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Gestão de conflitos: estratégias adotadas em unidade básica de saúde

Article · October 2013

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6 authors, including:

Milena Nunes Alves de Sousa Ankilma Do Nascimento Andrade


Centro Universitário de Patos-PB Faculdade Santa Maria, Cajazeiras, Paraíba, Brasil
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ISSN 1519-1672

133 Editorial

Relatos de Caso

134 Gestão de conflitos: estratégias adotadas em


unidade básica de saúde
Joácio de Oliveira Costa, Milena Nunes Alves de Sousa,
Ankilma do Nascimento Andrade Feitosa, Marcelo de Oliveira Feitosa,
Elisangela Vilar de Assis, Patrícia Peixoto Custódio

v. 15 nº 61 141 Gestão para a segurança e a qualidade de vida no


trabalho em uma lavanderia hospitalar
Denise Medianeira Mariotti Fernandes, Sergio Brasil Fernandes,
Outubro-Dezembro, 2013 Cristine Aspirot do Couto Ferrazza

151 Auditoria de enfermagem em Centro Cirúrgico


Driely Reis de Oliveira, Silvia Maria Jacinto, Cibele Leite Siqueira

Artigos Originais

159 Conformidade no prontuário do paciente:


um desafio permanente
Ivo Pavanello Filho, Maria Aparecida Testa Benessiuti

169 Gerenciamento de enfermagem em unidade


de emergência: dificuldades e desafios
Bruno Rafael Branco Zambiazi, Andrea Monastier Costa
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A Revista de Administração em Saúde (RAS) é publicação oficial 3. Os Artigos Originais, Revisões, Atualização, Relatos de
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gestão em saúde; administração sanitária; administração hospitalar, 200 palavras e o campo palavras-chave (no máximo 6) em portu-
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• endereço profissional completo, CEP e e-mail. CEP: 01318-901 - e-mail: ras@apm.org.br
Editorial
REVISTA DE
ADMINISTRAÇÃO
EM SAÚDE
Neste número da RAS, apresentamos, pela ordem, três relatos de caso e
Publicação da Associação
Brasileira de Medicina Preventiva dois artigos originais. Os relatos de caso constituem o tipo mais frequente e
e Administração em Saúde
comum de trabalho apresentado ou publicado. Entretanto, é necessário que vá
Editores além de uma descrição ou de mera reportagem do caso, devendo produzir uma
Dr. Ivomar Gomes Duarte
Correspondência: Avenida Brigadeiro Luis Antonio, 278 – necessária reflexão sobre o tema, consubstanciada nas considerações finais
7o andar – CEP 01318-901 – São Paulo, SP
E-mail: ras@apm.org.br ou conclusão do texto. As revistas costumam ser flexíveis na recepção e aceite
Conselho Editorial de trabalhos classificados como relatos de caso, sem que isso corresponda a
Dr. Alberto H. Kanamura – SP
Dr. Angelo Felicissimo – SP uma desvalorização desse tipo de trabalho. A importância dos relatos de caso
Dr. Antonio Quinto Neto – RS
Dra. Deborah Pimenta Ferreira – SP reside na sua característica exemplar e didática, ressalvadas as peculiaridades
Dr. José Agenor M. Silveira – SP
Dr. José Manoel C. Teixeira – SP
que tornam cada caso um evento particular. Os dados e as informações obti-
Dr. José Maria Rezende – PR das nos relatos de caso, embora circunscritos a uma realidade — e, por isso,
Dr. José Rodrigues Filho – PE
Dr. Haino Burmester – SP muitas vezes, não reprodutíveis —, servem como indicativo e sugestão para a
Dr. Ivomar Gomes Duarte – SP
Dr. Milton Menezes da Costa – DF elaboração de trabalhos de pesquisas análogas, nos distintos ambientes onde
Dr. Olimpio José Nogueira V. Bittar – SP
Dr. Silas Guedes de Oliveira – AM possam ocorrer.
Dr. Walter Cintra Ferreira Jr. – SP
Dra. Wanda dos Santos Andrade – CE
Apesar de não possuir a força de um artigo original, a singeleza de muitos
dos relatos de caso publicados intencionalmente nos vários números da RAS
Associação Brasileira de
Medicina Preventiva e revela a preocupação de profissionais ou de grupos de profissionais dos servi-
Administração em Saúde
(Fundada em São Paulo no
ços de saúde, os quais, além de suas rotinas de trabalho, desenvolvem um
dia 26 de novembro de 1976) olhar crítico e analítico de suas práticas e do seu cotidiano. E, mais, mostra o
Diretoria grande mosaico que é este país, bem como a dificuldade de se implantar e
Presidente:
Dr. Anísio de Moura
viabilizar um sistema público de saúde com acesso universal.
1o Vice-Presidente - SP: Estas observações eram necessárias, considerando-se algumas manifes-
Dr. Haino Burmester
2o Vice-Presidente - DF: tações recebidas por e-mail referentes a trabalhos publicados em números
Dr. Milton Menezes da Costa Neto
3o Vice-Presidente - RS: passados da RAS contendo relatos de caso.
Dr. Cláudio José Allgayer
Secretário Geral:
Dr. Fernando Augusto Tavares Canhisares
2o Secretário:
Dr. Ivomar Gomes Duarte
Dr. Rubens Baptista Junior Editor da RAS
1o Tesoureiro:
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2o Tesoureiro:
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Relato de Caso

Gestão de conflitos: estratégias


adotadas em unidade básica de saúde
Conflict management: strategies adopted in a primary health center
Joácio de Oliveira Costa1, Milena Nunes Alves de Sousa2, Ankilma do Nascimento Andrade Feitosa3,
Marcelo de Oliveira Feitosa4, Elisangela Vilar de Assis5, Patrícia Peixoto Custódio6

Palavras-chave RESUMO
Administração de recursos O objetivo deste trabalho foi identificar as estratégias adotadas pela equipe do departamento de pessoal da
humanos Secretaria Municipal de Saúde de Patos (SEMUSA), na Paraíba, para minimizar os conflitos entre os colaboradores
Estratégias nas unidades básicas de saúde. Trata-se de pesquisa exploratória e descritiva do tipo estudo de caso cuja
Gestão em saúde população-alvo foi constituída por sete colaboradores internos responsáveis pela gestão de conflitos na
SEMUSA. Foi utilizado questionário autoaplicado, respeitando os aspectos éticos de pesquisas envolvendo seres
humanos. Após análise estatística dos dados, foram encontrados os seguintes resultados: os colaboradores
que gerenciavam os conflitos na SEMUSA eram, em sua maioria, mulheres, adultas, casadas, tendo de 1 a 3
filhos. Entre os estilos propostos por Rahim, constatou-se que o mais prevalente foi o de colaboração, entretanto,
oportunamente, os gestores de conflitos encontravam na concessão e no acordo uma postura estratégica para
o trato com os conflitos, em geral não costumavam se abster de conflitos e a imposição aparecia como a última
estratégia a ser utilizada. Os gestores da SEMUSA reconheciam os conflitos como fenômeno que necessitava
de gestão, cuja estratégia escolhida era situacional, pois não havia uma única estratégia conveniente para todas
as situações; as estratégias se tornavam convenientes mediante fatores adversos relacionados à problemática
vivenciada. A SEMUSA tem por prioridade o estilo colaborativo, por meio da máxima integração possível entre
os envolvidos na resolução de conflitos.

Keywords ABSTRACT
Personnel management This study aimed to identify the strategies adopted by the staff of the personnel department of the Municipal Health
Strategies Office of Patos (SEMUSA), in Paraíba, Brazil, to minimize conflict among professionals at primary health centers.
Health management This is an exploratory and descriptive research with a case study design whose target population consisted of
seven internal professionals responsible for conflict management in SEMUSA. A self-administered questionnaire
was used, observing the ethical aspects of research involving human beings. After statistical analysis of data,
we found the following results: the professionals who managed conflict in SEMUSA were mostly women, adult
people, married, having from 1 to 3 children. Among the styles proposed by Rahim, we found out that the most
prevalent was collaboration, however, timely, conflict managers found in concession and agreement a strategic
attitude to deal with conflict; usually they did not avoid conflict and imposition emerged as the last strategy to be
used. SEMUSA managers recognized conflict as a phenomenon that needs management, whose strategy chosen
was situational, since there was not a single convenient strategy for all situations; strategies became convenient
by means of adverse factors related to the set of issues experienced. SEMUSA prioritizes the collaborative style,
through the maximum integration possible between those involved in conflict solving.

Recebido em: Trabalho realizado na Secretaria Municipal de Saúde– Patos (PB), Brasil.
20/12/2013 1.Administrador; Universidade Estadual de Campina Grande – Patos (PB), Brasil.
Aprovado em: 2.Administradora; Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Promoção de Saúde da Universidade de Franca (UNIFRAN);
05/02/2014 Professora da Faculdade Santa Maria (FSM) e Faculdades Integradas de Patos (FIP) – Cajazeiras (PB), Brasil. 
Conflito de interesses: 3.Enfermeira; Doutoranda em Ciências pela Faculdade de Medicina do ABC (FMABC); Docente na FSM – Ca­jazeiras (PB), Brasil.
nada a declarar 4.Administrador; MBA em Gerência de Projetos; Docente na Faculdade São Francisco (Fasp) – Cajazeiras (PB), Brasil.
Fonte de financiamento: 5.Fisioterapeuta; Doutoranda em Ciências pela FMABC; Docente na FSM – Ca­jazeiras (PB), Brasil.
nenhuma 6.Enfermeira do Hospital Regional de Cajazeiras – Cajazeiras (PB), Brasil.
Endereço para correspondência: Ankilma do Nascimento Andrade Feitosa – Rua Sousa Assis, 78 – Centro – CEP: 58900-000 –
Cajazeiras (PB), Brasil – E-mail: ankilmar@hotmail.com
Gestão de conflitos: estratégias adotadas em unidade básica de saúde 135

INTRODUÇÃO dos terrores atuais que ameaçam a vida profissional e,


As organizações estão inseridas em um ambiente dinâ- consequentemente, os resultados das corporações: o
mico e competitivo, diante do qual as pessoas assumem estresse, intrínseco à vida moderna em razão do aumento
papel relevante no que diz respeito à sua contribuição das demandas e incertezas6.
para o sucesso organizacional. Termos como “capital Portanto, é imprescindível um olhar profissional sobre
intelectual”, colaboradores, entre outros, são utilizados as incidências de conflitos nas organizações, pois estu-
pelos mais respeitados teóricos da administração para se dos revelam que o gerente de nível médio prioriza cerca
referir aos profissionais, demonstrando a importância do de 20% de seu tempo para lidar com conflitos, sendo a
gerenciamento de fatores capazes de influenciar a atuação gestão considerada mais importante do que a tomada de
das pessoas dentro das corporações. A dimensão pessoal decisão, liderança ou habilidades de comunicação. Sob
foi tão supervalorizada que se tornou mais relevante do essa perspectiva, a competência para controlá-los está
que a dimensão padronizada de cargo1. diretamente relacionada ao sucesso gerencial7.
Entretanto, os seres humanos são dotados de fatores Diante dos preceitos outrora elucidados, percebe-se
subjetivos que são responsáveis por condutas gerais. que um enfoque direcionado ao departamento de pessoal
Constantemente, impulsionam-se por elementos motiva- da Secretaria Municipal de Saúde de Patos (SEMUSA)
cionais, como a interação social. Muitas vezes, em face de torna-se oportuno, sob a prerrogativa de colaborar com o
emoções, afetos, personalidade, posturas e sentimentos, gerenciamento de conflitos no setor de saúde desse muni-
ficam sujeitos a desacordos, desavenças, oposições e cípio no estado da Paraíba, pois tal setor possui equipe
competições. Enfim, trata-se de situações conflitantes que multiprofissional, cujas atribuições se direcionam à gestão
dificultam o trabalho em equipe. Assim, o tema “administra- de desavenças que eventualmente possam surgir entre os
ção de conflitos” emerge como algo atual. Sua inserção nas colaboradores das unidades básicas de saúde (UBS) em
discussões da gestão de pessoas ocorre justamente porque seu processo de trabalho.
as desavenças são eventos quase impossíveis de serem A partir dessas ponderações, apresenta-se como
erradicados, mas podem estimular novas ideias sobre deter- objetivo geral identificar a principal estratégia adotada
minada situação, sendo capazes de se tornar positivos no pela equipe do departamento de pessoal da SEMUSA
contexto organizacional2. As questões conflituosas passam a para minimizar os conflitos entre os colaboradores das
figurar como específicas no processo organizacional, sendo UBS durante o trabalho. Tal propósito foi definido mediante
concebidas como propulsoras do desenvolvimento3. alguns questionamentos que refletem os problemas de
Por muito tempo os conflitos interpessoais foram enca- pesquisa: em um mundo altamente competitivo, habita-
rados por gerentes como algo inadmissível, uma única expe- do por pessoas que facilmente discordam entre si, quais
riência conflituosa era razão de demissões ou a constatação são as principais estratégias adotadas pela equipe do
da impossibilidade de permanência na organização. Hoje, departamento de pessoal da SEMUSA para minimizar os
em um contexto cuja diversidade é reconhecida como fator conflitos entre os colaboradores das UBS em seu processo
promissor que incita a criatividade, os conflitos não são de trabalho? Como as estratégias adotadas podem fazer
apenas tolerados, mas, em algumas ocasiões, até estimu- do conflito uma oportunidade potencial para melhoria da
lados, pois se tornam construtivos à medida que sugerem atuação das equipes e, consequentemente, das UBS?
ideias inovadoras, forçam a reavaliação e adicionam novas
perspectivas. Tal fato demonstra a necessidade de serem MÉTODO
resolvidos e administrados de modo adequado, abordados Trata-se de estudo exploratório descritivo, de caráter
enquanto processo que requer estratégias para que sejam quantitativo, realizado na SEMUSA. Essa é um complexo
solucionados em vista de um objetivo coerente4,5. organizacional dividido em sete coordenações que se dife-
Gerenciar conflitos no século XXI compreende renciam pelos objetivos do trabalho desenvolvido por cada
habilidade competitiva que pode agregar um diferen- equipe. O setor de pessoal encontra-se na coordenação
cial à organização, sobretudo em tempos nos quais se de apoio administrativo. Os participantes dessa pesquisa
evidencia que as corporações dependem de pessoas são colaboradores desse setor e a eles compete efetiva-
e de suas inter-relações. Ademais, a eficiência nesse mente o gerenciamento dos conflitos que ocorrem nas UBS
processo aperfeiçoa o ambiente psicológico e evita um distribuídas em todos os bairros do município. O universo

RAS _ Vol. 15, No 61 – Out-Dez, 2013


136 Costa JO, Sousa MNA, Feitosa ANA, Feitosa MO, Assis EV, Custódio PP

amostral foi constituído por sete colaboradores, responsá- As questões, entretanto, foram postas de forma alea-
veis pelas questões burocráticas e de relacionamento dos tória para os entrevistados e esses não foram informados
profissionais envolvidos no processo produtivo em saúde. sobre as estratégias correspondentes. Adotou-se tal postu-
Logo, foram incluídos neste estudo os colaboradores ra para que não houvesse manipulação ou enviesamento
internos do setor de pessoal da SEMUSA, maiores de dos dados. Eles foram submetidos à análise estatística.
idade e de ambos os sexos. Foram excluídos os demais Tipicamente, as medidas para cada respondente são
funcionários da SEMUSA que não estavam vinculados codificadas e, em seguida, abordadas de várias maneiras9.
diretamente ao departamento de pessoal e aqueles com Portanto, neste estudo, as respostas foram transcri-
idade inferior a 18 anos. tas por meio de valor numérico de 1 a 5, atribuído pelo
Assim, o modelo adotado neste estudo foi adaptado8 entrevistado de acordo com a frequência que optava
e visa a identificar as estratégias predominantes no trato pela proposta descrita na questão. Por conseguinte, foi
com os desacordos. O conteúdo dos questionamentos realizado somatório individual de cada frequência; esse
se baseou nas teorias referentes aos estilos de gestão valor indicava quantas pessoas optaram por cada uma das
de conflitos, para levantar as características comuns ao frequências. Calculou-se, então, o produto do número de
observar as situações conflituosas de acordo com cada pessoas que optaram por aquela determinada frequência
modelo de gestão e, a partir disso, determinar o predomi- por ela mesma. Os resultados obtidos foram somados e
nante. O Quadro 1 indica a qual tipo de estratégia (variável descritos no somatório total. Uma vez identificado esse
avaliada) cada questão está relacionada. valor, ele foi dividido pelo número de colaboradores que
responderam ao questionário (7); o resultado dessa
Quadro 1. Estratégias mensuráveis e questionamentos. operação indica a frequência média, refletindo sobre a
Estratégia – utilização da estratégia para resolução de conflitos em
Questionamentos
variável mensurada
Você tenta evitar ser colocado “em má situação” e evita
questão e, por fim, o somatório das frequências médias
ir sempre às Unidades Básicas de Saúde para resolver gerou variação numérica entre 3 e 15, que determinava o
os conflitos?
grau de utilização das estratégias.
Abstenção Você evita as discussões abertas das diferenças entre
as partes?
Destaca-se que a média foi calculada consideran-
Você tenta guardar as divergências que percebe e do apenas as três questões equivalentes à estratégia à
ainda não são explícitas para evitar ressentimentos? qual estavam associadas. A comparação das médias
Você tenta satisfazer as expectativas das partes possibilitou a verificação do que prevaleceu entre todas,
envolvidas no conflito?
sendo, portanto, a mais utilizada pelo setor de pessoal da
Acomodação Você procura se conformar com os desejos das partes
ou de uma das partes envolvidas? SEMUSA. Em outras palavras, as 3 questões relacionadas
Você concorda com a solução proposta pelas partes? entre si pela estratégia apresentaram resultado mínimo
Você discute sua opinião com os profissionais das de 3 e máximo de 15. Quanto mais próximo de 3, menos
Unidades Básicas de Saúde para mostrar os méritos da frequente a utilização da estratégia; em contrapartida,
sua posição?
Imposição
Você é firme na defesa de sua posição na questão?
quanto mais próximo de 15, mais predominante sua utili-
Você sustenta a solução que tem em relação ao
zação (Figura 1)4.
problema e costuma não abrir mão dela? Foram respeitados os princípios éticos e legais rela-
Você negocia com os conflitantes, de forma que se tivos à pesquisa envolvendo seres humanos, dispostos
possa chegar a um acordo?
na Resolução nº 196/96, de 10 de outubro de 1996, do
Você adota o “toma-lá-dá-cá”, de forma que se possa
Conciliação
chegar a um acordo? Conselho Nacional de Saúde; o estudo foi aprovado
Você propõe o meio-termo para solucionar os
impasses?
Você procura saber a questão em discussão para
encontrar uma solução aceitável para todos?
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15
Você troca informações precisas a respeito do caso
Colaboração para resolver um problema em conjunto?
– +
Você tenta colocar todas as preocupações na mesa,
de forma que as questões possam ser solucionadas da
melhor forma? Fonte: Adaptado de Rahim4.

Fonte: Adaptado de Rahim4. Figura 1. Frequência das estratégias.

RAS _ Vol. 15, No 61 – Out-Dez, 2013


Gestão de conflitos: estratégias adotadas em unidade básica de saúde 137

sob o Protocolo nº 56.208/2010, do Comitê de Ética em O cuidado que a SEMUSA apresenta em relação a evitar
Pesquisa da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). discussões abertas demonstra profissionalismo no modo
Os sujeitos da pesquisa leram e assinaram o Termo de como se abordava as desavenças e, ao mesmo tempo,
Consentimento Livre e Esclarecido deste estudo, que zelo pela promoção de ambiente organizacional otimizado.
resguarda a autonomia dos sujeitos de pesquisa, com O fato de não guardar as divergências perceptíveis é
garantia da preservação do anonimato e sigilo das relevante, uma vez que o processo de conflitos é desen-
informações. cadeado após esses serem sentidos e percebidos. Não
administrar um conflito nesse estágio pode fazer com que
RESULTADOS E DISCUSSÃO ele evolua, alcançando níveis indesejáveis e prejudiciais
para a equipe e, consequentemente, para a organização10.
Estratégias na gestão de conflitos As questões 3, 11 e 14 estiveram relacionadas à estra-
As 15 questões analisadas possibilitaram identificar tégia de acomodação dos conflitos. A Tabela 2 indica as
a estratégia predominante na gestão de conflitos imple- respostas dos entrevistados. As questões descritas nessa
mentada pela Administração de Recursos Humanos da tabela se referem ao modo de agir do gestor de conflitos
SEMUSA. Salienta-se que o conteúdo dessas questões mediante expectativas, pensamentos, sugestões para a
está embasado no trato com os desacordos8. resolução de conflitos de uma ou de ambas as partes. Essa
As 3 questões que refletem as táticas de abstenção postura é estratégica e tem por finalidade obter vantagens
em conflitos são as de número 6, 12 e 15 do instrumento sobre situações e necessidades futuras4.
de coleta de dados; elas estavam relacionadas às vezes A frequência com que a SEMUSA recorria à acomo-
em que a organização optava por evitar o conflito, assu- dação era pouco mais relevante dp que a mencionada
mindo uma postura de indiferença quanto às situações anteriormente (abstenção), a média total incidiu em 9,
conflitantes, pois em algumas dessas situações não é significando que comumente se tornava interessante
viável a resolução de conflitos, visto que os ânimos entre para a gestão eleger a solução proposta pelo outro como
as partes estão muito exaltados8. conveniente para administrar os desacordos.
Os dados apresentados na Tabela 1 revelam que a Os respondentes escolheram da primeira à última
SEMUSA buscava evitar as discussões abertas entre as questão, em sua maioria, o valor correspondente a 3
partes e, em geral, não extinguia as divergências percep- (intermediário), porque a proposta é contingencial, pois se
tíveis à administração. Pode-se perceber, ainda, que o satisfazer, conformar-se e concordar com as expectativas,
conflito era um evento que a SEMUSA escolhia enfrentar desejos e propostas das partes envolvidas no conflito é
e não resguardar, pois era uma prática ir sempre às UBS algo relativo e subjetivo4.
para solucioná-los. Como a adoção da estratégia de acomodação é
Por conseguinte, a média total (7) atribuída à estratégia relativa e subjetiva, são fatores determinantes para seu
de abstenção de conflito pode significar que, de modo uso: situações nas quais os gestores falharam e quando
geral, a SEMUSA não a utilizava com tanta frequência, o assunto em questão é relevante para uma das partes,
pois 7 é valor médio (ou intermediário) na escala, que com vistas a conquistar confiança ou simplesmente para
varia de 1 a 158. manter a harmonia organizacional11.

Tabela 1. Utilização das táticas que evidenciam a estratégia de abstenção de conflitos.


Raramente Sempre

n Questionamentos 1 2 3 4 5 Somatório total Média

Você tenta evitar ser colocado “em má situação” e evita ir


6 sempre às Unidades Básicas de Saúde para resolver os 6 1 0 0 0 8 1
conflitos?

Você evita as discussões abertas das diferenças entre as


12 0 0 1 3 3 30 4
partes?

Você tenta guardar as divergências que percebe e ainda não


15 4 2 0 1 0 12 2
são explícitas para evitar ressentimentos?

Média total 7

RAS _ Vol. 15, No 61 – Out-Dez, 2013


138 Costa JO, Sousa MNA, Feitosa ANA, Feitosa MO, Assis EV, Custódio PP

Em continuidade, foram relacionadas as questões de mais adiante e que não necessariamente precisa ser
número 1, 5 e 7 para mensurar a incidência de táticas aprovada pelos envolvidos4.
que caracterizavam a estratégia de imposição no trato Para mensurar a ocorrência de conflitos, os gestores
com os conflitos. da SEMUSA utilizavam a estratégia de conciliação; foram
Com base nos questionamentos e nos dados apre- analisadas as questões de número 2, 8 e 13 (Tabela 4).
sentados na Tabela 3, verificou-se que as discussões dos A estratégia de conciliação diz respeito à utilização de
gestores de conflitos da SEMUSA não estavam embasadas esforços com vistas a um acordo, o que se torna conve-
nos méritos da posição que ocupavam, como modo de niente quando ambas as partes possuem o mesmo poder
fazer com que os conflitantes acolhessem as propostas de e precisam de soluções imediatas em razão do tempo.
solução sem resignação; esses, como se pode observar O acordo significa que ambas as partes vão ceder visando
na Tabela 3, não costumavam sustentar a solução em alguma recompensa11.
relação ao problema em questão a ponto de se tornarem A média total da estratégia de conciliação foi mais rele-
resistentes a outras propostas. Entretanto, mantinham vante do que a de abstenção e imposição, totalizando 8, ou
postura firme em sua posição relativa ao desacordo que seja, era mais provável a concessão do que a abstenção
está em evidência. e a imposição no trato com os conflitos (Tabela 4).
A média total resultou em 6, o que demonstrou, em A SEMUSA, em conformidade com os dados apresenta-
números, a peculiaridade com que a SEMUSA fazia dos, demonstra-se empenhada na negociação com as partes
uso dessa estratégia para solucionar os desacordos. conflitantes, todavia, a negociação não estava baseada no
Isso pode demonstrar que a atitude de se impor existia, “toma-lá-dá-cá”4. Fazer uso do “toma-lá-dá-cá” é se propor
contudo, em situações peculiares, uma vez que, segun- a qualquer tipo de negociação, estar disposto a conseguir a
do os dados, raramente se fazia uso do título de gestor; qualquer custo, em razão do tempo, o que se pretende; isso
não era comum se fechar na solução do gestor para a pode ser perigoso e prejudicial para a organização.
situação conflitante. A estratégia de imposição faz com Da mesma forma, pode-se concluir, quanto ao meio-termo,
que o gestor de conflitos utilize a tática de coerção como que esse pode fazer com que se tolerem práticas abomináveis
modo de coibir uma situação que pode ser agravante dentro da organização, e a SEMUSA raramente se propunha

Tabela 2. Utilização das táticas que evidenciam a estratégia de acomodação de conflitos.


Raramente Sempre
Somatório total Média
n Questionamentos 1 2 3 4 5

Você tenta satisfazer as expectativas das partes envolvidas


3 0 0 5 1 1 24 3
no conflito?

Você procura se conformar com os desejos das partes ou de


11 0 2 4 1 0 20 3
uma das partes envolvidas?

14 Você concorda com a solução proposta pelas partes? 0 1 6 0 0 20 3

Média total 9

Tabela 3. Utilização das táticas que evidenciam a estratégia de imposição.


Raramente Sempre
Somatório total Média
n Questionamentos 1 2 3 4 5

Você discute sua opinião com os profissionais das Unidades


1 5 1 1 0 0 10 1
Básicas de Saúde para mostrar os méritos da sua posição?

5 Você é firme na defesa de sua posição na questão? 0 0 2 1 4 30 4

Você sustenta a solução que tem em relação ao problema e


7 5 2 0 0 0 9 1
costuma não abrir mão dela?

Média total 6

RAS _ Vol. 15, No 61 – Out-Dez, 2013


Gestão de conflitos: estratégias adotadas em unidade básica de saúde 139

a esse tipo de tática, embora, de modo geral, em algumas A utilização da estratégia de colaboração almeja fazer
ocasiões, buscava a negociação com características de do conflito algo que não é infértil, pois se entende que
concessão com vistas a um acordo. a partir do conflito é possível estabelecer um processo
Por fim, foram analisadas as questões de número 4, 9 de reflexão acerca das possíveis causas do problema
e 12 sob a perspectiva de medir a utilização da estratégia em questão, analisando o que está envolvido, possibili-
de colaboração4 (Tabela 5). tando o planejamento de melhorias para as realidades
Nessa estratégia foi verificada a frequência com que a relacionadas.
SEMUSA buscava compreender em profundidade o proces- Essa maneira de lidar com o conflito como “fonte de
so de conflito por meio da busca de informações precisas melhorias” para a organização é denominada processo
e autênticas a respeito do caso e, ainda, das partes sob a autoanalítico, quando é possível construir esse espaço nos
perspectiva de que a solução fosse aceitável para todos. coletivos dos serviços de saúde, seja por meio da inter-
As questões relacionadas às táticas de colaboração venção de terceiros, externos à situação conflitante, seja
receberam a maior pontuação, o que evidenciou uma pela capacidade que determinado grupo tem de colocar
ação planejada, estratégica e positiva sobre os conflitos. e desenvolver o referido processo6,12.
A média total que mensurava a frequência da utilização
dessa estratégia incidiu em 14, ou seja, a mais comum CONSIDERAÇÕES FINAIS
entre as estratégias abordadas neste estudo. O setor de pessoal da SEMUSA era responsável pela
De acordo com informações indicadas na Tabela 5, implementação das estratégias de trato com os conflitos
os gestores de conflitos da SEMUSA sempre procuravam que ocorriam nos ambientes de trabalho dos profissio-
entender o caso a que se referia a discussão, levantavam nais lotados nela ou contratados por ela, em especial as
informações precisas a seu respeito e, no momento da equipes das UBS.
intervenção no conflito, costumavam colocar as preocu- No setor de pessoal da SEMUSA, os profissionais
pações relevantes. Nessas ocasiões, os esforços tinham eram, em sua maioria, mulheres, aptas a lidar com ques-
em vista solucioná-los com o maior nível possível de cola- tões humanas devido às seguintes características: em
boração das partes, ou seja, agindo de maneira conjunta. sua maioria adultas, casadas, tendo entre um e três filhos

Tabela 4. Utilização das táticas que evidenciam a estratégia de conciliação.


Raramente Sempre
Somatório total Média
n Questionamentos 1 2 3 4 5

Você negocia com os conflitantes, de forma que se possa


2 0 0 0 3 4 32 5
chegar a um acordo?

Você adota o “toma-lá-dá-cá”, de forma que se possa chegar


8 5 0 2 0 0 11 2
a um acordo?

13 Você propõe o meio-termo para solucionar os impasses? 4 1 1 1 0 9 1

Média total 8

Tabela 5. Utilização das táticas que evidenciam a estratégia de colaboração.


Raramente Sempre
Somatório total Média
n Questionamentos 1 2 3 4 5
Você procura saber da questão em discussão para encontrar
4 0 0 1 1 5 32 5
uma solução aceitável para todos?
Você troca informações precisas a respeito do caso para
9 0 0 1 2 4 31 4
resolver um problema em conjunto?
Você tenta colocar todas as preocupações na mesa, de forma
12 0 0 0 2 5 33 5
que as questões possam ser solucionadas da melhor forma?
Média total 14

RAS _ Vol. 15, No 61 – Out-Dez, 2013


140 Costa JO, Sousa MNA, Feitosa ANA, Feitosa MO, Assis EV, Custódio PP

e tendo completado o Ensino Superior ou parado nessa De modo geral, as estratégias adotadas podem fazer
etapa da vida acadêmica. do conflito uma oportunidade para melhoria da atuação
A população-alvo, por sua vez, encarava os conflitos das equipes das UBS; diante das situações conflitantes,
como fenômeno que exige atitude por parte da gestão, os gestores, afastando-se ao máximo de reações movi-
eventos que não podem ser totalmente ignorados. das pelos afetos e relacionando a escolha do estilo a
Sob a perspectiva de melhor visualizar a administra- ser utilizado aos objetivos organizacionais, evidenciam
ção de conflitos desenvolvida pela SEMUSA, mostrou-se o processo autoanalítico, seja por suas intervenções ou
oportuno proceder à correlação das médias totais, as quais por um programa planejado de capacitação das equipes,
evidenciavam o estilo de estratégia preferencial utilizado para que se tornem capazes de desenvolver seu próprio
na SEMUSA para a gestão estratégica de conflitos. processo autoanalítico.
Observou-se, em geral, que as ações dos gestores Propõe-se, para aperfeiçoar a gestão de conflitos, a
de conflitos eram preferencialmente norteadas pela tática realização periódica de treinamentos específicos, com vistas
de colaboração; em outras situações, adotava-se uma ao desenvolvimento dos profissionais do setor de pessoal da
postura passiva (ou de acomodação) para ganhar no SEMUSA quanto às técnicas de negociação, mediação e arbi-
futuro, dispondo-se a aceitar as propostas das partes. tragem. E, ainda, a definição clara de um método padrão de
A conciliação apresentava-se como a terceira tática mais trato com os conflitos, assumido como política organizacional
utilizada, o que demonstrava interesse de negociação em e que seja construído a partir de uma cultura de colaboração.
Espera-se que a contribuição deste estudo não
algumas situações, por conseguinte, percebeu-se que era
alcance apenas as equipes de saúde do município de
mais comum o estilo de abstenção do que o de imposição.
Patos, uma vez que oferece subsídios para a discussão
O estilo preferencial revelou que, na maioria dos
da importância de uma gestão estratégica de conflitos.
casos em que os gestores de conflitos da SEMUSA eram
acionados para intervir, as partes eram conduzidas à
REFERÊNCIAS
colaboração, na qual era necessário encontrar solução
1. Cabrera LCQ. Visões tradicionais e modernas de empresa, trabalho e pessoas.
que beneficiasse a todos e que fosse coerente com os In: Zaima G, Boog M (orgs.). Manual de gestão de pessoas e equipes:
objetivos da organização. estratégias e tendências. 5. ed. São Paulo: Conti; 2002.

Entretanto, a figura ainda possibilita a visualização da 2. Nascimento EM, El Sayed KM. Administração de conflitos. In: Mendes JTG
(org.). Gestão do capital humano [Internet]. Curitiba: Gazeta do Povo; 2002.
distância entre a colaboração e os demais estilos, isso Disponível em: http://www.unifae.br/publicacoes/pdf/gestao/capital_humano.
talvez porque essa é a mais excelente das estratégias, pdf. Acesso em: 29 de setembro de 2009.
3. Vendemiatti M, Siqueira ES, Filardi F, Binotto E, Simioni FJ. Conflito
enquanto que as demais se tornam convenientes em
na gestão hospitalar: o papel da liderança. Ciênc Saúde Coletiva.
algumas situações, por isso, apresentam médias muito 2010;15(Suppl 1):1301-14.
próximas umas das outras. 4. Rahim AMM. A measure of styles of handling interpersonal conflict. Acad
Manage J. 1983;26(2):368-76.
Em outras palavras, a estratégia para a equipe parece
5. Robbins SP. Administração: mudanças e perspectivas. São Paulo: Saraiva;
ser situacional, não havendo uma estratégia única conve- 2003.
niente para todas as situações. Porém, o estilo preferencial 6. Chiavenato I. Comportamento organizacional: a dinâmica do sucesso das
é o de colaboração, no qual se propõe a máxima integração organizações. 2. ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2005.

das partes na busca pela solução do problema em questão. 7. Cecílio LCO. É possível trabalhar o conflito como matéria-prima da gestão em
saúde? Cad Saúde Pública. 2005;21(2):508-16.
Identificou-se que, oportunamente, os gestores de
8. Vergara SC. Métodos de pesquisa em administração. 3. ed. São Paulo:
conflitos encontravam na concessão e no acordo uma Atlas; 2008.
postura estratégica para o trato com os desacordos. 9. Roesch SMA. Projetos de estágio e de pesquisa em administração: guia para
As concessões eram realizadas em situações cujo assunto estágios, trabalhos de conclusão, dissertação e estudo de caso. 3. ed. São
Paulo: Atlas; 2006.
em questão apresentava valor muito grande para o envol-
10. Marquis BL, Huston CJ. Administração e liderança em enfermagem: teoria e
vido. Comprometeram os trabalhos que desempenhavam prática. 4. ed. Porto Alegre: Artmed; 2005.
ao mesmo tempo em que tais concessões proporciona- 11. McCintyre SE. Como as pessoas gerem o conflito nas organizações:
estratégias individuais negociais. Aná Psicológica. 2007;2(25):295-305.
vam condições para que se pudesse barganhar no futuro.
12. Andrade JMF, Andrade AN, Costa TS, Feitosa MO, Videres ARN, Custódio PP.
Quanto aos acordos, esses eram realizados de maneira Auditoria de enfermagem: conhecimento dos enfermeiros de um hospital do
ética, desconsiderando a utilização de táticas ilícitas. interior paraibano. Rev Adm Saúde. 2012;14(56):123-30.

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Relato de Caso

Gestão para a segurança e a qualidade de


vida no trabalho em uma lavanderia hospitalar
Management for the safety and the quality of life at work in a hospital laundry
Denise Medianeira Mariotti Fernandes1, Sergio Brasil Fernandes2, Cristine Aspirot do Couto Ferrazza3

Palavras-chave RESUMO
Saúde do trabalhador Os trabalhadores das lavanderias hospitalares (LH) estão expostos a riscos físicos, químicos, biológicos,
Qualidade de vida ergonômicos e acidentais. Minimizar esses riscos e proporcionar qualidade de vida no trabalho (QVT) a esses
Lavanderia funcionários deve ser preocupação constante dos gestores e dos próprios colaboradores que atuam direta
Trabalhadores ou indiretamente nesse setor. Essa preocupação motivou a realização deste estudo, que teve por objetivo
Gestão em saúde analisar e descrever ações práticas que visam reduzir ou eliminar riscos à saúde do trabalhador e cumprir
normas e procedimentos estabelecidos com o intuito de melhorar a segurança e a QVT em uma lavanderia
hospitalar. A realização deste trabalho baseou-se em aportes teóricos consolidados sobre segurança e QVT
e utilizou-se, como metodologia, a pesquisa-ação de natureza qualitativa, pois esta pesquisa caracteriza-se
por ser eminentemente prática. O planejamento e a execução das ações obtiveram êxito porque, dentre outros
resultados alcançados, proporcionaram aos colaboradores um desgaste físico menor, maior segurança e,
consequentemente, melhoria da QVT. Enfatiza-se a importância de continuar investindo na formação continuada
dos trabalhadores, por meio de cursos, palestras e instruções, a fim de mantê-los motivados, colaborativos e
conscientes da importância da segurança e da QVT.

Keywords ABSTRACT
Occupational health Workers of the hospital laundries (HL) are exposed to physical, chemical, biological, ergonomic and accidental
Quality of life risks. Minimize these risks and provide quality of life at work (QLW) of these employees should be a constant
Hospital concern of the managers and of the employees themselves who work directly or indirectly in this sector. This
Workers concern was the driving force for this study, which aimed to analyze and describe practical actions that aim
Health management to reduce or eliminate risks to worker’s health and to comply with the standards and procedures established
in order to improve the safety and QLW in a hospital laundry. The accomplishment of this work was based on
theoretical contributions consolidated about safety and QLW and it was used, as methodology, the action research
of qualitative nature, because this research is characterized by being eminently practical. The planning and the
execution of the actions have been successful because, among other achievements, have given employees a
less physical wearing, better safety and, consequently, improvement of QLW. We highlight the importance of
keeping investing in the continuing training of workers, through courses, lectures and instructions, in order to
keep them motivated, collaborative and aware of the importance of QLW.

Recebido em: Trabalho realizado no Hospital de Guarnição de Santa Maria (HGuSM) – Santa Maria (RS), Brasil.
19/08/2013 1.Administradora; Professora da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) – Cerro Largo (RS); Mestre em Engenharia de
Aprovado em: Produção pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) – Santa Maria (RS); Aluna do Programa de Pós-Graduação em
22/12/2014 Desenvolvimento Regional da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC) – Santa Cruz do Sul (RS), Brasil.
Conflito de interesses: 2.Militar; Encarregado da Lavanderia Hospitalar do HGuSM; Especialista em Gestão Educacional pela UFSM – Santa Maria
nada a declarar (RS), Brasil.
Fonte de financiamento: 3.Enfermeira; Chefe da Lavanderia Hospitalar do HGuSM; Especialista em Enfermagem do Trabalho pelo Centro São Camilo
de Desenvolvimento em Administração da Saúde (CEDAS) – São Paulo (SP), Brasil.
nenhuma
Endereço para correspondência: Denise Medianeira Mariotti Fernandes – Universidade Federal da Fronteira Sul – Rua Major
Antônio Cardoso, 590 – CEP: 97900-000 – Cerro Largo (RS), Brasil – E-mail: denise.fernandes@uffs.edu.br
142 Fernandes DMM, Fernandes SB, Ferrazza CAC

INTRODUÇÃO e QVT; na terceira seção, descrevem-se os aspectos


A lavanderia hospitalar (LH) é o setor responsável pela metodológicos utilizados no estudo; na quarta, apresen-
lavagem e desinfecção das roupas hospitalares e visa tam-se um diagnóstico com a identificação e definição
controlar infecções; executar o processamento das roupas do problema, o planejamento e a execução das ações
com qualidade, segurança e eficiência, utilizar técnicas visando à resolução desse problema, a avaliação dos
adequadas ao processamento da roupa, a fim de reduzir processos executados e uma reflexão sobre os resultados
custos; racionalizar tempo e material; e proporcionar um alcançados; por fim, na quinta seção, são expostas as
ambiente seguro e qualidade de vida no trabalho (QVT) considerações finais.
aos profissionais que atuam na lavanderia.
Esse setor, no entanto, é um ambiente insalubre, A IMPORTÂNCIA DA SEGURANÇA PARA
geralmente, quente e úmido, onde são lavadas roupas A QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO
infectadas com sangue, secreções e/ou excreções e, Desempenhar atividades laborais em lavanderias
além disso, são utilizados produtos químicos para a hospitalares com segurança no trabalho significa: utili-
desinfecção, faz-se esforço físico para pesar, passar, zar equipamentos de proteção individual (EPI), operar
dobrar e transportar roupas, e operam-se máquinas, tais máquinas com bom funcionamento e manutenção em dia,
como: lavadoras, centrífugas, secadoras, dentre outras. dispor de uma infraestrutura adequada com boa ventilação
Por atuarem nesse ambiente insalubre e executarem e iluminação, realizar exames médicos e psicológicos
todas essas atividades elencadas, pode-se afirmar que regularmente, estar preparado tecnicamente para o traba-
os trabalhadores das lavanderias hospitalares estão lho, conhecer as funções, as ações e os procedimentos
expostos a riscos físicos, químicos, biológicos, ergonô- que são desenvolvidos no setor e que devem constar do
micos e acidentais e que essa exposição pode afetar Manual da Lavanderia.
sobremaneira a segurança no trabalho e, consequente- Chiavenato1 valida essa ideia ao conceituar segurança
mente, a QVT deles. no trabalho como
Por isso, proporcionar um ambiente seguro e QVT aos
profissionais que trabalham na LH — objeto deste estu- [...] o conjunto de medidas técnicas, educacionais,
do — é essencial e, para isso, exige-se especial atenção médicas e psicológicas utilizadas para prevenir
ao cumprimento fiel das normas e procedimentos. acidentes, quer eliminando as condições inseguras do
Considerando que o conceito de QVT engloba aspec- ambiente, quer instruindo ou convencendo as pessoas
tos que se referem à segurança no trabalho, ao bem-estar e sobre a implantação de práticas preventivas.
à saúde do trabalhador no desempenho de suas atividades
laborais e que, além disso, leva em conta os aspectos físi- Nesse sentido, os gestores precisam oferecer um
cos, ambientais e psicológicos para a obtenção da QVT1, ambiente de trabalho com condições de segurança, saúde
minimizar esses riscos e proporcionar qualidade de vida e bem-estar aos trabalhadores, protegendo-os de doenças
no trabalho a esses funcionários devem ser preocupações ocupacionais e garantindo a integridade física e mental3.
constantes dos gestores, pois “[...] o sucesso das organi- Dessa forma, infere-se que a segurança no trabalho
zações depende cada vez mais do fator humano”2. é um fator de grande relevância capaz de interferir direta-
Nesse contexto, gestores do Hospital de Guarnição de mente na obtenção de QVT. Por isso, deve ser tratada com
Santa Maria (HGuSM), com essas preocupações, viabiliza- bastante atenção e responsabilidade.
ram a realização deste estudo que tem por objetivo analisar Cabe ressaltar que, além da segurança no trabalho, a
e descrever ações práticas que visam reduzir ou eliminar QVT envolve diversos outros fatores que estão inseridos
riscos à saúde do trabalhador e ao cumprimento das normas em indicadores econômicos, políticos, psicológicos e
e dos procedimentos estabelecidos com o intuito de melho- sociológicos4.
rar a segurança e a QVT em uma lavanderia hospitalar. Esse conjunto de fatores vai determinar o nível de QVT
Para atingir o propósito do trabalho, este artigo dos trabalhadores. Torna-se óbvia, portanto, que a ação dos
está estruturado em cinco seções: esta primeira seção gestores deve ir ao encontro dos anseios e das necessida-
apresentou uma abordagem introdutória sobre o tema; a des desses trabalhadores e proporcionar-lhes um ambiente
segunda contém a revisão de literatura sobre segurança propício para um bom desenvolvimento das atividades

RAS _ Vol. 15, No 61 – Out-Dez, 2013


Gestão para a segurança e a qualidade de vida no trabalho em uma lavanderia hospitalar 143

laborais. Isso engloba instalações físicas amplas e confor- Fernandes4 conceitua QVT como
táveis, utilização de EPI, realização de exames médicos e
laboratoriais periódicos e de consultas médicas e psicoló- a gestão dinâmica e continental de fatores físicos, tecno-
gicas, controle de vacinas e jornada de trabalho adequada. lógicos e sociopsicológicos que afetam a cultura e reno-
Por envolver essa grande gama de aspectos, conceituar vam o clima organizacional, refletindo-se no b ­ em-estar
QVT não pode ser uma questão definitiva, pois a percepção do trabalhador e na produtividade das empresas.
do que é qualidade de vida está em constante transforma-
ção e modifica-se de acordo com a evolução do conheci- Nesse contexto, apresenta-se um dos modelos de QVT
mento dos gestores e com as exigências da sociedade e (Quadro 1), com o intuito de facilitar a compreensão do
dos próprios trabalhadores ao tornarem-se conscientes de processo de obtenção de QVT e abordar seus objetivos.
sua importância para a organização em que atuam. Ressalta-se que esse modelo foi utilizado para analisar o
Segundo Limongi-França5, QVT nível de QVT da equipe da LH e para levantar os fatores
que deveriam ser aprimorados.
é o conjunto de ações de uma empresa no sentido de A análise ocorreu na lavanderia do HGuSM, um hospital
implantar melhorias e inovações gerenciais, tecnológi- militar, onde se verificou que, dentre outros aspectos, os
cas e estruturais no ambiente de trabalho. funcionários são concursados, estabilizados no emprego;
percebem salários, em média, três vezes maiores aos
Alicerçada na filosofia humanista, a QVT visa equilibrar pagos para empregados de lavanderias de hospitais
as expectativas do trabalhador (satisfação e bem-estar privados ou lavanderias terceirizadas, de acordo com
no trabalho) e da organização (melhores resultados levantamento feito em outras quatro lavanderias; e têm
organizacionais). consciência da importância do serviço que prestam aos

Quadro 1. Modelo de Walton.


Fatores de QVT Dimensões
1. Renda (salário) adequada ao trabalho
1. Compensação justa e adequada 2. Equidade interna (compatibilidade interna)
3. Equidade externa (compatibilidade externa)
4. Jornada de trabalho
2. Condições de segurança e saúde no trabalho
5. Ambiente físico (seguro e saudável)
6. Autonomia
7. Significado da tarefa
3. Utilização e desenvolvimento de capacidades 8. Identidade da tarefa
9. Variedade de habilidades
10. Retroação e retroinformação
11. Possibilidades de carreira
4. Oportunidades de crescimento e segurança 12. Crescimento profissional
13. Segurança do emprego
14. Igualdade de oportunidades
5. Integração social na organização 15. Relacionamentos interpessoais e grupais
16. Senso comunitário
17. Respeito às leis e direitos trabalhistas
18. Privacidade pessoal
6. Garantias constitucionais
19. Liberdade de expressão
20. Normas e rotinas claras da organização
7. Trabalho e espaço total de vida 21. Papel balanceado do trabalho na vida pessoal
22. Imagem da empresa
8. Relevância social da vida no trabalho 23. Responsabilidade social pelos produtos/serviços
24. Responsabilidade social pelos empregados
QVT: qualidade de vida no trabalho.
Fonte: Walton, citado em Chiavenato1.

RAS _ Vol. 15, No 61 – Out-Dez, 2013


144 Fernandes DMM, Fernandes SB, Ferrazza CAC

pacientes hospitalares. Em virtude disso, considerou-se na segurança e na QVT dos colaboradores que atuam
que as Dimensões relativas aos Fatores de QVT 1, 3, 4, 5, em uma LH.
6, 7 e 8 eram atendidas de maneira satisfatória. Enfatiza-se que, para realizar essas ações, a obser-
Por isso, neste estudo enfatiza-se, dentre os oito fato- vação participante foi a técnica empregada para a coleta
res que compõem esse modelo de QVT, a importância dos dados e que, a partir da análise desses dados,
do fator de QVT “2. Segurança e saúde nas condições evidenciaram-se riscos à saúde do grupo pesquisado.
de trabalho” que aborda as dimensões “4. Jornada de Em consequência disso, fez-se necessária a análise de
trabalho” e “5. Ambiente físico (seguro e saudável)”, pois vasta legislação e documentação, a elaboração um plane-
considera-se que esse fator é essencial para se obter uma jamento minucioso e a implantação de medidas visando
melhoria considerável na QVT dos trabalhadores. à padronização da execução de ações. Além disso, foi
preciso considerar os aspectos positivos que estavam
METODOLOGIA sendo praticados, corrigir as distorções existentes na LH e
Este estudo caracteriza-se por ser eminentemente orientar os colaboradores para que modificassem hábitos
prático. Os pesquisadores são parte integrante do grupo e métodos equivocados que estivessem contribuindo para
de participantes pesquisados e há um estímulo para que um maior risco à saúde deles.
toda a equipe de trabalhadores interaja e participe das
decisões que, de alguma forma, influenciam o bem-estar AÇÕES PARA MELHORIA DA QUALIDADE DE
da coletividade em uma LH. Portanto, justifica-se a opção VIDA NO TRABALHO EM UMA LAVANDERIA
pela pesquisa-ação de natureza qualitativa. HOSPITALAR
Diante disso, cabe ressaltar que: Os relatos e/ou reclamações dos funcionários quanto a
dores nas costas, quanto ao funcionamento das máquinas
Quando falamos de pesquisa, estamos pensando utilizadas na lavanderia, o que poderia vir a causar aciden-
em pesquisa-ação, isto é, uma ação em nível realista, tes de trabalho, e quanto à falta de EPI representaram
sempre acompanhada de uma reflexão autocrítica obje- o ponto de partida para a realização deste estudo. Era
tiva e de uma avaliação dos resultados. [...] Não quere- necessário realizar ações que melhorassem as condições
mos ação sem pesquisa, nem pesquisa sem ação6. de segurança e trabalho na LH, pois era nítido que havia
riscos à saúde dos trabalhadores da lavanderia que deve-
A pesquisa-ação “visa à mudança de atitudes, riam ser reduzidos ou eliminados.
de práticas, de situações, de condições de produtos, A fim de verificar tais aspectos, formou-se uma equipe
de discursos [...]”7. Nessa mesma linha de pensamento, de pesquisadores para, junto com os colaboradores da
Thiollent8 explica que “[...] a pesquisa-ação, além da LH, diagnosticar a QVT, analisar e avaliar os processos,
participação, supõe uma forma de ação planejada de propor melhorias na segurança dos trabalhadores e realizar
caráter social, educacional, técnico ou outro, [...]” e a ações para obtenção de mais QVT.
define como Consultaram-se normas regulamentadoras do
Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), manuais do
um tipo de pesquisa social com base empírica que é Ministério da Saúde e da Agência Nacional de Vigilância
concebida e realizada em estreita associação com uma Sanitária (ANVISA), além de vasta bibliografia sobre
ação ou com a resolução de um problema coletivo e segurança e qualidade de vida no trabalho, a fim de
no qual os pesquisadores e os participantes represen- aprimorar e/ou obter e/ou transmitir conhecimento teórico
tativos da situação ou do problema estão envolvidos e vinculá-lo à prática.
de modo cooperativo ou participativo (p. 16). Constatou-se que as instalações da lavanderia não
eram adequadas ao desempenho laboral em uma LH; os
Importante destacar que a pesquisa-ação tem como EPI não eram utilizados; a vacinação não estava em dia; e
objetivo principal produzir mudanças por meio de ações trans- os equipamentos estavam obsoletos e/ou sem manutenção.
formadoras de uma realidade a ser melhorada, aperfeiçoada9. Observou-se que a falta de conhecimento sobre
Nesse sentido, este estudo descreve ações que, na aspectos relacionados ao processamento das roupas, à
prática cotidiana, produziram mudanças para melhoria utilização dos produtos químicos para realizar a lavagem

RAS _ Vol. 15, No 61 – Out-Dez, 2013


Gestão para a segurança e a qualidade de vida no trabalho em uma lavanderia hospitalar 145

e ao emprego correto dos equipamentos levavam à exaus- (pesquisadores) de processo instruíram os votantes
tão ao final de uma jornada de trabalho. (a chefe, o encarregado e os outros cinco funcionários
Verificou-se que não havia um Manual de Lavanderia lotados na LH) para que escolhessem a causa do problema
que descrevesse os procedimentos a serem realizados no que deveria ser eliminada com maior urgência, a fim de
ambiente de trabalho. reduzir os riscos à saúde de todos os trabalhadores da
Nessa primeira avaliação, pode-se identificar que havia LH (chefia, área suja e área limpa).
muitas causas que contribuíam para um elevado índice de A partir da classificação obtida na votação, verificou-se
riscos à saúde dos trabalhadores da LH. que as instalações inadequadas eram a causa fundamen-
Diagnosticado o problema, toda a equipe foi envol- tal do problema. Mas, apesar disso, a equipe assumiu o
vida para encontrar soluções que eliminassem suas compromisso de perseverar na busca das soluções para
causas, pois a participação democrática é importante todas as causas levantadas.
no relacionamento humano dos integrantes do grupo Diante dessa constatação, era preciso realizar ações
pesquisado, independentemente da hierarquia dentro urgentes para minimizar ao máximo o problema (riscos à
da instituição. Se o problema é de todos, logo, a solu- saúde dos trabalhadores da lavanderia hospitalar), elimi-
ção para eliminar as causas desse problema deve ser nando suas causas.
encontrada por todos.
Isso gerou maior satisfação aos funcionários, pois, Instalações inadequadas (causa no 1 resolvida)
segundo eles próprios, é importante a participação de toda As instalações das lavanderias hospitalares devem
a equipe, já que, além de considerar ideias e experiências atender ao que regula a Resolução da Diretoria Colegiada
práticas, são eles os atores principais no processamento nº 50 (RDC-50), da ANVISA13, pois essa é a resolução que
das roupas hospitalares e conhecem mais do que qualquer trata do planejamento, programação, elaboração e avalia-
outra pessoa as etapas do processo e os riscos a que ção de projetos físicos de estabelecimentos assistenciais
podem estar expostos, caso não ocorra um zelo maior de saúde.
nas condições em que atuam. Essa resolução prevê para as unidades de processa-
Feigenbaum10 corrobora essa constatação dos funcio- mento de roupas de serviços de saúde: parede com visor
nários da LH ao argumentar que a QVT tende a ocorrer de entre a área limpa e a área suja e banheiro com vestiário
forma mais natural nos ambientes onde os colaboradores de barreira na área suja. Acrescenta-se a isso que
se envolvem nas decisões que influenciam seu dia a dia
no trabalho. A barreira de separação só é realmente eficiente se
Essa ideia é compartilhada por Fernandes4, que utiliza existirem as lavadoras com duas portas de acesso,
uma metodologia que parte do princípio de que não há uma para cada área, na parede que separa a área
ninguém melhor para avaliar suas necessidades e, conse- suja da área limpa14.
quentemente, desempenhar bem sua função e melhorar
sua QVT do que o próprio trabalhador. Isolar a área suja da área limpa, utilizando para isso
Por isso, a chefe da lavanderia reuniu os trabalhadores um sistema de barreiras físicas, é essencial para a saúde
para, com base em um diagrama de causa-efeito, elabo- dos trabalhadores, além de ser obrigatório, de acordo
rar uma lista das causas do problema central que estava com o Manual de Processamento de Roupas de Serviços
prejudicando a segurança (Quadro 2) e a QVT. de Saúde: Prevenção e Controle de Riscos, da ANVISA14.
As causas do problema foram levantadas, de acordo Dessa forma, pode-se controlar infecções hospitalares e
com a visão de cada um dos trabalhadores sobre as evitar a transmissão de doenças virais e bacterianas.
atividades desenvolvidas na LH. Além desses dados cole- Verificou-se que, apesar de as lavadoras serem de
tados, levou-se em consideração também as orientações barreira e de a parede que separa a área suja da área
e determinações constantes nas legislações do MTE e do limpa possuir visão adequada, por meio de visor, era
Ministério da Saúde no que tange à saúde e à segurança preciso, urgentemente, fazer adaptações nas instala-
no trabalho em lavanderias hospitalares. ções da lavanderia, pois a área suja possuía ligação
Para identificar a causa fundamental do problema foi com a área limpa, por meio de uma porta de madeira
utilizada a Votação de Pareto (Quadro 3). Os avaliadores que era fechada apenas na hora da lavagem, e não havia

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146 Fernandes DMM, Fernandes SB, Ferrazza CAC

Quadro 2. Relação das causas que põem em risco a saúde dos trabalhadores da lavanderia hospitalar.
Problema Riscos à saúde dos trabalhadores da lavanderia hospitalar
Nº 1 Instalações inadequadas
1) área suja interligada à área limpa
Letra A 2) iluminação precária e ventilação insuficiente
3) falta de um banheiro específico para os funcionários que atuam na área suja
Nº 2 Uso dos equipamentos de proteção individual (EPI)
1) falta conscientização dos próprios trabalhadores quanto ao uso correto dos EPI
Letra B 2) EPI inadequados e/ou falta de EPI
3) falta de cobrança/exigência da chefe para que os funcionários usem os EPI
Nº 3 Vacinação
1) falta de vacinação nos trabalhadores da lavanderia
Letra C 2) falta dos registros das vacinas realizadas nas carteiras de vacinação
3) despreocupação dos próprios trabalhadores quanto à vacinação
Nº 4 Equipamentos obsoletos e/ou sem manutenção
1) uso de uma secadora elétrica muito antiga (alto consumo de energia elétrica)
Letra D 2) a balança utilizada para pesar a roupa suja está muito velha; adquirir uma balança nova
3) falta de manutenção nos equipamentos
Nº 5 Excesso de trabalho
1) realização de mais lavagens do que o necessário
Letra E 2) lavagem de roupas limpas que voltam das unidades misturadas às roupas sujas
3) uso inadequado das máquinas e equipamentos
Nº 6 Preparo técnico-profissional
1) falta de treinamento específico para desempenho das atividades na lavanderia
Letra F 2) pouca realização de palestras/cursos para treinar o pessoal da lavanderia
3) falta de leitura de manuais técnicos de lavanderia
Fonte: adaptado do diagrama de causa-efeito proposto por Slack et al.11.

Quadro 3. Votação de Pareto realizada na lavanderia hospitalar.


Votantes
A B C D E F G Soma Classificação
Causas
Instalações inadequadas X X X 3 1º
Uso dos equipamentos de proteção individual (EPI) X 1 3º
Vacinação X X 2 2º
Equipamentos obsoletos e/ou sem manutenção X 1 3º
Excesso de trabalho 0 4º
Preparo técnico-profissional 0 4º
Fonte: adaptado da Votação de Pareto proposta pela Escola Nacional de Administração Pública (ENAP)12.

um banheiro exclusivo para o funcionário que atuava na Uso dos equipamentos de proteção
área contaminada. individual (causa no 2 resolvida)
Por isso, procurou-se um profissional habilitado Observou-se que a utilização dos EPI previstos não
(arquiteto) para propor uma adequação ao ambiente era realizada, em grande parte, por reação dos próprios
físico que atendesse não só às exigências impostas colaboradores. Reclamavam que era incômodo e que “não
pela legislação (RDC-50), mas principalmente às neces- protegia grande coisa”.
sidades de prevenção quanto à saúde e à segurança A leitura da NR 6 (Equipamento de Proteção Individual),
dos trabalhadores. do MTE15, foi a primeira atitude tomada pela equipe, a fim
Tal adequação foi realizada com sucesso e, além de de buscar a eliminação dessa causa. É preciso ter cons-
a barreira entre a área suja e a área limpa estar efetivada ciência de que, para os fins da aplicação da NR 6,
de maneira correta e ter sido construído um banheiro com
vestiário exclusivo para o funcionário que trabalha na área considera-se Equipamento de Proteção Individual -
suja, o ambiente foi climatizado, garantindo maior conforto EPI, todo dispositivo ou produto, de uso individual
no local de labor. utilizado pelo trabalhador, destinado à proteção de

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Gestão para a segurança e a qualidade de vida no trabalho em uma lavanderia hospitalar 147

riscos suscetíveis de ameaçar a segurança e a saúde Cabe destacar ainda que, atendendo ao que
no trabalho (p. 50)15. prescreve a NR 7 (Exames Médicos) do MTE 17, além
do acompanhamento da vacinação, definiu-se que os
Verificou-se que é imprescindível o uso de máscaras, funcionários devem passar por um controle de saúde,
botas impermeáveis, luvas de borracha, óculos, toucas e por meio de exames médicos e audiométricos, pelo
avental impermeável em uma LH, principalmente na área suja, menos uma vez por ano.
a fim de que os trabalhadores não sofram contaminações. No que tange a esses aspectos, entende-se que é
Dessa forma, buscou-se, por meio de palestras e essencial aos trabalhadores de uma LH estarem saudá-
instruções, a conscientização quanto à importância da veis para o desempenho de suas funções, mas princi-
utilização dos EPI, a fim de evitar uma série de doenças palmente estarem cientes sobre as próprias condições
(hepatites, febre tifoide, tuberculose, rotavírus, varicela etc.) de saúde.
e infecções hospitalares.
Além disso, a chefia encarregou-se de obter, junto ao Equipamentos obsoletos e/ou sem manutenção
centro de custo responsável pelas aquisições do hospital, (causa no 4 resolvida)
os EPI para atender às necessidades da equipe de traba- A manutenção em lavanderia
lhadores da LH.
Atualmente, o uso dos EPI é obrigatório e previsto no compreende cuidados técnicos indispensáveis ao
Manual da LH. Porém, o aspecto preponderante para a funcionamento regular e permanente dos motores,
obtenção de êxito nesse quesito deve-se à conscientização máquinas e instalações e engloba tanto as medidas
dos funcionários sobre a importância desses equipamen- preventivas como as corretivas (p. 39)18.
tos para a saúde deles próprios.
Portanto, aliando essa conscientização dos colabora- Conforme Torres e Lisboa19:
dores à disponibilidade, em quantidades suficientes, de
EPI para serem usados, essa causa foi eliminada. Para o trabalhador, a manutenção é uma das medidas de
segurança que a empresa oferece, a fim de ­protegê-lo
Vacinação (causa no 3 resolvida) de possíveis riscos de acidentes (p. 133).
Verificou-se que os funcionários estavam com todas
as vacinas vencidas e que os exames médicos e audiomé- A qualidade e a eficiência do processamento das
tricos não eram realizados há mais de cinco anos. Diante roupas hospitalares dependem da manutenção regular
disso, procurou-se, com celeridade, fazer um trabalho de das máquinas e equipamentos da LH. Apesar dessa
verificação nas legislações em vigor e de pôr em prática o importância, constatou-se que, além de uma centrífuga e
que nelas estava previsto, a fim de viabilizar, nesse aspecto, uma secadora parada, havia problemas hidráulicos e/ou
mais segurança aos trabalhadores. panes elétricas em todas as outras máquinas em uso.
A NR 32 (Segurança e Saúde no Trabalho em Estabeleceu-se que ficaria a cargo do encarregado
Estabelecimentos de Saúde) do MTE16 trata da vacinação da lavanderia a tarefa de realizar/coordenar a manuten-
dos trabalhadores da área de saúde e determina proce- ção (levantar defeitos, encontrar mecânicos, providenciar
dimentos a serem adotados de suma importância para a recursos/meios para aquisição de peças e pagamento de
prevenção das doenças imunopreveníveis. As principais pessoal contratado para realizar a manutenção).
vacinas são contra as hepatites A e B; contra difteria e Os problemas, em sua grande maioria, foram resolvi-
tétano; contra febre amarela; contra sarampo, caxumba e dos pelos próprios trabalhadores da LH que, dispondo de
rubéola; contra tuberculose; contra influenza e pneumo- peças novas, realizaram a reposição e/ou troca. Somente
cocos; e contra varicela. os consertos relativos a problemas eletrônicos e elétricos
Nesse contexto, a chefia da LH encarregou-se de obter, dos equipamentos necessitaram de pessoal especializado
junto à Secretaria Municipal de Saúde do município de Santa (técnicos contratados). As máquinas ficaram em perfeitas
Maria (RS), as doses necessárias para realizar as vacinas condições de trabalho e seguras.
nos integrantes da equipe. Dessa forma, todos foram imuni- Ainda, houve necessidade de substituição da balan-
zados e estão com suas carteiras de vacinação atualizadas. ça para realizar a pesagem das roupas hospitalares na

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148 Fernandes DMM, Fernandes SB, Ferrazza CAC

área contaminada por uma nova, uma vez que o equipa- Elaboração do Manual Técnico
mento estava todo enferrujado e com o funcionamento Administrativo da Lavanderia Hospitalar
comprometido. A administração da lavanderia identificou a neces-
Cabe destacar que foi realizado um planejamento para sidade da elaboração de um manual que, de acordo
aquisição de novas máquinas e equipamentos, por meio com as particularidades do hospital, definisse a forma
de pregão eletrônico (Sistema de Registro de Preços). ideal para a atuação dos funcionários da LH, de modo
Por se tratar de uma instituição pública, os gestores do que realizassem um processamento de roupas eficaz
hospital solicitaram recursos para tal aquisição aos esca- com segurança e consequente QVT. Ademais, a ANVISA
lões superiores que sinalizaram com uma boa perspectiva determina que:
de concedê-los.
A unidade de processamento de roupas deve possuir
Excesso de trabalho (causa n 5 resolvida)
o
normas e rotinas padronizadas e atualizadas de
Por meio de palestras, da interação com funcionários todas as atividades desenvolvidas, as quais devem
de outras lavanderias, verificou-se que era possível realizar estar registradas e acessíveis aos profissionais
menos lavagens (menor número de maquinadas) com envolvidos (p. 19)14.
melhor eficácia na desinfecção.
A utilização da balança nova para pesar as roupas na De acordo com as orientações contidas no Manual
área suja viabilizou o uso correto das lavadoras. Assim, de Lavanderia Hospitalar, do Ministério da Saúde 18,
as máquinas trabalham num regime mais adequado, quanto à elaboração de manual próprio, e no Manual
proporcionando economia de água, de produto quími- de Processamento de Roupas de Serviços de Saúde:
co e, principalmente, menor número de horas efetivas Prevenção e Controle de Riscos, da ANVISA14, quanto
trabalhadas no processamento das roupas hospitalares. ao registro de normas e rotinas padronizadas para os
Isso propiciou, entre outras vantagens, menos desgaste serviços realizados em lavanderia hospitalar, os pesqui-
físico, mais tempo para aperfeiçoar a higienização do sadores auxiliados pelos trabalhadores da LH elabora-
setor, para a manutenção dos equipamentos e para a ram e implantaram o Manual Técnico Administrativo da
organização da rouparia. Lavanderia Hospitalar.
O excesso de trabalho foi eliminado. Os funcionários Importante ressaltar que essas normas e determina-
têm a consciência e a certeza de que executam atividades ções não são estáticas. É preciso realizar as avaliações
necessárias, nem mais nem menos do que o necessário periódicas para que se aperfeiçoe cada vez mais o proces-
para realizar o processamento da limpeza e desinfecção samento das roupas hospitalares.
das roupas hospitalares. O Manual foi elaborado com os objetivos de: contro-
lar as infecções; processar as roupas hospitalares com
Preparo técnico-profissional (causa no 6 resolvida) qualidade, segurança e eficiência; preservar a qualidade
A falta de preparo técnico-profissional foi resolvida das roupas, em todas as etapas de seu processamento;
com a matrícula e participação do pessoal da lavanderia utilizar técnicas adequadas ao processamento da roupa,
no curso de Otimização de Processos e Procedimentos a fim de reduzir custos; racionalizar tempo e material;
Operacionais em Lavanderias Hospitalares, ofereci- e proporcionar um ambiente de trabalho seguro aos
do pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial profissionais que atuam na lavanderia. Ou seja, as
­(SENAI-RS), por meio da realização de palestras sobre normas e procedimentos constantes no manual abran-
processamento de roupas hospitalares e do fiel cumpri- gem aspectos que interferem diretamente na QVT dos
mento do Manual da Lavanderia, que os próprios funcio- trabalhadores.
nários ajudaram a elaborar. Dessa forma, além de atender ao que prescreve o
Cabe ressaltar que essas ações devem ser constante- Ministério da Saúde e a ANVISA, a LH possui uma diretriz
mente realizadas para que a formação e o aperfeiçoamento própria em que constam todos os aspectos inerentes aos
técnico-profissional sejam continuados. Dessa maneira, trabalhos realizados, etapas do processamento de roupas
é possível manter um excelente nível de qualidade no hospitalares, os horários de trabalhos, enfim, tudo o que
processamento de roupas hospitalares. diz respeito ao funcionamento da LH.

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Gestão para a segurança e a qualidade de vida no trabalho em uma lavanderia hospitalar 149

CONSIDERAÇÕES FINAIS trabalho melhorarão e, em virtude disso, poderá haver um


O presente artigo apresentou a análise e a descrição ganho significativo na QVT. Por isso, devem ser de amplo
de ações práticas realizadas na lavanderia hospitalar do conhecimento dos colaboradores que atuam nesse setor.
HGuSM que têm o propósito de reduzir ou eliminar riscos Evidenciou-se que, com a melhoria na QVT, os trabalha-
à saúde do trabalhador e atender às normas e procedi- dores da LH mostraram-se mais estáveis ­emocionalmente,
mentos estabelecidos para o trabalho nesse ambiente, menos estressados, mais motivados, mais eficientes na
com o intuito de melhorar a segurança e a qualidade de labuta (processamento das roupas hospitalares), mais
vida desses funcionários. atentos e mais receptivos às recomendações e orienta-
Desenvolveu-se um trabalho com ações conjuntas e ções. Além disso, passaram a ter satisfação pelo trabalho
a participação de todos os envolvidos no processo. Essa realizado e por estarem em um ambiente agradável onde
vivência propiciou um ganho pessoal e profissional a cada são valorizados por desempenhar uma função importante
um dos integrantes do grupo (pesquisadores e colabo- no contexto hospitalar.
radores), pois utilizou-se uma metodologia que viabiliza É relevante salientar que todas as atividades realizadas
a realização de ações práticas, além de acrescentar aos na LH devem ser permanentemente monitoradas, pois isso
saberes atuais as ações bem sucedidas, ampliando o propicia aos gestores fazer uma análise correta e eficiente
conhecimento e sugestionando o aperfeiçoamento dessas dos aspectos a serem corrigidos e/ou aperfeiçoados.
ações e de outras na rotina diária do trabalho em lavan- Nesses quesitos, acrescenta-se que avulta em importância
deria hospitalar. a participação proativa da equipe diretiva da LH.
O planejamento e a execução deste estudo A ideia é continuar investindo em educação para o
­mostraram-se exitosos porque, dentre outros resultados trabalho e formação continuada (capacitação e aperfei-
alcançados, proporcionaram um desgaste físico menor, çoamento) dos trabalhadores. Dessa forma, pretende-se
mais segurança no trabalho e QVT aos colaboradores. mantê-los motivados e colaborativos para que, cada vez
A exposição aos fatores de risco à saúde diminuiu, consi- mais, a QVT melhore.
deravelmente, com a adequação das instalações físicas; Em síntese, é preciso manter os trabalhadores da
a utilização de todos os EPI previstos; a vacinação em dia lavanderia hospitalar capacitados, por meio de cursos,
e a programação para a realização de exames audiométri- palestras e instruções, padronizar e cumprir as normas
cos anuais; a manutenção dos equipamentos; a redução e procedimentos adotados, propiciar instalações físicas
do tempo gasto no processamento da roupa e com o adequadas, dispor de máquinas e equipamentos em boas
preparo técnico-profissional condizente com o exercício condições de funcionamento (novos e/ou com manuten-
das funções em uma lavanderia hospitalar. ção em dia) e, principalmente, conscientizá-los de que
A participação no levantamento e na solução das eles próprios são responsáveis, em grande parte, pela
causas do problema, bem como na elaboração do Manual segurança e qualidade de vida no trabalho.
Técnico Administrativo da Lavanderia Hospitalar, propiciou
a interação e o envolvimento dos funcionários em relação a REFERÊNCIAS
questões que afetavam sua rotina diária de trabalho. Essa 1. Chiavenato I. Gestão de pessoas: o novo papel dos recursos humanos nas
contribuição foi fator decisivo para o sucesso deste estudo. organizações. Rio de Janeiro: Elsevier; 1999.
2. Sobral F, Peci A. Administração: teoria e prática no contexto brasileiro. São
Cabe ressaltar que a execução das tarefas na LH deve
Paulo: Pearson Prentice-Hall; 2008.
ser baseada, principalmente, nas legislações inerentes
3. Tachizawa T, Ferreira VCP, Fortuna AAM. Gestão com pessoas: uma abordagem
à saúde e ao trabalho. Dessa forma, as normas e os aplicada às estratégias de negócios. 2ª edição. Rio de Janeiro: FGV; 2001.
procedimentos que regem as atividades desenvolvidas e 4. Fernandes EC. Qualidade de vida no trabalho: como medir para melhorar. 2ª
o fim a que se destinam devem constar em um manual de edição. Salvador: Casa da Qualidade; 1996.
5. Limongi-França AC. As pessoas na organização. São Paulo: Gente; 2002.
lavanderia hospitalar. Esse manual deve ser prático, de fácil
6. Haguette TMF. Metodologias qualitativas na sociologia. 12ª edição. Petrópolis:
entendimento, acessível aos variados níveis de intelectuali- Vozes; 2010.
dade dos funcionários, ser eficaz e, principalmente, mostrar 7. Barbier R. A pesquisa-ação. Brasília: Plano Editora; 2002.
ao trabalhador que, ao cumprir as regras e procedimentos 8. Thiollent M. Metodologia da pesquisa-ação. 16ª edição. São Paulo:
estabelecidos, as condições de labuta e a segurança no Cortez; 2008.

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150 Fernandes DMM, Fernandes SB, Ferrazza CAC

9. Richardson RJ. Como fazer pesquisa-ação. In: Richardson RJ, organizador. 15. Brasil. Ministério do Trabalho e Emprego. Secretaria de Inspeção do Trabalho.
Pesquisa-ação. João Pessoa: Editora Universitária/UFPB; 2004. p. 149-74. Portaria nº 25, de 15.10.2001. Altera a Norma Regulamentadora que trata de
Equipamento de Proteção Individual – NR 6 e dá outras providências. Diário
10. Feigenbaum AV. Controle de qualidade total. 40ª edição. São Paulo: Makron
Oficial da República Federativa do Brasil. 2001 Out 17; Seção 1: 50-2.
Books; 1994.
16. Brasil. Ministério do Trabalho e Emprego. Gabinete do Ministro. Portaria nº
11. Slack N, Chambers S, Johnston R. Administração da produção. 3ª edição.
485, de 11.11.2005. Aprova a Norma Regulamentadora nº 32 (Segurança e
São Paulo: Atlas; 2009.
Saúde no Trabalho em Estabelecimentos de Saúde). Diário Oficial da República
12. Escola Nacional de Administração Pública. Análise e Melhoria de Processos. Federativa do Brasil. 2005 Nov 16; Seção 1: 80-94.
Brasília: ENAP; 2011. Disponível em: https://moodle.eadenap.serpro.gov. 17. Brasil. Ministério do Trabalho e Emprego. Secretaria de Segurança e
br/file.php/1/cursos/arqeadenap/Cursos/amp/htmls_nova_versao/mod03/ Saúde no Trabalho. Portaria nº 24, de 29.12.1994. Aprova o texto da norma
base03.html. Acesso em: 26 de agosto de 2012. regulamentadora nº 7 (Exames Médicos). Diário Oficial da República
13. Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Federativa do Brasil. 1994 Dez 30; Seção 1: 21278-80.
Resolução–RDC nº 50, de 21.02.2002. Dispõe sobre o regulamento técnico 18. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria Nacional de Ações Básicas de
para planejamento, programação, elaboração e avaliação de projetos físicos Saúde. Divisão Nacional de Organização de Serviços de Saúde. Manual
de estabelecimentos assistenciais de saúde. Diário Oficial da República de Lavanderia Hospitalar. Brasília: Centro de Documentação do Ministério
Federativa do Brasil. 2002 Mar 20; Seção 1: 39-75. da Saúde; 1986.
14. Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Processamento de roupas em 19. Torres S, Lisboa TC. Limpeza e higiene, lavanderia hospitalar. 2ª edição revista
serviços de saúde: prevenção e controle de riscos. Brasília: ANVISA; 2009. e ampliada. São Paulo: CRL Balieiro; 2001.

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Relato de Caso

Auditoria de enfermagem em Centro Cirúrgico


Audit of nursing in the operating room
Driely Reis de Oliveira1, Silvia Maria Jacinto1, Cibele Leite Siqueira2

Palavras-chave RESUMO
Registros de enfermagem A auditoria de enfermagem no Centro Cirúrgico é utilizada pelas instituições de saúde nos dias atuais com a
Auditoria de enfermagem finalidade de avaliar a assistência e otimizar os custos decorrentes da prestação dos serviços. Os registros de
Assistência de enfermagem enfermagem são a principal ferramenta de mensuração da qualidade e método para cobrança, mas, muitas
Gestão em saúde vezes, são banalizados pela própria equipe de enfermagem. O objetivo deste estudo foi relatar as experiências
vivenciadas pelas autoras durante a atuação profissional em Centro Cirúrgico. Trata-se de um relato de
experiência com abordagem descritiva. O conhecimento sobre a auditoria de enfermagem no Centro Cirúrgico
e a compreensão dos aspectos e mecanismos de atuação do profissional de enfermagem são imperativos
para uma prestação de assistência de enfermagem de qualidade.

Keywords ABSTRACT
Nursing records The audit of nursing in the surgical center is used by healthcare facilities with the purpose of evaluating assistance
Nursing audit and improving costs arising from the provision of the services. Nursing records are the primary tool of quality
Nursing care measurement and billing method. The objective of the study was to report the experiments experienced by
Health management the authors during professional performance in the surgical center. It is an experience report with descriptive
approach. Results showed that nursing execute most of the procedures in surgical center and ends up prioritizing
assistance to the detriment to notes in patient’s medical reports. The register itself is trivialized by nursing staff.
The knowledge about the nursing audit in surgical center and the comprehension of the aspects and mechanisms
of the role of the nursing professional is imperative for an nursing assistance provision of quality.

Recebido em:
27/11/2013 1.Graduanda em Enfermagem pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) – Poços de Caldas (MG), Brasil.
Aprovado em: 2.Mestre e Doutoranda em Enfermagem pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP); Docente do Curso de Enferma-
14/02/2014 gem da PUC Minas – Poços de Caldas (MG), Brasil.
Conflito de interesses: Endereço para correspondência: Cibele Leite Siqueira – Rua Francisco Tramonte, 400 – Jardim Centenário – CEP: 37704-256 –
nada a declarar Poços de Caldas (MG), Brasil – E-mail: cibsiq@gmail.com
Fonte de financiamento:
nenhuma
152 Oliveira DR, Jacinto SM, Siqueira CL

INTRODUÇÃO multiprofissional, esse conjunto de informações é suscep-


A área da saúde é caracterizada por processos tível a imprecisões em seus registros, fazendo-se neces-
contínuos; uma forma de assegurar a qualidade de sária uma análise apurada e imparcial de seu conteúdo,
toda atenção médico-hospitalar é por meio da auditoria realizada por meio da auditoria3.
de enfermagem, que trata da avaliação sistemática da A questão de pesquisa foi: a enfermagem prioriza o
qualidade de assistência prestada ao cliente1. cuidado em detrimento das anotações no prontuário?
A auditoria tem origem na área contábil e foi a partir Assim sendo, o presente estudo justifica-se, pois
do século XVII, na Inglaterra, durante a Revolução permite ao leitor se apropriar das experiências adquiri-
Industrial, que houve seu grande desenvolvimento. das pelas autoras, proporcionando uma visão holística
A prática da auditoria recebe novas diretrizes, na busca sobre a auditoria e a assistência de enfermagem no
de atender às necessidades das grandes empresas, Centro Cirúrgico.
tendo continuidade até os dias atuais1.
Na área da saúde, em 1918, nos Estados Unidos, OBJETIVO
a auditoria aparece por meio do médico George Gray O objetivo deste estudo foi relatar as experiências
Ward, que utilizou relato do prontuário para verificar a vivenciadas pelas autoras durante a atuação profissio-
qualidade da assistência prestada ao paciente2. nal em Centro Cirúrgico.
A auditoria de enfermagem é definida como uma
avaliação sistemática da qualidade da assistência RESULTADOS E DISCUSSÃO
prestada ao cliente obtida por meio da análise de
prontuários, do acompanhamento do cliente e da Auditoria de enfermagem
verificação da compatibilidade entre os procedimentos As atividades desenvolvidas pelo profissional de
que foram realizados e os itens que serão cobrados enfermagem em auditoria foram estabelecidas e apro-
na conta hospitalar. Desse modo, garante assistência, vadas pelo Conselho Federal de Enfermagem (COFEN)
cobrança e pagamento adequados3. por intermédio da resolução nº 266/20017.
A auditoria em enfermagem tem sido uma ferra- Tal auditoria deve incluir o estabelecimento de
menta gerencial que tem como finalidade a avaliação padrões de assistência e a utilização de instrumen-
da qualidade da assistência, dos processos e dos tos para a sua realização. Com a padronização dos
custos4. processos da assistência de enfermagem, a avaliação
A qualidade dos serviços de enfermagem inclui não tem como base os padrões desejáveis da prática assis-
somente a formação do enfermeiro, a restauração da tencial, com condições de avaliação dos processos e
saúde e melhoria da qualidade de vida mas o resultado análise dos resultados alcançados4.
do produto hospitalar medido por meio da qualidade Quanto à execução, a auditoria pode ser classifi-
da documentação e do registro de todas as ações de cada em:
enfermagem5. Auditoria Prospectiva, que se trata da avaliação
Todas as unidades de um serviço de saúde permi- dos procedimentos médicos antes da sua realização 1,
tem atividades de auditoria. O Centro Cirúrgico é tem caráter preventivo e procura detectar situações de
um ambiente fechado e ocupa lugar de destaque no alarme para evitar problemas8.
hospital, em decorrência da alta complexidade dos Auditoria Concorrente, que se refere à análi-
procedimentos realizados nesse local. Dessa forma, se pericial ligada ao evento no qual o cliente está
exige capacitação e preparação profissional, além do envolvido 1. É realizada quando o paciente ainda se
trabalho integrado e do relacionamento harmonioso encontra hospitalizado ou em atendimento ambu-
entre os profissionais6. latorial, podendo ser feita de quatro maneiras: pela
Considerando todas as atribuições legais e respon- avaliação feita pelo paciente e sua família, verificando
sabilidades contidas no prontuário, além de seu caráter suas percepções acerca da assistência prestada; pela

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Auditoria de enfermagem em Centro Cirúrgico 153

entrevista do funcionário após a prestação do cuidado, assistência, sendo, portanto, atividades dedicadas à
levando-o à reflexão; pelo exame do paciente e confron- eficácia dos serviços prestados10.
to com as necessidades levantadas; pela verificação Uma das maneiras de se avaliar sistematicamente
do cumprimento das atividades a serem realizadas a assistência prestada pelo profissional de enferma-
pelos profissionais8. gem é a verificação de seus registros e anotações no
Auditoria Retrospectiva, que se trata da análise prontuário. O prontuário serve como um instrumento de
pericial ligada aos procedimentos médicos realizados, verificação e deve apresentar uma estrutura sólida, pois
com ou sem análise do prontuário1. Realizada após a alta representa um documento com valor legal. Os dados
do paciente, avalia resultados e repara as falhas. Dessa contidos devem ser descritos adequadamente e no
forma, o paciente que deixou o internamento não é bene- documento devem constar a situação do paciente, as
ficiado após a avaliação dos dados obtidos. Entretanto, o intervenções realizadas e os resultados obtidos11.
benefício se reverte de forma global aos demais8. Na área de auditoria de qualidade, o enfermeiro tem
a oportunidade de aferir inadequações no processo
Quanto às modalidades, a auditoria pode ser clas- do trabalho assistencial, as quais podem demonstrar
sificada em: falhas em relação à qualidade. Como resultado, esses
Auditoria de Custos, que é a análise das contas erros geram gastos e trabalho desnecessários com
hospitalares realizada pelo enfermeiro, após a alta do a utilização indevida de equipamentos, fluxo inade-
paciente, verificando a compatibilidade entre o pron- quado de informações, desperdício de materiais e
tuário e a cobrança da conta hospitalar efetuada pelo medicamentos e excessos de estoques. Com a visão
auxiliar de faturamento 1. Isso é realizado por meio do do enfermeiro auditor voltada à avaliação da qualida-
cruzamento das informações recebidas pelo fatura- de do serviço prestado é possível identificar recursos
mento com as informações que estão registradas no que poderiam ser utilizados para outras funções,
prontuário do paciente5. oferecendo, assim, subsídios para ampliar a qualidade
Como, em sua grande maioria, as anotações de assistencial4.
enfermagem encontram-se de maneira inconsistente, Cabem à equipe de enfermagem a responsabilida-
ilegível e subjetiva nos prontuários médicos, é comum de e o comprometimento pela elaboração completa e
a prática de glosas no faturamento das contas hospi- adequada do prontuário médico-hospitalar9.
talares, tendo impacto negativo e significativo para o
orçamento das instituições. À equipe de enfermagem Auditoria em Centro Cirúrgico
cabem a responsabilidade e o comprometimento Dentre as unidades do âmbito hospitalar, o
pela elaboração completa e adequada do prontuário Centro Cirúrgico se destaca, pois é o setor que
médico-hospitalar9. contém diversos elementos destinados às atividades
Todos os procedimentos e ações de enfermagem cirúrgicas, desde o recebimento no pré-operatório
geram custos, e o principal meio de assegurar o recebi- imediato até a Recuperação Pós-Anestésica (RPA).
mento do valor gasto durante a assistência de enferma- Ele surgiu em meados do século XIX por necessidade
gem prestada é a realização adequada das anotações de um local asséptico onde os riscos de infecções
de enfermagem, sendo estas de grande importância fossem menores12.
para mostrar o cuidado prestado3. Até a década de 1960, a assistência ao paciente
Auditoria de Qualidade se refere à análise das cirúrgico era dirigida predominantemente para a área
atividades realizadas pela equipe de enfermagem, instrumental, atendimento às solicitações da equipe
por meio da análise do prontuário em geral, com foco médica e às ações de previsão e provisão do ato
nos registros de enfermagem. A avaliação e a revisão anestésico-cirúrgico. Após esse período, houve um
detalhada dos registros clínicos por profissionais intenso desenvolvimento de técnicas cirúrgicas e instru-
qualificados garantem a verificação da qualidade da mentais, o que tornou as cirurgias mais complexas,

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154 Oliveira DR, Jacinto SM, Siqueira CL

desencadeando no enfermeiro a necessidade de uma entre achados da realidade e bases teóricas pertinentes.
fundamentação científica13. Os relatos vinculam vivências servindo de fonte de difu-
Com os avanços e preocupações na área de cirur- são de saberes e fazeres, envolvem a pessoa que
gia, a presença da enfermagem no Centro Cirúrgico observa, estrutura os conhecimentos e registra as infor-
passou a desenvolver as técnicas de assepsia de Lister. mações, com interpretações e subjetivações próprias,
Esses cuidados com a organização do serviço definiram com o cuidado de serem metódicas e sistematizadas15.
a responsabilidade do enfermeiro, pois este deveria
ter conhecimentos específicos relacionados à saúde14. Descrição das experiências
A assistência prestada pelos profissionais de enferma- Trata-se de relato de experiência com abordagem
gem de um Centro Cirúrgico é caracterizada por planeja- descritiva baseada em vivência profissional das duas
mento, avaliação e continuidade do serviço, uma vez que autoras, a primeira com oito anos de experiência em
o paciente passará pelas fases pré, intra e pós-operatória, faturamento e auditoria de contas médicas, e a segunda
todas integradas ao seu estado físico e emocional6. com dez anos de atuação como técnica de enfermagem
A fase pré-operatória ocorre a partir do preparo no Centro Cirúrgico.
do paciente para a intervenção cirúrgica e do prepa- A primeira autora descreve sua atuação profissional
ro psicoemocional por meio de informações sobre o na análise e faturamento de prontuários médicos, sendo
procedimento que será realizado6. seu foco principal o processo contábil. Para adequar a
A fase do intraoperatório compreende a recepção cobrança de custos por procedimentos, é necessário o
do paciente na mesa cirúrgica até o seu encaminha- preenchimento de diversos campos, tanto médico como
mento à sala de RPA. Nessa fase, a enfermagem atua de enfermagem, como, por exemplo: história clínica,
minimizando os riscos decorrentes do procedimento registro diário da prescrição, evolução médica e de
anestésico e identificando sinais característicos de enfermagem, checagem dos serviços e dos relatórios
possíveis complicações6. de anestesia e cirurgia.
No pós-operatório, o processo de enfermagem A experiência profissional como auditora de contas
imediato inicia-se na sala de RPA, ao prestar os médicas da primeira autora foi adquirida durante oito
cuidados necessários ao paciente, ainda sob efeito anos de atuação no faturamento hospitalar de um
da anestesia, até a recuperação dos seus reflexos e a hospital geral privado de pequeno porte no sul de
estabilização dos sinais vitais6. Minas Gerais.
A assistência realizada no Centro Cirúrgico faz parte Especialmente na área privada, a auditoria de
de um conjunto de atividades que inclui a auditoria, que enfermagem é adotada como ferramenta de regulação
exige um trabalho coletivo, com equipe multiprofissio- e controle da utilização dos serviços de saúde, sendo
nal. A auditoria de enfermagem em Centro Cirúrgico se seu foco dirigido para o controle dos custos da assis-
dá por meio da análise das anotações de enfermagem, tência prestada17.
descrições cirúrgicas e anestésicas, comparando-as O processo da fatura da conta hospitalar se inicia
com as cobranças realizadas e o débito de sala na no pré-faturamento, segue para o faturamento, em
recuperação anestésica. Essas atividades incluem os seguida para a auditoria e então retorna ao faturamento
períodos pré, trans e pós-operatório. A enfermagem para o fechamento da conta hospitalar. Após a alta do
deve estar presente na assistência e na gerência de paciente ou durante o período da internação, o setor de
todas as etapas que passa o paciente, em especial nos pré-faturamento reúne todos os documentos gerados
processos de auditoria16. durante a internação, confere as assinaturas do pacien-
te e do médico responsável na guia de solicitação de
METODOLOGIA internação, preenchimento da anamnese e prescrições
Trata-se de um relato de experiência que é definido médicas, exames laboratoriais, radiológicos e ultrasso-
como observação sistemática da realidade, sem o obje- nográficos, e verifica prorrogações e autorizações dos
tivo de testar hipóteses, mas de estabelecer correlações procedimentos cirúrgicos.

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Auditoria de enfermagem em Centro Cirúrgico 155

Após a organização desses documentos, os pron- deixar de executar as tarefas com qualidade e satisfa-
tuários são liberados e entregues no faturamento. ção do paciente17.
As funcionárias do faturamento recebem os prontuários Para isso, são utilizadas ferramentas de trabalho,
e lançam as informações contidas nesses documentos como contratos, tabelas de diárias e taxas, revistas de
no programa de gestão hospitalar. materiais e medicamentos, e notas fiscais. Após examina-
O prontuário médico é um documento legal que dos os dados, é realizada a comparação desses gastos
possui todo o histórico de cuidado do paciente, é uma com o que consta na fatura, sendo que os que não corres-
fonte de conhecimento para profissionais da saúde e ponderem serão corrigidos, excluídos ou adicionados.
descreve sobre o serviço hospitalar que a instituição A auditoria em enfermagem visa a qualidade do
oferece. A conta hospitalar é o resultado da contabi- atendimento ao cliente, o controle de custos, o paga-
lização de todo o processo de internação e cuidado mento justo da conta hospitalar e a transparência da
prestado pela equipe multidisciplinar. negociação, embasada na conduta ética9.
A cobrança só é feita mediante relato comprobatório Existe também a negativa de pagamento de algo
por meio de registros médicos e da enfermagem. que foi faturado. A glosa é o cancelamento parcial
A auditoria é um instrumento de avaliação, está rela- ou total do orçamento, por ser considerado ilegal ou
cionada à importância e à repercussão da enfermagem indevido, e é aplicada quando qualquer situação gera
e associada ao controle administrativo-financeiro. Uma dúvidas em relação à regra e à prática adotadas pela
falha qualquer nos registros ocasiona erros de cobrança instituição de saúde9.
e dificulta o faturamento do prontuário17. Devido às anotações de enfermagem, em sua maio-
Após o lançamento dos dados obtidos, o espelho ria, serem inconsistentes, a prática de glosar itens do
da conta hospitalar é impresso e anexado ao prontuário faturamento das contas hospitalares tem sido significa-
faturado e segue para a auditoria de contas médicas. tiva para o orçamento das instituições. Dessa forma, as
O processo de análises se inicia por meio da auditoria anotações de enfermagem contidas nos prontuários são
interna retrospectiva, momento em que os itens cobra- utilizadas no processo de auditoria de enfermagem, a
dos na conta hospitalar são comparados com os dados fim de apontar inadequações da assistência de enfer-
fornecidos pelo prontuário. magem com relação aos serviços prestados, assegurar
A realização da auditoria de enfermagem por inter- o faturamento de contas hospitalares e rever glosas3.
médio da análise de prontuários possibilita identificar O serviço de auditoria está associado ao controle
problemas e orientar a equipe sobre o registro adequa- administrativo-financeiro das instituições de saúde;
do das ações, sendo este utilizado para respaldo ético erros em cobranças são relacionados à falha de regis-
e legal17. São observados: a quantidade de diárias, os tros de materiais e medicamentos utilizados e à ausên-
registros de todos os materiais descartáveis e medi- cia de anotações tanto pela equipe de enfermagem
camentos gastos pelo paciente conforme prescrição quanto médica.
médica, evolução da equipe de enfermagem, hemote- Especificamente, a auditoria no Centro Cirúrgico
rapia e laudos de exames de diagnose e terapêutica. reflete diretamente o serviço de enfermagem, pois, a
Já nos casos de procedimentos cirúrgicos é anali- partir das anotações e cuidados prescritos, são justifica-
sado o gráfico anestésico conforme tipo de anestesia dos os equipamentos e gases (oxigênio, ar comprimido,
empregada, descrição do ato cirúrgico, registros e halotano, etc.) utilizados com o débito assinalado na
anotações de enfermagem nos períodos pré, intra e nota de gasto do Centro Cirúrgico.
pós-operatório, equipamentos e aparelhos cirúrgicos, O enfermeiro é o agente determinante para levar a
tipo de sala conforme porte cirúrgico e utilização de equipe multidisciplinar a construir alicerces em relação
órteses, próteses e materiais especiais. aos registros de enfermagem, sendo estes os principais
O trabalho do Centro Cirúrgico requer ampla cola- marcadores de qualidade da assistência17.
boração da equipe atuante para que haja eficácia nos A eficácia dos registros deve estar ligada à super-
procedimentos e agilidade para o faturamento, sem visão constante da equipe de enfermagem, mas é por

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156 Oliveira DR, Jacinto SM, Siqueira CL

meio da educação permanente e continuada que se da folha de gasto, o registro dos materiais utilizados
consegue treinar e aprimorar os profissionais des- durante a cirurgia e, caso ocorram outras intercor-
sa classe. rências, registrá-las também, deixando mais uma vez
A educação continuada é utilizada como ferramenta o registro de enfermagem para outro momento. Ao
de instrução e acompanhamento da auditoria realizada término da cirurgia, cabe à circulante retornar o pacien-
em Centro Cirúrgico. É por meio dela que a equipe te à sala de RPA com seu prontuário e providenciar
interdisciplinar que tem acesso ao prontuário é orienta- a limpeza e organização da sala para uma próxima
da, para que os funcionários se conscientizem sobre a cirurgia, ficando, na maioria das vezes, seu registro de
importância legal do preenchimento de tal documento, enfermagem para depois, devido à escassez de tempo.
esclarecendo dúvidas e dando orientações contínuas Quanto menor o tempo da cirurgia, menos tempo sobra
para suporte da assistência1. para os registros.
A experiência profissional como técnica de enfer- A anotação é uma forma de comunicação da
magem da segunda autora foi adquirida durante dez enfermagem e possui como finalidades: estabelecer
anos de atuação no Centro Cirúrgico de um hospital diálogo entre os membros da equipe multidisciplinar;
de médio porte no sul de Minas Gerais. Tal setor é acompanhar a evolução do paciente; servir de base
composto basicamente por médicos-cirurgiões, anes- para a avaliação e a elaboração do plano assistencial;
tesistas, enfermeiras e técnicas de enfermagem. Foi constituir documento legal tanto para o paciente quanto
observado que as anotações de enfermagem eram para a equipe de enfermagem referente à assistência
feitas em etapas: pré-operatório (admissão no Centro prestada; contribuir para a auditoria de enfermagem 5.
Cirúrgico), transoperatório, alta da sala cirúrgica, A experiência profissional da autora nesse setor
admissão e alta na RPA. durante todos esses anos permitiu observar que a
Na admissão do paciente na sala de recuperação equipe de enfermagem prioriza o seu tempo em cuidar
pós-anestésico, é realizado o primeiro registro de e assistir o paciente, deixando as anotações para outro
enfermagem de acordo com o estado do paciente momento (que às vezes nem chega). Portanto, as
(consciente, orientado, pré-anestesiado, entubado). anotações são tão importantes quanto o cuidar, pois é
Supondo-se que o paciente esteja sonolento e impos- por meio delas que a equipe multiprofissional poderá
sibilitado de se comunicar verbalmente, a única forma dar a continuidade correta ao tratamento do paciente.
de obter informações é por meio do registro do setor As intercorrências assistidas pela enfermagem,
anterior à admissão na sala de recuperação pré ou quando anotadas no momento exato, trazem eficiência
pós-anestésica. por parte da enfermagem e ação imediata. A qualidade
O segundo registro é realizado após a cirurgia, e dos registros das ações prestadas reflete a prestação
o terceiro é a alta para o setor. Esses relatórios, na da assistência e a produtividade do trabalho. Quanto
prática, muitas vezes ficavam incompletos; alguns mais detalhadas forem as anotações, maiores serão
dos motivos observados foram: a falta de tempo, o as informações para direcionar a terapêutica do cuidar
número de cirurgias eletivas, cirurgias de urgência e pela equipe multiprofissional.
emergência e as várias tarefas que os profissionais de Reforça-se que o registro das intervenções da
enfermagem necessitam desempenhar, o que fazia com enfermagem é uma estratégia que valida a prática e
que tais trabalhadores priorizassem a assistência e o confirma os cuidados realizados, e que a ausência dos
cuidado ao paciente, deixando os registros para um mesmos dificulta a coesão e a comunicação entre as
momento oportuno. equipes multiprofissionais18.
A técnica de enfermagem (circulante) responsável O Centro Cirúrgico é um setor que está constan-
pelo transoperatório tem como funções monitorizar o temente em movimento; em consequência do fluxo,
paciente, auxiliar os médicos, organizar a sala e realizar do porte e da quantidade de cirurgias a serem feitas,
o registro de enfermagem da sala. Este também fica o tempo fica escasso para a equipe de enfermagem
incompleto, pois a circulante tem de fazer a anotação realizar as tarefas obrigatórias dentro dos prazos

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Auditoria de enfermagem em Centro Cirúrgico 157

estipulados. Esses eventos adversos acabam sendo DECLARAÇÃO DE AUTORIA E PARTICIPAÇÃO


resultantes da falta de registros no prontuário. Nós, na qualidade de autoras do presente artigo,
Cuidar e prestar assistência pela enfermagem declaramos que o estudo é inédito, havendo sido
são aspectos prioritários à reabilitação do paciente; composto com a participação de todas, estando a
portanto, os registros dessa população representam participação de cada autora destacada a seguir:
elemento essencial para o processo de trabalho, uma Driely Reis de Oliveira: revisão bibliográfica, coleta
vez que a gestão da informação constitui a qualidade e análise de dados, redação preliminar.
dos serviços prestados18. Silvia Maria Jacinto: revisão bibliográfica, coleta e
Para a auditoria de enfermagem, é válido o que está análise de dados, redação preliminar.
anotado; se não há registro, não houve a assistência Cibele Leite Siqueira: revisão bibliográfica, coleta e
e isso interfere na qualidade e no custo. Se não existe análise de dados, correção e redação final.
forma de cobrar os procedimentos prestados, mesmo
que foram realizados, se não foram justificados por REFERÊNCIAS
meio dos registros no prontuário, esses atos refletirão 1. Motta ALC. Auditoria de enfermagem nos hospitais e operadoras de planos
comprovadamente a qualidade do serviço prestado. de saúde. 5ª ed. São Paulo: Iátria; 2010.

A enfermagem tem conhecimento legal e ético 2. Scarparo AF, Ferraz CA. Auditoria em enfermagem: identificando sua concepção
e métodos. Rev Bras Enferm. 2008;61(3):302-5.
sobre as anotações do cuidado, sendo que o registro
3. Camelo SHH, Pinheiro A, Campos D, Oliveira TL. Auditoria de enfermagem
no prontuário se identifica como direito do paciente e e a qualidade da assistência à saúde: uma revisão da literatura. Rev Eletr
obrigação da equipe19. Enf. 2009;11(4):1018-25.
4. Scarparo AF, Ferraz CA, Chaves LDP, Rotta CSG. Abordagem conceitual
de métodos e finalidade da auditoria de enfermagem. Rev Rene.
CONSIDERAÇÕES FINAIS 2009;10(1):124-30.
A auditoria de enfermagem é utilizada pelas institui- 5. Setz VG, D’Innocenzo M. Avaliação da qualidade dos registros de
ções de saúde com a finalidade de avaliar a qualidade enfermagem no prontuário por meio da auditoria. Acta Paul Enf.
2009;22(3):313-17.
da assistência e acompanhar os custos decorrentes da
6. Alberti GF, Ribeiro MG, Velasque ACI, Salbego C, Dornelles CS. A prática
prestação dos serviços. Observa-se uma deficiência de enfermagem em centro cirúrgico: A utilização do índice de Aldrete
na atuação da enfermagem diante das anotações que e Kroulik para a avaliação do paciente em sala de recuperação pós-
constituem na única forma de averiguar o cuidado anestésica [Internet]. (No prelo); 2013 [cited 2013 Oct 05]. Available from:
www.urisantiago.br/saenfermagem/anais/2010/09%20A%20PRATICA%20
dessa categoria profissional. Ressalta-se, ainda, que DE%20ENFERMAGEM%20EM%20CENTRO%20CIRURGICO%20A%20
esses registros comprovam e validam a prática da equi- UTILIZACAO%20.pdf

pe de enfermagem. Sabe-se que o tempo de permanên- 7. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução n° 266, de 25 de outubro de
2001. Dispõe sobre as atividades do enfermeiro auditor [Internet]. Brasília:
cia do paciente dentro do Centro Cirúrgico é escasso COFEN; 2001 [cited 2013 Oct 29]. Available from: http://site.portalcofen.
e que os profissionais que exercem seu papel como gov.br/sites/default/files/ANEXO2662001.pdf
cuidadores nos períodos pré, intra e pós-cirúrgico não 8. Souza LAA, Dyniewicz AM, Kalinowski LC. Auditoria: uma abordagem
histórica e atual. Rev Adm Saúde. 2010;12(47):71-8.
têm nenhum compromisso com o registro de suas ativi-
9. Ferreira TS, de Souza-Braga AL, Cavalcanti-Valente GS, Ferreira de Souza
dades, atitude que constitui a principal ferramenta de
D, Moreira Carvalho-Alves E. Auditoria de enfermagem: o impacto das
apuração e cobrança de custos e, ainda, de fonte de anotações de enfermagem no contexto das glosas hospitalares. Aquichán.
informação para o planejamento do cuidado. 2009;9(1):38-49.

Em relação à qualidade dos registros, observou-se 10. Andrade JMF, Andrade AN, Costa TS, Feitosa MO, Videres ARN, Custódio
PP. Auditoria de enfermagem: conhecimento dos enfermeiros de um hospital
que tais anotações são incompletas e não proporcio- do interior paraibano. Rev Adm Saúde. 2012;14(56):125-30.
nam a qualidade necessária para oferecer subsídios 11. Abdon JB, Dodt RCM, Vieira DP, Martinho NJ, Carneiro EP, Ximenes LB. Auditoria
para a análise da auditoria de enfermagem. Foi eviden- dos registros na consulta de enfermagem acompanhando o crescimento e
desenvolvimento infantil. Rev Rene. 2009;10(3):90-6.
ciada, nesta pesquisa, que a auditoria de enfermagem
12. Oliveira MAN. Gerenciamento de novas tecnologias em centro cirúrgico
é uma especialização pouco conhecida pelos colegas pelas enfermeiras nos hospitais de feira de Santana – Ba. Rev Bras Enferm.
de trabalho. 2004;57(3):292-7.

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158 Oliveira DR, Jacinto SM, Siqueira CL

13. Fonseca RMP, Peniche ACG. Enfermagem em centro cirúrgico: trinta anos 16. Medrado SSR, Moraes MW. Auditoria de Enfermagem no Centro Cirúrgico: atuação
após criação do Sistema de Assistência de Enfermagem Perioperatória. do enfermeiro auditor. Rev SOBECC. 2011;16(1):56-63.
Acta Paul Enf. 2009;22(4):428-33. 17. Silva MJM, Silva MCS, Bezerra SLC, Santos YCC. Auditoria de Enfermagem
14. Turrini RNT. Ensino de enfermagem em centro cirúrgico nos cursos de na qualidade de assistência no centro cirúrgico. (No prelo); 2013.
bacharelado em enfermagem no Brasil [tese]. São Paulo: Universidade 18. Klein AGS, Bitencourt JVOV, Pai DD, Wegner W. Registros de enfermagem
de São Paulo; 2012. no perioperatório. Rev Enferm UFPE. 2011;5(5):1096-104.
15. Dyniewicz AM. Metodologia da Pesquisa em Saúde para Iniciantes. 2ª ed. 19. Geremia DS, Costa LD. Auditoria da qualidade dos registros de enfermagem em
São Caetano do Sul: Difusão Editora; 2009. uma unidade de internação clínica hospitalar. Rev Adm Saúde. 2012;14(54):57-64.

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Artigo Original

Conformidade no prontuário do
paciente: um desafio permanente
Conformity in patient forms: a continuous challenge
Ivo Pavanello Filho1, Maria Aparecida Testa Benessiuti2

Palavras-chave RESUMO
Auditoria clínica Tendo como desafio a melhoria contínua no prontuário não eletrônico do paciente internado, foi criada uma
Educação continuada comissão dentro de uma Autarquia Hospitalar Municipal, com 271 leitos e prontos-socorros adulto, obstétrico
Controle de formulários e e infantil, localizada na cidade de São Paulo, denominada Comissão de Educação Permanente no Prontuário
registros do Paciente Internado (CEPPPI). Por meio de auditoria retrospectiva e operacional ou recorrente com caráter
Gestão em saúde educacional permanente foram desenvolvidas ações aplicadas aos prontuários dos pacientes internados,
tanto os que deram entrada no Setor de Arquivo Médico quanto os constantes das Unidades de Internação.
Obedecendo ao fluxograma criado e envolvendo todos os profissionais que constroem e manipulam esse
documento, os resultados obtidos demonstraram mudanças significativas nas atitudes e conceitos, além da
incorporação das atribuições e valores éticos, reflexo da conscientização dos profissionais que participam do
processo, propiciando assim a diminuição das não conformidades nesse documento.

Keywords ABSTRACT
Clinical Audit Held with the challenge of medical records continuous improvement, a committee was created in a Municipal
Education, continuing Hospital Authority which has 271 inpatient beds plus adult, obstetric and pediatric emergency rooms, located in
Forms and Records Control São Paulo, Brazil, called Permanent Continuing Education Commission in Hospitalized Patient Record (CEPPPI).
Health management A retrospective and operational audit (or recurrent, with permanent educational nature) was performed in order
to develop some actions, applied to the hospitalized patients records, both those who were in the Medical
Archives and also those from the admission units. According to the flowchart created and in order to involve all
the professionals related to medical records, the results showed significant changes in attitudes and concepts
and also on assignments on ethical values incorporation, reflecting the professional’s awareness and providing
reduction of non-conformities in these documents.

Recebido em: Trabalho realizado no Hospital do Servidor Público Municipal (HSPM) – São Paulo (SP), Brasil.
10/12/2013 1.Médico Especialista em Ginecologia e Obstetrícia pela Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO, AMB);
Aprovado em: Médico Assistente da Clínica de Ginecologia do Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo – São Paulo (SP), Brasil.
27/03/2014 2.Enfermeira Especialista em Saúde Pública pela União Social São Camilo; Enfermeira do Hospital do Servidor Público Municipal
Conflito de interesses: de São Paulo e do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU 192) – São Paulo (SP), Brasil.
nada a declarar Aprovação do trabalho pela Comissão de Ética em Pesquisa do Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo,
Fonte de financiamento: CAEE Nº 26193.4.13.2.0000.5442.
nenhuma Endereço para correspondência: Ivo Pavanello Filho – Arquivo Médico/HSPM – Rua Castro Alves, 60 – Liberdade –
CEP: ­01532-900 – São Paulo (SP), Brasil – E-mail: ipavanellofilho@uol.com.br
160 Filho IP, Benessiuti MAT

INTRODUÇÃO educação permanente; aplicar educação permanente e conti-


nuada; promover conscientização e mudanças de atitudes e
O prontuário do paciente é um meio de comunicação comportamentos frente às obrigatoriedades na elaboração
escrita elaborado por uma equipe multidisciplinar do prontuário, quebrando paradigmas; criar subsídios que
facilitando a coordenação e a continuidade do plane- sirvam para avaliação e melhoria contínua na assistência
jamento da saúde¹. prestada ao cliente e colaborar para o ensino e pesquisa.
A composição de um documento legal corretamen-
te elaborado é imprescindível para garantir segurança
A auditoria é um sistema de avaliação e controle das e proteção para o cliente em suas necessidades básicas
informações, que serve para subsidiar a administração e integralidade, bem como para a equipe multiprofissional
quanto à eficiência e eficácia dos programas desen- envolvida no processo.
volvidos em uma instituição e assume caráter eminen-
temente educacional quando não somente indica as METODOLOGIA
falhas e problemas, mas aponta sugestões e soluções Este estudo, na modalidade artigo de atualização,
para a melhoria na conformidade dos registros, objeti- deriva de um processo de trabalho realizado em uma
vando a melhoria contínua do atendimento prestado². Autarquia Municipal na Cidade de São Paulo.
Os prontuários de pacientes foram o instrumento de
análise da atuação de uma equipe multidisciplinar e servi-
Torna-se evidente a necessidade de auditoria apon- ram como fonte de informação para coleta de dados, obje-
tando as divergências e anotando o correto, trazendo tivando a construção de ferramentas a serem aplicadas em
subsídio para a educação continuada e promovendo um processo educativo, visando à melhoria permanente e
um trabalho multidisciplinar efetivo³. continuada desse documento.
Tendo como desafio a oportunidade de melhoria
Com a busca de níveis de excelência no atendimento contínua sugerida pelo Compromisso com a Qualidade
ao cliente, este trabalho tem por finalidade trazer a expe- Hospitalar (CQH)4 da Associação Paulista de Medicina
riência de uma equipe multidisciplinar atuando com um (APM) e do Conselho Regional de Medicina do Estado de
novo modelo de gestão junto aos prontuários dos pacien- São Paulo (CREMESP), que no critério IV – Informações e
tes internados. A análise desse instrumento serviu para que Conhecimento examina a gestão das informações, incluin-
não conformidades fossem apontadas e ferramentas de do a obtenção de informações comparativas pertinentes, e
trabalho fossem criadas e aplicadas por meio de educação como o hospital identifica, desenvolve, mantém e protege
permanente para conscientização dos profissionais envol- os seus ativos intangíveis; e no item 5.1 – Informações
vidos nesse processo de trabalho, promovendo mudança do Hospital, que abrange a identificação das necessida-
de atitudes e comportamentos. des das informações, a implementação de sistemas de
Como mostra a literatura e com os dados coletados e informações que as atendem, a atualização tecnológica
resultados alcançados neste trabalho, fica claro e bem defini- dos sistemas desenvolvidos, a disponibilização das infor-
do que as ações a serem aplicadas para a melhoria na cons- mações aos usuários e a segurança das informações, foi
trução do prontuário do paciente devem ser dirigidas para criada uma equipe denominada Comissão de Educação
educação permanente efetivada por equipe multidisciplinar. Permanente no Prontuário do Paciente Internado (CEPPPI).
Para este trabalho, inicialmente a comissão foi
OBJETIVO composta por um médico e uma enfermeira. Após um
A proposta deste artigo é avaliar os prontuários dos ano foi agregada à equipe um profissional Assistente de
pacientes internados, tendo como objetivo principal diminuir Suporte Administrativo (ASA).
as não conformidades nos prontuários dos pacientes inter- Foi criado um fluxograma (Figura 1) que não alterasse ou
nados; e como objetivos secundários, fazer um diagnóstico prejudicasse o processo de trabalho já definido pelo Setor
situacional mediante levantamento de dados contidos no de Arquivo Médico e pelas Unidades de Internação (UI).
prontuário do paciente; criar ações para combater os proble- O projeto foi dividido em dois ciclos com implantação
mas levantados na auditoria; criar ferramentas que facilitem a de ações. No primeiro foi realizada uma revisão de todos os

RAS _ Vol. 15, No 61 – Out-Dez, 2013


Conformidade no prontuário do paciente: um desafio permanente 161

prontuários dos pacientes internados, no período de outu- de Gil, revisão por amostragem com 95% de confiança e
bro de 2010 a setembro de 2011, totalizando 8.329 pron- 5% de erro5, totalizando 3.419 prontuários, proporcionando
tuários. No segundo ciclo foi feita a avaliação dos pron- uma amostragem obtida por sorteio aleatório.
tuários, no período de outubro de 2011 a setembro de Nos dois ciclos apontados, os dois métodos de
2012, e após consulta em literatura foi utilizada a Fórmula auditoria utilizados foram: Auditoria Retrospectiva, no

Prontuário
de internação
Auxiliar suporte administrativo
Na enfermaria, após alta
do paciente Organiza o prontuário
de internação

1o ciclo 2o ciclo
Revisão de todos prontuários Revisão por amostragem
de internação com alta − outubro de sorteio-fórmula de Gil
de 2010 à setembro de 2011 a partir de outubro de 2011

3a Ação
1a Ação 2a Ação
Atuação de um auxiliar
Revisão de prontuários Atuação da equipe nas
suporte administrativo nas
de internação com alta unidades de internação
unidades de internação

Prontuário de Prontuário de Prontuário de


internação internação internação
Equipe de revisores/
Equipe de avaliadores Auxiliar suporte administrativo
avaliadores/educadores
Avalia e revisa Avalia/revisa o Avalia/revisa o
o prontuário de Internação prontuário de Internação prontuário de Internação

Equipe de avaliadores Equipe de avaliadores Auxiliar suporte administrativo


Convoca profissional para Na não conformidade Na não conformidade
apuração das não conscientiza profissionais conscientiza profissionais
conformidades p/ adequação necessária para adequação necessária

Profissional
Fim Fim
Avalia, recebe orientação e
formaliza o processo
educativo

Fim

Figura 1. Fluxograma do trabalho da equipe de educação permanente.

RAS _ Vol. 15, No 61 – Out-Dez, 2013


162 Filho IP, Benessiuti MAT

qual são avaliados os prontuários após a alta, e Auditoria • promoção de cursos anuais para capacitação dos
Operacional ou Recorrente2, no qual são avaliados os auxiliares de serviço administrativo (ASA), com foco
prontuários de pacientes hospitalizados. em suas atribuições e cumprimento dos deveres
Mediante esse recurso, três ações foram efetivadas: ­ético-legais na manipulação dos prontuários;
1ª. Atuação da equipe de revisores/educadores no Arquivo • solicitação de comparecimento de forma individual,
Médico junto aos prontuários de internação com alta com caráter educativo e informativo;
ou óbito que deram entrada nesse setor (Auditoria • formalização de todos os processos realizados através
Retrospectiva). de lista de anuência das orientações;
2ª. Atuação da equipe de revisores/educadores nos • apresentação das legislações vigentes e normatizações
prontuários, ação esta desenvolvida nas UI durante que norteiam a composição e construção do prontuário
o período de permanência do paciente na instituição do paciente, como o Código de Ética das diversas
(Auditoria Operacional ou Recorrente). categorias, Código Civil e Regulamento da Instituição6;
3ª. Atuação permanente e continuada do profissio- • recepção dos novos residentes com apresentação
nal administrativo, incorporado à equipe a partir pela equipe, com ênfase na construção do prontuário
de novembro de 2011, proporcionando a execução da do paciente e nas obrigações ético-legais;
terceira ação, focada exclusivamente nas UI (Auditoria • apresentação e divulgação do trabalho executado,
Operacional ou Recorrente). com ênfase nos indicadores apontados aos gesto-
res e equipe de qualidade, com o objetivo de que
Durante a realização do primeiro ciclo, além das ações as ações administrativas possam ser estabelecidas,
aplicadas permanentemente, foram definidos os indicado- de forma a reforçar as já introduzidas pela equipe de
res para condução e avaliação, que foram geradores de auditores/revisores.
resultados produzidos no trabalho desenvolvido. Os indi-
cadores elencados foram denominados: O segundo ciclo foi desenvolvido a partir de outubro de
• prontuários conformes: aqueles que estão de acordo 2012 com os mesmos objetivos, porém, contemplado com
com o especificado na legislação, conselhos de classe uma terceira ação, com foco na redução das não conformi-
e normatizações institucionais; dades no prontuário, por meio de auditoria operacional mais
• prontuários não conformes: aqueles que fogem às enriquecida, com a atuação permanente do ASA nas UI.
especificações. Para a análise dos resultados obtidos foi utilizada a
forma percentual; foi utilizado o teste do χ2 para a avaliação
Dentro dos prontuários não conformes, foram classi- da significância estatística7, sendo que não foi considerado
ficados os tipos dessas não conformidades: o indicador intercorrências correspondendo a 162 pron-
• médica; tuários no 1º ciclo e 20 prontuários no 2º ciclo.
• médica-enfermagem;
• enfermagem; RESULTADOS
• psicologia; Relembrando que o desenvolvimento do trabalho foi
• fisioterapia; dividido em 1º e 2º ciclos para coleta de dados e tendo
• nutrição; como objetivo principal a aplicação de ações para a melho-
• serviço social; ria na qualidade da composição dos prontuários, em cada
• fonoaudiologia; um dos ciclos foi implantado, de forma permanente, as 3
• intercorrências (prontuários que foram requisitados ações já mencionadas com os resultados a seguir.
em outros setores, obedecendo ao fluxo do Setor de
Arquivo Médico). 1º Ciclo
Do total de 8.329 prontuários avaliados no período
Para que o objetivo do trabalho fosse atingido (diminui- de outubro de 2010 a setembro de 2011, baseados nos
ção das não conformidades) foram utilizadas as seguintes indicadores construídos (Figura 2), foram observados:
ferramentas: • 3.310 prontuários conformes, o que corresponde a
• reunião com coordenadores de serviços; 39,7% do total avaliado;

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Conformidade no prontuário do paciente: um desafio permanente 163

• 4.857 prontuários não conformes, o que corresponde • Não conformidade médica-enfermagem: 1.328 pron-
a 58,3% do total avaliado; tuários, o que corresponde a 15,9% do total;
• 167 prontuários com intercorrências, o que correspon- • Não conformidade médica: 1.138 prontuários, o que
de a 2% do total avaliado. corresponde a 13,7% do total;
• Não conformidade enfermagem: 2.288 prontuários, o
Dentro dos prontuários não conformes, segundo os que corresponde a 27,5% do total;
indicadores já definidos, foi observado (Figura 3): • Não conformidade fisioterapia: 59 prontuários, o que
corresponde a 0,7% do total;
Intercorrência
• Não conformidade fonoaudiologia: 4 prontuários, o
(2%) que corresponde a 0,09% do total;
Conformidade
• Não conformidade serviço social: 30 prontuários, o
Não conformidade (40%) que corresponde a 0,4% do total;
(58%)
• Não conformidade psicologia: 10 prontuários, o que
corresponde a 0,1% do total;
• Não conformidade nutrição: nenhum prontuário, o que
corresponde a 0% do total;
• Intercorrência: 162 prontuários, o que corresponde a
2,0% do total.

2º Ciclo
Do total de 3.419 prontuários avaliados no período de
outubro de 2011 a setembro de 2012, com aplicação da
Fórmula de Gil com 95% de confiabilidade e 5% de erro,
baseado nos indicadores construídos foram observados
Figura 2. Distribuição do total de 8.329 prontuários revisados no
(Figura 4):
período de outubro de 2010 a setembro de 2011. • 1.513 prontuários conformes, o que corresponde a
44,2% do total avaliado;

Fonoaudiologia
Nutrição (0%) (0,9%) Serviço social Intercorrência
(0,4%) (1%)
Fisioterapia Intercorrência
(0,7%) (1,9%)
Conformidade
Psicologia (0,1%)
Não conformidade (44%)
Conformidades (58%)
(39,7%)
Enfermagem
(27,5%)

Médica (13,7%)
Médica e
Enfermagem
(15,9%)

Figura 3. Distribuição dos 8.329 prontuários revisados no período de


outubro de 2010 a setembro de 2011 segundo os indicadores e entre Figura 4. Distribuição do total de 3.419 prontuários revisados por
as categorias profissionais. sorteio no período de outubro de 2011 a setembro de 2012.

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164 Filho IP, Benessiuti MAT

• 1.886 prontuários não conformes, o que corresponde A partir de novembro de 2011 até setembro de 2012,
a 55,2% do total avaliado; além dos resultados apontados anteriormente, foram
• 20 prontuários com intercorrências, o que corresponde avaliados 1.606 prontuários (resultado do aprendizado)
a 0,6% do total avaliado. seguindo a mesma proposta de trabalho, resultados
esses consequentes das ações aplicadas com a atuação
Dentre os prontuários não conformes segundo os indi-
cadores já definidos, observou-se, conforme, a Figura 5:
• Não conformidade médica-enfermagem: 422 prontuá-
rios, o que corresponde a 12,3% do total; Fonoaudiologia (0%)
Nutrição (0%)
• Não conformidade médica: 455 prontuários, o que Psicologia (0%)
Serviço social (0,1%)
Fisioterapia Intercorrência
corresponde a 13,3% do total; (0,6%)
(0,2%)
• Não conformidade enfermagem: 989 prontuários, o
que corresponde a 29,0% do total;
• Não conformidade fisioterapia: 9 prontuários, o que Conformidades
Enfermagem (44,5%)
corresponde a 0,263% do total; (29%)
• Não conformidade fonoaudiologia: 3 prontuários, o
que corresponde a 0,0% do total;
• Não conformidade serviço social: 5 prontuários, o que
corresponde a 0,1% do total;
• Não conformidade psicologia: 1 prontuário, o que
corresponde a 0,0% do total;
• Não conformidade nutrição: 2 prontuários, o que
corresponde a 0,0% do total; Médica (13,3%)
• Intercorrência: 20 prontuários, o que corresponde a
0,6% do total. Médica e
Enfermagem
(12,3%)
A aplicação do teste do χ2 para demonstração da
Figura 5. Distribuição dos 3.419 prontuários revisados segundo os
significância do 1º e 2º ciclos está demonstrada no indicadores e entre as categorias profissionais, no período de outubro
Quadro 1. de 2011 a setembro de 2012.

Quadro 1. Teste do χ2 para significância do 1º e 2º ciclos.


1º Ciclo (n=8.7) 2º Ciclo (n=3.399)
Significância para
Categoria IC95% Valor p
Total não % de não Total não % de não p<0,05
conformidade conformidades conformidade conformidades

Médico-enfermagem 1328 16,26 422 12,42 2,44–5,20 0,0001 sig

Enfermagem 2288 28,02 989 29,10 -0,74–2,92 0,25 ns

Médico 1138 13,93 455 13,39 -0,86–1,91 0,46 ns

Fisioterapeuta 59 0,72 9 0,26 0,17–0,71 0,005 sig

Serviço social 30 0,37 5 0,15 -0,01–0,41 0,08 ns

Psicólogo 10 0,12 1 0,03 -0,06–0,20 0,27 ns

Fonoaudiólogo 4 0,05 3 0,09 -0,06–0,21 0,70 ns

Nutricionista 0 0,00 2 0,06 -0,009–0,21 0,15 ns

Total 4.857 59.47 1886 55,49 1,99–5,98 0,0001 sig

IC95%: Intervalo de confiança de 95%; ns: não significante; sig: significante.

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Conformidade no prontuário do paciente: um desafio permanente 165

continuada e permanente do ASA nas UI junto aos profis-


sionais envolvidos no processo da construção e organi-
zação deste documento.
Conformidade
Os resultados obtidos (Figura 6) foram os seguintes: Não conformidade (79%)
• 1.269 prontuários conformes, o que corresponde a (21%)
79,0% do total avaliado;
• 337 prontuários não conformes, o que corresponde a
21,0% do total avaliado;
• nenhum prontuário com intercorrências, o que corres-
ponde a 0,0% do total avaliado.

Dentre os prontuários não conformes, segundo os


indicadores já definidos, observou-se (Figura 7):
• Não conformidade médica-enfermagem: 57 prontuá-
rios, o que corresponde a 3,6% do total;
• Não conformidade médica: 105 prontuários, o que
corresponde a 6,6% do total;
• Não conformidade enfermagem: 173 prontuários, o
que corresponde a 10,8% do total;
• Não conformidade fisioterapia: 1 prontuário, o que Figura 6. Distribuição do total de 1.606 prontuários revisados
(resultado do aprendizado) no período de novembro de 2011 a
corresponde a 0,0% do total; setembro de 2012.
• Não conformidade fonoaudiologia: nenhum prontuário,
o que corresponde a 0,0% do total;
• Não conformidade serviço social: nenhum prontuário,
o que corresponde a 0,0% do total;
• Não conformidade psicologia: nenhum prontuário, o
Psicologia (0%) Fonoaudilogia (0%)
que corresponde a 0,0% do total; Fisioterapia (0%) Serviço social (0%)
• Não conformidade nutrição: 1 prontuário, o que corres- Nutrição (0%)

ponde a 0,0% do total; Enfermagem


(10,8%)
• Intercorrência: nenhum prontuário, o que corresponde Conformidade
(79%)
a 0,0% do total.
Médica
(6,6%)
DISCUSSÃO
Médica e
Com o início do processo, quando 100% dos Enfermagem
prontuários de internação foram avaliados com rigor, (3,6%)

e de acordo com as diretrizes legais (leis, órgãos de


classe, regulamentações e normatizações) foi possível
chegar a um diagnóstico situacional e construir os
indicadores.
No transcorrer do processo no 2º ciclo constatou-
-se que a fórmula aplicada, Fórmula de Gil5, revisão por
amostragem, demonstra confiança na amostra avaliada,
apresentando consistência nos resultados obtidos. Na
comparação entre o 1º e o 2º ciclos constatamos que a
diminuição das não conformidades deveu-se às ações Figura 7. Distribuição do total de 1.606 prontuários revisados
em porcentagem, segundo os indicadores e entre as categorias
aplicadas diretamente nas UI com orientação permanente, profissionais (resultado do aprendizado), no período de novembro de
pois as inúmeras dificuldades apresentadas na construção 2011 a setembro de 2012.

RAS _ Vol. 15, No 61 – Out-Dez, 2013


166 Filho IP, Benessiuti MAT

do prontuário do paciente constituem barreiras constantes formação desse profissional, observamos que a resposta
a serem transpostas. das ações aplicadas ocorreu em uma abrangência mais
uniforme nas diferentes especialidades, porém, apesar dos
Na enfermagem, o enfermeiro assume o papel de resultados positivos observados, as não conformidades
maior relevância técnica e delega as demais ações não deixaram de ocorrer, muito embora em uma menor
aos técnicos e auxiliares de enfermagem. A divisão incidência, fato esse que evidencia a necessidade da
de classe social provoca uma divisão social e técnica manutenção de uma educação permanente.
do trabalho. Nessa fragmentação interna se dão as Por tratar-se de uma instituição comprometida com o
principais questões que envolvem moral e ética e a ensino (residência médica nas diversas especialidades), a
fragmentação do trabalho da enfermagem8. construção do prontuário do paciente faz parte do aprimo-
ramento desses profissionais, sendo a sua atuação com
As várias categorias que atuam no desenvolvimento bastante frequência. Pelo fato desses médicos residentes
dos processos de enfermagem (enfermeiro, técnico e auxi- serem recebidos por essa equipe de revisores/avaliadores
liares de enfermagem), com competências e atribuições e com o objetivo de orientá-los quanto à construção e
bem definidas, fazem com que a atuação nos prontuários manipulação desse documento, somando-se ao compro-
seja mais frequente, resultando em probabilidade maior metimento dos coordenadores, preceptores e assistentes
de possíveis causas de não conformidade. nesse processo, o resultado observado foi favorável, vindo
Há dificuldade na manutenção da composição das ao encontro aos objetivos do trabalho desenvolvido.
equipes de enfermagem, consequência de grande A atuação do ASA nos diversos setores no cumprimen-
rotatividade devido a fatores inerentes à instituição. to de suas atribuições é de fundamental importância na
Também há a constante evolução e o aprimoramento nos manutenção desse processo de trabalho. Considerando
processos de enfermagem, que inevitavelmente alteram que cabe a ele organizar e manipular diariamente esse
o fluxo de trabalho durante o ato de sua implantação, documento, o profissional tem a oportunidade e a facilida-
o que requer uma quebra de paradigma e mudanças de de interagir com as diversas categorias, com o propósito
de comportamento, causando impacto na construção da adequação, evitando assim que posteriormente sejam
dos prontuários. caracterizados como não conformes.
Ao avaliarmos o Código de Ética da Enfermagem Segundo a proposta da Humaniza SUS14, o pron-
(1993) observamos que as exigências quanto às anota- tuário transdisciplinar na saúde estimula e fortalece
ções de enfermagem são inúmeras, conforme consta o trabalho em equipe e o diálogo entre profissionais,
em: COREN SP – Principais Legislações para o Exercício favorecendo a troca de conhecimentos, inclusive com
da Enfermagem, capítulo I – Das relações profissionais: os doentes e familiares1.
responsabilidades e deveres, art. 41, art. 71 e art. 729; A participação de profissionais de outras áreas
Decisão COREN SP, DIR 001/2000, art. 2º10; e Parecer (fisioterapia, fonoaudiologia, psicologia, serviço social
COREN SP GAB Nº 004/2011, São Paulo, conforme previs- e nutrição) na construção do prontuário do paciente é
to na resolução COFEN 191/199611,12. de fundamental importância para efetivação do trabalho
Embora as dificuldades que permeiam a categoria de multidisciplinar, com objetivo de redução do período de
enfermagem sejam inúmeras, constatou-se que a adesão internação, bem como o bem estar emocional do pacien-
desses profissionais às ações implantadas resultou em te, no entanto, com menor frequência, dependendo da
resposta positiva ao aprendizado. Em relação à atua- área de atuação.
ção das equipes médicas na construção do prontuário, Em consulta ao Código de Ética dos Assistentes
observou-se que as clínicas cirúrgicas, em comparação Sociais15, não há referências específicas ao preenchimento
com as clínicas médicas, apresentam um maior índice de prontuários, mas há o seguinte a respeito da identifi-
de não conformidades, fato esse ligado diretamente às cação profissional, no capítulo II, art. 3, item b: utilizar seu
características pertinentes à categoria cirúrgica. número de registro no Conselho Regional no exercício da
Por não existir fragmentação na categoria médica e profissão; e no capítulo III, art. 10º, item d, referente ao
devido às competências e atribuições previstas em leis13, trabalho em equipe: incentivar, sempre que possível, a
regulamentos e normas estarem inseridas claramente na prática profissional interdisciplinar16.

RAS _ Vol. 15, No 61 – Out-Dez, 2013


Conformidade no prontuário do paciente: um desafio permanente 167

Quanto aos deveres do nutricionista, no capítulo III, de enfermagem, inerentes à instituição. Com relação às
art. 5 – II do Código de Ética específico: identificar-se infor- demais categorias houve significância estatística.
mando sua profissão, número de inscrição no Conselho É fato que, quando o gestor adere à ideia e atua ativamen-
Regional de Nutricionistas e respectiva jurisdição, quando te para o desenvolvimento das propostas sugeridas e ações
no exercício profissional17. praticadas pela equipe de avaliadores/revisores, a adesão
Com relação à categoria da psicologia, não identifi- e o comprometimento dos funcionários envolvidos nesse
camos qualquer referência específica quanto ao preen- processo são muito mais rápidos, eficientes e satisfatórios.
chimento dos prontuários. Contudo, podemos inferir
procedimentos no art. 12º onde se lê: nos documentos CONCLUSÃO
que embasam as atividades em equipe multiprofissional o Decorrente do processo implantado para viabilização e
psicólogo registrará apenas informações necessárias para atuação da CEPPPI, obtivemos controle da condição atual
o cumprimento dos objetivos do trabalho e a preocupa- do prontuário e suas necessidades de melhoria. Feito o
ção em preservar o sigilo quando na relação com outros diagnóstico, implantadas as ações desenvolvidas e, com
profissionais não psicólogos18. a utilização de ferramentas adequadas, concluímos que
Observamos, junto à participação dessas categorias houve mudança significativa nas atitudes em consequência
na elaboração do prontuário, que as respostas às ações da conscientização por parte dos profissionais envolvidos
aplicadas foram rápidas e positivas, propiciando assim um no processo.
Essa mudança, aliada à incorporação das atividades
resultado efetivo na diminuição das não conformidades.
inerentes ao funcionário administrativo no manuseio do
Retomando o objetivo principal deste trabalho, que é a
prontuário e à ampliação e aprimoramento dos crité-
diminuição das não conformidades no prontuário do paciente
rios avaliados, proporcionou uma melhoria contínua na
ainda durante sua internação, e, avaliando as três ações apli-
documentação e organização do prontuário do paciente.
cadas de forma permanente, observou-se que, alavancadas
Concluímos também que houve uma diminuição conside-
pelas 1ª e 2ª ações, a 3ª ação (atuação direta do ASA nas UI)
rável da incidência de não conformidades nos prontuários.
foi primordial e necessária para os resultados do aprendizado,
Frente a esse panorama foi possível a constatação favo-
refletindo a diminuição expressiva das não conformidades.
rável nos resultados do aprendizado.
O resultado do aprendizado é consequência das ações
Obedecendo ao fluxograma criado e envolvendo todos
que desenvolveram e promoveram a conscientização
os profissionais que constroem e manipulam este docu-
e as mudanças de atitudes por parte dos profissionais
mento, os resultados obtidos demonstraram mudanças
que fazem parte desse processo. Esse resultado reflete significativas nas atitudes, conceitos e incorporação das
diretamente na qualidade do atendimento prestado ao atribuições e valores éticos, reflexo da conscientização
paciente. Constatamos que houve significância estatística dos profissionais que participam do processo, propiciando
quando comparados os 1º e 2º ciclos, considerando o assim a diminuição das não conformidades.
prontuário avaliado em sua totalidade, objetivo principal
deste processo de trabalho. AGRADECIMENTOS
Com relação ao indicador médico-enfermagem houve Agradecemos aos colegas pela colaboração e
significância estatística. Com relação ao indicador médico sugestões neste trabalho: Andrea Castilho Belfort
não houve significância estatística, muito embora a taxa (Coordenadora de Seção de Expediente); Celina Haruko
de prontuários conformes tenha aumentado. Com rela- Imamura Ichinose (Analista de Gestão de Infraestrutura);
ção ao indicador enfermagem, apesar de ter ocorrido um Juliane Cristina Borgatte (Coordenadora de Seção
aumento das não conformidades quando comparados os Técnica da Gerência de Ensino e Pesquisa); Maria Elisa
1º e 2º ciclos, constatamos que não houve significâncias de Menezes (Coordenadora do Setor de Admissão e Alta);
estatísticas. Não podemos deixar de esclarecer que esse Maria Guilhermina da Silva Cortez (Assistente de Suporte
resultado deveu-se à implantação dos novos modelos Administrativo); Ronaldo Félix Favaro (Coordenador de
de sistematização da assistência de enfermagem (SAE), Seção Técnica); e Vânia Euzébio de Aguiar (Coordenadora
e à grande rotatividade de recursos humanos na área de Serviço Técnico de Informação).

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168 Filho IP, Benessiuti MAT

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pdf . Acesso em: 10 de setembro de 2010. em: 17 de outubro de 2013.

RAS _ Vol. 15, No 61 – Out-Dez, 2013


Artigo Original

Gerenciamento de enfermagem em
unidade de emergência: dificuldades e desafios
Nursing management in the emergency unit: problems and challenges
Bruno Rafael Branco Zambiazi1, Andrea Monastier Costa2

Palavras-chave RESUMO
Gerenciamento Pesquisa de campo, descritiva, qualitativa, que objetivou identificar as dificuldades e desafios em relação ao
Enfermagem gerenciamento de enfermagem em uma Unidade de Emergência, bem como relatar as atividades gerenciais
Emergência desenvolvidas pelos enfermeiros. Para coleta de dados foi utilizada a entrevista semiestruturada contendo seis
Gestão em saúde questões abertas, realizadas a seis enfermeiros do setor de emergência de um hospital na cidade de Cascavel,
Paraná. Os resultados apontam que as atividades dos enfermeiros são voltadas quase que exclusivamente para
a assistência, deixando de lado a supervisão e o papel gerencial do profissional, justificadas principalmente pela
falta de mão de obra correlacionada com a alta demanda e complexidade do setor. Conclui-se que o profissional
enfermeiro vem enfrentando barreiras constantes quanto à qualidade da assistência e do trabalho desenvolvido,
no qual a falta de profissionais e o nível de estresse se tornam problemas de difícil solução.

Keywords ABSTRACT
Management A qualitative, descriptive, field research that aimed to identify the difficulties and challenges in relation to nursing
Nursing management in an Emergency Unit, as well to report the management activities performed by nurses. For data
Emergency collection we used a semi-structured interview containing six open questions held with six nurses who work in
Health management the emergency room of a hospital in the city of Cascavel, Paraná, Brazil. The results indicate that the activities
of nurses are geared almost exclusively to the care, leaving aside the supervision and the management role of
the professional, justified mainly by the lack of manpower correlated with high demand and complexity of the
sector. We conclude that nursing is facing constant barriers related to the quality of care and developed work,
in which the lack of professional and the stress level become difficult problems.

Recebido em: Trabalho realizado no Hospital Universitário do Oeste do Paraná (HUOP) – Cascavel (PR), Brasil.
25/09/2013 1.Enfermeiro; Especialista em Emergências Pré-Hospitalares e UTI; Enfermeiro PL Pronto Socorro Adulto do Hospital Metropolitano –
Aprovado em: Unidade Butantã – São Paulo (SP), Brasil.
27/03/2014 2.Enfermeira; Mestre em Enfermagem; Docente do Curso de Graduação e Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade
Conflito de interesses: Paranaense (UNIPAR) – Cascavel (PR), Brasil.
nada a declarar Endereço para correspondência: Bruno Rafael Branco Zambiazi – Avenida Giovanni Gronchi, 6582 – Morumbi – CEP: 05724-002 –
Fonte de financiamento: São Paulo (SP), Brasil – E-mail: zambiazi@hotmail.com
nenhuma
170 Zambiazi BRB, Costa AM

INTRODUÇÃO Na administração dos serviços de enfermagem,


A palavra gerenciamento é utilizada para definir as nas instituições de saúde, a gerência é considerada
ações de direção de uma organização ou grupo de uma das funções principais do enfermeiro, pois cabe
pessoas praticadas a fim de atingir uma meta ou objeti- a ele a responsabilidade de organizar o trabalho e os
vos em comum, por meio da união de esforços. A enfer- recursos humanos de enfermagem. Para a execução
magem utiliza esse gerenciamento no seu processo de dessa função, utiliza um conjunto de instrumentos técni-
trabalho e vem buscando meios mais eficazes de adequar cos próprios da gerência, ou seja, o planejamento, o
modelos administrativos ao seu cotidiano, de modo a dimensionamento de pessoal, a educação continuada,
não afastar o seu foco principal de atenção, o cuidado a supervisão, a avaliação de desempenho e os recursos
prestado ao paciente1. físicos, materiais e financeiro5.
O trabalho de enfermagem é composto por três ações Os enfermeiros utilizam o conhecimento técnico-admi-
básicas: educação em saúde, cuidado assistencial e nistrativo adquirido desde a graduação para organizar e
gerência. O processo de gerenciamento tem a finalidade controlar o processo de trabalho. Porém, não é possível
de organizar o espaço terapêutico, distribuir e controlar o utilizar-se de tal base supervalorizando a gestão sem que
trabalho da equipe de enfermagem, a fim de proporcionar essa esteja voltada para uma assistência de qualidade,
condições para a realização do cuidado2. visto que a gerência é essencial para a execução eficaz
dos cuidados de enfermagem, assim, articulam-se as
Os saberes acerca do gerenciamento se originaram a
duas práticas6.
partir da necessidade de organizar os hospitais e foram
Apesar do fato de que o cuidado e o gerenciamento
historicamente incorporados ao trabalho do enfermei-
deveriam estar intrinsecamente articulados na prática
ro. Porém, o entrelaçamento entre cuidar e gerenciar
profissional da enfermagem, o que se encontra na reali-
sempre se mostrou como um desafio, tendo sido mais
dade é a questão das atividades desenvolvidas pelo
enfatizado a partir da década de 1990, tanto no aspecto
enfermeiro em uma instituição serem majoritariamente
da formação inicial do profissional como na atuação de
de caráter administrativo-burocrático ou especificamente
lideranças de enfermagem3.
assistencialista1.
Quando o assunto é o “gerenciar”,
Verifica-se no ambiente hospitalar o desenvolvimento
de funções gerenciais confusas, diluídas e um tanto distan-
a finalidade é a organização do espaço terapêutico,
tes do usuário. Apesar da modernização e evolução nos
realizado preferencialmente pela(o) enfermeira(o), âmbitos organizacionais, técnico e científico. Tal fato ocorre
que contribui e controla o trabalho da equipe de em grande parte desses estabelecimentos, sobretudo nos
enfermagem, com vista a desenvolver condições níveis intermediários da hierarquia administrativa, nos quais
para a realização do cuidado, tendo como objetivo a frequentemente se situa o enfermeiro6.
organização em si2. Ao se tratar do atendimento de emergência7, por sua
vez, não há espaço para uma atuação gerencial confusa,
A enfermagem possui privativamente a direção do pois os enfermeiros da unidade de emergência devem
órgão de enfermagem, função amparada pela Lei do aliar a fundamentação teórica à capacidade de liderança,
Exercício Profissional, Lei Federal nº 7.498, de 25 de junho ao trabalho, ao discernimento, à iniciativa, à habilidade de
de 1986: ensino, à maturidade e à estabilidade emocional.
O grande fluxo de pacientes atendidos e a dinamicida-
Direção do órgão de enfermagem integrante da estru- de da rotina de um pronto-socorro (PS) fazem com que a
tura básica da instituição de saúde pública e privada, atuação do enfermeiro precise ser eficaz e eficiente, uma
e chefia de serviço e de unidade de enfermagem; vez que é essencial. Os enfermeiros de PS são elementos
Organização e direção dos serviços de enfermagem e fundamentais no processo de trabalho desse setor, não
de suas atividades técnicas e auxiliares nas empresas apenas ao realizarem o atendimento emergencial, mas
prestadoras desses serviços; Planejamento, orga- ao atuarem efetivamente no gerenciamento da unidade,
nização, coordenação, execução e avaliação dos levando assim à melhor organização para sanar as neces-
serviços da assistência de enfermagem4. sidades de cada paciente8.

RAS _ Vol. 15, No 61 – Out-Dez, 2013


Gerenciamento de enfermagem em unidade de emergência: dificuldades e desafios 171

OBJETIVO fazem. Deve ser preparada de modo que garanta respostas


A escolha da temática se deu pelo fato de estar objetivas e informativas, adequando seu conteúdo aos
cursando a residência de enfermagem com ênfase em dados que se pretende levantar11.
gerenciamento e possuir interesse pela área de emergên- As respostas foram gravadas e, posteriormente, trans-
cia, já tendo desenvolvido atividades hospitalares tanto critas e analisadas por meio de uma abordagem qualitativa.
em sala de emergência, Unidade de PS e Unidade de Os profissionais foram representados por letras do alfabe-
Terapia Intensiva. to, sendo utilizada a ordem das entrevistas em Enfermeiro
Diante dessa vivência na prática como profissional A, Enfermeiro B e assim sucessivamente.
enfermeiro, surgiu o interesse em desenvolver a presente Quanto a essa forma de pesquisa, Denzin e Lincoln12
pesquisa, a qual possibilitou a busca do conhecimento afirmam que:
relacionada aos principais problemas que acometem
o gerenciamento de enfermagem em uma Unidade [...] a pesquisa qualitativa é uma atividade situada
de Emergência e possui como objetivo identificar as que localiza o observador no mundo. Consiste em um
dificuldades e desafios em relação ao gerenciamento conjunto de práticas materiais e interpretativas que dão
de enfermagem em uma Unidade de Emergência, bem visibilidade ao mundo. Essas práticas transformam o
como relatar as atividades gerenciais desenvolvidas mundo em uma série de representações, incluindo
pelo enfermeiro. as notas de campo, as entrevistas, as conversas, as
fotografias, as gravações e os lembretes12.
MÉTODO
Trata-se de uma pesquisa de campo, descritiva com Esses autores complementam que o estudo qualitativo
abordagem qualitativa. A pesquisa de campo é utilizada possui uma abordagem naturalista e interpretativa. Assim,
para se adquirir informações, hipóteses ou repostas refe- os pesquisadores estudam as coisas em seu ambiente
rentes a um problema. Consiste na observação de fatos natural, tentando entender ou interpretar os fenômenos
e fenômenos tal como ocorrem espontaneamente, na da forma exata que acontecem.
coleta de dados a eles referentes e no registro de variáveis Os profissionais foram entrevistados individual-
que se presumem relevantes, para analisá-los9. Exige um mente, em seu local de trabalho, após autorização
planejamento geral e um plano específico para a coleta da instituição, aprovação da pesquisa pelo Comitê de
de dados, assim como um relatório de todas as atividades Ética e Pesquisa da Universidade Paranaense (UNIPAR
desenvolvidas durante o desenvolvimento da pesquisa, CAEE nº 02771412.2.0000.0109) e assinatura do Termo
inclusive os resultados finais10. de Consentimento Livre e Esclarecido de participação
O estudo descritivo possui uma coleta de dados em pesquisa, conforme lei nº 196/96 de diretrizes
sistematizada e padronizada, principalmente por meio e normas que regulamenta a participação de seres
de entrevistas, questionários e observação, sendo que o humanos em pesquisas 13.
pesquisador não pode em nenhum momento da pesquisa Os entrevistados foram informados sobre a preserva-
interferir nos resultados. Assim, os dados são estudados, ção da sua identidade, dando garantia de sigilo e priva-
mas não manipulados10. cidade das informações recebidas, de acordo com os
Para a obtenção das informações necessárias para princípios éticos da pesquisa em seres humanos. Ainda
a realização do presente estudo, foi utilizada a entrevista foram orientados sobre a total liberdade de escolha em
semiestruturada, com roteiro previamente elaborado, participar ou não da pesquisa.
contendo seis questões abertas, as quais foram realiza-
das a seis enfermeiros dos períodos matutino, vespertino RESULTADOS
e noturno, incluindo a coordenadora do setor de emer- O resultado apresentado se originou do conhecimento
gência de uma Instituição Hospitalar na cidade de obtido por meio da entrevista com seis enfermeiros do setor
Cascavel, Paraná (Anexo 1). de emergência de uma instituição hospitalar na cidade de
A entrevista é considerada a forma de coleta de Cascavel, Paraná.
dados mais flexível entre todas as técnicas, já que obtém Tais profissionais possuem uma média de idade de
informações sobre o que as pessoas sentem, pensam ou 34 anos, variando entre 29 e 42 anos. Dos seis entrevistados,

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172 Zambiazi BRB, Costa AM

quatro são pós-graduados em Urgência e Emergência e base suficiente, como representado na fala de um dos
também quatro foram capacitados com o curso de Advanced enfermeiros.
Trauma Care for Nurses (ATCN).
O tempo de atuação em unidades de emergência O profissional se constrói no cotidiano do trabalho. Mas
variou entre um e oito anos e nenhum profissional atua uma base teórica que ele possa aplicar no d ­ ia-a-dia é
em outra instituição hospitalar. importante. A graduação me deu essa base e noções
No que tange às atividades gerenciais, os profissionais de administração, gerenciamento de pessoal, elabo-
as entendem como sendo toda e qualquer atividade utiliza- ração de escala, quantificação. A base teórica que é
da para coordenar as ações de enfermagem, envolvendo importante para iniciar o trabalho a universidade me
processo assistencial, recursos humanos e físicos, entre deu sim. (Enfermeiro D)
outros. A instituição conta com subdivisões na equipe de
enfermagem, sendo que um profissional fica responsável Mesmo com a disciplina durante a graduação, houve
pela coordenação do setor. muita dificuldade por parte dos profissionais envolvidos
na pesquisa, ao necessitar de bases administrativas, pois,
Hoje em dia tem as subdivisões de coordenação, como relata um dos enfermeiros:
então a gente faz pouca coisa de gerenciamento,
é mais de supervisão mesmo e assistência direta A nossa realidade, a prática em si, é muito diferente do
ao paciente. Mas acredito que é toda parte de que a gente aprende enquanto acadêmico. Na reali-
coordenação de escala, gerenciamento da parte dade é sempre muito mais difícil do que se aprende
que tange equipamentos, material, espaço físico. na teoria. (Enfermeiro F)
(Enfermeiro E)
Dentre as atividades administrativas efetuadas
Atualmente, o enfermeiro coordenador também é pelo enfermeiro, destacam-se: realizar a estatística dos
supervisor de um dos plantões da noite, acumulando as atendimentos ocorridos na unidade, liderar a equipe de
duas funções, de coordenador e assistencialista. enfermagem no atendimento dos pacientes críticos e não
Para um dos profissionais entrevistados, gerencia- críticos, coordenar as atividades do pessoal de recepção,
mento é: limpeza e portaria, solucionar problemas decorrentes
com o atendimento médico ambulatorial, alocar pessoal
[...] toda atividade que vai de encontro com a e recursos materiais necessários, realizar a escala diária e
assistência de enfermagem, dentro do processo mensal da equipe de enfermagem, controlar estoque de
assistencial, assim como recursos humanos, equi- material, verificar a necessidade de manutenção dos
pamentos, organização do espaço físico, escalas, equipamentos do setor.
planilhas. (Enfermeiro B) Por possuir um enfermeiro responsável pela coor-
denação do setor em pesquisa, os demais profissionais
Quanto ao preparo dos profissionais durante a permanecem mais com as atividades de assistência
formação acadêmica, todos obtiveram disciplina voltada direta, desenvolvendo apenas as funções gerenciais
para as questões gerenciais. Segundo os entrevista- do dia-a-dia. Conforme relato do enfermeiro coorde-
dos, a Administração de Enfermagem foi abordada, no nador, o mesmo se sente sobrecarregado por também
entanto houve contradição quando questionados sobre permanecer na assistência, resolvendo basicamente
o aproveitamento da matéria após o término do curso os problemas relacionados à escala e à distribuição
e aplicação na vivência do trabalho. Dos profissionais de pessoal.
entrevistados, 50% acreditam que a disciplina não deu
base suficiente para a aplicação do gerenciamento Sei que a função de coordenação vai além disso, inclu-
ao iniciar a vida profissional, tendo sido superficial sive a parte que eu acho mais importante, mas que
e insuficiente. Já os demais relataram ter recebido foi relevada, é a educação continuada. (Enfermeiro D)

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Gerenciamento de enfermagem em unidade de emergência: dificuldades e desafios 173

Os demais relataram desenvolver diariamente: O fato do gerenciamento não ser realizado de forma
adequada, como pode ser observado na fala de um dos
[...] supervisão direta, planilha de gerenciamento de participantes, acarreta em:
enfermagem do hospital onde são fornecidos dados
em relação a admissões, profissionais do dia, horas [...] queda da qualidade da assistência. Você não tem
extras, atestados médicos. (Enfermeiro E) medicação, mão de obra, qualificação do profissional,
não investe na formação contínua do profissional,
capacitação, atualização. Isso tudo vai gerar queda
[...] escala diária, a distribuição de atividades para da qualidade da assistência. Um profissional bem
atendimentos e organização do setor, toda a parte treinado, atualizado e que presta uma assistência de
de relacionamento interpessoal entre a equipe para qualidade para um número de pacientes compatível e
evitar atritos, recursos materiais, encaminhamentos, preconizado pelo nosso órgão de classe, a qualidade
avaliação dos funcionários. (Enfermeiro A) da assistência é muito maior. No final da cadeia todo
o impacto vai cair sobre o paciente. E claro também
No entanto, para desenvolver tais atividades, os profis- na saúde do trabalhador que adoece, fica estressado,
sionais encontram diversas dificuldades durante os plan- com sobrecarga de trabalho, que tem que dar conta de
tões. O número insuficiente de profissionais relacionados fazer várias extras para suprir as questões de escala.
à alta demanda foi resposta unânime. (Enfermeiro D)

A demanda de pacientes é grande e mão de obra O atrito entre a própria equipe também foi citada pelos
pequena, gerando estresse dos funcionários e conse- profissionais entrevistados, além do afastamento do enfer-
quentemente discussões, virando um caos durante os meiro da parte gerencial para a assistencial, visto o número
plantões. (Enfermeiro A) insuficiente de técnicos de enfermagem e a alta demanda
e complexidade do setor, onde o enfermeiro supervisor
necessita colaborar com o trabalho técnico, deixando de
Falta de recursos humanos, equipamentos, estrutura lado o gerenciamento da unidade.
física adequada. (Enfermeiro B) Consequentemente, o diálogo e a relação entre o
enfermeiro e sua equipe se transformam em um dos
desafios para o desenvolvimento da administração das
A principal dificuldade é o número reduzido de funcio- atividades. Dois dos enfermeiros participantes da pesqui-
nários e o enfermeiro acaba permanecendo muito mais sa relataram que o relacionamento interpessoal é um dos
na assistência para ajudar a equipe e acaba deixando maiores desafios que possuem durante os plantões, visto
de lado a parte gerencial, voltando maior parte do turno que ao se ter um plantão sobrecarregado para toda a
de trabalho para a parte assistencial. (Enfermeiro C) equipe, o nível de estresse se torna elevadíssimo, gerando
conflitos pessoais.
Novamente, a sobrecarga de trabalho é citada, assim
Primeiro a sobrecarga de trabalho. Principalmente se como em outras questões anteriores. Para os demais enfer-
tratando de pronto-socorro a sobrecarga de trabalho meiros, o maior desafio é trabalhar com uma quantidade
é enorme. Tem dias que você não consegue nem insuficiente de profissionais.
comer quanto menos preencher um livro, uma planilha,
organizar alguma coisa ou até mesmo estruturar coisas O maior desafio hoje é conseguir manter uma escala
dentro da sala de emergência, conseguir organizar um adequada para a demanda. (Enfermeiro A)
prontuário, analisar. (Enfermeiro E)

Trabalhar com um número totalmente reduzido de


Superlotação de pacientes e número reduzido de funcionários, equipamentos sucateados e insuficientes
funcionários. (Enfermeiro F) para o número de pacientes assistidos. (Enfermeiro B)

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174 Zambiazi BRB, Costa AM

DISCUSSÃO e punção venosa com cateter, efetuar curativos de


O gerenciamento em enfermagem corresponde a maior complexidade, preparar instrumentos para intu-
um dos pilares de sustentação para uma assistência bação, aspiração, monitoramento cardíaco e desfibri-
convergente com a qualidade exigida pela clientela lação auxiliando a equipe médica na execução dos
atendida nos serviços de saúde dos tempos atuais. procedimentos diversos, realizar o controle dos sinais
Entretanto, as concepções de gestão e de cuidado vitais, executar a evolução dos pacientes e anotar no
ainda são vistas como estanques por muitos enfer- prontuário.
meiros, o que representa a expressão da divisão do As novas propostas gerenciais para o setor de
trabalho e culmina na dicotomia administração versus saúde estão criando estruturas mais enxutas e ágeis, a
assistência na vivência cotidiana desse profissional8. criação de unidades autônomas, a descentralização do
O enfermeiro articula, supervisiona e controla as processo decisório e a intensificação da comunicação,
ações que são desenvolvidas pelos profissionais de valorizando o fortalecimento do trabalho em equipe e
saúde, tanto referentes ao pessoal de enfermagem garantindo os objetivos comuns, estabelecendo maior
como aos procedimentos voltados para diagnóstico vínculo com a clientela e a melhoria na qualidade dos
e tratamento. O papel gerencial do enfermeiro inclui serviços prestados2.
inúmeras atividades que são necessárias e indispensá- O enfermeiro, como gerente, necessita ser eficiente
veis para garantir o desenvolvimento do trabalho cole- e eficaz. A eficiência se dá em fazer a coisas direito, e
tivo, bem como identificar técnicas de gerenciamento a eficácia em fazer a coisa certa. Dessa maneira, o
utilizadas para motivar as equipes na prestação dos enfermeiro precisa estar concentrado em fazer com
serviços com qualidade8. que as atividades sejam concluídas, ou seja, alcançar
Com relação à formação 14, a lógica do mercado a eficiência de maneira que suas decisões contem-
prima por mão de obra capacitada, para dar conta plem os clientes (pacientes), os funcionários (equipe
da dimensão tecnológica, e não privilegia a formação de enfermagem) e administração maior (direção de
crítico-reflexiva, capaz de provocar melhorias sociais enfermagem ou proprietário)17.
locais em médio e longo prazo. O gerenciamento do cuidado passa por decisões
As Diretrizes Curriculares para os Cursos de compartilhadas, partindo da multidisciplinaridade
Graduação em Enfermagem15 em vigor tentam orientar para a interdisciplinaridade. Cada profissional unido e
para competências gerais a serem alcançadas pelo coletivamente percebe e planeja a assistência à saúde,
futuro enfermeiro, como a atenção à saúde, a tomada baseado na individualidade do sujeito a ser cuidado,
de decisão, a comunicação, a liderança, a adminis- nas suas necessidades, adequando-as ao contex-
tração e gerenciamento e a educação permanente. to e às condições humanas e materiais da unidade
Das seis competências apontadas, cinco podem ser de saúde1.
caracterizadas como competências gerenciais. Não basta conhecer a administração de organi-
O ensino da Administração, no que diz respeito à zações e pessoas, é preciso estar preparado para
proposta do Ministério da Educação para o desenvol- essa prática. É preciso ter habilidades gerenciais
vimento de competências e habilidades, favorece a que identifiquem os comportamentos ou habilidade
aptidão para o processo de trabalho de gerenciamen- indispensáveis ao cargo gerencial. Essa abordagem
to. Tal fato é explicado pela necessidade de preparar começa com a identificação de habilidades gerais e
responsáveis pela evolução dos quadros da própria em seguida passa à busca de habilidades específicas
enfermagem enquanto profissão16. relacionadas à eficácia18. Assim, os gerentes devem ter
Em relação às atividades gerenciais desenvolvi- aptidão mental para analisar e diagnosticar situações
das pelos enfermeiros na unidade de emergência, complexas, ajudando a perceber como as coisas de
­destacam-se7: prestar o cuidado ao paciente juntamen- relacionam e a tomar decisões acertadas.
te com o médico, preparar e ministrar medicamentos,
viabilizar a execução de exames especiais procedendo CONSIDERAÇÕES FINAIS
a coleta, instalar sondas nasogástricas, nasoenterais e Aliando as duas áreas de atuação no momen-
vesicais em pacientes, realizar troca de traqueostomia to ­­— Gerenciamento e Emergência — e observando a

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Gerenciamento de enfermagem em unidade de emergência: dificuldades e desafios 175

dificuldade de muitos profissionais quando o assunto torna incompleto e mecanizado, sendo realizados apenas
é administrar, o presente estudo teve como objetivo os cuidados básicos, o que sobrecarrega todos os profis-
geral identificar as dificuldades e desafios durante a sionais física e emocionalmente.
atividade de gerenciamento de enfermagem em uma Quanto ao quadro de funcionários reduzidos, hoje
unidade de emergência de um hospital universitário, muitas empresas utilizam o dimensionamento como
relatando as atividades desenvolvidas pelo enfermeiro forma de representação numérica para convencer seto-
do setor, assim como os obstáculos vivenciados pelos res administrativos a contratar mais funcionários, sendo
profissionais, utilizando os resultados como forma de uma forma legal e representável. Por se tratar de uma
sugestão de mudanças e alterações no desenvolvi- instituição pública de ensino, há uma maior dificuldade
mento das atividades. nesse trabalho.
Os hospitais, como as empresas de um modo geral,
sofrem mudanças constantes na forma de gerenciar seus REFERÊNCIAS
diversos processos. No caso das instituições que prestam 1. Nóbrega MFB. Processo de trabalho em enfermagem na dimensão do
gerenciamento do cuidado em um hospital público de ensino [dissertação].
serviços de saúde, o ato de cuidar e gerenciar devem
Fortaleza: Universidade Estadual do Ceará; 2006.
andar juntos, envolvendo toda a equipe de enfermagem.
2. Gonçalves L. Processo de trabalho da enfermagem: bases qualitativas para
Ao longo do tempo os hospitais foram se transfor- o dimensionamento da força de trabalho em unidades de internação [tese].
mando em organizações complexas e, como as demais Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 2007.

empresas, são constituídos por pessoas, recursos físicos, 3. Ferraz CA. As dimensões do cuidado em enfermagem: enfoque organizacional.
Acta Paul Enferm. 2000;13(Especial pt 1):91-7.
financeiros e tecnologias, cabendo à administração o
4. Brasil. Lei nº 7.498/86, de 25 de junho de 1986. Dispõe sobre a regulamentação
papel de combinar todos esses elementos para alcançar do exercício da enfermagem, e dá outras providências. Brasília: Diário Oficial
os objetivos organizacionais. da União; 1986. Seção I, p. 9273-5.

O gerenciamento é uma atividade que vem sendo 5. Felli VEA, Peduzzi M. O trabalho gerencial em enfermagem. In: Kurcgant
P (org.). Gerenciamento em enfermagem. Rio de Janeiro: Guanabara
cobrada cada vez mais do profissional enfermeiro e exige Koogan; 2005.
do mesmo conhecimento, habilidade e atitudes em toda 6. Rossi FR, Silva MAD. Fundamentos para processos gerenciais na prática de
e qualquer situação, previsível ou não. cuidado. Rev Esc Enferm USP. 2005;39(4):460-8.

Percebe-se a importância e a necessidade do geren- 7. Wehbe G, Galvão CM. O enfermeiro de unidade de emergência de hospital
privado: algumas considerações. Rev Latino-Am Enfermagem. 2001;9(2):86-90.
ciamento de enfermagem em tais setores, facilitando o
8. Montezeli JH. O trabalho do enfermeiro no pronto-socorro: uma análise na
trabalho e a organização da unidade otimizando o aten- perspectiva das competências gerenciais [dissertação]. Curitiba: Universidade
dimento ao paciente. Federal do Paraná; 2009.

A gerência em enfermagem tem assumido funda- 9. Lakatos EM, Marconi MA. Técnicas de pesquisa. 7. ed. São Paulo: Atlas; 2009.

mental importância na articulação entre os vários profis- 10. Andrade MMA. Introdução à metodologia do trabalho científico. 8. ed. São
Paulo: Atlas; 2007.
sionais da equipe, além de organizar o processo de
11. Brenner EM, Jesus DMN. Manual de planejamento e apresentação de trabalhos
trabalho da enfermagem, buscando concretizar as ações acadêmicos: projeto e pesquisa, monografias e artigos. São Paulo: Atlas; 2007.
a serem realizadas junto com clientes, que buscam 12. Denzin NK, Lincoln YS. O planejamento da pesquisa qualitativa: teorias e
esses serviços para atender às suas necessidades de abordagens. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2006.

saúde-doença. 13. Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 196,
de 10 de outubro de 1996. Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas
No entanto, observa-se a sobrecarga de trabalho envolvendo seres humanos. Brasília: Ministério da Saúde; 1996.
e os profissionais da área voltados muitas vezes mais 14. Peres AM, Ciampone MHT. Gerência e competências gerais do enfermeiro.
para a assistência do que para a administração do Texto Contexto Enferm. 2006;15(3):492-9.

setor, ficando o gerenciamento em segundo plano, 15. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara
de Educação Superior. Resolução CNE/CES nº 3 de 07 de novembro de
sendo essa atividade fundamental para o planejamento 2001. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Cursos de Graduação em
do processo de trabalho, determinando a qualidade do Enfermagem. Brasília: Diário Oficial da União; 2001. Seção I, p. 37.
serviço e, consequentemente, uma melhoria na assis- 16. Nimtz MA, Ciampone MHT. O significado de competência para o
docente de administração em enfermagem. Rev Esc Enferm USP.
tência prestada. 2006;40(3):336-42.
Tais dificuldades refletem diariamente nos plantões e 17. Davel E, Vasconcelos J. Recursos humanos e subjetividade. 3. ed. São Paulo:
na equipe de enfermagem, prejudicando o trabalho em Vozes; 2000.
equipe e, principalmente no cuidado prestado, que se 18. Robbins SP. Administração: perspectivas e mudanças. São Paulo: Saraiva; 2003.

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Anexo 1. Instrumento para entrevista semiestruturada.


CARACTERIZAÇÃO DO SUJEITO

Idade: ______________

Pós-graduação: ________________________________________________

Tempo de atuação em Unidade de Emergência:_________________________

Atuação em outro local de trabalho: ( ) Sim ( ) Não

Especifique:______________________________

ROTEIRO DE PERGUNTAS

1. O que você entende por atividade gerencial na atuação do enfermeiro?

2. Obteve durante formação acadêmica disciplina voltada para gerenciamento?

3. Quais as atividades gerenciais que você desenvolve no seu processo de trabalho cotidiano?

4. Quais as dificuldades que você encontra para desenvolvê-las?

5. Quais os principais problemas observados devido não realização do gerenciamento?

6. Quais os desafios que você como profissional responsável pelo gerenciamento de enfermagem tem na Unidade de Emergência?

RAS _ Vol. 15, No 61 – Out-Dez, 2013


Compromisso
com a Qualidade
Hospitalar

Informações
PROGRAMA CQH –
COMPROMISSO COM A QUALIDADE HOSPITALAR
Av. Brig. Luiz Antonio, 278 – Bela Vista
Tel.: 11 3188-4213 / 4214
E-mail: cqh@apm.org.br
Site: www.cqh.org.br

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