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Resenha Crítica do Artigo "Normal-Patológico, Saúde-Doença: Revisitando

Canguilhem”

Disciplina: Normal e Patológico


Docente: Heloísa Caldas
Discentes:
- Maria Eduarda Pires de Souza Silva (202110245711)
- Mariana Armond Silva de Castro (202110244511)
-Raphaela Cristina Viana dos Santos (202110245211)
-Thainá da Rocha Carbos (202110243911)

Credenciais do autor:

Georges Canguilhem foi um filósofo e médico francês, nasceu em 1904 e


morreu aos 91 anos de idade, em 11 de setembro de 1995. Vivenciou períodos de
avanços científicos em diversas áreas de conhecimento, como também as polêmicas
consequentes desses avanços. Esse filósofo e médico preocupou-se em levar às ciências
da vida a reflexão filosófica, investigando o estatuto epistemológico de diversos
conceitos utilizados nestas ciências, como saúde, doença, normal e patológico. Sua tese
de doutorado em Medicina sob o título “O Normal e o Patológico” se divide em duas
partes: a primeira intitulada “Seria o estado patológico apenas uma modificação
quantitativa do estado normal?” e a segunda “Existem ciências do Normal e do
Patológico?”.
Além disso, Maria Thereza Ávila Dantas Coelho é graduada em Psicologia pela
Universidade Federal da Bahia (UFBA), onde concluiu mestrado e doutorado em Saúde
Coletiva, com ênfase em Ciências Sociais em Saúde.

Resumo da obra:

Primeiramente, a perspectiva positivista de Auguste Comte mostra como a


definição da normalidade e, consequentemente, das normas podem constituir um
modelo político, ao passo que o conhecimento do normal torna mais fácil a resolução do
patológico em uma sociedade. Além disso, Comte compreendeu que o patológico é uma
variação quantitativa do normal, mas, como destaca Canguilhem, não qualificou essas
transformações nesse espectro, considerando apenas os extremos dessa escala normal-
patológico. Segundo as críticas de Canguilhem, o positivismo de Comte falha ao não
apresentar exemplos concretos sobre tanto o normal quanto o patológico, o que poderia
levar a uma crença de que a saúde perfeita existiria. O problema nessa concepção de
ideal estaria em suas possíveis consequências: a noção de que ninguém é doente ou que
todos são doentes.
Ainda de acordo com Canguilhem, o normal pode anteceder ou suceder o
anormal (no caso, o patológico), dependendo do ponto de vista. Considerando o viés
puramente lógico, o anormal ocorre depois do normal, pois é definido a partir de um
conceito já existente do que é normal. Já por um aspecto filosófico, o normal, enquanto
componente da norma, viria após o anormal, uma vez que sua função seria justamente
normatizar o que é patológico. De qualquer forma, as definições de normal visam
classificar o que foge à norma (conceito produzido a partir do estabelecimento do
sistema capitalista, propondo as novas maneiras adequadas de agir e padrões desejáveis
de comportamento).
O texto também apresenta uma ideia muito importante para o estudo de
Canguilhem e para a história: o patológico também é normal. Ainda, o normal
patológico é diferente do normal fisiológico, pois a doença é inevitável - portanto, é
normal -, ao passo que o estado normal do organismo é a possibilidade de mudanças, o
que não ocorre na presença de uma patologia. Segundo o autor, o estado de saúde possui
a capacidade normativa de adquirir normas diferentes de acordo com novas condições, o
que caracterizaria o estado patológico como conservador, uma vez que não permite
essas transformações.
Além disso, o conceito de patologia varia conforme a norma muda, com o passar
do tempo e diante das mudanças na sociedade, sendo, portanto, avaliado somente em
termos comparativos. Essa variação na concepção da norma é influenciada pelos
objetivos traçados a partir da adaptação requerida para lidar com as alterações no
ambiente (como exemplificado no texto com a Revolução Francesa). Canguilhem, do
mesmo modo, apresenta a questão de que a constituição de normal e patológico
acontece de acordo com cada indivíduo, e que também muda junto com ele, sendo a
norma uma noção-limite que representa a capacidade máxima de um ser. Por isso, ele
conclui que não há patologia objetiva, porque o diagnóstico feito pelo médico só pode
ser concluído após a observação do comportamento do sujeito, e não apenas baseado em
exames fisiológicos. Isso porque, os resultados biológicos podem representar diferentes
consequências para cada indivíduo (às vezes um valor elevado no colesterol não
caracteriza doença em uma pessoa, mas em outra sim, por exemplo), representando uma
grande gama de possibilidades quanto a presença ou ausência de patologia.
Ainda segundo Canguilhem, a medicina não leva em consideração os conceitos
de normal e patológico, mas sim a fisiologia, preocupando-se apenas em restaurar o
indivíduo ao estado normal. Partindo de uma análise da segunda metade do século XIX,
Canguilhem concluiu que o surgimento de novas ciências (psiquiatria, sociologia e
psicologia) propunha estudar maneiras de intervir diretamente no indivíduo, a fim de
atingir os padrões de normalidade.
Ainda é apresentada a prática do “aborto terapêutico”, que visava impedir a
patologia no indivíduo por conta de um fator genético (que não era culpa do sujeito)
para manter o estado normal do século XX. O patológico, segundo a lógica de
Canguilhem, é a presença de normas vitalmente inferiores em comparação ao vital
sadio, sem representar uma oposição ao normal.
Canguilhem, além disso, afirma que a saúde é uma questão filosófica, pois é
particular e subjetiva do indivíduo, ao passo que o médico é acionado quando o sujeito
não consegue lidar com uma doença sozinho. Apesar disso, a saúde não é uma medida
que pode ser contabilizada. Desse modo, o autor também apresenta a necessidade de
união entre a saúde filosófica e a saúde científica.

Análise crítica:

A leitura desta obra, desde a introdução, nos leva a perceber a complexidade


conceitual do assunto, pois o autor começa por nos advertir que, embora não se
confundam, nem se valorizem igualmente doenças e saúde como iguais, o modo cultural
de compreendê-las diverge profundamente. A doença pode ser vista como algo externo
ao equilíbrio normal do organismo, algo que entra e sai dele, ou, ao contrário, como
uma reação global e salutar de defesa e até de sua adaptação a certas condições novas e
diferentes. Assim, percebem-se as dificuldades de diferenciação e entendimento do
normal e do patológico.
Para o autor, o ser normal não tem a mesma característica determinativa que
todos os indivíduos da mesma espécie e sim a flexibilidade de uma norma que se
transforma em sua relação com condições individuais. Isto leva a pensar que o conceito
de doença e de saúde varia de pessoa para pessoa. O que é normal, apesar de ser
normativo em determinadas condições, pode se tornar patológico em outras situações,
se permanecer inalterado. A pessoa é que pode avaliar essa mudança, pois é ela que
sofre as consequências desta transformação, no momento em que se sente incapaz de
realizar as tarefas impostas por esta nova situação, ao contrário do normal, que vive
num meio em que as novas situações e novos acontecimentos são possíveis.

O anormal não caracteriza o patológico. Segundo Canguilhem, “patológico implica


pathos, sentimento direto e concreto de sofrimento e de impotência, sentimento de vida
contrariada”.

As discussões propostas no presente livro vão de encontro aos conceitos atuais


de psicopatologia, trazendo um tema relevante para futuras discussões entre os
profissionais da saúde com relação à forma de ver o "doente". Esta leitura é indicada
para os mesmos, pois os argumentos do autor possibilitam uma construção de uma visão
mais crítica do assunto.

Bibliografia:

COELHO, Maria Thereza Normal-patológico, saúde-doença: revisitando Canguilhem

Canguilhem, Georges. (2010). O Normal e o Patológico. 6ª.ed. Rio de Janeiro: Forense


Universitária.

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