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Processo:
361/10.3GBLLE
Nº Convencional: 5ª SECÇÃO
Relator: MANUEL BRAZ
Descritores: HOMICÍDIO
AGRAVANTE
ARMA DE FOGO
CAÇADEIRA
DETENÇÃO DE ARMA PROIBIDA
QUALIFICAÇÃO JURÍDICA
CONCURSO DE INFRACÇÕES
CONCURSO APARENTE
MEDIDA CONCRETA DA PENA
PARENTESCO
PENA ACESSÓRIA
INTERDIÇÃO DE DETENÇÃO
USO E PORTE DE ARMA
Sumário :
O arguido interpôs recurso directo para este Supremo Tribunal, concluindo assim a sua
motivação:
«I – Vem o presente recurso da douta decisão proferida nestes autos, que condenou o
Recorrente.
II – A discordância do Recorrente tem a ver com a medida concreta da pena e a sua
aplicação.
III – A pena aplicada (17 anos e 10 meses de prisão) é uma pena demasiado severa para
os factos em apreço e face ao que se passou na audiência discussão e julgamento.
IV – O Tribunal “a quo” para a determinação da medida da pena e a aplicação daquela
pena concreta de (17 anos e 10 meses de prisão), considerou no seu ponto 5, (fls. 17 da
decisão), que “Tendo em conta a legitimação do nosso direito penal a partir da ideia de
necessidade social, com expressa consagração constitucional, e cuja função é a tutela de
bens jurídicos, a aplicação de qualquer pena só ganha sentido se estruturada e aplicada
em termos preventivos “, e mais à frente conclui: “Em casos como este, em que,
relativamente a alguns dos crimes em causa, há alternativa entre a pena de prisão ou
multa, de acordo com o art. 70º do Código Penal, o Tribunal deve dar prevalência à
pena de multa, sempre que esta realize de forma adequada e suficiente as finalidades da
punição — especiais e gerais “.
V – Ora, com o devido respeito por opinião contrária, afigura-se ao recorrente também
aqui que a medida da pena única de (17 anos e 10 meses de prisão), ora aplicada é
inquestionavelmente exagerada.
VI – Com efeito, o Tribunal “a quo” para aplicar aquela pena única de prisão, apesar de
desqualificar o crime mais grave, (homicídio), por não se mostrarem “provados factos
que possam levar à qualificação“, (fls. 13 da decisão), deu especial relevância aos
factores agravativos relacionados com a prática do crime, (detenção ilegal de arma),
dadas as (elevadas exigências de prevenção especial, situação de perigo e grau de
culpa), sem atender – entre outros – à ausência de antecedentes criminais do aqui
Recorrente.
VII – Nem tão pouco, considerou os factores atenuantes de especial importância, como
sejam o da confissão parcial por parte do Recorrente, os sentimentos manifestados pelo
recorrente no cometimento do crime e os motivos que o determinaram, as condições
pessoais do Recorrente e a sua situação económica, e ainda a sua conduta anterior aos
factos e posterior à prática destes, tendo demonstrado profundo arrependimento público,
principalmente aos seus familiares.
VIII – Por outro lado, por diversas vezes durante o julgamento, o recorrente admitiu os
factos mais relevantes para a descoberta da verdade.
IX – O Recorrente durante o julgamento admitiu os seus erros, demonstrando claro
arrependimento através da confissão, pedindo perdão aos seus familiares, (mãe, cunhada
e sobrinho), pelos actos cometidos.
X – Também foi com base nesses factos, admitidos pelo Recorrente, que o Tribunal “a
quo” deu como provada parte da acusação como se pode ver a fls. 3 a 7 da decisão, em
que o próprio Tribunal “a quo” refere que tais factos “... não merecem qualquer
controvérsia em julgamento“.
XI – Contudo, sublinhe-se, o Tribunal “a quo” refere “Que o arguido disparou a arma
em direcção ao irmão (...) O próprio o admitiu (embora tentando apresentar uma outra
versão) “(fls. 10 da decisão).
XII – Mais, confirmou a espingarda de caça, de canos de alma lisa e cumprimento de 71
cm, com o número de série 7017, “...era pertença de seu falecido pai e estava registada
em nome de sua mãe, I...C...” (fls. 6 da decisão).
XIII – Pela leitura da decisão se vê que o Recorrente é oriundo de um meio familiar de
humildes condições, sem passado delituoso, onde lhe foram incutidas regras adequadas
de convivência social (fls. 7 e 8 da decisão).
XIV – Aliás, o Tribunal “a quo” no ponto 1.15 da sua douta decisão (a fls. 6), refere que
após o Recorrente ter cometido os crimes de que foi condenado, “...dirigiu-se ao posto
territorial da Guarda Nacional Republicana de ..., onde se entregou“, não dando em
nosso entender, qualquer relevo a este facto que milita a favor do Recorrente na
fundamentação da decisão/condenação, pois entende o Recorrente que o Tribunal “a
quo“ tinha que considerar essa sua actuação em seu benefício aquando da aplicação da
medida concreta da pena, e não o fez.
XV – Violando assim o artigo 71º do Código Penal.
XVI – Dada a elevada idade do Recorrente, a doença grave de que padece e a
circunstância de ser ainda o único sustento da família, o Tribunal “a quo” não solicitou
uma perícia sobre a sua personalidade, apesar de se observar no relatório social ou de
informação dos serviços de reinserção social, fls. 432, que, “Apesar de o arguido ser
descrito como pessoa calma e responsável, parece apresentar alguma instabilidade
emocional, que poderá estar ligada à sua actual situação de saúde e de que teve
conhecimento pouco tempo antes da sua detenção “.
XVII – Violando assim os artigos 369°, n° 1, e 370°, n° 1, ambos do Código Processo
Penal.
XVIII – Não sendo possível averiguar em concreto, qual o seu estado clínico e
psicológico.
XIX – Atendendo que, poderia ser tido em consideração para a escolha da medida
concreta da pena, podendo até consagrar uma diminuição da pena aplicada ao
Recorrente, que não se concretizou.
XX – Sendo aplicada ao Recorrente (l7anos e 10 meses de prisão) por excessivamente
gravosa.
XXI – Também por aqui, o Tribunal “a quo” violou o artigo 71° do Código Penal.
XXII – O Tribunal “a quo” não considerou ainda, para a medida concreta da pena, o
facto de o Recorrente ter a seu cargo ainda duas filhas de 18 e 12 anos de idade, que
estão a estudar, e devia tê-lo considerado.
XXIII – O facto de o Recorrente, apesar da sua elevada idade, estar actualmente ainda
no activo e a trabalhar, como única forma de obter um rendimento mensal para garantir
o único sustento da sua família, devia ter beneficiado de uma redução na medida
concreta da pena, e não beneficiou.
XXIV – Também por aqui o Tribunal “a quo” violou o artigo 71° do Código Penal.
XXV – Por outro lado, e face aos factos e ao direito apurados no julgamento, a pena de
prisão aplicada ao recorrente (17 anos e 10 meses) peca, por si só, por excessivamente
gravosa, ultrapassando a medida da culpa.
XXVI – Pelo que foi violado o n° 2 do artigo 40° do CP.
Ao condenar o Arguido, ora Recorrente, atenta a moldura penal respectiva, o douto
Tribunal de 1ª Instância não considerou, designadamente, o disposto do artigo 71° e n°
2 do artigo 40°, ambos do Código Penal e artigo 369°, n° 1, e artigo 370° n° 1, ambos
do Código Processo Penal, pelo que foram violados estes mesmos preceitos legais.
Não devia o ora Recorrente ter sido condenado em pena tão elevada, podendo e
devendo este Supremo Tribunal de Justiça, determinar a revogação do douto Acórdão
ora posto em crise, na parte da aplicação da medida da pena, por outro, que tenha em
consideração as circunstâncias atenuantes supra referidas, aplicando ao recorrente uma
pena de prisão nunca superior a 10 anos».
Conhecendo:
1. O recorrente começa por dizer que a sua discordância se refere «à medida concreta da
pena e à sua aplicação», percebendo-se, pela sua argumentação, que tem em vista a pena
única, cuja medida refere repetidamente, classificando-a como excessiva, e as penas
parcelares, não só porque alega, no nº 11 da sua motivação, circunstâncias relativas a
cada um dos crimes, que, na sua perspectiva, lhe serão favoráveis («tendo em conta que,
quer relativamente ao crime de homicídio, quer no que concerne ao crime de detenção
ilegal de arma, o ora recorrente não tem antecedentes criminais neste ou noutros crimes,
tendo o mesmo confessado que não possuía licença para a utilização da arma que
detinha, a qual era pertença de sua mãe»), mas também porque diz que o tribunal devia
ter solicitado uma perícia sobre a sua personalidade, perícia essa que podia conduzir a
«uma diminuição da pena aplicada». Esta omissão em seu entender violaria o disposto
nos artºs 369º e 370º do CPP.
2. O arguido não retira consequências da alegação de que o tribunal recorrido devia ter
diligenciado pela realização de uma perícia sobre a sua personalidade. E os artigos 369º
e 370º do CPP são alheios a essa questão. Enquanto este dispõe exclusivamente sobre a
possibilidade de o tribunal solicitar «a elaboração de relatório social ou de informação
dos serviços de reinserção social, ou a respectiva actualização», aquele, no que se refere
à perícia sobre a personalidade do arguido, trata apenas da sua leitura na fase da
deliberação e votação, sendo estranho à sua realização. Sobre esta rege o artº 160º do
mesmo código.
Esta perícia podia ter lugar até ao encerramento da discussão, previsto no artº 361º, nº 2,
pelo que a sua não realização, se fosse essencial para a descoberta da verdade,
configuraria a nulidade prevista no artº 120º, nº 2, alínea d) [«a omissão posterior de
diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade»], que,
para poder ser conhecida, tinha de ser arguida perante o tribunal recorrido até ao
encerramento da discussão, nos termos do nº 3, alínea a), deste último preceito.
Não o tendo sido, se existiu, sanou-se.
3. Antes de entrar na apreciação da questão da medida das penas ou da pena, tem de ser
definida a qualificação jurídica dos factos, que é de conhecimento oficioso, como
resulta directamente do artº 424º, nº 3, do CPP. Desde logo, há que decidir se é de
censurar a decisão recorrida no ponto em que fez accionar, em relação à pena do
homicídio, a agravação prevista no nº 3 do artº 86º da Lei nº 5/2006, como pretende a
senhora procuradora-geral-adjunta junto deste Supremo Tribunal, em cujo parecer se
pode ler:
«A norma do nº 3 do artigo 86º da Lei nº 5/2006, de 23/02, na redacção introduzida pela
Lei nº 17/2009, de 06/05, é uma norma geral.
Sempre que outro regime não esteja especialmente previsto, as penas aplicáveis aos
crimes cometidos com arma são agravadas de um terço nos seus limites mínimo e
máximo.
Ora, para o crime de homicídio, a lei prevê um regime especial de agravação quando
aquele tenha sido cometido com utilização de meio particularmente perigoso ou que se
traduza na prática de um crime de perigo comum.
Daí que a norma geral constante do artigo 86º, nº 3, da referida lei tenha sempre de
ceder face ao regime especial previsto pelo Código Penal para o crime de homicídio.
Com o argumento de que se afastou justificadamente a aplicação do artigo 132º do
Código Penal, por considerar-se que, no caso concreto, os factos cometidos não eram
integradores da cláusula da especial censurabilidade concretizada na alínea h) do nº 2 do
artigo 132º do CP, não pode “recuperar-se” o regime geral previsto apenas para os
crimes relativamente aos quais a própria lei não pretendeu um regime especial de
punição».
É o seguinte o texto do nº 3 do artº 86º:
«As penas aplicáveis a crimes cometidos com arma são agravados de um terço nos seus
limites mínimo e máximo, excepto se o porte ou uso de arma for elemento do respectivo
tipo de crime ou a lei já previr agravação mais elevada para o crime, em função do uso
ou porte de arma».
E, em complemento, estabelece-se no nº 4:
«Para os efeitos previstos no número anterior, considera-se que o crime é cometido com
arma quando qualquer comparticipante traga, no momento do crime, arma aparente ou
oculta prevista nas alíneas a) a d) do nº 1, mesmo que se encontre autorizado ou dentro
das condições legais ou prescrições da autoridade competente».
Como se diz no nº 3, a agravação aí prevista só não terá lugar quando «o porte ou uso de
arma for elemento do respectivo tipo de crime ou a lei já previr agravação mais elevada
para o crime, em função do uso ou porte de arma».
O uso ou porte de arma não é elemento do crime de homicídio, cujo tipo legal
fundamental é o previsto no artº 131º do CP. Pode ser um factor de agravação, mas só o
será se, para além de preencher um dos exemplos-padrão «meio particularmente
perigoso» ou «prática de um crime de perigo comum» da alínea h) do nº 2 do artº 132º,
revelar «especial censurabilidade ou perversidade». Enquanto a agravação do nº 3 do
artº 86º, encontrando fundamento num maior grau de ilicitude, tem sempre lugar se o
crime for cometido com arma, a do artº 132º só operará se o uso de arma ocorrer em
circunstâncias reveladoras de uma especial maior culpa. Além, para haver agravação,
basta o uso de arma no cometimento do crime; aqui não.
O nº 3 do artº 86º só afasta a agravação nele prevista nos casos em que o uso ou porte de
arma seja elemento do respectivo tipo de crime ou dê lugar, por outra via, a uma
agravação mais elevada. A agravação do artº 86º, nº 3, não é arredada ante a mera
possibilidade de haver outra agravação, mas apenas se for de accionar efectivamente
essa outra agravação. Ora, o uso de arma não é elemento do crime de homicídio, como
se disse, e, no caso, não levou ao preenchimento do tipo qualificado do artº 132º.
Não há, assim, fundamento para afastar a agravação daquele artº 86º, nº 3.
4. Questão que deve ser posta nesta sede é a de saber se o arguido cometeu
efectivamente o crime de detenção de arma proibida.
Por morte do pai do arguido e da vítima não se procedeu à partilha dos bens existentes.
Um desses bens era a casa de habitação onde residia a mãe, casa essa que tinha anexos,
num dos quais residia o recorrente. A espingarda caçadeira em causa pertencera ao pai
do arguido, estava registada em nome da mãe e na altura encontrava-se no anexo que
servia de habitação ao recorrente. Não se sabe a que título ali se encontrava, quem a
colocara ali e desde quando ali se encontrava. Sabe-se apenas que a foi ali buscar para
disparar sobre o irmão. Não se pode assim ter como assente que arma era detida pelo
arguido. Este acto, único conhecido do recorrente em relação à arma, configura simples
uso: arguido limitou-se a utilizar a arma para realizar o homicídio.
Essa conduta do recorrente, não possuindo ele a necessária licença de uso e porte,
preenche o tipo objectivo do crime do artº 86º, nº 1, alínea c), da Lei nº 5/2006. Na
verdade, a espingarda em causa é uma «arma de fogo longa», como se vê das alíneas p),
q) e s) do nº 1 do artº 2º desse diploma, por ter cano de 71 cm (facto nº 12); é uma arma
de «tiro a tiro», na caracterização da alínea aj), visto não ter depósito nem carregador,
sendo alimentada manualmente (facto nº 12); e é uma arma de cano de «alma lisa»
(facto 12). Trata-se, pois, nos termos do artº 3º, nº 6, alínea c), de uma arma da classe D:
«São armas da classe D: As armas de fogo longas de tiro a tiro de cano de alma lisa». E,
conforme o disposto no artº 8º, nº 2, alínea a): «A aquisição, a detenção, o uso e o porte
de armas da classe D podem ser autorizados: Aos titulares de licença de uso e porte de
arma das classes C ou D».
E, não obstante o homicídio ser agravado em função da utilização da espingarda, ao
abrigo do falado artº 86º, nº 3, não é valorada nessa agravação a situação de proibição
em que o recorrente se encontrava em relação à arma, por falta da licença de uso e
porte. Isso porque à agravação é indiferente que o agente esteja numa situação de
legalidade ou de ilegalidade em relação à arma: a agravação teria lugar mesmo que o
recorrente tivesse licença de uso e porte.
Mas, apesar de o comportamento global do arguido ser subsumível a dois tipos legais –
homicídio e uso de arma proibida –, não deve concluir-se por um concurso efectivo de
crimes, mas antes aparente.
Vão nesse sentido os ensinamentos de Figueiredo Dias, que, depois de ter como assente
que «é a unidade ou pluralidade de sentidos de ilicitude típica» existente no
comportamento global do agente «que decide em definitivo da unidade ou pluralidade
de (…) de crimes», considera:
«A ideia central que preside à categoria do concurso aparente deve pois ser, repete-se, a
de que situações da vida existem em que, preenchendo o comportamento global mais
que um tipo legal concretamente aplicável, se verifica entre os sentidos de ilícito
coexistentes uma conexão objectiva e/ou objectiva tal que deixa aparecer um daqueles
sentidos de ilícito como absolutamente dominante, preponderante, ou principal, e hoc
sensu autónomo, enquanto o restante ou os restantes surgem, também a uma
consideração jurídico-social segundo o sentido, como dominados, subsidiários ou
dependentes; a um ponto tal que a submissão do caso à incidência das regras de punição
do concurso de crimes (…) seria desproporcionada, político-criminalmente desajustada
e, ao menos em grande parte das hipóteses, inconstitucional. A referida dominância de
um dos sentidos dos ilícitos singulares pode ocorrer em função de diversos pontos de
vista: seja, em primeiro lugar e decisivamente, em função da unidade de sentido social
do acontecimento ilícito global; seja em função da unidade de desígnio criminoso; seja
em função da estreita conexão situacional, nomeadamente espácio-temporal,
intercedente entre diversas realizações típicas singulares homogéneas; seja porque
certos ilícitos singulares se apresentam como meros estádios de evolução ou de
intensidade da realização típica global» (Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 2ª edição,
páginas 989 e 1015).
Como se viu, o arguido foi ao interior do anexo que lhe servia de habitação, pegou na
espingarda, que ali se encontrava, não possuindo a necessária licença de uso e porte,
trouxe-a para o exterior, apontou-a à vítima e disparou sobre ela, matando-a. A conexão
existente entre a conduta do arguido em relação à arma e o homicídio, esgotando-se
aquela na prática deste, faz aparecer, no comportamento global, o sentido de ilícito do
homicídio absolutamente dominante e subsidiário o sentido de ilícito da utilização da
arma proibida, havendo desde logo «unidade de sentido social do acontecimento ilícito
global», pois o que o recorrente pretendeu foi matar o irmão, não sendo o uso de arma
proibida mais que o processo de que se serviu para atingir o resultado almejado.
O autor citado aponta mesmo como exemplo de concurso aparente um caso como este:
«Circunstâncias como, p. ex., a de se utilizar arma proibida (…) constituem condutas
que concorrem com a de homicídio, em princípio, sob a forma de concurso aparente»
(ob. cit., página 1017).
Não é, pois, correcta a decisão recorrida no ponto em que autonomizou como crime do
artº 86º, nº 1, alínea c), da Lei nº 5/2006, o uso da arma, devendo o arguido ser
absolvido da acusação nessa parte.
A utilização de arma proibida relevará apenas na determinação da pena concreta do
homicídio.
Não implicando esta alteração da qualificação jurídica dos factos necessidade de defesa,
não há que accionar a notificação a que alude o referido artº 424º, nº 3, última parte.
Decisão:
Em face do exposto, acordam os juízes do Supremo Tribunal de Justiça, no provimento
parcial do recurso, em alterar a decisão recorrida do seguinte modo:
a) absolvem o arguido da acusação relativamente ao crime p. e p. pelo artº 86º, nº 1,
alínea c), da Lei nº 5/2006;
b) fixam em 14 (catorze) anos de prisão a pena do crime homicídio, p. e p. pelas
disposições combinadas dos artºs 131º do CP e 86º, nº 3, da Lei nº 5/2006; e
c) em 14 (catorze) anos a medida da pena acessória de interdição de detenção, uso e
porte de armas.
Sem custas, uma vez que não houve decaimento total – artº 513º, nº 1, do CPP, na
redacção dada pelo DL nº 34/2008, de 26 de Fevereiro.
Lisboa, 31 de Março