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Impostos, taxas e contribuições

financeiras
O artigo 3.º/2 da Lei Geral Tributária (LGT), lido em conjugação com o artigo 165.º/1/i) da CRP,
permite enquadrar os tributos em três grandes categorias:

os impostos, as taxas e as contribuições financeiras.

Artigo 3.º/2 da LGT e 165.º/1/i) da CRP


Impostos Artigo 4.º/1 da LGT

Os impostos são tributos de caráter unilateral, materializados em prestações pecuniárias, cuja finalidade
passa pela arrecadação de receitas (a título primário ou secundário). Estruturalmente, os impostos são
unilaterais e, como tal, não existe uma contraprestação direta e imediata (há sempre subjacente a ideia de
financiamento das despesas). Os impostos baseiam-se na capacidade contributiva (i.e., na capacidade
económica) dos sujeitos passivos assentando em critérios ad valorem (incidem sobre o valor de algo) - artigo
4.º/1 da LGT.

Os impostos estão sujeitos ao princípio orçamental da universalidade e, como tal, servem para financiar
todas as despesas, não se encontrando, por isso, consignados (art. 9.º/1 e 16.º da LEO).
Ta x a s Artigo 4.º/2 da LGT

As taxas são tributos de caráter bilateral, que pressupõem a existência contraprestação direta e imediata,
que tem de ser individualizável e presente. O modo de quantificação das taxas é feito pelo princípio da
cobertura dos custos. Divergência doutrinária.

À luz do artigo 4.º/2 da LGT as taxas podem assentar na prestação concreta de um serviço público, na
utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos
particulares
Artigo 4.º/3 da LGT

Contribuições financeiras
Quanto às contribuições financeiras podemos ter: contribuições financeiras unilaterais (contribuições especiais)
ou contribuições financeiras bilaterais (contribuições financeiras).

Contribuições financeiras unilaterais: Cometidas a reserva de lei da AR


(artigos 165.º/1/i) e 2 e 103.º/2
Ad valorem; da CRP

Consignadas a uma entidade pública de base não territorial.

Contribuições financeiras bilaterais:


Utilidade de grupo, sem contraprestação individualizável.
Re l e v â n c i a p r á t i c a
Em termos práticos, a distinção entre imposto, taxa ou contribuição financeira releva para o
princípio da legalidade na vertente da reserva de lei.

Impostos e contribuições financeiras unilaterais

Cometidos a reserva de lei da AR


(artigos 165.º/1/i) e 2 e 103.º/2
da CRP
Benefícios Fiscais
Os benefícios fiscais são normas de exceção à incidência tributária Artigo 2.º/1 do EBF

Pretende-se um desagravamento fiscal pela prossecução de interesses públicos extrafiscais relevantes (que
se sobrepõem às finalidades fiscais de arrecadação de receita).

A criação de um benefício implica um desvio ao princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP). Há que
encontrar um valor, direito, interesse ou princípio no nosso ordenamento jurídico para que se possa sopesar
os valores em causa, através do princípio da proporcionalidade em sentido amplo (artigo 18.º/2 da CRP).
Benefícios Fiscais
Adequação – Necessidade – Proporcionalidade em sentido estrito.

Princípio do ganho (através da existência de um ganho para a comunidade como um todo).

Princípio do mérito (o benefício fiscal deve ser visto como um prémio da conduta meritória do sujeito
passivo, contribuindo para o bem-estar social).

Importa, no caso da criação de um benefício fiscal, ver a aplicação da lei no tempo, bem como o
princípio da legalidade na vertente da reserva de lei (artigo 103.º/2 da CRP).
Re l a ç ã o j u r í d i c o - t r i b u t á r i a –
sujeitos

O sujeito ativo, nos termos do artigo 18.º/1 da LGT, é a entidade de direito público titular do direito de
exigir o cumprimento das obrigações tributárias – Estado ou Fisco, via de regra.

O sujeito passivo, nos termos do artigo 18.º/3 da LGT, é a entidade que se encontra vinculado ao
cumprimento da prestação pecuniária.
Substituição tributária
Enumerar os sujeitos da relação jurídico-tributária – o sujeito ativo será o Estado ou o Fisco (artigo 18.º/1)
ou ainda, no caso das quotizações para a Segurança Social, a própria Segurança Social; os sujeitos
passivos serão o substituto e o substituído (artigo 18.º/3).
Retenção na fonte
A substituição surge consagrada no artigo 20.º/1 da LGT (artigo 20.º/2 e 34.º
da LGT)

Dedução no rendimento,
no momento do seu
pagamento
Substituição tributária
1.º definir o tipo de retenção em causa:
Retenção na fonte a título definitivo: quando não existam mais obrigações tributárias ou acertos (ex: quotizações para a
Segurança Social);

Retenção na fonte por conta do imposto devido ao final: quando exista uma obrigação declarativa e acerto dos valores
que foram retidos (ex: IRS).

2.º determinar os responsáveis:

Substituição tributária Incumprimento do dever de retenção e/ou de entrega

Responsáveis – artigo 28.º


Substituição tributária
Havendo retenção, mas não havendo entrega ao Estado

Artigo 28.º/1 da LGT

A entidade obrigada (substituto) à entrega é a única responsável. O substituído fica desonerado de


qualquer responsabilidade.

O artigo aplica-se independentemente da retenção ser a título definitivo ou por conta do imposto devido ao
final.
Substituição tributária
Não havendo retenção, nem entrega ao Estado

Artigo 28.º/2 da LGT

Apenas se aplica às situações de retenção na fonte por conta do imposto devido ao final

O substituído é o responsável originário e o substituto só responde subsidiariamente.


Substituição tributária
Não havendo retenção, nem entrega ao Estado

Artigo 28.º/3 da LGT

Aplica-se às situações de retenção na fonte a título definitivo

O substituto é o responsável primário e o substituído só é responsável a título subsidiário pelo pagamento da


diferença entre as importâncias que deveriam ter sido deduzidas e as que efetivamente o foram.
Substituição tributária
Se existir um responsável subsidiário há que olhar para o artigo 23.º da LGT. Dispõe o n.º 1 que a
responsabilidade tributária se efetiva por reversão do processo de execução fiscal. A reversão contra o
responsável tributário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos
responsáveis solidários, sem prejuízo do direito ao benefício de excussão prévia (artigo 23.º/2 da LGT).

Assim, o responsável subsidiário pode recusar-se enquanto não forem excutidos todos os bens do património
do devedor originário.
Substituição tributária
Pode ainda haver reversão do processo de execução fiscal (artigo 23.º da LGT) para os membros de corpos
sociais e responsáveis técnicos (artigo 24.º da LGT). Assim, há que averiguar se há culpa funcional dos
membros dos corpos sociais e responsáveis técnicos.

Em primeiro lugar, há que ver se há culpa da empresa – quando a empresa se encontra desorganizada de
tal modo que não foi dado conhecimento da necessidade de cumprir a obrigação. Se houver culpa da
empresa, não há culpa funcional.
Substituição tributária
O artigo 24.º/1/a) contempla os casos em que o facto tributário constitutivo se dá quando o gestor ou
administrador está em exercício de funções, mas a exigência do cumprimento da obrigação tributária só
ocorre quando este cessou funções. O ónus da prova, nesta situação, recai sobre o sujeito ativo.

O artigo 24.º/1/b) contempla os casos em que o prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no
período do exercício do cargo do administrador ou gerente. Nestes casos, é sobre o gestor ou administrador
que recai o ónus da prova, há uma presunção de culpa.
Substituição tributária
A culpa funcional é apurada através do critério da diligência máxima, por estar em causa património alheio,
que deve ser conjugado com o artigo 64.º do CSC, que implica uma conduta criteriosa e ordenada.

A diligência do gestor e administrador afere-se pelo critério do risco, i.e., se o risco foi elevado e a conduta
temerária existe culpa funcional que não pode ser ilidida.
Substituição tributária
Por último, há que olhar para os casos consagrados no Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT). Nestes casos
não é possível ilidir a presunção de culpa do artigo 24.º/1 da LGT.

Abuso de confiança – artigo 105.º/1 e 4/a) do RGIT. Quem não entregar à administração tributária,
total ou parcialmente, prestação tributária de valor superior a 7 500 euros e ter decorrido mais de 90 dias sobre
o termo do prazo legal.

Abuso de confiança contra a segurança social – artigos 107.º e 105.º/1 e 4/a). Ocorre nas mesmas
circunstâncias do artigo 105.º contra a Segurança Social.

Havendo a aplicação de uma coima há uma contraordenação, não podendo ser ilidida a presunção de
culpa.
Substituição tributária
Caso da não entrega para conseguir o pagamento de salários dos seus trabalhadores

Coloca-se em contraposição o dever fundamental de pagar impostos (artigo 103.º/1 e 2 e 104.º da CRP)
com direito à retribuição (artigo 59.º/1 da CRP). Neste caso, não deve prevalecer o direito à retribuição
sobre o dever fundamental de pagar impostos. Existem mecanismos próprios, no caso de impossibilidade de
cumprimento das obrigações, como a insolvência, que devem ser acionados. Ainda, em situações de crise, o
Estado fica especialmente debilitado, com necessidade de mais receita. Não se deve preterir o interesse dos
concretos trabalhadores em detrimento do interesse da comunidade.
Princípio da legalidade
A competência para aprovação não se confunde com a iniciativa legislativa. A iniciativa legislativa cabe aos
Deputados, aos grupos parlamentares e ao Governo, e ainda, a grupos de cidadãos eleitores (artigo
167.º/1 da CRP).

O artigo 165.º/1/i) da CRP, que versa sobre a matéria da reserva relativa de competência legislativa da
Assembleia da República, dispõe que é da exclusiva competência da Assembleia da República, salvo
autorização ao Governo, a criação de impostos e sistema fiscal e regime geral das taxas e demais
contribuições financeiras a favor das entidades públicas.
Princípio da legalidade
As taxas e contribuições financeiras bilaterais escapam à reserva de lei da Assembleia da República. O
artigo 165.º/1/i), bem como o artigo 3.º/3 da LGT fazem referência ao regime geral das taxas e
contribuições financeiras. Não obstante, este regime nunca foi efetivamente criado (apenas existe um regime
geral para as taxas das autarquias locais, Lei n.º 53-E/2006).

Assim, apenas os impostos e as contribuições financeiras unilaterais se encontram cometidas a reserva


de lei.
Princípio da legalidade

O artigo 165.º/1/i) deve ser lido em conjugação com o artigo 103.º/2 que dispõe que os impostos são
criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais (importa reter que, os municípios
podem conceder benefícios fiscais, mas nunca criá-los) e as garantias dos contribuintes (p.e., alterações de
prazo de caducidade (artigo 45.º/1 da LGT) ou prazo de prescrição (artigo 48.º/1 da LGT)) ou decisões que
tenham transitado em julgado.
Princípio da legalidade
A Assembleia da República pode delegar competência no Governo

Lei de autorização legislativa (artigo 165.º/1/i) e 2)

As leis de autorização legislativa devem definir o objeto, a extensão, a duração e o sentido da autorização

Deste modo, a lei de autorização legislativa deve explicitar a matéria sobre a qual é permitido ao Governo
legislar (objeto), que incide sobre uma determinada categoria específica (extensão) e a duração da
autorização.
Princípio da legalidade
Se a Lei de autorização legislativa for concedida ao Governo na lei de Orçamento de Estado caduca apenas
no termo do ano económico (artigo 165.º/5, a duração não precisa de estar explícita).

Quanto ao sentido, este tem de ser entendido na tripla vertente adotada pelo Acórdão do TC n.º 368/92,
na ótica do delegante (a incidência em sentido amplo), na ótica do delegado (quantum) e um elemento de
informação genérica, permitindo um juízo de prognose – artigo 103.º/2.

A reter: o Governo só pode legislar no âmbito da lei de autorização legislativa (art. 198.º/1/b) CRP), sob
pena de inconstitucionalidade orgânico-formal.
Princípio da legalidade
As normas desoneradoras também se encontram sujeitas ao princípio da legalidade na vertente da reserva
de lei?

Divergência doutrinária

Vieira de Andrade e Casalta Nabais entendem que não.

Ana Paula Dourado entende que sim.


Princípio da legalidade
É exigência do princípio da legalidade que todas as leis em sentido formal sejam suficientemente
determinadas. Não obstante, determinados pormenores podem ser densificados por Decreto-Lei não
autorizado, por regulamento ou por portaria.

Podem ser remitidos conceitos vagos e indeterminados, mas não indetermináveis, ou a concretização de
questões meramente técnicas.
Aplicação da lei no tempo

Artigo 103.º/3 Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que tenham natureza retroativa

TC tem entendido que o preceito diz respeito à retroatividade em sentido forte.


Aplicação da lei no tempo
Em primeiro lugar, é determinante para a aplicação da lei no tempo saber se o facto tributário é
de obrigação única ou de obrigação periódica.

O IRS/IRC são factos tributários de obrigação periódica, formação sucessiva, (constitui-se no dia 1 de janeiro de cada
ano e extingue-se no dia 31 de dezembro).

No que respeita às mais-valias há uma divergência doutrinária. O STA entende que são factos tributários de obrigação
única (artigo 10.º/3 do CIRS). APD entende que são um facto tributário de obrigação periódica (artigo 43.º/1 do CIRS).
Aplicação da lei no tempo
Nos casos de tributos sujeitos a taxa liberatória (artigo 71.º do CIRS), o facto tributário é de obrigação única, concluído
no momento da obtenção do rendimento ou da colocação do mesmo à disposição do sujeito passivo.

Nos casos de factos tributários sujeitos a tributação autónoma (artigo 72.º do CIRS e 88.º do CIRC), o facto tributário é
de obrigação única, visto que a tributação incide sobre despesas avulsas, incidindo sobre cada ato de despesa.

O IVA, na perspetiva do consumidor final, é um facto tributário de obrigação única, visto que a obrigação nasce e
extingue-se no momento em que o consumidor final a realiza. No entanto, para o comerciante é um facto tributário de
obrigação periódica.
Aplicação da lei no tempo
Distinção entre retroatividade em sentido forte e retrospetividade.

Quando a lei seja aplicável a um facto tributário com Quando a lei seja aplicável a um facto tributário com
início no passado, mas que tenha inteiramente início no passado, mas cujos efeitos ainda se
decorrido ao abrigo de uma lei antiga. encontram a decorrer.
Aplicação da lei no tempo

Facto tributário de obrigação única

Retroatividade em sentido forte. No entendimento do TC, a


retroatividade em sentido forte encontra-se proibida pelo
artigo 103.º/3 da CRP, não sendo possível aplicar uma lei Princípio da proteção da confiança
nova a factos que tenham decorrido inteiramente no
passado.
Aplicação da lei no tempo

Facto tributário de formação sucessiva

Retroatividade em sentido forte

Retrospetividade. Neste caso, a lei nova aplicar-se-ia a um


facto que se iniciou ao abrigo da lei antiga, mas que
continua a produzir os seus efeitos. Tal só será possível se
não existir uma violação do princípio da confiança.
Aplicação da lei no tempo
Princípio da proteção da confiança

O TC (Acórdão n.º 128/2009) densificou o princípio da proteção da confiança, sendo


possível identificar 4 requisitos para se poder afirmar, ou não, a violação do princípio da
proteção da confiança:
É necessário que tenha havido um comportamento por parte do Estado que gerou uma expetativa de
continuidade (requisito difícil de verificar na prática, uma vez que o sistema fiscal está em constante
mudança);

Expetativa fundada em boas razões (criado por lei ou decreto-lei autorizado);


Aplicação da lei no tempo
Princípio da proteção da confiança
Levou a um investimento da confiança por parte dos sujeitos passivos (moldam o seu comportamento
em função do sistema fiscal em vigor).

Não pode haver nenhuma razão de interesse público que justifique a violação da confiança dos
sujeitos passivos. A razão de interesse público deve ser sopesado com o princípio da
proporcionalidade (artigo 18.º/3 da CRP).
Aplicação da lei no tempo
No caso dos benefícios fiscais, estes não são factos tributários, mas normas de exceção à incidência
tributária. Assim, se o benefício fiscal já tiver produzido todos os seus efeitos no passado, estamos diante de
um caso de retroatividade em sentido forte.

Se a lei nova se aplicar a um benefício fiscal constituído, mas com efeitos em curso, estamos diante de uma
situação de retrospetividade.

No caso dos benefícios fiscais há sempre que indagar a violação, ou não, do princípio da proteção da
confiança.
Aplicação da lei no tempo
No caso dos benefícios fiscais, estes não são factos tributários, mas normas de exceção à incidência
tributária. Assim, se o benefício fiscal já tiver produzido todos os seus efeitos no passado, estamos diante de
um caso de retroatividade em sentido forte.

Se a lei nova se aplicar a um benefício fiscal constituído, mas com efeitos em curso, estamos diante de uma
situação de retrospetividade.

No caso dos benefícios fiscais há sempre que indagar a violação, ou não, do princípio da proteção da
confiança.
Aplicação da lei no tempo
Normas oneradoras e desoneradoras

Entende-se que só as normas fiscais oneradoras do sujeito passivo é que não podem ser retroativas. Já as
normas desoneradoras, uma vez que não existe necessidade de tutelar a confiança do sujeito passivo,
podem ser retroativas.
Confisco
Acórdão do Gálls vs Hungria (TEDH) – em caso de alíquota de valor igual ou superior a 50% pode haver
uma violação do direito à propriedade privada e à iniciativa económica privada (artigo 61.º e 62.º da
CRP), sob pena de inconstitucionalidade material. De notar, que tal situação apenas ocorre quando o
imposto incide sobre o rendimento.

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