com o progenitor do próprio sexo.
Seguem-se o período de latência e a fase genital.
[384] A sexualidade não é, porém, a única força em ação no psiquismo humano. Se tudo
fosse sexual, não haveria conflito e tampouco inconsciente. Ao longo da sua carreira, Freud
elaborou três teorias do dualismo pulsional. A primeira, formulada em “A concepção
psicanalítica da perturbação psicogênica da visão” (1910), estabelece uma oposição entre as
pulsões do eu (autoconservação) e as pulsões sexuais (libidinais). A segunda, concebida em
“Sobre o narcisismo: uma introdução” (1914), sugere um antagonismo entre a libido
narcísica e a libido objetal. Por fim, a terceira, estabelecida em “Além do princípio de
prazer” (1920), propõe um conflito entre as pulsões de vida (Eros) e as pulsões de morte
(Tanatos).
[385] As pulsões de vida têm por meta unir, estabelecer agrupamentos cada vez mais
vastos e preservá-los. A libido é a energia das pulsões de vida. Já as pulsões de morte têm
por objetivo fragmentar, desfazer conexões, destruir. Em princípio, elas operam
internamente, em silêncio, até que, inexoravelmente, alcancem a sua meta: fazer todo
organismo vivo retornar ao estado inorgânico. Quando, porém, as pulsões de morte são
externalizadas, elas se manifestam como agressividade.
38
[386] Uma série de fenômenos clínicos levou Freud a formular o conceito de pulsões de
morte, entre eles: a compulsão à repetição, a neurose transferencial, a neurose de guerra, a
neurose de destino, o sadismo, o masoquismo, a ambivalência afetiva, a transferência
negativa, a resistência à cura, o sentimento de culpa, a melancolia etc.
Conclusão
[387] Para concluir, quatro afirmações sobre a psicanálise, todas elas decorrentes daquele
que é o seu conceito fundamental: o inconsciente.
[388] A psicanálise é a arte da suspeita: as coisas raramente são o que parecem ser.
[389] A psicanálise é a ciência do avesso; ela sempre se interessa pelo outro lado das
coisas.
[390] A psicanálise, escreveu Freud, “...traz à tona o que há de pior nas pessoas” (HMP,
51).
[391] A psicanálise, por fim, incomoda. Certa vez, Freud se descreveu como um daqueles
que “perturbaram o sono do mundo” (HMP, 32). Ele também declarou: “...provocar
oposição e despertar rancor é o destino inevitável da psicanálise...” (HMP, 17).
Tabela de siglas
ALEP FREUD, Sigmund. Algumas lições elementares de psicanálise. In: _______. Moisés e o
monoteísmo, Esboço de psicanálise e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1975. p.313-321.
(Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 23.)
BDP FREUD, Sigmund. Uma breve descrição da psicanálise. In: _______. O ego e o id e outros
trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1976. p.235-260. (Edição standard brasileira das obras
psicológicas completas de Sigmund Freud; 19.)
CIP FREUD, Sigmund. Conferências introdutórias sobre psicanálise; parte III. Rio de Janeiro: Imago,
1976. p.287-574. (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud;
16.)
CLP FREUD, Sigmund. Cinco lições de psicanálise. In: _______. Cinco lições de psicanálise,
Leonardo da Vinci e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1970. p.3-52. (Edição standard
brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 11.)
DVE FREUD, Sigmund. Dois verbetes de enciclopédia. In: _______. Além do princípio de prazer,
Psicologia de grupo e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1976. p.283-312. (Edição standard
brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 18.)
EA FREUD, Sigmund. Um estudo autobiográfico. In: _______. Um estudo autobiográfico, Inibições,
sintomas e ansiedade, A questão da análise leiga e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1976.
p.13-92. (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 20.)
EP FREUD, Sigmund. Esboço de psicanálise. In: _______. Moisés e o monoteísmo, Esboço de
psicanálise e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1975. p.163-238. (Edição standard
brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 23.)
HMP FREUD, Sigmund. A história do movimento psicanalítico. In: _______. A história do movimento
psicanalítico, Artigos sobre metapsicologia e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1974. p.11-
82. (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 14.)
NCIP FREUD, Sigmund. Novas conferências introdutórias sobre psicanálise. In: _______. Novas
conferências introdutórias sobre psicanálise e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1976. p.11-
220. (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 22.)
P FREUD, Sigmund. Psicanálise. In: _______. Um estudo autobiográfico, Inibições, sintomas e
ansiedade, A questão da análise leiga e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1976. p.295-309.
(Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 20.)
QAL FREUD, Sigmund. A questão da análise leiga. In: _______. Um estudo autobiográfico, Inibições,
sintomas e ansiedade, A questão da análise leiga e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1976.
p.203-293. (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud; 20.)
SP FREUD, Sigmund. Sobre a psicanálise. In: _______. O caso de Schreber, Artigos sobre técnica e
outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, s.d.. p.261-270. (Edição standard brasileira das obras
psicológicas completas de Sigmund Freud; 12.)
39
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Unidade III
As grandes escolas de psicologia
9 - A psicologia humanista:
[392] A psicologia humanista surgiu nos Estados Unidos da América em meados do século
passado, tendo desfrutado de enorme popularidade nas décadas de 1960 e 1970.
[393] A expressão “psicologia humanista” foi consagrada pela criação, em 1961, do
periódico Journal of humanistic psychology [Revista de psicologia humanista].
[394] A psicologia humanista é chamada de a “terceira força” em psicologia, constituindo-
se o behaviorismo e a psicanálise nas outras duas.
[395] Como o seu nome já o sugere, a psicologia humanista caracteriza-se por fazer da
pessoa humana o centro das suas atenções. Mais do que isso, a abordagem humanista em
psicologia distingue-se por não concordar com os retratos desumanizados do ser humano
oferecidos pelo behaviorismo e pela psicanálise. O homem não é apenas um animal ou uma
máquina! Tampouco é uma criatura perversa e destrutiva! – protestam os psicólogos
humanistas.
[396] A psicologia humanista não se constitui num sistema unitário, mas numa coleção de
várias abordagens afins. Entre os seus representantes, pode-se mencionar: Kurt Goldstein
(1878-1965), Ludwig Binswanger (1881-1966), Kurt Lewin (1892-1947), Friedrich Perls
(1893-1970), Gordon Allport (1897-1967), Carl Rogers (1902-1987), Viktor Frankl (1905-
1997), Abraham Maslow (1908-1970) e Rollo May (1909-1994). É possível citar também,
como precursores, vários dos neofreudianos revisionistas, tais como: Alfred Adler (1870-
1937), Carl Gustav Jung (1875-1961), Otto Rank (1884-1939), Karen Horney (1885-1952),
Erich Fromm (1900-1980) e Erik Erikson (1902-1994).
[397] A principal característica da psicologia humanista é a sua visão positiva da natureza
humana. O ser humano é bom e digno de confiança – eis o pressuposto fundamental da
abordagem humanista em psicologia.
[398] O humanismo observa que, historicamente, a psicologia focalizou muito mais os
aspectos mórbidos da vida mental do que o seu funcionamento saudável. Considera, pois,
necessário mudar de foco. A saúde, não a doença; o indivíduo plenamente realizado, não o
enfermo; os aspectos mais nobres do homem, não as suas debilidades – eis o que a
psicologia humanista enfatiza.
[399] Para o humanismo, a pessoa humana é concebida como fundamentalmente livre. O
indivíduo não é controlado pelo condicionamento nem determinado pelo inconsciente. O
homem é livre!
[400] A abordagem humanista em psicologia foi grandemente influenciada pela psicologia
da Gestalt, tendo, assim, uma orientação holística, não atomista. Trata-se, pois, no
humanismo, do homem total, da pessoa humana em sua totalidade.
[401] Os psicólogos humanistas costumam reconhecer a tendência para a individuação –
autorrealização ou autoatualização – como o fator motivacional fundamental.
[402] Outra ênfase distintiva dessa orientação em psicologia reside na maior importância
concedida ao presente do que ao passado. Para o psicólogo humanista, o indivíduo vive no
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presente, na esperança de uma realização mais plena no futuro. A psicologia humanista
privilegia, pois, o “aqui e agora”, não a história de vida pretérita.
[403] Também a vida mental consciente recebe mais atenção do que a inconsciente.
Embora não negue a existência do inconsciente, a psicologia humanista privilegia a
experiência banhada pela luz da consciência. Supõe-se que o indivíduo é
fundamentalmente um ser consciente, capaz de tomar consciência de todos os fenômenos
que ocorrem em seu psiquismo.
[404] Por fim, a fim de concluirmos essa caracterização geral da psicologia humanista, vale
acrescentar que a sua abordagem é idiográfica, não nomotética; ou seja, o humanismo
considera a pessoa em sua unicidade, ao invés tomá-la genericamente.
[405] O sobredito nos permite traçar este quadro:
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tendência para a autorrealização operam em harmonia. Esse é o modelo da saúde psíquica.
A pessoa é ela mesma.
[423] Incongruência. Quando as condições são desfavoráveis, isto é, quando o indivíduo se
depara com a consideração positiva condicional por parte de pessoas significativas para
ele, o indivíduo introjeta no próprio self as condições de valor ditadas pelos outros. Então:
o organismo faz uma experiência avalia a experiência a partir das condições de valor
introjetadas experimenta algumas experiências (aquelas que estão em contradição com
o autoconceito) como uma ameaça ao próprio self sente ansiedade defende-se
negando a experiência, isto é, não a simbolizando ou distorcendo a experiência, isto é,
deformando-a a experiência não é conscientizada a experiência não é assimilada à
Gestalt do self da pessoa, mas é excluída estabelece-se uma incongruência entre o
organismo e o self, a experiência e o autoconceito a tendência realizadora e a tendência
para autorrealização ficam dissociadas. Esse é o quadro do adoecimento psíquico, o
modelo de toda patologia psicológica. A pessoa tenta ser o que as outras pessoas gostariam
que ela fosse.
[424] A incongruência pode estar entre a experiência e a conscientização ou entre a
conscientização e a comunicação. No primeiro caso, a incongruência decorre da repressão;
no segundo, da inautenticidade.
[425] Pode-se também falar em congruência e incongruência entre o self e o self ideal. A
congruência entre o self e o self ideal traduz-se em alta autoestima: “eu sou o que gostaria
de ser”. A incongruência entre o self e o self ideal traduz-se em baixa autoestima: “eu não
sou o que gostaria de ser”.
[426] Relações precoces – frequentemente, com os pais – podem fomentar a
incongruência. Mas relacionamentos posteriores – com um psicoterapeuta, por exemplo –
podem restaurar a congruência. Passemos, pois, ao segundo bloco do pensamento
rogeriano: a sua teoria da psicoterapia.
[427] A terapia rogeriana é chamada de terapia “não-diretiva”, “centrada no cliente” ou “de
pessoa para pessoa”.
[428] Ela é não-diretiva porque o terapeuta não dirige o cliente; é o próprio cliente quem
dirige o tratamento.
[429] Ela é centrada no cliente – e não no terapeuta –, na medida em que se acredita que o
cliente é o principal responsável pela própria recuperação. Por isso mesmo, ele é chamado
de “cliente”, não de “paciente”.
[430] Ela é de pessoa para pessoa porque se trata de um relacionamento pessoal. A
psicoterapia, segundo Rogers, é apenas um caso de relação interpessoal construtiva.
[431] O objetivo da terapia é proporcionar ao cliente um estado de congruência entre o seu
self e as suas experiências organísmicas.
[432] A função do terapeuta, por sua vez, é criar uma atmosfera propícia ao pleno
desenvolvimento das potencialidades do cliente.
[433] Para tanto, Rogers não preconiza técnicas, mas atitudes terapêuticas. A saber: a
congruência, a consideração positiva incondicional e a compreensão empática.
[434] O terapeuta deve ser congruente: isto é, aquilo que o terapeuta experimenta em seu
organismo deve estar claramente presente em sua consciência e disponível para ser
comunicado ao cliente quando for conveniente. O terapeuta não deve se esconder por trás
da máscara de psicólogo profissional, mas ser autêntico, genuíno, transparente, natural,
verdadeiro. Nessa medida, o terapeuta funciona como um modelo de pessoa saudável para
o cliente.
[435] O terapeuta deve tratar o cliente com consideração positiva incondicional: ou seja,
deve acolhê-lo sem nenhuma condição de valor; deve aceitá-lo como é. Tratado dessa
maneira, o cliente sente-se encorajado a revelar-se por inteiro e a explorar porções ainda
não assimiladas de si mesmo.
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[436] O terapeuta deve compreender o cliente empaticamente: isto é, deve colocar-se no
lugar do cliente e ver o mundo com os olhos dele; deve entrar no campo experiencial do
cliente e sentir em si mesmo o que ele sente. Mais do que isso, o terapeuta deve tentar
captar mesmo aquilo de que o cliente não está de todo consciente, mas que está no limiar
da sua consciência. E, tendo compreendido o cliente dessa maneira, deve comunicar a ele
essa compreensão.
[437] Essas três atitudes terapêuticas concorrem para que o cliente alcance um estado de
congruência, saúde mental e crescimento psicológico.
[438] A pessoa madura, em estado de funcionamento ótimo, pode ser assim caracterizada:
total abertura à experiência, autoavaliação das próprias experiências, atitude não-
defensiva, congruência entre o self e o organismo, self em estado contínuo de mudança,
autoaceitação e, consequentemente, aceitação dos outros, capacidade de estabelecer
relações profundas, compromisso com o presente e criatividade.
[439] Rogers atuou como terapeuta durante toda a sua carreira profissional. As teorias
rogerianas da personalidade e da psicoterapia baseiam-se em milhares de horas de
observações clínicas. Embora não tenha sido um psicólogo experimental, Rogers
empenhou-se em demonstrar cientificamente a eficácia da sua abordagem terapêutica.
Procedeu a gravações sistemáticas de terapias completas por meio do registro sonoro das
mesmas, de transcrições integrais das sessões e mesmo da documentação cinematográfica.
Comparou os clientes que estavam em tratamento com um grupo de controle constituído
por pessoas que estavam em listas de espera. E conseguiu demonstrar que a terapia
centrada no cliente promovia mudanças positivas mensuráveis nas vidas das pessoas. Em
suma, como toda a psicologia humanista, a psicologia de Rogers não é uma psicologia de
laboratório, mas se pretende empiricamente fundada.
[440] A abordagem centrada na pessoa revelou-se aplicável a várias outras atividades além
da psicoterapia. Por exemplo, à educação. Em “Liberdade para aprender” (1969), Rogers
preconizou um novo método de ensino e aprendizagem: um método não-diretivo, centrado
no aluno; uma aprendizagem ativa, participada, criativa, espontânea, responsável e
personalizada.
[441] Todas as pessoas têm o desejo e a capacidade de aprender. Tudo o que cada um
necessita é de condições favoráveis. O professor é, portanto, apenas um facilitador do
processo. A sua função é criar um ambiente propício. A ele, cabe colocar à disposição dos
alunos recursos de aprendizagem, entre os quais os estudantes fariam as suas escolhas.
Tendo cercado os alunos de oportunidades, cabe ao professor dar-lhes liberdade,
encorajando-os a serem criativos. É preciso, pois, permitir aos estudantes aprofundarem o
que quiserem, segundo os seus interesses e no seu próprio ritmo. Segundo Rogers, o
professor deve abrir mão de todo mecanismo de coação. Ao invés de os alunos serem
avaliados pelo professor, os próprios estudantes avaliariam o seu rendimento.
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Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio)
Centro de Teologia e Ciências Humanas (CTCH)
Departamento de Psicologia
Unidade III
As grandes escolas de psicologia
10 - A psicologia cognitiva:
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[462] A principal característica da psicologia cognitiva é o retorno ao estudo dos processos
mentais. O behaviorismo expulsou a mente, a consciência e a cognição do campo da
psicologia. Passadas, porém, algumas décadas, com o cognitivismo, a psicologia readmitiu
o que fora banido. A mente está de volta! – eis o grito de guerra da revolução cognitiva.
[463] Um dos slogans de B. F. Skinner (1904-1990) era: Neither mind, nor neurons [Nem
a mente, nem os neurônios]. A psicologia cognitiva contemporânea e a neurociência têm se
interessado justamente pela mente e pelos neurônios.
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