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Exame em 16/01/2017
I
1. O Estado quer promover a natalidade. Pode, para tal, criar um imposto
anual de mil euros por ano que incida sobre os cidadã os, com mais de 30
anos, sem filhos? Justifique a sua resposta.
Antes demais importa começar por definir aquilo que seja um imposto. O imposto
é um tributo, referido no art. 3º/2 LGT e 4º/1 LGT, que se afigura como um dos
principais tributos geradores de receita do Estado. O imposto é, entã o, uma
prestaçã o patrimonial (pecuniá ria) e coativa, uma vez que o Estado goza de meios
coercivos para levar ao pagamento do mesmo, mas que se pauta por ser unilateral
e visar suportar as despesas do Estado. Ora, a unilateralidade do imposto significa
que o pagamento do imposto nã o tem associada nenhuma contraprestaçã o
específica do Estado, sendo cobrado com base na necessidade de sustentar as
despesas do Estado, mas nã o se pode dizer que o contribuinte saiba qual a
prestaçã o que está a suportar com os seus impostos dado que na verdade poderá
ela servir para suportar custos de outra pessoa. Ora, podemos assim dizer que os
impostos têm subjacente a ideia de Estado Social, que encontramos no art. 103º/1
CRP em que todos contribuímos para suportar a má quina do Estado, para que esta
possa fornecer os serviços essenciais e numa ló gica de que aqueles que mais
podem contribuir, fazem-no também em prol daqueles que podem menos. Ora, o
imposto tem assim a sua fundamentaçã o no princípio da igualdade (104º) mais
concretamente no princípio da capacidade contributiva que se prende com dizer
que aquele que aqueles que mais podem tributam mais que os que podem menos, o
que significa que este princípio nã o funciona apenas como pressuposto, na medida
em que só poderá haver tributaçã o lá onde haja manifestaçã o de riqueza, sendo
certo que nem toda a riqueza é tributá vel ideia de onde deriva o princípio de
mínimo de existência, abaixo do qual nã o há tributaçã o; mas este princípio
funciona também como um limite dado que a partir de um certo nível deixamos de
estar no â mbito da tributaçã o para passarmos a uma situaçã o de confisco, ou seja,
de ablaçã o injustificada da propriedade.
Ora, é certo que os impostos podem ter outras finalidades que nã o apenas a da
satisfaçã o dos interesses do Estado, desde logo finalidades especificamente
econó micas ou extrafiscais de vá rios â mbitos, ou de promoçã o de um
comportamento ou de incentivo à inibiçã o desses comportamentos. Ora, neste
caso, a criaçã o de um imposto com a finalidade de promover a natalidade parece
claramente demonstrar uma finalidade extrafiscal subjacente à sua criaçã o. No
entanto, parece ser de afirmar que a criaçã o de um imposto, ainda que nã o tenha
uma contraprestaçã o específica, tem de ter por base uma intençã o de sustentaçã o
do Estado nã o podendo basear-se unicamente em finalidades extrafiscais.
II
Ora, isto conduz-nos à definiçã o deste tributo como uma taxa (3º/2 e 3, 4º/2 LGT).
A taxa é também um tributo pecuniá ria e coativa mas que tem subjacente uma
contraprestaçã o específica e efetivamente efetuada, razã o pela qual dizemos que
está em causa um tributo bilateral/comutativo. Assim, as taxas surgem com base,
nã o na vontade das partes (nã o sao tributos ex voluntate mas ex lege) mas do
preenchimento de um pressuposto legal (36º LGT), daí derivando a sua
coatividade. Ora, quanto à sua bilateralidade as taxas podem ter como fundamento
a prestaçã o concreta de um serviço pú blico, o uso de um bem pú blico ou a remoçã o
de um obstá culo jurídico (fundamento que nã o é consensual mas que o TC e a lei
aceitam como fundamento da taxa, por exemplo, nos casos de licenças), sendo este
uso do bem ou de serviço publico que se pretende onerar. Assim, é certo que a taxa
assenta na realizaçã o de uma prestaçã o efetivamente efetuada, mas é também
admissível que essa prestaçã o assente numa presunçã o forte, ou seja, em poder
dizer-se que com grande probabilidade aquela prestaçã o foi efetuada e aquela
pessoa beneficiou dela (decorrente da decisã o relativa à taxa de segurança
alimenta valor + em que se entendeu que a possibilidade de ocorrer aquela
fiscalizaçã o dos estabelecimentos alimentares faria com que se pudesse presumir
com suficiente força para estar em causa uma taxa) . Foi isto que resultou do
acó rdã o 68/2007 em que se entendeu que o uso de á gua no imó vel assumia
carater de presunçã o forte da utilizaçã o de esgotos, o que nos permite dizer que, se
nã o podermos proar que efetivamente os investimentos de valorizaçã o em causa
nã o afetaram um e cada um dos proprietá rios dos imoveis onerados há grande
probabilidade de isso se verificar (presunçã o forte). Note-se que o TC tem também
defendido que é possível que as taxas se fundem em deveres legais, por exemplo de
fiscalizaçã o a um determinado setor- aconteceu com dos postos de combustíveis
em propriedade privada, em que o TC entende que o facto de a Administraçã o ter o
dever legal de fiscalizaçã o e verificaçã o do cumprimento das exigências legais
impostas à quele setor nos conduzia a uma prestaçã o de presunçã o forte derivada
de um dever legal que permitia sustentar a criaçã o de uma taxa.
Ora, seria aqui de analisar a questã o da reserva de lei referida no 165º/1 i) CRP
que refere que a reserva relativa da AR em causa diz rspeito ao regime geral das
taxas, regime este que nã o existe nem nunca foi criado, o que levou À afirmaçã o de
que a criaçã o de taxas era passível de ser efetuada pelo Governo e que este tanto o
poderia fazer no exercício do seu poder legislativo como administrativo, o que
permitia que as Câ maras criassem taxas locais, que sao, aliá s uma importante fonte
de receita para estas entidades.
III
Suponha que no dia 1 de julho de 2017 entra em vigor uma Lei através da qual a
Assembleia da Repú blica, entre outras medidas, revoga os artigos 78.º, n.º 1, a), e
78.º-A, do CIRS, eliminando a deduçã o respeitante aos dependentes e ascendentes
aí prevista, por essa deduçã o nã o ter como pressuposto a realizaçã o de quaisquer
despesas.
O diploma em causa contém uma disposiçã o relativa à produçã o de efeitos nos
termos seguintes: “As alteraçõ es introduzidas nos artigos 78.º e 78.º- A, do CIRS,
produzem efeitos desde 1 de janeiro de 2017”.
Margarida, mã e de 5 crianças, residente em Portugal e sujeito passivo de IRS,
considera que existem, pelo menos, dois fundamentos para julgar o diploma
inconstitucional.
Terá razã o? Justifique.
Alfredo (solteiro e residente em Portugal) é advogado por conta pró pria e obteve,
em 2016, os seguintes rendimentos:
Ora, o artigo 28º CIRS prevê duas formas de determinar quais sã o os rendimentos
desta categoria que vamos considerar para apurar a matéria tributá vel à qual
vamos aplicar a taxa correspondente. Pode o contribuinte ter um regime de
contabilidade organizada (nº1 al b) que se faz nos termos do CIRC (para o qual
remete o artigo 32º CIRS) que se traduz, nã o só numa exigência de eliminaçã o da
dupla tributaçã o econó mica mas num regime que exige que o profissional tenha
uma estrutura de organizaçã o de contabilidade que lhe permite apresentar todas
as despesas e lucros que tenha no exercício da sua atividade). No entanto, como
este regime de contabilidade tem muitos custos associados e é mais benéfico para
quem tenha muitas despesas relevantes, o CIRS prevê na al. A do nº1 do art. 28º a
possibilidade de a matéria tributá vel em sede de categoria B ser efetuada mediante
um regime simplificado referido no art. 31º CIRS. Ora, este regime prevê
determinados quocientes aplicá veis em funçã o da atividade desenvolvida. Neste
caso seria de aplicar o disposto na al b) que prevê a aplicaçã o de um quociente de
0.75 que daria uma matéria tributá vel de 22.500€. No entanto, conforme resulta
do artigo 31º nº13 a possibilidade de aplicaçã o deste quociente depende da
apresentaçã o de provas que sustentam despesas e encargos efetivamente
suportados.
Este rendimento estará sujeito a englobamento, o que significa, conforme 22º, que
se somará aos rendimentos de outras categorias (com atençã o à possibilidade de o
sujeito optar pela aplicaçã o de taxas especiais ou liberató rias nas categorias em
que isso seja legalmente permitido). Esta questã o do englobamento surge no
seguimento do disposto no artigo 104º/1 que prevê a criaçã o de um imposto ú nico
como forma de melhor concretizar o princípio da capacidade contributiva e de
simplificar o sistema fiscal. Assim sendo aplicaríamos a tabela das taxas
progressivas do artigo 68º CIRS.
b) Venda do seu carro particular (de coleçã o), com um ganho de 20 mil euros;
Neste caso entendo que seria possível conduzir este rendimento à categoria F (art.
8º) em virtude da constitiçã o de um direito de arrendamento (assumindo que o
advogado era o proprietá rio do imó vel). No entanto, nã o podemos esquecer um
importante princípio em vigor no â mbito da categoria B: princípio da atraçã o- que
implica dizer que cabem nesta categoria atividades que objetivamente
consideradas até se inseriam noutras categorias mas porque sã o desempenhadas
com carater habitual e no â mbito de uma atividade comercial independente
passam a pertencer na categoria B- razã o pela qual o artigo 3º/nº2 insira na
categoria B os rendimentos prediais, capitais e mais-valias que sejam imputá veis a
atividades geradoras de rendimento empresariais. Ora, se entendermos que este
arrendamento é feito no â mbito da atividade de advogado do sujeito passivo entã o
aplicar-se-á o art. 3º/2 al a), com o regime referido na al A) deste exercício – art.
28º e 31º para o regime simplificado que apure as deduçõ es a efetuar à matéria
coletá vel, no qual também se aplicaria a regra do englobamento (22º), somando
este rendimento ao rendimento referido em a) na aplicaçã o das taxas progressivas
do art. 68º.
Note-se que é possível que o titular de rendimento desta categoria opte pela
aplicaçã o de uma taxa liberató ria (art 71º) previsto no nº1 al a) aplicando-se uma
taxa proporcional de 28%, mediante retençã o na fonte. Ora, estas taxas liberató rias
chamam-se assim porque, tendo de haver retençã o na fonte (98º em que a
entidade devedora dos rendimentos retém os rendimentos tributados e entrega a
quantia devida à administraçã o), o sujeito passivo fica liberado da obrigaçã o de
englobamento destes rendimentos (22º), de apresentaçã o de declaraçã o destes
rendimentos, e de pagamento do imposto devido porque a entrega é feita pela
entidade substituta (art. 97º). Sendo de referir o disposto no nº6 do artigo 71º que
prevê a possibilidade de o sujeito optar pelo englobamento.
Apurados que estejam todos os rendimentos e depois de lhes ter sido aplicada a
taxa progressiva ou especial/liberató ria, estamos perante a coleta, ou seja, perante
o total de imposto a pagar. Ora, ainda é possível efetuar as deduçõ es à coleta
referidas no artigo 78º CIRS que elenca as deduçõ es possíveis, mas uma das
críticas aqui efetuadas é que estas deduçõ es têm um cará ter mais político do que
impactantes nas quantias tributá veis porque quando analisadas no caso concreto
têm uma expressã o muito reduzida.
Em que categoria de IRS inseriria cada um destes rendimentos (justifique) e como
seriam os mesmos tributados?
Duração: 2h30m
Cotação das perguntas: 4+4+7+5