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Capítulo 2 | Conceitos básicos sobre Segurança do Trabalho

2.1.3. Tipos de riscos de acidente de trabalho


Como se depreende do parágrafo anterior, a ocorrência de uma disfunção introduz
no ambiente de trabalho o risco de acontecer um AT. O conceito de risco tem duas
dimensões. Ele pode ser visto sob o prisma quantitativo, e assim designar a probabilidade
de ocorrência de um acidente, como pode ser analisado sob o aspecto qualitativo, e indicar
o perigo criado pela disfunção.
Não existe uma forma única de classificar esses riscos. Por exemplo, Ivar Odonne,
em sua obra Ambiente de trabalho: a luta dos trabalhadores pela saúde divide os fatores nocivos
em quatro grupos: (i) os fatores ambientais que também ocorrem fora dos locais de
trabalho (luz, calor etc.); (ii) os fatores ambientais que em geral só há nos locais de trabalho;
(iii) a atividade muscular; e (iv) as condições que determinam efeitos estressantes.
Outro exemplo de classificação de riscos pode ser encontrado na legislação trabalhista
brasileira, que, como se observa nas recomendações para a montagem dos Mapas
de Riscos, estabelece os riscos mecânicos, físicos, químicos. biológicos e ergonômicos.
Optou-se pela classificação aqui apresentada por melhor distinguir fatores causais
distintos, e ainda considerar situações que se fazem hoje presentes nos ambientes de
trabalho mesmo que não sejam legalmente reconhecidas.
2.1.3.1. Riscos mecânicos
São aqueles provocados pelos agentes que demandam o contato físico direto com
a vítima para manifestar sua nocividade. Por exemplo, a existência de uma gilete sobre
uma mesa de escritório (para ser usada em atividades como apontar lápis ou cortar
papéis) introduz no ambiente de trabalho um risco do tipo aqui estudado. Afinal, ao
se utilizar tal instrumento existe a chance de que o fio da lâmina entre em contato com
alguma parte do corpo (dedo, por exemplo), podendo assim provocar cortes.
Os riscos mecânicos se caracterizam por:
a) Atuar em pontos específicos do ambiente de trabalho.
b) Agir, em geral, sobre usuários diretos do agente gerador do risco.
c) Ocasionar, algumas vezes, lesões agudas e imediatas.
Além dos materiais cortantes, são exemplos de agentes geradores de riscos mecânicos
os materiais aquecidos, os perfurocortantes, os que estão em movimento, os
energizados, dentre outros.
São também rotulados como riscos mecânicos os causados, por exemplo, por
irregularidades no piso, como buracos. A rigor, o contato com esse agente não provoca
diretamente nenhuma lesão: no entanto, ele pode levar a uma queda, que costuma gerar
lesão, num tempo bastante curto. O mesmo se dá com os elementos que introduzem
riscos de incêndio no local de trabalho.
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2.1.3.2. Riscos físicos
São aqueles ocasionados por agentes que têm capacidade de modificar as características
físicas do meio ambiente, que, no momento seguinte, causará agressões em quem
estiver nele imerso. Por exemplo, a existência de um tear numa tecelagem insere no ambiente
um risco do tipo aqui estudado, já que tal máquina produz ruídos, isto é, ondas
sonoras que alterarão a pressão acústica que incide sobre os ouvidos dos operários.
Os riscos físicos se caracterizam por:
a) Exigir um meio de transmissão (em geral o ar) para propagar a nocividade.
b) Agir mesmo sobre pessoas que não têm contato direto com a fonte de risco.
c) Ocasionar, em geral, lesões crônicas, mediatas.
São exemplos de riscos físicos: ruídos (que podem gerar danos ao aparelho auditivo,
como a surdez, além de outras complicações sistêmicas); iluminação; calor; vibrações;
radiações (ionizantes ou não); pressões anormais.
Vale aqui destacar que a gravidade (e mesmo a existência) de riscos desse tipo
depende da concentração no ambiente de trabalho. Uma fonte de ruídos, por exemplo,
pode não constituir um problema (e, por vezes, é até solução contra inconvenientes
como a monotonia), mas tornar-se fonte geradora de surdez progressiva e, até mesmo de
surdez instantânea (por exemplo, um ruído de impacto que perfure o tímpano), dependendo
da intensidade e das demais características físicas do ruído por ela gerado.
2.1.3.3. Riscos químicos
São os provocados por agentes que modificam a composição química do meio
ambiente. Por exemplo, a utilização de tintas à base de chumbo introduz no processo de
trabalho um risco do tipo aqui enfocado, já que a simples inalação dessa substância pode
ocasionar doenças como o saturnismo.
Tal como os físicos, os riscos químicos podem atingir também pessoas que não
estejam em contato direto com a fonte e, em geral, provocam lesões mediatas (doenças).
No entanto, eles não demandam necessariamente a existência de um meio para
a propagação de sua nocividade, uma vez que algumas substâncias são nocivas por
contato direto.
Tais agentes podem se apresentar segundo distintos estados: gasoso, líquido, sólido
ou na forma de partículas suspensas no ar; sejam elas sólidas (poeira e fumos) ou
líquidas (neblina e névoas). Os agentes suspensos no ar são chamados de aerodispersoides.
As principais vias de penetração dessas substâncias no organismo humano são a
pele e os aparelhos respiratório e digestório.
As características do progresso tecnológico têm elevado a importância desse tipo
de risco, já que cada vez mais os processos industriais lançam mão da tecnologia química
(e, por decorrência, de substâncias tóxicas). Alguns autores estimam em 3.000 o número
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de substâncias novas lançadas anualmente no mercado, sem que se conheçam adequadamente
os riscos envolvidos pelo manuseio de várias delas.
2.1.3.4. Riscos biológicos
São aqueles introduzidos nos processos de trabalho pela utilização de seres vivos
(em geral, micro-organismos) como parte integrante do processo produtivo, tais como
vírus, bacilos, bactérias etc., potencialmente nocivos ao ser humano.
Esse tipo de risco pode ser decorrente, também, de deficiências na higienização
do ambiente de trabalho. Tal problema pode viabilizar, por exemplo, a presença de animais
transmissores de doenças (ratos, mosquitos etc.) ou de animais peçonhentos (como
cobras) nos locais de trabalho.
Atualmente, os riscos biológicos se fazem presentes com mais frequência em alguns
setores como a indústria farmacêutica e de alimentos, unidades de prestação de
serviços hospitalares e laboratórios de análises clínicas, centrais de tratamento de dejetos,
e em algumas atividades agroindustriais.
No entanto, o desenvolvimento recente da biotecnologia tende a fazer com que
esse tipo de risco ocorra com mais frequência.
2.1.3.5. Riscos ergonômicos
São aqueles introduzidos no processo de trabalho por agentes (máquinas, métodos
etc.) inadequados às limitações de seus usuários.
Por exemplo, a realização da atividade de levantamento manual de cargas com o
método das “costas curvadas” pode vir a provocar problemas lombares.
Os riscos ergonômicos se caracterizam pela ação em pontos específicos do ambiente,
e pela atuação somente sobre quem utiliza o agente gerador do risco (isto é,
exercendo sua atividade). Em geral, esses riscos provocam lesões crônicas, que podem
ter origem psicofisiológica.
Alguns exemplos de riscos ergonômicos são: postura viciosa de trabalho, em razão do
uso de equipamentos projetados sem levar em conta os dados antropométricos da população
usuária; dimensionamento e arranjo inadequados das estações de trabalho, provocando
movimentação corpórea excessiva; conteúdo mental do trabalho inadequado às
características do trabalhador, seja por gerar sobrecarga (estresse), ou por ser desprovido
de conteúdo (monotonia) etc.
2.1.3.6. Riscos sociais
São aqueles ocasionados pela forma de organização do trabalho adotada na empresa,
que podem provocar comportamentos sociais (dentro e/ou fora do ambiente de
trabalho) incompatíveis com a preservação da saúde.
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O emprego de turnos de trabalho alternados entre equipes (em que uma pessoa
trabalhe na primeira semana no horário das 22 às 6 horas; na segunda, das 6 às 14 horas;
e na terceira, das 14 às 22 horas, por exemplo) trará problemas para esses trabalhadores,
não só de natureza fisiológica (por incompatibilidade com seus ciclos circadianos), mas
também psiquicossociais, já que as relações sociais (com familiares, amigos etc.) serão
significativamente afetadas.
Outros exemplos de riscos sociais são: divisão excessiva do trabalho, jornada e
intensificação do ritmo de trabalho. Entre os principais efeitos sobre as pessoas estão as
doenças de fundo nervoso e mental.
2.1.3.7. Riscos ambientais
Antes de prosseguir, cabe aqui inicialmente salientar que a evolução tecnológica
recente tem feito com que os riscos gerados nos ambientes industriais ampliem seus raios
de alcance, em parte pelo uso cada vez mais intenso de substâncias químicas e de formas
energéticas mais concentradas, gerando os problemas de poluição ambiental já conhecidos.
Além disso, os sistemas produtivos se tornam cada vez mais integrados, o que eleva,
por um lado, as chances de interferências destrutivas de uma empresa sobre outra e, por
outro lado, que surja uma área potencialmente atingível por problemas criados pelas
empresas. Em função disso, alguns autores já propõem uma distinção entre “acidentes
normais” e “acidentes ampliados”, como os que ocorreram em Bhopal, Chernobyl etc.
Concorre para criar este tipo de expectativa o fato de que as próprias empresas
vêm cada vez mais se dando conta da similaridade existente no trato de questões como
a Gestão da Qualidade Total (objeto da série ISO 9000), a Gestão Ambiental (série ISO
14000) e, mais recentemente, a Gestão das Condições de Segurança (tema da série BS
8000, e que alguns autores consideram o embrião da série ISO 18000).
Por fim, cumpre destacar que a tipologia anteriormente apresentada visa simplesmente
mostrar as diversas formas pelas quais o trabalho pode gerar prejuízos à saúde
das pessoas, para assim facilitar o processo de identificação de riscos nas situações reais
de trabalho; logo, o “nome” que venha a ser dado a esse risco é de menor importância.

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