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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA – UFBA

INSTITUTO DE LETRAS
DEPARTAMENTO DE LETRAS GERMÂNICAS

ALANA MURINELLY SOUZA MONTEIRO

UM OLHAR SOBRE A AUDIODESCRIÇÃO DE CENAS DE


SEXO EM FILMES DE PRODUÇÃO E CO-PRODUÇÃO
BRASILEIRA

Salvador
2011
ALANA MURINELLY SOUZA MONTEIRO

UM OLHAR SOBRE A AUDIODESCRIÇÃO DE CENAS DE


SEXO EM FILMES DE PRODUÇÃO E CO-PRODUÇÃO
BRASILEIRA

Monografia apresentada ao Curso de Língua Estrangeira Moderna da


Universidade Federal da Bahia, como requisito parcial para obtenção
do grau de bacharel em Língua Inglesa.

Orientadora: Profa. Dra. Eliana P. C. Franco

Salvador
2011
À minha família e amigos.
AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar a Deus, que nunca me desampara.

À minha orientadora, Eliana Franco, por sua paciência e por ter me ensinado tanto.

À banca, por dedicar seu tempo à leitura do nosso trabalho.

Aos professores Mohamed Bambá, José Mamede e a Renata Mascarenhas por suas sugestões
preciosas.

Aos meus pais e irmãos, por sua paciência, apoio incondicional e por me fazerem rir do meu
próprio nervosismo.

Ao Felipe, meu namorado, que mais uma vez se mostrou presente mesmo estando a
quilômetros de distância.

Aos meus colegas do grupo TRAMAD por me ajudarem com sugestões e conversas
inspiradoras.

Aos meus amigos, por me aguentarem e me encorajarem sempre.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 9

1 O SEXO NO CINEMA 12

1.1 O PORNOGRÁFICO E O ERÓTICO 13

1.2 NARRATIVA E MISE-EM-SCÈNE 15

1.3 ENCENAÇÃO 16

1.3.1 Aspectos da encenação 16

1.3.1.1 Cenário 16

1.3.1.2 O figurino e a maquiagem 17

1.3.1.3 Iluminação 17

1.3.1.4 Atuação: Movimento e Performance 18

2 A AD DE CENAS DE SEXO 20

2.1 AS REGRAS BÁSICAS 20

2.2 A CENSURA 22

2.3 A PESQUISA DA AD NO BRASIL 24

3 O SEXO AUDIODESCRITO EM FILMES EXPOENTES DO 27


CINEMA BRASILEIRO
3.1 ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA 29

3.1.1 O médico e a jovem: a primeira cena 29

3.1.2 O estupro 38

3.2 O SIGNO DA CIDADE 47

3.2.1 Júlia e Gabriel 47

3.2.2 Gil e Teka 53

3.3 SE NADA MAIS DER CERTO 59


3.3.1 Leo e Marcin 59

CONSIDERAÇÕES FINAIS 66

REFERÊNCIAS 70
RESUMO

O texto audiovisual é hoje um grande veiculador de informação, entretenimento e também de


formação. A Audiodescrição (AD), uma modalidade de tradução audiovisual, existe para
garantir que os deficientes visuais participem dos discursos sociais e culturais da
contemporaneidade. Em um país onde a AD está prestes a se tornar obrigatória na televisão e
onde a primeira norma está em processo de construção, pesquisas a respeito de como as
audiodescrições tem sido feitas se fazem relevantes. O presente trabalho propõe a análise de
descrições de cenas de sexo feitas pelos grupos TRAMAD (UFBA), MIDIACE (MG) e
LEAD (UECE), primeiros grupos a estudarem a AD mais sistematicamente no Brasil. As
cenas analisadas são dos filmes Ensaio sobre a Cegueira (2008), O Signo da Cidade (2007) e
Se Nada Mais Der Certo (2009), todos eles de produção ou co-produção brasileira. O objetivo
é observar se as normas existentes são seguidas e se existe censura ou minimização nas cenas
de sexo audiodescritas. Para isso são observados aspectos cinematográficos como a encenação
e são usados parâmetros baseados nas “regras de ouro” das normas alemã (Wenn aus Bilden
Worte Werden, 2004), inglesa (ITC Guidance, 2000) e americana (AUDIODESCRIPTION
COALITION, 2008) como “não interpretar”, “não resumir” e “não antecipar informação”. A
partir da análise das cenas selecionadas foi possível observar que existem diversas formas de
se construir uma cena de sexo cinematograficamente e que as normas estrangeiras, apesar de
ponto de partida, não se aplicam da mesma forma em diferentes produções e por diferentes
tradutores aqui no Brasil, seja por seus diferentes estilos, clientes ou até por uma auto-censura
que os leva a minimizar cenas de sexo.

Palavras-chave: Audiodescrição, acessibilidade, tradução audiovisual, cenas de sexo.


ABSTRACT

The audiovisual text has been a major disseminator of information, entertainment and also
education. The audio description (AD), a type of audiovisual translation, exists to ensure that
the visually impaired people participate in the social and cultural discourse of contemporary
society. In a country where the AD is about to become mandatory on television and where the
first guideline is in process of construction, research regarding how audio descriptions have
been done become relevant. This study proposes an analysis of descriptions of sex scenes
performed by the first groups to study the audio description more systematically in Brazil:
TRAMAD (UFBA), MIDIACE (MG) and LEAD (UECE). The scenes which have been
analyzed are from Blindness (2008), The Sign of the City (2007) and If Nothing Else Works
Out (2009), all of them either Brazilian productions or co-productions. The objective is to
observe if the guidelines are followed and if there is censorship or minimization of audio
described sex scenes. The analysis of film aspects, such as the mise-en-scène, and parameters
based on the "golden rules" of the German guideline (Wenn aus Bilden Worte Werden, 2004),
the English guideline (ITC Guidance, 2000) and American one (AUDIODESCRIPTION
COALITION, 2008) are used for this purpose. Some of the “golden rules” used to create the
parameters of analysis are “do not interpret”, “do not summarize” and “do not anticipate
information”. From the scenes which have been analyzed it is possible to observe that there
are different ways of building a scene in cinema and that the audio description guidelines
from other countries, although used as a starting point for describing a scene, are not used the
same way in different productions nor by different translators here in Brazil. These
differences in translation can be motivated by different styles, clients or even by a self
censorship that leads them to minimize sex scenes.

Key words: Audio description, accessibility, audiovisual translation, sex scenes.


LISTA DE IMAGENS

Figura 1 Capa do filme Ensaio sobre a Cegueira 29

Figura 2 O médico no refeitório 30

Figura 3 O médico e a jovem. Planos fechados em branco e cinza 31

Figura 4 “A jovem e o médico, em pé, fazem sexo” 31

Figura 5 Vulto das mulheres que caminham em fila 39

Figura 6 As luzes do corredor iluminam as mulheres uma a uma 39

Figura 7 O Barman segura o rosto da Esposa (do Oriental) 40

Figura 8 Capa do filme O Signo da Cidade 47

Figura 9 Imagem no momento da fala: “cê tá a fim?” 48

Figura 10 Rosto de Gabriel ao ver Júlia nua 49

Figura 11 Plano aberto e bem iluminado dos corpos de Júlia e Gabriel 49

Figura 12 Gil ergue Teca 54

Figura 13 Plano fechado na mão de Gil entre as pernas de Teca 54

Figura 14 Plano aberto dos corpos nus. Iluminação destaca a silhueta do corpo de 55
Gil
Figura 15 Capa do filme Se Nada Mais Der Certo 59

Figura 16 Marcin e Leo se entreolham. 59

Figura 17 “Suas bocas se afastam enquanto seus narizes ainda se tocam” 60

Figura 18 “Embaixo de um lençol, Leo beija a nuca e a orelha de Marcin...” 61


INTRODUÇÃO

A Tradução Audiovisual (TAV) é a uma área dos Estudos de Tradução que vem
crescendo exponencialmente devido à grande popularização do material audiovisual causada
pelo desenvolvimento tecnológico, exigindo uma maior preocupação com a difusão desse tipo
de texto. Segundo Frederic Chaume (2004), “o texto audiovisual é um texto que se transmite
através do canal acústico e do canal visual. Seu significado é, então, construído através da
interação de diversos códigos de significação, não só o código lingüístico.” (2004, p.15) Além
das imagens e dos diálogos, tem-se a trilha sonora, os efeitos especiais, barulhos de cena,
todos interagindo na formação do significado. São exemplos de modalidades de TAV a
dublagem, a legendagem e o voice-over, sendo a dublagem e a legendagem as mais populares
tanto entre o público quanto na academia (pesquisa).
O texto audiovisual é hoje um grande veiculador de informação, entretenimento e
também de formação (educação à distância, vídeos educativos para crianças etc). Devido a
isso, a produção audiovisual também vem crescendo aceleradamente, o que pode ser notado
ao se observar o crescente número de filmes lançados a cada ano, não só produções
hollywoodianas, mas brasileiras e de outros países. O número de séries de TV e reality shows
produzidos, o advento da internet e sua ampla utilização nos campos do entretenimento, da
formação, do trabalho e da educação, além da facilidade e rapidez com que esses materiais
são multiplicados e difundidos através da internet e DVD também demonstram a importância
do texto e da tradução audiovisual hoje.
Mas e as pessoas que não ouvem ou não enxergam? Como é garantido o seu acesso a
um texto tão presente na vida moderna? A lei No 10.098 (2000), que estabelece normas gerais
para a promoção da acessibilidade das pessoas com necessidades especiais e promove a
supressão de barreiras incluindo barreiras de comunicação, retoma a discussão sobre a
garantia da acessibilidade a materiais audiovisuais. A legendagem para surdos ou legenda
fechada, mais conhecida como closed caption, já está disponível na televisão brasileira (Rede
Globo) desde 1997 (ARAÚJO; FRANCO, 2003, p. 249). Agora a legenda fechada divide
espaço no meio acadêmico e, em breve na televisão, com uma nova modalidade de TAV em
prol da acessibilidade de produtos audiovisuais para os deficientes visuais, a Audiodescrição
(AD). Essa modalidade de tradução vem para garantir que os deficientes visuais participem
dos discursos sociais e culturais da contemporaneidade, como afirma Sabine Braun:
Em uma sociedade que conta cada vez mais com o conteúdo audiovisual
como fonte de informação, entretenimento e educação, pessoas com
deficiência visual correm o risco de serem excluídas de importantes
discursos sociais e culturais. (BRAUN, 2008, p.1)1

A AD sempre existiu informalmente, já que ela consiste em transformar imagens


visuais em palavras, função geralmente atribuída às pessoas próximas ao deficiente, como
parentes e amigos. Como modalidade de tradução audiovisual a AD surgiu nos EUA na
década de 70 (SILVA, 2009) e “consiste na transformação de imagens em palavras para que
informações-chave transmitidas visualmente não passem despercebidas e possam também ser
acessadas por pessoas cegas ou com baixa visão”. (FRANCO; SILVA, 2010, p.23) Em
condições ideais, o ouvinte tem acesso à AD através de um fone de ouvido sem fio que
permite que ele sente em qualquer lugar na platéia, no caso do cinema ou espetáculos teatrais
ou de dança (AUDIO DESCRIPTION COALITION, 2007). Quando isso não acontece, existe
a possibilidade de se fazer sessões audiodescritas (o filme com AD para todos no local), ou, se
o número de deficientes visuais for pequeno, pode-se fazer a AD sussurrada.
A AD possibilita o acesso de deficientes visuais (cegos e pessoas com baixa visão) e
não se restringe a programas e espetáculos filmados (programas de TV, filmes, produtos
disponíveis em DVD e na internet). Espetáculos ao vivo como no teatro, na ópera, em
espetáculos de dança e visitas a museus seguidas de touch tours (onde é permitido que as
obras sejam tocadas), além de pinturas e esculturas, são também parte daquilo que a AD pode
tornar acessível.
Alguns países já disponibilizam esse recurso de acessibilidade há bastante tempo. Por
ser uma área recente, a pesquisa em AD vem crescendo e as normas já estabelecidas são
constantemente revisadas, já que foram criadas através da prática de profissionais pioneiros.
Alguns dos países que têm essas normas, ou guidelines, para AD são os EUA
(AUDIODESCRIPTION COALITION, 2008), a Alemanha (Wenn aus Bilden Worte Werden,
2004), a Espanha (UNE 153020, 2005) e a Inglaterra (ITC Guidance, 2000). As normas vem
sendo usadas como guias, não como sistemas fechados, afinal, cada filme é um filme. No
entanto, elas possuem pontos em comum acerca dos mesmos temas, os quais são chamados de
“princípios básicos”.
Seguindo os princípios básicos da Audiodescrição, os quatro guidelines são unânimes
em dizer que o tradutor (audiodescritor) deve descrever apenas o que ele vê. A intenção é dar

1
“In a society which relies increasingly on audiovisual content as a source of information, entertainment and
education, visually impaired people are at risk of being excluded from socially and culturally important
discourses.” (BRAUN, 2008) Todas as traduções de citações em inglês e espanhol neste trabalho são de nossa
autoria.
ao deficiente visual igual acesso ao produto audiovisual daquele do vidente acrescido dos
diálogos, da trilha sonora e dos barulhos de cena. Dessa forma, nenhuma explicação extra,
antecipação ou interpretação deve ser fornecida, correndo o risco de ser vista como
subestimação da capacidade de compreensão do ouvinte, preconceito, ou mesmo censura.
Dentro desse contexto, e levando-se em consideração que o Brasil ainda não possui
sua própria norma e, por isso, alguns grupos vem utilizando as normas já estabelecidas em
outros países como material para referência, é possível levantar as seguintes questões: será
que as normas existentes são seguidas integralmente aqui? As normas funcionam da mesma
forma com qualquer tipo de cena? Pensando nisso, o presente trabalho tem como principal
objetivo analisar como cenas de sexo de filmes em português brasileiro vem sendo
audiodescritas.
Para isto foram selecionadas como corpus 5 cenas de sexo tiradas de 3 filmes
diferentes: duas cenas de Ensaio sobre a Cegueira (2008), duas cenas de O Signo da Cidade
(2007) e uma cena de Se Nada Mais Der Certo (2009). Os filmes escolhidos foram
audiodescritos pelos três principais grupos envolvidos em pesquisa e/ou propagação da AD no
Brasil atualmente, o MIDIACE (MG), o TRAMAD (UFBA) e o LEAD (UECE).
Os critérios de análise das audiodescrições foram estipulados a partir de parâmetros
baseados nos “princípios básicos” das normas inglesa (ITC Guidance, 2000), americana
(AUDIODESCRIPTION COALITION, 2008) e alemã (Wenn aus Bliden Worte Werden,
2004). Em cada norma estes princípios são expostos de maneira diferente, mas, basicamente,
se referem à interpretação do que se vê, antecipação de informação ou sobreposição das falas
ou sons importantes pela AD. Os critérios de análise serviram para padronizar e organizar a
análise de cada cena, não refletindo sempre as crenças da autora desta pesquisa e de sua
orientadora.
Este trabalho divide-se em três partes. Na primeira é discutida a presença do sexo no
cinema, bem como as tentativas de diferenciar o erótico do pornográfico a fim de se encontrar
um termo para as cenas aqui analisadas. Também nesta parte é feita uma listagem dos
aspectos cinematográficos que podem interferir na audiodescrição (narrativa e encenação),
dando-se maior importância aos aspectos da encenação. A relação destes aspectos com a
audiodescrição e a censura é abordada na segunda parte do trabalho. Na segunda parte,
também são apresentados o corpus deste trabalho, a justificativa e a metodologia de análise
escolhida. Na terceira parte a análise do corpus é desenvolvida seguida das considerações
finais.
1 O SEXO NO CINEMA

Uma das dificuldades encontradas durante a pesquisa para o presente trabalho foi
localizar material que se referisse às cenas de sexo em um filme que não fosse pornográfico.
Uma cena de sexo em um filme de ação, por exemplo, parece carecer de nomenclatura, mas
basta fazer uma busca sobre livros e artigos que se refiram a “filmes eróticos” na internet (em
sites de livrarias ou revistas científicas online) para encontrar uma grande variedade de
material. Então, as cenas inseridas em filmes de outros gêneros, que não o pornográfico, são
cenas eróticas? Elas levam os filmes dos quais fazem parte a serem classificados como
eróticos?
Segundo Ronald Bergan em seu livro “... ismos. Para entender o cinema” (2010,
p.116): “O cinema erótico pode ser sugestivo ou explícito. Ao contrário da pornografia, o ato
sexual ou a nudez não são compulsórios, mas o sexo é sempre o foco principal, com ou sem
amor e romance.” Podemos então perguntar como seria possível nomear cenas de sexo em
filmes classificados como Drama, onde a cena de sexo não é o foco principal, já que este é o
caso das cenas a serem analisadas.
Em contrapartida, na breve descrição da história do Erotismo no cinema, feita logo em
seguida no mesmo livro, Bergan começa com um filme de 1896 intitulado O beijo. Um
simples beijo na tela acabou resultando no Código Hays, nos Estados Unidos, norma restritiva
de produção adotada em 1930. Alguns exemplos de erotismo que se seguem não estão
diretamente ligados ao sexo em cena, mas a tabus em diferentes épocas e diferentes lugares (a
Europa, por sempre ter sido mais liberal em relação à sexualidade, teria mostrado cenas mais
ousadas antes). Portanto, a própria definição de erótico no cinema parece não ser fechada.
Bergan cita como exemplos de filmes eróticos marcantes:
 A caixa de Pandora (1929), Georg Wilhelm Pabst;
 Marrocos (1930), Josef von Sternberg;
 A um passo da eternidade, (1953), Fred Zinnemman;
 E Deus criou a mulher (1956), Roger Vadim;
 Boneca de carne (1956), Elia Kazan;
 Os amantes (1958), Louis Malle;
 O silêncio (1963), Ingmar Bergman;
 O último tango em Paris (1972), Bernardo Bertolucci;
 Ata-me (1990), Pedro Almodóvar;
 E sua mãe também (2001), Alfonso Cuarón.
Ele conclui dizendo que, mesmo com cenas chocantes de filmes eróticos existentes e,
mesmo com o fato de quase todos os tabus já terem sido quebrados, “os melhores filmes
eróticos conseguiram se manter num campo estético próprio, mantendo distância, ainda que
estreita, da pornografia” (2010. p.117) Então qual é essa distância?

1.1 O PORNOGRÁFICO E O ERÓTICO

A fronteira entre o erótico e o pornográfico é delimitada a partir de alguns critérios,


que, para Carlos Gerbase (2006, p.39), apresentam falhas. A distinção plástica, que se
caracteriza pela exposição dos órgãos sexuais em ação sexual (pornográfico) ou exposição da
ação entre os amantes, mas omissão dos órgãos sexuais - no máximo mostrados “em
descanso” (erótico), apresentam problemas a partir do momento em que alguns filmes nos
quais as genitálias são mostradas durante a ação sexual são classificadas como arte erótica e
até premiados. É o caso de O império dos sentidos (de Nagisa Oshima, 1976), Romance (de
Catherine Breillat, 1999), O pornógrafo (de Bertrand Bonello, 2002) e Nove canções (de
Michael Winterbotton, 2004). (Ibid., 2006, p.39)
A distinção psicológica seria outro critério problemático que caracterizaria a cena
“pornográfica” como uma cena que “restringe a representação do ato sexual aos seus
componentes mecânicos, enquanto uma cena „erótica‟ considera as relações psicológicas
(emocionais) presentes naquela relação.” (2006, p.39). Para Gerbase, não há como separar o
componente emocional/psicológico de uma cena onde aparece um homem com o pênis ereto,
por exemplo. Isso presumiria que esse ato fosse mecânico, dependente da vontade somente, o
que, para ele, transformaria o Viagra em algo de menor valor que uma aspirina.
A distinção intuitiva - “Não sei conceituar pornografia, mas sei perfeitamente quando
estou diante dela” (Ibid., p.40) - e a distinção estética (erótico = “bom gosto”; pornográfico =
“mau gosto”), além de serem subjetivas demais, estão relacionadas a critérios de valoração
estéticas ligados à história, à cultura, e a ideologias.
A distinção funcional, a última mencionada por Gerbase e a que tem maior relevância
para o presente trabalho, consiste em presumir que o material pornográfico sempre teria a
função de excitar e o erótico de permitir a “apreciação estética”. O autor diz que um
adolescente pode excitar-se ao ver uma foto de uma mulher totalmente vestida.
Para Gerbase (2006, p.44), essas tentativas de diferenciar um produto de outro servem a
propósitos econômicos e vão contra a arte:
Essa é a grande esperteza da maioria dos fabricantes de obras audiovisuais
com sexo (eróticas ou pornográficas): mantê-las longe de qualquer
transbordamento exagerado dos sentidos. (...) Um cinema essencialmente
comercial, que trata o filme (erótico ou pornográfico) apenas como uma
mercadoria, retirando da representação do sexo qualquer vestígio de
transbordamento, de embriaguez, de arte, será sempre um cinema distante do
homem. A primazia de uma lógica econômica, numérica, que exige uma
determinada performance financeira de um filme, acima de qualquer outra
avaliação, costuma “coagular” a representação do sexo.

Em entrevista ao programa No Estranho Planeta dos Seres Audiovisuais (Tv Futura,


2008), especificamente a um episódio dedicado ao Pornográfico, a especialista Eliane Robert
Moraes2 afirma que o sexo sempre é motivo de tabu e que o senso comum diferencia o
erotismo da pornografia da seguinte forma:
 Erotismo é aquilo que é velado, insinuado, “mostrado, mas não tudo”;
 Pornografia é aquilo que é escancarado.
Para ela, essa é uma diferença moral e não estética. Da mesma forma que Gerbase, ela
problematiza a questão ao citar obras “extremamente obscenas” (como ela mesma diz), mas
muito artísticas. Moraes compara o filme Bruna Surfistinha (2010) com o Marquês de Sade
(1996), contrastando o que ela caracteriza respectivamente como “extremamente velado”, mas
comercial e um filme mais “escancarado e obsceno”, mas artístico.
Moraes, então, afirma que, se quisermos fazer uma delimitação, poderíamos pensar em
Pornografia como aquilo que é comercial, e Erótico como aquilo que é arte. No entanto, ela
diz preferir não fazer essa delimitação diante da existência do que ela considera pornografia
artística e pornografia comercial. Usando a tentativa de delimitar o Erótico e o Pornográfico
de Moraes, Bruna Surfistinha (2010) seria considerado um filme pornográfico já que é
comercial, apesar de ser classificado como “drama” por diversos sites3.

2
Eliane Robert Moraes é professora de Literatura Brasileira no Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas
da FFLCH da Universidade de São Paulo (USP), onde se graduou em Ciências Sociais (1984), e defendeu
mestrado (1990) e doutorado (1996) em Filosofia. Foi professora titular da Faculdade de Comunicação e
Filosofia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e também atuou como professora e
pesquisadora visitante nas universidades da California em Los Angeles (UCLA, USA), de Perpignan Via
Domitia (FR) e Nova de Lisboa (PT). Suas pesquisas concentram-se na interface entre Literatura e Erotismo e
atualmente se dedica a investigar a erótica literária brasileira.
3
< http://www.adorocinema.com/filmes/bruna-surfistinha/ficha-tecnica-e-premios/>;
<http://www.cinemaum.com.br/filmes/estreias/1166-bruna-surfistinha>;
< http://cinema.yahoo.net/filmes/ficha/id/16890/nomefilme/bruna-surfistinha>.
Essa dificuldade em delimitar, ou classificar filmes com cenas de sexo hoje pode ser um
resultado do que Eduardo Coutinho4 chama de “supervisibilidade das coisas”. A obrigação de
mostrar tudo (tanto em relação ao sexo quanto à violência, por exemplo), não permite sugerir
imagens. Ele chama isso de “prostituição da imagem”. Já Eliane Robert Moraes chama essa
exposição nas cenas de sexo de “fast food do sexo”. Para ela, é necessário um espaço em
branco para se criar e inventar, essa acumulação de imagens não permite que o telespectador
invente.
Em virtude da óbvia dificuldade, hoje, em se classificar alguns filmes como Eróticos ou
Pornográficos, além da aparente carência de nomenclatura para uma cena de sexo que não
está inserida em nenhuma dessas classificações, mas sim em um drama, filme de ação ou
mesmo comédia, chamaremos as cenas estudadas neste trabalho de “cenas eróticas” ou
simplesmente “cenas de sexo”.

1.2 NARRATIVA E MISE-EN-SCÈNE

A construção de um filme envolve inúmeras técnicas, recursos e pessoal. É um grande


trabalho em equipe e nada é por acaso. A escolha do uso de algumas dessas técnicas de forma
padronizada se chama estilo do filme, e é a partir desse estilo que se construirá a narrativa de
um filme.
Segundo Bordwell e Thompson (2008, p.75), a narrativa é:
(…) uma cadeia de eventos com uma relação de causa-efeito ocorrendo em
um tempo e espaço. (...) Geralmente, uma narrativa começa com uma
situação; uma série de mudanças ocorre de acordo com um padrão de causa e
efeito; finalmente, uma nova situação emerge trazendo o fim da narrativa.
Nossa relação com a estória depende da nossa compreensão do padrão de
mudança e estabilidade, causa e efeito, tempo e espaço.5

4
Eduardo de Oliveira Coutinho (São Paulo, 11 de maio de 1933) é um cineasta brasileiro, considerado um dos
mais importantes documentaristas da atualidade.

5
“We can consider a narrative to be a chain of events in cause-effect relationship occurring in time and space.
(…) Typically, a narrative begins with one situation; a series of changes occurs according to a pattern of cause
and effect; finally, a new situation arises that brings about the end of the narrative. Our engagement with the
story depends on our understanding of the pattern of change and stability, cause and effect, time and space.”
(BORDWELL; THOMPSON, 2008, p. 75)
Quando escolhemos assistir a um filme, já manifestamos uma relação de expectativas
com a narrativa daquele texto audiovisual. Esperamos ver conflitos entre personagens,
problemas, uma relação de causa e efeito, um clímax e a resolução de conflitos.
(BORDWELL; THOMPSON, 2008, p. 74) Essas expectativas são confirmadas ou não aos
poucos, de acordo com o que os eventos, cronológicos ou não, vão nos dizendo. Cada
informação é importante e pode reforçar uma idéia anterior através de repetições
(paralelismo), de pistas sonoras e/ou visuais, ou através dos personagens. Essas mudanças e
essa história são contadas numa tela e existem elementos que ajudam a construir essa
narrativa, como é o caso da mise-en-scène.

1.3 ENCENAÇÃO

Mise-en-scène significa, literalmente, “colocar em cena”, e foi traduzido para o


português como encenação. O termo vindo do teatro, significa, no cinema, o controle do(s)
diretor(es) sobre o que vai aparecer na tela (BORDWELL; THOMPSON, 2008, p.112).
Bordan (2010, p. 146) define mise-en-scène como “a composição e a colocação de elementos
dentro de um enquadramento individual.” Bordwell e Thompson (2008) são mais detalhistas e
dizem que fazem parte da encenação alguns aspectos comuns ao teatro, como: cenário,
iluminação, figurino e maquiagem, atuação e movimentação dos atores em cena.
Apesar de ter aspectos semelhantes ao teatro, a encenação no cinema tem um aspecto
muito particular que a diferencia, a presença da câmera e as múltiplas possibilidades de
pontos de vista que ela proporciona. Jacques Aumont (2006, p.59) destaca a diferença da
encenação no teatro e cinema e adiciona o plano como peça chave de um filme quando diz
que “(...) a planificação é precisamente a encarnação da diferença entre o cinema e o teatro:
„onde pôr a câmara?‟ (...) Sem a planificação, a encenação de cinema estaria condenada a ser
indefinidamente o decalque da encenação de teatro (...).”

1.3.1 Aspectos da encenação

1.3.1.1 Cenário

Bordwell e Thompson também usam a comparação com o teatro quando analisam os


aspectos da encenação no cinema. Para os autores, o cenário é menos importante no teatro do
que no cinema: o teatro se apóia na performance dos atores, enquanto, no cinema, o cenário
pode ser o destaque de uma cena. Tudo vai depender da decisão do diretor ou diretores. O
cenário tanto pode ser destaque, quanto pode ser simplificado como forma de chamar atenção
para os outros elementos em cena, como os atores: “O cenário pode superar os atores ou pode
ser reduzido a nada.” (BORDWELL;THOMPSON, 2008, p.117)6.

1.3.1.2 O figurino e a maquiagem

O figurino pode ter funções bem específicas em um filme e são muitas as


possibilidades. (BORDWELL;THOMPSON, 2008, p. 119) Ele pode ser usado para mostrar
classe social e relações de poder entre personagens, além de mostrar mudanças de
comportamento. As cores do figurino podem servir para chamar a atenção do telespectador
para alguém em particular ou camuflar essa pessoa. A maquiagem (ou a ausência dela)
também faz parte do figurino e serve, algumas vezes, para acentuar qualidades expressivas do
rosto do ator, especialmente o olhar. (BORDWELL;THOMPSON, 2008, p. 124) Além de
todas essas possíveis funções, a maquiagem é peça chave do figurino de filmes de ficção
científica e terror, uma aliada dos efeitos especiais.

1.3.1.3 Iluminação

O jogo de “mostrar e esconder” as peças do quebra cabeça que formam a cena é, em


grande parte, responsabilidade da iluminação. De acordo com Bordwell e Thompson (2008, p.
124) “Áreas mais claras e escuras dentro de um enquadramento ajudam a criar a composição
geral de cada plano e guiam nossa atenção a certos objetos e ações.” 7. Desta forma, um gesto
importante, uma arma, um objeto que indicará um assassino mais tarde, pode ser mostrado
sutilmente através de um jogo de luz e sombra, fazendo com que o telespectador faça suas
próprias inferências sobre a narrativa.
Bordwell e Thompson destacam ainda quatro aspectos da iluminação: a qualidade, a
direção, a fonte e a cor. A qualidade se refere à intensidade dessa luz: uma luz mais intensa
forma sombras bem definidas, texturas mais ásperas e contornos mais definidos, enquanto
uma luz mais suave resulta em uma iluminação mais suavizada, mais branda.

6
“Setting can overwhelm the actors or it can be reduced to nothing.”
7
“Lighter and darker areas within the frame help create the overall composition of each shot and thus guide our
attention to certain objects and actions.”
O jogo de sombra e luz é também um artifício usado para destacar personagens, ações
e para insinuar mistério. Em cenas de sexo esse jogo é comum como forma de suavizar o ato
sexual, deixando-o mais “sutil” ou “menos explícito”. Com a tecnologia, a cor também pode
ser alterada. O uso de uma técnica que deixa a luz amarelada pode dar a impressão de que
uma cena é iluminada por tochas, velas ou uma fogueira, por exemplo.
A direção da luz se refere ao percurso que ela faz da sua fonte até o objeto a ser
iluminado. Ela pode ser frontal (eliminando sombras visíveis), lateral (criando jogo de
sombras no objeto iluminado), pode vir de trás do objeto (criando silhuetas), de baixo
(distorcendo traços, e por isso é muito usada em filmes de terror) ou pode vir de cima
(destacando os traços do rosto do ator ou criando uma figura fantasmagórica).
A fonte de luz pode ser natural, o que acontece em muitos documentários, mas
Bordwell e Thompson (2008, p. 127) explicam que:
Na maioria dos filmes de ficção, os abajures e postes que vemos na encenação
não são a principal fonte de iluminação para a filmagem. Essas fontes de luz
que estão visíveis, no entanto, motivam a decisões a respeito da iluminação e
que são feitas na produção.8

1.3.1.4 Atuação: Movimento e Performance

Outro aspecto da encenação que o diretor controla é a movimentação e interpretação


dos atores e das “figuras/silhuetas”.
O diretor também pode controlar o comportamento de várias figuras na
encenação. Aqui, a palavra figura inclui uma variedade de possibilidades, já
que a figura pode representar uma pessoa, mas também pode ser um animal
(Lassie, o burro Balthasar, o pato Donald), um robô (R2D2 e C3PO na série
StarWars), um objeto (...), ou simplesmente uma silhueta. A encenação
permite a tais figuras expressar sentimentos e pensamentos; além disso ela
pode dinamizar tais elementos para criar vários padrões cinéticos.
(BORDWELL; THOMPSON, 2008, p. 132)9

A movimentação, as expressões faciais, a indumentária, tudo isso classificará o


personagem e explicitará seu papel na narrativa do filme. Sua presença no enquadramento, em

8
“In most fictional films, the table lamps and streetlights you see in the mise-en-scene are not the principal
sources of illumination for the filming. But these visible sources of light will motivate the lighting decisions
made in production.”
9
“The director may also control the behavior of various figures in the mise-en-scene. Here the word figures
covers a wide range of possibilities, since the figure may represent a person but could also be an anirnal (Lassie,
the donkey Balthasar, Donald Duck), a robot (R2D2 e C3PO in the StarWars series), or object (…) or even a
pure shape (4.80). Mise-en-scène allows such figures to express feelings and thoughts; it can also dynamize them
to create various kinetic patterns.”
conjunto com as técnicas de iluminação, edição são, portanto, peças fundamentais da
construção de uma narrativa e nos fazem acompanhá-la.
Em cenas de sexo, alguns elementos ligados à encenação são recorrentes. Dentro do
universo dos cenários existe uma grande ocorrência de cenas de sexo em quartos, o que é
considerado um clichê. A iluminação muitas vezes é baixa e faz com que não vejamos
contornos claros; o enquadramento geralmente envolve filmagens em planos aproximados que
proporcionam imagens de partes dos corpos dos atores, ou silhuetas desfocadas. Essas
características suavizam a cena de sexo sugerindo ações e deixando boa parte da criação da
imagem por conta da imaginação do público. Elas podem ser causadas por diversas razões
como, por exemplo, o aumento da bilheteria, afinal, se a classificação for livre e as cenas
suavizadas mais pessoas assistirão ao filme.
Diante de tantos pontos significativos dentro da construção de um filme, pode-se
inferir que todos devem ser levados em conta, mais especificamente ao audiodescrever uma
cena de sexo.
2 A AD DE CENAS DE SEXO

2.1 AS REGRAS BÁSICAS

A Audiodescrição é uma das muitas modalidades de Tradução Audiovisual (TAV),


que não consiste em trabalhar somente com o signo lingüístico, mas também com a
complexidade do texto audiovisual. Iracema Vilaronga define a Audiodescrição como:

(...) o áudio extra, integrado ao som original do produto audiovisual, contendo


descrições tais como: cenários, expressões faciais e corporais dos personagens,
conteúdo de texto, figurinos, entradas e saídas de personagens, indicação de
tempo e espaço, movimentações em geral e demais elementos relevantes para
a captação e compreensão da obra por pessoas impossibilitadas de usufruir
total ou parcialmente dos recursos visuais. (VILARONGA, 2009, p.1060)

Para Sabine Braun (2008) até mesmo a edição e as técnicas de movimentação de


câmera contribuem diretamente para a construção de significado, o que, segundo Payá, torna
o conhecimento da linguagem cinematográfica um requisito para o audiodescritor:

Pensar na audiodescrição como uma adaptação dos produtos audiovisuais


passa por considerá-la uma atividade tradutora de caráter intersemiótico: se
trata de traduzir imagens em palavras. Nesse sentido, no momento de redigir o
roteiro audiodescritivo de um filme, o audiodescritor deve conhecer tanto o
sistema meta (sistema verbal) como o sistema de origem (sistema
audiovisual), e mais concretamente uma de suas principais linguagens
específicas: a linguagem cinematográfica. (PAYÁ, 2007, p.4)10

Levando-se em consideração a importância da linguagem cinematográfica, questões


sobre o que deve ser descrito ou, dependendo do tempo disponível, do que deve ser priorizado
são centrais para a realização da AD. As normas (ou guidelines) para AD dos EUA
(AUDIODESCRIPTION COALITION, 2008), da Alemanha (Wenn aus Bilden Worte
Werden, 2004), da Espanha (UNE 153020, 2005) e da Inglaterra (ITC Guidance, 2000)
discutem vários pontos em comum:
 a definição de Audiodescrição;

10
“Pensar en la audiodescripción como una adaptación de los productos audiovisuales pasa por considerarla una
actividad traductora de índole intersemiótico: se trata de traducir imágenes en palabras. En este sentido, a la hora
de redactar el guión audiodescriptivo de una película, el audiodescriptor debe conocer tanto el sistema meta
(sistema verbal) como el sistema origen (sistema audiovisual), y más concretamente uno de sus principales
lenguajes específicos: el lenguaje cinematográfico.”
 como a AD é feita, já que alguns procedimentos variam de país para país (em alguns
países ela é feita por um audiodescritor e revisada por outro, já na Alemanha ela é feita
por dois tradutores e um deficiente visual-consultor);
 as tecnologias disponíveis em cada país para que se ouça a AD;
 a confecção de roteiros;
 os aspectos lingüísticos (como “evitar o uso de metáforas e regionalismos”, “evitar o
uso de „cerca de‟, „aproximadamente‟ quando descrever tamanhos”);
 as especificações sobre diferentes tipos de AD ao vivo ou pré-gravadas (peças,
materiais em vídeo ou DVD, programas de TV, exibições em museus, óperas e
espetáculos de dança);
 aspectos polêmicos (raça, etnia, nacionalidade);
 a censura.

Não há um consenso entre as normas sobre como a AD deve ser feita, algumas normas
divergem quanto a certos aspectos. Podemos usar como exemplo a questão da nomeação dos
personagens. A norma americana diz que os personagens devem ser nomeados apenas depois
que seus nomes forem mencionados no diálogo do filme. Até que esse nome seja mencionado,
o personagem deve ser identificado por uma característica marcante, por exemplo, “o homem
de chapéu” ou “a mulher ruiva”.
Já a norma alemã reconhece que esta é uma questão problemática e que os
personagens deveriam ser identificados por características marcantes até que seus nomes
sejam mencionados, mas mostra-se mais flexível ao reconhecer que, em certos tipos de filme
os personagens principais só têm seus nomes revelados muito tarde. Por conta disso, eles
optam por nomear os personagens no começo do filme e, se possível, fornecer mais
informações como idade, estatura, cor dos cabelos.
As normas possuem também o que algumas chamam de “princípios básicos” ou
“regras de ouro”, que geralmente são semelhantes, mas são definidas ou aplicadas de forma
diferente. A norma americana, por exemplo, tem como regra principal “descreva o que vê”.
De acordo com essa norma, nós vemos ações e gestos, não vemos o que motiva esses gestos,
logo uma AD deveria dizer “ela cerra os pulsos” ao invés de dizer “ela está com raiva”, ou
“ela franze a testa” ao invés de “ela está tensa”. Outras normas são mais flexíveis quanto a
isso. A norma inglesa chama de “regras de ouro” as seguintes regras: “descreva o que está lá
[na tela]”, “não dê uma versão pessoal do que está na tela” e “nunca sobreponha diálogos ou
comentários”. Já a norma alemã diz:
Para o trabalho concreto de descrição isto significa não abreviar
acontecimentos, resumindo-os (não: „ele é derrubado a golpes‟, mas sim, „o
mascarado dá-lhe um soco na cara, joga-o no chão e lhe dá pontapés na
barriga‟), e não interpretar acontecimentos ou anteceder explicações que
ainda virão mais tarde (não: „a sua úlcera sempre dói‟, mas, mais
precisamente, „ele pressiona a sua mão na barriga, seu rosto está desfigurado
pela dor‟). (DOSCH; BENECKE, 2004, p.20-21)11 (tradução não
publicada).12

No que concerne as “regras de ouro” as normas americana, alemã e inglesa são muito
semelhantes, portanto constituem importantes critério para nortear e avaliar o trabalho do
audiodescritor. Contudo, não devem ser vistas como verdades absolutas já que cada filme terá
desafios diferentes e que outros fatores também afetam a AD, tais como o tempo limitado
disponível entre diálogos e sons importantes.

2.2 A CENSURA

Gabriela L. Scandura em seu artigo “Sex, Lies and TV: censorship in subtitling”
(2004) afirma que a censura existe em modalidades de Tradução Audiovisual populares, como
a legendagem, em forma de omissões ou substituições de frases, alusões, ou referências
eróticas, vulgares ou inconvenientes. As normas para AD sinalizam para a possibilidade de
censura na descrição de cenas de sexo. Ao tratar de diferentes graus de dificuldade em um
filme, a norma alemã apresenta “cenas eróticas e/ou de amor” como cenas difíceis de serem
descritas, já que “exigem uma descrição especialmente empática” (BENECKE, 2004, p. 10).
A norma em questão, no entanto, não é mais específica em relação a esse tipo de cena, o que
também acontece com a norma americana. Esta última menciona, em um único parágrafo, o
fato da censura ser injusta tanto com o material quanto com o público (aqui chamado de
“ouvinte”), mas não possui uma seção que discuta a descrição de cenas de sexo:

Audiodescritores que censuram informação por conta do seu próprio


desconforto, falham para com seus ouvintes. Os audiodescritores devem
11
“(…) Ereignisse nicht zu verkurzen, indem man zusammenfasst ( Nicht:Er wird zusammengeschlagen,
sondern etwa: Der Maskierte schlagt ihm mit der Faust ins Gesicht, storBt ihn zu Boden und tritt mit dem Fub in
seinen Bauch), und Ereignisse nicht zu interpretieren oder Erklarungen, die apater kommen vorwegzunehmen
(Nicht: Sein Magengeschwur tut wieder weh, sondern genauer: Er presst seine Hand an den Bauch, sein Gesicht
ist schmerzverzerrt).“
12
Tradução não publicada de autoria de Marlene Holzhausen.
descrever qualquer informação sobre nudez, atos sexuais, violência, etc.
Ouvintes devem ter acesso a tudo que é evidente ao público vidente e se o
audiodescritor sente que descrever certas cenas o deixará desconfortável, ele
não deve aceitar o serviço. (AUDIO DESCRIPTION COALITION, 2007,
p. 4)13

A norma inglesa dispõe de uma seção dedicada a “Programas com sexo explícito ou
cenas violentas”, onde a descrição de cenas de sexo é considerada um tema delicado: “A
descrição de material com cenas explícitas de sexo deve ser lidada com sensibilidade. (...) Se
feita insensivelmente, o material pode gerar constrangimento ou soar grosseiro ou
monótono”14 (ITC Guidance, 2000, p.31).
Ao ser mais específica, a norma fala da edição dos materiais de acordo com o horário
que são exibidos na TV da Inglaterra, e que o audiodescritor deve estar atento para o horário
que o programa será exibido, já que cenas de violência ou palavrões serão editadas.
Para Cristina Kessler Felizardo (2010), a própria construção de cenas eróticas no
cinema se depara com decisões a fazer em torno da explicitude das mesmas: “as ações serão
mostradas ou sugeridas para que o público imagine o resto”. Dessa forma, para ela, a censura
ou suavização, quando ocorre, se dá por diversas razões:

Do tratamento dado à temática ao grau de explicitude imagética, as opções


feitas na confecção da obra cinematográfica podem produzir resultados
diversos, dos mais realistas e explícitos àqueles que fornecem apenas sutis
indicações, provocando o espectador a complementar a ação com o auxílio de
sua imaginação. O “proibido” e o “permitido” em termos de representações do
sexo no cinema estão ligados a um complexo conjunto de interesses que
envolvem produtores, governos, grupos religiosos e a sociedade em geral.
Assim, estão envolvidos no tema tanto a interdição (censuras, códigos de
produção, sistemas de auto-regulamentação) quanto a afirmação (discursos
produzidos pelos filmes em torno do sexo). (FELIZARDO, 2010, p.254)

A série No Estranho Mundo dos Seres Audiovisuais (2008), exibida pelo Tv Futura,
aborda a censura como “parte integrante do audiovisual Erótico”, representado pelas tarjas
pretas, borrões ou cortes secos.
Quando essa censura acontece, nada mais lógico do que ela ser traduzida pelo
audiodescritor. Mas e quando a iluminação é forte? E quando o plano é aberto e podemos ver

13
Describers who censor information because of their own discomfort fail their listeners. Describers must say
the factual information about nudity, sexual acts, violence, etc. Listeners should now everything that is evident to
sighted people. If a describer feels that describing particular material will make him/her uncomfortable, s/he
should not accept this assignment. (AUDIO DESCRIPTION COALITION, 2007, p. 4)
14
Describing sexually explicit material has to be sensitively handled. (...) If handled insensitively they may be
embarrassing, crude or just very dull.
claramente a movimentação dos corpos durante o ato sexual? E quando não há “tarjas pretas,
borrões ou cortes secos”? Será que essa mesma minimização que ocorre em legendas e
dublagens acontece nas audiodescrições? Se temos que descrever o que vemos, sem resumir,
interpretar ou antecipar e, ao mesmo tempo, sermos “sensíveis” para com as cenas de sexo,
como isto se dá nas cenas dos 3 filmes brasileiros selecionados para o presente trabalho?

2.3 A PESQUISA DA AD NO BRASIL

A AD como atividade profissional voltada para a acessibilidade começou nos anos 70


nos EUA até que chegou à Europa nos anos 80, se espalhando desde a Inglaterra até países
como Alemanha e Espanha. As pesquisas no assunto, no entanto, só começaram nos anos 90 e
tinham como principais objetivos estudar o assunto para sua implantação na TV. Segundo
Franco e Silva (2010, p. 27-28):
Nessa fase inicial, as pesquisas procuravam traçar um perfil da população com
deficiência visual e seus hábitos televisivos, estabelecer se a audiodescrição seria um
recurso apreciado por seu público alvo, e determinar se o seu uso contribuiria para que
esse público compreendesse materiais audiovisuais mais facilmente.

Aqui no Brasil as primeiras pesquisas na área tinham objetivos semelhantes. Em 2005,


o grupo de pesquisa formado na época por alunos da Graduação e Pós-Graduação da
Universidade Federal da Bahia (UFBA) e dois especialistas da Universidade Estadual de Feira
de Santana (UEFS) realizaram um projeto piloto com testes de recepção com cegos e pessoas
com baixa visão. Em sua primeira fase, desenvolvida em Salvador, a pesquisa pioneira no
Brasil e coordenada pela professora doutora Eliana Franco proporcionou a apresentação da
AD para muitos cegos que nunca tinham ouvido falar da modalidade. Além disso, constatou
que muitos cegos tem hábitos televisivos e se beneficiam da AD, como um dos entrevistados
atestou:
“Eu estou acostumado a ouvir filmes sem audiodescrição. A audiodescrição é muito
importante porque evita que fiquemos imaginando muito, que nos sintamos ansiosos
sobre o que está acontecendo (...) Assim, a audiodescrição nos estimula, nos faz sentir
vontade de assistir mais filmes.” (FRANCO, 2007, p. 183)

Apesar de terem hábitos televisivos, não é de se estranhar que um grande número de


deficientes visuais jamais tenha ouvido falar em AD, afinal ela é recente no Brasil. Tendo sido
disponibilizada publicamente em 2003 pela primeira vez (Festival Assim Vivemos), só em
2005 foi disponibilizada em um DVD. Irmãos de Fé foi o primeiro filme com audiodescrição
a ser lançado no país, e em 2008 foi lançado Ensaio sobre a Cegueira. O roteiro de AD do
filme Ensaio sobre a Cegueira foi feito pela MIDIACE (Associação Mídia Acessível), a
primeira associação de audiodescritores do Brasil criada em 2008 e formada, na época,
basicamente por integrantes das universidades federais de Minas Gerais, Bahia e universidade
estadual do Ceará.
O TRAMAD (Tradução, Mídia e Audiodescrição), grupo de pesquisa coordenado pela
Dra. Eliana Franco (UFBA) que começou em 2004, realizou a revisão do roteiro em questão.
Hoje, o grupo TRAMAD é formado por voluntários graduandos, graduados e pós-graduados,
além de uma consultora com deficiência visual, e vem trabalhando com a AD de filmes, e
espetáculos de teatro e dança. A primeira dissertação de mestrado em AD no Brasil é de
autoria de uma integrante do grupo (SILVA, 2009).
O LEAD (Legendagem e Audiodescrição), grupo coordenado pela Dra. Vera Lúcia
Santiago Araújo (UECE) vem também desenvolvendo muitas pesquisas na área além de
promover visitas guiadas a museus, promoção de festivais acessíveis e AD de peças e filmes,
inclusive filmes locais. Esses três grupos se destacam como pioneiros na pesquisa da AD aqui
no Brasil, mas é cada vez mais evidente o crescente interesse na área em diferentes partes do
país e áreas do conhecimento.
Em uma mesa redonda sobre audiodescrição realizada na Faculdade de Comunicação
da UFBA (FACOM) no dia 31 de Maio deste ano, a doutoranda Renata de Oliveira
Mascarenhas apresentou um panorama sobre as pesquisas em AD em andamento no Brasil.
Abaixo seguem alguns dos exemplos apresentados por ela:

PROJETOS EM LETRAS
 Acessibilidade audiovisual via audiodescrição: em busca de um modelo (TRAMAD/
UFBA);
 SOBREMESAS: apresentações de rua de coreografias curtas com audiodescrição
(TRAMADAN/ UFBA);
 Elaboração de um modelo de audiodescrição para cegos a partir de subsídios dos estudos
de multimodalidade, semiótica social e estudos da tradução (PROCAD/ UECE/ UFMG);
 DVD acessível: audiovisual e acessibilidade: produção e divulgação de DVDs para cegos e
surdos (UECE/ LEAD/ BNB CULTURA);
 Tradução audiovisual: audiodescrição para cegos (UNB).
PROJETOS EM EDUCAÇÃO
 Imagens que falam (UFPE);
 Acessibilidade à comunicação: promovendo a cidadania da pessoa com deficiência na
escola (UFPE);
 Preconceito em relação aos „incluidos‟ da educação inclusiva (UNEB);
 Educação Inclusiva: Ambiente Web acessível com Objetos de Aprendizagem para
Representação Gráfica (UFSC);
 Design de interface gráfica humano-computador em ambientes adaptativos para web
(UFSC);
 A TV Digital Interativa gerando Educação, tecnologia e participação em Cidades Radicais
(UNESP).

PROJETOS EM COMUNICAÇÃO
 Acessibilidade à comunicação, ciberativismo, cegueira e percepção tátil, arte, literatura e
comunicação (UFPB);
 Web e acessibilidade (UFBA-FACOM).

Observa-se que os estudos em AD ainda se concentram nos cursos de Letras e


Tradução, mas o tema já chama a atenção de outros campos. Além desses trabalhos existem 8
dissertações em AD em andamento. Também chama a atenção o fato de que ainda não houve
nenhuma pesquisa que abordasse a questão da audiodescrição de cenas de sexo aqui no Brasil.
Na mesma mesa, a consultora do grupo TRAMAD, Iracema Vilaronga mostrou um
panorama da luta pela obrigatoriedade da AD na televisão brasileira, as leis de acessibilidade
e as portarias que anulavam ou adiavam a implementação da AD ou diminuíam o tempo de
AD proposto pela portaria anterior, atrasando todo o processo. Sabe-se que em Julho deste
ano a exibição de 2 horas semanais de programação audiodescrita passa a ser obrigatória, o
que consiste em um pequeno primeiro passo em direção à acessibilidade mais plena dos meios
audiovisuais.
Com a notícia da obrigatoriedade da exibição de 2 horas semanais de programação
audiodescrita na televisão brasileira, a tendência é que mais pesquisadores mostrem interesse
em desenvolver estudos na área. O momento é propício já que, além da exibição obrigatória, a
ABNT está em processo de construção de uma norma brasileira para audiodescrição.
3 O SEXO AUDIODESCRITO EM FILMES EXPOENTES DO CINEMA
BRASILEIRO

Para o presente trabalho, que tem como objetivo analisar como as cenas de sexo vem
sendo audiodescritas no Brasil, foram selecionadas 5 cenas retiradas de 3 filmes em português
brasileiro. Somente a audiodescrição das cenas de sexo de cada filme será analisada. As cenas
foram retiradas dos seguintes filmes:
 Ensaio sobre a Cegueira (2008): 2 cenas. Audiodescrição: MIDIACE/ TRAMAD.

 O Signo da Cidade (2007): 2 cenas. Audiodescrição: MIDIACE.

 Se Nada Mais Der Certo (2009): 1 cena. Audiodescrição: LEAD.

Os filmes escolhidos foram audiodescritos pelos primeiros grupos que estudaram a


audiodescrição de forma sistemática no Brasil, portanto usaram as normas européias e a
americana (as únicas disponíveis até então) como referência. Os filmes tem em comum
também o fato de serem brasileiros (o Ensaio sobre a Cegueira é uma co-produção brasileira)
e todos fazem parte do acervo do grupo TRAMAD. As cenas analisadas tem a duração de 2
minutos e meio, em média, e dos 3 filmes selecionados, todos são longas.
A análise foi construída em três etapas. Primeiro, as cenas selecionadas foram transcritas.
Essa transcrição resultou em uma primeira tabela com 3 colunas. Na primeira coluna da tabela
encontra-se a marcação do tempo de entrada e saída da audiodescrição e das falas dos
personagens. Na segunda coluna está a transcrição da audiodescrição, e na terceira, as falas
dos personagens. A transcrição das falas encontra-se em itálico, em letra minúscula e as
pausas são indicadas por reticências. A transcrição da audiodescrição, por representar a
transcrição do que seria o roteiro da AD, segue a pontuação normal de um roteiro.
Posteriormente, as cenas foram contextualizadas dentro da narrativa do filme,
descrevendo-se brevemente o que acontecera antes e a relevância da cena dentro do filme. Em
seguida as cenas foram assistidas novamente e foi acrescentada uma quarta coluna à tabela
com comentários sobre a cena e a AD. Os comentários foram escritos lado a lado com o
momento da cena e AD observados.
Finalmente, foi feita uma análise da AD da cena assistida de acordo com os seguintes
parâmetros:
 Aspectos da encenação, como o cenário, a iluminação, enquadramento, presença de
planos fechados, médios ou abertos. Entende-se que a combinação desses aspectos
resulta em uma cena mais “explícita” ou mais “sutil”;
 Aspectos da audiodescrição tais como a voz do locutor (se masculina ou feminina),
velocidade de leitura do roteiro e o ritmo da AD (se existem pausas para que se ouça
os barulhos de cena e fundos musicais);
 “Princípios básicos” criados a partir de uma combinação das normas inglesa,
americana e alemã.
Como já foi dito anteriormente, ao citar “princípios básicos” ou “regras de ouro”, as
normas parecem repetir idéias semelhantes com palavras diferentes. A norma americana cita
como regra “descreva o que vê”. A norma inglesa usa 3 regras: “(...) descreva o que está lá,
não dê uma versão pessoal do que está na tela e nunca sobreponha diálogos ou comentários”.
(ITC Guidance, 2000, p.9).15 A norma alemã fala em descrever “tudo o que existe para ser
visto” e depois explica que “para o trabalho concreto da descrição isso significaria: não
abreviar acontecimentos, resumindo-os (...) e não interpretar acontecimentos ou anteceder
explicações que ainda virão mais tarde” (DOSCH; BENECKE, 2004, p. 20-21). Anteceder
informações, segundo a norma em questão, significaria estragar uma surpresa ou pôr fim a um
mistério que ainda não foi esclarecido ao público vidente, como: “é o assassino quem está
atrás da porta, (...) o policial é um mentiroso” (Ibid, 2004, p.21).
Juntando essas regras chegou-se ao parâmetro que será usado para analisar as cenas neste
trabalho, que são:
 não interpretar (não dar sua opinião);
 não resumir/ generalizar/ minimizar;
 não antecipar;
 não sobrepor.

15
“There are three golden rules to description: describe what is there, do not give a personal version of what is
there and never talk over dialogue or commentary.”
3.1 ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA

Filme: Ensaio sobre a Cegueira


Ficha Técnica

Diretor: Fernando Meirelles


Roteirista: Don Mckellar
Baseado na obra de José Saramago
Distribuição: FOX
Lançamento: 2008
Duração: 121 min
País: Canadá / Brasil / Japão
Língua: Inglês / Japonês
Roteiro Audiodescrição e Tradução
Legendas: Daniela Cesar, Patrícia Freitas
e Rodrigo Campos (MIDIACE)
Revisão e Finalização de Roteiro e
Tradução: Avany Lima, Eliana Franco e
Iris Fortunato (TRAMAD)
Figura 1: Capa do filme Ensaio sobre a Cegueira.

3.1.1 O médico e a Jovem: a primeira cena

A cena se passa logo após o personagem identificado como “O Médico” voltar de uma ala
onde a comida era distribuída. Nesse ponto do filme os personagens estão sendo chantageados
por um personagem identificado como “O Barman”, que tem uma arma e chantageia as
pessoas de outras alas. Para receber comida, as pessoas de outras alas devem dar jóias ou
dinheiro. “O Médico” entrega jóias e recebe apenas duas caixas de comida, quando deveria
receber três. Ao se manifestar contra a injustiça e discutir com um homem que ele percebe
estar usando uma máquina de escrever Braille, é ameaçado com uma arma em seu pescoço
pelo “Barman”.
Em seguida, ao entregar as refeições em sua ala, o Médico percebe que algumas pessoas
reclamam de terem que dividir a comida e questionam a quantidade recebida. Chateado,
quando sua esposa, a única pessoa que enxerga, o oferece comida, ele recusa batendo na mesa
e derrubando a comida da colher. Sua mulher se retira e quando todos saem, a personagem
identificada como “A Jovem” traz comida e o consola dizendo que ele não poderia mesmo ter
reagido, ou começaria uma guerra.

Figura 2: O médico no refeitório.

O cenário é dominado pela cor cinza, cor predominante no filme, e é um refeitório que
está bastante sujo. No começo da cena transcrita o plano aberto permite que se veja o chão do
refeitório repleto de pequenos sacos plásticos e papéis, poças e um pano abarrotado. O
enquadramento, com o homem à direita ao fundo, dá importância e atenção ao cenário. A
iluminação é fraca e vem detrás da mesa onde o homem se encontra, do alto, permitindo a
visualização de uma silhueta masculina.
Em seguida, a partir da chegada da Jovem, os planos se tornam mais fechados,
próximos ao rosto dos dois e permitem a visualização da mesa com muitos sacos plásticos e
caixinhas de suco industrializado. O cenário apóia a fala do Médico de que o lugar “parece
uma privada” e a passagem do tempo no filme: um lugar que era um antigo
hospital/manicômio, depois de muito tempo sem cuidados, agora está imundo.
Os personagens vestem roupas escuras e de aparência gasta e suja (ele uma blusa
verde musgo e ela uma blusa violeta desbotada), os cabelos do homem e sua barba estão
crescidos (mais uma referência à passagem do tempo).
Figura 3: O médico e a jovem. Planos fechados em branco e cinza.

A partir do momento em que os personagens começam a se beijar, a tela fica branca e


uma música lenta no piano é ouvida. Os planos agora são fechados e o jogo de closes em
branco e cinza sugerem movimentos e deixam muito da cena para a imaginação do público.

Figura 4: “A jovem e o médico, em pé, fazem sexo.”

Menos de um segundo antes da entrada da Esposa na cena, o branco e a música lenta


que sugeriam uma certa fantasia e limpeza em meio àquele ambiente, somem. Dá-se lugar
novamente ao cinza e gemidos mais fortes, à realidade. Pela primeira vez é possível ver os
corpos dos personagens e a palavra “sexo” é mencionada, mas ainda não há tempo para se
descrever a disposição de um corpo em relação ao outro, o que acontece na sequência.
A voz usada na AD de Ensaio sobre a Cegueira é a voz masculina, forte, mas num tom suave.
Ao descrever a cena de sexo, há uma leve mudança no ritmo da leitura do roteiro antes da
música começar, o que reflete o avanço da tensão sexual da cena. Em seguida, a voz volta ao
ritmo suave anterior.
AD FALAS Comentários
01:03:35 Jovem:
01:03:38 doutor? está aqui?
01:03:40 Médico:
estou. estou aqui.
01:03:41
01:03:41 Do outro lado da sala, a
jovem se levanta, caminha
01:03:46
até ele e senta.
01:03:49 M:
01:03:50 aqui. aqui.
01:03:52 J:
01:03:53 eu trouxe comida. A aproximação da Jovem
nessa cena representa um
01:03:53 M:
consolo à consciência do
01:03:55 não. pelo amor de médico que, nesse
momento, se sente
deus não. esse lugar
inferiorizado e covarde
é uma privada. por não ter enfrentado o
Garçom (não ter cumprido
01:03:56 J: seu papel de “homem alfa”
01:03:57 a culpa não é sua. em sua ala).
você fez tudo que A Jovem também segura a
podia. mão do Médico o tempo
todo que fala com ele.
01:03:58 M: Esse gesto, não
01:04:02 não. não. eu não fiz audiodescrito, também
reforça essa posição de
... aquele proximidade e conforto.
desgraçado colocou
a arma bem no meu
pescoço.
01:04:03 J: exato
01:04:03
01:04:03 M:
01:04:04 então eu podia ter
tentado agarrá-lo,
então eu...
01:04:04 J:
01:04:07 e depois?
(sobrepondo a fala
dele) me fala?
01:04:08 Ele passa a mão pela barba
01:04:10 e abaixa a cabeça.
01:04:10 M:
01:04:10 eu sei lá.
01:04:11 J:
01:04:16 se você tivesse
matado ele ia ser
bem pior. você teria
começado uma
guerra... uma guerra
de verdade.
01:04:19 M:
01:04:25 tem razão... é, tem
razão. vou fingir que Ao se colocar no lugar de
“alguém que já fez o que
foi isso que eu
ele queria”, a Jovem ganha
pensei. sua confiança e simpatia.
A relação do Médico com
01:04:26 J:
a Jovem é de semelhança,
01:04:29 não é nada fácil diferente da relação dele
com sua Esposa, que no
matar alguém...
momento, é de
como eu fiz. dependência.
01:04:32 Ele envolve os ombros dela
01:04:37 com o braço direito e
inclina a cabeça até
encostar na cabeça dela.
01:04:39 Eles se aproximam no A mudança de “intenções”
nessa cena é sutil. Apesar
01:04:44 abraço, ainda sentados. Os
de uma simpatia e troca de
rostos pressionados um carinho já ter acontecido
em uma cena anterior, a
contra o outro.
relação entre os 2
01:04:46 Ele corre a outra mão de personagens não é uma
relação sensual.
01:04:52 seu ombro para o pescoço.
Os lábios tocam o rosto Até esse momento em que
dela. o abraço dura mais, não
fica óbvio que vai
01:04:55 Começa a beijar seu rosto
acontecer uma cena de
01:04:57 lentamente. sexo em poucos segundos.
01:04:58 Ela fecha os olhos. O filme mostra, então, as
01:04:59 costas do médico sentado
num banco abraçado com
a jovem, e só podemos ver
a nuca do médico e parte
do rosto da jovem. Não
sabemos se ele primeiro
cheirou ou beijou o rosto
dela, mas a mudança na
expressão facial dela e a
demora dele nessa
posição, segurando o rosto
da jovem, nos diz que algo
está acontecendo.

A AD passa essa idéia de


mudança de intenções com
“Ele corre a outra mão de
seu ombro para o pescoço.
Os lábios tocam o rosto
dela.”
01:05:01 Ele continua a beijar seu Aqui percebemos a
sequência de ações sendo
01:05:15 rosto... Os lábios cada vez
descritas uma a uma,
mais próximos dos dela... construindo a tensão
sexual que cresce entre
Se beijam. Ele apalpa seus
eles.
seios levemente com a mão
A voz do audiodescritor
esquerda. Ela envolve seu
começa mais pausada e
pescoço com os braços. Ele lenta e fica levemente
mais rápida no final,
a toma dos braços e a põe
construindo a cena de
sobre a mesa. carícias até o sexo, sem
mencionar a palavra sexo
nem uma vez.
01:05:16 A tela fica branca. Nesse momento começa a
tocar uma música lenta e
01:05:17
ouvem-se sussurros. A
01:05:23 Na tela branca, em branco espera para que se comece
uma descrição permite que
01:05:27 e cinza, os dois vultos
o ouvinte perceba uma
pálidos se abraçam. mudança de situação e que
os personagens estão
01:05:35 Ele percorre o corpo dela fazendo sexo.
01:05:38 com as mãos e a aperta
A AD é feita sobre a
contra o corpo.
música, mas faz pausas,
deixando espaço para que
se ouça não só a música,
como também a respiração
dos dois e gemidos.

Para deixar esse espaço, a


descrição de algumas
ações são antecipadas
(como o beijo) e
explicitadas (como o
texto da AD seguinte), já
que muito dessa parte é
visualmente sugerido,
deixando que o público
imagine o resto.
01:05:46 Ela passa as mãos pelos
01:05:52 cabelos dele, que estão
crescidos e sem corte...
Beija seu rosto.
01:05:55 Tela escura em chumbo e As cenas do casal e da
esposa são intercaladas
01:06:00 preto. A jovem e o médico,
aqui para mostrar o que
em pé, fazem sexo. acontecia em dois lugares
diferentes ao mesmo
A esposa dele, de pé
tempo.
01:06:01 sozinha no pátio, olha para
A falta de tempo devido à
01:06:03 o lado.
mudança brusca de cena,
faz com que se use um
resumo: “Fazem sexo”.
Esse resumo será mais
detalhado na sequência.
01:06:06 Ela sai do pátio.
01:06:07
01:06:15 Sobre a mesa, a jovem está A música aqui já não é
ouvida, indicando o início
01:06:19 debaixo do médico. Suas
de nova situação: a
pernas ao redor dos quadris chegada da esposa, uma
situação mais séria/ tensa.
dele.
A AD permite que se ouça
os sussurros e gemidos do
casal e depois é direta por
conta dos poucos
segundos disponíveis para
se ouvir os sussurros
diminuírem e o barulho do
médico vestindo as calças
(a fivela do sinto tilinta).
01:06:25 M:
01:06:26 oh, meu deus... meu
deus...
01:06:27 Ele se afasta. Inclina o
01:06:30 tronco em direção ao chão
e se levanta.
(ruído)
01:06:31 Eles se viram na direção do
01:06:33 ruído.
01:06:34 M: olá?
01:06:38 Mulher do médico:
01:06:40 não diga nada. vai
ficar mais fácil pr´eu
entender.
01:06:40 A esposa dele se aproxima.
01:06:41
01:06:41 J:
01:06:44 desculpa, foi minha
culpa. eu não
queria...
01:06:45 MM:
01:06:46 shhh. vamos ficar
quietos.
01:06:46 O médico se senta.
01:06:47
01:06:47 MM:
01:06:49 vamos todos ficar
quietos.
01:06:50 Entre eles a esposa os fita Erro de gravação. “o”
jovem ao invés de “a”
01:06:55 por um segundo e depois
jovem.
se vira para o jovem e fala
em seu ouvido.
01:06:58 MM:
01:06:59 eu enxergo.

01:07:02 J:
01:07:05 eu sabia. pelo menos
eu acho que eu
sabia.
01:07:06 MM:
01:07:08 shhh. é segredo.
01:07:11 MM:
01:07:17 é segredo. eu confio
em você. ninguém
pode saber, tá bom?
01:07:18 A jovem sorri. A mulher
01:07:22 do médico e a jovem
continuam abraçadas.

Como se pôde observar, pouco se descreve a aparência dos personagens. Estes já


haviam sido descritos anteriormente. O audiodescritor opta por mencionar apenas uma
mudança no visual do médico, a mudança nos cabelos, a qual indica que algum tempo já se
passou e confirma uma fala dele sobre as condições de higiene do lugar, que reflete nos
cuidados pessoais dos personagens. (“Ela passa as mãos pelos cabelos dele, que estão
crescidos e sem corte...”).
A sensualidade/erotismo da cena é transmitida ao cego/deficiente visual através da
descrição das ações (toques, beijos) e das pausas dadas para que se ouçam os barulhos de
cenas (gemidos, movimentos e esbarrões na mesa) e a música.
Em relação a não interpretar (opinião), por conta do tempo relativamente pequeno
disponível para AD, pode-se notar que é dada prioridade às ações e movimentos corporais e
não são usados muitos termos que dêem margem à interpretação, como adjetivos, por
exemplo. Essa AD leva essa regra bem a sério e se baseia nas ações para dar o “tom” da cena.
No que concerne a não resumir/ generalizar/ minimizar, há uma generalização
(01:05:55 - 01:06:00) devido à falta de tempo, já que só vemos que os dois estão, de fato,
tendo relações quando a tela volta ao tom acinzentado do filme e podemos ver os corpos em
plano médio mais nitidamente. A posição dos corpos é descrita na sequência. Se fosse
mencionado que os dois estavam fazendo sexo antes (durante a música, por exemplo) poderia-
se entender como um caso de antecipação.
Já em relação a não antecipar, logo antes da tela ficar branca (01:05:01 - 01:05:15)
algumas ações são levemente antecipadas ou explicitadas. Por exemplo, não é possível ver a
boca do Médico beijando o rosto da Jovem (ele está de costas), mas a imagem e o olhar dela
sugerem isso e, para a construção das carícias que resultam na cena de sexo, aquilo que foi
sugerido visualmente foi explicitado na AD dando coerência à cena, sem antecipar, no
entanto, que eles estavam “começando a fazer sexo”. Outro momento em que o “sugerido
visualmente” é detalhado na AD é durante a tela branca. Vemos vultos e imaginamos,
baseado nos vultos e planos fechados nas mãos, costas, rostos e a imagem final que as carícias
descritas acontecem de fato.
Finalmente, em relação a não sobrepor, não há sobreposição de falas ou barulhos
importantes.

3.1.2 O estupro
A cena se passa depois que as jóias e o dinheiro nas alas acabam. Os homens da ala 3, os
chantagistas, pedem que as outras alas mandem suas mulheres para lá em troca de comida.
Depois de uma discussão na ala 1, algumas mulheres se voluntariam. Um personagem da ala 3
identificado como “O Velho”, que já era cego antes do vírus aparecer e era o responsável por
avaliar o valor das jóias arrecadadas anteriormente, passa na ala 1 para contar quantas
mulheres vão e saber se elas estão menstruadas (nesse caso estariam dispensadas e seriam
chamadas em outro dia). Uma mulher diz que nove mulheres irão e ele reclama, dizendo que
elas terão que trabalhar dobrado. Ele diz ainda que elas devem se preparar e que a comida será
entregue depois, se eles ficarem “contentes”. Também diz que levou uns pães para “dar uma
força” a elas e arremessa pacotes com um pão cada. A mulher do médico olha para uma
tesoura pendurada em frente a uma TV e os homens vão embora, então a cena transcrita
começa. Até aqui, somente o médico e a jovem sabem que a mulher do médico enxerga.
A cena é composta por imagens e diálogos fragmentados. Visualmente, ela é escura e, na
maior parte do tempo, o que se vê são closes e vultos cor da pele em meio à escuridão. É uma
cena de estupro que se apóia fortemente no código sonoro. As falas e sons de roupa rasgando,
cama rangendo, agressões, gemidos de dor das mulheres e de prazer dos homens, além da
música sombria e constante constroem grande parte da violência da cena. Dessa forma, o foco
dessa cena não é o cenário ou o figurino.
Enquanto as mulheres andam até a ala 3, em alguns momentos é possível visualizar o
corredor com roupas e sujeira espalhadas pelo chão, e que as mulheres vestem vestidos
surrados. Na maior parte da cena o enquadramento traz as mulheres no centro, em plano curto
ou médio (vê-se o personagem até o quadril ou quase todo). Durante a caminhada até a ala 3,
o foco são seus pés e seus rostos. A iluminação nesse momento vem de cima, em feixes de luz
que viriam de lâmpadas espaçadas no corredor, criando espaços alternados de sombra e luz.
Dessa forma, os traços dos seus rostos tensos parecem mais duros e é possível visualizar as
mulheres, que estão em fila, uma a uma à medida que passam pela fonte de luz. Em outros
momentos há uma iluminação de fundo que permite ver somente a silhueta dessas mulheres
caminhando em fila, em plano médio e curto, ou, na sequência, as silhuetas de alguns dos
homens que as esperam.

Figura 5: Vulto das mulheres que caminham em fila.

Figura 6: As luzes do corredor iluminam as mulheres uma a uma


Quando as mulheres entram na ala e o Barman começa a “selecioná-las”, os planos se
tornam fechados e o enquadramento (com as mulheres à esquerda e o Barman à direita)
juntamente com a iluminação lateral, cria um jogo de luz e sombras que ora revela o rosto
tenso e assustado das mulheres, ora mostra um pouco mais do rosto do Barman.
Os planos fechados também mostram partes do corpo das mulheres sendo tocadas,
uma mulher tendo seu vestido tirado e uma blusa sendo rasgada. Essas imagens são alternadas
rapidamente e a iluminação diminui ainda mais.

Figura 7: O Barman segura o rosto da Esposa (do Oriental).


Quando o plano é aberto, a imagem é turva e, em alguns momentos, se vê vultos que
parecem nus, ao passo que e em outros não se vê absolutamente nada, o que nos coloca no
lugar daqueles que não enxergam. Os sons nos dizem o que acontece em cena e, visualmente,
é o público que preenche as lacunas visuais a partir do que ouve.
A voz do locutor da AD não muda, mas o ritmo da descrição é rápido e as descrições
são curtas, devido ao pouco tempo disponível e à importância dos sons da cena.

AD FALAS Comentários
01:12:22 Das grades das janelas, A música nessa cena é
as mulheres caminham extremamente importante
01:12:26
em fila. Cada uma com para a criação de um clima
o braço no ombro da tenso, para preparar o
anterior. telespectador para a cena
01:12:39 Tela branca. por vir.
01:12:40
Na cena anterior, a mulher
do médico olha para uma
tesoura que ela tinha
guardado e essa ação é
descrita, chamando
atenção para o objeto que
será usado posteriormente,
em outra cena, para matar
o Barman.
Aqui, enquanto as
mulheres passam em fila
em segundo plano,
podemos ver a tesoura em
primeiro plano pendurada
no que parece ser o mesmo
lugar de antes. Isso
significa que ela não tinha
a intenção de reagir ao que
os homens fariam. Isso não
é descrito. Ao invés disso,
é dada uma pausa para que
se ouça a música que
aumenta o volume, criando
o clima de tensão na cena.
A expectativa de uma
reação é quebrada para o
vidente, mas não para o
deficiente visual.

O estado dos corredores


não é mencionado aqui.
01:12:44 Os vultos negros das
mulheres caminhando.
01:12:46
01:12:51 Mulher 1:
não adianta tentar fugir...
01:12:53
tá cheio de guardas.

01:12:54 Mulher 2:
pelo menos seria mais
01:12:57
rápido... já íamos estar
mortas agora.
01:12:58 Esposa do médico:
01:12:59
ninguém vai morrer.
01:13:00 Na tela escura, Junção de duas imagens
claridade cruza as fortes. Não há tempo para
01:13:10
grades da janela e descrever as duas.
ilumina, pela porta
aberta, a figura das
mulheres passando
pelo corredor.
Um a um, o rosto das
mulheres que passam.
01:13:18 Um bastão de metal
risca o chão.
01:13:19
01:13:20 - elas estão vindo! Pausa. O barulho do portão
[- olha lá! elas abrindo, arrastando.
01:13:27
estão vindo.
- elas estão vindo!
[-abram os portões!
abram os portões!

01:13:29 - olha só... as garotas tão


vindo! eu tô louco pra
01:13:32
isso.
01:13:33 Elas não diminuem o O chão está sujo, mas já
passo. Os pés foi mostrado em pior
01:13:36
descalços no chão estado antes, como, por
imundo. exemplo, no início desta
cena. A palavra “imundo”
parece ajudar a construir a
carga pesada da cena por
vir.
01:13:37 - deixa elas entrarem! A AD se sobrepõe à
deixa elas entrarem! segunda fala (repetição).
01:13:39
01:13:38 Pela grade, mãos dos
homens tentam tocá-
01:13:41
las.
01:13:41 - aqui... você vem pra Leve sobreposição.
mim.
01:13:50
Uma mulher: sai. sai. sai!

-é... pra cá...


-oi! bem vindas!

Barman:
aí garotas. tudo bem. não
tenham medo. estamos
aqui pra amar vocês!
01:13:51 Elas entram. Eles Podemos ouvir o som de
começam a despi-las. um pano rasgando. Passa a
01:13:53
idéia da violência.
01:13:54 Barman:
aí galera, vão com calma.
01:13:59
tem pra todo mundo
aqui... quem ficar sem a
gente divide. tá bom? é
assim que vai ser.bom. eu
quero vocês por ordem de
beleza ta?
as mais gostosas pra cá. e
as feiosas pro fim da fila.
tá bom?
01:14:06 Uma delas mal se
move.
01:14:08
01:14:09 Barman:
que é isso?... ela é um
01:14:14
peixe morto. toma conta
dela. anima ela.
01:14:15 O Barman a empurra e Na verdade, essa é a
passa à Esposa. Jovem, personagem da
01:14:18
Alice Braga. O fato da AD
descrevê-la como a
Esposa, que é a mulher
com quem o Barman vai
interagir em seguida, cria
uma continuidade da ação.
É uma quebra a menos na
descrição, mas não é o que
se vê.
01:14:19 Barman: Essa fala, inclusive, remete
onde é que você tava essa ao fato da Jovem ter
01:14:25
minha vida toda? eu te trabalhado como garota de
conheço? (risada) eu te programa em um hotel no
conheço? qual ele era o Barman, daí
beleza. beleza. sua identificação no filme.
O fato de ele perguntar se
a conhece e ela
permanecer calada, nos
responde que sim, e que
ela não quer ser
identificada.

Sobreposição na repetição
(“beleza”).
01:14:25 Tirando a roupa da
Esposa.
01:14:26
01:14:27 Barman:
por que ta tremendo?...
01:14:37
você tá tremendo? por que
tá tremendo? ... não...
calma. calma... vocês duas
vem comigo... você é
loira? você é loira?
01:14:39 Ele pega a Mulher do Barman: Sobreposição. Sussurro.
Médico... beleza... tudo bem. Fala sem muito conteúdo
01:14:40
(quase sussurrado) semântico.
01:14:41 Ele a apalpa.
01:14:42
01:14:44 Barman:
hum. essa aqui já é mais
01:14:46
madura. é assim que eu
gosto.
01:14:47 Ela contrai o rosto.
01:14:48
01:14:49 Barman:
você gosta disso?... é a
01:14:57
minha arma... (risadas)
você gosta?
01:14:57 Mulher do médico:
não gosto não.
01:14:57
01:14:58 Frente a frente, seus
rostos quase se tocam.
01:15:00
01:15:00 Barman:
moça... moça?... mas que
01:15:08
surpresa, moça...
tudo bem, você vem
comigo. e se você fugir, eu
arranco seus mamilos com
os dentes, tá legal?
01:15:12 Ele força a cabeça dela
para baixo.
01:15:13
01:15:14 Barman:
vai. assim...
01:15:15
01:15:15 Mulher do médico:
não.
01:15:15
01:15:16 O rosto dele na
penumbra.
01:15:17
01:15:18 Barman:
vai. eu não tô pedindo tá
01:15:21
legal?... vai. vai!
01:15:22 Mulher do médico:
arranco ele com os dentes.
01:15:23
01:15:23 Barman:
tenta! eu estouro sua
01:15:30
cabeça. e a cabeça da sua
amiga, tá? eu acabo com
vocês duas.
01:15:31 Barman:
tudo bem. vem aqui, moça.
01:15:32
aí, aí, aí...
01:15:32 Agarra a Esposa pelos
cabelos.
01:15:34
01:15:35 Barman:
aí... aí. aí... isso. assim...
01:15:39
isso...
01:15:40 Flashes de luz sobre os
vultos na escuridão do
01:15:42
quarto.
01:15:42 O Velho: Muitas pausas na
certo... isso mesmo, isso dublagem. Ao invés de
01:15:58
mesmo... tudo bem... não preenchê-las com AD, foi
se preocupe... você está deixado espaço para ouvir
tão tensa. por favor, senta os gemidos das pessoas, os
aí. cai fora daqui!...um gritos das mulheres e os
pouco tensa... agora sim... rangidos das macas e
posso morder os seus mesas. Os diálogos passam
peitos? a atmosfera da cena como
algo grosseiro. A
linguagem é bem grosseira
e violenta.
01:15:59 A tela escurece
completamente.
01:16:00
01:16:02 O Velho: Ouvem-se alguns gritos
só um pouquinho... deixa... das mulheres, e gemidos
01:16:04
Uma mulher: dos homens.
pára!
01:16:07 O Velho:
viu só? não foi tão ruim.
01:16:12
só deu uma mexida...
mexa, mexa, mexa!
01:16:13 Uma delas é
violentamente sacudida
01:16:15
sobre a cama.
01:16:16 Um homem:
anda peixe morto. se mexe
01:16:19
pra mim! anda!
01:16:20 O homem a soca no
rosto.
01:16:20
01:16:21 mexe vai!
(Soco)
01:16:22
01:16:22 Tela escura Espaço para um breve
silêncio e música
01:16:23
“fúnebre”. Elas levam a
mulher que morreu
espancada nos braços.
Em relação a não interpretar (opinião), pode-se notar o uso da palavra “imundo”
(01:13:36) para descrever o chão. O chão não está tão sujo quanto em outras cenas e quanto a
palavra “imundo” nos faz pensar, mas a carga semântica da palavra ajuda a construir o peso
da cena que começa. O uso de uma palavra tão forte pode ser visto, também, como uma
postergação da descrição da imagem do corredor sujo que aparece enquanto as mulheres se
dirigem à ala 3, no início da cena transcrita (01:12:22-01:12:40). A escolha por não
audiodescrever o corredor em detalhes neste momento, em prol de permitir que a música
cumpra o seu papel, se justificaria pelo fato dela ser mais importante para a narrativa, do que
as macas no corredor ou lençóis e sujeira.

Em relação a não resumir/ generalizar/ minimizar, pode-se notar que em uma cena,
duas imagens são unidas pela AD (01:13:00). Não há tempo para descrevê-las separadamente
e, na verdade, o fato delas serem vistas uma após a outra não deixa claro se elas são dois
pontos de vista diferentes de um mesmo momento, ou dois momentos diferentes. O fato da
mulher do médico não ter levado a tesoura (que aparece em primeiro plano no começo da
cena) não é mencionado. A expectativa de uma reação é quebrada para o vidente, mas não
para o deficiente visual.
Outro momento em que esse parâmetro chama a atenção é quando a “Jovem” é
chamada de “Esposa” na AD (01:14:15). A “Esposa” (do oriental) aparecerá na sequência,
mas a AD menciona o Barman e sua interação com as duas como se elas fossem uma só
pessoa. A escolha diminui a fragmentação de falas na cena, que, devido aos diálogos e sons
importantes, possui poucos espaços para descrições curtas e diretas. Além disso, ela não
atrapalha a compreensão do que se passa, mas é diferente do que se vê e omite uma
informação importante para a narrativa, que é o fato de o Barman e a Jovem se conhecerem. A
pergunta dele (“onde você estava minha vida toda? eu te conheço?”) na verdade é uma forma
de restabelecer relações na narrativa, uma forma de paralelismo, já que ele era o Barman do
hotel no qual ela ficou cega durante um programa
No que concerne não antecipar, há ocorrência de antecipação que funciona como
uma explicitação do som por vir, o som do soco que encerra a cena. Apesar de ser uma
explicitação através de uma antecipação, se esta não existisse, a cena acabaria e o deficiente
visual teria que ouvir uma descrição descontextualizada e perderia o impacto que o som do
soco causa. Outro momento em que há uma rápida antecipação acontece logo que as mulheres
entram na ala 3. A descrição “Elas entram. Eles começam a despi-las.” (01:13:51-01:13:53) é
falada enquanto as mulheres ainda entram na ala, mas, logo em seguida, o Barman começa a
falar e não deixa espaço para essa descrição.
Em relação a não sobrepor, em alguns momentos a AD se sobrepõe a falas repetidas
ou sem muito conteúdo semântico (01:14:25 e 01:14:40).
Existe pouco tempo livre para a AD, já que, mesmo quando não existem falas, outros
sons se fazem importantes para a construção da cena, que é longa (4 minutos) e praticamente
toda escura. A escolha parece ser pontuar ações importantes para a narrativa de forma objetiva
e distinguir personagens, já que a mudança de um para o outro acontece rapidamente.

3.2 O SIGNO DA CIDADE


Ficha Técnica

Direção: Carlos Alberto Riccelli


Roteiro: Bruna Lombardi
Direção de fotografia: Marcelo Trotta
Direção de arte: Mara Abreu
Diretor-assistente: Kim Riccelli
Produtores: Bruna Lombardi e Carlos Alberto
Riccelli
Produtor Executivo: Ary Pini
Produtores associados: Daniel Filho e Geórgia
Costa Araújo
Produtora: Pulsar Produções
Distribuição: Europa Filmes / MAM
Roteiro de audiodescrição e legendagem: Cíntia
Araújo, Leise Abreu, Renise Santos e Rodrigo
Campos (MIDIACE)
Lançamento: 2007

Figura 8: Capa do filme O Signo da Cidade.

3.2.1 Júlia e Gabriel

A cena se passa entre dois jovens: Júlia e Gabriel. Júlia é uma jovem que é encontrada
por Teca (Bruna Lombardi) desacordada e sangrando, num apartamento. Ela tinha provocado
um aborto e estava muito machucada. Teca liga para um amigo enfermeiro que leva um
colega de trabalho e eles cuidam de Júlia. Teca passa a visitar Júlia para levar comida e
remédios e descobre que o filho que a menina esperava era de Luís, o rapaz que ia na sua casa
para consultar o Tarô, e que acabou cometendo suicídio ao se jogar da janela dela. Teca
entrega os escritos de Luís para Júlia, que os leva com ela quando foge do apartamento.
Gabriel é um rapaz que anda descalço pela cidade de São Paulo desde o suicídio da
mãe. Ele intervém quando vê Júlia jogando as coisas de Luís (roupas, diários, papéis) de cima
de um viaduto. Dois mendigos correm para o meio da rua para pegar as roupas e dois carros
quase os atropelam. Gabriel pergunta se ela é louca e diz que ela pode causar um acidente
com aquilo. Ela fica confusa com a repreensão e ele volta à sua caminhada sem rumo. Júlia,
então, passa a andar atrás dele, até que anoitece e ela pergunta se ele vai andar a noite toda
porque ela está cansada e com fome. Os dois param para comer e Gabriel lembra que tem que
alimentar seu cachorro. Ele volta pra casa a contragosto e Júlia vai com ele. Júlia pergunta se
pode tomar um banho e ele diz que sim. Gabriel entra no banheiro enquanto Júlia está no
banho para deixar uma toalha e a cena acontece. Ela marca uma possibilidade de mudança na
vida dos dois personagens, duas pessoas solitárias que se encontram para dividir essa solidão.
A cena acontece no banheiro da casa de Gabriel, um banheiro antigo amplo, onde
predomina a cor branca (paredes, pia, um armário, cortinas do box) e não há quase móvel
nenhum. O cenário praticamente some para dar lugar aos dois personagens. O enquadramento
dá destaque ao box no início da cena, permitindo que Júlia apareça nua no centro da tela em
plano aberto e bem iluminado. Como é dia, a luz entra pela janela do banheiro e o branco
reforça a iluminação.

Figura 9: Imagem no momento da fala: “cê tá a fim?”


Figura 10: Rosto de Gabriel ao ver Júlia nua.

Os planos fechados predominam, mostrando a reação de Gabriel ao ver Júlia nua e, em


seguida, os beijos dos dois. Os planos fechados ora mostram os rostos, ora mostram partes do
corpo, como a lateral dos troncos e quadris dos dois corpos nus se encontrando. Em seguida,
quando o casal se abaixa para fazer sexo, o enquadramento os centraliza e o plano aberto
permite a visão dos corpos por inteiro, ele sentado no chão e ela de frente para ele e em cima
dele, com os pés apoiados no chão. A partir desse momento se alternam os planos abertos e
médios, permitindo que se veja os movimentos e os corpos (por inteiro ou até a cintura). O
enquadramento do plano aberto é feito de fora do banheiro, a porta de moldura amarela e a
parede verde do corredor viram moldura para os dois corpos, reforçando a atenção chamada
para o ato sexual e os corpos nus.

Figura 11: Plano aberto e bem iluminado dos corpos de Júlia e Gabriel.
A voz da AD é masculina. Há uma diminuição do ritmo da fala (pausas em uma
mesma frase). Percebem-se também pausas de durações diversas entre uma AD e outra,
variando de 6 a 24 segundos, pausas consideradas longas e adequadas para a inserção de
descrições. Só existe diálogo no início da cena, e depois, os sons que constituem o código
sonoro são o barulho da água caindo do chuveiro, a respiração ofegante dos dois,
principalmente de Júlia, e uma música suave, mas não romântica.

AD FALAS Comentários
01:07:02 Júlia está no banho. As
01:07:06 cortinas do box estão
cerradas.
01:07:05 [Gabriel] eu vou deixar Sobreposição.
01:07:07 uma toalha aqui pra
você, tá?
01:07:09 [Júlia] cê tá a fim? Nesse momento Júlia abre
01:07:10 a cortina e Gabriel pode ver
o corpo dela nu. Não há
descrição da expressão
facial de Gabriel. Ele está
com a boca entreaberta e
olha fixamente para o
corpo de Júlia sem piscar.
Ouve-se o barulho do
chuveiro.
01:07:16 [Júlia] não quer
01:07:17 entrar?
01:07:23 Julia sai molhada e nua Não há tempo para
01:07:24 do chuveiro. descrever mais do que isso.
01:07:24 [Júlia] vem.
01:07:25
01:07:27 Ela se aproxima de As ações são descritas ao
01:07:35 Gabriel, sobe a mão pela mesmo tempo em que
camisa do rapaz, passa acontecem. Há 2 segundos
pelo seu pescoço e entre essa AD e a seguinte,
acaricia sua nuca. o que permite que se ouça o
barulho da água do
chuveiro caindo.
01:07:37 Ela aproxima seus lábios
01:07:40 dos lábios de Gabriel.
01:07:45 Os dois se beijam. Nesse momento começa a
01:07:46 tocar uma música
instrumental que não é
romântica. É lenta, marcada
por um “eco” do que parece
ser uma guitarra.
Ouve-se então a música e o
chuveiro.
01:07:54 Julia ajuda Gabriel a tirar Pausa de 7 segundos entre a
01:07:56 a camisa. AD anterior e essa.
01:07:58 Eles se acariciam ávidos. Aqui já se pode ouvir a
01:08:00 respiração ofegante de
Júlia. A música e o barulho
do chuveiro continuam.
Interpretação (“‟avidos”).
01:08:02 Seus corpos, já nus, estão
01:08:04 colados.

01:08:09 Eles se abaixam até o O volume da respiração dos


01:08:11 chão, onde transam. dois cresce, enquanto a
música também aumenta de
volume levemente e ainda
se ouve o chuveiro.
O uso da palavra ”transam”
chama atenção, já que a
pausa desta AD até a
próxima é de 23 segundos.
01:08:35 Ambos, sem fôlego, Aqui, novamente, parece
01:08:37 chegam ao orgasmo. haver um caso de resumo.
Ao invés de descrever os
indícios visuais que
levaram a essa conclusão
(diminuição do ritmo dos
movimentos, a cabeça de
Júlia inclinada para trás,
além da informação
acústica da respiração
ofegante ficar mais
espaçada), resume-se a
“chegam ao orgasmo,
mesmo existindo tempo
para a descrição.
01:08:41 Se beijam.
01:08:42
01:08:44 E se abraçam.
01:08:45
01:08:49 O casal está sentado no Não há informação sobre a
01:08:51 chão do banheiro. posição em que estão
sentados e a informação de
que eles estão no chão do
banheiro já foi dada.
01:08:53 Gabriel acaricia Júlia... Gabriel toca as cicatrizes de
01:09:00 As cicatrizes dos cortes Júlia, passando os dedos
na barriga e pulsos de sobre elas. É um gesto
Júlia são notadas por
significativo de carinho
Gabriel.
sobre uma agressão sofrida
e praticada por ela, contra
seu próprio corpo. É
importante para a cena e
para o enredo do filme,
como um sinal de mudança
de atitude, um alívio para a
dor dela, no entanto, o
gesto não é descrito.

01:09:09 Gabriel a abraça.


01:09:10

01:09:14 Na cozinha, Júlia prepara


01:09:15 um misto.

Em relação a não interpretar (opinião), a escolha lexical para descrever a forma


como eles se acariciam chama atenção (ávidos).
Em relação à não resumir/ generalizar/ minimizar (descrever o que se vê), o uso da
palavra ”transam” em “Eles se abaixam até o chão, onde transam.” caracterizaria um resumo
ou minimização, já que a pausa desta AD até a próxima é de 23 segundos e a posição dos
corpos um em relação ao outro, bem como detalhes de movimentos não são descritos. Os 23
segundos de respirações ofegantes, gemidos, música e barulho de chuveiro, mas nenhuma
descrição, parecem ir de encontro a esses parâmetros e à proposta de AD como a parte visual
do produto audiovisual.16
Da mesma forma, parece haver um caso de interpretação e/ou resumo no momento em
que a AD diz “Ambos, sem fôlego, chegam ao orgasmo”. Ao invés de descrever os indícios
visuais que levaram a essa conclusão (diminuição do ritmo dos movimentos, a cabeça de Júlia
inclinada para trás, além da informação acústica da respiração ofegante ficar mais espaçada),
resume-se a “chegam ao orgasmo”, mesmo existindo tempo para a descrição.
Outra parte da cena que chama atenção é logo depois do ato sexual, quando eles estão
sentados e Gabriel toca as cicatrizes de Júlia, passando os dedos sobre elas. A posição em que
eles estão sentados não é especificada. Além disso, o toque dele nas cicatrizes dela é um gesto
significativo de carinho sobre uma agressão sofrida e praticada por ela, contra seu próprio
corpo. A AD diz: “Gabriel acaricia Júlia... As cicatrizes dos cortes na barriga e pulsos de Júlia

16
Em pesquisa de recepção de dança (espetáculo Os 3 Audíveis, 2008) não publicada, foi verificado que os
silêncios não podem ser tão longos, mesmo que a ação se repita ela deve ser dita.
são notadas por Gabriel.” Não há descrição dos gestos, que inclusive, já indicam que Gabriel
notou as cicatrizes.
Em relação a não sobrepor, existem sobreposições durante o filme, mas nessa cena
em especial, só acontece uma vez, no início da cena. Essa leve sobreposição, contudo, não
prejudica a compreensão da fala ou da AD.
Nessa cena, há espaço suficiente para descrições mais específicas e pausas, além disso
a cena é bem iluminada, com enquadramento em plano aberto, sem muitos closes. Não há
suavização cinematográfica do ato sexual em si, portanto não há necessidade de suavização na
AD, já que há tempo disponível.

3.2.2 Gil e Teca

A cena acontece quase no final do filme, depois de várias “conclusões” de histórias.


Júlia, a menina que se cortava e praticara um aborto, joga os estiletes fora e está com Gabriel,
que voltou para casa e aparece tocando instrumentos musicais novamente. Dois personagens
homossexuais agora têm um bebê, que nasceu na rua e foi abandonado pela mãe, e falam
sobre como será a criação dele com dois pais. Um dos rapazes, que anteriormente no filme
apanhara de dois homofóbicos na rua e quase morrera queimado, parece bem. O corpo de
Sombra, o enfermeiro que salvou Julia do aborto desastroso e a filha de um assaltante, é
encontrado na rua. Ele fora vítima de uma bala perdida disparada por um assaltante, agora
segurança de boate, durante uma perseguição. Outro fechamento importante é o fato do pai de
Teca ter falecido em seus braços.
Neste momento do filme que antecede a cena de sexo, Teca e Gil conversam no
apartamento dela e ele a diz que já entrou com o pedido de divórcio. Eles falam sobre os
astros e destino e Gil demonstra curiosidade em saber o que os astros diriam para ele fazer.
Teca pergunta se ele quer que ela leia as cartas para ele e ela lê. Depois, ela diz que ele deve
aceitar o emprego na Amazônia e a cena transcrita começa.
O início dessa cena acontece na sala de Teca, com closes alternados dos rostos dela e
de Gil. Em um dado momento, um plano aberto revela uma estante de livros, um computador,
um sofá, um abajur alto e uma imagem de Iemanjá em segundo plano. Em primeiro plano
estão Gil à esquerda e Teca à direita, ao centro é possível ver uma mesa forrada com um pano
estampado em um tom rosa-avermelhado e cartas de tarô organizadas dentro de um círculo de
sal grosso. A iluminação destaca Teka e Gil enquanto eles conversam. Há, então, um corte
direto para o corredor onde o casal se beija, de pé, encostado em uma moldura de porta de cor
azul, no centro do enquadramento. É possível ouvir bem a respiração e o som de beijo. Nesse
mesmo corredor fica uma bancada onde Teca senta depois que Gil a ergue. As paredes azuis e
a camisa azul escuro de Gil, juntamente com o vestido preto com bolas brancas que Teca usa,
dão um tom mais escuro à cena, entretanto Teca senta na bancada ao lado de um abajur que
ilumina seus corpos e os planos fechados da mão de Gil entre as pernas dela e dos beijos dos
dois. A iluminação vinda do abajur dá um efeito de traços de luz nos corpos e rostos, e os
planos fechados guiam a atenção do público para cada movimento feito pelo casal e para as
reações de ambos (como expressões faciais que mudam, por exemplo). Nesse momento
começa uma música lenta, no piano, que acompanha todo o resto da cena.

Figura 12: Gil ergue Teca. Figura 13: Plano fechado na mão de Gil entre as pernas de Teca.

Quando eles vão para o quarto os planos fechados dão lugar a planos médios de Gil por cima
de Teca que está deitada de frente para ele. Os planos médios guiam a atenção do público ora
para o movimento das costas e quadris de Gil e pernas de Teca em volta dele, ora para os
rostos dos dois personagens que se beijam e reagem às carícias um do outro mudando
expressões faciais e arqueando a cabeça para trás (Teca). Há então uma mudança de plano em
fade out (quando a imagem some aos poucos, ficando desfocada, até desaparecer
completamente) que dá lugar à imagem de Teca e Gil, ainda deitados na posição anterior, mas
agora parados, beijando-se lentamente. A imagem é vista em um plano mais aberto (só não é
possível ver os pés dos dois) e a iluminação principal, que vem do outro lado da cama, cria
sombras em primeiro plano e destaca a silhueta das costas e glúteos de Gil.
Figura 14: Plano aberto dos corpos nus. Iluminação destaca a silhueta do corpo de Gil.

A cena então termina com Teca deitada de lado, de costas para a câmera e Gil
acariciando suas costas até os quadris. O plano é médio e a iluminação agora é frontal,
permitindo que se veja as costas de Teca e o rosto de Gil bem iluminados.
A locução da audiodescrição é feita por um homem e as descrições são lidas sem pressa, num
tom suave.
AD FALAS Comentários
01:29:26 [Teca] você tem que ir.
01:29:27
01:29:29 [Teca] os caminhos tão se Gil e Teca estão sentados à
abrindo pra você... vai ser mesa, um de frente pro
01:29:34
muito bom. outro. A mesa é quadrada
e está cheia de cartas de
Tarô dispostas dentro de
um círculo de sal grosso.
01:29:36 [Gil] e nós dois?
01:29:37
01:29:40 [Gil] teria sido bom?
01:29:41
01:29:44 [Teca] teria sido um erro.
01:29:45
01:29:51 Gil e Teka se beijam. O cenário muda e agora
eles estão em um corredor.
01:29:52
Gil e Teca estão de pé, um
de frente pro outro. Teca
está encostada em uma
bancada ou aparador (não
é possível ver). Ele a
levanta, coloca-a em cima
da bancada e sobe seu
vestido ao subir com as
mãos nas coxas dela.
Há um intervalo de 8
segundos até a próxima
descrição.
01:30:02 Aos poucos, vão se Ela tira a blusa dele e ele
despindo. coloca sua mão direita por
01:30:04
baixo do vestido dela,
entre suas pernas. Ele pára
de beijá-la e a olha
enquanto ela fecha os
olhos, inclina a cabeça
para trás e volta a abrir os
olhos fitando-o.
Gil carrega Teca nos
braços, ainda de calça
jeans e ela ainda de
vestido, com as alças
caídas. Teca aparece
deitada na cama e depois
há um corte direto para a
cena de Gil em cima de
Teca, entre suas pernas e
sem roupa. Ela ainda com
o vestido.
Intervalo de sete segundos
entre essa descrição e a
próxima.
01:30:16 Vão para o quarto. Exatamente no momento
em que essa descrição é
01:30:18
falada, Gil faz um
movimento contra o corpo
de Teka, como se a
estivesse penetrando.
01:30:22 E fazem amor na Aqui o movimento dos
cama. corpos é bem visível. Teca
01:30:23
inclina a cabeça para trás
enquanto Gil fecha os
olhos e comprime os
lábios enquanto sustenta
seu corpo sobre os braços.
Em plano médio (vemos as
cabeças e os troncos dos
personagens até sua
cintura). Gil vai beijando
Teca em direção à sua
vagina, portanto ele some
do enquadramento e
vemos Teca, nua, com os
olhos fechados, a boca
aberta, por onde respira.
Ela segura a cabeça de Gil,
olha em direção ao rosto
dele e volta a inclinar a
cabeça para trás com os
olhos fechados.
Fade out.
Em um plano mais aberto
que permite ver todo o
corpo dos dois (exceto os
pés), podemos ver Gil
deitado sobre Teca, entre
suas pernas. Ele está
apoiado nos seus
antebraços e as mãos de
Teca estão na lombar dele.
Os dois se beijam, mas os
corpos não se movem
mais.
A iluminação aqui é
voltada para o destaque do
corpo de Gil. Um pequeno
abajur em forma de pedra
de cristal ao fundo ilumina
suas costas e
principalmente sua lombar,
destacando a silhueta do
seu glúteo. Outra luz de
cima reforça a iluminação
das suas costas e glúteo.
Teca está na sombra.
Num plano mais fechado
que permite que vejamos
da cabeça ao glúteo de
Teca, vê-se agora a
silhueta das costas de Teka
deitada de lado e Gil,
apoiado sobre seu braço
esquerdo acariciando as
costas de Teca lentamente
com a mão direita até o
seu quadril. Ele a olha.
01:30:50 Gil a acaricia.
01:30:51
01:30:56 Dia. Gil deixa o prédio
levando suas malas.
01:31:01

Em relação a não interpretar (opinião), as interpretações são feitas através de resumos e


minimizações citadas abaixo.
No que concerne a não resumir/ generalizar/ minimizar (descrever o que se vê), a descrição
do beijo acontece depois que o casal já está se beijando e nenhuma menção à mudança de
cenário é feita. Também não se faz referência ao fato de eles estarem de pé.
Ao dizer “Eles se beijam” como forma de iniciar a cena, é possível observar que há
tempo para descrever onde eles estão sem sobrecarregar o áudio (a pausa é de 8 segundos). Na
descrição “E fazem amor na cama” (01:30:22-01:30:23) também podemos notar a
minimização da imagem, muito mais detalhada e sensual do que a descrição da mesma, ainda
mais quando se dispõe de 27 segundos para a inserção de AD com pausas para que se ouça os
sons de cena.
Um outro exemplo de resumo/minimização é a última descrição do sexo depois dos 27
segundos de silêncio, que diz “Gil a acaricia”, mas não descreve como a ação ocorre.
No que concerne não antecipar, talvez a espera para descrever o beijo depois que o
som é ouvido tenha sido uma forma de não antecipar o beijo. No entanto, quando a mudança
de cena acontece, a imagem já é dos dois de pé se beijando em outro local do apartamento de
Teca. Não há surpresa.
Na descrição “Aos poucos, vão se despindo” (01:30:02-01:30:04) pode-se notar uma
antecipação, já que só a blusa de Gil é retirada e Teca só aparece nua mais tarde, além disso, a
descrição passa a idéia de que ao chegar no quarto os dois já estariam despidos, o que não
acontece. Há também um caso inverso à antecipação quando se ouve “Vão para o quarto”.
Nesse momento os dois já estão no quarto e Gil já está deitado sobre Teca.
Em relação a não sobrepor, não há sobreposição de falas ou sons importantes pela
AD.
A cena é curta e com muita informação visual para ser descrita (movimentação dos
corpos, troca de cenário, muitas ações em plano médio ou fechado, iluminação), isso exige
que o audiodescritor faça escolhas e dê pausas que permitam ouvir o código sonoro que dá um
ritmo mais lento à cena. No entanto, não há diálogos e a respiração do casal e a música são
audíveis durante toda a cena, permitindo uma maior flexibilidade de escolha de onde inserir a
descrição.
3.3 SE NADA MAIS DER CERTO

Ficha Técnica

Origem: Brasil, 2009.


Direção: José Eduardo Belmonte.
Roteiro: Breno Akex, José Eduardo Belmonte e Luis
Carlos Pacca.
Produção: Ronaldo D'Oxum, José Eduardo Belmonte,
Abdon Buchar e Thalita Bucar.
Fotografia: André Lavenere.
Edição: Frederico Ribeincher.
Música: Zepedro Gollo.
Audiodescrição: LEAD-UECE

Figura 15: Capa do filme Se Nada Mais Der Certo

3.3.1 Leo e Marcin


A cena acontece depois de uma fuga dos personagens Leo e Marcin. Eles estavam
comemorando o resultado de um roubo de uma grande quantia em dinheiro e esperavam seu
pagamento. Gaúcho, o chefe da operação, contava o dinheiro enquanto Marcin brincava com
a arma de Wilson, o taxista e companheiro de crime. Todos ficam apreensivos com a
brincadeira, e Marcin, achando que a arma não estava carregada, a aponta em direção à
Sybelle, a travesti que acompanhava Gaúcho. A arma dispara. Uma troca de tiros entre
Wilson e Gaúcho resulta na morte de Gaúcho. Os capangas trocam tiros com Wilson que foge
sozinho e machucado. Leo e Marcin fogem juntos. Eles vão para o apartamento de Marcin e
Leo a consola, já que ela chora muito. Depois que ela está mais calma, eles se entreolham e a
cena começa.

Figura 16: Marcin e Leo se entreolham.


A cena de sexo acontece em um lugar descrito como sendo o apartamento de Marcin.
As paredes são brancas, e há uma grande janela com cortinas de renda vermelha. A cor
vermelha domina o cenário antes de Marcin e Leo se beijarem, possivelmente fazendo uma
transição da violência, relacionada com o sangue das mortes de Sybelle e Miguel, e da paixão,
do sexo que vai acontecer. O fato dos dois personagens vestirem branco e dos lençóis também
serem brancos passa, paradoxalmente, a idéia de pureza e inocência que Marcin transmite,
mesmo tendo acabado de matar alguém acidentalmente.

Figura 17: “Suas bocas se afastam enquanto seus narizes ainda se tocam”

Enquanto os dois estão sentados lado a lado, o plano é médio e mostra Leo abraçando
Marcin, que chora. Os dois estão no centro da tela e a iluminação é frontal, eliminando
sombras. A partir do momento que a cena de sexo começa, os planos passam a ser bem
fechados, e só é possível visualizar partes dos corpos dos dois, sendo às vezes difícil até
identificar a quem pertence a parte que aparece na tela. Além disso, o ato sexual acontece
debaixo de um lençol branco. A cor do lençol permite uma boa iluminação mesmo nos planos
filmados por baixo do lençol, mas aí a cena se torna um pouco turva e o próprio lençol toma o
enquadramento de vez em quando. Os planos muito próximos, a dificuldade em identificar o
que está no enquadramento e a falta de nitidez trazem sutileza à cena.
Figura 18: “Embaixo de um lençol, Leo beija a nuca e a orelha de Marcin...”

O ritmo da voz do locutor da AD não muda durante a cena de sexo. A locução da AD é feita
por um homem, mas durante o filme são mostradas legendas do que seriam divisões do filme
em capítulos ou temas, estas são lidas por uma locutora mulher. Compondo o código sonoro,
há também as narrações off screen de Leo lendo cartas que ele escreve para um Diogo e que
contam sua perspectiva das coisas que estão acontecendo na vida dele. Há ainda algumas
narrações off screen de Ângela e suas leituras ou pensamentos. Não há música propriamente
dita. Existe o som de notas de guitarra, mas o volume é baixo. Há também o som ainda mais
baixo de respiração de Leo e Marcin e, às vezes, de estalos de beijos, mas as pausas na AD
permitem que se escute esses sons.
AD FALAS Comentários
01:43:36 O olho de Leo sai do
foco.
01:43:37
01:43:39 Olhos de Marcin
encaram os dele.
01:43:40
01:43:43 [Legenda] A Origem da Essa é a leitura da legenda,
Vida. lida por uma voz feminina
01:43:45
[Ângela] para que seja diferenciada
[off screen]: da voz do locutor de AD.
o peso do mundo é o amor. A fala seguinte é a
narração feita por Ângela e
ambas são lidas quase ao
mesmo tempo. As vozes
das duas mulheres lendo
juntas soa um pouco
confuso.
A imagem de um quadril
feminino nu é mostrada na
tela enquanto as vozes são
ouvidas. Pode-se ver a
vulva de uma mulher
branca (provavelmente
Marcin) que está deitada
sobre um lençol branco. A
perna esquerda está
esticada, a direita dobrada,
e a mão direita sobre a
barriga, logo abaixo do
umbigo.
A priorização da leitura do
título e/ou da narração de
Ângela faz sentido. A fala
e a legenda dão o tom do
que vai acontecer.
01:43:52 Os lábios de Leo tocam
os de Marcin com As ações são descritas no
01:43:54
suavidade. momento em que aparecem
01:43:58 Suas bocas se afastam na tela. As pausas aqui dão
enquanto seus narizes o tom de falta de pressa e
01:44:00
ainda se tocam. também de hesitação por
01:44:05 Leo hesita e beija a parte das personagens.
boca de Marcin mais
01:44:07
uma vez.
01:44:11 Ela fica inerte, mas
depois o abraça.
01:44:13
01:44:15 Imagem desfocada de
seus corpos nus... Os
01:44:19
dois se beijam com
paixão.
01:44:27 Embaixo de um lençol, Não há descrição da
Leo beija a nuca e a posição de um corpo em
01:44:34
orelha de Marcin... relação ao outro, o que
Boca de Leo pode fazer com que a AD
entreaberta sobre a pele soe estranha. Marcin está
branca dela. deitada de costas para Leo
e ele beija seu pescoço e
orelha por trás.
01:44:38 A mão de Marcin Não dá pra distinguir muito
percorre o corpo de bem, mas pela posição dos
01:44:40
Leo pressionando-o. corpos, aqui parece ser a
mão de Leo a apertar
Marcin.
01:44:46 Imagem desfocada dos
corpos nus sob um
01:44:50
lençol branco... A mão
de Marcin aperta Leo.
01:44:54 Rosto ofegante de Marcin não está ofegante.
Marcin. Atrás dela, a Ela parece cansada, até
01:45:02
cortina de renda melancólica, mas não
vermelha. Ela está ofegante. Respira pelo
pensativa... Leo dorme. nariz de boca fechada e seu
olhar está perdido, voltado
para o chão.
01:45:03 Garotinha loira com Marcin tem uma visão,
vestido branco em pé, como uma memória. O
01:45:07
dá fresta entre duas título da parte seguinte
cortinas vermelhas. combina com essa visão:
“Aquele que não fui.”
Talvez fosse bom sinalizar
que é uma visão, já que a
imagem da garota é
intercalada com cenas de
dentro do quarto e a voz da
locutora que lê os títulos
das “partes” do filme é a
voz de uma mulher, o que
pode gerar confusão: “O
casal está só ou não?”. Em
contrapartida dizer que é
uma visão pode ser
entendido como uma
explicação extra, além de
não existir tempo
disponível para essa
explicação.
01:45:08 [Legenda] Aquele que não
fui.
01:45:09
01:45:12 Rosto de Marcin. Seus Essa descrição poderia ser
cabelos curtos e loiros usada para a parte que é
01:45:22
estão desalinhados... descrita como “ofegante”.
Seu semblante é sério, A expressão facial é a
e seu olhar perdido... mesma.
Caminha olhando para
baixo com as mãos em
volta do pescoço.
01:45:23 Com uma das mãos, Descrição da ação. A
toca a vagina. Cheira escolha da palavra
01:45:27
seus dedos sujos de “vagina” condiz com o tipo
sangue. de filme e de cena. Não é
um pornô e a idéia aqui
não é erotismo ou
sensualidade. É a
sinalização de que uma
mulher que sempre se
vestiu de menino e se
comportou como tal,
apesar de frisar que seu
nome era Marcin e não
Marcinho, perdeu a
virgindade. Ela é uma
mulher. A escolha lexical
de “sujos” é que passa uma
idéia negativa, mesmo que
não intencional, em relação
ao sexo e perda da
virgindade.
01:45:32 Rosto de Marcin
dormindo.
01:45:36
Leo se aproxima da
cama e a beija no rosto.
01:45:41 [Leo] vamo acordá
(sussurrado)

Em relação a não interpretar (opinião), a escolha lexical “ofegante” para descrever a


expressão de Marcin, não condiz com o que se vê na tela. A expressão facial dela é a mesma
do começo ao fim dessa descrição, que termina com “pensativa”.
Outra escolha que chama a atenção é a da palavra “sujos” na descrição “Cheira seus
dedos sujos de sangue”. Mesmo que não intencionalmente, relacionamos a palavra sangue
com sujeira ou morte, mas aqui, acaba por passar uma atitude negativa em relação à perda da
virgindade e até do sexo. Como a cor vermelha predomina, dizer “(...) dedos vermelhos de
sangue” poderia soar menos negativo, talvez até reforçando a idéia de paixão.
No que concerne a não resumir/ generalizar/ minimizar (descrever o que se vê), não
há evidências destes aspectos. Há a omissão da figura da vulva feminina no início da “parte”
do filme que tem o título lido por uma mulher, mas não havia tempo para a descrição da
mesma e outros aspectos mais importantes para a narrativa foram priorizados (a leitura da
legenda, a voz da personagem Ângela narrando).
No que concerne a não antecipar, não há evidencias de antecipação de mistérios, surpresas
ou acontecimentos na cena.
Em relação a não sobrepor, devido à complexidade sonora do filme, ao se incluir AD,
a leitura de legendas e estas terem que se relacionar com as narrações off screen, existe
sobreposição de falas ou narrações durante o filme. Nessa cena especificamente, ela ocorre no
início. A legenda do “título” da cena aparece ao mesmo tempo em que a voz de Ângela diz “O
peso do mundo é o amor.” Dessa forma, a leitura da legenda, que é feita por uma voz
feminina, se mistura à voz de Ângela causando certo desconforto e confusão. As informações
são importantes e não há espaço para dizê-las separadamente, resultando em uma
sobreposição que não está relacionada unicamente ou diretamente à AD.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com o objetivo de observar como a audiodescrição de cenas de sexo vem sendo feita
no Brasil, foi proposta aqui a análise das audiodescrições de 5 cenas tiradas de 3 filmes de
longa metragem, dois brasileiros e uma co-produção brasileira. Após a aplicação da
metodologia de pesquisa e considerando aspectos analisados através de parâmetros baseados
em algumas das normas de audiodescrição existentes, bem como aspectos da encenação
fílmica, foi possível inferir que a audiodescrição de cenas de sexo amplifica muitas questões
relacionadas à audiodescrição em geral.
Uma dessas questões é a exemplificada pelo primeiro parâmetro utilizado na análise, a
questão da interpretação, que diz que o audiodescritor deve descrever o que vê. Podemos
observar que a interpretação na audiodescrição existe em diferentes níveis, estilos e é
motivada por diferentes aspectos sendo o mais comum deles o pouco tempo disponível para a
descrição. A interpretação como uma escolha subjetiva feita pelo tradutor existe na AD
quando o tradutor/audiodescritor faz as escolhas sobre o que descrever em uma cena e como
fazê-lo, ou seja, a todo momento.
De acordo com a análise foi observado que interpretações relacionadas à escolha
lexical, mais especificamente adjetivos, ocorreram no filme Se Nada Mais Der Certo
(“ofegante”, “dedos sujos de sangue”). O mesmo aspecto chama atenção na primeira cena do
filme O Signo da Cidade, quando a palavra “ávidos” é usada para descrever a forma como
Gabriel e Júlia se acariciam. Na segunda cena de Ensaio sobre a Cegueira, a cena do estupro,
enquanto as mulheres andam até a ala 3 a palavra “imundo” é usada para descrever o chão do
corredor por onde elas passam. Essas interpretações não prejudicam a compreensão na
narrativa do filme e caracterizam ocorrências causadas por falta de tempo disponível para se
descrever mais detalhadamente cada aspecto ou por haver mais informações visuais
importantes a serem descritas.
Estritamente ligado ao primeiro parâmetro de análise está o parâmetro de “não
resumir”. Aqui, se destaca o filme O Signo da Cidade e sua primeira cena de sexo onde os
personagens Gabriel e Júlia estão no banheiro. As ações são resumidas deixando o cego com
uma informação pronta, vaga, que não forma uma imagem mental da situação. Isso também
acontece na segunda cena do mesmo filme com a descrição das ações apenas, sem descrever a
forma como elas acontecem. Se nos ativermos apenas ao texto audiodescrito (“Gil e Teka se
beijam”; “Aos poucos vão se despindo”; “Vão para o quarto” e “E fazem amor na cama.”)
percebemos que muito é deixado para a imaginação do espectador com deficiência visual,
mesmo existindo tempo suficiente para uma descrição mais detalhada.
Se entendermos o resumo como a condensação de informação, então podemos inferir
que ele acontecerá quando não houver tempo suficiente para que a forma como as ações
acontecem seja descrita. Percebemos o resumo com essa motivação na primeira cena de
Ensaio sobre a Cegueira quando a descrição diz “(...) A jovem e o médico, em pé, fazem
sexo.” Por conta da existência de outras informações visuais relevantes que precisavam ser
descritas, como a mudança de cenário, fez-se uso de uma descrição resumida. Mesmo assim
houve a tentativa de explicitação da forma como a ação aconteceu ao se dizer “em pé”. O
resumo, nesse caso, não só se justifica como é necessário. O mesmo não acontece nas cenas
de O Signo da Cidade onde existem pausas de mais de vinte segundos sem descrições do
como, mas somente das ações de forma condensada, gerando muito “silêncios” durante a
cena. Este tipo de resumo foi apontado em teste de recepção de uma pesquisa não publicada
pelo grupo TRAMAD (2008) como uma atitude que não agrada os deficientes visuais. Nesse
teste, onde a recepção da audiodescrição de dança é observada, foi unânime entre os sujeitos
participantes com deficiência visual a opinião de que silêncios longos criam uma certa
angústia ou expectativa no público para saber o que está se passando visualmente, mesmo que
a ação esteja se repetindo.
O terceiro parâmetro de análise, a antecipação, não é indicado pelas normas por ser
uma medida que pode acabar com um suspense importante para a narrativa. No entanto,
antecipar uma ação importante quando não é possível descrevê-la no momento em que
aparece na tela, por conta de diálogos ou pela existência de outras informações visuais
importantes, mostrou-se necessário. Foi o caso de “Elas entram. Eles começam a despi-las.”
de Ensaio sobre Cegueira (01:13:51 – 01:13:53), onde a descrição acontece enquanto elas
ainda estão entrando na ala. Em seguida o Barman começa a falar e se a descrição fosse entrar
depois da fala dele já seria tarde demais, outras coisas precisavam ser descritas.
A partir da análise dos filmes selecionados foi possível observar também que existem
diversas formas de se construir uma cena de sexo cinematograficamente. Em uma cena de
sexo, o conjunto formado pela iluminação, os planos e o foco, assim como o fundo musical e
o som de sussurros e gemidos pode gerar cenas mais explícitas, como no caso do O Signo da
Cidade, ou mais sugeridas, como em Se Nada Mais Der Certo, ou ainda em cenas que se
apóiam fortemente no código sonoro deixando grande parte da construção da imagem a cargo
da imaginação do público, como as cenas de Ensaio sobre a Cegueira (principalmente a do
estupro).
Observou-se, no entanto, que nem sempre há uma regularidade na tradução de cada
tipo de cena de sexo para a audiodescrição. Mesmo levando-se em consideração problemas
como curto espaço de tempo para descrição, grande volume de informações visuais, ou ainda
grande importância narrativa exercida pelo código sonoro, algumas vezes, quando uma cena é
mais explícita visualmente, a audiodescrição é suavizada. Se pensarmos na classificação do
filme, não há a necessidade de se resumir ações usando “Eles transam” quando há tempo
disponível para detalhá-las, até porque essa censura já terá sido feita pelo próprio filme em
linguagem cinematográfica. Se um filme é de classificação livre, as cenas de sexo serão
sugeridas ou suavizadas cinematograficamente fazendo-se uso de planos fechados,
fornecendo imagens parciais de partes do corpo que não dos órgãos sexuais, ou com cenas
desfocadas.
A audiodescrição de cenas de sexo parece estar, então, condicionada ao tempo
disponível em primeiro lugar, depois ao código sonoro e à forma como as ações acontecem.
Para a seleção de que material/ imagem descrever é necessário que se preste bastante atenção
aos aspectos da encenação também. Se há uma boa iluminação e há planos médios e abertos,
não há a intenção de esconder ou suavizar a cena, então é importante manter uma coerência
em relação às imagens do filme. A falta de coerência pode ter como conseqüência a
transformação de uma cena erótica em uma cena romântica ou mecânica, assim como uma
narração rápida em uma cena lenta pode transformá-la em uma cena de ação.
Então, no caso do corpus analisado, as cenas audiodescritas continuaram sendo “cenas
eróticas”? Podemos concluir que nem todas mantiveram seu erotismo. A cena do filme O
Signo da Cidade, por exemplo, continuou sendo uma cena de sexo, mas o erotismo criado
cinematograficamente e visualmente não é percebido na versão audiodescrita. Por
conseqüência do resumo, seu erotismo foi minimizado. Já no filme Ensaio sobre a Cegueira,
sua primeira cena construiu o erotismo através de uma leve antecipação dos beijos para que
fosse possível perceber uma progressão das carícias. Na segunda cena, caracterizada pela
violência e não erotismo, o tom da cena foi mantido na audiodescrição. A cena de sexo de Se
Nada Mais Der Certo, mais marcada por ser um “rito de passagem” do personagem Marcin do
que por seu erotismo, também manteve seu tom.
Podemos concluir em relação ao corpus analisado que as normas estrangeiras, apesar
de ponto de partida, não se aplicam da mesma forma em diferentes produções e por diferentes
tradutores aqui no Brasil, seja por seus diferentes estilos, clientes ou até por uma auto-censura
que os leva a minimizar cenas de sexo. Dos filmes analisados, por exemplo, O Ensaio Sobre a
Cegueira apresentou um foco maior na questão da “não interpretação”, dedicando atenção à
descrição de ações e dando pausas para que o código sonoro cumprisse seu papel. Mesmo se
tratando de cenas escuras com planos menores, muito do que era visto foi descrito e às vezes
até explicitado (no caso de imagens muito turvas com movimentos sugeridos, mas difíceis de
serem identificados exatamente) dando a impressão de que o deficiente visual veria mais do
que o próprio vidente. Em O Signo da Cidade foi observado o grande número de ações
resumidas e longos silêncios, gerando uma incoerência com as imagens bem iluminadas e
planos abertos e médios e reduzindo consideravelmente a carga erótica de ambas as cenas. Já
o filme Se Nada Mais Der Certo também ateve-se à descrição do que aparecia na tela e
conseguiu manter a carga erótica apesar ser uma cena turva com muito mais sugestão do que
imagens explícitas.
Como proposta para novas pesquisas ou aprofundamento desta, podemos sugerir testes
de recepção e entrevistas com deficientes visuais para checar suas impressões sobre a
audiodescrição dessas e de outras cenas de sexo, bem como analisar a carga erótica provida
pela AD. Sendo este estudo o primeiro a lançar um olhar sobre este tipo de cena, mais
pesquisas se fazem necessárias até mesmo para comparar como outros países vem
desenvolvendo as suas audiodescrições de cenas de sexo e checar se o fator cultural gera
descrições diferentes. Pesquisas posteriores contribuiriam, então, para a possível elaboração
de uma sessão que falasse especificamente das cenas de sexo em material não classificado
como “erótico” ou “pornográfico” dentro das normas que estão sendo elaboradas pela ABNT.
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REFERÊNCIAS FILMOGRÁFICAS

ENSAIO sobre a Cegueira. Direção: Fernando Meirelles. Roteirista: Don Mckellar


Baseado na obra de José Saramago. País: Canadá / Brasil / Japão. Distribuição: FOX
Lançamento: 2008.

O SIGNO da Cidade. Direção: Carlos Alberto Riccelli. Roteiro: Bruna Lombardi. Produtora:
Pulsar Produções. Distribuição: Europa Filmes / Mam. Lançamento: 2007.
NO ESTRANHO PLANETA DOS SERES AUDIOVISUAIS. Criação: Cao HAMBURGER.
Transmissão original: 25 de Setembro de 2008- 20 de junho de 2009.

_______________. Episódio: Pornográficos. Criação: Cao HAMBURGER. Transmissão


original: 25 de Setembro de 2008- 20 de junho de 2009.

_______________. Episódio: Sonoros. Criação: Cao HAMBURGER. Transmissão original:


25 de Setembro de 2008- 20 de junho de 2009.

_______________. Episódio: Montagem. Criação: Cao HAMBURGER. Transmissão


original: 25 de Setembro de 2008- 20 de junho de 2009.

_______________. Episódio: Conclusão do Futuro Audiovisual. Criação: Cao


HAMBURGER. Transmissão original: 25 de Setembro de 2008- 20 de junho de 2009.

SE Nada Mais Der Certo. Direção: José Eduardo Belmonte. Roteiro: Breno Akex, José
Eduardo Belmonte e Luis Carlos Pacca. Lançamento: 2009.

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