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Flávia Fairbanks Lima de Oliveira Marino

Aline Calixto

Neste capítulo, serão abordados os principais distúrbios


menstruais. Serão discutidos assuntos importantes,
como sangramento uterino anormal, sangramento ute-
rino disfuncional, hi perandrogenismo, síndrome dos
ovários policísticos e hiperprolactinemia. Será abordado
ainda, em cada distúrbio menstrual, o passo a passo
diagnóstico com quadro clínico, exames laboratoriais
e de imagem dos transtornos descritos. Isto permite a
diferenciação entre um distúrbio e outro, por meio de
exames de laboratório com dosagens de FSH/LH, corti-
sol, glicemia de jejum, TSH/T4 livre, prolactina e exames
de imagem, como ultrassonografia, tomografia compu-
tadorizada e ressonância magnética, a fim de afastar
causas tumorais. Os assuntos tratados no capítulo são
Transtornos
de grande importância na prática médica, abordados
em muitas questões de Ginecologia das provas de con-
cursos médicos.
menstruais
134 SIC GINECOLOGIA HEDCEL

1. Introdução
Transtornos menstruais, como a hemorragia uterina disfuncional, o hi-
perandrogenismo, a Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP) e a hiper-
prolactinemia, constituem causas frequentes de procura aos serviços
de Ginecologia. Para o seu total entendimento, apresentaremos os con-
ceitos de normalidade do ciclo menstrual e os seus respectivos desvios.

Tabela 1 - Conceitos de normalidade da menstruação

Média de 28 dias (de 21 a 35 dias); para algumas lite-


Duração do ciclo
raturas, de 24 a 38 dias

4 a 8 dias; >8 dias, considerado prolongado; <4 dias,


Duração do fluxo
reduzido

Volume de san-
gramento a cada 5 a 80mL
menstruação

Tabela 2 - Nomenclatura dos distúrbios menstruais

Hipomenorreia Diminuição da duração (<2 dias)

Hipermenorreia Aumento da duração (>8 dias) ou perda sanguínea >80mL

Ciclos muito curtos, intervalo muito pequeno entre uma


Polimenorreia
menstruação e outra (<21 dias); na literatura, <24 dias

Ciclos muito longos, intervalo muito longo entre uma


Oligomenorreia
menstruação e outra (>35 dias)

Aumento da quantidade (volume) menstrual ou


aumento da duração (>8 dias - observar que o
conceito de menorragia engloba o conceito de
hipermenorreia. A distinção entre menorragia e hiper-
Menorragia menorreia é controversa na literatura; alguns autores
colocam o conceito de menorragia como mais amplo
- aumento do volume menstrual ou do tempo de
duração -, enquanto outros consideram que menorra-
gia e hipermenorreia são sinônimos)

Sangramento volumoso fora do período habitual da


Metrorragia
menstruação

Menostase Suspensão brusca do ciclo (condição rara)

2. Sangramento uterino anormal


Todo e qualquer tipo de alteração do padrão usual do ciclo menstrual
recebe o nome de Sangramento Uterino Anormal (SUA). Cada trans-
torno recebe uma classificação semiológica, de acordo com o tipo de
alteração. As alterações da ciclicidade e do tempo de sangramento são
definidas na anamnese de acordo com o relato da paciente. As alte-
rações de fluxo são mais bem qualificadas pelo número de absorven-
tes trocados diariamente. Apesar de cada alteração representar uma
variação de padrão, existem algumas divergências de acordo com a
bibliografia científica utilizada pela instituição que elabora a prova. To-
davia, essas diferenças são conceituais, e a grande maioria das ques-
tões não se fixa nesses detalhes, visto que o intuito é entender qual é
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padrão de ciclo menstrual que o termo semiológico representa. A Fi-


gura 1 demonstra as principais alterações relevantes para a resolução Pergunta
das questões.
2012 - HC-ICC
Amenorreia
Ausência de menstruação por 6
1. A melhor definição para irre-
meses ou por 3 ciclos gularidades menstruais em que
Metrorragia
consecutivos do padrão usual sangramento acontece em pe-
da paciente Sangramento volumoso fora
do período em que a ríodos regulares e de quantidade
Oligomenorreia paciente deveria ficar diminuída é a:
Ciclos longos (mais de menstruada
35 dias de duração)
Me norragia
oligomenorreia
Aumento da quantidade (volume) menorragia
Polimenorreia
Sangramento menstrual e/ou aumento da menometrorragia
Ciclos curtos (menos de 4
uterino anormal duração (>8 dias). Observe que o
21 dias de duração)
conceito de menorragia engloba o
hipomenorreia
conceito de hipermenorreia. metrorragia
Resposta no final do capítulo
H ipermenorreia Hipomenorreia
Aumento da duração da Diminuição da duração da
menstruação (>8 dias) menstruação (<2 dias)

Figura 1 - Termos semiológicos que classificam os tipos de sangramento uterino


anormal

Como já foi comentado, existem pequenas diferenças na literatura


quanto a alguns números, mas o padrão patológico da alteração é o
mesmo. Por exemplo, alguns autores consideram a polimenorreia como
sendo ciclos curtos, com menos de 24 dias de duração, mas a maioria
dos autores a considera como ciclos menores de 21 dias. Apesar de os
números divergirem, a ideia central é a de ciclos curtos, o que real-
mente importa para a resolução das questões das provas.
A maioria dos autores considera a hipermenorreia como aumento no
tempo de sangramento, enquanto outros também aplicam o termo
para o aumento no fluxo menstrual. Esses autores, que atribuem à
hipermenorreia um conceito mais amplo, definem que ela seria um
sinônimo da menorragia. Entretanto, a ideia central do conceito se-
miológico é o mesmo: aumento do sangramento (em fluxo ou tempo)
no período usual de menstruação da paciente. Se o sangramento
ocorrer fora do período usual de sangramento da paciente, o termo
correto será "metrorragia". Já nos casos em que a paciente relatar
aumento do tempo de menstruação e/ou do fluxo e, também, san-
gramentos fora do período usual de menstruação, atribui-se o termo
"menometrorragia".
A etiopatogenia do SUA varia muito, de acordo com a faixa etária da
paciente. De modo geral, observamos:
- Infância: o SUA à menarca é anormal. Nessa faixa etária, a vagina é
a principal fonte de sangramento, e não o útero. As vulvovaginites
são as causas mais frequentes de sangramento genital. Podem-se,
ainda, considerar condições dermatológicas, crescimento neoplásico,
trauma por acidente, abuso sexual e corpo estranho;
Adolescência: o SUA resulta de anovulação ou defeitos na coagulação
sanguínea. Gestação, Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs) e
abuso sexual devem ser avaliados;
Idade reprodutiva: há aumento na taxa de sangramento uterino dis-
funcional por gravidez e DSTs, assim como leiomiomatose e pólipos
endometriais;
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- Perimenopausa: geralmente, o sangramento uterino disfuncional


nessa fase é causado por ciclos anovulatórios, porém é preciso avaliar
a possibilidade de neoplasias benignas e malignas;
- Menopausa: a maioria dos casos de sangramento é atrofia do en-
dométrio e vagina por ausência de estrogênio. Entretanto, pode ser
decorrente de pólipos endometriais, carcinoma endometrial (mais
frequente nessa faixa etária), tumor ovariano produtor de estrogênio
e neoplasias ulcerativas vulvar, vaginal e cervical;

Tabela 3 - Principais doenças associadas ao sangramento uterino anormal

- Gravidez;

- Hiperplasia endometrial;

- Pólipos endometriais;

- Pólipos endocervicais;

Miomatose uterina;

- Adenomiose;

- Endometrite crônica;

- Malformações arteriovenosas;

- Dispositivo intrauterino (DIU);

- Contracepção hormonal,

- Doença renal e hepática;

Coagulopatias;

- Doença tireoidiana;

Sangramento uterino disfuncional (quando as causas citadas são desca


tadas).

Gravidez: sangramento anormal no início da gestação é encontrado


em 15 a 20% das gestações. Na maioria das vezes, não há identificação
de qualquer problema associado. Entretanto, deve-se estar atento às
possibilidades de abortamento, gestação ectópica, mola hidatiforme,
eversão do colo uterino ou pólipos;
Hiperplasia endometrial: resulta da estimulação estrogênica crônica
do endométrio sem a oposição da progesterona. Portanto, é comum
em ciclos anovulatórios crônicos. Pode ser simples ou complexa; com
ou sem atipias. O diagnóstico pode ser realizado por ultrassonogra-
fia (USG) transvaginal com espessamento endometrial ou histeros-
copia. A biópsia de endométrio pode ser realizada por curetagem ou
histeroscopia:
Hiperplasia simples: glândulas dilatadas sem ramificações, ou rami-
ficações ocasionais;
Hiperplasia complexa: glândulas endometriais mais próximas entre
si, com menos estroma interposto, com ramificações; suas células
podem ou não exibir mitoses;
Lesões sem atipia: formas excessivas de endométrio proliferativo;
regridem espontaneamente, após curetagem ou uso de progestogê-
nios. Há baixo risco de progressão para adenocarcinoma (de 1 a 3%).
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Independentemente de serem simples ou complexas, o tratamento


consiste em progestogênios - acetato de medroxiprogesterona 5 ou
10mg/d por 14 dias por mês por 3 a 6 meses ou noretindrona 5mg
no mesmo esquema. Uma opção é o DIU com liberação de levonor-
gestrel (Mirena0);
Lesões atípicas: geralmente não regridem espontaneamente e
podem ser bastante resistentes a curetagens repetidas ou aos
progestogênios. Oferecem elevado risco de progressão para adeno-
carcinoma (de 10 a 30%), sendo consideradas lesões pré-malignas.
O tratamento preferencial é a histerectomia. Nas mulheres que de-
sejam manter a fertilidade, pode-se tentar progestogênio em altas
doses - acetato de megestrol 80mg, 2x/d, por 6 a 9 meses, e com
biópsias sequenciais de endométrio para monitorizar a resposta
ao tratamento. Pode-se tentar a inserção do DIU com a liberação
de levonorgestrel (Mirena0). A recorrência é comum, e as pacien-
tes que não respondem bem ao tratamento clínico têm indicação de
histerectomia.
Pólipos endometriais: podem causar SUA devido a fragilidade vas-
cular, inflamação crônica e erosões na superfície. São diagnosticados
por USG transvaginal, histerossonografia, histeroscopia. A histeros-
copia cirúrgica fornece tratamento simples e altamente efetivo. Fa-
tores de risco são idade avançada, obesidade e uso de tamoxifeno.
Na maioria das vezes, os pólipos são benignos, mas há transformação
pré-maligna ou maligna em 4 a 5% dos casos. Assim, recomenda-se a
polipectomia histeroscópica às pacientes:
Sintomáticas;
Assintomáticas com fator de risco para transformação maligna,
sendo eles:
Pós-menopausa;
* >60 anos;
Pólipo 1,5crri;
Uso de tamoxifeno.
tamoxifeno é um modulador seletivo do receptor de estrogênio, uti-
lizado para tratamento de câncer de mama, visto que reduz a ação do
estrogênio no tecido mamário, mas estimula a proliferação endome-
trial, causando hiperplasia endometrial, pólipos endometriais, carci-
noma endometrial e sarcoma uterino;
Pólipos endocervicais: também denominados de pólipos cervicais,
são, geralmente, diagnosticados no exame especular. São assintomá-
ticos, mas podem causar hemorragia, sangramento pós-coito e leu-
correia vaginal sintomática. São, em sua maioria, benignos, e podem
malignizar em menos de 1% dos casos. Entretanto, o câncer de colo de
útero pode se apresentar na forma de massa polipoide, assim pode
haver confusão entre ambos. Por isso, faz-se a retirada do pólipo
cervical (pinça fórceps "em anel" ou extratora de pólipos - o pólipo é
pinçado e torcido junto à sua base para estrangular seus vasos supe-
riores) no consultório seguida da avaliação histológica do material. A
recorrência está entre 6 e 15%;
Miomatose uterina (leiomioma uterino): é extremamente comum, e
SUA é a sua principal manifestação clínica. Entretanto, a maioria
das pacientes com miomatose uterina não apresenta SUA. Assim, os
miomas não podem ser considerados a causa de sangramento anor-
mal antes que outras possibilidades tenham sido excluídas, espe-
cialmente quando não invadem ou deslocam a cavidade uterina. Os
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que causam SUA são aqueles com componente submucoso, miomas


submucosos e intramurais grandes que distendem o endométrio ad-
jacente. Não é qualquer mioma que provoca sangramento; a com-
pressão inferior e o trauma pela fricção intracavitária na superfície
epitelial causam inflamação crônica focal ou ulceração, resultando
em sangramento. Pode, ainda, haver erosão e ruptura de vasos su-
perficiais. O diagnóstico é feito por USG transvaginal (tamanho, nú-
mero e localização dos miomas) e histerossonografia. O tratamento
é composto de contraceptivos combinados que reduzem o volume e
a duração do sangramento, embora sejam menos efetivos em mio-
mas submucosos. Anti-Inflamatórios Não Esteroides (AINEs) podem
participar do tratamento, enquanto os agonistas de GnRH formam
outra linha terapêutica. Tratamentos cirúrgicos são geralmente re-
servados para sintomáticos:
Miomas submucosos únicos: miomectomia histeroscópica. Preser-
vam a fertilidade;
Miomas submucosos múltiplos e grandes: miomectomia histeroscó-
pica. Requerem maior experiência técnica e podem evoluir com siné-
guias intrauterinas que causem infertilidade;
Miomatose intramural: miomectomia histeroscópica subtotal, mio-
mectomia abdominal ou histerectomia. São indicações de histerec-
tomia: SUA, miomas grandes e múltiplos e ausência de interesse em
gravidez.
- Adenomiose: observa-se infiltração das glândulas e estroma endo-
metriais no miométrio. Algumas mulheres desenvolvem lesões nodu-
lares focais, que correspondem a proliferação miometrial excessiva
em torno de focos do endométrio ectópico - adenomiomas. A do-
ença pode desenvolver-se a partir da invaginação endomiometrial
do endométrio ou se desenvolver de restos müllerianos. Quanto ao
diagnóstico, a USG transvaginal apresenta cistos miometriais. A res-
sonância magnética de pelve, por sua vez, é o melhor exame de ima-
gem, e o tratamento é composto de:
Uso contínuo de progestogênio;
Agonista de GnRH;
Inibidores da aromatase;
DIU com liberação de levonorgestrel - Mirena®;
Embolização da artéria uterina.
- Endometrite crônica: a condição pode resultar de infecções (clamídia,
tuberculose, micoplasma), corpos estranhos (DIU), tumores intraute-
rinos (mioma submucoso) e exposição à radiação. Entretanto, em 1/3
das pacientes, não é possível identificar o fator causal. As pacientes
podem apresentar-se assintomáticas (maioria) ou sintomáticas: dor
à mobilização do colo uterino (sintoma mais comum), SUA (sangra-
mento intermenstrual ou pós-coito ou menorragia) e dor pélvica vaga
do tipo cólica. Geralmente, a endometrite crônica não é a causa direta
do SUA, mas é a causa indireta ou contribuinte dele;
- Malformações arteriovenosas: mistura de canais arteriais, venosos
e capilares com ligações fistulosas. Podem ser congênitas ou adquiri-
das. Quando adquiridas, são formadas por vasos únicos de grande ca-
libre que se formam após trauma de cesárea ou associado a câncer de
colo de útero ou endométrio, doença trofoblástica gestacional, uso de
DIU. São raras e acometem mais o corpo uterino, mas também podem
ser encontradas no colo. Manifestação clínica é menorragia ou me-
HEDCEL TRANSTORNOS MENSTRUAIS 139

nometrorragia após abortamento, curetagem ou outra cirurgia ute-


rina intracavitaria. Há sangramento uterino intenso não associado a
trauma, podendo se instalar lenta ou subitamente com sangramento
potencialmente fatal. A USG transvaginal revela estruturas tubulares
hipoecoicas dentro do miométrio, e, ao Doppler, notam-se vasos de
grande calibre e reversão do fluxo sanguíneo (cores "em mosaico"). A
confirmação diagnóstica se dá por angiografia, e o tratamento con-
siste em embolização arterial ou coagulação cirúrgica dos vasos arte-
riais da malformação arteriovenosa;
DIU: com ele, pode haver desequilíbrio entre prostaglandinas e trom-
boxano. Há, ainda, aumento na vascularização endometrial, conges-
tão e degeneração no tecido endometrial. Esses fatores corroboram
para o sangramento. A conduta envolve descartar infecção, gravidez,
doença estrutural e rotação, perfuração ou fixação do DIU. Iniciam-
-se AINEs;
Contracepção hormonal e terapia de reposição hormonal: sangra-
mento uterino normal pode ocorrer com métodos contraceptivos de
progesterona apenas, além de sangramentos de escape irregulares e
leves. Na contracepção hormonal combinada, também é comum san-
gramento de escape, principalmente no 1° mês de uso da medicação
(de 30 a 50% das pacientes), sendo atribuído à atrofia endometrial. A
terapia de reposição hormonal, especialmente aquelas que usam es-
quema contínuo, provoca sangramento uterino irregular. Entretanto,
quando esse sangramento persiste por mais de 6 meses após seu iní-
cio, deve-se descartar patologia uterina que o justifique;
Doenças renal e hepática: a doença renal pode ser acompanhada de
hipoestrogenismo, amenorreia e infertilidade, possivelmente devido
à desregulação hipotalâmica da secreção de GnRH. Há, ainda, a piora
da anemia dessas pacientes com o fluxo menstrual. Nesses casos, a
1g opção é a progesterona contínua ou intramuscular a cada 3 meses.
Outra opção é o DIU com liberação de levonorgestrel (Mirena°). As
pacientes com doença hepática apresentam níveis altos de estrogênio
circulante (devido à redução na depuração do hormônio), levando a ní-
veis baixos de LH e FSH, acarretando alteração no eixo hipotalâmico-
-hipofisario-ovariano, ciclos anovulatórios e SUA. Além disso, essas
pacientes apresentam alteração na hemostasia. Como proceder com
hepatopatas, então?
Hepatite virai crônica ou cirrose leve compensada: contraceptivos
hormonais;
Hepatite virai ativa ou agudização de doença virai crônica: apenas
contraceptivo de progesterona;
Cirrose grave descompensada: evitar qualquer tipo de contracepção
hormonal.
Coagulopatias: alterações na coagulação provocam SUA. A doença de
von Willebrand é a anormalidade hematológica que mais afeta as mu-
lheres. O tratamento em pacientes com doença de von Willebrand e
sangramento menstrual intenso envolve desmopressina, terapia anti-
fibrinolítica, ácido tranexâmico, contraceptivos com estrogênio e pro-
gesterona ou DIU com liberação de levonorgestrel (Mirenal;
Doença tireoidiana: no hipertireoidismo, há hipomenorreia e amenor-
reia em 5% das pacientes. No hipotireoidismo, observam-se anovula-
ção, amenorreia e defeito de hemostasia por redução em fatores de
coagulação. O tratamento consiste em reverter o quadro de hipo ou
hipertireoidismo.
140 SIC GINECOLOGIA HEDCEL

Anovulação Anovulação
Coagulopatias Pólipos e mioma
Infecções Hiperplasia endometrial
Complicações da gravidez Câncer de colo de útero/endometrial

Privação de
estrogênio

Nascimento 10 20 30

Corpo estranho Anovulação Atrofia vaginal/endometrial


Trauma Contra ce pção hormona I Terapia hormonal
Infecção Complicações na gravidez Câncer endometrial
Tu mor ovariano Infecções
Sarcoma botrioide Endocrinopatias
Pólipos e miomas

Figura 2 - Causas usuais de sangramento anormal por idade


Fonte: Endocrinologio Ginecológica Clínica e Infertilidade, 82 edição.

3. Sangramento uterino disfuncional

A - Definição
O Sangramento Uterino Disfuncional (SUD), ou hemorragia disfuncio-
nal, é o sangramento vaginal devido às alterações nos mecanismos
neuroendócrinos que controlam o ciclo menstrual. Os sangramentos
excessivos provocados por alterações anatõmicas não fazem parte do
conceito de SUD. É, portanto, um diagnóstico de exclusão, sendo fir-
mado somente quando todas as causas orgânicas citadas são afasta-
das. Pode apresentar-se por hipermenorreia, menorragia, metrorragia
e/ou menometrorragia, além de ser, geralmente, originário de ciclos
ovulatórios ou anovulatórios e acomete qualquer período da vida da
mulher, sendo mais frequente na adolescência e no climatério.
O SUD com ciclos anovulatórios corresponde a 90% das pacientes com
SUD. São comuns nos extremos reprodutivos: imaturidade do eixo hi-
potalâmico-hipofisário-ovariano na adolescência e falência ovariana
no climatério. Manifesta-se por irregularidade menstrual, amenorreia,
metrorragia e menorragia. Muitas mulheres com anovulação apresen-
tam amenorreia de semanas a meses, seguida de sangramento intenso,
irregular e prolongado, devido ao estímulo endometrial pelo estro-
gênio sem ação da progesterona (intensa proliferação endometrial).
Nesse caso, há alteração no eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano.
Vale lembrar que alterações ponderais excessivas aumentam o tecido
gorduroso, que é produtor de estrogênios (ação da aromatase) e pro-
voca resistência a insulina, ambos relacionados com anovulação.
O SUD com ciclos ovulatórios acontece com ciclos normais, e a me-
norragia origina-se em falhas nos mecanismos de controle do sangra-
mento menstrual. Vasos que nutrem o endométrio apresentam menor
tônus vascular e, consequentemente, maiores vasodilatação e perda
sanguínea. Acredita-se que as prostaglandinas intrauterinas estão for-
temente envolvidas nesse processo. Compreendem aumento das pros-
HEDCEL TRANSTORNOS MENSTRUAIS 141

taglandinas e das suas inter-relações, com tendência ao sangramento


- aumento da relação PGE2-PGF2 e da relação PGI2-TxA2. Tais prosta-
glandinas proporcionalmente mais elevadas têm ação anticoagulante
e favorecem o sangramento uterino ou não o estancam no momento Dica
adequado. Em resumo:
A anovulação é a princi-
O SUD tem mecanismos fisiopatológicos diferentes, de acordo com a pal causa de sangramento
etapa da vida da mulher. São eles:
uterino disfuncional
- Na adolescência: ciclos anovulatórios por imaturidade do eixo nos extremos da vida
hipotalâmico-hipofisário-ovariano;
reprodutiva (adolescência
- Na menacma: SUA por causas anovulatórias ou ovulatórias: e climaterio).
Anovulatórias: SOP, hiperprolactinemia, insuficiência ovariana e
estresse;
Ovulatórias: alterações na produção de prostaglandinas.
- No climatério: inicialmente, insuficiência lútea (ovulatória) e, poste-
riormente, insuficiência ovariana (anovulatória). Lembrando que a
atrofia endometrial por falência ovariana é a principal causa de san-
gramento pós-menopausa.

B - Apresentação clínica
O SUD pode ter diversas intensidades, desde leve e insidiosa até grave
e emergencial. Comumente leva à instalação de um quadro anêmico
agudo ou crônico.
Quando a hemorragia é grave, a paciente apresenta alterações hemo-
dinâmicas, como hipotensão, taquicardia, vasoconstrição periférica e
palidez cutâneo-mucosa. Nesse caso, a conduta emergencial é restabe-
lecer a homeostase. Quando o SUD tem longa duração e menor intensi-
dade, instala-se a anemia ferropriva.
Quando a causa provável é ovulatória, o SUD apresenta-se com ci-
clicidade de sangramento, podendo haver dismenorreia e alterações
comportamentais relacionadas ao ciclo. Nas formas anovulatórias, o
sangramento profuso costuma ser precedido de períodos de amenor-
reia e/ou oligomenorreia.
Quando a causa é um distúrbio de outra glândula, outros sinais podem
estar presentes, como galactorreia na hiperprolactinemia; hirsutismo,
acne e obesidade, na SOP; e sinais de hipoestrogenismo, na insuficiên-
cia ovariana. Deve-se estar atento à necessidade de descartar as prin-
cipais doenças que causem SUA antes de diagnosticar SUD (diagnóstico
de exclusão), por meio de anamnese, exame físico e exames comple-
mentares. Tais doenças encontram-se relacionadas na Tabela 3.
- Gravidez/abortamento: caracterizam atraso menstrual, e solicita-se
beta-HCG. Trata-se do principal diagnóstico diferencial nos casos de
sangramentos excessivos;
- Moléstia inflamatória pélvica aguda: corrimento vaginal possivel-
mente presente ou ausente + dor abdominal 4. dor à mobilização do
colo uterino e à palpação dos anexos; Importante
- Mioma uterino: afastado pelo exame físico + USG + exame da cavi- O exame padrão-ouro
dade endometrial (histeroscopia ou histerossalpingografia) na sus- para avaliação da ca-
peita de mioma submucoso;
vidade intrauterina é a
- Câncer de colo uterino: afastado pela colpocitologia onática e col- histeroscopia.
poscopia com biópsia (se necessário);
142 SIC GINECOLOGIA HEDCEL

- Câncer de endométrio: afastado por obtenção de amostra endometrial,


biópsia aspirativa, dilatação e curetagem ou histeroscopia com biópsia;
- Coagulopatia: afastada por provas laboratoriais de avaliação da
coagulação;
- Hipotireoidismo: afastado pela dosagem de TSH e T4 livre;
- Doença hepática: afastada pela clínica e por provas laboratoriais de
função hepática;
- Sangramentos de tratos digestivo e urinário: necessitam de avalia-
ções próprias com colonoscopia, exames de urina e do trato urinário;
- Corpos estranhos: geralmente provocam sangramento e leucorreia
purulenta;
- Pólipos endometriais e cervicais: mesmos exames para o diferencial
de miomas; o exame complementar ideal para diagnosticar pólipos
endometriais é a histeroscopia.
- DIU;
- Uso de medicamentos, como anticoagulantes.
O exame padrão-ouro para avaliação da cavidade uterina é a
histeroscopia.
É fundamental um bom conhecimento do ciclo menstrual; o ideal é
anotá-lo em um calendário menstrual.

É difícil caracterizar perda por sangramento superior a 80mL. O método


ideal é corar a hematina (produto de conversão da hemoglobina), po-
rém é algo muito trabalhoso e pouco prático. No dia a dia, caracteriza-se
como perda de coágulos >2,5cm, sangramento intenso vermelho-vivo,
troca de absorvente ou tampão a cada 3 horas (ou em menor período),
>20 absorventes durante a menstruação, duração >7 dias ou anemia.

C - Conduta
- Anamnese e exame físico;
- Avaliação de doença sistêmica subjacente (renal, hepática, he-
matopoética e tireoide) e uso de medicações (hormonais, an-
ticoagulantes, outras medicações que possam alterar o eixo
hipotalâmico-hipofisário-ovariano);
- Laboratório: beta-HCGehemograma(avaliaranemia etrombocitopenia);
- A paciente está ovulando?
Sangramento menstrual infrequente, irregular imprevisível e varia-
ção no fluxo e duração, sem síndrome pré-menstrual importante e
sem anormalidade visível ou palpável no trato genital: sangramento
anovulatório;
Sangramentos mensais regulares, intensos e/ou prolongados: san-
gramento por lesão anatômica ou por disfunção hemorrágica;
Sangramento intermenstrual (no meio do ciclo): doença intrauterina,
fazer USG transvaginal e/ou histeroscopia;
Se, pelo padrão de sangramento, não for possível definir ciclos ovu-
latórios ou anovulatórios, deve-se dosar a progesterona na fase Iú-
tea do ciclo (do 22° ao 24° dia do ciclo). Se >3ng/mL, há ovulação.
- Para pacientes anovulatórias:
TSH;
Tratamento empírico das pacientes com anovulação.
MEDCEL TRANSTORNOS MENSTRUAIS 143

- USG transvaginal - quando solicitar?


Ciclos menstruais regulares com aumento no volume e duração do
sangramento;
Ciclos menstruais regulares complicados por sangramento inter-
menstrual, na ausência de lesão vaginal ou cervical;
Sangramento anormal, apesar de evidências de ovulação: dosagem
da progesterona (>3ng/mL) ou amostragem endometrial (endomé-
trio secretor);
Falha no tratamento clínico empírico para anovulação.
- Quando fazer histeroscopia com biópsia endometrial (para descartar
hiperplasia endometrial, pólipo de endométrio e câncer endometrial)?
Pacientes com sangramento anormal >35 ou 40 anos e com endomé-
trio normal (5 a 12mm à USG transvaginal);
Pacientes com sangramento anormal e com histórico de exposição
em longo prazo ao estrogênio sem oposição da progesterona (ci-
clos anovulatórios crônicos) endométrio normal (5 a 12mm à USG
transvaginal);
Pacientes com endométrio >12mm à USG transvaginal;
Se endométrio <5mm à USG transvaginal, isso significa que o endo-
métrio está atrófico ou hipotrófico, dispensando essa avaliação por
histeroscopia. Não realizar biópsia endometrial por histeroscopia.
A histeroscopia é o método definitivo para diagnóstico e tratamento
(retira a lesão) da doença intrauterina sintomática.
A ressonância magnética de pelve apresenta boa acurácia para ava-
liar a anatomia uterina, distinguir adenomiose de miomatose uterina e
avaliar as proximidades dos miomas da cavidade uterina. Geralmente,
é solicitada quando há necessidade de complementar a avaliação rea-
lizada pela USG transvaginal ou quando esta não pode ser realizada.
- Se vaginite ou cervicite: pesquisar clamídia, gonococo e tricomoníase;
- Se houver doença conhecida ou forte suspeita: funções hepática e renal;
- Quando solicitar coagulograma?
Adolescentes, mulheres com história pessoal ou familiar de sinto-
mas de sangramento (sangramentos fáceis, gengivorragia, epistaxe)
e mulheres com menorragia não explicada;
Solicitar: contagem de plaquetas, tempo de sangramento ou analisa-
dor da função plaquetária, tempo de atividade da protrombina, PTT,
fator de von Willebrand (nos primeiros dias do ciclo), atividade do
cofator da ristocetina (atividade do fator de von Willebrand), fator
VIII e tipagem sanguínea;
Pacientes com tipagem sanguínea tipo O apresentam fator de von
Willebrand e fator VIII mais baixo (25%).

Tabela 4 - Exames laboratoriais

- Cultura cervical;

- Tempo de tromboplastina parcial;

- Contagem de plaquetas,

- Tempo de protrombina;

- Tempo de sangramento,

- Cofator da ristocetina - von Willebrand;


144 SIC GINECOLOGIA MEDCEL

- Hemograma completo;

- HCG;

- Prolactina;

Função tireoidiana;

Função hepática.

Anamnese +exame físico


Gestação Doença Normal Alterações em Alterações em vulva, vagina
sistêmica útero ou anexos ou colo

Beta-HCG + 4
USGTV Exames de <40 anos Colpocitologia oncotica,
sangue
4 vulvoscopia, biópsia, perfil
de secreção vaginal
Conduta 4 Tratamento SUD
obstétrica (3 meses)
Tratamento da
doença de base • Tratamento específico
+ tratamento de
SU A
Alteração Alteração Alteração
Normal
anexial ute rina endometrial
USGTV: ultrassonografia trans vaginal
SUD: Sangramento Uterino Disfuncional
SUA: Sangramento Uterino Anormal Propedêutica e tratamento específico

Figura 3 - Investigação para sangramento uterino dis funcional

D - Tratamento
Dependendo da gravidade do caso, pode ser clínico ou cirúrgico.

a) Clínico
Diversas classes de medicamentos podem ser empregadas:
Anti-inflamatórios não hormonais: inibem a síntese de prostaglandi-
nas, sendo mais eficazes na menorragia (mioma, DIU) do que nos san-
gramentos anovulatórios;
Progestogênios: decidualizam e diminuem a espessura endometrial;
podem ser usados isolados em sangramentos anovulatórios, mas não
são eficazes na menorragia. Quando utilizados para o tratamento de
ciclo anovulatórios, são usados por 2 semanas ao mês. O uso cíclico de
progesterona oral leva a sangramento após a sua interrupção (cure-
tagem clínica ou química). Seu uso contínuo provoca amenorreia;
Danazol: derivado da testosterona, tem ações antiestrogênica e anti-
gonadotrófica e deve ser usado por curto período, para não aumentar
os riscos de osteopenia/osteoporose;
- Anticoncepcionais hormonais combinados: atrofiam o endométrio,
sendo eficazes nos sangramentos anovulatórios e em alguns casos de
miomatose. Introduz-se 1 comprimido, 2 a 3x/d, por 7 dias. O sangra-
mento (curetagem química) ocorre após 2 a 5 dias da suspensão. Rein-
troduz-se 1x/d, no 59 dia de fluxo, por 21 dias, com pausa de 7 dias, e
mantém-se por, no mínimo, 3 meses;
HEDCEL TRANSTORNOS MENSTRUAIS 145

Análogos de GnRH: para bloqueio do eixo hipotalâmico-hipofisário-


-ovariano, devem ser usados por curto período, para não aumenta-
rem o risco de osteopenia/osteoporose (exemplos: leuprolida lmg/d,
SC, e goserelina 3,6mg/mês, SC, nafarrelina, spray nasal). Apresentam
uma taxa considerável de efeitos adversos, como fogachos e sintomas
urogenitais de atrofia; são utilizados antes do procedimento cirúrgico
para redução do volume uterino e controle prévio da anemia;
Sistema intrauterino (SIU) medicado com progesterona: 96% das
usuárias apresentam redução do fluxo, e cerca de 40% entram em
amenorreia. A eficácia é semelhante à da histerectomia.

b) Cirúrgico
- São indicações do tratamento cirúrgico:
Causas estruturais e neoplasias;
Falha no tratamento clínico;
Miomas grandes >3cm, submucosos, distorção da cavidade endome-
trial: embolização da artéria uterina, miomectomia por histerosco-
pia ou abdominal, ou histerectomia.
Ablação endometrial (Figura 4): remoção do endométrio em toda a
sua espessura e extensão por meio de histeroscopia, ou não. Nesse
caso, pode ser feita por meio de balão térmico, crioablação, micro-
-ondas ou outros menos utilizados; promove redução do fluxo seme-
lhante ao obtido pelo DIU liberador de levonorgestrel (Mirena®);

Tabela 5 - Contraindicações absolutas à ablação endometrial

- Malignidade do trato genital;

- Mulheres que desejam preservar a fertilidade;

Gestantes;

- Infecção pélvica aguda;

Cirurgia uterina prévia.

- Curetagem uterina: raspagem da camada interna do útero por meio


de cureta;
- Histerectomia: retirada cirúrgica do útero. Pode ser realizada pelas
vias abdominal, vaginal ou laparoscópica.

Endométrio Tuba uterina

Endométrio tratado
Ovário
Útero
Cérvice
Ressecção endoscópica do
endométrio
Vagina

Figura 4 - Ablação endometrial


146 5IC GINECOLOGIA HEDCEL

c) Na Emergência
- Reposição volêmica:
Repouso;
Estrogenoterapia intensiva: estrogênios conjugados 2,5mg VO a
cada 4 horas, até cessar o sangramento ou até 3 doses. Em situa-
ções de menor sangramento, pode ser prescrito 1,25mg de estrogê-
nio conjugado por 7 a 10 dias. A terapia estrogênica deve ser seguida
de progesterona. Pode ser associada a terapia antifibrinolítica por
curto período de tempo;
Em hemodinamicamente instáveis, pode-se optar por estrogênio
equino conjugado 25mg a cada 4 horas, até o sangramento desa-
parecer, por até 24 horas. Realiza-se terapia hormonal com proges-
terona posterior. O estrogênio intravenoso provoca proliferação
endometrial, ocasionando a sua estabilização. Consequentemente,
a paciente interrompe o sangramento;
O tratamento com altas doses de estrogênio aumenta notavelmente
o risco de tromboembolismo;
A curetagem uterina é utilizada, se necessário, para estancar a he-
morragia. Deve-se sempre solicitar exame anatomopatológico do
produto obtido para diagnóstico etiológico;
Tratamento hormonal de manutenção com progestogênio na 2g fase.

Tabelo 6 - San gramento uterino dis funcional ou hemorragia dis funcional

- O SUO pode ser causado por distúrbios do eixo hipotalâmico-hipofisário-


-ovaria no, aumento das prostaglandinas, distúrbios hepáticos e tireóideos
e alterações ponderais excessivas;

- Os dist irbios do eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano podem expressar


SUD co m ciclos anovulatórios ou ovulatórios, dependendo de sua fisiopa-
tologia durante a menacma: ovulatórios - insuficiência lútea e hiperme-
norrag a essencial - e anovulatórios SOP, hiperprolactinemia, insuficiên-
cia ova -iana e estresse;

- Os san ;ramentos disfuncionais ovulatórios apresentam-se geralmente


cíclicos, com dismenorreia e dor do meio do ciclo. Já nos anovulatórios, há
sangramento geralmente precedido de amenorreia;

- Sintomas como galactorreia (hiperprolactinemia), hirsutismo, acne, obesi-


dade (SOP), fogachos, secura vaginal e insônia (falência ovariana) podem
auxiliar no diagnóstico fisiopatológico;

- Abortamento, moléstia inflamatória pélvica aguda, miomas e pólipos


endometriais, câncer de colo ou endométrio, coagulopatia, corpo estranho
e hipotireoidismo são os principais diagnósticos diferenciais de SUO;

- O tratamento cirúrgico é indicado a casos de sangramento abrupto refra-


tário à medicação, anemias importantes e instabilidade hemodinâmica.

4. Hiperandrogenismo

A - Definição
O hiperandrogenismo é o excesso da concentração ou da ação dos an-
drogênios na mulher, produzidos a partir do colesterol pelas glândulas
MEDCEL TRANSTORNOS MENSTRUAIS 147

suprarrenais e pelos ovários, e está, em grande parte (80%), ligado à


Sex Hormone-Binding Globulin (SHBG) ou à albumina (19%), restando
pequena fração livre no plasma (1%), responsável pelas manifestações
do hiperandrogenismo.

Tabela 7- Principais androgênios na mulher

Androgênios Produção

Testosterona (T) Ovário + suprarrenal

Androstenediona Ovário + suprarrenal

Diidrotestosterona (DHT) Conversão periférica

Deidroepiandrosterona (DHEA) Ovário + suprarrenal (90%)

Sulfato de deidroepiandrosterona
Suprarrenal (100%)
(DHEAS)

A quantidade de SHBG é um fator importante, pois determina a fração


ligada e a fração livre dos hormônios. Além disso, ela aumenta com es-
trogênios (anticoncepcionais orais, por exemplo) e com a administração
de hormônio tireoidiano (por exemplo, no controle do hipotireoidismo)
e diminui na obesidade, nos estados hiperinsulinêmicos (como SOP) e
com a administração de androgênios.

O androgênio mais potente é a diidrotestosterona, resultado da con-


versão periférica da testosterona pela enzima 5-alfarredutase.

B - Etiopatogenia
Diversos fatores podem levar ao hiperandrogenismo. Os mais impor-
tantes são:
- Aumento da produção de androgênios ovarianos (por exemplo, tu-
mores de ovário, SOP - hiperandrogenismo funcional) e suprarrenal
(como síndrome de Cushing);
- Uso de substâncias androgênicas (anabolizantes; progestogênios de-
rivados da 19-nortestosterona);
- Diminuição da SHBG com aumento das taxas livres de androgênios
circulantes. Exemplos: obesidade, hiperinsulinemia;
- Diminuição do catabolismo e depuração dos androgênios;
- Aumento da resposta do tecido-alvo.

C - Apresentação clínica
- Aspectos fenotipicos relacionados ao hiperandroge-
nismo ("maçã") e mulher normal ("pera")
O hiperandrogenismo leva tanto à redução dos caracteres essencial-
mente femininos (desfeminilização) quanto à virilização. Os principais
sinais são:
Alopecia androgenética;
Aumento da massa muscular;
- Aumento da gravidade da voz;
148 SIC GINECOLOGIA HEDCEL

- Aumento do clitóris;
Alterações menstruais: de ciclos oligomenorreicos a amenorreia - ci-
clos anovulatórios;
- Esterilidade por fator ovulatório;
- Abortamentos de 19 trimestre por insuficiência lútea;
Hirsutismo;
- Acne;
Obesidade centrípeta;
- Acantose nigricans - marcador de resistência a insulina.

1 2 3 4

1 2 3 4

1 2
1 2 3 4
111
4)
1 2 3 4
2 3 4
MIM
A"-
4,
1 2 3 4
1 2 3 4

Figura 5 - Escala de Ferriman-Gallwey para hirsutismo. Interpretação da escala de


Ferriman: abaixo de cada figura, de acordo com a porcentagem de pelos, atribui-se
nota de 1 a 4, e somam-se os pontos (total <8 = normal, 8 a 16 = hirsutismo leve, 17 a
25 = hirsutismo moderado, >25 = hirsutismo grave).

No entanto, deve-se observar que a virilização é marcada por aumento


da massa muscular, redução das mamas, engrossamento da voz e dito-
romegalia. O clitóris normal tem de 1 a 1,5cm de comprimento e 0,5cm
de largura. Quando ocorre virilização, deve-se pensar em tumores pro-
dutores de androgênios ovariano ou de suprarrenal. E, na SOP, é co-
mum haver hirsutismo, acne e alopecia androgênica.

D - Principais causas de hiperandrogenismo


SOP (mais comum);
Hiperplasia de suprarrenal congênita de início tardio (não clás-
sica): trata-se de uma doença congênita marcada por deficiência
parcial ou total da 21-hidroxilase (mais comum) ou 11-hidroxilase.
Na forma tardia da doença, ocorre deficiência apenas do cortisol,
com consequente aumento no ACTH, que é capaz de normalizar
a produção de cortisol e provoca hiperplasia de suprarrenal com
aumento de androgênios. Há aumento nas taxas de testosterona,
androstenediona e sulfato de deidroepiandrosterona. Nessa forma
tardia da doença, também chamada não clássica, não há alteração
no cortisol e aldosterona séricos.
HEDCEL TRANSTORNOS MENSTRUAIS 149

21-hidroxilase Hiperplasia de
ou 11-hidroxilase
—0> Cortisol —Po ACTH
suprarrenal

4
Aumento de
androgênios

4
SDH EA,
androstenediona,
testosterona

Aldosterona e cortisol
séricos normais

Figura 6 - Mecanismo de hiperandrogenismo na hiperplasia de suprarrenal


congênita

O diagnóstico presuntivo é realizado pela dosagem da 17-hidroxipro-


gesterona sérica >200ng/dL e confirmado pelo teste de estimulação
com ACTH.

17-hidroxiprogesterona
60 minutos após
estimulação com teste
ACTH

2 a lOng/mL 10 a 10Ong/mL >10Ong/mL


200 a 1.000 1.000 a 10.000 >10.000

Hiperplasia Hiperplasia
Portador congênita de congênita de
suprarrenal não suprarrenal
clássica clássica

Figura 7 - Diagnóstico pela dosagem de 17-hidroxiprogesterona 60 minutos após


estimulação com ACTH

Tumor ovariano e de suprarrenal secretor de androgênio


- Como mencionado, sinais de virilização são indicativos clínicos de pro-
dução tumoral de androgênios. Devem-se, nesses casos, dosar os an-
drogênios séricos;
- A dosagem de testosterona total sérica é utilizada para excluir tumo-
res ovarianos. Testosterona total sérica >200ng/mL sugere neoplasia
ovariana, devendo-se evoluir com exames de imagem para elucidação
diagnóstica;
- Sulfato de deidroepiandrosterona >700pg/dL sugere a presença de neo-
plasia suprarrenal, devendo ser realizada Tomografia Computadorizada
(TC) ou Ressonância Nuclear Magnética (RNM) para esses pacientes.

Síndrome de Cushing
- Trata-se do resultado da exposição prolongada a níveis elevados de
glicocorticoides exógenos ou endógenos. São manifestações clínicas:
disfunção menstrual, acne, hirsutismo, obesidade centrípeta, dislipi-
demia, intolerância a glicose, fácies "em lua cheia", estrias abdominais,
gordura com distribuição central, perda da força muscular nos múscu-
los proximais, facilidade para desenvolver hematomas;
150 SIC GINECOLOGIA HEDCEL

- Em pacientes com essas características, é mandatória a dosagem de


cortisol livre na urina de 24 horas: <90 pg - normais; >300 pg - sín-
drome de Cushing. Uma opção diagnóstica é o teste de supressão com
dexametasona.

c) Androgênios exógenos
Pacientes que fazem uso exógeno de androgênios podem evoluir com
sinais e sintomas de hiperandrogenismo.

E - Diagnóstico clinico e laboratorial


O diagnóstico do hiperandrogenismo deve ser feito por avaliação clí-
nica e laboratorial:
- Clinica: na anamnese, questiona-se sobre oleosidade de pele e cabe-
los, alteração da libido, irregularidade menstrual, acne, hirsutismo
etc. No exame físico, verificam-se hirsutismo, clitoromegalia, timbre
da voz, distribuição da gordura corpórea;
Exames laboratoriais: dosagens séricas dos androgênios (androste-
nediona, sulfato de deidroepiandrosterona, testosterona total e li-
vre), prolactina (PRL), hormônios tireoidianos, FSH e LH para avaliar
SOP; exames de imagem para avaliar ovários e suprarrenais (USG/
TC/RNM), a fim de excluir as neoplasias.

5. Síndrome dos ovários policísticos


A - Definição
Compreende uma forma de hiperandrogenismo acompanhada por ano-
vulação crônica. É conhecida, também, como síndrome de Stein-Leven-
thal, por causa dos 2 autores que a descreveram, em 1935, notando a
associação entre amenorreia, hirsutismo, obesidade e ovários policísti-
cos. Cursa com aumento do risco de diabetes e doença cardiovascular.

B Etiopatogenia
Sua etiopatogenia exata não está definida, mas é aceitável uma desor-
dem no processo normal de maturação folicular e ovulação, passando
pelos seguintes processos basicamente:
Disfunção na produção de androgênios;
Anovulação;
- Hiperinsulinemia;
- Obesidade.
Há uma disfunção primária na enzima CYP17 e no citocromo, com alte-
ração na produção de androgênios, levando a atresia folicular prema-
tura e anovulação. Portanto, não há pico na taxa de progesterona na
fase lútea, e há manutenção na produção estrogênica ovariana, culmi-
nando com alterações na produção de GnRH e aumento na produção
de LH. O LH encontra-se aumentado em relação ao FSH (relação >2:1).
Há aumento da produção androgênica pela hiperplasia das células te-
cais sob estímulo do LH. Os níveis relativamente baixos de FSH inibem
a maturação folicular adequada e o fenômeno de dominância folicular,
persistindo folículos em estágios iniciais da maturação e folículos atré-
sicos, o que forma o aspecto policístico.
HEDCEL TRANSTORNOS MENSTRUAIS 151

Com o estado hiperandrogênico, há diminuição da SHBG e aumento dos


esteroides sexuais livres. O estrogênio livre aumentado age na hipófise,
estimulando a secreção ainda maior de LH, perpetuando o ciclo vicioso.
A produção excessiva de androgênios e a sua conversão em estrogê-
nios constituem o substrato fisiopatológico da anovulação crônica.

Aumenta Disfunção
androgênios primária na
produzidos pela enzima CYP17 e
teca citocro mo

Estimula GnRH
1`LH Aumenta
androgênios

progesterona;
manutenção da
taxa de estrogênio Atresia folicular
prematura

Assim, obtêm-se: Anovulação


'T` LH
FSH ou normal
estrogênio
4, progesterona

Figura 8 - Fisiopatologia da síndrome dos ovários policísticos

Resposta ao
estímulo do LH

00
-----.
Folículo
pré-ovulatório

9,5 mm

8mm Parada do desenvolvimento

Ymm

Insulina

Figura 9 - (A) Desenvolvimento folicular normal e (8) anovulação proposta em pa-


ciente devido à insulinemia

O hirsutismo ocorre em 70% das pacientes com SOP. Sua manifesta-


ção depende da atividade cutânea da 5-alfarredutase. O diagnóstico
pode ocorrer pela presença de sinais clínicos ou aumento androgênico
em exames laboratoriais. O aumento anormal de androgênios leva a
pelos na face, região cervical, tórax e abdome inferior, e a acne é in-
tensamente causada pela DHT (diidrotestosterona). A distribuição de
pelos é tipicamente masculina, com índice de Ferriman-Gallwey x8. De
15 a 30% das mulheres com hirsutismo leve a moderado não apresen-
tam alterações laboratoriais, sendo essa manifestação em razão de
hiperatividade da 5-alfarredutase na pele (transforma a testosterona
152 SIC GINECOLOGIA HEDCEL

e diidrotestosterona, que é androgênio mais potente). Também se ob-


servam mulheres com sinais de hirsutismo e dosagens hormonais nor-
mais, podendo ser decorrentes da redução da SHBG com consequente
aumento da fração livre de androgênio ou de aumento na sensibilidade
do receptor. A redução na SHBG, por sua vez, aumenta a fração livre do
androgênio e a sua bioatividade nos receptores.

1' atividade de 5-alfarredutase na pele + SHBG = hirsutismo sem aumento


de androgênios totais séricos

Vários mecanismos têm sido propostos para explicar esse desequilíbrio


funcional. Atualmente, uma hipótese bastante defendida e aceita é a de
hiperinsulinemia (por aumento da produção pancreática, diminuição da
depuração hepática ou, principalmente, resistência dos tecidos periféri-
cos à sua ação). No caso da síndrome, parece que a resistência periférica
à ação da insulina - causada por diminuição dos receptores para insulina
ou mecanismo defeituoso pós-receptor - é a hipótese mais provável.

C - Hiperinsulinemia

A hiperinsulinemia determina o estado anovulatório por ação direta e


sinérgica com o LH nos ovários e por diminuição da produção hepá-
tica da SHBG. Pacientes com hiperinsulinemia apresentam maior risco
de doenças cardiovasculares (por alteração do metabolismo lipídico -
aumento do colesterol LDL e triglicérides) e doenças tromboembólicas
por estímulo à coagulação.

Hiperplasia das células


Hiperandrogenismo
teca por ação do LH

Baixos níveis de FSH, 4


com inibição do Estado
Queda da
desenvolvimento 4— hiperestrogênico
SHBG
folicular e dominância relativo
folicular ausente
A Aumento dos esteroides
sexuais livres

Feedback positivo na hipófise


com novo aumento do LH

Ciperinsulinemia por
aumento da resistência
periférica

Figura 10 - Insulinemia

Ligação do
receptor
de IGF

Redução de Aumento
SHBG de LH

4
Aumento de
androgênios

Figura 11 - Resumo da ação da hiperinsulinemia e aumento na produção de


andro gênios
MEDCEL TRANSTORNOS MENSTRUAIS 153

Observam-se ainda, na obesidade, aumento na aromatização perifé-


rica, aumento na produção de insulina e redução na SHBG, culminando
com elevada produção androgênica e maior fração de androgênios
livres/biodisponíveis.
Importante
D - Quadro clinico e diagnóstico O diagnóstico de
síndrome dos ovários
Tabela 8 - Características clínicas policísticos é de exclusão,
devendo ser afastadas
- Oligomenorreia ou amenorreia (83%);
outras causas frequentes
- Infertilidade; de hiperandrogenismo,
- Obesidade; como hiperplasia suprar-
renal de início tardio,
- Hirsutismo (50%);
neoplasia ovariana e de
- Acne; suprarrenal produtoras
- Acantose nigricans; de androgênios, síndrome
de Cushing e uso de
- Alopecia androgênica.
androgênio exógeno.
A síndrome é a principal causa de infertilidade endócrina, responsável Associa-se, ainda, a
por cerca de 25% dos casos de infertilidade feminina. Além disso, é a necessidade de exclusão
principal doença endócrina da mulher na menacma, com prevalência de de hiperprolactinemia e
cerca de 8% nessa população. hipotireoidismo também
Em 2004, o Conselho de Rotterdam estabeleceu critérios para definir
associados a anovulação.
a doença, normatizando condutas e determinando a necessidade de
controlar as pacientes com a síndrome, visando à regularização das
funções menstrual e ovulatória, ao controle do hirsutismo e de outros
aspectos do hiperandrogenismo e à reversão da infertilidade. Além
disso, esse controle permite a diminuição da resistência a insulina e
seus riscos associados, como diabetes mellitus tipo 2, dislipidemias e
doenças cardiovasculares.

Tabela 9 - Critérios do consenso de Rotterdam (2004) Importante


A presença de pelo menos 2 dos critérios a seguir já define
A ultrassonografia trans-
o diagnóstico, afastadas outras causas de anovulação
hiperandrogênica vaginal comprovando o
aspecto polimicrocístico
- Disfunção menstrual anovulatória (geralmente ciclos oligomenorreicos e/
do ovário não é mais
ou amenorreia);
imprescindível para o
- Sinais clínicos e/ou laboratoriais de hiperandrogenismo; diagnóstico. Se a paciente
- USG pélvica transvaginal evidenciando 12 ou mais folículos de 2 a 9mm em apresentar oligomenor-
cada ovário e/ou aumento do volume ovariano superior a 10cm3. teia e sinais de hirsu-
tismo, já preencherá 2 dos
- Exames laboratoriais 3 critérios diagnósticos
- Avaliação de hiperandrogenismo: da síndrome, e a compro-
vação ultrassonográfica
Testosterona total e DHEAS:
será desnecessária. Con-
* Tumor secretor androgênio DHEAS >700pg/dL: tumor suprarrenal;
vém atentar-se para esses
*Testosterona >200ng/dL: tumor ovariano.
detalhes nas questões
SHBG: pode estar baixa na SOP. de provas de concursos
- Exclusão de outras causas de hiperandrogenismo: médicos.
TSH;
154 SIE GINECOLOGIA MEDCEL

PRL;
17-hidroxiprogesterona;
Avaliar estigmas de Cushing - cortisol urinário de 24 horas.
- Gonadotrofinas:
FSH;
LH;
Relação LH-FSH.
- Exclusão de diabetes e pré-diabetes:
Razão glicose-insulina de jejum <4,5: resistência a insulina;
Glicemia de jejum/HbA1c/Teste de Tolerância a Glicose Oral (TTGO)
de 75g.

Tabela 10 - Testes de diabetes mellitus

Intolerância a Diabetes
Normal
glicose mellitus
Jejum 5100mg/dL 100 a 125mg/dL ?-126mg/dL

TTGO de 2 horas 5140mg/dL 140 a 199mg/dL 200mg/dL

HbAlc 55 , 6 5,7 a 6,4 k. 6,5

Grande associação de SOP a resistência a insulina e diabetes.


- Lipidograma completo e triglicérides:
Perfil lipídico, devido à associação de SOP a síndrome metabólica e
dislipidemia.
- USG transvaginal/pélvica:
Figura 12 - Ovários policisticos à
ultrassonogra fia
12 ou mais folículos de 2 a 9mm em cada ovário e/ou aumento do vo-
lume ovariano superior a 10cm3.

Tabela 11 - Critérios de síndrome metabólica

Qualquer conjunto de 3 a 5 critérios constitui


Pontos de corte definidos
diagnóstico de síndrome metabólica
- k102cm para homens;
Circunferência abdominal aumentada*
k88cm para mulheres.

2150mg/dL ou farmacoterapia para níveis de triglicérides


Níveis de triglicérides elevados
elevados**

<40mg/dL para homens;


Níveis de HDL reduzidos - <50mg/dL para mulheres; ou
- Farmacoterapia para hipertensão.

PA sistólica kl 30 rn rri H g , PA diastólica -?.85mmHg ou farmaco-


PA elevada
terapia para hipertensão

Níveis de glicose em jejum elevados 2100mg/dL ou farmacoterapia para níveis de glicose elevados

* As diretrizes para circunferência abdominal variam entre as populações e países específicos devem ser utilizados.
Os valores aqui apresentados referem-se aos dos Estados Unidos.
Fibratos e ácido nicotínico são os fármacos mais empregados para triglicérides elevados e HDL reduzido. Pre-
sume-se que os pacientes tratados com esses agentes tenham níveis de triglicérides elevados e HDL baixo.

PA: Pressão Arterial; HDL: lipoproteína de alta densidade.

Fonte: Ginecologia de Williams, 8g edição.


HEDCEL TRANSTORNOS MENSTRUAIS 155

E - Tratamento das síndromes hiperandrogênicas


Deve-se sempre orientar perda de peso para aumentar SHBG, melho-
))
rando a resistência a insulina e diminuindo a conversão periférica dos
androgênios;
Utilizam-se anticoncepcionais orais para supressão da função ova-
Vídeo
riana. Dá-se preferência àqueles com progestogênios com ação an- Síndrome dos ovários
tiandrogênica, como acetato de ciproterona e drospirenona; policísticos
São drogas antiandrogênicas: acetato de ciproterona, espironolac-
tona, flutamida e finasterida;
São indutores da ovulação: citrato de clomifeno ou gonadotrofinas,
usados em pacientes que desejam engravidar;
Recorre-se a cauterização laparoscópica dos ovários (microperfura-
ções) e ressecção "em cunha" dos ovários (cirurgia de Thaler);
Tratamento estético para hirsutismo com diversas técnicas de depila-
ção (além dos tratamentos mencionados das causas);
Tratamento estético para acne e acompanhamento dermatológico;
É importante lembrar que as pacientes apresentam incidência au-
mentada de hipertensão, dislipidemia, diabetes e doenças cardiovas-
culares, o que aponta para a importância de um acompanhamento
multiprofissional. Além disso, entre as pacientes sem tratamento, os
estímulos estrogênico e hiperandrogênico sem oposição da progeste-
rona aumentam os riscos de câncer de endométrio, mama e ovário.

- Complicações da síndrome dos ovários policísticos Dica


Risco aumentado de diabetes e doença cardiovascular A metformina é usada
4011.11.0r IMF ~Ir /NI IMF 4111111r para diminuição da
Câncer de endométrio resistência a insulina,
AMEI ~NP ~Ir 411~ Iffieffir IN/ podendo restaurar os
Complicações gestacionais: DMG, PE e DVHC ciclos ovulatórios; esse
ANIENF "FF INF 4111111111I "Fr medicamento é consi-
HAS derado excelente trata-
~II /MI /IP' ~E/ AMEI ~I INRI mento para pacientes com
Câncer de mama
síndrome dos ovários
AMEI ~II ~V" 411~ /IV ~II policísticos.
Câncer de ovário
Ileer Ileir "Ir /MV~II
Dislipidemia
411~ ~II /NI ~Dr ~I ~II /NI
Figura 13 - Complicações relacionadas à síndrome dos ovários policísticos

Seguem respostas rápidas:


- Hormônio responsável pela hiperplasia de células do estroma ova-
riano com produção androgênica na teca: LH;
Enzima transformadora de androgênio em estrogênio: aromatase;
- Enzima relacionada ao hirsutismo na SOP: 5-a Ifarredutase;
Hormônios que participam da regulação da síntese de androgênios:
LH, ACTH, IGF e inibina;
- Disfunção específica na produção de androgênios: citocromo p450c17
e enzima CYP17;
156 SIC GINECOLOGIA
MEDCEL

- Androgênio geralmente não elevado na SOP: DHEAS; DHEA - pouco


elevado;
- Alterações típicas na hiperinsulinemia: » SHBG, t LH, 1' resposta ao
LH;
- Papel obesidade SOP: hiperinsulinemia, SHBG, t aromatização
periférica;
Relação LH-FSH: elevada 2:1, FSH normal ou diminuído, LH elevado;
- Estrogênio na SOP: elevado, principalmente estrona;
- PRL na SOP: pode estar levemente elevada;
- SHBG na SOP: reduzida;
- Progesterona na SOP: baixa, compatível com a 1@ fase do ciclo;
Diagnóstico da SOP: ciclos menstruais irregulares/hiperandroge-
nismo/ovários policísticos à USG; k 2 critérios de Rotterdam;
- Diagnóstico de ovário policístico: USG 1 ou 2 ovários - k12 folículos
com 2 a 9mm diâmetro ou volume ovariano >10cm3; o diagnóstico é
feito quando há 1 achado em 1 dos ovários.

6. Hiperprolactinemia

A - Definição
A PRL é um hormônio polipeptídio secretado pela adeno-hipófise. Sua
secreção é controlada por meio da constante inibição exercida pela
dopamina. Há um fator estimulador da secreção de PRL, que é o TRH
(fator liberador do hormônio tireotrófico). A ação da PRL difere na ges-
tante e na não gestante. Durante a gestação, seus níveis crescem cons-
tantemente até o termo, mas não ocorre lactação, devido à inibição
exercida pelos estrogênios nos receptores mamários de PRL. Quando
ocorre a dequitação (saída da placenta), há a liberação da ação da PRL
na mama, permitindo a lactação.
Na não gestante, a PRL está diretamente relacionada aos ovários, atu-
ando no crescimento folicular e na dominância folicular com papel sinér-
gico às gonadotrofinas. Se a PRL está elevada, determina um bloqueio
da ação da aromatase, um bloqueio da ação do FSH em seus recepto-
res e, ainda, atresia folicular por bloqueio da maturação. Além da ação
direta nos ovários, a hiperprolactinemia pode inibir a secreção pulsátil
do GnRH. Todos os mecanismos descritos alteram a função ovariana.

B - Apresentação clinica
Os sinais e os sintomas da hiperprolactinemia são:
- Galactorreia: ação direta do aumento de PRL na mama;
Amenorreia: alteração da função ovulatória;
Esterilidade: alteração da função ovulatória;
- Acne: alteração da função ovulatória e hiperandrogenismo;
- Hirsutismo: principalmente, hiperandrogenismo;
- Distúrbios visuais: se a etiologia é tumoral, há aumento da hipófise e
compressão do quiasma óptico, levando a hemianopsia bitemporal;
- Sinais de hipoestrogenismo;
- Outros distúrbios menstruais: oligomenorreia, insuficiência lútea;
Diminuição da libido.
MEDCEL TRANSTORNOS MENSTRUAIS 157

C - Etiologia
a) Uso de medicamentos
Psicotrópicos;
- Antidopaminérgicos (clorpromazina, haloperidol, metoclopramida,
veraliprida, alfametildopa, reserpina);
- Estrogênios;
Progestogênios;
- Antidepressivos triciclicos;
- Opiáceos;
- TRH;
Cocaína.

Tabela 12 - Medicamentos e fitoterápicos associados a hiperprolactinemia

- Antidepressivos ansiolíticos:
Alprazolam;
Buspirona;
lnibidores da monoaminoxidase;
lnibidores da receptação da serotonina.
- Antidepressivos triciclicos;
Metoclopramida;
- Octreotida;
- Sumatriptano;
Anti-hipertensivos:
Atenolol;
Metildopa;
Verapamil.
Ranitidina;
Hormonais:
Estrogênio + medroxiprogesterona;
Medroxiprogesterona injetável;
Contraceptivo hormonal combinado.
- Alguns fitoterápicos;
- Antipsicáticos;
- Clorpromazina;
Ciclobenzaprina;
Danazol,
- Domperidona;
lsoniazida;
- Ácido valproico;
Opioide.

b) Tumores
- Adenoma de hipófise (prolactinoma): os microadenomas são tumo-
res hipofisários menores de 1cm, e os macroadenomas são tumores
de 1cm ou mais. Ambos podem ser secretores de PRL. Suspeita-se de
adenomas quando a dosagem de PRL está acima de 10Ong/dL;
Outros sítios: carcinoma broncogênico e hipernefroma.
158 SIC GINECOLOGIA HEDCEL

Alterações fisiológicas
Alterações fisiológicas do sono e do exercício físico, gravidez, lactação,
situações de estresse, coito e manipulação mamária.

Doenças endocrinas
- Hipotireoidismo;
- Hiperplasia adrenal;
- Insuficiência hepática.

Alterações da parede torácica


Mastectomia, herpes-zóster, mastoplastia e traumas, principalmente
queimaduras.

D - Diagnóstico
A hipótese de hiperprolactinemia deve ser investigada sempre que a
paciente apresenta queixa de alteração menstrual, principalmente se
tende a oligomenorreia ou mesmo amenorreia e, também, galactorreia
e esterilidade. Inicia-se com anamnese completa, afastando-se outras
possibilidades, como o uso de medicações e gestação atual. Devem-
-se, também, pesquisar doenças que possam explicar as manifestações
apresentadas, como hipotireoidismo, alterações hepáticas etc.
Roteiro diagnóstico: dosagem de PRL + dosagem de TSH para afastar
hipotireoidismo.
- Se PRL <25mg/mL: normal;
- Se PRL >100mg/mL: provável etiologia tumoral que deverá ser inves-
tigada mais profundamente com radiografia de sela túrcica, TC de crâ-
nio, RNM (melhor exame) e avaliação de campo visual;
- Se PRL entre 25 e 100mg/mL: procurar causas diversas, desde uso
de medicamentos a outras doenças endócrinas e doenças da parede
torácica.

E - Tratamento
O tratamento está indicado para sintomáticas ou pacientes com tumor de
hipófise de grande extensão (macroadenoma hipofisário). Já as pacien-
tes com microadenomas de hipófise assintomáticos não têm indicação
de tratamento, mas deve-se realizar acompanhamento clínico. Quando
há indicação, o tratamento pode ser clínico, cirúrgico ou radioterápico:
- Clinico: o mais indicado inicialmente, com boa resposta terapêutica na
maioria dos casos. As drogas mais utilizadas são a bromocriptina, com
posologia diária e efeitos colaterais como tontura, cefaleia, náuseas,
depressão, alucinações, hipotensão ortostática, e a cabergolina, com
posologia semanal e menor incidência de efeitos colaterais;
- Cirúrgico: ressecção transesfenoidal seletiva, reservada aos casos de
tumor de hipófise extenso (macroadenoma) refratário ao tratamento
clínico, ou a pacientes com intolerância à medicação. Pode trazer
complicações como meningite, diabetes insipidus, fístulas liquóricas e
pan-hipopituitarismo;
- Radioterapia: reservada aos casos de recidiva de tumores após res-
secção cirúrgica, para tentar reduzir tumores irressecáveis refratá-
rios à medicação e para os casos de tumores mistos. Seus resultados
são menos eficientes do que o tratamento cirúrgico, com resposta
lenta e insatisfatória na maioria dos casos.
MEDCEL TRANSTORNOS MENSTRUAIS 159

Tabela 13 - Comparação para o diagnóstico dos diversos transtornos menstruais e diagnósticos diferenciais

Hipotireoidismo Dosar TSH.

Hiperprolactinemia Dosar PRL e pesquisar macroprolactinoma.

Hiperplasia adrenal congênita de inicio tardio Dosar 17-hidroxiprogesterona.

Tumor ovariano/hipertecose Dosar testosterona total.

Tumor de adrenal Dosar sulfato de deidroepiandrosterona.

Síndrome de Cushing Dosar fração livre do cortisol urinário e teste da supressão do cortisol.

Resumo
Quadro-resumo

- Origem: possivelmente, ciclos ovulatórios ou anovulatórios. Estes últimos (90%) são comuns nos extremos repro-
dutivos: imaturidade do eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano na adolescência e falência ovariana no climatério. O
SUA, devido a ciclos ovulatórios, acontece por produção inadequada de estrogênio e progesterona;

- Etiopatogenia: distúrbios no eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano, excesso de ou falta de estrogênios, aumento das


prostaglandinas, distúrbios de outros órgãos, insuficiência hepática/cirrose, hipertireoidismo, hipotireoidismo;

- Apresentação clínica: hipermenorreia, polimenorreia, menorragia, entre outros;

Diagnóstico: afastar quaisquer patologias orgânicas por meio de anamnese/exame físico e exames complementares;

- Tratamento: clínico (anti-inflamatórios não hormonais - progestogênios: danazol; anticoncepcionais hormonais com-
binados - análogos de GnRH: SIU medicado com progesterona); cirúrgico (ablação endometrial, curetagem uterina,
histerectomia).

Hiperandrogenismo
Trata-se do excesso da concentração ou da ação dos androgênios na mulher, produzidos a partir do colesterol pelas
glândulas suprarrenais e pelos ovários, em grande parte (80%) ligado à SHBG ou albumina (19%), restando pequena
fração livre no plasma (1%);

- Diversos fatores podem levar ao hiperandrogenismo. Os mais importantes são aumento da produção de androgê-
nios ovarianos e suprarrenal, uso de substâncias androgênicas, diminuição da SHBG com aumento das taxas livres
de androgênios circulantes;

- Apresentação clínica: alopecia androgenética, aumento da massa muscular, engrossamento da voz, aumento do
clitóris e alterações menstruais - de ciclos oligomenorreicos a amenorreia, esterilidade por fator ovulatório, aborta-
mentos de 1° trimestre por insuficiência lútea, hirsutismo, acne, obesidade centrípeta, acantose nigricans;

- Diagnóstico clínico: anamnese e exame físico;

- Laboratório: dosagens séricas dos androgênios (androstenediona, sulfato de deidroepiandrosterona, testos-


teronas total e livre), PRL, hormônios tireoidianos, FSH e LH para avaliar SOP; exames de imagem para avaliar
ovários e suprarrenais (USG/TC/RNM), a fim de excluir as neoplasias.

Síndrome dos ovários policísticos


Corresponde ao hiperandrogenismo acompanhado por anovulação crônica com etiopatogenia ainda não definida;

- Há aumento na produção androgênica, devido a hiperplasia das células tecais sob estímulo do LH que está
aumentado em relação ao FSH (relação LH-FSH >2:1). Os níveis relativamente baixos de FSH inibem a maturação
folicular adequada e o fenômeno de dominância folicular, persistindo folículos em estágios iniciais da maturação
e em atresia, o que oferece o aspecto policístico aos ovários;
160 SIC GINECOLOGIA HEDCEL

Síndrome dos ovários policísticos


O quadro clínico é composto por ciclos menstruais irregulares (espaniomenorreia ou amenorreia), hirsutismo, acne,
alopecia, obesidade e ovários aumentados com múltiplos cistos;

- O tratamento envolve perda de peso, drogas antiandrogénicas (o acetato de ciproterona é o mais utilizado), metfor-
mina (quando houver resistência periférica a insulina) e citrato de clomifeno (indutor da ovulação) nas pacientes que
desejem engravidar.

Hiperprolactinemia
A PRL é secretada pela adeno-hipófise. Sua secreção é controlada por meio da constante inibição exercida pela
dopamina. Há um fator estimulador da secreção de PRL, que é o TRH;

A PRL atua no crescimento e na dominância folicular com papel sinérgico às gonadotrofinas. Se a PRL estiver eleva-
da, determinam-se bloqueio da ação da aromatase, bloqueio da ação do FSH em seus receptores e atresia folicular
por bloqueio da maturação. Além da ação direta nos ovários, a hiperprolactinemia pode inibir a secreção pulsátil do
GnRH, alterando a função ovariana, indiretamente;

- Os sinais e sintomas são galactorreia (ação direta do aumento de PRL na mama), amenorreia, esterilidade, acne,
hirsutismo, distúrbios visuais, sinais de hipoestrogenismo, outros distúrbios menstruais (espaniomenorreia, oligo-
menorreia, insuficiência lútea) e redução da libido;

- A etiologia envolve o uso de medicamentos (psicotrópicos, antidopaminérgicos, estrogênios, progestogênios, antide-


pressivos tricíclicos), tumores, doenças endócrinas (hipotireoidismo, hiperplasia adrenal, insuficiência hepática);

- O roteiro diagnóstico compreende dosagem de PRL + dosagem de TSH para afastar hipotireoidismo:
Se PRL <25mg/mL: normal;
Se PRL >100mg/mL: provável etiologia tumoral que deverá ser investigada mais profundamente com radiografia
de sela túrcica, TC de crânio, RNM (melhor exame) e avaliação de campo visual;
Se PRL entre 25 e 100mg/mL: procurar causas diversas, desde uso de medicamentos, outras doenças endócrinas e
doenças da parede torácica.

- No tratamento clínico, a droga mais utilizada é a cabergolina. O tratamento cirúrgico consiste na ressecção tran-
sesfenoidal seletiva, reservada aos casos de tumor de hipófise extenso (macroadenoma) refratário ao tratamento
clínico, ou a pacientes com intolerância à medicação;

- A radioterapia está reservada aos casos de recidiva de tumores após ressecção cirúrgica, para tentar reduzir tumo-
res irressecáveis refratários à medicação e para os casos de tumores mistos.

Resposta
da questão do capítulo

1. D

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