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2. Não, este parecer não viola o adágio “Extra Ecclesiam nulla salus”, porque a necessidade de
preceito e de meio ainda é requerida para o recebimento da graça e da fé infusa. Seriam
cristãos anônimos (na linguagem rahneriana), que fariam parte da Igreja “in voto” e não “in
re”.
3. Enquanto tais religiões contém porções da revelação sagrada, as duas verdades mínimas
elencadas pelos tratadistas dos séculos XVII e XVII como meios necessários para salvação
[podem] ser cumpridas: a crença explícita que Deus existe e que é remunerador (se da ordem
sobrenatural ou natural é matéria ainda disputada, como bem disse Ripalda na Disp. XVII, sect.
XIII, n. 236 de seu “De ente supernaturali”).
O que serve especialmente para religiões como o islã: o Alcorão vale-se expressamente das
palavras árabes que indicam que o universo e a natureza foram criados por Alá. Algumas delas,
como sinaliza o teólogo Abu Bakar (do departamento de teologia e filosofia islâmica da
Universidade da Malásia), estão em verbos e substantivos árabes como “khalaq” e “khaliq”,
“badi`”, “j`ala”, “fa`ala” e “fa`il”, “fatar”, “fatir” e “ansh`a” (ver C., 6:1-3; 32:4; 29:61; 31:25;
2:117; 6:101; 42:11; 6:98 e 67:23).
A criação do universo pela onipotência de Deus, contudo, pode ser atestada por signos verbais
e não verbais: os signos verbais estão contidos no Alcorão e nas tradições proféticas (3:112-
114; 12:1 e 13:1-2); os sinais não verbais ou naturais, por outro lado, estão contidos no próprio
universo e apontam, assim como as leis naturais, para o próprio Deus e seus atributos
(41:53;45:3-5 e 51:20). Por consequência, é possível verificar algum conhecimento natural dEle
a partir dos “sinais dados para os sensatos” (3:190; 2:164 e 21:32)
Eis o fundamento insuspeito da teologia natural islâmica: a criação como espelho do Criador e
de seus atributos invisíveis; um fundamento inquestionavelmente semelhante ao dado por São
Paulo Apóstolo na Epístola aos Romanos: “Desde a criação do mundo, as perfeições invisíveis
de Deus, o seu sempiterno poder e divindade, se tornam visíveis à inteligência, por suas obras;
de modo que não se podem escusar” (Romanos, 1, 20).
O Alcorão tampouco rejeita, como vimos, esta ascensão até Deus através dos sinais da criação,
o que é posição comum entre os teólogos muçulmanos e de antigos exegetas deste livro como
Qadi Baydawi. Mas sequer precisamos elencar um Averróis (sobre este, reitero: jamais foi
defensor da teoria posterior da “dupla verdade”), um Avicena ou um Al-Farabi; exemplos
como o de al-Ash`ari, o fundador da escola Ash`arite de muçulmanos sunitas, já bastam.
Nenhum leitor atento de sua “Al-Luma` fi-r-Radd”, em particular do primeiro capítulo, duvidará
de sua extensa exposição dos argumentos para o “se é” de Deus. É possível elencar ainda
autores de outras escolas de Kalam (de Maturidi, Mu’tazili), mas fiquemos por aqui.
Lembrando que até mesmo na tradição de Kalam houveram filósofos que criticaram doutrinas
como o atomismo, o voluntarismo e até o ocasionalismo (implícito ou explícito em alguns
teólogos árabes); autores como An-Nazzam são exemplos célebres da falta de unanimidade de
certas vertentes do “escolasticismo” árabe sobre algumas questões.
Para não esquecer: as suras corânicas 50:28 e 6:80 não atestam, nem de longe, a negação da
teologia natural. São passagens que sequer tratam dos signos naturais que aqui comentamos.
Aliás, ninguém poderá negar ao Alcorão o conhecimento de Deus pelo “lumen” natural do
intelecto sem lidar com as passagens que aqui já expomos.
4. À vista disso, ademais, podemos dizer que essas religiões podem dispor ocasionalmente da
graça e da cogitação côngrua (hipótese de Gabriel Vásquez em I-II, Disp. CLXXXIX, c. XVI, n.
144) em razão da “fé” cultivada sobre Deus uno.
6. Sim, existem vários teólogos católicos (“modernistas” como Royo Marín e Francis Sullivan)
que entendem o ecumenismo sob as diretrizes escolásticas.