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LINGUÍSTICA TEXTUAL

SUMÁRIO

ESBOÇO HISTÓRICO DA LINGUÍSTICA TEXTUAL ________________________ 7


DA RUPTURA ESTRUTURALISTA À LINGUÍSTICA TEXTUAL________________ 7
ESTRUTURALISMO: UM PASSO PARA A LINGUÍSTICA CONTEMPORÂNE____ 7
OS ESTUDOS GERATIVISTAS _______________________________________ 10
_

A NECESSIDADE DE RENOVAÇÃO DO HORIZONTE LINGÜÍSTICO__________12


DAS GRAMÁTICAS DE FRASE ÀS GRAMÁTICAS DO TEXTO ______________ 15
ATIVIDADE COMPLEMENTAR ______________________________________ _ 18
OS PRIMEIROS PASSOS DA LINGUÍSTICA TEXTUAL ____________________ 19
A CONCEPÇÃO DE SUJEITO E DE LÍNGUA ____________________________ 19
A IDÉIA DE TEXTO _________________________________________________ 23
O CONTEXTO NA LINGUÍSTICA TEXTUAL______________________________ 25
COMPREENDENDO AS ESTRUTURAS COGNITIVAS _____________________ 27
ATIVIDADE COMPLEMENTAR ________________________________________ 30

PRINCÍPIOS E PROCEDIMENTOS DA LINGUÍSTICA TEXTUAL _____________ 31


ALGUNS ELEMENTOS BÁSICOS DA LINGUÍSTICA TEXTUAL ______________ 31
A COERÊNCIA TEXTUAL ___________________________________________ 31
A COESÃO TEXTUAL ______________________________________________ 36
A RELAÇÃO ENTRE A COERÊNCIA E A COESÃO TEXTUAL ______________ 41
A POLIFONIA TEXTUAL ____________________________________________ 43
ATIVIDADE COMPLEMENTAR _______________________________________ 49
A LÍNGUA ESCRITA E A LÍNGUA FALADA ______________________________ 52

PENSANDO A ORALIDADE E O LETRAMENTO __________________________52


CARACTERÍSTICAS DA LÍNGUA ESCRITA______________________________ 53
CARACTERÍSTICAS DA LÍNGUA FALADA ______________________________ 55
O TEXTO CONVERSACIONAL ________________________________________57
ATIVIDADE COMPLEMENTAR _______________________________________ 59
GLOSSÁRIO ______________________________________________________ 61
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ____________________________________ 63
ESBOÇO HISTÓRICO DA LINGUÍSTICA TEXTUAL

DA RUPTURA ESTRUTURALISTA À LINGUÍSTICA TEXTUAL

No momento em que se para com o intuito de observar o desenvolvimento da


LINGUÍSTICA na história, é possível identificar que vários estudos foram se
modificando com o passar do tempo. Segundo Hilário Bohn, “da mesma maneira
como a morte do indivíduo não significa o seu desaparecimento, ele continua na
memória coletiva ou familiar, continua gerando sentidos depois que sai do convívio
social, assim é com os paradigmas, somente depois de muitos anos da saída do
palco dos auditórios científicos é que se podem avaliar os efeitos que produzem
sobre a visão de mundo e as pessoas que o habitam”.

Dessa forma, no universo da ciência da linguagem, principalmente no século XX,


modelos lingüísticos
sofreram infl uências e/ou infl uenciaram outros estudos. Seja para ratifi car ou
negar, a LINGUÍSTICA
apresentou esse movimento entre identidade e alteridade. As correntes
LINGUÍSTICAs tiveram infl uência de
idéias, concepções anteriores e apontaram para futuros posicionamentos. E é
justamente por isso que
inicialmente vamos rever alguns conceitos principais que marcaram a LINGUÍSTICA
no século XX, no intuito
de compreendermos o que levou ao surgimento de uma importante vertente da
ciência da linguagem:
a LINGUÍSTICA Textual. Afi nal, para se compreender o presente é fundamental
conhecer o passado, saber
quais foram as condições de existência que propiciaram a cristalização de um
determinado movimento,
e não de outro em seu lugar.

ESTRUTURALISMO: UM PASSO PARA A


LINGUÍSTICA CONTEMPORÂNEA
Se é possível considerar o século XIX como a época do estudo histórico e
comparativo das línguas,

o século posterior marca uma importante ruptura na LINGUÍSTICA. Não raro se


ouviu que a LINGUÍSTICA era
uma disciplina predominantemente histórica. Diante de tal afi rmação, o que
aconteceria se alguém dissesse
o contrário? Qual seria a conseqüência de se negar o que até então se ratifi cava?
Bem, não precisa
de muito esforço para pelo menos se achar que causaria muito rebuliço, não é?!
Pois foi justamente isso
que aconteceu no século XX com o advento do estruturalismo saussuriano, que
vocês já devem conhecer.
Porém, para que se possa compreender o processo histórico que levou ao
surgimento da LINGUÍSTICA
Textual, torna-se importante relembrar alguns pressupostos básicos de um
movimento que balançou os
pilares dos estudos da linguagem.
Inicialmente, podemos apontar como marco do estruturalismo saussuriano o
lançamento póstumo
do livro de Ferdinand de Saussure intitulado Cours de Linguistique Générale (Curso
de LINGUÍSTICA geral),
publicado em 1916. A existência da referida obra se deu graças à contribuição de
três de seus discípulos,
a partir de rascunhos feitos nas aulas do grande mestre genebrino.

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-
Atenção
Atenção
Atenção
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Atenção
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Atenção
No momento em que, a exemplo da prática escolar, numa época na qual se estudar
uma língua
significava estudar textos, os seus sentidos, inclusive a partir de disciplinas
intituladas “compreensão
de texto”, Saussure apresenta uma nova abordagem LINGUÍSTICA. Ele propõe não
mais se ater à função
significativa de texto, à prática da linguagem, e sim ao seu funcionamento, a sua
teoria. Com o referido
deslocamento, separa-se, portanto, a prática da linguagem de sua teoria. Nesse
sentido, a língua passa a ser
pensada como sistema de signos e a fala fica excluída dos estudos científi cos da
linguagem.

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Atenção Atenção
Lembra de que a LINGUÍSTICA no século XIX era histórica e comparativa? Pois é!
Por conta dos estudos
de Saussure, a LINGUÍSTICA no século XX deixa de ser histórico-comparativa. O
motivo da mudança se
baseia na idéia do mestre genebrino de que não havia sentido estudar a língua em
sua historicidade (ou
diacronia), mas mediante o seu viés descritivo (sincrônico). Diante disso, podemos
dizer que ele prefere,

então, estudar o estado da língua, e não sua evolução.

No intuito de tornar a referida questão mais clara, Saussure compara a língua


em seu estado com um jogo de xadrez.

Sua tese é de que, assim como num jogo de xadrez, o “jogo da língua” apresenta
um sistema de valores. Bem, vamos ver o que ele próprio diz sobre isso:

Por isso que, para Saussure, o lingüista proposto a compreender o estado


da língua deve analisá-lo em um dado momento, descrevendo-o, e ignorar
sua evolução, ignorar sua história, ignorar sua diacronia.

A língua é uma forma e não uma substância

No estruturalismo, a língua será vista como forma, e a fala, substância.


Nesse sentido, forma deve ser compreendida como essência, em seu sentido fi
losófico.
A forma é constante, como a língua. Já a substância é circunstancial

– como a fala –, é tida como aparência, e não como essência. No jogo de xadrez,
por exemplo, as regras estão para a forma, já as peças do jogo, para a substância.
Se transferirmos essa lógica para a linguagem, poderemos fazer a seguinte
associação a partir
da frase abaixo:

Nóis comprô a rôpa.

O que importa para o estruturalismo ao estudar a língua é a forma, as regras, não a


substância, a
aparência. Assim, temos a seguinte regra de constituição da frase:

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Pronome + verbo + objeto

Os desvios ortográfi cos, por exemplo, estão ligados aos traços da fala. Esses
traços, para Saussure,
são de ordem individual, ou seja, peculiar a determinados falantes, e não social,
geral como o é a regra.
Os traços podem variar, a depender do falante, do momento em que se emite a
frase. Portanto, é um ato
individual. Assim, apesar do desvio à norma culta, sua estrutura continua a ser de
uma frase da língua
portuguesa.

Bem, agora, no quadro abaixo, vamos visualizar algumas dessas diferenças


estruturalistas
apresentadas:

A partir de nossos estudos, foi possível perceber que há muitas oposições no


estruturalismo. Por
isso, podemos dizer que o estruturalismo tem a característica de se ocupar das
diferenças. É por isso que
Saussure propôs suas dicotomias, como língua (langue) X fala (parole), sincronia X
diacronia. Existem
mais dicotomias saussurianas, porém nosso objetivo agora é compreender as
motivações históricas e LINGUÍSTICAs
para a constituição da LINGUÍSTICA Textual. Esses princípios básicos trabalhados
já servem para

o nosso propósito nesse módulo. Por isso, é importante internalizar tudo o que foi
até agora trabalhado
aqui, tá?!
OS ESTUDOS GERATIVISTAS

Agora que já vimos certos pontos básicos do estruturalismo, vamos relembrar alguns
pressupostos
de um estudo que também teve muita importância no século XX, por volta do fi nal
da década de 50, e
que infl uenciou muito o pensamento lingüístico: O gerativismo. Esse movimento
lingüístico vai, em um
momento, influenciar a LINGUÍSTICA Textual. Por isso, prestem bastante atenção,
meus amigos!

Quando falamos em gerativismo, um nome fundamental vem à mente: Noam


Chomsky. Ele foi o
criador do gerativismo, estudo que propõe uma gramática gerativa (doravante GG)
que passou a ser conhecida
a partir da obra de Chomsky, Syntactic structures, publicada em 1957. Ela propõe
principalmente
que a geração dos enunciados seja, pelo menos parcialmente, determinada pelo
estado da mente/cérebro.
O referido autor vê o cérebro como um órgão do corpo humano que deve ser
estudado como se estuda

o corpo humano. Para ele, cada parte teria sua função. Portanto, uma parte do
cérebro seria responsável
pela linguagem.
Bem, se a linguagem é vista como uma propriedade da
mente/cérebro do falante, fi ca fácil começar a entender a afi r-
mação de que a linguagem é inata. Essa idéia difere do estruturalismo
americano, o qual vê a aquisição da linguagem como
resultado de repetição, estímulo/resposta, a partir da experiência,
sendo, assim, um constructo social, e não mental.

Lembre-se:

Para o gerativismo, aquisição da linguagem é inata, portanto,


já nascemos com ela.

Outro ponto importante tratado


pelo gerativismo é a existência
de uma gramática universal (GU).
A partir dessa concepção, todas as

línguas têm pontos em comum, têm princípios gerais. Diante disso, fi ca clara

a afi rmação de que, diferente dos estudos estruturalistas, os quais se baseavam

nas diferenças, nas dicotomias, o gerativismo vai se voltar para as semelhanças,

para os princípios universais existentes em todas as línguas.

Ao trabalhar com a GU, Chomsky também vai se ocupar, a despeito do


estruturalismo, que efetuava
uma atividade descritiva em suas pesquisas - em explicar esses fenômenos
lingüísticos ligados a um
conjunto de princípios gerais. Por esse motivo, não há problema em dizer que nesse
sentido a prioridade
torna-se mais teórica que empírica. E é no intuito de descrever o conhecimento
implícito do falante
mediante um quadro teórico-explicativo que Chomsky elabora a teoria da gramática
gerativa. De acordo
com José Borges Neto, o trabalho do lingüista, nesse momento, passa a ser dividido
em dois grupos:

Atenção
Nos estudos de Chomsky, a sintaxe ganha um lugar de destaque. Dessa forma, ele
mesmo diz o
seguinte:
“Uma língua é um conjunto (fi nito ou infi nito) de orações, cada uma delas de
tamanho
fi nito e construída a partir de um conjunto finito de elementos”.

Assim, a sintaxe ganha uma autonomia, já que, a partir dela, são geradas as
orações gramaticais coerentes.

O conhecimento que os falantes possuem de uma língua em suas mentes é


chamado de competência LINGUÍSTICA.
A competência, então, é justamente o conhecimento lingüístico internalizado que
permite ao falante ter a
propriedade de utilizar o conjunto de regras que se encontram presentes em sua
mente. A competência possibilita
que o falante faça uso da linguagem e a adquira na infância, vez que a linguagem é
uma propriedade inata.

É preciso distinguir a competência LINGUÍSTICA da performance. A performance se


refere ao modo
com que o falante vai utilizar a linguagem. A esse fator são incorporadas questões
extraLINGUÍSTICAs, envolvendo
o ambiente, a sociedade, os interlocutores.
Nesse momento é importante deixar bem claro que a teoria gerativa centra-se na
competência, que
é de caráter universal, e está relacionada à mente/cérebro do falante. A isso se pode
dizer que a preocupação
central da teoria gerativa é a aquisição da linguagem. Se fôssemos buscar uma
pergunta fundamental
que pudesse resumir o propósito da teoria gerativa seria a seguinte:

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Como conseguimos falar?

Portanto, não esqueça:

O objeto de estudo do gerativismo é a competência.

Para entender a possível existência de uma gramática universal, comum a todas as


línguas, nós podemos
pensar na seguinte situação: Ao ouvir a frase “Eu comi um bolo”, é possível que
uma criança diga “Eu
vi um cachorro”. Bem, mesmo que ela nunca tivesse ouvido tal enunciado, não
deixou de conjugar corretamente
o verbo. Para Chomsky, essa propriedade é inata. O que também auxilia no
processo de produção de
enunciados inéditos é a criatividade LINGUÍSTICA. Podemos, então, conceituá-la da
seguinte forma:

Entende-se por criatividade LINGUÍSTICA a capacidade que o falante tem de


compor e compreender
sentenças às quais ele nunca foi exposto.

E aí? Conseguiram compreender alguns dos pontos básicos do gerativismo? Agora


vamos perceber,
de forma mais sintetizada, certas diferenças que podem ser estabelecidas entre o
gerativismo e o
estruturalismo, no quadro abaixo:

A NECESSIDADE DE RENOVAÇÃO DO
HORIZONTE LINGÜÍSTICO
Nos itens anteriores, nós pudemos rever algumas características básicas de dois
importantes movimentos
lingüísticos do século XX. Lembramos de certos conceitos principais, além de
acompanharmos
como se cristalizaram diferenças que marcaram tanto o estruturalismo quanto o
gerativismo. Tais diferenças
também fi zeram essas duas vertentes muitas vezes percorrerem em suas
pesquisas caminhos opostos
(a começar da escolha do objeto de estudo) e dividirem a atenção de lingüistas e
pesquisadores.

No entanto, apesar de falarmos das diferenças entre o estruturalismo e o


gerativismo, isso não significa
que esses dois movimentos sejam totalmente opostos, que não tenham pontos em
que se tocam.
Nesse sentido, faremos umas considerações aos momentos em que se aproximam
para, a partir de singularidades
entre eles, ser possível compreender melhor o surgimento do que nos é primordial
discutir nesse
tema: a constituição histórica da LINGUÍSTICA Textual. Mas para isso também é
necessário fazer algumas
considerações a respeito do formalismo e do funcionalismo.

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Semelhanças entre estruturalismo e gerativismo

Se analisarmos a proposta de Saussure, veremos que ele se volta para o trabalho


descritivo da língua
(langue). A partir daí, segundo a visão de língua como sistema, esses estudos
lingüísticos giram em torno
desse sistema, ou seja, das “regras do jogo”. Isso acarreta em não se considerar
como principal o aspecto
da comunicação, e sim a estrutura em si.

A comunicação no estruturalismo é tratada como emissão e recepção


de mensagens. Diante desse processo, a mensagem é enviada, recebida e de-
codificada. Dá para perceber que, mediante tal processo, a comunicação humana
não se diferencia da comunicação entre máquinas, não é?!

Ao observarmos o gerativismo, perceberemos que ele toma como ob

jeto de estudo a competência LINGUÍSTICA, que tem caráter universal e se insere


na mente/cérebro. Já a performance é deixada de lado. Bem, como a comunicação
tem a ver com o uso
da língua em situações determinadas, ela se insere no plano da performance, do
desempenho lingüístico
do falante. Dessa forma, é possível compreender que, como a comunicação está no
plano da performance,
ela é deixada de lado pelos estudos gerativistas.

Atenção
Os estudos formalistas

Já vimos que nos estudos formalistas da linguagem se enquadram o estruturalismo


e, de certo
modo, o gerativismo. Eles são chamados de formalistas porque vêem a língua em
sua forma, como um
objeto descontextualizado. O formalismo preocupa-se bastante com as
características internas da língua,
relegando a um outro lugar a língua em seu uso. Quanto a este tipo de estudo,
Dillinger salienta:

Atenção
Então, deu para perceber que o formalismo vai analisar a língua em sua forma.

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O funcionalismo

Diferente do formalismo, o funcionalismo vai procurar estudar a linguagem em sua


função. Assim,
para o funcionalismo, o estudo da função das formas LINGUÍSTICAs é
predominante. As características internas
da língua, bastante estudadas pelos formalistas, no funcionalismo não serão tão
importantes quanto
as relações entre a língua e a interação social, a língua e o contexto social, a língua
e a comunicação.

Você se lembra que falamos sobre a atitude de Saussure de propor


o estudo do FUNCIONAMENTO da linguagem e não de sua
FUNÇÃO? Pois é! Ao fazer isso, ele acabou deixando um campo
descoberto, que viria a chamar a atenção de lingüistas. Ora, vários pesquisadores
da linguagem acharam que não se poderia deixar de lado a
FUNÇÃO da língua na sociedade, afi nal, somos seres comunicativos.
Utilizamos a língua para nos comunicarmos, para construirmos sentido
a partir do momento em que há uma interação. Mais uma vez,

vamos ver o que Dillinger tem a nos dizer, agora sobre o funcionalismo:

Atenção
Bem, nos estudos funcionalistas já podemos destacar alguns, como a
socioLINGUÍSTICA, a LINGUÍSTICA antropológica,
a análise do discurso, a LINGUÍSTICA textual (este último, foco de nossos estudos
neste módulo).

Para resumir algumas características do formalismo e do funcionalismo, acompanhe


a tabela abaixo
com idéias apresentadas por Dik e adaptadas por Maria Helena de Moura Neves:
Portanto, vocês puderam entender o que motivou a existência da LINGUÍSTICA
Textual no cenário da
ciência da linguagem no século XX. Agora já estamos prontos para avançarmos
mais e adquirirmos mais
conhecimento acerca desse assunto.

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Agora, vamos tratar de uma questão que muito interessa à LINGUÍSTICA Textual: a
passagem da gramática
de frase à gramática de texto. Preparados? Ótimo! Então vamos lá!

DAS GRAMÁTICAS DE FRASE ÀS GRAMÁTICAS DO


TEXTO

A partir do Curso de LINGUÍSTICA geral, de Saussure, a gramática se tornou o


centro da refl exão LINGUÍSTICA
contemporânea. Nesse sentido, passou a ser papel da LINGUÍSTICA construir
teorias sobre a gramática
das línguas naturais. De acordo com essa idéia, podemos definir gramática da
seguinte forma:

Um sistema de regras que tem a capacidade de efetuar a descrição de um sistema


lingüístico.

Portanto, tem-se essa gramática como descritiva. Assim, não confunda a gramática
descritiva com a gramática
com a qual nós temos contato na escola: a normativa. Para isso, vamos ver como
elas se diferenciam ok?!

Atenção
Ora! sabe aquelas palavras ou estruturas que, em um momento de descontração (ou
de descuido),
nós utilizamos e que alguém sempre aparece para dizer “Essa palavra não existe”,
ou “Você falou errado”?
Pois é, essas questões que extrapolam o uso gramatical (além de outras) não são
valorizadas devidamente
pela gramática normativa.
A gramática descritiva, dentro dessa visão estruturalista, vai ver a língua como um
sistema opositivo. Para se
realizar a análise, parte-se de unidades menores para unidades maiores que
justificam ou englobam as anteriores.

Assim, o primeiro nível de análise é o fonológico. Como se trabalha a partir de uma


visão dicotômica,
opositiva, é possível perceber que o nível fonológico não é signifi cativo, porém,
permite distinguir
significados. Como exemplo, podemos observar que a diferença fonológica entre
/BATA/ e /PATA/
(/B/ e /P/) é suficiente para distinguir os significados.

Bem, já deu para perceber que o nível fonológico se integra a um nível maior e
signifi cativo, que é

o morfológico, certo?! Podemos então definir a morfologia da seguinte maneira:


Morfologia: Parte da gramática que se propõe a descrever formas que
constituem as palavras, os morfemas.

Para diferenciar o nível morfológico do fonológico, podemos dizer que:

O fonema é a unidade mínima não signifi cativa.


O morfema é a unidade mínima significativa.

O morfema também é considerado a base do nível seguinte: o sintático. A sintaxe,


então, é a parte
da gramática que se propõe a analisar as relações que os morfemas e as orações
mantêm entre si. Nessa
perspectiva, pode-se tomar a oração a partir da definição abaixo:

A oração é a unidade máxima de estudo.

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Portanto, nessa perspectiva, parte-se da análise da unidade mínima não signifi
cativa, que é o fone-
ma, e se estende até à unidade máxima de análise: a oração.

Agora que já foram apresentadas algumas características das gramáticas,


principalmente na visão
estruturalista, vamos ver quais foram as mudanças que ocorreram na LINGUÍSTICA
Textual desde a sua
constituição, bem como o momento em que as gramáticas de texto entram nesse
cenário. Para tanto, é
preciso distinguir três fases de constituição de tal disciplina.

Atenção
1ª FASE – transfrástica.

Anteriormente, foi possível observar que as gramáticas de frase, até mesmo por ter
como unidade
máxima de estudo o enunciado, apresentavam limitações. Essas limitações também
se estabeleceram por
não se contemplar, nas aludidas gramáticas, fatores que ultrapassavam o limite das
frases e que só poderiam
ser analisadas no interior do texto, como é o caso da co-referência. Nessa fase,
muitos estudiosos
apresentaram conceitos sobre o texto. Harweg, por exemplo, definia o texto como
“uma seqüência pronominal
ininterrupta”. Já Isemberg o definiu como sendo uma “seqüência coerente de
enunciados”.

Atenção
Ao analisarmos a frase
João saiu correndo. Ele estava com muito medo.
veremos que há uma ligação entre o pronome ELE e o referente (João). Esta ligação
estabelecida
entre João e o pronome ELE (co-referente de João) se dá principalmente pela
predicação desses dois elementos,
e não somente por questões de concordância. Só que esse elemento coesivo por si
não garantiria,
ao longo de uma seqüência, a existência de um texto.

A questão da presença de elementos coesivos, como as conjunções, também foi


tema dos estudos
na fase transfrástica. O que chamou a atenção, também, foi o fato de que um trecho,
mesmo sem a presença
de conjunções, poderia ter coerência.

Ora! na frase

Pedi por você; ninguém me ouviu.

não é difícil perceber a relação de adversidade, mesmo sem a presença do


conectivo “mas”.

Já deu para perceber que a idéia de um texto se constituir apenas pela soma de
frases não estava dando
certo, não é?! Essa questão abriu espaço para a necessidade de uma outra forma
de tratar o texto. É a partir daí
que vários estudiosos se voltam para a criação das gramáticas textuais. É
justamente por isso que se diz que:

A fase transfrástica abriu espaço para a constituição das gramáticas textuais.

FTC EaD | LETRAS16


2ª FASE – As gramáticas textuais

Nos primeiros assuntos deste bloco temático nós revisamos, além de outros,
conceitos básicos do
gerativismo. Vimos que Chomsky visou elaborar uma gramática gerativa de sentido.
Para tanto, procurou
se voltar para a competência LINGUÍSTICA do falante, levando em consideração
que o falante tem a propriedade
inata da linguagem e é capaz de produzir enunciados infinitos e inéditos em uma
dada língua.

De forma análoga, esta segunda fase da LINGUÍSTICA textual, recebendo infl


uências do gerativismo,
passou a levar em consideração a COMPETÊNCIA TEXTUAL do falante.

Vamos compreender melhor essa questão. A passagem da fase transfrástica para a


elaboração da
gramática textual se deu principalmente porque se pôde perceber que, além de
muitos textos não apresentarem
o fenômeno da co-referenciação, é indispensável para a compreensão de diversos
textos levar
em consideração o conhecimento intuitivo do falante.

A partir daí, preconizou-se que todo falante de uma língua é capaz de produzir
textos inéditos,
bem como de ter a propriedade de elaborar paráfrase. Além disso, seria possível ao
falante reconhecer os
diversos tipos textuais (narrativo, descritivo, dissertativo).

Essas capacidades textuais são, respectivamente, intituladas de CAPACIDADE


FORMATIVA, CAPACIDADE TRANSFORMATIVA e CAPACIDADE
QUALIFICATIVA.
Já que todos os falantes teriam essas capacidades, a gramática textual, nesse
sentido, deveria se
voltar para as seguintes questões:

1. O que faz com que um texto seja um texto, isto é, como se dão os elementos
constituidores
da textualidade.
2. Como se pode delimitar um texto. Como se pode considerar completo o texto.
3. De que forma os textos podem se diferenciar.
Mesmo com o empenho em desenvolver uma gramática textual, tais itens não
puderam ser contemplados
devido à impossibilidade de se chegar aos devidos objetivos.

Desse jeito, em lugar de procurar descrever a competência textual do falante, como


pregava a gramática
textual, tornou-se mais viável analisar de que forma se constituem, funcionam os
textos em uso,
bem como o modo que se dá sua compreensão. Assim, surge a 3ª FASE da
constituição da LINGUÍSTICA
Textual: a elaboração de uma teoria de texto. A referida teoria irá tomar o texto não
mais como um produto
acabado, e sim como um processo que resulta de questões sociocognitivas,
interacionais, comunicativas.
Mas dessa última fase, que nos interessa bastante, nós trataremos mais adiante.

Depois de observarmos a constituição da LINGUÍSTICA Textual, de vermos os


movimentos que a infl uenciaram
e o que motivou sua existência no cenário lingüístico no século XX, agora é a hora
de testarmos nossos
conhecimentos. Vamos ver se tudo o que foi apresentado até aqui está fazendo
sentido? Então vamos lá!

LINGUÍSTICA Textual 17
Atividade Complementar Atividade Complementar
1. Aponte algumas diferenças existentes entre: Língua X Fala
2. Defina a diferença existente entre a Sincronia e a Diacronia
3. Aponte algumas características presentes nos estudos funcionalistas.
4. Explique, com suas palavras, de que forma o gerativismo influenciou a
LINGUÍSTICA Textual.
5. Saliente algumas diferenças existentes entre o formalismo e o funcionalismo
FTC EaD | LETRAS18
OS PRIMEIROS PASSOS DA LINGUÍSTICA
TEXTUAL

A CONCEPÇÃO DE SUJEITO E DE LÍNGUA

Agora vamos começar a compreender algumas questões fundamentais da


LINGUÍSTICA textual. Vamos
começar, então, pela concepção de sujeito e de língua.

Quando falamos em sujeito, o que vem à mente em primeiro lugar? A que nós
associamos tal palavra?
Lembrou? Bem, para ajudar, vou convocar um personagem muito simpático, criado
por Maurício
de Souza. Acompanhem um trecho da historinha abaixo e vejam os signifi cados do
sujeito que foram
mobilizados pela professora e por Chico Bento.

LINGUÍSTICA Textual 19
Observe que a professora trata da questão do sujeito gramatical, ao passo que
Chico Bento
associa a palavra “sujeito” a pessoas. A historinha se desenvolve dessa forma até o
final. Nesse
momento, ao dar um exemplo na lousa – “Chove lá fora” –, a professora trata do
sujeito inexistente.
Logo depois o sinal bate e ela libera os alunos. No entanto, Chico Bento apresenta
a
impossibilidade de sair da escola devido ao fato da presença do “sujeito inexistente”.
Como isso
ocorre? Ora, estava chovendo!

E aí, se divertiram com a historinha? Além do humor, ela também nos traz a idéia de
sujeito gramatical, aquele que a gente aprende nas gramáticas e que nos
acompanha por vários
anos letivos nos colégios. Sempre que se fala em sujeito, principalmente com
estudantes,
não raro vem a lembrança das subdivisões entre os sujeitos da gramática: simples,
composto,
oculto, entre outros. É, mas não se esqueçam, a partir de agora, que nós não iremos
tratar
desse tipo de sujeito.

Quando tratarmos de sujeito em LINGUÍSTICA Textual, vamos nos remeter a um


outro tipo, que não

o gramatical, apresentado pela professora na historinha acima, certo?!


Vamos tratar de um sujeito chamado de psicossocial. Mas, para isso, antes vamos
compreender
como ele passou a existir. Então, é preciso observar as concepções clássicas do
sujeito e atentar para as
mudanças que ocorreram até se chegar à referida concepção de sujeito.
As concepções clássicas do sujeito

Segundo Ingedore, a concepção de sujeito vai variar de acordo com a concepção de


língua que se
adote. Dessa forma, ao tratar a língua como expressão de pensamento, teremos a
confi guração de um
sujeito individual, consciente.

Uma característica fundamental desse sujeito é que ele se apresenta como o “dono
do seu dizer”. Para
ele, tudo o que diz é fruto exclusivo dele mesmo. Entende-se o sujeito consciente
como um sujeito adâmico

Já sacaram que adâmico vem de Adão, que, de acordo com a


Bíblia, foi o primeiro homem a existir no paraíso, não é? De maneira
similar, o discurso desse sujeito é tido como único, produto único e
exclusivo dele.

O receptor, de acordo com essa concepção, apresenta uma


postura passiva, vez que a ele é passada a mensagem da mesma forma
como se processou na mente do falante, cabendo apenas com

preender a referida mensagem dessa maneira. A língua, a partir daí, é vista como
um produto mental do
falante. Por isso que se diz que essa é uma visão mentalista do sujeito.

Depois do sujeito consciente, dono do seu dizer, surge a idéia de


sujeito assujeitado. Nessa perspectiva, a língua passa a ser tida como estrutura.
Bem, diferente do sujeito consciente, o assujeitado não produz

o seu dizer. Na verdade, ele reproduz discursos da estrutura social.


Apesar disso, o sujeito assujeitado muitas vezes acha que é “dono
de seu dizer”, isto é, não percebe que está sendo assujeitado, mas o que faz
é apenas reproduzir discursos sociais. Ele, portanto, apresenta-se como
um ser que não tem consciência de seu assujeitamento ideológico.

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Para compreendermos melhor esse item, vamos ver o que Marilena Chauí nos
apresenta sobre a
ideologia:

Segundo Chauí, a principal função da ideologia é ocultar a divisão social, é


dissimular essa divisão.
Nesse plano, a ideologia busca fazer com que cada qual aceite a posição social em
que está. Todos nós já
ouvimos por aí que SOMOS TODOS IGUAIS, que TEMOS OS MESMOS DIREITOS.
Bem, quanto a
essa idéia de igualdade, vamos ler um texto de Manuel Bandeira e atentar para seu
conteúdo:

O bicho

Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos

Quando achava alguma coisa


Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade

O bicho não era um cão,


Não era um gato,
Não era um rato.

O bicho, meu Deus, era um homem.


Nós claramente percebemos que aquilo que prega a ideologia não condiz
com a realidade, não é?! Afi nal de contas, o que mais percebemos
no dia-a-dia são as diferenças sociais, econômicas, culturais
existentes em nossa sociedade.

Você percebeu que o assujeitamento está ligado à ideologia?


Jóia! Agora vamos conhecer os estudos de Louis Althusser. Não

se deve, nesse contexto, falar de ideologia sem mencionar os


trabalhos realizados por ele acerca dos ARE e dos AIE. Você
não sabe o que significam? Então acompanhe a definição:

ARE – Aparelhos Repressores de Estado


AIE – Aparelhos Ideológicos de Estado

Os ARE teriam por função reprimir a sociedade, primeiramente pela violência e


secundariamente

LINGUÍSTICA Textual 21
pela ideologia. Exemplos de ARE são a polícia, o exército...

Os AIE, ao contrário dos ARE, agiriam primeiro pela ideologia, depois


pela violência. Como exemplo podemos citar a escola, a família, a igreja.

Assim, podemos dizer que os AIE representam o lugar das lutas


de classes.

Chegamos, então, à terceira concepção


de sujeito: o psicossocial. Vimos
que o primeiro, o consciente, apresenta-se como “dono do seu dizer”. Já

o segundo, ao contrário, apenas repete discursos sociais. Portanto, o primeiro


produz seus discursos e o segundo reproduz discursos da estrutura
social. É possível perceber que os dois primeiros situam-se em extremos:
ou é consciente ou é assujeitado.
O sujeito psicossocial vai galgar um equilíbrio em relação aos primeiros.
Ele tem noção de que possui a propriedade de elaborar seu discurso,
escolher suas palavras, mas também tem consciência de que está inserido em
uma sociedade. Portanto, podemos dizer que o psicossocial (re)produz discursos.

Uma importante característica desse sujeito é que ele só se confi gura como sujeito
na interação
com o outro. Nos dois primeiros, o papel do ouvinte é passivo, vez que ele recebe
as mensagens
como foram passadas e/ou as decodifi ca. Nessa terceira concepção, ele vai ter um
papel fundamental: o
de interagir e se constituir como sujeito nessa interação.

FTC EaD | LETRAS22


-
O sentido vai ser produzido nesse processo e serão levados
em consideração fatores cognitivos e extralingüísticos, dos quais trataremos
mais à frente.

A língua, nesse sentido, passa a ser o lugar de interação, de produção


de sentidos. O texto aqui não mais é tido como um produto
acabado, e sim como parte desse processo interativo.

Agora, vamos sintetizar esses tipos e sujeito em um quadro


resumitivo!
A IDÉIA DE TEXTO

Afinal, o que é texto? Como ele se caracteriza? Bem, antes de responder essas
perguntas, vamos
rever algumas questões tratadas anteriormente neste módulo.

Você se lembra de que o desenvolvimento da LINGUÍSTICA Textual compreende


três fases e que a
concepção de texto por vezes variou? Pois bem, nas duas primeiras fases, a
transfrástica e a da elaboração
de gramáticas textuais, presentifi caram-se as concepções de texto e de não-texto.
Nessa perspectiva, o
texto era visto como “seqüência LINGUÍSTICA coerente em si” e o não-texto como
“seqüência LINGUÍSTICA
incoerente em si”.

Já dá para perceber que, nesse primeiro momento, o texto era visto como um
produto acabado,
enfatizando, assim, a materialidade LINGUÍSTICA, o aspecto formal do texto.

Depois disso, passou-se a pensar o texto não mais como um produto acabado, mas
como um processo
de produção e recepção comunicativa. Dessa forma, o estudo sobre o texto passou
a analisá-lo a
partir de sua elaboração, de sua verbalização, de seu planejamento.

Portanto, tendo o texto como uma atividade verbal, chega-se à elaboração de uma
teoria do texto.

As ações que desenvolvem a atividade verbal, segundo Leont’ev, têm uma


motivação social. Dessa
forma, a atividade verbal teria uma motivação, uma fi nalidade e se daria sua
realização. O que fi ca evidente
diante dessa questão é que a forma de se estudar e de encarar o texto como
processo social e interacional
mobiliza uma estrutura mais complexa.

Assim, Ingedore salienta que a teoria da atividade verbal é “a adaptação ao


fenômeno ‘linguagem’
de uma teoria da atividade de caráter fi losófico, articulada com uma teoria da
atividade social (humana),
que se especifica em uma teoria da atividade (comunicativa) verbal”.

A citação acima evidencia que, para a elaboração da teoria da atividade verbal,


houve um encontro
de duas outras teorias: a de caráter fi losófico e a da atividade humana. Nesse
sentido, parte-se da motivação
de se pensar a linguagem em sua função social, como prática social, como meio de
interação.

A partir da teoria da atividade verbal, você pôde perceber que o texto passou a ser
tratado não
como um produto acabado, e sim em seu processo de constituição. Dessa forma, o
caráter apenas formal

LINGUÍSTICA Textual 23
sai de cena e entram, também, questões extraLINGUÍSTICAs, sociais, cognitivas.

Para visualizar melhor a teoria da atividade verbal, acompanhe o esquema abaixo e


perceba as relações
estabelecidas entre outras teorias, bem como a articulação delas com a linguagem.
Depois, observe como
se poderia compreender os anseios da teoria da atividade verbal a partir de alguns
questionamentos.

TEORIA DA ATIVIDADE VERBAL

Diante disso, é possível levantar algumas questões fundamentais para o estudo


propriamente
lingüístico:

“COMO SE CONSEGUEM REALIZAR DETERMINADAS ACÕES OU INTERAGIR


SOCIALMENTE
ATRAVÉS DA LINGUAGEM?”

COMO A LINGUAGEM SE ORGANIZA PARA A REALIZAÇÃO DE FINS SOCIAIS?

Para a realização do ato verbal, segundo Ingedore, antes o sujeito idealiza um plano
geral do texto
a partir dos seguintes fatores:

• MOTIVAÇÃO – HÁ, ENTRE OUTROS, UM MOTIVO CENTRAL.


• SITUAÇÃO – LEVA EM CONSIDERAÇÃO INFLUÊNCIAS INTERNAS,
DETERMINANTES
DAS ESCOLHAS A SEREM REALIZADAS, BEM COMO O AMBIENTE EXTERNO
(A SITUAÇÃO PROPRIAMENTE DITA).
• PROVA DE PROBABILIDADES – EFETIVA UMA TRIAGEM DAS AÇÕES
POSSÍVEIS
PARA DETERMINAR QUAIS SÃO AS MAIS EFICAZES PARA ATINGIREM OS
OBJETIVOS
PRETENDIDOS.
• TAREFA-AÇÃO – A ESCOLHA EFETIVA, BASEADA NAS PROBABILIDADES, DA
AÇÃO PARA A ARTICULAÇÃO DA ATIVIDADE.
...........................................................................................................................

Ingedore salienta os seguintes aspectos “superfi ciais” apresentados por Leont’ev,


que determinam
a realização verbal da intenção verbal:

• A LÍNGUA PARTICULAR;
FTC EaD | LETRAS24
• O GRAU DE DOMÍNIO DA LÍNGUA;
• O FATOR FUNCIONAL-ESTILÍSTICO;
• O FATOR AFETIVO, EXPRESSIVO;
• AS DIFERENÇAS INDIVIDUAIS EM EXPERIÊNCIA VERBAL ENTRE FALANTE E
OUVINTE;
• O CONTEXTO VERBAL, NO SENTIDO DE “CONTEXTO LINGÜÍSTICO”;
• A SITUAÇÃO COMUNICATIVA.
Observe que, nesse ponto de vista apresentado, há várias situações infl uenciando
na realização
verbal. O texto não é simplesmente o produto pronto, acabado. Podemos, a partir
daí, ter o texto como
uma produção verbal que se constitui na atividade comunicativa a partir da interação
social. Nas palavras
de Ingedore, “a LINGUÍSTICA Textual trata o texto como um ato de comunicação
unifi cado num complexo
universo de ações humanas”.

Bem, como o texto não é mais visto como um produto acabado, fi nalizado, pronto,
já é possível
perceber que o sentido de um texto não está nele, mas se constrói a partir dele. É
certo que as marcas
LINGUÍSTICAs auxiliam na produção de sentido, porém, é importante também voltar
nossas atenções para o
contexto em que se deu a produção LINGUÍSTICA.

Vocês puderam perceber o que foi dito anteriormente a respeito do sentido do texto
(construído
a partir dele), bem como sobre a questão da infl uência do contexto na análise
textual, certo?! Do sentido
textual nós trataremos no próximo bloco, ao abordarmos a coesão e, principalmente,
a coerência. Mas o
contexto nós iremos abordar agora, ok?! Então vamos lá, pessoal!
O CONTEXTO NA LINGUÍSTICA TEXTUAL

Ao tratar de texto, vimos que, tendo-o como um processo interativo de construção de


sentido, é
necessário, para sua compreensão, mobilizar conhecimentos lingüísticos e
extralingüísticos. Assim, torna-
se importante levar em consideração o contexto.

Bem, como os conceitos, principalmente no âmbito da ciência, são propensos a


mudança, nesse
sentido, não é complicado admitir que o conceito de contexto varia de acordo com o
autor que o utilize,
bem como do momento em que é utilizado.

Vários autores já se ocuparam em elaborar teorias acerca do contexto. Hymes


(1964) foi um deles.
Ele desenvolveu um esquema (SPEAKING) no qual procurou caracterizar o
contexto. Ingedore nos
apresenta esse esquema, apontando a característica referente a cada uma das
letras da palavra apresentada
entre parênteses. Podemos, portanto, visualizar, a partir de Ingedore, o esquema de
Hymes da seguinte
forma:

S . SITUAÇÃO

P . PARTICIPANTES

E . FINS, PROPÓSITOS

LINGUÍSTICA Textual 25
A . SEQÜÊNCIA DE ATOS

K . CÓDIGO

I . INSTRUMENTAIS

N . NORMAS

G . GÊNEROS

Além de Hymes, outros autores, como Goodwin & Duranti, procuraram elaborar suas
teorias acer

ca do contexto. Dessa forma, suas pesquisas contemplavam principalmente


fenômenos como o ambiente
em que se dá o texto, o contexto social e cultural, os conhecimentos prévios,
o co-texto.

Você se lembra?

Ao tratarmos da fase transfrástica, você pôde perceber que o contexto


era tratado apenas como “ambiente verbal”. Assim, levava-se em
consideração apenas sua natureza LINGUÍSTICA. Pois é, esse entorno verbal
intitulou-se CO-TEXTO. Não se esqueça disso, ok?!

A pragmática também marcou presença ao tratar, principalmente mediante


estudos acerca da teoria da atividade verbal e dos atos da fala, da questão
do contexto. Nesse sentido, atestou a importância de se descrever as ações em um
momento de interlocução.

Assim, a linguagem se viu marcada pela INTERATIVIDADE, bem como por uma
característica
de atividade SOCIAL. Bem, já que a linguagem apresenta-se como sendo utilizada
em um ambiente
social, constituindo-se na relação entre interlocutores, é natural entendermos que a
utilizamos com uma
determinada fi nalidade. Nós nos munimos da linguagem com uma intenção. É
justamente por isso que a
linguagem ganha uma outra característica: a INTENCIONALIDADE.

Porém, só as relações entre interlocutores, bem como a descrição de suas ações


pura e simplesmente,
não se fazia sufi ciente. Ora, sabemos que em uma outra cultura várias expressões,
várias atitudes
podem apresentar conotações diferentes, podem produzir efeitos de sentido variado.
Pensando nisso,
uma outra teoria passou a se destacar no cenário da LINGUÍSTICA Textual
justamente por contemplar essas
questões que foram apresentadas. Assim, o contexto sociocognitivo entra em cena.

Observe as frases abaixo e procure responder de acordo com seus conhecimentos:

Para você, o que representa a cor branca?

E a cor preta?

Já respondeu? Certo! Agora, observe a citação abaixo,


retirada do dicionário de símbolos, de Herder Lexikon:

O branco “é muitas vezes utilizado nos ritos de nascimento,


casamento, iniciação e morte; era a cor do luto,
por exemplo, nos países eslavos e na Ásia, e também na
corte francesa”.

E agora? Será que com a informação complementar


você conseguiu apontar mais uma representação à
cor branca? Se não conseguiu, signifi ca que já deveria

conhecer essa informação, certo?

FTC EaD | LETRAS26


Quando nós conversamos ou lemos algum texto, entramos em um processo de
construção de sentido.
Nós nos propomos, nesse momento, a participar do “jogo da linguagem” e a
interagir. Nesse processo,
mobilizamos bem mais do que nosso conhecimento lingüístico e nosso
conhecimento a respeito do
momento da interlocução. Além disso, fazemos valer nosso conhecimento prévio,
nosso conhecimento
do mundo, mobilizamos conhecimento acerca da sociedade, acerca da história.

No entanto, para que possa haver interação e os sentidos possam “brotar” durante
esse “jogo”, é necessário
que todo esse conhecimento de mundo seja semelhante. Ora, como temos vidas
diferentes (muitas
vezes podem ser até parecidas, mas não são iguais), os conhecimentos de mundo
devem ser semelhantes.

Diante do exposto anteriormente, imagine uma conversa entre um brasileiro e um


alemão, ambos
sem saber a língua do outro. A comunicação, nesse caso, fi ca complicada, não é?
Agora, mesmo com
interlocutores que conheçam a língua do outro, mas que desconheçam os aspectos
culturais um do outro,
a comunicação também não se daria de forma satisfatória, principalmente se
utilizarem, entre outras
expressões, gírias e regionalismos. Pois é exatamente nesse conhecimento de
mundo similar que se baseia

o contexto sociocognitivo. As estruturas cognitivas são importantes para esse


contexto.
Muitos autores, ao falar em contexto e, conseqüentemente, busca de sentido,
apresentam a metáfora
do iceberg.
A exemplo do iceberg, a ponta que está exposta representaria
a materialidade LINGUÍSTICA, parte evidente do texto. O resto do iceberg,
todo o gelo submerso, representa uma parte importante do
texto. Mas, para se chegar até lá, é necessário mergulhar, ir em busca
dos sentidos encobertos. Para tanto, não basta somente conhecer a
estrutura LINGUÍSTICA. É preciso mobilizar também os conhecimentos
prévios, os conhecimentos de mundo, as estruturas cognitivas. Assim,
se pode penetrar no texto e descobrir sua riqueza, seus segredos,
seus sentidos.

Agora podemos ver a linguagem não como trans

parente, a partir da qual é possível extrair toda a sua

essência, e sim como opaco. A forma que temos de

iluminá-la e torná-la claro é utilizando as estratégias

apresentadas.

Já vimos, então, do que trata o con

texto sociocognitivo e o que ele propõe. No entanto, para compre

endermos melhor alguns elementos importantes para a LINGUÍSTICA

Textual, que tal conhecermos agora as estruturas cognitivas? Ok,

então vamos nessa, turma!


COMPREENDENDO AS ESTRUTURAS COGNITIVAS

Muitas vezes não temos consciência da utilização de estratégias cognitivas, porém


esses mecanismos
fazem parte do nosso relacionamento com a linguagem. Sem eles, seria complicado
preencher certas
lacunas deixadas. Ora, se já sabemos que o texto não é transparente, e sim opaco,
podemos concluir
que o texto se apresenta INCOMPLETO. Se fosse completo, teríamos que ser, ao
máximo, minuciosos,

LINGUÍSTICA Textual 27
colocar todas as informações para que a mensagem pudesse ser compreendida.
Imagine o trabalhão que
daria, hein?!

Porém, graças às estruturas cognitivas, torna-se possível preencher as lacunas


textuais. Assim, não
é necessário tentar preenchê-las através das palavras, da materialidade
LINGUÍSTICA, no sentido de apresentar
exaustivamente explicações ou fazer a todo momento considerações a respeito do
que se diz. Nós
próprios já nos incumbimos disso no momento em que mobilizamos nosso
conhecimento prévio, seja a
respeito da cultura, da sociedade, dos interlocutrores e/ou da própria língua. Bem, é
melhor observarmos
a utilização dessas estratégias para compreendermos com propriedade essa
questão. Para isso, a partir de
agora serão apresentados alguns tipos de estratégias cognitivas. Então, acompanhe
a apresentação de tais
elementos e preste bastante atenção, ok?!

FRAMES – São estruturas cognitivas globais armazenadas na memória. Essas


estruturas são ativadas
diante de um conceito primário, mobilizando elementos que individualmente
constituem também
conceitos, mas em conjunto representam um frame. Observe, por exemplo, que, ao
pensar a palavra
NATAL, outros elementos são mobilizados:

NATAL

ÁRVORE PAPAI-NOEL
BRINQUEDOS

Perceba que não há uma ordem ou seqüência na disposição


desses elementos. Assim, a palavra BRINQUEDOS poderia ter
surgido primeiro, ou ÁRVORE por último, no esquema acima. Se
pensarmos nas palavras que surgiram a partir da palavra NATAL,
individualmente são conceitos, mas, em conjunto, como apareceram,
representam um frame.

Os frames também se adequam às circunstâncias. Ora, a mesma


palavra apresentada, dita por um professor, poderia desencadear
um frame diferente. Quer ver?

NATAL
.
NOTAS FINAIS
.
FINALIZAÇÃO DO ANO LETIVO
.
RECUPERAÇÃO

FTC EaD | LETRAS28


Tá vendo?! Agora vamos conhecer mais uma estrutura cognitiva.

ESQUEMAS – Assim como o frame, o esquema também é uma estrutura cognitiva


global; no
entanto, diferentemente daquele, este segue uma ordem ou seqüência e leva em
consideração as relações
temporais e causais.

Para melhor compreender essa estrutura cognitiva, observe o exemplo abaixo


apresentado por
Fávero acerca de uma comunicação feita por um marido à sua esposa:

“Há um acidente grave na esquina, pois uma ambulância e um carro da polícia estão
parados lá”.

Bem, diante do referido exemplo, o conhecimento prévio é mobilizado a partir de


esquemas, que
fazem com que possamos compreender a mensagem. Nesse sentido, sabemos que
num acidente grave
há ambulâncias para assistir as vítimas, bem como policiais para fazer a ocorrência
e registrar o(s)
responsável(eis) pelo acidente.

Todas essas informações se encontram em nossa mente e preenchem as lacunas


deixadas. Isso se
dá porque, ao falar sobre a ocorrência de um acidente, nós conseguimos visualizar
este evento e, a partir
de esquemas, compreendê-lo. Assim, não precisamos perguntar “Pra que a
ambulância?” ou “Pra que
policiais no local?”.

PLANOS – Estruturas cognitivas que mantêm uma ordem; porém, diferente dos
esquemas, o
leitor/ouvinte percebe a intenção do locutor/falante. O plano, assim como o próprio
nome designa, é
efetuado por um planejador. Isso pode ocorrer em vários momentos de nossa vida.
Veja como exemplo
um namorado que traceja um plano para pedir a sua amada em casamento. Que
romântico, não?! Ou um
fi lho que planeja pedir ao pai um aumento na mesada. Nesses exemplos, foram
utilizados planos para se
alcançar um objetivo. Com isso, percebe-se o plano utilizado para se chegar ao
objetivo.

SCRIPTS – Os scripts se diferenciam dos frames principalmente pela sua


dinamicidade. Você se
lembra de que o frame é um conjunto de elementos que se voltam a um conceito
primário? Pois bem, o
script vai incorporar uma sucessão de ações que envolvem uma determinada
situação. Repare no texto
abaixo e na situação descrita.

Nesse texto, as ações remetem a uma fase específi ca da vida: a velhice. Os scripts
evidenciam, no
texto, essa sucessão de ações: “Já não enxerga mais como antes”, “andar já não
pode mais”, “Acometida
por um problema de coluna”. Conhecemos esse script vez que temos consciência
dessa seqüência estereotipada
das ações que remetem à velhice.

Vocês puderam ter contato, nesse momento, com algumas estruturas cognitivas.
Não se esqueçam
de que as estruturas não se encerram aqui. Há muito mais que essas. Quem quiser
se dedicar ao estudo
da LINGUÍSTICA Textual, poderá consultar a bibliografia apresentada no fi nal do
módulo e conhecer mais
dessas estruturas cognitivas. Agora é hora de testarmos os nossos conhecimentos.
Vamos ver o que conseguimos
compreender do assunto apresentado?

LINGUÍSTICA Textual 29
Atividade Complementar Atividade Complementar
1. Levando em consideração o contexto (a posição dos interlocutores, o
conhecimento de mundo,
as marcas LINGUÍSTICAs etc), analise a tirinha abaixo e seu(s) efeito(s) de sentido.
2. Com base no que você depreendeu dos assuntos estudados, apresente as
concepções clássicas
do sujeito, fundamentando-as.
3. Agora, indique a concepção de sujeito com a qual a LINGUÍSTICA Textual se
identifi ca, salientando alguns
pontos de imbricamento entre a LINGUÍSTICA Textual e o referido sujeito que
expliquem tal identificação.
4. Tendo como base o assunto apresentado anteriormente, faça algumas
considerações a respeito
da importância das estruturas cognitivas para a LINGUÍSTICA Textual.
5. Apresente sua visão a respeito de como se pode definir um texto.
FTC EaD | LETRAS30
PRINCÍPIOS E PROCEDIMENTOS
DA LINGUÍSTICA TEXTUAL

ALGUNS ELEMENTOS BÁSICOS DA


LINGUÍSTICA TEXTUAL

Como uma metáfora da condição humana, Leonardo Boff utiliza a águia e a galinha
como fi guras
representativas da vida do ser humano. A galinha representa o ser arraigado,
limitado; a águia é apresentada como a transcendência, o ilimitado.
Com isso, Boff sugere a união entre esses dois elementos como meio
ideal para a condição humana. A respeito desses símbolos, o referido
autor salienta:

“Recusamo-nos a ser somente galinhas. Queremos ser também

águias que ganham altura e que projetam visões para além do galinheiro.
Acolhemos prazerosamente nossas raízes (galinha), mas não à custa da copa
(águia) que mediante suas folhas
entra em contato com o sol, a chuva, o ar e o inteiro universo. Queremos resgatar
nosso ser de águias.
As águias não desprezam a terra, pois nela encontram seu alimento. Mas não são
feitas para andar na
terra, senão para voar nos céus, medindo-se com os picos das montanhas e com os
ventos mais fortes”.

Tomado pelo espírito de águia, proponho sairmos do chão para utilizar nossa
capacidade ilimitada
de conhecer, de descobrir novos horizontes. Agora é o momento de mais uma vez
levantarmos vôo e
descobrirmos os elementos básicos da LINGUÍSTICA Textual. Então, não percamos
tempo. Vamos bater
asas e decolar!
A COERÊNCIA TEXTUAL

Leia o texto abaixo:

O amor por entre o verde

Vinicius de Moraes

Não é sem freqüência que, à tarde, chegando à janela, eu vejo um casalzinho de


brotos que vem
namorar sobre a pequenina ponte de balaustrada branca que há no parque. Ela é
uma menina de uns
treze anos, o corpo elástico metido num blue jeans e um suéter folgadão, os cabelos
puxados para trás
num rabinho de cavalo que está sempre a balançar para todos os lados; ele, um
garoto de, no máximo,
dezesseis, esguio, com pastas de cabelo a lhe tombar sobre a testa e um ar de
quem descobriu a fórmula da
vida. Uma coisa eu lhes asseguro: eles são lindos, e fi cam montados, um em frente
ao outro, no corrimão
da colunata, os joelhos a se tocarem, os rostos a se buscarem a todo momento para
pequenos segredos,
pequenos carinhos, pequenos beijos.

São, na sua extrema juventude, a coisa mais antiga que há no parque, incluindo
velhas árvores que
por ali espapaçam sua verde sombra; e as momices e brincadeiras que se fazem
dariam para escrever
todo um tratado sobre a arqueologia do amor, pois têm uma tal ancestralidade que
nunca se há de saber
a quantos milênios remontam.
LINGUÍSTICA Textual 31
Eu os observo por um minuto apenas para não perturbar-lhes os jogos de mão e
misteriosos brinquedos
mímicos com que se entretêm, pois suspeito de que sabem de tudo o que se passa
à sua volta. Às vezes, para
descansar da posição, encaixam-se os pescoços e repousam os rostos um sobre o
ombro do outro, como dois
cavalinhos carinhosos, e eu vejo então os olhos da menina percorrerem
vagarosamente as coisas em torno,
numa aceitação dos homens, das coisas e da natureza, enquanto os do rapaz
mantêm-se fi xos, como a perscrutar
desígnios. Depois voltam à posição inicial e se olham nos olhos, e ela afasta com a
mão os cabelos de sobre
a fronte do namorado, para vê-lo melhor e sente-se que eles se amam e dão
suspiros de cortar o coração. De
repente o menino parte para uma brutalidade qualquer, torce-lhe o pulso até ela
dizer-lhe o que ele quer ouvir,
e ela agarra-o pelos cabelos, e termina tudo, quando não há passantes, num longo e
meticuloso beijo.

-Que será – pergunto-me em vão – dessas duas crianças que tão cedo começam a
praticar os ritos do
amor? Prosseguirão se amando, ou de súbito, na sua jovem incontinência,
procurarão o contato de outras bocas,
de outras mãos, de outros ombros? Quem sabe se amanhã quando eu chegar à
janela, não verei um rapazinho
moreno em lugar do louro ou uma menina com a cabeleira solta em lugar dessa
com cabelos presos?

-E se prosseguirem se amando – pergunto-me novamente em vão – será que um dia


se casarão e serão felizes?
Quando, satisfeita a sua jovem sexualidade, se olharem nos olhos, será que
correrão um para o outro e se darão
um grande abraço de ternura? Ou será que se desviarão o olhar, para pensar cada
um consigo mesmo que ele
não era exatamente aquilo que ela pensava e ela era menos bonita ou inteligente do
que ele a tinha imaginado?

É um tal milagre encontrar, nesse infi nito labirinto de desenganos amorosos, o ser
verdadeiramente
amado ... Esqueço o casalzinho no parque para deter-me por um momento na
observação triste, mas fria, desse
estranho baile de desencontros, em que freqüentemente aquela que deveria ser
daquele acaba por bailar com
outro porque o esperado nunca chega; e este, no entanto, passou por ela sem que
ela o soubesse, suas mãos
sem querer se tocaram, eles olharam-se nos olhos por um instante e não se
reconheceram.

E é então que esqueço de tudo e vou olhar nos olhos de minha bem-amada como se
nunca a tivesse
visto antes. É ela, Deus do céu, é ela! Como a encontrei, não sei. Como chegou até
aqui, não vi. Mas é ela,
eu sei que é ela porque há um rastro de luz quando ela passa; e quando ela me abre
os braços eu me crucifico
neles banhado em lágrimas de ternura; e sei que mataria friamente quem quer lhe
causasse dano; e
gostaria que morrêssemos juntos e fôssemos enterrados de mãos dadas, e nossos
olhos indecomponíveis
fi cassem para sempre abertos mirando muito além das estrelas.

E aí, você gostou do texto? Conseguiu entender o que ele expressa? Foi difícil?

Bem, no decorrer do texto de Vinicius de Moraes, você deve ter percebido a


existência de termos
que remetem a outros (ele, ela, eles, este...) ou que relacionam partes do texto
(mas, e, pois...). Esses termos
são chamados de elementos coesivos e podem auxiliar na compreensão do texto.
Já deu para perceber
que a coesão encontra-se na materialidade LINGUÍSTICA, vez que os elementos
coesivos são elementos
textuais explícitos, ou seja, se estabelecem na linguagem, marcam-se no texto.

Nos estudos realizados acerca dos mecanismos de coesão textual, podem-se


destacar os de Halliday &
Hassan, que dividiram os elementos coesivos em: referência, substituição, elipse,
conjunção e coesão lexical.

REFERÊNCIA

O mecanismo de referência remete a um termo do texto (endofórico) ou externo a


ele (exifórico).

Referência exofórica – Quando remete a um


elemento exterior ao texto, ou seja, fora dele.

Na frase:

“Adorei a mensagem desse outdoor”.

a referência (desse) é exofórica, vez que remete a algo


que está fora do texto (no caso, o outdoor)

FTC EaD | LETRAS32


Referência endofórica – A remissão é feita a um termo que se encontra dentro
do texto.

Em:

“Bruna é uma excelente aluna. Ela tirou dez mais uma vez”.

o termo ELA remete a um outro termo do texto (Bruna).


Assim, a referência endofórica pode ser:

ANAFÓRICA: quando remete a um termo anterior. No caso da frase apresentada


anteriormente, a referência é anafórica, já que o termo remetente (Bruna)
encontra-se antes do termo remissivo (ela).

CATAFÓRICA: quando o termo remetente se segue no texto. Dessa forma,


na frase

“Gosto de todos os seus planos, menos este: o de parar com os estudos”.

o termo remissivo (este) vem antes do trecho remetente (o de parar com os


estudos).
Podemos sintetizar a referência da seguinte forma:

SUBSTITUIÇÃO

A substituição é parecida com a referência, mas Halliday & Hassan a distinguem.


Para eles, na substituição,
diferentemente da referência, o elemento remissivo não é o mesmo que o referente.
Observe o
seguinte enunciado:

“Jorge comprou um carro vermelho, mas José resolveu comprar um preto.”


Desse jeito, o referente sofreu uma redefi nição. O carro pretendido por João tem
uma característica
diferente do de José. Aí a cor vermelha é “repudiada”.

ELIPSE

A elipse consiste na supressão de um termo que pode ser facilmente identifi cado a
partir do contexto.
Assim, substitui-se um léxico, uma oração, um enunciado por zero ( ø ).

- Marta saiu cedo?


-ø Saiu ø.
No exemplo acima, não foi preciso, na resposta, dizer “Marta saiu cedo”. Apesar da
supressão de
MARTA e de CEDO, a mensagem pôde ser facilmente compreendida. O próprio
contexto da situação
comunicativa foi capaz de propiciar a compreensão da resposta dada. Portanto, as
lacunas deixadas não
prejudicaram a mensagem.

CONJUNÇÃO

A conjunção (ou conexão) tem a propriedade de relacionar as partes de um texto


(elementos ou
orações). Estas relações têm uma especificidade. Veja o exemplo abaixo:

“Márcio correu bastante, mas não conseguiu pegar o ônibus”.

Pode-se observar que a relação existente na frase apresentada é de adversidade.


Se MÁRCIO CORREU
BASTANTE, a expectativa é que ele conseguisse PEGAR O ÔNIBUS. Como essa
expectativa é
LINGUÍSTICA Textual 33
frustrada pela segunda oração, NÃO CONSEGUIU PEGAR O ÔNIBUS, estabelece-
se uma relação
específica de adversidade.

COESÃO LEXICAL

A coesão lexical caracteriza-se a partir de dois mecanismos: a reiteração e a


colocação.
“Gosto muito de viajar de avião. O aparelho é mesmo muito seguro e bastante
eficiente.”
No trecho acima, APARELHO é hiperônimo de AVIÃO. Nesse caso, temos um
exemplo de coesão
lexical por reiteração.

Em

“Morri de medo quando vi o machado. Aquela coisa me fez passar mal.”

temos também um exemplo de coesão lexical por reiteração. Dessa vez, ocorre pela
presença de um
termo genérico (coisa). O mesmo tipo de coesão se vê na frase

“O menininho saiu correndo. O garotinho realmente estava com pressa.”

Só que, dessa vez, a coesão se dá a partir de um sinônimo de menininho


(garotinho).

No trecho

“Houve um acidente na estrada. Logo depois chegaram as ambulâncias para


transportar os pacientes
até um hospital próximo.”
pode-se perceber que ACIDENTE, AMBULÂNCIAS, PACIENTES e HOSPITAL são
facilmente
relacionados por nós, não é?! Assim, elas pertencem a um mesmo campo signifi
cativo.

A coesão lexical pode ser visualizada a partir do seguinte esquema:

A esses estudos de Halliday & Hassan, acerca dos mecanismos coesivos, vários
autores fi zeram
suas ressalvas, teceram suas críticas. Há pontos importantes em relação às
divergências existentes, como
a não aceitação da diferença entre a referência e a substituição. Além disso, muitos
autores não vêem a
coesão lexical como um mecanismo independente.

Por conta dessas e de outras questões, Fávero propõe o estabelecimento de três


formas de coesão
textual: a referencial, a recorrencial e a seqüencial.

COESÃO REFERENCIAL

Esse tipo de coesão se dá no momento em que um elemento faz referência a


outro. Dessa forma, pode-se perceber que o elemento remissivo deve ser
interpretado
não em seu sentido próprio, e sim no sentido do termo referido.

Vamos ver melhor como se dá esse processo?! Ok! Então, preste atenção.

FTC EaD | LETRAS34


A coesão referencial pode se apresentar de duas formas: por SUBSTITUIÇÃO ou
por
REITERAÇÃO.

SUBSTITUIÇÃO: Como o próprio nome nos adianta, esse tipo de coesão ocorre
com a substituição
do termo referente por um outro termo. Dessa forma, o sentido do termo referente é
retomado
por uma outra forma, a chamada pro-forma, a qual se caracteriza principalmente por
apresentar baixa
densidade de sentido. Repare como esse processo funciona:

“Comprei uma televisão. Ela é enorme”.

Na frase acima, temos a retomada de TELEVISÃO pela pro-forma pronominal ELA.


O termo
remissivo passa a abarcar, nessa frase, o sentido contido em “televisão”. Como o
pronome vem depois

do referente, essa coesão também é tida como anafórica.

A substituição também pode se dar por ø (zero). É o caso da elipse, que passa a se
encaixar aqui:

-Você vai agora?

-ø Vou ø.

Houve, no exemplo acima, a substituição do pronome EU e do advérbio AGORA por


ø.

REITERAÇÃO: Na reiteração há, ao longo do texto, a repetição de expressões que


têm a mesma
referência.

Você sabia?
Essa repetição pode se dar das seguintes formas:

• Por repetição do mesmo item lexical: “Ana chorou muito. Ana está triste”.
• Por sinônimos: “-A criança agitada caiu. Também o menino só vive correndo!”.
• Por hiperônimos: “Gosto muito de frutas. Adoro principalmente as bananas”.
• Por hipônimos: “Os macacos são muito espertos. Os animais vivem se divertindo,
pulando de
galho em galho”.
• Por expressões nominais defi nidas: “Admiro muito Castro Alves. O poeta dos
escravos ainda vive
em minha memória”.
• Por nomes genéricos: “Vi no céu a coisa mais linda. Um cometa rasgou o espaço”.
RECORRÊNCIA

A recorrência, ao contrário do que muita gente imagina, não é uma repetição.


Quando repetimos
algo, signifi ca que fazemos uma retomada, de forma que a idéia passada seja
reproduzida com o mesmo
sentido. Na recorrência, o termo recorrente não aparece novamente da mesma
forma, com o mesmo
sentido. O discurso não mantém aquela idéia inicial. Ele, ao contrário, progride. A
recorrência faz com
que o discurso possa fl uir, possa se desenvolver, caminhe, não fi que estático, da
mesma forma. Em “Irene
no Céu”, de Manuel Bandeira, há uma recorrência, e não simplesmente uma
repetição:

“Irene preta
Irene boa
Irene sempre de bom humor”
Repare que no trecho acima o discurso progride, a recorrência faz com que o texto
caminhe, se

LINGUÍSTICA Textual 35
desenvolva. A recorrência é um recurso que não raro encontramos em poemas e
músicas. Ela também
pode destacar nos textos a propriedade rítmica, a entoação, entre outras.

SEQÜENCIAÇÃO

A coesão seqüencial se parece bastante com a recorrencial, que nós vimos


anteriormente. Porém,
há uma diferença entre as duas: a seqüenciação não retoma termos ou estruturas.
Ela pode ser temporal
ou pode se dar por conexão.

TEMPORAL – Quanto à coesão temporal, Fávero salienta que “embora todo texto
coeso tenha
uma seqüenciação temporal (já que a coesão é linear), uso o termo em sentido
restrito: para indicar o
tempo do ‘mundo real’”.

Assim, essa questão de temporalidade e, conseqüentemente, de coesão temporal,


pode ser observada
na seguinte frase:

“Ele levantou da cama, escovou os dentes, tomou café e foi trabalhar.”

Observe que houve uma seqüência estabelecida em relação ao “mundo real”. A


coesão seqüencial
temporal também pode ser marcada por partículas temporais:

“Só irei viajar amanhã.”

SEQÜENCIAÇÃO POR CONEXÃO – Como o próprio nome já nos adianta, esse tipo
de coesão
se dá a partir da conexão de partes de um texto, de sentenças, de frases,
principalmente mediante
conectivos:

“Maria ou Fernanda jogará hoje.”

“Se ela gostasse de mim, eu seria o homem mais feliz do mundo.”

Bem, vocês puderam acompanhar alguns tipos de coesão textual. É preciso lembrar
que a coesão
não se esgota diante do que foi abordado nesse módulo. Há mais elementos
coesivos, porém, como introdução,
esses tipos apresentados já nos são sufi cientes para ter uma idéia da relação
coesiva em textos,
um dos pontos principais da LINGUÍSTICA Textual. Agora vamos passar para um
outro item que também é
importantíssimo para os estudos da referida disciplina: a coerência textual.

A COESÃO TEXTUAL

Em algum momento de sua vida você ou uma pessoa que você conhece já deve ter
se deparado com
um texto e, após fazer uma leitura, ter dito: “Não entendi esse texto. Para mim, não
está coerente”, ou “O
que o texto apresenta está totalmente incoerente”. Pois é. Muitas vezes não
conseguimos compreender a
mensagem de um determinado texto, caracterizando-o como um texto incoerente.
Mas você sabe por que
isso acontece? Bem, a resposta para essa pergunta será dada a partir de agora.
Mas não se preocupe. Prometo
tentar ser muito coerente, tá?!
Primeiramente, podemos dizer que a coerência é o que dá textualidade a
uma determinada seqüência LINGUÍSTICA. É mediante a coerência que uma
seqüência
LINGUÍSTICA pode se tornar um texto.

Agora, você deve estar se perguntando:

FTC EaD | LETRAS36


Ou

Lembra de que, quando estudamos as características de um texto, concluímos que


ele deve ser visto não
como um produto acabado, fi nalizado, mas como um processo interativo, dinâmico?
Além disso, percebemos
que o sentido textual é produzido na interação entre texto e leitor/ouvinte. Pois aí
está! A coerência situa-se
justamente nesse processo, que envolve tanto o texto e o contexto quanto os
interlocutores.

Agora, vamos ver alguns fatores que contribuem para a constituição da textualidade,
ou seja, para
que a coerência se configure, proporcionando, assim, a compreensão textual.

CONHECIMENTO DE MUNDO

O que aconteceria se você tivesse que ler um artigo de física quântica? É,


acho que, assim como muitos, você não entenderia muita coisa. A não ser que
tenha um conhecimento sobre esse assunto. Pois é justamente o conhecimento
que nós temos sobre as mais variadas questões que é o conhecimento de mundo,
ou conhecimento enciclopédico.

Esse conhecimento se encontra armazenado em nossa mente, mas não de


qualquer forma. Há uma estruturação cognitiva. Desta forma, podemos rever
algumas
estruturas cognitivas auxiliadoras nesse trabalho de organização mental:

• FRAMES
• ESQUEMAS
• PLANOS
• SCRIPTS
CONHECIMENTO PARTILHADO

Em uma situação comunicativa, para que se compreenda uma determinada


mensagem, é importante
que os interlocutores tenham um conhecimento parecido. Perceba que é impossível
o fato de interlocutores
terem o mesmo conhecimento, vez que as duas vidas, mesmo que tenham uma
rotina parecida, são
diferentes. Além das experiências, das situações pelas quais passam não poderem
ser idênticas, a forma de
absorver ou perceber tais situações seria desenvolvida por visões particulares,
individuais. Mas eles devem
ter conhecimentos em comum. Vamos entender melhor essa questão. Fique de olho
na seguinte frase:

“Detesto quando ele acende o cigarro. A fumaça me incomoda bastante.”

Para nós, não é difícil perceber que a fumaça citada na frase acima é produzida pelo
cigarro. Conseguimos
compreender o exemplo citado porque temos esse conhecimento compartilhado.
Por isso, não
foi preciso explicar que a fumaça sai do cigarro.

INFERÊNCIAS

As inferências se assemelham a deduções possíveis de serem feitas a partir de


nosso conhecimento
de mundo. Veja a frase abaixo:

“Pedro adquiriu uma linda mansão em um excelente bairro!”

LINGUÍSTICA Textual 37
Diante dessa frase, nós podemos fazer as seguintes inferências:
Pedro tem uma casa nova.
A nova casa de Pedro é uma mansão.
Pedro tem dinheiro para comprar uma mansão.
Pedro é rico.
Pedro é um ótimo partido!
É claro que as inferências dependem também do contexto. Se uma mãe tiver o
propósito de arru

mar um marido rico para sua fi lha, a última inferência estaria bem direcionada.
Porém, nesse caso, todas
as inferências seriam válidas.

FATORES DE CONTEXTUALIZAÇÃO

Os fatores de contextualização também são bastante importantes para direcionar


uma situação de
comunicação. Esses fatores fazem com que a perspectiva na comunicação seja
direcionada, no intuito de
imprimir a coerência, o entendimento. Eles podem ser:

TÍTULO

NOME DO AUTOR

CARIMBO

DATA

ASSINATURA

Entre outros
SITUACIONALIDADE
Imagine uma pessoa indo à praia vestida com um paletó e uma gravata, e outra em
um casamento,

vestida apenas com uma sunga.

Essa cena vai se tornar estranha, não é? Isso


ocorre porque essas pessoas não adequaram a roupa
ao local. No contexto social, há regras básicas de conduta
que devemos seguir. Assim também acontece com
a língua. Temos que adequá-la ao ambiente, à situação
comunicativa, situação esta que vai determinar as nos

sas escolhas em relação à forma de dizer, à forma de falar.

Não é prudente, por exemplo, utilizar gírias na linguagem durante uma entrevista de
emprego, a
não ser que o trabalho seja direcionado para uma situação comunicativa em que se
precise utilizar gírias
ou algo parecido. Porém, no mais, não se faz conveniente o uso da respectiva
linguagem em uma entrevista
de emprego. Assim, fi ca claro que a situação comunicativa, e também sócio-
cultural, é determinante
para a coerência na produção textual.

INFORMATIVIDADE

De certa forma, a informatividade está ligada ao grau de previsibilidade. Diante


disso, quanto mais

FTC EaD | LETRAS38


previsível for o texto menor será seu grau de informatividade. Para ilustrar essa
questão, Beaugrande &
Dressler apresentam os seguintes casos:

1. O oceano é água.
2. O oceano é água. Mas ele se compõe, na verdade, de uma solução de gases e
sais.
3. O oceano não é água. Na verdade, ele é constituído de gases e sais.
No primeiro exemplo, o grau de informatividade é muito pequeno. Isso porque todos
nós sabemos
que o oceano é constituído de água.

No segundo, o grau de informatividade aumenta, já que mais informações, nesse


caso em relação
à composição do oceano, são apresentadas.

Já no terceiro, há um grau altíssimo de informatividade. Em um primeiro momento, a


afi rmação
de que “O oceano não é água” pode “chocar” as pessoas e se tornar incoerente para
elas. Porém, mais
adiante, apresenta-se a explicação para tal afirmação: “Na verdade, ele é constituído
de gases e sais”.

A partir desses exemplos, foi possível observar que um texto pode ter um grau
mínimo de informatividade,
por ser previsível demais, ou até chegar a um grau máximo de informatividade, pela
ausência
de previsibilidade.

FOCALIZAÇÃO

A focalização está intimamente ligada ao conhecimento de mundo e ao


conhecimento compartilhado.
Na verdade, a focalização é a concentração de uma parte desses conhecimentos
em um determinado
momento comunicativo.

Imagine a análise que um psicólogo faria de um casamento. Agora, imagine a


análise feita sobre o
mesmo evento, mas dessa vez por um crítico de teatro. Não é difícil perceber que o
FOCO das análises
não será igual. Cada um observará o casamento de acordo com sua visão de
mundo, buscando nele os
aspectos que lhes interessam. Agora, observe as frases:

“Preciso de mais mangas.”

A focalização poderá, em casos como esse, evitar a incoerência. Essa frase poderia
ser dita em
contextos, tais como:

• Uma costureira solicitando mangas para a confecção de camisas;


• Um feirante necessitando de colocar mangas em sua barraca para serem
vendidas.
Isso acontece pela propriedade da palavra (no caso acima, MANGA) ser
POLISSÊMICA, ou seja,
ter mais de um sentido.
INTERTEXTUALIDADE
Pode-se dizer que a intertextualidade é a relação de um texto com outros textos.
Vamos ver como

o processo de intertextualidade se dá, na prática. Para isso, observe a fábula abaixo,


atribuída a Esopo e
traduzida por Neide Smolka:
O lobo e o cordeiro

Um lobo, ao ver um cordeiro bebendo de um rio, resolveu utilizar-se de um


pretexto para devorá-lo. Por isso, tendo-se colocado na parte de cima do rio,
começou
a acusá-lo de sujar a água e impedi-lo de beber. Como o cordeiro dissesse
que bebia com as pontas dos beiços e não podia, estando embaixo, sujar a água
que vinha de cima, o lobo, ao perceber que aquele pretexto tinha falhado, disse:
“Mas, no ano passado, tu insultaste meu pai”. E como o outro dissesse que então
nem estava vivo, o lobo disse: “Qualquer que seja a defesa que apresentes, eu não
deixarei de comer-te”.

LINGUÍSTICA Textual 39
A fábula mostra que, ante a decisão dos que são maus, nem uma justa
defesa tem força.

Agora, acompanhe a fábula de Millôr Fernandes com o mesmo título:

O LOBO E O CORDEIRO

Estava o cordeirinho bebendo água, quando viu refletida


no rio a sombra do lobo. Estremeceu, ao mesmo tempo que ouvia a voz cavernosa:
“Vais pagar com a vida o teu miserável crime.” “Que crime?” – perguntou o
cordeirinho tentando ganhar tempo, pois já sabia que com lobo não adiantava
argumentar.
“O crime de sujar a água que eu bebo.” “Mas como posso sujar a água
que bebes se sou lavado diariamente pelas máquinas automáticas da fazenda?”

– indagou o cordeirinho. “Por mais limpo que esteja um cordeiro é sempre sujo
para um lobo” – retrucou dialeticamente o lobo. “E vice-versa” – pensou o
cordeirinho,
mas disse apenas: “Como posso eu sujar a sua água se estou abaixo da corrente?”
“Pois se não foi você foi seu pai, foi sua mãe ou qualquer outro ancestral
e vou comê-lo de qualquer maneira, pois como rezam os livros de lobologia, eu só
me alimento de carne de cordeiro” – fi nalizou o lobo preparando-se para devorar o
cordeirinho. “Ein moment! Ein moment!” – gritou o cordeirinho traçando lá o seu
alemão kantiano. “Dou-lhe toda razão, mas faço-lhe uma proposta: se me deixar
livre atrairei pra cá todo o rebanho.” “Chega de conversa” – disse o lobo – “Vou
comê-lo logo, e está acabado.” “Espera aí” – falou fi rme o cordeiro – “Isso não é
ético. Eu tenho, pelo menos, direito a três perguntas.” “Está bem” – cedeu o lobo
irritado com a lembrança do código milenar de jungle. – “Qual é o animal mais
estúpido do mundo?” “O homem casado” – respondeu prontamente o cordeiro.
“Muito bem, muito bem!” – disse o lobo, logo refreando, envergonhado, o súbito
entusiasmo. “Outra: a zebra é um animal branco de listras pretas ou um animal
preto de listras brancas?” “Um animal sem cor pintado de preto e branco para não
passar por burro” – respondeu o cordeirinho. “Perfeito!” – disse o lobo engolindo
em seco.” Agora, por último, diga-me uma frase de Bernard Shaw.” “Vai haver
eleição em 66” – respondeu logo o cordeirinho mal podendo conter o riso. “Muito
bem, muito certo, você escapou!” – deu-se o lobo por vencido. E já se ia preparando
para devorar o cordeiro quando apareceu o caçador e o esquartejou.
MORAL: QUANDO O LOBO TEM FOME NÃO DEVE SE METER EM FILOSOFIAS.

Agora, observe uma fábula, com o mesmo título, mas com sua produção datada por
volta do século
VII a.C.

O lobo e o cordeiro

Um lobo, que já havia comido à saciedade, viu um cordeiro caído no chão.


Compreendeu que ele
caíra de medo, aproximou-se para tranqüilizá-lo, e disse que apenas deveria lhe
apresentar três proposições
verdadeiras para ir embora são e salvo. E o cordeiro disse, em primeiro lugar, que
gostaria de não
tê-lo encontrado; segundo, que esperava que o lobo não fi zesse nada contra ele,
porque era cego; e, por
fi m, em terceiro lugar, “que possam todos os abomináveis lobos morrer da pior
morte, pois nos fazem
uma guerra sem quartel sem nada terem sofrido de nossa parte”. E o lobo teve de
reconhecer a verdade
do que ele dissera, devolvendo-lhe a liberdade.

Moral: A fábula mostra que, muitas vezes, a verdade tem seus efeitos até sobre os
inimigos. ESOPO,
2006, p.119 – 120)

Perceba que a intertextualidade está vinculada ao conhecimento prévio. Ora, quem


conhece a fábu-

FTC EaD | LETRAS40


la “O lobo e o cordeiro”, de Esopo, irá naturalmente relacioná-la à de Millôr. Isso
porque elas têm uma
relação de intertextualidade, ou seja, um texto remete a um outro texto. Nesse caso,
a fábula de Millôr remeterá
à de Esopo. Porém, para reconhecer a intertextualidade, é primordial que se tenha
conhecimento
da estrutura textual a que o outro texto remete.

INTENCIONALIDADE

Já vimos que, ao produzir um texto, há um objetivo, uma intenção a ser alcançada


com isso. O processo
da intencionalidade diz respeito justamente a essa intenção. As estratégias de
produção textual vão
girar em torno de uma determinada intenção. Ora, quem nunca imitou ou viu alguém
imitar um discurso
sem nexo, aparentemente incoerente, para se fazer de bêbado ou para tentar
sugerir que não estivesse em
seu juízo total?

Pois é. Até em fi lmes podemos ver esse tipo de cena, principalmente quando
tratam de estratégias jurídicas para inocentar um acusado.

ACEITABILIDADE

Quando aceitamos que um texto tem uma intenção, um objetivo a atingir,


logicamente
atribuímos a ele uma característica de argumentatividade. Tal característica
está ligada à intencionalidade. Grice, com o seu Princípio Cooperativo, nos leva
a enxergar a comunicação como um evento interativo. Diante disso, você já deve
ter percebido que, para a existência da comunicação como um processo dinâmico,
é preciso que os participantes de tal evento aceitem fazer parte do “jogo da
linguagem”, aceitem interagir,
produzir sentidos, entrar em combate dialógico. É preciso se inserir, aceitar
participar desse “jogo” para
que o texto seja constituído durante o referido processo interativo e argumentativo.

Nesta parte do módulo, foram apresentados alguns pontos importantes para que se
estabeleça a coerência
textual. Você também pôde ter a noção de que a coerência não é qualidade só das
seqüências LINGUÍSTICAs e de
que tampouco depende única e exclusivamente de fatores extralingüísticos. A
coerência se dá nesse processo de
constituição textual que envolve todos esses elementos. Agora já podemos
compreender a relação entre estes dois
fatores primordiais para a LINGUÍSTICA Textual: a relação entre a coerência e a
coesão.

A RELAÇÃO ENTRE A COERÊNCIA E A COESÃO


TEXTUAL

Tanto a coesão quanto a coerência são elementos primordiais para o estudo e a


compreensão da
LINGUÍSTICA Textual. Esse foi um dos motivos de apresentá-los separadamente.
Outro motivo é que, dessa
forma, foi possível observarmos como se dão os processos de coesão e coerência
de um modo mais específico
e abrangente, o que não signifi ca dizer que os dois assuntos se esgotem no que foi
apresentado;
muito pelo contrário!

Durante a apresentação da coerência, percebemos que há estruturas


extraLINGUÍSTICAs que nos auxiliam
no processo de compreensão textual, de interpretabilidade. É interessante pensar
que, a todo momento, ao
nos comunicarmos, fazemos a utilização de tais estruturas e, muitas vezes, nem
percebemos. A linguagem fl ui,
na grande parte das vezes, com tamanha naturalidade que não nos damos conta do
processo complexo que a
subjaz. Coisa parecida ocorre quando analisamos sintaticamente uma frase: no
momento em que é produzida
por nós, nem pensamos “onde está o sujeito” ou “que o verbo é transitivo”, não é?!

No decorrer de nossa análise a respeito do processo de coesão textual, as marcas


LINGUÍSTICAs evidenciaram
que são valorosas. Quando aplicadas corretamente, auxiliam bastante para que o
texto se torne
inteligível, coerente. Como pôde ser visto no texto, mais precisamente nas
seqüências LINGUÍSTICAs, não
raro ocorre o aparecimento de elementos que retomam termos anteriores, remetem
a outros termos,
substituem léxicos e/ou seqüências LINGUÍSTICAs e que até imprimem
circunstâncias e relações entre ter-

LINGUÍSTICA Textual 41
mos, frases, orações... Esses elementos têm a propriedade de dar uma linearidade
ao texto, de estabelecer
uma ligação entre suas partes. Assim, podemos dizer que a coesão pode ser
visualizada na matéria LINGUÍSTICA
do texto, pode ser reconhecida na seqüência LINGUÍSTICA.

Por conta da relação existente entre a coerência e a coesão, muita gente pensa que
as duas estão
intimamente ligadas ao ponto de não poderem se separar. Nesse sentido, os
referidos elementos não
poderiam existir um sem a presença do outro. De acordo com esse ponto de vista,
vamos ver qual é a
posição de Koch & Travaglia diante da seguinte citação:

“Como a coesão não é necessária, há muitas seqüências LINGUÍSTICAs com


poucos ou nenhum elemento coesivo, mas que constituem um texto porque são
coerentes e por isso têm o que se chama de textualidade”.

E continuam:

“Como a coesão não é sufi ciente, há seqüências LINGUÍSTICAs coesas, para as


quais o receptor não pode ou difi cilmente consegue estabelecer um sentido global
que a faça coerente”.

Assim, a idéia de interdependência total é posta em xeque. Para comprovar, Araújo


apresenta dois
textos de Koch & Travaglia, os quais nós vamos analisar aqui.

TEXTO 1 – O SHOW

O show

O cartaz
O desejo

O pai

O dinheiro

O ingresso

O dia

A preparação

A ida

O estádio

A multidão

A expectativa

A música

A vibração

A participação

O fim

A volta

O vazio

Koch & Travaglia


Diante do primeiro texto, é possível dizer que não há um alto grau de coesão. Tem-
se a constituição
textual mediante a colocação de várias palavras sem nenhum elemento de ligação.
Mas será que tal ausência
faz com que não se consiga compreender do que o texto trata? Ora, se prestarmos
atenção, veremos
que há uma coerência. Não é difícil notar que está se tratando de etapas efetuadas
por uma pessoa, provavelmente
por um jovem, desde a hora em que teve noção da realização do evento
(provavelmente um
show de música) até sua fi nalização, a volta para casa.

O que é bastante interessante de se perceber nesse texto é que a própria disposição


das palavras
evidencia um grau – ainda que pequeno – de coesão, vez que “ligam” os
acontecimentos. Se não houvesse
essa “ordem” na colocação das palavras, fi caria mais difícil a compreensão textual.

Apesar de podermos caracterizá-lo, em suma, como um texto não coeso, vimos que
há coerência.

FTC EaD | LETRAS42


Agora, observe o próximo texto:

TEXTO 2

João vai à padaria. A padaria é feita de tijolos. Os tijolos são caríssimos. Também
os mísseis são caríssimos. Os mísseis são lançados no espaço. Segundo a
teoria da Relatividade o espaço é curvo. A geometria Rimaniana dá conta desse
fenômeno.

Koch & Travaglia

O que vemos aqui é o oposto do texto “O show”. Está clara a presença da coesão.
No decorrer da
leitura, é notória a retomada de termos, a repetição de palavras. No entanto, se fi
zermos a pergunta que
não quer calar...

Já sabemos a resposta para isso, não é? Bem, o que percebemos aí é


um amontoado de frases que juntas não produzem um sentido global. Não é
possível dizer do que o texto trata. Assim, apesar da notória coesão, não há
coerência no conjunto das frases.

É importante que fi que clara a noção de que a coerência e a coesão


apresentam-se como elementos primordiais para a LINGUÍSTICA Textual e, ao fi
gurarem
em conjunto, desde que empregadas corretamente, auxiliam no processo
de compreensão textual. Todavia, uma não é condição de existência da
outra. Vimos, através de explicações e exemplos, que tanto a coerência quanto
a coesão podem existir separadamente.

E aí, conseguiu compreender a relação entre a coerência e a coesão textuais? Se


não entendeu, vamos
dar mais uma lida, agora com bastante atenção, certo?! Mas, se a resposta for
positiva, maravilha! Já estamos
prontos para avançar em nossos estudos. Já podemos conhecer outros itens
bastante interessantes e que vão
nos auxiliar para que tenhamos um melhor contato com os diversos tipos de textos.

Nosso destino agora é sobrevoar a semântica da enunciação. Vamos fazer um vôo


panorâmico
e avistar um trabalho bastante interessante de um teórico chamado Oswald Ducrot:
a polifonia. Nesse
trabalho, o referido autor irá de encontro à concepção da “unicidade do sujeito”.
Após esse primeiro
momento, apresentará sua proposta de dispersão do sujeito. É assim que ele irá
tentar apresentar para
nós as “várias vozes” que estão presentifi cadas em nosso discurso. Estão prontos?
Ok! Sendo assim,
sigam-me!

A POLIFONIA TEXTUAL

É possível constatar, pela contribuição de Ducrot (1987) com a sua teoria polifônica
da linguagem,
a não-unicidade do sujeito. Ao tratar da questão polifônica da linguagem, Ducrot
retoma a teoria de
Bakhtin ([1929], 1976), fundamentada pela idéia de dialogismo, retratando-a ao
campo da Semântica da
Enunciação, direcionando-a ao espaço lingüístico. Durante a formulação de sua
teoria, que se fez fundamental
para os estudos da linguagem, como objetivo principal a ser galgado, teve a
intenção de comprovar
a não-unicidade do sujeito, evidenciando um cenário enunciativo no qual várias
vozes circundam-no a
fi m de se fazerem presentes e predominantemente incontestes para a
concretização do ato de elocução.

Partindo dessa concepção, o locutor não é o responsável único pela produção


discursiva. Neste
contexto, o sujeito está disperso, pois na elocução encontram-se marcas discursivas
as quais assinalam a

LINGUÍSTICA Textual 43
presença de outros discursos (interdiscurso), de outras vozes que se digladiam
numa arena dialógica e se
fi rmam como parte produtora da enunciação.

Para marcar a presença da polifonia nos enunciados, Ducrot mobiliza conceitos de


locutor e enunciador.
Vamos ver como ele os apresenta em sua teoria polifônica da linguagem:

“Por definição, entendo por locutor um ser que é, no próprio sentido do enunciado,
apresentado como seu responsável, ou seja, como alguém a quem se deve
imputar a responsabilidade deste enunciado”.

Diante do exposto, dá para perceber que o locutor é tido como o responsável pelo
enunciado; no
entanto, Ducrot assinala que o locutor é diferente do sujeito empírico, da pessoa em
si. Ainda em relação
ao locutor, Ducrot o separa em duas instâncias: “locutor enquanto tal” (L) e “locutor
enquanto ser do
mundo” (.).

Quanto ao enunciador, Ducrot salienta o seguinte:

“Chamo ‘enunciadores’ estes seres que são considerados como se expressando


através da enunciação, sem que para tanto se lhe atribuam palavras precisas; se
eles ‘falam’ é somente no sentido em que a enunciação é vista como expressando
seu ponto de vista, sua posição; sua atitude, mas não no sentido material do termo,
suas palavras”.

Para tentar deixar essas concepções mais claras, Ducrot se baseia no trabalho de
Genette acerca da
teoria da narrativa. Assim, ele compara o locutor com o autor, e o enunciador com a
personagem:
LOCUTOR/AUTOR X ENUNCIADOR/PERSONAGEM

A partir daí, pode-se observar que é no intuito de cristalizar mais a distinção


apresentada acerca
do locutor e do enunciador que Ducrot propõe uma analogia entre a diferença dos
sujeitos e a teoria da
narrativa, de Genette. A esse respeito, o narrador aproxima-se do locutor, e o
personagem do enunciador.
Da mesma forma que o narrador mobiliza personagens, o locutor irá mobilizar
pontos de vista para o
enunciado, ou seja, enunciador(res). Da mesma forma que Genette opõe o autor ao
narrador, Ducrot o
faz com o locutor e o sujeito falante empírico.

Vamos visualizar melhor a polifonia de Ducrot. Para isso, leia o exemplo abaixo e
perceba como é
possível efetuar o estabelecimento de locutores e enunciadores no decorrer de
seqüências LINGUÍSTICAs.

Eu ouvi Paulo dizer: Não vai mais haver a festa.

Diante da frase acima, pode-se ver que, ao se estabelecer a análise de


sobreposição de vozes, temos,
logo de início, um locutor ., ou “locutor enquanto ser do mundo”. Também, nesse
caso, há uma divisão em
duas instâncias LINGUÍSTICAs: o “locutor enquanto tal”, ou o “responsável” pela
enunciação e o locutor .. É
possível compreender a presença do locutor . por este ser a origem do enunciado. A
marca LINGUÍSTICA de 1ª
pessoa no exemplo (eu) evidencia sua presença. A respeito disso, Ducrot afirma:

“De um modo geral o ser que o pronome eu designa é sempre ., mesmo se a


identidade deste . só fosse acessível através de seu aparecimento como L”.
No decorrer do exemplo, tem-se a confi guração do L¹, responsável pelo enunciado
“Não vai mais
haver a festa”. A presença do termo “não” na frase mobiliza duas perspectivas, dois
enunciadores: enunciador
E, que afi rma haver a festa hoje. Essa perspectiva, no entanto, é rejeitada por L¹; e
a de que “não
vai haver a festa hoje”, perspectiva da qual o L¹ comunga.

Assim, para salientar características do enunciador, Ducrot ainda se vale da


concepção de Genette
sobre o “centro da perspectiva”, ou “sujeito de consciência”, a partir do qual são
apresentados os acontecimentos.
Esse ponto de vista é colocado em paralelo com a fi gura do enunciador,
caracterizando-o, dessa
forma, por apresentar um ponto de vista que pode se distanciar da perspectiva do
locutor. Dessa forma,
Genette explicita que o narrador pode ser compreendido como “quem fala” e o
centro da perspectiva
como “quem vê”.

FTC EaD | LETRAS44


Nesse sentido, Ducrot estabelece os parâmetros de constituição de uma teoria que
se propõe a
romper com as idéias até então vigentes e esboça uma nova forma de abordagem
semântica da constituição
dos sujeitos, bem como o desenvolvimento teórico ao conceber, em seus estudos, o
caráter polifônico
da linguagem.

É, compreender todas essas idéias leva um pouco de tempo. Se tiver alguma difi
culdade, não se
aflija. Aos poucos, questões mais complexas passam a fazer sentido para nós.
Nesse momento, é necessário
que você tente internalizar os pontos principais da teoria polifônica da linguagem. A
parte teórica às
vezes se torna um pouco complexa, mas quando passamos a praticar, tudo fi ca
bem melhor. Você gostou
da análise feita a partir do exemplo apresentado? Achou difícil? Bem, quaisquer que
sejam as respostas,
uma coisa é certa: Temos de convir que Ducrot, ao questionar a noção da unicidade
do sujeito, acabou
apresentando uma forma diferente de ver o texto, de observar os enunciados. E isso
é importantíssimo
para o desenvolvimento dos estudos lingüísticos.

A teoria polifônica de Ducrot também auxilia em muitos trabalhos de Análise do


Discurso, aqui no
Brasil. Ao se apropriarem dessa teoria polifônica, muitos pesquisadores se propõem
a transcender o nível do
enunciado, no qual se dão os estudos ducrotianos e, tomando o discurso como
efeito(s) de sentido, analisam
a discursividade aliada à marcação polifônica. Para ilustrar essa questão importante
para nossos estudos, vez
que em alguns momentos a Análise do Discurso dialoga com a LINGUÍSTICA
Textual, observem uma análise,
ainda tomando a fábula como corpus, que contempla tal entremeio teórico:

HIERARQUIA

Diz que um leão enorme ia andando chateado, não muito rei dos animais porque
tinha acabado de
brigar com a mulher e esta lhe dissera poucas e boas.1 Ainda com as palavras da
mulher o aborrecendo o
leão subitamente se defrontou com um pequeno rato, o ratinho mais menos que ele
já tinha visto. Pisou-
lhe a cauda e, enquanto o rato forçava inutilmente para fugir, o leão gritou:
“Miserável criatura, estúpida,
ínfima, vil, torpe: não conheço na criação nada mais insignifi cante e nojento. Vou te
deixar com vida apenas
para que você possa sofrer toda a humilhação do que lhe disse, você, desgraçado,
inferior, mesquinho,
rato!” E soltou-o. O rato correu o mais que pôde, mas, quando já estava a salvo,
gritou pro leão: “Será
que Vossa Excelência poderia escrever isso para mim? Vou me encontrar agora
mesmo com uma lesma
que eu conheço e quero repetir isso pra ela com as mesmas palavras!”2

MORAL: AFINAL NINGUÉM É TÃO INFERIOR ASSIM.

SUBMORAL: NEM TÃO SUPERIOR, POR FALAR NISSO.

1. Quer dizer: muitas e más.


2. Na grande hora psicanalítica, que soa para todos nós, a precisão da linguagem é
fundamental.
(FERNANDES, [1963] 1999, p. 110)
No primeiro momento do texto, após o título, confi gura-se a existência típica do
Locutor (L)
narrador de fábulas e “estórias” fi ccionais, que põe em cena um enunciador, E0, o
qual se posiciona do
ponto de vista da perspectiva genérica, presente em inúmeras fábulas ao longo dos
tempos. Essa evidência
se dá a partir da marca LINGUÍSTICA “Diz que”, a qual remete à voz genérica “Era
uma vez”, elocução
à que atribui uma posição enunciativa marcadora da perspectiva remota, a qual
atravessa os tempos e é
assimilada pelo locutor a partir do momento em que se dá o seu aparecimento
histórico. A perspectiva,
nesse caso, é atribuída à voz coletiva, que comumente assimila a referida marca de
enunciado em fábulas,
marca esta passível de ser presentifi cada em outros enunciados, em outras
estórias, de ocorrer em outras
enunciações. É nessa mobilidade na qual se confi gura que torna visível seu caráter
genérico, característico
de fábulas, pois marca um tipo de produção textual conhecida em suas primeiras
aparições mediante a
forma oral, motivo de apresentar sua origem como “perdida” no esteio do tempo e
absorvida na utilização
coletiva de inúmeras sociedades.

No fragmento “não muito rei dos animais”, o L mobiliza três enunciadores (E).

LINGUÍSTICA Textual 45
O E1, ponto de vista que representa a voz sustentadora da idéia de o leão ser o rei
dos animais. O
E1 se assimila à perspectiva do senso comum, vez que a sociedade vê
convencionalmente no leão um ser
imponente, situado na camada mais alta do “reino dos animais”. Nesse caso, de
forma fi gurativa, o leão
representa a arquitetura social vigente, caracterizando uma sociedade estruturada
de acordo com uma
visão patriarcal, a partir da qual o homem ainda tem supremacia em termos de poder
e de direitos em
relação à mulher. O leão, portanto, encontra-se num lugar que deve ser mantido,
preservado. Além do
E1, manifestam-se dois outros enunciadores distintos mediante o grau de
intensidade, marcado discursivamente
pelo intensifi cador “muito”. Assim, tem-se o E2, que aplica um grau maior ao “rei
dos animais”,
indicando o ponto de vista de que o leão pode ser mais que o rei dos animais,
portanto, “muito rei dos
animais”. No entanto, em oposição ao referente grau ascendente, que é rejeitado no
discurso, passa a ser
estabelecido o E3 sob um caráter estrutural de litotes. Portanto, ao apresentar-se
como um enunciado
negativo: “não muito rei dos animais”, remete-se ao posicionamento do E3, confi
gurado mediante o sentido
de o leão estar pouco rei dos animais. Esse é o ponto de vista que se leva em
consideração na fábula.
A partir daí verifica-se a presença de um abalo, de um estremecimento nas bases da
arquitetura social. Tal
situação é observada mediante a caracterização do posicionamento do locutor e o
vínculo estabelecido
com o centro da perspectiva em questão. O acionamento das posições locutor /
enunciador efetua-se na
fábula em análise remetendo à teoria polifônica de Ducrot em consonância com o
discurso na AD, a partir
do qual se podem identifi car os efeitos de sentido considerando a sociedade e as
ideologias presentes,
já que várias vozes são firmadas, marcando o discurso mediante essa cadeia de
relações.

Simbolicamente, o leão é:

Considerado o “rei” dos animais na terra (ao lado da águia, a “rainha” dos pássaros)
(...) Outras
características de forte teor simbólico são, sobretudo, a coragem, a ferocidade e sua
suposta sabedoria.
É representado geralmente como símbolo de poder e de justiça nos tronos e
palácios soberanos (LEXIKON,
1990, p. 120-121).

No entanto, no momento em que aparece “andando chateado não muito rei dos
animais”, esse, por sua
vez, surge momentaneamente descaracterizado de seu valor simbólico, visto que
não se encontra tão feroz, nem
tão sábio. Na verdade, já que tivera “acabado de brigar com a mulher e esta lhe
dissera poucas e boas”, subentende
-se que o leão não se sentiu confortável por ter de ouvir as “poucas e boas”. Ao se
evidenciar um “poder”
apresentado pela mulher, percebe-se que o leão não está mais em sua posição
hegemônica que lhe é atribuída.
Nesse ponto de vista, ela passa a desmantelar toda uma concepção de poder que a
ele é instituído.

Ao se colocar que “esta lhe dissera poucas e boas”, o L mobiliza mais três
enunciadores: o primeiro,
E4, aponta para as mulheres oprimidas, pusilânimes, que não dizem nada. Nessa
concepção, tem-se um
lugar historicamente ocupado pela mulher, mediante o paradigma da concepção
machista. A partir daí, retoma
-se o ponto de vista daquele que vê a mulher subordinada à autoridade masculina,
numa condição préestabelecida
ao longo dos tempos. O E5 diz respeito às mulheres que realmente dizem “poucas
e boas”, em
seu sentido denotativo, no intuito de agradar, de servir. No entanto, na fábula, o
sentido de poucas e boas
é justamente o inverso, ou “muitas e más”, que é explicado com uma citação do
autor de forma irônica, já
que o referido sentido inverso é de conhecimento geral, por esta expressão, “poucas
e boas”, fazer parte do
contexto da referida sociedade, a qual é estabelecida no texto, mobilizando o E6.

No enunciado, o operador argumentativo “porque” dá início à apresentação da


explicação do referido
posicionamento situacional do leão. Assim, tem-se “porque tinha acabado de brigar
com a mulher e esta lhe
dissera poucas e boas”. Diante desse fragmento, percebe-se a proximidade do
discurso com o cenário brasileiro
do séc. XX. Ao optar pelo léxico “mulher”, em vez de leoa, bem como estabelecer
uma propriedade
de detentor da utilização da palavra, marcada na fábula por “lhe dissera poucas e
boas”, subentende-se que
se está remetendo não só a uma produção fi ccional, mas também a situações
presentes no contexto social
da época de produção do corpus. O léxico “mulher” e o verbo “dissera” aparecem no
texto como marcas
de isotopia, depreendida em Análise do Discurso, segundo Fiorin (2005, p.112 –
113), como “a recorrência
de um dado traço semântico ao longo do texto”. A isotopia, nesse sentido, possibilita
um outro plano de
leitura. Isso faz com que a fábula em questão adquira a propriedade de ser lida não
apenas em seu plano
FTC EaD | LETRAS46
alegórico, e, sim, de estabelecer a possibilidade, a partir das marcas isotópicas, de
ver na fábula uma história
de “homens” e, por conseguinte, da sociedade.

Nessa disposição, já no primeiro período da fábula, é possível reconhecer a


presença da realidade social
da época em destaque. Assim, o leão fi gura como o homem, mais precisamente
como o “chefe da casa”,
ocupando seu lugar historicamente marcado pelo posicionamento ideológico
machista. Nesse momento, o
Brasil passa por uma fase de mudanças, marcada pela eclosão de vários
posicionamentos ideológicos. Um
deles foi o movimento feminista, que busca estabelecer a autonomia da mulher, a
igualdade de direitos. Ao
considerar no texto a idéia de que o homem “tinha acabado de brigar com a mulher
e esta lhe dissera poucas
e boas”, aciona-se a posição do E6, representado pela mulher que, afetada pelo refl
exo de uma ideologia
feminista, busca afi rmar-se como sujeito integrante da sociedade, que não quer
mais ocupar o lugar em que
se encontra, e assim se apresenta com disposição para “brigar”, lançar-se ao
embate, reivindicar seu espaço
social, afirmar seu direito de posicionar-se ideologicamente, sem submissão.

Quando o leão, através de um discurso direto, grita: “Miserável criatura, estúpida, ínfi
ma, vil, torpe:
não conheço na criação nada mais insignifi cante e nojento. Vou te deixar com vida
apenas para que você
possa sofrer toda a humilhação do que lhe disse, você, desgraçado, inferior,
mesquinho, rato!”, passa a ser
desmantelado mais um símbolo que o caracterizava: o símbolo de justiça a que se
assimilara em palácios
soberanos, visto que o rato não lhe tivera feito mal algum. Além disso, presentifi ca-
se o L1, já que, para
Ducrot (1987, p. 182), o locutor é “um ser que é, no próprio sentido do enunciado,
apresentado como seu
responsável, ou seja, como alguém a quem se deve imputar a responsabilidade
deste enunciado”. Através
dos verbos “conheço”, “vou” e “disse”, apresentados em 1ª pessoa do singular,
constata-se a presença
do pronome elíptico “eu”, que revela L1 não apenas como “locutor enquanto tal”,
mas também como
ser do mundo, representado por .. A esse respeito, Ducrot (1987, p. 188) salienta:
“de um modo geral o
ser que o pronome eu designa é sempre ., mesmo se a identidade deste . só fosse
acessível através de seu
aparecimento como L”. Dessa forma, confi guram-se divididas duas instâncias
LINGUÍSTICAs estabelecidas
na enunciação: L1 e ..

O emprego do discurso direto é, portanto, um procedimento que permite a L colocar


em seu enunciado
(discurso citante) a “fala” da personagem – leão – que se apresenta como locutor
(L1) do discurso citado. Tal
emprego “simula restituir as falas citadas e se caracteriza pelo fato de dissociar
claramente as duas situações de
enunciação: a do discurso citante e a do discurso citado” (MAINGUENEAU, 2002 p.
140).

A atitude do leão remete à teoria de Althusser ([1985] 2003) acerca dos Aparelhos
Repressores de
Estado, vez que o leão age preponderantemente através da violência física (mesmo
sem descartar a existência,
em um menor grau, da ideologia), ao pisar a cauda, impedindo que o rato possa
fugir, bem como
mediante a violência verbal, que se apresenta por meio de insultos e ofensas
destinadas ao rato. Apesar
disso, os valores, mesmo por meio de estruturas repressivas, são levados mediante
a ideologia. Tratando

o cenário fabular como a representação alegórica da sociedade, torna-se mais


evidente a estratégia que se
coloca como meio de garantir a sustentação da estrutura social vigente a partir de
meios repressivos. A
esse respeito, Althusser ([1985] 2003, p.70) frisa o seguinte:
O aparelho (repressivo) do Estado funciona predominantemente através da
repressão (inclusive a
física) e secundariamente através da ideologia. (Não existe aparelho unicamente
repressivo). Exemplos:

o Exército e a Polícia funcionam também através de ideologia, tanto para garantir


sua própria coesão e
reprodução, como para divulgar os “valores” por eles propostos.
Depois que o leão o soltou, no decorrer da fábula, a atitude do rato de correr “o mais
que pôde”
reafirma o temor do rato em relação ao leão, corrobora a posição de supremacia do
capitalismo no cenário
social. O operador argumentativo “mas” tem a propriedade de estabelecer uma
oposição, uma adversidade,
um contraste com a idéia anterior. Ao se colocar na fábula o fragmento “mas,
quando já estava a salvo, o rato
gritou pro leão”, tem-se a impressão que o rato, mediante a presença do operador
argumentativo “mas”, em
oposição à sua reação anterior, que foi a de correr “o mais que pôde”, aproveitaria a
oportunidade, já que
“estava a salvo” e, portanto, momentaneamente protegido de qualquer represália,
para reagir aos insultos do

LINGUÍSTICA Textual 47
leão. Porém, em uma primeira análise, isso não ocorre. Nesse sentido,
surpreendentemente o rato diz: “Será
que Vossa Excelência poderia escrever isso para mim? Vou me encontrar agora
mesmo com uma lesma que
eu conheço e quero repetir isso pra ela com as mesmas palavras!”

O que se evidencia no trecho anterior, em relação à polifonia, é mais uma divisão na


enunciação em duas
instâncias LINGUÍSTICAs: o L2 – o rato –, mobilizado mediante o discurso direto,
como ser do discurso, responsável
pelo ato da enunciação, e o ., estabelecido como ser no mundo a partir do pronome
oblíquo tônico de 1ª pessoa
“mim”, bem como pelo pronome reto “eu”, marcado no enunciado. Mais uma vez
confi gura-se na fábula a presença
do discurso citado, dissociando as situações de enunciação, visto que se tem dessa
vez o L2.

Porém, ao considerar o posicionamento do rato, não como um pedido primordial


para a sua necessidade
de se auto-afi rmar perante um ser hierarquicamente inferior a ele, mas como uma
forma de
escárnio voltado ao leão, modifi ca-se o desenvolvimento polifônico assimilado ao
referido trecho. Há o
estabelecimento, nessa ótica, da divisão do sujeito na teoria polifônica de Ducrot em
duas instâncias LINGUÍSTICAs:
um locutor . e o locutor L2, a exemplo da primeira análise. Porém, o L2 mobiliza um
enuncia-
dor, o E7, com o qual não se assimila. Tal posição de sujeitos se dá, vez que, nessa
segunda possibilidade
de leitura, ao levar em consideração a posição de onde fala o autor da fábula e de
sua característica irônica,
o trecho ganha um caráter não mais de pedido, e sim de deboche, de ironia. Quanto
à posição dos sujeitos
da polifonia, Ducrot (1987, p.198) explica:
Falar de modo irônico é, para o locutor L, apresentar a enunciação como
expressando a posição de
um enunciador. Posição de que se sabe por outro lado que o locutor L não assume a
responsabilidade, e,
mais que isso, que ele a considera absurda. Mesmo sendo dado como o
responsável pela enunciação, L
não é assimilado a E, origem do ponto de vista expresso na enunciação.

A “tirada” do rato é feita, nesse sentido, não como uma colocação sincera, mas
surge na forma
irônica. Por isso, o pedido expresso na verdade é de cunho absurdo para ele, já que
não pretende obter
resposta alguma do leão. Por “querer” que o leão repita a ofensa “com as mesmas
palavras” no intuito de
que possa dizer as mesmas coisas à lesma, a qual, para o rato, se apresenta como
ser mais insignifi cante
que ele próprio, o “mais menos”, gera um efeito de sentido que indica o não
afetamento moral do rato
pelas ofensas do leão, ser “superior”, que não consegue fazer com que um outro,
insignifi cante, se sinta
em sua condição de rebaixamento moral. O rato salienta que há um posicionamento
inferior ao dele, no
entanto não se sente afetado pelo leão, o que põe em dúvida uma possível
onipotência, vez que, em se
tratando do “rei dos animais”, o local soberano em que se encontra deveria lhe
instituir a centralização
do poder, o que, diante da posição irônica do rato, não ocorre.

A moral da fábula “Afinal ninguém é tão inferior assim” e a submoral “Nem tão
superior, por falar nisso”
são de responsabilidade do locutor L, o qual se assimila à voz dos contadores de
histórias e que, para tanto, se apresenta
a partir da perspectiva da voz genérica. Nesse sentido, na moral e na submoral são
resgatados L e o ponto
de vista a que L se assimila: o E0. Além disso, os referidos fragmentos resgatam a
idéia de poder desenvolvida
durante a análise, que marca a luta da mulher, a qual ganha maior relevo com o
posicionamento do ideal feminista
e o poder das classes dominantes, desenvolvido a partir de um movimento
capitalista de produção intensifi cada
e de exploração do trabalho, o que na década de 50 caracterizou a sociedade
moderna. Apesar de se ter um valor
hierárquico presentifi cado na fábula, o qual, mesmo corroído pelas estruturas
ideológicas que tendem a combater

o processo de assujeitamento desenvolvido pela ideologia dominante, não se


desmantela, não passa a ocupar um
lugar social inferior ao que se situa, não há centralização do poder. A partir do
momento em que uma luta de
classes, uma estrutura ideológica é colocada em embate, cristaliza-se a concepção
de que em todos os locais de
conflito existe a presença do poder.
(MADUREIRA, André Luiz Gaspari).

Bem, agora que já vimos alguns pontos básicos da polifonia, vamos tentar aplicá-los
e realizar outras
façanhas em nossa atividade. Se você sentir difi culdade em algum momento, não
desista. Lembre-se
de que uma forma de aprender é analisando nossos erros e tentando superar
nossos limites. Não esqueça
de seu espírito de águia, tá?! Mãos à obra!

FTC EaD | LETRAS48


Atividade Complementar Atividade Complementar
Tentar e falhar é, pelo menos, aprender. Não chegar a tentar é sofrer a inestimável
perda do que
poderia ter sido.

Geraldo Eustáquio

Leia o texto a seguir:

Os urubus e sabiás

Tudo aconteceu numa terra distante, no tempo em que os bichos falavam... Os


urubus, aves por
natureza becadas, mas sem grandes dotes para o canto, decidiram que, mesmo
contra a natureza, eles
haveriam de se tornar grandes cantores. E para isto fundaram escolas e importaram
professores, gargarejaram
dó-ré-mi-fá, mandaram imprimir diplomas, e fi zeram competições entre si, para ver
quais deles
seriam os mais importantes e teriam a permissão de mandar nos outros.

Foi assim que eles organizaram concursos e se deram nomes pomposos, e o sonho
de cada um urubuzinho,
instrutor em início de carreira, era se tornar um respeitável urubu titular, a quem
todos chamavam
por Vossa Excelência. Tudo ia muito bem até que a doce tranqüilidade da hierarquia
dos urubus foi
estremecida. A fl oresta foi invadida por bandos de pintassilgos tagarelas, que
brincavam com os canários
e faziam serenatas com os sabiás... Os velhos urubus entortaram o bico, o rancor
encrespou a testa, e eles
convocaram pintassilgos, sabiás e canários para um inquérito.
“-Onde estão os documentos dos seus concursos?” E as pobres aves se olharam
perplexas, porque nunca
haviam imaginado que tais coisas houvesse. Não haviam passado por escolas de
canto, porque o canto nascera
com elas. E nunca apresentaram um diploma para provar que sabiam cantar, mas
cantavam, simplesmente...

-Não, assim não pode ser. Cantar sem a titulação devida é um desrespeito à ordem.

E os urubus, em uníssono, expulsaram da floresta os passarinhos que cantavam


sem alvarás...

MORAL: Em terra de urubus diplomados não se ouve canto de sabiá.

Rubem Alves

Esse texto é bem bacana, muito prazeroso de se ler. Agora, depois do prazer da
leitura vamos pôr
a mão na massa.

1. Retire do texto de Rubem Alves alguns elementos de coesão e apresente suas


devidas
classificações.
LINGUÍSTICA Textual 49
2. Dos mecanismos de coerência estudados, apresente quatro deles e ilustre sua
conceituação com
exemplos próprios.
Agora lá vai mais uma fábula bem interessante:

O renascer dos belos sentimentos, uma vez satisfeitas as necessidades básicas.1

Esta pungente história se passou no meio de uma selva, nas areias de um deserto,
num velho navio abandonado
e sem rumo, em qualquer lugar em que há difi culdades de alimentação e o homem
começa a sentir a antropo
ou qualquer outra fagia a lhe espicaçar o estômago.

Pois, sozinho e sem se alimentar há vários dias, o homem vinha caminhando no


vasto areal (ou selva, ou
etc...), seguido apenas de seu fi el cachorro. Lá para as tantas lhe deu, porém, o
espicaçar acima enunciado, a fome
bateu-lhe às portas da barriga: “pan, pan, pan, ó de casa!” Já batera antes, mas o
homem tinha fi ngido que não
ouvia. Naquele momento, porém, não resistiu mais e atendeu à fome. Matou o
cachorrinho, única coisa comível
num raio de quilômetros. Matou-o, assou-o num fogo improvisado, e comeu-o, todo,
todo, com uma fome canina
(perdão!). Quando tinha acabado de comer o animal, sentou-se, plenamente
satisfeito. E foi então que olhou em
torno e começou a chorar: “Ai, ai, ai”, - soluçou – “pobre do Luluzinho! Como ele
adoraria roer esses ossos!”

MORAL: QUANDO EU TIVER UMA CASA CONFORTÁVEL, ESCREVEREI UM


TRATADO
DE SOCIOLOGIA.
1. “Para se exercer as virtudes do espírito é necessário um mínimo de conforto
material.” (Santo
Agostinho) (Fernandes, 1963, p. 67).
3. Estão lembrados da teoria polifônica de Ducrot? Vocês se lembram também do
exemplo em
que foi aplicada a polifonia? Pois bem. Agora é a sua vez. Analise a fábula de Millôr
Fernandes e procure
evidenciar a sobreposição de vozes. Para isso, evidencie no decorrer do texto
fabular as posições de locutores,
bem como as de enunciadores, como foi feito no exemplo dado.
FTC EaD | LETRAS50
4. Atente no texto abaixo e, a partir daí, trate da questão da relação entre a
coerência textual e coesão.
Brasil do B
BRASÍLIA – Brasil bacharel. Biografia bordada, brilhante. Bom berço. Bambambã.
Bico bacana, boquirroto.
Bastante blábláblá. Baita barulho. Bobagem, besteira, blefe. Batente banho-maria.
Bússola biruta. Baqueta bêbada.

Brasil biafra. Breu. Barbárie boçal. Barraco barrento. Barata. Bacilo. Bactéria. Bebê
buchudo, borocoxô.
Bolso banido. Boca banguela. Barriga baldia. Barbeiragem. Bastaria bóia, baião-de-
dois.

Brasil Bélgica. Brancura. Black-tie. Badalação brega. Boa brisa. Bens. Banquetes.
Brindes. Brilho besta.
Bonança bifocal. BMW: blindagem. Bolsa balofa: babau, baby.

Brasil bordel. Bancadas bandoleiras, buscando boquinhas, brechas, benesses.


Bruna, biombo, bastidor
barato. Balcão. Barganha. Bazar. Banda bandida. Bando bandalho. Baiano.
Barbalho. Brisa besta. Bagunça.

Brasil benemerente. Bonança, Brasília bondosa. Banqueiro bajulado, benefi ciado,


bafejado. Bancarrota
brecada. Balancete burlado. Bem-bom. Boca-livre. Brioche, bom-bocado. Bilheteria,
borderô.

Brasil baixada. Borrasca. Barro. Buraqueira. Boteco. Bagulho. Birita. Bílis.


Bochincho, bebedeira. Bofete. Bordoada.
Berro. Bololô. Bafafá. Bazuca. Baioneta. Bala. Bangue-bangue. Blitz. Bloqueio.
Boletim. Bíblia. Bispo. Beato. Benzedeira.
Brasil benfazejo. Boleiro. Bate-bola. Bossa. Balangandã. Balacobaco. Boêmia.
Barzinho. Bumbo. Batuca

da. Balance. Bole-bole. Beleza beiçola. Beldade. Biquíni. Bumbum buliçoso.


Boazuda. Beijo. Beliscão.
Balada boba, burlesca, basta.
Josias de Souza. Folha de São Paulo, 15 de junho de 2000.

5. Agora, escolha um parágrafo do texto “Brasil do B”, reescrevendo-o e imprimindo-


lhe a coesão textual.
Não se esqueça de que não deve faltar em seu parágrafo nenhuma palavra do
parágrafo escolhido, ok?!
LINGUÍSTICA Textual 51
A LÍNGUA ESCRITA E A LÍNGUA
FALADA

PENSANDO A ORALIDADE E O LETRAMENTO

Quando falamos em oralidade, o que logo vem à mente? E no caso do letramento?


É, não é difícil
associar a oralidade à fala e o letramento a escrita. E isso não vem de hoje. Essas
características remontam
de tempos, mas continuam sendo vistas por muitas pessoas a partir de seus
significados de lá atrás.

O objetivo desse nosso estudo sobre a oralidade e o letramento é o de esclarecer


alguns pontos que
os caracterizam hoje em dia, inserindo-os, para isso, em um contexto social. Mas
para isso é necessário que
lembremos como eram pensados anteriormente, o que vamos começar a fazer a
partir de já, ok?!

O letramento

Durante muito tempo, chamou-se aquele indivíduo que sabia ler e escrever de
LETRADO. Bem,
se tomarmos essa caracterização como parâmetro, chegaremos à conclusão de que
os analfabetos, as
pessoas que não sabem ler, são denominadas de ILETRADAS.

Diante disso, ao pensarmos na forma com que as pessoas viam (e muitas ainda
vêem) essa questão,

teremos a diferenciação abaixo:


Assim, pode-se ver que a relação estabelecida na diferenciação acima gira em torno
da escrita. Se
uma pessoa não tem o domínio da escrita, ela é taxada de iletrada. Mas, se
dissermos o seguinte:

O letramento não equivale à aquisição da escrita

Aí as coisas começam a fi car um pouco complicadas, não é? E agora, como


caracterizar o letramento?
Vamos mais adiante. Dessa vez, preste atenção na afi rmação abaixo:

Os analfabetos também estão inseridos no processo de letramento.

Embolou tudo aí dentro de sua cabeça? Não se afl ija! Vamos ajeitar tudo agora.
Primeiro, vamos
ver o que Marcuschi nos diz sobre o letramento:

“O letramento (...) envolve as mais diversas práticas da escrita (nas suas variadas
formas) na sociedade e pode ir desde uma apropriação mínima da escrita,
tal como o indivíduo que é analfabeto, mas letrado na medida em que identifi ca

o valor do dinheiro, identifi ca o ônibus que deve tomar, consegue fazer cálculos
completos, sabe distinguir as mercadorias pelas marcas etc., mas não escreve
cartas
nem lê jornal regularmente, até uma apropriação profunda, como no caso do
indivíduo que desenvolve tratados de Filosofi a e Matemática ou escreve romances.
Letrado é o indivíduo que participa de forma significativa de eventos de letramento
e não apenas aquele que faz um uso formal da escrita”.
E agora, fi cou mais claro? É preciso, portanto, pensar o letramento como uma
prática social. É o letramento
que permite que as pessoas “leiam” o mundo à sua volta. Ora, quem não conhece
ou nunca ouviu falar

FTC EaD | LETRAS52


de uma pessoa que não tem o domínio da escrita, mas na hora de passar o troco ao
fazer uma compra nunca
é enganado? Ou mesmo alguém que trabalha vendendo variados tipos de produtos,
mas consegue lidar muito
bem com o dinheiro, calcular o troco e não se atrapalha com as marcas de produtos
similares.

Estar no processo de letramento é estar fazendo parte desse sistema de práticas


sociais, e não pura
e simplesmente a aquisição da escrita. É claro que a escrita também faz parte desse
processo, mas o letramento
vai mais além que isso.

E não podemos pensar o letramento como um só. Sabemos que existem várias
práticas sociais.
Então temos letramentoS, no plural. Nesse sentido, Marcuschi salienta que “o
letramento é um processo
de aprendizagem social e histórica da leitura e da escrita em contextos informais e
para usos utilitários,
por isso é um conjunto de práticas, ou seja, letramentos”.

Bem, já vimos como vem sendo pensado o letramento hoje em dia. Agora,
passemos para a oralidade.

A oralidade

É certo que, em um primeiro momento, a oralidade nos remete à idéia de língua


falada. Se nos
restringirmos a isso, poderemos chegar à seguinte situação:

Ao pensarmos da forma apresentada acima, estaremos estabelecendo uma


dicotomia entre a oralidade
e o letramento. Porém, é mais conveniente visualizarmos tanto a oralidade quanto o
letramento
como elementos intrinsecamente ligados.

Quando nos perguntamos o que vem a ser a escrita, não raro vem à mente a
seguinte resposta:

A escrita é a representação da fala.

No entanto, não podemos aceitar que a fala seja a mera representação da


escrita. Em primeiro lugar, a escrita não consegue representar alguns fenômenos
próprios da oralidade, como os gestos, as entonações, os movimentos corporais
entre, outros. Quanto a uma provável dicotomia, Marcuschi salienta:

“Oralidade e escrita são práticas e usos da língua com características


próprias, mas não sufi cientemente opostas para caracterizar dois sistemas
lingüísticos
nem uma dicotomia”.

Ao observar a oralidade e o letramento como práticas sociais, o mais


importante é reconhecer sua natureza que envolve o uso da língua, tanto oral
como escrita. Mas será que se podem ser identifi cadas, hoje em dia, as carac

terísticas da língua e da fala de forma determinante?

Para responder à questão acima, vamos observar algumas características atribuídas


à fala e à língua.
Depois, tentaremos ver como tais características podem ser apresentadas em
diversos tipos de texto.

CARACTERÍSTICAS DA LÍNGUA ESCRITA


Ao longo do tempo, a escrita passou a ganhar uma signifi cativa importância. Muito
se falou que o
desenvolvimento de uma nação dependia da escrita. Uma tese já foi postulada a
esse respeito. A grande
virada cognitiva atribuía à presença da escrita o fato de muitas sociedades se
erguerem tecnologicamente,

LINGUÍSTICA Textual 53
bem como o da aquisição de um raciocínio formal.

Porém, essa tese não é mais considerada hoje em dia. Autores como Jack Goody e
Walter Ong já
deixaram de lado esse pensamento.

É claro que a escrita já faz parte do nosso dia-a-dia. Até mesmo um analfabeto está
exposto
a sua influência.

Assim, podemos constatar a presença da escrita, junto com a oralidade,


em diversos momentos de nossa vida. Em nosso trabalho, na família,
na escola, na igreja estamos nos utilizando da escrita e da oralidade,
estamos insertos em um ambiente de práticas sociais, participando dos
processos de letramento e de oralidade.

Se pararmos para pensar, para que serve a escrita e a leitura em


casa? Diante de tal pergunta, é possível citar diversos momentos em que essas se
fazem presentes, tais
como:

• Ao se elaborar uma lista de compras;


• Quando deixamos um recado pendurado na geladeira;
• No momento em que necessitamos do auxílio de uma receita para preparar alguma
comida;
• Nas horas de descanso, quando pegamos uma revista ou algo parecido para ler e
relaxar;
• Sempre que queremos nos informar através da leitura de um jornal ou de uma
revista;
• Quando precisamos efetuar um pagamento e, para isso, pegamos uma folha de
cheque para
preencher.
Já deu para perceber que, se formos listar, ocuparemos o resto do módulo. Assim,
pôde-se perceber
que tanto a escrita como a oralidade são imprescindíveis hoje em dia.

Quantas vezes você já viu alguém ser tratado com preconceito por conta da escrita?
Pois é! A
escrita, desde que foi criada, pouco mais de 3.000 anos antes de Cristo, veio
ganhando um status impressionante,
tornando-se até motivo de preconceito, principalmente em nossa sociedade.
Sempre temos
conhecimento de pessoas que sofreram preconceitos por não saberem escrever ou
por não utilizarem o
modelo padrão da escrita corretamente. Sem sombra de dúvida, muitos de nós até
já fizeram isso.

A importância da escrita tem se tornado algo tão notório que até mesmo
organizações que primam
pelo desenvolvimento de nações atestam a importância da alfabetização. É o caso
da UNESCO, que atribui
à falta de alfabetização a presença da pobreza, da doença, do atraso.

No entanto, os dados acerca do desenvolvimento não atestam a crença da


UNESCO. Nem sempre

o desenvolvimento está ligado à alfabetização.


Agora, vamos ver o que Marcuschi nos diz sobre a escrita:

“A escrita seria um modelo de produção textual-discursiva para fi ns comunicativos


com certas especificidades
materiais e se caracterizaria por sua constituição gráfica, embora envolva também
recursos
de ordem pictórica e outros (situa-se no plano dos letramentos). Pode manifestar-se,
do ponto de vista de
sua tecnologia, por unidades alfabéticas (escrita alfabética), ideograma (escrita
ideográfica) ou unidades
iconográfi cas, sendo que no geral não temos uma dessas escritas puras. Trata-se
de uma modalidade de
uso da língua complementar à fala.”

Perspectiva dicotômica

FTC EaD | LETRAS54


Em uma perspectiva dicotômica, de ordem normativa, Marcuschi nos apresenta um
quadro e nele
salienta diferenças a respeito da fala e da língua. Tal perspectiva não se preocupa
com os usos da língua
em textos e está presente em várias gramáticas escolares. Assim, leva à
visualização da leitura a partir do
ensinamento de regras gramaticais. Acompanhe com atenção o referido quadro e
observe o tratamento
formal e rígido:

Uma das características dessa visão dicotômica é a de considerar a fala como o


local do erro, do
caos. Também não leva em consideração questões dialógicas e discursivas.

Veremos um outro quadro, diferente da perspectiva dicotômica, e que também


apresenta alguns
problemas. Agora, vamos passar a estudar alguns aspectos da língua falada.

CARACTERÍSTICAS DA LÍNGUA FALADA

Anteriormente nós vimos que a escrita, em muitas sociedades, tornou-se


fundamental no dia-adia
do ser humano. Também foi e ainda é fonte de preconceito. Já a fala, em relação à
escrita, tem uma
primazia cronológica.

Repare que nós, antes de sermos seres que dominam a escrita, somos seres que
utilizam a oralidade.
Assim, a fala ganha um caráter natural. A escrita, nesse ponto de vista, é um fato
histórico, diferente da
fala, um bem natural.

A partir daí, não se deve dizer que a fala, por sua primazia cronológica e por ser um
bem natural,
seja mais importante que a escrita. Hoje em dia, a fala e a escrita andam de mãos
dadas.

Um pouco antes, vimos a concepção de Marcuschi a respeito da escrita. Agora


veremos como ele
caracteriza a fala. Perceba as peculiaridades de cada uma e compare os dois
conceitos:

“A fala seria uma forma de produção textual-discursiva para fi ns comunicativos


na modalidade oral (situa-se no plano da oralidade, portanto), sem a necessidade
de uma tecnologia além do aparato disponível pelo próprio ser humano. Caracteriza
-se pelo uso da língua na sua forma de sons sistematicamente articulados
e signifi cativos, bem como os aspectos prosódicos, envolvendo, ainda, uma série
de recursos expressivos de outra ordem, tal como a gestualidade, os movimentos
do corpo e a mímica”.

Ao tratarmos da escrita, foi possível visualizar um quadro de Marcuschi acerca da


perspectiva dicotômica.
Agora, vamos observar uma outra perspectiva que se tornou foco de atenção para
os estudos
da relação entre fala e escrita.

Perspectiva sociointeracional

Essa perspectiva leva em consideração a interação, a situação dialógica. No


entanto, peca ao não
contemplar a descrição e a explicação de fenômenos sintáticos e fonológicos.
Observe o quadro elabora-

LINGUÍSTICA Textual 55
do por Marcuschi a respeito dessa perspectiva:

(DESTACAR O QUADRO ABAIXO)

Fala e escrita apresentam

Dialogicidade
Usos estratégicos
Funções interacionais
Envolvimento
Negociação
Situacionalidade
Coerência
Dinamicidade

Nesse sentido, Marcuschi sugere que a perspectiva interacionista seja integrada aos
estudos da Análise da
Conversação etnográfi ca e da LINGUÍSTICA Textual, para que os estudos
apresentassem melhores resultados.

Diante disso, dá para perceber que nos estudos da fala e da escrita não há
consenso, muito menos
nos da oralidade e do letramento. Segundo Marcuschi, “as diferenças entre fala e
escrita se dão dentro de
um continuum tipológico das práticas sociais de produção textual e não na relação
dicotômica de dois
pólos opostos”.

Muitas vezes, ao tratar de gêneros textuais, percebemos que, em relação à fala e à


escrita, tais gêneros
se misturam. Além disso, muitos textos escritos podem apresentar mais aspectos
orais. Agora,
observe o quadro abaixo elaborado por Marcuschi:

Quando analisamos a língua em seus diversos meios de manifestação, levando em


consideração

o seu uso na sociedade, vemos que muitas vezes os aspectos da fala e da escrita
se misturam. Vejam, a
exemplo disso, o bate-papo na internet. Ele representa a língua falada ou a língua
escrita? Ou deveríamos
observar esse tipo de texto como um texto misto? Bem, muitas respostas para essas
questões estão sendo
propostas, principalmente a de ser um texto misto. Mas o que importa nesse
momento é que a língua,
tanto falada como escrita, passe a ser vista de outra forma, que não como um
sistema dicotômico, formal
e rígido. É preciso acompanhar os novos estudos acerca desses aspectos e
compreender como essas
questões estão sendo tratadas ultimamente.
Além disso, é importante vermos alguns aspectos da conversação. Preste bastante
atenção para esse
outro trabalho em textos conversacionais. Prontos? Então vamos nessa!

FTC EaD | LETRAS56


O TEXTO CONVERSACIONAL

Quando falamos em conversação, é natural pensarmos logo em


troca, em interação. Assim, podemos dizer que o texto conversacional
é construído por interlocutores que interagem frente a um tópico, a um
tipo de assunto que os guia durante esse processo interativo.

Apesar de estarem sendo conduzidos a partir de um tópico, é interessante


pensarmos que, ao tratarmos da língua falada, na fala tem-se uma característica
de processo não-planejado. As pessoas vão improvisando, criando
o texto naquele momento. Se compararmos com a escrita, veremos que
nessa situação é possível corrigir, apagar, riscar.

Nesse sentido, as marcas da correção não se fazem presentes,


ao contrário da língua falada, já que o que é dito não pode ser apagado. Acompanhe
comigo o poema de Olavo Bilac:

A um poeta

Longe do estéril turbilhão da rua,

Beneditino, escreve! No aconchego

Do claustro, na paciência e no sossego,Trabalha, e teima, e lima, e sofre, e sua!

Mas que na forma se disfarce o emprego

Do esforço; e a trama viva se construa

De tal modo que a imagem fi que nua


Rica mas sóbria, como um templo grego.

Não se mostre na fábrica o suplício

Do mestre. E, natural, o efeito agrade,

Sem lembrar os andaimes do edifício:

Porque a Beleza, gêmea da Verdade,

Arte pura, inimiga do artifício,

É a força e a graça na

simplicidade.

Além de ser uma das grandes obras da literatura, esse poema nos traz a idéia que
traçávamos: a

de que a língua escrita pode ser planejada. Compare-a, portanto, a um


edifício. Certamente não veremos os andaimes, e sim a obra pronta, o
prédio finalizado.

No texto conversacional, chamamos a fala de cada um dos interlocutores


de turno. Podemos perceber que na conversação normalmente
há excessivas trocas de turno, vez que a palavra é passada de um interlocutor
para o outro durante esse momento interativo.

Além dessa característica, se repararmos bem veremos que o texto conversacional


é constituído
principalmente dos seguintes elementos:

LINGUÍSTICA Textual 57
• Repetições
• Correções
• Hesitações
• Paráfrase
• Elipse
• Digressões
Quanto à repetição, Marcuschi já chegou a afi rmar que é uma característica típica
da fala. Além
disso, ele diz que a repetição é fenômeno que representa mais de 20% da fala.

Vamos observar agora uma parte de um texto conversacional retirado do NURC


(norma LINGUÍSTICA
urbana culta) de São Paulo. O texto gira em torno de uma conversa entre uma
jornalista (L1) e uma escritora
(L2) que se conhecem e têm um grau de parentesco: são primas. Elas são viúvas,
paulistanas e têm
60 anos. O diálogo foi acompanhado por uma documentadora, que introduz um tema
para ser debatido.
Por isso, não se trata de um diálogo espontâneo.

Agora, vamos ao texto:

Doc. Gostaríamos que dessem as suas opiniões a respeito de televisão...

L1 olha I. ...eu...como você sabe...uma pessoa um diretor lá da folha...certa feita me


chamou...e me
incumbiu de escrever sobre televisão...o que me parece é que na ocasião...quando
ele me incumbiu disso...ele
pensou...que ele iria...fi car em face de uma recusa...e que eu ia...esnoBAR (ri)..
agora vamos usar um termo...
que eu uso bastante que todo mundo usa muito...eu ia esnobar a televisão...como
todo intelectual realmente
esnoba...mas acontece...que eu já tinha visto durante muito tempo
televisão...porque::houve uma época na
minha vida que a literatura::me fazia prestar muita atenção...e eu queria era uma
fuga...então a minha fuga...
era me deitar na cama...ligar o::receptor e fi car vendo...fi car vendo...e::aí eu
comecei a prestar atenção naquela
tela pequena...vi...não só que já se fazia muita coisa boa e também muita coisa ruim
é claro...mas::vi também
todas as possibilidades...que aquele veículo... ensejava e que estavam ali laTENtes
para serem aproveitados...
agora voCÊ...foi dos tempos heróicos...da mencionada luta

L2 eu estava na Tupi trabalhando como::...funcionária da Tupi...da


rádio...Tupi...quando foi lança-
da a primeira (primeira) televisão...de modo que eu vi nascer propriamente a
a...televisão...

L1 vinte e cinco anos né?

L2 é( ) eu...eu vi nascer...eu estava lá...ah... todo momento né? E:::uma coisa eu


gostaria de::...lembrar
a você justamente a respeito da linguagem...é o seguinte que eu noto...que muito
paulista fi ca um
pouco chocado...com o linguajar carioca...com os esses e os erres do carioca...

L1 silabados...

L2 que eram justamente um dos...um dos defeitos muito grandes do rádio...daquele


tempo que
era...quando::um::...locutor ia fazer um teste...o::...o chefe dizia a ele...”diga aí os ef/
os esses e os erres”...
esse era o teste...

L1 é...
L2 para saber se ele tinha...ah::...boa dicção para falar em rádio...não é?...então ele
caprichava...é
isso que o Chico Anísio está...ah ah ah...caçoando...

L1 é...

L2 no programa dele...

L1 no programa dele

L2 do Chico Anísio...não é? Ele...ca/eh...eh...ele inSISte...DORme em cima dos


esses e dos erres né?

FTC EaD | LETRAS58


L1 dos erres...ahn

L2 e...mas eu noto que agora...sobretudo na nossa família que nós temos muita
preocupação...da
da linguagem simples e da linguagem::...correta

L1 exata

L2 é...exata...nós ficamos um pouco chocados com o esse e o erre exagerados dos


cariocas

L1 dos cariocas

L2 que são mesmo um preciosismo inútil né?

L1 é::e agora como o que domina o mercado é a Globo...e os estúdios da


Globo...estão no no Rio...
isso faz com que...até os paulistas que vão para o Rio...os artistas paulistas que
estão lá...

L2 adoram...

L1 eles começam a adoTAR...para não fi car diferente...e::uma vez::que::...nós


estamos aqui dando
um depoimento sobre esse aspecto da linGUAgem...eu já enfoquei na nas minhas
crônicas da Folha...a
pedra no caminho que é a:: a pronúncia tão diferente...e mesmo...a maneira de falar
as singularidades que
têm cada região...do país...e e e que...como isso constitui numa Pedra no caminho
quando é passado em
termos de arte cênica...e no caso da televisão uma vez que a televisão vai para o
Brasil inteiro não é?...ar/
as redes...das grandes emissoras cobrem o Brasil inteiro...então...vo/...não sei se
vocês acompanharam a
polêmica em torno de Gabriela...Gabriela...ah...jornais baianos::...não é?eh::fi
zeram...editoriais...a respeito
de Gabriela...indignados porque...é é que aquela baiaNIce que se falava...lá não era
absolutamente

L2 artifi cial

L1 a maneira...como o baiano falava...depois ao correr da novela...eu tenho a


impressão que eles
foram aparando essas arestas...mas a verdade é esta...é no no...por
exemplo...se...estão gravando agora
este...está passando agora em São Paulo O Grito não é? No Brasil todo aliás O
Grito de Jorge Andrade
que é um excelente autor um autor paulista...pois bem...uma grande atriz que é a
Maria Fernanda...faz
uma paulista de quatrocentos anos eXatamente com a linguagem que você
assinalou(...)

Bem, esse é um exemplo de texto conversacional. Nele você pode observar a


presença de vários
pontos apresentados, caracterizadores da referida tipologia textual.

Agora, vamos exercitar o que foi depreendido nesta parte do módulo?

Atividade Complementar
1. Diante do que estudamos, defina:
Oralidade
LINGUÍSTICA Textual 59
Letramento

2. Agora saliente a relação que existe entre a oralidade e o letramento.


3. Tendo como base o último texto apresentado, o texto conversacional, procure
identifi car nele
alguns aspectos presentes na conversação e ilustre com exemplos retirados do
referido texto.
FTC EaD | LETRAS60
Glossário
ANÁFORA: expressões de caráter coesivo que fazem referência a passagens já
ocorridas no texto.

CATÁFORA: elementos coesivos que têm por propriedade realizar a antecipação de


um determinado
elemento que surgirá no texto.

COERÊNCIA: é o que dá textura a uma seqüência LINGUÍSTICA, ou seja, o que faz


que um texto seja
um texto.

COESÃO: mecanismo que dá tessitura ao texto por meio de variados elementos,


como de oposição,
remissivos, catafóricos, anafóricos, elementos assinalizadores de relações de
sentidos entre
enunciados ou suas partes entre outros.

ENUNCIAÇÃO: na perspectiva de Ducrot, é o acontecimento histórico do enunciado,


acontecimento
que, para ele, se configura como uma aparição momentânea.

ENUNCIADO: segundo Ducrot, enunciado é um fragmento do discurso que se


apresenta no
domínio do observável.

ENUNCIADOR: é a fi gura da enunciação que representa a pessoa cujo ponto de


vista é apresentado.
É a perspectiva que o locutor constrói e de cujo ponto de vista narra, quer identifi
cando-se
com ele quer distanciando-se dele.
Brandão, 1997, p.90

ESCRITA: modelo de produção textual-discursiva para fi ns comunicativos com


certas especifi cidades
materiais e se caracterizaria por sua constituição gráfica, embora envolva também
recursos de
ordem pictórica e outros (situa-se no plano dos letramentos).

Marcuschi, 2005, p. 26

FORMALISMO: os estudos formalistas voltam-se para as questões relativas à língua


e sua forma,
aos princípios de sua organização. Nesse sentido, distancia-se da visão da
linguagem e de sua relação
com seu meio e/ou seu contexto.

FUNCIONALISMO: leva em consideração o estudo da linguagem e sua função,


estabelecendo um
vínculo entre a linguagem e os contextos histórico e de interação social.

FRASE: para Ducrot, a frase, diferentemente do enunciado, não se estabelece no


domínio do
observável, sendo um objeto teórico inventado pela gramática. Apesar de ser uma
construção do
lingüista, a frase permite dar conta dos enunciados.

LETRAMENTO: processo de aprendizagem social e histórica da leitura e da escrita


em contextos
informais e para usos utilitários, por isso é um conjunto de práticas, ou seja,
letramentos.

Marcuschi, 2005, p. 21.


LINGUÍSTICA TEXTUAL: estudo das operações LINGUÍSTICAs, cognitivas e
argumentativas reguladoras
e controladoras dos processos de produção, constituição, funcionamento e
compreensão
dos textos escritos ou orais.

Fávero, 2005, p.100

LOCUTOR: é uma função enunciativa que o sujeito falante exerce e através da qual
se apresenta
como eu no discurso. É o ser apresentado como responsável pelo dizer, mas não é
um ser no mundo,
pois trata-se de uma ficção discursiva.

Brandão, 1997, p.91

LINGUÍSTICA Textual 61
ORALIDADE: prática social interativa para fi ns comunicativos que se apresenta sob
variadas formas
ou gêneros textuais fundados na realidade sonora.

Marcuschi, 2005, p. 21.


PARÁFRASE: atividade de reformulação contribuidora para a coesão textual e que
se diferencia da
repetição principalmente pela criatividade.

POLIFONIA: termo cunhado inicialmente por Bakhtin para caracterizar a


possibilidade de ocor

rência de mais de uma “voz” em um texto.


REFERÊNCIA: função pela qual um signo se relaciona a um objeto extralingüístico,
podendo ser
endofórico ou textual e exofórico ou situacional.

Fávero, 2005, p. 13

REITERAÇÃO: caracteriza-se por se confi gurar como repetição de uma dada


expressão (ou de
expressões) no texto.
TEORIA POLIFÔNICA DA ENUNCIAÇÃO: teoria desenvolvida por O. Ducrot
(retomando o

termo “polifonia” de Bakhtin) que visa contestar a teoria da unicidade do sujeito.


FTC EaD | LETRAS62
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LINGUÍSTICA Textual 65
FTC - EaD

Faculdade de Tecnologia e Ciências - Educação a Distância

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