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Alfred Benjamin

A ENTREVISTA
DE AJUDA

Tradução URJAS CORRtA ARANTES


Revisão ESTELA DOS SANTOS ABREU

Martins Fontes
São Paulo 2008
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Tí111/o original: THE H ELPING INTERV/E\V.
Publicado originalmente por Houghton MifJlin Company, Boston .
Copyright © by Alfred Benjamin, 1969.
Copyright© by Houghton Mifflin Company, 1974 .
Copyrigh t © 1978, Lil'raria Mar1 i11s Fontes Editora Ltda .,
São Paulo, para a presente edição.

1' edição 1978


12' edição 2008

Tradução
UR IAS CORRÍ:.A ARANTES

Revisão da lradução Introdução do editor 11


Estela dos Somos Abreu
R evisões gráficas
Prefácio 15
/ vete Batista dos Santos
Marise Simões Leal
Dinar/e Zorzanelli da Silva
Produção gráfica
Geraldo Alves 1. Condições 19
Paginação/Fotolitos
S11tdio 3 Desenvolvimento Editorial Fatores e.\ternos e atmosfera 20
A sala 20
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (C D') Interrupções 22
(Câ mara Brasileira do Livro, SP, BrasiJ)
Fatores internos e atmosfera 23
Benjamin, Alfred
A cnt revis1a de ajuda / Alfred Benjamin ; tradução Uri as Co rrêa Tra zer-se a si mesmo; desejo de ajudar 23
Arames ; revisão da rradução Es1ela dos Santos Abreu. - 121 ed . -
São Paulo : Martins Fontes, 2008. - (Psicologia e pedagogia)
Conhecer a si mesmo,- confiar nas próprias idéias 25
Títuio original : The hclping in1erview
Ser honesto, ouvir e absorver 26
Bibliografia. Mecanismos de enfrentamento vs. mecanismos de defesa 28
ISBN 978-85-336-2406-1

1. Aconselhamen10 2. Entrevista L Título. II . S~rie .

07-9812 CDD-158.3
2. Estágios 29
Índices para catálogo sistemá tico :
1. Aconselhame nto : Psicologia aplicada 158.3 Abrindo a primeira entrevista 30
2. Entrevista : Psicologia aplicada 158.J Iniciada pelo entrevistado 31
Todos os direitos desta edição reservados à
Iniciada p elo en rrevistador 33
Livraria Martins Fontes Editora Lida. Explicação de nosso papel 34
Rua Co11se/heiro Ramalho, 330 0 1325-000 São Paulo SP Brasil
Te/. (1 l ) 3241 .3677 Fax (1 l ) 3105.6993
Emprego de formulários 35
e-mail: info@marti11sfo11teseditora.com .br http ://www.martinsfonteseditora .com .br O fator tempo 36
Três estágios principais 39 Perguntas do entrevistado sobre ele mesmo 107
Abertura ou colocação do problema 39 "Por quê?" 109
Desenvolvimento ou exploração 41 Reflexõesfinais 116
Encerramento 51 Como utilizar as perguntas 117
Estilos de encerramento 54 Quando utilizar as perguntas 118

3. Filosofia 59 6. Comunicação 123


Minha abordagem pessoal 59 Defesas e valores 123
Tipo de mudança desejado 60 Autoridade como defesa 127
Como estimular a mudança 61 Resultados de teste como defesa 129
Desempenho de um papel ativo e vital 62 Julgamento como defesa 130
Demonstração de respeito 66 Tratando com obstáculos 131
Aceitação do entrevistado 66 O quanto você fala 132
Compreensão 69 Interrupções 132
Conseguir empatia 75 Respostas 134
Humanizar a essência 80 Forças e facetas 134
Um útil teste de comunicação 134
Quando o entrevistado não quer falar 135
4. O registro da entrevista 83 Preocupação consigo mesmo 137
Anotações 83 Fornecendo informações de que o entrevistado necessita 139
Abordagens diferentes 83
Alguns "não faça" 85
7. Respostas e indicações 143
Honestidade .essencial 86
Gravação 87 (Uma lista graduada de respostas e indicações do
entrevistador, partindo das centradas no entrevistado,
passando gradualmente àquelas enfocadas no
5.Apergunta 91 entrevistador, e daí para as autoritárias, concluindo
Questionando a pergunta 91 com o emprego franco da autoridade.)
Perguntas abertas vs. perguntas fechadas 93 Respostas e indicações centradas no entrevistado 146
P erguntas diretas vs. perguntas indiretas 96 Silêncio 146
Perguntas duplas 97 "Ahn-han" 147
Bombardeio 99 Repetição 149
Situação invertida 102 Elucidação 151
Perguntas do entrevistado sobre outras pessoas 104 Refletir 153
Perguntas do entrevistado sobre nós 106 Interpretação 156
Explicação 158
Orientação para a situação 159
Explicação de comportamento 160
Explicação de causas 161 As famílias, às namoradas e aos amigos daqueles
Explicação da posição do entrevistador 162 que deram a vida pelos seus respectivos países,
Respostas e indicações centradas no entrevistador 163 durante a Guerra dos Seis Dias de 1967, entre
Encorajamento 163 árabes e israelenses, dedico este livro com a fervorosa
Afirmação-reafirmação 165 esperança de que a paz no Oriente Médio esteja
Sugestão 167 próxima e de que logo prevalecerá uma cooperação
Aconselhamento 168 frutífera entre os povos dessa região.
Pressão 175
Moralismo 179
Respostas e indicações autoritárias 183
Concordância-discordância 185
Aprovação-desaprovação 186
Oposição e crítica 187
Descrédito 188
Ridicularização 189
Contradição 190
Negação e rejeição 191
O uso aberto da autoridade do entrevistador 192
Repreensão 193
Ameaça 194
Ordem 195
Punição 195
Humor 196

Despedida 199

Bibliografia complementar 203


Introdução do editor

A entrevista - urna ferramenta ou um relacionamento? A


entrevista - consegue-se, concede-se ou ela acontece? Acom-
panhar a evolução desses significados talvez seja o mesmo que
traçar a história do aconselhamento, da assistência social. e da
medicina nos Estados Unidos. Há trinta anos, a literatura sobre a
entrevista acentuava sem dúvida seu conceito de "ferramenta":
obter informações sobre os entrevistados, que pudessem ser
úteis para contratá-los como empregados ou, então, para acumu-
lar dados de pesquisa. Mesmo na condução da entrevista psi-
quiátrica, eram freqüentes investigação e interpretação, pergun- .
tas e respostas, pois o psiquiatra de trinta anos atrás, cujo contato "
com a psicanálise era recente, sabia bem o que tinha .de fazer.
Sua responsabilidade era "descobrir coisas" sobre o paciente e,
em seguida, dar ao paciente urna interpretação sobre ele mesmo.
Alimentar a imagem da entrevista como instrumento de investi-
gação e de atuação sobre a psique é exagerar um pouco, mas tal-
vez não esteja muito longe disso. Igualmente, o assistente social
estava lá para obter fatos, de modo a poder tomar as decisões
necessárias. Os conselheiros coletavam informações junto aos
estudantes para fins de aconselhamento.
Esses empregos da entrevista não são mal-intencionados,
em geral, e nem estão desatualizados. O fato é que obter dados
_1_2_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Introdução do editor _ _ _ _ _ __ __ _ _ _ __ _ _ _ _ _1_3

era, antigamente, o principal objetivo da entrevista; mas agora dantes estão se preparando para usar. Como editor, posso me
isso tem um papel menor. Hoje toda a ênfase recai na "entrevis- permitir tanto entusiasmo? Se me é pem1itido, classificaria este
ta de ajuda", na qual se sublinha a função de relacionamento. livro como uma pequena pedra preciosa, cortada e facetada
De fato, se levarmos em conta todas as formas de comunicação profissionalmente, com uma superficie bem-polida , emitindo
que ocorrem na entrevista, vemos que ela é o relacionamento. luz calorosa e viva.
A necessidade atual em todos os tipos de atuação profissional
de ajuda - aconselhamento na escola e faculdade, serviço so- C. Gilbert Wrenn
cial, aconselhamento de reabilitação, grande parte da medicina
e da psiquiatria - é esta: aprender como fazer da entrevista um
relacionamento de ajuda. Pode haver, talvez, fornecimento de
informações, mas agora o enfoque incide sobre o processo de
crescimento do cliente. Nem todos concordarão comigo, mas
acredito que deva necessariamente existir um produto secundário
salutar de crescimento e mudança no entrevistador, ainda mais se
o relacionamento for verdadeiramente aberto e criativo. Desse
modo, o objetivo da entrevista é desenvolver um relacionamento
caracterizado pela confiança mútua e mudança criativa.
Este livro trata justamente de tal questão crítica: como
fazer da entrevista de ajuda um relacionamento de ajuda? É o
único livro atual que conheço sobre a entrevista, tratada com
sensibilidade e de forma total. Seu conteúdo é cristalino e apre-
sentado de forma atraente. O plano geral é suficientemente
simples para ser entendido por estudantes, e o pensamento e a
linguagem são psicologicamente bastante profundos para qual-
quer especialista em relações humanas. Oferece com habilida-
de excelente auxílio tanto a profissionais corno a interessados
em aspectos vitais, tais como emprego de perguntas (ou melhor,
seu não-uso!), o mal causado pela pergunta "por quê?", o blo-
queio da comunicação pelos nossos próprios comportamentos
de defesa, etc. Se o leitor está acostumado a sublinhar passa-
gens importantes em livros, aqui terá problemas, já que cada
parágrafo apresenta uma atração peculiar, convidando a grifar!
Prevejo uma vida muito útil para essa abordagem profun-
damente simples do tipo de entrevista de ajuda que milhares de
profissionais empregam todos os dias, e que outros tantos estu-

'~
Prefácio

A entrevista tem ocupado grande parte do meu tempo e de


minhas reflexões durante os últimos dez anos. Tenho praticado,
ensinado e meditado sobre a entrevista. Agora, após muita pon-
deração, decidi escrever sobre ela.
A entrevista que me preocupa é a entrevista de ajuda. Basi-
camente, suponho que existam dois tipos de entrevista: aquela
na qual o entrevistador procura a ajuda do entrevistado, e aque-
la em que o entrevistador tenta ajudar o entrevistado. Seus limi-
tes nem sempre podem ser definidos claramente, mas o propó-
sito de cada uma é nítido. A primeira inclui a entrevista jorna-
lística, a de pesquisa e a entrevista no setor de seleção de pes-
soal. O jornalista quer sua história, o pesquisador sua informa-
ção e o chefe de pessoal, o homem certo para o cargo vago em
sua fábrica. Para eles, a entrevista é uma ferramenta que os ajuda
a obter o que necessitam. Se, ao aplicarem suas habilidades, eles
ainda ajudam o entrevistado, isso é mais ou menos acidental.
A entrevista que pretendo discutir aqui é a do segundo tipo.
Seu objetivo principal é o de ajudar o entrevistado. Ele está no
centro; ele é o focalizado; ele é o mais importante. Tudo o mais
é acidental.
Para mim, a entrevista é um diálogo entre duas pessoas, um
diálogo que é sério e tem um propósito. O objetivo da entrevista

BIBLIOTECA !JNIVERSIT ;:, ..


PrrnF RC'Grn PAf ri
.::.
1.::.
6_ _ _ _ _ __ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Prefácio _ _ _ _ __ _ _ __ 17

é auxiliar o entrevistado, que pode vir até nós livremente, pro- No trabalho de reabilitação e aconselhamento pessoal que reali-
curando ajuda. Pode vir contra sua vontade, forçado pela lei ou zei durante anos, entrevistei muitas pessoas. Durante meu ano
outros agentes, talvez por nós mesmos. Em qualquer caso, a sabáticD* na Temple University, em 1967-1968, liberado das
questão fundamental para o entrevistador deve ser sempre a tarefas e responsabilidades cotidianas, coloquei no papel minha
seguinte: qual será o melhor modo de ajudar essa pess.oa? abordagem e meus pontos de vista sobre a entrevista de ajuda.
Não estou certo de poder definir "ajuda" satisfatoriamente Existem muitos livros sobre a técnica de entrevista - e alguns
para mim mesmo. Essa talvez seja uma razão da existência excelentes. Contudo, são realmente poucos aqueles que conhe-
deste livro. Ajudar é um ato de capacitação. O entrevistad r ço que tratam exclusivamente da entrevista de ajuda. Publica-se
capacita o entrevistado a reconhecer, sentir, saber, decidir, esco- com abundância para especialistas em entrevistas, e pouco para
lher se deve mudar. Este ato de capacitação exige doação da o praticante geral dessa arte. Estou seguro de que uma aborda-
parte do entrevistador. Precisa dar uma parte de seu tempo, de gem básica da entrevista de ajuda é importante para ambos os
sua capacidade de ouvir e entender, de sua habilidade, conheci- grupos. O primeiro irá recebê-la, provavelmente, como parte de
mento e interesse - parte de si mesmo. Se essa doação puder ser seu treinamento profissional. Mas o segundo, freqüentemente
sentida pelo entrevistado, o ato de capacitação encontrará recep- negligenciado, é para quem meu livro se dirige em particular.
tividade. O entrevistado receberá ajuda de maneira adequada e Meu trabalho se destina a todos aqueles que, engajados com a
significativa para ele. A entrevista de ajuda é a ampla interação entrevista de ajuda durante anos, ou no início de carreira, que-
verbal entre entrevistador e entrevistado, na qual se dá o ato de rem pensar mais profundamente sobre o que implica o processo
capacitação. Dá-se, mas não é sempre que os objetivos são alcan- de entrevista e tornar-se mais conscientes de seu próprio papel,
çados; muitas vezes não sabemos se o foram ou não. de suas atitudes e formas de comunicação nessa importante
A entrevista é o tipo de diálogo no qual muitas pessoas, re- tarefa profissional.
presentando diversas ocupações, estão envolvidas a maior parte As transcrições de entrevistas citadas no decorrer da obra
do tempo. O médico a põe em prática quando conversa com seu foram compiladas de diversas fontes. Algumas foram extraídas
paciente, e o educador ao conversar com seu aluno. O psicólo- de gravac;ões; outras, de anotações feitas durante ou logo depois
go, o assistente social, o terapeuta em reabilitação, o conselhei- da entrevista. Outras foram inventadas por mim. Muitas trans-
ro, o chefe do departamento de pessoal - todos esses e muitos
crições provêm de entrevistas conduzidas por estudantes ou
outros se valem da entrevista de ajuda quando trabalham com
colegas; e são usad as com autorização. Todas têm intenção
seus clientes. Embora tragam consigo outras habilidades e
didática: são utilizadas para esclarecer os pontos em discussão.
backgrounds divergentes, todos entrevistam e desejam profun-
damente ajudar. Essas palavras são dirigidas a eles. Com certe- Por esse motivo, todas são breves. Não indico as várias filia-
za, não é porque tenho todas as respostas; sei que não as tenho. ções profissionais dos entrevistadores citados porque isso me
Não sei mesmo se existem respostas adequadas a cada um e a parece menos importante que o fato de todos estarem engajados
cada caso. Minha intenção é, mais propriamente, estimular - na entrevista de ajuda. Esses profissionais são professores, con-
pela primeira vez ou novamente - a reflexão e o interesse sobre selheiros, assistentes sociais, terapeutas em reabilitação, admi-
esse aspecto de nossa vida profissional.
Em Israel, onde vivo e trabalho, tenho lecionado técnica de * Ano sabático: prática universitária em Israel. Para cada sete anos de
entrevista na Universidade de Tel-Aviv e na Faculdade de Haifa. magistério, há um dedicado a teses, viagens de estudo, etc.
.:.
1.:.
8_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda

nistradores, supervisores, médicos, enfermeiras, encarregados 1. eondições


do setor de pessoal, assim como estudantes desses campos. In-
troduzimos pequenas alterações para assegurar a clareza e o
anonimato do entrevistado .
As fonte s referidas no texto (o ano da publicação .está entre
parênteses) são dadas na Bibliografia Complementar, no final
do livro, ao lado de outras leituras que me influenciaram, negati-
va ou posi tivamente, e cuja consulta poderá interessar ao leitor.
Propositalmente, omiti notas de rodapé porque as julguei um
possível obstáculo à comunicação entre o leitor e o autor. Para
compensar essa possível falha, fiz alguns breves comentários
sobre os diversos livros citados na Bibliografia Complementar.
Minhas concepções nesta obra não são originais. Não pro-
ponho nenhuma teoria nova. Como qualquer um, fui e continuo Há algum tempo, eu estava quase chegando à minha casa,
sendo influenciado por muitas concepções e personalidades. depois de um dia de trabalho, quando um esh·anho se aproxi-
Temos, e sempre teremos, muito o que aprender. Contudo, para mou de mim e perguntou se eu conhecia uma determinada rua
ser honesto com meus leitores e comigo mesmo, desejo afirmar que ele estava procurando. Apontei-lhe a direção: "Desça direto .
que, muito além de qualquer outro fator, o trabalho de Carl e depois tome a sua esquerda." Certo de ter sido entendido, con-
Rogers me estimulou a tentar dominar o campo da entrevista de tinuei caminhando. Notei, então, que o desconhecido estava
ajuda. Minha gratidão ao Dr. Rogers é profunda. caminhando na direção oposta àquela que lhe indicara: "O
Também quero dizer que, sem a cooperação ativa dos estu- senhor está indo na direção errada." "Eu sei, respondeu ele, mas
dantes, colegas e entrevistados, este livro nunca teria sido escrito. ainda não estou totalmente convencido."
Por fim, quero manifestar meus profundos agradecimentos Fiquei perplexo. Ali estava eu. Por muitas e muitas vezes
à minha esposa Joyce (Aliza) que, pacientemente, revisou co- havia tentado salientar para meus alunos que cada um possui um
migo os originais e esclareceu meu pensamento através de efi- espaço vital próprio, que cada um é único, e que podemos ajudar
ciente assistência editorial. melhor os outros capacitando-os a fazer aquilo que eles próprios
desejam profundamente. Aquele homem me pedira uma infor-
A.E. mação. Eu a dera do melhor modo que me era possível. Ele a
entendera-pelo menos eu tinha certeza disso. Mas tudo isso não
fora suficiente para mim. Ainda bem que nenhum dano ocorrera.
Ele me dissera que ainda não estava muito certo, e era isso mes-
mo. Mas, eu estava intranqüilo. Como é frágil a areia que nos
serve de base! Como precisamos ter cuidado para não ajudar
demasiado, ou ajudar a ponto de interferir onde não nos querem
ou necessitam! Tecnicamente não se tratava de uma entrevista de
_2_0_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista deaJi1da Condições _ _ __ 21

ajuda, é claro. Mas que importância tinha isso? Sempre seremos às vezes, de necessidade - a de arranjar-se com o que possa
principiantes, pensei comigo mesmo enquanto abria a porta de conseguir. Estou supondo que você tenha uma sala. Certa vez
minha casa - percebendo, admito, que eu era um deles. ajudei a instalar um centro de reabilitação em Israel. Os prédios
Muitos elementos ajudam a configurar a entrevista de estavam longe da fase de acabamento, mas os encarregados
ajuda. É preciso começar por algum lugar, e as condições favo- queriam ação imediata, e nos telegrafaram dizendo : "Entrevis-
ráveis que gostaríamos de criar para a entrevista são um ponto tas podem ser feitas em barracas." Telegrafamos em resposta:
de partida conveniente - condições destinadas a facilitar e a não "Enviem barracas."
atrapalhar o diálogo sério e intencional no qual nos engajare- De fato, uma entrevista de ajuda pode ser realizada em
mos logo que o entrevistado chegue. Ele ainda não chegou, e quase todos os lugares, mas cm geral imaginamos que aconteça
isso é um pouco reconfortante porque, na verdade, temos medo em uma sala. Nunca fui capaz de dizer a alguém como deveri a
dele - não realmente dele, pois não sabemos nada, ou muito ser o aspecto dessa sala. A única coisa que posso afirmar é que
pouco, sobre ele, mas de nossa interação com ele, e dele conos- não deve parecer ameaçadora, ser barulhenta ou provocar dis-
co. Estamos um pouco ansiosos. À medida que tomamos maior trações. O que nela se encontra, dela faz parte, e o entrevistado
consciência dessa inquietação, podemos começar a relaxar um se adaptará a isso. Em circunstâncias normais, nada que faça
pouco. Agora, pelo menos, sabemos como nos sentimos. Não parte do equipamento do entrevistador profissional precisa ser
sabemos como ele se sente, mas ousamos supor que se sente escondido. O que não queremos que o entrevistado veja - fi-
mais ou menos como nós mesmos, se não pior. chas de outros clientes, anotações de outros estudantes, eletro-
Logo ele estará aqui. O que podemos fazer para tomar esta cardiogramas de outros pacientes, os restos de nosso almoço -
entrevista tão útil para ele quanto possível? Não estou sugerin- pode ser tirado da sala antes que o entrevistado entre. A atmos-
do que quando tivermos mais prática, e a entrevista já estiver fera profissional de uma sala não precisa ser camuflada. Afinal
integrada à nossa rotina cotidiana, continuaremos a passar pelo de contas, o entrevistado sabe que está diante de um profissio-
mesmo estado de tensão. Porém, estou certo de que tanto as nal, e esse tipo de sala poderá até mesmo ajudá-lo a focalizar o
condições externas, como as internas, que criamos para o entre- assunto sobre que deseja falar.
vistado, antes de sua chegada e enquanto está conosco, são de Nosso objetivo é proporcionar urna atmosfera que se mos-
grande importância. A atmosfera resultante, se lograrmos nos- tre mais propícia à comunicação. Cada entTevistador decidirá
sos objetivos, será intangível, mas ainda assim sentida pelo sobre como chegar a isso. A sala também tem de ser adequada a
entrevistado durante a própria entrevista, ou então ele se dará ele, já que permanecerá nela grande parte do tempo. Caso se
conta disso talvez retrospectivamente. sinta melhor com uma mesa desarrumada, suponho que isso
não incomodará a maioria das pessoas, a menos que comece a
remexer em seus papéis enquanto o entr·evistado está falando.
Fatores externos e atmosfera Quanto às roupas que o entrevistador usará, tudo o que posso
sugerir é que devemser apropriadas. Também aqui cada um deci-
Asa/a dirá o que isso significa para ele. Além do mais, ninguém pode
adivinhar ou satisfazer as expectativas de todos os entrevista-
É dificil especificar as condições externas, pois o modo dos, restando portanto ao entrevistador assumir sua própria per-
como você organiza e decora sua sala é uma questão de gosto e, sonalidade e padrões profissionai s mínimos.
::_2::_2_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Condições _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _2_3

A questão de como dispor as cadeiras surge com freqüên- utilidade, poderá assustar o entrevistado seguinte, que está es-
cia. Na maioria das vezes estão envolvidas somente duas pes- perando, ou, no mínimo, tomá-lo mais ansioso do que já está. A
soas e, habitualmente, é o entrevistador quem decide onde am- equipe de auxiliares normalmente coopera, se tem conhecimen-
bos irão se sentar. Até onde sei, também aqui não há uma res- to do que isso representa e se foi informada de que você está
posta definitiva. Alguns entrevistadores preferem sentar-se atrás entrevistando. Precisamos mais de comunicação que de avisos.
de uma mesa, olhando o entrevistado de frente, e acreditam que
essa disposição é desejável para ambas as partes. Outros se sen-
tem melhor quando encaram o entrevistado sem uma mesa Fatores internos e atmosfera
entre eles. _Há ainda os que preferem duas cadeiras igualmente
confortáve-is, próximas uma da outra, num ângulo de noventa Não acho que seja mais fácil ser específico a respeito das
graus, com uma mesinha por perto. Essa disposição é a que condições internas mais favoráveis à entrevista de ajuda. Con-
melhor funciona para mim . O entrevistado pode me fitar quan- tudo, acredito que essas são mais importantes para o entrevista-
do quiser, e em outros momentos pode olhar para a frente, sem do do que todas as condições externas reunidas, pois as internas
me ver em seu caminho. Também eu me sinto à vontade. A existem em nós, o entrevistador.
mesinha próxima preenche suas funções normais e, se desne-
cessária, também não incomoda ninguém. Trazer-se a si mesmo; desejo de ajudar

Interrupções A questão é: o que trazemos conosco, dentro de nós, a nos-


so respeito, que possa ajudar, bloquear ou não afetar o entrevis-
As condições externas que podem e devem ser evitadas tado, de um modo ou de outro? Aqui, novamente, não disponho
incluem interferências e interrupções. Neste ponto, sou intransi-
de respostas, mas quero apontar duas condições ou fatores in-
gente. A entrevista de ajuda é exigente para ambas as partes. Do
ternos que considero básicos:
entrevistador exige, entre outras coisas, que se concentre o mais
completamente possível no que está acontecendo ali, criando 1. Trazer para a entrevista precisamente tanto de nós mes-
desse modo a relação e aumentando a confiança. As interrup- mos quanto sejamos capazes, detendo-nos logicamente no pon-
ções externas só servem para prejudicar. Chamadas telefônicas, to em que isso possa constituir obstáculo ao entrevistado ou ne-
batidas à porta, alguém que quer dar "uma palavrinha" com gar a ajuda de que ele necessita.
você, secretárias que precisam de sua assinatura "imediatamen- 2. Sentir dentro de nós mesmos que desejamos ajudá-lo
te" num documento - tudo isso pode destruir em segundos aqui- tanto quanto possível, e que nada naquele momento é mais
lo que você e o entrevistado tentaram criar num tempo conside- importante. O fato de mantermos tal atitude permitirá que ele,
rável. A entrevista de ajuda não é sagrada, mas é pessoal e mere- no decorrer da entrevista, tome consciência disso.
ce e necessita o respeito que desejamos mostrar ao próprio en- Trata-se de ideais que raramente realizamos por completo,
trevistado . Ponderado este fato, encontraremos um modo de mas quando o entrevistado percebe que estamos fazendo o me-
obter a cooperação necessária de nossos colaboradores. lhor que nos é possível nesse sentido, isso vai ter muito signifi-
Muitos entrevistadores costumam colocar um aviso na cado para ele e acabará sendo útil. Embora nem sempre ele seja
porta: "Favor não perturbar", ou algo parecido. Apesar de sua capaz de formulá-lo, provavelmente levará da entrevista - se
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l
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2_4 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Condições _ _ _ _ _ _ _ __ 25

nada mais concreto - o sentimento de que pode confiar em nós certas condições internas ou atitudes podem nos auxiliar. Co-
como pessoas e a convicção de que o respeitamos como tal. nhecer-se, gostar de si próprio, sentir-se bem consigo mesmo, é
A confiança do entrevistado no entrevistador e a convicção uma dessas condições.
de que aquele o respeita representam, evidentemente, apenas
uma parte da finalidade da entrevista de ajuda, seja ela entre Conhecer a si mesmo; confiar nas próprias idéias
professor e aluno, chefe e operário, médico e paciente, seja entre Seja ou não um lugar-comum , acredito que quanto mais
terapeuta em reabilitação e cliente; porém, sem isso, muito
nos conhecemos, melhor podemos entender, avaliar e controlar
pouco de realmente positivo será alcançado. Declarações cate-
nosso comportamento e melhor compreender e apreci.i l' o com-
góricas como "Pode confiar em mim", ou "Eu o respeito inteira-
portamento dos outros. Quanto mais familiarizado s C')m nós
mente", sem dúvida não ajudarão, se o entrevistado não as sentir
mesmos, menor a ameaça que sentimos diante do que encontra-
como verdadeiras. Por outro lado, se confiança e respeito mútuo
mos. Podemos até mesmo chegar a ponto de gostar de algumas
estão claramente presentes na entrevista, e isso é sentido por
coisas nossas e, portanto, tolerar melhor aquelas de qu e não
ambas as partes, não haverá necessidade de expressão verbal.
gostamos nada ou só um pouco. E, então, quanto mais prosse-
Acredito que os que ensinam e escrevem sobre o campo das
guimos no exame e na vontade de descobrir, é possível que con-
relações interpessoais se referem basicamente a isso quando
tinuemos mudando e crescendo. Voltados para nós mesmos,
falam de "contato", boa "relação" e bom "relacionamento"; e
agora devemos considerar a atmosfera que propicia essas coisas. podemos nos sentir à vontade conosco e, assim, sermos capazes
Essa atmosfera intangível talvez seja particularmente de ajudar os outros a se sentirem bem consigo mesmos e conos-
determinada pelo interesse que sentimos e mostramos pelo que co. Além disso, porque estamos bem com o nosso self, menor
o entrevistado está dizendo, e pela compreensão dele, de seus será a tendência deste a interferir em nossa compreensão do self
sentimentos e atitudes. Comunicamos todas essas coisas, ou do outro durante a entrevista.
sua ausência, de muitas formas sutis, das quais o entrevistado Essa atitude ajudará o entrevistado a confiar em nós. Ele
pode ter mais consciência que nós mesmos . Nossa expressão saberá quem somos, posto que nós, aceitando o que somos, não
facial revela muito. Movimentos e gestos completam o quadro, teremos nenhuma necessidade de nos esconder sob uma másca-
apoiando, negando, confirmando, rejeitando ou embaraçando. ra. Ele sentirá que não estamos nos escondendo e, conseqüente-
O tom de nossa voz é ouvido pelo entrevistado, e o faz decidir mente, se esconderá menos. Sentir-se-á querido e pode corres-
se existe confirmação de nossas palavras, ou se essas não pas- ponder ao nosso sentimento, talvez sem saber que realmente po-
sam de uma máscara que o tom de voz revela, sussurrando: demos gostar dele porque nos sentimos bem com nós mesmos .
"Logro, fingimento, cuidado!" Para melhor ou para pior, esta- Estou sugerindo que nossa presença necessária na entrevista
mos expostos ao entrevistado, e quase tudo o que fazemos ou não precisa ser uma carga pesada, que não precisamos estar preo-
deixamos de fazer é anotado e pesado. cupados conosco, mas que podemos nos concentrar integral-
E, assim, retornamos a nós próprios. O que levar de nós mente no entrevistado. Podemos estar liberados para escutar,
mesmos para a entrevista? Somos o único termo conhecido da tentar compreender tanto quanto possível, tentar descobrir o
equação. De certo modo, é disso que tratam os capítulos se- que é sentir como ele sente - em resumo, estar realmente inte-
guintes. Para além de nossa suposta competência profissional, ressado, porque nada em nós se interpõe no que vem dele.
_2_6_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Condiçàes _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _2_7

Nunca atingiremos por inteiro esse objetivo, mas é tentando dificuldade. Em vez de inibi-lo, tal franqueza pode encorajá-lo
que podemos chegar mais perto. a enfrentar sua situação mais vigorosamente. Novamente estou
Confiar em nossas próprias idéias e sentimentos constitui admitindo que nos aceitamos o suficiente para não termos ne-
outra importante condição interna. Relativamente bem com nós cessidade de parecer aos outros como todo-poderosos, onis-
mesmos, e concentrados no entrevistado, descobriremos que cientes e próximos da perfeição. Aqui estou preocupado antes
idéias e sentimentos emergirão em nós. Devemos ouvir cuida- de mais nada com a integridade em relação a nós mesmos.
dosamente essas idéias e sentimentos, assim como os que nas- Obviamente, cada um terá de decidir o ponto em que se situa a
cem do entrevistado. Dependerá sempre de nós decidir se, quan- fronteira entre a honestidade e a imprudência. Por exemplo,
do e como expressá-los. Acredito que uma vez estabelecidos a podemos sentir sinceramente que o entrevistado é arrogante ou
confiança e o respeito, exprimir sentimentos e idéias como nos- dependente, mas talvez não seja adequado ou útil dizê-lo dessa
sos, sem comprometer o entrevistado, pode ajudar mais do que forma, ou talvez seja melhor nem dizê-lo.
embaraçar. Suponho que tal comunicação nossa obviamente Uma observação final. Muitas vezes os observadores prin-
ocorrerá quando o entrevistado não se sentir ameaçado por ela, cipiantes estão tão preocupados com o que irão dizer em segui-
quando estiver pronto para ouvi-la, e tiver segurança de nosso da que têm dificuldade em ouvir e absorver o que está aconte-
respeito contínuo, sem importar o que faça com nossos senti- cendo. Não é uma atitude benéfica, embora compreensível. Tal-
mentos e idéias expressados. Em minha opinião, isto não impli- vez leve algum tempo descobrir que, em geral, o que dizemos é
ca lhe dizer o que fazer. Não o faríamos, mesmo que perguntas- muito menos importante do que nos parece. Quando começa-
se. Antes, tal comunicação nos ajuda a desempenhar o papel de mos, podemos estar tão entusiasmados que nossa própria ansie-
um agente ativo, cooperativo e presente, durante a entrevista. dade interfere no processo. Podemos estar tão inseguros que
precisamos provar que estamos confiantes. Não conheço remé-
dio para isso, exceto paciência e autoconsciência. O entrevista-
Ser honesto, ouvir e absorver
do em geral nos mostrará o caminho certo - se o permitirmos.
Segue-se logicamente uma outra condição interna: hones- Lewin (1935) e outros autores falam do espaço vital que
tidade com nós mesmos para sermos honestos com ele. Se não cada um de nós ocupa. O que tenho tentado dizer se resume
ouvimos ou entendemos alguma coisa, se, absortos, não o escu- nisso: parece-me que, ao entrevistar, o melhor é agir de modo a
tamos, se tomamos consciência de que não estávamos inteira- não impormos nosso espaço vital ao entrevistado, confundir o
mente com ele, é muito melhor dizê-lo do que agir como se nosso com o dele; e nos comportarmo~ de forma a capacitá-lo a
tivéssemos prestado atenção, afirmando que ele não foi claro explorar seu próprio espaço vital em razão da nossa presença, e
ou pretendendo que o que perdemos provavelmente não tinha não apesar dela. Sentindo confiança e respeito, ele poderá lan-
importância. Penso que a maior parte dos entrevistados sente-se çar-se nessa exploração como nunca tentara antes - uma nova
melhor com entrevistadores que lhe parecem seres humanos experiência para ele, portanto, e que pode enriquecê-lo para
falíveis. Toma-se mais fácil, assim, revelarem sua própria fali- além do que dizemos ou deixamos de dizer.
bilidade.
A honestidade recíproca desta natureza pode incluir, às
vezes, dizer ao entrevistado que não temos a solução para sua
_2_8 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda

Mecanismos de enfrentamento vs.


mecanismos de defesa
2. Estágios

Sigmund Freud (1955, 1936) e sua filha Anna (1946) nos


propiciaram insights inovadores sobre os mecanismos de defesa
- coisas que fazemos inconscientemente para proteger nosso
ego. Mais recentemente, pesquisadores do comportamento
humano salientaram os mecanismos de enfrentamento - coisas
que fazemos conscientemente para satisfazer as imposições da
realidade (Maslow, 1954; Wright, 1960; White, 1963). Sem ne-
gar a importância vital das defesas, afirmam que por vezes é
possível confrontar-se, por exemplo, com o desapontamento,
em lugar de reprimi-lo ou racionalizá-lo. No tipo de atmosfera
que descrevi acima, pode ser possível ao entrevistado enfrentar Finalmente chegou o grande dia. Pode não parecer tão gran-
a realidade ao invés de defender-se dela, negá-la ou distorcê-la de para você no momento, mas logo estará terminado, e sua pri-
até ficar irreconhecível. meira entrevista se tornará parte de seu passado. O entrevistado
Todos conhecem a velha fábula da raposa que desejava re- está esperando do outro lado da porta. E veio, apesar do mau
galar-se com algumas uvas de suculenta aparência. Ao desco- tempo. Você esperava que não ... mas, agora, está alegre por ele
brir que estavam fora de seu alcance, decidiu que as uvas esta- se encontrar aqui. Afinal esse é o momento pelo qual esperou.
vam verdes. Não admitindo que lhe faltavam as necessárias ha- Você leu, estudou, praticou - tudo isso ou apenas parte - e o
bilidades ou instrumentos, e depreciando a qualidade das uvas, momento de agir aí está. Ao se aproximar cautelosamente da
a raposa nos dá um exemplo típico de mecanismo de defesa. porta para recebê-lo, sente tudo se esvaindo - tudo o que você
Enfrentar, pelo contrário, é encarar os fatos e decidir, então, o aprendeu sobre desenvolvimento humano, psicologia da perso-
que fazer com eles. Se pudermos criar uma atmosfera em que o nalidade, meio cultural; tudo o que você exercitou em simula-
confronto seja alcançado, nossa entrevista de ajuda poderá aju- ções ou troca de papéis; todas as coisas que repetiu para si
dar mais do que se pode prever. mesmo sobre o que fazer ou não fazer durante uma entrevista.
Tudo i so, e mais ain<la, não existe mais, e você se sente comple-
tamente só e desprotegido, com apenas uma porta entre ele e
você. Mas, no fim das contas, é a você que ele veio ver, e assim
que você o fizer entrar, acontecerá a lição mais importante que
poderia receber sobre entrevi sl<l'l: nela não existe ninguém a não
ser você e o entrevistado. Co1,, o correr do tempo, acabará se
acostumando e, em pouco, começará a aceitá-la como é: a base
do relacionamento de ajuda.
Sem dúvida você já havia feito entrevistas antes, mas nun-
ca esteve tão consciente disso como agora - ou talvez não tives-
:_]_:_O_ _ _ _ _ _ __ _ _ __ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Estágios _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _3_1

se tomado consciência alguma. Nesse momento você está as- Iniciada pelo entrevistado
sustado e indeciso. Só pode contar com você - você e ele, espe-
Alguém pede para vê-lo. O mais sensato a fazer, ao que
rando do outro lado da porta. Se ao menos pudesse contar com
parece, é deixá-lo dizer o que o trouxe até você. Simples, mas
ele ... Mas você pode, acredito; e o fará cada vez mais, à medida
nem sempre fácil de fazer. Às vezes sentimos que deveríamos
que o tempo passar. Como ele veio com um objetivo específico,
pode saber melhor como você poderá ajudá-lo. Des~;'a maneira, saber o que o trouxe e deixar que ele tome conhecimento de que
se você aprender a confiar nele, isso o ajudará a dar-lhe a ajuda sabemos. Assim, podemos dizer: "Você deve querer saber como
de que necessita. Demorará algum tempo aprender essa impor- Johnny está se saindo com seu novo professor." Isso pode ser
tante lição, pois nesse exato momento você está muito preocu- correto, ou não. Se for, nada ganhamos além, talvez, de nosso
pado consigo mesmo, e tem a sensação de estar completamente sentimento de perspicácia. Se não for, o entrevistado poderá ser
só e vulnerável. colocado em situação embaraçosa. Pode sentir que era com
_Mais uma palavra antes de girar a maçaneta. Disse e reafir- aquele assunto que deveria estar preocupado e, para não contra-
marei neste livro muitas coisas em que creio sinceramente. São dizer o entrevistador, pode concordar, mesmo que pretenda
verdadeiras para mim, e descobri que normalmente dão certo. algo bem diferente. O entrevistado mais confiante simplesmen-
Mas talvez não sejam verdadeiras ou úteis para você. As res- te dirá: "Não, o motivo por que vim é ..." Mas, sem dúvida, esta-
postas sugeridas aqui - na medida em que são respostas - pode- rá pensando: "Por que você precisa me dizer para que estou
rão não ser válidas para você. E certamente não precisam ser. aqui? Assim que você deixar, eu lhe contarei."
Mas se o estimularem a questioná-las, e daí surgirem respostas Às vezes podemos estar certos de que sabemos o que o
significativas e aproveitáveis para você, sentir-me-ei mais que levou a nos.procurar, e mostrar-lhe isso de saída. Naturalmente,
recompensado por tê-las posto neste trabalho. A entrevista de pode acontecer que acertemos, e o fato de dizer a alguns entre-
ajuda é mais uma arte e uma habilidade do que uma ciência, e vistados por que vieram pode ajudá-los a começar a entrevista.
cada artista precisa descobrir seu próprio estilo e os instrwnen- No entanto, na minha opinião, se alguém pediu para nos ver, e
tos para trabalhar melhor. O estilo amadurece com experiência, veio, é melhor deixá-lo expor em suas próprias palavras exata-
estímulo e reflexão. Não pretendo que meu estilo seja adotado mente o que o trouxe, o que há de especial para contar. Termi-
por você, mas estou muito interessado em estimulá-lo a desen- nadas as saudações habituais, estando ambos acomodados, o
volver e a refletir sobre o seu próprio. melhor a fazer é ajudá-lo a iniciar a entrevista, se ele necessitar
disso (o que não acontece normalmente), e ouvir o mais atenta-
mente possível o que tem a dizer. Se acreditamos que algo deve
A brindo a primeira entrevista ser dito, devemos fazê-lo de forma rápida e neutra, para não
interferir em seu rumo: "Conte-me, por favor, o que o trouxe
Gosto de distinguir dois tipos de primeira entrevista: a ini- aqui", ou "Ahn-ahn ... vá em frente", ou "Compreendo que quis
ciada pelo entrevistado, e a iniciada pelo entrevistador. Vamos me ver", ou "Fique à vontade para falar sobre o que você está
começar pela primeira. pensando" .
Sou firmemente contrário a todas as fórmulas para entre-
vista. Dessa maneira, sou cauteloso com introduções tais como:
-=.3-=.2_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Estágios _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _3_ 3_

"Estou contente por você ter vindo esta manhã", porque posso estacionar", ou "É bom o dia hoje estar ensolarado depois de
não estar ou não permanecer contente por muito tempo. Tam- toda aquela chuva, não é?", ou "Sei que é difícil começar.
pouco aprecio frases como: "Por favor, em que lhe posso ser Aceita um cigarro?".
útil?". Não pretendo pôr em dúvida o sincero desejo de auxiliar Ocasionalmente, o entrevistado poderá iniciar com uma
do entrevistador. A questão é que nem sempre o entrevistado pergunta: "Quem deve falar sou eu ?", ou "Você está esperando
sabe, no começo, que tipo de ajuda você pode dar. Pode saber, que eu comece?'', ou "Preciso falar?" . Nesse caso, acredito que
mas simplesmente não ser capaz de verbalizá-la de imediato. o mais plausível é dizer um "Sim" ou "Ahn-ahn'', acompanha-
Pode saber, mas_receia situá-la tão abruptamente no início. Não dos ou não de aceno de cabeça, e acrescentar, se necessário,
estamos certos se ele aprecia a idéia de vir até ali para ser ajuda- algo sobre talvez não ser muito fácil, mas que só ele sabe o que
do, ou que sentido dá à palavra "ajuda". Por fim, nossa cultura
o trouxe até ali e deseja discutir.
está tão permeada de "Posso ajudá-lo?" cuja intenção é clara-
mente outra que é melhor tentar, até onde for possível, ajudar
Iniciada pelo entrevistador
sem valer-se dessa expressão.
Também não simpatizo com a palavra "problema". "Qual A entrevista se ini cia com uma nota diferente quando foi o
o problema que você gostaria de discutir?" Esse tipo de abertu- entrevistador que a provocou. Percebo aí urna regra e um pe1i-
ra também me preocupa por diversas razões. Primeiro, pode ser go. A regra é simples: situar no início, com clareza, aquilo que
que o entrevistado não tenha um problema. Segundo, pode levou você a pedir ao entrevistado qu e viesse vê-lo. Dessa ma-
ainda não ter pensado nisso como um problema, até que coloca- neira, o entrevistador no setor de admissão de pessoal pode dizer:
mos a palavra em sua boca. Terceiro, a palavra "problema" é "Examinei atentamente o formulário que preencheu outro dia, e
pesada, carregada, como algo que é melhor evitar do que en- pedi que viesse para conversarmos sobre os tipos de trabalho
frentar. Não estou sugerindo que as pessoas não têm problemas; em que está interessado e de que maneira podemos ser úteis. Vi
mas podem tê-los e não saber ou não desejar enfrentar o fato de que você, nessa parte do formulário, escreveu que ..." O médico
sua existência. O uso da palavra "problema" no início, fora de pode observar: "Pedi a você que viesse para conversarmos
contexto e sem saber como o entrevistado reagirá, irá mais em- sobre os resultados daqueles testes, e que já estão aqui; assim
baraçar que ajudar. vejamos ..." Um conselheiro de centro de reabilitação pode co-
E agora, um paradoxo. Quando alguém vem nos procurar meçar assim: "Você já está aqui há uma semana, Betty, e pedi .
porque o deseja sinceramente, e porque iniciou o contato com que viesse me ver para conversarmos a respeito de suas impres-
esse objetivo, poderá estar tão ansioso que quase tudo o que dis- sões deste lugar e de outros assuntos que queira discutir." Nesse
sermos não será notado. Desde que não obstruamos seu cami- momento, poderá fazer aquilo que realmente quer: escutar Betty.
nho, ele começará a falar. O grande perigo que existe nas sessões iníciadas pelo en-
Às vezes, é cabível ou necessária uma introdução por parte trevistador é a possibilidade de elas se transformarem em monó-
do entrevistador, algo que ajude o entrevistado a iniciar. Mas, logos ou conferências, ou uma mistura dos dois. Um pai, cha-
devemos tentar isso somente quando sentimos que será útil. mado pelo professor para discutir problemas de seu filho, ob-
Frases curtas, como as seguintes, podem quebrar o gelo: "Com servou: "Se você me chamou apenas para ouvi-lo, seria melhor
o trânsito confuso daqui, você deve ter tido dificuldades para que tivesse escrito uma carta." Esse perigo pode ser evitado se
34- - - - - - - - - - - - - - - - - - A entrevista de aj uda
-

tomarmos o cuidado de permanecermos quietos, depois de ter-


mos indicado o propósito da entrevista e dado alguma informa-
l Estágios _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ ___:3~
5

só interessam ao nosso empregador. O entrevistado pode ape-


nas querer saber quem somos numa determinada agência ou
ção, se for o caso, que consideramos necessária. Em geral, o en- instituição, com a intenção somente de saber se está com a pes-
trevistado terá muito a dizer se perceber que estamos prontos e soa certa, se somos quem ele deveria ver, e não outro. Preci-
desejosos de ouvi-lo. Se objetivamos uma conversa, µma boa co- samos apenas nos identificar, e situar nossa posição ali para que
municação, precisamos cuidar para que o entrevistado tenha ele prossiga com tranqüilidade. Se nossa posição chegar a ser
oportunidade de expressar-se plenamente. É a única forma de colocada em discussão, será apenas em termos daquilo que po-
descobrir se e como ele nos entendeu, o que pensa e como se demos ou não fazer. Isso deve ser claramente explicado quando
sente. Se não for assim, será preferível, realmente, mandar oportuno. Exemplos:
uma carta.
"Suponho que você sabe para que pedi que viesse", ou "Meu nome é F. Sou a conselheira escolar, e você pode dis-
"Nós dois sabemos por que você está aqui", ou "Você pode ten- cutir comigo tudo o que a preocupa sobre Jane."
tar adivinhar por que pedi que viesse até aqui" são aberturas "Nossa agência oferece o serviço que você está procurando.
A pessoa encarregada é a Srta. Smith e, se quiser, posso marcar
que, levadas a sério, podem ser encaradas por um ângulo amea-
uma hora para você."
çador. Não há lugar para essas reservas inúteis na entrevista; e o
"Percebo que nós dois gostaríamos de ouvir uma opinião
entrevistado pode não saber por que está ali e, ainda mais,
médica. Aqui não temos nenhum departamento apropriado, mas
temer que não acreditemos nisso. Pode pensar que sabe o moti- temos convênio com o hospital X. Quer que prepare sua guia de
vo, e não desejar dizê-lo; ou pode imaginar uma série de razões encaminhamento?"
e confundir-se. Também pode considerar isso uma provocação,
e reagir à altura; ou pode decidir lutar coritra nós em vez de
cooperar. É bastante duvidoso que esses tipos de abertura pro- Emprego de formulários
movam o encontro de duas pessoas; pelo contrário, podem
forçá-las a se separar ou mantê-las afastadas. Acredito que o
Por fim, chegamos aos formulários . Francamente não me
entrevistado tem o direito de saber imediatamente o nosso obje-
preocupo muito com eles, embora aprecie sua função em nossa
tivo ao chamá-lo. Se a intenção é ajudar, quanto mais honestos
sociedade. A informação pedida é com freqüência dada com
e abertos formos, da mesma forma ele o será. O resultado será
relutância, e recebida com precaução. Como resultado, os for-
uma entrevista verdadeira, na qual duas pessoas conversam de
mulários podem se colocar entre o entrevistado e o entrevista-
maneira séria e objetiva.
dor. Penso ser melhor preencher os formulários necessários du-
rante e como parte integrante do processo de entrevista. Às ve-
zes essa formalidade pode ser cumprida de maneira rápida e
Explicação de nosso papel
sem prejuízo. "Antes de continuarmos, Sr. Jones, eis aqui um
Ainda duas reflexões sobre essa fase de abertura. Acho breve formulário que precisamos preencher. Se tiver alguma
melhor não envolver o entrevistado nas complexidades de nos- reserva com respeito a alguma das perguntas, por favor me in-
so papel, profissão ou background profissional, que realmente forme quando chegar lá e tentaremos ver do que se trata."
~3~6 _ _ _ __ _ __ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Estágios _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __ 37

Se 0 formulário é longo, complicado, ou ambos, o entre- mos esquecido, se ele não era importante para nós, se o mantí-
vistador poderá marcar um encontro especial com o entrevista- nhamos esperando por um motivo que lhe é desconhecido, e se
do para, juntos, o preencherem, aproveitando a ocasião para dar fomos sinceros com ele. É óbvio o que isso significa em termos
início ao relacionamento. As pessoas, em geral, aceitam sim- de confiança e respeito. Os encontros devem ocorrer na hora esti-
plesmente responder perguntas como um fato inevitável da vida, pulada ou, então, dê uma boa e verdadeira razão: "Sei que temos
a não ser que tenham respondido às mesmas perguntas muitas e um encontro às nove, Mary, mas aconteceu um fato inteiramente
muitas vezes, em diversas agências, ou a pessoas diferentes nu- imprevisto e, assim, terá que desculpar-me por me atrasar uns
ma mesma agência. Ninguém poderá culpá-las, então, se empa- quinze minutos. Sinto muito, mas esse assunto não pode esperar."
carem. Mas se não for esse o caso, e o entrevistado perceber por De outro lado, quando a mãe de Shirley corre à escola e
nosso comportamento que pode situar suas reservas - que pode insiste em vê-lo imediatamente, não há normalmente nenhum
discutir item por item - não haverá dificuldades, desde que motivo para cancelar tudo e recebê-la. Não havia sido marcado
tenhamos aceito o formulário como algo importante ou, pelo nenhum encontro, não é uma emergência e você realmente está
menos, como um fato inevitável da vida. Um bom relaciona- ocupado. Se ela precisa vê-lo hoje , terá de esperar até você ter
mento inicial pode ser construído se ambas as partes aceitarem uma hora livre. Ela deve ser informada disso de forma polida,
essa inevitabilidade. Enquanto trabalham juntos, podem desco- mas firme. Se a receber preocupado com outr·os assuntos, poderá
brir muito um do outro, e criar uma atmosfera adequada de estar distraído e tenso demais para escutá-la da maneira que gos-
modo que, preenchido o fo1mulário, a entrevista prossiga sem taria. A honestidade tem o dom de facilitar um relacionamento.
arestas. Normalmente você deve dizer às pessoas, implícita ou ex-
plicitamente, quanto de seu tempo pertence a elas. Isso estrutu-
ra a entrevista. "Desculpe-me, Sra. Brown, mas dentro de dez
O fator tempo minutos tenho ·uma reunião com minha equipe. Se não puder-
mos terminar até lá, marcaremos outro encontro." Isso é prefe-
Nossa cultura mede muito em tennos de tempo, e dá a ele rível a continuar sem dizer nada, mas sentindo-se cada vez mais
um grande valor. Costumeiramente dizemos "Mais vale perder pressionado, e desejando que ela se levante e saia. Daí para a
um minuto do que a vida", "O tempo não espera por ninguém" frente, você não a ouve, e talvez ainda sinta raiva por ela não ter
e "Tempo é dinheiro". Assim sendo, em nossa cultura, tempo é terminado, e você com aquele encontro importante (sobre o
um fator importante para a entrevista. Ficamos imaginando a qual, é lógico, ela nada sabe). Uma assistente social pode dizer:
importância do fato de o entrevistado ter vindo tarde ou cedo, e "Carol, concordamos em nos encontrar todas as segundas-fei-
o significado que isso tem para ele. Em outras palavras, temos ras às quatro horas, e vamos ter em cada sessão quarenta e cinco
consciência do tempo, e supomos que o entrevistado também minutos para falarmos sobre tudo o qu e você quiser."
tenha - e, em geral, ele tem. Nosso comportamento também é Quando diversas entrevistas estão programadas, o fator
observado por ele nessa dimensão. Quando marcamos uma en- tempo é parte integrante da atmosfera geral e do relacionamen-
trevista para as dez da manhã, estamos lá, e disponíveis para o to. Em entrevistas únicas, esse tipo de estruturação de tempo
entrevistado? Isso é mais que mera cortesia. Quanto mais ele não é muito importante, mas mesmo assim os limites devem ser
esperou depois das dez, mais ficou imaginando se não o teria- colocados com clareza. Às vezes, as pessoas continuam falando
_3_8_ _ _ _ _ _ _ _ _ __ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda
Estágios _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _3_9

sem perceber que estão se repetindo. Talvez não saibam como


finalizar, levantar e sair. Como frutos de nossa sociedade, po- você poderá estar falando mentalmente com o entrevistado A,
dem considerar que é mais educado continuar sentadas, espe- enquanto o entrevistado B está ali sentado, com direito a rece-
rando pelo nosso sinal de encerramento da entrevista. ber sua atenção integral. Afaste o entrevistado A de sua mente,
Não estou afirmando que devemos apressar o entrevistado, antes de receber B. Para fazê-lo , poderá necessitar de alguns
mas que devemos deixar claro para ele o tempo disponível, de minutos para ponderar os fatos cuidadosamente, anotar em sua
modo que se oriente. Não tenho uma resposta precisa sobre quan- agenda o que prometeu verificar para o entrevistado A, ou sim-
to tempo deve durar urna entrevista. Entretanto, penso que, em plesmente reclinar-se na cadeira ou dar uma volta, preparan-
geral serão suficientes 30 a 45 minutos. O que não foi dito nes- do-se para B.
se período, provavelmente permaneceria não revelado mesmo
se estendêssemos o tempo da entrevista, e haveria muita repeti-
ção. Esse é o limite máximo; se depois de dez minutos ambos Três estágios principais
perceberem que terminaram, não há razão para continuar senta-
dos só porque a meia-hora ainda não escoou. "Muito bem, se Como a Gália de César, a entrevista se divide em três par-
não há mais nada a acrescentar, creio que terminamos por aqui. tes. Mas, diferentemente daquela, essa divisão nem sempre é
Obrigado por ter vindo." claramente visível. Às vezes, essas partes se fundem umas nas
Retomaremos esse assunto ao discutirmos o encerramento outras de forma tal que é dificil isolá-las. Essas divisões ou
da entrevista. Aqui, desejei acentuar a importância do fator tem- estágios indicam movimento. Se ausentes, isso poderá demons-
po, para entrevistador e entrevistado, e demonstrar que ele pode trar que nada ocorreu, que, por exemplo, nunca saímos do está-
tornar-se uma ponte onde os dois se encontram. Ambos pode- gio 1. Por outro lado, o movimento pode ser tão rápido que é
rão se sentir à vontade dentro de uma estruturação de tempo; e muito dificil determinar onde se encerra um estágio e começa o
quando há necessidade, o entrevistador pode ajudar o entrevis- outro. Eles são:
tado, verbalizando aquilo que esse está sentindo, mas não quer
ou não consegue expressar: "Tenho a impressão de que você gos- 1. Abertura ou colocação do problema
taria de parar por aqui. Acertei, Jim?", ou: "Você continua olhan- 2. Desenvolvimento ou exploração
do o relógio, e estou me perguntando se você tem outro com- 3. Encerramento
promisso. Se quiser, podemos continuar em outra ocasião." Es-
sa atitude de sensibilidade e abertura da parte do entrevistador Abertura ou colocação do problema
não irá diminuir a confiança e o respeito; ao contrário, poderá
aumentá-los. No estágio de abertura, é situado o assunto ou problema
Uma observação de caráter prático: se precisar entrevistar que motivou o encontro entre entrevistado e entrevistador. Essa
diversas pessoas num mesmo dia, intercale alguns minutos fase em geral termina quando ambos compreendem o que deve
entre as entrevistas para escrever ou fazer anotações. Pense cui- ser discutido e concordam que o será. (Se discordam, já podem
dadosamente sobre o que ocorreu até o momento, ou então rela- parar ali.) Na realidade, a entrevista poderá não se ocupar ex-
xe e se prepare para a próxima pessoa. Pois, de outra maneira, clusiva, ou mesmo principalmente, desse assunto . Outros pon-
tos podem ser levantados, e o que parecia tão central no início
_4_0 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Estágios _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _
4.:.....
1

pode ter sua importância diminuída e ser substituído por outro Desenvolvimento ou exploração
tópico. Pode ocorrer que, à medida que o entrevistado se sinta à Uma vez que o assunto foi situado e aceito, passa então a
vontade durante a entrevista, ele se permita discutir qual é o ser examinado, explorado. Entramos ass im na segunda fase: a
assunto principal, alterando desse modo, em parte ou integral- exploração. O corpo principal da entrevista foi alcançado, e a
mente, o foco da entrevista. Assim, o professor pode. marcar um maior parte de nosso tempo será despendida no exame mútuo
encontro com Dick e dizer-lhe que percebeu que o aluno não
do assunto, tentando verificar todos os aspectos e tirando algu-
tem feito os trabalhos de casa com a assiduidade habitual. Se
mas conclusões. Nesse momento, quando você poderá sentir
Dick sentir que o professor quer realmente ajudá-lo, que seu
maior necessidade de ajuda, terei que desapontá-lo. ão posso
interesse é sincero e não visa simplesmente a resolver o proble-
lhe dizer o que falar ou não falar, o que fa zer ou não fazer. Tal-
ma da lição de casa, poderá passar a relatar suas dificuldades no
vez você queira consultar alguns dos excelentes volumes sobre
lar. Como resultado, ambos poderão se envolver em uma dis-
estudos de caso, que apresentam material so bre muitas profis-
cussão dessas dificuldades, e das soluções que podem ser
sões, e vári os enfoques de entrev ista. (Vej a no fim deste volume
encontradas, retomando ao quase esquecido ponto da lição de
a Bibliografia Complementar.) Este não é um livro de estudos
casa somente quando os dois, tendo explorado a situação, o
de caso. Porém, o Capítulo 7, "Respostas e Indicações", poderá
encararem como parte de um quadro mais amplo, e concorda-
rem quanto ao seu planejamento. Aqui todos os três estágios ser útil.
Aprendendo com as entrevistas p assadas. Tentando não
foram cobertos. O assunto foi colocado, explorado e encerrado.
desmerecer outras fontes, diria que você tem o melhor auxílio ao
Um outro exemplo é mais ilustrativo: um homem, procu-
rando visivelmente um emprego, vem até o departamento de utilizar suas próprias entrevistas como ponto de referência - dis-
colocações para entrevistar-se com você. Enquanto os dois dis- cutindo-as com seus colegas e supervisores, refletindo sobre
cutem e exploram as possíveis oportunidades de emprego, veri- elas, ouvindo gravações suas ou de outrns . Cada enh·evista é
ficam que ele está realmente interessado em aperfeiçoar seu diferente. Com o passar do tempo, você talvez descobrirá um
treinamento vocacional, mas não sabe como obtê-lo ou finan- modelo; mas ele adquirirá forma graças à sua atuação, sua
ciá-lo. No encerramento, os dois estarão fazendo planos sobre maneira de ser. A descoberta, exame e decisão sobre o que man-
essa questão . A necessidade de um emprego, supostamente o ter ou mudar nesse modelo irá formar um tipo de crescimento
objetivo, foi substituída por algo mais importante durante a profissional e pessoal que, acredito, será muito significativo
entrevista. O objetivo verdadeiro é o progresso no treinamento para você.
vocacional. Certos aspectos dessa fase principal ela entrevista merecem
Uma senhora consulta seu médico, queixando-se de fortes uma consideração cuidadosa. Poderia indicar alguns deles,
dores de cabeça. Encorajada a descrever seus sintomas - ponto embora reconheça que existam muitos outros aos quais apenas
exato, quando começa a sentir, em que circtmstâncias - ela diz faço referência. Mais uma vez reafirmo que meu desejo é esti-
' ' mular- não apresentar respostas, mas ajudá-lo a encontrar suas
em determinado momento, que pensa estar grávida novamente
e ... O verdadeiro problema foi descoberto, e a entrevista prosse- próprias soluções.
gue de modo adequado. Pergunta: Você ajudou o entrevistado a ampliar seu campo
de percepção até o limite possível? Ele foi capaz de olhar os
42
__:_::_~--~~~~~~--~~~~~~ A entrevista de ajuda
Estágios _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _43
_

fatos da maneira como pareciam a ele, e não a você ou a qual-


profundos de rejeição, amargura e desesperança. Aos poucos
quer outra pessoa? Ele conseguiu olhar corretamente o que via,
você começou a ver e compreender. Você não concordou, não
e transmitir isso, ou se percebeu através dos olhos dos outros?
desculpou, mas começou a sentir o que ele tinha passado, e ain-
Ele descobriu seu próprio eu, ou encontrou um eu que pensou
da passava. Você viu quanto ódio e ressentimento ele sentia em
devia encontrar? Sua atitude o impediu de explorar seu próprio
relação aos judeus que conhecia, e como não tinha a menor
espaço vital, ou capacitou-o a movimentar-se dentro dele, sem
consciência do fato de você ser judeu.
apoio de influências externas? ,. . .
Pergunta: Você ajudou o entrevistado a deslocar-se de uma
Quando Lucy disse: "Agora que estou parahtica, Jamais
estrutura de referência externa para uma interna? Você o ajudou
conseguirei me casar", o que você fez? Você sabe que se sentiu
a chegar perto de si mesmo para explorar e expressar o que des-
transtornado, sentiu que o mundo dela ruíra. Mas o que você
cobriu, em vez de envolver-se em lugares-comuns ou rótulos
disse? O que mostrou? Você a ajudou a abrir-se, a falar sobre o
avaliativos que os outros sempre têm prontos para impingir-lhe?
problema, todo ele, a ouvi-lo e examiná-lo? Talvez você tenha
Você o capacitou a dizer-lhe como se sente verdadeiramente,
dito: "Não sej a tola; você é jovem, bonita e inteligente e, quem
como as coisas parecem ser para ele de verdade?
sabe, talvez ..." Mas você não disse isso. Já deve ter dito algo
Quando Michael disse que sabia ser errado roubar, você
parecido a doentes no hospital, até aprender que isso os levava a
retrucou: "Então, por que você faz isso?" Ou tentou talvez
se afastarem de você. Naquele momento, você simplesmente
fazê-lo sentir e expressar o que se passava em seu íntimo - sua
olhou para ela e não ficou com medo de sentir o que ambos sen-
estrutura interna de referência-, dizendo algo semelhante: "Você
tiam. Então disse: "Você sente que toda a sua vida está arruina-
diz que isso é errado, mas continua roubando. Gostaria de saber
da por esse acidente." "É isso mesmo", ela retrucou, chorando
o que isso significa para você, e como o compreende." Você
amargamente. Continuando a falar, em seguida. Ela continuava
está satisfeito por não ter se mostrado como detetive ou mora-
paralítica, mas você não aceitara a maneira de ela odiar e enfren-
lista - sua estrutura interna de referência - perguntando: "Você
tar o fato.
tem irmãos e irmãs, e eles também ... ?", ou afirmando: "Estou
Quando Charles, um jovem negro do Harlem, contou-lhe
certo de que, como você sabe que esse tipo de coisa é errado,
que odiava os judeus e que, se pudesse, estrangularia a todos
isso não deverá ocorrer de novo."
com prazer, havia muita coisa que você gostaria de dizer. Estava
Interessado na estrutura interna de referência do entrevis-
tudo na ponta da língua, quando refletiu que estava ali para
tado, você está preocupado com o que é central para ele, e não
ajudá-lo, no que fosse poss ível. Como ele perceberia seu desejo
com o que é central para você: isso pode ser periférico para ele
de ajudá-lo, se você nem mesmo o estava ouvindo? Se era as-
e, nesse caso, afastá-lo dele mesmo em sua direção. Se ele diz:
sim que ele se <;entia, você decidiu, era melhor escutá-lo e tentar
"Espero para seu próprio bem que não tenha irmãs; elas são ter-
compreender o que isso significava para ele. E você não lhe
ríveis", e você replica: "Acontece que tenho uma irmã e nos
chamou a atenção, não o criticou, não disse para ele parar de falar
damos muito bem; suas irmãs é que devem achar você terrível",
ou sentir-se desse modo. Não fez nenhuma apologia dos valores
a estrutura de referência foi deslocada. Mas se afirmar: "Você e
judaico-cristãos. Em lugar disso, você abriu mais ainda seu
suas irmãs não estão se dando muito bem agora'', você não des-
campo de percepção ao di zer: "Nesse momento você está odian-
locou, mas manteve a estrutura interna de referência do entre-
do os judeus desesperadamente." Ele pôs para fora sentimentos
vistado.
_4_4 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Estágios _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __ _ 4
_5_

Pergunta: Você permite que o entrevistado explore o que conscientes de nosso comportamento de n ão desejar descobrir
quiser, à sua própria maneira, ou o conduz na direção que esco- o que realmente está acontecendo.
lheu para ele? Seu comportamento indica realmente ausência
de ameaça? Ele estava com medo de se expressar e, se foi as- Eto. Ontem à noite, pela primeira vez em semanas, dormi per-
sim, o que fez para diluir esse medo? Você quis realmente feitamente bem, sem ter tomado o remédio.
ouvi-lo, ou quis que ele escutasse porque você tinha já a respos- Etr. Aquele remédio é muito importante para você. Agora, veja-
ta para seu problema, porque estava ansioso para "dar a ele um mos, você estava tomando .. . três vezes ao dia, certo?
bocado de seus pensamentos", ou porque realmente você não
queria ouvir mais, pois de qualquer maneira não teria sabido o Fico imaginando o quanto podemos perder com es sa in-
que fazer? sensibilidade. E imagino também o que o paciente pensa sobre
Você terá que responder a essas perguntas quando fizer o interesse since ro do médico por sua pessoa, e como isso pode
uma auto-avaliação ou avaliar suas entrevistas. Haverá respos- ser importante para restituir-lhe a saúde.
tas diferentes para diferentes entrevistados; você não responde- Cooperar com o entrevistado significa escu tar e rt;s ponder
rá sempre exatamente da mesma maneira. àquilo que ele está dizendo e sentindo . Significa capacitá-lo a
Pergunta: Você acompanhou o entrevistado ou o forçou a se expressar completamente. Significa segui-lo, em vez de pe-
acompanhar você? O que você prefere? O que é melhor para dir-lhe que nos siga. Isso implica decisões bem-definidas: esta-
ele? mos preparados para deixar o entrevistado tomar a iniciativa e
mantê-la por quanto tempo precisar? Estamos preparados para
Eto. * Quando estive na guerra, tinha dois companheiros ecos- deixá-lo assumir a responsabilidade sobre si mesmo, ou senti-
tumávamos ... mos que precisamos assumi-la por ele? Estamos preparados
Etr. Lá está você voltando para o passado agora, e acho que para deixá-lo liderar ou precisamos que ele nos siga? Afinal de
devemos prosseguir com seus planos escolares. Tenho conta:, , trata-se de questões filosóficas , mas as respo ndemos de
aqui comigo os resultados dos testes e tenho certeza de
um modo ou de ouh·o toda vez que estamos entrevistan do .
que você deve estar interessado neles.
Freqüentemente, quando consideramos com profundidade
o assunto em discussão, descobrimos que os aspectos se fundem ,
Esse tipo de interrupção em entrevistas ocorre com mais
freqüência do que imaginamos. Às vezes pretendemos isso que pensamentos geram outros pensamentos e que os sentimen-
mesmo, e mesmo assim o procedimento é discutível. Em outras tos fazem brotar outros sentimentos, mais ou menos como os
ocasiões, não temos essa intenção, apenas somos levados por estágios acabam se confundindo no processo de entrevista. Po-
nós mesmos e, mais tarde, refletindo sobre isso, desejamos que rém, nem sempre isso é verdade ; algumas vezes a continuidade
tivesse sido de outra maneira. Ocasionalmente, sentimo-nos pres- do processo pode ser interrompida e eventualmente estrangula-
sionados pelo tempo, ou suspeitamos que o entrevistado está da. O entrevistado pode olhar para você, como se estivesse di-
inventando coisas. Mas, às vezes, não estamos suficientemente zendo : "Bem, e agora para onde vamos?'', e você mesmo pode
estar se perguntando isso. Mais uma vez, não tenho respostas
conclusivas, mas posso dar algumas sugestões. Para algun s en-
* Eto. = entrevistado; Etr. =entrevistador. trevistados, você pode expressar seus sentimentos: "Você está
46 Estágios _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _4_7
- - - - - - - -- - - - - - A entrevista de ajuda

olhando para mim como se estivesse querendo dizer: 'Bem, e pronto para dividir um pouco comigo"; ou "Posso ver na ex-
agora, para onde vamos?'" Uma outra possibilidade é perguntar pressão de seu rosto que há muitas coisas ocorrendo aí por den-
a si mesmo e ao entrevistado sobre o que está acontecendo: tro; estou pronto a participar delas se você estiver pronto a me
aceitar''. O silêncio desse tipo pode ajudar muito se o entrevis-
"Estou me perguntando se já dissemos tudo o que tínhamos para
tador não se sentir ameaçado ou incomodado por ele, mas, ao
dizer por hoje." Ou, então, você pode dizer: "A não ser que você
contrário, se puder manejá-lo como parte de um processo em
tenha alguma coisa para acrescentar, talvez já tenhamos falado
continuidade.
muito sobre seus atrasos; estou tentando imaginar se haveria
Ocasionalmente instala-se um silêncio, e seu motivo é mui-
alguma coisa mais em sua mente." Expressando embaraço ou
to claro para o entrevistador. De fato, necessitando também ele
incompreensão de sua parte, você poderia fazer a seguinte obser-
de uma pausa, pode compartilhá-la com o entrevistado. Esse
vação: "Francamente não entendo o que toma dificil para você pode ter acabado de dizer algo temo, trágico, chocante ou ame-
continuar." Afirmando a mesma coisa de modo um pouco dife- drontador, e ambos sentem necessidade de absorvê-lo até o fim,
rente, você lhe dará um outro peso: "Sinto que você está tendo em silêncio mútuo. Se depois desse silêncio o entrevistado ain-
muita dificuldade em continuar. Se ajudar a você ficarmos senta- da encontra dificuldades para continuar, um comentário o aju-
dos, pensando um pouco, isso não me incomoda nem um pouco." dará a retomar a linha de pensamento; por exemplo: "Deve ter
Você convidou o entrevistado ao silêncio. sido uma experiência cheia de ternura para você."
Muitas formas de silêncio. Minha experiência me ensina que A confusão freqüentemente levará ao silêncio. Uma deter-
a maior parte dos entrevistadores principiantes considera dificil minada situação pode estar confusa para o entrevistado. Ele pode
suportar o silêncio. Eles parecem julgar que, se há um silêncio, ter revelado alguma coisa que o confundiu, ou você pode tê-lo
a culpa é del e . e o lapso deve ser corrigido imediatamente e a feito de maneira inadvertida. Nesse caso, quanto menor o silên-
qualquer preço. Consideram o silêncio como uma quebra de cio, melhor, pois a confusão gerará menos confusão. Você terá
etiqueta, que precisa ser corrigida no momento. Com o tempo, de agir para aliviar a tensão, de modo adequado à situação e
os entrevistadores aprendem a diferenciar os silêncios, a apre- conforme seus critérios: ."O que lhe disse agora sobre você e
ciar e a reagir diante de cada um de maneira diferente. _ John parece ter deixado você confuso." Isso pode bastar, mas,
Existe, por exemplo, o silêncio de que o entrevistado preci- em caso contrário, pode-se acrescentar: "O que eu quis dizer foi
sa para ordenar seus pensamentos e sentimentos. O respeito a que ...." e, então, passar a reformular sua afirmação. É muito
esse silêncio é mais benéfico do que muitas palavras da parte provável que isso provoque uma resposta do entrevistado.
do entrevistador. Quando estiver preparado, o entrevistado con- Em situação completamente diferente, você pode perceber
tinuará, geralmente quase em seguida - em tomo de um minu- que o entrevistado - depois de ele ou de você terem situado o
to. Esse minuto, no início, parecerá muito longo, mas, com a assunto a ser discutido - pode estar confuso quanto ao que fazer
experiência, aprendemos a medir internamente o tempo. Caso o em seguida. Em geral, nesses casos, você pode ser útil, estrutu-
silêncio se prolongue, podemos desejar fazer uma rápida obser- rando um pouco a situação para ele: "Percebo que você não
vação para ajudar o entrevistado a prosseguir: alguns podem sabe o que dizer, nem exatamente por onde começar. Aqui você
perder-se no silêncio, e gostariam da indicação de uma saída pode dizer o que quiser e começar por onde desejar. Realmente
possível. Podemos dizer, por exemplo: "Deve haver muita coisa quero tentar compreender o que você pensa e como se sente em
acontecendo aí por dentro, e gostaria de saber se você está relação a essa questão, e ajudá-lo, se puder."
Estágios _ _ _ _ __ 49
_:_4..8::.._ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda

O silêncio de resistência significa alguma coisa mais. O Inevitavelmente, às vezes entrevistador e entrevistado fala-
entrevistado pode guardar silêncio porque está resistindo ao rão ao mesmo tempo, e ambos então recuarão com pedidos de
que considera um interrogatório. Talvez esteja vendo em você desculpa e encorajamentos para que o outro continue. Isso pode
uma figura autoritária à qual é preciso opor-se ou evitar. Talvez ser embaraçoso, e um pouco de senso de humor pode ser de uti-
ainda não esteja preparado para revelar o que realmente está se lidade. É claro que parto do pressuposto de que estamos inte-
passando em sua mente. Talvez o entrevistador corisidere essa ressados em ouvir o entrevistado, e não acredito que precisa-
forma de silêncio como a mais difícil de lidar, porque ele pró- mos falar exatamente naquele momento. Podemos intercalar
prio tende a se sentir rejeitado, contestado e recusado. Em tais uma rápida observação: "Desculpe a interrupção; prossiga e eu
circunstâncias, cada um faz o que considera melhor, porém é falarei depois." Muitas vezes bastará apenas um sorriso, acom-
muito importante: (1) observar a situação claramente como ela panhado de um aceno de encorajamento. Ou: "Estava tentando
se apresenta e, (2) não responder como se estivesse sendo pes- imaginar o que você diria em seguida, e agora perdi a seqüên-
soalmente atacado. Mostrar ao entrevistado que podemos acei- cia. O que você estava dizendo?"
tar essa forma de resistência talvez seja uma maneira eficaz de Exemplos pessoais podem ser embaraçosos. Durante a en-
romper seu silêncio: "Seu silêncio não me incomoda, mas sinto trevista, aflora de vez em quando a tentação de usar um exem-
que de alguma forma você está ressentido comigo. Gostaria que plo ou experiência pessoal. Em cada circunstância, cabe a você
você me falasse sobre isso, para que possamos discuti-lo jun- decidir se cede ou não à tentação. Nem todos concordam comi-
tos." Ou talvez: "Não acredito que nenhum de nós dois esteja go, mas acredito que, por diversas razões, é melhor não ceder.
muito à vontade com esse silêncio. Posso esperar, mas, se existe Minha experiência e exemplo pessoal têm significado para
alguma coisa que você está sentindo, pode ser útil que você me mim . ão estou convencido de que o terão para o entrevistado.
diga o que é e que a examinemos juntos." Além disso, ele talvez hesite em manifestar o que sente hones-
Por fim, existem os silêncios breves, pausas curtas, durante tamente, com receio de ofender-me ao fazer comentários sobre
as quais o entrevistado pode simplesmente estar procurando meu exemplo. Por outro lado, ao apresentar minha própria ex-
mais idéias e sentimentos para expressar. Pode ocorrer também periência, posso sem intenção assustar o entrevistado. Ele pode
que esteja buscando uma maneira de expressá-los, ou, talvez,
pensar: "Talvez isso tenha funcionado para você; mas se eu
deseje primeiro esclarecer para si mesmo o que pensa e sente,
fo sse você, estaria onde você está agora, e não nesta confusão."
antes de continuar. Esse é o ponto em que com muita freqüência
Se ele for ca paz de expressar seu ressentimento, tanto melhor.
atrapalhamos seu caminho. Dizemos alguma coisa importante
Contudo, se negar a si mesmo essa liberdade de expressão, pode
ou não - e destruímos sua cadeia de pensamentos. Por essa ra-
parecer que aceitou o que eu disse, levando-me a acreditar que
zão é melhor não apressar, não interpretar um breve silêncio
como uma ordem celeste para agir, mas esperar um pouco e o ajudei , quando isso não ocorreu.
preparar-se para o que vier. Geralmente alguma coisa virá em Não quero dizer que a experiência dos outros não possa
seguida a esses rápidos "silêncios pensativos". Então, em vez beneficiar o entrevistado. Claro que pode. O que afirmo é que o
de atrapalhar, teremos ajudado o entrevistado a expressar uma confundo quando entro em cena com minha experiência e exem-
idéia com a qual estava lutando. Não devemos interrompê-lo, plos pessoais. Porém, se o entrevi stado os solicitar, a situação
nem levá-lo a sentir que aqui ele não pode se debater com suas muda, e posso optar pelo atendimento desse pedido. Mesmo as-
idéias e sentimentos sem ser logo cortado. sim, acredito que é de prudêpcia sublinhar minhas palavras com
_5_0_ __ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __ _ _ A entrevista de ajuda
Estágios - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - = -5=-
1

uma recomendação : "Isso funcionou para mim, mas não sei se


O segundo espectro aguarda apenas um coup de grâce. Seu
funcionará para você"; ou "Isso me ajudou, mas estou curioso
nome é: "Sei exatamente como você se sente." O entrevistado
para saber como será com você". Dessa forma, indico que ele é pensa: ''Não acredito. Como você pode 'saber' como me 'sinto'?
o centro da situação, e que não precisa copiar meu exemplo. Ele Mesmo que saiba, e daí? Não sente como eu sinto, ou jamais pen-
vai perceber que não vejo minha experiência ou exe)11plo como saria em dizer que sabe." Esse espectro é frio e distante. Se tiver
oferecendo necessariamente uma solução. uma mente, com certeza não tem coração e, portanto, fora com ele!
Uma maneira mais simples de abordar o problema é contar Se sinceramente sentimos com o entrevistado o que ele está
superficialmente experiências de outros através da generaliza- sentindo, se podemos fazer com que saiba por meio de nosso
ção e despersonalização . Por exemplo: "Conheci muitos estu- comportamento que estamos sentindo com ele, tão próximos
dei ntes que, quando enfrentaram uma situação semelhante, des- quanto podemos, e se somos capazes de demonstrar isso sem obs-
cobtiram que vale a pena ... Qual é sua opinião?" Ou: "Há pessoas truir seu caminho, não precisaremos dizer nada, porque ele logo
que costumam en frentar obstáculos dessa forma. Geralmente se saberá. Compreenderá que jamais saberemos exatamente como
sentem melhor quando conseguem ... O que você acha?" Resta ele se sente, mas, como outro ser humano, estamos fazendo o pos-
ainda o pe1igo de o entrevistado pensar que deve adotar a orienta- sível e demonstrando que estamos tentando. "Eu sei como você se
ção mencionada porque outros o fizeram e, em particular, porque sente" significa, na realidade, "Eu não sei como você se sente e
eu a mencionei - mas o risco é pequeno. não vou fazer nada para descobrir".
Uma outra tentativa de encorajamento que deve ser evitada Adiante discutiremos com mais detalhe as respostas e indi-
a qualquer custo é a seguinte: "Bem, você sabe que todo o mundo cações. No momento faremos apenas alguns comentários antes
de analisarmos o encerramento. É possível que tenha deixado a
tem que passar por isso, mais cedo ou mais tarde. Depois da
in1pressão de que, em minha opinião, o entrevistador nunca deve-
tempestade vem a bonança, e amanhã cedo você estará se sen-
ria liderar ou interrogar. O que acredito é que os entrevistadores
tindo bem melhor. Uma baa noite de sono sempre ajuda e,
indicam e questionam a ponto de darem ao entrevistado um papel
então, por que não experimenta?"
de subordinado. Naturalmente, às vezes é necessário conduzir e
Agora, mais do is espectros que pairam sobre o pano de perguntar; porém, quando exageramos, não estamos capacitando
fundo de uma entrevista típica, mas devem ser deixados de o entrevistado a se expressar tão integralmente quanto poderia.
lado . O primeiro é: "Se eu fosse você, faria o seguinte ..." A Alguns entrevistados precisam ser conduzidos, e gostam de ser
reação do entrevistado: "Simplesmente não acredito. Se você interrogados. Mas esses indivíduos provavelmente esperam que
fosse eu, se sentiria tão confuso e inseguro como eu, e sería- resolvamos seus problemas, em lugar de ajudá-los a atingir suas
mos dois sem saber o que fazer. Se você fosse eu, não diria próprias e mais significativas soluções. Quando tentamos isso,
isso. Se estivesse em meu lugar, não saberia o que fazer tanto nenhuma experiência de crescimento é dada ao entrevistado,
quanto eu. Mas se eu fosse você, nunca diria a ninguém 'Se eu visando ajudá-lo a enfrentar situações futuras.
fosse você, faria o seguinte .. .' " É muito melhor dizer direta-
mente: "Acho que sua melhor alternativa no momento é ..." Ou: Encerramento
"Acho que agora a melhor coisa que você pode fazer é ..." Pelo
. . O estágio três - encerramento - sob muitos aspectos se
menos isso soa smcero.
assemelha ao estágio um - o contato inicial - embora se efetue
::_5:.::2_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda
Estágio s - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -53
-

de maneira inversa. Agora precisamos moldar um final para o mos - que a entrevista está quase para terminar - , podemos agir
contato e a separação. Nem sempre o encerramento é fácil. O de acordo.
entrevistador iniciante, em particular, talvez não compreenda Há razões convincentes para que se evite introduzir ou dis-
como deixar o entrevistado perceber que o tempo está se esgo- cutir material novo na fase de encerramento. O que pode acon-
tando. Talvez receie fazer o entrevistado sentir-se mandado tecer se você permitir que isso ocorra? Como você precisa sair
embora. O próprio entrevistador talvez não esteja preparado para rapidamente, ou tem um compromisso logo depois, não estará
encerrar a sessão. Ambos podem encontrar dificuldade em se ouvindo tão atentamente quanto deveria o que o entrevistado
separar.
tem a dizer. Depois que perceber isso, ficará irritado com o
Muitas coisas devem ser ditas sobre a fase de encerramen- entrevistado por ter vindo, logo agora, depois de tanto tempo,
to da entrevista, mas acredito que haja dois fatores básicos: com novas e importantes idéias que deveria ter apresentado
mais cedo. Então você se sentará, debatendo-se intimamente,
1. Os dois participantes da entrevista devem ter consciên- enquanto ele continua falando. Esse estado de coisas é desagra-
cia do fato de que o encerramento está ocorrendo, e aceitar esse dável para ambos, e pode ser evitado com relativa facilidade.
fato, em particular o entrevistador.
2. Durante a fase de encerramento, nenhum material novo Etr. Sabe, Helen, estou muito satisfeito com a nossa conversa
deverá ser introduzido ou discutido de alguma forma; caso de hoje. Agora teremo de interromper porque tenho que
exista material novo, deve-se marcar outra entrevista para dis- tomar meu ônibus.
cuti-lo. Eto. Ainda não lhe contei o que papai disse quando veio me ver
na semana passada. Não sabia que ele vinlrn, e estava no
É responsabilidade do entrevistador lidar com esses dois meio de ..
fatores do modo mais eficaz que puder. A tarefa se toma mais Etr. Acho bom que queira falar sobre isso; mas se você conti-
fácil à medida que ele avalia progressivamente sua importância, nuar agora, não conseguirei ouvi-la bem porque estou preo-
e se sente à vontade diante dela. A menos que o entrevistado cupado em não perder meu ônibus - quem sabe quando virá
seja particularmente experiente ou sensível, nem sempre saberá o próximo? Então, por que não marcamos um novo encon-
tro para quinta-feira à mesma hora, e assim discutiremos o
quanto tempo resta à sua disposição, e você pode ajudá-lo indi-
assunto da forma como ambos queremos . Quinta está bem?
cando que o encerramento está próximo: "Bem, nosso tempo
Então, até lá.
está se esgotando. Há alguma coisa que você gostaria de acres-
centar antes de tentarmos verificar até onde chegamos?" Mui-
Você passou muito tempo se perguntando se Helen não iria
tas vezes você e ele terão realmente terminado, e você pode evi-
nunca fazer menção a seu pai; de fato , você estava mesmo espe-
tar muitos passos em falso e silêncios embaraçosos, dizendo:
rando que ela o fizess e. M as, quando ela por fim falou no pai,
"Estou sentindo que nenhum de nós tem algo de útil a acrescen-
você ficou indeciso entre o desejo de ouvi-la e a necessidade de
tar nesse momento." Ao sentir apoio e concordância, você con-
tomar aquele ônibus . Entretanto, sabendo que perder o ônibus
tinua: "Bem, então vamos ver..." Acho que nos sentimos melhor
poderia complicar o resto de seu dia, e suspeitando que poderia
com esse tipo de estruturação simples. Sabendo agora, defini-
vir a sentir que Helen era a culpada, você decidiu que era prefe-
tivamente, o que antes temíamos, antecipávamos ou supúnha-
rível parar e triarcar um novo encontro.
_5_4_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __ _ _ _ _ A entrevista deaju<4J Estágios _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __ 55

Encerrar uma entrevista, mesmo quando um novo material entrevistado e do entrevistador. Às vezes, as cortesias habituais
é introduzido em seu final, é bem mais fácil quando os dois serão suficientes para levar a entrevista ao seu final. Nessas cir-
lados sabem que um outro encontro está programado. cunstâncias, a seguinte observação de encerramento poderá
servir: "Creio que é isso; sabemos como entrar em contato um
Etr. Nosso tempo por hoje está quase esgotado, Sra. Keen. com o outro se houver necessidade de discutir mais alguma coi-
Eto. E o acampamento para Betty nesse verão? sa" ; ou: "Obrigado por ter vindo. Acho que esse nosso encontr.o
Etr. Não imaginei que estivesse pensando nisso. Não temos con- foi muito frutífero para ambos". Não estou pretendendo sugenr
dições de discutir o assunto agora, mas, se quiser, podemos fórmulas, mas quero sublinhar o fato de que as afirmações de
começar por aí na próxuna semana. encerramento devem ser curtas e diretas. Quando não temos
mais nada a acrescentar, quanto mais falarmos , menos signifi-
Você não sabe por que a mãe de Betty esperou até o último cativo será, e mais longo e difícil o encerramento.
momento para colocar o assunto do acampamento. Talvez nem Às vezes, em um encerramento, você pode querer refe-
ela mesma saiba. Talvez tenha feito isso por não estar preparada rir-se ao assunto discutido antes na entrevista com uma declara-
mais cedo, ou por medo de discuti-lo, e esperasse que você o ção conclusiva, uma reafirmação efetiva d~quil,? er:i que ambos
fizesse por ela; ou talvez quisesse que você ficasse mais um concordaram. O orientador escolar pode dizer: Sei agora como
pouco junto a ela. Você poderia continuar com especulações. Po- você se sente quanto aos planos universitários de Bill. Quando
deria escolher entre fazê-las mentalmente ou por escrito, mas sabe
ele vier me ver estaremos preparados para levar em conta suas
que não pode prosseguir com isso agora. Tanto a mãe de Betty
restrições . Vocês dois poderão partir desse ponto, como você
como você compreendem que a entrevista chegou ao final.
sugeriu." O médico pode dizer a se~ pacien~e:A "A.gora que j_á
Não estou sugerindo que devamos ser inflexíveis e traba-
decidimos sobre a operação, tomarei as providencias necessa-
lhar mecanicamente, com um olho no relógio. Porém estou
rias. Então, como combinamos, você entrará em contato com o
convencido de que a entrevista é mais útil quando tem um tem-
hospital." Ou o funcionário de recrutamento do ~~partamento
po limitado, e quando ambos aceitam e trabalham dentro dessa
de seleção poderá concluir: "Certo. Então vou venficar as al~er­
estrutu ra de tempo. A aceitação do fator tempo é importante es-
nativas que discutimos. A não ser que eu venha a chama-lo
pecialment e mm1a série de eritrevistas . É de grande auxílio re-
antes, verei você na próxima terça-feira."
conhecer que o fato de estarmos juntos é uma situação delimi-
tada e que, além di sso, somos pessoas com obrigações profis- Ocasionalmente, um resumo final mais explícito é neces-
sionais e particulares que precisam ser respeitadas. O encerra- sário para verificar se você e o entrevistado se entendera~ : "An-
mento das entrevistas únicas é mais dificil de ser realizado. Mas, tes de você ir embora, quero ter certeza de que o entendi corre-
se em algum ponto no decorrer do processo, verificamos quan- tamente. Você não pode voltar ao trabalho por enquanto por
to tempo aproximadamente ainda temos disponível, e se puder- causa do bebê. Você acha que John poderia, no outono, passar
mos iniciar o encerramento com bastante antecedência, dando para uma escola notuma, e trabalhar d~rante o di:. Até. então,
tempo suficiente para reunir as coisas, o encerramento deverá sua família continuará ajudando. Gostana que voce me dissesse
ser relativamente fácil. se esqueci alguma coisa, ou se não entendi bem." .
Estilos de encerramento. Há muitos estilos de encerramen- Uma abordagem um pouco diferente é pedir ao entrevista-
to, e a escolha de um deles dependerá da própria entrevista, do do que coloque como compreendeu o que houve durante a en-
6_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda
.:5..:.
Estágios _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __57

trevista: "Tivemos um bom papo, Jack, e estou curioso para sa-


ber o que você está levando daqui . Não tem sido fácil para você sarmos, já que poderia criar a impressão de que estamos rejei-
tando o entrevistado. O que quer que fique para o fim - passos
falar, eu sei, e não estou certo de ter compreendido tudo o que
de revisão a serem dados, ou resumo das questões - deveria ser
tentou expressar. Assim, se puder fazer uma espécie de resumo
analisado sem pressa e, prcferivelmente, como uma tarefa con-
em voz alta, isso poderia ajudar a nós dois. Se eu quiser acres-
centar alguma coisa, eu o farei." · junta. Com paciência, prática, atenção e reíl~~ão, cada~ pode
desenvolver um estilo que o satisfaça e fac1hte a entrevista de
Às vezes, durante um encerramento, desejamos indicar
ajuda.
assuntos que foram mencionados, porém não discutidos por
falta de tempo: "Aí está a campainha, e nem mesmo chegamos
,. a falar sobre o francês, ou sobre seu trabalho escrito. Podemos
fazer isso da próxima vez, se você quiser. Você sabe meu horá-
"li rio; quando gostaria de voltar?"
•'
li
1: Finalmente, quando durante a entrevista foram feitos pla-
:! nos definidos, pode ser bom recapitulá-los rapidamente durante
i• o encerramento, sobretudo quando o entrevistador e o entrevis-
lf
i! tado têm tarefas diferentes a cumprir. Esse é um tipo de feed-
back recíproco para verificar se ambos entenderam o que têm
que fazer. "Agora, vejamos. Você concordou em falar com sua
mãe sobre a autorização e sobre desligar a televisão lá pelas dez
da noite. Vou falar com a Srta. Barret sobre sua mudança de
lugar. Há algo mais a acrescentar ou corrigir?" Da mesma
forma, umfeedback mútuo ocorre quando o entrevistador situa
primeiro sua parte na tarefa a ser executada, encorajando assim
o entrevistado a situar a sua: "Suponho que por hoje isso é tudo.
Tomamos muitas decisões. Da maneira como entendi, vou veri-
ficar a possibilidade de cursos noturnos de eletrônica, e averi-
guar sobre uma bolsa de estudos. E você, quais são as coisas
que irá verificar antes de nosso próximo encontro?"
O encerramento é especialmente importante porque o que
ocorre durante esse último estágio tende a determinar a impres-
são do entrevistado sobre a entrevista como um todo . Precisa-
mos estar certos de que demos a ele total oportunidade de se
expressar, ou, alternadamente, precisamos criar um tempo con-
veniente para ambos com esse propósito. Devemos permitir um
tempo suficiente para o encerramento, de modo a não o apres-
3. Filosofia

1
'"
1i
"

li
;: Todo profissional comprometido com a entrevista de ajuda
:~
tem para si uma filosofia que orienta suas ações. Não impo1ta
se tem ou não consciência dela, se pode ou não verbalizá-la:
essa filosofia determina o que ele faz ou deixa de fazer, e de
que modo se desincumbe de sua tarefa. Em termos de sua filo -
sofia, ele determina seu próprio papel na entrevista e, dessa
maneira, em grande parte o do entrevistado. Suas atitudes na
entrevista, que podem ser explícitas ou implícitas, expressas ou
não, constituem sua filosofia em relação à ajuda e à entrevista.
Se não estiver consciente de possuir uma filosofia, ou se não
puder enunciá-la, um exame de seu comportamento durante a
entrevista de ajuda revelará qual é su~ filosofia. Qualquer pes-
soa profundamente interessada em seu trabalho desejará desco-
brir a filosofia segundo a qual trabalha. Tomando consciência
de como se comporta, pode decidir se quer agir assim, ou se
gostaria de comportar-se diferentemente - para expressar uma
filosofia diferente da atual.

Minha abordagem pessoal

A filosofia que mantenho está ligada intimamente à minha


atuação na entrevista de ajuda e caracteriza, certamente, tudo
. 6_
.:_ 0 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda 61
Filosofia - -- - - -- - ·

que escrevi até aqui e ainda escreverei neste livro. Não estou riências informações úteis - cognitivas ou emocionais: novos
tentando provar que minha filosofia está certa ou errada, se é fatos ou sentimentos e atitudes mai s realistas, ou tudo isso ao
boa ou má; também não posso determinar que importância terá mesmo tempo.
para você. De qualquer modo, creio que devo tentar situá-la Nesse momento ficou claro que o entrevistado precisa de
para que você a conheça e seja estimulado a aprender qual é a nós, e que talvez precisemos ser necessários. Comprometidos
sua filosofia. Em outras palavras, apresentarei a millha não por-
com profissões que visam ao aperfeiçoamento da condição hu-
que você tenha obrigação de conhecê-la, mas principalmente
mana, obviamente precisamos sentir que precisam de nós, e
porque quero encorajá-lo a pensar mais profundamente na sua
devemos estar sempre conscientes disso para não impormos
própria. Tal introspecção, por sua vez, poderá capacitá-lo a de-
nossa ajuda ao entrevistado que não precisa mais de nós. Deve-
finir sua filosofia, e mesmo a alterá-la, agora ou no futuro, se
mos nos questionar constantemente sobre até que ponto temos
julgar necessário.
necessidade de controlar sua vida, dizer-lhe o qu e fazer e como
Na melhor das hipóteses, a entrevista de ajuda irá propor-
fazê-lo; até que ponto podemos tolerar suas divergências co-
cionar ao entrevistado uma experiência significativa, levando-o
nosco; e até que ponto podemos encorajá-lo a encontrar seu
à mudança. A experiência é o relacionamento com você: mu-
próprio caminho, e não aquele que traçamos, e torná-lo auto-sufi-
dança é o que resulta do relacionamento, mudança nas idéias,
ciente, independente de nós, o mais cedo possível. Parece-me
nos sentimentos em relação a si mesmo e aos outros, alteração
que a terapia de ajuda pode ter lugar em três áreas principais:
na informação que possui sobre um tópico importante para ele
- uma mudança nele próprio, como pessoa. A mudança tam- informação e recursos, · autoconsciência e consciência dos ou-
tros e crescimento pessoal.
bém é possível para o entrevistador, na medida em que participe
integralmente do processo da entrevista - mas, em princípio,
visa ao entrevistado. E isso ocorre em conseqüência do relacio-
namento com você na entrevista de ajuda: alguma coisa pode se Como estimular a mudança
alterar no entrevistado. Aqui surgem duas questões básicas:
Acredito que podemos ajudar melhor o entrevistado a aju-
1. Qual o tipo de mudança que desejamos provocar? dar-se através de um comportamento que crie uma atmosfera de
2. Qual é a melhor maneira de obtê-la? confiança, na qual ele se sinta int eg ralmente respeitado. Pode-
mos ajudá-lo melhor através de um comportamento que de-
monstre que o consideramos responsável por si próprio, por suas
Tipo de mudança desejado ações, pensamentos e sentimentos, e que acreditamos em sua
capacidade de usar cada vez mais seus próprios recursos. Em tal
A mudança que desejamos ajudar a promover é basica- clima, ele pode defrontar-se mais consigo mesmo e com seus
mente aquela que o entrevistado será capaz de construir - que pensamentos e sentimentos que governam seu comportamento,
seja significativa para ele e lhe permita agir no futuro com mais
mas que ele oculta, distorce ou nega para si próprio e para nós.
êxito como pessoa. A mudança em que estamos interessados Fornecemos informação, quando necessário; mas percebendo
implica aprendizagem. O entrevistado deverá tirar dessas expe-
que isso partiu de nós, queremos saber como ele a entendeu .
_6_2_ _ _ __ _ _ _ _ __ _ _ _ _ __ _ A entrevista de ajuda
Filosofia - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
63

Oferecemos os recursos à nossa disposição e discutimos seu


tempo ele é ativo, ao mostrar-se como pessoa profundamente
beneficio potencial para ele, mas acreditamos que a decisão
envolvida com outra pessoa.
quanto à sua aplicabilidade cabe a ele. Agimos no sentido de
O entrevistador é e age como urna pessoa autêntica. Ele
ajudá-lo a tomar-se cada vez mais consciente de si mesmo, de
não abdica de sua autoridade, mas a emprega de modo que o en-
seu espaço vital, de sua própria estrutura de referência. Que-
trevistado venha a ser a autoridade em sua própria vida. O entre-
remos ajudá- lo a aprender que a mudança é possível, mas que
vistador se vale de sua autoridade para colocar o entrevistado
cabe a ele decidir quando e como mudar.
no centro do palco, e para mantê-lo ali. Contribui com sua pes-
Comportamo-nos da maneira que provará ser menos amea- soa e com seu conhecimento profissional para ajudar o entre-
çadora para ele, a fim de que possa explorar profundamente a si vistado, e não simplesmente para exibir sua sabedoria ou suas
mesmo, explorar suas relações com os outros e destes com ele. esplêndidas qualidades pessoais. Mantém sua autoridade de
"'"· Sentimos nitidamente que aprender a mudar dessa maneira é
11:
modo que o entrevistado possa chegar a confiar em si mesmo
"' bom, e toma mais fácil o caminho para nova aprendizagem e
"· para encontrar seu próprio caminho e direção. O entrevistador
"'.:1 mudança. Não lhe dizemos o que pensar ou como sentir; mas revela o que ele próprio entende e vê, aquilo que imagina que o
li
~1 nosso comportamento revela que valorizamos nossos próprios entrevistado está pensando e sentindo, para desse modo ajudá-lo
pensamentos e sentimentos, e também os dele. Indica que quan- a olhar mais profundamente e tentar com mais afinco atingir
to mais ele puder descobrir sobre seus próprios sentimentos e seu próprio eu - e não para impor suas interpretações ao entre-
pensamentos, mais capacitado estará para agir sobre eles ou mo- vistado, para dizer-lhe como deve pensar, sentir e comportar-se.
dificá-los, caso se decida por isso. Desejamos ajudá-lo a aproxi- O entrevistador se coloca inteiramente à disposição do entrevis-
mar-se de si mesmo e, assim, também dos outros. Sendo aceito tado na busca de soluções para este último, na busca de manei-
como urna pessoa responsável, ele pode aprender a ver-se como ras de mudar e ir em frente. Cria uma atmosfera em que o entre-
tal e a apreciar a aplicação dessa nova aprendizagem. Depois de vistado tem um interesse genuíno no conhecimento do entrevis-
encerradas as entrevistas, ele poderá continuar a crescer. tador, porque sabe que o outro não quer impor-se a ele. Em sua
luta, o entrevistado descobre a importância das reações do
Desempenho de um papel ativo e vital entrevistador aos seus pensamentos, sentimentos e comporta-
De modo algum vejo o entrevistador como elemento passi- mentos.
vo. Ao contrário, vejo-o, durante todo o tempo, como ativo. Não O entrevistador não quer que o entrevistado dependa dele,
estou pressupondo que deva falar muito, mas sim que tome sua mas que· se apóie cada vez mais em si mesmo. Não recusa sua
presença e interesses continuamente sentidos. O entrevistador é autoridade, mas a usa para entender e ser entendido, e para for-
ativo ao lograr um entendimento tão profundo quanto possível necer informações e recursos de que dispõe. Por outro lado,
do mundo do entrevistado, ao encorajá-lo a descobrir como é não se oculta atrás de sua autoridade para tomar decisões em
esse mundo e como se sente nele. O entrevistador é ativo em nome do entrevistado, ou fazer qualquer coisa que o entrevis-
seu interesse e participação na busca do entrevistado visando a tado não possa entender ou aceitar. Embora aja sob sua própria
responsabilidade, ele não tira a responsabilidade do entrevista-
mudanças significativas. O entrevistador é ativo ao dar de si
do. Quando não se sente muito seguro, ele o admite; quando
mesmo quando sente que isso é útil e adequado. Durante todo o
está seguro, sabe que a segurança é sua, e não do entrevistado,
r
1 _6_4_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Filosofia _ _ _ _ _ __ ---- 65

que precisa descobrir seus próprios pontos de apoio, para er- Em outros termos, só posso chegar até ele se ele quiser e
guer-se com firmeza. permitir, se ele quiser e permitir o acesso a si mesmo; somente
Está muito em moda hoje em dia "ajudar outra pessoa a se se ele for capaz de aproximar-se de si mesmo ele permitirá que
ajudar", mas receio que freqüentemente isso não passe de uma outros o façam. Não há dúvida de que o entrevistador pode aju-
racionalização para explicar tudo o que, como entrevistadores, dar nesse processo, mas dependerá sempre do entrevistado efe-
fazemos. Aceita-se geralmente hoje em dia esse objetivo no tivá-lo ou não, ousar ou recusar-se a isso. Estou certo de que
nível cognitivo, mas nem todos mantemos necessariamente podemos ajudar em quase tudo, mas respeitando integralmente
conceitos idênticos quando nos referimos à entrevista de ajuda. o entrevistado e seu mundo, mostrando a ele que o fazemos, e
Desse modo, é necessário explicar detalhadamente o que estou não apenas com palavras, mas por nosso comportamento.
pensando quando emprego essas palavras. Quero dizer algo Ao experimentar nossa atitude, o entrevistado terá mais
muito preciso, de modo que você possa decidir o que pensa e consciência de si mesmo e, eventualmente, de nós. Sentindo-se
respeitado, será capaz de respeitar nossa possível contribuição.
sente a respeito do meu ponto de vista. Minha filosofia não é
Talvez não a aceite; mas, mesmo rejeitando-a, estará mais perto
nova; e para alguns poderá parecer até um pouco gasta. Mesmo
daquilo que lhe parecerá direito - uma decisão, sua decisão,
assim, creio que é válida e operacionalmente sólida.
ainda que alcançada por nossa mediação .
Para ir direto ao assunto, o que é que nós, entrevistadores,
Uma ilustração. Consciente dos riscos implicados, vou me
trazemos realmente à entrevista de ajuda? Essencialmente, tra- permitir ser pessoal. Em nossa cultura, talvez ironicamente,
zemos nosso conhecimento, experiência, habilidade profissio- consideramos a vida do indivíduo como sagrada. Há algum
nal, as informações que possuímos e os recursos à nossa disposi- tempo, recebi um S.O.S . para ir ao hospital "ajudar" um jovem
ção. Além disso, trazemos a nós mesmos: nosso desejo de ser- que insistia em se suicidar. Ele ficara cego recentemente e sen-
mos úteis, nosso calor e estima em relação ao próximo, nosso tia, segundo me informaram os médicos, que a solução era a
background, nossos preconceitos e defeitos, nosso próprio espa- morte. No hospital, conversamos - ou melhor, eu falei , pois o
ço vital e nossa própria estrutura interna de referência. (Como se jovem se recusava terminantemente a fazê-lo. Repeti o que
lembram, expus tudo isso no Capítulo 1.) Em termos ideais, isso haviam me contado, e ele confirmou sua intenção. Então dis-
é o bastante; portanto, suponho, conseguimos ajudar os outros de se-lhe por que eu estava ali. Esqueci quais foram exatamente as
maneira satisfatória dispondo desse arsenal, e nos esforçando. palavras, mas lembro-me de minha atitude. Eu fora chamado
Agora, o que significa isso para o entrevistado? Francamente para persuadi-lo a viver; no entanto, o objetivo de minha visita
nada - nada a menos que ele nos perceba e perceba também nos- não era realmente esse, pois sentia que não tinha nem o direito,
sos conhecimentos e atitudes, a não ser que tudo o que somos e nem o poder para fazê-lo. A decisão era dele. Eu fora para in-
'i representamos não caia em ouvidos surdos, olhos cegos e emo-
ções congeladas. Só quando ajudamos o entrevistado a ouvir,
formá-lo que, caso ele se decidisse em favor da vida, eu estava
preparado para trabalhar com ele, com tudo o que pudesse, para
ver, pensar e sentir, ele será capaz de nos perceber - depois de que sua vida viesse a se tomar tão plena e compensadora quan-
ter percebido a si próprio e, talvez, depois de ter percebido que to possível.
nós o percebemos. Tenho certeza de que ele só poderá nos res- O caso acabou se transformando em uma daquelas histó-
ponder depois de ter aprendido a responder a si próprio. rias de sucesso que encontramos ocasionalmente. O êxito foi
66
- - - -- - -- - - -- - -- - - - - A entrevista de ajuda Filosofia _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _6_ 7_

dele, embora o respeito por ele e por seu mundo fossem meus.
valoriza. Pelo contrário, trata-se da atitude segundo a qual o
Se ele houvesse decidido diferentemente, espero que teria podi-
entrevistado tem tanto direito quanto eu a idéias, sentimentos e
do respeitá-lo do mesmo modo; porém, como está claro agora,
valores próprios; é querer fazer o máximo possível para enten-
ele teria perdido muito.
der o espaço vital do entrevistado em tem1os de suas idéias,
sentimentos e valores, e não conforme as minhas. É difícil man-
Demonstração de respeito
ter tal atitude, e mais ainda comunicá-la ao entrevistado. Às
O respeito pelo entrevistado e por seu universo implica um vezes pode ser malcompreendida, e interpretada como anuên-
interesse sincero por ambos. Demonstramos esse interesse pela cia, consentimento ou confirmação. Mesmo assim, não resta
maneira como lhe damos atenção, excluindo cuidadosamente outra escolha senão tentar. De outra maneira, o entrevistado
sempre que possível, interferências externas enquanto estamos' suspeitará que o estamos julgando, pedindo que pense e sinta
ali com ele e para ele, e ao mostrar que o que é importante para como nós ou, pior ainda, que sinta e pense como acreditamos
ele, também o é para nós. Quando sentimos que precisamos de que deveria estar pensando e sentindo .
mais informação ou detalhes, não devemos pressioná-lo ime- Quando aceito uma idéia ou sentimento, estou dizendo ao
diatamente, caso daí possa resultar ruptura ou destruição do entrevistado mais ou menos o seguinte: "Estou ouvindo você",
fluxo de expressão do entrevistado. Se o fizermos, ele poderá ou "Então é assim que você vê a coisa". Procuro mostrar-lhe o
pensar que estamos interessados naquilo que nos parece mais que ele me mostrou, para que, assim, ele possa examiná-lo,
,,,
"' importante, e não naquilo que para ele é mais significativo, e tomar consciência, refletir - fazer o que bem entender - mas,
'I
que deve adequar seu interesse ao nosso. Uma linha tênue sepa- basicamente, para que o feedback lhe permita verificar se está
ra o interesse da curiosidade. É algo intangível, mas sei que expressando seu verdadeiro eu, ou um eu que deseja emendar,
existe; e penso que todos percebemos que a maioria dos entre- rejeitar ou modificar. Em outras palavras, tento fornecer ao
vistados aprecia o primeiro, e se ressente com a outra. Perce- entrevistado um feedback que não seja distorcido pela minha
bem rapidamente que, quando estamos interessados, é em seu própria pessoa e personalidade. Reenvio ao emissor a comuni-
favor, e que quando o incitamos ou agimos por curiosidade, é cação que me transmitiu. Quanto menos ruído houver na devo-
em nosso próprio interesse. lução, mais eu a aceitei. Nada há de mim mesmo nesse proces-
so, exceto a maneira como recebi a mensagem e a transmiti de
Aceitação do entrevistado volta. Sou um ouvinte fiel, um observador e informante fide-
digno. O que devolvo ao entrevistado são "fatos" que ele enun-
Todos refletimos bastante sobre o importante conceito de ciou. Eles podem ser altamente emocionais ou intelectuais;
aceitação, e o papel que ele tem na entrevista de ajuda. Acei- podem ser claros ou não para mim; podem me parecer "bons"
tação significa tantas coisas diversas para tantas pessoas dife- ou "maus" - ou mesmo incompreensíveis. Relato o que recebi.
rentes que julgo necessário explicar o que significa para mim.
Trato o que ele me disse com respeito, e trato-o como um igual,
Basicamente, para mim aceitação significa tratar o entrevistado valendo tanto quanto eu.
como um igual, e con, iderar seus pensamentos e sentimentos Quando Bill exclama: "Meu professor de matemática é um
com sincero respeito. Isso não quer dizer concordância; nem perfeito bobo", aceito isso, mostrando-lhe a opinião desfavorá-
pensar ou sentir como ele; não significa valorizar o que ele vel que tem de seu professor, para que faça o que quiser com
_6_8_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda 69
Filosofia - - - - - - - - --- - - - - - - - - - - - -

essa informação. Bill pode repeti-la, modificá-la, ampliá-la, obviamente, é impossível quando existe uma forte antipatia .
etc. Talvez seja verdade que posso aceitar mais prontamente o Em minha opinião, não podemos ajudar verdadeiramente uma
que Bill me disse se minha própria opinião coincide com a dele, pessoa que não podemos aceitar. Nessa situação, o único cami-
e menos se for contrária; mas isso apenas demonstra como é nho possível é não iludir o entTevistado nem a nós mesmos, mas
realmente complicado e dificil o ato de aceitar..Obviamente ajudá-lo a encontrar alguém que o aceite. Isso não é um fracas-
posso ir além da simples aceitação. Posso concordar com Bill, so. Pelo contrário, se tentamos honestamente aceitá-lo, mas não
ou discordar dele. Aceitando como ele se sente, posso conside- conseguimos, não há alternativa melhor.
rar necessário dizer-lhe como eu me sinto. Posso recompen- A incapacidade de aceitar alguém pode ocorrer mesmo
sá-lo ou puni-lo, mas se quiser aceitar seus sentimentos sobre o que não existam diferenças Cll I t ura is. Pode existir o que é co-
professor de matemática, tudo o que posso fazer é fornecer-lhe nhecido como choque de personalidade. Também aqui o me-
" o feedback, e através do meu comportamento deixar claro que o
"'
1:1
,,1 lhor é permitir que entendamos o que está ocorrendo, para que
... entendi.
"I possamos liberar o entrevistado e a nós mesmos de uma situa-
!11
Quando a Sra. L. diz que o apartamento, o qual você teve ção desconfortável e sem objetivo. Para resumir, na entrevista
11
r. tantas dificuldades para encontrar, "não passa de um velho corti-
de ajuda devemos ser capazes de aceitar a nós mesmos - nossas
ço'', você pode se sentir ofendido e querer reagir à altura. En-
idéias e sentimentos também- e de agir de acordo. Nossa esca-
tretanto, se você aceita a Sra. L. e seus sentimentos a respeito do
la de aceitação pode ou não aumentar com o tempo, mas só
apartamento, tudo o que pode dizer é mais ou menos o seguinte:
podemos ajudar quando podemos aceitar.
"Acho que a senhora não deu importância ao apartamento." Isso
é aceitar os sentimentos do entrevistado. Se você está ressentido
Compreensão
com ela, por causa das dificuldades que teve, então não a está
aceitando. Não estou insistindo no fato de que você devia acei- A certeza de que foi compreendido é de fato um aspecto
tá-la: estou apenas salientando que você não está. Você pode importante da experiência significativa que o entrevistado levará
mesmo perceber-se dizendo: "Bem, entendo que não tenha dado consigo da entrevista de ajuda, se o relacionamento entre ele e o
importância a esse lugar. Tentei muito encontrar um, e isso foi o entrevistador for positivo. É essencial para o processo de entrevis-
melhor que consegui. Estou um pouco magoado, mas não signi- ta que o entrevistado seja compreendido, mas existem diversas
fica que estou criticando a senhora pelos seus sentimentos. Bem maneiras de compreensão, e algumas ajudam mais que outras.
sei que não tentou tudo o que tentei para encontrar esse aparta- Três formas de compreensão. Através dos séculos, grandes
mento." Em outras palavras, podemos ser capazes de aceitar escritores demonstraram - e mais recentemente muitos psicólo-
idéias e sentimentos das outras pessoas, mas não as pessoas em gos salientaram - que há três modos alternativos de uma pessoa
si; e às vezes podemos verbalizar isso. compreender outra. Um deles é saber "sobre" ela. Leio sobre
Um outro aspecto da aceitação é a habilidade em tratar com ela, ouço outros falarem dela , participo da discussão sobre ela
respeitosa igualdade alguém de outra cultura, raça, cor ou fé. em reuniões de equipe - cu sei a respeito del a. Compreendo-a,
Nesse caso, nossas lentes podem distorcer ofeedback, e a natu- por assim dizer, através dos olhos dos outros, e não atravé s dos
reza da distorção vai depender do tipo de lentes que emprega- meus ou dos seus. Trata-se de uma compreensão remota, dis-
mos. A aceitação não exige que se goste muito de alguém, mas, tante da própria pessoa.
_7_0_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda 71
Filosofia - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

Tomemos dois exem plos simples: sei que Louis só fala mente não podemos fazê-lo de outra maneira, e o melhor é ter-
francês. E então, quando o encontro, dirijo-me a ele em seu mos consciência de que é isso que estamos fazendo. Permi-
idioma, e conversamos. Assim, soube antecipadamente algo so- tam-me dar uns poucos exemplos para esclarecer: "Eu não o
bre ele, agi de acordo e funcionou. Mas nunca é tão simples compreendo. Está tão quente aqui, e mesmo assim você se
assim. A partir do relatório que me foi entregue, se~ que Carol é queixa que está frio." Isso é simples e óbvio. Não posso enten-
uma estudante fraca, e que talvez tenha problemas. Quando a der que você esteja com frio, quando eu estou com calor. Na-
entrevisto, gradualmente percebo que ela ouve muito mal, tem
turalmente, a inferência é que há algo errado com você. "Eu o
vergonha disso, e tenta desesperadamente ocultar o fato. Isso
compreendo perfeitamente. Se estivesse em seu lugar, teria
não foi difícil de descobrir, mas simplesmente implicou desistir
agido da mesma forma." Esse exemplo também é claro, mas
da tentativa de saber a respeito de Carol e começar a compreen-
dê-la. comparemos com o seguinte: "Eu não o compreendo. Em seu
lugar, teria feito o oposto, e lhe asseguro .. ."
Esse método é menos distante, e está um passo mais próxi-
mo da própria Carol. Talvez existam algumas emoções humanas universais, mas
A segunda maneira de se compreender uma pessoa, por- tendemos a compreender apenas em tennos de nós mesmos a
tanto, é compreendê-la, não através dos olhos dos outros, mas pessoa que as expressa. Entendo sua expressão de contentamen-
através dos nossos. Como esse é o método pelo qual compreen- to ou tristeza, se for compatível com a alegria ou tristeza que já
demos mais freqüentemente os outros, vamos examiná-lo mais experimentei, conheci ou posso imaginar. De outro modo, não
detidamente. Quando eu compreendo você, ou falho nessa ten- posso compreender, e é muito provável que o considere "erra-
tativa, emprego recursos que estão à minha disposição: minha do", "estranho" ou "absurdo". Posso compreender o sofrimento
aparelhagem de percepção, meu pensamento, meus sentimen- do Sr. A. pela perda de sua mão direita. Não posso compreender
tos, meu conhecimento, minhas habilidades. Eu compreendo a dor que o Sr. B. expressa pela perda de parte do dedo mínimo
você ou não em meus termos, conforme meu espaço vital, esquerdo. Entendo Johnny C., que gosta da escola, mas não
minha estrutura interna de referência. Se não falamos a mesma posso por mim mesmo compreender Johnny D., que a odeia.
linguagem - apesar de ambos falarm os a mesma língua - não Posso compreender o fato de se tomar uma bebida alcoólica de
poderei de modo algum compreendê-lo. Se estou sofrendo de vez em quando. Posso mesmo compreender o Sr. E., que gasta
indigestão, compreenderei você de maneira diferente daquela parte de seu cheque de seguro de aposentadoria em bebida. Mas
que o faria se a pessoa que amo tivesse acabado de concordar simplesmente não consigo compreender o Sr. F., que gasta todo
em casar-se comigo. E, é claro, o mesmo ocorre a você em seus o seu salário mensal no bar, em uma semana, bate em sua mulher
esforços para compreender-me, exceto que para você ainda é e me culpa por não ter dinheiro!
mais difícil. Você veio me procurar buscando ajuda; e, portan- Se não compreendemos uma outra pessoa, talvez queira-
to, além de tudo o mais, você tem em mente o motivo pelo qual mos descobrir o que está gerando o obstáculo. Com o tempo,
ve10 me ver. podemos aceitar a falta de comunicação como inevitável em
Em resumo, quando eu compreendo você, ou deixo de fa- determinadas circunstâncias. Então, no mínimo, podemos ten-
zê-lo, é em meus termos, conforme meus conhecimentos, mi- tar enfrentar o que não estamos compreendendo. Embora a bar-
nha experiência, minha imaginação. Suponho que freqüente- reira não seja removida, tampouco será reforçada.
.:_7::_2_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda 73
Filosofia _ _ _ __

A terceira maneira de compreender outra pessoa é a mais


sas estão sendo ditas, o tom usado, as expressões, os gestos em-
significativa, embora simultaneamente a mais dificil. Trata-se
pregados. E mais, ouvir inclui o esforço de perceber o que não
de compreender com a outra pessoa, como Rogers (1961, cap.
está sendo dito, o que apenas é sugerido, o que está oculto, o
17) tão bem o situou. É necessário deixar tudo de lado, menos
que está abaixo ou acima da superfície. Ouvimos com nos~o s
nosso senso comum de humanidade, e somente com ele tentar
ouvidos, mas escutamos também com nossos olhos, coraçao,
compreender com a outra pessoa como ela pensa, 'sente e vê o
mente e vísceras.
mundo ao seu redor. Significa nos livrarmos de nossa estrutura
Nosso objetivo é ouvir com compreensão. Isso precisa ser
interna de referência, e adotar a do outro. A questão não é dis-
aprendido e praticado. Devemos nos familiarizar com esse ins-
cordar ou concordar com ele, mas compreender o que é ser com
trumento, ver como funciona para que possamos utilizá-lo o
ele. Aparentemente é simples, mas, na realidade, muito dificil
melhor possível. Devemos compreender o que há de implica-
de se realizar.
ção para nós no ato de ouvir, antes de sermos capazes de ouvir
Todos os médicos consultados foram unânimes em afirmar
com compreensão. Um teste simples nos mostrará se estamos
que o Sr. Crane precisa de uma cirurgia cardíaca. Concordaram
aprendendo a ouvir. Tem funcionado comigo, e também com
tratar-se de uma intervenção simples, realizada com freqüência e
alguns de meus alunos. O teste é o seguinte: se durante a entre-
com uma alta porcentagem de sucesso. Posso saber alguma coisa
vista de ajuda você puder dizer com suas próprias palavras o
sobre doenças do coração; posso mesmo já ter sido operado. Mas
que o entrevistado disse, e dizer a ele com suas palavras os sen-
ali estava o Sr. Crane, teimosamente recusando-se a pensar na
timentos que ele expressou e, então, ele aceitar tudo isso como
operação. Quero compreender com ele o que se passa em seu
emanando del e, existe uma grande possibilidade de que você o
interior, e farei todo o possível para compreender, com o Sr.
tenha ouvido e compreendido.
Crane, o que significa a operação para ele, o que está por detrás
À medida que aprendemos mais e mais a escutar com com-
de sua teimosa oposição. Quero compartilhar com ele sua forte
preensão os outros, mais aprendemos a escutar com compreen-
resistência ao que é, segundo os médicos, uma coisa simples.
são a nós próprios. O resultado é que, eventualmente, seremos
Talvez eu não tenha sucesso, mas quero tentar tudo o que estiver
capazes de ouvir o entrevistado e nós mesmos simultaneamen-
ao meu alcance. Talvez ele fale de seus temores profundos. Se o
te, sem que um se coloque no caminho do outro . E depois,
fizer, nós dois poderemos então explorá-los, e talvez o Sr. Crane
como sou aquele que ouve com compreensão - pelo menos
se submeta à intervenção. Mas se o considero teimoso, tolo ou
tento firmemente - minha presença é impmiante. Ajo e reajo.
primitivo, se por causa de sua atitude me sinto repelido ou rejeita-
Seguindo o entrevistado, penso e sinto. Logo poderei dizer al-
do, se premido pelo tempo insisto para que veja as coisas à minha
go ; e então, enquanto presto atenção nele, também devo fazer
maneira, provavelmente não chegarei a lugar nenhum.
isso comigo. Muitas vezes é compli cado, pois mesmo com a
Ouvir: um instrumento essencial. A compreensão exige o
melhor intenção me surpreendo avaliando-o e aquilo que ocor-
uso de um instrumento indispensável: ouvir. Ouvir de verdade é
re entre nós. Encontro-me aprovando aqui, e desaprovando ali;
um trabalho dificil, que implica muito pouca coisa de mecâni-
concordando ou discordando; confirmando ou negando. Posso
co. Ouvir exige, antes de mais nada, que não estejamos preocu-
expressar tudo isso, apenas uma parte, ou nada. Mas devo ouvir
pados, pois se estivermos, não poderemos dar uma atenção ple-
a mim mesmo, assim como a ele, pois ambos estamos envolvi-
na. Em segundo lugar, ouvir implica escutar o modo como as coi-
dos e somos importantes.
11

74 _ _ _ _ _ _ - - - - - - - - - - - A entrevista de ajuda 75
Filosofia - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

Aqui existe um perigo que deve ser indicado claramente. 4. Como percebe o material que ele, o entrevistador ou am-
Posso escutar tão cuidadosamente e tentar de tal modo com- bos desejam discutir. O que pensa e como se sente sobre o que
preender, que acabo sendo absorvido pela estrutura interna de está envolvido.
referência do entrevistado; como resultado, terei dificuldades 5. Quais são suas aspirações, ambições e objetivos.
em nos separar. Se isso acontecer, não serei capaz de ajudar, 6. Que mecanismos de defesa emprega.
porque a form a de ajuda que geralmente o entrevistado exige 7. Que mecanismos de enfrentamento usa ou é capaz de
vai além do ouvir com compreensão. Devo permanecer eu mes- usar.
mo - ainda que seja somente para capacitá-lo a aproximar-se de 8. Quais são seus valores; qual é sua filosofia de vida.
si mesmo. Enquanto ouvir com compreensão, posso compreen- Não é necessário lembrar que não demos "um guia aprova-
1.
1
der algo que ele ainda não entendeu; posso adquirir insights do"; trata-se apenas de algo com que principiamos a tatear -
!
li sobre sua situação que talvez ele precise saber para mudar. Se como uma mão no escuro. Com um pouco de luz, podemos dei-
;1
me afasto muito de mim mesmo, e chego demasiado perto dele, xar cair a mão.
não estarei ali com minha própria estrutura de referência para
ajudá-lo quando mais precisar de mim. Depois de muito esfor- Conseguir empatia
ço, posso chegar a sentir que compreendo com o Sr. Crane o Agora wna historinha. Em um dos kibutz de Israel, havia
que o afasta de sua cirurgia cardíaca, mas somente comunican- um burro. Era wn burro especial, na verdade, com suas longas
do isso a ele, examinando o problema com ele, poderei ajudá-lo orelhas sedosas e grandes olhos brilhantes; e todas as crianças o
a tomar a decisão que o levará à intervenção e talvez a uma vida amavam profundamente. Assin1, quando, um dia, ele desapare-
com mais saúde e melhor. ceu, todas as crianças ficaram angustiadas, pois ele era a atra-
Sugestão de objetivos para o ouvir. Os que se iniciam na ção favorita das crianças da comunidade. Durante a manhã, as
entrevista de ajuda freqüentemente perguntam o que devem crianças costumavam vir em duas ou três, ou em grupos inteiros
procurar compreender agora que realmente desejam ouvir. É com seus professores, para visitar o burro. Os menores chega-
claro que não existe nenhuma resposta global, pois há muitas vam a cavalgá-lo um pouco. À tarde, as crianças obrigavam seus
variáveis implicadas. Contudo, pode ser importante ouvir com pais a irem ver Shlomo, o burro. Mas agora ele estava perdido,
compreensão alguns ou todos os seguintes itens: e as crianças estavam abatidas e tristes. A tristeza foi contagio-
sa; e antes que o dia terminasse, todos os membros do kibutz
1. Como o entrevistado pensa e sente em relação a si mes- haviam se reunido no vasto refeitório e, com a preocupação
mo; como ele se percebe. estampada em todos os rostos, estavam decidindo o que fazer.
2. O que ele sente e pensa sobre os outros em seu mundo, Haviam procurado em todas as partes, mas Shlomo, o burro,
especialmente aqueles que lhe são importantes; o que ele pensa não fora encontrado.
e sente em relação às pessoas em geral. No mesmo kibutz vivia wn ancião, pai de um dos primeiros
3. Como ele percebe os outros relacionados consigo; co- colonos. Ultimamente estava um pouco senil, e as crianças às
mo, em sua opinião, os outros pensam e sentem a seu respeito, vezes o arreliavam abertamente, apesar de os adultos agirem com
especialmente aqueles que são importantes em sua vida. um pouco mais de circunspecção. Então, quando toda a popula-
_7_6_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Filosofia _ _ _ _ _ _ _ ______ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _7_7

ção da comunidade se encontrava reunida no novo e vasto refei- aproximá-lo mais de seu próprio mundo, de seu próprio eu. O
tório, pensando no que fazer, entrou o velho puxando Shlomo entrevistador empático preocupa-se tanto com o eu do entrevis-
atrás de si. Se o júbilo foi enorme, o espanto e a surpresa foram tado, e quer tanto que este também aprenda a preocupar-se, que
maiores ainda. Enquanto as crianças rodeavam o animal, os está pronto a abandonar temporariamente seu próprio espaço
adultos cercaram o velho. "Como foi, perguntaram ao ancião, vital, e tentar pensar e agir e sentir como se o espaço vital do
que você foi o único entre nós que conseguiu localizar o burro? outro fosse o seu próprio. Estando lá, pode compreender com o
O que você fez?" entrevistado, mas somente quando retorna a si mesmo, ao seu
Vocês podem imaginar muito bem o embaraço do velho, e próprio espaço vital, é que ele se toma capaz de ajudar. Agora
também sua alegria, pois nunca haviam lhe dado tanta atenção. ele pode compartilhar pensamentos e sentimentos do entrevis-
Passou a mão por sua careca, olhou para o teto, e depois para o tado como se fossem seus, porque os compreende com ele. O
chão, sorriu e disse: "Foi simples. Eu me perguntei: Shlomo entrevistado terá sentido isso. Ele terá sentido que o entrevista-
(que também era o nome do velho), se você fosse Shlomo, o dor realmente se importa com ele porque fez o possível para
~
burro, onde você iria? Então, fui até lá, encontrei-o e o trouxe compreendê-lo; agora o entrevistado precisará das reações do

~
1
de volta." Incidentalmente, Fenlason (1952) conta uma história
similar. Só posso jurar pela minha como verdadeira.
entrevistador ao que encontrou, para que essa compreensão de
si mesmo se tome parte da interação.
Essa história exemplifica o aspecto da empatia, que é im-
!
~
portante na entrevista de ajuda, tal como a entendo. Empatia
significa você sentir-se por dentro, participar do mundo interior
Retomemos por um momento ao Sr. Crane, aquele que
necessita de uma operação, mas se recusa a aceitá-la. Depois de
várias conversas, o entrevistador compreende o que há na raiz
da outra pessoa, embora permaneça você mesmo. O velho de sua recusa. Durante a conversa ele tentou pensar e sentir
1 encontrou o burro porque tentou sentir para onde o burro gosta- como se fosse o Sr. Crane. Sentiu a angústia do outro ao perder
' ria de ter ido, como se ele fosse o burro por um momento. Ele um irmão muito querido, meses atrás, após uma intervenção
sabia que não era; porém foi até lá e o trouxe de volta. A empa- cirúrgica - de tipo completamente diferente. Ele estava confuso
1
tia na entrevista de ajuda é similar à terceira maneira de com- quanto ao significado da cirurgia. Não eram todas igualmente
preender - compreender com - já discutida anteriormente. O perigosas? Ele pensou - como se fosse o Sr. Cra ne - no que
entrevistador empático tenta, até onde for possível, sentir a ficaria para sua mulher e filho s caso ele morresse, e queria estar
estrutura interna de referência do entrevistado, e tenta ver o bem para novamente sustentá-los, como costumava fazer. E
mundo através dos olhos deste, como se fosse o seu próprio. As imediatamente fez ver ao Sr. Crane, por suas atitudes e pala-
palavras "como se" são cruciais, pois apesar de o entrevistador vras, que estava compreendendo com ele. Então, tudo termi-
ser empático, não deve perder de vista o fato de que permanece nou. O Sr. Crane sentiu-se compreendid o; o entrevistador retor-
ele mesmo. Sabendo o tempo todo que é diferente do entrevis- nou à sua estrutura de referência própria. Tendo compreendido,
tado, ele tenta sentir a especificidade do mundo interior de pen- queria agora ajudar o Sr. Crane mais do que nunca; e este, tendo
samentos e sentimentos do outro, para chegar mais perto dele, sido compreendido, estava pronto para escutar. Somente agora
para compreender com ele até onde for possível. o Sr. Crane conseguiu ouvir e compreender o que os médicos
O entrevistador empático explora com o entrevistado o estavam realmente dizendo sobre sua operação. Essa ocorreu
mundo interno de pensamentos e sentimentos deste, visando logo depoi s, e o Sr. Crane se recuperou.
_7_8_ _ _ _ _ _ _ _ _ __ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Filosofia _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _!!!.._
79

Avicena. Tentaram-se tratamentos de t0 d0 0 . . .


Empatia não é smommo de simpatia. Simpatia implica
gantes, ungüentos, inalações vento t~po. pilulas, pur-
repartir sentimentos, interesses e lealdades comuns. Quando , · ' sas sangnas catapla
descanso, exercicios, festins e jejuns _ ' d ' . smas,
relacionada a padrões e costumes sociais, a simpatia pode per- príncipe ainda insistia em afirmar qu que e nada serviram. O
correr toda a escala da piedade e caridade, até a sincera compai- . b . e era uma vaca e porta t
devena ser a atido. Uma longa viage 1 . . ' n o,
xão pelo outro. Simpatia é importante, e às vezes necessária, não havia melhorado suas condições m pe as capitais do mundo
mas não é a mesma coisa que empatia. por um mês ao seu leito Exp · ' nem mesmo acorrentá-lo
· enmentaram a pe -
Também não se deve confundir empatia com identificação. rajamento: apesar de tudo d . rsuasao, o enco-
' ª oença passana d· ·d
Quando me identifico com outro, quero ser como ele - pensar muito depressa; todos sabiam e me , ' ~em uvi a, e
' smo o pnncipe deve ·
como ele o faz, sentir e agir como ele. Quero ser como ele à ber, é claro, que ele não era um a vaca, mas um soberano amado na sa-
,
custa de meu próprio eu. Quero me apagar e me substituir pelo Tamb em em nada resultara a comis - ·
10
eu do outro. A empatia envolve sempre dois "eus" separados dis- no . Finalmente, ameaçaram destro::~çao pe :eu triste desti-
0
tintamente; a identificação resulta em um. Quando o entrevista- aquela tolice infeliz. Ainda ass· . ca.so nao parasse com
im, 0 prmcipe permaneceu fir
dor se identifica com o entrevistado, ele se toma o entrevistado. me: e1e era uma vaca e deveria ser abafd -
. h i o.
Dessa maneira, às vezes, pode acontecer de o entrevistador sen- Av1cena c, egou. Primeiro tento b
. ' u sa er tanto quanto pos ·
tir-se tão perturbado pelos infortúnios do outro, tão assoberbado vel sobre o pnncipe, escutando a todo ·d d si-
· h · · s cm a osamente - e na-
pelos problemas aparentemente insolúveis do outro que, ao final que 1e pais avia mmtos que queriam f 1 D .
da entrevista, ambos podem ver-se reduzidos à ineficácia desa- preender o príncipe, escutando-o Comª arl. :_pois, .tentou com-
l '"" " ,, · . · 0 e e nao dizia nada mais
l.,
..... lentadora. Então, o entrevistado precisará de outra pessoa que d o que muuuu , isso adiantou mui' to pouco Enta_ e .
~~I
... possa compreençler com ele, mas que mantenha e conserve seu camente quanto podia, tentou compre d · o, ~o ~mpatl-
l
· · en er com o pnncipe seu
eu e, em conseqüência, seja capaz de dar desse eu para ajudar o estranh o mun do mtenor. Finalinente , d'isse ao príncip . · "S ·
1

outro a enfrentar seus aborrecimentos e problemas. agora compreendo que você é uma d e. .im,
Mas príncipe você está tão vaca, e ev~ ser abatido.
Aqui está uma história que Coleman (1964) e outros rela- ' ' magro que antes ser ·
gordar um pouco." Ouvindo is , . ia preciso en-
tam. Há muitos séculos, Avicena, o famoso médico árabe da . - . so, o prmcipe começou a comer -
Idade Média, foi importunado pelos amigos de um príncipe coisa que quase nao fazia ultimament .
ões. Então lentamente o r· , , e ~ e ª apreciar suas refei-
doente, que residia em uma terra distante: queriam que fosse Ç .' ··· ma 1e obvio.
até lá e curasse o doente. Diziam que o principe estava muito en- . dSe Avicena houvesse
. se identificado com o pnnc1pe , . ha-
fermo , que muitos médicos haviam sido consultados, mas todos vena uas vacas pedmdo para sere b t.d . '.
· d 1 - . m ª a i as. Se tivesse sim-
fracassaram. Ele, Avicena, era sua última esperança. Quando o patizoª o cohm e e,~nao tena agido melhor que seus antecesso-
famoso médico ouviu isso, mostrou-se interessado e perguntou
pelos sintomas da doença do príncipe. Os amigos responderam
res. que ouve 1oi uma empatia t 1
claro que ele foi bem-sucedido
contado essa história.
c: .
que co~s.egum ajudar. E
' so contrano eu não teria
,

afirmando que o príncipe teimava em acreditar que havia se


transfonnado em uma vaca, e exigia ser abatido. Avicena concor- Ainda
· não tivemos exatamente nossa d'iscussao
_ filoso'
. fi·ca
dou em deslocar-se até onde residia o desafortunado príncipe. ,
Para dizer a verdade fmgimos
· 'ª
agora o que julgo ser o foco·
Como o príncipe era muito amado por seus súditos, tudo o central: nos mesmos na entrevista d . d V
queremos nos comportar d . e aJu a. amos supor que
que era possível já havia sido experimentado antes do apelo a ªmaneira proposta neste capítulo.
80 81
- - ---- - - - - -- - -- - - - - A entrevista de ajuda Filosofia

Uma pergunta se coloca: como podemos comunicar tudo isso humano na entrevista, expondo sua humanidade tanto quanto
ao entrevistado? Como podemos fazê-lo saber que realmente o possível. Ele não deve se comportar nem como um boneco,
respeitamos e que estamos realmente interessados, que o esta- nem como um técnico . Deve deixar de lado qualquer má!>cara,
mos ouvindo cuidadosamente, que estamos tentando com- fachada ou outro "equipamento profissional", que crie barrei-
preendê-lo ao máximo possível, que o aceitamos e ao.seu mun- ras entre ele e o entrevistado. Deve dar-se na entrevista de aju-
do, por aquilo que são, e que queremos ser empáticos até o da, de uma maneira tão aberta que o entrevistado possa facil-
ponto que nos é possível? E isso porque podemos nos interro- mente encontrá-lo e, através dele, chegar mais perto de si mes-
gar sobre qual o valor de tudo isso, a menos que o entrevistado mo e dos outros. o entrevistador não deve ter medo de reve-
sinta nosso interesse e desejo honesto de ajudá-lo. lar-se. Ele quer que o entrevistado se revele, e que aprenda al-
Não posso iludir essa linha básica de questionamento. Te- guma coisa sobre ele, sendo ajudado dessa maneira. Ele quer
nho uma resposta. Talvez não seja satisfatória; pode ser tomada que o entrevistado aprenda com seu comportamento que ele, o
como urna ameaça, ou então causar um suspiro de alívio. Qual- entrevistacl , não deve se revelar, qu e isso é perigoso, indesejá-
quer que seja sua reação, para mim, ao menos, é uma resposta. vel e inadequado? Se o entrevistador é frio e distante, pode es-
A resposta é: pelo nosso próprio comportamento durante a en- perar que o entrevistado se aproxime e seja caloroso? Quando o
trevista. Somente isso comunicará ao entrevistado 0 que real- entrevistador é cauteloso e cuidadoso, pode o e1 !revistado ser
mente estamos sentindo e pensando. Estamos envolvidos no aberto? Esse poderá sentir-se livre para expressar de maneira
relacionamento tanto quanto ele, e o que fazemos ou deixamos aberta seus pensamentos e sentimentos a alguém entrincheira-
de fazer, o que dizemos ou não, ocorrerá diante do entrevistado. do atrás da barricada do profissionalismo? Se o entrevistador
Ele sentirá e responderá ao nosso calor ou frieza, ao nosso ver- tenta compreender com ele seus pensamentos e sentimentos, o
~a~eiro envolvimento ou à nossa fachada, à nossa atenção ou entrevistado não terá necessidade desses pensamentos sobre
md1ferença. Ele nos responderá como uma pessoa que pensa e seus pensamenLos, desses sentimentos sobre seus sentimentos?
sente, se nos permitirmos aparecer como tal. Ele reagirá a tudo Na entrev ista de ajuda, ser humano refere-se a alguma coi-
de nós que apresentarmos - ou a nada de nosso, se for isso que sa - além do que já foi dito sobre respeito, interesse, ouvir,
estivermos lhe dando. compreender, aceitar e empatia - de nosso próprio comporta-
A questão, então, transforma-se na seguinte: como deve o mento que dá substância a essas atitudes. Antes de mais nada,
entrevistador comportar-se na entrevista de ajuda? Gostaria precisamos estar preparados para mostrar ao entrevistado quem
muito de apresentar minha resposta, porque sinto que ela é basi- somos, sem nos ocultarmos, para que ele se sinta encorajado a
ca~ente correta. Sinto-me tão seguro a esse respeito que pode-
olhar para o que ele é, sem reservas. Devemos ser sinceros, au-
rei até parecer dogmático. tênticos , congruentes - não apenas agindo, mas sendo . Enquan-
to o entrevistado alimentar qualquer dúvida sobre nós como
Humanizar a essência seres humanos, não irá se permitir confiar em nós . Sentirá que
não é sábio, nem seguro , nem aceitável confiar nos outros e em
Acredito, com os existencialistas (Beck, 1966 ver especial- si mesmo . Se ele sente que somos autênticos no que fazemos e
mente o capítulo de Dreyfus; Buber, 1952; Bugental, 1965; dizemos, pela maneira como expressamos nossos pensamentos
J ourarei, 1964), que o entrevistador deve comportar-se como ser e sentimentos, nossas ambivalências e incertezas, pode apren-
82
- - - - - - - - - - - - - - - - - A entrevista de ajuda

der que é seguro expor-se por meio dos seus. Se nos ouve e não 4. O registro da entrevista
sente nenhuma mensagem contraditória por detrás de nossas
palavras, poderá aprender a escutar genuinamente a si próprio,
sem censura.
Devemos aprender a nos tornar mais sensíveis ao que ocor-
re na entrevista de ajuda: ouvir com aquele "terceiro ouvido"
que Reik ( 1954) descreve, e deixar o entrevistado saber que so-
mos sensíveis e conscientes, e não porque lhe dizemos isso,
mas porque nos comportamos de modo que veja o que somos .
Devemos nos permitir ser livres e espontâneos; não precisamos
nos manter a distância, numa tentativa de atingirmos o padrão
do entrevistador "m ode lo", temendo que o entrevistado apren-
da a reagir a ele, e não a nós. Nw1ca atingiremos a perfeição na
entrevista, mas estou firmemente convencido de que podere- Anotações
mos nos aproximar da humanidade que constitui sua essência.
A anotação é paiie integrante do processo de entrevista.
Precisamos dela para reavivar a memória, lembrar da execução
de nossa parte no plano estabelecido de ação, discutir a entre-
vista com nossos colegas de profissão. A razão mais importante
para se manter registros talvez seja a possibilidade de acompa-
nhar nossa própria evolução e desenvolvimento, mostrando-nos
o que fizemos ou deixamos de fazer, como nos comportamos
em determinada situação ou com diferentes entrevistados em
circunstâncias diversas. O registro pode ser uma ponte entre o
passado e o presente para nossas futuras atuações, à medida que
adquirimos experiência em entrevista.

Abordagens diferentes
Sem dúvida alguma, existem tantas maneiras de registrar
uma entrevista quanto entrevistadores. Acredito que, se o entre-
vistado consegue relacionar-se com o entrevistador, será capaz
de se relacionar com seu estilo de anotação. O relacionamento
poderá sofrer prejuízo se a entrevista de ajuda tiver interferên-
cia do entrevistador ou de seu modo de tomar notas. Se o entre-
_.8_
:. 4_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda 85
O registro da entrevista __ _

vistador se sente bem consigo mesmo e com seu método, as pos-


pouco embaraçosa no início. É como se o sapato estivesse cal-
sibilidades são de que o entrevistado aceite rapidamente a ambos.
çado no pé errado. Mas por que realmente achamos qu e é
Em nossa cultura, quando as anotações são manipuladas com
assim? Talvez porque ainda associemos o ato de tomar not a <t
discriminação, não costuma haver reações negativas. Pelo contrá-
uma posição de superioridade.
rio, a ausência dessa prática poderá ser encarada como negligên-
cia ou falta de interesse. Normalmente, não é necessária nenhuma
Alguns "não faça "
explicação sobre nossa técnica de registro. Contudo, pode-se dar
sem dificuldade uma explicação, de acordo com as necessidades Algumas coisas que não se devem fazer merecem maior
de uma ou das duas partes da entrevista. Conheço um professor atenção de nossa parte . Não transforme a tomada de notas em
que, quando está entrevistando um aluno, diz o seguinte: ''Não um interrogatório: "Vejamos agora se anotei corretamente quais
escreverei nada enquanto estivermos conversando, porque prefiro são seu s sentimentos em relação à sua mulher." Não deixe que
prestar atenção em você e em mim. Mas, depois que você sair, as anotações interfiram no ritmo da entrevista: "Por favor, não
farei algumas anotações rápidas para que possa lembrar-me fale tão depressa que não consigo acompanhar." Se você se per-
melhor do que conversamos. Se você quiser fazer o mesmo, pode- mitir um envolvimento maior com o registro do que com o
remos inclusive comparar nossas anotações." entrevistado, não estará dando a ele o respeito que merece e ne-
Durante a primeira entrevista com um novo paciente, um cessita. O registro deverá sempre subordinar-se ao processo da
.1 colega meu, especialista em terapia ocupacional, diz o seguinte: entrevista, e nunca o contrário .
1
1 "Espero que você não se importe se eu fizer algumas anotações Não se oculte ou fuja através das anotações: "Deixe-me
durante nossa conversa. Não confio em minha memória, e se ver... É, minhas notas indicam aqui, no nosso encontro da sema-
não anoto rapidamente, começo a ficar preocupado e a perder o na passada , que nós dois observamos que sua atitude ao admi-
fio da meada. Posso ouvi-lo melhor dessa forma." nistrar o orçamento está bem mais entusiasmada." Certa vez,
Conheço entrevistadores que acreditam não haver nenhuma uma entrevistada queixou-se de seu orientador: "Ele usa suas
necessidade de explicação, e agem de modo que isso não ocor- anotações como meu marido usa seu jornal. Não posso passar
ra. Há pessoas que anotam apenas informações básicas. Outras por cima de nenhum deles."
anotam também planos de ação e decisões tomadas em conjun- Não faça segredo de suas anotações, para que isso não des-
to. Alguns entrevistadores anotam idéias e sentimentos expres- perte ansiedade ou curiosidade do entrevistado. Por fim, quan-
sos pelo entrevistado; outros, resumem também seus próprios do tomar nota na presença do entrevistado, não escreva nada
comentários. Um amigo meu costumava fazer anotações copio-
que você não esteja preparado para mostrar-lhe. Certa vez um
sas. Durante anos, fez várias tentativas de reduzi-las. Numa des-
entrevistador precisou deixar seu consultório por alguns mo-
sas ocasiões, o entrevistado com quem já tinha mantido contato
mentos, durante uma entrevista. Quando voltou ouviu da pes-
anteriormente, percebendo seu esforço, fez a seguinte observa-
soa a quem estava entrevistando : "Vi que você escreveu a meu
ção: "Seria muito melhor que você escrevesse mais. Isso o dei-
xaria mais tranqüilo." respeito que não coopero e que sou agressivo!" Se considera-
mos legítimo e necessário anotar comentários significativos
Sei também de exemplos em que o entrevistado, e não o
apenas para nós, e não para o entrevistado - tais como avalia-
entrevistador, fazia as anotações. Essa situação pode ser um
ções, determinações, conclusões -, i so não deverá ser feito em
_8_6_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __ _ ____ A entrevista de ajuda O registro da entrevista 87

sua presença e, evidentemente, deverá ser mantido fora de seu a pesquisa, devemos declarar isso no início. Caso a infonnação
alcance durante as futuras entrevistas.
obtida não possa ser mantida confidencial, também devemos
Em resumo, cada um desenvolve seu próprio estilo de entre- deixar isso claro. De modo algum devemos prometer sigilo se
vistar, exatamente da mesma forma que desenvolve sua própria não tivermos certeza de que podemos cumprir. A pergunta: "Se
maneira de fa zer anotações sobre a entrevista. Ambos sofrem eu contar a você o que aconteceu, você promete não contar ao
alterações à medida que ganhamos experiência, e ficamos mais à meu professor?" não deve ser respondida afirmativamente, a
vontade conosco e com o entrevistado. Verifiquei em minha pró- menos que o entrevistador pretenda manter sua promessa.
pria carreira que, com o passar do tempo, as anotações diminuem Entretanto, não é necessário responder positivamente, posto
em volume, e se adquire um estilo que cria condições para uma que eu, o entrevistador, talvez não esteja preparado par~pron:e­
boa entrevista, além de adequar-se às necessidades pessoais. ter algo sobre o que nada conheço. Posso responder: Prefiro
não prometer nada sem estar a par do assunto; mas diga-me o
Honestidade essencial que tem em mente, e então tentaremos descobrir juntos o que
Agora que temos as anotações feitas durante a entrevista, isso pode significar"; ou "Não posso prometer sem conhecer o
ou logo após seu término, que faremos com elas? A entrevista problema; mas prometo, se você me contar, que não farei nada
envolve wn aspecto ético. Supõe-se que a entrevista de ajuda sem primeiro informá-lo do que se trata e discutir com você".
seja confidencial, e freqüentemente isso é afirmado. Essa con- Aqui estão mais dois exemplos. Uma mãe coloca para o fun-
fiança precisa ser mantida. Nossas anotações, ou registro da cionário encarregado de liberdade condicional o seguinte proble-
ma: "Gostaria que você prometesse não contar a meu filho que
entrevista, estão sob a forma de resumo, relato corrente, pontos
vim procurá-lo." Uma resposta honesta seria: "Talvez pudesse
resumidos que servem como lembretes, ou uma combinação de
me dizer o que quer discutir, e analisaremos a questão no decor-
todos esses, com um provável acréscimo de um apanhado geral
rer da conversa." E, finalmente, uma criança pode dizer a seu
e de wna avaliação. A entrevista está conservada em seus as-
professor: "De qualquer jeito você vai contar ao diretor, então por
pectos tangíveis, e essas anotações são confidenciais. Só po-
que deveria eu conversar com você?" De nada adianta o profes-
de m ser compartilhadas com os profissionais cuja tarefa é aju-
sor prometer não contar, pois talvez seja obrigado a fazê-1?, ou
dar-nos a ser mais eficazes, por exemplo, nosso supervisor ou
possivelmente queira discutir o assunto com ele. Uma manerra .de
aqueles que trabalham conosco na equipe de profissionais dedi-
contornar o problema poderia ser a seguinte: "Eu talvez querra
cada a ajudar o entrevistado. Embora os entrevistadores nem
informar alguma coisa ao diretor, mas não contarei nada além do
sempre o afirmem com clareza, muitos deles conservam certas
que tivermos decidido no final de nossa conversa."
informações confidenciais apenas para si próprios, partilhando
algumas informações com o supervisor e membros da equipe, e
Gravação
relatando apenas o mínimo necessário à administração. Conhe-
ço entrevistadores que mantêm arquivos separados sobre o mes-
Nesta época de avanços tecnológicos, deve-se dizer algu-
mo entrevistado para essas diferentes finalidades.
ma coisa sobre o gravador e o sistema de videotape, mais recen-
Qualquer que seja o melhor procedimento, de uma coisa temente desenvolvido. A gravação de uma entrevista não pode
estou certo: devemos ser honestos. Se as anotações se destinam ser considerada como um conjunto simples de anotações.
li

88 O registro da encrevista _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _8_9


- - - - - - - - - - - - - - - - - - A entrevista de ajuda

Trata-se de um registro completo do que foi dito e, no caso do que a fita será mantida confidencial , em geral ele não fará obje-
videotape, é também um registro do que ocorreu. Esse registro ções. Ele só ficará inquieto se perceber que eu o estou. Se puder
pode servir a muitos fins, mas não é como tomar notas. Con- lhe dizer que também ele poderá ouvir as gravações para apren-
siderando os custos e o espaço necessários, as entrevistas gra- der, será ainda bem melhor. Se mesmo assim o entrevistado
vadas geralmente não podem ser guardadas por muito tempo, e colocar objeções , então talvez o melhor seja respeitar seus sen-
é ma~s fácil recorrer a anotações escritas do que a fitas grava- timentos. Algumas pessoas simplesmente sentem medo ou são
das. E claro ~u~ as fitas podem ser transcritas mas isso implica desconfiadas. Em regiões ou culturas em que o gravador raramen-
um tempo adic10nal, e uma equipe especializada de secretárias te é utilizado ou conhecido, a insistência du entrevistador pode se
o que nem sempre é possível. ' revelar verdadeiramente nociva. Quando alguém percebe que está
A principal utilidade da entrevista gravada é o aprendizado trabalhando com pessoas desconfiadas, o mais aconselhável é
ou a pesquisa. Consideraremos aqui apenas a primeira finalida- aceitar o problema e deixar o gravador de lado.
de. Não conheço melhor sistema para mostrar, objetivamente, Estou impressionado com os beneficios que os entrevista-
ao entrevistado o que e de que modo ele está fazendo . A utiiiza- dos podem obter escutando suas próprias gravações. Isso é váli-
ção do gravador pode assustar a princípio, mas à medida que do para crianças , adolescentes e adultos . Inicialmente, o inte-
nos habituamos a ele, pode ser altamente compensador. resse pode se centralizar nos aspectos técnicos. Talvez mude
"Eu realmente falei tanto?" depois para o aspecto do som da própria voz - que usamos
"Não consigo me lembrar de ter falado isso. Onde será que muito e conhecemos tão pouco, a ponto de muitas vezes sermos
eu estava?" incapazes de reconhecê-las. Mais tarde, o interesse geralmente
"Puxa, realmente interrompi muitas e muitas vezes. Será incide sobre aquilo que de fato ocorreu na entrevista, que é um
que ele percebeu isso como eu agora?" diálogo sério e importante realizado entre duas pessoas. Ao
"~stive bem melhor hoje. Escutei bem, e acho que com- escutar sua própria entrevista, o entrevistado avalia com freqüên-
pr~endi ~ ~ue acont~ceu, e mostrei isso. Mas ainda estou um pou- cia mais profundamente sua seriedade, esclarece para si mesmo
quinho rapido demais para meu gosto na captação de imagens." sua finalidade e obtém muitos insights importantes. Até onde
Em minha opinião, isso é uma aprendizagem importante. sei, tendemos a usar as entrevistas gravadas unicamente para
Em lugar _de tentar adivinhar - "Acho que disse isso e aquilo, favore~er nossa própria aprendizagem. Minha sugestão é que

mas ela nao me compreendeu" - posso verificar e ter certeza. elas também podem favorecer a aprendizagem do entrevistado.
Além di~so, posso continuar sozinho nesse tipo de aprendiza-
gem, e amda de acordo com minha conveniência e tempo dis-
ponível.
E o entrevistado? Como reagirá ao gravador? Estou firme-
mente convencido de que, depois dos primeiros minutos ele não
reag~á d~ ~odo a~gum, porque não mais o perceberá. Do ponto
de vista etico, creio que o fato de a entrevista ser gravada não
pode permanecer oculto. Se digo ao entrevistado que costumo
gravar as entrevistas para posteriormente aprender com elas, e
5. A pergunta

11*'

Questionando a pergunta

É tão grande o número dos que consideram a pergunta


como um instrumento básico, que julgo necessário dedicar a ela
um capítulo inteiro. Muitos entrevistadores estão convencidos -
ou, pelo menos, agem como se estivessem - de que seu princi-
pal papel é fazer perguntas. Parecem argumentar que, uma vez
que é bom fazer perguntas, quanto mais fizerem, melhor. Gosta-
ria de questionar a pergunta, ou seja, o uso da pergunta. Desejo
considerar os vários tipos de pergunta, e os diferentes propósi-
tos a que podem servir. Examinando-se entrevistas, ao acaso,
verifica-se que a maioria delas está tão entremeada de pergun-
tas que se pode começar a pensar que a única coisa que o entre-
vistador pode fazer, ou se sente bem ao fazê-lo , é perguntar.
Suas indagações parecem mantê-lo à tona; impossibilitado de
perguntar, afundará.
Realmente, tenho muitas reservas quanto ao emprego de
perguntas na entrevista. Estou certo de que fazemos perguntas
demais, muitas delas sem importância. Fazemos perguntas que
confundem o entrevistado, que o interrompem. Fazemos per-
guntas que provavelmente o entrevistado não tem condições de
responder. Fazemos inclusive perguntas para as quais não que-
_9_2_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda A pergunta _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __ 93

remos resposta e, em conseqüência, não ouvimos as respostas isso o que você deseja, e o entrevistado está pronto a suportá-lo,
que vão ser dadas.
não há mais nada a acrescentar, exceto, talvez, que nossas duas
Porém, minha maior objeção ao uso das perguntas é mais filosofias diferem fundamentalmente. Estou convencido de que
profunda. Faz-nos retomar por um momento à filosofia - mas o modelo pergunta/resposta não cria a atmosfera em que pode
algumas vezes é preciso retroceder um pouco, antes de conti- se desenvolver um relacionamento positivo, cordial; em que o
nuar. Se iniciamos a entrevista de ajuda fazend~ perguntas e entrevistado pode encontrar uma experiência valiosa; ou desco-
obtendo respostas, fazendo mais perguntas e obtendo mais res- brir mais sobre si mesmo, suas forças e suas fraquezas, ou em
postas, estamos estabelecendo um modelo do qual nem nós, que ele tem oportunidade de crescer.
nem certamente o entrevistado, seremos capazes de nos desem- "Devemos então - ouço a pergunta - eliminar todas as per-
1'"' ' baraçar. Sem oferecer-lhe alternativas, estaremos ensinando que,
!i guntas?" Obviamente devemos fazer perguntas às vezes, mas e
nessa situação, nossa função é fazer perguntas, e a dele, respon- esse é um "mas" muito importante -parece-me que:
dê-las. E o que é pior, já tendo se acostumado a tal modelo devi- 1. Devemos estar conscientes do fato de que estamos fa-
do à sua experiência anterior, o entrevistado pode adaptar-se zendo perguntas.
imediatamente ao mesmo. Assim, novamente ele se verá como 2. Devemos contestar as perguntas que estamos prestes a
um objeto, um objeto que responde quando interrogado e, fazer e pesar cuidadosamente a conveniência de fazê-las.
quando não, mantém a boca fechada - e, sem dúvida alguma, 3. Devemos examinar cuidadosamente os vários tipos de
também a mente e o coração. Ao introduzirmos o modelo per- pergunta de que dispomos, e os tipos de pergunta que, pessoal-
gunta/resposta, estamos dizendo ao entrevistado, de modo tão mente, temos tendência a fazer.
claro como se estivéssemos usando palavras, que nós somos a 4. Devemos considerar alternativas à formulação de per-
autoridade, o chefe, e que só nós sabemos o que é importante e guntas.
relevante para ele.
5. Devemos receber com sensibilidade as perguntas que o
Enfatizar esse tipo de comportamento é fazer implicita- entrevistado está fazendo, quer esteja perguntando abertamente
mente uma suposição, da parte do entrevistador e do entrevista- quer não.
do (que também precisa ser colocada claramente aqui), a saber, O teste definitivo, naturalmente, é o seguinte: A pergunta
que o entrevistado se submete a esse tratamento humilhante que estou a ponto de fazer será útil para o entrevistado?
apenas porque espera que apresentemos uma solução para seu
problema, ou porque pensa que essa é a única forma que você
tem de ajudá-lo. Quanto a você, o entrevistador, já fez suas per- Perguntas abertas vs. perguntas fechadas
guntas e obteve suas respostas : agora, mostre seus truques! Se
não tem a solução no bolsinho do colete, se não pode ajudar de-
Vamos então analisar mais profundamente o tema das per-
pois do longo interrogatório, que direito teve de fazêr pergun-
guntas na entrevista. Antes de qualquer coisa, devemos consi-
tas? Você é útil em quê? O entrevistado pode sentir tudo isso; derar a pergunta aberta em oposição à fechada . A pergunta
talvez sinta ou não, mas você sentirá. Tendo feito perguntas e
aberta é ampla, a fechada é restrita. A pergunta aberta permite
obtido respostas, você se sentirá obrigado a formular uma solu-
ao entrevistado amplas possibilidades; a pergunta fechada o
ção para dar a resposta, para anunciar seu "veredito." Bem, se é
limita a uma resposta específica. A pergunta aberta o convida
94 95
- - - - - - - - - - - - - - - - A entrevista de ajuda A pergunta - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

a alargar seu campo perceptivo; a pergunta fechada o restringe. porque pressupõe que a resposta dada pelo interrogador é a res-
A pergunta aberta é um convite às suas concepções, opiniões, posta que o entrevistado daria se interrogado. É mais fechado
pensamentos e sentimentos; a pergunta fechada exige apenas que a pergunta fechada, que ao menos solicita uma resposta não
fatos objetivos. A pergunta aberta pode ampliar e aprofundar o conhecida de antemão pelo entrevistador. Porém aqui não há
contato; a pergunta fechada pode limitá-lo. Em resumo, a pri- nenhuma alternativa para a resposta dada ou sugerida pela pró-
meira pode abrir totalmente a porta para um bom relaciona- pria pergunta.
mento; a segunda, geralmente a mantém fechada. É bastante
fácil diferenciar a pergunta ampla da pergunta limitada. Por "Ninguém roubaria, a não ser que soubesse o porquê, não
exemplo: acha?"
I':1 "
1 ,,

" Como você se sentiu depois do j ogo?"


"Está perfeitamente claro que é assim que ela se sentiria
depois do que você disse, não é?"
"Você se sentiu muito bem depois do jogo, não foi ?" "É melhor você se afastar de pessoas como aquelas. Todo o
mundo sabe o que elas estão 'aprontando' - isso é óbvio, não é?"
"O que é que há com você hoje?"
"Você não está parecendo hoje como nos outros dias. Do mesmo modo, embora com uma implicação ligeira-
Aconteceu alguma coisa?" mente diferente, existe a pergunta que realmente exige uma res-
posta, mas que o entrevistador formula de modo que você con-
"Você quer aprender o oficio de sapateiro?" corde com ele, se você souber o que é bom para você. Você não
"Aprender a fazer sapatos é uma possibilidade. Você pensa tem escolha, a menos que esteja preparado para arriscar-se à
ou sente alguma coisa em reléição a isso?" indignação, punição ou total perplexidade do entrevistador.

"Onde você nasceu? Quantos anos você tem?" "Você não teve a intenção de fazer isso, teve? Foi porque
você estava transtornado e cansado que o atacou daquela forma,
" Você gosta da escola, não é?" não foi?"
"Você gos ta da escola?"
"Algumas pessoas gostam da escola, outras não. E você?" "Você realmente não quer nos deixar ainda, quer? Só por-
que você está zangado agora, não vai querer pôr em risco sua
"Tenho certeza de que você gosta de sua nova irmãzinha. saúde, vai?"
Ela é adorável, não é?"
"Sua irmãzinha me parece adorável, mas acontece que não "Você não sentia realmente o que falou sobre seu pai, sen-
sou o irmão dela. Como é que você se sente em relação a ela?" tia? Ele realmente gosta de você, e você sabe disso muito bem,
não sabe?"
Você pode preparar sua própria lista e então, talvez, per-
guntar a você mesmo a que tipo de pergunta preferiria responder. "Você não antipatiza com todos os negros, da maneira
. ~ão podemos prosseguir sem mencionar a pergunta que já como disse, não é? Debaixo da pele somos todos irmãos; você
mclm a resposta. Esse tipo é mais do que uma pergunta retórica, acredita nisso, não é?"
_9_6 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A enrrevista de ajuda 97
A pergunta - - - - - - - - - - - - - - - - -- - - - -

Essas perguntas podem soar ridículas, mas mesmo assim


"O que é que você acha de nosso novo sistema de not.as?"
são freqüentemente feitas, inadvertidamente às vezes, mesmo
"Você deve ter muitas opiniões sobre o nosso novo sistema
por aqueles que as consideram desse modo.
de notas."
"Como lhe parece seu novo aparelho?"
"Gostaria muito que você falasse sobre seu novo apare lho.,,
Perguntas diretas vs. perguntas indiretas
Talvez você conteste que algumas ou todas as perguntas
Em seguida, deve-se fazer uma distinção entre perguntas
indiretas relacionadas acima não são de forma alguma pergun-
diretas e indiretas. Como seu nome indica, perguntas diretas
tas. Se não lhe parecem perguntas, tanto melhor. Há os que sus-
são interrogações precisas, enquanto as indiretas perguntam
tentam que essas perguntas indiretas são, apesar de tudo, per-
sem parecer fazê-lo. Todas as perguntas abertas mencionadas
guntas, e concordo com eles . Gosto delas porque nem sempre
anteriormente são diretas . Podemos tomá-las ainda mais aber-
se parecem com perguntas, embora na verdade demonstrem
tas, formulando-as indiretamente. A pergunta indireta geral-
interesse. Tendem a deixar o campo completamente aberto para
mente aparece sem um ponto de intenogação no final, mas
o entrevistado; deixam-no ficar com a bola.
ainda assim fica claro que a pergunta está sendo feita e uma res-
posta procurada. Aqui estão algumas perguntas abertas, segui-
das de suas versões indiretas:
f, .
i'
Perguntas duplas
,:,
,..
i;·
"É duro trabalhar durante o dia e estudar à noite, não é?"
Chegamos agora a um tipo de pergunta que, até onde sei,
"Deve ser duro trabalhar durante o dia e estudar à noite."
nunca tem utilidade na entrevista de ajuda ou em qualquer outra
situação. Refiro-me à pergunta dupla. Quando muito, limita o
"Como você se sente ao fazer sua lição de casa com toda
essa criançada em volta?" entrevistado a uma de duas alternativas; na pior das hipóteses,
confunde tanto a ele como ao entrevistador. O entrevistado não
"Estou tentando imaginar como lhe parece fazer sua lição
sabe a qual das duas perguntas responder, e quando finalmente
de casa com toda essa criançada em volta."
responde, não sabemos a que pergunta respondeu. Não obst~­
te, todos usamos perguntas duplas de vez em quando. Tambem
"Como é que você está vendo seu novo emprego?"
faço isso, e toda vez que acontece, fico furioso. Suponho ~ue a
"Estou tentando imaginar como lhe parece seu novo
emprego ." saída seja aceitarmo-nos como seres humanos, que prec1s_am
errar às vezes e depois extrair o máximo da situação. Para mim,
"Você está aqui há uma semana. O que é que você tem para
dizer?" isso implica voltar sobre meus passos e desvincul ar as duas per-
guntas, de modo que tanto eu como o entrevistado possamos sa-
"Você está aqui há uma semana. Deve haver muita coisa
que esteja com vontade de falar." ber a qual delas ele respondeu.
Em primeiro lugar, aqui estão alguns exemplos de pergun-
tas duplas do tipo "ou/ou", que limitam o infeliz entr~vistado a
uma escolha entre duas alternativas. Ele pode prefenr ambas,
98 99
- - - - -- - - - - - -- -- - - - Aentrevista de ajuda A pergunta - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

ou nenhuma delas, ou ainda uma terceira; mas aí está ele, força- Etr. Você acordou na hora com o despertador ou foi sua mãe
do a escolher entre duas alternativas que estamos contentes por que o chamou?
oferecer-lhe. Eto. Ah ... Eu ainda consegui pegar o trem.
Etr. Você ficou de novo vendo televisão ontem à noite, e deixou
"Você quer café ou chá?" sua lição de casa para depois, ou sua mãe o forçou a sen-
tar-se e a estudar?
"Você quer vir amanhã ou depois de amanhã?"
Eto. Mamãe saiu ontem à noite para ir ao cinema.
"Você quer estudar violino ou violoncelo?"
Etr. Minhas perguntas o ajudam e você está aprendendo mais
"Você quer morar com sua mãe ou com seu pai?" sobre si mesmo?
"E hoje você quer costurar ou fazer tricô?" Eto. Não posso dizer realmente.
"Você quer estudar para carpinteiro ou para pintor de pare- Etr. Você está se adaptando melhor agora às muletas; e os ócu-
des?" los? Eles caíram bem?
Eto. Ah, claro.
A única desculpa que posso aceitar para esse tipo de pergun- Etr. Houve atividade em grupo ontem à noite, e você participou?
ta é que o entrevistador não disponha de nenhuma outra alternati- Eto. Alguns garotos resolveram ir nadar.
va, ou que conheça tão bem o entrevistado que tem certeza de Etr. Você estudou francês no co légio, e, além disso, sua família
F 1, que ambas as escolhas são relevantes. Em qualquer dos casos,
fala francês em casa?
Eto. Eu tenho uma prima que está na França. Ela teve inglês no
entretanto, a desculpa é inconsistente. Talvez haja outras alterna-
/1:: colégio e me convidou para passar o verão com ela.
i:.
l ::
tivas; talvez o entrevistado tenha mudado de idéia, ou pode estar Etr. Como vai indo seu pai, e como está o emprego de sua mãe?
..
querendo fazê-lo. O entrevistador, portanto, deveria dizer: Eto. Meu irmão Jack está em casa, de licença. Ele me disse que há
um novo regulamento, e que poderei me alistar no outono.
"Tudo o que podemos lhe oferecer no momento é carpintaria
ou pintura de paredes. Não sei se alguma delas o atrai. Se não tiver Talvez eu tenha exagerado, mas como nunca podemos
interesse por nenhuma, podemos pensar mais nesse assunto." obter uma única resposta significativa para as duas perguntas, é
melhor fazê-las separadamente, se for mesmo necessário fazê-
"A senhora tem costurado ou feito tricô ultimamente, Sra. las. De outro modo, o entrevistado pode desistir e não respon-
Smith? Há muitas outras coisas que pode fazer aqui, como ces- der a nenhuma, assumindo o controle da situação, como pude-
taria, tapeçaria, joalheria, pintura de mosaico. Gostaria de expe- mos verificar nos exemplos acima.
rimentar alguma coisa diferente hoje?"

Quanto às perguntas duplas que simplesmente confundem Bombardeio


entrevistador e entrevistado, quanto menos forem feitas, me-
lhor. Alguns exemplos ajudarão a nos mostrar como essa técni- Antes de passarmos para um outro aspecto da pergunta,
ca pode criar confusão e, por isso, nos dar mais consciência da não posso deixar de atacar os freqüentes abusos da pergunta
importância de evitá-la. dupla em um nível mais absurdo ainda. Estou me referindo ao
sistema conhecido como "bombardeio" de perguntas. Aqui o
_:1...::0...::0_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda 101
Apergunra - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

instrumento se toma uma arma apontada contra o entrevistado, Eto. Ele achou que o comércio poderia ser algo bom, mas disse
se não de forma contundente, pelo menos de modo que dificil- que eu precisaria de mais estudo do que tenho.
mente inspira confiança, gera relacionamento ou cria uma Etr. Quanto tempo você estudou?
atmosfera na qual entrevistador e entrevistado possam exami- Eto. Oito anos.
nar o problema que têm em mãos. Em lugar disso, o entrevista- Etr. Quantos anos você tem agora?
do descobre-se em meio a uma saraivada de perguntas; e, se Eto. Estou entrando nos vinte.
fugir para o abrigo mais próximo, só nos resta admirar sua luta Etr. Seu pai e sua mãe são vivos? Você va i ficar com eles quan-
do sair daqui?
pela sobrevivência. Vou dar um exemplo, sem maiores comen-
Eto. Claro que espero que sim, porque .. . em primeiro lugar...
tários, porque ele fala por si mesmo. "Bem, por que não respon-
vou precisar de ajuda ... e ...
,, de? Precisa de mais tempo para pensar? Será que não há nada
Etr. Você acha que gostaria de voltar à escola por algum tempo?
que você possa dizer? Será que não fui suficientemente claro? Eto. Acho que sim, mas não sei se financeiramente ...
Você acha que não sei o que está acontecendo ou que não me Etr. Exatamente, como está sua situação financeira neste mo-
preocupo? Você acha melhor que eu pare de fazer perguntas? mento?
Você acha melhor que eu o deixe sozinho um pouco?" Até Eto. Bem, não é mu ito boa.
ouvir sua própria voz na gravação, a entrevistadora alegava que Etr. O que atrai você para o comércio?
havia tentado levar o entrevistado a falar, e que ele se recusava. Eto. Esta r em contato com pessoas e mercadorias, acho.
Parece-me ouvir alguém opor a objeção de que este exem- Etr. Você está pensando em mais alguma coisa?
plo é demasiado radical, e que o citei por brincadeira. De qual- Eto. Gosto de Direito.
quer modo, o bombardeio e o interrogatório não estão menos pre- Etr. Você está pensando em formar-se advogado?
sentes no seguinte trecho, embora não tão óbvio à primeira vis- Eto . Não sei. Acho que papai gostaria que eu o ajudasse lá na fa-
ta ou quando ouvido pela primeira vez: zenda, se eu pudesse ... Isto é, se os médicos concordassem ...
Eh-. Que tipo de fazend a se u pai possui ?
Eto. Praticamente tudo, menos gado.
Etr. Olá, Jack, entre. Sou o funcionário encarregado de coloca-
Eh-. Há mais alguma coisa além de Comércio e Direito pela
ções do Centro. Sei que você vai nos deixar logo. O que
qual você estaria interessado?
você gostaria de fazer quando sair daqui?
Eto. Bem, eu costumava fotografar um pouco.
Eto. Não sei exatamente. Sabe, ...
Etr. Isso parece interessante. O que é que você costumava fazer?
Etr. O que é que você já fez antes?
Eto. Bem, tentei muitas coisas, mas aí fiquei doente e ...
Etr. Sim, eu sei. Você chegou a aprender algum oficio ou já fre- Isso, eu penso, é um interrogatório feito com a melhor das
qüentou uma escola profissional? intenções. O entrevistador tem a intenção de ajudar, e o entre-
Eto. Eu comecei com soldagem, mas ... vistado parece preparado para receber, além de mostrar-se
Etr. Certo . Isso já passou. Há alguma coisa em que você estaria necessitado de ajuda . Porém o bombardeio é tão intenso que
interessado agora? nenhum pode ajudar o outro. Eles mal conseguem acompanhar
Eto. Eu estava pensando que talvez o comércio ... o que está sendo dito, e muito menos ainda explorar pensa-
Etr. E o que é que o orientador vocacional sugeriu? Ele discutiu mentos e sentimentos de Jack. Não se faz nenhuma tentativa de
com você o resultado de seus testes? permitir que ele se expresse completamente. Não resta dúvida
_:1_::_0~2_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda 103
A pergunta - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

de que ele deve sentir que depende do entrevistador encontrar


baseados no raciocínio: "Devo ter feito algo de errado, pois ele
uma solução. Nada foi feito para encorajá-lo a chegar a uma
está começando a me interrogar." Essa atitude quase inevitavel-
solução, ou para fazê-lo sentir que pode ser capaz de encontrar
mente transparecerá para o entrevistado: "Aqui quem faz per-
uma saída. Infelizmente, esse exemplo não é radical. Gostaria
guntas sou eu. Quem voce pensa que e' para me mterrogar.
~ . ?"
que fosse .
Examinando nosso "risco" um pouco mais de perto, acho
que o entrevistado pode dirigir-nos perguntas sobre três áreas
de interesse para ele: os outros, nós e ele. (Não estou levando
Situação invertida
em consideração perguntas retóricas, para as quais ninguém
espera realmente uma resposta. Devemos simplesmente apren-
Vamos agora inverter a situação. O que devo fazer com as
der a identificá-las, e permanecemos calados.)
perguntas que o entrevistado me dirige? E se ele me interrogar
Há ainda uma quarta área - a da busca de informações -
ou bombardear com perguntas? Não tenho uma resposta exata
porém é mais aparente que real. Geralmente não passa .de uma
para essa situação, mas acredito que existe uma abordagem efi-
camuflagem ou de uma extensão das três áreas menc10nadas
ciente que desejo compartilhar com vocês.
antes e, se deixamos de compreender isso, podemos perder uma
Minha opinião é que não devemos dar uma resposta a
boa parte da interação que está se desenvolvendo. Não estou
todas as perguntas. Algumas vezes, a ética pode até mesmo nos
sugerindo que perguntas que obviamente solicitam. informa~
impedir, porque, agindo dessa forma, podemos trair a confian-
ções não devam ser tratadas pelo que são. Quero dize~ que e
ça de outra pessoa. Por outro lado, acho que devemos responder
preciso cuidado, e verificar sempre se nada há de escondido sob
a todas as perguntas que nos forem feitas, e tratar cada uma da
a superficie, que, por sua vez, mereça uma resposta. "Que horas
mesma forma como tratamos tudo o que o entrevistado diz - es-
são?" é uma pergunta bastante inocente. Entretanto, na entre-
cutando com a maior compreensão possível, e sendo útil ao
vista, pode significar: por quanto tempo ainda vou ter que
máximo em nossa resposta. Nem todas as perguntas exigem
agüentar isto aqui? ou "Gostaria que isto aqui continuasse, mas
uma resposta, mas todas exigem atenção respeitosa, e geral-
mente uma reação pessoal de nossa parte. sei que não vai"; ou ainda "Esper? que você não. ~e ~et~?11ª po~
muito tempo; estou perdendo minha aula de gmast1ca . Se ha
É interessante, de passagem, notar que embora os entrevis-
sentimentos como esses ocultos sob as perguntas, apenas pres-
tadores estejam bastante preparados para empregar livremente
tar a informação indicaria que não estamos suficientemente
perguntas - com freqüência de forma excessivamente livre -
atentos ao que está se passando. Uma resposta sensível aos sen-
estão despreparados e mais ou menos acautelados contra as
timentos ocultos na pergunta poderia ser a seguinte: "Gostaria
perguntas que lhes são dirigidas. Talvez sejam duas faces da
de saber como você está se sentindo a respeito de nossa conver-
mesma moeda. Se pudermos aprender a ameaçar menos com
sa de hoje"; ou "O tempo parece voar hoje, mas vamos ter que
nossas perguntas, e a nos sentir menos ameaçados com as per-
parar logo mais"; ou "Você deve estar imaginando por quanto
guntas que nos dirigem, seremos melhores profissionais na
tempo vou continuar prendendo você" "Que aula está perdendo
entrevista de ajuda. Uma vez que percebamos a pergunta como
nesse momento?".
uma das formas de expressão do entrevistado, ela não nos per-
Dessa forma, temos obrigação de fornecer a informação so-
turbará. Não podemos nos agarrar a uma postura de defesa,
licitada quando for viável e adequado fazê-lo, mas devemos sem-
,
104 A pergunta _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __ _ _ ____ _ _ _1_0_5
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - A entrevista de ajuda

pre estar atentos à possibilidade de haver algo atrás e além da como a dele agora. Talvez ele estej a preocupado consigo mes-
pergunta que mereça ser captado. Não estou falando de interro- mo, e com o tratamento rigoroso que teme receber de mim.
gatório, como nesse exemplo seguinte (o que acho do interroga- Portanto, devo honestamente responder: "Não posso lhe falar
tório não é mais segredo agora): "São nove e trinta e cinco. Já sobre ela, naturalmente, da mesma fonna como não poderia
lhe disse que horas são; agora, por que não me diz .o que real- falar de você com ela; mas estou tentando imaginar se você não
mente queria perguntar? Vamos, não tenha medo, não vou está preocupado com nosso encontro, pensando que vou ser ri-
mordê-lo". goroso com você." Uma saída alternativa seria ignorar inteira-
É sobretudo com essas solicitações incisivas de informa- mente a referência à mulher, como se estivesse subentendido
ção que precisamos manter nosso "terceiro ouvido" funcionan- que o assunto não era aquele, e dizer: " Suponho que você está
do, pois, mesmo fazendo ostensivamente uma pergunta, o en- tentando imaginar como você e eu vamos nos entender."
trevistado pode estar comunicando uma outra coisa. Lembro-o Existem muitas possibilidades quando o entrevistado nos
me de uma vez em que perguntaram meu nome durante a entre- faz perguntas sobre outras pessoas. Gostaria de me referir ra pi-
vista. Disse meu nome, pensando que o entrevistado deveria damente apenas às seguintes situ ações: (a) quando a outra pes-
saber qual era. Acrescentei isso, e me interroguei em voz alta se soa é conhec ida do entrevistador e do entrevistado, antes de seu
ele teria alguma suscetibilidade em relação ao meu nome. Ele contato atual; (b) quando a pessoa só é conhecida do entrevista-
tinha - e muito forte - e a entrevista começou. Não tenho a in- do ; (c) quando, como resultado do re lacionamento de ajuda, o
tenção de criar um bicho-de-sete-cabeças. Pode não haver nada entrevistador encontra a outra pessoa, conhecida anteriormente
por detrás da pergunta do entrevistado; mas vale a pena exami- apenas pelo entrevistado.
ná-la com sensibilidade pois talvez haja. No primeiro caso, o entrevistado pode nos dizer: "Bem,
Quando o entrevistado nos interroga mais especificamente agora já lhe contei como aquele médico me tratou . O que você
em alguma das três áreas mencionadas, creio que a abordagem acha dele?" Talvez queiramos expressar nossa opinião sobre ele.
deve s~r a mesma: responder todas as vezes de modo a ajudar 0 Fazendo-o ou não, o melhor é retornar ao esquema de referên-
entrevistado, e ser sensível e honesto quando respondemos a cia do entrevistado: "Pessoalmente gosto muito dele, mas com-
pergunta, .e também quando não a respondemos. Se consegui- preendo que tenha tratado você com muita frieza, mais ou me-
mos relacionar nossa resposta com o entrevistado, em geral não nos como um número, e não como uma pessoa."
nos sairemos mal. Quando o outro é desconhecido para nós, é muito mais fá-
cil deslocar-se para o espaço vital do entrevistado: "Não conhe-
Perguntas do entrevistado sobre outras p essoas ço o Dr. L., mas tenho a impressão de que você gosta tanto dele
que apenas está um pouco sentido porque ele o ajudou a melho-
Passemos agora a considerar as perguntas do entrevistado rar tão rapidamente, pron to para deixar o hospital depois de
sobre outras pessoas. Por exemplo: "A mulher que saiu na hora amanhã."
em que cheguei parecia bastante transtornada. Você a tratou Quando o entrevistado sabe que temos um relacionamento
· com muita severidade?" Que faremos diante disso? Certamen- com a outra pessoa (que pode ser íntima dele), pode criar-se
te, não ignorar, mas também não responder diretamente. No uma situação que os entrevistadores tratarão de modo diferente.
fim das contas, sua entrevista foi confidencial da mesma forma O entrevistado pode dizer: "Então, agora você conheceu minha
106
- - - - - - - - - -- -- - - - - -- A entrevista de ajuda
A pergunta - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - =l-=-0_:_
7

mãe. Ela dev e ter lhe contado muita coisa a meu respeito . O que
Etr. Fico contente em saber que você gosta de mim, Hank. Esta-
ela falou? Vamos, n ão finja q ue ela não disse nada." Embora as va ficando um pouco nervoso. Acho bom você ter colocado
respostas seguintes de entrevistadores sejam diferentes, apre- isso. Hoje você fumou um cigarro atrás do outro. Acho que
sentam três coisas em comum: o entrevistador é honesto sobre fiquei nervoso justamente vendo você nervoso . Há alguma
o que revela ou não revela, e quando o faz expressa seus pensa- coisa que você quer falar, mas não conseguiu ainda, não há?
mentos e sentimentos com sinceridade, acabando por retomar Eto. Você está usando um vestido diferente hoje de novo.
ao espaço vital do entrevistado. Quantos vestidos você tem?
Etr. Na verdade não são tantos assim; simplesmente alterno mui-
"Sabe, June, não posso lhe contar o que ela disse, exata- to. Você presta muita atenção nas minhas roupas. Como vo-
mente pela mesma razão por que não poderia contar a ela o que cê se sente usando o uniforme que tem que usar aqui?
•• conversamos. Tivemos uma boa e longa conversa e, em conse- Eto. Você tem filhos?
qüência, acho que com preendo melhor seu relacionamento com Etr. Tenho, dois meninos. O mais velho tem a idade de Jimmy.
sua mãe e o dela com você." E você conseguiu falar com o professor de Jirnmy sobre as
"Sua mãe me pediu para não discutir nossa conversa com refeições?
você. Prefere que você pergunte a ela diretamente o que disse Eto. Você já se divorciou alguma vez?
para mim. Estou tentando imaginar como você se sente em rela- Etr. Não. Será que você está tentando me dizer que só quem
ção a isso." passou pela sua experiência será capaz de compreender?
"Sua mãe realmente disse coisas a seu respeito que talvez Eto. Como você se sente quanto ao fato de ser cega?
você considere 'erradas ' que ela pense ou sinta assim. Tive a im- Etr. Bem, não posso dizer que gosto muito. Acho que estou ten-
pressão de que ela realmente pensa e sente como me falou. Sim- tando fazer a mesma coisa que você, isto é, continuar levan-
plesmente ela vê as coisas de uma forma diferente da sua. Por do as coisas da melhor maneira possível. Estou vivendo com
exemplo, ela realmente acha que você fica na rua até muito tarde da isso há mais tempo, e portanto talvez seja mais fácil. Sabe,
noite, e que o resultado disso é o prejuízo nos seus estudos. Ela quer você nunca chegou a falar realmente de seus sentimentos
muito que discutamos isso com mais profundidade. Você pensou em relação à cegueira, nem mesmo em relação a outras coi-
mais alguma coisa sobre o que conversamos na semana passada?" sas, desde que começamos nossas conversas. Eu estava pen-
sando que talvez o gelo esteja começando a derreter-se um
pouco.
Perguntas do entrevistado sobre nós

A segunda área é aquela na qual o entrevistado nos interro- Perguntas do entrevistado sobre ele mesmo
ga dir~tamente sobre nós mesmos. Mais uma vez, aqui só posso
A última área consiste em perguntas que o entrevistado
sugenr uma abordagem. R esponda diretamente, quando for
formula sobre ele mesmo. Sem repetir o que já foi dito, vou
conveniente, não fique muito tempo com a palavra e retorne a
citar alguns exemplos que refletem o mesmo tipo de aborda-
ele o mais rapidamente possível.
gem:

Eto. Você é mesmo uma pessoa maravilhosa por ser capaz de


Eto. Pareço estar doente hoje?
me ouvir da maneira como me ouve. Mas isso não o deixa
Etr. Você está se sentindo doente hoje?
nervoso?
Eto. Você já se decidiu sobre que "tipo" eu sou?
108 109
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - A entrevista de ajuda A pergunta

Etr. Francamente, minha cabeça não funciona dentro desse tipo "Por quê?"
de coisa. Não vejo você como um "tipo". Estou tentando ver
você como você mesmo, como Paul. Penso que talvez você A expressão mais empregada em um interrogatório , e mais
sinta necessidade de classificar pessoas, e talvez pense que usada para fazer perguntas é "Por quê?". No início dessa dis-
eu também faço o mesmo.
cussão quero confessar que tenho uma certa aversão à maneira
Eto. Você acha que devo aceitar aquele emprego?
Etr. Percebo que você está tendo dificuldade para decidir. Não
como essa palavra geralmente é empregada, e talvez à própria
posso lhe dizer se você deve ou não aceitar, mas posso ten- palavra. Há motivos legítimos para o emprego dessa palavra em
tar resumir os prós e os contras, tal como os vejo, do seu nossa língua, sem dúvida, mas acho que o "por que" tem sido
ponto de vista. Bem ... Agora vou acrescentar alguns sobre tão utilizado de modo indevido qlie seu significado original
os quais tenho pensado .. . Não é uma decisão fácil de tomar está distorcido. Já foi uma palavra empregada na busca da in-
e quero ajudar você no máximo que puder, para que decid~ formação . Significava a investigação da causa ou razão. Quan-
por uma coisa ou outra. do empregada dessa forma, mesmo hoje, é apropriada, e não
Eto. Olhe para mim! Será que algum rapaz gostaria de chegar conheço nenhuma outra que ocupe seu lugar. Infelizmente, esse
perto de uma coisa como eu? não é gera lmente o modo como ela é usada hoje em dia.
Etr. Acho que você está me perguntando se vai ter um namora- Hoje, a palavra "por que" conota reprovação, desconforto .
do algum dia, ou se algum homem vai querer casar com
Então, quando usada pelo entrevistador, comunica que o entre-
você. Honestamente, não sei. No üúcio tive dificuldades em
vistado agiu "errado" ou comportou-se "mal". Mesmo quando
olhar para você, mas agora não. Também não sei o que pode
não é essa a intenção do entrevistador, a palavra será entendida
ser feito através de um tratamento médico. Mas você sabe,
Judy, acho muito mais fácil olhar para você agora do que nesse sentido. O efeito sobre o entrevistado será visivelmente
escutá-la. Não estou criticando você, apenas estou lhe con- negativo, porque é muito provável que tenha sido educado em
tando como me sinto. Você parece dura - tão dura que te- um ambiente em que o "por qu e" implicava culpa ou condena-
nho a impressão de que se algum rapaz fosse se aproximar ção. Bem naturalmente, ele reagirá à palavra, na enlrevista, da
de você, você o afastaria de modo a provar para você mes- maneira como aprendeu a reagir a ela durante anos , mesmo que
ma que ninguém quer se aproximar de você. o entrevistador a tenha empregado apenas no ::ientido da indaga-
ção genuína. Desse modo, toda vez que o entrevistado ouve a
Tenho uma ligeira suspeita de que este capítulo está lem- palavra "por que", pode sentir necessidade de defender-se, re-
brando de algum modo um livro de culinária, embora tudo o que cuar e evitar a situação, ou de atacar.
tive a intenção de fazer foi sugerir possíveis maneiras de chegar Em seus primeiros anos de vida, as crianças usam com fre-
até o fogão sem se queimar. Como responder às perguntas do qüência a palavra - muitas vezes para nosso divertimento. Para
entrevistado, quando e se responder: todas essas são questões elas, é a chave capaz de abrir os segredos do mundo ao redor;
tão pessoais do entrevistador, e dependem tanto dele, que não toma-as capazes de explorar e de descobrir. Elas pedem infor-
tenho certeza de ter me saído bem no que tentei fazer - oferecer mação sem implicar julgamento moral, aprovação ou reprova-
uma abordagem que considero útil. Creio que vocês descobri- ção. Mas elas aprendem. Aprendem que os adultos usam a pala-
rão suas próprias saídas, o que quer que decidam fazer com o vra de forma diferente - para colocá-las 11~1 "linha-de-fogo",
que expus acima. para mostrar que estão se comportando de maneira pouco acei-
IIO A pergunta _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _1_1_1
- - - - - -- - A entrevista de ajuda

tável. Lentamente, mas com firmeza, as crianças param de usar te dos adultos. Qualquer que seja o resultado, a palavra "por
a palavra com a finalidade de indagar, e começam a empregá-la que" tornou-se um anátema.
contra os outros, da forma como foi usada contra elas. Ressoam Essa é a principal razão da minha forte aversão ao emprego
nos ouvidos de uma criança perguntas como: "Por que você do "por que" na entrevista de ajuda. Independentemente do sig-
sujou de lama meu assoalho limpo?" "Por que está.descalço?" nificado pretendido pelo entrevistador, o "por que" é entendido
"Por que você não usa direito o garfo e a faca?" "Por que você com demasiada freqüência como ''Não faça isso'', ou "Considero
quebrou aquele prato?" E assim por diante. Ela aprende a imitar isso muito mau", ou "Você devia ter vergonha de fazer isso".
os mais velhos. Logo começa a dizer a seu amigo: "Por que Em conseqüência, o entrevistado se refugiará em si mesmo, ata-
você pegou minha bicicleta?'', mostrando que desaprova o ato, cará ou racionalizará, mas não se aproximará mais de nós ou
e não que está interessada em obter a informação útil. Ela dirá dele mesmo. Não se sentirá livre para explorar e examinar, mas,
para sua mãe: "Por que devo ir ao armazém?", "não porque sentindo-se ameaçado, precisará se defender da melhor forma
deseja saber qual a razão, mas porque não deseja ir. Essa passa que puder. Aqui estão alguns exemplos:
a ser sua maneira de dizer o seguinte: "Não, estou contra isso."
Ao mesmo tempo, as crianças descobrem uma maneira de Etr. Por que você conversou com Bill na aula de hoje?
se defender da palavra ameaçadora. Em países onde se fala Eto. Eu não .. . não conversei com Bill.
inglês, elas responderão "because" quando lhe dirigirem um Etr. Mas eu vi você conversando com ele durante a aula de ma-
"why" . Em Israel, a palavra para "por que" é "lama", e a respos- temática.
ta fornecida pelas crianças é "kova". Essa significa literalmente Eto. Ah, não era nada. Não vou mais fazer isso. Apenas per-
"chapéu" e é tão sem sentido, naturalmente, como percebem guntei a ele .. .
ser a própria pergunta. Porém, tais respostas são mais que uma Etr. Mas, Charlie, não estou lhe dando uma bronca; eu só queria
estratégia defensiva. Indicam que as crianças estão aprendendo saber por quê. Sabe, vocês, os garotos, têm ignorado Bill
desde que ela veio para a nossa turma, e fiquei feliz em ver
a jogar segundo as regras dos adultos. Descobriram que não há
que, finalmente ...
resposta com sentido à pergunta, e que, de fato, não se espera
nenhuma resposta. Toda vez que ouvem a palavra "por que" sa-
As intenções eram boas, e o dano causado provavelmente
bem agora o que ela realmente significa: "Modifique seu com-
não foi grande. Mas poderia ter sido evitado facilmente se a
portamento, aja como os adultos, os fortes, querem que você
aja." E elas respondem de acordo . professora tivesse dito a Charlie, desde o início, que ela o tinha
visto conversando com Bill, e queria saber dele o que estava
Mais tarde, aprendem uma lição complementar. Dia sim,
acontecendo entre os dois, se realmente havia ocorrido uma
dia não, escutam na escola: "Por que você chegou atrasado?"
mudança.
"Por que não fez a lição-de-casa?" "Por que não consegue ou-
vir?" "Por que não responde?". Quando tentam dar uma respos-
Etr. Mary, você poderia me dizer por que sua mãe veio ver você
ta, não são ouvidas, ou, o que é pior, são duplamente punidas. ontem à noite?
Então aprendem a não responder de modo algum. Podem ou Eto. Desculpe, Srta. Jones. Sei que os pais não podem ficar de-
não mudar seu comportamento; podem submeter-se ou revol- pois das nove, mas ... era importante ... e isso não vai aconte-
tar-se; podem se sair bem ou fracassar na adaptação ao ambien- cer de novo.
_1_1_2 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda 113
A pergunta __

Etr. Mas, Mary, eu não estava censurando. Nem sabia que ela resposta, e encontra várias possibilidades. Forças diferentes e
estivera aqui depois das nove. Notei que vocês duas esta- contraditórias podem estar impelindo-o ou retendo-o . Ele pode
vam bastante preocupadas e...
até mesmo saber, ou pelo menos julgar que sabe, mas não dese-
ja revelar nada. Pode estar confuso, envergonha?º· ou mesmo
Mais uma vez, nenhum prejuízo real foi provocado, mas o
se divertindo. Qualquer que seja o motivo, esse tipo de mterro-
mal-entendido também poderia ter sido facilmente evitado. Tan-
gatório sem dúvida alguma é ineficaz. Podemos obter uma res-
to a professora de Charlie como a Srta. Jones agiram com hones-
posta de vários tipos, mas provavelmente ouviremos uma que
tidade e interesse, e não criticando. Entretanto, foram vistas por
nos satisfaça, uma resposta que o entrevistado percebe que que-
outro prisma pelos entrevistados, que deduziram a partir de expe-
remos ouvir, em vez de um passo verdadeiro e significativo em
riências passadas que o modo como estavam sendo interrogados
sua compreensão de si mesmo.
significava que tinham feito algo errado. Só depois que a falsa
Com freqüência obteremos uma resposta, mas a um preço
interpretação foi retificada é que ambas as entrevistas puderam
muito elevado. Podemos levar o entrevistado a se fechar, em
prosseguir de maneira útil para todos os envolvidos. Em entre-
lugar de se abrir; defender-se, em lugar de olhar para dentro;
vistas, quanto menos esclarecimentos tenhamos que fazer,
racionalizar, em lugar de entrar em contato com sua própria
melhor, porque a distorção não é uma boa base para a confiança
e o respeito. verdade . Alguns exemplos ilustrarão o que tenho em mente:
Infelizmente, ainda não posso dar minha argumentação por
Etr. Por que você chegou atrasada de novo hoje de manhã, Jean?
encerrada. Mesmo admitindo que a conotação negativa à pala- Eto. O ônibus não parou de nGvo. Estava muito cheio .
vra "por que" foi exagerada, ou que ela possa ser retificada pelo
entrevistador, é preciso ainda contestar o emprego indevido da Essa respo sta pode ou não satisfazer o professor, mas Jean
palavra. Com grande freqüência, os entrevistadores recorrem a sabe que há algo mais do que isso. Ela não pode, não quer colo-
ela para expressar suas frustrações com o entrevistado, consigo car em palavras. Outra briga em casa hoje de manhã - gritos e
mesmos ou com ambos. O "por que" parece exigir do entrevista- choro - e não valia a pena levantar-se da cama. Era mais seguro
do uma resposta de que talvez ele não disponha, que não é clara sob os cobertores, fingindo que ainda dormia. Mas ela não vai
para ele ou que não quer revelar - pelo menos ainda não, talvez contar isso ao professor; quase nem admite isso para si mesma.
por causa da forma como o entrevistador está tentando obtê-la. A história do ônibus cheio parece tão boa quanto qualquer ou-
Muitas vezes isso vai resultar em um combate mortal para ver
tra. Deixemos o professor fazer com ela o que desejar. Jean po-
quem resiste por mais tempo. Qualquer que venha a ser o resul-
deria ter conseguido ser mais honesta consigo mesma, se o pro-
tado, na minha opinião, não justifica o método.
fessor tivesse começado a entrevista de forma diferente, se
Posso sinceramente desejar saber o porquê do comporta-
tivesse dito algo como: "Tenho notado, Jean, que você tem che-
mento de alguém: a causa, a razão, a necessidade, a motivação,
gado atrasada nesses últimos dias . Gostaria de saber se há algu-
a explicação. E então pergunto: "Por quê?". É mais fácil para
ma coisa errada, e se aqui na escola podemos ajudar. Posso fi-
mim perguntar, do que, para o entrevistado, responder. Por um car depois da aula hoje. Talvez possamos conversar sobre o as-
lado, ele talvez não saiba realmente o porquê; ele mesmo pode
sunto. O que você acha?"
estar surpreso com sua conduta. Ou então está procurando uma
Aqui estão alguns outros exemplos:
_1_14_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda 115
A pergunta - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

"Agora, por que você não pegou aquele emprego, Joe? Tí- ria saber por que ela não estava tomando aquelas pílulas, e
nhamos combinado que você o faria. Outras pessoas não perde- então ela pensou rápido: "Vou tomá-las de agora em diante,
riam essa oportunidade. Por que você não foi até lá? Você sabe doutor, vai ver." O médico ficou satisfeito. Sorriu, estendeu-lhe
que não há muitos empregos sendo oferecidos por aí, e eu tinha a mão e a levou até a porta do consultório. Ele realmente não
certeza de que você tentaria. Você disse que ia tentar. Por que queria saber por quê. Apenas queria que ela tomasse o remédio.
não tentou?" O entrevistado permaneceu mudo. Ele. mesmo não Gostava da velha senhora, mas estava muito ocupado para per-
sabia por quê. O Sr. Gates tinha razão, mas não podia contar-lhe der seu tempo.
lhe. Não podia contar nem a si mesmo. Tinha alguma coisa a "Por que você se saiu tão mal no vestibular, um rapaz bri-
ver com aquela mão . Ele pensou que havia superado isso. Sabia lhante como você?" Jack respondeu: "Realmente não sei, não
que o Sr. Gates pensava que ele havia superado aquilo. Ele consigo entender." O orientador apertou o rapaz: "Mas você
tomara o metrô até o local. Havia dito muitas vezes a si mesmo deve saber, deve ter alguma idéia, pelo menos. Afinal de con-
que dessa vez ilia até o fim. E então sentiu aquela mão em seu tas, foi você quem fez o exame, e não eu. Por que se saiu tão
bolso - ou melhor, a falta dela - e, antes de saber onde se encon- mai?" Jack realmente não sabia - pelo menos não estava cons-
trava, viu-se de volta para casa mais uma vez. Permaneceu cala- ciente do fato de que talvez soubesse. Percebeu que o orienta-
1
1
do, confuso, envergonhado . Só mais tarde foi que compreendeu
realmente tudo isso; só muito mais tarde pôde perceber e verba-
dor estava irritado com ele, e parecia preocupar-se mais com o
porquê ele havia se saído tão mal do que com o fato em si. Sem
lizar como havia se sentido. Agora odiava a si mesmo, e ao Sr. saber o que dizer, não disse nada.
Gates, que se tornava cada vez mais impaciente. Joe finalmente Espero ter deixado claro o que pretendia. Todos os entre-
saiu com uma resposta: "Não consegui encontrar o lugar." O Sr. vistados acima sentiram-se ameaçados, aguilhoados, pressiona-
Gates replicou: "Você não conseguiu encontrar o lugar.. . depois dos. Não sentiram que o entrevistador se preocupava com eles,
de todas as explicações! Bem, hoje apareceu mais uma oportu- respeitava-os, que realmente queria ajudá-los. ~ão tiver~m con-
nidade. É bem próximo de sua casa. Tenho certeza de que você dições para expressar o que pensavam ou sentiam. Sentiram-se
poderá fazer o trabalho. Você quer tentar?" O Sr. Gates havia se rejeitados, incompreendidos, molestados. Por essa razão, re-
acalmado. Ele tinha recebido a resposta. cuaram, mentiram ou reagiram mesmo se a única arma de que
"Por que não tomou as pílulas que lhe receitei? Não lhe dispunham era o silêncio.
disse como era importante para você tomá-las?" A Sra. Bell se E então, a expressão "por que" nunca deveria ser usada?
esforçava muito para não chorar. Sabia que o médico estava Sei que gostaria eu mesmo de empregá-la menos, pois apesar
bem-intencionado. Também sabia como ele era ocupado, e quan- de todas as minhas palavras e objeções quanto ao seu uso, ela
to tempo levaria se tentasse contar-lhe o porquê. Também sabia continua a aflorar. Tento evitá-la, e fico feliz quando consigo,
exatamente por quê. Não sabia se estava certa ou não, mas não mas com bastante freqüência lá está ela para ser trabalhada no-
se preocupava com isso. Sabia que não se preocupava em ficar vamente. Essa expressão, entretanto, tem realmente um lugar
boa novamente. Na realidade, obtinha mais atenções como justificável, e esse é o ponto adicional que gostaria_de escl_are~
doente. Sabia muita coisa - sobre seus filhos e os filhos deles, e cer agora. Se o entrevistado percebe que nossa atitude nao e
do modo como a tinham levado para aquela casa. E sobre a ameaçadora, e se usamos o "por que" simplesmente para obter
casa ... ela também sabia bastante sobre isso. Mas o médico que- informação concreta que o entrevistado possui, e sentimos que
_1_1 _6 ___ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda
11-
A pergunta - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 7

precisamos, então nosso uso da palavra não deve causar dano


comentário desse tipo que me parece estar ouvindo agora, à
indevido. Talvez esteja dizendo isso apenas para nos aliviar e
medida que me aproximo do final do capítulo. Não pretendi
confortar enquanto continuamos a perguntar "por que", mas es-
matar a pergunta nessa longa invectiva. Ela tem seu lugar na
pero que meu argumento seja legítimo.
entrevista de ajuda- e um lugar tão importante, na verdade, que
Por todas as razões apresentadas anteriormente, sinto que
não me restou outra escolha senão abordar extensamente o as-
devemos empregar o "por que" o mínimo possível, e quando
sunto. Com demasiada freqüência, receio, a pergunta é empre-
realmente o usarmos, devemos fazê-lo para chegar a fatos e não
gada como um martelo. Quando usada indiscriminadamente,
a sentimentos, a pensamentos e não a emoções. Em nossa cultu-
dificulta o progresso. Quando usada ameaçadoramente, é peri-
ra, fatos e pensamentos são mais facilmente acessíveis, mais
gosa. Não retiro uma palavra do que escrevi, mas sinto que não
facilmente revelados, do que sentimentos e emoções. Em uma
posso abandonar o tema tão facilmente. Permanece ainda a per-
atmosfera não ameaçadora, na qual existam confiança e respei-
gunta: Como e quando a pergunta pode ser usada com algum
to, acho que podemos indagar:
proveito na entrevista de ajuda? Acho que respondi a isso impli-
"Por que se mudou para nossa cidade?"
citamente nas páginas precedentes, mas para encerrar a discus-
"Por que você quer matricular seu filho nessa escola?"
são, vou ser explícito agora.
"Por que você está planejando voltar a trabalhar, depois de
todo esse tempo que passou em casa?" Como utilizar as perguntas
Vamos considerar o como. Exceto quando nossas pergun-
Se apesar de nossas precauções, sentimos que nossa per- tas têm a finalidade de preencher formulário s, ou obter infor-
gunta colocou o entrevistado em situação embaraçosa, pode- mações específicas necessárias (quando talvez a pergunta
mos ainda retirá-la e formulá-la de outro modo. Por mais cuida- fechada seja inevitável), ela tem de ser- estou convencido - tão
do que tenhamos, nunca sabemos com certeza como uma pes- aberta quanto possível. Devem ser perguntas únicas, e não
soa vai receber uma pergunta que consideramos inteiramente duplas ou múltiplas. Devem ser enunciadas com a maior brevi-
inócua e objetiva. Apenas podemos ser tão sensíveis quanto dade possível, embora sendo claras e inteligíveis. Se puderem
somos, e tentar nos tomarmos tão sensíveis quanto for possível. ser indiretas, ao invés de diretas, melhor. Quanto menos per-
guntas diretas fizermos, maior a probabilidade de não criar urna
atmosfera de: "Estou aqui para fazer perguntas, e você está aqui
Reflexões finais
para respondê-las." Sou firmemente a favor da eliminação de
perguntas tipo "por que" ao máximo possível. Um últimu as-
H. S. Sullivan, o notável psiquiatra norte-americano que
pecto. Após termos feito a pergunta, devemos parar exatamente
escreveu um livro sobre a entrevista psiquiátrica (1954), sabia
aí, esperar e ouvir a resposta. Se não o fizermos, isso deverá nos
como ouvir seus pacientes. Ele escutava com grande concentra-
revelar algun1a coisa sobre a pergunta que estamos fazendo.
ção, tentando compreender. Então, subitamente, se saía com
Poderemos descobrir que elas não têm a importância e significa-
alguma coisa como: "Bem, e isso não é interessante?" como se
do que acreditamos. Ouvir com discernimento gravações de nos-
estivesse insinuando: "E então? Para onde vamos agora?" É um
sas entrevistas pode ser altamente revelador sob esse aspecto.
A pergunta _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __:1~1~
9
_1_1_8_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda

"Não fui muito claro, fui? Que sentido teve isso para você,
Quando utilizar as perguntas
se é que teve algum?"
Em seguida, o quando. Uma situação que exige perguntas é "Bem, é isso. Senti que você realmente queria minha opi-
aquela em que fomos incapazes de ouvir, escutar ou compreen- nião honesta sobre o assunto. Agora, eu gostaria de saber sua
der por um motivo ou outro. Penso que é melhor e mais honesto opinião honesta sobre a minha. O que você acha disso tudo?"
indagar, em lugar de substituir as palavras perdidas.por aquelas "Tenho a impressão de que estamos conversando sem nos
entender nesses últimos minutos. Acho que será útil ouvir mais
que imaginamos foram ditas. Podemos chegar a isso sem fazer
de sua parte a respeito de sua sugestão, de modo que possamos
uma pergunta diretamente, mas o efeito será o mesmo: entender melhor um ao outro."

"Desculpe, perdi a última parte. O que você disse?' '


Em terceiro lugar, posso querer formular uma pergunta
"Não entendi sua pergunta a respeito de Joe. Estava muito
para auxiliar o entrevistado a esclarecer ou explorar mais pro-
distraído observando como você parece nervoso."
"Sinto muito por essa interrupção, mas não pude evitá-la. fundamente um pensamento ou sentimento que ele vem expres-
Onde estávamos quando fui chamado?" sando. Pode ser apenas para fazê-lo saber que estou com ele,
ouvindo e tentando compreender; ou, percebendo que um pouco
Perguntas desse tipo podem revelar algumas de nossas de estruturação pode ajudá-lo a prosseguir em seu caminho,
falhas, mas não vão, acredito, afastar o entrevistado. Mostrando posso formular uma pergunta que lhe forneça isso. Minha in-
nossa preocupação, nosso interesse, nossa falibilidade humana, tenção não é desviá-lo de seu rumo mas, ao contrário, mantê-lo
isso poderá trazê-lo para mais perto de nós. nele. Tenho em mente perguntas ou afirmações como:
Uma segunda situação se refere a se fomos entendidos pe-
"Você se referiu a muitas crianças . O que quer dizer com
lo entrevistado. Às vezes falamos mai:s do que pretendíamos,
isso?"
ou nos expressamos mal; então, ficamos imaginando se conse-
"Aquela sensação em seu peito, você pode descrevê-la com
guimos transmitir nossa intenção. Ocasionalmente, podemos mais detalhes?"
falar pouco, e o pouco que dizemos parece-nos desprovido de "Parece mesmo que você odiava isso. É verdade?"
ambigüidade; mesmo assim perguntamo-nos se fomos enten- "Estou tentando imaginar como você se sentiu quando ela o
didos corretamente. Algumas vezes, simplesmente sentimos chamou para repreendê-lo."
necessidade de umfeedback da parte do entrevistado para ter- "Do modo como você fala sobre 'os velhos de lá', tenho a
mos certeza de que nos compreendeu como tivemos a intenção impressão de que às vezes você se inclui, e outras vezes você se
de sermos compreendidos. Qualquer que seja o caso, sinto que exclui. É assim- algumas vezes dentro, e outras vezes fora?"
é preferível verbalizar nossas dúvidas em lugar de permane- "Vejo que você está pensando seriamente em sair de casa.
cermos calados e ficarmos imaginando. De outra forma, a in- Você tem alguma idéia do que vai fazer depois, caso não consiga
aquele emprego?"
certeza pode aumentar e estragar o relacionamento que foi
construído .
Afirmações ou perguntas como essas podem ser incluídas
"Acho que andei divagando um pouco. Como é que você
nessa categoria ou na que se segue. Algumas vezes somos nós
entendeu o que eu disse?" que precisamos de esclarecimento, embora possamos atribuir
_1_2_0 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda
A pergunta-- - - - - - - - - - - - - - - - -
121

essa necessidade ao entrevistado. Outras vezes ambos podem


ajudar o entrevistado a superar uma lacuna embaraçosa ou que-
precisar de esclarecimentos. E, em certas situações, nunca se
brar um longo e pesado silêncio.
percebe a verdade disso.
Pode surgir uma outra situação, na qual precisamos de
"Há mais alguma coisa que você gostaria de discutir hoje?"
maiores informações - não para satisfazer nossa curiosidade, mas "Percebo que você sente dificuldade em continuar. Talvez
para compreender de forma mais completa. Podemos sentir que possamos falar um pouco mais sobre sua estada no hospital.
precisamos saber mais do entrevistado a fim de permanecermos Você gostaria de fazer isso?"
dentro de seu esquema de referência. Aqui, o volume de pergun- "Parece-me que você foi ao jogo de futebol, mas saiu na
tas que utilizarmos dependerá de nossa sensibilidade e com- metade. O que aconteceu?"
preensão da situação. A menos que tenhamos grande consciência "Agora que você tem os resultados dos testes que fez, estou
do que estamos fazendo, nossas próprias necessidades podem tentando imaginar como isso afetará seus planos vocacionais."
tomar o lugar das necessidades do entrevistado. Tudo depende "Não sei o que fazer desse silêncio, você sabe?"
de como verbalizamos nossas interrogações, e se interrompe- "Você falou alguma coisa sobre dificuldades no seminário
mos ou não seu fluxo de palavras, pensamentos ou sentimentos. quando chegou. Você está interessado em falar sobre isso agora?"
Sabendo que não sou o mais paciente dos seres humanos, tento
seguir a regra de interpor uma pergunta. apenas se a falta de Minha batalha contra a pergunta está encerrada. Tive a in-
compreensão do que veio antes impede que eu compreenda o tenção de destroná-la, mas não de expulsá-la do palácio. Pre-
que vem depois. tendi estimular o leitor a pensar sobre a pergunta e seu lugar na
entrevista de ajuda. Envolvo-me intensamente com o assunto e,
"Há quanto tempo seu pai está paralisado?" suponho, demonstro isso. Colocar minhas idéias no papel foi
"Não entendi bem o que levou você a mudar de emprego. muito útil para mim. Espero que venha a ser de utilidade para
Você poderia me falar um pouco mais sobre isso?" você também - quer concorde ou discorde, quer se abstenha de
"Acho que compreendo quais foram seus sentimentos em julgar. Se, como resultado da leitura deste capítulo, você se tor-
relação a Mary, mas como é que Phil entra na história?" nou mais consciente das perguntas que faz, é porque houve co-
"Estou tentando imaginar como você se sentiu quando Jim municação.
voltou para casa depois do acidente."
"Você já se submeteu a alguma cirurgia antes?"
"Posso interrompê-lo um momento para perguntar se você
falou com o diretor?" ·

Por fim, posso considerar necessá1io perguntar alguma coi-


sa que pode ajudar o entrevistado que tem dificuldade em conti-
nuar falando, embora pareça ter mais coisas a dizer. Isso exige
habilidade. O entrevistado simplesmente pode estar tomando
fôlego e, ao interrogá-lo, posso tirá-lo de seu caminho. Sem
dúvida, há riscos, mas a pergunta certa no momento certo pode
6. eomunicação

Neste capítulo discutiremos a comunicação. Em certo sen-


tido, estivemos discutindo-a até agora. Sem comunicação, não
haveria entrevista. Entretanto, como bem sabemos, há entrevis-
tas - e mesmo entrevistas de ajuda - nas quais a comunicação
está longe de ser perfeita. A meta do entrevistador é facilitar a
comunicação, mas freqüentemente surgem obstáculos que a
impedem, distorcem ou complicam. Obviamente, há vários fa-
tores que podem ajudar ou impedir a comunicação, e já indi-
quei alguns e fiz referência a outros. No presente capítulo, in-
cluirei tais fatores em uma estrutura que lhes dê mais sentido.
Também sobre a comunicação, como sobre muitas outras coi-
sas neste volume, não disponho de um enfoque original; mas o
considero adequado, claro e simples. Funcionou melhor para
mim do que qualquer outro esquema que tentei anteriormente;
e, na prática, descobri sua validade. Esse esquema inclui dois
conceitos básicos: defesas e valores.

Defesas e valores

Quanto menos defensivos nos tomamos como entrevista-


dores, mais poderemos ajudar o entrevistado a deixar de lado
~1-=2_:_
4 _ _ _ _ _ __ __ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda 125
Comunicação _ __ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __ _ _ _

suas defesas. Em conseqüência, aumentará a comunicação en- coisas, mas sabíamos onde estávamos . Agora sei que aprendi
tre os dois. Quanto mais consciência tivermos de nossa escala mais dele naquelas conversas do que durante os quatro nnos que
de valores, e quanto menos quisermos impô-la ao entrevistado, passei na escola. [u não soube na época, mas ele me ensi nou a
mais estaremos aptos a ajudá-lo a ter conhecimento de seus pró- pensar e a ver o que estava fazendo. Depois de algum tempo,
prios valores e a mantê-los, adaptá-los ou rejeitá-los, como me- acho que ele se cansou, e não o culpo . Acho que me considerou
lhor lhe parecer. Conhecendo meus próprios valores, posso afir- um caso perdido, e nunca saberá o quanto me ajudou. Levou
má-los. Se puder aceitá-los como uma parte em mutação de anos para que eu mesmo descobrisse."
meu próprio eu em mudança, estou pronto a aceitar os do entre- Sempre que o entrevistador fala direta ou indiretamente ao
vistado do mesmo modo, e como uma parte em mudança de seu entrevistado: "Você não pode dizer isso", está usando seu siste-
eu em mutação. Alguns desses meus valores podem ser cons- ma de valores para bloquear a comunicação. Sempre que decla-
tantes para mim, e alguns para ele; mas não devo temer expor ra aberta ou implicitamente: "Eu não quero ouvir isso", está di-
os meus, nem devo temer ser exposto aos dele. Por sua vez, ele zendo ao entrevistado para não se comunicar, para envergonhar-
pode aprender a não recear expor seus valores ou expor-se aos se, manter-se em silêncio. Se o entrevistador não ouvir, quem o
meus, porque saberá que não está sendo ameaçado. Nessa fará? Sempre que o entrevistado diz a si próprio: "Não posso
atmosfera, ele poderá aprender a descrever seus valores sem falar disso" ou "Ele não quer ouvir isso", há obstáculos à boa
medo de ser julgado. Não precisará defender-se, porque não se comunicação. Podem ter surgido por si, mas também podem
sentirá atacado. Percebendo que não há necessidade de adapta- refletir o comportamento do entrevistador. É bem diferente se o
ção aos valores do entrevistador, poderá descobrir aqueles em entrevistador pensa: "Sei que ele não gostará de ouvir isso, mas
que realmente acredita.
sei também que aceitará." Nunca podemos ter certeza, é claro,
Há algum tempo, conversei com um jovem que, ao relem- de como o entrevistado nos aceita, do que vê em nós ou quem
brar seus tempos de escola, assim se referia a um de seus pro- lhe lembramos. Ao que parece, a única escolha plausível é ser-
fessores :
mos autenticamente nós mesmos, tanto quanto possível, e não
"Ele foi meu professor por três anos no secundário, e eu o nos comportarmos de maneira defensiva sempre que possível ,
fiz passar um mau bocado. Eu era um demônio, e odiava o na esperança de que eventualmente ele nos veja como somos.
sujeito. Era o que eu pensava então, mas não era apenas ódio. Rogers ( 1961 , cap. 17) salientou que nossa própria neces-
Ele não me deixava sair da aula sem alguma coisa e, muitas sidade de avaliação, afirmação ou negação, constitui o maior
vezes, me segurava depois do horário para conversar sobre o obstáculo à boa comunicação, e estou convencido de que é as-
que havia acontecido em classe. Dizia-me exatamente o que sim. Por exemplo, se, quando o entrevistado me diz que todos na
sentira, e me lembro de ter dito uma porção de coisas ... Não sei reunião se voltaram contra ele, eu demonstrar interesse em sa-
exatamente por quê ... Acho que eu confiava nele. Agora, perce- ber como ele viu a situação, estou abrindo as portas para a co-
bo que o professor nunca me disse que ele estava certo e eu municação. Pelo contrário, se lhe digo que certamente a coisa
errado. Disse que havia coisas que eu fazia, que ele não podia per- não foi tão terrível, que exagera e que talvez estivesse em falta
mitir, ou algo semelhante, e me explicou por quê. Contei-lhe como com as pessoas que se voltaram contra ele, estarei fec hando as
me sentia em relação aos colegas da classe, e como a escola era portas. No caso anterior, minha resposta o levará a explorar como
chata. Ele ouviu. Nunca chegamos a um acordo sobre diversas lhe parece a situação. Poderei então ser capaz de ajudá-lo a exa-
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6 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Comunicação _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _127
_

minar mais além, e a esclarecer seu papel, bem como sua per- mente contra mudanças . Seus valores são um escudo seguro para
.cepção dos outros e a dele sobre si mesmo. No último caso, mi- repelir a ameaça.
nha resposta revela-lhe em essência que julgou mal a situação, Muitos entrevistadores que aprenderam a se revelar sem
e que a culpa pode ter sido dele. Em conseqüência, ele pode medo, descobriram que os entrevistados absorvem essa lição a
sentir necessidade de se defender contra meu julgamento, e partir de seu exemplo. O entrevistador pode permitir-se descre-
assim deixar de analisar a situação. ver como percebe o comportamento do entrevistado, sem que
Outro exemplo: o entrevistado me diz que gostou de um este se sinta avaliado ou rotulado. O entrevistador, por exemplo,
determinado livro, e eu lhe digo que não gostei; ele abster-se-á pode dizer: "Essa velha história me aborrece", ou "Pela maneira
de examinar o que o atraiu no livro, ou se sentirá no dever de de- como você falou, sinto que deve haver mais do que isso'', ou
fender seu gosto. Por outro lado, se eu mostrar interesse em sua "Fico um pouco aborrecido com esses sorrisos, e estou tentan-
opinião, ele poderá se sentir encorajado a discutir o livro e ex- do imaginar como você se sente de verdade a meu respeito'', ou
plorar o que lhe chamou a atenção . Em conseqüência, pode co- "Eu sinto que você quer que eu lhe diga o que é certo para você,
meçar a aprender alguma coisa sobre si próprio, tais como seus
mas não posso fazer isso".
gostos e simpatias, seus valores . Tendo sido ouvido atentamen-
te, pode querer ouvir m inhas opiniões porque ficou realmente
Autoridade como defesa
interessado em meus valores - mas vendo-os como meus, não
como seus. Como resultado, nossos respectivos valores pode- Às vezes o entrevistador emprega sua autoridade como uma
rão ou não ser modificados, mas pelo menos saberemos como defesa, como uma barricada. "Os professores nunca erram", "O
ambos nos sentimos em relação ao livro. médico sabe o que é melhor", e "Os adultos têm mais experiên-
A comunicação não melhora essencialmente se apenas con- cia" - com freqüência são expressões convenientes de defesa.
cordo com o entrevistado quando esse declara gostar de um certo Não resolverão o problema do entrevistado, mas servem para
romance. Na realidade, não descrevemos, nem aprendemos nada proteger o entrevistador de um "ataque" sob a forma de uma
sobre nossos respectivos valores. Em outras palavras, não sabe- busca honesta da parte do entrevistado, um confronto real com
mos o que leva cada um de nós a gostar do mesmo livro. Um sua situação. Diante de uma aparência de superioridade, o en-
pode ter gostado devido ao enredo; o outro devido à brilhante trevistado deve se defender da melhor maneira possível. Se ele
caracterização das personagens. As razões para gostar da mesma a percebe como expressão dos valores do entrevistador, poderá
coisa podem ser bem diferentes. No que diz respeito à comunica- submeter-se ou empunhar um escudo para defender seus pró-
ção, o fato de ambos gostarmos é muito menos significativo do prios valores. Prevalecerão dois grandes obstáculos à comuni-
que o fato de sermos capazes de expressar nossas razões. cação: o uso da autoridade pelo entrevistador e o uso, pelo en-
Existe uma possibilidade real de que, em conseqüência de trevistado, de armas para combatê-la.
nossa descrição mútua, a percepção de um ou de ambos venha a Não estou sugerindo que nosso papel - nossa função na so-
modificar-se. Para algumas pessoas, isso é um desafio: elas o ciedade e na vida do entrevistado - não esteja relacionado com
tomam como parte de seu crescimento. Para outras, significa a autoridade; ele está. A questão é como empregamos essa au-
perigo; a mudança é uma ameaça, e não podem permitir que a toridade na entrevista de ajuda, e visando a quais finalidades.
comunicação seja clara e direta. Elas se defenderão obstinada- Enquanto transcorre a entrevista, estamos indicando, sugerindo
Comunicação _ _ _ _ _ _ _ _ __ 129
.::.1.::.
2.8::.. _ _ _ _ _ __ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda

ou dizendo: "Isso é um segredo profissional", "Isso não pode olhar e corresponder a todos os aspectos de uma determinada
ser discutido", "Você tem que aceitar minhas palavras", "Eu sei situação. Podemos ajudar o entrevistado a chegar a uma deci-
o que é melhor", "Isso é o ponto final, não há nada mais a acres- são. Podemos mesmo construí-la por ele, em certo sentido.
centar?". Quando o entrevistado se defronta com tais atitudes, Mas, o que quer que façamo s, estaremos fazendo com ele, e não
não é surpresa que se sinta cercado e tratado como.um objeto. para ele. Ele irá considerar-se um igual , permitindo-se tomar de
Talvez ele se submeta, tomando-se dessa forma dependente da nós o que escolher, e rejeitar o que não é para ele.
autoridade. Talvez ele se rebele, visando à sua autodefesa. O que
faltará vai ser a livre e aberta expressão, e uma troca de idéias e Resultados de teste como defesa
sentimentos. A comunicação terá sido obstruída. Os entrevistadores tendem a valer-se de um outro escudo
A alternativa é a atmosfera em que prevalece um senso de defensivo . Escondendo-se atrás de diagnósticos e de resultados
igualdade - não a igualdade de conhecimento, experiência ou de teste, perdemos de vista a pessoa e, em seu lugar, vemos a
habilidade profissional, mas igualdade de importância e de dig- categoria em que foi colocada. No entanto, penso que percebe-
nidade, em que cada ser humano respeita integralmente o outro. mos cada vez mais que diagnósticos podem estar equivocados,
Dessa maneira, como entrevistadores, não dispomos de ne- e que resultados de teste fornecem apenas uma parte do quadro.
nhum escudo defensivo: somos vulneráveis. Nada tendo a es- Apesar de hoje termos à disposição mais testes psicológicos e
conder, podemos surgir como pessoas autênticas, tentando aju- psicométricos do que antigamente, muitos ainda estão em seu
dar de verdade uma outra pessoa. O entrevistado descobrirá logo estágio experimental, e raramente podemos considerá-los con-
que não somos onipotentes, sábios e nem o receptáculo de to-
clusivos. E o que é pior para nós e nossos entrevistados: peritos
das as virtudes humanas. Quanto mais cedo descobrir, melhor
igualmente qualificados podem chegar a diagnósticos diferen-
para ele e para o nosso relacionamento. Percebendo que não
tes, pois a interpretação do teste depende em grande parte de
somos um livro fechado, ele pode permitir-se folhear as pági-
idiossincrasia s do psicólogo que o interpreta . Na realidade, tra-
nas de si mesmo. Descobrirá que a armadura que trouxe consi-
ta-se de um escudo frágil - o que pode explicar por que às vezes
go, como resultado de hábitos e experiências, não é necessária.
é sustentado com tanta tenacidade. Se gostamos ou não, o fato é
Desde que esteja em confronto com uma pessoa verdadeira,
que mesmo na medicina, em que os diagnósticos são quase sa-
descobrirá que pode expressar seu verdadeiro eu. Também para
crossantos, especialistas concordes quanto ao diagnóstico com
ele não haverá lugar onde se ocultar, mas não estará sozinho.
freqüênci a sugerem vias opostas de tratamento . E mais , a opi-
Um outro estará ali, quando começar a aceitar-se.
nião médica parece concordar hoje em que, a menos que o
Você realmente possui as respostas? Estamos certos de
nossas certezas? Nossas conclusões são necessariamente corre- paciente queira melhorar, pouco pode ser feito por ele. Como
tas só porque são nossas? Numa atmosfera em que um igual em todas as relações efetivas de ajuda, o paciente está no cen-
encontra outro igual, nossas certezas podem muito bem ceder tro; devemos chegar até ele, e começar daí. Os diagnósticos e os
lugar a uma atitude de "Vamos ver" ou "Vamos tentar". Talvez resultados de teste podem afastar os entrevistados de si mes-
isso seja apenas provisório, mas deve ser entendido por ambos mos, o que não acontece com a confrontação humana e aberia.
e, em conseqüência, ser importante para ambos. Livre de escu-
dos de defesa, não nos resta alternativa senão sermos flexíveis,
_1_3 _0 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda
Comunicação _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _131
_
Julgamento como defesa
parte se apega firmemente ao seu ponto de vista; é pegar ou lar-
Devemos fazer menção de uma última forma de defesa: o gar, e não, dar e receber. Gradualmente a entrevista chega a um
julgamento do entrevistado. Também isso constitui um obstá- ponto morto. A sessão não termina de verdade, mas é como se
culo para a comunicação aberta, posto que encoraja a racionali- nada mais pudesse ser dito ou feito. Entrevistado e entrevista-
1,ação do nosso co mportamenlo, em lugar de nos defrontarmos dor parecem estar dizendo um ao outro: "Essa discussão não nos
com ele. Julgamos que o entrevistado não é "cooperativo", que leva a nada, e portanto podemos parar. Você não me ouve e eu
é um "criador de casos em sala de aula", que é "agressivo", que não o ouço, então de nada adianta." De fato, é inútil. Contudo,
é "submisso", que é um "excêntrico", etc. Em conseqüência, o mesmo nesse ponto, se pudermos ser suficientemente honestos
vemos assim e, muitas vezes também ele se verá dessa maneira. para perceber o que está acontecendo, e expressá-lo, a situação
Mas isso é o seu eu verdadeiro, todo ele ou apenas uma parte? pode ser salva. "Estivemos gritando um para o outro, e agora
Ou é nossa percepção dele, e uma percepção em determinado parece não haver mais nada a dizer. Acho que tiramos tudo o
lugar e sob certas circunstâncias? Incorremos em erro? Mesmo que havia em nosso íntimo para fora, mas não estou certo se
que estejamos certos, que o "julguemos" corretamente, julga- atingimos um ao outro. Francamente, assim que a discussão foi
mos também a nós próprios? Poderia ele estar agindo dessa for- esquentando, eu escutei você cada vez menos; suponho que
ma por nossa causa - devido à sua percepção de nós ou de sua aconteceu o mesmo de seu lado . Por que não admitimos que fi-
reação à nossa percepção dele? zemos um péssimo papel, e tentamos novamente?"
Estudantes que tentam ouvir gravações de suas entrevistas,
com o mínimo possível de defesa, muitas vezes se perguntam
se julgaram corretamente o entrevistado, ou se seu julgamento Tratando com obstáculos
não teve o menor significado. Também os entrevistados, ouvin-
do suas próprias gravações, indagam se perceberam acertada- Há sempre meios pelos quais descobrir em que medida os
mente o entrevistador e o julgaram com justiça. É impressio- obstáculos à comunicação estão presentes: conferir anotações,
nante o quanto os dois se aproximam na entrevista em que am- ouvir fitas gravadas e discutir a entrevista com outros profissio-
bos abandonam as armaduras defensivas. É então que ocorre a nais. Esses testes e tarefas auto-impostos, por assim dizer, não
verdadeira confrontação, e as freqüentes discussões em entre- são completamente seguros. De qualquer modo, sem dúvida é
vistas tendem a desaparecer. Para mim, discussão não quer di- válido dizer que em toda entrevista existem, em certa medida,
zer discordância honesta, ou luta aberta entre valores. Pelo con- obstáculos à comunicação. Nosso objetivo não é eliminá-los,
trário, significa mal-entendido, confusão, tentativa de um estar pois nossa incapacidade de fazê-lo pode nos conduzir ao deses-
por cima do outro, colocação de pontos de vista· sem relação pero; pelo contrário, o que se visa é tomar consciência de nossa
com o que está sendo ouvido, falar mais para o gravador do que conduta nas entrevistas, para verificar onde estamos criando
para o outro . obstáculos, e tentar reduzi-los o máximo possível, sempre reco-
Descobri que à maior quantidade de obstáculos à comuni- nhecendo que continuamos humanamente falíveis. As cinco
cação corresponde mais discussão. Isso não deve nos surpreen- maneiras de reduzir os obstáculos, que passo a discutir, me aju-
der, porque a discussão é a resultante desses obstáculos. Cada daram e a muitos de meus alunos.
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O quanto você fala do. Nossos motivos podem ser os melhores: mostrar que en.ten-
Se você tende a falar tanto ou mais que o entrevistado, é demos tão bem que podemos terminar a sentença do entrevista-
muito provável que esteja bloqueando a comunicação dele com do em seu lugar, demonstrar nosso interesse através de pergun-
você. É muito provável que esteja agindo como autoridade, tas intercaladas. Não obstante nossos motivos, estamos de fato
como um superior na entrevista, que deve ser respe.itosamente barrando aquilo que vem em nossa direção, apesar de acreditar-
ouvido, e que seja dessa maneira que o entrevistado sente. Tal- mos sinceramente que estamos esti mu lan do mais o fluxo da
vez você esteja fazendo uma conferência, em lugar de tomar conversa.
consciência suficiente da estrutura de referência interna do Às vezes, as interrupções conduzem a uma espécie de dueto;
entrevistado. E isso leva o entrevistado a ter consciência demais ambos os interlocutores falam ao mesmo tempo - um continua
da estrutura interna do entrevistador. com o que estava dizendo quando interrompido, e o outro prosse-
Se você perceber que está falando muito pouco - cerca de guindo sua interrupção. Quando percebemos o qu~ .está .aconte-
10% ou menos do total da conversa - talvez você queira saber o cendo, possivelmente o melhor é parar e, se necessano, di~er cla-
porquê disso. Existem muitas pausas e silêncios embaraçosos? ramente o que houve. Mas essa explicação deve ser rápida, ou
Você fala pouco porque está relutando em interferir no caminho também poderá constituir-se numa interferência. "Desculpe, con-
do entrevistado, mas descobre que, em se contendo, você faz tinue": isso pode ser o suficiente. Às vezes, o entrevistado, tr~ina­
exatamente isso, apesar de tudo? Ambos estão à vontade com o do a respeitar "a autoridade'', pára no caminho, assim que abnm?s
fato de que você esteja falando tão pouco, ou a atmosfera pare- nossa boca. Nessa circunstância, é bom falar um pouco mais:
ce pouco natural e tensa para os dois? Se você acha que o pouco "Desculpe a interrupção, falei rápido demais, vá em frente que eu
que diz permite ao entrevistado expandir seus sentimentos e falarei depois, quando você terminar."
expressar suas idéias e, ao mesmo tempo, lhe permite continuar Devemos nos tomar especialmente sensíveis às. interrup-
com ele, talvez você tenha construído um bom relacionamento. ções do entrevistado. Elas podem indicar que não o entende~os
A quantidade de conversação é apenas um índice do que ocorre direito, que ele decidiu acrescentar ou emendar alguma coisa
na entrevista, e deve ser vista dentro do contexto integral do ou que, por uma razão ou por outra, encontrou dificuldades er:n
processo. continuar ouvindo. Algumas observações do entrevistado - tais
como: "Eu estava falando, ouça-me por favor", ou "Fui cortês
Interrupções ouvindo-o, então por favor seja gentil e me escute" - geralmen-
te agregam um insulto à indelicadeza. A entrevista de ~juda n~o
Você costuma deixar o entrevistado finalizar o que está fa- é um exercício de boas maneiras, a menos que esse seja o obje-
lando, ou muitas vezes termina por ele, e já dá a resposta? Você tivo. Qualquer que seja o caso, se o entrevistado nos interrom-
tende a interrompê-lo porque é rápido em captar suas intenções, pe, e desejamos remover o máximo possível dos obs~áculos à
e fica impaciente? Acreditando que já ouviu muitas vezes o que comunicação, a sensibilidade de nossa parte ao que esta aconte-
ele está dizendo agora, você fica aborrecido e corta a conversa? cendo poderá ajudar a encontrar as causas . Se realmente desej~­
Depois de suas interrupções, o que acontece com a fluidez da mos ouvir o entrevistado, a melhor coisa a fazer é parar e ouvir.
entrevista? Uma interrupção cria um grande obstáculo à comu- Sempre haverá tempo para expor nossas opiniões. Infelizmente,
nicação: interrompe a comunicação que realmente está se dan- muitas vezes nossa necessidade de falar é maior que nossa ca-
Comunicação _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _1_3 _5
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aula. O teste é desafiador e difícil, mas descob1i que as pessoas


pacidade de ouvir. Isso é uma falha muito humana, mas, desde valorizam a experiência de aprendizagem implicada, dela reti-
que crie obstáculos à comunicação, deve ser superada. rando uma satisfação autêntica. Duas ou mais pessoas são con-
vidadas a discutir um tópico sobre o qual possuem diferentes
Respostas pontos de vista. Cada um tem permissão para dizer o que qui-
Estou respondendo ao que o entrevistado expressou ou ser, mas com uma condição: antes de emitir seus pontos de vis-
àquilo que, em minha opinião, ele deveria ter expressado? Em ta, deve reorganizar as idéias e sentimentos expressos pela pes-
outros termos, estou respondendo às suas necessidades ou às soa que a precedeu, de modo a deixá-la satisfeita. A suposição
minhas? Minhas respostas o habilitam a se expressar ainda mais? implícita aí é que, se eu for capaz de contar o que você disse e
Minhas respostas são claras? Estou me fazendo entender? Mi- sentiu, então o escutei e o entendi. Se não puder, coloquei obs-
nhas respostas criam obstáculos adicionais àqueles que o entre- táculos no caminho ou você não se fez suficientemente claro.
vistado já está enfrentando? Para resumir, minhas respostas são Desse modo, o teste motiva aquele que fala a esclarecer seu
uma ajuda ou um obstáculo à fluidez de sua conversa? Consi- pensamento, e o que ouve a concentrar-se mais no que está sen-
deraremos mais amplamente esse aspecto no capítulo seguinte. do dito do que na resposta que dará. Quanto mais predomina-
rem os sentimentos durante a conversa, mais difícil será obede-
Forças e facetas cer à regra. Às vezes as coisas atingem um tal ponto que é ne-
cessário haver uma pessoa neutra. Assim que cada participante
Qualquer tópico discutido em uma entrevista de ajuda apre- fala, ela recoloca - até que esse se declare satisfeito - o que ele
senta geralmente várias facetas. Ajudo o entrevistado a ver, dis- disse e sentiu, antes que o participante seguinte possa falar.
cutir e aceitar o maior número possível dessas facetas. Quando Na entrevista de ajuda, nem sempre vamos querer recolo-
uma ação está sendo considerada, é comum que certas forças car os pensamentos e sentimentos expressos pelo entrevistado,
empurrem o entrevistado num sentido, e outras em sentido con- mas se formos capazes de recapitular sua mensagem para nós,
trário. Essas forças antagônicas podem dar-se ao mesmo tem- ficará demonstrado que existem obstáculos mínimos para a
po. Estou ajudando o entrevistado a explorar todas as direções, comunicação. Em outros termos, se posso criar uma atmosfera
ou meu comportamento o impede de fazê-lo? Coloco obstáculos na qual você libera seus sentimentos e idéias sem minha inter-
ao curso de sua exploração do próprio espaço vital e campo per- ferência, e se posso reconhecer essas idéias e sentimentos como
ceptivo? Não conseguimos responder sempre a essas perguntas seus, é provável que estejamos nos comunicando realmente, e
difíceis; mas, pelo fato de colocá-las, podemos remover as bar- que os obstáculos sejam mínimos. Mais ainda, nessa atmosfera,
reiras à comunicação . você será receptivo às idéias e sentimentos que eu lhe comuni-
car. Assim, o resultado será uma verdadeira entrevista.
Um útil teste de comunicação
Em um artigo muito conhecido, "Dealing with Breakdowns Quando o entrevistado não quer falar
in Conununication Inlerpersonal and Intergroup", escrito em
1951, Rogers (1961, cap. 17) refere-se a um interessante teste
A entrevista não consiste apenas de conversação; existe
de comunicação que freqüentemente é empregado em treina-
ainda uma comunicação não-verbal. No entanto, se não houver
mento de relações humanas e em várias situações de sala de
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conversa nenhuma, não poderá existir uma entrevista. "O que


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fazer se o entrevistado não fala, ou não quer continuar a falar?" em si próprio, que o impedem de ir adiante. A resposta ao silên-
- essa é uma pergunta freqüente. Estou certo de que, em muitos cio embaraçoso dependerá da percepção do entrevistador sobre
casos, o entrevistado falará se lhe for dada a oportunidade. o que está acontecendo. Só posso sugerir maneiras possíve is de
Certa vez encontrei uma jovem que desejava discutir seu rela- reabrir a comwücação.
cionamento com o marido. Ela insistia que ele era do "tipo
silencioso", e que raramente falava. Concordamos em nos reu- "Há algo mais que você desejaria falar?" (Entrevistado
nir os três. O marido falou - pelo menos tentou - mas, cada vez meneia a cabeça) "Muito bem, eu gostaria de fazer mais um
que começava, sua mulher o interrompia. Percebendo isso, não comentário .. ."
pude deixar de sorrir. A jovem entendeu meu sorriso, e fez um "Vejo que você está com dificuldades para continuar. Estou
tentando imaginar se seu silêncio tem relação com algo que eu
esforço supremo para não interrompê-lo. A última vez que a vi,
tenha dito."
ela me informou bem-humorada que seu marido não pertencia
"Não sei exatamente o que fazer para quebrar esse silêncio.
mais ao tipo silencioso, e que ela havia aprendido muita coisa Talvez haja alguma coisa que você tenha dificuldade de pôr em
sobre seu próprio comportamento. palavras."
Admito que nem sempre seja tão simples assim, mas se o "A última vez que ficamos em silêncio como agora, você
entrevistado tem interesse na entrevista geralmente falará, se o disse que era por causa de algo que eu havia feito. E desta vez?"
deixarmos ou o encorajarmos um pouco. De outro lado, talvez
ele não deseje a entrevista, e se sinta obrigado a comparecer
pela pressão dos outros, ou talvez de nós mesmos. Nesse caso, Preocupação consigo mesmo
talvez seja preferível que indiquemos aceitar e entender sua re-
lutância, e então deixar de forçá-lo ainda mais. Quando estiver O fator básico da comunicação se relaciona mais ao com-
pronto, ou "motivado", retomará e falará. Se não retomar, não portamento do enh·evistador do que ao do entrevistado. À medida
será porque fizemos conscientemente da experiência uma amea- que a entrevista se processa, você, o entrevistador, pode estar se
ça ou algo desagradável. Nem todos querem ser ajudados, e interrogando sobre o que dizer ou fazer em seguida. Essa preocu-
nem todos podem ser ajudados na entrevista de ajuda. É doloro- pação com seu próprio papel pode absorver tanto sua atenção,
so ver uma oferta de ajuda recusada, mas devemos aprender a que não estará realmente ouvindo o entrevistado. Você estará
aceitar a recusa. Eventualmente podemos até aprender a aceitar preocupado com aquela vozinha interior que insiste em saber o
o fato de que, em situações em que "falhamos", outro entrevis- que fará a seguir. Essa voz interior constitui um verdadeiro obstá-
tador pode ser bem-sucedido. culo à comunicação. Não deve ser confundida com a outra voz
Mas o que fazer se o entrevistado não quiser continuar a interior, que leva você para mais pe1io do mundo do entrevistado
falar? Aqui, estou supondo que houve comunicação, e que o - aquele "terceiro ouvido" com que você subitamente entende
contato foi estabelecido. Se, então, o entrevistado parar, talvez alguma coisa expressa vagamente. A voz que insiste em saber o
seja por ter terminado. Ou talvez o entrevistador tenha posto que fazer a seguir é um muro entre você e o entrevistado. Está
obstáculos no seu caminho, do tipo discutido anteriormente. Ou mais preocupada com você do que com ele, mais com a impres-
talvez o entrevistado tenha encontrado novamente obstáculos são que você vai causar do que com as impressões que ele lhe
provocaria se estivesse ouvindo e tentando entendê-lo.
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_1_3_8 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda
obstáculo à comunicação. Se pudermos nos aceitar como falí-
Então você não deve se importar com o que vai fazer ou veis, erraremos menos. Se aprendermos a nos apoiar em nossa
dizer? É claro que deve, mas não conscientemente, enquanto o espontaneidade, sensibilidade e senso comum, escutaremos
entrevistado estiver se expressando. Quando você realmente melhor e entenderemos mais. Nosso comportamento influencia
ouve, quase inevitavelmente ocorre uma pausa entre o momento 0 do entrevistado mais do que imaginamos. Comportando-nos
em que o entrevistado pára e a sua deixa. O que quer que diga abertamente, encorajamo-lo a agir da mesma forma.
ou faça em seguida, não será premeditado. Pode não estar poli-
do, nem cuidadosamente burilado, mas será autêntico. Virá
para fora espontaneamente, como resultado de você ouvir de Fornecendo informações de que o entrevistado necessita
verdade. De modo algum você terá planejado sua ação, ao pre-
ço de ter perdido o que o entrevistado dizia. Você não se parecerá Nesse ponto, quero discutir um obstáculo à comunicação
com o entrevistador "ideal", mas se parecerá com você mesmo. que muitas vezes não é percebido como tal, sendo inteiramente
O entrevistador "ideal" não existe, mas você sim, e se o entre- desprezado. Estou me referindo a certos aspectos implicados
vistado puder sentir você autêntico, não-programado, espontâ- no processo de fornecer informações ao entrevistado.
neo, terá uma experiência rara em nossa sociedade. Poderá até No entanto, antes de mais nada, observemos as seguintes
ousar aprender com essa experiência. circunstâncias especiais. Algumas vezes, quando o entrevistado
Por outro lado, se o entrevistado sentir que estamos ocupa- pede ao entrevistador alguma informação, este pode não querer
dos, não com o que ele está dizendo, mas com a eventual res- fornecê-la porque pensa que o entrevistado já a possui ou pode
posta, isso pode prejudicar a relação entre nós. Desse fato ele facilmente obtê-la por si próprio. Por exemplo:
poderá aprender uma lição que não gostaríamos que aprendes-
se: na entrevista, a coisa mais importante não é ser ouvido, mas Eto. Estou vermelho?
ter uma resposta. Agindo a partir dessa conclusão, também não Etr. Você está se sentindo embaraçado?
nos ouvirá, mas planejará suas respostas. Talvez isso pareça Eto. Pode me dizer se haverá esse curso no próximo outono?
absurdo, mas sei que acontece. Et~. As novas listas acabaram de ser publicadas; você pode pro-
Quando não se origina apenas da falta de experiência, essa curá-las.
preocupação consigo mesmo possui raízes profundas em outra
parte. Estamos mais preocupados em como aparecemos, em No primeiro exemplo, o entrevistador pode não ter querido
lugar de estarmos satisfeitos com o que somos. Estamos mais responder nem sim, nem não, pois supôs que o como o entrevis-
preocupados em demonstrar nosso papel do que em revelar tado se sentia era mais importante que qualquer outra informa-
nosso íntimo; em sermos percebidos como superiores, em vez ção que poderia fornecer sobre a cor de sua face. No segundo
de agirmos como um igual; em apresentar um show de autori- exemplo, pode não ter querido dar uma resposta definida por-
dade, e não deixar nossa autoridade - se ela existe, na verdade que quis encorajar o entrevistado a fazer por si mesmo, obtendo
- aparecer naturalmente na seqüência da troca de idéias e sen- informações adicionais durante o processo. No entanto, a falha
timentos. no fornecimento de certos tipos de informação pode criar obs-
Reitero minha convicção de que a preocupação do entre- táculos à comunicação.
vistador consigo mesmo, à custa do entrevistado, cria um sério

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140
- - - - - - - - - - - - - - - -- - - A entrevista de ajuda
Nessa categoria i
da , pode 1·mp e1rr
. a entre
mportante
·t de
.
mformação que, se forneci-
l Comunicação _ _ _ _ _ __ _ _ _ _ _ _ _ __ _ _ _ _ _ _
141

quear 0 progre ~ d. vr~ ª.ªavançar, e se não dada, pode blo- vir a afetá-lo. Quando adequado, isso me parece o melhor auxí-
S:;o, rscutrre 1 · · e: lio possível que uma respostn pode propiciar.
pedida pelo en trevistado
. T em pnmerro 1ugar . a ill!ormação
trevistador pos . · rata-se de conhecimento que o en- O entrevistador pode também dar, de maneira útil, infor-
sur, e o entrevist d - mações que o entrevistado não pediu. Pode lazer isso para redu-
dela e não pod b
A a o nao, mas sente que precisa
e o te-la por , . zir a tensão. Em certas ocasiões, o entrevistado pode querer per-
situações ' é provertoso
. da seus propnos. recursos. Em tais
seguintes a m ruma resposta drreta. Nos exemplos guntar, mas talvez não tenha coragem, nem saiba como fazê-lo.
' era reflexã 0 d 0 · Talvez o entrevistado nem sequer saiba que, se dispuser de toda a
verbal do fato d sentimento ou reconhecimento
e o entrevist d 0 . - informação necessária, se sentirá mais relaxado. Todas as decla-
não teria bastado: ª estar procurando a mformaçao
rações do en trevistador, a seguir, exemplificam essa abordagem :
Eto. Você conversou c
namos? om 0 Sr. Adams da maneira como combi- "O dinheiro ainda não chegou; sei que você deve estar an-
sioso."
Etr. Sim, tivemos um
logo perceb a co~versa. Há algumas coisas que a gente "Sou a pessoa qu e se encontra com os pais das crianças que
que amb e, mas ha outras pelas quais é dificil acreditar ficam conosco. Você pode me telefonar, e marcaremos um
E to. y oce, sabeos se
esteJam
ganb falando
. b do mesmo acidente. encontro, toda vez que desejar discutir assuntos referentes à esta-
Etr . N-ao, ainda
. não se.. eia olsa. de estudos?. da de Peggy. Uma vez por mês haverá um encontro de todos os
Eto. Eu se tº . i, mas assim que souber eu aviso. pais, no qual..."
, n :rei a operação?
Etr. Voce nao sentirá n d "O Sr. S. está doente hoje. Estou no lugar dele. Ficaria con-
verá um ªª
pouco de dor d
durante a operação, mas depois ha-
t l .
tente em poder conversar com você, a menos qu e prefira esperar
que ele retome. "
sível par uran e a guns dias. Faremos o pos-
a que você se sinta b . . d. "Eu vi você colando do Joe, e seus dois exames são pratica-
não será m · em, mas nos pnmeiros ias
, uito confortável. mente idênticos. Antes de dizer qualquer coisa, queria que sou-
Eto. La na fábrica ele b .
Etr. Que et .b _s sa em que estive no hospital X? besse disso. "
I sai a nao Est . .
sente a esse respeito..· ou tentando imaginar como você se "Tenho a impressão de que está imaginando se eu sei mais
Eto. Se eu precisar dur , . sobre você do qu e o que me contou . Para dizer a verdade, eu sei.
com você? ante as fenas, posso entrar em contato O Dr. D. me contou sobre sua doença, e quis que eu lhe contasse
Etr. Não, não é possível isso. Estou contente por saber, porque a si m posso entender
durante m·nh , ' _mas a Sita. C. estará à disposição, melhor a situação. Como será que você se sente sobre isso ... quer
i a ausencia y - , dizer, sobre o fato de que eu se i."
mas tamb , · oce quer que eu va e descanse
em quer me ter o mais perto possível. ' "b tarei livre até o meio-dia, e assim temos muito tempo, e
você pode me dizer o que quiser, sem pressa."
Em alguns dos exem l .
da informação solicitada P os _acima, o entrevistador vai além
referência do entr . · Relaciona-a com o esquema interior de Um último aspecto. Eu, o entrevistador, posso remover um
se pelo que sio-nif evrstado, e desse modo demonstra seu interes- obstáculo à comunicação dizendo ao entrevistado francamente
b • ..., rca a resposta .
para o entrevistado, ou como pode o que estou fazendo ou me propondo a fazer, e quais as minhas
razões para tanto. Isso eliminará a aura de mistério que cerca
_1_42_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda

meu status, e indica que, na entrevista de ajuda, ele pode tam-


bém ser franco. Alguns exemplos:
7. Respostas e indicações
"Eu gostaria de escrever e pedir a ele as gravações, e então
poderemos compará-las. Está bem?"
"Não estarei aqui na próxima terça-feira, porque tenho um
compromisso mais cedo. Que tal quarta-feira?"
"Vou lhe dar a injeção agora. Vai doer um pouco. Então,
você terá que ficar deitado por mais ou menos 1O minutos, e
depois poderemos continuar com os exames. Não estou esconden-
do nada, portanto, pode relaxar."

Por vezes não poderei fornecer determinadas informações


porque não as possuo, e gostaria de contar isso ao entrevistado.
Por exemplo: "Ainda não posso lhe informar sobre o acampa-
mento de verão para Janet porque a comissão ainda não chegou Neste último capítulo, vamos nos concentrar nas respostas
a uma decisão. Teremos de esperar." e indicações. Vou abordar as já mencionadas, porém não colo-
cadas no presente contexto, bem como outras ainda não referi-
das. Considerando que o número de respostas e indicações é
praticamente ilimitado, não vou nem mesmo tentar ser abran-
gente, mas somente considerar aquelas que são usadas com mais
freqüência. Embora não tenha a pretensão de ser imparcial, ten-
tarei ser honesto.
A diferença entre resposta e indicação não pode ser clara-
mente definida, pois uma resposta pode transformar-se em uma
indicação e uma indicação pode ser considerada como resposta
e interpretada como tal. Entretanto, há uma diferença básica na
maneira como os entrevistadores individualmente indicam e
respondem, e isto se tomará evidente quando examinarmos o
estilo particular que cada entrevistador desenvolve e considera
mais compatível. Trechos de entrevistadores escolhidos ao aca-
so podem apresentar um quadro enganoso. Os trechos que trans-
creverei, portanto, têm a finalidade de identificar e analisar a
resposta ou indicação particular, e não se relacionarão com o
estilo do entrevistador. Desenvolver um estilo é uma tarefa que
cada entrevistador, se tiver interesse, deve cumprir, por si mes-
mo, da forma menos ameaçadora e mais útil para ele.
_1_4 _4 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Respostas e indicações ____ __ __ _ _____ - 145

A diferença essencial entre resposta e indicação se caracte- muito diretiva pode ser útil em uma situação em que de nadava-
riza já nas definições das duas palavras. Quando respondo, falo lem o reconhecer nem o refletir sentimentos, e sabemos que a
em termos do que o entrevistado expressou. Reajo, com alguma recíproca também é verdadeira. Além disso, dispõe-se de evi-
coisa minha, às idéias e sentimentos que ele me comunicou. dências de pesquisa suficientes para demonstrar que é o entre-
Quando indico, começo a controlar. Expresso idéias e senti- vistador, como ser humano, a quem o entrevistado percebe,
mentos aos quais espero que o entrevistado reaja. A indicação, acima e além de qualquer teoria da entrevista que o entrevista-
naturalmente, pode também estar na resposta ao que já ocorreu dor defenda, ou de quaisquer indicações ou respostas que em-
na entrevista ou à última afirmação feita pelo entrevistado; en- pregue.
tretanto, implica geralmente uma atitude bastante diferente. Um outro aspecto deve ser enfatizado. Estou convencido de
Quando estou indicando, lanço mão do meu próprio espaço vital; que é um erro admitir que o entrevistador que fala pouco e usa
quando estou respondendo, inclino-me mais a utilizar o espaço mais respostas do que indicações é passivo, ou que o que fala
vital do entrevistado. As respostas do entrevistador mantêm o muito e indica com freqüên cia é ativo. Tal como vejo, ouvir com
entrevistado no centro das coisas; as indicações trazem o entre- compreensão não significa passividade. Familiarizar-se com o
vistador para o centro. Filosoficamente falando, os entrevista- espaço vital do entrevistado é realmente atividade. Um entrevis-
dores que geralmente empregam mais respostas que indica- tador que fala e indica extensivamente não pode, de modo
ções, parecem acreditar que a descoberta da saída está dentro algum, ser ativo nesse sentido. O que faz diferença é o grau de
do próprio entrevistado. Os que têm tendência a indicar, pare- envolvimento do entrevistador com o entrevistado - com seus
cem agir com a convicção de que o entrevistado precisa da saí- pensamentos e sentimentos, suas esperanças e seus medos, suas
da apontada pelo entrevistador. É evidente que aqui há muita percepções do mundo. Assim, o entrevistador pode estar muito
indefinição e superposição. As intenções do entrevistador são ativamente envolvido e não dizer quase nada, ou pode estar pas-
importantes, mas a maneira como o entrevistado as percebe é de- sivo, embora fale e indique durante a maior parte do tempo. A
cisiva. Para cada entrevistador existe a floresta e existem as ár- questão permanece: com quem está o entrevistador mais envol-
vores. A floresta é seu estilo global; as árvores, suas indicações vido? Repetindo: o entrevistador que está amplamente envolvi-
e respostas. Neste capítulo, deveremos examinar apenas as árvo- do consigo mesmo é ativo ou passivo, de uma forma claramente
res, na expectativa de que isto possa nos ajudar eventualmente a diferente do entrevistador que está envolvido fundamentalmente
olhar a floresta mais de perto e vê-la mais claramente. com o entrevistado.
Há alguns anos, Robinson (1950) apresentou uma lista gra- Apesar das indefinições, sobreposições e ambigüidades, as
duada de respostas e indicações, variando do que denominou a respostas e indicações serão descritas em uma certa ordem. Não
mais não-diretiva até a mais diretiva; isto é, das mais centraliza- de "bom" para "ruim", ou de "certo" para "errado", tampouco
das no esquema de referência interno do entrevistado até as ao acaso ou sem avaliação. Verifico realmente que, quanto mais
menos centralizadas nele. Basearei meu modelo na sua aborda- nos inclinarmos a usar as respostas e indicações relacionadas
gem, embora mantendo-me afastado da controvérsia não-direti- por último neste capítulo, menos estaremos levando em consi-
va/diretiva (Rogers, 1942) a qual- concordo - pertence ao pas- deração o entrevistado e seu mundo. Quanto mais empregar-
sado (para maiores detalhes, vide Rogers, 1961; Bugental, 1965; mos as respostas e indicações relacionadas no início, menos
Beck [ed.], 1966). Compreendemos hoje que tuna indicação provavelmente estaremos lhe impondo a nós e nosso mundo.
147
146 Respostas e indicações - - - - - - - - - - - - - - - -
_ _ _ A entrevista de ajuda
tendo em silêncio. Não estou com medo do silêncio porque sinto
Essa não é uma regra definitiva. Talvez nem mesmo seja con-
que é isso que você deseja." Muitas ve~es seus gestos comuni-
sistente. Entretanto, todos seguimos wna tendência distinta que
carão isto bastante claramente ao entrevistado. .
se expressa em nosso estilo, tenhamos ou não consciência dis- A menos que o entrevistador pise terreno firme, deve evi-
so. É a nossa maneira de sennos humanos. Há várias dessas tar silêncios extensos; um minuto de silêncio significativo é
maneiras, e não escondo aquela que sinto ser a mais proveitosa. bastante longo. Se é verdade, como diz o provérbio, que as pa-
lavras são prata e o silêncio é ouro, então devemos realmente
valorizar o silêncio como resposta, bem mais do que o fazemos.
Respostas e indicações centradas no entrevistado Talvez possamos nos tomar mais conscientes de nossos ~ró­
prios sentimentos sobre o silêncio na entrevist~, e de.termm~
Silêncio como o empregamos. O silêncio, como resposta mtencional uti-
lizada apropriadamente, pode ser um aspecto importante da ex -
Já discuti o silêncio em outro contexto. Se volto a tratar periência que o entrevistado leva consigo, dizendo a si mesmo :
disso é porque pode ser uma resposta, embora tal fato seja fre- "Aqui fui realmente ouvido."
qüentemente considerado sem importância. A resposta é não-
verbal, naturalmente; mas pode expressar muito. Um gesto da "Ahn-han"
parte do entrevistador pode comunicar: "Sim, estou ao seu lado,
prossiga'', ou "Estou esperando porque percebo que você não Essa é uma resposta verbal. Embora não seja uma palavra,
terminou" ou, ainda, "Você já falou isso antes; estou começan- é claramente um som emitido. É geralmente considerada como
do a me aborrecer". Nossos gestos têm muito significado; da indicador de abertura da parte do entrevistador, expressando:
mesma forma que nossos olhares e a maneira como nos mexe- "Prossiga, estou com você; estou escutando e ~companh~ndo
mos em nossa cadeira. Da mesma forma que as palavras, o você." Entretanto, seu uso não é assim tão restrito. Atraves de
silêncio também tem significado. Através dele, entrevistador e um "ahn-han", o entrevistador pode, em vez disso, indicar
entrevistado podem estar se aproximando mais um do outro, aprovação do que o entrevistado está dizendo, ou .de como ele
está se saindo na situação. Pode dizer ao entrevistado que o
partilhando alguma coisa; ou o silêncio pode mostrar-lhes como
entrevistador gosta do que ele está fazendo e, portanto, enc~ra­
realmente é profundo o abismo que os separa. O silêncio pode
já-lo a continuar naquela direção. O "ahn-han'_' pode t~mbem,
dar mais ênfase a um desentendimento. Pode ser neutro, ou
algumas vezes, sugerir crítica, como se estive.sse dizendo~
conter muita empatia. Pode ser o resultado de confusão . Pode
"Então, é assim que você se sente!" ou "Então, é iss? qu~ voce
comunicar: "Realmente, terminamos, mas ainda não admiti-
está pensando!". Em outras situações, pode .implica~ Julga-
mos isso." Como resposta deliberada, o silêncio implica que o
mento pendente, como se o entrevistador estivesse dizendo:
entrevistador decidiu não dizer nada, considerando isso como a
"Bem, vamos ver o que você vai acrescentar; quero esperar um
coisa mais útil que pode oferecer no momento. Decidiu não
pouco." .
interferir verbalmente, mas está dentro da entrevista, e sua pre-
As possibilidades são as mais variadas. "C'est le ~on .qw
sença é sentida pelo entrevistado. É como se o entrevistador fait la musique." Isto é válido para todas as respostas e. mdica-
estivesse dizendo: "Você sabe que estou escutando. Creio que a ções, incluindo o "ahn-han". Talvez queiramos ter mais cons-
melhor maneira pela qual posso ser útil a você agora é me man-
_1_4_8_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda
Respostas e indicações _ _ _ _ _ _ _ _ __ 149

ciência de como usamos o "ahn-han", isto é, se o usamos, e


ca necessariamente que ele se recuse a comprometer-se. Isso
estudar como o entrevistado o interpreta. Nos trechos seguin-
pode acontecer mais tarde. Enquanto isso, deseja fazer saber a~
tes, ele assume diversos significados:
entrevistado, emitindo esse som, que está preparado para conti-
nuar escutando. Embora seja aparentemente um som de não-
Eto. Não sei o que seria melhor para mim; fico indo de lá para cá
e não consigo me decidir. julgamento, o "ahn-han" possui muitas nuanças das quais o
Etr. Abn-han. entrevistador pode estar consciente, e que o entrevistado perce-
Eto. Não gosto do modo como esta agência funciona. Vocês be correta ou incorretamente. Pode ser dificil acreditar que um
prometem um monte de coisas, mas são apenas palavras, pequeno "ahn-han" tenha urna faixa tão ampla de significados
com nada por trás delas. e interpretações; entretanto, uma leitura atenta e cuidadosa de
Etr. Abn-han. entrevistas mostrará que é isto o que realmente acontece.
Eto. Se minha mãe pelo menos parasse de ficar atrás de mim,
tudo seria muito bom. Ela não fica em cima do meu irmão, Repetição
apenas em cima de mim.
Etr. Abn-han. Agora, finalmente, o entrevistador fala. Utiliza palavras reais,
1
porém as palavras do entrevistado. A repetição pode ser feita de
J I
várias forrn as, mas o fundamento é o mesm o: servir de eco, per-
l
1
No primeiro exemplo, o entrevistador pretendeu ser aber-
to, para deixar o entrevistado explorar sua própria indecisão.
mitir ao entrevistado ouvir o que ele disse, partindo do press u-
posto de que isto pode ajudá-lo, encorajá-lo a continuar falan-
No segundo, sentiu a desaprovação da crítica expressada. No
do, examinando, observando com mais profundidade . Quando
último, quis esperar e ver o que se seguiria. Agora, observemos
o entrevistador emprega a repetição, seu próprio campo percep-
os seguintes exemplos. Quando a entrevistadora analisou seus
tivo não entra de forma alguma no quadro, ou penetra muito
sentimentos, concluiu que, no primeiro exemplo, sentiu aprova-
superficialmente. A repetição comunica ao entrevistado : "Es-
ção e, no segundo, desaprovação. Não fica evidente como os
entrevistados a interpretaram. tou escutando você muito atentamente, tão atentamente, de fato,
que posso repetir o que você disse. Estou fazendo isto agora
porque pode ajudar você a se ouvir através de mim. Estou repe-
Eto. No mês passado segui sua sugestão, e funcionou. Saí-me
tindo o que você disse, para que possa absorvê-lo e considerar o
muito melhor com o orçamento, e bebi muito menos. :._.--
Etr. Abn-han. seu impacto, se tiver algum, em você. Por enquanto, estou fora
Eto. Experimentei o aparelho contra surdez - tentei realmente - disso."
mas não me acostumo com ele. Por isso trouxe-o de volta; A repetição pode ser efetuada de quatro formas básicas:
talvez sirva para outra pessoa. 1. Repetição exata do que foi dito, sem nem mesm o trocar
Etr. Abn-han. o pronome empregado pelo entrevistado:

Outras respostas poderiam ter sido usadas, mas isso é fugir Eto. Senti-me com frio e desamparado.
da questão: outras respostas sempre podem ser usadas . O "ahn- Etr. Senti-me com frio e desamparado.
han" parece cauteloso da parte do entrevistador, mas não irnpli-
2. Repetição exata, mudando apenas o pronome:
150
~------------------ A entrevista de ajuda
151
Respostas e indicações - - - - - - - - - - - - - - - - - -
Eto. Senti-me com frio e desamparado.
Etr. Você se sentiu com frio e desamparado. enxergava cada vez menos. Fechei os olhos e abri. Era como
se uma cortina cinzenta tivesse descido sobre o mundo todo;
_ Acho ~ última fórmula mais útil que a primeira. A repeti- o mundo que eu conhecia desmoronou naquela noite.
çao exata, mclus1ve do pronome, parece artificial e afetada. Se Etr. Uma cortina desceu sobre o mundo que você conhecia, e
o entrevistador quer se manter fora da situação a tal ponto, 0 ele desmoronou em tomo de você. Você havia ficado cego.
uso de um gravador seria preferível, na minha opinião.
. 3. Repetição de parte do que foi dito, aquela que o entre- É possível, naturalmente, empregar a repetição de outras
v1st~dor percebe ser a mais importante e que vale a pena ser formas - sarcasmo ou descrédito, por exemplo:
0uv1da novamente pelo entrevistado:
' Eto. Eu não fiz isso.
1'
Eto. Então, Joe, Mike e Chick me atacaram e, antes que perce- Etr. Você não fez isso'
besse o que estava acontecendo, me atiraram ao chão e cor-
reram . Entretanto, no momento, deverei considerar, não este tipo
Etr. Eles o atacaram, o atiraram ao chão e correram. de resposta centrada no entrevistador, mas aquele em que o
entrevistado é mantido como figura central.
4. Repetição, na forma de resumo, do que o entrevistado
falou. Trata-se de um processo seletivo. Obviamente ao sele- Elucidação
cionar, o entrevistador utiliza seu próprio campo p~rceptivo.
Entretanto, ele se mantém emocional e intelectualmente afasta- A elucidação é comumente entendida como esclarecimen-
do e apenas resume o que ouvi u. Às vezes, isso resulta na ênfa- tos do entrevistador ao entrevistado sobre o que este último
se de um aspecto de que o entrevistado acabou de falar, mais do disse ou tentou dizer. Há um outro lado da moeda, mas observe-
que qualquer outro; por isso vai além da terceira forma apresen- mos primeiro este, que apresenta duas intenções possíveis:
tada acima e, também, além da repetição. Estamos agora mais 1. O entrevistador permanece muito próximo do que seu
distantes do gravador. Comparem os dois exemplos seguintes: parceiro expressou, mas simplifica o que foi dito para tomá-lo
mais claro. Depende então do entrevistado, naturalmente, deci-
Eto. Não podia contar a ele porque nunca ficávamos sozinhos - dir se esta resposta ajudou, se realmente elucidou o que ele tinha
os rapazes poderiam perceber o que estava acontecendo em mente. Por exemplo:
ou ... não sei. Tudo o que sei é que toda vez que tentei con-
tar-lhe havia gente por perto; e eu não podia contar-lhe Eto. A única coisa que está clara para mim é que estou totalmen-
então ... em parte por causa dessas pessoas.. . ' te confuso. Quero tentar, mas não posso. Quero ser forte,
Etr. Você não conseguia ficar com ele por tempo suficiente para mas estou agindo como um fraco . Quero me decidir, mas
contar-lhe. deixo todo o mundo me levar de um lado para o outro. É
Eto. Quando cheguei em casa aquela noite ... foi terrível... No uma grande confusão ...
início, vi as coisas embaçadas. Depois as coisas começa- Etr. Você vê de forma bastante clara que está confuso e sem
ram a dançar diante dos meus olhos, pude apenas sentir que conseguir fazer o que desejaria fazer.
Respostas e indicações _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __ 153
152_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda

Eto. Ele simplesmente me "botou numa fria'', quando ...


2. O entrevistador, com suas próprias palavras, tenta eluci-
Etr. Desculpe, mas meu conhecimento de gíria não é muito bom
dar para o entrevistado o que este último teve dificuldade em - onde foi mesmo que ele botou você?
expressar claramente. O entrevistador apresenta uma síntese
possível das idéias e sentimentos verbalizados pelo entrevista- O entrevistado explica, e a entrevista prossegue. Neste caso,
do, para sua aprovação, correção ou rejeição. É como se o en- a pergunta foi uma bu sca evidente de elucidação - e não um
trevistador estivesse traduzindo as palavras do entrevistado mero f<tlar por falar - e o relacionamento melhorou com isso.
para uma linguagem mais familiar para ambos. Aqui estão mais alguns exemplos:

Eto. Não tenho certeza se foi realmente bom ele ter vindo. Foi Eto. .. . e ela disse que essa era sua intenção, mas não pareceu
uma demonstração de amizade, bondade e generosidade da muito "puro" para mim .
parte dele, mas não mereço isso, se ele o fez por mim - e se Etr. Pensei que "puro" se relacionava com leis dietéticas judai-
não fez por mim, mesmo assim estou satisfeita porque veio. cas. O que você quis dizer utilizando-o da forma como aca-
porque realmente não mereço. Mas ele é assim, e nada pude bou de faze r?
conseguir dele. Não pude nem mesmo dizer-lhe como me Eto. Você também ficaria louco se vivesse numa casa como a
sinto. Fiquei totalmente confusa ...
minha. Você também não suportaria. Você não teria dela
Etr. Você não pode dizer a ele como se sente indigna de sua
atenção. uma melhor impressão do que eu.
Etr. (em tom leve, quase de brincadeira) Você está me atribuin-
Eto. É fácil acostumar-se a ser paralítica, mas a gente nunca se
do toda a sorte de pensamentos e sentimentos em relação a
acostuma com isso. Não é claro, eu sei, mas não consigo
sua casa. Honestamente, não sei como ela é. Acho que sei
tomar isto claro de modo algum. Você entende o que quero
dizer? como você se sente em relação a ela, mas talvez pudesse
descrevê-la um pouco para que eu chegasse a compreender
Etr. Entendi você dizer que é possível viver como paralítica,
o que a deixa tão contrariada com o que acontece lá.
mas que a gente nunca se sente inteiramente da maneira co-
mo costumava sentir-se antes ...
Eto. É isso mesmo. A gente pode se arranjar bem; isto é bastante
Refletir
simples. É outra coisa com que a gente nunca se acostuma - Esta é uma resposta muito difícil de ser utilizada. Refletir
lembrando, comparando e ...
os sentimentos e atitudes do entrevistado exige uma audição e
uma compreensão profundamente empáticas. Servir de espelho
Por outro lado, a elucidação relaciona-se com a necessida-
no qual o entrevi stado pode ver seus sentim entos e atitudes
de de o entrevistador ter as coisas esclarecidas para si mesmo.
refletidos exige uma facilidade em reconhecer e verbalizar es-
Este aspecto da elucidação, como uma resposta, é freqüente-
ses sentimentos e atitudes . Na repetição, o entrevistador trans-
mente negligenciado, ou senão distorcido. Necessita portanto
m ite ao entrevistado o que este disse. Na reflexão, verbaliza o
de maior destaque. Não se pode esperar que o entrevistador
que o entrevistado sente. A reflexão não deve ser confundida com
entenda tudo. Ele é falivelmente humano, e ajudará o entrevis-
a interpretação, que será discutida mais adiante. A reflexão
tado saber que o entrevistador compreende e aceita esse fato.
consiste em trazer à superficie e expressar em palavras aqueles
Uma atitude desse tipo facilitará a comunicação.
sentimentos e atitudes que ficam por trás das p alavras do entre-
154 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda
Respostas e indicações _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _1_5_5
vistado. O entrevistador faz eco aos sentimentos não expressa-
dos como tais pelo entrevistado, mas claramente percebidos Eto. Fui demitido ontem ... dispensa geral ... depois de todos es-
pelo entrevistador a partir do que o outro afirmou. O entrevista~ ses anos na fábrica ... sem nenhuma idéia do que vou fazer
dor percebe estes sentimentos e os verbaliza. Atuando como agora.
Etr. Depois de muitos anos de emprego estável, você está agora
um espelho ou um eco, o entrevistador nada acrescenta de seu,
sem trabalho, e se sente totalmente perdido.
exceto - e isto é extremamente importante - sua sensibilidade e
Eto. Simplesmente não suporto mais, e preciso fazer alguma coisa.
interesse empáticos, que lhe dão condições para traduzir em Etr. Você está farto, e sente que tem de descobrir uma saída.
palavras o que o entrevistado quis efetivamente dizer, mas de- Eto. É tão dificil saber que ela está no hospital e que não há nada,
clarou intelectual ou descritivamente. De uma certa forma, o absolutamente nada, que eu possa fazer.
entrevistador atua como uma anfitriã que percebe, entende e Etr. Você sente ansiedade e está totalmente desorientado.
;:;I
:.!
expressa os desejos de seu convidado, quando ele hesita em Eto. Você está me escutando, não há dúvida, mas isto não me
declará-los abertamente por não saber se isto seria apropriado faz bem algum.
'1 para a situação. Etr. Você sente que estou prestando atenção ao que você está
No refletir, o entrevistador não faz conjecturas nem pressu- dizendo, mas isto não aproxima você da solução de seus
11' problemas.
posições: verbaliza o que está por trás do conteúdo das palavras
e o coloca em evidência, como conteúdo emocional que estava Eto. Se fosse minha irmã que tivesse feito aquilo, minha mãe
não teria dito nada. Foi sempre assim.
presente todo o tempo, mas sem ser expresso pelo entrevistado.
Etr. Você sente que sua mãe sempre o discriminou, e você se
Isto é dificil de ser atingido . A possibilidade da seguinte com-
ressente disso.
plil:;ação também deve ser reconhecida: a reflexão apresentada Eto. Bem, não sei ... tratava-nos de forma diferente ... Acho que
pode ser distorcida e, conseqüentemente, rejeitada pelo entre- você tem razão . Devo ter sentido a discriminação por parte
vistado. Nesse caso, não foi reflexão, mas uma outra resposta, dela; mas quando você falou, meu primeiro impulso foi
provavelmente interpretação . Entretanto, mesmo a verdadeira defender mamãe.
reflexão pode ser rejeitada pelo entrevistado quando a percebe
como ameaçadora. Por isso nem sempre é fácil ter a certeza de Aqui, o entrevistado, de início, encontrou dificuldade em
que sua resposta foi na verdade uma reflexão. A análise da en- aceitar o tom de sentimento de suas próprias palavras. No trecho
trevista como um todo geralmente o ajuda a certificar-se disso. seguinte, o entrevistado rejeitou o conteúdo afetivo de suas pala-
Eu arriscaria esta regra geral: a verdadeira reflexão será aceita vras:
pelo entrevistado porque consiste simplesmente em traduzir em
palavras o tom de sentimento do que acabou de ser dito. Ou, em Eto. Você tem o direito de fazer o que quiser. Não me importo.
outras palavras, o que o entrevistado expressou verbalmente foi Só não venha com aquelas tolices de querer ajudar. Você
acompanhado de uma mensagem afetiva que o entrevistador não tem que ... mas você não quer, e isso é diferente.
recebeu e depois traduziu em palavras, completando, em certo Etr. Você está bastante zangado comigo neste momento.
sentido, a comunicação do entrevistado. Os exemplos seguintes Eto. Não, não estou. Você tem todo o direito ...
ilustram esse ponto:
Quando o entrevistador utiliza a reflexão, ele responde não
a seu próprio esquema interno de referência, mas unicamente
156 157
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - A entrevista de ajuda Respostas e indicações _ _ __

ao tom emocional do entrevistado. Assim, no último exemplo, para indicações. Estamos caminhando para o proscênio. O peri-
o entrevistador refletiu a raiva do entrevistado, em vez de reagir go é óbvio - assumirmos o controle à custa do entrevistado;
à sua afirmação de que ele, o entrevistador, não queria ajudar. representarmos no lugar dele. Podemos terminar gostando tan-
Nem o entrevistador, naturalmente, contestou a afirmação. to deste papel que não percebemos que o deixamos de lado; que
Acreditou que havia provas suficientes em contrário mas que o colocamos na platéia, por assim dizer; que fizemos do sujei-
levantar o problema seria prejudicial neste ponto porque estava to-entrevistado um objeto-espectador.
em jogo a raiva do entrevistado e não fatos imparciais. O entre- A interpretação é de dois tipos. O primeiro baseia-se no
vistador estava preparado para lidar com este fato, embora o esquema interno de referência do entrevistado; o segundo no es-
entrevistado ainda não estivesse. Mais tarde, quando o entrevis- quema interno de referência do entrevistador. Quando interpre-
tado pôde aceitar e explorar sua raiva, ele próprio recordou as to o que entendi da comunicação do entrevistado, em termos de
situações em que houve ajuda e começou a compreender o seu espaço vital, estou respondendo a ele. Por outro lado, quan-
motivo real de sua raiva. do faço a interpretação em termos do meu próprio espaço vital,
atravessei uma ponte irreversível, e espero que ele me respon-
Interpretação da. Estou começando a lidclar. Esta distinção é muitas vezes
descuidada, mas não deve sê-lo de forma algum a. Faz uma dife-
Agora, finalmente, o esquema de referência do entrevista- rença bastante grande se traduzo em te rmos de como as coisas
dor é colocado em jogo. Em todas as respostas até agora ele não parecem para ele, ou como parecem para mim. Nos exemplos
se expressou. Se falou alguma coisa, restringiu-se a verbalizar o de interpretação que se seguem, as respostas do entrevistador
que o entrevistado falou ou sentiu. Esta limitação do eu é cons- deslocam-se gradualmente no sentido das indicações; o esquema
trangedora para muitos entrevistadores. Eles desejam impres- de referência muda do entrevistado para o entrevistador.
sionar o entrevistado com seu estilo pessoal. Manter-se calado,
dizer "ahn-han", repetir o que foi dito, ou refletir o tom de sen- Eto. Não importa muito um dia ou outro. Posso contratar uma
timento do entrevistado não é o bastante para eles; e para al- babá para a terça-feira, se este dia for mais conveniente.
guns, é absolutamente incompatível. Pessoalmente, gosto des- Etr. Ouvi a Sra. dizer que pode vir qualquer dia, mas a terça-fei-
ra envolve a contratação de uma babá. A quinta é bastante
sas respostas clássicas, não-diretivas, e estou convencido de
conveniente para mim, então marquemos para quinta. Está
que os entrevistados as consideram úteis quando o entrevista- bem assim?
dor se sente à vontade com elas, e não as emprega meramente Eto. Eu não procuro emprego há tanto tempo que estou um tanto
como técnica. Na minha opinião, o maior mérito dessas respos- confuso com as perspectivas. Não posso ver-me claramente
tas é que elas são - são obrigadas a ser - centradas no entrevis- procurando emprego.
tado. Utilizando-as, respondemos a ele. É o seu esquema de Etr. Entendi você dizer que, estando habituado a empregos está- .
referência interno que é extremamente importante. veis, você encontra dificuldades em mudar, ver-se como de-
Neste ponto da nossa discussão, a ênfase se desloca. O sempregado e ter que agir como tal. É difi cil mudar de pa-
péis dessa maneira, e compreender que é você todo o tempo. ·
esquema de referência do entrevistador entra em jogo e, à medi-
Eto . ... Não posso deixar de lado o espo1te ... Todo o mundo está
da que a discussão avança, assume gradualmente o primeiro
amontoando trabalhos de casa ultimamente, e isto simples-
plano. Caminhamos devagar, mas com segurança, de respostas mente é demais.
159
Respostas e indicações - - - - - - - - - - - - - - - - - -
158
A entrevista de ajuda
na estruturação da entrevista, por exemplo - ou como uma res-
Etr. Você parece estar dizendo que a culpa é dos professores,
posta a afirmações e perguntas do entrevistado. Como tem cará-
quando você não faz todo o trabalho de casa, porque eles
ter descritivo, a explicação deve ser em tom neutro. Ela diz que é
passam muita coisa, e você não pode ser flexível quanto a
suas atividades esportivas. assim que as coisas são. Implica que devemos aceitar a maneira
Eto. O caminhão chegou tarde todas as semanas do mês passado, e como são as coisas e comportarmo-nos de acordo. Ela tende a
eles não têm me dado tanto trabalho como costumavam dar. ser impessoal, lógica, positiva.
Tenho as mesmas despesas, mesmo assim; e vocês têm que Nem todos os entrevistadores empregam a explicação com
compensar a diferença. Além de tudo, os caminhões são seus a mesma intensidade. Alguns hesitam em usá-la, até que o
e tudo isso ... entrevistado esteja preparado para assimilá-la, quando é muitas
Etr. Ninguém mais se queixou. Vou verificar o serviço de cami- vezes supérflua. Outros entrevistadores acham que a explicação
nhões e as distribuições de traba1ho, mas estou me pergun- neutra pode ajudar o entrevistado a aproximar-se da realidade
tando se o trabalho o satisfaz da maneira como pensava. ou permanecer dentro de seus limites. Tendo dado uma explica-
Eto. Meus irmãos mais velhos estão todos trabalhando, e minha
ção, alguns adotam como prática verificar se o que explicaram
irmã mais velha é casada e não mora em casa. Então, mamãe
foi entendido na forma pretendida; outros pressupõem esse
e papai ficam em cima de mim porque não têm ninguém
aspecto . A explicação, na entrevista, pode ser dividida em qua-
por perto para eles ficarem em cima. Aposto que não trata-
vam os outros desse jeito, quando tinham a minha idade. Isto tro categorias: orientação para a situação, comportamento, cau-
não está certo. sas, e posição do entrevistador.
Etr. Você sente dificuldades em ser o bebê da família.
Eto. A gente nunca sabe exatamente o que as pessoas estão lhe
Orientação para a situação
dizendo quando não se pode ouvir bem. Quando se está de
costas, bem,. .. então não se sabe absolutamente nada, e eles Etr. Tudo o que acontece dentro desta sala fica somente aqui, até
resolvem falar da gente porque sabem que não podemos onde me diz respeito. Aqui você pode sentir-se livre para
escutar. É por isso que não quero o aparelho contra surdez. dizer o que quiser, da forma como quiser. Tentarei ajudá-lo
Isto somente pioraria as coisas. Então eles simplesmente a compreender e a decidir em que direção você quer ir.
não adivinhariam, eles saberiam, e eu desmoronaria. Todo Etr. Possuímos dois programas em nosso centro de reabilitação.
o mundo aproveitaria ... Um é para os que dormem aqui; o outro destina-se aos que
Etr. Observei que você suspeita bastante das pessoas. Fico imagi- preferem ir para casa todas as tardes. O primeiro programa
nando se você percebe que pode estar causando exatamente é mais longo, porque temos mais tempo disponível. O outro é
os resultados que você teme. Seu comportamento despertaria menos intensivo, mas dá possibilidade às pessoas de esta-
hostilidade em mim, também, se não o conhecesse melhor. rem com suas famílias à noite ...
Etr. Não sou o diretor. Sou o orientador da escola, mas o Sr. G. me
Explicação pediu para vir ter com você. Solicitações como a sua são
encaminhadas para mim porque tenho mais tempo disponí-
Uma explicação é uma afirmação descritiva. Pode incluir
vel que o diretor. Espero que não se incomode de discuti-
aspectos avaliativos de linguagem - quer sejam entendidos co-
las comigo. Naturalmente, deverei passar ao Sr. G. qual-
mo tal quer não- que podem ser percebidos pelo entrevistado. O
quer decisão a que chegarmos.
entrevistador pode utilizar a explicação como uma indicação -
_1_6_0________________ _ _ _ A entrevista de ajuda 161
Respostas e indicações _ _ _ _ __

Etr. Receio não ter sido muito claro. O médico vai vê-lo, mas
Etr. Não sei se minha explicação é a correta, mas você realmen-
somente depois de te1mos os resultados de seus exames.
te disse que o comportamento de seu pai ti nha mudado ulti-
Ele está ocupado, mas não indiferente. E não poderia ajudá-
mamente, que ele não ficava em casa tanto tempo como
lo sem saber o que dizem os exames. Logo que tivermos os
antes, e que sua mãe contou.que havia uma outra mulher ~
resultados, marcarei uma consulta para você.
quem ele havia se li gado . E óbvio que é duro para voce
Etr. Admito ser verdade. Em classe, realmente perco a paciên-
aceitar, mas talvez seja verdade.
cia às vezes. Temos quarenta alunos, e ali você é um dos
quarenta. Mas agora tenho tempo apenas para você, e não
acho que vou perder a paciência. Realmente quero saber o
que aconteceu em casa na noite passada - não porque seja Explicação de causas
intrometido, mas porque gostaria de ajudar, se puder. Com-
preendo que tudo começou quando ... Eto. Sou geralmente bastante pontual, mas agora que você cha-
mou a atenção, percebo que tenho chegado atrasado a qua-
se todas as nossas entrevistas. Não consigo entender. O que
você acha?
Explicação de comportamento
Etr. Quando pessoas pontuais chegmn atrasadas várias vezes
em seguida, a explicação pode ser que elas não têm muita
Etr. Por que você não me chama de Fred, e eu o chamarei de
pressa para vir. Elas podem querer e ao mesmo tempo n.ão
John? Gosto muito mais dos primeiros nomes, e tenho real-
querer. O querer e o não querer podem estar em confüt_o
mente dificuldade em lembrar-me de sobrenomes.
internamente, resultando no atraso. Pode haver outra exph-
Etr. Quero ouvir o que você tem a dizer sobre o assunto, mas o
cação, mas o que você acha dessa em relação a você?
fato é que a Srta. J. me pediu para vê-lo porque acha seu com-
Eto . ... Quero que me diga por que sinto medo de você.
portamento em classe prejudicial às aulas. Ela diz que você
Etr. Bem você indicou várias vezes que eu lembro sua mãe e,
me r~cordo, você às vezes sentia medo dela.
inte1Tompe quem está falando , conversa com seus colegas e
não consegue ficar quieto.
Eto. É porque sou cego que as pessoas me tratam assim - sentindo
Etr. Vou recolher uma amostra de sangue agora para que possa-
pena de mim e mantendo-se a distância. Foi isso que o mstru-
mos verificar seu grau de anemia. Em mim não vai doer
tor de viagem disse que fizeran1, e você não pode negá-lo.
nada e em você muito pouco, e isto ajudará nós dois a saber
o que estamos fazendo. Etr. Não, não posso negar que ser cego é duro para você, mas
realmente sinto que a causa de seu problema não é tanto sua
Etr. Você está se comportando aqui exatamente da mesma for-
cegueira, mas como você convive com ela; como você pen-
ma, também. Você ataca meus argumentos, mas não revela
sa e sente pelo fato de ser cego. Esta é a verdadeira causa,
os seus. Não compartilho da raiva de seu marido, mas
começo a ver como ele deve se sentir. na minha opinião. .
Eto. Está bem, vou contar: você me odeia por causa da mmha
Etr. Seu comportamento parece realmente infantil - querendo
pele escura - porque sou negro e você é branco. ,
que cuidem de você, sentindo dificuldade em tomar-se in-
Etr. Até onde realmente me conheço, isto não é verdade. As ve-
dependente; achando mais fácil brincar do que trabalhar.
zes, realmente, deixo de gostar de você, mas por uma razão
Há mais coisas sobre isso, naturalmente, mas este é o qua-
inteiramente diversa: porque sinto que você não está me
dro que vejo. Não estou afirmando se é certo ou errado, mas
apenas descrevendo como me parece. tratando como um igual. Você assume uma at itude supe-
rior, desafiante e hostil. Você guarda bem-escondido o que
_1_6_2 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Respostas e indicações _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _1_6_3

está por baixo disso tudo, mas quando realmente se revela, pode ser discutido com outros funcionários da agência, pois
me agrada muito. Então, sabe, rejeito sua explicação. Vejo- isto poderia baixar a moral e criar condições para mexeri-
ª como uma defesa. Você precisa demonstrar hostilidade cos por parte dos clientes. Por isso vou lhe pedir para parar
para mim porque de\T achar qu e sou hostil a você. Quanto de discutir sobre o Sr. T. e passar a alguma coisa frutífera
am1m .. . sobre a qual possamos conversar.

Vocês podem querer determinar se todos os trechos acima


Explicação da posição do entrevistador são de caráter tão descritivo e tão neutros no tom, como deve-
riam ser.
Etr. Gostaria que você soubesse qual é minha posição, porque ela
provavelmente influenciará os membros do conselho. Nós
devemos trazer de volta seu filho, porém em caráter experi-
mental. Ainda não estou seguro de que este seja o mellior lu- Respostas e indicações centradas no entrevistador
gar para ele. Sei, entretanto, que será dificil encontrar algo
melhor e então acho que todos devemos dar-lhe - e também Encorajamento
a nós - outra chance, porém uma chance limitada, para que
haja in1parcialidade de todos os envolvidos. Acredito que quase tudo o que fazemos na entrevista de aju-
Eto . ... mas por que você não vai falar com a Srta. M. sobre esse da é para encorajar o entrevistado, de uma maneira ou de outra.
assunto? Você é o orientador da escola e ela me mandou Nossa atitude, nossa abordagem, nossas respostas - tudo visa
falar com você. Então por que não vai conversar com ela? apoiá-lo e fortalecê-lo em seus esforços para procurar um cami-
Etr. Minha posição é realmente muito simples. Se e quando a nho significativo e que valha a pena para ele. Desejamos auxi-

Srta. M . desejar discutir o assunto comigo, devo estar pron-
liá-lo para que chegue mais próximo da realidade e de seu pró-
1 to para fazê-lo. Sinto que depois de tudo o que aconteceu,
1'1 seria melhor que você falasse com ela. Em seguida, nós três prio eu, para que ele possa explorar sua situação presente e de-
poderíamos discutir o problema, desde que vocês duas assim terminar suas metas futuras. Nosso mais leve "ahn-han" visa
o desejem. Você e eu nos encontramos várias vezes, de impeli-lo para a frente, dizendo-lhe: "É isso mesmo. Prossiga.
modo que eu poderia tentar ajudar a elucidar as coisas para Você está no seu caminho. Eu estou com você. Eu cuido de você."
você mesma. Acho que fizemos isso. Sei que minha posi- Nosso simples desejo de ajudar tem por objetivo dar apoio. A
ção a irrita, e sinto muito por isso; mas, honestamente, não maneira como realizamos nosso trabalho visa estimular e forta-
posso agir de outra forma. lecer a determinação. Esta forma de encorajamento é uma parte
Eto. Não posso compreender como vocês permitem uma pessoa integrante da nossa filosofia. Da mesma forma que a empatia,
como o Sr. T. trabalhando aqui. Ele é grosseiro e ignorante,
não se traduz em palavras; mas, se está presente em nós, o entre-
e ele é quem devia estar recebendo ajuda, ao invés de tentar
ajudar os outros. vistado a perceberá. Se não está, o fato de dizermos que está não
Etr. É política da nossa agência - e concordo com ela totalmen- a fará presente, tampouco enganando-o para que acredite que
te - que qualquer pessoa que venha nos procurar tem o está.
direito de gostar ou não gostar de qualquer um com quem Agora, entretanto, devemos discutir o encorajamento de
mantenha contato. Por outro lado, esse tipo de problema não um tipo diferente - uma espécie de indicação (às vezes, uma
_1_6_4 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Respostas e indicações _ _ _ _ ·- - - - - - - - - - - 165

resposta) na qual o encorajamento é verbal e abertamente ex- ra nos retirarmos quando verificarmos que não estamos aju-
presso. O que encoraja uma outra pessoa? Não sabemos real- dando. E o que é mais importante, devemos indicar de uma
mente. Ela se sente encorajada quando lhe dizemos que outros forma tal - se alguma forma devemos indicar - que o entre-
sofrem mais do que ela, e que de alguma forma aprendem a tirar vistado possa se libertar do nosso controle, se assim o esco-
proveito da experiência? Ela se sente encorajada quando dize- lher, sem achar que nos feriu ou ofendeu. Devemos ter em
mos que o tempo é o melhor remédio, e que dentro em pouco o mente que, na indicação , encorajamos o outro a ser liderado;
mundo lhe parecerá um lugar mais agradável? Sente-se encora- dizemos-lhe que ainda não pode chegar lá sozinho; alimenta-
jada quando afirmamos que a apoiaremos pelo tempo que sentir mos a dependência, pelo menos temporariamente; assumi-
que precisa de nós - com a implicação de que ela pode depender mos a responsabilidade, no momento, a qualquer pre ço . Tudo
de nós porque somos fortes, e ela fraca? Se ela é ou não funda- isto tem um efeito cumulativo. Portanto, se devem os indicar,
mentalmente encorajada e fortalecida, não sabemos. temos real mente que levar em consideração as conseqüências
Creio que essas questões são de importância básica. Cada de nossa ação. Feita a advertência, posso prosseguir.
entrevistador descobre respostas operacionais para elas. Acre-
dito que minha posição está clara no capítulo sobre filosofia. Afirmação-reafirnzação
Ela está presente necessariamente em minha abordagem em todo
este livro, particularmente com relação às indicações a serem Usamos a afirmação ou reafirmação como uma indicação
discutidas (devemos estar mais concentrados nas indicações, de para dizer ao entrevistado, em palavras, que acreditamos em sua
agora em diante). Estas indicações são de uso geral, porque o capacidade de agir e superar obstáculos, enfrentar com êxito
pressuposto é de que são úteis. Sem dúvida, algumas vezes são. sua situação. Com efeito, estamos também mostrando-lhe que
Não obstante, tenho fortes objeções a elas, simplesmente por- podemos ver mais longe do que ele; que ele pode, com seguran-
ça, depositar em nós sua confiança; que depende dele agir, mas
que tendem a empurrar e pressionar o entrevistado a partir do
exterior, do esquema de referência de uma outra pessoa - al- que precisa de uma pequena palmadinha nas costas para ajudá-lo
em sua trajetória. Assim, mostramos que ele precisa de uma
guém que é visto e se vê como superior, como uma figura de
influência externa para mantê-lo em movimento ou fa zer com
autoridade. Essas indicações podem ser intemalizadas pelo
que dê a partida e que isto nós podemos oferecer. Os exemplos
entrevistado e assim servir para fortalecê-lo; por outro lado, tal-
seguintes variam da reafirmação branda à expressamente aberta:
vez não. Ele pode apreender literalmente nossas várias tentati-
vas de ajudar, sentindo-se encurralado por elas em vez de forta- Eto. Não posso enfrentá-lo.
lecido ou realmente ajudado, e desejando nada mais que esca-
par da situação o mais ileso possível. Em última análise, acho, o A essa afirmação, diferentes entrevistadores podem replicar:
efeito de indicações sobre o entrevistado depende da pessoa
que ele é, da pessoa que ele percebe que somos, e da pessoa que Etr. Você não tentou; não deve ser tão rnim assim como você
ele pensa que acreditamos ele possa tomar-se. pensa.
Etr. ão estou tão certo de que você não possa; prefiro achar
Na indicação, devemos ter certeza de que estamos cons-
que você pode.
cientes de nossa ação, e de que conhecemos a quem estamos
Etr. Você não pode? Essa é a opinião de uma pessoa; outra pes-
dando indicação e para que fim. Devemos estar preparados pa- soa pensa de outra forma.
li 166 Respostas e indicações _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _1_6_7
- - - - - - - - - - - - - - - - -- - A entrevista de ajuda

Etr. Claro que você pode. ão posso ir com você, mas estarei Sugestão
presente espiritualmente.
Etr. É difícil, eu sei; mas você pode e você deve.
A sugestão é uma forma branda de conselho. Sua riqueza
Eto. .. . Realmente não sei se virei novamente. de linguagem tende a ser experimental e vaga. Nela o entrevis-
Etr. Bem, depende de você, mas acho que você devia. Você se tador apresenta uma possível linha de ação. A sugestão não exi-
saiu muito bem hoje, e da próxima vez tenho ·certeza de que ge submissão nem ameaça o entrevistado com rejeição, caso não
se sairá muito melhor. a siga até o fim. Estou falando da verdadeira sugestão, natural-
Eto. Nunca vou conseguir um emprego - com a aparência que mente, e não da ordem dissimulada. A sugestão dá ao entrevis-
tenho. tado as opiniões consideradas do entrevistador, mas deixa-o li-
Etr. Calma, meu jovem. Roma não foi construída em um dia. vre para aceitar, recusar ou propor idéias suas. Na verdade, sua
Apenas começamos a explorar as possibilidades, e você já finalidade pode ser estimular o entrevistado a pensar e planejar
quer pendurar as chuteiras. Vejamos agora ... por si mesmo. Quando esta é a intenção sincera do entrevistador,
Eto. (soluçando) É simplesmente horrível! a sugestão comunica: "Acho que minha idéia é boa, e pode fun-
Etr. Eu sei ... Tem sido bastante difícil ir ... Tente parar de chorar cionar. Depende de você, naturalmente, decidir." Se apresentada
agora. Você se sentirá muito melhor amanhã, e o mundo lhe claramente como sugestão, e objetivando verdadeiramente este
parecerá mais belo.
fim, é aberta ao invés de fechada, provisória ao invés de final. É
Eto. Ela me odeia, eu tenho provas.
um igual falando para um igual; um deles pode possuir mais
Etr. Agora pare com isso; sua mãe realmente ama você. Ela
informação, conhecimento ou experiência, mas não está visando
mesma me disse isso. Ela faz tudo para ser boa para você, e
sei que você quer se esforçar para ser boa para ela. Eu lhe impô-las ao outro. A sugestão pode ser oferecida quando solici-
garanto que tudo vai dar certo se todos nos reunirmos. Ela tada pelo entrevistado ou sem ter sido solicitada.
está querendo e eu também. Você vai ver. ..
Eto. Minhas pernas vão ficar boas, não é? Elas têm que ficar. Se Eto. Não me ocorre mais nada. Você tem alguma idéia?
não ficarem, vou me matar! Etr. Estava pensando que poderia ser útil tirá-lo da escola de
Etr. Agora, apenas relaxe. Tudo sairá bem. Os médicos estão enfermagem por algum tempo, e deixá-lo em casa porque
fazendo tudo o que podem, e você sabe que a medicina hoje poderia ver exatamente o que você faz com o bebê, em vez
pode fazer milagres. Você vai ficar boa. Tenho certeza que de imaginar todo o tipo de coisas como ele vem fazendo.
sim. Quanto a ... Bem, sei que você não falou sério. Tudo vai Eto. Não posso me decidir se me caso na primavera ou se ternli-
sair bem. no a faculdade primeiro. Você sabe o que quero dizer ...
Etr. Acho que sim, e sugiro que você tente discutir isso com Bob,
colocando o seu ponto de vista. Ele pode surpreendê-la, afi-
Muitas vezes, a reafirmação dura, enfatizando a consciên-
nal de contas. Então, quando vocês vierem na próxima se-
cia, chega quase ao morali<;mo. Pode sugerir descrédito também mana, poderemos discutir o assunto com mais detalhes.
- como se o entrevistador estivesse dizendo: "Você possivelmen- Que você acha disso?
te não poderia" ou "Não posso acredit.ar que você o faria". Estas Etr. Tenho uma sugestão a fazer, se você quiser ouvir. É apenas
indicações serão discutidas mais adiante. uma idéia que me ocorreu e lhe digo porque pode valer a
pena. Se você pegasse aquele trabalho na companhia X, que
envolve menos horas, teria condições de conseguir crédi-
_1_6_8_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda 169
Resposras e indicações - - - - - -- - - - -- - - -· ____ _

tos suficientes à noite para tem1inar seu curso em dois assunto é básico na entrevista de ajuda, desejo resumir minhas
anos, e além disso ficaria independente financeiramente.
opiniões em relação a isso. Vou começar analisando o conselho
Você poderia inclusive obter um empréstimo da universi-
dade. Devemos ter algum trabalho no verão em nosso cam- que foi realmente - ou pelo menos verbalmente - solicitado pela
pus. É como se estivesse pensando alto. Como você se sen- entrevistada. O primeiro passo, acredito, não é satisfazer ime-
te quanto a tudo isso? diatamente a solicitação, mas em vez disso, descobrir o que o
Etr. Minha sugestão é ir lá e fazê-lo. Você tem hesitado bastante próprio entrevistado pen sa sobre a situação que está sendo dis-
tempo, e já examinamos todos os ângulos. Se você não se cutida e que alternativas - se alguma - ele considerou. Quando
decidir logo, vai perder a oportunidade. Eles não ligam para a mulher da minha hi stória percebeu que me recusava ~ entrar
como você se sente, mas para o que você pode fazer; e você em seu jogo, sugeriu ela mesma o "conselho" que estava espe-
tem condições de fazer. Por isso sugiro que você comece. rando ouvir de uma outra pessoa. Mesmo sendo limitada a apli-
De qualquer forma , é assim que sinto.
cação da lição que aprendi naquele dia, tenho certeza de que,
quando o entrevistador é solicitado a dar um conselho, é essen-
Aconselhamento
cial que, antes de mais nada, capacite o entrevistado a identifi-
Dar ou não conselho tem sido e continua sendo um proble- car e delimitar as áreas nas quais procura aconselhamento. O
ma controvertido que, infelizmente, não pode ser solucionado entrevistado deve ser encorajado a verbalizar suas esperanças e
aqui. Novamente, é uma questão de filosofia pessoal. Aconse- temores relativos a essas áreas - em resumo, lançar o máximo
lhar é, em essência, dizer algo mais do que como se comportar, possível de luz em sua própria situação.
o que fazer ou deixar de fazer. O conselho pode ser oferecido
direta ou indiretamente, de forma ameaçadora ou indireta. Pode "Fico imaginando que alternativas você tem considerado."
ser oferecido porque realmente sentimos que isto é o que o "Compreendo que você está tremendamente preocupado
entrevistado deve fazer para seu máximo interesse ou porque com isto. Talvez se você puder me contar as várias alternativas
nos sentimos compelidos a libertarmo-nos de uma situação que considerou e como se sente em relação a elas, possamos ser
difícil, e a maneira mais fácil é dar um conselho "desinteressa- capazes de chegar a alguma coisa que, para você, 'tenha sentido'."
"Imagino que você discutiu este assunto com outras pes-
do". Podemos preferi-lo para satisfazer nossa necessidade de
soas e como você se sente com relação ao que tinham a dizer.
dominar, ou para satisfazer sua necessidade de submeter-se.
Talvez, se compreendermos o que você exclui, possamos alcan-
Antes de analisarmos mais de perto o aconselhamento, quero çar alguma coisa positiva."
mencionar uma experiência pessoal que ocorreu há alguns anos "Sinto que todos nós só podemos obter beneficio do conse-
e até hoje me ajuda em decisões relacionadas a conselho. lho quando ele cai em solo fértil, por assim dizer; se puder me
Uma vez uma mulher veio me ver e começou a entrevista contar mais sobre seus próprios pensamentos a respeito do as-
declarando: "Consultei muita gente e recebi uma grande quan- sunto, talvez sejamos capazes de alcançar alguma coisa frutífera
tidade de conselhos. Não gostei de nenhum deles, e assim, ago- para você."
ra, venho ao senhor para ver o que tem para dizer. Meu proble-
ma é ..." Como estou convencido de que todos nós damos conse- Obviamente, existe um sem-número de maneiras de expres-
lhos com muito maior freqüência que percebemos, e como este sar isso, mas o objetivo é sempre apanhar todos os pensamentos
e sentimentos possíveis do entrevistado relativos ao assunto so-
_1_7_0 _ _ _ _ _ _ _ _ __ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Respostas e indicações _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _
1 _71_

bre o qual desej a aconselhamento. Às vezes, só isto é suficiente A necessidade do entrevistador de dar conselhos pode inter-
para possibilitá-lo a chegar a uma decisão. Outras vezes, um li- romper prematuramente o exame conjunto do assunto que está
geiro esclarecimento de nossa parte levará a resultados positi- em pauta. Se o entrevistador toma consciência dessa necessida-
vos. No caso de o entrevistado não poder chegar à sua própria de, pode pensar duas vezes antes de dar um conselho e pergun-
solução, pelo menos teremos obtido dele o máximo de informa- tar-se se foi solicitado e, se o foi, se ele é, realmente, necessário.
ção que esperamos receber. Ninguém pode beneficiar-se com Sinto que também é importante que o entrevistador exami-
conselhos a menos que tenham significado para ele, a menos ne até onde o entrevistado sente que não pode decidir sozinho.
que os compreenda em termos de seu próprio esquema de refe- O entrevistado pode ter aprendido a considerar-se uma pessoa
rência, e até que tenha se expressado suficientemente de modo a que precisa do conselho de outros, que é incompetente para
realmente ouvir o conselho que alega querer. Só então é que pode escolher, que deve ser sempre dependente de un1 "especialista".
considerá-lo significativo em seu espaço vital particular. Estou realmente ajudando-o, ao oferecer o conselho que procu-
Surge ago ra a questão de saber se eu, o entrevistador, tenho ra? Não poderei estar reforçando seu conceito negativo de si
o direito moral, profissional ou simplesmente razões humanas mesmo? Será que ele é capaz de construir alguma coisa com
para dar conselhos. Se concluo que não tenho, devo declarar meu conselho, ou a procura de conselho levará a mais procura
isso aberta e claramente: de conselhos, dependência a mais dependência? Possui ele os
recursos internos exigidos para pôr em prática o conselho de
"É difícil para você decidir, mas sinto que não tenho nenhum alguém, pedirá a outros para reforçá-lo? Daria eu possivelmen-
direito moral de fazê-lo por você. Eles são seus filhos, e deixá-los te mais assistência negando conselhos, tentando mostrar-lhe o
com os pais de sua mulher ou ficar com eles é uma decisão que, que está envolvido em sua procura, capacitando-o a mudar seu
sinto, você tem que assumir sozinho." autoconceito?
"Isto está fora da minha competência profissional. O máxin1o Quando é bom o relacionamento e o entrevistador é since-
que posso fazer é recomendar um médico qualificado que poderá
ro, pode permitir-se dizer ao outro: "Não resolverei o seu dile-
lhe dar aconselhamento adequado. Porém, mesmo nesse caso, di-
ma vocacional para você. Você pcrrece ver-se como um pobre
ferentes médicos adotam abordagens diferentes; tenho a impres-
inválido infeliz, mas eu não. Se fosse lhe dizer o que fazer, você
são de que, em última análise, você é quem tem que decidir."
"O que eu faria em seu lugar? Honestamente, não sei dizer. teria fundamento para pensar que eu o considero assim. Então
Tenho tentado compreender como as coisas parecem para você, seriamos dois com essa opinião. Prefiro que não haja nem um;
mas não posso dizer se elas pareceriam assim para mim, se eu mas se tiver que haver um, não serei eu. Então vamos direto ao
fosse você. Como você terá que viver com sua decisão, não que- que interessa, e analisar o que você deverá estar fazendo com o
ro influenciá-la indevidamente. Tenho a impressão, no entanto, resto da sua vida no que se refere a trabalho."
que ainda não analisamos todos os aspectos da casa em X. .. " É muitas vezes mais fácil aconselhar do que se envolver
mais profundamente com as lutas do outro. Esse entrevistador
É também essencial que o entrevistador pergunte a si agiu não a partir da fraqueza, mas a partir da força. Ele não usou
mesmo se tem necessidade de dar conselhos, em momentos a saída fácil, e sua recusa em ceder mostrou-se, afinal, justificada.
específicos ou de maneira geral. Esta necessidade pode interfe- Algumas vezes, especialmente quando o contato é breve e
rir na luta do entrevistado para decidir o que é melhor para ele. superficial, e acreditamos sinceramente que não podemos aju-

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dar o entrevistado a efetuar uma mudança nele mesmo, pode pa- Agora que o conselho foi dado, como o entrevistado rece-
recer inevitável dar conselhos e ficar por aí. Infelizmente, mui- be, compreende e reage a ele? No exemplo acima, a mãe de Jim
tos de nós sentimos que às vezes devemos agir dessa forma. sentiu que o entrevistador tinha posto em palavras seus próprios
Um muro de pedras se interpõe em nosso caminho, e tudo o que pensamen tos não cristalizados. O conselho pareceu seguro para
temos como ferramenta é um cinzel. ela, e combinaram encontrar-se novamente no ano seguinte
para analisar o que deveria ser feito então. Se um entrevistador
Eto. Você é o orientador aqui .. . você deve saber o que meu filho dá conselhos dentro do esquema acima delineado, desejará tra-
deve estudar. Eu não sei, e não me preocupo desde que seja zer à tona uma reação aberta a ele. Ele pode dizer: "Estou ima-
um meio de vida honesto. Você é pago para dar conselhos. ginando como você reage em relação a isso" ou "Seria útil para
Se soubesse para qual escola eu o enviaria, não perderia meu nós dois se você me contasse o que realmente pensa deste con-
tempo vindo até aqui. Tenho coisas mais importantes para selho. Uma vez que ele se destina a você, é importante saber se
fazer. sente que será útil a você".
Etr. Talvez você me deixe discutir este assunto de escola com Ocasionalmente, os entrevistadores caem numa armadilha.
seu filho. Ele pode saber em que direção ...
O entrevistado procura aconselhamento para provar que é inútil
Eto. Ah, não. Você vai me dizer, e eu direi a ele; e é melhor ele
e, por implicação, que a pessoa que aconselha também o é. Se
me escutar se souber o que é bom para ele.
somos apanhados , não será porque não recebemos qualquer
advertência, e temos de inventar nossos próprios meios para es-
Tendo pesado todas estas considerações, o entrevistador
capar. Essa reflexão me conduz a uma consideração mais geral:
deve ainda fazer a si mesmo umas poucas perguntas finais antes
como nos sentimos e reagimos quando nossa opinião , julga-
de, finalmente, dar o melhor conselho que possa. Sei o bastante
mento e conselho são rejeitados? Tomamos como uma ofensa
sobre o que está envolvido para dar conselhos? Possuo bastante
pessoal, ou podemos suportá-lo? Ou talvez até n u~ divertimos
informação real, bem como suficiente conhecimento dos pen-
observando o entrevistado tomar sua própria decisão, destruin-
samentos e sentimentos expressos do entrevistado, de modo
do a nossa? Impomos-lhe estas nossas "pérolas", ou as exibi-
que meu conselho seja seguro e significativo para ele? Chega- mos para que possa examiná-las e decidir por si mesmo se as
mos no estágio em que meu conselho vai verdadeiramente adquirirá para seu próprio uso?
ajudá-lo? Um único exemplo será suficiente: Como nos sentimos quando nosso conselho é aceito - e não
funciona? Pelo menos o entrevistado alega que não funcionou
Etr. Bem, creio que analisamos este assunto de moradia para
para ele. Temos então que defender nossa própria sabedoria, ou
você e sua família de forma bastante completa. Consideran-
procuramos entender o que está acontecendo com o entrevista-
do tudo o que me falou e a situação de moradia como a co-
nheço, acho que não seria melhor mudar nestas alturas. Es-
do? E se nosso conselho funciona para o entrevistado e, cheio
sa não é uma solução ideal para você, eu sei, e será particu- de gratidão, ele volta e solicita mais conselhos, orientação e
larmente dificil para Jim; mas, por outro lado, você parece indicações? Somos tão sábios! Por que não esbanjar um pouco
sentir-se segura de que pode contornar suas dificuldades mais daquela profunda sabedoria? Quando sentimos que isso é
escolares por mais um ano. Nessa época, as coisas podem um pouco demais, a quem culpamos, com quem ficamos zan-
ter mudado ... gados? Podemos esclarecer nossas dúvidas muito bem, classifi-
.::_
1.:_7.:_
4 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Respostas e indicações _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _1_ 7_5

cando-o como um chato, ingrato e dependente. Nós, natural- lhamento não é necessariamente a etapa final em nosso relacio-
mente, tivemos apenas a intenção de ajudar, mas algumas pes- namento - a não ser que ele decida que deva ser porque não pre-
soas, dizemos a nós mesmos, simplesmente se aproveitam. E cisa mais de nós. Se ele voltar, e não tivermos deixado a porta
isso resolve tudo - para nós. completamente aberta, ele pode hesitar, temendo que fiquemos
Verifiquei que os entrevistadores que insistem em dar con- aborrecidos com a forma como seguiu o conselho. Devemos
selhos, mesmo quando não são solicitados, tendem a ser aqueles convencê-lo por nosso comportamento de que estamos muito mais
que mais se ressentem quando o conselho é recusado ou malcom- interessados nele do que em qualquer conselho que demos.
preendido. Reforçar o conselho parece ser uma espécie de ulti- Com muita freqüência, as pessoas aceitam um conselho e vão
mato: pegue-o ou vá embora. Entretanto, mesmo se o entrevis- embora; e nunca mais ouvimos falar delas. O conselho pode ou
tador não tem nenhuma necessidade de controlar os outros, ainda não ter ajudado. Em qualquer dos dois casos, devíamos querer
pode achar necessário, em certas ocasiões, oferecer conselho saber o resultado . Se deixamos a porta aberta, podemos sempre
não especificamente solicitado. Pode deparar com algo que o continuar a partir do ponto onde o conselho dado deixou de ser
entrevistado não conhece, não analisou, ou considera fora de usado ou começar de novo. Portas fechadas são uma barreira
questão . Se pode oferecer um conselho desse tipo, e não se sente para a continuidade da comunicação.
rejeitado se for recusado, se o oferece deliberadamente, man-
tendo as reservas referidas em mente, não estará pondo em risco Pressão
o relacionamento.
A pressão se relaciona tão de perto com a persuasão e a adu-
Etr. Você já pensou em tornar-se fotógrafo profissional? Você lação que não vou tentar diferenciá-las entre si; é uma indicação
obviamente gosta de fotografia, e dedica a ela muito do seu ou resposta cuja finalidade é aguilhoar o entrevistado, para não
tempo. Em te1mos de sua limitação, isto deve dar certo - e deixá-lo escapar do que, em nossa opinião, ele não devia. A pres-
você podia ganhar a vida com aquilo que você gosta de são envolve apoio para reforçar a determinação do entrevistado
fazer como passatempo. Talvez queira pensar mais um
em levar a cabo o que ambos discutiram, e pelo menos o entrevis-
pouco sobre isso. Podíamos discutir isto quando você vier
na próxima semana . Se você pensar em alguma outra coisa,
tador sente que seria benéfico para o entrevistado. Relaciona-se
poderíamos também discutir. com os aspectos práticos de uma discussão ou acordo teóricos.
Por exemplo, ambos podem concordar em que o entrevistado
Uma última palavra. Um conselho, depois de dado, deve deva reiniciar seus estudos. A decisão permanece teórica desde
ser acompanhado. Creio que devíamos nos encontrar com o que o entrevistado não faça nada em relação a ela. O entrevista-
entrevistado novamente, ou pelo menos entrar em contato com dor pressiona, adula, persuade o entrevistado para impulsioná-lo
ele, de alguma forma, para verificar até onde nosso conselho à ação e transformar a teoria em prática.
comprovadamente ajudou. Se não deu resultado, podemos que- Freqüentemente, a pressão ocorre depois que o conselho
rer explorar a situação com o entrevistado para descobrir o que foi ostensivamente aceito pelo entrevistado, ou pelo menos não
faltou. Isto fornecerá um recurso indispensável de feedback para foi inteiramente rejeitado. Esse é o ponto exato no qual a pres-
o entrevistador interessado em seu desenvolvimento profissio- são pode ser perigosa. Demos conselhos de boa-fé e admitimos
nal e pessoal. Também indicará ao entrevistado que o aconse- que o entrevistado o tenha aceito, mas nada além disso aconte-
.:
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6_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda
177
Respostas e indicações - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
ce. Ele não se mexe para levá-lo a cabo. Então pressionamos,
bajulamos, persuadimos. Construímos sobre o que acreditamos Etr. Pensei que tivéssemos concordado em que você escrevena
ser a função sólida de nosso conselho, sem termos a confirma- aquela carta. Naturalmente, falar sobre a carta não é º, ~es~
mo que escrevê-la. Você pensou que era uma boa ideia ha
ção de se esta fundação é de areia ou de pedra. O que é necessá-
apenas uns dias, e até hoje a carta não está escrita.
rio aqui é menos pressão, e mais exame do espaço vital do
Eto. Foi uma boa idéia sua, e ainda é. Tentei várias vezes, mas
entrevistado. Talvez essa seja sua maneira de rejeitar nosso rasguei-as todas. Elas simplesmente não estavam corretas.
conselho. Talvez seja essa sua maneira de nos fazer saber que Talvez eu decididamente não possa fazê-la.
teoricamente o conselho é eficiente mas, na prática, para ele Etr. Mas é claro que pode. Não precisa ser uma obra-prima lite-
pelo menos, é irrelevante. Essa recusa em mexer-se pode ser rária. Simplesmente precisa ser escrita. Tenho caneta e pa-
talvez sua maneira de comunicar que devemos procurar outra pel aqui. Por que não tenta escrevê-la agora, enquanto esta-
opção, uma que se revele mais significante para ele. mos discutindo o assunto?
Algumas vezes admito que a pressão tem resultados positi- Eto. Simplesmente não posso. Tenho estado pensando em coi-
vos. Definitivamente, nosso apoio e confiança no entrevistado sas, e... pensei que talvez fosse melhor, apesar de nido, con-
podem fortalecê-lo suficientemente para capacitá-lo a agir. Mes- tar-lhe pessoalmente. Vai ser dificil contar; mas uma vez
mo nesse caso, estou certo de que devemos sempre conferir se que não posso escrever, não tenho alternativa .
estamos apoiando e demonstrando confiança no entrevistado,
ou em nosso próprio conselho. Por trás da rejeição do entrevis- Aqui a entrevistada propôs uma alternativa de açã~ ~a~s
tado ao nosso conselho, ou de sua resistência a ele, na hesitação importante para ela. O entrevistador, apesar de sua pres~ao mi-
ou inércia, pode estar simplesmente bruxoleando a centelha da cial, foi capaz de escutar e perceber isso . Ambos ex~mmaram
ação auto-iniciada. Reconhecendo esta pequena chama, e fa- juntos o problema, e eventualmente o entrevistador foi capaz de
zendo-a brilhar, damos a mais importante de todas as ajudas. apoiar o entrevistado em seu rumo. A carta permaneceu sem ~er
Em resumo, proponho que, quando vocês descobrirem que escrita, mas houve a conversa. Embora estivesse longe de satis-
estão pressionando, observem o efeito que isso produz no en- fatória mesmo assim foi melhor do que nada. A seu tempo,
trevistado. Você está inadvertidamente empurrando-o contra a outras 'conversações se seguiram entre a entrevistada e o filho
parede? Você está pressionando o seu argumento admitindo que que tinha se separado dela. Entretanto, nem to~os os entr:vista-
também é o dele? Qual é o dele? O que vocês dois podem apren- dos são tão determinados , nem todos os entrevistadores tao per-
der de uma situação na qual uma linha de ação, sobre a qual teo- ceptivos e preparados para recuar a fim de avançar com novas
ricamente concordaram, rompe-se quando chega o momento de forças. Por exemplo:
executá-la? Você está tão absorto em pressionar que não pode Etr. Bem, e como se saiu?
ver outra coisa, nem mesmo a tentativa do entrevistado de lutar Eto. Não fui ... quer dizer, não apareci lá. Você foi muito bom em
corpo a corpo com seu próprio problema a seu modo? Você o ter marcado a entrevista, mas ... simplesmente não pude 1r.
está escutando com toda a compreensão que pode mobilizar, ou Etr. Não foi fácil conseguir aquela entrevista para você. Realmen-
insiste em que o escute e comece a se movimentar? Aqui estão te não compreendo. Apesar de tudo, você concordou que
algumas ilustrações: seria melhor entrevistar-se com o chefe do departamento, e
então me dei ao trabalho de conseguir com que ele se en-
contrasse com você e agora .. .
178 Respostas e indicações _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _
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____ - - - - - - - - - - - - - - - - - A entrevista de ajuda

Eto. Lamento muito mesmo, mas simplesmente não podia en- Etr. Podemos verificar isto, mas tenho certeza de que sua mãe
frentar. ficaria satisfeita com esse esquema. Em nossa última conver-
Etr. Lamentar não nos ajuda. Ele é um homem extremamente sa, me contou como era difícil para você fazer trabalho de
ocupado, e não sei se vou poder conseguir outra entrevista. casa com todas as crianças em volta. Quanto a você estudar
Entretanto, vou tentar. Informarei a você se ele vai atendê- na casa do Bob, isso ajudaria a ele também. Você sabe que
lo e quando. Não vou desistir e também não vou deixar você ele só consegue se concentrar tarde da noite, e dessa forma
desistir da luta. Ele é um homem amável a seu modo e de vocês dois podem beneficiar-se.
qualquer forma, não vai mordê-lo. ' ' Eto. Bem, eu realmente nunca tentei.
Eto. Você é uma pessoa muito boa, mas depois que analisei, pa- Etr. Por que não tenta, e vê como funciona? Você podia tam-
rece que desisti do ... bém pedir à sua mãe, e me informar se a compreendi corre-
Etr. Bem, não se pode desistir disso facilmente . Eu não vou, e tamente ou não. Se você tentar isto esta semana, podemos
você também não . Pode ser ligeiramente embaraçoso para conversar sobre o assunto na próxima. Você acha que vai
eu explicar - mas não tem importância. Vou conseguir outra tentar?
entrevista para você, e desta vez você irá. Quando você es- Eto. Se minha mãe concordar, vou tentar.
tiver naquele escritório conversando com ele, verá que não Etr. Realmente acho que você deve. Até a próxima semana!
é tão difícil como lhe parece neste momento. Já fomos mui-
to longe, e não podemos desistir agora. Comparem o exemplo anterior com o seguinte:
Eto. Nem mesmo sei se quero trabalhar lá ...
Etr. Ora, vamos - claro que você quer trabalhar lá; temos falado Etr. Esse é o sistema de organização do nosso centro. Pode pa-
só sobre isso há semanas. Você está hesitando , mas eu não recer rígido, mas você deve passar por todas as atividades
estou. Agora mesmo, parece dificil, mas algum dia aprecia- recomendadas a fim de que os instrutores possam avaliar
rá tudo isso. Levou tanto tempo até que você se decidisse seu desempenho, e determinar para o que você se adapta
em qualquer direção, que devemos manter tudo até conse- melhor.
guirmos sucesso. Você verá; não vai ser nada ruim, e uma Eto. Claro, mas um monte dessas coisas são infantis e ...
vez terminado , você estará se sentindo muito bem. Etr. Posso apenas insistir com você para que faça o melhor. Se
em vez de lamentar-se você tivesse ido adiante, agora você
A entrevista foi devidamente marcada; o entrevistado não já teria terminado as tarefas mais simples. Ninguém quer
apareceu . O entrevistador julgou ter havido irresponsabilidade, esconder nada de você, mas há certos procedimentos ...
ingratidão e falta de cooperação. O contato foi interrompido. Eto. Acho que me sairia melhor em ...
Aqui estão dois exemplos finais de pressão nos quais acon- Etr. Se você se conformasse, ganharia muito mais.
selhamentos prévios não estavam envolvidos:
Moralismo
Eto. Eu podia fazer trabalho de casa na casa de meu amigo. O moralismo é uma mistura de aconselhamento e pressão,
Etr. Você podia estudar lá, mas não estuda.
com uma significação a mais. Quando o entrevistador simples-
Eto. Acho que minha mãe se sentiria diminuída - sabe, é como
mente aconselha e persuade, baseia-se em seu próprio julga-
se minha casa não fosse bastante boa para mim, ou algo se-
melhante. mento. Para ele, pelo menos, isso é suficiente. Quando emprega
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o moralismo, entretanto, recorre a novas armas; traz para a ação que, a fim de sobreviver, deve tomar-se ainda mais poderoso.
uma munição mais poderosa. Dispõe dessas forças contra o en- Deve tornar-se astuto para ludibriá-lo. De e tornar-se um mes-
1

trevistado para fazê-lo "ver a luz". As principais armas que o tre em estratégia. Ele pode parecer submeter-se, desarmando
entrevistador escolhe são essas duas que o entrevistado sente temporariamente seu oponente, no momento personificado pelo
maior dificuldade em combater: a consciência - a sua própria, a entrevistador, a fim de aplicar um duro golpe na primeira opor-
do entrevistador ou a de Todo o Mundo; a moral - aquelas tunidade. Ele pode, ao contrário , não ceder um milímetro, mas
sagradas normas sociais a que ninguém, em sã consciência, manter seu terreno da melhor forma que pode, nunca chegando
pode se opor ou mesmo questionar. perto de seu próprio eu, porque está muito ocupado recuando,
O entrevistado cai na cilada. Render-se é admitir derrota. defendendo- se e atacando.
Resistir é declarar-se um marginal. Deve curvar os joelhos, ou Vocês podem considerar parcial meu ponto de vista, e in-
levantar a cabeça em desafio? Assediado dessa forma, pode agir sistir em que, algumas vezes, a moralização é um agente útil na
de várias maneiras, mas o mais provável é que será na forma de
entrevista de ajuda. Não vou continuar discutindo este ponto,
representação, simulação. O que está realmente ocorrendo den-
mas devo acrescentar um comentário. Confiram e reconfiram,
tro dele, ele tem certeza que manterá bem-escondido. O inimigo
porque as aparências podem ser enganosas. Não se satisfariam
é 'extremamente poderoso, a pressão imensa, para qualquer ou-
com palavras presentes, mas observem o comportamento futu-
tra coisa que não representação ou fuga.
ro. Se você se saiu vitorioso, examine a que preço sua vitória foi
Na verdade, pode não ser sempre representação; o "réu"
obtida; se derrotado, pense novamente, antes de rejeitar o enh·e-
pode sentir-se verdadeiramente culpado, e ficar chocado com
vistado como "sem-esperança". A moralização pode ser opres-
seu próprio comportamento. A moralização tem sido conside-
sora. Na melhor das hipóteses, ajuda o entrevistado a ver como
rada eficaz. Sua cabeça cai sobre o peito; está profundl}ITiente
a sociedade o julga, como outros observam seu comportamen-
sentido e admite a derrota. O entrevistador triunfou. PÕrém o
entrevistado foi realmente ajudado? O que aprendeu dessa expe- to. Na pior das hipóteses, bloqueia o exame do eu e da ação
riência que possa enriquecer sua vida e estimular uma mudança motivada pelo eu, e reprime maior expressão de sentimentos e
em uma direção significativa para ele? Eu arriscaria o palpite atitudes. Pode resultar em submi ssão sem insight ou desafio
de que provavelmente aprendeu a ser mais cuidadoso no futuro, obstinado. as seguintes il ustrações, a moralização é usada co-
para não ser apanhado novamente; ou a aceitar o fato de que a mo indicação ou resposta :
resistência contra um inimigo tão poderoso é vã e que, portanto,
o caminho mais sábio é submeter-se ou ceder; a desistir de ten- Etr. Ajudar seu pai por umas duas horas à tarde realmente não é
um a coisa terrível. Sua irmã cuida de todo o serviço de casa,
tar encontrar-se e, em vez disso, estudar o inimigo e competir
com ele. e você quer fazer a sua parte, tenho certeza. Sei que é duro
não brincar com os outros meninos, mas você se sentirá mui-
Por outro lado, se o entrevistado está verdadeiramente in-
to melhor se cumprir sua parte nas tarefas. A vida não é
dignado e se recusa a submeter-se e, abertamente, desafia o ini- sempre um mar de rosas: e, creia-me, muitos garotos dão
migo a fazer o pior, o que aprendeu que o capacite a mudar para mais duro do que você. Pela alma de sua mãe morta, você vai
uma direção que valha a pena? Aqui a experiência me diz que querer fazer o esforço.
ele geralmente aprendeu que o inimigo é realmente poderoso e Eto. (silêncio ... lágrimas ... silêncio.)
r
r
_1_8_2_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __ _ A entrevista de ajuda
Respostas e indicações _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _1_:_8.:.....
3

Etr. Você devia ter me fa lado quando pensou em desistir do em-


prego. Não é tão fácil encontrar empregos, e outras pessoas comportar. Acho que devia realmente se envergonhar de
gastaram tempo e energia para encontrar esse para você. você mesmo. Com essa atitude você não vai muito longe
Qualquer outra pessoa em seu lugar ficaria feliz em ter. .. neste mundo. As pessoas tentam ajudar, e você fala coisas
Eto. Não, não ficariam. Só porque tenho uma incapacidade não maldosas sobre elas. Suponho que você esteja apenas um
significa que tenho que agüentar todo aquele lixo. Devia ter pouco zangado no momento e realmente não tem esta in-
lhe contado. Talvez algum bobo possa ficar, mas eu não pos- tenção, tem?
so, não vou ficar. Eto. (silêncio)
Etr. Você deve aprender a viver com sua deficiência. Os traba- Eto. Você não conhece minha mãe. Se ela pudesse, se livraria de
lhos que você pode fazer são dificeis de encontrar. De qual- mím. Ela tem vergonha de mÍn1 e me esconde todas as
quer forma, não podia ser tão ruim como você diz. vezes que pode. Eu queria estar morto.
Eto. Era sim, mas eu não devia ter lhe falado. Sinto muito sobre Etr. Agora pare com estes absurdos. Você está inventando tudo
isso. isso. Não é certo você falar assim de sua mãe, depois de
Etr. Lamentar não adianta. tudo o que ela fez e está fazendo para você. Estou realmen-
Eto. O que você quer que eu fa ça, me ajoelhe a seus pés? Se não te surpreso, um rapaz inteligente como você... Sua cons-
tem outro emprego é só dizer. ciência não lhe diz que você está errado?
Etr. Não, não tenho neste exato momento; e, de qualquer forma, Eto. (silêncio)
prin1eiro tenho que com iderar aqueles que estão querendo
fazer um esforço real; telefone para mim no próximo mês,
está bem? Respostas e indicações autoritárias

Para terminar, permitam-me citar alguns exemplos ainda Agora estamos prestes a discutir o último grupo de indica-
mais extremos de moralismo: ções e respostas deste levantamento. Também aqui não faço ne-
nhuma tentativa de ser exaustivo, e simplesmente enfatizo algu-
Etr. Você tem que se virar com seu salário. Outros conseguem
mas das mais importantes indicações e respostas incluídas nes-
bastante bem. Você mesmo admite que "bebe um pouco" e
fuma muito . Ficar dizendo que está nervoso não alimenta ta categoria. Neste grupo, o entrevistador percebe seu papel sob
nem veste sua família. Você tem apenas que conseguir se uma luz específica e age de acordo. Antes de considerar essas
controlar. Naturalmente, você ama sua família. Então tem indicações e respostas, portanto, permitam-me dizer umas pou-
que fazer um esforço para provar isto - não para mím, mas cas palavras sobre a filosofia subjacente à percepção do entre-
para eles. Eles o respeitarão mais por isso, e você se sentirá vistador.
menos nervoso. À medida que prosseguimos neste capítulo, testemunha-
Eto. (silêncio) mos uma mudança gradual de atitude da parte do entrevistador.
Eto. Não gosto do Sr. J. nem um pouco. Ele grita o tempo todo, Exceto por pequenos desvios, caminhamos em uma sucessão
e é injusto. Ele até xinga. contínua até o presente ponto de nossa discussão. Olhemos
Etr. Não compreendo como você pode dizer urna coisa como
agora para trás, e examinemos essa sucessão contínua. Embora
essa, mesmo se você a sente. O Sr. J. me falou o quanto
gosta de você, e a dificuldade que ele tem para fazer você se relativamente fluida, começa em uma posição na qual o entre-
vistado é central em todo o processo da entrevista, e gradual-
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::.. 4 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Respostas e indicaçõc:o 185

mente muda para uma posição oposta, na qual o entrevistador entrevistado sobre a direção a tomar. No seu modo de ver, essa
emerge como figura central. é a ajuda que o entrevistado ve io buscar e, com toda a imparcia-
Em uma extremidade do continuum, o entrevistador vê o lidade, depende dele concedê-la. Hcí também sombras no fim
entrevistado como responsável por si mesmo, como sua própria desse continuum; mas, essencialmente, as atitudes e comporta-
autoridade. O entrevistador trata o entrevistado como um igual; mentos do entrevistador refletem a filosofia aqui delineada. Ten-
ele o escuta, tenta entendê-lo empaticamente, e o aceita como é. tei descrever a posição de autoridade sem prevenções; mas como
O entrevistador tenta esclarecer, descrever, em vez de avaliar, é estranha à minha filosofia pessoal, posso tê-la exagerado ou
os pensamentos e sentimentos expressados pelo entrevistado. atenuado. (Para um tratamento mais detalhado do assunto, con-
Ele se esforça para eliminar os obstáculos de comunicação, e está sultem a Bibliografia Complementar, no final do livro .)
pronto para ajudar o entrevistado a caminhar no sentido de uma Tendo analisado a filosofia que se oculta sob a posição de
mudança significativa. Quando o entrevistador considera poten- autoridade, estamos preparados para discutir as indicações e
cialmente útil, ele, como um igual no processo de entrevista e respostas que são baseadas no claro pressuposto de que, em cir-
como ser humano congruente (Rogers, 19 51 ), expressa suas cunstâncias normais, o entrevistador será capaz de solucionar o
próprias idéias e sentimentos. Não os impõe ao entrevistado, problema do entrevistado, uma vez que o identifique - desde
mas apresenta-os como originados de um participante interes- que, naturalmente, o entrevistado esteja preparado para coope-
sado. Sua preocupação não é se suas idéias e sentimentos são rar, escutar quando necessário, e obedecer sempre que ordena-
adotados, mas se podem ajudar o entrevistado a encarar essas do a assim fazer.
idéias e sentimentos dentro de si próprio, impulsionando-o na
direção que ele escolher. Con cordância-discordância
À medida que o panorama muda, até que finalmente o
Aqui, o entrevistador comunica ao entrevistado se, em sua
entrevistador ocupa o centro do palco da entrevista, alcançamos
opinião, ele está certo ou errado. Tendo obtido suficientes in
o ponto em que o entrevistador, voluntária e conscientemente,
formações do entrevistado, bem como de outras fontes quando
vê-se como a autoridade. Ele assume a responsabilidade pelo
necessário, e dependendo fortemente ele sua própri a experiên-
que ocorre na entrevista, e se comporta e atua como tal. Define
cia e formação, ele declara sua posição. Admitindo que seu jul-
seu papel como uma função de ajuda mas, para ele, ajudar sig-
gamento é correto, quer natmalmente que o entrevistadu o trate
nifica orientar, instruir e, se necessário, coagir. Na medida em
seriamente. Aqui estão alguns exemplos representativos :
que é o superior na entrevista, para que outra finalidade poderia
estar ali? A autoridade deriva de seu conhecimento, suas habili-
Eto . Mesmo assim não posso me decidir. Fico imaginando se os
dades e sua posição; e deve ser empregada abertamente para
resultados do teste podem me ajudar a decidir. De qualquer
beneficio do entrevistado. Ele é claro em relação a valores. Pelo forma, quero engenharia, mas ...
menos, conhece o certo e o errado, o bom e o mau, o próprio e o Etr. Todos os dados me levam a pensar que engenharia é o ca-
impróprio; e o diz em termos corretos. Pode escutar o entrevis- minho certo para você. Os resultados dos testes, e tudo o
tado e esforçar-se para entendê-lo; mas sabe que, mais cedo ou mais que me contou, indicam que você está no caminho
mais tarde, terá de agir - e está preparado para fazê-lo. Uma vez certo. Sou claro nisso; mas se hesitar mais um pouco, vai
que tenha decidido o curso a seguir, não hesita em instruir o perder a chance para o vestibular do próximo ano.
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Respostas e indicações _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _187
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Eto. Você não acha que ser cego é a pior coisa que pode aconte-
você certamente teria aparecido ; mas desde que você deci-
cer a uma pessoa?
diu, não há mais nada a falar sobre esse ponto.
Etr. Bem, francamente não acho. É duro ser cego, concordo. Mas
Eto. Jack e eu vamos abrir nossa própria loja de fotografia.
ser completamente surdo ou inválido, por exemplo, é muito
Etr. Muito bem; estou feliz em saber disso . Jack é um companhei-
pior. Você pode achar difícil acreditar no momento, mas
com o tempo você vai ver que estou certo. ro tão bom. Tenho certeza de que vocês dois vão ter sucesso.
Eto. ... Tenho certeza de que n;\o foram só Hitler e seus seguido- Agora estou pronto para discutir o assunto do empréstimo.
res os responsáveis pelo início da guerra, e não vejo por que Eto. Ontem, depois da aula, a Sra. R. perguntou-me novamente
culpar os alemães por tudo o que aconteceu. qual era o problema. Resolvi contar-lhe. Estou tão aliviado
Etr. Você está bastante errado. À medida que ficar mais velho e por ter tirado isso dos meus ombros.
ler mais sobre o assunto, vai entender melhor. Etr. Não estou certo de que tenho sido prudente. Tínhamos con-
Eto. Doutor, posso sair da cama amanhã? Gostaria muito. cordado que eu falaria com ela primeiro, uma espécie de
Etr. Estou de acordo. Na realidade, se você não tivesse me pedi- preparação do terreno. Espero pelo menos que você tenha
do, eu teria lhe falado de qualquer forma. Uma hora fora da tido tato.
cama amanhã OK? Eto. Da forma como vejo as coisas, se eu trabalhar todo o verão
Eto. Você disse que me informaria hoje se concorda ou não. e parar de ficar andando por aí sem fazer nada, posso ga-
Etr. Pensei nisso com muito cuidado e, pessoalmente, não pos- nhar o bastante para comprar um carro e ainda me preparar
so concordar. Estou convencido de que você e John podem para os exames no outono.
resolver as coisas, e estou pronto para ajudá-la o máximo Etr. Isso é maravilhoso. Estava esperando que fosse isso o que
ci ue ruder FssB é apenas minha opinião, naturalmente; você decidiria. Tenho certeza de que você escolheu acertada-
p<n\·111 há por trás dela anos de experiência. Você deve pen- mente; e, como lhe disse, nossa agência está sempre satis-
sar e me informar. feita em ajudar bons meninos como você.

Aprovação-desaprovação Oposição e crítica


Esta é semelhante a concordância-discordância. Entretanto, Tanto a oposição como a crítica foram abertas ou implici-
não é a questão de certo e errado que está envolvida, mas a de tamente expressas em algumas das indicações e respostas pre-
bom ou mau. O entrevistador expressa um julgamento de valor cedentes da parte do entrevistador. Quando o entrevistador se
quando, a partir de seu esquema de referência, isso parece apro- opõe, está dizendo não a um curso de ação pretendido. Quando
priado. Manifesta aprovação ou desaprovação do comportamen- ele critica, expressa sem ambigüidade sua insatisfação com a
to, planos pretendidos ou concepção de vida do entrevistado. "má" conduta, ou ação "errada" do entrevistado. O entrevista-
dor, de sua posição vantajosa, está certo de que esta oposição
Etr. Você finalmente se decidiu a entrar na competição?
Eto. Ah, claro.
ou critica é bem-fundamentada.
Etr. Muito bem. Desejo-lhe sucesso.
Eto. Ah,... assumi o emprego, finalmente.. . Comecei ontem. Eto. Gostaria que todos vocês parassem de ficar em cima de
. 1
Não é ruim. num .
Etr. Estou muito surpreso em ouvir isso. Pensei que havíamos Etr. Não gosto de seu tom de voz. E não estou em cima de você,
decidido procurar mais. Algo que se adaptasse melhor a como você diz. Você tem sido rude desde que chegou aqui,
_:1::_8::_8_ _ _ __ _ _ __ _ _ _ _______ A entrevista de ajuda 189
Resposrns e indicações - - -- -- - - - - -- - - - - - - - - -

mas tenho tentado deixar passar isto. Tentei estender-lhe avaliar a situação de forma mais correta e com mais autoridade,
minha mão em sinal de amizade, mas você continuou me e que o entrevistado faria bem em ser orientado por ele. Por
hostilizando. Não vou tolerar mais isto. Agora depende de exemplo:
você!
Eto. Gostaria de ir sozinho ao correio. Estou trabalhando bem Etr. Você, nunca?
com meu cão-de-guia, e quero comprar meus próprios selos.
Eto. Ela chama todo o mundo, mas a mim, nunca, estou lhe dizen-
Etr. Sinto muito, mas você não pode. Admiro seu desejo de do!
independência; mas, na minha opinião, você ainda não está
Etr. Simplesmente não posso acreditar. Além de tudo, você está
preparado. Mais dois dias de prática intensiva e eu poderei
na sala de aula, como todos os outros. Simplesmente não
dar permissão. De que selos você precisa?
faz o menor sentido a forma como você vê isso.
Eto. Quero chegar mais tarde segunda-feira. Tenho algo impor-
Eto. ... E eu não fechei os olhos a noite toda, doutor.
tante para resolver amanhã. De qualquer forma, até que
Etr. A enfermeira de plantão me disse que você donniu profun-
arrumem as coisas na oficina às segundas-feiras não perde-
damente por algum tempo. Talvez você tenha donnido de
ria mais do que umas duas horas, e podia compensá-las.
olhos abertos.
Etr. Sinto muito, Bob, mas não vai dar. Se todo o mundo fosse
Eto. Para os outros, sim, mas para mim, nunca uma palavra
fazer isso, não haveria ninguém aqui. Quando se entra em
amável.
atividade, não se pode entrar e sair à hora que quiser. O que
Etr. Olha, Tom, simplesmente não posso ac r~ditar nisso. Você
quer que você tenha de fazer não pode ser tão importante
só se lembra das repreensões e esquece os elogios. Sua mãe
que tenha de ser a primeira coisa na manhã de segunda-
feira. O que é, a propósito? falou realmente de sua sensibilidade a criticas, e que você
parece co nsiderar os elogios como nece~sários. Talvez se
você fizes se uma lista apenas por uma semana, obteria wn
Descrédito
quadro dife rente do que realmente acontece em sua casa.
O descrédito não implica necessariamente que o entrevis-
tador suspeite que o entrevistado está mentindo. Supõe, na rea- Ridicularização
lidade, que a percepção do entrevistado de uma situação dada é
Em intenção, ridicularizar está relacionado com desacredi-
incorreta ou distorcida, e que o entrevistador, de sua posição, pode
tar; porém a indicação ou resposta é mais dura, mais sarcástica.
detectar e apresentar uma visão não distorcida e mais objetiva.
Aqui, o entrevistador instrui condescendentemente o entrevista-
Na utilização de indicações e respostas de descrédito, o entre-
do com a finalidade de demonstrar como ele e suas percepções
vistador pode muito bem pretender encorajar o entrevistado,
são absurdos. A ridicularização é uma forma de provocação,
mostrando-lhe - inclusive com o emprego do sarcasmo, se ne-
destinada a confundir o entrevistado, fazendo-o comportar-se
cessário - que as coisas não podem ser tão ruins como ele des-
"sensivelmente" como "outras pessoas" - como o entrevistador.
creve. O entrevistador está convencido de que pode interpretar
O entrevistador assegura ao entrevistado que também ele avalia-
o ponto em discussão mais conetamente do que o entrevistado,
rá a situação pelo mesmo prisma, uma vez que se livre destas
e dessa forma ajudá-lo a caminhar em um sentido que sua per-
noções absmdas e percepções ridículas. É como se o entrevista-
cepção distorcida agora toma dificil, se não impossível, perce-
dor estivesse dizendo: "Sim, estou deliberadamente fazendo pou-
ber. Em resumo, o entrevistador informa a seu parceiro que pode
co de você, para que seja capaz de libertar-se de suas tolas con-
190 Respostas e indicações _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _1_9_1
~---------~
. A entrevista de ajuda

Eto. Sinto um calor insuportável aqui dentro.


cepções e agir de uma forma benéfica para você mes~o. Mas
Etr. Não é possível; todas as janelas estão completamente abertas.
você só pode conseguir isto se começar a ver a realidade da
Eto. Eu realmente o amo e quero casar com ele.
forma como a vejo." Comparem os diálogos seguintes em ter-
Etr. Você quer casar com ele por causa do dinheiro e da posição
mos de intenção e personalidade do entrevistador: social que ele ocupa. Você pode enganar a você mesma, mas
a mim não.
Eto. Pensei em voltar a trabalhar o dia todo ... Eto. Só há débeis mentais aqui nesta escola, e eu quero sair des-
Etr. Experimentou sua habilidade em percepção extra-senso- ta porcaria o mais rápido possível.
rial... Pensou que a loja viria exatamente para dentro da sua Etr. Esta não é uma escola de crianças retardadas. Na realidade,
casa, não foi? a maioria das crianças são tão inteligentes, e talvez até mais
Eto. Simplesmente não consegui ir até ela e pedir desculpas. que você.
Etr. Ah, claro que não, ela poderia ter comido você. Eto. Sou tão feliz "andando por aí", como você chama.
Eto. Você me deu tantos remédios que não me lembro de tomá- Etr. Sei que não é. Você está apenas adotando a saída mais fácil.
los. É um infeliz e solitário. Ninguém poderia ser feliz vivendo
Etr. Acho que vou ter de lhe telefonar de hora em hora para lem- da maneira como você vive.
brar-lhe quais os que deve tomar.
Eto. Não pude fazer a caminhada ontem porque choveu a maior
Negação e rejeição
parte do tempo.
Etr. Compreendo. Você teria derretido; e se um dia conseguir um Entre as indicações e respostas relacionadas nesta série,
emprego, vai esperar que venham apanhá-lo de táxi quando negação e rejeição são as mais extremas. O entrevistador que as
estiver chovendo . emprega rejeita as idéias, pensamentos e sentimentos do entre-
Eto. Não deu para avisar a você que não o faria na semana pas- vistado e, dessa forma, é bem possível que esteja rejeitando o
sada.
próprio entrevistado. Ele está dizendo ao entrevistado que, a me-
Etr. Claro! Os telefones estavam com defeito, e o correio não
nos que seus pensamentos, atitudes e comportamentos mudem,
funciona nesta cidade.
nada pode ser conseguido na entrevista. A menos que o entre-
vistado se adapte às percepções do entrevistador, ele é indigno
Contradição
do tempo deste último, e não merece mais atenção de sua parte.
"Não é assim. É de outra forma. É assim." É isso que o en- Faz-se com que o entrevistado compreenda que, nas condições
trevistador está afirmando ou deixando implícito quando utiliza presentes, ele não pode ser orientado nem receber assistência.
a contradição como indicação ou resposta. Está dizendo "não", Ou muda ou vai embora. O entrevistador, confiante em sua reti-
"errado", "mau" ao que o entrevistado expressou. Ele está se- dão, não pode avançar além disso. Alguns exemplos:
guro de seus motivos e faz com que o entrevistado saiba e sinta
isto. Não há nenhuma dúvida possível, nem duas maneiras de Etr. Já discutimos este ponto várias vezes. Você insiste que não
ver as coisas. Ele pretende orientar o entrevistado para o rumo pode, e que tem tentado. Eu insisto que você pode e que não
"certo". Inclusive contradiz os sentimentos expressos do en- tem realmente tentado. Não tem sentido continuar dessa for-
trevistado quando estes são "maus" ou "desorientados". Por ma. Você pode voltar a me ver se e quando tiver algo novo
exemplo: para relatar.
193
_1_9_2 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda Respostas e indicações _ _ __ - - - - - - - - -- - - -

Eto. ... E eu mal tinha começado, tinha acabado de aprontar dicações e respostas conforme ocasionalmente utilizadas - dei-
minhas ferramentas, quando o supervisor me mandou jun- xando ao leitor a decisão quanto à sua adequação e valor bené-
tar minhas coisas e sair. Nem mesmo tinha aberto a boca. fico.
Etr. Por acaso conheço o supervisor, e sua história simplesmen-
te não é verdadeira. Das outras vezes não pude verificar, mas Repreensão
desta, pude e o fiz . Você foi arrogante e desafiador, não
quis cooperar; e pelo que ele me disse, você falou muitas Quando repreende, o entrevistador interpreta e avalia as
coisas completamente inoportunas. Espero que consiga ar- idéias, sentimentos e ações do entrevistado. Tendo compreendido
ranjar um emprego, mas não será por nosso intermédio. Para estes de forma satisfatória, reage negativamente em relação a
nós, chega! eles. "Esta não é a maneira de pensar, sentir ou agir", adverte. O
Eto. Você não sabe o que é andar com uma bengala ou com um entrevistado precisa se corrigir; e na esperança de que um debate
cão-de-guia. As pessoas olham e apontam para você como verbal resolverá o problema, começa a falar sem demora:
se você fosse uma aberração ou algo parecido. Vou usar um
guia - mamãe está disposta a isso - ou então vou ficar em Eto. Pensei que o trabalho não fosse para a próxima semana.
casa. Etr. Não sei quem deu a você esta idéia. Todo o mundo parece ter
Etr. Bem, se é essa a sua atitude, não podemos ajudá-lo. Mas entendido. É melhor você pensar menos e escutar mais. Ain-
lembre-se apenas que mamãe não vai ficar a seu lado a vida da há tempo para prepará-lo, portanto comece a trabalhar.
toda e depois, bem, o problema é seu. Eto. Sei que eles são meus pais, mas não os sinto como tal.
Etr. Você não sente que eles são seus pais? Como você diz tolices.
Discutimos isso exaustivamente, e você mesmo disse que
sabe que eles são . Sei que tem ido difícil ; mas agora já pas-
O uso aberto da autoridade do entrevistador
sGu, e é melhor você controlar estes seus sentimentos antes
que eles o controlem. Tantas crianças não encontram seus
Estamos agora atingindo a fase na qual o entrevistador faz pais novamente; você tem sorte por ter conseguido - certo?
uso aberto de sua autoridade. Ele assume total responsabilidade Eto. Acharia melhor que você contasse para ele que eu quero
pelo que acontece na entrevista e domina a situação como tal. mudar.
Atua a partir de sua posição de autoridade, e através de seu com- Etr. Olhe aqui, Bill, é melhor você parar com isso. Você quer
portamento aberto incentiva o entrevistado na direção que lhe sempre que os outros façam a sua parte quando ela é desagra-
parece correta, acima de qualquer questionamento. Ele é a figu- dável. As coisas agradáveis você está sempre pronto a fazer
ra determinante no processo de entrevista. Suas atitudes são cen- sozinho. Conversamos muito sobre isto, e acho que você
compreendeu por que não o faz, mas compreensão não é ?
trais, mas ele vai um passo adiante: além de expressar essas ati-
bastante. Você tem que agir a partir do que você conhece. E
tudes, age a partir delas abertamente e sem ambigüidade, admi-
melhor você mesmo co ntar a ele que quer mudar, porque não
tindo que se o entrevistado pode ser coagido assim, talvez possa vou fazer isto por você. Já é tempo para você crescer. Se não
ser ajudado. Ele não vê outra saída disponível e adota essa como quer dizer a ele que quer mudar do trabalho em madeira para
último recurso. Não vou analisar aqui aqueles entrevistadores metal, como é que você vai ter a iniciativa de pedir uma garo-
que baseiam suas entrevistas principalmente no uso aberto da ta em casamento? Vamos, comece a se mexer'
autoridade. Em vez disso, vou limitar-me à discussão destas in- Eto. Estava bem-intencionado .
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9_:_
4 __________________ A entrevista de ajuda
Respostas e indicações _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _1_9_5

Etr. E daí? Estar bem-intencionado não é a mesma coisa que


parar, mas se você acredita honestamente que vai longe
fazer o bem. Você a agride muito, e estou bastante irritado
nesse mundo, com a maneira que você tem de ver as coi-
com todo esse problema. Da próxima vez, é melhor pensar
sas, está redondamente enganada. A menos que você mude
mais nos outros do que em você mesmo.
- e rapidamente - está caminhando em direção a muitos
problemas.
Ameaça
Com o emprego da ameaça, o entrevistador notifica o en- Ordem
trevistado dos passos que dará se esse continuar trilhando seu Aqui o entrevistador ordena francamente ao entrevistado pa-
caminho atual. Ele diz, com efeito, que mobilizará o poder sob ra que siga suas instruções. Age com base nos pressupostos ante-
seu comando que é, naturalmente, maíor do que o entrevistado riormente mencionados, e talvez com o acréscimo do seguinte: o
pode mobilizar. Isto significa, em um contexto social mais am- entrevistado precisa ser conduzido por uma mão firme, e ele, o
plo, que o entrevistador adverte o entrevistado das conseqüên- entrevistador, está mais bem qualificado para executar essa tarefa.
cias que o esperam se ele persistir em seus caminhos errados. É
uma advertência precisa. Eto. ... elas simplesmente vieram ... Não posso controlar minhas
lágrimas.
Eto. Estou lhe contando a verdade. Não levei aqueles lápis! Etr. Claro que pode. Tente compor-se: enxugue os olhos e assoe
Etr. Se você continuar mentindo, vou ter que mandá-lo para o o nariz. Temos muita coisa para conversar.
diretor, e ele .. . bem, ele sabe o que fazer. Etr. Pare de ficar brincando com o cabelo, desvia muito a atenção.
Eto. Não pude fazer nada; meu ônibus atrasou de novo hoje de Eto. Não posso jogar bola hoje. Minha mão ...
manhã. Etr. Entre logo naquele campo. Eu estarei lá, e quero ver você
Etr. Se chegar atrasado mais uma vez, teremos que lhe pedir lançando como nunca o fez em sua vida.
para que deixe nossa oficina. Talvez um ônibus se atrase, Eto. Preciso muito ver você hoje.
mas sei que havia um anterior que poderia ser facilmente Etr. Você chegou com um atraso de uma hora para o nosso últi-
tomado. mo compromisso também. Agora, saia, por favor. Estou mui-
to ocupado, como pode ver. Espere lá fora, e eu lhe direi
Eto . Acho que meu irmão é compl etame nte mau.
mais tarde quando posso vê-lo.
Etr. Você vai continuar pensando assim até fazê-lo acreditar
Eto. Realmente não sei se devia ...
também, e seu irmão ainda vai terminar na cadeia; ele pode
Etr. Entre naquele avião, e quando tudo tiver passado, venha
querer provar que você tem razão.
ver-me novamente. Não quero vê-lo até que tenha dado
Eto. ... Apesar de ter conseguido as notas e a bolsa de estudos,
uma boa chance a essa coisa. Sei que você pode fazer isso,
não quero ir para a universidade agora.
também. Boa sorte!
Etr. Se você continu ar com esses absurdos, vou falar para seus
pais darem você como um caso perdido. Eu não perco nada
Punição
se você não for para a universidade; o problema é todo seu.
Eto. Sinto que não estamos chegando a lugar algum. O entrevistador, sentindo que pode punir o entrevistado
Etr. Isto não me surpreende! Com sua atitude, não é de estra- por alguma impropriedade de seus atos ou atitudes, exerce o
nhar que não estejamos chegando a lugar algum. É melhor poder e influência implícitos em seu papel. Ele pode, inclusive,
_:l.:_9_:6_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda
Respostas e indicações 197
alegar que está ajudando o entrevistado com isso, embora este
lhada. Algumas vezes manifes ta-se em nossa gargalhada es-
·último não possa apreciá-lo no momento. Aqui, o entrevistador
pontânea com o entrevistado; outras vezes em sua gargalhada
lança sua última cartada sob a premissa de que, se não funcio-
provocada por nós . De vez em quando é uma piada que se ajus-
nar nada mais vai dar resultado. Mesmo quando esta aborda-
ge~ - a mais autoritária - é mobilizada, a intenção e atitude do ta à situação - uma que o entrevistador acredita que não criará
nenhum obstáculo à comunicação, mas que servira para aliviar
entrevistador variam muito. Comparem os exemplos seguintes:
a tensão e clarear a atmosfera.
Eto. Quebrei os óculos dele. Os outros apenas observaram. Estou me referindo, naturalmente, ao humor espontâneo,
Etr. Fiquei satisfeito porque você me contou, Dick, embora já o não artificial - algo muito natural, não pl anejado. Pode consis-
soubesse. Você vai ter que pagar, sabe. Posso conseguir tra- tir, por exemplo, de nada mais que uma sobrancelha levantada,
balho para você na lanchonete se não tiver o dinheiro sufi- um sorriso, um gesto. Quando isto aco ntece, há uma maior
ciente para pagar. aproximação entre entrevistado e entrevistador, estabelecendo
Eto. Tudo o que vocês fazem aqui é dar desculpas. uma ligação adicional. Por falta de um term o melhor, posso
Etr. Então é melhor você procurar outra agência. Até logo. chamar isso de gostar realmente um do outro, e confiança na na-
Eto. Vocês todos só falam, mas estão é realmente com medo de tureza de ajuda do relacionamento humano.
fazer alguma coisa.
Etr. Bem, eu pelo menos, não estou. Você está suspenso de todas
as atividades por urna semana, e não poderá sair daqui, natu-
ralmente.
Eto. Ele é meu filho, e eu farei o que quiser com ele.
Etr. Você está bastante enganado. A lei, nestes casos, protege a
criança contra os pais, e nós vamos ao tribunal para cumpri-
la. Terei que mostrar-lhe quem é mais forte, e não hesitarei
em fazê-lo!

Humor

Sinto-me incapaz de concluir com uma nota tão sombria.


Para sorte minha, há ainda uma reação do entrevistador que
merece ser mencionada. Sempre observei que o humor, quando
usado apropriadamente, pode ser tão útil quanto muitas outras
indicações e respostas, ou até mais. Embora não possa definir
exatamente o que tenho em mente, não me refiro a sarcasmo,
ridicularização ou cinismo. Ao contrário, estou pensando na-
quele leve toque de humor que se origina do ouvir com empa-
tia, e que reflete uma visão positiva da vida. É uma resposta
muito individual e pessoal, para a qual não há uma receita deta-
Despedida

Quando, finalmente, comecei a colocar este livro no papel,


após pensar durante anos em fazê-lo, escrever a introdução de-
monstrou ser bastante fácil. Despedir-se é mais dificil. É como
algo que ocorre às vezes na entrevista de ajuda. Quando chega a
hora de os dois finalmente se despedirem um do outro, ambos
sabem que é o fim, e então se retardam um pouco, não mais pre-
cisando um do outro, mas desfrutando de suas reflexões mú-
tuas. Portanto, acho dificil separar-me agora e continuar o meu
caminho. Não que eu não possa; na realidade, devo. Mas há um
desejo de demorar-me por apenas mais um momento, para
meditar sobre o que foi realizado e considerar como foi feito.
Escrevi este livro para que pudéssemos pensar profunda e
desapaixonadamente sobre a entrevista de ajuda, e fazer isto com
o mínimo de barreiras à comunicação, inclusive as da linguagem
esotérica. Gostaria que analisássemos as muitas maneiras pelas
quais os entrevistadores se comportam, e a influência que seus
modos particulares de comportamento podem exercer sobre o
entrevistado. Uma vez que há tantos modos de comportamento
quanto entrevistadores, tentei simplesmente descrever certos pa-
drões que me parecem predominantes. O entrevistado em si mes-
mo permanece a eterna interrogação. Nunca sabemos antecipa-
damente quem ele será; mas quem quer que seja, devemos estar
sempre preparados para tentar ajudá-lo.
_2_0_0 _ _ _ _ _ __ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda 201
Despedida - - -- - -- - - - - - - - - - -

Estou convencido de que o comportamento do entrevista- nar. Contudo, mudança envolve tra ll.i lho árduo do tipo que nin-
dor influencia acentuadamente a percepção que o entrevistado guém pode fazer por nós . Um livro apropriado pode auxiliar-nos;
tem dele como pessoa, e a reação do entrevistado ao processo bem como um supervisor perceptivo, anotações, gravações,
de entrevista. Se nosso comportamento não importasse, haveria role-playing e discussão franca com colegas. Por fim, a mudan-
pouco interesse em escrever sobre isso. Entretanto, é importan- ça implica um trabalho sem-fim que cada um deve realizar den-
te, e continuará sendo, enquanto os seres humanos tentarem tro de si mesmo.
ajudar outros seres humanos por meio da entrevista. Se os com- Nossa opinião sobre a entrevista de ajuda também não per-
putadores assumirem esta função, minha premissa não será mais manece estática. Ela também muda à medida que experimenta-
válida. Odeio contemplar as implicações de uma mudança des- mos e·descobrimos mais sobre como nosso comportamento afe-
sas, e retomo rapidamente ao entrevistador humano, para o qual ta o dos outros. À medida que reflito sobre o que escrevi, verifi-
escrevi. co que não fui tão descritivo como tive a intenção de ser. Talvez
Creio que o que é válido para o entrevistado é válido tam- meus próprios valores tenham se interposto muitas vezes. Pos-
bém para nós, entrevistadores. As pessoas podem mudar; as so apenas repetir, uma vez mais, que minha intenção foi a de
pessoas realmente mudam. Sem essa convicção de nossa parte, estimular o pensamento e, possivelmente, a mudança ; mas adi-
a entrevista, nossa ferramenta, se desintegraria. O debate é mais reção que esse pensamento e essa mudança tomam deve ser de
acirrado sobre aquilo que provoca a mudança - o que a promo- sua escolha.
ve e o que a impede. Podemos mudar nosso comportamento se Quando estamos entrevistando, somos deixados com o que
pudermos nos permitir, antes de mais nada, descobrir como somos. Não temos livros, nem notas de aulas, nem alguém ao
realmente nos comportamos. Analisando nosso próprio com- nosso lado nos assistindo. Estamos sozinhos com a pessoa que
portamento de forma não-defensiva, podemos aprender muito. veio procurar nossa ajuda. Qual a melhor forma de ajudá-la?
Não mais nos sentindo ameaçados, podemos nos permitir exa- Defrontar-nos-emos com os mesmos problemas básicos sempre
que enfrentarmos uma entrevista pela primeira vez. São eles, em
minar nosso trabalho mais de perto. Com a utilização de grava-
resumo:
ções, anotações, observadores, supervisão, discussão,feedback
do enh·evistado e auto-exame, podemos chegar ao ponto no qual 1. Devemos nos permitir emergir como seres humanos
seremos capazes de descrever nosso comportamento na entre- autênticos, ou nos esconder atrás do nosso papel, posição, auto-
vista de ajuda. Após descrevê-lo, podemos então considerar se ridade?
é assim, de fato, como acreditamos, que estávamos nos com- 2. Devemos realmente tentar escutar o entrevistado com
portando, e se desejamos continuar nos comportando dessa for- todos os nossos sentidos?
ma. Minha intuição diz que devemos sempre descobrir um abis- 3. Devemos tentar compreender com ele - com empatia e
mo - ou pelo menos uma fenda - entre o que estamos realmente aprovação?
fazendo, o que pensan1os que estamos fazendo e o que ideal- 4. Devemos interpretar para ele seu comportamento em ter-
mente desejamos fazer. mos de seu esquema de referência, do nosso ou do da sociedade?
Tenho a convicção de que podemos fazer com que nosso 5. Devemos avaliar seus pensamentos, sentimentos e ações,
comportamento se aproxime da nossa filosofia. Em outras pa- e se o fizermos, em termos de quais valores: dele, nossos, da
lavras, podemos mudar no sentido do eu que queremos nos tor- sociedade?
_2_0_2_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ A entrevista de ajuda

6. Devemos apoiá-lo, encorajá-lo, pressioná-lo, de modo Bibliografia complementar


que, apoiando-se em nós, possa talvez ser capaz, um dia, de
apoiar-se em sua própria força?
7. Devemos fazer perguntas e interrogatórios, empurrar e (Os livros referidos no texto são precedidos por
aguilhoar, fazendo-o sentir que estamos no comaI1do, e, uma um asterisco. Os comentários que acompanham
algumas das referências são de A. Benjamin.)
vez que todas as nossas interrogações tenham sido respondidas,
devemos fornecer as soluções que ele está procurando?
8. Devemos orientá-lo na direção que julgamos ser a mais
correta para ele?
9. Devemos rejeitá-lo, assim como seus pensamentos e
sentimentos, e insistir em que ele se tome como nós mesmos,
ou que, pelo menos, se submeta à nossa percepção do que ele
podia ou devia tomar-se?
A Visões gerais da entrevista
Estes são, na minha maneira de ver, os pontos centrais. A
Bingham, W . e Moore, B . How to interview, 4 ~ ed. Harper, 1959.
maneira como lidamos com eles hoje não é necessariamente a
Kahan, R. e Cannel, C. The Dynamics oflnterviewing. Wiley, 1957.
mesma como lidaremos com eles amanhã. A escolha é sua.
Ambos os livros consideram, resumidamente, todos os aspectos da
entrevista. Prefiro o segundo porque se orienta mais para a entrevista de
ajuda; ver especialmente Capítulos 1 e 2.

B. Livros, incluindo estudos de casos, que tratam


especificamente da entrevista de ajuda

Bordin, E., Psychological Counseling. Appleton, 1955.


Um enfoque clínico eclético.

Brammer, L. e Shostrom, E. Therapeutic Psychology. Prentice Hall,


1965 .
Ver especialmente o Capítulo 7.

Buchheimer, A e Balogh, S. The Counseling Relationship. Chicago:


Science Research Assoe iates, Inc., 1961 .
Um volume de estudos de caso muito útil, com um esboço, claramente
definido.

Callis, R. et a!., A Casebook of Counséling. Appleton, 1955.


~2:_::0_:4_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __ A entrevista de ajuda 205
Bibliografia complementar_ __ - ----- -----
Evraiff, W. Helping Counselors Grow Professionally. Prentice Hall,
Tyler, L. F. Th e Work of1he Co1111selor, 2:' c> d. Appleron, J 9ó 1.
1963.
Ver Capítulos 2 e 3, que vale a pena ler e reler.
Este é altamente recomendável , devido ao fato de que as entrevistas
incluídas são analisadas por vários especialistas de pontos de vista Willi arnson, E. G. How to Counsel Students. McGraw-Hill , 1939.
divergentes. Williamson, E. G. Counseling Adolescents. McGraw-Hill, 19 5 O.
* Fenlason, A. Essentials in lnterviewing. Harper, 1952. O autor tende para o enfoque autoritário. Ambos os trabalhos merecem
ser conhecidos.
As Partes II e III são de extrema importância.
Garrett, A. lnterviewing: Principies and Methods. Service Association
of America, 1942 (58). . C. Livros e artigos que tratam da filo sofia da entrevista
de ajuda, e livros vários citados no texto
Uma introdução "obrigatória".
Miller, L. Counseling Leads. Pruett Press, Boulder, Colo. Arbuckle, D. Counse!ing: Philosophy. Theory and Pracrice. All yn and
Patterson, C. H. Counseling and Psy chotherapy - Theory and Prac- Bacon, 1965.
tice. Harper, 1959.
Uma notável exposição da filosofia centrada no cliente.
Muito próximo do meu enfoque.
* Beck, C. E. Guide/inesfor Guidance. William C. Brown, Iowa, 1966.
Patterson, C. H. Theories of Counseling and Psychotherapy. Harper,
Trata de todos os grandes enfoques filosóficos contemporâneos. Ver
1966.
especialmente o Capítulo 48, de E. Dreyfus.
Porter, E. H., Jr. Therapeutic Counseling. Houghton Mifflin, 1950.
Boy, A. e Pine, G. Client-centered Counseling in the Secondary
Indispensável para o objetivo de auto-exame do entrevistador quanto a
School. Houghton Mifflin, 1963 .
aceitar ou não seu enfoque não-diretivo. Ver especialmente "Pré e Pós-
teste". * Buber, M . I and Thou. C. Scribner's Sons, 1952.
Buber, M . Th e Knowledge ofMan. Harper & Row, 1965.
Rogers, C. R. Counseling and Psychotherapy. Houghton Mifflin, 1942.
Ver especialmente "Apêndice: Diálogo entre Martin Buber e Carl R.
Colocação clássica do ponto de vista não-diretivo. Rogers".
Sachs, B. Th e Student, the lnterview, and the Curriculum. Houghton * Bugental, J. F. The Searchfo r Authenticity. Holt, 1965.
Mifflin, 1966. Um enfoque existencialista bem -Je finido .
Snyder, W. Casebook of Non-directive Counseling. Houghton
* Coleman, J. C. Abnormal Psychology and Modem life, 3 ~ ed . Scott
Mifflin, 1947.
Foresman, 1964.
*Sullivan, H. S. The Psychiatric lnterview. Norton, 1954.
* Fiedler, F. E. "The Concept of an Ideal Therapeuti c Relationship'',
Embora não aplicável diretamente, este livro é basicamente estimulante Journal ofConsulting Psychology, vol. 14 (1950), pp. 239-245.
para o estudante da entrevista de ajuda. *Fiedler, F. E. "A Comparison of Therapeutic Relationships in
Thome, F. C. "Directive and Ecletic Personality Counseling", Six Psychoanalytic, Non-directive and Adlerian Therapy", Journa/ of
Approaches to Psychotherapy, eds. M. McCa1y e D. Sheer, Holt, Consulting Psychology, vol. 14 (1950), pp. 436-445.
1955. * Fiedler, F. F .. "Factor Analysis of Psychoanalytic, Non-directive
and Adlerian Therapeutic Relationships", Jourrial of Consulting
A posição autoritária por excelência.
Psychology, vol. 15 (1951), pp. 32-38.
~2'..'.'.0~6:_______________ ___ A entrevista de ajuda
Bibliografia complementar_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _2_0_7

* Freud, A The Ego and the Mechanisms of Defense. Intemational


Universities Press, 1946. ' Psychotherapy", Journal of Abnormal Psychology, vol. 71 (fev.
1966), pp. 1-9.
*Freud, S. Little Hans. Hogarth, 1955 .
*Freud, S. The Problem ofAnxiety. Norton, 1936. * White, R. W., ed. The Study of Lives. Essays on Personality in
Honor ofHenry A. Murray. Atherton Press, 1963.
Freud inicia e sua filha elabora o estudo dos mecanismos de defesa.
Ver Capítulo 8, "As Funções de Enfrentamento dos Mecanismos do
Heller, K. et ai., 'The Effects of Interviewer Style in a Standardized Ego", de Theodore C. Kroeber.
Interview", Journal of Consulting Psychology, vol. 30 (1966), pp.
Wiens, A N. et ai., "Speech lnterruptions During lnterviews", Psy-
501-508 .
chotherapy: Theory Research and Practice, vol. 3 (1966), pp. 153-
* Jourard, S. M. The Transparent Self. Van Nostrand, 1964.
158.
Jung, C. G. Modem Man in Search ofa Sou/. Harcourt, 1932.
* Wright, B. Physical Disability: A Psychological Approach. Harper,
Ver especialmente Capítulo 11. 1960.
* Lewin, K . A Dynamic Theory ofPersonality. MacGraw-Hill, 1935 . Analisa o enfrentamento vs. a derrota.
Discussão teórica do "espaço vital" .
* Maslow, A. Motivation and Personality Harper, 1954.
Discute o enfrentamento como oposto à defesa. ·
Maslow,A. TowardaPsychologyofBeing. VanNostrand, 1962.
Matarazzo, J. D . and Wiens, A. N . "Interviewer Influence on Du-
rations of Interviewee Silence", Journal ofExperimental Research
in Personality, vol. 2 (1967), pp. 56-69.
May, Angel e Ellenberger, eds. Existence: A New Dimension in
Psychiat1y andPsychology. Basic Books, 1958.
May, R. Existential Psychology, Random , 1961.
May, R. , Psychology and the Human Dilemma. Van Nostrand, 1966.
McDaniel et ai., Readings in Guidance, 2~ ed. Holt, 1965 .
McGowan and Schmidt. Counseling: Readings in Th eory and
Practice. Holt, 1962.
As duas coletâneas de trabalhos acima contêm uma amostragem rica e
variada de enfoques filosóficos .
* Reik, T. Listening with the Third Ear. Farrar Strauss, 1954.
* Robinson, F. Principies and Procedures in Student Counseling.
Harper, 1950.
* Rogers, C. R. Client-centered Therapy. Houghton Mifflin, 1961.
* Rogers, C. R. On Becoming a Person. Houghton Mifflin, 1961 .
Ver particularmente os Capítulos 3 e 17.
Truax, C. B. "Reinforcement and Nonreinforcement in Rogerian
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