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Eliel Baia
Resumo
O ensaio investiga parte da obra dos arquitetos, de forma que se torna possível
considerar aproximações formais entre projetos, e relações entre formas e conceitos, dos
quais o principal foco do estudo são suas aproximações enquanto condensadores sociais. O
método aplicado, desde o início da pesquisa é híbrido, se considerar a busca por material
gráfico e documentação em arquivos e acervos.
O ensaio pretende demonstrar a proximidade do projeto do SESC Pompéia com o
Construtivismo russo, amparado pela teoria da racionalidade das formas, pelas propostas de
ensino dos Vkhutemas e das Oficinas de Criatividade, além da ideia de condensador social
que contorna tanto as ações de Lina Bo Bardi como dos arquitetos da vanguarda soviética.
Em meados dos anos 1970, Lina é convidada a repaginar os galpões da antiga fábrica
de tambores da Pompéia, na Zona Oeste de São Paulo. Impressionada com a estrutura
existente, teve como partido o restauro da estrutura ali encontrada, defendendo sua
sobrevida veementemente. Além dos galpões da década de 1930 que receberam as
intervenções, o conjunto ainda conta com as novas torres para abrigar o programa
esportivo, nos fundos do lote, por onde passava um córrego a céu aberto, hoje encanado e
coberto por um deck de madeira, batizado de “rua da praia”.
O complexo fabril perde seu caráter de espaço laboral à medida em que Lina
remodela sua arquitetura e repensa seu uso, sugerindo, assim, um lugar para o ócio, para o
descanso, para atividades não ligadas ao trabalho. Nasce a Cidadela da Liberdade.
No limite, o olhar atento de Lina para questões sociais é o principal ponto de contato
do SESC com os construtivistas russos que, no início da década de 1920, lutaram pela
construção de um ideário de estado voltado para as necessidades sociais dos trabalhadores,
em uma incessante busca por soluções e novas tipologias arquitetônicas.
O pensamento construtivista, e aqui destaca-se a arquitetura, vai apontar para a
construção de uma sociedade plural, de amplo acesso aos mais diversos serviços, antes
restritos à determinadas classes. Desse modo, os projetos ligados à vanguarda russa vão
propor um novo modo de vida, mais coletivo e planejado, articulando diversos atores da
sociedade.
Leonidov que se associa a Ginzburg no início dos anos 30, momento onde ele passa
pela experiência de viver em uma unidade habitacional projetada por Ginzburg, tem a
oportunidade de se aproximar da proposta condensadora, apropriando-se do tema no
projeto Narkomtiazhprom. Não construído, o projeto propõe um grande vão aberto para a
cidade no térreo do edifício e destaca-se pelo programa amplo, de caráter misto, com
apartamentos unifamiliares, área de lazer, trabalho e estudo, aglutinando uma certa ideia de
cidade para trabalhadores.
“Pedimos ao arquiteto soviético que, como artista, e
empregando toda a sua sensibilidade intelectual, capte
e amplifique, antes que a massa cega de seu próprio
crescimento, as mínimas vibrações da energia em
desenvolvimento e lhes dê forma no edifício” (El
LISSIZTKY, 1970, p.16)
Sabemos hoje que tais ideias morreram com os grandes expurgos de Stalin nos anos
30, e como dito no artigo de Maria Isabel Villac, o condensador social fracassou em suas
ideias mais básicas, mas aqui nos importa as ligações entre Lina e Leonidov, e suas
experimentações e sucessos através do condensador social, e com a proximidade de
Leonidov com Ginzburg, podemos considerar que possuía conhecimento sobre as ideias de
condensador social.
Em determinados projetos de arquitetos
brasileiros, os “condensadores sociais” escapam da
moda das culturas consumíveis, dos ditames dos meios
massivos de comunicação e dos espaços tornados
“mercadoria”. Em obras notáveis, como o Serviço Social
do Comércio (Sesc) Fábrica Pompéia (1977-1982)13, de
Lina Bo Bardi, e o Centro Cultural São Paulo (1982)14,
de Eurico Prado Lopes e Luiz Benedito Castro Telles, o
espaço social não se encaixa nas prescrições de
comportamento e de modos de percepção “adequados
a cada situação”. Contudo, ele está aberto à
espontaneidade da experiência que os espaços e a ação
de apropriação propõem.
Em uma cidade dura como São Paulo, os
condensadores sociais — compreendidos como
indutores de relações sociais humanas consideradas
como de fundamental importância cultural —
promovem a convivência e a simultaneidade de
atividades, distinguindo, assim, a cultura cidadã em
amplo espectro. Inspirados pela multifuncionalidade e
pela presença dos clubes comunais soviéticos, e tendo
como substrato a cultura do homem comum e uma
interpretação antropológica de um “jeito social”
brasileiro, esses condensadores contemporâneos
propõem um entendimento amplo do significado de
cultura e, embora não tratem de edifícios
habitacionais, promovem o “habitar coletivo” nos
espaços públicos. (VILLAC, 2018. pag 105)
Na mesma direção, é evidente que Lina tem o ideário do condensador social como
bússola em sua ação, não fazendo qualquer tipo de distinção entre os usuários do SESC,
propondo um espaço plural, diversificado em sua abordagem programática, aberto à cidade,
absolutamente pautado na coletividade. “Aqui fizemos uma pequena experiência socialista”,
disse Lina repetidas vezes (SANTOS, 1996).
Considerações finais
A pesquisa se propôs a cruzar o projeto do SESC Pompéia com elementos caros aos
construtivistas, notabilizando três pilares de sustentação: a forma, a educação e o
condensador social. A contribuição das aulas teóricas e as orientações foram fundamentais
para este resultado parcial do estudo.
Referências bibliográficas
LIMA, Celso; JALLAGEAS, Neide. Vkhutemas: desenho de uma revolução. São Paulo:
Kinoruss, 2020.
LIMA, Zeuler R. M. de Almeida. Lina Bo Bardi. New Haven/ London: Yale University
Press, 2013. LUZ,
Vera Santana. Ordem e origem em Lina Bo Bardi. São Paulo: Giostri, 2014.
OLIVEIRA, Olívia. Lina Bo Bardi: obra construída. Barcelona: Gustavo Gili, 2002.
SANTOS, Cecília Rodrigues dos. SESC Fábrica da Pompéia. Lisboa: Editorial Blau,
1996.
VAINER, André; FERRAZ, Marcelo (org.). Cidadela da Liberdade. Lina Bo Bardi e o
SESC Pompéia. São Paulo: Edições Sesc, 2013.
VILLAC, Maria Isabel. Condensador social: uma questão para a vida pública
contemporânea. São Paulo: Revista Oculum, Janeiro-Abril, 2018.
Lista de imagens
Montagem 1:
[SESC Poméia]
https://vejasp.abril.com.br/atracao/sesc-pompeia-30-anos/
[Narkomtiazhprom]
https://thecharnelhouse.org/2013/02/16/ivan-leonidov/ivan-leonidov-narkomtiazhp
rom-project-1934-1-2/