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DOCE DE LEITE

Processos Tecnológicos: Leite e Derivados


o Origem incerta;
Origem
o Na Argentina, a iguaria é considerada "patrimônio cultural alimentar e
gastronômico“;
o Uma lenda diz que em 1829, quando a cozinheira do então
governador da Província de Buenos Aires, Juan Manuel de Rosas,
esqueceu o leite com açúcar no fogo, bem na época em que seu
patrão assinava o Pacto de Cañuelas com o opositor Juan Lavalle,
pondo fim à guerra civil na nação vizinha.
o 1814 já havia cartas pedindo doce de leite de Buenos Aires para
Córdoba;
o 1817 o general Lavalle e seu exército foram servidos com doce de
leite em um banquete;
o No Brasil, América Central e Antilhas a partir do século XVI e está
ligado a expansão na produção da sacarose à possibilidade de seu uso
para preservação do leite.
Definição
o “produto com ou sem adição de outras substâncias alimentícias, obtido por concentração e ação do calor e
pressão normal ou reduzida do leite ou leite reconstituído, com ou sem adição de sólidos de origem láctea
e/ou creme adicionado de sacarose (parcialmente substituída ou não por monossacarídeos e/ou outros
dissacarídeos” (RTIQ nº 354/2010)

o Designação (denominação de venda): apenas produtos em que a base láctea não contenha gordura e/ou
proteína de origem não láctea
Perfil do produto
o Nomenclaturas: Dulce de leche, milk jam, milk caramel and dairy confectionary;
o Maior parte dos artigos científicos são argentinos e brasileiros, poucos trabalham sobre a microestrutura do
produto tradicional, light e diet;
o Alto volume produzido, com baixa uniformidade;
o aW: cerca de 0,85;
o Elevados teores de sólidos: aW menor que 0,85 – proteção contra crescimento de bolores e leveduras;
o Tipos:
• Uso doméstico;
• Industrial: Confeitaria, Sorvetes;
• Formatos: cremoso, barras, pingos.
Legislação brasileira
o Portaria MAPA nº 354/1997 – RTIQ (regulamento técnico de identidade e qualidade);

o Portaria MAPA nº 855/2010 – altera o ítem 5.2 *inclusão de carbonato de sódio como coadjuvante de tecnologia;
o Harmonizada no Mercosul.
Classificação (RTIQ nº 354/1997)
o Quanto ao conteúdo de matéria gorda: o Quanto à adição de corantes:
• Doce de Leite ou Doce de Leite com creme; • Doce de Leite para Sorveteria;
o Quanto à adição ou não de outras substâncias: o Quanto ao uso de sais conservantes:
• Doce de Leite ou Doce de Leite com adições; • A partir de 600mg/kg até 1000mg/kg – “Uso
exclusivo industrial”;
o Quanto à adição de espessantes/estabilizantes
e/ou umectantes autorizados:
• Na adição: Doce de Leite para confeitaria;
Ingredientes (RTIQ nº 354/1997)
Opcionais:
o Ácido sórbico e seus sais – Na, K ou Ca
(conservador);
Obrigatórios: o Citrato de sódio (estabilizante);
o Sorbitol (umectante);
o Leite e/ou leite reconstituído
o Gomas diversas – alginato, carragena, ágar, CMC,
o Sacarose (máx. 30kg/100L de arábica, xantana, gelana, pectina e outras
leite) (espessantes) – quando em mistura não deverão
ultrapassar 20000 mg/kg;
o Lactase (betagalactosidase), bicarbonato de
sódio, hidróxido de sódio e de cálcio, carbonato
de sódio (coadjuvantes de tecnologia);
Padrões de identidade e qualidade:
FÍSICO QUÍMICOS: MICROBIOLÓGICOS INORGÂNICOS:
o Umidade máxima: 30 g/100g; o Enterotoxinas estafilocócicas; o Arsênio ≤ 0,10 mg/kg
o Matéria gorda: 6 – 9 g/100g ( n = 5, c = 0; m = ausente) o Chumbo ≤ 0,20 mg/kg
(maior que 9 – Doce de leite com o Estafilococos coagulase o Cádmio ≤ 0,10 mg/kg
creme); positiva;
o Cinzas máximo: 2g/100g; ( n = 5, c = 2; m = 10; M = 10²)

o Proteína mínima: 5g/100g o Bolores e Leveduras (RDC 42/2013)


(rtiq nº 354/1997) ( n = 5, c = 2; m = 50; M = 10²)
Histórico de consumo
o Argentina, Brasil, Uruguai, Chile;
o Brasil - 82624 toneladas (2017); 74955 toneladas (2018);
o Regiões com maior produção (Br): sudeste, sul e nordeste – MG, SP e SC;
o MG – exportação 106000 dólares – EUA, Reino Unido, Angola e Bolívia (2016);
o México:
• leite de cabra – rebanho relevante, onde cerca de 75% do leite era utilizado para fabricação de doce de leite (dados de
1990)
• exportado para os EUA sem tarifa (um dos poucos lácteos exportados);

o Argentina:
• 92593 toneladas (2017) e 100575 toneladas (2018)
• Exportações para Brasil, Canada, Chile, Japão, Síria e EUA
Mercado Brasileiro

o 63% dos brasileiros possuem o hábito de


comprar doce leite;
o Apesar disso, o estudo sugere que o
doce de leite foi o terceiro produto
lácteo que mais perdeu espaço na mesa
dos brasileiros, ficando atrás somente
do sorvete e petit suisse.

Fonte: Embrapa, 2021.


Mercado Global
o Argentina, Uruguai e Brasil;
o Argentina: em média 130.000 toneladas por ano;
o 2012 a produção foi de mais de 143.000 toneladas;

o 125.898 se destinam ao consumo interno e o restante a exportação – sendo quase 60% para indústria;
o Em 2008 o Chile exportou 5,7 milhões de dólares.
Tecnologia de processamento
INGREDIENTES: o Adicionar o leite e o bicarbonato de sódio
Matérias-Primas Quantidades o Aquecer o leite até 70° C
Leite Integral Pasteurizado 20L o Adicionar a sacarose e NaCl;
Bicarbonato de Sódio 7,5g o Não esquecer de colocar o cone no tacho;
Citrato de Sódio (0,2g/L) 4g o Deixar concentrar, quando estiver bem concentrado, fazer uma leitura no
Sacarose (25%) 5kg refratômetro;
NaCl (0,2g/L) 4g o Quando estiver em 68° Brix (70% sólidos totais), adicionar a glicose de
milho;
Glicose de Milho (2g/L) 40g
o Ponto final: teste da proveta com água fria;
Sorbato de Potássio (0,08g/L) 1,6g
o Adicionar o conservante Sorbato de Potássio;
Total
o Resfriar para 65-70° C e envasar em frascos de vidro.
Tecnologia de processamento
o Tempo; o Contínuo – 3 estágios:
• 1º Aquecimento: Formação de cor no estado
o Temperatura;
líquido – 85°C
o Aumento ou diminuição de pressão; • 2º Aquecimento: 110-150°C – 1min;
• 3º Resfriamento;
o Intensidade da pressão;
o Balanço de massa o Produção em larga escala;

-> afetam as características do produto o Redução consumo de vapor;

o Batelada – sistema aberto; o Evaporadores de filme descendente


multiploefeito (2-3) até 55°B;
o Semicontínuo – evaporadores
multiploefeito + sistema aberto; o Evaporador scraped surface – aumento da
superfície de contato (palhetas/lâminas)–
o Diminui o consumo de vapor
70°B;
Tecnologia de processamento
Batelada – sistema aberto Semicontínuo – evaporadores multiploefeito +
sistema aberto
Diminui o consumo de vapor

Fonte: Lisboa (2015) apud Mendrone, Sousa (2012)

Fonte: Vargas et al (2021) apud Zalazar e Perotti (2011)


Tecnologia de processamento
o Contínuo – 3 estágios:
• 1º Aquecimento: Formação de cor no estado líquido – 85°C
• 2º Aquecimento: 110-150°C – 1min;
• 3º Resfriamento;

o Produção em larga escala;


o Redução consumo de vapor;
o Evaporadores de filme descendente multiploefeito (2-3) até
55°B;
o Evaporador scraped surface – aumento da superfície de
contato (palhetas/lâminas)– 70°B;
Tecnologia de processamento: matéria-prima
o Coadjuvantes de tecnologia: (bicarbonato de sódio – hidróxido de cálcio - carbonato de sódio);
o Redutor de acidez; corrigir se acidez (°Dornic) maior que 10 - 13;
o Durante a concentração aumenta o teor de ácido láctico relacionado ao aumento do fosfato de cálcio
coloidal e também a formação de ácidos orgânicos pela degradação da lactose;
o NaCO3 é utilizado para aumentar o pH para diminuir a coagulação das proteínas – desestabilização
das micelas de caseína;
o Acidez adequada inibe a saponificação de ácidos graxos livres –formação de aromas desagradáveis e
contribui para formação de cor através da reação de Maillard;
Tecnologia de processamento: matéria-prima
o Correção da acidez:
o 1°Dornic = 0,01% de ácido láctico
o (𝑀𝑀)-(á𝑐𝑖𝑑𝑜 𝑙á𝑡𝑖𝑐𝑜): 90 g/mol
o (𝑀𝑀) -𝑁𝑎𝐶𝑂3:84 𝑔/𝑚𝑜𝑙
o Reação de neutralização 1:1;
o Logo para neutralizar 0,01% de ácido
(1°D) – 0,01g/L NaCO3

o Detalhe importante, utilizar mais que 40g/100L de bicarbonato


de sódio pode causar um escurecimento no doce de leite e
trazer notas de sabão;
Tecnologia de processamento: matéria-prima
Coadjuvantes de tecnologia
o Lactase:
o Hidrólise da lactose (conforme % desejado);
o Aumento de dulçor, aumento de reatividade na reação de Maillard (açúcar redutor);
Tecnologia de processamento: matéria-prima
o Conservante - Sorbato de potássio:
o Efeito direto no crescimento de bolores;
o Diminui levemente a taxa de crescimento dos MO (leveduras) – dependência da aW;
o Uso combinado com aW baixa: redução da taxa de crescimento e períodos de defasagem;
o Condições adversas - aW baixa (0,74) + pH baixo = não são suficientes para inibir o crescimento total;

o “Uso exclusivo industrial”: 1000 mg/kg


o Uso doméstico: 600 mg/kg
Tecnologia de processamento: matéria-prima
Estabilizantes:
o Citrato de sódio:
o Liga-se ao cálcio solúvel no leite, forçando a saída do cálcio de dentro da micela de caseína (equilíbrio
cálcio micelar e solúvel);
Tecnologia de processamento: matéria-prima
LEITE e/ou LEITE EM PÓ:
o Produto de boa qualidade físico química e microbiológica;
o Pasteurizado, padronizado (% gordura);
GORDURA DO LEITE:
• Rendimento do produto;
• % afeta a textura do produto.
Tecnologia de processamento: matéria-prima
Açúcar – SACAROSE:
o Dissacarídeo (glicose + frutose);
o Solubilidade em água: 67 % (20°C) e 83% (100°C) – uso de açúcar invertido (xarope de glicose)
aumenta a solubilidade;
o Aplicação: 18 – 28 kg/100 L leite;
o Influencia nas características gelificantes das proteínas;
o Caramelização;
Tecnologia de processamento: matéria-prima
Açúcar – GLICOSE:
o Monossacarídeo redutor – reação de Maillard – escurecimento durante a ebulição –
adicionar ao final do processo;
o Propriedades antimicrobianas – menor aW e efeito osmótico;
o Adição de cerca de 2 g/100 L de leite de xarope de glicose – melhoria da textura e brilho;
o Adição de diferentes quantidades (substituindo a sacarose) para obter diferentes perfis de
textura;
o Plasticidade do produto;
o Menor dulçor que sacarose;
o Diminui a cristalização da sacarose;
Reologia do produto
o Fluido tixotrópico, pseudoplástico – viscosímetros rotacionais;
o Varia conforme adição de espessantes – maior comportamento pseudoplástico (confeitaria);
o Varia conforme o pH e °C;
• Acidificação diminui a viscosidade aparente, a alcalinização aumenta;

Parâmetros interessantes:
• Tensão de escoamento “yield stress”: método direto e rápido
Tecnologia de processamento: fluxograma

• Adição de NaCO3 antes da concentração


do leite, conforme a quantidade
calculada para a correção;
• Adição da sacarose durante o
aquecimento (50°C), melhor dissolução
e e glicose no final do processo;
Tecnologia de processamento: evaporação
o A partir de 100°C – formação de espuma;
o Tacho encamisado – circulação de vapor e água fria;
o Tipo de concentrador – tacho aberto, com cone de proteção: afeta o padrão de cor da reação;
o Observar espessura do isolamento – perda de energia na forma de calor pela camisa do tacho ($$)

o Agitador/misturador do tacho: tipo âncora para fluídos viscosos, com ou sem pás plásticas
(raspadores);

Fonte: Juyal et al, 2016


Ponto final de cocção
o °Brix -> respeitar a umidade máxima e o rendimento desejado;
o Teste da gota no copo d’água;

ST = 1,02 SL + 1,15 (R²=0,9) ST = 1,084SL – 2,55 (R²=0,8)


Predição de sólidos totais (ST –m/m) (diferença da Predição de sólidos totais (ST –m/m) (diferença da
umidade) após 24h através dos sólidos solúveis umidade) no momento da medição através dos sólidos
(°Brix - SL); solúveis (°Brix - SL);

Fonte: Oliveira et al, 2016


Tecnologia de processamento: embalagem
o Deve oferecer proteção contra perda de umidade e contaminação microbiana;
o Lata e vidro;
o Polipropileno (PP): baixo peso e boa proteção contra umidade e contaminação
Equipamentos
Tecnologia de processamento: bioquímica
o Reação de Maillard:
o Função do tempo e temperatura de cocção;
o Possibilidade de redução das características nutritivas: dano aos aminoácidos essências;

o Estabilidade das proteínas:


o Qualidade do leite – correção com estabilizantes e redutores de acidez.
Textura - viscosidade
o Nº de sólidos no produto, aumenta a dureza do produto;
o Aumento de caseína é diretamente proporcional ao aumento de dureza;
o Proteínas: estabilizam a emulsão gordura-água;
o Elevado teor de gordura: produtos com textura oleosa;
o Baixo teor de gordura: produto pegajoso;
Cristalização da lactose
o Limite de solubilidade:
DOCE DE LEITE
o 15°C: 16,8 g/100g
o 30°C: 24,8 g/100g

o Lactose no doce de leite:


Solução supersaturada de lactose o Aprox. 4,5% no leite;
o Aprox. 9,9 % no doce de leite;

+
Sacarose diminui a solubilidade da
o cerca de 33% (em base seca)

o °C durante o processo:
o aprox. 93°C – lactose solúvel;
lactose o Após resfriar, diminui o limite de solubilidade;
o Formação de hidratos de α-lactose;
Cristalização da lactose
o Tamanho do cristal aceitável
sensorialmente: 10 – 20 µm
o Produtos com maior dureza (mais
densos)
o – menor mobilidade da lactose
o Maior temperatura – diminuição da
dureza -maior mobilidade da lactose
o + mobilidade + reorganização dos
cristais em aglomerações de cristais
Cristalização da lactose: tecnologias
Conforme o princípio utilizado:
o Enzimas hidrolíticas:
o Aumenta o custo do produto e tempo de processo;
o Semeadura:
o adição de lactose, agitação, resfriamento controlado – aumento de bolhas de ar, viscosidade,
contaminação e tempo de processo;
o Ultra filtração:
o Custo inicial elevado;
Cristalização da lactose: tecnologias
Inovações e pesquisas
o Adição de prebióticos – inulina, oligassacarídeos;
o Substituição da gordura por gordura com diferente perfis lipídicos;
o Doce de leite desidratado e com adição de probióticos.
Inovações e pesquisas
Referências
BRASIL, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Portaria nº 354, de 04 de setembro de 1997. Disponível em Diário Oficial da União - Seção 1, número 172, de
08/09/1997 - Imprensa Nacional

BRASIL, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Portaria nº 855, de 27 de setembro de 2010. Disponível em: Diário Oficial da União - Seção 1, número 186, de
28/09/2010 - Imprensa Nacional.

JUYAL, D., SAWHNEY, I., DODEJA, A., MINZ, P.S. DESIGN ASPECT OF SCRAPER BLADE ASSEMBLY FORENHANCING FILM HEAT TRANSFER COEFFICIENT OF
SCRAPEDSURFACE HEAT EXCHANGER. 2016 Journal of Food Process Engineering. Disponivel em:doi:10.1111/jfpe.12408
Lisboa, Camila Pereira. DESENVOLVIMENTO DE UM CONCENTRADOR DE SUCO DE FRUTAS A PARTIR DA REDUÇÃO DA PRESSÃO. Trabalho de Conclusão de Curso.
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https://fahor.com.br/images/Documentos/Biblioteca/TFCs/Eng_Mecanica/2015/CamilaPereiraLisboa.pdf
Tamime, A. Y. Dairy Powders and Concentrated Products. Dairy Science and Technology Consultant. 2009, Wiley-Blackwell, Ayr, UK.
Oliveira, Ana Carolina Paiva de; Pinto, Sandra Maria; Carvalho, Antônio Fernandes; Schuck, Pierre; Perrone, Ítalo Tuler; Abreu, Luiz Ronaldo. PARÂMETROS
INDUSTRIAIS DA PRODUÇÃO DE DOCE DE LEITE. Rev. Inst. Laticínios Cândido Tostes, v. 71, n. 3, p. 179-185, jul/set, 2016

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