Você está na página 1de 204

As sete artes liberais

Um estudo sobre a cultura medieval

PAUL ABELSON

Tradução
Nelson Dias Corrêa
As sete artes liberais: um estudo sobre a cultura medieval
Paul Abelson
1ª edição — outubro de 2019 — cedet
Título original:
e seven liberal arts: a study in mediaeval culture, 1906

Reservados todos os direitos desta obra.


Proibida toda e qualquer reprodução desta edição por qualquer meio ou forma, seja ela
eletrônica, mecânica, fotocópia, gravação ou qualquer outro meio de reprodução, sem
permissão expressa do editor.

Editor:
Felipe Denardi

Tradução:
Nelson Dias Corrêa

Revisão & preparação:


Vitório Armelin

Diagramação:
Gabriela Haeitmann

Capa:
Brunortega | Projetos Grá cos

Revisão de provas:
Jéssica Cardoso Leite
Luiz Fernando Alves Rosa
Natalia Ruggiero Colombo
Sa ri Linares

Desenvol imento de eBook:


Loope Editora | loope.com.br

Os direitos desta edição pertencem ao


CEDET — Centro de Desenvolvimento Pro ssional e Tecnológico
Rua Armando Strazzacappa, 490
CEP: 13087–605 — Campinas, SP
Telefone: (19) 3249–0580
e-mail: livros@cedet.com.br
Conselho editorial:
Adelice Godoy
César Kyn d’Ávila
Silvio Grimaldo de Camargo

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Abelson, Paul.

As sete artes liberais: um estudo sobre a cultura medieval / Paul Abelson; tradução de Nelson
Dias Corrêa – Campinas, SP: Kírion, 2019.

Título original: e seven liberal arts: a study in mediaeval culture

ISBN 978-85-94090-32-4

1. Educação 2. Educação liberal 3. Idade Média I. Título II. Autor

CDD 370 / 370–112 / 930

Índices para catálogo sistemático:


1. Educação – 370
2. Educação liberal – 370–112
3. Idade Média – 930
Sumário

Capa
Folha de Rosto
Créditos
Dedicatória
Introdução
Capítulo I. O desenvolvimento do currículo das sete artes liberais
Capítulo II. Gramática: o estudo prático do latim
Capítulo III. Gramática: o estudo da literatura latina
Escopo
Métodos
Capítulo IV. Gramática: os manuais
O primeiro período
O segundo período
Vocabulários: caráter geral
Dicionários escolares
Capítulo V. Retórica
A. Estudo técnico
Condições gerais
Manuais
B. O estudo do Dictamen
Caráter geral
Manuais
Capítulo VI. Lógica
A. Período pré-universidade
Escopo e livros-texto
B. A época das universidades
Capítulo VII. Aritmética
A. Caráter geral do quadrivium
B. A extensão do conhecimento
Primeiro período
Caráter geral
Obras didáticas
Segundo período
Caráter geral
Livros-texto
Terceiro período
Caráter geral do conhecimento matemático
Escopo
Livros-texto
Capítulo VIII. Geometria
Primeiro período
Segundo período
Terceiro período
Capítulo IX. Astronomia
Primeiro período
Segundo período
Terceiro período
Capítulo X. Música
Caráter geral
Livros-texto
Conclusão
Notas
Bibliogra a crítica
Fontes primárias
Obras secundárias
À minha esposa,
Helen C. Abelson.
Introdução

A CRÍTICA moderna faz ressaltar duas concepções, as quais eleva,


propriamente, a cânones da ciência historiográ ca. Sob in uência da teoria
da evolução, pressupõe que existe uma continuidade em toda a história; que o
presente tem raízes profundas no passado; que “mudam-se os tempos, mudam-se
as vontades”, mas sempre devagar e gradualmente; que não se contam mais
cataclismas na história da humanidade do que no curso da formação e do
desenvolvimento do planeta Terra. Em segundo lugar, sustenta que a única
maneira razoável de julgar o passado é à luz do espírito contemporâneo, da mesma
época tomada em particular, e não desde a perspectiva do presente. Hoje, de fato,
é malvisto o historiador que não confere a devida importância ao Zeitgeist dos
dias passados.
Ramo de investigação não há que, sob o efeito desses cânones, tenha passado
por mudanças tão notáveis quanto as operadas nos estudos medievais. Boa parte
do que se tomava por verdade histórica em determinadas áreas, e isso num recuo
de cinqüenta anos, foi simplesmente aniquilada. Nossas idéias sobre esse período
fascinante se alteraram a tal ponto que, às noções tradicionais, na sua quase
totalidade, o estudioso moderno ora responde com descon ança. “As coisas”,
adverte, “podem não ter sido como nos levaram a crer”.
É desse ponto de vista que o autor se propõe a investigar uma fase da cultura
da Idade Média. O objetivo desta monogra a é apresentar um estudo intensivo,
submetendo à prova dos dois cânones supracitados o material colhido e arrolado.
Em poucas palavras, o problema foi descobrir como o espírito irresistível da
mudança e do ajuste interagiu com o espírito da tradição na esfera singular da vida
medieval. Tal empresa, claro, só se poderia articular de uma maneira: mediante
um amplo estudo das variadas sortes de instrumentos de que dispôs a educação do
período, isto é, as in uências que moldaram o homem letrado comum.
A investigação, portanto, restringiu-se a de nir os limites do currículo das
sete artes liberais; a determinar o escopo de cada uma das disciplinas; a revelar
qualquer traço característico da quantidade e qualidade da instrução oferecida
pelas escolas medievais; e, nalmente, a compreender a relação entre a educação
liberal, toda a riqueza de conhecimento possuída pelo mundo nesse período e o
esquema da Weltanschuung* medieval.
Naturalmente, o material necessário a uma pesquisa dessas, bem como a tudo
quanto os alemães chamam, convenientemente, Kulturstudien, não se encontra na
superfície de um lão histórico qualquer. Com efeito, foi preciso procurar todo o
campo da história medieval, entre resíduos e despojos, os dados que lançassem luz
sobre questões implicadas. As conclusões que se apresentam aqui têm
fundamento num exame detalhado das obras didáticas em uso nas escolas que, ao
longo dos períodos abordados, ofereceram educação superior nas sete artes
liberais. Possibilitaram-na os resultados de investigações recentes no campo da
literatura latina, de pesquisas sobre a história das ciências matemáticas e, em
alguma medida, sobre a história da loso a. A grande massa de periódicos
especializados, franceses, mas em especial alemães, tem exibido resultados
positivos e negativos. Contamos ainda com estudos intensivos sobre as condições
gerais da cultura em porções limitadas da Europa Ocidental.
Gostaria de expressar minha gratidão aos professores D. E. Smith, Paul
Monroe e E. L. orndike, do Teachers’ College, Columbia University, pelo
auxílio que me prestaram na preparação desta monogra a. O Prof. Smith leu os
capítulos sobre o quadrivium, e brindou-me com diversas e boas sugestões; o Prof.
Monroe passou por todo o texto, e fez, com todo o escrúpulo, a sua crítica; o Prof.
orndike, gentilmente, apreciou o texto conforme saiu do prelo. Ao meu colega,
Sr. Robert I. Raiman, agradeço as valorosas sugestões sobre redação e estilo.
Acima de tudo, porém, sou especialmente grato ao Prof. James Harvey Robinson,
da Columbia University, a quem devo o meu próprio interesse por essa fase da
cultura medieval. Todo o mérito que se possa atribuir a este trabalho, deve-se,
integralmente, ao seu estimulante magistério, à sua crítica aguda e ao seu conselho
fraterno.

PAUL ABELSON
Bryn Mawr Park, Yonkers, NY
31 de março de 1906

* Cosmovisão — NT.
CAPÍTULO I
O desenvolvimento do currículo das sete artes liberais

O DESENVOLVIMENTO histórico do currículo que integra as sete artes liberais tem


recebido pouquíssima atenção dos estudiosos.1 É bem verdade que, no atinente a
várias questões de grande interesse, as fontes à mão são escassas, e as opiniões das
autoridades, con itantes. Todos, entretanto, concordam no fundamental: que o
ciclo das artes liberais na Idade Média foi, historicamente, um desdobramento
dos sistemas grego e romano de educação; que desse programa de estudos, uma
vez alterado pela introdução dos ideais cristãos, desenvolveu-se, pouco a pouco, o
currículo medieval. No presente capítulo, percorreremos brevemente a rota dessa
evolução.
A educação grega, nos primeiros tempos, consistia no estudo da música e em
ginástica.2 À medida que evoluíram tanto a vida como o pensamento grego, a
disciplina da música ampliou-se, a ponto de abarcar a poesia e as letras. No
esquema ideal de Platão, a educação dos “guardiões” mirava a integralização do
que chamaremos ensino primário, secundário e superior. O primário — ginástica,
música, letras (i.e. gramática) — seguiria até os vinte anos de idade. O secundário,
entre os vinte e os trinta, contemplaria a ciência — aritmética, geometria,
astronomia e teoria musical — e o superior, dos trinta aos trinta e cinco, o estudo
da loso a, preparação nal para vida prática do cidadão ideal. Temos aí, nas duas
primeiras etapas do programa, um possível prenúncio da separação entre o
trivium e o quadrivium.3
O currículo de Aristóteles, destinado a servir de base para os estudos
superiores, consistia em (1) leitura e escrita, (2) ginástica e (3) música, por vezes
desenho. Ele também considerava a ginástica e a música terrenos fundamentais.4
Suas idéias sobre educação nos chegaram de maneira assaz fragmentária: a
despeito de certas teorias, não há evidência alguma de que ele tenha instituído a
integração de gramática, retórica, dialética, aritmética, geometria e astronomia ao
currículo preparatório da educação grega, e tampouco o livro VIII da Política,
fonte única do seu pensamento educacional, dá-nos a entender que essas
disciplinas do currículo avançado de Platão constituíssem igualmente o que já se
chamou de “programa aristotélico de ensino secundário”.5 Na falta de uma
exposição de nitiva das suas idéias sobre o tema, é razoável supor que
convergissem com as de Platão, exceto, talvez, em que o seu plano para o
adestramento cientí co do homem requeria mais de ciência natural do que de
matemática.6 Mas mesmo esses “estudos cientí cos”, quer matemáticos, quer
biológicos, foram jamais tomados como parte do currículo que ao menino grego
coubesse estudar sem antes ter-se tornado “efebo”.7
De encontro aos “estudos cientí cos” vieram os so stas e os “estudos
práticos”: a sua ascendência fez da retórica, e não da ciência natural, a disciplina
essencial do ensino superior. Um dos efeitos dessa mudança foi a necessidade de
introduzir-se alguma carga de matemática no currículo preparatório, dado o
grande valor que lhe atribuíam os gregos. Assim, constatamos que, no século III, a
preparação do jovem grego consistia no estudo das seguintes disciplinas:
ginástica, gramática (rudimentos da linguagem), música, desenho, aritmética e
geometria — as duas últimas distintamente mencionadas como as mais
avançadas. Temos, outra vez, um prenúncio da separação entre o trivium e o
quadrivium, divisão consagrada apenas em tempos posteriores.8 No mais, não se
registram alterações no currículo grego até o nal do século I da Era Cristã.
Nos escritos de Fílon de Alexandria (ca. 30 a.C.) há referências freqüentes às
artes liberais. A não ser pela ginástica e pelo desenho, constam da sua lista todas
aquelas que se praticavam três séculos antes do seu tempo — entre elas, porém,
Fílon inclui a retórica e a dialética. Todas essas disciplinas são tratadas como
estudos preparatórios, nitidamente diferenciados da educação superior, a loso a.
A astronomia, na classi cação de Fílon, não tem lugar entre as disciplinas
preparatórias.9
Na primeira metade do século III, deparamos um escritor que alude a
gramática, retórica, geometria, aritmética, astronomia e música, e o faz de tal
modo que não restem dúvidas de que ele as tomasse como artes liberais.10 A
dialética, segundo ele mesmo, ainda era considerada uma disciplina superior.
A gura-se, portanto, que o currículo grego teve, até depois de Alexandre
Magno, apenas três ou quatro disciplinas preparatórias: letras, música, ginástica e
desenho; que outras disciplinas, como a dialética e a matemática, foram-lhe
acrescentadas à medida que o conhecimento se expandia; e que desse modo veio a
consolidar-se na Hélade livre um ciclo de estudos que era tido como o mínimo
indispensável ao cidadão médio. Conquanto não houvesse à época um número
de nitivo de disciplinas, pelo menos seis ou sete das que mais tarde formaram o
currículo medieval eram já estudadas no primeiro século da nossa era.11
Passando a Roma, observamos que as idéias gregas sobre educação
começaram a adotar-se só depois da Segunda Guerra Púnica. Findado o primeiro
período de inovação, quando a educação do jovem romano era conduzida por
mestres gregos e em língua grega, houve grandes esforços para a fundação de uma
literatura e de uma educação nacionais. Esse período marca o surgimento das
primeiras obras didáticas em latim. Varrão (116–27 a.C.), contemporâneo de
Cícero e de César, tentou, como eles, criar um sistema de educação baseado nas
idéias gregas, mas cuja matéria-prima fosse a literatura romana. Para tal, Varrão
escreveu sobre todas as disciplinas ensinadas na Grécia do seu tempo, apenas
omitindo o desenho e inserindo a astronomia. A sua obra, hoje perdida, reunia
sob o título Disciplinarum libri no em tratados de gramática, retórica, dialética,
geometria, aritmética, astrologia, música, medicina e arquitetura.12 Não há
dúvida de que os livros se destinassem às escolas secundárias, as quais então já
distinguiam-se das escolas retóricas, mais avançadas. O currículo secundário dessa
época trazia a gramática no seu sentido estreito, e assim também a literatura, a
geometria e a música, numa repetição do currículo grego do século III a.C.13
Sêneca (2 a.C.–65 d.C.), uma autoridade do seu tempo no respeitante ao que
nos interessa, não limitou a sete as disciplinas secundárias. Com efeito, suas idéias
sobre o que constituísse o círculo da educação liberal parecem ter sido bastante
inde nidas: ora gramática, música, geometria, aritmética e astronomia; ora a
medicina também se habilita; ora a retórica e a dialética são estudos avançados,
logo pertencentes à loso a.14
Tampouco uintiliano (25–95) parece ter sustentado alguma concepção das
sete artes liberais. Diz ele que o treinamento oferecido pelo grammaticus de fato
cobria a έγκύκλια παιδεία [enkyklia paideia], mas o ciclo preparatório reservado ao
seu aluno-modelo de oratória consistia apenas em gramática, um pouco de
música, geometria e astronomia — e mesmo essas disciplinas, à exceção da
gramática, tratadas de um modo super cial. Até os dezesseis anos de idade, essa
era toda instrução que os meninos recebiam.15
Vemo-nos agora ainda mais longe das sete artes liberais. Ao que tudo indica, a
in uência de Varrão em nada contribuiu para a permanência do currículo que ele
modelara à semelhança do grego. O malogro da sua tentativa de estabelecer em
Roma um currículo grego modi cado deveu-se ao fato de que, passado pouco
tempo, vieram a tomar-se como estudos avançados a retórica e a dialética. Assim,
se comparado ao modelo grego, que os romanos claramente intentaram seguir, o
programa secundário de Roma era um tanto menor. Em primeiro lugar, o período
próprio à educação secundária era mais curto, estendendo-se até os dezesseis anos
de idade, e não até os vinte e um, como na Grécia. Ademais, a índole romana fez
rejeitar do currículo tudo quanto não fosse de natureza prática, donde o estudo da
matemática, em que os gregos, contemplativos, deleitavam-se, ter-se reduzido ao
mínimo. uintiliano recomendava estudos em geometria, aritmética e
astronomia, mas tão-somente enquanto estudos práticos.
As escolas romanas, parcialmente helenizadas, conservaram sua e ciência e
praticidade por algumas gerações, até que o século III assistisse ao começo de um
declínio. Instalava-se o espírito da super cialidade, e tudo era sacri cado em
nome das necessidades práticas do dia. Exceto na Gália e na Hispânia, onde traços
regionais encorajavam o estudo da retórica e o mais elevado cultivo da eloqüência,
o currículo, em geral, contraiu-se, e o grammaticus, tal como previsto por
uintiliano, apossou-se do trabalho do rhetor.16 Desse modo, enquanto se via um
declínio no âmbito do ensino superior, a escola secundária enriquecia-se com
elementos da retórica e da dialética. O currículo da escola romana do período
consistia, portanto, no estudo super cial de elementos de gramática, retórica,
dialética, aritmética, geometria, música e astronomia. Era esse, com toda a
certeza, o padrão vigente nas escolas pagãs em inícios do século IV.
As evidências a esse respeito se nos mostram bastante convincentes à luz dos
últimos estudos sobre De nuptiis Philologiae et Mercurii, de Marciano Capela.17
Considerando-se o pouco que se sabe da sua vida, é muito improvável que Capela
tenha sido o formulador de algum currículo, de maneira que a sua obra, a qual
descreve o conteúdo das sete artes liberais — gramática, dialética, retórica,
geometria, aritmética, astronomia e música, nessa mesma ordem — parece mais
re etir os padrões da sua época. A m de retratar as artes liberais em poesia,
Capela voltou-se, naturalmente, à obra de Varrão. Este, “vir Romanorum
eruditissimus”, era decerto, para um provincial africano como Capela, uma
autoridade digna de se seguir em termos de estilo e conteúdo.18 A obra de Capela,
como a de Varrão, divide-se em nove livros, ainda que as artes retratadas sejam
apenas sete; os dois primeiros livros compõem a introdução alegórica. Corrobora-
se, então, na similaridade entre as formas de apresentação, a hipótese de que ele
acompanhasse Varrão no entendimento das matérias: segundo o próprio Capela,
a omissão da medicina e da arquitetura, ambas abordadas na obra de Varrão, deu-
se a título de preservação do cenário mitológico da sua alegoria.19
Pode-se olhar para o século IV como o período em que o currículo das escolas
pagãs de todo o império assumiu o caráter estável de um programa de artes
liberais. Esses anos de transformações sociais e políticas marcaram as fases nais
da evolução de um programa de estudos que, por intermédio da escola pública —
instituição característica do império tardio —, revelou-se talvez o meio mais e caz
de preservar a cultura da Antigüidade clássica.
Não obstante, ao longo dos três séculos da sua cristalização, esse currículo foi
visto com profunda descon ança pelos líderes cristãos. Homens como Orígenes,
Tertuliano e Jerônimo consideraram essas mesmas escolas as mais formidáveis
oponentes da nova religião — e à luz do que estava em jogo na disputa, suas
denúncias veementes contra a educação pagã tornam-se no mínimo
compreensíveis.
O nal do século IV assistiu, porém, a uma mudança decisiva: o triunfo dos
ideais cristãos foi total, e a decadência da antiga educação em quase todo o
império foi tão notável quanto o ocaso do paganismo. Agora que as escolas pagãs
já não mais ameaçavam a supremacia da Igreja, os líderes cristãos podiam
debruçar-se desapaixonadamente sobre os méritos do antigo currículo. Não foi
preciso grande esforço da razão para notar que as escolas retóricas da Gália, no
seu declínio entre os séculos IV e V, eram menos do que inúteis do ponto de vista
cristão, ao passo que a matéria da instrução que elas ofereciam — literatura,
retórica e dialética — era de real valor para o estudo da teologia. Foi essa, na
verdade, a opinião predominante entre os éis do novo credo desde o primeiro
momento de tensão com o paganismo. Mesmo as respectivas gerações de
Orígenes, Tertuliano e Jerônimo freqüentaram as escolas em certa medida, e se
um bom cristão, consciencioso, não se podia tornar professor de retórica, por
outro lado não lhe cabia censura por estudar em instituições pagãs. Parece
razoável que, no correr do século V, os cristãos não objetassem à introdução das
sete artes liberais de Marciano Capela num currículo que se intentava preliminar
ao estudo da teologia.20
A incorporação de elementos do currículo pagão foi incentivada pelo próprio
Agostinho (354–430), autor de tratados sobre gramática, retórica, dialética,
aritmética, geometria e música — seis das sete disciplinas do currículo medieval.21
Sua in uência, sob a invocação da justi cativa bíblica ao “despojo dos egípcios”,
foi decisiva para que a Igreja reconhecesse as artes liberais como disciplinas
adequadas à educação cristã. Embora não tenha concebido o currículo das sete
artes liberais, Agostinho, mais do que qualquer outro, possibilitou sua adoção
generalizada pela cristandade ocidental.22
Com o apoio de autoridade tão ilustre, foi natural que as artes liberais,
seculares, tivessem garantida a sua posição no currículo medieval.23 Cassiodoro
(480–575), ao que se sabe, foi o primeiro cristão a empregar o termo “sete artes
liberais”. Em De artibus et discipliniis liberalium literarium, obra complementar ao
seu De institutis literarum sacrarum, Cassiodoro acompanha Agostinho em
a rmar a necessidade dos estudos liberais como preparação para os estudos sacros,
e vale-se das Escrituras para mostrar que sete devem ser as disciplinas: “A
sabedoria edi cou para si uma casa, levantou sete colunas” (Pr 9, 1). Essa
passagem dá sustentação conclusiva aos seus argumentos, e que ele a tenha citado
é, com efeito, signi cativo. Isso quer dizer que os próceres cristãos daquele tempo
admitiram a necessidade de incorporar ao seu currículo os estudos seculares; e
como esses estudos, já por um século e meio, tinham sido sempre sete, era também
necessário explicar, de um ponto de vista cristão, que esse número fora
divinamente sancionado. Com Cassiodoro, xaram-se tanto o número como as
próprias disciplinas do currículo medieval. Sua autoridade, somada à de
Agostinho, foi o bastante para imprimir a esse programa a rigidez que se
conservaria por quase nove séculos. O trabalho de ambos marca a transição nal
do currículo pagão para mundo das letras.
A partir de Cassiodoro, o termo “sete artes liberais” passa a expressar
comumente o ciclo preparatório de estudos seculares. Isidoro de Sevilha emprega-
o tanto quanto fala de trivium e quadrivium,24 da mesma forma que Alcuíno,
Rábano Mauro e os escolásticos. O termo estabeleceu-se de tal forma que não raro
as artes liberais foram tema de poemas e pinturas.25

Resumindo-se os dados desta primeira investigação, podemos fazer as seguintes


generalizações:

1. Em aproximadamente cinco séculos de desenvolvimento educacional, os


gregos chegaram a um currículo de sete artes liberais. Todo o conteúdo
desse currículo foi conservado para Roma, e em latim, por Varrão.

2. Roma adotou parcialmente esse currículo somente entre o período nal


da república e os primeiros tempos do império.

3. Já no declínio do império, deu-se um notável retorno ao currículo grego


na sua integralidade. Sua forma e conteúdo xaram-se de uma vez por
todas ao nal século III da nossa era.

4. O cristianismo, triunfante, julgou necessário apropriar-se do conteúdo


desse currículo, a m torná-lo disciplina preliminar ao estudo superior da
teologia.

5. Admitido o valor dos estudos seculares, as autoridades cristãs seguiram a


linha do menor esforço: adotaram in toto o currículo pagão que existia,
consagrando a sua escolha com a sanção das Escrituras.

6. O espírito da tradição, tão próprio ao período, foi forte o bastante para


manter a estabilidade desse currículo no curso de toda a Idade Média.
CAPÍTULO II
Gramática: o estudo prático do latim

C OMO arte liberal, a gramática teve na Idade Média um alcance muito maior
do que o termo hoje implica. A palavra “gramática” foi introduzida em
Roma no período helenístico, e veio a ter lá o mesmo sentido que então assumira
no mundo grego: o estudo da literatura.1 Naturalmente, foi essa a perspectiva
tomada pelos autores de obras didáticas na Idade Média.2
Essa disciplina fundamental mirava, portanto, o domínio da linguagem
universal daquele tempo, a língua da Igreja e do Estado, laço de união entre as
classes letradas de toda a Europa Ocidental.
Mas não será da amplitude conferida pelos próprios gramáticos à de nição da
disciplina que dependerá a nossa avaliação sobre o peso da gramática no currículo
medieval; o nosso norte, em última instância, serão os verdadeiros objetivos e
resultados da instrução. uais eram, a nal, os seus objetivos? Em primeiro lugar,
o domínio prático da língua latina, rota segura para o alto conhecimento; em
segundo, a apreciação das suas formas literárias.
Este capítulo dedica-se a examinar o real escopo, conteúdo e método do
ensino da gramática. Em outras palavras, tentaremos descobrir como o jovem
aluno de uma escola medieval era instruído em latim, uma língua que não lhe era
a materna, de maneira que, dentro de três ou quatro anos, ele a tivesse como meio
de expressão cotidiana num ambiente de estudos. O próximo capítulo reserva-nos
tarefa mais complicada, isto é, encontrar uma resposta satisfatória à controversa
pergunta: “Até que ponto o ensino da gramática previsto no currículo desenvolvia
a capacidade de apreciação literária?”.
Não há dúvidas de que o objetivo prático, a aquisição do idioma para ns de
comunicação, fosse sempre alcançado.3 Nesse trabalho, porém, o professor
medieval estava à própria sorte, pois o método em voga na Roma Antiga,
qualquer que tenha sido, não tinha a menor utilidade para o ensino do latim
como língua estrangeira — fato esse que torna o problema ainda mais
interessante.
Se carecemos de um registro autêntico e integral do método empregado na
instrução em latim, ainda é possível, em certa medida, reconstituir a vida escolar
nesse período.4 Com base em várias fontes, estabeleceu-se que o menino medieval
já soubesse pronunciar e escrever palavras latinas, bem como dizer as orações em
latim, quando iniciava o estudo da gramática. Três anos de canto e de recitação
dos salmos tinham já fortalecido a sua memória e lhe ensinado as quantidades
latinas, ainda que, àquela altura, ele não soubesse o signi cado das palavras.5
Assim o grammaticus dava início ao trabalho de apresentar o menino à
gramática latina. O seu ponto de partida, claro, eram as partes do discurso. Era
preciso um texto básico, em que as regras elementares viessem ilustradas com
palavras simples. Nos dias de hoje, os problemas com que o professor se deparava
seriam considerados invencíveis; os livros eram escassos, e por vezes nem um
único aluno em toda a sala possuía uma cópia do texto. ue progresso faria um
professor moderno ao ensinar uma língua estrangeira sem o amparo de copiosos
manuais? O mestre-escola, porém, sem se deixar intimidar, tirava o máximo da
sua própria cópia, sempre surrada, não raro imperfeita. Dia após dia, lia em voz
alta uma determinada seção, a qual explicava cuidadosamente, traduzindo para o
vernáculo as palavras mais difíceis; os meninos, nas suas tábuas de cera, copiavam
frases simples e ilustrativas, e na aula seguinte, tendo recitado a lição anterior,
tinham de avançar do mesmo modo sobre outra porção do texto. O processo
continuava, somente variado por freqüentes revisões, até que os alunos tivessem
memorizado um certo número de regras e aprendido o signi cado de várias
palavras do uso diário. Entretanto, ao perceber que os meninos aprendiam
depressa as palavras novas, o professor, nas suas explicações, passava gradualmente
do vernáculo para o latim. A m de facilitar a aquisição de palavras cotidianas, ele
introduzia oportunamente algum colloquium, uma espécie de manual de
conversação. Não havendo um à mão, ajudava-lhe o engenho a compilar o seu
próprio.6
O trabalho do professor só aumentava depois de os seus alunos terem
dominado esses rudimentos, pois aí se fazia necessário um livro adequado para
uma criança de onze anos de idade. Provê-la de tal livro é, sem dúvida, mera
questão de pedagogia. Nos nossos dias, quando o professor, constantemente
achacado por uma pletora de livros, tem-se pasmo ante a variedade de opções ao
seu dispor, a gravidade que o problema tinha para o professor medieval mal pode
ser estimada. E, todavia, a solução encontrada põe à prova a nossa admiração.
Embora as circunstâncias obrigassem cada mestre-escola a compilar o seu próprio
livro, todos utilizaram-se de material similar. Parecem ter partilhado o mesmo
entendimento sobre uma situação pedagógica enfrentada por todos, mais ou
menos da mesma forma.
Nas suas incursões pela lologia, pelos antiquários e pela Kulturgeschichte,* os
historiadores modernos têm lançado luz sobre um sem-número dessas obras.
Algumas, conquanto representem o trabalho de uma vida, jamais atingiram a
popularidade para além da escola onde atuava o seu autor; outras, mais célebres,
foram usadas com certa freqüência aqui e ali; mas poucas foram conhecidas em
toda a cristandade, de maneira que escola alguma pudesse reivindicar distinção
enquanto não se as houvessem estudado intramuros. Esses pequenos livros são
verdadeiros monumentos de habilidade pedagógica. Vindos de tantas partes da
Europa Ocidental, o que reduz ao mínimo as possibilidades de plágio, trazem
notáveis evidências de similitude no que diz respeito à escolha e à abordagem do
material. Lendas e narrativas, provérbios e ditos populares, fatos do cotidiano
particularmente interessantes: disso tudo compunha-se o universo dos pequenos
leitores.
Mas não é esse o único fato impressionante sobre os livros didáticos. Ainda
mais signi cativas são as mudanças e adaptações, tanto no material como no
método, que os autores zeram para adequar-se ao espírito e ao temperamento
das suas respectivas gerações. A nós nos parece natural que o New England
Primer** do século XVIII perdesse o lugar para um livro mais interessante aos olhos
do menino do século XX. Raramente procuramos tais mudanças na Idade Média,
e contudo não só as houve, mas foram tão acentuadas quanto as de hoje. Desse
modo, nos tempos que se seguiram à dissolução do império, os livros utilizados
em sala acusavam grande dependência dos métodos romanos; foram-se ajustando
de geração em geração, e já na alta Idade Média as peculiaridades clássicas haviam
praticamente desaparecido. Diríamos, em palavras modernas, que o mestre-escola
entendeu o “princípio da apercepção”.7
Como é de supor, o espírito da época ditava que jamais a disciplina em si
mesma ofuscasse o objetivo geral da educação, isto é, o bem viver segundo o
cristianismo. Na verdade, todas essas obras didáticas baseiam-se, uniformemente,
em duas idéias: instruir em latim e inculcar, por tabela, princípios éticos e
religiosos. A gura-se, no entanto, que os autores variavam nos seus métodos. Uns
empregavam material de caráter abstrato, outros preferiam o concreto, e por vezes
num só livro combinavam-se as duas coisas.
O modelo da primeira tendência foram os Disticha Catonis. A amplitude da
utilização desse livrinho, datado aproximadamente do século IV, empresta
particular interesse à análise do seu conteúdo. De partida, os 143 dísticos da
versão analisada podem ser classi cados da seguinte maneira:

1. O espírito da religião 17
2. Autocontrole 35
3. Deveres para com os outros 35
4. Máximas prudenciais 35
5. Informações variadas 218

Vê-se logo que esse livro não é de origem pagã, como geralmente se supõe —
algo que uma leitura atenta dos dísticos iniciais sugeriria com nitidez. O texto
pode ser considerado representativo de um período de transição: a primeira Idade
Média, quando era de uso corrente. Sua popularidade em nada foi comprometida
pelo fato de abundar em traços de estoicismo; a Europa Ocidental ainda precisava
da herança clássica, o bastante para não se desfazer de obra tão útil. Assim, essa era
de fé pôs nas mãos dos seus meninos, os botões da Igreja, um livro tão meticuloso
em evitar questões de ortodoxia, que os zelosos suspeitaram ser-lhe o autor um
pagão.
O Liber proverborum de Otlo foi composto no século X, em parte para
suplantar os Discticha Catonis. À sua geração, naturalmente soaria mais
interessante um livro baseado em fontes bíblicas e patrísticas do que outro
qualquer baseado em autores profanos.9
Com Deliciae cleri, de Arnulfo, marca-se mais um passo de afastamento dos
romanos e aproximação de uma perspectiva puramente medieval; a obra assenta
quase que por inteiro nas Escrituras em geral, e em particular nos Provérbios.10
Os Proverbia Wiponis, os chamados Sche larer Proverbia e os Proverbia Henrici
representam ainda outro estágio na evolução das obras desse gênero. Nelas o
material deriva-se de fontes caracteristicamente nacionais — nem de autores
clássicos, nem de autores cristãos.11
Não obstante, a cartilha que mais despertava o interesse de alunos e
professores era a qual se entremeasse de fábulas e narrativas. A doutrina do
mestre-escola moderno, segundo a qual, para as crianças, melhor o concreto do
que o abstrato, parece ter sido a palavra de ordem do seu protótipo medieval.
Nenhuma outra hipótese dá conta da impressionante quantidade dessas coleções.
Embora passassem por obra de autores diversos, todas elas baseavam-se
rmemente nos cinco livros de Fedro, contemporâneo de Tibério, e na obra de
Aviano, autor do século II. No século X, as fábulas de Fedro foram trabalhadas por
um dito Rômulo, e como tais fundamentaram todas as subseqüentes compilações
medievais, tanto em latim como em vernáculo.12 Dentre as coleções em uso no
nal da Idade Média, podem-se destacar o Novus Aesopus e o Novus Avianus de
Alexandre Neckham; nada menos que sete manuscritos da sua obra, e em verso,
foram encontrados por Hervieux.13 O Phaedrus foi parafraseado e posto em
prosa por monges que o quiseram empregar no magistério, e nada menos que 47
desses manuscritos foram já encontrados na França, no sul da Alemanha, na
Inglaterra, na Bélgica e na Itália, ao passo que dos manuscritos em verso já se
descobriram 112 na França, na Espanha, na Holanda, na Alemanha, na Inglaterra,
na Áustria, na Bélgica, na Itália e na Suíça. O corpus diretamente derivado de
Fedro bate a marca de 216 manuscritos.14
Os tipos de obras didáticas descritos até aqui assinalam a tendência geral em
termos de método e abordagem no ensino primário do latim. Mas, do século XI
em diante, houve professores que almejassem combinar o abstrato e o concreto e
adaptar o material aos gostos da sua própria geração ou nacionalidade.15 Esses
esforços encontraram a sua melhor expressão nos 2.473 versos que compõem o
primoroso Fecundia ratis, livro escrito por Egberto, padre e submagister scholae
em Liège, entre 1022 e 1024.16
Na sua exaustiva investigação, Voigt demonstra que o objetivo do autor era a
criação de uma cartilha ideal, que apresentasse o melhor da literatura sem no
entanto extrapolar os limites da compreensão de uma criança. Para tanto, valeu-se
do que era sacro e profano, concreto e abstrato; fábulas e provérbios lado a lado
com os melhores escritos dos Padres da Igreja. ue Egberto dedicou a essa tarefa
um grande zelo vê-se pela quantidade de autores citados, direta ou indiretamente.
O livro contém uma imensidão de informações a respeito da vida de estudos e
assuntos congêneres. uanto à forma, segue uma linha de di culdade progressiva,
começando por sentenças de uma só linha, até chegar, no nal, a parágrafos com
mais de vinte. uanto ao conteúdo, semelhantemente, os 2.473 versos de
Fecundia ratis apresentam-se em graus de di culdade cada vez maiores: os
primeiros 595 são provérbios e epigramas de uma linha; os próximos 400 (596–
1008), dísticos um pouco mais so sticados; os 760 seguintes (1008–1768)
incluem fábulas de extensão variada; e os últimos 600, tópicos teológicos e
bíblicos.17
Não restam dúvidas de que o mestre-escola medieval apreciava
inteligentemente as di culdades pedagógicas em torno do ensino de uma língua
estrangeira que se deveria tornar, para o aluno, o meio de expressão mais
cotidiano. Do mesmo modo, a gradual modi cação e adaptação dos materiais,
sempre em vista das necessidades de cada tempo e da motivação da classe,
demonstra a grande habilidade do professor medieval, que em muitos casos era
impelido a ser o autor da cartilha que os seus alunos haveriam de estudar.

* História cultural — NT.


** A primeira cartilha publicada nos Estados Unidos — NT.
CAPÍTULO III
Gramática: o estudo da literatura latina

ESCOPO

N OS seus estudos introdutórios, como visto, o aluno adquiria os rudimentos


do latim por meio das compilações de provérbios e fábulas, em prosa e
verso. Também dominava, em certa medida, as regras da composição e da
prosódia, donde estar pronto para a leitura de autores mais sérios.
Tal como na Grécia e em Roma, liam-se primeiro os poetas; isso porque a
poesia, além de ser mais facilmente memorizável, propiciava meios mais
adequados para o domínio das sutilezas da língua. A escolha dos autores dependia
sempre do gosto do professor e da acessibilidade das cópias — o viés religioso
tinha, a esse respeito, muito menos in uência do que já se supôs.1
Porém, mesmo admitindo-se que os alunos freqüentassem os autores latinos,
persistem irresolutas algumas questões de grande interesse. Em que medida se
estudavam os clássicos? E com que espírito? uais eram os autores preferidos?
Acaso o estudo dos clássicos, conforme os usos e os métodos da época, cultivava
realmente uma apreciação da literatura em geral, e em particular da literatura
romana?
Essas perguntas são fonte de controvérsia desde a época dos humanistas, de tal
forma que dar-lhes uma resposta de nitiva não gura entre as possibilidades ao
nosso alcance. No fundo, elas implicam o problema imensamente variado que nos
oferece o uso dos clássicos durante Idade Média — um tema cuja história ainda
está por ser escrita.2 Esse ponto sobre a educação medieval tornou-se, aliás, e não
sem motivo, um campo de batalha para protestantes e católicos. Um lado quer
nos convencer de que esse foi um tempo de ignorância generalizada; não poderia
ser diferente — é o que nos dizem —, dada a funesta ascendência da Igreja sobre a
educação. Citam-se casos isolados de barbarismo e frases mutiladas de umas
poucas personalidades, pressupondo-se, inocentemente, ser isso o bastante para
levar a discussão.3 O outro lado, zeloso para com a fé antiga, não somente
rea rma a assiduidade aos clássicos, mas também alega, no auge do seu
entusiasmo, ter-se aproximado a Idade Média da educação básica universal.4
A atitude de autores recentes no que diz respeito a essa polêmica indica uma
reação a tais extremos. Esse novo ponto de vista tem levado os pesquisadores a
compilar, com toda a diligência, listas e mais listas de alusões a autores clássicos
presentes nos escritos de autores medievais. Dessas compilações, tiramos
seguramente que os autores medievais, em maior ou menor grau, tinham
familiaridade com os seguintes clássicos: Plauto, Terêncio, Catulo, Lucrécio,
Virgílio, Horácio, Ovídio, Lucano, Marcial, Pérsio, Cícero, Sêneca, os Plínios,
uintiliano, Cornélio Nepos, César, Salústio, Lívio, Suetônio e Tácito.5
Contudo, ao passo que essa generalização está decerto mais de acordo com o
espírito da histogra a moderna, as evidências em que ela se apóia passam longe de
ser conclusivas — ainda não se provou que ao menos uma parte considerável
dessas referências sejam de primeira mão. Os fatos, com efeito, indicam uma
conclusão oposta. É bem sabido que o estudioso medieval, graças ao elaborado
manual de Prisciano, contava com uma extensa coleção de citações de todos os
autores enumerados logo acima.6 Mas quantas dessas citações realmente
representavam algo mais do que a mera familiaridade com a obra de Prisciano?
Os parágrafos anteriores deixam claro que é impossível dar às questões
levantadas uma resposta completa e de nitiva. Ainda assim, restam prováveis os
seguintes pontos:

1. Houve um interesse geral pela cultura literária nas escolas da Idade


Média;

2. Os clássicos latinos foram mais estudados do que o mais solidário


estudante da cultura medieval poderia esperar.

ue houvesse cultura literária nas escolas da Idade Média pode-se inferir dos
seguintes fatos:

• Houve grande produção de bons escritos em latim, tanto em prosa com


em verso, ao mesmo tempo em que se produziam os habituais calhamaços
do período.7

• Parte das evidências de ignorância ou indiferença aos clássicos pertence à


era das universidades, quando a escolástica já transformara o espírito do
tempo a in uência da Igreja sobre a educação diminuíra muito em relação
ao período anterior.

As queixas de João de Salisbury sobre o abandono dos clássicos não podem


passar por características desse tempo. Lidas na íntegra, suas observações apontam
que o estudo da gramática em sentido amplo, isto é, como a leitura dos clássicos,
era, na verdade, uma idéia ultrapassada, datada do período anterior ao advento da
escolástica.8
Se olharmos com atenção para as condições educacionais da Idade Média, e
não somente em um país, mas em toda a Europa Ocidental, constataremos logo
que em momento algum os clássicos sofreram de uma negligência comparável à
que se tem suposto. Mesmo no chamado “período das trevas”, entre os séculos VI e
VIII, encontramos evidências inquestionáveis de que a Itália estava repleta de
escolas — monásticas, catedrais e seculares, públicas e privadas.9
Há indícios su cientes para a rmar que a dita reforma carolíngia não
implicou um renascimento na literatura, mas apenas uma transferência do
letramento, por meio de Alcuíno e de Paulo Diácono, da Britânia e da Itália para
a França — mudança que não foi temporária, senão permanente. Essa cultura, que
se manteve no império reformado, é também encontrada nas cortes otonianas,
pelas muitas escolas que, direta ou indiretamente, foram in uenciadas pelos
seguidores de Alcuíno. O interesse pelos clássicos não teve ruptura ao longo de
todo o período.10
Pesquisas verticais sobre regiões em particular, sejam quais forem,
demonstram a existência de um interesse constante, tanto nas escolas monásticas
como nas catedrais e ainda outras, pelo estudo da gramática e da literatura.11
A posição da Igreja medieval em relação aos estudos seculares já foi bastante
distorcida. Alguns a rmam que ela se opunha por completo ao estudo literário,
uma vez que a palavra o cial objetava à educação enquanto m de si mesma. O
erro, aqui, é evidente. Em primeiro lugar, a regra que em tantas ordens religiosas
manteve a prática de copiar manuscritos como parte da rotina simplesmente ia ao
encontro do estudo dos clássicos. Casos isolados, em que monges apagassem os
pergaminhos com a nalidade de escrever vitae dos santos, certamente reduzem-
se à insigni cância quando pensamos nas mais de mil cópias ainda hoje existentes
desse importante manual: a gramática de Prisciano.12
Da forma como chegaram até nós, os catálogos das bibliotecas monásticas da
Idade Média mostram que quase a metade de todo e cada acervo era composta,
invariavelmente, de gramáticas e autores clássicos, pagãos.13
Ademais, as próprias biogra as dos supostos oponentes da educação clássica
mostram que eles todos receberam uma boa instrução nos clássicos.14
Aumenta constantemente o número de centros de educação secular cuja
existência é de nitivamente comprovável. Há evidências de que cada pedaço da
cristandade ocidental não somente abundasse em escolas menores, senão que
ainda abrigasse muitos centros de cultura em que se freqüentava assiduamente a
literatura do universo clássico.15 Fato é que se identi caram aproximações do
brilhante magistério de Bernardo de Chartres aos padrões modernos de
educação.16
Teodulfo, bispo de Orleans, sucessor de Alcuíno na posição de conselheiro
educacional de Carlos Magno, e cujo interesse pelas artes liberais é insuspeito,
revela ter lecionado os seguintes autores, clássicos e cristãos, no século VIII:
Virgílio, Ovídio, Pompeu, Sedúlio, Rutílio, Arátor, Fortunato, Juvenco e
Prudêncio.17
Walter de Speyer, educado em Speyer no nal do século X, debruçou-se sobre
Virgílio, o Homero latino, Horácio, Pérsio, Juvenal, Estácio, Terêncio, Lactâncio,
Boécio e Constantino durante os seus anos de instrução em gramática.18
No mesmo século deparamos Gerberto, mais tarde Papa Silvestre II, a tratar,
entre as outras disciplinas que ensinava em Rheims, de Virgílio, Estácio, Terêncio,
Juvenal, Pérsio, Horácio e Lucano. Tudo isso ele considerava preliminar ao estudo
da retórica. Ora, os interesses de Gerberto, como sabemos, eram mais
matemáticos do que literários; daí que ele julgar necessário o estudo desses
autores, como parte da disciplina da gramática, pareça indicar e mesmo re etir o
consenso mais básico entre os professores do seu tempo.19
Um século adiante, Otlo menciona expressamente os nomes de Horácio,
Terêncio e Juvenal.20
Hugo de Trimberg, o erudito mestre-escola de Bamberg, dá, em 1280, os
nomes dos livros e dos autores de que tratava: Virgílio, Ovídio, Juvenal, Pérsio,
Estácio, o Homero latino, Sedúlio, Juvenco, Arátor, Próspero e Prudêncio.21
Em inícios do século XIII, Everaldo de Béthune, gramático e retórico, eleva a
modelos de estilo — na terceira parte da sua obra principal, o Laborinthus — os
mesmos autores mencionados por Hugo de Trimberg.22
João de Garlandia, explicitamente, oferece uma lista dos autores obrigatórios
para cada disciplina, mencionando, no tocante à gramática, os nomes de Estácio,
Virgílio, Juvenal, Horácio, Ovídio, Salústio, Lívio, Sêneca e Marcial.23
No século XII, deparamos um mestre-escola que menciona Lucano, Pérsio,
Terêncio e Horácio entre os livros gerais para o estudo da gramática.24
Um poema satírico do século XIII indica que se estudavam os seguintes
autores: Ovídio, Juvenal, Terêncio, Horácio, Pérsio, Plauto, Virgílio, Lucano,
Boécio e Maximiano.25
Virgílio foi estudado ao longo de toda a Idade Média; consideravam-no
autoridade em gramática, além de um mestre do estilo — por isso o atencioso
estudo da Eneida. A imensidão de glosas a Virgílio e a outros autores, que, a não
ser a título de ilustração, di cilmente seriam trazidos à sala de aula, parece
demonstrar o amplo emprego que eles tiveram.26
É signi cativo que Henri d’Andeli, autor do humorístico A batalha das sete
artes, tenha colocado sob a insígnia de Orleans, isto é, no partido pelo estudo da
gramática, os seguintes autores: Donato, Prisciano, Pérsio, Virgílio, Horácio,
Juvenal, Estácio, Lucano, Sedúlio, Prudêncio, Arátor e Terêncio.27
O exposto até aqui exempli ca a contento o escopo e o espírito da instrução
em literatura enquanto parte do estudo da gramática latina. É evidente que os
clássicos não eram tudo que o professor empregava no adestramento dos alunos
em termos de forma e apreciação literária; o espírito da época também pedia
autores cristãos. Esse mesmo fato, entretanto, sustenta a hipótese, pois à medida
que examinamos cuidadosamente as evidências, descobrimos que apenas se liam
os autores cristãos cuja excelência literária estava acima de qualquer suspeita.
Assim, entre literatura de conteúdo cristão e literatura de conteúdo pagão, o
mestre-escola, como é de esperar, optava pela primeira, porém jamais para a
exclusão da segunda. Nem o mais célebre dos autores cristãos sequer rivalizou
com Virgílio em popularidade.
Entre os autores cristãos, vale a pena mencionar Juvenco (ca. 330), o autor de
Historia evangelica, um evangelho em verso. O livro foi muito utilizado; seu estilo
puro e dicção uente devem ter impressionado positivamente os professores.
Além disso, o seu conteúdo era mais que satisfatório de um ponto de vista cristão.
Os seus vários glossários, bem como o vasto número de manuscritos que nos
restaram, indicam que esse autor foi muito empregado nas escolas.28
Muito conhecido é também Carmen Paschale, de Sedúlio ( . 430). O livro,
baseado no Velho e no Novo Testamento, tornou-se padrão para o ensino da
gramática, do metro e da história bíblica. De um modo geral, foi muito benquisto
na Idade Média.29
Mas o autor cristão mais empregado, cuja popularidade quase igualou a de
Virgílio, foi Aurelius Prudentius Clemens, mais conhecido como Prudêncio ( .
400). Suas obras, especialmente Psychomachia e Cathemerinon, representam a
mais elevada expressão do cristianismo em forma clássica. Sua in uência foi
profunda, mais que naturalmente, e admiração por ele foi enorme — chamaram-
no “dissertissimus atque christianissimus poeta”. A presença de Prudêncio nas
salas de aula pode-se medir pelos vinte e um manuscritos diferentes que ainda
restam de glossários germânicos das suas obras.30
MÉTODOS

Passando aos métodos de instrução, temo-los tão bem elaborados no estudo


avançado dos clássicos quanto na instrução elementar do latim. Agora que o
objetivo central é o domínio das formas literárias, o método empregado consistia
em revelar a etimologia das palavras. Os dicionários, por conseguinte, eram muito
usados, e ao aluno se ofereciam, à guisa de explicação, exposições mitológicas e
históricas.31
Estudar gramática, a essa altura, signi cava estudar Virgílio. Fez-se necessário
escrever comentários sobre a sua obra, e de fato muitos houve que os escrevesse.
Esses comentários podem dividir-se em quatro grupos:

a. Comentários literários sobre o autor. O mais famoso foi o de Marius


Servius Honoratus, que serviu de fonte e modelo para obras
subseqüentes. Nele o desenvolvimento limita-se ao mínimo necessário
para esclarecer o texto em nível literal.32

b. Virgílio enquanto retórico. A obra de Tiberius Claudius Donatus ( .


400) é a mais conhecida desse grupo. Nela a Eneida é apreciada como
uma obra-prima de composição retórica.

c. Panegíricos. Este grupo trata Virgílio como a mente universal. O elogio


da pena de Macróbio, autor do século v, pode ser considerado o mais
típico.

d. Comentários místicos e alegóricos. Esses comentadores tomam Virgílio


como o livro do qual se revela o que está oculto. As obras de Fulgêncio —
De con enientia virgiliana e Mythologicon — podem der consideradas
modelares.33

No estudo dos autores clássicos, relatos das suas vidas e das suas épocas eram
muitas vezes disponibilizados aos alunos. Esse material encontrava-se em
livrinhos conhecidos como “accessus ad poetas”.34 Embora a explicação literal
fosse o objetivo elementar da instrução, o fato é que, no mais das vezes, alcançava-
se muito mais do que isso. As formas e expressões idiomáticas eram enfatizadas;
seções inteiras, memorizadas; e o aluno via-se testado com freqüência, tendo de
reformular a idéia do autor em prosa correta, sem barbarismos ou solecismos, para
provar que compreendera o que leu.35
A qualidade desse trabalho dependia principalmente do caráter do professor.
Bernardo de Chartres, por exemplo, que educou João de Salisbury no século XII,
não somente lia os autores junto com os alunos, mas também explicava
construções, apontava equívocos, elucidava questões, pedia aos alunos que
julgassem e criticassem, fazia-os decorar passagens e escrever exercícios originais.
Por mais que esse trabalho represente o que havia de melhor no ensino da
gramática, a prática da composição em prosa e verso era muito comum nas escolas
em geral; o último dos três anos dedicados ao estudo da gramática era reservado a
atividades desse gênero.36 Essa instrução tinha um nome técnico, dictare, e a
habilidade de fazer um dictamen metricum era uma espécie de testamentum
maturitatis em gramática.37 O exercício baseava-se, naturalmente, numa passagem
qualquer de um autor clássico ou das Escrituras; raras vezes algum jovem bem-
dotado entregava como dictamen uma produção poética mais so sticada.38
Tudo o que se disse acerca dos clássicos e da sua presença no programa de
gramática só vale para o período antecedente à era das universidades. O caráter da
instrução modi cou-se, assumindo então feições mais dialéticas — e disso os
livros do período virão dar o próprio testemunho. Era o tempo da disputa entre
“as artes” e “os autores”, sendo “as artes”, como vimos, nada mais que um
tratamento lógico para todas as sete artes liberais. Em vez de textos originais e de
comentários sobre os autores, encontraremos breves antologias; o Floretus e o
Facetus — este erroneamente atribuído ao João de Garlandia — são exatamente o
tipo de material que começava a suplantar os clássicos no terreno do estudo da
gramática.39
É precisamente nessa mudança de método que reside a explicação para o
declínio do gosto clássico e do estilo latino nos séculos XIII e XIV. A situação
contrasta de forma aberrante, e mesmo Hallam o admite, com a prevalência do
clássico no século x, e especialmente no XI,40 a qual se deveu,
inconfundivelmente, à imensa carga de instrução oferecida nas escolas do
período.
A disciplina da gramática encolheu nos tempos da escolástica. Depois de
passar apressado pelos fundamentos do latim, o aluno era empurrado até a
universidade, e de lá para Aristóteles. O abandono da literatura latina fez sofrer
lado a lado autores pagãos e cristãos; com o tempo, entretanto, o declínio do
interesse pelos clássicos causou a própria reação, abrindo espaço para os
humanistas. Não obstante, o propósito central desta investigação é avaliar a típica
instrução medieval, de maneira que um exame detalhado dessa fase de declínio,
além de estranho à nossa investigação, teria mais a ver com um estudo qualquer
sobre o humanismo.
CAPÍTULO IV
Gramática: os manuais

S E queremos formar uma idéia a respeito do caráter da instrução numa


instituição educacional, voltamo-nos para o seu currículo e para os manuais
utilizados nas várias disciplinas. Mas se hoje em dia esses livros dão-nos pouco,
não mais do que um vislumbre, os manuais da Idade Média eram praticamente a
somatória de todo o conhecimento à disposição. Um exame atento dos manuais
medievais, por árido que possa parecer, abre-nos uma perspectiva privilegiada
sobre o caráter da educação medieval.
O manual representava não somente o que o aluno estudava, mas também, em
muitos casos, o que professor sabia; na maioria das vezes, o seu trabalho consistia
em tirar ditados do livro. Esse método era tão difundido, que as palavras legere e
docere tornaram-se sinônimos.
Dois eram os tipos de texto: enciclopédico (tratados sobre todas ou quase todas
as disciplinas do currículo) e individual (textos dedicados a matérias especí cas).
Via de regra, os textos individuais consistiam em adaptações, abreviadas ou
expandidas, de partes das obras enciclopédicas mais usadas. Tais adaptações,
quase sempre obra de algum professor, não raro serviam de base para textos
subseqüentes.
Entre as enciclopédias-padrão constaram as de Capela, Cassiodoro,
Agostinho, Boécio, Isidoro de Sevilha, Beda, Alcuíno, Rábano Mauro e Remígio
de Auxerre. As obras de Boécio e de Beda tratam somente das disciplinas do
quadrivium; Capela baseou-se em Varrão, e a sua obra serviu de modelo para
Cassiodoro e Isidoro de Sevilha.1
uanto aos manuais de gramática, baseavam-se todos, em primeiro lugar, nas
obras de Donato e Prisciano. Eles podem ser divididos em duas classes, cada uma
pertencente a um período distinto, sendo o m do século XII o momento de
transição.
As obras gramaticais do primeiro período apresentam as seguintes
características: 1) aderência estrita aos planos de Donato e Prisciano; 2)
disposição para re etir sobre os fatos da gramática. Os traços marcantes do
segundo período são: 1) exagero da disposição re exiva observada anteriormente;
2) escassez de material ilustrativo; 3) abordagem direta e maçante do conteúdo.
Esse é o período da gramática escolástica.
O PRIMEIRO PERÍODO

Os manuais do primeiro período vêm quase todos da Itália.2 Muitos deles são em
forma de diálogo, não ao modo socrático, mas na fórmula “pergunta e resposta”.
uanto ao seu valor fundamental, pode-se dizer que eram bastante rigorosos na
abordagem da sintaxe, conquanto inúteis no tratamento das derivações.3
O manual de gramática mais conhecido em toda a Idade Média foi o Ars
grammatica minor, de Élio Donato.4 Não se trata de uma cartilha, como se diz
algumas vezes, mas sim de um plano geral das oito partes do discurso, composto
em cerca de oito páginas. A fonte de Donato foi o hoje perdido Ars grammatica
de Palêmon, autor do século I.5
Totalmente diverso, e bem mais compreensivo, era o Institutio de arte
grammatica, de Prisciano.6 O objetivo dessa obra, conforme exposto pelo autor na
sua carta dedicatória, era assentar o estudo do latim na mesma base cientí ca do
estudo do grego. Prisciano segue o método de Apolônio Díscolo, a quem deve,
com efeito, boa parte do seu material. A obra divide-se em dezoito seções: as
dezesseis primeiras tratam de morfologia, e as duas últimas, de sintaxe — essas
duas, bastantes rigorosas, são por vezes encontradas num volume à parte. A
maioria dos manuscritos ainda existentes contêm apenas as dezesseis primeiras
seções, o que mostra que a sintaxe de Prisciano não foi tão estudada quanto o
resto da sua gramática.
Essa foi a gramática mais avançada da Idade Média, e ainda hoje sobrevivem
mil manuscritos. O texto cobre cerca de 584 páginas in-octavo, das quais 162 são
dedicadas à sintaxe. Prisciano cita nada menos que 255 autores diferentes, entre
eles Aristófanes, Aristóteles, Júlio César, Catão, Cícero, Demóstenes, Heródoto,
Homero (78 vezes), Horácio (158 vezes), Juvenal (121 vezes), Lucrécio (25
vezes), Ovídio (73 vezes), Salústio (80 vezes), Terêncio (225) e Virgílio (a Eneida
por 721 vezes, e outras obras por 146).7 Muitos resumos da obra de Prisciano
foram elaborados para ns escolares, entre eles um da pena de Rábano Mauro.8
Além das gramáticas de Donato e Prisciano, podemos referir, em ordem
cronológica, as seguintes obras:
Instituta artium e Catholica, de Valério Probo, um dos principais
1. gramáticos da segunda metade do século I, responsável pelas linhas gerais
da gramática latina tradicional.9

2. Artis grammaticae libri III, de Diomedes, gramático do século IV que


muito fez pela preservação do antigo ensino da gramática. Livro usado em
São Galo durante o século IX; modelo para muitos manuais medievais.10

3. Institutionum grammaticarum libri V, de Flávio Sosípatro Carísio,


contemporâneo de Diomedes. O material procede fundamentalmente de
Varrão e do hoje perdido De poetis, de Suetônio.11

4. Ars de nomine et verbo, de Focas. Alcuíno inclui este livro entre os títulos
da famosa biblioteca de York. Foram encontradas glosas à obra.12

5. Ars grammatica, de Mário Vitorino, gramático e retórico do século IV. O


seu tratado sobre versi cação, em quatro livros, é mencionado por
Notker.13

6. De nomine et verbo, de Consêncio, um contemporâneo do célebre


Sidônio Apolinário.14

7. De differentiis et societatibus graeci latinique verbi, de Macróbio. Tratado


sobre a diferença entre o verbo latino e o verbo grego, adaptação da
sintaxe grega de Apolinário de Alexandria. O autor foi um reconhecido
estudioso, que viveu entre ns do século IV e o começo do século V.15

8. Commentarius in artem Donati, de Mário Sérvio Honorato. O autor foi


um famoso comentador de Virgílio. A sua gramática, um comentário a
Donato, também constava na biblioteca de York nos dias escolares de
Alcuíno.16

9. Commentarius in artem Donati, de Servius Marus, contemporâneo de


Sidônio Apolinário. No que toca a esse período, Marus é, sem sombra de
dúvida, o grande comentador de Donato.17
Ars de verbo, de Eutiques, pupilo de Prisciano. Ainda sobrevivem muitas
10. glosas a essa obra.18

11. Ars (grammatica) breviata, de Santo Agostinho. Breve excerto da sua


enciclopédia das artes liberais.19

12. Institutio de arte grammatica, de Cassiodoro. Breve tratado sobre a


gramática, que integra a sua enciclopédia das sete artes liberais.20

13. Ars grammatica, de Asper. Breve abordagem das letras, sílabas, partes do
discurso etc. Foi encontrado na biblioteca de São Galo no século IX.21

14. Ars grammatica, de S. Bonifácio, o apóstolo dos germânicos. Sua obra é


uma adaptação das gramáticas de Donato, Carísio e Diomedes.22

15. Dialogus de Arte grammatica, de Alcuíno. A obra é baseada em Donato, a


quem Alcuíno segue abertamente. O nome do autor deu à obra grande
destaque; Notker de São Galo considerava-a melhor do que as gramáticas
de Donato e Prisciano.23

16. Excerptio de arte grammatici Prisciani, de Rábano Mauro. Breve


compêndio de rudimentos da gramática. Traz muitas ilustrações e
algumas observações sobre prosódia, aparentemente colhidas em Ars
grammatica major, de Donato.24

17. Tractatus in partibus Donati, de Esmaragdo, abade de Saint-Michel.


Trata-se de um comentário sobre Donato, mas os exemplos procedem da
Vulgata, e não de Cícero e Virgílio, como ocorre com a maioria dos
comentadores. O objetivo declarado dessa inovação era “que o leitor
pudesse, a um só tempo, compreender o espírito da gramática e o sentido
das Escrituras”.25

18. Expositio super Donatum, de Remígio de Auxerre ( . 908), famoso


professor de literatura sacra e profana. Além deste celebrado comentário,
que foi lido até o Renascimento, Remígio também escreveu um
comentário sobre a enciclopédia de Capela.26
O SEGUNDO PERÍODO

A posição de destaque ocupada por Prisciano foi mais tarde tomada por
Alexandre de Villedieu, com o Doctrinale de 1199.27
Cabe aqui fazer algumas considerações, que expliquem, do ponto de vista
medieval, a popularidade fenomenal desse livro que, por três séculos, dominou a
maioria das escolas européias. O número de manuscritos ainda existentes chega a
255 — 33 do século XIII, 64 do século XIV, 154 do século XV e 9 do século XVI —,
mas o total de edições impressas certamente ultrapassa marca de 295.28
O livro foi usado em escolas da Alemanha, França, Inglaterra, Espanha, Itália
e Polônia, bem como nas universidades. As razões para tanto são as seguintes:

1. A gramática era toda em verso. Num tempo que a memorização, graças à


escassez de livros, era um recurso tão predominante na instrução, a forma
versi cada era decerto uma bênção para o professor. Essa inovação foi o
toque de originalidade desse livro.

2. Ao abordar a matéria, o autor leva em conta as mudanças operadas sobre a


língua latina no decorrer dos sete séculos desde Prisciano. Ele inclui no
seu livro muitas palavras das Escrituras, bem como expressões de origem
teutônica latinizadas, atendendo às necessidades práticas da língua
corrente.

3. A sintaxe de Prisciano já não era adequada para um tempo em que se


enfatizavam os aspectos lógicos da gramática. No que diz respeito à
sintaxe, a obra de Alexandre é minuciosa; a clareza da sua abordagem foi
já objeto do elogio de lólogos modernos.29

4. A sua abordagem da prosódia e das guras representa, igualmente, um


avanço no caminho aberto por Prisciano.30

Apesar de todas essas inovações, a obra de Alexandre, que é só uma parte da


sua produção sobre a gramática, o cálculo e o direito canônico, é, no nal das
contas, apenas um comentário às gramáticas mais antigas — especialmente a de
Prisciano, a quem segue de perto no tratamento das questões etimológicas.
O tratado apresenta três divisões principais: etimologia (1073 linhas), sintaxe
(476 linhas) e quantidade, acento e gura (1095 linhas). Na sua forma usual,
trazia ainda um prólogo e 12 “capitalia”. Gramática avançada, destinada àqueles
que já tivessem passado por Donato, isto é, pela sua Ars grammatica minor, o livro
omite, na primeira parte, o tratamento de números, verbos regulares, advérbios,
conjunções e preposições, dando aos pronomes atenção apenas super cial.
uanto à sintaxe, naturalmente, omitem-se tempos e modos, ao passo que as
quantidades, acentos e guras, tanto retóricas como gramaticais, são tratadas
exaustivamente.31
A aplicação geral e o rigor dos Doctrinale valeram ao seu autor o epíteto de
“Aristóteles da gramática”. Por isso é que mais tarde tornou-se o primeiro alvo dos
humanistas e de seus ataques à antiga ordem, vindo a cair em desuso após uma
campanha implacável que durou cerca de 25 anos (1510). Não obstante, como
mostra Reichling, os mesmos humanistas incorporaram muito da obra de
Alexandre nos seus livros.32
Segundo em importância, somente abaixo dos Doctrinale, foi para o período a
obra de Everaldo de Béthune, Graecismus (ca. 1212).33 Assim como o livro de
Alexandre, é em verso; o nome tem a ver com o capítulo sobre as declinações
gregas, matéria um tanto desconhecida do autor. Os principais tópicos do livro
são etimologia, barbarismos, tropos e solecismos.
Outra obra popular de Everaldo de Béthune foi o seu Labortinthus, um
poema didático sobre gramática e estilo. Muito usado no século XIV, foi de grande
ajuda para a deposição de Prisciano; Lutero considerava-o “uma tolice dos
monges, um desses livros inúteis e nocivos apresentados pelo diabo”.34
Entre os manuais de menor importância, podem-se referir:

1. A Summa de Petrus Helias, composta às voltas de 1142. O livro é um


comentário a Prisciano, e consta entre os citados por Duns Scott na sua
obra sobre gramática. Típico do seu tempo, escrito em verso, explica a
gramática latina sem fazer referência aos autores clássicos.35

2. Ars rhythmica, de João de Garlandia. Elaborado, trata da prosódia com a


ilustração de poemas completos. O autor, que assina também um
comentário aos Doctrinale, foi professor de gramática na Universidade de
Toulouse entre 1229 e 1232.36

3. Um comentário sobre os quinze primeiros livros de Prisciano escrito por


Robert Kilwardy, Arcebispo de Cantuária entre 1272 e 1279.37

4. De modis significandis, comumente conhecido com Modista, de Miguel de


Marbais, autor amengo do século XIII.38

5. Catholicon, composto em 1286 por Johannes Balbus Januensis. A obra


compõe-se de cinco livros: De orthographia, De accentu, De etymologia,
De figuris e De prosodia. Leva ainda, como apêndice, um breve
vocabulário.39

6. Artis grammaticae institutio. Gramática bem conhecida no seu tempo,


baseada em exemplos de Salústio, Virgílio, Horácio, Ovídio, Lucano e
Juvenal. Obra de César Lombardo, outro autor do século XIII.40

7. Grammatica speculativa de modis significandis, do famoso escolástico


Duns Scott. Representativo da abordagem losó ca dada à matéria no
nal da Idade Média.41

8. Florista, de Ludolfo de Lüchow (ca. 1236), professor da prestigiada escola


de Hildesheim. O título vem da sua primeira linha, ou melhor, verso:
“Flores grammaticae propono scribere”. Muito usado na Alemanha, nos
Países Baixos e na França.42
VOCABULÁRIOS: CARÁTER GERAL

Aos manuais propriamente ditos suplementavam os chamados “vocabulários”, que


ocupavam um lugar de destaque no ensino da gramática sob o currículo das artes
liberais. Conhecidos como ocabularii, dictionarii, glossae e comentarii, eram
indispensáveis para domínio do latim, prático e literário.43
Os típicos “vocabulários” medievais eram mais que meras fontes de consulta
para a estudo deste ou daquele autor em particular. Havia tipos diferentes: alguns
de palavras latinas, em latim simpli cado, outros em vernáculo (francês, alemão
ou inglês); alguns em ordem alfabética, outros classi cados por assunto (corpos
celestes, animais etc.). Alguns eram dicionários no sentido mais puro da palavra;
outros já tinham algo de enciclopédico, numa espécie de meio-termo entre as
duas coisas. Indícios sugerem que cada biblioteca em cada escola, no limite dos
registros de que dispomos, guardasse ao menos um desses dicionários.44
Além desses havia glossários especiais, voltados para a tradução de palavras
difíceis de um manual padrão ou de algum autor em particular. A amplitude da
utilização desses vocabulários especiais pode ser constatada, por exemplo, na vasta
coleção de glossários publicada por Steinmeyer e Sievers. Nela encontramos um
dicionário alfabético com aproximadamente 5,2 mil palavras da Vulgata,
compiladas por Rábano Mauro; glossários de praticamente todos os livros do
Velho e do Novo Testamento; e glossários da obra de Capela, Donato, Prisciano e
de outros autores freqüentados nas escolas.45
DICIONÁRIOS ESCOLARES

Os muitos vocabulários em voga na Idade Média, como é de esperar, eram edições


revisadas de dicionários clássicos. O mais antigo dentre eles é de Isidoro de
Sevilha, parte do seu famoso Etymologiae. Baseado inteiramente em autores do
nal do império, talvez constituía a seção mais proveitosa da sua própria
“enciclopédia”.46
A segunda grande obra desse gênero é o famoso dicionário de Paulo Diácono,
que o dedicou a Carlos Magno. Trata-se de uma síntese de Pompeu Festo, autor
do século II, cuja obra, por sua vez, era uma versão simpli cada de De verborum
significatu, um dos primeiros léxicos latinos.47
O próximo em ordem cronológica é o chamado Glossarium de Salomão III,
Bispo de Constance (919). Essa obra, compilada por um monge de São Galo é, na
verdade, o que poderíamos chamar de enciclopédia: as palavras aparecem em
ordem alfabética, acompanhadas de excertos dos escritos mais famosos.
Sobrevivem diversos manuscritos; a primeira edição data de 1470. O texto foi
escrito em latim, originalmente, mas glossários em alemão foram acrescentados
com o passar do tempo e, sob essa forma diferenciada, o livro foi muito usado por
toda a Idade Média.48
Elfrico, Arcebispo de Cantuária (1016), é o autor de um famoso Glossarium.
Ele agrupou e ordenou engenhosamente todo o material, a m de explicar os
signi cados de muitas palavras de origem latina. Com esse pequeno livro, a
aquisição de vocabulário devia ser algo bem fácil para o menino anglo-saxão.49
Talvez o mais célebre dicionário medieval tenha sido o Vocabulista, de Papias,
o Lombardo (ca. 1053–1063). Consistia em dois tipos de material: primeiro, um
glossário; segundo, informações relevantes para o estudante das sete artes liberais.
No glossário propriamente dito, vale notar, o autor parece não fazer distinção de
quantidade, gênero e in exão entre formas clássicas e formas “bárbaras”. A
popularidade do livro — e isso julga-se pela grande quantidade de imitadores —
deve-se, em grande medida, à segunda parte.50
Um século depois de Papias, deparamos o famoso Panormia, de Osbern de
Gloucester, uma promissora tentativa de explicar etimologicamente o signi cado
das palavras.51
Hugutio, ou Hugo de Pisa (Bispo de Ferrara, 1210), é o autor do Liber
derivationum. Embora muito popular, a obra nunca foi impressa na íntegra. O
conteúdo baseia-se em Papias, e o nome alude à tentativa de ordenar as palavras
conforme a suas derivações. Os erros contidos nessa obra foram um prato cheio
para os humanistas.52
De igual importância foram os três Dictionari de João de Garlandia: um de
palavras comuns, outro de palavras obscuras, e um último de “coisas em geral”. A
obra ainda era de uso corrente na infância de Erasmo de Roterdã.53
O já mencionado Catholicon foi tão conhecido como gramática quanto como
dicionário. Para o sentido das palavras, sua fonte foi Papias; quanto à etimologia,
Hugutio. Essa obra esteve entre os primeiros livros publicados em latim. O
vocabulário, um tanto pretensiosamente, tratava de “orthographia, prosodia,
signi catio, origo, etymologia, [...] dictiones quae frequenter inveniuntur in biblia
et in dictis sanctorum et poetarum”.54
Alexander Neckham é o autor de nada menos que três vocabulário bem
so sticados: Vocabularium biblicum, Repertorium ocabulorum e De utensilibus.
Os dois primeiros jamais foram publicados; o último costura as entradas dos
artigos por meio de uma narrativa, com glosas interlineares em francês.55
Marchesini de Regio (ca. 1300) é o autor do famigerado Mamotrecus, que
reúne glossários gramaticais, ortográ cos e exegéticos das Escrituras.56
Havia outros tantos glossários de menor importância. Referimos apenas
alguns deles: o vocabulário de Martinus de Arenis (1307), uma síntese de Papias;
o chamado Vocalubarius eabonicius; Vacabularius Optimus; Gemma
gemmarum; Lucidarius; Summarium Heinrici. Todos eles basearam-se nas obras
mais elaboradas que tratamos acima.57
CAPÍTULO V
Retórica

A
ESTUDO TÉCNICO

CONDIÇÕES GERAIS

M AIS que qualquer outra disciplina do currículo medieval, a retórica revela os


traços característicos do período. Enquanto nas outras áreas, especialmente
na gramática, seguiam-se em grande parte os mesmos métodos e ideais de ns do
império, alterados tão-somente na medida em que o obrigavam as novas
circunstâncias e o passar do tempo, o estudo da retórica assumiu um caráter
totalmente diferente. Por um lado, a prática do período romano foi quase que
completamente abandonada, quando não reduzida ao mero domínio das regras
da ciência. Por outro, uma fase insigni cante da retórica clássica — o estudo das
epístolas e do dictamen — recebeu tamanha ênfase e desenvolveu-se a tal ponto
que acabou suplantando o estudo retórico propriamente dito no currículo
medieval.
Essa mudança não se deu sem razão. A decadência das escolas retóricas em
Roma foi causada pelo formalismo esterilizante que resultou da perpetuação de
um ideal de orador, e isso num tempo em que o mundo não tinha o que fazer dos
oradores. Nos dias de Cícero, o treinamento em oratória harmonizava-se com o
espírito da época; seu uso mais nobre era a defesa da liberdade, e as obras de
Cícero, sete sobre a eloqüência, eram mais que oportunas. No império tardio,
entretanto, apesar da mudança de cenário, o treinamento formal em oratória,
como já vimos, permaneceu o mesmo. Ora, um sistema educacional tão
engessado, arti cial, não poderia ter senão uma in uência aviltante.1 Mas se
Roma, então cristianizada, permitiu que morressem as escolas pagãs, não foi por
ser avessa a apropriar-se, conforme os seus interesses, dos elementos essenciais da
cultura que elas transmitiam. Não era possível, pela natureza das coisas, admitir o
ideal de educação do mundo antigo — o treinamento do orador —, e por isso a
retórica, que fora base da educação no Império Romano, perdeu muito da sua
importância na Idade Média. Nada mais natural que as escolas cristãs se
recusassem a enfatizar a “ars bene dicendi”, como em geral se de nia a retórica.2
Declamações in amadas, panegíricos em latim castiço, apóstrofes dirigidas a
heróis mitológicos; nada disso poderia servir de alguma coisa. O bem falar pode
até ser valioso para um pregador, mas certamente não seria nesse campo que a
excelência viria para o máximo benefício.
Pode-se dizer que a opinião de Rábano Mauro, o “praeceptor Germaniae”,
representa razoavelmente bem a posição medieval quanto ao valor da retórica:

Basta que os jovens dispensem alguma atenção ao estudo da retórica. Mesmo assim, nem
todos que esperam ingressar no sacerdócio, mas apenas aqueles ainda não comprometidos
a dispor do seu tempo na busca do maior benefício deveriam estudar a matéria. De
qualquer forma, quem deseja alcançar a arte da eloqüência pode fazê-lo melhor com a
leitura e a audição dos grandes oradores do que estudando as regras da retórica.3

Isso explica por que o tempo dedicado à técnica retórica era tão pouco em
comparação ao investido na gramática. O número de manuscritos encontrados e o
caráter elementar dos seus conteúdos sugerem a relativa indiferença medieval a
esse ramo do currículo.4
MANUAIS

Cícero e uintiliano foram modelos de retórica para toda a Idade Média. Suas
obras, porém, muito raramente se empregavam como manuais — talvez por conta
da sua extensão considerável.5
De qualquer modo, os princípios desses mestres foram transmitidos à Idade
Média por uma série de manuais, todos compostos na segunda metade do século
IV, e por tratados elementares que se encontram nas obras de Capela, Agostinho e
Cassiodoro, além, claro, do trabalho especial de Alcuíno. Esses tratados, poucos
em número e tamanho, vão desde simples catálogos das guras abordadas por
Cícero e uintiliano até resumos bem elaborados das suas obras principais. Os
mais elementares, formando como que um tecido entre a gramática e a retórica,
são:

1. De schematis lexeos, de Júlio Ru ano. O autor, que viveu na segunda


metade do século IV, compilou 44 guras de retórica e ilustrou-as com
abundantes citações de Cícero e Virgílio.6

2. Do mesmo caráter é o anônimo Carmen de figuris, do qual ainda existem


vários manuscritos.7 A obra contém 63 guras retóricas, cada uma
ilustrada por três linhas de fontes clássicas variadas, inclusive o De oratore
de Cícero e o De institutis de uintiliano.

3. Mais breve e menos formal, Schemata Dianeos apresenta 63 guras. Cerca


de 15 são apenas nomeadas, bastando ao autor fazer as devidas referências
à obra de uintiliano.8

4. Liber de schematibus et tropis, do Venerável Beda. Nessa obra, as guras de


retórica são explicadas e copiosamente ilustradas com base na Vulgata. O
autor justi ca a sua escolha: como as guras são a parte mais importante
da retórica, aquelas que constam dos livros mais importantes — as
Escrituras — são as mais valiosas, e portanto devem ser preferidas a
quaisquer outras.9
5. O típico Libri III Artis rhetoricae, de Chirius Fortunatianus. Baseado nas
obras de Cícero e de uintiliano, e escrito em forma de catecismo, este
livro foi amplamente utilizado, de modo que ainda sobrevivem diversos
manuscritos — alguns datados do século VIII.10 Apesar dos seus defeitos, a
obra de Fortunaciano foi de grande valor para as escolas.11 ue ela
atendesse às necessidades da época vê-se pelo fato de que autores
sucessivos, notadamente Cassiodoro, tomaram-na como base para a
elaboração das suas próprias obras.

6. O fragmentário De rhetorica, de Agostinho, é baseado nas obras de


Cícero e do seu professor, Hermágoras de Rodes. Não é preciso dizer que
a fama do autor fez o livro popular. Pode-se creditar a sua versatilidade ao
fato de o próprio Agostinho ter lecionado retórica.12

7. Similarmente incompleto é o Institutiones oratoriae, de Sulpício Vítor.


Pelo fragmento que restou, supõe-se um comentário bem organizado e
elaborado sobre os elementos da retórica. O autor foi um praticante do
direito, e isso se re ete em certa ênfase sobre os aspectos técnicos mais
diretamente ligados à defesa jurídica. Impresso em 1521, em Basiléia.13

8. O mais elaborado entre os tratados de retórica, baseado em Hermágoras,


Cícero, uintiliano e ainda outros, é o Ars rhetorica de Júlio Vítor. Em 27
seções, o autor aborda exaustivamente tudo quanto seja essencial à ars;
seus traços característicos são a subdivisão lógica e a relativa subordinação
dos tópicos. A obra é repleta de exemplos tirados de Cícero e de
uintiliano, e é a primeira a tratar a epístola como um componente da ars
rhetorica. O destaque dado às epístolas tempos mais tarde foi tamanho,
que o estudo desse tema veio a abarcar toda a disciplina da retórica.14

9. Mais breve, porém igualmente bem organizado, é o Liber de arte rhetorica


da enciclopédia de Marciano Capela. A abordagem é técnica, clara, exceto
nas partes introdutórias. Embora ilustrado com orações de Cícero, este
livro, como manual, não merece distinção alguma. O seu uso, com efeito,
deveu-se ao fato de ele ser parte de uma obra completa sobre as sete artes
liberais.15
10. Um texto bem prático, e ainda mais popular do que o livro de Capela, foi
a síntese de Fortunaciano feita por Cassiodoro. O breve Arte rhetorica,
parte de seu Institutionis liberalium literarum, traz uma série de diagramas
a m de esclarecer as relações entre os termos. As seis páginas de
Cassiodoro, muito provavelmente, encerram tudo o que o estudante
médio deveria saber sobre retórica.16

11. Isidoro de Sevilha é mais um cujo De rhetorica integra uma obra


enciclopédica. Trata brevemente das partes orationis, as quais, na sua
própria obra, reduziram-se a quatro: exórdio, exposição, argumentação e
conclusão. Parte considerável do tratado é dedicada à discussão dos
“silogismos” e da “lei da retórica” — e a adição da última é tão signi cativa
quanto as observações de Vítor sobre a epistola. Um terço da obra é
dedicado às guras, que são de nidas de maneira sucinta e não raro
ilustradas com exemplos de autores clássicos.17

12. De rhetorica et de virtutibus, de Alcuíno, é um diálogo entre ele e Carlos


Magno. uase que inteiramente baseado no De inventione de Cícero e no
excerto de Isidoro, o texto carece das boas qualidades de ambos, e não sem
razão é tomado como derivativo e imaturo.18 Não obstante, o texto é de
importância considerável para nós: trata-se de um dos marcos na
transição da técnica antiga, tal como abordada nos referidos tratados, para
a abordagem medieval, tipi cada no dictamen.19

Os tratados posteriores, como os de Notker, Remígio de Auxerre,


Boncompagno e Bernardo de Chartes, seguem de perto os modelos que
descrevemos.20 Além desses textos, onde a retórica é tratada como um
componente das sete artes liberais, restam ainda peças fragmentárias sobre a arte
retórica.21 Todas elas, pela sua natureza, estão mais para comentários do que para
compêndios.
Em geral, a leitura das obras didáticas era tudo o que se tentava em termos de
estudos técnicos. Às vezes, porém, em função de um interesse particular do
professor, ou da acessibilidade dos livros, ou de certas tradições, algumas escolas
dedicavam algum tempo à leitura das obras retóricas de Cícero, particularmente
De inventione, De oratore e Topica, além do pseudo-ciceroniano Ad Herennium.22
Em certos casos, liam-se também historiadores e prosadores, tanto clássicos como
cristãos, com destaque para Consolação da Filosofia, de Boécio.23
Pode-se dizer que Cícero e uintiliano, a título de ilustração, e sempre que as
condições o permitissem, eram lidos posteriormente ao estudo técnico da
retórica.24
B
O ESTUDO DO DICTAMEN

CARÁTER GERAL

Enquanto se prestava relativamente pouca atenção à forma teorética e lógica da


retórica no estudo das sete artes liberais, duas das formas práticas eram
assiduamente cultivadas. Trata-se da epístola e do documento, leigo ou
eclesiástico.
Vimos como a epístola, já desde os primeiros compêndios, foi considerada
uma forma de expressão retórica.25 Os autores, com o passar do tempo, viram-se
obrigados a atentar cada vez mais para o domínio dos aspectos práticos, em
detrimento das concepções de invenção, elocução etc. Numa época em que ler e
escrever era uma conquista de poucos, ser o dono de um bom estilo era uma
grande realização. A capacidade de escrever uma carta, um contrato, um
testamento, ou de reduzir à escrita, quando necessário, qualquer outro ato formal
do dia-a-dia, certamente era mais importante, para clérigos e leigos, do que
orações equilibradas e obras literárias.
Assim, logo no início da Idade Média, a redação de cartas e a preparação de
documentos comuns começou a tomar posse da atenção dos estudantes de
retórica no curso das sete artes liberais. Com efeito, esses estudos gradualmente
integraram a totalidade da retórica na Idade Média. As leis de Carlos Magno
dispunham que os clérigos fossem capazes de produzir “cartas et epistolas”.26
Pode-se dizer com precisão considerável: a partir da era carolíngia, o estudo da
retórica tornou-se de composição em prosa. Essa arte era chamada ars dictandi, ars
prosandi ou dictamen; o professor era o dictator, e dictare signi cava a capacidade
de escrever em prosa, tanto privada como o cial.
Tal estudo, naturalmente, pressupõe modelos. A literatura antiga, porém, não
lhe poderia oferecer exemplos materiais — Cícero e uintiliano serviam apenas
para a oratória. Mais uma vez, como no caso da gramática, o mestre-escola se viu
lançado à própria sorte, o que o impeliu a procurar novos modelos.
O material que o professor da Idade Média reunia em vista dessa forma de
instrução é mesmo imenso. Por tabela, além de apontarem os modos e os métodos
de instrução, essas coleções proporcionam-nos, como raras outras fontes, uma
visão abrangente da vida e das instituições medievais; vislumbramos o
orescimento do direito nacional, a gradual introdução do direito romano, os
variados contatos que a Igreja veio a travar com as coisas mundo. En m, são-nos
reveladas, por esses modestos livros escolares, muitas fases importantes da vida das
pessoas. O conteúdo desses tratados chamou a atenção de estudiosos do direito
romano: na esteira de Savigny, que rastreou até o estudo do dictamen na Itália,
como parte da retórica, a origem do estudo do direito romano na Europa
Ocidental, investigadores têm vasculhado cuidadosamente esses formulários
todos. Muitos dos documentos aqui encontrados lançam luz sobre a
Kulturgeschichte européia.27
É desde essa perspectiva, depois de tanto enriquecer o estudioso da
jurisprudência, que esses documentos serão de novo examinados. As evidências
apreciadas conformemente levam a quatro importantes generalizações. Visto que
a limitação de espaço não nos permite analisar com pormenores as fontes que
alicerçam as conclusões, os parágrafos seguintes trarão somente os dados mais
representativos.

1. A preparação de documentos formais, no que respeita ao estudo da


retórica, foi introduzida na primeira Idade Média. Essa ars dictaminis,
assiduamente cultivada no norte da Itália, evoluiu para uma disciplina
especial, vindo a tornar-se, por m, o estudo do direito. A história da
Universidade de Bolonha e das condições literárias na Itália medieval
sustentam por completo essa a rmação.28

2. O mundo o cial e as chancelarias eclesiásticas, com as suas necessidades,


tornaram o estudo da ars dictaminis algo inevitável para as escolas
medievais. As múltiplas relações de Igreja e Estado, as complexas inter-
relações da sociedade feudal e dos prelados, tudo isso requeria diretrizes e
modelos de composição em prosa. Ao professor medieval coube suprir
essa necessidade. Nas cartas e documentos modelo, discutiam-se questões
de Estado e Igreja, às vezes citando cartas reais, da pena de grandes
personagens, às vezes com respostas imaginárias, escritas por professores
ou alunos bem preparados. A título de ilustração: o Breviarium de
dictamine, de Alberico de Monte Cassino, traz o documento original da
polêmica entre Henrique IV e Gregório VII;29 do mesmo caráter, se bem
que mais antigo — ns do século IX —, é o chamado Formularius de
Salomão III, Bispo de Constança;30 a Summa prosarum dictaminis, da
Saxônia, inclui documentos autênticos da Arquidiocese de
Magdeburgo;31 do mesmo modo, a Summula dictaminis do cisterciense
Bernoldo de Kaiserheim deve o seu conteúdo aos arquivos de Kaiserheim;
e por último, os modelos no dictamen de Arnoldo de Protzan procedem
dos arquivos da Breslau.32
uando não se dispunha de material contemporâneo, incorporavam-se
documentos famosos do passado, muitas vezes com respostas redigidas
pelos alunos. Há muitos desses textos interpolados. Um exemplo notável
é o Formularius de Baumgartenburg, escrito em 1302; mais da metade
dos exemplos contidos nessa coleção vêm de uma obra de Ludolfo de
Hildesheim. O autor, aliás, reconhece a sua dívida: “Multas elegantis styli
praesenti operi inserui epistolas quae magnorum dictatorum formulariis
excerptas”.33

3. Os mesmos eventos que requeriam registro o cial — testamentos,


honrarias, contratos, concessões de imunidade, alforria etc. — pediam a
redação de documentos não tão formais. Isso as escolas liberais supriam
com o ensino da retórica.
Na sua maior parte, o material examinado não tem nada que ver com
haute politique, temporal ou espiritual, e sim com demandas da vida
privada no seu ponto de contato com vida pública. Todas as coleções
trazem modelos de privilegia, commissiones, citationes, procurationes,
donatoriae, petitiones, sententia, confirmationes, appelationes, executoriae,
dispensationes, indulgentiae, exemptiones, visitationes, inquisitiones,
formatae, obligatoriae, testimoniales, testamenta, emancipationes,
permutationes, adaptiones etc.34 Se a maioria desses documentos dizem
respeito a questões eclesiásticas, é tão-somente porque a Igreja tocava a
vida do homem médio em muitos pontos. Salta aos olhos o papel
desempenhado pela sala de aula na transmissão de conhecimento mais ou
menos técnico.
Prova mais direta de que essas coleções de dictamina não se reduzem a
guias para chancelarias, prelados e príncipes reside no fato de que todos
os seus modelos são precedidos por breves tratados a respeito da ars
prosandi, ou ars dictaminis, ou summa dictaminis, ou summa prosarum
dictaminis, ou summa dictaminum. Isso é tão característico das coleções
dedicadas a questões de Igreja e de Estado quanto das mais modestas ou
prosaicas.35

4. As escolas da Idade Média desenvolveram uma forma especial de


composição: a epistola. Muito da instrução estava na arte da redação de
cartas, a qual sem dúvida desenvolveu-se com todas as minúcias de que a
mente medieval era capaz.
ue as epístolas fossem parte fundamental do estudo da retórica vê-se
no fato de que todas as coleções, nas suas partes didáticas, enfatizam o
aprendizado das partes epistolae — salutatio, exordium (ou captatio
bene olentiae), narratio, petitio e conclusio são cuidadosamente explicadas,
de nidas e ilustradas. Também a relação entre a epistola e o todo da ars
dictaminis é devidamente ressaltada.36 Dá-se muita atenção à salutatio na
abordagem dos tratamentos adequados aos diversos graus da hierarquia
eclesiástica e do serviço público. Assim na breve Summa dictaminis de
Orleans, composta às voltas 1180, em que a parte didática ocupa sete
páginas contra quatro e meia sobre a salutatio.37 No elaborado
Formularius de Baumgartenburg, datado de 1032, a seção didática — “de
modo prosandi” — quase toda a primeira das seis partes é dedicada à
mesma salutatio.38
De igual importância são as variações nos exemplos de vários
dictamina. Uma forma é apresentada junto com outras duas ou três, como
alternativas, mostrando novamente que os modelos à nossa frente
destinam-se à instrução. É pouquíssimo provável que o empregado da
chancelaria se importasse em variar as suas fórmulas. Assim, entre os
modelos de salutatio ed patrem, Hugo de Bolonha apresenta em Rationes
dictandi as seguintes variações: “venerabile et delecto patri”; “reverendo
ac diligendo patri”, “a genitori dulcissimo eius dilectus lius perennem
cum delitati seruitium”, “quiquid patri peramens lius” e “quiquid
domino subditus servulus”.39 Ainda mais signi cativa é a forma de
salutatio dada pelo autor no modelo ad amicum, com nada menos que 16
variações.40 As glosas numerosas que podem gurar nos manuscritos
indicam, uma vez mais, que eles eram utilizados como manuais.
MANUAIS

As seções anteriores determinaram a posição de destaque que a ars dictandi, essa


forma modi cada de retórica, ocupava no currículo das sete artes liberais.
Contudo, falta ainda nominar os principais livros nesse campo. Aqueles cujo
conteúdo fosse inteiramente legal, no sentido estreito da palavra, foram
simplesmente omitidos.

1. Ao passo que a ars dictandi foi estudada na Itália desde o início do século
VI, o primeiro compêndio de fórmulas de cujo emprego escolar não
restam dúvidas é o assim chamado Salsburg Formularius, datado, pelo
menos, de 821. Sua organização, conteúdo, referências incidentais e
glossários demonstram conclusivamente que ele fora concebido como
obra de referência para cartas modelo, memorandos e documentos
similares. Essa dedução é inevitável, se bem que o volume não contenha as
introduções didáticas sobre a ars mesma. Como se trata da primeira do
seu gênero, passamos agora a uma breve descrição.41
O livro consiste em 126 composições independentes, as quais, juntas,
ocupam cerca de 70 páginas do texto. São 25 fórmulas para transações do
dia-a-dia leigo, como testamentos, anúncios de venda etc; cerca de 10 têm
um caráter estritamente legal; 30 pertencem a relações o ciais — de rei
para rei, de rei para súdito, de arcebispo para rei etc. A coleção traz 8
manuscritos autênticos de cartas de Alcuíno ao seu pupilo, Arno; o
restante é uma variedade inclassi cável de documentos de menor
importância.

2. Muito similar é Fomulae Salomonis III, composta às voltas do ano 900. A


obra traz 48 documentos, que se distribuem em aproximadamente 50 das
suas páginas. O seu traço distintivo reside no fato de que metade do livro
consiste em material contemporâneo (874–884). uanto ao conteúdo,
importa muito mais do que a obra mencionada acima, pois reúne
documentos sobre as relações entre reis e clérigos da alta hierarquia da
Igreja.42
3. A primeira coleção de espistolae propriamente dita para o uso escolar são
as Epistolae Alati, compostas na segunda metade do século IX. São 7
cartas. Embora o nome do autor e o local da composição permaneçam
incertos, o seu conteúdo é prova su ciente de que fosse usado como
manual numa escola monacal. De modo geral, as cartas são uma
correspondência imaginária entre um professor e um aluno.43

4. Em Rationes dictandi, de Alberico de Monte Cassino, temos o primeiro


manual em que se delineia a teoria da composição epistolar. Alberico, que
foi professor no século XI, produziu outras duas obras ainda maiores sobre
o assunto: Flores rhetorici ou Dictaminum radii e o Breviarum de
dictamine, ambos jamais publicados.44

5. Rationes dictandi prosaici foi composto por Hugo de Bolonha entre 1119
e 1124. Uma série de manuscritos completos sobrevive ainda hoje. Sob
todos os aspectos, a obra fundamenta-se em Alberico.45

6. Composta sob anonimato na segunda metade do século XII, a Summa


dictaminis de Orleans é o mais breve manual ainda existente. Ele segue
Alberico em cada detalhe, e apresenta quatro capítulos adicionais sobre
diferentes tipos de privilegia. Considerando-se que Orleans, àquela época,
era o centro de literatura clássica mais conhecido em toda a Europa, a
brevidade desse escrito é realmente notável. O carácter super cial do
texto parece indicar que, em Orleans, prestava-se mais atenção à idéia
clássica de retórica — isto é, a leitura dos historiadores e retóricos antigos
— do que ao estudo medieval das epístolas e dictaminis.46

7. Na Summa dictandi, composta às voltas de 1225, o professor de Bolonha


Guido Faba oferece uma abordagem teórica da ars, com atenção especial à
espistola. Seu Dictamina rhetorica é um compêndio elementar com
excertos de vários autores.47

8. Se os quatro últimos livros devem sua origem à Itália, onde, como vimos,
a ars dictandi foi plenamente desenvolvida ao longo do século XI,
deparamos coleções ainda mais elaboradas em solo germânico. A primeira
e mais fundamental desse gênero é a Summa prosarum dictaminis que
passa pelo título Sächsisches Formelwerk. O autor é desconhecido, mas
sabemos que a data da composição não ultrapassa 1230. Os modelos
baseiam-se no material empregado por um professor de nome Gernard,
que, em 1222, tornou-se bispo de Brandembugo. Trata-se de um estudo
minucioso a respeito da ars, com ilustrações especiais de altos privilegia,
ou litterae missiles. O texto abre com um exaustivo tratamento de não
menos que 20 tipos de privilegia; a seguir, uma compilação de 109
documentos autênticos, para ilustrar os princípios enunciados. Atestam o
seu emprego como obra didática o número de manuscritos anda
existentes, as notas de margem encontradas em todos eles e o fato de que
ao menos duas famosas coleções germânicas o têm como base.48

9. A Summa dictaminum de Ludolfo de Hildesheim, é especialmente


interessante. Ela traz, como um simples bater de olhos comprova, um
tratamento tradicional da epistola pre xada a um discurso de litterae
missiles, bem como quase todo o conjunto de cartas ilustrativas da coleção
saxã. Aqui, mais uma vez, o conteúdo mostra, acima de qualquer dúvida,
que o livro fora concebido como obra didática.49

10. A Summa de arte prosandi, de Conrado de Mure, é mais um entre muitos


tratados escolares deste rector puerorum de Zurique. Trata-se de uma
compilação organizada em 1275. Chama a atenção o seu agudo caráter
dialético: faz-se distinção após distinção, divisão e subdivisão, até que se
tenham exauridos todos os casos possíveis. O autor aborda, sob nomes
diferentes, “quem manda a carta”, “para quem”, “de quem”, “como”,
“quando” etc; seguem-se listas intermináveis de todas as pessoas a quem se
pudesse dirigir a palavra, inclusive os antigos o ciais romanos. Desse
modo, 138 títulos seculares e outros 50 títulos eclesiásticos são nomeados
e recombinados sob diferentes títulos, e mesmo assim há poucos exemplos
pelo livro. A obra de Conrado, pode-se dizer, é representativa do carácter
escolástico que àquele tempo perpassava até um campo de estudos
eminentemente prático como o da ars dictandi.50

11. Poetria de arte prosaica metrica et rithmica, de João de Garlandia, o Inglês,


foi escrito às voltas de 1270. A seção intitulada “De arte prosaica” contém
material para a instrução em retórica e dictamen, que são tratados,
dialeticamente, de uma forma fantástica.51

12. O chamado Formularius de modo prosandi, de Baumgartenburg, data


aproximadamente de 1302. Essa compilação antecipa a forma que os
tratados vieram a assumir nos últimos anos do século XIV; a sua extensão,
o tratamento elaborado e exaustivo — se bem que não inteiramente
dialético — e a riqueza de exemplos e ilustrações — parte considerável
emprestada da coleção saxã — imprimem à obra mais a divisa de livro de
referência para as escolas do que de manual que professor e pupilo de fato
usassem no estudo do dictamen. É de notar, neste livro, o pequeno
sumário de princípios legais, anexo à sexta pars.52

13. A Summula dictaminis compilada por Bernoldo de Kaiserheim em 1312


pode ser classi cada como livro de referência para o professor. Ao mesmo
tempo que omite o tratado elementar sobre dictamen, o autor dedica um
breve capítulo à salutatio, para o que recorre a muitos exemplos. O
segundo traz uma coleção classi cada de proverbia e sententia comuns
para inserção nas cartas. Essas procedem, conta-nos o autor, do Liber
decretalis, de Sêneca, Salomão e de vários outros autores. A outra parte da
obra é reservada a modelos ilustrativos de diferentes tipos.53

Com a propagação das universidades no século XIV, e o a uxo de estudantes


aos cursos de lógica, a atenção dada ao dictamen só fez decrescer. A parte técnica
estereotipou-se em tabulae,54 e as outras foram assumidas pelo estudo do direito.
Na verdade, pouquíssimas universidades ofereceram aulas sobre o assunto.55
CAPÍTULO VI
Lógica

A
PERÍODO PRÉ-UNIVERSIDADE

ESCOPO E LIVROS-TEXTO

N O currículo universitário moderno, o termo “lógica” implica o domínio de


uma propedêutica da loso a. O exame de um livro-texto revelará:
determinada teoria do conhecimento; considerações sobre as di culdades na
relação entre os nomes gerais, o pensamento e a realidade; de nições de termos e
proposições, algumas “leis do pensamento”; e o tratamento formal do silogismo.
Somem-se a isso alguns capítulos sobre o moderno método cientí co, indutivo, e
então teremos uma verdadeira introdução à loso a.
Não é tão simples delimitar o escopo da lógica no currículo medieval.1 Em
primeiro lugar, os mesmos homens de estudo, apesar das suas discriminações, não
raro confundiam lógica e loso a; admitiam que a lógica era a pedra sobre a qual
são construídos poderosos monumentos da razão, e ao mesmo tempo quase
sempre glori cavam-na como ars artium, scientia rationalis, disciplina
diciplinarum, scientia scientiarum.2 Em segundo lugar, a abordagem escolástica
aos problemas da loso a é tão lógica na sua natureza e no seu método, que
mesmo aos estudiosos modernos parece impossível discernir entre a loso a
lógica e a lógica formal puramente didática.3
Se essa confusão não é tão séria desde a perspectiva do historiador da loso a,
para os nossos ns, entretanto, parece essencial esclarecê-la. Uma incursão pelas
livros-texto produzirá evidências abundantes em favor das seguintes teses:

1. Os problemas metafísicos não zeram parte do estudo da lógica


propriamente dita, no âmbito das sete artes liberais, durante toda a Idade
Média.4

2. Na Idade Média, o único ponto de contato entre a loso a e o ensino da


lógica estava no fato de que o termo “substância” — a primeira das
categorias de Aristóteles — é de um caráter misto, parte lógico e parte
ontológico.5

3. Sob o currículo das sete artes liberais, a lógica não era senão o que hoje
chamamos de lógica formal.

Nos parágrafos seguintes, sustentaremos tais proposições de duas maneiras:


primeiro, mediante uma análise direta dos livros-texto, mostraremos que o
material neles contido voltava-se apenas à instrução formal da lógica; em seguida,
analisando outros tratados lógico- losó cos, demonstraremos indiretamente que
as questões de lógica mais próximas do campo da especulação losó ca eram
sempre abordadas pelos autores nas suas obras metafísicas, jamais nos seus livros
de lógica.
O nosso ponto de partida será um inventário de toda a bagagem lógica do
período, cujos limites foram já de nidos pelos trabalhos exaustivos de Jourdain,6
Cousin,7 Rémusat,8 Hauréau9 e Prantl.10
Segundo esses pesquisadores, apenas os seguintes tratados, dos quais outros
derivaram-se, foram conhecidos e empregados na Europa Ocidental até o nal do
século XII:

1. A seção sobre lógica na enciclopédia de Capela.

2. Principia dialectiae, de Agostinho, e o pseudo-agostiniano Categoriae


decem ex Aristotele decreptae.

3. A seção De dialectica, de Cassiodoro.

4. Várias obras de Boécio, classi cadas a seguir:


a. Traduções:
i. Isagoge, de Porfírio.
ii. Categorias, de Aristóteles.
iii. De interpretatione, de Aristóteles.
b. Comentários:
i. Sobre a tradução de Isagoge feita por Vitorino.
ii. Sobre a sua própria tradução de Isagoge.
iii. Sobre as Categorias de Aristóteles.
iv. Sobre De interpretatione, de Aristóteles (2 edições).
v. Sobre os Topica de Cícero.
c. Obras originais:
i. Uma introdução ao silogismo categórico.
ii. Sobre o silogismo categórico.
iii. Sobre o silogismo hipotético.
iv. De divisione.
v. De definitione.
vi. De differentiis topicis.

5. De arte dialectica, seção de Etymologiae, de Isidoro de Sevilha.

Jourdain e os demais também provaram conclusivamente que os Analíticos, os


Tópicos e as Refutações sofísticas de Aristóteles, embora traduzidos e comentados
por Boécio no século V, foram absolutamente desconhecidos até o nal do século
XII.
Para os nossos próprios ns, podemos agrupar o material acima listado em
dois conjuntos: (1) obras de Boécio em que a lógica é tratada à luz das suas
relações losó cas; e (2) obras que contêm a matéria puramente formal da
instrução em lógica, compreendidas as obras de Boécio, Capela, Cassiodoro,
Agostinho e Isidoro de Sevilha.
Passando ao primeiro conjunto, parece que, enquanto os problemas
losó cos da lógica eram mais importantes para Boécio, ele, no entanto, distingue
claramente entre o que chamou de loso a prática ou formal — isto é, a lógica —
e loso a teorética — física e metafísica.11 A lógica formal, que ele de ne como a
loso a cujo objetivo é discernir o raciocínio verdadeiro do raciocínio falso, ele
realmente a considera auxiliar da loso a teorética. As suas obras sobre de nição,
divisão e silogismo são rigorosas do ponto de vista didático, ainda que pareçam
escolares demais a quem esteja, como Prantl, à procura de uma teoria da lógica.
Contudo, até os críticos mais hostis admitem que a sua abordagem dos silogismos
hipotéticos é “notavelmente cuidadosa”.12 Parece claro que Boécio distingue entre
a lógica formal da sala de aula e os conceitos lógico- losó cos que são o ponto de
partida para o estudo de questões metafísicas. Enquanto juntava material para a
instrução em lógica, ele também coletou e tornou acessível uma parte do que seria
tomado pela escolástica na construção do seu sistema monumental. Esse material,
Boécio apresentou-o como loso a, e não como lógica. Infelizmente, parte do seu
material didático, a exemplo dos Analíticos, dos Tópicos e das Refutações sofísticas,
permaneceram desconhecidas, e, no século XII, alcançaram as salas de aula por
meio de outras fontes.13
A distinção entre o escopo do que chamaremos “lógica escolar” e “metafísica
lógica” é levada adiante por outros autores que se seguiram a Boécio. Examinando
as obras puramente didáticas sobre a “lógica escolar”, veremos que o elemento
metafísico, nomeadamente a consideração das categorias e de suas implicações,
parece omitido por completo.
Não há dúvidas de que o livro-texto mais importante tenha sido a Introdução
de Porfírio, objeto de glosas e mais glosas, comentários e mais comentários.14
Como, então, Porfírio trata os problemas losó cos na sua obra sobre lógica
formal? Simples: ele claramente desconsidera-os, na medida em que extrapolavam
o escopo da sua introdução às categorias de Aristóteles.
Outra vez, se voltarmos as nossas atenções para as obras lógicas do próprio
Filósofo, será em vão buscar declarações sobre o que mais tarde se tornaria o
problema da escolástica. A ciência lógica que criou era para ele mesmo apenas um
instrumento, um organon, e não um sistema losó co. É bem verdade, como
observaram os lósofos, que o seu tratamento da primeira categoria — substância
— assume a posição dos uni ersalia in re, mas as suas considerações, na medida
em que envolviam o problema ontológico, de modo algum implicam, do ponto de
vista propriamente lógico, a aceitação dessa instância antiplatônica a respeito dos
universais. As questões de realismo versus nominalismo, ontologia e
epistemologia, não eram problemas de lógica para Aristóteles.15
Passando aos livros do período medieval, constatamos que o mais antigo entre
eles é De arte dialectica, de Marciano Capela. À parte a introdução fantástica e a
conclusão, temos cerca de 30 páginas (12mo), divididas em quatro partes: (1)
predicáveis, de nições, divisão, homônimos, sinônimos, parônimos; as categorias e
a doutrina da contradição (12 pp.); (2) de nomine et verbo e a proposição (3 pp.);
(3) quantidade e qualidade das proposições e con ersão (5 pp.); (4) silogismos
categórico e hipotético (6 pp.). Esses são os elementos essenciais do tratado de
lógica no período pré-universitário. O espaço dedicado ao tratamento das
categorias é relativamente grande, próximo de um terço do tratado, mas é
inteiramente formal; não se pode tirar nenhuma conseqüência filosófica, ainda que
substância, quantidade e relação sejam naturalmente mais detalhadas e ilustradas
do que as outras sete categorias. Assim, nosso primeiro livro-texto tipicamente
medieval não revela viés losó co algum no tratamento das partes da lógica mais
avizinhadas à metafísica.16
Em Principia dialecticae, por vezes chamado de Tractatus de dialectica,
Agostinho de ne a lógica como “scientia bene disputandi”. Nada se fala a respeito
das questões que os escolásticos mais tarde jugariam tão vitais; sequer discutem-se
as categorias. O autor concentra-se em elucidar o nome, o verbo e a preposição.17
Como o pseudo-agostiniano Categoriae decem ex Aristotele decreptae, que possui o
caráter de tradução, paráfrase e comentário, a obra não toca, em momento algum,
as implicações losó cas das categorias.18
De dialectica, de Cassiodoro,19 sejam quais forem os seus defeitos do ponto de
vista da crítica histórica — a despeito de quanto se prove, como disse Prantl, “obra
grosseira e sem sentido”20 — foi, sem sombra de dúvida, o mais popular entre os
livros didáticos para o estudo da lógica. O que revela o exame dessas ١٥ páginas?
Muito sobre termos e de nições (٧ dos ١٥ atributos de Boécio) e sobre modos e
guras silogísticas; um bom tanto sobre probabilística, tirado dos tópicos de
Boécio (apresenta-se inclusive matéria sobre a argumentação retórica); mas
nenhuma palavra sobre os temas discutidos pelos escolásticos. E por quê? A
inferência é certa: também para Cassiodoro, a lógica era simplesmente um meio
— um meio ad disserendas res —, e não trato elementar da loso a. Por isso ele
raramente menciona os predicáveis de Porfírio, explicando-os numas poucas
linhas. Todas as intrincadas relações de genus, species, differentia, accidentia e
proprium, nas quais Porfírio se demora, são omitidas por completo, e as próprias
categorias não se saem muito melhor. Na mente de Cassiodoro, ao que parece, o
menino que iniciava o estudo da lógica precisava um pouco mais dos predicáveis
do que das suas distinções lógicas; as relações dessas categorias com as verdades
eternas deveriam car para mais tarde, quando ele iniciasse o estudo da teologia.21
Passando aos outros enciclopedistas, veri camos em Isidoro de Sevilha, na sua
seção De dialectica, a mesma concepção do escopo e das funções do estudo da
lógica.22 Ele a de ne como “quae disputationibus subtilissumis vera secernis a
falsis”, e de novo como “disciplina ad discernendas rerum causas inventa”. “Id est
species philosophiae [...] rationalis de niendi, quaerendi et discernendi potens”.
Para ele, como para Cassiodoro, é no silogismo “ubi totius eius artis utilitas et
virtus ostenditur”.23
Na obra de Isidoro, o Isagoge e as Categorias são tratados mais difusamente,
porém com menor rigor do que em Cassiodoro. Nada indica que ele inclua
qualquer problema losó co, metafísico ou teológico no seu tratamento da lógica
formal. Também para ele é evidente que essas questões pertencem a outro campo;
ele diz, com efeito, que a teologia abarca tudo o mais, inclusive a lógica.24
Até aqui, a nossa análise dos livros-texto da primeira Idade Média mostrou
que os autores que de niram o escopo da lógica no currículo das artes liberais
limitaram a instrução formal à mera aquisição dos rudimentos da ciência,
omitindo, cuidadosamente, tudo quanto fosse de caráter metafísico. Essa mesma
atitude foi tomada pelos autores subseqüentes, cujas obras baseiam-se
inteiramente no trabalho dos seus antecessores.
Temos em De dialectica, de Alcuíno, um exemplo do que foi o ensino da
lógica durante o chamado Renascimento Carolíngio. A in uência desse trabalho
foi enorme; alguns acreditam que ainda maior do que a de todos os outros livros-
texto — e não exatamente sem razão, dado o vastíssimo alcance das obras de
Alcuíno e seus pupilos e o sem-número de escolas in uenciadas pelo seu
magistério nos séculos VIII, IX, X e XI.25 A obra, contudo, não é original. No seu
pano e abordagem, baseia-se quase que inteiramente no pseudo-Agostinho sobre
as categorias, em Isidoro de Sevilha e, indiretamente, Boécio.26 Não se pode
esperar, portanto, nada além do encontrado em fontes anteriores. Porém a relativa
importância que ele atribui a diferentes partes da matéria pode-se ver na sua
compilação, e isso nos dá precisamente o que procuramos. Alcuíno dedica, é
verdade, espaço relativamente grande — cerca de metade do texto — à discussão
das categorias, mas como o texto não passa de um excerto do pseudo-Agostinho,
outra vez procuramos em vão quaisquer a rmações losó cas sobre os problemas
levantados pelas categorias. ue Alcuíno dedicasse tanto espaço a essas distinções
puramente verbais explica-se pela sua inclinação literária. Ao que parece, também
ele sustenta que problemas metafísicos cabem melhor em obras sobre lógica
formal.
A opinião de Rábano Mauro é relevante. Ainda que as obras tidas por suas
nas gerações seguintes não lhe pertencessem, a sua in uência enquanto maior
pupilo de Alcuíno e líder do magistério de Fulda conferem grande valor ao seu
juízo sobre o tema. O ensino de lógica em Fulda teve uma in uência positiva
sobre o cultivo desse ramo das sete artes liberais.27 Graças a Rábano Mauro e seu
colega Raimundo de Halberstadt, o estudo da lógica difundiu-se rapidamente
pela Britânia, Gália, Alemanha e Flandres, e a tal ponto que, nas escolas dos
séculos X e XI, disputas de lógica e discussões teológicas dividiam as mesmas salas
de aula.28
A visões de Rábano Mauro estão dadas no seu famosos tratado De clericorum
institutione.29 Ele de ne a lógica em palavras que já deparamos: “Disciplina
rationalis quaerendi, de niendi et disserendi, etiam vera et a falsis discernendi
potens”.30 O seu entusiasmo por essa disciplina devia-se ao fato de que, para ele, a
lógica permitia a penetração sutil da engenhosidade dos hereges e a refutação
sumária de suas mágicas conclusões. Ao ilustrar como um silogismo falacioso
pode, por exemplo, contestar a Ressurreição, ele mostrou a necessidade de se
estudarem verdadeiros modos de silogismos, os quais “se devem aplicar à busca da
Verdade contida nas Escrituras”.31
Passando ao século X, temos um relato preciso dos ensinamentos lógicos que
Gerberto ministrava na escola catedral de Reims, instituição reconhecida entre as
maiores do seu tempo. Como material didático, ele emprega partes das obras de
Boécio, o Isagoge, as Categorias, De interpretatione e os Tópicos de Cícero — tudo
isso, como já visto, voltado para o aspecto técnico-formal da lógica.32
No século seguinte, Anselmo, teólogo e lósofo, que também era instrutor do
trivium, escreveu a sua obra didática para o estudo da lógica. O texto são as
categorias; a lógica formal, o objetivo. Nada encontramos sobre distinções
metafísicas no Dialogus de grammatico; o livro é, em suma, apenas uma
introdução à lógica.33
A mesma visão sobre o escopo da lógica formal é partilhada por Abelardo. Em
seu volumoso e tardio De dialectica, a lógica é de nida simplesmente como
“discretio veritatis seu falsitatis”. A ausência de uma posição declarada sobre os
problemas de realismo e nominalismo é ainda mais signi cativa se considerada à
luz da personalidade de Abelardo. É evidente que essas questões, ao seu ver, não
caberiam num tratado de lógica formal.34
Nosso exame encerra-se com a menção ao tratado de Abelardo. Como visto,
todos os textos por que passamos — de Capela a Abelardo — provam que, até o
século XIII, o ensino da lógica no currículo medieval de forma alguma envolvia
questões de metafísica. Refazendo o percurso e revendo os mesmos autores,
encontramos provas indiretas em favor dessa suposição. Os mesmos problemas
fronteiriços, entre a lógica e a metafísica, foram tratados pelos autores, não em
manuais de lógica, mas em outras obras losó cas.
Começando por Boécio, vemos que a sua loso a tem dois lados: um formal,
prático, que é a lógica; outro teorético, especulativo, que se volta para a loso a
no seu sentido mais amplo, isto é, a física e a metafísica. Sendo os problemas
teológicos e metafísicos, para alguém do temperamento de Boécio, mais
importantes do que os da lógica formal, é natural que mesmo nas suas discussões
de problemas puramente formais as implicações losó cas dessas questões
venham ao primeiro plano. Ele as podia facilmente enfatizar no tratamento de
questões que tocassem mais de perto o problema losó co. O Isagoge de Porfírio e
as Categorias de Aristóteles, bem como o seu De interpretatione, ofereciam esse
ponto de contato. Assim, todas as idéias losó cas dignas de serem preservadas
do ponto de vista medieval foram reunidas à luz dos problemas suscitados e não
resolvidos por Porfírio na discussão da natureza de genus e substância. Elas não
foram introduzidas como seções de um manual de lógica, mas como material
lógico-metafísico digno de ser transmitido para as gerações seguintes.35
Alcuíno é o próximo autor de cuja pena temos tanto um tratado formal de
lógica como estudos metafísicos. O cotejo dessas obras mostra que, enquanto no
seu De dialectica — um tratado sobre lógica — as categorias não recebem senão
um tratamento super cial, na sua grande obra teológica, De fide Sanctae
Trinitatis, elas são analisadas exaustivamente. A razão para tanto é óbvia: como
termos de lógica, a importância das categorias era muito pequena. Na metafísica,
as categorias têm um impacto direto sobre a própria essência da fé; daí o
elaborado tratamento da matéria gurar entre seus escritos teológicos.36
Passando a Erígena, vemos que este reconhecido fundador da escolástica,
embora se utilizasse de silogismos para defender a identidade da religião e da
loso a, pessoalmente desprezava a lógica formal, a qual considerava indigna da
atenção dos pensadores. Ele rejeitava a idéia de que a lógica ou a dialética
constituíssem uma introdução à loso a.37 Não obstante a pouca estima pela
dialética, Erígena discutiu longamente as categorias ao tratar das relações que elas
mantinham com os seus próprios interesses teológicos e metafísicos. No primeiro
livro de De divisione naturae, as implicações ontológicas aristotélicas são
exaustivamente examinadas e criticadas. Aqui, mais uma vez, vemos que o tema
do autor era a metafísica, e não a lógica formal.38
Gerberto, cuja importância enquanto autor e professor de lógica formal é
bem fundada, estava, claro, interessado nas implicações losó cas dos problemas
da lógica. Seu De rationali et de ratione uti, aparentemente um tratado de lógica, é
na verdade uma obra metafísica, uma contribuição para o problema ontológico.
ue ele não tenha empregado esse texto nas suas aulas de lógica — e disso há
provas — é mais uma evidência de que, também para ele, as implicações losó cas
das categorias não faziam parte da lógica formal.39
Ainda o grande Anselmo, cujo tratado de lógica já mencionamos, não
discutiu as categorias em Dialogus de grammatico, e sim nos seus justamente
consagrados Monologium e Prosologium, ambos tratados losó cos.40
Em De sex principiis, de Gilberto de Poitiers, encontramos toda uma obra
dedicada ao problema lógico-metafísico. Escrito em 1150, o tratado aborda os
aspectos metafísicos das categorias, e o autor faz o possível para reduzir a seis as
dez categorias de Aristóteles. A obra passa longe de ser um livro-texto de lógica
formal; e se fosse, Gilberto teria incorporado a “nova lógica” de Aristóteles —
dois Analíticos, Tópicos e Refutações sofísticas —, pois é sabido que ele tinha
conhecimento dessas obras.41
A análise empreendida até aqui tende a uma só conclusão: a lógica, tal como
ensinada no currículo das sete artes liberais, esteve totalmente separada da
loso a no período anterior ao surgimento das universidades.
B
A ÉPOCA DAS UNIVERSIDADES

As gerações seguintes à de Pedro Abelardo e Gilberto de Poitiers testemunharam


a chegada das obras de Aristóteles à Europa Ocidental. Não faz parte desta
investigação esmiuçar a in uência dessa época sobre a história intelectual da
Europa; retratar a hostilidade da Igreja para com esse “novo” aporte losó co, ou
como ela uniu-se ao Filósofo quando cou claro que ele lhe seria de grande valor
para provar racionalmente o teísmo, nada disso vem ao caso.42 Basta-nos
rea rmar o fato já estabelecido de que a sua lógica completa era bem-vinda ao
currículo universitário mesmo antes de contar com a chancela da ortodoxia. Com
efeito, enquanto as suas obras losó cas foram condenadas não menos que 37
vezes, o estudo das obras lógicas jamais foi censurado.43
ual era o conteúdo da sua “lógica completa”? Essa consistia no vetus logica,
material utilizado pelos autores do período pré-universitário, ao qual foi acrescido
o no us logica: os dois Analíticos, Tópicos e Refutações sofísticas. Todo esse corpo de
conhecimento foi conhecido como antiqua logica, e compreendia tudo quanto
hoje se conhece como lógica aristotélica. A posse do Organon completo, junto
com outras obras metafísicas de Aristóteles, esclareceu para os escolásticos a
posição exata que a lógica ocupava no todo da loso a: ela deveria ser um
instrumento e um estudo preparatório para a chamada “primeira loso a”.44 A era
das universidades ampliou o escopo das artes liberais para incluir a loso a de
Aristóteles — a gramática, isto é, a literatura, foi deixada de lado. Mas enquanto a
quantidade de instrução nas artes aumentava, e imensamente, o caráter geral da
instrução em lógica não perdeu o seu aspecto formal. Nesse período, o ensino da
lógica não incluiu mais metafísica do que no período anterior — como no caso do
período pré-universitário, os livros do novo período mostram-no claramente. A
mudança foi noutra direção: toda a educação foi infectada pelo espírito dos
métodos de lógica formal. Todavia, como uma das sete artes liberais, a lógica
manteve a sua posição de estudo propedêutico.45
É de supor que os tratados de Aristóteles formassem, nesse período, o único
material sobre lógica em uso corrente nas universidades. Mas quando pensamos
na idade a que os alunos começavam a estudar lógica, por volta dos quatorze anos,
torna-se evidente que o Organon era difícil demais para os primeiros passos. Aqui,
como em outras disciplinas do currículo, a obra do comentador e adaptador vinha
a calhar. É improvável que a lógica apresentada ao estudante por meio desses
textos derivativos fosse outra coisa que não uma abordagem simpli cada dos
meros elementos da lógica, uma breve sondagem da logica antiqua.
Conforme o tempo passava, e cada vez mais disciplinas se perdiam no
labirinto das distinções lógicas, nem o tratado mais elaborado de Aristóteles seria
fonte bastante para os autores de obras didáticas – o espírito da época exigia
distinções verbais mais sutis. Em resposta a essa demanda, surgiu a logica moderna,
ou parva logica. Esse material “moderno” consistia em capítulos de terminorum
proprietatibus. Esse material tipicamente medieval logo tornou-se adição regular
aos livros que antes continham apenas a lógica de Aristóteles.46
O número desses livros atualizados foi muito grande, se bem que todos muito
similares em caráter. Eles representavam o esforço do professor prático por utilizar
todo o crescente conhecimento sobre uma disciplina que por dois séculos crescera
continuamente em importância, ao ponto de usurpar, no âmbito do trivium, as
divisas tradicionais da gramática. Por causa dessa similaridade, não há propósito
em fazer um exame minucioso desses diferentes textos;47 apenas o mais antigo e
mais típico, Summulae logicales, de Pedro Hispano, mais tarde nomeado Papa
João XXI ( . 1227), merecerá a nossa atenção.48
Por cerca de três séculos, em toda a Europa Ocidental, esse tratado foi usado
quase que exclusivamente como livro-texto de lógica formal. Embora aparecesse
sob títulos diversos, o texto sempre fora o mesmo de Pedro.49 O livro tem sete
seções, das quais seis tratam do material contido no Organon e no Isagoge de
Porfírio. A última trata ordenadamente das distinções gramaticais e lógicas — o
vago de terminorum proprietatibus.
O objetivo principal deste capítulo foi determinar os limites da disciplina
ministrada sob o nome de lógica durante todo esse período; tudo o mais
subordinou-se a esse m. A confusão sobre o escopo da matéria como parte do
currículo das artes liberais, bem como a sua relação com a loso a medieval,
pareceu-nos pedir um tratamento especial. Do material aqui apresentado, decerto
parece incorreto a rmar, como faz Rashdall,50 que foi um naco da lógica a
semente da escolástica. A lógica nada tinha que ver com as questões metafísicas
que Porfírio e Boécio puseram de lado, tomando-as por estranhas ao domínio da
lógica. ue essa posição se manteve ao longo de todo o período, isso as páginas
antecedentes provam acima de qualquer suspeita.
CAPÍTULO VII
Aritmética

A
CARÁTER GERAL DO UADRIVIUM

S Eé inquestionável que o trivium — gramática, retórica e lógica — ocupava a


maior parte do tempo dedicado ao estudo das sete artes liberais, a tradicional
opinião de que “a verdadeira educação secular da idade das trevas foi o trivium”,
sendo as disciplinas do quadrivium, ou matemáticas, raramente estudadas, está
longe de ser historicamente correta.1 Tal a rmação não se poderia fazer nem
mesmo com respeito à era das universidades, quando a lógica e a loso a foram
sabidamente os estudos essenciais. O equívoco, entretanto, é bastante
compreensível; as reais dimensões do conhecimento matemático anterior ao
século XII eram tão reduzidas, que até pouco tempo atrás foram praticamente
desconsideradas. Historiadores das ciências matemáticas consideraram esse
período “estéril”. Chegou-se a a rmar que a mente medieval sequer tivesse aptidão
para o estudo da matemática.2
Mas a ausência de trabalho criativo durante uma boa parte da nossa época não
implica necessariamente a falta de instrução na disciplina. Muito pelo contrário,
no caso.
Tomando a questão de todos os pontos de vista, parece que evidências
permitem uma única conclusão: as disciplinas do quadrivium foram amplamente
estudadas no curso de toda a Idade Média. Em primeiro lugar, as experiências
pessoais que ilustram o estudo das sete artes liberais incluem, invariavelmente,
tanto as disciplinas do trivium como as do quadrivium.3 O exame dos fatos
relativos à posição da Igreja revela que sínodo após sínodo, desde os dias de Carlos
Magno, zeram do cômputo eclesiástico e da música obrigações para o clero. É
certo que na Inglaterra, para citar um único exemplo, entre o século VIII e a
conquista normanda, não se ordenou um só sacerdote incapaz de calcular a data
da Páscoa e depois explicá-lo ao modo de Beda, o Venerável.4 É ponto pací co
que a Igreja tivesse interesse em ao menos três disciplinas do quadrivium:
aritmética, astronomia e música. Daí que não devamos esperar hostilidades à
instrução do quadrivium nas escolas medievais.
Ademais, examinando o estado geral das escolas européias entre o período
carolíngio e o renascimento intelectual do século XIII, facilmente identi camos
um interesse contínuo pela matemática em todas as escolas monásticas e catedrais.
Isso vale para as escolas de Fulda, Heresfeld, Reichenau, São Galo, Augsburg,
Mainz, Hildesheim, Espira, Colônia, Stavelot, Münster, Verdun, Corvey,
Ratisbona, Saint-Emmeran, Passau, Ranshofen, Klosterburg, Reichersburg,
Wessobrunn, Metten, Benediktbeuern, Polling, Niederaltaich, Kremsmünster,
Saint-Florian, Admont e muitos outros centros educacionais do Sacro Império
Romano-Germânico. Interesse ainda maior nota-se em diversas instituições na
França e nos Países Baixos, tais como as de Reims, Liège, Lobach, entre outras.5
Constatamos também que os grandes professores do período foram quase todos
conhecidos por aulas de matemática e suas contribuições a essa ciência. A título
de ilustração, podemos citar os nomes de Rábano Mauro, Érico e Remígio de
Auxerre, os três Notkers, Radberto, Ermenrico, Heilpric, Tatto, Hermano
Contracto, Guilherme de Hirsau, Heraldo de Landsberg, Odão de Cluny,
Gerberto (mais tarde Papa Silvestre II), Enguelberto de Liège, Bispo Gilberto de
Lisieux, Odão de Tournai, Abbo de Fleury, Hucbald, Otlo, Conrado de
Nuremberg (irmão do famoso Anselmo), Sigfrido e Reginbald. Estudos
demonstram que todos eles tinham aptidão matemática, lecionavam matemática
e, na maioria dos casos, produziram obras de mérito nas áreas do quadrivium.6 A
falta de valor cientí co na maior parte desses tratados explica o desinteresse em
publicar a grande quantidade de manuscritos que se encontram pelas bibliotecas
da Europa.7 Mesmo incompleta, porém, a relação dos livros-texto do quadrivium
sugere a contento que essas disciplinas foram bastante estudadas.
Muito se fala, de modo geral, sobre o fato de o conhecimento matemático ter
sido próximo do insigni cante até o século XII.8 Apesar disso, o exame mais
ligeiro dos livros-texto realmente utilizados nessa época derrubaria a a rmação de
que somente as mais elementares proposições da geometria, o método para o
calcular a Páscoa e o uso do ábaco fossem o objeto da atenção dos matemáticos. É
preciso precaver-se contra aquilatar as realizações da Idade Média desde o ponto
de vista do nosso tempo, em que os lugares-comuns da matemática são projeções,
cálculo in nitesimal e teorias da composição.
Nos capítulos seguintes, dedicados às disciplinas do quadrivium, tentaremos
defender as seguintes teses:
Consideradas as dimensões do conhecimento matemático à disposição na
1. Europa no período em questão, as proporções do conhecimento
transmitido ao estudante do quadrivium eram relativamente grandes. Isso
não quer dizer que os professores medievais soubessem muito de
matemática, mas sim que as escolas cumpriam a sua missão, transmitindo
às futuras gerações todo o conhecimento matemático que possuíam, e que
o aluno era obrigado a apropriar-se desse conhecimento antes de passar ao
estudo avançado da loso a.

2. O padrão da educação matemática nas grandes escolas na Idade Média era


muito alto. Embora não haja evidências de trabalho criativo nos
primeiros séculos, os últimos indicam progresso na assimilação de novos
materiais.9

3. A quantidade e o caráter da instrução matemática na Idade Média


andaram pari passu com o avanço do conhecimento matemático nas
várias disciplinas.

4. Mesmo depois do século XIII, quando, já na universidade, o quadrivium


fundiu-se ao programa geral da loso a, os estudos matemáticos
passavam longe do descaso. Mesmo sob o domínio dos escolásticos, a
quantidade de instrução matemática acompanhou o passo do gradual
avanço das ciências.10
B
A EXTENSÃO DO CONHECIMENTO

O conhecimento aritmético da Idade Média pode ser classi cado em três


períodos. No primeiro, que termina com o século X, a Europa sabia pouquíssimo
do tipo de aritmética tão cultivado pelos gregos na dita era alexandrina. Sabia-se,
basicamente, o que consta nos manuais do neopitagórico Nicômaco, composto
no nal do século.11 Nesse período, o estudo da aritmética limitava-se ao
cômputo eclesiástico, no âmbito da prática, e às propriedades numéricas, no
âmbito teórico. O ábaco romano era o rude instrumento das operações
numéricas, e utilizavam-se os algarismos romanos.12
No segundo período, entre o nal do século X e o nal do século XII, nota-se
um avanço considerável. O emprego do ábaco modi cado por Gerberto
difundiu-se; a divisão complementar e o cálculo por colunas, métodos que em
muito superavam a dactilonomia da era anterior, eram comuns.13 Progresso ainda
maior há no terceiro período, também chamado de época algorística, durante os
anos nais da Idade Média. Os algarismos arábicos e o zero entraram em uso
quando boa parte da antiga matemática grega foi recobrada por meio de
traduções do árabe.14 Ainda que cada período tenha o seu método próprio, sua
porção de conhecimento e a sua amplitude em termos de instrução matemática,
não é de supor que se possam traçar quaisquer linhas de nitivas entre eles.
Veremos a seguir que essas linhas sobrepõem-se umas às outras e que as obras
didáticas características de uma época anterior continuaram a ser usadas em certa
medida.15
PRIMEIRO PERÍODO

CARÁTER GERAL

A aritmética, nesta fase, é essencialmente a arte do cálculo. Dedica-se quase que


exclusivamente ao cômputo da Páscoa — tanto assim que as palavras “computus”
e “arithmetica” tornaram-se sinônimos —, mas não se pode sustentar que lhe
escapasse por completo o tratamento das propriedades e das relações numéricas.
Com efeito, os elementos místicos e simbólicos são muito presentes na aritmética
teórica; e isso graças a Nicômaco, cujo livro foi a fonte de Boécio e dos cristãos —
Isidoro de Sevilha, Alcuíno, Rábano Mauro, entre outros — ter-se enveredado
por esse tipo de especulação. O método era rude; raramente empregava-se o
ábaco, e a pesada notação romana tornava quase impossível o cálculo com
números grandes. Na verdade, não há registro autêntico de operações realizadas
para além dos três dígitos.16 As frações romanas, sempre que empregadas,
necessitavam do auxílio de tábuas especiais, baseadas no “sistema do meio”. Se os
livros-texto de uso corrente provam alguma coisa, o conjunto de conhecimentos
matemáticos possuído pela Europa Ocidental durante esse período era mesmo
pequeno — ao ponto de dar às redescobertas e traduções posteriores,
nomeadamente da escola alexandrina de matemática, a aparência de um acréscimo
inteiramente novo.17
OBRAS DIDÁTICAS

Por estranho que pareça, os livros-texto do período não tratam de métodos de


operação. Os poucos casos em que isso acontece, e incidentalmente, sugerem
intenso trabalho mental e de dactilonômico.18 Os textos seguintes guram entre
os mais usados:

1. O capítulo sobre aritmética em De nuptiis Philologiae et Mercurii, de


Marciano Capela, é nada mais que um resumo sumaríssimo da aritmética
de Nicômaco. Além da introdução alegórica, o texto traz material sobre as
propriedades e o signi cado místico dos números em consonância às
noções pitagóricas. O texto deve a sua popularidade ao fato de constar
como capítulo num bom livro-texto sobre sete artes liberais.19

2. De intitutione arithmetica libri duo, de Boécio, foi a fonte de


conhecimento aritmético da Idade Média por cerca de dois séculos,
mesmo após a introdução do sistema hindu de notação e cálculo.
Resumida, comentada e editada inúmeras vezes, chegou a passar pelo
prelo até o século XVI.20 uais são, a nal, os conteúdos dessa obra
notável?
O exame das suas 80 colunas e 100 diagramas surpreende pela ausência
de uma única regra de operação; tudo o que se vê é uma interminável
classi cação das propriedades numéricas — triangulares, perfeitos,
excessivos, defectivos etc. Veri ca-se uma variedade de números pares e
ímpares, bem como o tratamento de proporções e progressões. O
conteúdo da obra parece indicar que o texto de Boécio não se destinava
ao uso dos alunos, mas à orientação do professor. Ademais, constitui-se
numa introdução adequada à interpretação mística dos números bíblicos,
da qual não raro deduziam-se lições de moral.21

3. O breve De arithmetica de Cassiodoro é, na melhor das hipóteses, um


condensado da obra de Boécio. Nada de novo é apresentado. uatro
diagramas classi cam as propriedades numéricas, e cada tipo tem a sua
de nição e ilustração. A obra nada informa a respeito de métodos
práticos.22

4. O breve capítulo de Isidoro de Sevilha segue as mesmas linhas que o de


Cassiodoro. Trata-se de uma classi cação quádrupla dos números,
baseada nas suas propriedades e relações. O autor inclui alguns absurdos a
respeito da nomenclatura latina e certos arroubos sobre a importância dos
números.23 Também nesta obra, buscamos em vão por uma única
sentença acerca dos métodos e das regras das operações.

5. De temporum ratione, do Venerável Beda, é o primeiro texto do período a


tocar o aspecto prático do cálculo — a obra trata do cômputo eclesiástico.
Não surpreende, portanto, que ele tenha servido de modelo para os
séculos seguintes.24

6. O Liber de ratione computi, do mesmo autor, é de caráter similar, porém


de forma mais condensada.25

7. Também De cursu et saltu lunae ac bissexto, de Alcuíno, é uma obra sobre


o cômputo eclesiástico. O seu conteúdo, no entanto, é mais astronômico
do que aritmético.26

8. O Liber de computo, de Rábano Mauro, é talvez o mais completo e mais


característico livro-texto do período em questão. Os ٩٦ capítulos
abordam em detalhe, mas concisamente, todo o conhecimento necessário
no tocante ao cômputo da Páscoa. É claro que se apresenta a classi cação
multiforme das propriedades e relações numéricas, mas isso em menos
que uma coluna. O restante da obra é dedicado ao sistema grego de
notação, às divisões do tempo, aos calendários grego e romano, aos nomes
dos planetas, a fatos sobre a Lua, a solstícios, equinócios, epactae e outros
fenômenos astronômicos envolvidos no estudo do cômputo. Os ciclos
lunares e o método de cálculo da Páscoa são explicados conforme o plano
de Beda. Como é de esperar, a seção mais importante da obra inteira
dedica-se ao cômputo eclesiástico.27 É signi cativo que haja, logo na
introdução, um capítulo sobre dactilonomia e os símbolos romanos. Mais
signi cativa, porém, é a omissão das regras para as quatro operações.
Assim, parece que o cálculo se zesse principalmente de cabeça, talvez
com a ajuda de um sistema elaborado de dactilonomia, e que as quatro
operações elementares, com números inteiros, fossem pré-requisito para o
estudo do cômputo. Sob todos os aspectos, pode-se tomar a obra de
Rábano Mauro como representativa do conhecimento e do ensino
aritmético do período. A grande in uência do “praeceptor Germaniae”
sugere por si só o amplo uso da sua obra, e numerosos livros-texto sobre o
cômputo, anônimos ou não, basearam-se no seu tratado.28

Além desses livros-texto, em que se revelam as características atribuídas ao


período, há ainda, da mesma época, outras obras excepcionais sobre a aritmética.
A sua existência e o seu emprego, todavia, de modo algum debilitam as nossas
conclusões sobre o caráter geral da instrução aritmética nessa fase inicial da Idade
Média.29
Sobre os métodos de divisão e as frações, são de particular interesse os
seguintes e breves escritos, erroneamente atribuídos a Beda:

• De numerorum divisione libellus.

• De loquela per gestum digitorum et temporum ratione libellus.

• De unciarum ratione.30

A origem desses tratados não pode ser rastreada para além do século X.31
Supõe-se, por conseguinte, que eles indiquem um lento progresso do
conhecimento aritmético. De todo modo, esse mesmo material serviria de base
para as realizações de Gerberto.
SEGUNDO PERÍODO

CARÁTER GERAL

O ponto de partida para rastrear o progresso do estudo aritmético nesse período


pode ser encontrado nas marcantes realizações matemáticas de Gerberto. O valor
exato das suas contribuições à aritmética ainda é uma questão em aberto. Alguns
lhe atribuem a introdução do cálculo por colunas na Europa Ocidental;32 outros
lhe atribuem, também, a introdução do sistema arábico de notação.33 Por outro
lado, Cantor, o Nestor dos historiadores da matemática, sustenta que Gerberto
não tivesse familiaridade alguma com o sistema arábico.34
Todos, porém, concordam nos seguintes pontos: (1) Gerberto e seus
discípulos, nomeadamente Bernelinus, incrementaram o ábaco e estenderam a sua
utilização com a introdução de apices diferenciados no topo de coluna; (2)
Gerberto e seus discípulos não se utilizaram do zero; (3) encontramos no livro de
Gerberto a primeira obra sobre o método de cálculo com o ábaco; (4) Gerberto,
que foi o primeiro a empregar o método da divisão complementar, tornou
possível a realização das quatro operações no ábaco. Para os ns da nossa
investigação, ainda outro fato sobre Gerberto é pertinente: ele ensinou as
disciplinas do quadrivium com notável sucesso na escola de Reims entre 972 e
982, e um registro completo dos seus métodos ainda existe.35
As duas obras de Gerberto, Regulae de abaci numerorum rationibus e o
fragmentário De numerorum abaci rationibus, podem ser tomadas como
representativas do que fosse um livro-texto de aritmética entre o século X e o
início do século XIII. O exame desses tratados36 revela que os processos
empregados em adição, subtração e multiplicação são muito parecidos com os
métodos modernos, enquanto o processo de divisão — tema da segunda obra, que
é a menor — difere por completo. Comparados ao sistema arábico, os métodos de
divisão de Gerberto foram considerados, não impropriamente, “quase tão
complicados quanto o engenho humano seria capaz de fazê-los”. Con rma essa
opinião o nome “divisio ferrea”, que passou a acompanhar os métodos de
Gerberto após a introdução do sistema hindu, chamado, por sua vez, de “divisio
aurea”.37
Nos dias de Gerberto, de um modo geral, quem escrevia sobre a aritmética era
conhecido por “abacista”. A introdução dos métodos hindus, por in uência dos
árabes, veio a restringir esse termo àqueles apegados aos métodos antigos, a saber:
(1) a utilização do ábaco; (2) a notação romana; (3) as frações duodecimais; (4) a
ausência do zero; (5) a incapacidade de extrair-se a raiz quadrada.38 Os melhores
métodos dos algoristas, como os autores do período seguinte eram chamados, não
necessariamente suplantaram a obra dos abacistas. Houve, de fato, uma
competição entre a escola abacista — por vezes chamada, erroneamente, escola
boeciana — e a nova escola, dita arábica.
A intrínseca superioridade do novo sistema não causou de imediato o
desaparecimento dos livros-texto baseados no antigo. Assim como as obras
aritméticas de Boécio foram impressas até o século XVI, também edições dos
antigos abacistas continuaram em uso muito para além do triunfo dos
alegoristas.39
LIVROS-TEXTO

Passando aos livros-texto do período, encontramos, com efeito, diversas


impressões. Contudo, apenas os mais típicos, aqueles mais celebrados no seu
tempo, pedem aqui ser mencionados.

1. Hermano Contracto, monge e professor em Reichenau na primeira


metade do século XI, é o autor de um Liber de abaco. O tratado é mais
breve do que as obras de Gerberto e confessadamente baseado nelas
mesmas.40

2. Rodolfo de Laon compôs tratado similar no século XII.41

3. João de Garlandia, autor de um tratado sobre o cômputo, compôs


também um livro-texto sobre o ábaco. É signi cativo que o mesmo autor
tenha preparado as duas obras; isso mostra que o escopo da aritmética
houvera-se ampliado, causando a separação total entre o cômputo
eclesiástico e a aritmética propriamente dita.42
TERCEIRO PERÍODO

CARÁTER GERAL DO CONHECIMENTO MATEMÁTICO

O exame do terceiro período, o algorístico, traz-nos até o meio da era das


universidades. Embora o quadrivium estivesse fundido no programa geral
oferecido sob o auspício das faculdades, a aritmética, tanto teórico como prática,
foi mais estudada nesse do que no período anterior. Isso, claro, graças aos avanços
do conhecimento na matéria.
As características da aritmética algorística eram: (1) o uso do sistema hindu-
arábico de notação; (2) o sistema de valor local; (3) o uso do zero; (4) a dispensa
total do ábaco; (5) o uso combinado de símbolos e números — na verdade, uma
combinação de álgebra e aritmética, na acepções atuais dos termos —; (6) a
introdução, na Europa Ocidental, de vastíssimo material aritmético do Oriente,
proporcionada por traduções latinas de fontes árabes. A tendência geral foi
abordar a aritmética pelos lados prático e cientí co, mas nem por isso os aspectos
místicos da disciplina, tão populares em outros períodos, foram negligenciados de
algum modo. O tratamento fantástico das propriedades numéricas continuou
bastante comum.43
Desse modo, o começo do século XIII é marcado pela introdução do sistema
arábico de notação e pela sua adoção, no lugar da notação romana e do ábaco.
Essa revolução fundamental deu-se gradualmente. A transição entre o período do
ábaco e era do algarismo remonta às traduções da aritmética hindu-arábica feitas
pelos seguintes e prestigiados matemáticos do século XII:

• Adelardo de Bath, que escreveu Regulae abaci às voltas de 1130. A ele


também se atribui o manuscrito de Cambridge intitulado Algorithm de
numero indorum.44

• Abraham Ibn Ezra, cujo tratado sobre a aritmética data de inícios do


século XII.45
• João de Sevilha, que compôs o seu Algorismus às voltas de 1140.46

• Geraldo de Cremona, que preparou um Algorismus na segunda metade


do século XII.47

• O anônimo que, às voltas de 1200, compôs um breve tratado sobre os


algarismos no sul da Alemanha.48

Essas obras de transição, conquanto escritas anteriormente à ascensão das


universidades, durante o declínio das escolas monásticas e catedrais, se
estabelecem a seqüência histórica neste estudo particular, não se podem tomar
como livros-texto característicos do período. Não precisamos, portanto,
demorarmo-nos sobre eles, que serviram tão-somente a um propósito admirável:
apresentar o sistema hindu-arábico aos matemáticos da Europa, pavimentando o
caminho para trabalhos posteriores.
É verdade, entretanto, que os primeiros anos do século XIII foram realmente
decisivos na história dos estudos aritméticos e matemáticos. Isso porque
inauguraram um uxo constante, e que perpassou todo o restante do século, de
traduções e adaptações de livros árabes e gregos.49 No campo da aritmética, a
introdução desse novo conhecimento produziu dois efeitos diversos: (1) sua
utilização e extensão na aplicação ao comércio; e (2) a adoção do sistema arábico
de notação nos estudos acadêmicos da matemática. O primeiro resultou num
extraordinário desenvolvimento dos aspectos práticos da aritmética e de partes da
álgebra nos centros comerciais de Itália, Inglaterra e Alemanha durantes os três
séculos posteriores.50 O principal representante dessa tendência foi Leonardo de
Pisa, que era lho de um mercador. O seu volumoso Liber abaci, composto em
1202, apresentou ao mundo uma quantidade de conhecimento prático e teórico
que ainda hoje pode ser considerada admirável.51 Não obstante, a in uência desse
livro sobre as universidades não foi perceptível nem mesmo na Itália, seu país.52
Nesse contexto, podemos nomear outro notável: o dominicano Jordano de Nemi,
cujos esforços para tornar acessível a ciência aritmética às tradicionais escolas
medievais comparam-se aos de Leonardo para popularizar a descoberta entre os
mercadores europeus.53 Dele interessam-nos Algorithmus demonstratus, breve
tratado sobre o cálculo;54 Arithmetica demonstrata, sobre a teoria dos números;55
e De numeris datis, sobre a álgebra.56 O seu caráter abstrativo, cientí co, assenta
no emprego de símbolos gerais. Excluindo-se de partida todos as aplicações
comerciais, temos, nesses tratados, o material perfeitamente adequado para o
estudo acadêmico da disciplina.57
ESCOPO

A pergunta sugere-se a si mesma: quanto desse material era de fato empregado no


ensino da aritmética? O exame dos registros da instrução nas universidades deve
dar-nos a resposta.
Passando a esses registros, deparamos as seguintes condições: em Paris, dava-
se pouca atenção à matemática. Os pré-requisitos para o mestrado, em 1366,
ditam vagamente “que o estudante compareça a seminários sobre alguma obra
matemática”.58 De todo modo, o fato de Sacrobosco ter lecionado matemática na
Universidade de Paris antes de 1255, considerando-se que o mesmo fora autor de
um algorismo baseado em Jordano, permite supor que, antes de 1366, tenha-se
estudado ali ao menos o material contido na aritmética de Jordano.
Em Bolonha, onde cultivava-se a matemática muito mais do que em Paris,
houve na faculdade de artes uma cadeira de aritmética. Previa-se, de nitivamente,
um curso sobre “algorismi de minutiis et integris”, material do Algorithmus
demonstratus de Jordano.59
Os estatutos da Universidade de Praga para o ano 1367 requerem, para a
conclusão do mestrado, um curso sobre “algorismus”. O conteúdo, segundo uma
escala de conferências para o mesmo ano, devia-se aprender em até três semanas,
donde ser claro que a disposição inicial referia-se ao estudo de obras tais como a
de Sacrobosco, ou seja, dos elementos práticos da aritmética.60 Na mesma
universidade, encontramos “o estudo da aritmética” entre os pré-requisitos para o
mestrado; outros registros indicam que ali se estudavam “algorismus” e
“arithmetica accurata”. Aqui, obviamente, distingue-se entre os elementos práticos
e teóricos da aritmética.61
A Universidade de Viena, durante toda a Idade Média, foi tão reconhecida
pelo estudo da matemática quanto a de Paris pelo estudo da loso a; chegou,
inclusive, a abrigar disputações sobre a matéria. E enquanto os dados sobre o
ensino da aritmética em Viena não representam a situação que, como vimos, era
comum a tantas outras universidades, as informações de que dispomos a esse
respeito, quando alinhadas a outras evidências, são, de fato, reveladoras. A agenda
de seminários para 1391–1399 mostra que ali se abordavam: (1) “algorismus de
integris”; (2) “algorismo de minutiis”; (3) “computus physicus”; (4) “frações
astronômicas”; (5) “arithmetica et proportiones”; e (6) “arithmetica”.62 À luz do
cuidado que ali se tomou para evitar a competição, duplicando-se os seminários,
podemos supor que esses cursos tratassem de aritmética e álgebra elementar e
teórica — justamente o tema da obra de Jordano.
A mesma distinção entre algorismus e arithmetica, isto é, entre os elementos
práticos e teóricos da aritmética, é também enfatizada em registros do século XV.
Ao que parece, havia níveis de remuneração para diferentes tipos de professores de
aritmética. Os seminários de “arithmetica” valiam o dobro dos seminários de
“algorismus”, se bem que o número de sessões fosse o mesmo para ambas as
disciplinas. Também parece signi cativo que o honorário correspondente aos
seminários de aritmética fosse igual à remuneração pelo mesmo número de aulas
sobre uma matéria aparentada à matemática teórica: a música.63
Em Leipzig, lha de Praga, prevaleciam as mesmas condições.64
Mais signi cativo, talvez, seja o fato de a Universidade de Colônia, fundada
1389 sobre as mesmas bases da Universidade de Paris, ter disposto para o
mestrado, em 1398, os mesmos pré-requisitos adotados em Viena.65
Condições similares existiram em Erfurt, Heidelberg, Oxford, e mesmo em
universidades italianas, como as de Pádua e de Pisa, onde a obra de Leonardo não
teve in uência alguma durante o século XV.
As evidências indicam claramente o escopo da instrução aritmética nas
universidades européias. Dado que o material utilizado nesses programas era
aparentemente idêntico ao conteúdo dos três livros de Jordano, é-nos permitido
inferir que o conhecimento cientí co sobre a aritmética estava plenamente
representado na educação universitária, sendo prevista, para a conclusão do
mestrado, a sua quase totalidade.
LIVROS-TEXTO

Determinado o caráter das obras didáticas do período, passamos ao exame dos


livros-texto empregados nas universidades.

1. O primeiro em importância, porque o mais usado durante três séculos, foi


o do inglês John Hollywood, dito Sacrobosco, cujo Tractatus de arte
numerandi, ou Algorismus, foi reimpresso inúmeras vezes e sob diversos
títulos.66 A obra não é senão um excerto do Algorismus demonstratus de
Jordano; traz as regras da aritmética sem demonstrações ou ilustrações, e
palavra nenhuma sobre as frações. Na verdade, mal passa de uma
exposição das nove operações aritméticas tais como explicadas por
Jordano — as regras de multiplicação aparecem em verso. O caráter da
obra determina prontamente o seu lugar no currículo: serve como um
guia, um texto a partir do qual se introduzirem os elementos da aritmética
antes de iniciar-se o estudo da aritmética teórica, mais audacioso.67

2. O que Sacrobosco fez a título de levar o Algorismus de Jordano até as


universidades, outros zeram-no com as suas duas outras obras.
Arithmetica speculativa, de omas Bradwardinus (1290–1349), cobre
toda a aritmética avançada de Jordano.68

3. Sacrobosco e Bradwardinus foram os adaptadores de Jordano, isto é, da


sua aritmética prática e teórica. Do mesmo modo, em meados do século
XIV, Nicolau Oresme, que foi aluno e professor da Universidade de Paris,
difundiu a aritmética e a álgebra de Jordano, especialmente as partes
dedicadas às frações e à álgebra sincopada. Seu Algorismus proportionum69
baseia-se inconfundivelmente na obra de Jordano. Esse tratado, no
entanto, foi mais do que uma simples exposição: o uso de expoentes
fracionários marca um avanço de Oresme em relação à sua fonte.70

4. Jean de Murs, outro matemático francês do mesmo século, trabalhou na


simpli cação de Boécio e de Jordano, fontes do seu Arithmetica
speculativa. A ampla utilização desse livro, um manual padrão de
aritmética teórica, é atestada pelo grande número de edições ainda
existentes.71

5. De minutiis physicis, de Johannes von Gmünden, é o típico livro-texto das


universidades germânicas do século XV. O autor, docente afamado na
Universidade de Viena, foi o primeiro em toda a Europa a ensinar
matemática como especialidade — antes do seu tempo, como se sabe, era
costume que os professores se revezassem em diferentes disciplinas dentro
das suas faculdades. Johann von Gmünden lecionou em Viena, tanto
“algorismus de integris” como “algorismus de minutiis”, de 1412 a 1417.
Ele empregava textos populares nas suas aulas: sobre aritmética integral,
Sacrobosco; sobre frações, algum comentador de Jordano; e sobre frações
astronômicas, seu próprio De minutiis physicis.72

6. O Algorismus “para estudantes” de Johann von Peuerbach foi muito


usado na Alemanha pela geração seguinte à de Gmünden. A popularidade
desse livro deveu-se ao fato de o autor ter sucedido o mesmo Gmünden
na Universidade de Viena. Como livro-texto, o tratado representa um
avanço em relação a Sacrobosco, cuja obra Peuerbach almeja suplantar.73

7. Podemos encerrar o nosso exame com Algorismus de integris, de


Prosdocimo de Beldemandi, professor da disciplina na Universidade de
Pádua em 1410. Esse texto, em tudo similar ao de Sacrobosco, mostra que
as universidades italianas não haviam sofrido qualquer in uência de
Leonardo de Pisa até meados do século XV. Nesse tempo, ao que parece,
elas ainda trilhavam o que se poderia chamar aritmética acadêmica.74

Com o aumento e o avanço do conhecimento universal em aritmética —


termo aplicado à álgebra —, houve uma tendência, já no nal do século XV, a
retirar-se a aritmética elementar dentre os pré-requisitos para o mestrado. Isso
explica a importância de uma nota sobre Heidelberg, de 1443. O estudo do
“algorism” e “de proportionibus” é ali posto numa classe de disciplinas eletivas,
“quos non oportet scholares formaliter in scolis ratione alicuius gradus
audivisse”.75 Esses seminários, pagos, davam-se, evidentemente, como um curso
extra ou auxiliar, para ajudar os alunos a “desenferrujar”. Assim, vê-se que a
exigência da aritmética nas universidades aumentara sensivelmente desde o século
XIV.76
Não quisemos, com este capítulo, apenas delinear o caráter e o escopo da
instrução aritmética tal como inserida entre as sete artes liberais. uisemos,
também, oferecer ao leitor uma melhor compreensão da natureza das evidências
que fundamentaram as nossas visões, expressas, de partida, nos parágrafos
introdutórios. Embora a variedade e o caráter alusivo dos dados disponíveis por
vezes desa em a capacidade de análise, ca demonstrada a continuidade histórica
do estudo da aritmética no esquema do ensino superior medieval. Não restam
dúvidas de que as escolas medievais ensinaram sempre tudo quanto se soubesse de
aritmética; de que os professores de aritmética fossem geralmente os grandes
matemáticos do seu tempo; de que esse magistério, porque em dia com o
progresso do conhecimento, tinha, justamente, um caráter progressivo; de que
jamais, nem mesmo nas infecundas gerações que encerram a Idade Média, quando
a educação escolástica já sobrevivia à sua utilidade, deixou a aritmética de ser
estudada no seio das faculdades medievais.
CAPÍTULO VIII
Geometria

N O capítulo anterior, zemos uma análise detalhada do caráter geral da


instrução no quadrivium, especialmente no que se refere à aritmética. As
mesmas conclusões, entretanto, aplicam-se à geometria. É de supor que a
geometria fosse amplamente ensinada tanto no período pré-universitário como na
era das universidades, e que o escopo dessa instrução caminhasse pari passu com
os avanços do conhecimento na matéria.
Resta-nos indicar as proporções do conhecimento em geometria disponível a
cada período e descrever brevemente as obras didáticas utilizadas. Como no caso
da aritmética, distinguem-se três períodos: (1) antes de Gerberto; (2) entre os
tempos de Gerberto e o século XIII; (3) entre o século XIII e o humanismo.
PRIMEIRO PERÍODO

Até o nal do século X, a era de Gerberto, quase que não existia na Europa
Ocidental conhecimento em geometria tal como a de ne o uso moderno da
palavra. Com efeito, parece que o termo se empregava em sentido etimológico, e
não no sentido em que os gregos o entendiam. Dada a negligência dos romanos,
que apenas cuidavam da sua aplicação prática, a agrimensura, o mais provável é
que nenhuma geometria digna do nome de ciência tenha sido transmitida à Idade
Média.1 Disso dão testemunho os livros-texto do tempo de Gerberto. Os mais
usados eram os de Marciano Capela, Cassiodoro e Isidoro de Sevilha.
O texto de Capela, de modo geral, é um breve relatório sobre geogra a, a
localização de sítios históricos e fatos congêneres. Somente no nal da obra
encontramos algumas de nições: linhas, triângulos, quadrângulos, o círculo, a
pirâmide, o cone. Nada há nesse texto de geometria propriamente dita, ou mesmo
de agrimensura.2 O capítulo de Cassiodoro não se sai melhor,3 e o mesmo vale
para o tratamento de Isidoro de Sevilha.4
Conquanto esses tenham sido, ao que tudo indica, os únicos livros-texto de
geometria à época de Gerberto, é bem verdade que os agrimensores do Império
Romano tardio, os gromatici, legaram à Idade Média algum conhecimento sobre
estimar-se a área de um triângulo, de um quadrilátero e de círculo.5
Mas se a ciência da geometria fora negligenciada, a geogra a e a cosmogra a
foram introduzidas para suprir a de ciência. O material sobre essas disciplinas era
farto, e por isso elas foram muito cultivadas. A maioria dos vinte livros das
Etymologiae, de Isidoro de Sevilha, diziam respeito à Naturkunde.6 De uni erso,
de Rábano Mauro, foi outra compilação do mesmo tipo.7 Compêndios baseados
na geogra a de Plínio, entre outros, foram muito numerosos no período, e as
referências ao estudo desses obras como parte do quadrivium são bastante
comuns.8
SEGUNDO PERÍODO

Passando ao tempo de Gerberto, deparamos um aumento pequeno, embora


relativamente signi cativo, na quantidade de conhecimento em geometria.
Graças à “descoberta” de uma cópia das obras boecianas sobre a geometria, e
também do Codex arcerius, um bocado da geometria de Euclides e alguns
fragmentos dos gromatici vieram parar nas escolas da cristandade.9 Todavia, o
novo aporte geométrico não teve lá muito valor, nem pela quantidade, nem pela
qualidade. As supostas obras de Boécio, as quais Gerberto encontrara,10
consistiam em dois livros: o primeiro, todo ele baseado em Euclides, continha
basicamente os enunciados dos livros I e III, inclusive de nições, axiomas e scholia;
algumas das proposições dos livros III e IV; e as demonstrações completas das três
primeiras proposições do livro I, dadas, nas palavras do autor, “ut animus lectoris
ad enodatioris intelligentiae accessum quasi quibusdam graditus perducatur”. A
segunda obra trazia os cálculos das áreas de guras geométricas. Esses, segundo
Chasles, baseaim-se quase que inteiramente nas obras do gromaticus Frontino.11
Comparando esse corpo de conhecimento ao texto de Euclides transmitido
por Téon, vemos que a geometria de Boécio consiste nas de nições euclidianas, na
teoria dos triângulos e quadriláteros e em algumas teorias dos círculos e
polígonos. Além disso, encontramos as suas próprias demonstrações dos seguintes
problemas: (1) a construção de triângulo equilátero, dado o lado; (2) traçar-se, de
um ponto dado, uma linha reta de determinado comprimento; e (3) segmentar
uma linha menor numa linha maior.
Gerberto, aparentemente, tomou posse de todas as pecinhas de
conhecimento geométrico disponíveis, tanto teóricas como práticas, e fez do
conjunto delas a base mesma da sua obra.12 O seu livro-texto não impressionou os
estudiosos pela originalidade, e pode-se considerar que ele representa a totalidade
da instrução em geometria oferecidas nas escolas até o nal do século do século
XIII. Em grande medida, esse livro e outras obras de caráter similar logo
substituíram a geogra a e a cosmogra a, que, graças à escassez de verdadeira
geometria, passaram por esse nome até os dias de Gerberto.13
TERCEIRO PERÍODO

Como no caso da aritmética, os séculos XII e XIII formam um período de


transição. A geometria de Euclides, como é de supor, foi uma das muitas obras
matemáticas que alcançaram a Europa Ocidental por meio de traduções de fontes
árabes. Naturalmente, esse incremento do conhecimento em geometria logo foi
apropriado pelas universidades, que o integraram ao novo curso, ampliado.
Depois dos trabalhos de Adelardo de Bath, que traduziu Euclides do árabe em
1120, e de Geraldo de Cremona, autor de outra tradução,14 datada de 1188,
pode-se dizer que a Europa Ocidental fora devidamente apresentada à geometria
euclidiana. Foi então que as obras de Boécio e de Gerberto acabaram descartadas
pelas universidades, e assim restou, como disciplina do currículo, o lado
puramente teórico da ciência.
Temos evidências bastantes de que Euclides, tal como adaptado no De
triangulis de Jordano de Nemi, por exemplo, foi ensinado durante toda a Idade
Média, até o Renascimento.15 uase todas as listas de pré-requisitos para o
mestrado incluem cinco ou seis dos seus livros — Bolonha, Praga, Viena, Leipzig,
Pádua, Pisa e Colônia, invariavelmente.16 Mesmo a Universidade de Paris,
notoriamente desinteressada da matemática, requereu, na alta Idade Média, os seis
livros completos de Euclides — e não apenas as três primeiros, como geralmente
se supõe.17 É certo, por conseguinte, que o candidato a universitário, mirando um
diploma nas artes, tivesse o mínimo de conhecimento sobre o texto euclidiano: a
teoria dos triângulos e quadriláteros; as várias aplicações da teoria de Pitágoras a
um grande número de construções; os teoremas do círculo; os teoremas dos
polígonos inscritos e circunscritos; as proporções geométricas; e a similaridade
das guras. Acresça-se a isso tudo a teoria dos números — contida nos livros VII,
VIII, IX e X —, que era estudada como parte da aritmética teórica, e então nos
veremos forçados a concluir que, como parte quadrivium, transmitia-se um tanto
muito mais que considerável da geometria.
Cursos adicionais sobre a teoria das coordenadas foram ministrados nas
universidades dos séculos XIV e XV.18 O ensino avançado da geometria abriu o
caminho para geometria analítica de Descartes, no século XVI.19 Pode-se dizer o
mesmo do estudo da perspectiva, que, em algumas universidades, foi tema de
cursos ministrados como parte do quadrivium.20
ue os gregos apresentados à Europa Ocidental por in uência dos árabes
estimularam inclusive especulações originais, isso vê-se pelas obras de Leonardo
de Pisa (Practica geometria, 1220), Jordano de Nemi (De triangulis, c. 1237),
omas Bradwardinus (Geometria speculativa, c. 1327) e Nicolau Oresme
(Tractatus de latitudine forarum), às quais ainda hoje atribui-se mérito
cientí co.21 É decerto verdade que essas obras, por marcantes que sejam de um
afastamento em relação aos gregos, não encontraram o seu caminho até o
currículo medieval.22 Mas essa falta de assimilação, esse deixar passar novas idéias,
se presta a evidência do interesse super cial pela instrução matemática.23
Mesmo nos nossos dias, depois de cinco séculos de fenomenal
desenvolvimento nos estudos da geometria, o valor exato da obra de Euclides
como livro-texto continua a ser uma questão em aberto.24 Com isso em mente,
não parece razoável esperar que as universidades medievais — instituições de uma
era que louvava a tradição — estivessem mais dispostas a se desfazer de Euclides
do que hoje estão as nossas escolas.
CAPÍTULO IX
Astronomia

A O longo de toda a Idade Média, a astronomia foi talvez a mais popular entre
as disciplinas do quadrivium. As razões para tanto nada têm de obscuras.
Em primeiro lugar, a astronomia estava intimamente ligada a pelo menos outras
duas disciplinas do quadrivium: aritmética e geometria. Também neste caso, o
dia-a-dia dos homens era mais afetado pelo aspecto prático da disciplina; o
interesse popular pelos movimentos celestes era maior na época do relógio solar
do que o poderia ser hoje, na era do relógio de pulso. Ademais, o peculiar apego
medieval à astrologia ajudou a promover o estudo da astronomia — não se pode
subestimar o alcance dessa in uência. O grande Kepler, no início do século XVII,
chamou a astrologia de “ lha tola da astronomia”, e acrescentou: “mas pela
existência da lha a mãe teria morrido de fome”.1 Outro fator estimulante do
interesse pela astronomia foi a relevância do cômputo da Páscoa, pois se o cálculo
em si podia ser feito mecanicamente, o estudo dos problemas astronômicos mais
profundos, de um modo ou de outro implicados na operação, era contudo
inevitável. Na verdade, o que esses livros apresentavam a respeito do computus
propriamente dito, no mais das vezes, era-lhe apenas remotamente relacionado.2
Aos letrados, o fato de o próprio Aristóteles ter escrito uma obra sobre
astronomia deve ter parecido razão su ciente para manter a disciplina no
currículo superior. Não admira, portanto, que o seu De caelo constasse entre as
obrigações do mestrando na maioria das universidades. Por m, a harmonia entre
a doutrina geocêntrica e os dogmas teológicos da época3 deve ter sido um
estimulante poderoso: num tempo em que a idéia de universalidade, na Igreja e
no Estado, dominava a mente do homem, quão atrativa deve ter sido uma
disciplina de caráter tão universal! O fascínio que hoje nos causam os milagres da
ciência moderna mal se pode comparar com a in uência que as maravilhas da
astronomia, ciência ainda na infância, exerciam sobre a mente do estudante
medieval.
Não surpreende que veri quemos, no curso de toda a Idade Média, uma
atenção contínua para com o estudo da astronomia. As conclusões gerais sobre a
instrução em aritmética e geometria aplicam-se com ainda mais força à
astronomia: abundam as evidências de que a instrução no período pré-
universitário acompanhasse o estado da arte na astronomia; de que a astronomia
elementar e avançada foi pré-requisito em quase todas as universidades entre os
séculos XIII e XV;4 de que a carga de instrução avançada em astronomia foi muito
grande durante toda a era das universidades; de que foram muitos os autores e
professores dedicados à astronomia; de que se deu assimilação do aporte arábico;
de que tábuas astronômicas cada vez melhores foram produzidas continuamente;
e de que idéias originais não foram raras nesse campo. É preciso desfazer-se das
noções tradicionais sobre a cultura medieval para apreciar devidamente a
importância do fato de que a manufatura e comercialização de instrumentos
astronômicos não era um ramo infrutífero ao nal do século XV.5
uanto às proporções do conhecimento astronômico da Idade Média,
podemos, outra vez, distinguir três períodos: o primeiro termina com a virada do
século XII; o segundo compreende o século XII como um todo; e o terceiro se
estende entre os séculos XIII e XVI.
PRIMEIRO PERÍODO

Neste período, como é de esperar — e os livros-texto o demonstram — as


proporções do conhecimento astronômico eram bastante limitadas. Entre as
obras didáticas mais utilizadas no período, destacam-se as abaixo referidas:

1. Seção de Nuptiis Philologiae et Mercurii, de Marciano Capela. Além dos


fatos óbvios da astronomia elementar, o capítulo contém material
alegórico sobre as constelações. De seu estudo o aluno medieval tirava um
pouco mais do que oferecem as nossas geogra as escolares, mas sob o
título pretensioso de “geogra a matemática”.6

2. O compêndio astronômico de Cassiodoro de ne a lex astrorum como


“disciplina quae cursus coelestium siderum et guras omnes contemplatur
est altitudines stellarum circa se et circa terramindagabili ratione
percurrit”. No entanto, Cassiodoro não vai além de meramente de nir
alguns termos astronômicos.7

3. O tratamento que Isidoro de Sevilha dispensa à matéria é mais adequado.


Ele de ne a astronomia nos mesmos termos, substancialmente, porém
amplia o seu escopo, incluindo o estudo do efeito dos corpos celestes
sobre a Terra. Suas de nições são mais claras e mais completas; sua
exposição da teoria geocêntrica, mais precisa.8 Todavia, ele dedica um
terço da obra à mera enunciação dos nomes das estrelas; a astrologia, ao
seu ver, é uma parte da astronomia, que tem seu lado cientí co — a
observação e o estudo das estrelas — e o seu lado supersticioso — a crença
de que o curso das estrelas in uencia os destinos do homem.9 O texto não
dá conta de tudo que Isidoro conhece em termos de astronomia; outras
partes das Etymologiae contêm material de caráter cosmológico e
cosmográ co. Nessas outras partes, convenientemente, Isidoro sintetiza
obras romanas de história natural.10
4. De natura rerum e De temporum ratione, do Venerável Beda, foram os
livros-texto de astronomia mais importantes do período. Essas obras têm
valor mesmo aos olhos da crítica moderna, na medida em que re etem,
sob todos os aspectos, a grande erudição desse notável medieval. Elas
contêm todo o material necessário para o domínio completo dos métodos
do cômputo eclesiástico. Somando a isso um bom tanto de referências à
obra de Plínio, Beda, com efeito, preparou um tratado completo e
sumamente útil de astronomia e geogra a física. A ampla utilização desse
livro, e por vários séculos, deve-se não somente à fama do autor, mas
também à perenidade da obra.11

5. O popular tratado de Alcuíno, De cursu et saltu lunae ac bissexto, era,


como o título sugere, bastante limitado — lida apenas com a astronomia
do computus.12

6. O Liber de computo, de Rábano Mauro, com o caráter ambivalente de


tratado sobre computus e astronomia, sustentou por completo o interesse
tradicional fomentado por Beda e Alcuíno.13

As obras de Beda, Alcuíno e Rábano Mauro instituíram um mínimo de


instrução em astronomia nas escolas do período. Esse mínimo ultrapassava em
muito o simples conhecimento técnico requerido para o cômputo eclesiástico, na
medida em que incluía, entre muitos outros tipos de dados astronômicos, o
estudo dos ciclos do Sol, da Lua e das estrelas e as mudanças de estação. Mas as
escolas mais importantes iam muito além disso. Livros famosos no nal do
império, como as obras tardias de Sêneca, Phaenomena et prognostica de Arato, o
Astronomicon de Mânlio, o Poeticon astronomicon de Higino e o Catasterismi de
Eratóstenes, foram muito empregados nas escolas do período pré-universitário.14
Na verdade, boa parte desse Lehrstoff astronômico acusava o raciocínio fantástico
de uma época em que a tradição e a littera scripta — não necessariamente
eclesiástica — eram mais autoridade do que a observação individual. Considere-se
ainda que apenas os fragmentos do conjunto em que assentava a teoria ptolomaica
eram de conhecimento da Europa Ocidental, não havendo, por conseguinte, à
disposição das escolas, teoria adequada para lidar com os planetas. À parte as
limitações da época, é bem verdade que existia amplo interesse em aprender, um
espírito cuja persistência pode ser comparada à do moderno espírito cientí co. O
fato de não raro utilizarem-se instrumentos astronômicos, e de existir já no
começo do século XI um livro-texto sobre uso do astrolábio, indica
su cientemente o caráter da instrução nessa matéria. A existência desse livro
parece mais representativa do temperamento da época do que uma anedota
muitas vezes referida a título de ilustração da ignorância medieval: diz-se que os
contemporâneos de Gerberto, vendo as esferas que usava nos estudos,
acreditavam piamente que ele tivesse uma aliança com o demônio.15
SEGUNDO PERÍODO

No campo da astronomia, o século XII foi um tempo de progresso. A gradual


assimilação do que por muitos anos fora um tesouro perdido é mais acentuada no
caso da astronomia do que nos casos da aritmética e da geometria. O elaborado
tratado de Ptolomeu, síntese da astronomia dos gregos, que, sob o título
Almagesto, do século IX em diante, encontrou lugar nas escolas árabes do Leste e
do Oeste, foi um dos primeiros livros traduzidos do árabe para o latim. Já em
1116, Platão de Tivoli fez uma tradução do texto a partir da versão Al-Battani.16
Da Itália e da Espanha, volumes e mais volumes de material astronômico
chegaram a outros centros intelectuais da Europa, de modo que todo o
conhecimento possuído pelos árabes já estava sob domínio europeu em meados
do século XIII.
TERCEIRO PERÍODO

Tal crescimento permitiu uma retomada cientí ca, suplementada, claro, pelo De
coelo de Aristóteles, que então já estava à disposição das universidades européias.
É óbvio que o estudante universitário não poderia ser lançado ao estudo da
astronomia, tanto da árabe como da aristotélica, nem tirar grande proveito das
tábuas astronômicas sem antes ter-se-lhe dado alguma instrução preliminar. Do
ponto de vista do professor medieval, eram necessidades do dia: (1) um breve
tratado introdutório sobre os fundamentos da astronomia; (2) um arrazoado
suscinto, para uso escolar, sobre a teoria ptolomaica; (3) algum tratado sobre o
uso dos vários instrumentos astronômicos.
Essas necessidades foram supridas com sucesso. A demanda por um tratado
elementar de astronomia, que incorporasse “os últimos avanços da ciência”, como
diríamos hoje, e ao mesmo tempo servisse para o uso escolar, foi atendida pelo
histórico Libellus de sphaera de Sacrobosco. O caráter elementar do conteúdo é
sugerido pelo autor na sua própria introdução.17 A imensa popularidade desse
livro, bem como a amplitude da sua utilização ao longo de quatro séculos —
foram encontradas cerca de 60 edições diferentes18 —, têm sido referidas para
rebaixar a carga de instrução em astronomia oferecida nas universidades. Note-se,
porém, que esse livro era usado apenas como volume introdutório, e que a um
curso qualquer sobre “sphaera”, tema do livro de Sacrobosco, seguia-se
invariavelmente, em todas as universidades, um curso avançado sobre teoria
astronômica.19 Como tratado introdutório, o livro cumpriu bem a sua função.
Nem Melâncton, príncipe dos professores da Reforma, já distante o triunfo do
humanismo, pode superá-lo — fato que se prova na sua introdução laudatória a
uma edição de 1531.20
No século XIII, foi suprida a necessidade de um livro-texto avançado, que
incorporasse as reivindicações cientí cas da teoria ptolomaica. Dois italianos,
Geraldo de Cremona e Giovanni Campano de Novara, compilaram adaptações
melhoradas de um grande número de edições árabes, em geral imperfeitas, do
Almagesto. As suas obras intituladas eorica planetarum tornaram-se obrigatórias
em todas as universidades, e equivalia, no âmbito do mestrado, ao curso avançado
de astronomia.21
A terceira necessidade do dia, isto é, a demanda por um livro-texto sobre o
instrumental, foi atendida por uma série de autores. Sacrobosco escreveu o
popular De astrolabio; Roberto Grosseteste, professor de matemática em Oxford,
falecido em 1253, escreveu um tratado homônimo; e Pietro d’Abano foi o autor
de Astrolabium planun. Esses livros tornaram-se o material para a instrução do
astrolábio ou do planisfério nas universidades.22
Os três tipos de livro continuaram em uso nas universidades por todo o século
XIV e cerca de oito décadas do século XV. Durante esse tempo, requereu-se do
graduando medieval a assimilação de textos sobre astronomia elementar e
avançada e sobre o manuseio do instrumental astronômico.
Em astronomia, como nas outras disciplinas do quadrivium, houve o mesmo
desejo de incorporar ao currículo o novo conhecimento. Assim, no nal do século
XV, quando Peuerbach e Regiomontanus, astrônomos famosos na sua geração,
tinham enriquecido a ciência com as suas primorosas traduções do Almegesto e
suas tábuas astronômicas, então as universidades elevaram as condições da
astronomia. eorica planetarum e outros tantos epítomes da ciência foram logo
transformados em textos-padrão da disciplina.23
En m, desta investigação sobre o escopo e o caráter da instrução em
astronomia no currículo medieval, podemos tirar as seguintes conclusões: (1) a
instrução na disciplina seguiu por todo o período; (2) durante a Idade Média, a
carga de instrução, que já não era grande, limitava-se ao ensino dos métodos de
cômputo eclesiástico; (3) o currículo ampliou-se a cada novo incremento da
astronomia, e o novo material incorporava-se aos livros-texto então utilizados; (4)
o estudante medieval conhecia não somente os fundamentos da astronomia, mas
também a base cientí ca das teorias em voga; (5) à falta do telescópio, essas
teorias explicavam a contento todos os problemas astronômicos do dia e
ofereciam boa hipótese de trabalho para todos os fenômenos familiares aos
estudiosos.
CAPÍTULO X
Música

A música, tal como ensinada no quadrivium, era exclusivamente teórica. Ciência


especulativa, tinha um caráter totalmente matemático, não requerendo, portanto,
aptidão especí ca para a arte musical. Na verdade, durante toda a Idade Média,
não foram tidos como músicos, em sentido estrito, nem o cantor nem o
instrumentista.1 Essa concepção caracteristicamente medieval sobre a função da
música simpli ca muito o escopo da nossa investigação. Dado que apenas no
Renascimento o termo “músico” passou a designar aquele que exercita tanto a
ciência como a arte, não precisamos tocar as muitas controvérsias que pairam
sobre a história da arte musical na Idade Média.2
Não obstante, fatos relacionados ao ensino da música prática são-nos
pertinentes, na medida em que lançam luz sobre o aspecto cientí co da disciplina.
Se é bem verdade que os instruídos na arte do canto não eram músicos no sentido
medieval, e que a um “músico” mais valia a teoria dos números do que uma bela
voz ou a destreza ao tocar um instrumento, também é certo que, como parte do
quadrivium, no período pré-universitário, a ciência da música aprendia-se melhor
nas escolas de boa reputação pelo ensino musical na instrução primária.
Nos parágrafos seguintes, fatos relativos à história da instrução na arte do
canto serão comentados conforme a luz que lançaram sobre a posição que a
disciplina ocupava no currículo das sete artes liberais.3
CARÁTER GERAL

Ao percorrer a história das três primeiras disciplinas do quadrivium — aritmética,


geometria e astronomia —, vemos que todas tiveram três períodos característicos.
Cada uma teve um período em que o conhecimento, embora limitado e quase
sempre insigni cante, era preservado religiosamente e transmitido às gerações
seguintes mediante a instrução nas escolas; cada uma teve um período em que a
principal preocupação era assimilar as novidades que chegavam do lado de lá dos
Pirineus; cada uma teve um período em que o conhecimento assimilado integrou-
se ao currículo e passou a ser assiduamente cultivado. Mas o caso da música foi
outro. Não houve um período de assimilação, que permitisse o progresso no
período seguinte. Não. O avanço da disciplina condicionou-se tão-somente ao
abandono das teorias da era anterior. Nesse campo, a obra da Idade Média foi
inteiramente original, e valorosa apenas na medida em que se ignoraram as
tradições do período clássico.4
Distinguem-se dois períodos na história da disciplina: um termina mais ou
menos com o século XI; o outro, com o século XV. As condições e necessidades da
Igreja ensejaram melhorias nas partes teórica e prática. Naquele tempo, todos
concordam, estudava-se música apenas nas escolas da Igreja, monásticas e
catedrais. A era da música secular ainda estava por vir.5
A importância que o estudo da música tinha para a Igreja fez dos rudimentos
na arte algo essencial para a educação do sacerdote6 — não foi por acaso o
mecenato de Carlos Magno. Não surpreende, portanto, o interesse excepcional
que, entre os séculos IX e XI, manifestou-se em diversos mosteiros da Europa
Ocidental. Enquanto as escolas de Metz e São Galo despontaram pela excelência
em educação musical, as de Soissons, Fulda, Mainz, Treves, Reichenau, St. Amand
e muitas outras mencionadas com respeito ao quadrivium destacaram-se também
pela instrução em música teórica e prática.7
As evidências de instrução em música nesse período podem ser vistas de
diversas maneiras. Numerosas referências incidentais, espalhadas pelos relatos já
citados em relação ao estudo do quadrivium, mostram que a música era estudada
juntamente com as outras disciplinas do programa das sete artes liberais. A carga
de estudos intensivos em escolas particulares da primeira Idade Média mostra
com clareza uma crescente da instrução em música e a grande in uência dessas
escolas sobre os teóricos.8 O vasto número de livros-textos medievais — bons,
maus e indiferentes — reunidos por Gerberto e Coussemaker nas suas coleções
monumentais, que cobrem todo o terreno até o século XV, é prova convincente da
extensão, se não que também da qualidade, do ensino teórico da música.9
No segundo período, correspondente, grosso modo, ao período das
universidades, o lado especulativo da música foi ainda mais enfatizado. Há
menções à música em todas as referências a pré-requisitos acadêmicos, tanto da
licenciatura como do mestrado. Os fatos mais que justi cam a cautelosa
generalização de Rashdall: “Oxford e as universidades germânicas parecem ter
concordado em exigir ainda De re musica, de Boécio, ou alguma outra obra
musical, a m de sustentar a teoria de que o programa das artes consistia no
trivium e no quadrivium completos”.10
LIVROS-TEXTO

Graças ao desenvolvimento único do estudo da música, os livros-texto não se


podem classi car ao modo da aritmética, da geometria e da astronomia. O
melhor é dividi-los em dois grupos: no primeiro, todos cujos autores seguiam
implicitamente o padrão da teoria grega e do tetracorde; no segundo todos
aqueles que, em maior ou menor grau, emanciparam-se da in uência grega, onde
se incluem re exões sobre “organon” (harmonia em sentido moderno), as escalas
e a notação — foi a partir daí que se desenvolveu, gradualmente, o sistema
moderno de notação.
Entre os livros-texto que serviram de base para boa parte dos tratados do
primeiro período11 estão as obras de Marciano Capela, Boécio, Cassiodoro e
Isidoro de Sevilha, que combinam todos os vestígios da teoria grega de que a
Idade Média viria a ser herdeira. Conquanto breves, as compilações de Capela,
Cassiodoro e Isidoro12 devem ter sido de grande in uência, na medida em que
traços das suas obras encontram-se em quase todos autores subseqüentes.13 Mas a
in uência predominante nesse período foi exercida, de fato, pelo elaborado
compêndio de Boécio:14 seus cinco livros De musica formaram a base de toda a
música teórica. Com efeito, a obra manteve sua autoridade ao longo de toda a
Idade Média — grande representante da ars musica antiqua. A sua importância
justi ca uma análise de conteúdo.
O texto ocupa 132 páginas impressas, com numerosas ilustrações, tabelas,
diagramas e esquemas. Divide-se em cinco livros:

• Livro I: Contém cerca de um quinto da obra. Trata da história, do caráter


e das divisões da ciência. Expõe-se a teoria da consonância, e as
proporções que formam consonância e dissonância são apresentadas em
detalhe, acompanhadas dos respectivos nomes gregos. Depois de muitas
classi cações e de nições, em que se enfatizam analogias entre a
harmonia e o movimento dos planetas, o livro termina com um capítulo
sobre “o que é um músico”, onde é dada a de nição que se tornaria
clássica.15
• Livro II: Trata exclusivamente de quantidades aritméticas. Expõe-se a
mística pitagórica dos números e introduz-se a “proporção musical”, a
qual, na opinião de Boécio, é um tipo diferente de proporção aritmética.

• Livro III: Criticam-se em detalhe as teorias de Aristóxenes. Daí este livro


assumir um tom algo polêmico.

• Livro IV: Dedica-se a uma exposição da divisão e do uso do monocórdio


na teoria musical. Trata, também, do sistema de notação que emprega as
letras do alfabeto, ainda que de forma não sistematizada.

• Livro V: Reservado a um exame daqueles pontos da teoria musical em que


divergem.

Essa breve análise mostra que as únicas seções adequadas para o uso escolar
são os livros II e IV. Foram esses, provavelmente, os únicos utilizados. O fato de
que esses dois livros, ou pelo menos os seus temas, parecem ter sido a base de toda
uma cadeia derivativa dá razão de ser à nossa suposição.16
Entre esses textos derivativos, destacam-se:

1. Musica disciplina, de Aureliano de Reome. Composto no século IX.17

2. Comentário de Remígio de Auxerre ao De musica de Marciano Capela.


Escrito no século seguinte.18

3. Liber de harmonica institutione, de Hucbald (880–930), que representa a


tentativa de erigir um sistema musical fora da Igreja, a partir das teoria de
Boécio.19

O avanço causado pela emancipação de Boécio foi tão gradual, que é difícil
nomear o primeiro texto que a manifesta. Entretanto, Cita et vera divisio
monochordi, composto por Bernelinus no século X, pode ser considerado um
divisor de época. Os críticos mais competentes acreditam que o livro aborda os
aspectos matemáticos da teoria musical num espírito essencialmente original.20
De Bernelinus em diante, o progresso no sentido de uma teoria musical
medieval seguiu regularmente. O acúmulo de conhecimento foi gradualmente
re etindo-se nos livros-texto, e ao nal do século XIV personi cou-se em Jean de
Murs, professor de matemática na Universidade de Paris. O seu livro foi a obra-
padrão adotada pelas universidades durante os séculos XIV e XV.21
Conclusão

O S resultados deste estudo podem ser resumidos da seguinte forma: o


currículo das sete artes liberais desenvolveu-se plenamente nas escolas do
Império Romano no século IV. A cristandade, triunfante, julgou necessário
apropriar-se do conteúdo do currículo, e adotou-o integralmente, uma vez que os
estudos seculares poderiam ser de grande valor para o cristão se a educação liberal
pudesse ser apenas um meio, isto é, uma preparação para o ensino superior da
teologia.
Embora a tradição, o espírito da época, tenha preservado esse currículo na sua
integralidade, a quantidade e qualidade da instrução nas várias disciplinas não se
manteve exatamente a mesma ao longo de toda a Idade Média. Conforme as
necessidades, cada geração enfatizou certas matérias, não raro em detrimento de
outras, ou mesmo para o completo abandono. Assim, antes do século XII, o estudo
da literatura latina foi assiduamente cultivado, em parte porque o domínio da
língua e da literatura latinas era fundamental para esse período formativo, e em
parte porque as outras disciplinas do currículo — a lógica e os estudos
matemáticos — ainda não se haviam desenvolvido o bastante para que a instrução
nelas mesmas adquirisse algum valor cultural. Mais tarde, quando a precisão de
raciocínio tornou-se pré-requisito para lidar com as questões que ocupavam as
mentes ilustradas — questões de teologia e metafísica —, o estudo da lógica
assumiu a liderança dentro do esquema da educação. Ainda mais tarde, já no nal
da Idade Média, quando a matemática, com todos os avanços, ocupava cada vez
mais espaço em novas outras mentes ilustradas, foi a vez de enfatizarem-se a
aritmética, a geometria e a astronomia.
A verdadeira carga de instrução nas diferentes disciplinas, e isso ao longo de
toda a Idade Média, aproximou-se, invariavelmente, da totalidade do
conhecimento disponível a cada geração.
A atitude da Igreja medieval e das autoridades intelectuais da cristandade
nunca foi de hostilidade à cultura secular. Eminentes homens do clero, mesmo os
mais ascéticos em relação às artes liberais, foram todos treinados à maneira
tradicional. Naturalmente, com suas vidas atribuladas, nem todos continuaram
interessados por esses estudos — não mais do que o homem prático de hoje
mantém aceso algum entusiasmo pelas disciplinas que formam o essencial da
educação nas faculdades modernas.
Houve um interesse geral pelos estudos clássicos nas escolas da Idade Média, e
esse nunca foi tão forte quanto no tempo em que a Igreja controlava todas as
instituições de ensino. Se ele diminuiu na era das universidades, foi como uma
reação às condições pré-universitárias — e não como continuidade.
Numa era que louvava a tradição, uma era sem grá cas nem prensa móvel,
uma era de deferência à autoridade e à littera scripta, os livros-texto sobre as
diferentes matérias são prova inequívoca da quantidade e da qualidade da
instrução que se oferecia. O exame detalhado dessas obras revela os incríveis
esforços dedicados à adaptação do material disponível às necessidades do dia. Eles
demonstram rara habilidade pedagógica, uma compreensão profunda das
condições subjacentes, distintíssima individualidade e um desejo ardente de
assimilar cada novo passo na evolução da disciplina.
Em ao menos duas disciplinas do currículo — retórica e música —, os
estudiosos da Idade Média abandonaram as trilhas originais e desenvolveram os
seus estudos em harmonia com o espírito da época.
Apesar das inclinações dialéticas no nal do Idade Média, a instrução em
lógica foi surpreendentemente livre do que em geral pressupomos terem sido as
puerilidades no estudo da loso a. As evidências mostram que a instrução nas
artes liberais passava ao largo das amenidades metafísicas ao gosto medieval,
quaisquer que fossem. Essas sutilezas diziam respeito ao especialista, e não a quem
buscava a cultura liberal.
Notas

CAPÍTULO I
1. De penas inglesas e americanas, não pôde o autor localizar mais do que
três estudos especí cos sobre o tema: T. Davidson, “ e Seven Liberal
Arts”, e Educational Review, vol. II, pp. 467–73 [consta ainda como
apêndice em Aristotle and Ancient Educational Ideals, do mesmo autor];
H. Parker, “ e Seven Liberal Arts”, e English Historical Review, vol. V,
pp. 417–61; A. F. West, “Seven Liberal Arts”, capítulo de Alcuin and the
Rise of the Christian Schools, pp. 4–27.

2. P. Monroe, Source Book of the History of Education, pp. 17 e ss; p. 223.

3. Platão, Republic (trad. Jowett), livro II, § 374 e ss.; livros III, VI, VII. Cf.
Bosanquet, e Education of the Young in the Republic of Plato, pp. 12–
16.

4. Aristóteles, Politics (trad. Jowett, 1885), cap. VIII, 3, pp. 245 e ss.;

5. Davidson, Aristotle, pp. 198 e ss.

6. Cf. Burnet, Aristotle on Education, p. 135.

7. Cf. Laurie, Survey of Pre-Christian Education, pp. 287 e ss. Note-se que as
obras de Platão e de Aristóteles sobre educação, embora teoréticas,
representam, na essência, a prática educacional do seu tempo. No tocante
à educação preparatória, ambos parecem ter adotado por completo as
idéias gregas da época. V. Monroe, op. cit., pp. 132–33.
8. Cf. Davidson, Aristotle, p. 240, onde são citadas as autoridades gregas. A
referência omite a ginástica, o que é um erro óbvio — em tempo algum
essa disciplina esteve fora do currículo preparatório dos gregos.

9. Não se suponha que a instrução nesses vários campos, uma vez relegada à
condição de estudos preparatórios, fosse tão completa quanto no caso de
ser elevada a estudos avançados. O ensino superior com freqüência
impõe-se ao básico na escala intelectual, e assim como as faculdades hoje
determinam o currículo da escola secundária, também as escolas retóricas
do período helenístico, na medida em que se equiparavam às faculdades
modernas, determinavam o caráter do ensino preparatório. Daí que a
instrução nos diversos estudos liberais fossem pouco mais do que
elementar nesse período, e decerto não tenha superado a instrução
oferecida nas escolas medievais. Para referências completas a Fílon, v.
Davidson, op. cit., pp. 242–3.

10. Citado em Davidson, op. cit., p. 243.

11. Grasberger, Erziehung und Unterricht im klassischen Alterthum, vol. II,


pp. 237 e ss.

12. Ritschl, “De M. Varronis Disciplinarum libris”, em Opuscula III, pp. 352–
72. West (Alcuin, p. 7) aceita a conclusão de Ritschl, isto é, que esses
foram os temas dos nove tratados, e arrola ainda outras para sustentá-la.
Todas as autoridades concordam que Varrão escreveu sobre gramática,
retórica, dialética, música, geometria e arquitetura. Boissier (Étude sur la
vie et les ou rages de M. T. Varron, pp. 333 e ss.) não crê que Ritschl o
tenha provado quanto às outras três disciplinas, com o que Davidson (op.
cit.) concorda.

13. Cf. Laurie, op. cit., pp. 337–63.

14. Sêneca, epístolas 88–9, em Opera (Leipzig, 1882), vol. IV, pp. 38 e ss.

15. uintiliano, Instit., livro I, caps. 8–10, em Watson (trad.), vol. I, pp. 70–
80.
16. uintiliano, Instit., livro II, cap. 1, em Watson (trad.), vol. I, pp. 96–9.

17. Parker data esse livro decisivo em antes 330. V. Parker, English Historical
Review, vol. V, pp. 444–6.

18. Esse livro é uma mistura de prosa e verso, forma de literatura que se
expandiu com Varrão. V. Ebert, Allgemeine Geschichte der Literatur des
Mittelalters im Abendlande, 1ª ed., pp. 459 e ss.

19. V. Capela, De nuptiis Philologiae et Mercurii, ed. Eyssenhardt (1866), p.


332, onde o autor atribui a omissão de medicina e arquitetura ao fato de
essas disciplinas puramente materiais não terem lugar numa obra que
trata de interesses supramundanos. A relação entre as obras de Capela e de
Varrão é exaustivamente abordada por Parker (loc. cit., passim).

20. Para um tratamento completo do con ito entre ideais cristãos e pagãos, v.
Schmid, Geschichte der Erziehung, II, pp. 48–83; Boissier, La Fin du
paganisme, I, pp. 233 e ss.; O. Denk, Geschichte des gallo- ankischen
Unterrichts und Bildungrwesens, pp. 140–63.

21. Agostinho, Retractationes, I, cap. 6, (PL 32, col. 59); Confessiones, IV, cap.
16 (ibid., col. 704). Discussão completa da relação de Agostinho com o
currículo das sete artes liberais em Parker, loc. cit., pp. 427 e ss.

22. Agostinho, De doctrina christiana, II, cap. 40, PL 34. col. 63.

23. O seu parecer nal sobre a questão encontra-se em uma das suas últimas
obras, De doctrina christiana; nela se expressam as suas visões maduras
sobre a educação cristã. V. loc. cit., esp. II, cap. 18, 40–2.

24. V. Isidoro de Sevilha, Etymologiae lib. XX, I, 2; III, 1 (PL 81, cols. 73, 153).

25. Teodulfo, “Carmen de septem liberalibus artibus in quadam pictura


depictis”, em Duemmler (ed.), Poetae latini aevi carolini, pp. 544–7. Cf.
Ebert, op. cit., II, p. 77. Para a reprodução de uma típica ilustração
artística, v. Cubberley, Syllabus of Lectures on the History of Education.
O termo “liberal”, tal como aplicado às artes, era usado já nos dias de
Platão e Aristóteles para distinguir os estudos próprios ao homem livre,
que nem vulgarizam nem valorizam ocupações rentáveis (Polit., VII, 2).
Mais tarde, o programa preparatório veio a ser conhecido como έγκύκλια
παιδεία, enkyklia paideia (Grasberger, II, 235). Os romanos não se
utilizaram do termo sem antes adotar as idéias gregas sobre educação.
Sêneca empregou o termo “liberalia studia” (Epist. 88); Cassiodoro valeu-
se apenas do adjetivo; Isidoro de Sevilha abre o seu breve tratado sobre as
artes: “Disciplinae liberalium artium septem sunt” (Etymologiae, I, 2, PL
82).

CAPÍTULO II
1. V. Sandys, History of Classical Scholarship, pp. 6–10. A grande amplitude
atribuída ao termo é vista com clareza nas de nições dos gramáticos. A
gramática de Dionísio Trácio (ca. 166 a.C.), a mais antiga ainda existente,
e com ela todos os congêneres no curso dos treze séculos seguintes,
de nem a gramática assim: “Um conhecimento empírico dos usos da
linguagem tal como corrente entre poetas e prosadores. Divide-se em seis
partes: (1) a boa leitura, atenta à prosódia; (2) a exposição, conforme as
guras poéticas; (3) o reconhecimento de particularidades e alusões
dialéticas; (4) a descoberta das etimologias; (5) a boa interpretação das
analogias; e (6) a crítica das obras poéticas, que é a parte mais nobre da
gramática”. Cf. Davidson, Aristotle, p. 214.
Essa de nição foi adotada quase letra a letra pelos romanos. Varrão, um
dos primeiros gramáticos latinos, atribui à disciplina as seguintes funções:
“(1) emendatio, ou correção; (2) lectio, ou leitura; (3) enarratio, ou
exposição; e (4) judicium, ou crítica”. V. Wilmmans, “Varronis fragmenta”,
p. 208 — citado em Eckstein, “Lateinischer Unterricht”, em Schmid
(org.), Encyklopädie des gesammten Erziehungs und Unterrichtswesens, vol.
IV, pp. 210 e ss.
Não são menos abrangentes as de nições de Cícero e uintiliano. V.
Cícero, De oratore, I, 42, trad. Watson, p. 198; uintiliano, Institutes of
Oratory, I, 4, trad. Watson, vol. I, p. 29.
Diomedes, no século IV, dá à gramática a sua própria de nição: “Tota
autem grammatica consistit praecipue intellectu poetarum et scriptorum
et historiarum prompta expositione et in rect loquendi scribendique
ratione”. V. Keil (ed.), Grammatici latini, vol. I, p. 426.

2. Assim em Cassiodoro: “Grammatica est peritia pulchre loquendi ex


poetis illustribus orationibusque collecta” (De artibus et de disciplinis
liberalium literarum, PL 70, col. 1152). Isidoro de Sevilha, no século VI,
de ne a gramática como “scientia recte loquendi et origo et
fundamentum liberalium literarum” (Etymologiae libri XX, livro I, cap. 5,
PL 82, col. 81). No século IX, Rábano Mauro a rma: “Grammatica est
scientia interpretendi poetas atque historicos et recte scribendi
loquendique ratio” (De institutione clericorum, livro III, 18, PL 107, col. 395).
Fica claro que “gramática”, na Idade Média, era o mesmo que dizer, nos
nossos tempos, “língua e literatura”.

3. F. Paulsen, Geschichte des gelehrten Unterrichts, vol. I, pp. 40–48.

4. A “autobiogra a” de Valafrido Estrabão, tal como reproduzida em Karl


Schmidt, Geschichte der Paedagogik, vol. II, pp. 197–212, não constitui
um retrato autêntico da vida escolar do poeta nem é, como erroneamente
a rmado por Wattenbach (Deutschlands Geschichtsquellen im Mittelalter,
vol. VI, 1893, parte I, p. 279, nota 2) uma invenção ou falsi cação do
século XII. Trata-se, apenas, de uma Darstellung [representação]
imaginária composta pelo Pe. Martin Marty e publicada anonimamente
sob o título “Wie man vor tausend Jahren lehrte und lernte” como
suplemento a Jahresbericht über die Erziehungsanstalt des
Benedictinersti s Maria Einsiedelen, 1856–57. V. Günther, Geschichte des
mathematischen Unterrichts im deutschen Mittelalter, p. 63, nota 1; M.
Cantor, Vorlesungen zur Geschichte der Mathematik, vol. I, p. 792.

5. V. Specht, Geschichte des Unterrichtswesens in Deutschland, pp. 68–80,


nota. As evidências apresentadas por Specht procedem, em primeiro
lugar, do cotejo de referências incidentais encontradas nas vitae de
eminentes guras medievais.
6. Assim no Colloquium de Elfrico (cf. p. 47, acima), onde uma conversa é
conduzida sucessivamente por um monge, um camponês, um caçador, um
pescador, um cozinheiro etc., cada um nomeado, ao seu turno, os objetos
do seu uso diário.

7. A fábula e o provérbio da Idade Média tratavam de eventos de caráter


medieval: a história do lobo, clássica, tornava-se a história do lobo, do
pastor e do monge. Para exemplos desse tipo de adaptação, v. acima, pp.
25, 26 e ss.

8. Essa classi cação é apenas nossa; nada no texto sugere tal divisão. A
quantidade relativamente pequena de elementos didáticos puramente
religiosos explica a suposição de que o autor fosse um pagão, embora nada
no texto justi que a rmá-lo. Nossa análise baseia-se na edição bilíngüe,
inglês-latim, publicada em Londres no ano de 1663 — praticamente
idêntica às quatro versões editadas por Zarncke e publicadas em Berichte
über die Verhandlungen der Königlichen Sächsischen Gesellscha der
Wissenscha en, philologisch-historische Classe, vol. XV (duas versões, pp.
23–78), vol. XVII (pp. 54–103) e XXII (pp. 181–92). A quarta versão
procede do famoso manuscrito de Catão mantido na Cambridge
University. Uma quinta versão consta em Peiper, “Beiträge zur
lateinischen Cato-Literatur”, Zeitschri für deutsche Philologie, vol. V, pp.
165–86. Para relações de versões em inglês, v. Hazlitt, “Contributions
toward a History of Earlier Education in Great Britain”, em Antiquary,
vol. XXXV, pp. 205 e ss.; vol. XXXVI, pp. 138 e ss. Para notas bibliográ cas
completas acerca de Catão, v. Teuffel (ed. Schwabe), Geschichte der
römischen Literatur, II, pp. 1002–3.

9. B. Pez (ed.), esaurus Anecdotorum Novissimus, t. 3, III, cols. 483–536.

10. Texto e introdução de J. Huemer (ed.), Romanische Forschungen, vol. II,


pp. 211–246. Para uma fonte crítica sobre Arnulfo, v. ibid., pp. 383–90;
vol. III, pp. 461 e ss. Não se suponha que houvesse algum desejo da parte
da Igreja por suprimir os dísticos supostamente pagãos; os livros que os
suplantaram estavam, de fato, mais atualizados. O menino que estudasse
num monastério, sob in uências cristãs, certamente estaria mais
interessado por uma cartilha baseada nas Escrituras do que por outra
baseada nos Disticha.

11. Para o texto e a crítica dos Sche larer proverbia, v. Anzeiger fur Kunde der
Deutschen Vorzeit, vol. XX, pp. 218–20. Dos Proverbia Heinrici, quatro
manuscritos foram encontrados — v. Voigt (ed.), Fecundia ratis, LXIII–V,
nota 4.

12. As últimas e mais completas investigações sobre o tema constam em


Hervieux, Les Fabulistes latins, 5 vols, que inclui textos e críticas.

13. Texto das Fábulas de Esopo, acompanhado de uma introdução histórica,


em Du Méril, Poésies inédites du Moyen Âge, pp. 169–559; 262–76.

14. V. Hervieux, op. cit., vol. I, pp. 78–259; 334–47; 436–445; 461–602;
608–83. O cálculo não inclui as traduções para o vernáculo, cujo exame
não é relevante para o nosso caso. Omitiu-se, da mesma forma, uma
análise das edições impressas, dado que o assunto concerne mais
propriamente a última fase humanismo. Os temas das fábulas de Aviano,
sob o tratamento exaustivo de Hervieux, revelam-se ainda outra vasta
fonte de material para o ensino do latim elementar. V. Hervieux, op. cit.,
vol. III, passim.

15. Também os “livros de adivinhas”, produto de origem britânica que


rapidamente se espalhou por toda a Europa, dizem-nos muito sobre os
métodos do ensino introdutório do latim. V. Ebert, op. cit., vol. I, pp. 628
e ss. Cf. Forschungen zur deutschen Geschichte, vol. XXVI, pp. 599–632. As
tentativas mais bem-sucedidas em produzir uma cartilha consonante ao
espírito da época são representadas por duas coleções, ambas escritas por
monges que, como professores, escreveram livros que serviram de cartilha
tanto para eles mesmos como para outros docentes. Uma delas é Fabulae
et parabolae, do cisterciense Odão de Cirrington (ca. 1200). Tal como as
obras de Fedro e Aviano, essa coleção foi muito utilizada na sua forma
original e sob formas alternativas. As fábulas são cheias de alusões a
eventos e costumes daquele tempo. Sobrevivem cerca de 75 dessas
historietas; evidências mostram que o livro foi concebido para o uso
escolar. Cf. Voigt, em Quellen u. Forschungen zur Sprach. und
Kulturgeschichte der germanischen Völker, vol. XV, pp. 47 e ss.; Anzeiger
für deutsches Alterthum und deutsche Literatur, vol. V, pp. 99–125. Texto
completo em Hervieux, op. cit., vol. IV, pp. 173–248. A outra coleção é a
editada por Ernest Voigt, v. “Kleine lateiniasche Denkmäler der
iersage”, em Quellen und Forschungen zur Sprach. und Kulturgeschichte
der germanischen Völker, vol. XXV, pp. 16 e ss.

16. Fecundia ratis, ed. E. Voigt, pp. 12–39.

17. Entre os autores referidos nessa obra, Voigt identi cou os seguintes
nomes:
1. Prosadores latinos — Varrão, Cícero, Cornifício, Salústio, Sêneca,
Cúrcio, Capela, Boécio, Isiodoro, gramáticos.
2. Poetas latinos — Plauto, Terêncio, Lucílio, Públio, Virgílio, Horácio,
Ovídio, Fedro, Pérsio, Lucano, Juvenal, Aviano, entre outros.
3. Escrituras — Gênesis, Êxodo, Deuteromônio, Reis, Esther, Jó,
Salmos, Provérbios, Eclesiastes, profetas, Atos dos Apóstolos,
epístolas.
4. Teólogos — Lactâncio, Ambrósio, Jerônimo, Crisóstomo, Agostinho,
Sedúlio, Cassiano, Próspero, Pedro, Gregório Magno, Isidoro, Beda,
Rábano Mauro, Ratério.
Cf. Voigt, op. cit., pp. 54–63.

CAPÍTULO III
1. Sandys, op. cit., cap. 32, pp. 594 e ss. A diferença entre o estudo dos
clássicos na Idade Média e no Renascimento seria apenas a diferença entre
os ns pretendidos.
2. Cf. Comparetti, Virgil in the Middle Ages, introdução; H. O. Talyor,
Classical Heritage of the Middle Ages, p. 363.

3. V. Hallam, Introduction to Literature of the Middle Ages, vol. I, cap. 1;


Robertson, History of the Reign of the Emperor Charles V, pp. 14, 15, 514–
16. Cf. Compayré, History of Pedagogy, p. 68; Laurie, Rise and Early
Constitution of the Uni ersities, p 73. Maitland discute essas tradicionais
contendas protestantes em Dark Ages, esp. pp. 9–52, 122–41, 171–87.

4. V. o capítulo intitulado “ e Primary Schools in the Middle Ages” em


Educational Essays, do Irmão Azarias. O entusiasmo da perspectiva
apresentada pelo autor fundamenta-se em investigações recentes sobre as
condições educacionais numa série de distritos franceses durante o
período pré-revolucionário. A falácia dos argumentos, a meu ver, reside
no fato de a Idade Média ser tratada como um só período — fatos
verdadeiros no que toca à baixa Idade Média são atribuídos ao período
com um todo. Pelo menos até o século XV, educação primária não era
senão o preparo para o estudo avançado das artes liberais, algo muito
distante do que o termo quer dizer nos nossos dias, a saber, a educação das
massas. A polêmica em torno desse tema atinge o cúmulo do absurdo
quando a mesma evidência é tomada por ambos os partidos como prova
cabal dos seus respectivos pontos. Assim, o fato de Ratério de Verona ter-
se recusado a admitir a ordenação daqueles que ou não freqüentaram uma
escola episcopal ou não foram tutelados por algum professor é citado por
Oznam (“Des Écoles et de l’instruction publique en Italie aux temps
barbares”, p. 39) como prova de que a instrução preliminar fosse tida
como essencial aos sacerdotes desde o século IX, ao passo que Güderman
(Geschichte des Erziehungswesens und der Kultur der Juden in Italien
während des Mittelalters, p. 20) considera-o um claro indício da
ignorância do clero àquela época.

5. Para bibliogra a a respeito dos vários autores clássicos e do seu emprego


na Idade Média, v. Taylor, op. cit., pp. 363–65. Sandys (op. cit., pp. 606–
38) oferece uma síntese do tema, que, embora breve e imprecisa, traz
algumas referências em detalhe. Sobre a medida em que vários desses
autores se zeram presentes nos estudos medievais, v. Manitius, “Beiträge
zur Geschichte römischer Dichter im Mittelalter”, em Philologus:
Zeitschri für das klassische Alterthum, vols. 47–52, 56, Suplemento (vol.
VII). Sobre os manuscritos ainda existentes, v. Teuffel (ed. Schwabe),
Geschichte der römischen Literatur.

6. V. acima, pp. 40 e ss.

7. O exaustivo trabalho de Ebert Allgemeine Geschichte der Literatur des


Mittelalters im Abendlande está repleto de evidências desse fato. Daí
encontrarmos, nos tempos de Gregório Magno e de Gregório de Tours, as
excelentes produções de Arátor, Fortunato e Adelmo. V. Ebert, op. cit.,
vol. I, pp. 490–616; vol. II, pp. 144 e ss. Para uma análise compreensiva da
produção literária da Idade Média, v. Guizot, History of Civilization, vol.
II, pp. 317–78.

8. João de Salisbury, Metalogicon, I, cap. 24; II, caps. 9, 10, 17; Polycraticus,
VII, cap. 12 (PL 199, cols. 662–3, 853–6, 866–69, 874–6). Cf. Poole,
Illustrations of the History of Medieval ought, pp. 109–24, 200–8.
Mesmo no tocante às condições educacionais do seu tempo, os escritos de
João de Salisbury não são tão severos quanto geralmente se tem crido. V.
Poole, “Excursus on the Interpretation of a Place in John of Salisbury’s
Metalogicus”, op. cit., apêndice 7, pp. 359 e ss.

9. V. Bursian, Geschichte der classischen Philologie in Deutschland, vol. I, pp.


9–76; Oznam, “Des Écoles et de l’instruction publique en Italie aux
temps barbares”, em Documents inédits pour servir a l’histoire litéraire de
l’Italie.

10. Dispondo numa espécie de genealogia todo o vasto material sobre a


história das escolas mais famosas, como feito por Wattenbach em Das
Schri wesen im Mittelalter (vol. I, pp. 241–487), pude rastrear a
in uência do renascimento carolíngio até os séculos XII e XIII — dois
séculos mais tarde que a data prevista pelas investigações de West (Alcuin
and the Rise of the Christian Schools, pp. 164–79) e Gaskoin (Alcuin, His
Life and His Work, pp. 201 e ss.). As evidências mostram a difusão e a
persistência das tradições de São Galo, Reichenau, Corvey e de outras
muitas escolas por toda a Europa. Vale dizer que não mais se sustenta a
visão geralmente aceita sobre o declínio da educação sob Luiz, o Piedoso.
Cf. Wattenbach, op. cit., pp. 112 e ss.

11. Dentre os típicos estudos sobre esse tema, podem-se referir: M. Fayet, Les
Écoles de la Bourgogne sons l’Ancien Régime; C. de Beaurepaire de
Robellard, Recherches sur l’instruction publique dans le Diocese de Rouen
avant 1789; C. Stallaret, “De l’Instruction publique au Moyen Âge (VIIme
au XVIme siécle)”, em Memoires couronnées de l’Académie Royale de
Belgique, vol. 23 — sobre as condições nas dioceses de Utrecht, Cambrai
e Tournay —; Sack, Geschichte des Schulwesens zu Braunschweig; K. F.
Krabble, Geschichtliche Nachrichten über die höheren Lehranstalten in
Munster; Meyer, Geschichte des Hamburgischen Schul-und-
Unterrichtswesens des Mittelalters; C. Engel, Das Schulwesen Strassburgs
bis 1538; D. A. Fechter, Geschichte des Schulwesens im Basel; F.
Nettesheim, Geschichte des Schulwesens im alten Herzogthum Geldern; J.
E. Struve, Geschichte des Hochsti s Osnabrück; H. Holstein, “Geschichte
der ehemaligen Schule zu Kloster Berge”, em Neue Jahrbücher für
Philologie und Paedagogik, vols. 132–33; Baring, Beiträge zur Han. Kirch,
u. Schul. Geschichte.

12. Keil (ed.), Grammatici latini, vol. II, prefácio, p. 13. Sobre as bibliotecas
dos mosteiros, v. Montalembert, e Monks of the West, vol. V, pp. 136–
56.

13. Essas listas são mencionadas no artigo de F. A. Eckstein intitulado


“Lateinischer Unterricht”, em Schmid (org.), Encyklopädie des gesammten
Erziehungs und Unterrichtswesens, vol. IV, pp. 231 e ss.; T. Gottlieb, Ueber
mittelalterliche Bibliotheken, pp. 17–273 passim. Cf. Wattenbach, Das
Schri wesen im Mittelalter, pp. 481–500; Putnam, Books and their
Makers during the Middle Ages, vol. I, pp. 133 e ss.

14. V. resumos das inúmeras vitae em Ebert, op. cit.

15. Esse tema tem recebido a atenção dos defensores da Idade Média desde os
tempos de Mabillon, cujo Traité des études monastiques (1691) expôs, pela
primeira vez, a grande amplitude dos estudos seculares entre os
beneditinos. V. Hurter, Tableau des institutions et des moeurs de l’Église au
Moyen Âge, vol. III, cap. 35–8; Ziegelbauer, Historia rei literariae Ordinis
S. Benedicti, esp. pt. 1, caps. 1–2. Encontra-se uma admirável síntese em
Montalembert, e Monks of the West, vol. V, pp. 102–169 (uma lista de
escolas famosas, longa, porém incompleta, consta nas pp. 108–9, 132–4).
Specht (Geschichte des Unterrichtswesens in Deutschland, pp. 269–394)
trata em detalhe da obra educacional das principais escolas germânicas.

16. V. João de Salisbury, “De usu legendi et praelegendi et consuetudine


Bernardi Carnotensis”, em Metalogicus, I, cap. 24, PL 199, cols. 853–56.
Cf. acima, p. 124, nota 5. Cf. Poole, capítulos sobre a escola de Chartres e
sobre João de Salisbury, op. cit., pp. 109–35; 210–25. Para um breve e
excelente estudo, baseado em fontes primárias, acerca do magistério de
Bernardo, v. a introdução de Barach à edição de De mundi uni ersitate.

17. “ eodul i Carmen de Libris quos legere solebam”, em Duemmler (ed.),


Poetae latini medii aevi, pp. 543 e ss. Sobre o seu interesse pelos clássicos,
e para uma apreciação do seu caráter, v. Ebert, op. cit., vol. II, pp. 70 e ss.

18. Walter de Speyer, Acta Santi Christophori, I, vv. 96–109, em Pez (ed.),
esaurus Anecdotorum Novissimus, t. 2, III, col. 39.

19. “Cum ad rhetoricam suos provehere vellet, id sibi suspectum erat, quod
sine locutionum modis, qui in poetis discendi sunt ad oratoriam artem
perveniri non queat. Poetas igitur adhibuit, quibus assuescendos
arbitrabatur. Legit itaque ac docuit, Maronem et Statium Terentiumque
poetas; Juvenalem quoque ac Persium Horatiumque satiricos, Lucanum
etiam historiographum. uibus assuefactos locutionumque modis
compositos ad rhetoricam transduxit”. Richer, Hist. libri IV, livro III, cap.
47 (Monumenta Germaniae Historica, Scriptores, t. III, p. 617).

20. Otlo de Saint-Emmeran, Liber metr. de Doctrina Spirit, em Pez (ed.),


es. anecdot. III, 2, p. 442.

21. “Registrum multorum auctorum”, em Sitzungsberichte der Philol. Hist.


Class. Kaiser. Akad. der Wiss. Wien, vol. 116, pp. 145–90. Esses 1030
versos, na edição crítica de Humer, constituem uma fonte muito
signi cativa no que diz respeito à amplitude do estudo da literatura
clássica na Idade Média.

22. V. “Laborinthus, Tertius Tractatus”, em Leyser, Historia poetarum et


poematum Medii Aevi, pp. 825 e ss. Cf. Saintsbury, History of Criticism, I,
pp. 408 e ss.

23. Hauréau, Notices et extraits., vol. XXVII, II, pp. 1–86; cf. Sandys, op. cit., p.
528, nota 5.

24. Honório de Autun, Libellus de animae exsilio et patria, alias De artibus,


PL 172, col. 1243.

25. Nicolau de Bibera, Carmen satiricum, vv. 35–45 (edição crítica de Fisher,
em Geschichtsquellen der Provinz Sachsen, vol. I, p. 38). Para mais
evidências desse e, v. Gottlieb, Ueber mittelalterliche Bibliotheken, pp.
439–49.

26. Comparetti, pp. 119–34. Para textos e a crítica das glosas virgilianas em
alemão médio, v. Steinmeyer, “Die deutschen Virgilglossen”, em Zeit. f.
deut. Alterthum, vol. III, pp. 1–96. Algumas glosas dos séculos VIII e IX, a
Virgílio e a Juvenal, constam no Corpus Glossariorum Latinorum, IV, pp.
427–70; 5, pp. 652 e ss. Steinmeyer & Siever, Althochdeutsche Glossen,
vols. II e III.

27. V. Henri d’Andeli, “La Bataille des Sept Arts”, em Notices et Extraits, vol.
V, II, pp. 503–10. Esse famoso poema é geralmente considerado um sinal
da competição, sucedida na França do século XIII, para suplantar os
clássicos pela lógica escolástica. Os protagonistas desse embate são Paris,
representante da “nova” lógica, e Orleans, representante dos “antigos”
estudos clássicos.

28. Ebert, op. cit., vol. I, pp. 115 e ss.; Meier, Die sieben eien Künste im M.
A., p. 20.
29. Cf. Ebert, op. cit., vol. I, pp. 373 e ss. Huemer rastreou até Remígio de
Auxerre a autoria de um glossário sobre Sedúlio. V. Sitz. der Konigl. Akad.
d. Wiss. Philol. Hist. Class. vol. 116, pp. 505–551. Esse fato pode ser
considerado um elo da nossa cadeia de argumentação. Mesmo quando o
entusiasmo do renascimento carolíngio houvera já passado, vemos que
então subsistia o interesse puramente literário num poeta cristão, cuja
distinção residia no fato de ele abordar os temas do Evangelho conforme a
mais estrita versi cação da clássica.

30. Ebert, op. cit., vol. II, 1ª ed., pp. 251–88, esp. 280–88; Glover, Life and
Letters in the Fourth Century, pp. 249–277. Textos: Psychomachia, J.
Bergmann (ed.); Cathemerinon, T. Obbarius (ed.), Tübingen: 1845.
Tradução metri cada por F. G. Smith (Londres & Nova York, 1898).

31. As seguintes linhas de Partitiones duodecim versuum, de Prisciano, obra


concebida para o ensino da gramática a partir de Virgílio, dá-nos uma boa
idéia do método empregado. O autor toma a primeira linha de cada livro
da Eneida e pede ao aluno que lha explique, analisando palavra por
palavra. Assim, passando pelas 12 primeiras linhas dos 12 livros, ele cobre
a maior parte da gramática e do metro: “Arma quae pars orationis est?
Nomen. uale? Appellativum. Cujus est speciei? Generalis. Cujus
generis? Neutri. Cur Neutri? uia omnia nomina quae in plurali numero
in a desinuht, sine dubio neutri sunt generis. Cur singulare ejus in usu
non est? uia multas varias res hoc nomen signi cat. Cujus est gurae?
Simplicis. Fac ab eo compositum. Armiger, armipotens, semermis,
inermis et inermus. Cujus est casus in hoc loco? Accusativi”. Em Keil ed.,
Gramm. Lat., vol. III, pp. 459–528.

32. Texto de ilo e Hagen, Leipzig, 1878.

33. O tópico é tratado exaustivamente em Comparetti, op. cit., pp. 50–119.


Desses quatro métodos para a interpretação de Virgílio, o primeiro foi
realmente usado nas escolas para o estudo da gramática. O exame dos
outros comentários mostra conclusivamente que eles eram incompatíveis
com o uso escolar, servindo apenas a estudantes já maduros. Sustentam
essa a rmação o grande número de glossários em comentários da primeira
classe. Se eles todos, como os vocabulários medievais, revelam uma
curiosa ignorância da etimologia, não pode haver dúvidas quanto à sua
utilidade em sala de aula — v. Comparetti, op. cit., p. 129. Um
interessante comentário anônimo sobre Virgílio, encontrado nos
manuscritos de Verona, consta em Mai (ed.), Interpretes veteres Virgilii
Maronis, em Classici Auctores e Vaticanis Codicibus, t. VII. Cf. ibid, pp. 8–
9.

34. Specht encontrou alguns manuscritos do gênero, os quais remontam até o


século XII (op. cit., p. 103). Para mais sobre Virgílio e outros poetas, v.
Comparetti, op. cit., pp. 135–55.

35. A grande obra de Donato, Ars grammatica major, foi usada para esse m.
A obra cita Virgílio e outros e outros poetas. V. Keil (ed.), vol. IV, pp.
367–402.

36. Metalogicus, livro I, caps. 9, 14, PL 199, cols. 838, 853 e ss. Para provas da
identidade entre Bernardo de Chartres e Bernardo Silvestre, v. Poole, op.
cit., p. 114, nota 9.

37. Specht colheu uma série de referências à prática do dictamen nas vitae de
grandes personagens (op. cit., p. 112).

38. Os três casos mais notáveis são: (1) Visio Wettini, de Valafrido Estrabão,
com seus 900 hexâmetros, escrito no século VIII — em MGH Poet. lat M.
A., vol. II, pp. 303 e ss., e PL 114. (2) O célebre Waltherius de Ekkehardt I
(ca. 973), que, apesar de escrito em alemão, era também um exercício de
dictamen modelado em Virgílio e em Prudêncio — v. Ebert, op. cit., vol.
III, pp. 265 e ss. (3) Acta St. Christophori, de Walther de Speyer, composta
ao nal dos seus estudos em gramática, ele então com 18 anos, durante
cerca de dois meses. A primeira parte contém o “Liber de studio poetae”,
citado nesta monogra a — Pez (ed.), op. cit., vol. III, II, cols. 30–94.

39. Sobre Floretus, v. Hist. Lit. de la France, vol. VIII, pp. 92–4; cf. Sandys, op.
cit., pp. 643–50; Norden, Antike Kunstprosa, vol. II, pp. 688–731. Sobre
os manuscritos dessas obras, v. Hauréau, Notices et extraites, vol. 27, II, p.
15–20, 25–27.
40. Hallam, op. cit., p. 7.

CAPÍTULO IV
1. Vem ao caso estimar o espaço ocupado por cada disciplina nas
enciclopédias:

Gramática Retórica Dialética Aritmética Geometria Astronomia Música


Capela 11 14 11 11 15 9 11
Cassiodoro 25 52 18 2 2 15 2
Boécio 40 30 67
Isidoro 50 14 14 2 1 3 12
Alcuíno 54 26 25 23
Rábano Mauro 55 60

2. Sandys, op. cit., pp. 638 e ss.

3. Fr. Haase, De medii aevi studiis philologicis, citado em Paulsen, Geschichte


des gelehrten Unterrichts, p. 46.

4. Pouco se sabe a seu respeito além do fato de ter sido um professor de São
Jerônimo. Sobre os relatos fantásticos da sua vida, v. Meier, Die sieben
eien Künste im M. A., p. 12. A Ars grammatica minor é assim chamada a
título de diferenciação da Ars grammatica major, de Donato, que é um
tratado bem mais elaborado.

5. Cf. Stolz, Lateinische Grammatik, p. 4; Teuffel & Schwabe, Geschichte der


römischen Literatur vol. II, p. 1035. Texto em Keil (ed.), Grammatici
latini, vol. IV, pp. 355–67. Dada a grande importância da sua obra para a
educação medieval, apresentamos a seguir uma análise do conteúdo do
livro:

1. O nome
a. De nição
b. Atributos
i. ualidade: comum, próprio, coletivo, apelativo
ii. Comparação: positivo, comparativo, superlativo
iii. Gênero
iv. Número: singular e plural
v. Figura
vi. Caso: nominativo, genitivo, dativo, acusativo, vocativo
2. Pronome
a. De nição
b. Atributos
i. ualidade: de nido, inde nido
ii. Gênero
iii. Número
iv. Figura: simples, composta
v. Pessoa
vi. Caso — ilustrações (todos os pronomes declinados)
3. Verbo
a. De nição
b. Atributos
i. ualidade: modos (indicativo, imperativo, optativo, conjuntivo,
in nitivo, impessoal) e formas (defectivo, freqüentativo,
incoativo)
c. Conjugações
d. Gênero: ativo, passivo, neutro
e. Número
f. Figura: simples, composta
g. Tempo: presente, passado e futuro
4. Advérbio
a. De nição
b. Relação: lugar, tempo, número, negação, a rmação,
denominação, opção
c. Comparação
d. Figura
5. Particípio
a. De nição
b. Gênero — ilustrações
c. Caso — ilustrações
d. Tempo — ilustrações
e. Signi cado
f. Número
g. Figura — ilustrações (todas as formas de lego)
6. Conjunção
a. De nição
b. Atributos: copulativa, disjuntiva, expletiva, causal
c. Figura: simples, composta
d. Ordem: prepositiva, subjuntiva, comum — ilustrações
7. Preposições
a. Atributos
b. Casos: acusativo e ablativo — lista de preposições, caso a caso
8. Interjeição
a. De nição
b. Atributos: signi cado (júbilo, espanto, medo etc.)

Eis todo o conteúdo do livro. O seu caráter e forma elementares


tornaram-no um bom guia para professores, que o podiam comentar e
ampliar como quisessem. Originalmente, porém, fora escrito para
meninos cuja língua materna era o próprio latim, de maneira que foi
necessário adaptá-lo às necessidades das nações germânicas. Assim,
compôs-se um grande número de textos sobre gramática a partir dele.

6. Pouco se sabe da vida do autor. A sua fama foi grande; chamaram-no


“communis hominis praeceptor”, “latini eloquentiae decus”. Cf. Keil (ed.),
op. cit., vol. II, p. 12. Texto em Keil (ed.), vols. II e III. F. Stolz, op. cit., p. 4,
revela um trabalho elaborado, mas nada original.

7. As numerosas citações devem tê-lo tornado uma ótima antologia. Até que
ponto as eruditas citações em que abundavam os medievais eram copiadas
de Prisciano, e não dos originais?

8. Keil (ed.), op. cit., vol. II, prefácio, p. 10.

9. A gramática de Isidoro de Sevilha não passa de uma compilação de


Donato e Prisciano; nada apresenta de característico. Contudo, em razão
de integrar uma enciclopédia, é possível que tenha sido usada em alguma
medida. Não existe cópia em separado.

10. Cf. Teuffel & Schwabe, op. cit., vol. II, pp. 729 e ss.; Haase, Vorlesungen
über ateinische Sprachwissenscha , p. 11; Keil (ed.), vol. IV, pp. 3–192.

11. Teuffel & Schwabe, ibid.; Keil (ed.), vol. I, p. 17. Texto em Keil (ed.), vol.
I, pp. 7 e ss.

12. Teuffel & Schwabe, op. cit., vol II, pp. 1057 e ss; Specht, op. cit., p. 91.
Texto em Keil, vol. I, pp. 300 e ss.

13. Texto em Keil (ed.), vol. V, pp. 410–41. Cf. Specht, p. 90; “Versus de
Sanctis Eboracensis Ecclesiae”, vv. 1535–1561, citado em West, Alcuin, p.
35. Sobre glosas, v. Steinmeyer & Siever, Althochdeutsche Glossen, vol. II,
pp. 363–5.

14. Specht, p. 91; Teuffel & Schwabe, op. cit., vol. II, pp. 1033 e ss; Sandys, p.
217. Texto em Keil (ed.), vol. VI, pp. 3–184.

15. Cf. Sandys, p. 235; texto em Keil (ed.), vol. V, pp. 329 e ss.

16. Cf. Haase, op. cit., p. 11; Sandys, pp. 224 e ss. Texto (trechos) em Keil
(ed.), pp. 599–655.

17. Sandys, p. 218. Texto em Keil, vol. IV, pp. 405–448. Cf. Sandys, p. 462;
texto em Keil (ed.), vol. IV, pp. 405–48.

18. Teuffel & Schwabe, op. cit., p. 1245; West, Alcuin, p. 35; Steinmeyer &
Siever, op. cit., vol. II, p. 161. Texto em Keil (ed.) vol. V, pp. 442–89.

19. Specht, p. 91; texto em Keil (ed.), vol. V, pp. 490 e ss.

20. Keil (ed.), vol. VII, p. 214.

21. Cf. Specht, p. 91; texto em Keil (ed.), vol. V, pp. 525 e ss.

22. Cf. Sandys, p. 453; Ebert, vol. I, pp. 653–59; Bursian, Geschichte der
classischen Philologie in Deutschland, vol. I, pp. 14 e ss. Texto em Mai
(ed.), Classic Auctores e Vat. Cod., t. 7, pp. 475–598.

23. Meier, p. 14; texto em PL 101, cols. 848–901.

24. PL 111, cols. 613–678.

25. Sobre os manuscritos ainda restantes e seus fragmentos, v. urot,


“Notices et extraits de divers manuscripts latins pour servir a l’histoire des
doctrines grammaticales au Moyen Âge”, em Notices et extraits, t. 23, II,
pp. 4, 65, 68, 81. Cf. Meier, op. cit., p. 14; Hist. lit. de la France, t. 4, pp.
445 e ss.
26. Remígio foi o autor de comentários sobre Donato, Prisciano e Capela (De
nuptiis). Sua obra sobre Donato foi impressa em Basiléia em 1499, sob o
título Remigii fundamentum scholarum. Cf. Huemer, Sitz. der Konigl.
Akad. d. Wiss. Philol. Hist. Class. Wien, vol. 96, p. 538. Para uma
descrição das suas obras gramaticais, v. urot, op. cit., p. 94, nota 2;
trechos, ibid., passim.

27. Texto e introdução de Reichling, Monumenta Germaniae Paedogogica,


XII. urot tratou exaustivamente de Doctrinales em De Alexandri de
Villa Dei Doctrinale (1850) e Notices et extraits, vol. 22, II. Mais
recentemente, Julius Neudeker apresentou novo material sobre o tema em
Das Doctrinale (1885). No entanto, a obra de Reichling superou todos os
estudos anteriores.

28. Bibliogra a crítica em Reichling, op. cit., 121–309.

29. V. Haase, Vorlesungen, pp. 13, 15.

30. Reichling, op. cit., pp. 7–10.

31. Os versos abaixo, sobre a primeira declinação, dão-nos uma boa idéia do
caráter do livro como um todo:

Rectis as es a dat declinatio prima,


Atque per am propria quaedam ponuntur Hebraea
Dans ae diphthongon genitivis atque dativis.
Am servat quartus; tamen en aut an reperimus,
Cum rectus t in es vel in as, vel cum dat a Graecus.
Rectus in a Graeci facit an quarto breviari.
uintus in a dabitur, post es tamen e reperitur.
A sextus, tamen es quandoque per e dare debes
Am recti repetes quinto, sextum sociando.
Primo plurali decet ae quintoque locari.
Atque secundum habet arum, nisi syncopa at.
Tertius aut sextus habet is, tamen excipiemus;
uando mas t in us, in a femineum sine neutro,
Femineis abus sociabitur ut dominabus
Sexum discernens; istis animas auperaddes.
Accusativis pluralibus as sociabis
Versibus his nota t declinatio prima.

Texto em Reichling, op cit., pp. 8–9. Fica evidente que comentários ao


Doctrinale não eram de todo desnecessários. Na verdade, como declarado
pelo autor já no seu prólogo, o professor tinha que explicar o texto e
ilustrá-lo em “língua leiga”. Desses comentários há muitos. Reichling
aborda alguns deles em op. cit., 60–71.

32. Reichling, “Der Kampf um das Doctrinale”, op. cit., 83–110.

33. Título completo: Graecismus sive liber carmine hexametro scripius de


figuris deque octo partibus orationibus. Texto em J. Wrobel (ed.), Corpus
Grammaticorum Medii Aevi, vol. I. Reichling (op. cit., 129–143) foi
quem datou Graecismus. Cf. Babler, Beiträge zur einer Geschichie der Lat.
Grammat. in M. A., pp. 95 e ss; Schmid, Geschichte der Erz., vol. II, pp.
298 e ss.

34. Texto em Polycarp Leyser, pp. 796–854; parcialmente em G. Mari,


“Trattati medievali di ritmica latina”, Memorie del Reale Institute
Lombardo, t. 20, pp. 453 e ss. Crítica de M. urot em Comptes rendus,
Academic des Inscriptions et Belles-Lettres, 2ª ed., t. 6, pp. 239–69.

35. Meier, op. cit., p. 15. O comentário faz parte do Speculum doctrinale de
Vicente de Beauvais. Cf. urot, Notices et extraits, vol. 22, II, p. 2.

36. Texto em G. Mari (ed.), “Trattati medievali di ritmica latina”, em Memorie


del Reale Instituto Lombardo, t. 20., pp. 383 e ss. Cf. Reichling, op. cit.,
pp. 54–55.

37. Encontra-se na biblioteca da Universidade de Cambridge. Cf. Sandys, p.


641.

38. Meier, p. 15.


39. Haase, Vorlesungen, p. 14. Trechos do dicionário em Le Catholicon de
Lille, A. Scheler (ed.), em Memoires Couronées de L’Académie Royale de
Belgique, t. 37.

40. Texto na edição C. Fierville, 1886. Cf. Sandys, p. 584.

41. Schmid, op. cit., vol. II, p. 439. A obra, muito usada, foi reimpressa
diversas vezes por Gutenberg. Cf. Hallam, Lit. of M. A., 4ª ed., vol. I, p.
80.

42. Meier, p. 15. Ludolf é o autor da Ethica Ludolfi, uma adaptação dos
Disticha Catonis. Cf. Peiper, op. cit. (citado acima, p. 24, nota 8). Sobre
algumas outras gramáticas do período, v. urot, op. cit., em Notices et
extraits, vol. 22, II, pp. 1–58; trechos, passim.

43. A lexicogra a medieval tem sido objeto de diferentes pesquisas, mas


todas elas são mais ou menos fragmentárias. A mais recente e mais
rigorosa monogra a a esse respeito é de F. Heerdegen “Lateinische
Lexicographie”, em I. Müller (ed.), Handbuch der klassischen
Alterthumswissenscha , vol. 2, II, pp. 497 e ss. As numerosas coleções de
dicionários medievais terão menção no próximo capítulo.

44. O famoso codex dos glossários de São Galo contém pelo menos 2,5 mil
palavras em ordem alfabética. V. Corpus Glossariorum Latinorum, IV, pp.
201–98. Sobre os manuscritos preservados, v. op. cit., prefácio, pp. 15 e ss.
Cf. Sandys, op. cit., p. 584, nota.

45. Steinmeyer & Sievers, Althochdeutsche Glossen, 3 vols: vol. I, glosas


bíblicas; vol. II, Padres da Igreja e gramáticos; vol. III, informações
variadas. Embora a obra de Steinmeyer e Sievers cubra apenas território
germânico, as glosas nela contidas são tão representativas do caráter geral
desses livros que merece, com efeito, uma explicação mais cuidadosa. A
obra traz quatro diferentes “glosas” a Capela, usadas em São Galo;
algumas a Donato; pelo menos 10 “glosas” extensas a Prisciano; algumas a
Cícero; cinco a Horácio; duas a Ovídio; nove a Salústio; e quinze a
Virgílio. O número de “glosas” a autores cristãos não é excepcionalmente
grande na comparação com o número de autores pagãos — à parte o caso
de Prudêncio, que, como vimos, parece ter gozado de mais popularidade
que a média. Assim, a Carmen paschale de Sedúlio é representada por
quatorze “glosas”, e Juvenco por oito, ao passo que Prudêncio tem nada
menos que 47, cobrindo cerca de 200 páginas (quarto). Há ainda por
volta de 40 sobre os nomes de bestas, aves, peixes etc., o que mostra, mais
uma vez, a amplitude do emprego da fábula. De igual signi cância são as
Saxon Riddles, de Adelmo, e “Eight Principal Vices”. V. op. cit., passim.
Entre outras “glosas” interessantes, podemos citar uma sobre De
temporum ratione, do Venerável Beda, cf. p. 80.

46. Etymologiae XX, livro X, PL 82, cols. 367–98. Outras partes da obra
incluem material que se aproxima de um glossário.

47. A obra de Paulo Diácono foi publicada três vezes, sendo a última em
ewrewk de Poner, Sexti Pompei festi de verborum significatu cum Pauli
epitome.

48. Meier, Die sieben eien Künste im M. A., p. 16.

49. Título completo: “Colloquium ad pueros linguae Latinae locutione


exercendos”. Texto em orpe (ed.), Analecta Anglo-Saxonica, pp. 18–36.
V. Zupitza, Sammlung englischer Denkmäler. Elfrico provavelmente é o
autor do vocabulário que lhe é atribuído em Wright (ed.), A Volume of
Vocabularies. Sobre a popularidade das suas obras como livros-texto, v.
White, Ael ic, pp. 119–24.

50. O título completo é Elemerarium doctrinae erudimentum (Veneza,


1491). Análise e crítica da obra em Lowe, Prodromus corporis glossariorum
latinorum, pp. 235 e ss. cf Sandys, p. 501; Haase, Vorlesungen, p. 13;
Heerdegen, op. cit., p. 498. Supõe-se que a principal fonte de Papias foi o
dicionário anônimo do século VIII e IX, que, por sua vez, deriva
parcialmente da obra de Sidônio. V. Sandys, pp. 235, 639, nota 3.

51. V. “ esaurus novus Latinitatis sive lexicon vetus e membranis nunc


primum erutum”, em Mai (ed.), Classici Auctores e Vaticanis Codicibus, t.
8. Prova da identidade desse elaborado dicionário (p. 632 in-octavo) com
Panormia, v. Lowe, op. cit., pp. 240 e ss. Um dicionário de Petrus Helias,
composto neste período, encontra-se perdido. Cf. Meier, p. 15.

52. Análise e crítica em Lowe, op. cit., pp. 243 e ss. Sobre os derivados de
Papias e de Hugotio, v. Lowe, op. cit., pp. 247–59. Para aprofundar-se nas
glosas do nal da Idade Média, v. Lowe, op. cit., pp. 222 e ss.

53. Texto em Wright (ed.), A Volume of Vocabularies, pp. 121–38. Cf. Scheler,
op. cit., pp. 18–83; Eckstein, loc. cit. O mesmo autor compôs Opus
synonimorum e Opus aequivocorum, que, de certa forma, podem
classi car-se como vocabulários. V. PL 150, cols. 1578–90. Para uma crítica
aos vários dicionários manuscritos ainda existentes, v. Hauréau, em
Notices et extraits, vol. 27, II, pp. 38–48.

54. Texto impresso em algum momento entre 1469 e 1483. Cf. Heerdegen,
op. cit., p. 499.

55. Texto em Scheler (ed.); cf. Sandy, p. 527.

56. Título completo: “Expositio in singulis libris Bibliae authore


Marchisino”. Cf. Schmid, Geschichte der Erziehung, vol. II, p. 299.

57. V. Haase, Vorlesungen, pp. 13 e ss; Meier, op. cit., p. 17. Para um breve
estudo sobre as glosas na Idade Média, com trechos ilustrativos, v. Babler,
op. cit., pp. 170–88.

CAPÍTULO V
1. O caráter decadente da instrução em retórica no império tardio recebeu
tratamento exaustivo de George Kauffman, “Rhetorenschulen und
Klosterschulen”, em Histor. Taschenbuch (1869), pp. 1–94; O. Denk,
Geschichte des Gallo-Frankischen Unterrichts und Bildungswesens, pp. 40–
163, esp. 140–63; Dill, Roman Society in the Last Century of the Western
Empire, pp. 321–76.
2. Rábano Mauro, De institutione clericorum, III, cap. 19, PL 107, col. 396.

3. Ibid., col. 397.

4. Pelo número de códices reunidos por K. F. Halm na sua coleção de livros-


texto de retórica (Rhetores Latini Minores, 1863), estimamos que ainda
existam cerca de 100 manuscritos utilizados na Idade Média. Compare-se
a isso o número de manuscritos de gramática ainda restantes — 1 mil só
de Prisciano — e então será possível apreciar o tempo que as escolas
medievais dedicavam a essas duas disciplinas.

5. Cria essa impressão a pequena quantidade de manuscritos das obras


retóricas de Cícero e das Institutiones de uintiliano que nos chegaram
de uma só vez. Considere-se ainda M. T. Ciceronis opera, ed. Orelii,
prefácio. Segundo o editor, sobrevivem quatro manuscritos de De
inventione e de De oratore, as quais antecedem o século XIII.

6. Texto em Halm (ed.), Rhetores Latini Minores, pp. 48–58. Virgílio, como
vimos, era considerado uma autoridade retórica no sentido mais estreito
da palavra, isto é, quanto à escolha das palavras. Cf. Comparetti, Virgil in
the Middle Ages, p. 133. Cf. supra, pp. 31–2.

7. Halm (ed.), op. cit., pp. 63–70.

8. Halm (ed.), op. cit., pp. 71–7.

9. Halm (ed.), op. cit., pp. 608–18. Cf. Saintsbury, History of Criticism, vol.
I, pp. 374 e ss. A a rmação de que essa obra de Beda é de “suma
importância” baseia-se na suposição equivocada de que Beda ilustra suas
guras com citações dos clássicos e das Escrituras, sugerindo, assim,
comparações. A fonte mais con ável, Halm, não traz uma só ilustração
procedente dos clássicos.

10. O seu caráter representativo gera interesse pela análise do conteúdo. As


40 páginas (quarto) dividem-se em três partes: a primeira é dedicada
exclusivamente ao tratamento das guras e de outros termos técnicos,
cerca de 80 deles. Na sua de nição, retórica é a “bene dicendi scientia”; o
orador, “vir bonus dicendi peritus”, cujo objetivo é “persuadere”. Os genera
civilum questionum são “demonstrativum, deliberativum, judicale”.
As outras partes do livro são dedicadas à exposição técnica do “partium
orationis officium”: (1) invenção; (2) explicação; (3) con rmação; (4)
provocação; (5) persuasão. O segundo livro é dedicado ao detalhamento
da invenção, e tem como base De inventione, de Cícero, e o terceiro livro
de Institutiones, de uintiliano (esp. caps. 5 e 6). As de nições são
simples, e os exemplo, breves. O terceiro livro trata suscintamente, e ao
modo tradicional, de “explicação”, “con rmação”, “provocação” e
“persuasão”; os exemplos, outra vez, são de Cícero e de uintiliano. Texto
em Halm, op. cit., pp. 81–134.

11. Discute-se que o tratamento pormenorizado das guras e o excesso de


classi cações da obra de Fortunaciano sugiram mais o espírito dos
retóricos gregos do que os de Cícero e uintiliano, ambos opositores de
tal requinte. V. Saintsbury, op. cit., vol. I, pp. 87–9, 107, 108, 346 e ss. Cf.
uintiliano, Institutes, trad. Watson, livros 8–9, pp. 71 e ss; Cícero,
Topica, em Orelli (ed.), Opera, vol. I, p. 45–479.

12. Texto em Halm (ed.), 137, 151; PL 32, 1439 e ss. A superioridade
atribuída aos escritos de Agostinho sobre dialética e retórica baseia-se nas
declarações dos seus editores beneditinos (1679, t. 1, ap. 152). Essa
opinião é aceita por Saintsbury (op. cit., vol I, p. 377) e negada por
Crecilinus (Jahresbericht über das Gymnasium zu Elberfeld, 1857). Cf.
August Reuter, “Augustine’s Rhetoric”, em Kirchengeschichtliche Studien,
pp. 324–51

13. Halm (ed.), pp. 318–52.

14. Halm (ed.), pp. 373–448.

15. Em Eyssenhardt (ed.), livro V, pp. 138–93; Halm (ed.), 451–92. Cf.
Saintsbury, vol. I, pp. 349 e ss. — “um dos melhores retóricos latinos”.

16. PL 70, C. 1157–67; Halm (ed.), pp. 495–504.

17. Halm (ed.), pp. 507–22.


18. Cf. West, Alcuin, p. 104; Saintsbury, vol. I, 375–6.

19. Pode-se ver isso de duas maneiras. A obra, como o título sugere, une as
duas coisas, retórica e virtude. Escrita especialmente para o rei, seu objeto
não é retórico, mas judicial, como se vê nos versos introdutórios: “ ui
roro civiles cupiat cognoscere mores / Haes praecepta legat quae libe riste
tenet”.
A ênfase, portanto, realoca-se. Em Cícero, o objetivo do estudo da
retórica é adestrar o orador, peticionário das causas civis, o qual, claro,
deve ser virtuoso. Em Alcuíno, o propósito é ensinar retórica ao rei, para
que ele seja capaz de julgar. A virtude, também segundo Alcuíno, é
necessária ao orador, mas para outro m. Daí que ele incluísse uma
discussão das quatro virtudes cardeais — prudência, justiça, fortaleza e
temperança — no que é, confessadamente, um livro-texto de retórica. Os
genera causarum dos antigos retóricos, demonstrativum, deliberativum,
judicabile, tornam-se honestum, admirabile, humile etc. Mudança um
tanto curiosa, mas facilmente explicada à luz do propósito da obra. Texto
em Halm (ed.), pp. 520–50; PL 101, cols. 101 e ss.

20. Sobre a Rethorica de Notker, v. Hattemer (ed.), Denkmäler des


Mittelalters, vol. III, pp. 560–85. Sobre a retórica de Remígio de Auxerre,
v. Hist. lit. de la France, vol. IV, p. 119. O texto de Bernardo de Chartres
está perdido. Cf. Barach, op. cit., XIII. O texto de Boncompagno
encontra-se na Biblioteca de Munique, Cod. Lat. ZZ., 499 fols., 1–58 cf.
Sitzungsberichte der Konigl. Bayerisch. Akad. zu München (1861), pp. 134
e ss. Um Antiqua retheorica de Boncampagno, professor de retórica em
Bolonha, foi apresentada aos professores e estudantes de direito civil e
canônico a 26 de abril de 1215, e o seu autor foi, por isso mesmo,
laureado. Trata-se de uma obra de retórica, estritamente. A sua outra obra,
Novissima rhetorica, traz bastante material de ordem legal, além, claro, de
material tradicionalmente técnico a respeito da retórica, mostrando, em
aproximadamente 30 páginas, como então se interpenetravam o estudo da
retórica e o estudo do direito. Outras obras suas, sobre o dictamen, serão
abordadas adiante.
21. Por exemplo: Emporius, De Ethopoeia, em Halm (ed.), pp. 561–74;
Clodiano, De statibus, ibid., pp. 590–92.

22. Catálogos de bibliotecas dos séculos VIII e IX apontam, não raro, a


existência de uma cópia de Topica e De inventione. Outra ocorrência
freqüente é Ad Herennium. Cf. Mullinger, Schools of Charles the Great, p.
84.

23. “Huic urbi (sc. rhetorici) subjacent historiae fabulae libri oratorie et
ethice conscripti”. Em Honorii Augustod. libell. de animae exsilio, cap. 3,
Pez (ed.), esaurus Anecdotorum, vol. 2, I, p. 229, citado em Specht, op.
cit., p. 116.

24. João de Garlandia, por exemplo, no século XIII, ao elencar os autores que
um estudante deveria freqüentar, menciona, de Cícero, De inventione, De
oratore e Ad Herennium, além das Declamações e Instituições, de
uintiliano. Cf. Leyser, op. cit., p. 339; Sandys, p. 525. ue as obras
retóricas de Cícero, em particular De inventione, foram
consideravelmente usadas, isso se prova pelos elaborados comentários que
se lhes dedicaram, a exemplo de Fabius Laurentius — v. Halm (ed.), pp.
155–310. Sobre manuscritos congêneres, alguns datados do século VII, v.
Halm (ed.), op. cit., pp. 593 e ss. uintiliano foi provavelmente usado em
partes; só assim se explica a existência de tantas seleções. Essas, em geral,
consistiam de passagens tiradas de Institutiones, e por vezes guravam
como apêndice em textos sobre retórica. Exemplo em Halm (ed.), op. cit.,
pp. 501–4.

25. Cf. Júlio Vítor, Ars rhetorica, em Halm (ed.), pp. 447 e ss. Cf. p. 52.

26. “Capitula de Doctrina Clericorum”, em Man. Germ. Hist., Leges, I, pp.


107–8.

27. V. Savigny, Geschichte des römischen Rechtes, vol. III, cap. 21, pp. 152 e ss.
A íntima relação entre o estudo da retórica e o estudo dos elementos do
direito foi estabelecida pelas investigações originais de Specht, que reuniu
informações que remontam à Gregório de Tours — v. Specht, op. cit., pp.
١–١٢٠. Trataram do dictamen os seguintes pesquisadores: Savigny,
Geschichte des röm. Rechts im Mittelalter, cap. 21; Eugéne de Rozidre,
Recueil général des formules usitées dans l’Empire des ancs du Vme au Xme
siécle, 3 vols. (1859–1871); L. Rockinger, Ueber Briefsteller und
Formelbucher in Deutschland während des M. A. Muitos formularii
existem pelas universidades européias, e por vezes guram de algum
modo nos periódicos dedicados à história medieval. Assim, por conta do
seu valor histórico, a título de ilustração, muitos textos importantes têm
sido editados e publicados. Diversos códices têm sido publicados em
Archiv für Kunde Oesterreichischen Geschichtsquellen, Neues Archiv für
altere deutsche Geschichskunde e Notices et extraits des manuscrits de la
Bibliotheque Nationale. Cf. e. g. Wattenbach, “Ueber Briefsteller des
Mittelalters”, introdução e textos em Archiv, vol. XIV, pp. 29–67; Otto
Stobbe, “Ein Formelbuch aus der Zeit König Rudolfs I und Albrecht’s I”,
ibid., pp. 305–78; Johannes Voigt, “Das urkundliche Formelbuch des
Könglichen Notars aus der Zeit der Könige Ottokar II und Wenzel II von
Bohmen”, em Archiv, vol. XXIX, pp. 1–185; Karl Zeumer, “Über die
alteren frankischen Formelsammlungen”, Neues Archiv, vol. VI, pp. 1–
115; E. Dümmler, “Zu den carolingischen Formelsammlungen”, Neues
Archiv, vol. VII, pp. 401–3; Karl Zeumer, “Ueber Fragmente eines
Formelhandschri des IX Jahrhunderts”, Neues Archiv, vol. VIII, pp. 601 e
ss.; Idem, “Neue Erörterungen tiber altere frankische
Formelsammlungen”, Neues Archiv, vol. IX, pp. 311–58. Várias coleções de
fórmulas são descritas em Forschungen zur deutschen Geschichte, vol. VIII,
pp. 327–66; vol. X, pp. 642–53; vol. XV, pp. 213–38. Outras são descritas
em C. Langlois, “Formulaires de lettres du xii au xiii et du xiv siécles”,
constituindo-se uma série de artigos em Notices et extraits, vol. 34, I, pp.
1–32; II, pp. 1–29; vol. XXV, pp. 409–34. Manuscritos de formulae
epistolares são descritos em Leopold Deslisle, Notices et extraits, vol. 27, I,
pp. 87 e ss. Dentre as coleções de dictamina em geral, a mais completa é a
de Ludwig Röckinger em Quellen zur Bayerischen und Deutschen
Geschichte, vol. VII, pp. 1–312; vol. IX, pts. 1–2. Ao todo, a sua coleção
contém cerca de 1,2 mil peças separadas, entre formulários e cartas, do
período carolíngio até o século XIV. A coleção de Roziére, apesar de conter
a maior quantidade localizada de epístolas (190, enquanto Röckinger
inclui apenas 78), tem, ao nosso ver, mais valor para o estudante do
direito do que para o investigador das condições sociais como um todo.
As formulae, no entanto, estão bem classi cadas; um terço da obra, com
uma série de tabelas excelentes, oferece ao estudioso um índice valoroso
de todo o tema. Algumas notas bibliográ cas em Langlois, op. cit.,
Notices et extraits, vol. 34, I, p. 7, notas 1 e 2.

28. V. Rashdall, Uni ersities in the Middle Ages, vol. I, cap. 4, pp. 90–127;
Oznam, Documents inédits pour servir a l’histoire littéraire de l’Italie, Paris,
1850; esp. “Ars dictandi in Italien”, em Sitzungsbericht der Königl. Bayer.
Akad. der Wiss. zu München (1861), pp. 98–151.

29. Para uma suscinta descrição desse “breviarium”, v. Röckinger, “Briefsteller


und Formelbücher des el en bis vierzehnten Jahrhunderts”, em Quellen
zur Bayerischen und Deutschen Geschichte, vol. VII, pp. 5 e ss.

30. Em Röckinger, Quellen etc., vol. VII, pp. 189–256.

31. Texto e introdução, Röckinger, op. cit., vol. IX, pp. 201–346.

32. Summula dictaminis de Bernoldo, em Röckinger, op. cit., vol. IX, II, pp.
849–924. O texto de Formularius, de Arnaldo de Protzan, está
reproduzido em Wattenbach, Codex diplomaticus Silesiae, vol. V, Breslau,
1862. Cf. Röckinger, Quellen etc., vol. VII, pp. 38 e ss. Nos primeiros
séculos da Idade Média, também as Variae de Cassiodoro foram muito
populares. Mais tarde, foi a vez das Epistolae de Alcuíno. Ao contrário do
que a rma Meier (Sieben eien Künste, p. 26), a coleção dos dictamina
baseada em Epistolarum libri sex de rebus gestis Frederici, de Petrus de
Vineas, e a coleção dos Summa dictaminis de Tomás de Cápua, cada uma
representando um lado da controvérsia entre o imperador e o Papa, não
podem, ao nosso ver, ter sido utilizadas como livros-texto — o seu caráter
controverso tê-los-ia barrado na sala de aula. Não pudemos encontrar o
dictamen de Petrus na Collectio Historica de J. G. Habnius.

33. Sobre Summa dictaminis, de Ludolfo de Hildesheim, v. Röckinger (ed.),


Quellen etc., vol. IX, pp. 347–402. Texto do Formularius de
Baumgartenburg em ibid., II, pp. 713–838. Sobre a introdução de
exercícios escolares nas coleções, v. Röckinger (ed.), op. cit., vol. XII, p. 41,
onde encontram-se muitos exemplos. Jaffé e Wattenbach, no Codex
diplomaticus Silesiae, V, pp. 60–5, provaram que um número signi cativo
de cartas lombardas do reinado de Lotário, e outras concernentes à
controvérsia entre Frederico I e o Papa Adriano, não passam de dictamina
estudantis. Cf. Röckinger (ed.), op. cit., vol. XII, p. 52. Naturalmente,
sugere-se a si mesma a seguinte questão: quantos documentos espúrios,
mais tarde carimbados como simples fraudes, não eram, de origem, obra
inocente da imaginação estudantil?

34. V. Röckinger (ed.), Quellen etc., vol. IX, passim, esp. 214–59, 385–98,
749–58.

35. Por exemplo: Sächsische summa prosarum dictaminis, ou a de Domingos;


Röckinger (ed.), Quellen etc., vol. IX, pp. 209–346, 525–92.

36. Outras duas partes da Epistola, “superscriptio” e “subscriptio”, raramente


foram tratadas. Cf. Röckinger (ed.), Quellen etc., vol. IX, p. 10, nota.

37. Röckinger (ed.), Quellen etc., vol. IX, pp. 103 e ss.

38. Ibid., pp. 725–48.

39. Rationes dictandi Hugutionis Hononiinsis; Röckinger, Quellen etc., vol. IX,
p. 64.

40. Ibid., pp. 64–5.

41. Drei Formelsammlungen aus der Zeit der Karolinger, em Quellen und
Forschungen, pp. 47–168. Evidências do seu emprego como livro-texto
em ibid., introd., pp. 24, 43 e ss.

42. Röckinger (ed.), op. cit., vol. VII, pp. 189–256.

43. Ibid., pp. 171–85. Cf. ibid., introd., pp. 21–9.

44. Como o seu Rationes dictandi pode ser considerado um marco do ensino
da retórica na Idade Média, faremos aqui uma análise mais detalhada do
seu conteúdo. O volume consiste cerca de 20 páginas (in-octavo), e
divide-se em 13 parte desiguais. Depois de uma breve introdução, o autor
passa à de nição do dictamem e das suas partes, e vai se encaminhando
para a epístola, a qual de ne como forma da oratio. Nomeiam-se, então, as
cinco partes da epístola: a primeira e mais importante, chamada salutatio,
é explicada e ilustrada em pormenores. Na verdade, mais do que um terço
da obra é reservado ao exame da natureza do discurso; mostram-se todas
as formas possíveis — do rei para o Papa, do súdito para o prelado, do
Papa para o mundo, do imperador para o mundo, dos bispos para os
encarregados, de nobre para nobre, de amigo para amigo. Da salutatio o
autor passa para a captatio bene olentiae, e em seguida para a narratio;
petitio e conclusio são abordadas muito brevemente. Discutidas as cinco
partes da epístola, o autor prossegue com uma re exão a respeito da
possibilidade de diminuírem-se essas partes, isso conforme as
necessidades, e chega à óbvia conclusão de que salutatio e narratio não se
podem omitir. Ele parte para outra re exão, agora sobre as possibilidades
de intercâmbio entre as diferentes partes das cartas, e testa vários arranjos
e combinações. Depois de breves considerações, de caráter retórico, sobre
a “questão das cartas”, ele parte para a discussão das variedades das cartas,
abordando as formas pessoal, impessoal etc., para concluir com algumas
observações sobre o uso dos conectivos. Esse breve tratamento do aspecto
prático da retórica medieval é típico a todos os dictamina que pude
examinar. Röckinger, op. cit., vol. 11, I, pp. 9–28.

45. Röckinger (ed.), Quellen etc., vol. 9, I, pp. 53–94.

46. Ibid., pp. 103–14.

47. A obra chegou a ser impressa, mas ainda existem muitos manuscritos. Só
em Munique há 7 de cada um dos seus textos. Cf. Röckinger (ed.), op.
cit., vol. VII, p. 178.

48. Röckinger (ed.), op. cit., vol. IX, pp. 209–346.

49. Ibid., pp. 359–98. Para o cotejo das cartas ilustrativas das duas obras, v.
ibid., pp. 206–7. Para comentários do Mestre Simão a Ludolfo, v. ibid., II,
pp. 973–84.
50. Introdução e texto em Röckinger (ed.), Quellen etc., vol. IX, pp. 405–82.

51. Mari (ed.), Romanische Forschungen, vol. XIII (1902), pp. 183 e ss.

52. Röckinger (ed.), Quellen etc., vol. 9, II, pp. 725–838.

53. Ibid., pp. 845–948.

54. Para exemplos dessas tabulae, com diferentes esquemas, v. Johannes Bondi
de Aquileia, Practica usus dictaminis. Röckinger (ed.), op. cit., vol. 9, II,
pp. 956–66.

55. Algumas universidades previam seminários sobre um libellus de arte


epistolandi. Cf. Prantl, Geschichte der Uni . Ingolstadt, vol. II, p. 76 (citado
em Rashdall, op. cit., vol. I, p. 442, nota 1).

CAPÍTULO VI
1. Talvez seja preciso esclarecer que lógica e dialética foram sinônimos
durante toda a Idade Média. Isso nota-se em Isidoro de Sevilha — v.
Rémusat, Abelard, vol. I, pp. 300 e ss.

2. Alberto Magno repreende a confusão. V. De praedicabili, livro I, trat. I,


cap. 2, c. 104. Opera.

3. “É difícil”, diz Blakey, “manter à vista a distinção radical entre a ciência —


isto é, a loso a lógica — e as formas ou sistemas puramente dialéticos
que sempre se impõem à nossa apreciação das especulações abstratas da
Idade Média” (Historical Sketch of Logic, pp. 121 e ss.).

4. O conjunto de problemas losó cos de que os escolásticos se ocuparam


não tem melhor de nição do que as históricas palavras de Porfírio: “Mox
de generibus et speciebus illud quidem sive subsistant sive in solis nudis
intellectibus posita sint, sive subsistentia corporalia sint an incorporalia,
et utrum separata a sensibilibus an insensibilibus posita et circa haec
consistentia dicere recusabo; altissimum enim negotium est huius modi,
et majoris egens inquisitionis” (em Boécio, Commentarius in Porphyrium
a se translatus, PL 64, col. 82). Temos aqui o problema escolástico sob os
seus três aspectos: (1) ontológico; (2) realismo versus idealismo; (3)
epistemológico. Os três, de uma forma ou de outra, foram importantes o
su ciente para ocupar a atenção dos pensadores medievais por cerca de
seis séculos.

5. Sobre os limites da lógica na sua relação com a loso a, v. Baldwin,


Dictionary of Psychology and Philosophy; Braniss, Die Logik in ihrem
Verhältniss zur Philosophie geschichtlich betrachtet, pp. 13–6, 44–6; Grote,
Aristotle, vol. I, pp. 84–96.

6. Jourdain, Recherches critiques sur l’âge et l’origine des traductions latines


d’Aristote (Paris, 1845).

7. Victor Cousin, “Introduction aux ouvrages inédits d’Abélard”, em


Collection des documents inédits sur l’histoire de France, vol. XXIV (1836).

8. De Rémusat, Abélard, 2 vols. (1845).

9. Hauréau, De la Philosophia scolastique (1850).

10. Prantl, Geschichte der Logik im Abendlande, vol. II (1861).

11. “Est enim philosophia genus, species vero eius duae; una quae theoretice
dicitur, altera quae practice id est speculativa et activa”. (Dialogue in
Porphyrium Dialogia Victorino translatus, PL 63, col. 11). É evidente que
os seus escritos não se destinavam meramente à instrução em lógica
formal, a começar pelo seu próprio volume: algo em torno de 900 colunas
de material original. O plano de Boécio ia muito além de escrever um
livro-texto; era legar à posteridade, de uma forma acessível, inteligível, as
investigações dos lósofos seus antecessores. Com efeito, a sua obra
tornou-se uma fonte de lógica e loso a para a produção de livros-texto
(cf. Ueberweg, Geschichte der Philosophie, vol. I, p. 354). Não se a gura
que Boécio tivesse uma visão de nitiva sobre as divergências losó cas de
Platão e Aristóteles; Hauréau não teve sucesso em revelar alguma
inclinação ou parcialidade (cf. Hauréau, op. cit., vol. I, pp. 92–9). V.
Cousin, op. cit., 67–75.

12. Prantl, op. cit., vol I, pp. 682–700.

13. Prantl, op. cit., vol II, pp. 98–9.

14. Boécio, Pseudo-Rábano Mauro (Super Porphyrium) e Pedro Abelardo


estão entre os comentadores mais notórios.

15. Trendelenberg, Geschichte der Kategorienlehre, p. 250. Omitir-se em


relação aos problemas aludidos na introdução de Porfírio é algo próprio
aos livros-texto de lógica formal. Capela, Cassiodoro, Isidoro de Sevilha,
Alcuíno, Rábano Mauro e ainda outros, todos evitam o assunto. Nenhum
deles, nesses tratados, toma posição a respeito dos temas losó cos em
questão. Na verdade, eles sequer parecem dar-se conta da sua
importância; falam da primeira e da segunda substância, aparentemente
ignorando as suas implicações metafísicas. Para um resumo do problema
dos universais e da antítese platônico-aristotélica, cujos ecos se fazem
ouvir no tratamento da primeira categoria, v. Hauréau, op. cit., vol. I, cap.
3, pp. 47–73; Grote, Aristotle, vol. II, apêndice, pp. 243–68; Rémusat,
Abélard, vol. I, pp. 275–367.

16. Eyssenhardt (ed.), livro IV, pp. 98–137.

17. Prantl, op. cit., vol. I, pp. 665 e ss. Cf. Agostinho, Retract., I, 6, Opera (PL
32, p. 591, cols. 1409–19). Sobre autenticidade da primeira obra referida,
v. Prantl, loc. cit.; Cf. p. 141, nota 12.

18. Prantl estabelece o caráter espúrio. Entretanto, não resta dúvida de que
data do nal do século IV e que serviu de livro-texto durante a Idade
Média, fato esse que o grande número de cópias e de glosas ampara
tranqüilamente. Prantl chega a considerar que tenha sido ele a base dos
tratados lógicos de Isidoro de Sevilha e de Alcuíno.

19. PL 70, cols. 1167–1203.


20. Prantl, op. cit., vol. I, p. 722.

21. Ao introduzir o silogismo, Cassiodoro faz o que pode para nos mostrar a
importância ofuscante dessa parte da lógica: “Nunc ad syllogisticas
species formulasque veniamus in quibus nobilium philosophorum jugiter
exercetur ingenium” (PL 70, col. 1174). Ele saía-se melhor do que poderia
saber. Os elementos práticos da lógica, era isso o que ele e as gerações
depois dele queriam, e não na forma exaustiva na qual Aristóteles os
deixou. Por isso a seção de Cassiodoro foi tão utilizada, ao passo que
metade do elaborado aparato que Boécio legou ao mundo logo se perdeu,
sinal de não ter sido recuperado até o m do século XX.

22. PL 82, Etymologiae, livro II, cols. 140–54.

23. Ibid., cols. 73, 128, 146.

24. Ibid., Etymologiae, livro II, c. 24, col. 140.

25. Assim, a instrução em lógica que Walther de Speyer recebeu no século X


coincide com a carga que encontramos no livro de Alcuíno. Cf. Pez (ed.),
Acta St. Christophoris, livro I, “De Studio”, vv. 114–47. Cf. Specht, op. cit.,
p. 24.

26. PL 101, cols. 949–75. Cf. Prantl, op. cit., vol. II, pp. 14 e ss.

27. Prantl, op. cit., vol. II, pp. 40 e ss.

28. Por exemplo: augmari, Vita S. Bernwardi, c. I; Otlo, Vita St. Wolfgang,
c. 28, MG-SS. 4, pp. 538–78, citado em Specht, p. 125. Os escritos de
Notker Labéu permitem identi car o caráter da instrução em lógica
oferecida em São Galo ao longo do século X, ao passo que o grande
número de manuscritos ainda existentes dá testemunho da popularidade
do tema. Para uma edição dos seus comentários sobre as categorias, De
interpretatione e Capela, bem como a sua obra original sobre o silogismo,
v. Hattemer, Denkmäler des Mittelalters, vol. III, pp. 257–559.

29. PL 104, III, c. 20, cols. 397–8.


30. Ibid.

31. “Cum ergo sint verae connexiones, non solum verarum; sed etiam
falsarum sententiarum, facile est veritatum connexionum etiam in scholis
illis discere, quae praeter ecclesiam sunt, sententiarum autem veritates in
sanctis libris ecclesiasticis investigandae sunt” (loc. cit.). Essas
considerações de Rábano Mauro, sobre a importância transcendente da
lógica formal para a teologia, podem ser consideradas decisivas na história
do currículo medieval. Aristóteles considerara a lógica apenas como um
meio para a boa compreensão, especialmente em contendas, na medida
em que requeria agudeza no trato das ambigüidades da linguagem, faro
para os signi cados subjacentes a diferentes expressões e capacidade de
apreciação de tudo quanto implica uma proposição qualquer, sem no
entanto de nir concepções ou predileções losó cas. No mesmo espírito,
Boécio, Cassiodoro e Isidoro de Sevilha enxergaram na lógica uma parte
menor da loso a, a qual consideraram “disciplina disciplinarum”. Até os
tempos de Erígena, não se veri ca nenhuma ligação direta entre o estudo
da lógica, tal como empreendido nas escolas, e a teologia ou metafísica.
Rábano Mauro assinalou-o ao chamar a mesma lógica “disciplina
disciplinarum”, e encarou a sua grande importância para o estudo das
Escrituras. Não foi preciso mais do que a experiência, isto é, as acusações
de heresia a Erígena e a Berengário de Tours, para que se revelassem os
perigos ocultos no abuso do silogismo. De um modo geral, regido como
era pelas concepções da Igreja, o educador medieval apreciou a relevância
das palavras de Rábano Mauro. Todavia, se as suas idéias estimularam o
estudo da lógica formal, por outro lado não surtiram efeito sobre o escopo
da disciplina como parte do currículo. Se é verdade, como já dito muitas
vezes, que esse fervoroso esforço dialético não produziu novos dados
cientí cos, também é certo que a intensi cação do estudo da lógica
pavimentou o caminho do renascimento intelectual da era de Abelardo.
Com efeito, foi com o instrumental da lógica escolar que Roscellinus,
Guilherme de Champeaux, Anselmo e Abelardo atacaram com tanto
sucesso os problemas losó cos da Idade Média. O seu bom uso do
método dialético em discussões metafísicas e teológicas causa a impressão
de que o ensino da lógica e o ensino da metafísica tornaram-se idênticos
no período (“Ainsi la dialectique devint la philosophie premiére ou la
metaphysique”, em Haureau, op. cit., vol. I, p. 32. V. Rémusat, Abélard,
vol. I, p. 303: “La scolastique n’a donc pas été la philosophie reduite à la
dialectique, mais aux formes de la dialectique”). Mas não foi isso o que
aconteceu. Aconteceu, na verdade, que o estudo da lógica tomou o lugar
de destaque até então ocupado pela gramática. A prova disso — e aí
divergimos de Hauréau — pode ser encontrada nos escritos dos mesmos
homens. Tanto nas obras escolásticas como nos livros-texto do período, a
separação entre lógica e metafísica parece clara o su ciente, ao menos no
que diz respeito à lógica enquanto uma das sete artes liberais.
A conhecida sátira do combate das artes liberais é um indício tardio
das mudanças que principiaram na França com a virada do século XII,
mais precisamente nas escolas de Paris e arredores, onde a in uência de
Abelardo era tão forte. Foi então que a lógica tornou-se a segunda
disciplina do trivium.
Muitas vezes citado, o dístico: “Gramm loquitur, Dia vera docet, Rhet
verba colorat. / Mus canit, Ar numerat, Geo ponderat, Ast colit astra” não
vem de antes do século X. Da mesma forma, não pode ser lido como se
indicasse a ordem dos estudos sob o trivium nos tempos que antecederam
o período escolástico. Isso, aliás, ca provado pelo fato de que, à exceção
de Marciano Capela, os autores dos livros-texto adotam, invariavelmente,
outra ordem: gramática, retórica e dialética.

32. Richer, Histor. libri etc., III, c. 46–7 (MGH-SS 3, p. 617).

33. Anselmo, Dialogus de grammatico (PL 158, cols. 561–81). Cf.


Weddingen, “Essai critique sur la philosophie de S. Anselm”, em Memoires
couronnées de l’Academic Royale de Belgique, t. 25, III, pp. 18 e ss. Anselmo
põe-se a resolver o paradoxo do seguinte silogismo: “Omnis homo potest
intelligi sine grammatica; nullus grammaticus potest intelligi sine
grammatica; ergo nullus grammaticus est homo”. É a partir daí que
Anselmo desenvolve, neste breve tratado, toda a sua lógica formal.

34. Cf. Ueberweg, op. cit., vol. I, p. 392; Hauréau, vol. I, pp. 267–86. Texto
em Cousin, Ouvrages d’Abélard, pp. 173 e ss.; Prantl, vol. II, pp. 163–204;
Rémusat, Abélard, vol. I, pp. 361 e ss.
Cf. pp. 65, 66. Se apreciamos o interesse de Boécio pelos dois aspectos da
35. sua “philosophia” à luz da extensão dos comentários que ele produziu
sobre cada uma das lógicas — formal e a especulativa —, vemos que dois
terços dos escritos considerados dedicam-se às partes da lógica que tocam
as raias da metafísica. São dois comentários a Profírio, Isagoge, um às
Categorias e dois a De interpretatione.

36. V. Alcuíno, De dialectica, PL 101, cols. 949 e ss. De Fide Sanctae., ibid.
livro I, cols. 9 e ss.

37. De divisione naturae, PL 122, cols. 870 e ss. Cf. Hauréau, op. cit., vol. I, 12,
pp. 118–9.

38. De divisione naturae, livro I, cap. 22, ibid., col. 469. Cf. Ueberweg, op. cit.,
pp. 358–66. A partir de Erígena, vemos as mesmas questões discutidas,
aparentemente, sob a mesma lógica. O exame super cial dessas obras
mostra que elas não eram livros de lógica para a sala de aula; que não
tratavam de lógica formal, mas de metafísica pura e simples. É bem
verdade que a posição nominalista, entre os comentadores dos tratados do
século IX, manifesta-se discretamente, num primeiro momento, e pouco a
pouco assume contornos cada vez mais distintos. Hauréau mostrou ser
este o caso dos comentários de Erígena e Remígio de Auxerre a Marciano
Capela. Essas breves referências ao problema losó co são feitas como
simples dados da realidade, e, com efeito, prenunciam o nominalismo
vindouro. Assim, eles importam na medida em que remontam à história
da escolástica, mas, vistas à luz do texto mesmo, não provam que a
questão losó ca fosse uma parte da instrução formal em lógica. Para o
comentário de Erígena, v. Notices et extraits. t. 20, pt. II, pp. 8–39, onde
implicações realistas contrastam com a visão aristotélica de Marciano
Capela. Para o comentário de Remígio — texto, introdução e crítica —, v.
Hist. lit. de la France VI, p. 120; Hauréau, op. cit., I, pp. 144 e ss; e Notices
et extraits, XX, pt. II, p. 20; Cf. Ueberweg, op. cit., I, pp. 367–88.

39. V. Richer, Histor. libri etc, vol. III, c. 46–7 (MGH-SS 3, p. 617).

40. Textos de Monologium e Prolologium em PL 158, cols. 141 e ss; 233 e ss.
41. Prantl, op. cit., vol. II, pp. 215 e ss. Cf. Hauréau, vol. I, pp. 298 e ss.;
Ueberweg, op. cit., vol. I, p. 399.

42. A matéria é tratada em detalhe nas obras das autoridades referidas nas
notas 1–5, p. 74, esp. Jourdain. Cf. p. 65. Algumas notas sobre a literatura
concernente em Ueberweg, op. cit., vol. I, p. 430.

43. V. Launois, De variis Aristotelis in Academia Parisiensis fortunes, citado


em Prantl, op. cit., vol. III, pp. 9–10.

44. Essa idéia está expressa na sua Metafísica, IV, 3, VII, 12. Cf. Ueberweg,
System of Logic and History of Logical Doctrines, p. 33.

45. ue esta tenha sido a postura adotada mesmo no auge da escolástica vê-se
pela opinião de Alberto Magno: “Logica una est specialium scientiarum;
sicut in fabrili in quae specialis est ars fabricandi maleum”. Ele a de ne
como “sapientia contemplativa docens qualiter et per quae devenitur per
notum ad ignoti notitiam”. A lógica, ao seu ver, não pertence à metafísica,
ou philosophia prima. Cf. Alberto Magno, De predicab., livro I, trat. I,
caps. 1–3, Opera; cf. Ueberweg, History of Philosophy, vol. I, p. 435.

46. Cf. Ueberweg, op. cit., vol. I, pp. 453–4; Prantl, op. cit., vol. III, pp. 50 e
ss.

47. Entre os autores mais famosos nessa área, podemos mencionar Miguel
Pselo, João Ítalo, Guilherme de Sherwood e Lamberto de Auxerre. Prantl,
op. cit., vols. II–III, discute e analisa os textos de cada um desses autores.
De nada nos valem as suas discussões, porque o que ele busca são teorias
lógicas; Prantl desconsidera a perspectiva de um modesto livro-texto. V.
Prantl, op. cit., II; seção XIII, notas 1 e 3; seção XIX, nota 1.

48. Não pôde o autor garantir para si uma cópia dos textos, motivo por que se
viu obrigado a con ar na análise de Prantl, cujo trabalho, por sua vez, é
excepcionalmente completo. V. Prantl, op. cit., vol. III, pp. 33–74. Cf.
Hist. lit. de la France, vol. XIX, p. 326. A prioridade do conteúdo de
Summulae é reivindicada por Prantl para uma Synopsis de Miguel Pselo,
mas urot e outros sustentam que a chamada Synopsis é, na verdade, uma
tradução da obra de Pedro Hispano; Ueberweg tende à segunda visão.
Ueberweg, System of Logic, p. 41. Nota bibliográ ca completa em
Ueberweg, History of Philosophy, vol. I, p. 404.

49. Prantl, sozinho, utilizou-se de nada menos que 48 edições impressas.

50. Rashdall, Uni ersities in the Middle Ages, vol. I, p. 38.

CAPÍTULO VII
1. Rashdall, Uni ersities in the Middle Ages, vol. I, p. 35. Laurie, Rise and
Constitution of the Early Uni ersities, pp. 61 e ss. Ambos partilham desse
visão tradicional.

2. Hankel, Geschichte der Mathematik, pp. 304–59, esp. pp. 334, 358.

3. Por exemplo: vida de São Cristóvão, por Walter de Speyer; vida de São
Wolfgang, por Otlo de Saint-Emmeran; vida de Santo Adalberto, por
Bruno de uerfurt. Cf. Specht, op. cit., pp. 89–149, esp. 127 e ss.

4. Günther, Geschichte des mathematischen Unterrichts im deutschen


Mittelalter, p. 14.

5. Specht, op. cit., pp. 297–394; Wattenbach, Deutschlands


Geschichtsquellen im M. A., 7ª ed., pp. 241–487, passim. V. Ziegelbauer,
Historia Rei. Lit. O. S. B., I, passim.

6. Cantor, Vorlesungen über Gcschichte der Mathematik, vol. I, pp. 771–97;


Günther, op. cit., pp. 39–61, onde há referências especí cas à atividade
matemática de cada uma das escolas e pessoas mencionadas. Para listas de
obras congêneres, v. Ziegelbauer, op. cit., vol. IV, 304-411.

7. O Codex Vaticanus 3896 contém nada menos que 26 tratados sobre


aritmética em manuscritos; cf. Günther, op. cit., p. 67.
8. V. Hankel, op. cit., p. 334.

9. Günther, op. cit., pp. 81–121, 146–207.

10. O descaso tradicionalmente atribuído à Idade Média com relação à


matemática baseia-se numa suposição equivocada: que o desinteresse de
Paris, mãe das universidades, fosse partilhado pelo período como um
todo. Objete-se, no entanto, que a Universidade de Viena deu muitíssimo
valor às disciplinas matemáticas. Na verdade, o que se dava na maioria das
universidades medievais era justamente um meio-termo entre os extremos
— Paris e Viena —, de maneira que elas ofereciam uma carga razoável de
instrução matemática. Cf. Rashdall, op. cit., vol. I, pp. 440–43; Günther,
op. cit., pp. 2017 e ss.

11. Foi por meio de Boécio, tradutor e adaptador do texto, que essa forma
particular de aritmética tornou-se conhecida como boeciana. Texto de
Nicômaco na edição R. Hoche, Leipzig (1866). Para uma análise de
Nicômaco, v. Gow, Short History of Greek Mathematics, pp. 89–95.

12. Cf. Ball, History of Mathematics, p. 137.

13. H. Weissenborn, Gerbert-Beiträge zur Keniniss der Mathematik des


Mittelalters (Berlim, 1888), pp. 208–51. Cajori, History of Mathematics,
pp. 114 e ss.

14. Günther, op. cit., vol. I, pp. 797–809. A palavra “algoritmo” é derivada de
Al-Khwarizmi, nome do primeiro e mais importante matemático árabe
conhecido na Europa.

15. Existe ainda um Computus datado de 1395. Trata-se de uma interessante


coleção de textos medievais sobre aritmética, pertencente ao Sr. George
Plimpton, de Nova York.

16. Hankel, op. cit., pp. 309 e ss.

17. Cf. Günther, op. cit., pp. 64–78.


Na obra de Alcuíno sobre o cômputo, De cursu et saltu lunae ac bissexto
18. (PL 101, cols. 979 e ss.), multiplica-se CCXXXV por IV:

CC x IV — DCC
XXX x IV — CXX
V x IV — XX
DCCCCXL

Para um exemplo similar (6144: 15), v. Pseudo-Beda, De argumentis


lunae, PL 90, col. 719.

19. Eyssenhardt (ed.), livro VII, pp. 254–96. Para um exemplo mais completo
das interpretações metafísicas de Capela, v. Gow. op. cit., pp. 69. e ss.

20. V. Morgan, Arithmetical Books, pp. 3, 4, 10, 11, 13. Referências aos livros
de Boécio impressos em Paris e em Viena, o último datado de 1521. De
arithmetica libri duo (PL 63, cols. 1079–1168).

21. Cf. Günther, op. cit., pp. 82 e ss. Texto em PL 63, cols. 1079–1166 (ed.
Friedlein, 1867). Para um caso divertido de interpretação dos números, v.
Rábano Mauro, De institutione clericorum, PL 107, col. 400, onde se
explica o sentido místico no número 40.

22. De artibus, PL 70, cols. 1204–8.

23. “Tolle numerum rebus omnibus et omnia pereunt. Adime saeculo


computum et cuncta ignorantia caeca complectitur nee differi potest a
ceteris animalibus qui calculi nesciunt rationem” (Etymol. lib. XX, livro II,
cap. 4). Texto completo em PL, 82, cols. 154–63.

24. PL 90, cols. 294–578. À parte glosas e scholia, restam cerca de 80 colunas
de texto — tamanho moderado.

25. Ibid., cols. 579–606.

26. PL 101, cols. 679–1002.


27. PL 107, cols. 669–727. Como essa era a parte essencial de todos os livros-
texto do período, cabe fazer uma breve exposição do problema implicado
no cômputo eclesiástico. O objetivo do cômputo era determinar a data do
primeiro domingo seguido à primeira meia-lua depois do equinócio da
primavera. Resolvia-se o problema encontrando o chamado “número
áureo” e as “letras dominicais”, indicações, com o que se determinavam as
posições e relações nas tábuas do ciclo metônico. Ser capaz de fazê-lo
implicava conhecer: (1) o equinócio da primavera; (2) o dia da primeira
lua cheia; e (3) o ajuste necessário às tábuas do ciclo metônico. Desde os
tempos do abade Dionísio Exíguo (c. 525), resolveram-se os problemas
astronômicos e elaboraram-se sucessivas tábuas entre o mesmo Dionísio,
o abade Félix de Cyrilla, Isidoro de Sevilha e o Venerável Beda. Com o
auxílio de duas regras para as operações e o uso das tábuas referidas, a data
da Páscoa podia ser prontamente determinada. As regras eram: (1) para
encontrar o número áureo, some-se 1 ao numeral do ano — na tábua — e
divida-se a somatória por 19; o resto será o número áureo, e, não havendo
resto, o número áureo é 19. (2) “Para encontrar a letra dominical, some-se
ao numeral do ano o quociente da sua própria divisão por 4; some-se a
isso mais 4; divida-se por 7 a somatória, e o seu resto, subtraia-o de 7. O
resto determinará o lugar das letras na tábua”. A partir dessas respostas,
determinava-se a data da Páscoa com facilidade. As exigências de
conhecimento aritmético aos alunos que intentavam simplesmente
resolver esse problema não eram lá muito grandes, mas é certo que, depois
do renascimento carolíngio, todo e cada sacerdote que estudasse as artes
liberais seria capaz de entender não somente os métodos, mas também os
princípios por trás dessas operações, o que implica, além de bom
racícionio matemático, um tanto não desconsiderável conhecimento
aritmético e a astronômico. V. Smith & Chietham, Dictionary of
Christian Antiquities, entrada “Páscoa”; F. J. Brockman, “Die Christliche
Oesterrechnung”, em Systeme der Chronologie, pp. 53–83. Para uma
versão modernamente simpli cada do cômputo da Páscoa, v. Ball,
Mathematical Recreations and Problems, p. 238; Cantor, op. cit., vol. I, pp.
532 e ss; p. 780.

28. Günther, op. cit., p. 66. Entre os professores medievais que basearam as
suas obras sobre o cômputo inteiramente em Rábano Mauro, são dignos
de nota, porque demonstram a amplitude da sua in uência: Heilpric,
monge de São Galo; Hermano Contracto, Guilherme de Hirsau,
Notquero Labéu e João de Garlandia. Note-se, porém, que as suas obras,
conquanto escritas antes de Gerberto, e por isso mesmo pertencentes, em
princípio, ao segundo período da nossa classi cação, não podem ser
tomadas como índices dos métodos que então se utilizavam. uando
foram compostas, o estudo do cômputo já se havia tornado simplesmente
o estudo técnico para o cálculo da Páscoa; já não signi cava, como no
tempo de Rábano Mauro, o estudo da aritmética.

29. Assim, “Prepositiones (arithmeticae) Alcuini ad acuendos juvenis”,


coleção de problemas difíceis corretamente atribuída ao famoso professor,
se é de especial interesse sob certos pontos de vista, não pode, entretanto,
ser tomada como indicativo de que comumente se estudassem tais
problemas naquela época. O fato de Gerberto os conhecer ao nal do
século X é igualmente inconclusivo no que diz respeito à sua aplicação em
sala de aula, haja vista que Gerberto foi o gênio matemático do seu tempo.
Esses problemas pertencem à mesma classe dos jogos matemáticos que
eram conhecidos de tão poucos. Texto em PL 101, col. 1143. Cf. Hankel,
op. cit., p. 310, nota. Referências completas aos jogos matemáticos
medievais em Günther, op. cit., p. 88, nota 1.

30. PL 90, cols. 682–709. V. Karl Werner, Beda der Ehrwilrdige und seine Zeit
(Viena, 1875), pp. 107 e ss., citado em Günther, op. cit., p. 5.

31. Hankel, op. cit., pp. 307–10.

32. Nagl, “Gerbert und die Rechenkunst des 10 ten Jahrhunderts”, em


Sitzungsberichte der Hist. Philol. Class, der Kais. Akad. der Wiss, vol.
CXVI, pp. 861–922; Friedlein, “Das Rechnen mit Columnen vor dem 10
tem Jahrhundert”, em Zeitschrijt fur Math. u. Phys., vol. IX, pp. 297–330,
esp. pp. 320 e ss.

33. Weissenborn, Gerbert-Beiträge sur Kenntniss der Maihematik des


Mittelalters, pp. 209–239, esp. 233.
34. Cantor, Vorlesungen, vol. I, pp. 797 e ss, onde resumem-se os pontos
históricos da controvérsia.

35. Richer, Hist. Lib., MGH-SS 3, pp. 618 e ss.

36. Últimas edições críticas em Bubnov, Gerberti opera Mathematica (Berlim,


1899). Pode-se inferir a extensão da in uência dessas obras pela vasto
número de manuscritos ainda existentes, os quais são enumerados pelo
editor (op. cit., pp. 17–111, passim).

37. Cajori, History of Mathematics, p. 117. O seu caráter mecânico revela-se


em algumas regras que Gerberto nos oferece: (1) o uso da multiplicação
restringia-se o quanto possível, e jamais deveria pedir a multiplicação de
um número de dois dígitos por outro; (2) tinha-se de evitar a subtração e,
na medida do possível, substituí-la pela adição; (3) as operações tinham
todas de proceder mecanicamente, sem espaço para juízos. V. Hankel, op.
cit., pp. 319 e ss, onde há exemplos concretos de divisão por esse método.
A ilustração mais complicada é dada em Friedlein, Die Zahlzeichen und
das elementar Rechenen der Griechen und Römer und des Christlichen
Abendlandes nom 7 ten bis 13 ten Jahrhundert, pp. 109–34.

38. Cajori, op. cit., p. 119.

39. Cf. Günther, op. cit., pp. 99–110. Cantor, Mathematische Beiträge zum
Kulturleben der Völker, pp. 330–40.

40. Boncompagni, Bulletino di Bibliografia e di storia delle scienze


matematiche e fisiche, vol. X, pp. 643–47. Parte de uma coleção de sete
textos sobre o ábaco (loc. cit., 595–647). Dois textos similares, do século
XII, constam em op. cit., vol. XV, 135–62. Sobre outros abacistas do período,
v. Cantor, op, cit., vol. I, pp. 831–36.

41. Hist. lit. de la France, VII, pp. 89 e ss. Texto e crítica em Nagl, Suplemento
a Zeit. für Math. u. Phys., vol. XXXIV, pp. 129–46, 161–70.

42. Boncompagni, X, 593–607. Sobre outros abacistas do século XII, v.


Cantor, op. cit., pp. 843–48; Günther, op. cit., pp. 92–106.
43. Cantor, Beiträge, p. 338; Cajori, op. cit., p. 119.

44. Textos, Boncompagni, Bullettino, vol. XIV, pp. 91–134; Boncompagni,


Trattati di aritmetica, pp. 1–23. Fragmento da sua obra sobre
multiplicação e divisão em Zeit. für. Math. u. Phys., XXV, Suplemento, pp.
132–39.

45. Crítica da obra em Steinschneider, Zeit. für. Math., vol. XXV, suplemento,
pp. 59–128.

46. Boncompagni, Trattati d’aritmetica pp. 25–136.

47. Cantor, op. cit., vol. I, p. 853.

48. Texto e crítica em Cantor, Zeitsch. f. Math. u. Phys., X, pp. 1–16.


Encontra-se um texto similar, composto no mesmo século e procedente
de monastério próximo de Ratisbona, em Curtze (ed.), Zeitsch., XLIII,
Suplemento, pp. 1–23. A existência desses manuscritos mostra que,
mesmo nos dias de declínio, algumas escolas monásticas mantiveram-se
atualizadas com o estado da arte em aritmética.

49. Wüstenfeld, “Die Übersetzungen arabischer Werke in das Lateinische seit


dem 11 ten J. H”. Abhand. König. Gesel. d. Wiss. zu Göttingen, vol. XXI,
passim., esp. pp. 20–38; 50–96.

50. Günther, op. cit., pp. 131–41; Cantor, Vorlesungen, vol. II, pp. 110, 216 e
ss.; F. Unger, Die Methodik der practischen Arithmetik, pp. 1–33.

51. Cantor, op. cit., vol. II, pp. 3–35.

52. Ibid., 167, 205.

53. Cantor, op. cit., vol. II, p. 86, localizou manuscritos de Jordano em
Basiléia, Cambridge, Dresden, Erfurt, Munique, Oxford, Paris, Roma,
orn, Veneza, Viena e em diversos pontos no Sul da Alemanha.
54. Impresso em 1534. Por muito tempo essa obra foi erroneamente atribuída
a Regiomantus. Cf. Cantor, op. cit., vol. II, pp. 49–61; Morgan, op. cit., p.
16.

55. Impresso em 1514. Cf. Morgan, op. cit., p. 10; Cantor, loc. cit.

56. A melhor edição é a de Treutlein, em Zeit. für Math. u. Phys. XXXVI,


Suplemento, pp. 127–66.

57. A primeira obra mencionada é um breve tratado de aritmética prática. Em


cerca de 57 páginas, explica o sistema arábico de notação e os métodos de
operação, entre os quais o autor inclui nove: numeratio, additio,
subtractio, duplicatio, multiplicatio, mediatio, divisio, progressio e radicum
extractio. O caráter representativo desse livro ajudou na sua classi cação,
que tantas vezes observamos em livros populares de aritmética por toda a
Europa. Espaço considerável, algo em torno de dois quintos da obra, é
dedicado ao tratamento de dois tipos de frações, as “minutiae
philosophicae” ou “minutiae physicae”, isto é, as frações astronômicas, e as
“minutiae vulgares”, ou frações comuns. No que toca às primeiras, o texto
é bastante completo; há inclusive algumas páginas sobre proporção. A
segunda obra é de um caráter todo outro. Os 10 primeiros livros tratam
sucessivamente de propriedades numéricas, relações, números primos e
perfeitos, números poligonais, sólidos, redundantes, proporções e outras
classi cações igualmente re nadas. Aqui, mais uma vez, os números são
tratados da mesma forma que na obra de Boécio. Todavia, como
observado por Cantor (op. cit., vol. II, pp. 61 e ss), a obra tem um valor
cientí co diferenciado, na medida em que é o primeiro livro a empregar,
em vez de números concretos, letras como símbolos gerais. A terceira obra
consiste em quatro livros de problemas algébricos e aritméticos, cujas
resoluções envolvem, além do estudo das proporções, equações simples e
quadráticas com uma ou mais variáveis.

58. Rashdall, op. cit., vol. I, p. 437, nota 1.

59. Rashdall, op. cit., p. 249.

60. Cantor, op. cit., vol. II, p. 140.


61. Mon. Uni . Prag., I, 1, pp. 56, 77 (citado Rashdall, p. 442, nota 3).

62. Compilado por Günther, op. cit., p. 209, de Aschbach, Geschichte der
Wiener Uni ersität im ersten Jahrhundert ihres Bestehens. V. ibid., I, pp.
137–68, passim.

63. Günther, op. cit., pp. 210–11; Cantor, op. cit., vol. II, pp. 140, 174 e ss.

64. Günther, op. cit., p. 215. Cf. Hankel, op. cit., p. 357. Em Leipzig, podia-
se “ouvir” o algorismo de qualquer bacharelando, mas o mesmo não se
dava com nenhuma outra matéria. V. “Tabula pro gradu Baccalauriatus”,
em Zarncke “Die Urkündlichen uellen zur Geschichte der Univ.
Leipzig”, Abhandl. der Kön. Sachs. Gesell. der Wiss. Phil. Hist. Class., vol.
II, p. 862. Esse fato reforça o argumento de que a instrução no algorismus
fosse apenas uma disciplina elementar.

65. V. De Bianco, “Statua Facultatis Artium”, em Die Alte Uni . Köln, anexo
II, pp. 438–43. Cf. Hankel, op. cit., p. 357; Cantor, op. cit., vol. II, p. 442.

66. Impresso pela primeira vez em Paris, 1496. Entre outros títulos, passou
também por Opusculum de praxi numerorum quod algorismum ocant
(Paris, 1511) e Algorismus domini Joannes de Sacrobosco (Veneza, 1523).
Cf. Morgan, op. cit., pp. 13–4; Günther, op. cit., pp. 176 e ss.
Manuscrito-cópia X510 H74, pp. 211–22, Library of Columbia
University, Nova York.

67. Tal se evidencia na existência de comentários a obra de Sacrobosco,


dentre os quais um da autoria de Petrus de Dacia é descrito por Cantor
(op. cit., vol. II, p. 90) e Günther (op. cit., p. 167, nota 2).

68. Impressão em Paris e Viena em 1495 e 1502, respectivamente. Cf. Cantor,


vol. II, p. 113; Morgan, op. cit., p. 11. O tratado sobre proporções,
resumido por Alberto da Saxônia no nal do século XIV, foi usado como
livro-texto na maioria das universidades. A obra de Jordano era muito
difícil, por causa da sua notação simbólica. Cf. Rashdall, op. cit., vol. I, p.
442, nota 3.
69. Edição crítica em Zeitsch. für Math. u. Phys., XIII, Suplemento, pp. 65–73.
Breve resumo das obras de Oresme Curtze, Die mathematischen Schri en
des Nicolas Oresmus. O grande número de manuscritos ainda existentes
comprova a sua ampla utilização. Como a obra de Bradwardinus, foi
certamente livro-texto nas universidades germânicas.

70. Os três livros da obra são organizados logicamente: o primeiro trata das
de nições de frações em que todas as regras se apresentam em termos
simbólicos; o segundo oferece exemplos concretos e problemas para a
aplicação das regras; e o terceiro lida com proporções geométricas. A
similaridade essencial entre essa obra o Tractatus de proportionibus de
Bradwardinus revela que ambos os autores se utilizaram, e de maneira
idêntica, da mesma fonte: Jordano. Cf. Cantor, op. cit., vol. II, p. 137.

71. Günther, op. cit., p. 183, nota 1. Cf. Morgan, op. cit., pp. 3, 11.

72. Impresso em 1515. Cf. Morgan, op. cit., p. 11. Cantor, Vorlesungen, vol. II,
p. 177; Günther, pp. 232 e ss.

73. Impresso em 1492 como Opus algorithms jucundissimum. Sobre outras


edições, v. Günther, op. cit., p. 237; Morgan, op. cit., p. 11.

74. Publicada em 1483 e 1540, em Pádua. V. Favaro, em Bulletino,


Boncompagni, t. XII, p. 60.

75. Citado em Rashdall, op. cit., vol. I, p. 440, nota 3.

76. No começo do século XVI, era costume publicar tratados aritméticos que
reunissem todos esses textos. Para uma descrição de alguns desses, v.
Morgan, op. cit., pp. 10–1.

CAPÍTULO VIII
1. Cantor, Vorlesungen, vol. I, p. 522. Mais detalhes em Cantor, Die
römischen Agrimensoren und ihre Stellung in der Geschichte der
Feldmesskunst. Leipzig, 1875.

2. De nuptiis, Eyssenhardt (ed.), pp. 194–254.

3. PL 70, 1212–16.

4. PL 82, 161–3.

5. Cf. Hankel, op. cit., pp. 312 e ss; Günther, op. cit., p. 14.

6. Günther, loc. cit.

7. De uni erso libri vigintiduo, PL 111, cols. 9–612 passim, esp. livros VI–X.

8. V. Pez, es. 3, III, 630; Specht, 143–49.

9. Cf. Specht, loc. cit.; Günther, op. cit., pp. 73 e ss., 115 e ss.

10. A geometria de Boécio por anos constituiu uma Streit age entre os
historiadores da matemática. O fato de o uso de apices, do ábaco e da
multiplicação por colunas ser explicado entre o primeiro e o segundo
livros no manuscrito mais antigo, que data do século XI, principiou a
controvérsia em torno da origem do ábaco e da introdução do que
podemos chamar notação hindu-arábica. Nessa controvérsia, os
principais historiadores da matemática, Kastner, Chasles, Martin,
Friedlein, Weissenborn e Cantor, entre outros, tomaram lados diferentes
— alguns chegando ao ponto de negar a Boécio a autoria dos livros sobre
geometria. O peso da autoridade (Cantor, Vorlesungen, vol. I, 540–51)
parece con rmar que Boécio foi o autor da geometria contida nesses
manuscritos. Naquilo que diz respeito a todos, porém, todos concordam:
sendo ou não sendo de Boécio a autoria dos originais, é certo que esses
livros-texto não foram usados nos dias de Gerberto. Texto de Boécio em
PL 63, cols. 1037–64.
11. Chasles, Geschichte der Geometrie, trad. Sohncke, p. 524. O último cotejo
das fontes de Boécio consta em Weissenborn, Zeit. f. Math,u. Phys. vol.
XXIV (1879), e sustenta a opinião de que Boécio lançara mão de um
excerto de Euclides, e não do original.

12. Bubnov, Gerberti opera mathematica, pp. 48–97.

13. Cf. Günther, op. cit., pp. 115 e ss; Cantor, op. cit., I, 809–824; Gow, op.
cit., pp. 205–6.

14. Cf. Jourdain, Recherches sur les traductions latines d’Aristote, 1ª ed. (Paris:
1819), p. 100; Hankel, op. cit., p. 335. Cf. Weissenbom, in Zeit. f. Math.
u. Phys. vol. XXV, suplemento, pp. 141–66. Essa obra passou pelo século
como uma tradução original de Campano, e foi a primeira das edições
latinas de Euclides, publicada em 1482. Referências a Geraldo em Ball,
op. cit., p. 172.

15. Sobre o texto de Jordano de Nemi, v. Curtze (ed.), orn: 1887. Cf.
Cantor, op. cit., I, pp. 670, 852, notas 1 e 2.

16. Cf. Rashdall, op. cit., I, pp. 250, 442; Hankel, op. cit., pp. 356 e ss.;
Günther, op. cit., pp. 199, 209 e ss., 215, 217, 281. É incorreta a a rmação
de Compayré (Abelard and the Origin, and Early History of Uni ersities,
p. 182), de que apenas o Euclides de Boécio foi ensinado nas
universidades. Os estatutos de Viena para o ano de 1389, aos quais nos
referimos e citamos, dizem claramente: “cinco livros de Euclides”. É óbvio
que isso não pode signi car a geometria de Boécio, que tinha apenas dois
livros. V. Kollar, Statua Uni ersitatis, Vieniensis, I, p. 237, citado em
Mullinger, e Uni ersity of Cambridge, p. 351.

17. Kastner, Geschichte der Mathematik, I, p. 260.

18. Essa disciplina foi desenvolvida por Nicolau Oresme em Tractatus de


latitudinibus formarum e Tractatus de uniformitate et deformitate
intensionum.
19. Cf. Trop e, Geschichte der Elementar-Mathematik, II, pp. 407 e ss.
Günther, op. cit., pp. 181, 199, 210, 211.

20. Günther, loc. cit.

21. Cantor, Vorlesungen, vol. II, pp. 35–40, 73–86, 113–118, 128–137. Cf.
Curtze em Zeitsch. f. Math. u. Phys. XIII, suplemento pp. 79–104.

22. Günther, op. cit., p. 162; Cajori, op. cit., p. 134.

23. Isso é contestado por Hankel, op. cit., p. 349; e Compayré, op. cit., p. 182.

24. Cf. Smith, Teaching of Elementary Mathematics, p. 229, nota 1 e 2; Ball,


History of Mathematics, pp. 56–64.

CAPÍTULO IX
1. Citado em Wolf, Geschichte der Astronomie, p. 82.

2. Um caso marcante é o Liber computus de Rábano Mauro: 42 dos 96


capítulos contêm material puramente astronômico, em nada pertinente à
questão da Páscoa. V. PL 107, cols. 669–726.

3. Por exemplo, Pedro Lombardo, Sent. 2, I, 8; 4, I, 6–7; Tomás de Aquino,


Summa Ia, q. 70 (citada em White, Warfare of Science and eology, vol. I,
p. 117.

4. Suter, Die Mathematik auf den Uni ersitäten des M. A., III, esp. pp. 64, 67,
73, 77, 79, 89; Günther, op. cit., pp. 184–90, 199, 210, 215, 217. Cf.
Barnard, Superior Instruction, pp. 159–60.

5. Suter, op. cit., pp. 65–95, oferece extensas considerações sobre o ensino
da astronomia elementar em todas as mais importantes universidades. Cf.
Günther, op. cit., pp. 146 e ss; Wolf, op. cit., pp. 197–218. Maedler,
Geschichte der Himmelskunde, pp. 113–46, trata da astronomia avançada
no nal do século XIV e no início do século xv. Cf. Hankel, op. cit., p. 349.

6. V. De Nuptiis, Eyssenhardt (ed.), pp. 296–330.

7. V. PL 70, cols. 1216–18.

8. Supõe-se que Isidoro de Sevilha levou o mundo medieval a adotar a noção


grega da esfericidade da Terra, não obstante essa mesma noção contrariar
as dos teólogos patrísticos. Cf. White, op. cit., I, pp. 88–99.

9. PL 82, cols. 169–84.

10. Ibid., livro v, caps. 38–9; livro VI, cap. 17; livro VIII.

11. Gunther, op. cit., p. 8, nota 1; PL XC, cols. 187–277, 293–578.

12. PL 101, cols. 979–1001.

13. Rábano Mauro, De institutione clericorum, III, p. 25 (PL 107, cols. 403).
Seu De uni erso traz muito material astronômico, esp. livro IX, 10. Cf. p.
94.

14. Esses livros-texto contêm uma grande quantidade de material grego.


Várias edições de cada obra mencionada são anteriores ao advento da
imprensa. V. Wolf, op. cit., pp. 192, 201–2. Para outras referências aos
escritos cosmológicos do período, v. Peschel, Geschichte der Erdkunde, pp.
93–100.

15. Cf. Günther, op. cit., pp. 75–8; Specht, p. 138; Günther, Didaktik der
mathematischen Geographie, pp. 6 e ss. A obra é: B. Hermanni Contracti
monachi Augiensis de utilitatibus astrolobii libri II, em Pez (ed.), esaurus
anecdotorum no issimus, III, vol. II, cols. 110 e ss. A anedota de Gerberto é
um tradicional lugar-comum. Hermano Contracto também escreveu
alguns outros livros-texto de astronomia — De eclipsis e De computo, por
exemplo. Dentre os escritos menores dessa época, podemos mencionar
Astronomicarum institutiones, de Guilherme de Hirsau (1080), De
computatione temporum, de Clemens Langton, o mesmo autor de De
orbibus coelestibus (v. Maedler, op. cit., vol. I, p. 106). Sobre a obra de
Guilherme de Hirsau, v. Prantl, Sitzungs. der Königl. Bay. Akad. der
Wissen. zu München, vol. I, pp. 1–21.

16. Berry, History of Astronomy, pp. 76–85; Ball, op. cit., p. 172; Wolf, op.
cit., pp. 193–200, 203–8; Günther, op. cit., pp. 146–9.

17. “Tractatum de sphaera quatuor capitulis distinguimus. Dicturi primo


compositionem sphaerae, quid sit sphaera, quid sit eius centrum, quid
axis sphaerae, quid sit polis mundi, quot sint sphaerae et quae sit forma
mundi. In secundo, de circulis ex quibus sphaera materialis compositur et
ilia super coelestis (quae peristam imaginatur) componi intelligitur. In
tertio, de ortu et occasu signorum et de diversitate dierum et noctium et
de divisione climatum. In quarto, de circulis et motibus planetarum et de
causis eclipsium” (Libellus de sphaera, ed. Melanchton [1531], p. 1). O
livro, repleto de ilustrações, foi composto em 1250, e também foi
conhecido como De sphaera mundi e Sphaera materialis. A biblioteca da
Columbia University, Nova York, abriga as seguintes edições:
Württemberg, 1545, 1550, 1558, 1578; Veneza, 1490, 1537, 1564; Paris,
1500. Ademais, possui um interessante manuscrito anotado por Jean de
Murs.

18. Wolf, op. cit., p. 209.

19. V. nota 2, p. 120.

20. V. Sacrobosco, op. cit., Praefatio Melanchtonis.

21. Rashdall, op. cit., I, pp. 250, 442; Suter, op. cit., pp. 76–7.

22. Suter, op. cit., p. 67; Wolf, op. cit., pp. 160–6, onde é traçada a história do
manuseio do astrolábio e do planisfério.

23. Berry, op. cit., pp. 86, 87, 94; Wolf, op. cit., p. 211. Além desse tratamento
teórico da astronomia, outras duas fases da matéria, ambas práticas,
ensinavam-se: seminários sobre o cômputo, para atender à necessidade
prática dos clérigos — esses formavam boa parte do corpo discente —, e
cursos sobre astrologia, especialmente, na Itália, onde a disciplina
realmente fazia parte do currículo.

CAPÍTULO X
1. Cf. Ambros, Geschichte der Musik, vol. II, pp. 119 e ss. A tendência
medieval a classi car a música como ciência teórica, como uma parte da
matemática a ser estudada depois da aritmética, foi meticulosamente
rastreada até romanos como Cícero. V. Schmidt, uaestiones de musicis
scriptoribus Romanis, imprimis de Cassiodoro et Isidore (1899). Essa idéia a
respeito do que a nal constituía um músico não assentava simplesmente
em teóricos como Boécio, o qual, por sua vez, não tinha conhecimento
algum da arte musical. Os professores de música prática, que trabalhavam
para aprimorar os métodos de ensino conforme às necessidades da Igreja,
tinham a mesma visão. Assim Aureliano de Reome (século IX), diz:
“Tantum inter musica distat et cantorum, quantum inter grammaticum et
simplicem lectorem [...]. Is vero est musicus qui ratione per pensa
scientiam canendi non servitio operis sed imperio assumpsit
speculationis”. V. Gerberto, Scriptores de musica sacra, I, pp. 38–9. Outros
professores práticos, como Hucbald, cuja obra representa um passo no
desenvolvimento do sistema de notação, Regino de Prum, Berno
Hermano Contracto, Guilherme Hirsau e Guido d’Arezzo, acompanham
Aureliano. V. Brambach, “Verhältniss zwischen Musik theorie und Praxis
im Mittelalter”, em Die Reichenauer Sängerschule. Cf. Ambros, II, pp. 40 e
ss. A a rmação de Williams (Story of Notation, pp. 73–4), sobre Guido
d’Arezzo citar com freqüência uma estrofe sobre o que faz um músico
(Gerberto, op. cit., I, p. 25), foi feita com sarcasmo — e é insustentável.

2. Entre as questões espinhosas nesse campo estão: o tamanho da in uência


do Papa Gregório Magno sobre o desenvolvimento do chamado canto
gregoriano; a originalidade dos serviços prestados por Hucbald e Guido
d’Arezzo; o desenvolvimento da notação musical; se havia ou não havia,
na Idade Média, harmonia musical tal como nós a de nimos. Os
trabalhos mais atualizados no que diz respeito a essas questões são de
Hugo Riemann, Geschichte der Musiktheorie e Studien zur Geschichte der
Notensckri . V. Williams, e Story of Notation (1903). A obra de
Franchinus Gaforius, ericum opus armonicae disciplinae, é, ao que tudo
indica, o primeiro livro-texto representativo da nova tendência do
Renascimento. Cf. Matthews, Literature of Music, p. 21.

3. Por outro lado, a in uência que o estudo teórico da música exerceu sobre
a arte musical não pode ser ignorada. O simples cotejo dos nomes
considerados importantes para o desenvolvimento da arte musical com os
nomes dos teóricos mais famosos revela a presença dos mesmos nomes em
ambas as listas. Esta pode ser tomada como um index da in uência do
teórico sobre a prática. Parece ter havido na Idade Média uma ciência e
uma arte da música, sendo primeira uma parte do quadrivium, e que
muitos professores práticos, como Hucbald, Berno de Reichenau, Odão,
Hermano Contracto, Guido d’Arezzo e João Coto, foram também
teóricos reconhecidos. Cf. Brambach, Das Tonsystem und die Tonarten des
christlichen Abendlandes im Mittelalter, passim. Cf. Riemann, Geschichte
der Musiktheorie, pp. 50–96; Ambros, op. cit., II, pp. 92–216.

4. O progresso só foi possível com o gradual abandono, no século XI, das


teorias gregas parcialmente transmitidas — e em alguns casos
incorretamente transmitidas — por Boécio. Historiadores da teoria
musical parecem concordar em que o vulto Boécio di cultou muito o
desenvolvimento da música teórica na Idade Média. Cf. Brambach, Die
Musik Literatur des Mittelalters, pp. 13–24; Ambros, op. cit., II, p. 41.

5. Nauman, e History of Music, vol. I, pp. 168 e ss.; Langhans, Die Musik
Geschichte, pp. 11–7.

6. Cf. Rábano Mauro, De institutione clericorum, III, cap. 24, cols. 401 e ss.,
PL 107.

7. Cf. Specht, op. cit., p. 140; Ambros, op. cit., vol. II, pp. 96 e ss.
Schubinger, Die Sängerschule St. Gallens, passim, esp. pp. 86 e ss.
8. Brambach, Die Sängerschule zu Reichenau im Mittelalters, passim;
Schubiger, op. cit., passim.

9. V. Gerbert, Scriptores ecclesiastici de musica, 3 vols. (St.-Blais, 1784);


Coussemaker, Scriptorum de musica medii aevi, 4 vols. (Paris, 1864–67).
Essas duas coleções nem de longe esgotam o assunto. Desde então foi
encontrada uma série de tratados da primeira Idade Média. Cf.
Brambach, Die Musik Literatur des M. A. (1883), pp. 5 e ss.

10. Referências detalhas em Rashdall, op. cit., I, p. 443. V. Suter, op. cit., pp.
76– 7, 79–80, 91; Günther, op. cit., pp. 199, 210–11, 215.

11. Parcialmente em Gerberto, op. cit., I; Coussemaker, op. cit., II.

12. V. Capela, em Eyssenhardt (ed.), pp. 331–75; Cassiodoro, em PL 70, cols.


1208–12; Isidoro, PL 82, cols. 163–9.

13. V. Brambach, Die Musik Literatur, pp. 7, 9. Schmidt registra a existência


de 27 manuscritos de Isidoro (op. cit., pp. 17–20).

14. Texto em PL 63, cols. 1166–1300. Utilizei-me da tradução alemã de O.


Paul (Leipzig, 1872), que me permitiu usar o comentário, maior que o
texto, sem o qual até Günther declarou-o ininteligível. Cf. Günther, op.
cit., p. 112.

15. “Is vero est musicus qui ratione perpensa, canendi scientiam, non servitio
operis, sed imperio speculationis assumit [...]. Isque musicus est cui ad est
facultas secundum speculationem rationemque propositam ac musicae
convenientem de modis ac rythmis de que generibus cantilenarum ac de
permixtionibus ac de omnibus de quibus posterius explicandum est ac de
poetarum carminibus judicandi”. Boécio, De musica, livro I, caps. 43, 63,
cols. 1596.

16. V. tabelas de Brambach sobre a origem boeciana dos primeiros livros-


texto medievais (Die Musik Litteratur, passim). Indica-se a procedência
das partes de cada texto referido.
17. Scriptoris, I, pp. 27–63.

18. Ibid., pp. 63–94.

19. Ibid., pp. 104–52. Cf. Ambros, op. cit., II, pp. 122 e ss. Para os tratados de
Notker e de outros professores de música do período, v. Gerberto,
Scriptoris, I–II, passim.

20. V. Brambach, Die Musik Litteratur, pp. 15 e ss. Texto de Bernelinus em


Gerberto, Scriptoris, pp. 313–330.

21. Riemann, Geschichte der Musiktheorie, pp. 235 e ss. As referências citadas
na p. 132, nota 1, mostram que os pré-requisitos eram “aliquis musica” ou
“musica de Muris”. Para o texto de Murs, v. MS. x510-h74, Columbia
University, Nova York.
Bibliogra a crítica

O S títulos abaixo foram consultados durante a preparação desta monogra a.


Alguns foram já criticados brevemente, e outros de maneira mais completa,
tanto no corpo do texto como nas notas ao m do livro. Por isso levam notas
críticas apenas aqueles que demandam mais detalhamento.
FONTES PRIMÁRIAS

Abelardo, P. Ouvrages inédites. Ed. Cousin. Em Collection de Documents Inédits


sur l’Histoire de France. Paris: 1836.
Contém elaborada introdução crítica.

Alberto Magno. Opera. Edição de 1651, t. 1.

Alcuíno. De Cursu et Saltu lunae ac Bissexto. Ed. Migne. Patrologia Latina


[doravante PL] 101.

________. De dialectica. PL 101.

________. De fide sanctae et individualis Trinitatis libri tres. PL 101.

________. De rhetorica et de virtutibus. PL 101.

________. Liber de Ratione Computi. PL 101.

Alexander de Villa-Dei. Doctrinale. Ed. Reichling. Monumenta Germaniae


Paedagogica, 12. Berlim: 1893.

Anselmo, Santo. Dialogus de Grammatico. PL 158.

________. Monologium. PL 158.

________. Prosologium. PL 158.

Arnulfo. Deliciae cleris. Ed. J. Huemer. Em Romanische Forschungen, vol. 2.

Aristóteles. Politics. Trad. B. Jowett. Oxford: 1885.

Agostinho, Santo. Ars (grammatica) breviata. Ed. Keil. Grammatici latini, vol. 5.

________. De Doctrina Christiana. PL 34.


________. De Rhetorica. Ed. Halm. Rhetores Latini Minores.

Agostinho, Santo (Pseudo). Principia Dialecticae. PL 32.

Beda, o Venerável. De natura rerum. PL 90.

________. De temporum ratione. PL 90.

________. Liber de schematibus et tropis. Ed. Halm. Rhetores Latini Minores.

________. (Pseudo) De numerorum divisione libellus; De loquella per gestum


digitorum et temporum ratione libellus; De unciarum ratione. PL 90.

Boécio. De arithmetica libri duo. PL 63.

________. De musica libri V. Ed.-trad. O. Paul. Leipzig: 1872.

________. Interpretatio Euclidis Geometriae libri duo. PL 63.

________. Opera philosophica. PL 64.

Capela, M. De nuptiis Philologiae et Mercurii. Ed. F. Eyssenhardt. Leipzig: 1866.

Cassiodoro. De artibus et de disciplinis liberalium literarum. PL 70.

Catholicon (seleções). Ed. A. Scheler. Em Memoires couronnées de l’Académie


Royale de Belgique, vol. 37. Bruxelas: 1886.

Catonis disticha de moribus. Em James Wright, Sales Epigrammatum. Londres:


1663.

Cícero. De Oratore. Trad. J. S. Watson. Londres: 1896.

________. Opera. Ed. I. C. Orellus. Turim: 1845.

Corpus Glossariorum Latinorum. Ed. G. Lowe, vol. 3–5. Leipzig: 1892.


Coleção monumental de dicionários latinos. Ainda incompleta, superou
todas as tentativas anteriores.
D’Andeli, Henri. “La Bataille des sept arts: ction, critique et satirique”. Em
Notices et extraits des manuscripts de la Bibliotheque Nationale, vol. 5, pp. 496–
510.

Donato, A. Ars grammatica major. Ed. Keil. Grammatici latini, vol. 4.

________. Ars grammatica minor. Ed. Keil. Grammatici latini, vol. 4.

Du Méril, M. E. P. Poésies inédites du Moyen Âge. Paris: 1854.


Contém um ensaio sobre as fábulas de Esopo e uma coleção de outras
histórias e poemas populares.

Egberto de Liège. Fecundia ratis. Ed. E. Voigt. Halle: 1889.

Elfrico. Colloquium ad pueros linguae latinae locutione exercendos. Ed. orpe.


Analecta Anglo-Saxonica. Londres: 1846.

Erígena, J. E. De divisione Naturae. PL. 122.

Everaldo of Béthune. Laborinthus. Ed. P. Leyser. Em Historia Poetarum et


Poematum Medii Aevi. Halle: 1721.
Parcialmente reproduzido em Mari Giovani (ed.), Trattati medieavali de
ritmica latina (Memorie del Reale Instituto Lombardo, t. 20, Milão).

Gerberto (Papa Silvestre II). Opera Mathematica. Ed. B. Bubnov. Berlim: 1899.

Halm, C. F. (org.), Rhetores latini minores. Leipzig: 1863.


A única coleção completa dos manuais retóricos latinos; em termos de rigor
acadêmico, tão boa quanto a coleção de gramáticas editada por Keil. Contém a
maioria dos tratados sobre técnica retórica referidos nesta monogra a.

Hermano Contracto. De utilitatibus astrolobii liber. esaurus Anecdotorum


Novissimus, 3, II.

Hervieux, L. Les Fabulistes latins depuis le siécle d’Auguste jusqu’ la fin du Moyen


Âge. 5 vols. 1893–1899.
A investigação mais completa, acima de todos os demais trabalhos sobre o
assunto. Além das análises, traz ainda as íntegras dos textos.

Honório de Autun. De animae exsilio et patria alias De Artibus. PL 172.


Umas das poucas fontes autênticas a detalhar o escopo do currículo medieval
no século XII.

Hugo de Trimberg. Registrum multorum auctorum. Ed. J. Huemer. Em


Sitzungsberichte der philologisch-historischen Classe der Kaiserlichen Akademie der
Wissenscha , vol. 126. Viena.

Interpretes veteres Virgilii Maronis. Ed. Mai. Classici Auctores e Vaticanibus


Codicibus, t. 7. Roma: 1835.

Isidoro de Sevillha. Etymologiae libri XX. PL 82.

João de Garlandia. Poetria de arte prosaica metrica et rithmica. Ed. G. Mari.


Romanische Forschungen, vol. 23.

João de Salisbury. Polycraticus. PL 199.

________. Metalogicus. PL 199.

Jordano de Nemi. Geometria vel de triangulis libri IV. Em Mitheilungen des


Copernicus-Vereins für Wissenscha und Kunst. orn: 1887.
Primeira edição comentada do texto. A introdução apresenta uma lista das
obras de Jordano. Diagramas no apêndice; 71 proposições demonstradas.

________. De Numeris Datis. Ed. P. Treutlein. Em Zeitschri für Mathematik


und Physik, vol. 23 (suplemento).

Carlos Magno. Capitula de doctrina clericorum. Monumenta Germaniae Historica.


Leges I, pp. 107–8.

Grammatici latini. 7 vols. Ed. H. Keil. Leipzig, 1857–1880.


A única coleção completa das gramáticas latinas mais usadas; obra de um
eminente lólogo. Contém a maioria dos textos sobre gramática abordados no
texto.

“Kleine lateinische Denkmaler der iersage”. Ed. E. Voigt. Em Quellen und


Forschungen zur Sprach und Kultur Geschichte der germanischen Volker.
Coleção de fontes importantes, apesar de escassas.

Langlois, C. V. “Formulaires des lettres du XII, du XIII et du XIV siècle”. Em Notices


et extraits des manuscrits de la Bibliothèque Nationale, t. 34–35.
Edição crítica.

Monroe, P. Sourcebook of the History of Education for the Greek and Roman
Periods. Nova York: 1902.
Compilação de fontes, com introduções e comentários. Organizada para o
m de mostrar a evolução das teorias educacionais.

Nagl, A. “Eine Algorismusschri des XII Jahrhunderts”. Em Zeitschri für


Mathematik und Physik, vol. 34, pp. 129–146, 161–170.

Nicole Orestne. Algorismus proportionum. Ed. M. Curtze. Em Zeitschri für


Mathematik und Physik, vol. 13 (suplemento).

Nicomachi Geraseni Pythagorei introductionis Arithmeticae libri II. Ed. R. Hoche.


Leipzig: 1866.

A única fonte disponível — e em grego — desse texto fundamental.

Nicolau de Bibera. Carmen satiricum. Ed. T. Fisher. Em Geschichtsquellen der


Provinz Sachsen. Halle: 1870.

Notices et extraits de divers manuscripts latins pour servir à l’histoire des doctrines
grammaticales au Moyen Âge. Ed. M. urot. Notices et Extraits des Manuscripts
de la Bibliothdque Nationale. Paris, t. XXII, pt. 2.
Contém material original de grande valor.

Notquero. Opera. Em H. Hattemer (ed.), Denkmaler des Mittelalters. São Galo:


1844–1849.
Otlo de Saint-Emmeran. De doctrina spirituali liber metricus. Ed. B. Pez.
esaurus Anecdotorum Novissimus, t. 3.

________. Liber proverborum. Ed. B. Pez. esaurus Anecdotorum Novissimus, t.


3.

Paulo Diácono. Sexti Pompei festi de verborum significatu quae super-sant cum
Pauli epitome. Ed. A. D. ewrevvk. Budapeste: 1889.

Platão. Republic. Trad. B. Jowett. Em Dialogues of Plato, vol. 3. Oxford, 1875.

Prisciano. Institutio de arte grammatica. Ed. Keil. Grammatici latini, vols. 2–3.

________. Partitiones duodecim versuum Aeneidos principalium. Ed. Keil.


Grammatici latini, vol. 3.

Prudêncio. Cathemerinon. Trad. E. G. Smith. Londres e Nova York: 1898.

________. Psychomachia. Ed. J. Bergman. Upsala: 1897.

uintiliano. Institutes of Oratory. Trad. J. S. Watson. 2 vols. Londres: 1882.

Rábano Mauro. De institutione clericorum. PL 107.

________. Excerptio de Arte Grammatici Prisciani. PL 111.

________. De Uni erse Libri Vigintiduo. PL 111.

________. Liber de computo. PL 107.

Richer. Historiarum libri IV. Monumenta Germaniae Historica, Scriptores, t. 3

Röckinger, L. “Briefsteller und Formelbucher des El en bis Vierzehnten


Jahrhunderts”. Em Quellen zur bayerischen und deutschen Geschichte, vol. IX, I, II.
Munique: 1863.
A mais completa coleção a esse respeito.
________. “Drei Formelsammlungen aus der Zeit der Karolinger”. Em Quellen
zur bayerischen und deutschen Geschichte, vol. VII. Munique: 1858.
Reúne algumas das fontes mais antigas sobre o assunto, reeditadas ou
publicadas pela primeira vez.

Roziére, E. D. Recueil générel des formules usitées dans l’Empire de France du Vme
au Xme siècle. 3 vols. 1859–1871.

João de Sacrobosco. Algorismus. Nova York: Columbia University.

Libellus de sphaera cum praefatione Melanchtonis. Würtemberg: 1531.

Schä larer proverbia. Em Anzeiger fur Kunde der Deutschen Vorzeit Neue Folge,
vol. 20.

Scriptores ecclesiastici de musica ex variis Italiae, Galliae et Germaniae codicibus


manuscriptis collecti. Ed. Martin Gerbert. St. Blaise: 1784.

Scriptorum de musica medii aevi, Nova Series. 4 vols. E. De Coussenaker. Paris:


1864–1867.

Sêneca, L. A. Opera Omnia. 5 vols. Leipzig, 1882.

Sérvio. Commentarii in Virgilii carmina. 3 vols. Ed. G. ilo & H. Hagen.


Leipzig: 1878.

Steinmeyer, E. “Die Deutschen Virgilglossen”. Em Zeitschri fur Deutsches


Alterthum, vol. 3. Berlim: 1872.

Steinmeyer, E. & Sievers, E. Die Althochdeutschen Glossen. 3 vols. 1879–1895.


A única coleção substancial desse gênero.

Teodulfo. Carmina. Em Poetae latini medii aevi. Ed. Duemmler. Monumenta


Germaniae Historica, Scriptores. Berlim: 1881–1884.

Trattati d’Aritmetica. Ed. Boncompagno. Roma: 1857.


Edição crítica de importantes textos medievais sobre aritmética.
Walter de Speyer. Libellus de studio poetae; Acta Santi Christophori. Ed. B. Pez.
esaurus Anecdotorum Novissimus, t. 2, III.

Wright, omas. A Volume of Vocabularies. (1oth to 12th centuries). 1857.

Zarncke, F. Die “Urkundlichen uellen zur Geschichte der Universität Leipzig in


den ersten 150 Jahren ihres Bestehens”. Em Abhandlungen der Königlichen
Sachsischen Gesellscha der Wissenscha en, philologisch-historische Classe, vol. 2.
1857.
OBRAS SECUNDÁRIAS

Ambros, A. W. Geschichte der Musik. 5 vols. Breslau: 1862–1881.


Um dos melhores livros sobre o assunto; cobre toda a Idade Média até
Palestrina. O quinto volume traz composições musicais a título de ilustração ao
terceiro volume. Langhans continuou o projeto, passando pelos séculos XVII, XVIII
e XIX. Autoridade máxima no assunto.

Aschbach, J. Geschichte der Wiener Uni ersität im ersten Jahrhundert ihres


Bestehens. 2 vols. Viena: 1865.
Festschri publicado por ocasião dos 500 anos da universidade. Completo,
baseado em fontes primárias; metade do livro é dedicada às vidas e obras dos
professores mais célebres. Trata-se de uma das mais detalhadas histórias das
universidades medievais. O terceiro capítulo (Studien) é especialmente lúcido.

Babler, J. J. Beitrage zur einer Geschichte der Lateinischen Grammatik im


Mittelalter. Halle: 1885.
Série de estudos diversos.

Ball, W. R. R. Mathematical Recreations and Problems of Past and Present Times.


3ª ed. Londres: 1896.
Coleção de passatempos famosos e problemas matemáticos pitorescos. Muito
informativo.

________________. A Short Account of the History of Mathematics. 3ª ed.


Londres: 1901.
O melhor resumo em inglês para o estudante avançado. Rigoroso; contém
notas bibliográ cas proveitosas.

Barach, C. S. Bernard on Chartres, sein Leben, seine Lehrwirksamkeit, seine


Schri en. Em Barach & Wrobel (org.), Bernardi Sylvestris De mundi uni ersitate.
Breve retrato do magistério e da in uência de Bernardo. Baseado em fontes
primárias.
Barnard, H. An account of Uni ersities and other Institutions of Superior
Instruction in Different Countries (cuja terceira parte é sobre a educação nacional).
Em síntese, uma compilação de artigos e capítulos de obras de referência
sobre a história da educação superior.

Beaurepaire, C. M. de R. de. Recherches sur l’instruction publique dans le Diocese de


Rouen avant 1789. 3 vols. Évreux: 1872.
Estudo intensivo; o único desse gênero.

Bergmann, J. Geschichte der Philosophie. 2 vols. Berlim: 1892.


História geral da loso a, com ênfase na evolução dos sistemas losó cos.
Leitura razoavelmente fácil.

Berry, A. A Short History of Astronomy. Nova York: 1899.


Breve história geral da astronomia. Popular, ilustrada e bem fundamentada;
provavelmente a mais útil em inglês.

Bianco, F. J. Versuch einer Geschichte der ehemaligen Uni ersität und der
Gymnasien der Stadt Koln. Colônia: 1833.
Pesquisa geral. O seu valor reside principalmente na compilação de
documentos reproduzida como apêndice, a qual compõem quase metade do livro.

Blakey, R. Historical Sketch of Logic. Londres: 1851.


Pouco valorosa.

Boissier, G. Étude sur la vie et les ou rages de M. T. Varron. Paris: 1861.


O mais completo estudo sobre a vida e a obra de Varrão. O capítulo citado
nesta monogra a, sobre os Disciplinarum libri, é um tanto breve.

________. La Fin du paganisme. 2 vols. Paris: 1891.


Pesquisa panorâmica sobre os casos mais evidentes de declínio do paganismo.
A segunda parte do primeiro volume contém capítulos sugestivos sobre a
interação entre a educação romana e os ideais cristãos.

Bosanquet, B. e Education of the Young in the Republic of Plato. Cambridge:


1900.
Introdução e seleções dos primeiros quatros livros da República.
Brambach, W. Das Tonsystem und die Tonarten des christliche Abendlandes im
Mittelalter. Leipzig: 1881.
Investigação valorosa.

Die Musikliteratur des Mittelalters bis zur Blüthe der Reichenauer Sangerschule.
Karlsruhe: 1883.
Estudo comparativo sobre os manuais do período, dedicado a aquilatar a
in uência de Boécio.

“Die Reichenauer Sängerschule, Beitrage zur Geschichte des Gelehrsamkeit und


zur Kenntniss mittelalterlicher Musikhandschri en”. Em Beihe e zum
Centralblatt fur Bibliothekenwesen, I.
Excelente monogra a. Trata de maneira admirável a controversa relação entre
prática e teoria musical na Idade Média.

Braniss, J. Die Logik in Ihrem Verhaltniss zur Philosophic geschichtlich


betrachtet. Berlin, 1823.
Antigo e breve Preisschri , lógico e claro. O único tratado desse gênero.

Brockman, F. J. System der Chronologic. Stuttgart, 1883.


Manual conveniente. Contém o essencial da obra mais antiga e mais extensa
de Ideler.

Burnet, John. Aristotle on Education. Cambridge: 1903.


Excelente discussão sobre a perspectiva educacional de Aristóteles. Baseia-se
em condensados da Ética e da Política.

Bursian, C. Geschichte der classischen Philologie in Deutschland. 2 vols. Munique:


1883.
História geral da atividade acadêmica na Alemanha. O capítulo sobre o
período anterior ao humanismo é demasiado breve e impreciso.

Cajori, F. A History of Elementary Mathematics. Nova York: 1896.


Breve pesquisa sobre a história da matemática elementar, baseada nos
resultados de pesquisas contemporâneas. Rigorosa e de fácil leitura.

Cantor, M. Mathematische Beitrage zum Kulturleben der Volker. Halle: 1863.


Os capítulos sobre a história da matemática são bem completos e de fácil
leitura. Uma das primeiras obras desse famoso historiador.

Die Römischen Agrimensoren und ihre Stellung in der Geschichte der


Feldmesserkunst. Leipzig: 1875.
A mais recente investigação sobre o assunto. Seu escopo é muito mais amplo
do que o título sugere; vai dos pioneiros gregos até os grammatici romanos e a sua
in uência sobre a Idade Média.

Vorlesungen über Geschichte der Mathematik. 3 vols. 2ª ed. Leipzig: 1894–1900.


A maior autoridade em tudo quanto diz respeito à história da matemática. O
volume I vai até 1200; volume II até 1668; e o volume III de 1668 a 1758. Fonte
inesgotável de informação.

Chasles, M. Geschichte der Geometric. Trad. L. A. Sohnke. Halle: 1839


Tratado geral sobre a história da ciência assinado pelo célebre matemático
francês. Notas e observações complementares compõem dois terços do livro.
Erudito.

Comparetti, D. Virgil in the Middle Ages. Trad. E. F. M. Benecke. Londres: 1895.


O melhor livro sobre o assunto. Abrangente.

Compayré, G. History of Pedagogy.


Livro geral, popular. Todo o texto é perpassado pela antipatia do autor para
com a Idade Média. Enviesado.

________. Abelard and the Origin and Early History of Uni ersities. Nova York:
1902.
Retrato suscinto, baseado em fontes secundárias.

Curtze, M. Die mathematischen Schri en des Nicole Oresme. Berlim: 1870.


Pan eto biográ co sobre as obras completas do autor.

Davidson, T. Aristotle and Ancient Educational Ideals. Nova York: 1892.


Abordagem so sticada e bastante sugestiva.
De Morgan, A. Arithmetical Books. From the Invention of Printing to the Present
Time. Londres: 1847.
Compilação única. Cada livro é meticulosamente detalhado.

Denk, V. M. O. Geschichte des gallo- ankischen Unterrichts und Bildungswesens


on den altesten Zeiten bis auf Karl den Grossen. Mainz: 1892.
O único trabalho cientí co completo sobre os primórdios da educação dos
francos. Baseado inteiramente em fontes primárias.

Dill, S. Roman Society in the Last Century of the Western Empire. Londres: 1898
Pesquisa panorâmica. Muito informativa.

Ebert, A. Allgemeine Geschichte der Literatur des Mittelalters im Abendlande. 3


vols. Leipzig: 1874–1887.
Um clássico. Livro completo e bem organizado.

Eckstein, F. A. “Lateinischer Unterricht”. Em Schmid (org.), Encyklopädie des


gesammten Erziehungs und Unterrichtswesens, vol. 4, pp. 204–405.
Muito informativo. Já foi editado separadamente.

Friedlein, G. “Das Rechnen mit Columnen vor dem 10 Jahrhundert”. Em


Zeitschri für Mathematik und Physik, vol. 9.
Artigo sobre a controvérsia matemática em torno de Boécio.

________. Die Zahlzeichen und das elementare Rechnen der Griechen und Romer
und des christlichen Abendlandes om 7 ten bis 13 ten Jahrhundert. Erlangen:
1869.
Tratado geral, repleto de informações sobre a história da notação e do cálculo.

Gaskoin, C. J. C. Alcuin, His Life and His Work. Londres, 1904.


A mais recente e mais completa biogra a de Alcuíno, baseada em todas as
fontes disponíveis.

Gottlieb, T. Ueber mittelalterliche Bibliotheken. Leipzig: 1890.


Excelente. O livro reúne um grande número de títulos recorrentes nos
catálogos das bibliotecas medievais.
Glover, T. R. Life and Letters in the Fourth Century. Cambridge: 1901.
A ênfase recai sobre a importância de Prudêncio para o desenvolvimento da
cristandade ocidental.

Gow, J. A Short History of Greek Mathematics. Cambridge: 1884.


O título engana; trata-se, na verdade, de uma história da matemática
elementar. Elaborado e repleto de notas bibliográ cas, é um dos poucos trabalhos
originais sobre o tema em língua inglesa.

Grasberger, L. Erziehung und Unterricht im klassischen Alterthum. 3 vols.


Würtemberg: 1864–1881.
Tratamento exaustivo da matéria.

Grote, G. Aristotle. 2 vols. Londres: Bain & Robertson, 1872.


Obra inacabada do famoso helenista sobre Aristóteles, sobretudo o Organon.
Perspicaz e erudita.

Güdeman, M. Geschichte des Erziehungswesens und der Kultur der Juden in Italien
während des Mittelalters. Viena: 1884.
Um dos três volumes de uma extensa obra a educação e a cultura judaicas na
Espanha, na França e na Itália medievais. A maior autoridade nesse campo
especí co.

Guizot, F. History of Civilization. Trad. W. Hazlitt. Nova York: 1850.


As 16ª e 18ª seções oferecem um panorama da atividade literária entre os
séculos VI e VIII. Bastante sugestivo, simpático ao espírito da Idade Média.

Günther, F. Geschichte des mathematischen Unterrichts im deutschen Mittelalter bis


zum Jahre 1525. Monumenta Germaniae Paedagogica III. Berlim: 1887.
Obra admirável, minuciosa. O autor domina o seu tema sob todos os
aspectos.

Günther, S. & Kirchoff, A. Didaktik und Methodik des Geographieunterrichts. 2


vols. Munique: 1895.
A contribuição de Günther (porção citada no texto) é uma breve história da
geogra a, que serve como introdução ao tema.
Haase, F. Vorlesungen über lateinische Sprachwissenscha . Leipzig: 1874.
Notas publicadas do eminente lólogo. Fragmentárias.

Hallam, H. Introduction to the Literature of Europe, vol I, 5ª ed. Londres: 1873.


O capítulo citado demonstra a impropriedade dessa obra para o atual
estudante da Idade Média.

Hankel, H. Zur Geschichte der Mathematik im Alterthum und Mittelalter.


Leipzig: 1874.
Livro completo, bem escrito; repleto de referências bibliográ cas. A ênfase
recai sobre o período clássico, sendo um tanto breve o tratamento da Idade Média
(do século XII ao século XV). O livro diminui o conhecimento matemático
medieval.

Hauréau, B. De la philosophie scolastique. 2 vols. Paris: 1850.


Pesquisa pioneira num campo até então esquecido pelos historiadores. Ainda
muito valorosa.

Hazlitt, W. C. “Contributions toward a History of Earlier Education in Great


Britain”. Em Antiquary, vols. 35–6.
Bibliogra a comentada sobre tudo quanto diz respeito ao assunto. Impresso
na Inglaterra.

Heerdegen, F. Lateinische Lexicographic. Em Müller, I. von (org.), Handbuch der


klassischen Alterthumswissenscha , vol. II, 2.
Monogra a a par das últimas pesquisas. A série de que faz parte é a última
grande coleção de obras sobre a Antigüidade clássica.

Histoire Littéraire de la France. 1733–1895.


A mais completa história literária da França. Contém análises de todas as
principais obras francesas.

Huemer, J. “Ueber ein Glossenwerk zum Dichter Sedulius”. Em Sitzungsberichte


der Philologisch-Historischen Classe der Kaiserlichen Akademie der Wissenscha en,
Bd. CXVIII. Viena: 1888.
Hurter, F. von. Tableau des institutions et des moeurs de l’Église au Moyen Âge,
particulierement au XIIIeme siècle, sous le regne du Pape Innocent III. 3 vols. 1843.
Pesquisa geral, com ênfase no lado bom das diversas atividades da Igreja e suas
relações com a Idade Média.

Jourdain, A. Recherches critiques sur l’âge et l’origine des traductions latines


d’Aristote. Paris: 1843.
O primeiro estudioso a cobrir este assunto fundamental. Sua obra marcou
época, e ainda é uma referência.

Kästner, A. G. Geschichte der Mathematik. Göttingen, 1296–1800.

Superada, mas informativa.

Kaufman, G. “Rhetorenschulen und Klosterschulen oder Heidnische und


christliche Cultur in Gallien während des 5 und 6 Jahrhunderts”. Em Historisches
Taschenbuch, 4ª ed., 1869.
Estudo interessante, baseado em fontes primárias.

Kirchengeschichtliche Studien. Leipzig: 1890.


O artigo citado nesta monogra a é pormenorizado no corpo da obra.

Langhans, W. Die Musik-Geschichte in zwölf Vorlesungen. Leipzig: 1878.


Breve pesquisa assinada de autoridade no assunto.

Laurie. S. S. Historical Survey of Pre-Christian Education. Londres: 1895.


Estudo geral, popular. Baseado em fontes secundárias.

________. Rise and Early Constitution of Uni ersities. Nova York: 1903.
Idem.

Lowe, G. Prodromus glossariorum latinorum. Leipzig: 1876.


Investigação pioneira no campo da lexicogra a latina. O livro aprofunda-se
nas fontes de inúmeros dicionários, e o capítulo sobre os dicionários medievais
descreve os manuscritos mais conhecidos.

Mabillon, J. Traité des études monastiques. Paris: 1691.


A primeira defesa acadêmica da cultura medieval em tempos modernos. O
nome do autor é associado aos beneditinos.

Maitland, S. R. e Dark Ages. 3ª ed. Londres: 1853.


Escrito especialmente para combater o preconceito contra a Idade Média em
inícios do século XX. Apesar do tom apologético, é bem escrito e bem
fundamentado; o autor não encontra di culdades para derrubar os exageros sobre
o “estado da educação” nos séculos X, XI e XII.

Madler, J. H. Geschichte der Himmelskunde on der altesten bis auf die neueste
Zeit. 2 vols. Braunschweig: 1873.
Leitura fácil, voltada para o estudante. Abordagem super cial do período
anterior a Copérnico.

Manitius, M. “Beiträge zur Geschichte römischer Dichter im Mittelalter”. Em


Philologus: Zeitschri für das klassische Alterthum, vol. 47–52, 56, suplemento
(vol. 7).

Marty, Martin (autor anônimo). “Wie man vor tausend Jahren lehrte und lernte”.
Em Beilage-Jahresbericht über die Erziehungsanstalt des Benedictinersti s Maria
Einsiedelen, 1856–57.
Diário imaginário de Valafrido Estrabão, em que os dias de escola do poeta
são revividos em detalhe. O autor demonstra imaginação histórica; os fatos da
vida de Estrabão são bem costurados ao longo da narrativa.

Mattew, J. E. e Literature of Music. Londres: 1896.


Excelente bibliogra a comentada. Informativo e bem organizado.

Meier, G. Die Sieben Freien Kunste im Mittelalter. Capítulos sobre gramática,


retórica e dialética. Em Jahresbericht der Benedictinersti s Maria Einsiedelen,
1885–1886.
Retrato laudatório, feito por um estudioso católico, dos métodos empregados
no ensino da gramática, da retórica e da dialética durante a Idade Média. Mesmo
não sendo uma contribuição original, dá conta de fatos interessantes.

Montalembert, C. F. e Monks of the West. Trad. Casquet. Nova York: 1896.


Defesa do monasticismo e da sua contribuição para a civilização ocidental.
Texto bem elaborado, de tom apologético.

Mullany, P. F. (Ir. Azarias). Educational Essays. Chicago: 1896.


Coleções de ensaios, em geral polêmicos.

Mullinger, J. B. Schools of Charles the Great and the Restoration of Education in the
Ninth Century. Londres: 1877.
Obra de referência.

________. Uni ersity of Cambridge om the Earliest Times. Cambridge: 1873.


Cobre desde os primórdios até 1534. Os dois primeiros capítulos tratam das
condições gerais na educação na Idade Média.

Nagl, A. “Gerbert und die Rechenkunst des 10 ten Jahrhundert”. Em


Sitzungsbeirichte der philologisch-historischen Classe der Kaiserlichen Akademie der
Wissenscha en, Bd. CXVI.
Investigação sobre a história da matemática. O autor defende a originalidade
de descobertas matemáticas de Gerberto.

Nauman, Emil. e History of Music. 2 vols.


Pesquisa geral, popular e toda ilustrada. A Idade Média é tratada
exaustivamente.

Norden, E. Die Antike Kunst-prosa om 6 ten Jahrhundert or Christus bis in die


Zeit der Renaissance. 2 vols. Leipzig: 1898.
Obra abrangente de um eminente lólogo. Repleta de referências
bibliográ cas.

Oznam, A. F. “Des Écoles et de l’instruction publique en Italie aux temps


barbares”. Em Documents inédites pour servir a l’histoire littéraire de l’Italie.
Leipzig e Paris: 1897.
Compêndio sobre a cultura literária italiana entre os séculos VIII e XIII. Traz
como apresentação um ensaio bem elaborado sobre a educação pública na Itália
durante a alta Idade Média. Bem amparado por fontes originais.
Parker, H. “ e Seven Liberal Arts”. Em English Historical Review, vol. 5, julho de
1890.
O melhor estudo sobre a evolução do currículo medieval. O autor assenta os
seus argumentos com bastante força.

Paulsen, F. Geschichte des gelehrten Unterrichts auf den Deutschen Schulen und
Uni ersitaten. 2 vols. Leipzig: 1885.
Trata da história da educação superior na Modernidade. O primeiro capítulo
é uma potente a rmação da importância da universidade medieval.

Peiper, R. “Beitrage zur lateinischen Cato-Literatur”. Em Zeitschri für deutsche


Philologie, vol 5. Halle: 1874.
Estudo crítico sobre um manuscrito berlinense de Ludolf von Lüchow: a sua
versão dos Disticha Catonis.

Peschel, O. Geschichte der Erdkunde bis auf Alexander on Humboldt und Carl
Ritter. 2ª ed. Munique: 1877.
Obra padrão; parte de uma série o cial sobre a história da ciência na
Alemanha. Abundante em referências.

Poole, R. L. Illustrations of the History of Mediaeval ought. Londres: 1894.


Série de estudos sugestivos, muito rica em notas bibliográ cas. Cada um dos
temas é abordado minuciosamente.

Prantl, C. “Des Abt Wilhelm von Hirschau Philosophicae et Astronomicae


Institutiones”. Em Sitzungsberichte der Königlichen Bayerischen Akademie der
Wissenscha en zu München, 1861.
Discussão sobre os pontos principais da obra de Guilherme de Hirsau e a sua
importância.

________. Geschichte der Logik im Abendlande. Leipzig: 1855–1870.

Trabalho brilhante, monumental; resta insuperável na abordagem dos problemas


lógico-metafísicos da Idade Média. Apesar de muito erudito, o autor é demasiado
polêmico, chegando a ofender os seus oponentes.
Putnam, G. H. Books and eir Makers During the Middle Ages. 2 vols. Nova
York: 1896.
O volume 1 traz muito material de grande interesse a respeito das bibliotecas
e dos manuscritos medievais.

Rashdall, Hastings. Uni ersities in Europe in the Middle Ages. 2 vols. Oxford:
1895.
Livro excelente; talvez a melhor história geral das universidades medievais,
com destaque para o tratamento dos primórdios. Baseado em investigações
seríssimas.

Reichling, T. “Das Doctrinale des Alexander de Villa-Dei”. Em Monumenta


Germaniae Paedagogica, vol. 12, introdução. Berlim: 1893.
Caso admirável de “meticulosidade germânica”. Palavra nal sobre o assunto.

Rémusat, F. M. Ch. de. Abelard. 2 vols. Paris: 1845.


A primeira investigação de fôlego sobre a vida e a in uência de Abelardo.
Obra relevante.

Rieman, Hugo. Geschichte der Musiktheorie; IX–XIX Jahrhundert. Leipzig: 1898.


Autoridade na matéria.

________. Studien zur Geschichte der Notenschri . Leipzig: 1878.

Investigação minuciosa.

Ritschl, F. De M. “Terentii Varronis Disciplinarum libris commentarius”. Em


Opuscula Philologica, III: 1877.
Publicado em 1845, originalmente como uma dissertação. A discussão
fundamenta-se na crítica textual mais aguda.

Robertson, W. History of the Reign of the Emperor Charles V with a view of the
Progress of Society in Europe. Harpers: 1829.
Muito popular nos seus dias, ou seja, em ns do século XVIII, a obra ilustra
primorosamente o avanço da historiogra a em tempos recentes. O autor faz
imensas generalizações, e em duas páginas sintetiza os “efeitos inevitáveis daquele
estado de coisas sobre as ciências, as letras e a religião”; as “provas e ilustrações”
cobrem duas páginas. No que diz respeito à nossa investigação, pode-se tomar a
obra do Rev. W. Robertson como representativa do olhar enviesado que em geral
se reservava à Idade Média antes do advento da moderna historiogra a.

Rockinger, L. “Die Ars dictandi in Italien”. Em Sitzungsberichte der Königlichen


Bayerischen Akademie der Wissenscha en zu München, 1861.
Investigação crítica baseada em fontes gerais.

Sandys, J. E. History of Classical Scholarship. Cambridge: 1903.


O único livro desse tipo em língua inglesa. Fragmentário e impreciso, não
compete com tratados estrangeiros sobre a literatura clássica.

Saintsbury, G. A History of Criticism and Literary Taste in Europe. 3 vols. Nova


York: 1900.
O primeiro volume é dedicado à crítica clássica e medieval. Escopo bastante
amplo, geral; leitura fácil, mas pouco rigorosa.

Savigny, F. C. Geschichte des römischen Rechts. 7 vols. Heidelberg: 1834.


Obra destacada no seu tempo, repleta de informações e de material original.
Ainda uma autoridade sobre o assunto.

Schmidt, C. uaestiones de musicis scriptoribus Romanis, imprimis de Cassiodoro et


Isidore. Darmstadt: 1899.
Tese de doutoramento. Investigação crítica sobre posição da música no
esquema das artes liberais. Bem fundamentada.

Schmid, K. A. Geschichte der Erziehung om Anfang an bis auf unsere Zeit,


bearbeitet in Gemeinscha mit einer Anzahl on Gelehrten und Schulmannern. 5
vols. Stuttgart: 1884–1902.
História completa da educação. Contém uma série de monogra as de
especialistas eminentes.

Schmidt, Karl. Die Geschichte der Paedagogik. Ed. Lange.


Popular, mas pouco rigoroso. Pesquisa geral.

Smith, D. E. Teaching of Elementary Mathematics. Nova York: 1903.


Contém material preciso e atualizado sobre a história de ramos da
matemática.

Schubiger, P. A. Die Sängerschule St. Gallens om achten bis zwöl en Jahrhundert.


Einsiedeln: 1858.
Tratamento exaustivo, calcado nas fontes. Traz as notas dos professores da
escola a respeito de cantos importantes. Contribuição relevante, de maneira geral.

Specht, F. A. Geschichte des Unterrichtswesens in Deutschland on den ältesten


Zeiten bis zur Mitte des 13 Jahrhunderts. Stuttgart: 1885.
Livro admirável, baseado inteiramente em fontes primárias; o melhor do
ramo. Referências completas.

Stallaret, Ch. & Van der Haegen, P. “De l’Instruction publique au Moyen Age
(VIIme au XVIme siècle)”. Em Memoires couronnées de l’Académie Royale de Belgique,
vol. 23. Bruxelas: 1853.
Trata especialmente da situação dos Países Baixos. Contribuição séria.

Stolz, F. Lateinische Grammatik. Em Müller, I. von (org), Handbuch der


klassischen Alterthumswissenscha , vol. 2, II. Munique: 1900.

Suter, H. Die Mathematik auf den Uni ersitaten des Mittelalter. Zurique: 1887.
Contribuição valiosa, baseada inteiramente em fontes primárias. Notas
bibliográ cas detalhadas.

Taylor, H. O. e Classical Heritage of the Middle Ages. Nova York: 1901.


Obra encantadora e bem atualizada.

Teuffel, W. S. Geschichte der römischen Literatur. Ed. L. Schwabe. 5ª ed. Leipzig:


1890.
Notas e bibliogra a bastante ricas. Obra padrão.

esaurus Novus Latinitatis, Classici Auctores e Vaticanis Codicibus, t. 3. Ed. A.


Mai. Roma: 1836.

Trendelenberg, A. Geschichte der Kategorienlehre. Berlim: 1846.


Obra séria, a única sobre o assunto. Muito detalhada.
Trop e, J. Geschichte der Elementarmathematik, vol. 2. Leipzig: 1903.
Aborda separadamente o desenvolvimento histórico de cada disciplina —
aritmética, álgebra etc. Bom livro, baseado nas melhores fontes secundárias.

Ueberweg, F. History of Philosophy. Trad. G. S. Morris. Nova York: 1885.


Livro padrão do estudante, não superado no tocante à bibliogra a. A Idade
Média é explorada em profundidade.

________. System of Logic and History of Logical Doctrines. Trad. T. M. Lindsay.


Londres: 1871.
Os capítulos historiográ cos são os melhores sobre o assunto.

Unger, F. Die Methodik der praktischen Arithmetik in historischer Entwickelung.


Leipzig: 1888.
Bom retrato do desenvolvimento da disciplina na Era Moderna. O capítulo
sobre a Idade Média é muito breve e insatisfatório.

Wattenbach, W. Das Schri wesen im Mittelalter. 2ª ed. Leipzig: 1875.


Estudo geral sobre os usos e métodos da escrita, edição e preservação de livros
durante a Idade Média.

________. Deutschlands Geschichtsquellen im Mittelalter bis zur Mitte des 13


Jahrhunderts. 2 vols. 7ª ed. Stuttgart e Berlim: 1904.
Obra de valor inestimável para o estudante da história medieval. Repleta de
informações e dados biográ cos, traz ainda a crítica das fontes mais relevantes.

Weddingen, A. van. “Essai Critique sur la Philosophie de S. Anselme”. Em


Memoirés Couronnées de l’Académie Royale de Belgique. Bruxelas: 1875.
Contém um bom retrato da vida e da obra de Anselmo.

Weissenborn, H. Gerbert Beitrage zur Kenntniss der Mathematik der Mittelalters.


Berlim: 1888.
Pesquisa original sobre as controvérsias em torno das obras aritméticas e
astronômicas de Gerberto.

West, A. F. Alcuin and the Rise of the Christian Schools. Nova York: 1892.
Livro interessante. Popular, porém sério.
White, A. D. History of the Warfare of Science with eology in Christendom.
Nova York: 1901.
Valoroso pela bibliogra a, rico em notas e referências. Tom polêmico.

White, C. L. Ael ic. Boston: Yale, 1898.


A palavra nal sobre o assunto.

Williams, C. F. A. e Story of Notation. Londres e Nova York: 1903.


Texto breve e acessível, de leitura fácil. Atualizado.

Wolf, R. Geschichte der Astronomie. Munique: 1877.


A melhor obra sobre o assunto. Rica em notas e referências bibliográ cas.

Wustenfeld, F. Die “Übersetzungen Arabischer Werke in das Lateinische seit dem


II ten Jahrhundert”. Em Abhandlungen der Königlichen Gesellscha der
Wissenscha en zu Göttingen, t. 22.
Catálogo descritivo de todos os livros árabes traduzidos para o latim. Inclui
listas de manuscritos e obras impressas que sobrevivem ao tempo.

Zarncke, F. “Beitrage zur Mittel-Lateinischen Spruchpoesie”. Em Berichte über die


Verhandlungen der Königlichen Sächsischen Gesellscha der Wissenscha en,
philologisch-historische Classe, vols. 15, 17, 22. Leipzig: 1862–1868.
Contém quatro edições comentadas de Catão, um Cato no us, um Cato
rhythmicus, um Cato interpolatus e um Cato leoninus.

Ziegelbauer, R. P. M. Historia rei literariae Ordinis S. Benedicti, 1754.


Contribuição única. Vol. I: as escolas e bibliotecas beneditinas. Vol. II: diversos
autores em todas as linhas. Vol. III: biogra as. Vol. IV: bibliogra a.

Você também pode gostar