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A “NOVA” LEI DE TERRAS DO BRASIL (LEI Nº 13.

465, DE 11 DE
SETEMBRO DE 2017) E A (RE)PRODUÇÃO DOS CONFLITOS PELA
TERRA, NA AMAZÔNIA RONDONIENSE.

ALYSON FERNANDO ALVES RIBEIRO 1

Resumo
A presidência de Michel Temer sancionou, no dia 12 de maio de 2017, em Brasília, a Lei
13.465/2017, que flexibiliza a regularização fundiária de terras da União, com o nome de Programa
Nacional de Regularização Fundiária. Essa “nova” legislação das terras devolutas do Brasil é
baseada na medida provisória 759. O presente artigo buscar analisar os conflitos de classe na
(re)produção do espaço agrário do estado de Rondônia, gestados no seio do processo de
regularização fundiária, promovido pela Lei 13.465/2017.O referido reordenamento jurídico, uma
agenda territorial do agronegócio, possui como principal inovação, alargamento da área de
regularização em terras da União de 1.500 para 2.500 hectares, em todo território nacional (Brasil,
2017). O que inclui o aumento de posses a ser legalizadas pelo Programa Terra Legal na Amazônia
(PTLA). Essa privatização da terras, é inseparável às necessidades de acumulação primitiva do
capital, sendo regra e não exceção do movimento do capital . A Lei 13.465/2017 possui como
movimento dialético a condição-meio-produto a transformação de terras devolutas em mercadoria.
Uma brecha para o sepultamento do legado da reforma agrária. Segundo Paulino (2017) essa
“liquidação” das terras públicas é o maior atentado à Constituição brasileira, pois permite ampla
legalização da grilagem, no qual os ruralistas ficarão a vontade, para apropriar os fundos territoriais
(Moraes, 1999); que são terras de domínio comum, ou seja, patrimônio mais fundamental de uma
sociedade. Terras que deveriam ser destinadas a reforma Agrária. O que separa a contradição
histórica do valor de uso e valor de troca é a violência. Segundo Mitidiero Júnior (2017), a “nova”
jurisdição para campo brasileiro arquitetada pela bancada ruralista, intensifica a barbárie no campo,
ao representa uma derivação violenta da privatização de terras e apropriação dos bens da natureza
para a expansão do capital. Como reflexo deste panorama a geografia dos conflitos agrários em
Rondônia cresceu (re)produzindo conflitos pela terra e pelo território, uma vez que a mencionada
regularização fundiária aqueceu o mercado de terras na Amazônia rondoniense, resultando em
invasões, desmatamento e loteamento de terras indígenas da etnia Uru-Eu-Wau-Wau, por

1
Acadêmico do curso de doutorado do Programa de Pós-Graduação em Geografia/ UFS (Brasil).
Bolsista Capes. E-mail de contato: alyson_pop17@hotmail.com
madeireiros ilegais que buscam a legalização da terra invadida. Desta forma, a Lei 13.465/2017
representa o sequestro da reforma agrária, ao aprofunda o fosso entre a terra de negócio e a terra de
Buen Vivir, fortalecendo a necessidade de luta pela terra, como sinônimo de luta contra a acumulação
primitiva do capital: fórmula sine qua non de expansão e concentração do capital.

Palavras-Chave: Lei 13.465/2017. Conflitos agrários. Invasão de terra. Uru-Eu-Wau-Wau.


Acumulação Primitiva.

Abstract:
The presidency of Michel Temer sanctioned, on May 12, 2017, in Brasilia, Law 13.465 / 2017, which
eases the land regularization of the Union, under the name of National Program for Land
Regularization. This "new" legislation of the vacant lands of Brazil is based on the provisional measure
759. This Article to seek to analyze the class conflicts in the (re) production of the agrarian space of
the state of Rondônia, originated in the process of land regularization, promoted by Law 13.465 /
2017.This juridical reorganization, a territorial agribusiness agenda has as main innovation the
enlargement of the area of regularization in lands of the Union of 1,500 to 2,500 hectares, throughout
the national territory (Brazil, 2017). This includes the increase of land legalized by the Land Legal
Program in the Amazon (PTLA). This privatization of land is inseparable from the needs of primitive
accumulation of capital, being a rule and not an exception to the movement of capital. Law 13.465 /
2017 has as a dialectical movement the condition-medium-product the transformation of vacant lands
into merchandise. A breach for the burial of the legacy of agrarian reform. According to Paulino
(2017), this "liquidation" of the public lands is the greatest attack on the Brazilian Constitution, since it
allows a broad legalization of land ownership, in which the ruralists will be free to appropriate the
territorial funds (Moraes, 1999). which are common domain lands, that is, the most fundamental
patrimony of a society. Land that should be destined for agrarian reform. Based on Lefebvre's reading
(2013) what separates the historical contradiction of use value and exchange value is
violence. According to Mitidiero Júnior (2017), the "new" jurisdiction for Brazilian countryside,
designed by the ruralist group, intensifies barbarism in the countryside, and represents a violent
derivation of the privatization of land and appropriation of the assets of nature for the expansion of
capital. As a reflection of this panorama, the geography of the agrarian conflicts in Rondônia grew (re)
producing conflicts for the land, since the mentioned land regularization warmed the market of lands in
the rondoniense Amazon, resulting in invasions of indigenous lands of the Uru-Eu-Wau- Wau, are
being invaded, deforested and parceled out by illegal loggers.Thus Law 13.465 / 2017 represents the
abduction of agrarian reform, deepening the gap between business land and the land of Buen Vivir,
strengthening the need to fight for land, as a synonym of struggle against the primitive accumulation of
capital: sine qua non of expansion and concentration of capital.

Keywords: Law 13.465 / 2017. Agrarian conflicts. Invasion of land. Uru-Eu-Wau-Wau. Primitive
Accumulation.

1-Introdução
A presidência de Michel Temer sancionou, no dia 12 de maio de 2017, em
Brasília, a Lei 13.465/2017, que flexibiliza a regularização fundiária de terras da
União, com o nome de Programa Nacional de Regularização Fundiária. Essa “nova”
legislação das terras devolutas do Brasil é baseada na medida provisória 759.
O presente artigo buscar analisar os conflitos de classe na (re)produção do
espaço agrário do estado de Rondônia, gestados no seio do processo de
regularização fundiária, promovido pela Lei 13.465/2017.
A Lei 13.465/2017 possui como movimento dialético a condição-meio-
produto a transformação de terras devolutas em mercadoria. O referido
reordenamento jurídico, possui como principal inovação o alargamento da área de
regularização em terras da União de 1.500 para 2.500 hectares, em todo território
nacional (Brasil, 2017). O que inclui o aumento de posses a ser legalizadas pelo
Programa Terra Legal na Amazônia (PTLA).
Um cenário doloroso, integrante desse movimento de privatização da terra
desencadeado pela ampliação da regularização de terras da União pela Lei
13.465/2017, na Amazônia brasileira é a invasão de terras indígenas da etnia Uru-
Eu-Wau-Wau, no estado de Rondônia. Um reflexo da materialidade dos conflitos
na\pela terra, cuja amplitude na Amazônia brasileira manifesta sua terrível potencia:
a barbárie.
Sendo assim, o referido artigo colocar em xeque o limite à pretensa
neutralidade jurídica, da regularização fundiária e da Lei 13.465/2017. Essa
privatização da terras, é inseparável às necessidades de acumulação primitiva do
capital, sendo regra e não exceção do movimento do capital.

1- Lei nº 13.465/2017: a “nova” lei de terras do Brasil

Seguindo a lógica de (re)definição jurídica da propriedade da terra, a


presidência de Michel Temer sancionou, no dia 12 de maio de 2017, a Lei
13.465/2017 que flexibiliza a regularização fundiária de terras da União, na chamada
Amazônia Legal. Com o nome de Programa Nacional de Regularização Fundiária,
essa nova legislação das terras devolutas do Brasil é baseada na Medida Provisória
759. Permite, entre outros pontos, a regularização de grandes condomínios
construídos em terras griladas, a compra de lotes da reforma agrária após dez anos
da titulação e a venda de terras na Amazônia.
Essas facilidades e inovações na regularização fundiária advindas da
referida MP são marcadas por várias críticas e oposições, o que lhe conferiu a
denominação de “MP da Grilagem”, em lembrança à prática fraudulenta de aquisição
de terras, marcante na questão agrária do Brasil e tão presente na Amazônia. Em
função disso, algumas análises apontam que a referida lei pode estimular a
continuação da apropriação ilegal de terras públicas, a reconcentração fundiária e,
inclusive, estimular pressões políticas e econômicas para a conversão de áreas
protegidas em espaço do agronegócio.
A referida MP da Grilagem, promulgada em Lei 13.465/2017, mediante
Projeto de Lei de Conversão (PLV) 12/2017, cujo relator foi o senador Romero Jucá
(PMDB-RR), ampliou a área de regularização em terras da União de 1.500 para
2.500 hectares, em todo território nacional, incluindo o aumento de áreas a serem
legalizadas pelo Programa Terra Legal na Amazônia, constituindo, assim, uma
“nova” lei de terras do Brasil (Ribeiro et al, 2018) . Evidencia-se o favorecimento de
latifundiários e grileiros ao estimular a reconcentração fundiária e ferir princípios do
direito social à moradia. Deve-se ressaltar que a Constituição de 1988, no artigo
191, determina o limite da posse em 50 hectares. A tabela a seguir expõem a
violência associada à luta pela terra no Brasil, na ultima década e em parte do
período pós-golpe.

Tabela 1- Comparação dos conflitos no campo (2007-20017)


Fonte: CPT (2017)
Nessa trilha de sepultamento da Reforma Agrária, por vias da redefinição
jurídica da terra, o Governo Temer converte a Medida Provisória nº 754 em Lei nº
13.465/2017, e como era esperado, mudanças significativas ocorreram no aparato
ideológico legal da política fundiária, tendo como horizonte regularizar a grilagem de
terras para atender o emergente mercado de terras mundializado, a partir do modelo
hegemônico de desenvolvimento agropecuário, resultando em mais concentração de
terras, expropriação e massacres do campesinato e dos movimentos sociais de luta
pela terra.
Segundo o professor Marco Antônio, da Universidade da Paraíba (UFPB),
idealizador e organizador do Dossê: Micghel Temer e a Questão Agrária, publicado
este ano na Revista Okara, a opção política pela regularização fundiária, efetivada
para substituição da política de reforma agrária, como resposta aos problemas
estruturais do espaço agrário do Brasil, é acompanhada pelo crescimento dos
conflitos agrários acrescido da criminalização dos movimentos sociais e da
impunidade (MITIDIERO JUNIOR, 2017).
Conforme levantamento do Instituto do Homem e Meio Ambiente da
Amazônia (IMAZON), a alegada “regularização” prometida pela Lei representará
perda de dinheiro em virtude da redução do valor da terra, que somente na
Amazônia será de aproximadamente R$ 20 bilhões. A norma também amplia
indevidamente as hipóteses de regularização fundiária, sem levar em conta o
licenciamento ambiental e urbanístico, a participação popular ou a elaboração de
estudos técnicos.
Como bem afirma Paulino (2017), essa “liquidação” das terras públicas do
Brasil pelo imbróglio jurídico da Lei 13.465/2017 é o maior atentado à Constituição
brasileira, pois permite ampla legalização da grilagem, no qual os ruralistas ficaram à
vontade para legalizar, apropriar e dominar o patrimônio mais fundamental de uma
sociedade: as terras de domínio comum e os recursos da natureza.
Sendo assim, faz-se necessário retomarmos a agenda de pesquisa
assentada em uma análise crítica que tenha por base a concepção da totalidade
social como processo que constrói a realidade. À crítica aos instrumentos jurídicos
que buscam legitimar uma contrarreforma agrária, para fins de acumulação de
capital e consequente expropriação e coerção territorial dos grupos sociais
vulneráveis, como ocorrem, pelo controle e domínio de terras de sociedades não
capitalistas.

3 – Invasões, grilagem e (re)produção dos conflitos por terra e território: a


síntese contraditória da Lei 11.952/09 na Amazônia Legal rondoniense.

A violência do ponto de vista teórico marxiano e engelsiana é resultado do


processo decurso da civilização. Para Karl Marx (1975), a civilização inicia-se com a
divisão social do trabalho, consolidada pela relação contraditória entre a cidade e o
campo, estruturada na produção mercantil cujo desenvolvimento, ocasiona uma
revolução em toda a sociedade anterior.
Desta forma a violência é gestada no interior do processo de advento e
consolidação do modo de produção capitalista. Segundo Engels (1975), a
propriedade capitalista da terra é o estágio de desenvolvimento da sociedade
capitalista, delimitada pela a primeira grande cisão da sociedade em uma classe que
explorava e outra que era explorada, sendo esta divisão mantida e legitimada pelo
Estado.
A leitura de Rosa Luxemburgo (1988) é imprescindível na analise da
barbárie como condição-produto desta acumulação original cujo movimento do
capital via imperialismo se estabelece tanto pelo processo de espoliação como de
exploração, principalmente pelo controle e domínio de terras de sociedades não
capitalistas.
Desta forma a cumulação primitiva, e sua face predatória e fraudulenta
ocorre pela generalização da violência no desenvolvimento das relações capitalistas
de produção, na realização da produção do valor, através da concentração dos
meios de produção e do roubo da força de trabalho.
Nessa conjuntura atual da questão agrária brasileira, sob os ditames da Lei
13.465/2017, a ação do agrohidronegócio em grilar, legalizar e concentrar terras
esboça o panorama dos conflitos agrários intensos em todo o Brasil, conforme se
constata:
Em 2016 incidiu o maior número de ocorrências de conflito pela terra nos
últimos 10 anos, totalizando 1.295 conflitos; o maior número de pessoas
envolvidas, tanto nos números da luta pela terra como no número de total
de conflitos (conflitos por terra, água e trabalho), chegando,
respectivamente, a 686.735 e 909.843 pessoas; a maior quantidade de área
em disputa entre 2007 e 2016, perfazendo 23.697.019 hectares de terra; o
maior número de conflitos pela água, totalizando 172 conflitos (o maior de
toda a série histórica da CPT, iniciada em 2002); e o segundo maior número
no total de conflitos no campo, chegando a 1.536 conflitos em 2016, dois
conflitos a menos do que o registrado em 2007 (1.538 conflitos)
(MITIDIERO JUNIOR, 2017, p. 7).

O ano de 2019 inicia com uma intensificação das denúncias de invasão a


terras indígenas no Brasil. Segundo a Comissão da Pastoral da Terra (CPT), ao
menos cinco terras demarcadas registraram derrubada de floresta para pastagens, a
abertura de estradas (picadas) e estabelecimento de lotes para ocupação ilegal de
terras tradicionais, em 5 estados do então território da Amazônia Legal( Quadro 1).

Amazônia Legal Terra Indígena Ocorrência


Estado (Tis)
Maranhão Awa Arariboia Ameaça e invasão
Mato Grosso Harãwatsédé Ameaça de reinvasão
Pará Arara Roubo de madeira e abertura
de lotes
Roraima Yanomani Invasão de garimpeiros
Rondônia Uru-Eu-Wau-Wau Loteamento, invasão e
ameaça.
Quadro 1 – Invasão de terras indígenas(Tis) no território da Amazônia Legal
Organizada pelo autor
Fonte: CPT (2019)

Em relação ao estado de Rondônia, a Ti dos Uru-Eu-Wau-Wau, está sendo


invadidas por grileiros, que buscam estabelecer lotes, roubar madeirae ocupar
ilegalmente o território indígena .

A ordem veio de fora Amanhã vem mais de 200 pessoas aqui, vocês fiquem
esperando. Vem gente de todo canto. Nessa primeira invasão, eles
praticamente entraram na aldeia, ficaram a apenas dois quilômetros. Muito
perto Depois da ação da polícia, eles estão se mudando para outros locais
(Puré. Liderança-Uru-Eu-Wau-Wau, CPT, 2019).

A TI dos Uru-Eu-Wau-Wau é habitada por 4 povos, Amondawa, Juma, Oro


Win e Uru-Eu-Wau-Wau. E está localiza na porção Norte do Estado de Rondônia
(figura1), com uma área tem a extensão de 1.867.117 ha, sendo homologada por
decreto do então presidente Collor em 1991.
Segundo a Funai (2019),cerca de 500 pessoas aguardam legalização da
terra para poder extrair madeira. A TI dos Uru-Eu-Wau-Wau está sendo invadida, com
objetivo de lotear a terra, para extração de madeira. Com a prerrogativa do aumento no
limite para regularização fundiária promovida pela Lei 13.465/2017, os fazendeiros que se
encontram nas franjas limítrofes da Ti dos Uru-Eu-Wau-Wau, passaram a aumentar seus
limites de terra, desmatando e ocupando na tentativa de legalizar a terra invadida (figura 1).

Figura 1 -Localização e desmatamento da (TI) Uru-Eu-Wau-Wau, Rondônia, 2018.


Fonte: Funai (2018).
Como podemos observar, o avanço sobre a TI dos Uru-Eu-Wau-Wau, está
crescendo a cada ano, tendo sua maior frente de penetração de corte e desmatamento o
ano de 2018. O desmatamento busca a efetivação da invasão da terra indígena, além de
proporcionar ao madeiro a venda ilegal de madeira. Segundo a FUNAI (2019), após ajuizar
130 ações contra danos ambientais, o Ministério Público Federal (MPF) descobriu que,
além de derrubarem e venderem madeiras, madeireiros estão leiloando ilegalmente terras
indígenas para várias pessoas no estado. Apenas entre setembro e outubro, um total
de 42 polígonos de desmatamento, representando 692,34 hectares de corte raso de
floresta. Esse desmatamento é realizado, tanto no território indígena, como na
Unidade de Conservação Parque dos Pacais Novos, que esta sobreposta a TI dos Uru-Eu-
Wau-Wau( Figura 1).
Entre os dias 23 a 28 de agosto de 2019, foi realizada uma operação
interinstitucional entre Funai, Ibama, Polícia Militar Ambiental, Exército Brasileiro e
ICMBio de Campo Novo de Rondônia, com o objetivo de promoveram ação de
fiscalização na Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau. Segundo a Funai (2019), foram
encontradas duas balsas, usadas para atravessar motocicletas e mantimentos pelo
rio Floresta, barracas montadas, trilhas, pontes em igarapés construídas para
passagem de motos, quatro acampamentos e plantações feitas em áreas
desmatadas pelos invasores(Figura 2 e 3).

Figura 2 – acampamento dos invasores Figura 3- Balsa transportadora


Fonte: FUNAI, 2019 Fonte: FUNAI, 2019

Segundo a Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé, após denúncias


de indígenas de que estavam ouvindo invasores em suas terras, a ONG Kanindé em
conjunto com a FUNAI Ji-Paraná, o Batalhão da Polícia Ambiental e a Associação
Jupaú realizaram uma operação contra madeireiros ilegais. Através de uma fazenda
na zona rural do município de Governador Jorge Teixeira foi encontrada uma trilha
que seguia para dentro da Terra Indígena. Neste caminho foram descobertos vários
focos com lascas e madeira serrada, além de uma castanheira com mais de vinte
metros que havia sido derrubada. No total, foram aprendidos mais de 17 metros
cúbicos de madeira de essência não identificada (Figura, 4).

Figura 4 - Madeira ilegal é apreendida na TI Uru-Eu-Wau-Wau – RO. Fonte: Kanindé, 2019


Para que possamos ter uma ideia desta violência ambiental, da pilhagem do
saque da riqueza da terra, contra o território de ocupação e suo milenar dos Uru-Eu-
Wau, segundo a Kanindé( 2019), se fosse uma carga de mogno africano, esse
montante valeria em média 42 mil reais. devemos salientar que a castanheira, tem
seu corte proibido desde 1994. Arvore esta, símbolo da luta e preservação da
Amazônia contra os ditames da terra mercadoria.
Segundo a coordenadora da Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé,
Ivaneide Bandeira, o conflito entre os grileiros e os indígenas é iminente.

O clima é de medo. Os madeireiros grileiros que estão invadindo as terras bem


armados. Esses invasores são violentos. Esse tipo de grilagem perto da aldeia é a
primeira vez ao longo da história da TI Ure-eu-wau-wau. Eles já grilavam em vários
pontos da unidade, mas próximo deles é a primeira vez. É algo escandaloso
(Kanindé, 2019)

Infelizmente concordamos: uma faísca não tardará em explodir esse barril de


pólvora. Desta forma, a situação da TI Uru-Eu-Wau, reflete os tempos obscuros da luta do
campesinato e dos indígenas pela terra trabalho, sendo esta luta acuada pelos
latifundiários, em sua maioria, grileiros, que por meio do arrepio da violência
armada, disputa a(s) riqueza(s) diversa(s) e adversa(s) da(na) terra.
Essa invasão a terras indígenas configura-se no rastro da expansão e
consolidação da acumulação primitiva, no território da Amazônia Legal, a ao longo
da transformação da terra em mercadoria pela liquidação do campesinato e dos
povos indígenas. Essa conversão violenta envolve a criação de uma “história
universal”, através da metanarrativa marxiana da luta de classe, travada pelas
condições de vida e de luta social no campo, que romper todos os limites da
mercantilização da terra pela expropriação da vida.

4 – Considerações finais

A “nova” lei de terras do Brasil, Lei 13.465/2017, votada no “calar da noite”,


um dia antes de ser votado o parecer da Comissão da Câmara dos Deputados que
bloquearia a autorização para o Supremo Tribunal Federal investigar crimes do
Presidente Michel Temer, revela o contexto da “barganha” da banca ruralista para
colocar na esfera jurídica, no aparato da lei, sua agenda territorial para o domínio de
terras públicas do Brasil, com especial ação para a Amazônia. Essa jurisdição da
terra é a via de acesso para o capital imprimir sobre a terra(geo) suas
marcas(grafias), geografando a questão agrária do Brasil com mais reconcentração
fundiária, exclusão e violência (RIBEIRO ET AL, 2018).
A opção política pela regularização fundiária, efetivada para substituição da
política de reforma agrária, como resposta aos problemas estruturais do espaço
agrário do Brasil, é acompanhada pelo crescimento dos conflitos agrários e
territoriais, que evidencia a resistência dos povos indígenas, grupo social, a priori,
que deveriam ser atendidos justamente pela política de regularização fundiária.
Desta forma, a Lei 13.465/2017 representa a empreitada do capital E Estado
em lança terra ao mercado, sendo a invasão de terras indígenas dos Uru-Eu-Wau-
Wau na Amazônia rondoniense, um reflexo direto, que aprofunda o fosso entre a
terra de negócio e a terra de Buen Vivir, fortalecendo a necessidade de luta pela
terra, como sinônimo de luta contra a acumulação primitiva do capital: fórmula sine
qua non de expansão e concentração do capital.

Referências

BRASIL. Lei nº 13.465, de 11 de julho de 2017. Dispõe sobre a regularização


fundiária rural e urbana, sobre a liquidação de créditos concedidos aos assentados
da reforma agrária e sobre a regularização fundiária no âmbito da Amazônia Legal;
institui mecanismos para aprimorar a eficiência dos procedimentos de alienação de
imóveis da União.http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
2018/2017/lei/l13465.htm, acesso em 03 de maio de 2019.

CPT. Comissão Pastoral da Terra. Caderno Conflitos no Campo – Brasil, CPT


Nacional – Brasília, 2018.

CPT. Comissão Pastoral da Terra. Pelo menos seis terras indígenas sofrem com
invasões e ameaças de invasão no início de 2019.
https://www.cptnacional.org.br/publicacoes/noticias/conflitos-no-campo/4603-pelo-
menos-seis-terras-indigenas-sofrem-com-invasoes-e-ameacas-de-invasao-no-inicio-
de-2019, acesso em 08 de junho de 2019

CONJUR. Novo marco legal: lei da regularização fundiária privatiza terras públicas,
dizem entidades. Revista Consultor Jurídico, 2017. Disponível em
<www.conjur.com.br/2017-jul-30/lei-regularizacao-fundiaria-privatiza-terras-publicas-
dizem-entidades > Acesso em 28 de junho 2019.

ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. Rio de


Janeiro, RJ: Civilização Brasileira, 1975. (Coleção perspectivas do homem).

FUNAI. Fundação Nacional do índio. Operação interinstitucional apreende invasores


na Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau, 2019.
http://www.funai.gov.br/index.php/comunicacao/noticias/operacao-nterinstitucional-
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2019.

IMAZON. Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia. Nota Técnica sobre o


impacto das novas regras de regularização fundiária na Amazônia. Belém (PA),
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Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé. Madeira ilegal é apreendida na terra


indígena Uru-Eu-Wau-Wau, 2019. http://www.kaninde.org.br/madeira-ilegal-e-
apreendida-na-terra-indigena-uru-eu-wau-wau/, Acesso em 01 de julho de 2019.

LUXEMBURG, Rosa. A acumulação do capital: contribuição ao estudo econômico


do imperialismo. 3. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1988. 220 p. (Os economistas).

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http://www2.fct.unesp.br/nera/artigodomes/6artigodomes_2017.pdf, acesso em: 20
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PAULINO, E. T. Liquidação das terras públicas no Brasil: contextos, pretextos e


passivos territoriais em face da Lei 13.465/2017. Bol. Goia. Geogr. (Online).
Goiânia, v. 37, n. 3, p. 391-408, set./dez. 2017.

RIBEIRO, Alyson. F. A.; SILVA, Ricardo. G. C.; SANTOS, Josefa. L.; RODRIGUES,
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“nova” lei de terras do Brasil. Revista OKARA: Geografia em debate, v.12, n.2, p.
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http://www.periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/okara/article/view/41336/20730, acesso
em 01 de junho de 2019.

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