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Tutoria de Contencioso Administrativo e Tributário Andreia Marouvo

Professor João Miranda


Caso I:

Imagine que a Câmara Municipal de Lisboa decidia hoje aprovar uma deliberação com
o seguinte teor:
1. A fim de contribuir para a ajuda ao povo ucraniano, impõe-se aos proprietários de
imóveis sitos no município de Lisboa arrendados em sistema Airbnb com rendimentos
superiores a 200.000€ anuais, por referência ao ano de 2019, a cedência gratuita de
10% da sua capacidade hoteleira para acolhimento de refugiados daquele Estado.
2. Os proprietários deverão comunicar quais os imóveis que disponibilizarão para este
efeito até final do mês de Maio, na sequência de notificação da Câmara Municipal de
Lisboa.

Armando, proprietário de vários imóveis em Lisboa explorados no sistema Airbnb e que


sofreu prejuízos avultados no período pandémico, quer propor uma acção para evitar a
notificação.
Bruna, proprietária de vários imóveis no Porto explorados no sistema Airbnb, considera
esta medida um perigoso precedente, que afronta diversos princípios que devem
nortear a conduta administrativa, e quer reagir contra a deliberação.
A Associação Lisbonense de proprietários (ALP) entende que a medida é
inconstitucional a vários títulos e dá indicação ao seu advogado para a impugnar.

Responda fundamentadamente às questões seguintes:


a) Analise a viabilidade de cada uma das pretensões, nomeadamente quanto:
i) Ao pedido a formular;
ii) Ao tribunal competente;
iii) Á base de legitimidade (ativa e passiva);
iv) Ao prazo de apresentação da petição
b) Armando, Bruna e ALP poderiam coligar-se?
c) Haveria algum pedido urgente especialmente apto a evitar os prejuízos para os
sujeitos indicados?

Resolução:

Da deliberação resulta um regulamento. Da sequência de necessitar de um ato


administrativo para ser operativa – a notificação – classifica-se como norma não
imediatamente exequível.

Em relação aos pedidos:


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Professor João Miranda
O pedido será de acordo com o art.37/1º c) CPTA. O ato notificação tem juridicidade, é
um ato administrativo que vem dar execução a uma norma, norma essa mediatamente
exequível, para lhe dar execução é preciso emitir os atos de notificação e esses atos
servem para que o particular indique à câmara quais são os 30/100 imóveis que vão
ficar adstritos à ocupação temporária pelos refugiados.

(Atos e normas: apesar da identificabilidade dos sujeitos, sempre que fazemos o


recorte da situação retroativa as pessoas permanecem ali, no entanto, este cruzamento
de dados que é feito demonstra não ser evidente nomeadamente quanto às pessoas
que exploravam antes e que agora podem ter deixado de explorar porque faliram,
mudaram de vida – é uma não identificabilidade imediata. Também não é referido a
durabilidade da deliberação – a norma pode ser válida este ano, no próximo ano, daqui
em diante e por isso podem alguns não exercer este ano e reabrir no ano seguinte, mas
vão voltar a identificar-se, pode então haver uma normatividade subjacente na
vocação de continuidade da norma e aí estamos mais próximos da norma não
imediatamente exequível do que o ato.)

Armando tinha interesse processual segundo o artigo 39.º CPTA, interesse qualificado.
Armando não pode impugnar a norma pois ela não é imediatamente exequível, só o
poderia fazer caso o ato – notificação – já tivesse chegado – art.73/3.º. A única
entidade que pode impugnar regulamentos não imediatamente exequíveis é o MP.

Quanto a Bruna, há que averiguar a legitimidade no art.73.º, n.º 3 CPTA. Bruna não
tem legitimidade.
(*Nota: em matéria de atos administrativos, há uma norma que permite que as
pessoas que residam no município atuem: art.55/2.º CPTA. *Discussão se faria sentido,
ou não, estender a lógica ao art.73/3.º 2ª parte CPTA*).

B quer atacar numa ação principal a norma então quer aplicar o art.73/3º b) !! Se não
quiser atacar a norma na ação principal será incidental segundo o art.73/3º a) CPTA
(esta alínea não implica a sua vigência na ordem jurídica, por isso é que é importante o
n4).

Quanto à Associação. Esta não teria legitimidade, pois prosseguem interesses


individuais homogéneos, dado que o direito de propriedade é um direito individual –
abarca o 9/1º CPTA que é uma regra geral sobre a legitimidade ativa (Não se aplica o
art.73/3.º CPTA).

No entanto, a Associação pode impugnar o ato de aplicação, nos termos do artigo


55/1.º c) e pedir a desaplicação da norma - art.73/3.º a).
Tutoria de Contencioso Administrativo e Tributário Andreia Marouvo
Professor João Miranda

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