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A Mensagem e Os Lusíadas

A Mensagem

Mensagem: uma epopeia lírica

A Mensagem, cujas poesias componentes foram escritas entre 1913 e 1934,


sendo este último o ano da sua publicação, é sem dúvida a obra-prima onde
pessoa imprimiu o seu ideal patriótico, sebastianista e regenerador. É uma obra
nacional, uma versão moderna, espiritualista e profética de Os Lusíadas.

Esta obra poderá ser vista com uma epopeia, porque parte dum núcleo histórico,
mas a sua formulação, sendo simbólica e mítica, do relato histórico, não
possuirá a continuidade. Aqui, a acção dos heróis, só adquire pleno significado
dentro duma referência mitológica, e serão apenas eleitos aqueles homens e
feitos que manifestam em si esses mitos significativos, tendo assim direito à
imortalidade.

Nesta obra menciona-se:

. Os antepassados e os fundadores que pela sua acção criaram a pátria, e


ergueram a personalidade;

. As Mães, que estão na origem das dinastias, cantadas como “Antigo seio
vigilante”, ou “humano ventre do império”;

. Os heróis navegantes, aqueles que percorreram o mar em busca do caminho


da imortalidade, cumprindo um dever individual e pátrio;

. Na era crepuscular de fim de vida, os profetas, as vozes que anunciam já


aquele que viria regenerar a pátria moribunda, abrindo novo ciclo de vida,
uma nova era – o Encoberto.

A estrutura da obra

A estrutura da Mensagem, sendo a de um mito numa teoria cíclica, transfigura e


repete a história de uma pátria como o mito de um nascimento, vida, morte e
renascimento.

Tem uma forma simbólica tripartida – Brasão, Mar Português, O Encoberto, que
se poderá traduzir como: os fundadores, ou o nascimento; a realização, ou a
vida; o fim das energias latentes, ou a morte, e essa conterá já em si, a próxima
ressurreição, o novo ciclo que se anuncia – o Quinto Império.
Carácter épico - lírico

A Mensagem é uma obra épico - lírica, pois parte de um núcleo histórico (heróis
e acontecimentos da História de Portugal), mas apresenta uma dimensão
subjectiva introspectiva, de contemplação interior.

O mito

As figuras e os acontecimentos históricos são convertidos em símbolos, em


mitos, que o poeta exprime liricamente. “O mito é o nada que é tudo”, verso do
poema “Ulisses”, é o paradoxo que melhor define essa definição simbólica da
matéria histórica da Mensagem.

Sebastianismo

A Mensagem apresenta um carácter profético, visionário, pois antevê um império


futuro, não terreno, e ansiar por ele é perseguir o sonho, a sede de Absoluto, a
ânsia do impossível, a loucura. D. Sebastião é o mais importante símbolo da
obra que, no conjunto dos seus poemas, se alicerça num sebastianismo
messiânico e profético.

Quinto império: império espiritual

É esta a mensagem de Pessoa: a Portugal, nação construtora do Império no


passado, cabe construir o Império do futuro, o Quinto Império. E enquanto o
Império Português, edificado pelos heróis da Fundação da nacionalidade e dos
Descobrimentos é termo, territorial, material, o Quinto Império, anunciado na
Mensagem, é um espiritual. “E a nossa grande raça partirá em busca de uma
Índia nova, que não existe no espaço, em naus que são construídas daquilo que
os sonhos são feitos… “, contendo assim um apelo futuro.

Resumindo:

Nascimento – 1ª Parte “Brasão”

É a fundação da nacionalidade, há um desfile de heróis lendários ou históricos,


desde Ulisses a D. Afonso Henriques, D. Dinis ou D. Sebastião. Esta 1ªparte,
vai-se subdividir em cinco partes: os campos, os castelos, as quinas, a coroa e o
timbre, sendo ao todo composto por 19 poemas.
Realização – 2ª Parte “Mar Português”

Possui 12 poemas inspirados na ânsia do Desconhecido e no esforço heróico da


luta com o mar. Verifica-se o apogeu da acção portuguesa dos Descobrimentos
em poemas como “O Infante”, “O Mostrengo”, “Mar Português”.

Morte – 3ª Parte “O Encoberto”

Menciona-se a morte das energias de Portugal simbolizada no “nevoeiro”; dá-se


afirmação do sebastianismo representado na figura do “Encoberto”, e há ainda o
apelo e ânsia messiânica da construção do Quinto Império. Esta 3ªparte, vai-se
subdividir em três partes: os símbolos, os avisos e os tempos, sendo ao todo
composto por 13 poemas.

O BRASÃO

A primeira parte de Mensagem considera uma versão do brasão real português


utilizado no século XV e a cada uma das suas partes associa um poema relativo
a Portugal.

“O Brasão” tem dois campos: o escudo central, e a bordadura periférica que é o


campo dos castelos. Cada um destes campos inspirou um poema adequado:

. "O dos Castelos": refere-se à terra, mais genericamente à materialidade, e


consiste numa descrição geográfica da Europa e da posição de Portugal nela;

. "O das Quinas", onde as quinas representariam as cinco chagas de Cristo,


refere-se à divindade, ao Deus Cristão cuja religião se entrelaça com a
história de Portugal, representando os valores espirituais.

Segue-se um conjunto de poemas, designado "Os Castelos", sendo que a cada


um dos sete castelos do brasão associa-se um herói , ou um monarca que pela
sua acção tenha moldado a História de Portugal.

"As Quinas", um conjunto de poemas dedicados a figuras portuguesas que


foram vítimas da engrenagem implacável da História, e dela sofreram as
consequências, tal como D. Sebastião.

“A coroa”, distingue com um poema o cavaleiro Nuno Álvares Pereira.

“O timbre”, que no séc. XV era uma espécie de dragão conhecido na mitologia


como grifo, justifica três poemas referidos aos três alicerces da política de
expansão portuguesa: o Infante D. Henrique que a iniciou, D. João II que
apontou a meta das Índias e traçou o futuro de Portugal, e Afonso de
Albuquerque que foi o braço direito do Império Português do Oriente.
Brasão real português utilizado no sécXV

O MAR PORTUGUÊS

A segunda parte de Mensagem, “O Mar Português”, tem como tema o desvendar


do mar desconhecido, por parte dos portugueses, entre os séc. XV e XVI, que
representa a vitória do querer e da ousadia sobre a ignorância.

O medo do desconhecido, uma fabricação do espírito que não tem causa


palpável, é vencido pela vontade de desvendar a Verdade. Essa vontade,
inicialmente um sonho, materializa-se na Descoberta. Pessoa privilegiava os
triunfos do espírito sobre os ganhos materiais, fazendo poucas referências ao
império físico e nenhuma às riquezas materiais dele derivadas.

Esta parte de Mensagem é também sobre os homens que levaram a cabo a


Grande Obra, sendo o primeiro poema dedicado àquele que esteve na origem do
desvendar dos mares, o Infante D. Henrique.

Os poemas de "Mar Português" seguem uma ordem aproximadamente


cronológica, mas é o antepenúltimo poema que dá o nome ao conjunto, "O Mar
Português", que olha em retrospectiva a época das Descobertas e pergunta
"Valeu a pena?", oferecendo, como resposta, duas das frase mais célebres de
toda a literatura portuguesa; "tudo vale a pena se a alma não é pequena" e
"quem quer passar além do Bojador tem que passar além da dor".

No penúltimo poema do ciclo, “A Última Nau”, a época de ouro é encerrada com


o desaparecimento de D. Sebastião, que embarca para uma ilha desconhecida, e
o poeta transporta-nos subitamente à actualidade em que escreve,
interrompendo a narrativa para confiar ao leitor o seu pensamento. No entanto,
a visão de Pessoa atira-nos imediatamente para o futuro, um futuro em que O
Desejado regressa para retomar o sonho interrompido de um império universal.
No último poema do ciclo, “A Prece”, há uma súplica a Deus, pedindo que
reacenda a Alma Lusitana para que de novo "conquistemos a Distância".

O ENCOBERTO .

A terceira parte de Mensagem tem como temas o Quinto Império e O Desejado


que há-de vir para torná-lo realidade.

Possui três partes, das quais a primeira,"Os Símbolos", trata da simbologia do


tema:

. ”D. Sebastião”, o rei que morreu na terra mas nasceu para o mito com a
promessa de voltar para conduzir a Nação à glória: ”O Quinto Império”;

. “O Desejado”, aquele cuja vinda se aguarda com fervor, “

. ”As Ilhas Afortunadas”, o local fora do Espaço onde os mitos esperam para
se concretizar

. ”O Encoberto”, aquele que talvez já esteja entre nós mas ainda não se deu a
conhecer.

A segunda parte, "Os Avisos", menciona aqueles que anunciam a vinda do


messias português:
.“O Bandarra”, o único com o dom da profecia;

. “O Padre António Vieira”

. “O terceiro”, que é o próprio Fernando Pessoa, referindo-se a si próprio num


poema sem nome.

A terceira parte, "Os Tempos", é uma sucessão arbitrária de cinco ocasiões


simbólicas representando épocas ou Tempos antes do advento do Encoberto e
do consequente estabelecimento do Quinto Império.

. “A Noite” é o primeiro poema, mas não tem qualquer relação com o tema e
passa-se cronologicamente antes da questão sequer se pôr.

. "A Tormenta", refere a agitação íntima de Portugal que aspira ser a nação do
Quinto Império. Deus envia um sinal orientador cuja identidade não é
revelada, referindo-se talvez a Bandarra. No entanto, como usa o termo
"hausto", talvez se refira a um ser vivo que poderia ser o próprio Fernando
Pessoa.

. "Calma" é uma espécie de tempo de espera para uma divagação sobre as


impossibilidades possíveis. É, mais do que os outros poemas do conjunto, o
tempo do sonho e da divagação.

. "A antemanhã" representa a proximidade do início da caminhada: o


Mostrengo, de “Mar Português”, volta para simbolizar o medo de uma nova
via desconhecida que há a percorrer, via esta que será espiritual e
revolucionária para um mundo habituado ao materialismo. Portugal não tem
medo, mas ainda não se lançou nessa via.

. "O nevoeiro" corresponde ao tempo actual, o momento de escrever, e como


os três poemas anteriores, não parece representar uma sequência
cronológica, mas sobretudo fenómenos psicológicos, sociais e políticos vistos
pelos olhos de Pessoa, que podem coexistir no tempo. Com este poema,
encerra-se a obra com uma chave de ouro, mencionando o mito sebastianista
de que o Rei voltará numa manhã de nevoeiro e mostrando que,
simbolicamente, nevoeiro é a situação que então se vive em Portugal, de
onde o grito final "É a Hora!". .

Simbologia da mensagem

Brasão – simboliza a nobreza imutável do passado;

Mar – simboliza a vida e a morte; o nascimento, a transformação e o


renascimento;
Campos – símbolo do paraíso ao qual os justos acedem depois da morte;
espaço de vida e acção:

Castelo – dada a sua habitual localização num lugar mais elevado, simboliza a
segurança, a protecção e a transcendência;

Quinas – os cincos escudos das armas de Portugal reenviam para as cinco


chagas de Cristo, adquirindo uma dimensão espiritual;

Coroa – símbolo de perfeição e de poder: promessa de imortalidade;

Timbre – insígnia que coroa o brasão, indicadora da nobreza de quem o usa,


remete para a sagração do herói numa missão transcendente;

Grifo – ave fabulosa com a força e a sabedoria, o poder terrestre e celeste;

Padrão – monumento de pedra que os navegadores portugueses erguiam nas


terras que iam descobrindo; simboliza o domínio da propagação da civilização
cristã sobre as mesmas;

Mostrengo – simboliza o desconhecido, os medos, os perigos e os obstáculos


que os navegadores tiveram de enfrentar e vencer;

Nau – simboliza a força e a segurança numa travessia difícil; bem como o


incitamento à viagem e a uma vida espiritual; prende-se, também, com a
aquisição de conhecimentos;

Ilha – símbolo do desejo de felicidade terrestre ou eterna; do além


maravilhoso; da sabedoria e da paz;

Noite – simboliza a morte; remete para um tempo de gestação que


desabrochará como manifestação de vida;

Manhã – símbolo de pureza; de vida para paradisíaca, de confiança em si, nos


outros, na existência;

Nevoeiro – simboliza a indeterminação, indefinição; o prelúdio da aparição.

Os Lusíadas

Os DEZ cantos dos Lusíadas

Canto I - Consílio dos Deuses (estâncias 20 a 41) - O canto I é constituído


pela proposição em que o poeta anuncia o que vai cantar, pela invocação de
inspiração às ninfas, pela dedicatória do seu poema ao Rei D. Sebastião e pelo
Consílio dos Deuses no Olimpo. Neste Consílio os Deuses iam decidir se
ajudavam os portugueses a chegar à Índia ou os impediam. Esta reunião era
presidida por Júpiter, tendo estado presentes todos os Deuses convocados.

Júpiter, decide ajudá-los pois considerou que os portugueses, pelos seus feitos
passados eram dignos de tal ajuda.

Vénus apoia Júpiter pois vê reflectida nos portugueses a força e a coragem do


seu filho Eneias.

Marte decide também a favor dos portugueses pois sentia-se apaixonado por
Vénus.

Baco pelo contrário não queria que os portugueses fossem para a Índia com
medo de perder a sua fama no Oriente.

No final do Canto, o poeta reflecte acerca dos perigos que em toda a parte
espreitam o Homem.

Canto II – A armadilha - O rei de Mombaça, influenciado por Baco, convida os


Portugueses a entrar no porto para os destruir. Vasco da Gama, ignorando as
intenções, aceita o convite, pois os dois condenados que mandara a terra colher
informações tinham regressado com uma boa notícia de ser aquela uma terra de
cristãos. Na verdade, tinham sido enganados por Baco, disfarçado de sacerdote.
Vénus, ajudada pelas Nereidas, afasta a Armada, da qual se põem em fuga os
emissários do Rei de Mombaça e o falso piloto.

Vasco da Gama, apercebendo-se do perigo que corria, dirige uma prece a Deus.
Vénus comove-se (estrofe 33) e vai pedir a Júpiter que proteja os Portugueses,
ao que ele acede e, para a consolar, profetiza futuras glórias aos Lusitanos. Na
sequência do pedido, Mercúrio é enviado a terra e, em sonhos, indica a Vasco da
Gama o caminho até Melinde onde, entretanto, lhe prepara uma calorosa
recepção. A chegada dos Portugueses a Melinde é efectivamente saudada com
festejos e o Rei desta cidade visita a Armada, pedindo a Vasco da Gama que lhe
conte a história do seu país.

Canto III - Após uma invocação do poeta a Calíope. Vasco da Gama inicia a
narrativa da História de Portugal (estrofes 6 a 20). Começa por referir a situação
de Portugal na Europa e a lendária história de Luso a Viriato. Segue-se a
formação da nacionalidade e depois a enumeração dos feitos guerreiros dos Reis
da 1.ª Dinastia, de D. Afonso Henriques a D. Fernando.

Destacam-se os episódios de Egas Moniz e da Batalha de Ourique, no reinado de


D. Afonso Henriques, e o da Formosíssima Maria, da Batalha do Salado e de Inês
de Castro, no reinado de D. Afonso IV.

Egas Moniz

Neste episódio (estrofes 35 a 41) conta-se a história do aio de D. Afonso


Henriques. Tendo dado a sua palavra ao rei de Castela que o soberano
português lhe prestaria vassalagem, conseguiu o levantamento do cerco
castelhano a Guimarães. Mas como D. Afonso Henriques se recusou a acatar
estas condições, Egas Moniz foi entregar-se ao rei castelhano, com a mulher e
os filhos, comovendo a todos pela sua lealdade e honra.

Batalha de Ourique

Em seguida (estrofes 42 a 54) é narrada a lenda da batalha de Ourique, em que


o fundador de Portugal derrota cinco reis mouros depois de ter uma visão de
Cristo. Por este motivo pinta os cinco escudos e os trinta dinheiros na bandeira
de Portugal.

Dinastia de Borgonha

Nesta última cidade D. Afonso acaba por ser cercado pelo rei de Leão, e Camões
introduz o seu herdeiro D. Sancho I na história, que se torna no assunto do
canto bélico juntamente com o pai, e depois da morte deste (estrofes 83 e 84)
como rei.

Episodio: Inês de Castro (estrofes 118 a 135)

Na situação inicial apresenta-nos D. Inês que vivia um modo de vida feliz e


despreocupado em que recordava constantemente o seu amado, o infante D.
Pedro.

Mas o rei (D. Afonso, pai de D. Pedro) para solucionar o problema de seu reino
manda matar D. Inês, pois D. Pedro era casado.

D. Inês fala com o rei, e pede piedade pelos seus filhos, pois, iriam ficar órfãos.
O rei pensa outra vez mas o povo incentiva-o e acaba por mandar matar Inês.

Canto IV - Vasco da Gama prossegue a narrativa da História de Portugal. Conta


agora a história da 2.ª Dinastia, desde a revolução de 1383-85, até ao
momento, do reinado de D. Manuel, em que a Armada de Vasco da Gama parte
para a Índia.

Após a narrativa da Revolução de 1383-85 que incide fundamentalmente na


figura de Nuno Álvares Pereira e na Batalha de Aljubarrota, seguem-se os
acontecimentos dos reinados de D. João II, sobretudo os relacionados com a
expansão para África.

É assim que surge a narração dos preparativos da viagem à Índia, desejo que D.
João II não conseguiu concretizar antes de morrer e que iria ser realizado por D.
Manuel, a quem os rios Indo e Ganges apareceram em sonhos, profetizando as
futuras glórias do Oriente. Este canto termina com a partida da Armada, cujos
navegadores são surpreendidos pelas palavras profeticamente pessimistas de
um velho que estava na praia, entre a multidão.

Episódio: Batalha de Aljubarrota (estrofes 24 a 44)

Neste episódio os Portugueses vão para uma guerra contra os castelhanos. Os


Portugueses estavam em desvantagem numérica em relação aos Espanhóis. O
Rei D. João I foi lutar e sobreviveu à batalha.

Na batalha, destacam-se as actuações de Nuno Álvares Pereira e de D. João,


Mestre de Avis. Salienta-se também o facto dos irmãos de Nuno combaterem
contra a própria Pátria, acabando por morrer numa batalha em que foram
traidores de Portugal.

Episódio: Despedidas em Belém

Este episódio é o inicial à viagem e só surge no final do canto IV.

Trata-se da despedida dos portugueses que vão para a Índia, fazem-se os


preparativos numa igreja abençoando as naus para que não naufraguem e
rezando e pedindo a Deus que os guiasse.

Velho do Restelo (estrofes 94 a 104)

No momento da largada ouve-se a voz de um respeitável velho que sobressai


de entre todas as que se tinham feito ouvir até então. Ela representa todos
aqueles que se opunham à louca aventura da Índia e preferiam a guerra santa
no Norte de África e critica a ambição portuguesa.

Canto V - Vasco da Gama prossegue a sua narrativa ao Rei de Melinde,


contando agora a viagem da Armada, de Lisboa a Melinde.

É a narrativa da grande aventura marítima, em que os marinheiros observaram


maravilhados ou inquietos o Cruzeiro do Sul, o Fogo de Santelmo ou a Tromba
Marítima e enfrentaram perigos e obstáculos enormes como a hostilidade dos
nativos, no episódio de Fernão Veloso, a fúria de um monstro, no episódio do
Gigante Adamastor, a doença e a morte provocadas pelo escorbuto.

O canto termina com a censura do poeta aos seus contemporâneos que


desprezam a poesia.

Episódio: O Adamastor (estrofes 37 a 40)

Apareceu um gigante ao dobrar o Cabo das Tormentas. Era o Adamastor e dizia


que aquele mar lhe pertencia e que quem se tinha atrevido a entrar nele tinha
morrido.

Depois, Vasco da Gama põe-se de pé e pergunta ao gigante quem era. Chocado


o gigante responde-lhe e conta a história da sua vida. Tinha sido transformado
num Cabo por Júpiter por amar Thétis. Um amor que não é correspondido.

Canto VI - Fim da narrativa de Vasco da Gama, a Armada sai de Melinde guiada


por um piloto que deverá ensinar-lhe o caminho até Calecut.

Baco, vendo que os portugueses estão prestes a chegar à Índia, resolve pedir
ajuda a Neptuno, que convoca um Concílio dos Deuses Marinhos cuja decisão é
apoiar Baco e soltar os ventos para fazer afundar a Armada. É então que,
enquanto os marinheiros matam despreocupadamente o tempo ouvindo Fernão
Veloso contar o episódio lendário e cavaleiresco de Os Doze de Inglaterra, surge
uma violenta tempestade.

Vasco da Gama vendo as suas caravelas quase perdidas, dirige uma prece a
Deus e, mais uma vez, é Vénus que ajuda os Portugueses, mandando as Ninfas
seduzir os ventos para os acalmar.

Dissipada a tempestade, a Armada avista Calecut e Vasco da Gama agradece a


Deus. O canto termina com considerações do Poeta sobre o valor da fama e da
glória conseguidas através dos grandes feitos.
Episódio: Tempestade (estrofes 70 a 84)

É este um episódio simbólico em que se entrelaçam os planos da viagem e dos


deuses, portanto a realidade e a fantasia.

Esta tempestade é o último dos perigos que a armada lusitana teve que
enfrentar para chegar ao Oriente, e Camões descreve-a de uma forma bastantes
realista, tanto relativamente à natureza, quando refere a fúria desta
(relâmpagos, raios, trovões, ventos), como relativamente ao sentimento de
aflição sentido por parte dos marinheiros.

Canto VII - A Armada chega a Calecut. O poeta elogia a expansão portuguesa


como cruzada, criticando as nações europeias que não seguem o exemplo
português. Após a descrição da Índia, conta os primeiros contactos entre os
portugueses e os indianos, através de um mensageiro enviado por Vasco da
Gama a anunciar a sua chegada.

O mouro Monçaíde visita a nau de Vasco da Gama e descreve Malabar, após o


que o Capitão e outros nobres portugueses desembarcam e são recebidos pelo
Catual e depois pelo Samorim (estrofes 43 a 65). O Catual visita a Armada e
pede a Paulo da Gama que lhe explique o significado das figuras das bandeiras
portuguesas. O poeta invoca as Ninfas do Tejo e do Mondego, ao mesmo tempo
que critica duramente os opressores e exploradores do povo.
Canto VIII - A descrição da pintura (estrofes 1 a 42) começa com Luso, o filho
ou companheiro de Baco, depois Ulisses, Viriato e Sertório. Paulo da Gama
explica ao Catual o significado dos símbolos das bandeiras portuguesas,
contando-lhe episódios da História de Portugal nelas representados. Baco
intervém de novo contra os portugueses, aparecendo em sonhos a um sacerdote
brâmane e instigando-o através da informação de que vêm com o intuito da
pilhagem.

O Samorim interroga Vasco da Gama, que acaba por regressar às naus, mas é
retido no caminho pelo Catual subornado, que apenas deixa partir os
portugueses depois destes lhes entregarem as fazendas que traziam. Inicia-se a
viagem de volta a Portugal. Segue-se o episódio da Ilha dos Amores; Vénus e
Cupido preparam uma recepção aos portugueses para compensar-lhes os
sofrimentos.

Canto IX - Após vencerem algumas dificuldades, os portugueses saem de


Calecut, iniciando a viagem de regresso à Pátria. Vénus decide preparar uma
recompensa para os marinheiros, fazendo-os chegar à Ilha dos Amores. Para
isso, manda o seu filho cúpido desfechar setas sobre as Ninfas que, feridas de
Amor e pela Deusa instruídas, receberão apaixonadas os Portugueses.

A Armada avista a Ilha dos Amores e, quando os marinheiros desembarcam para


caçar, vêem as ninfas que se deixam perseguir e depois seduzir. Tétis explica a
Vasco da Gama a razão daquele encontro (prémio merecido pelos “longos
trabalhos”), referindo as futuras glórias que lhe serão dadas a conhecer. Após a
explicação da simbologia da Ilha, o poeta termina, tecendo considerações sobre
a forma de alcançar a Fama.

A Ilha dos Amores

Vendo agora a frota em segurança no seu regresso a Portugal, Vénus pede a


ajuda do seu filho Cupido para juntar os amores e ferir as nereidas com as
flechas do amor. Com as ninfas e Tétis sob esta influência, coloca uma ilha
mística na rota dos portugueses, e a ela traz os amantes.

Podem ser consideradas três descrições no episódio da Ilha dos Amores:

O locus amoenus: o cenário onde decorre o encontro amoroso (estrofes 52 a 67


e mais algumas até ao final do canto) é típico do locus amoenus, com os seus
chãos maciamente relvados, águas límpidas e cantantes, arvoredos frondosos e
até um lago. O poeta fala ainda da simpática fauna que aí se cria e dos frutos
que se produzem sem cultivo. É um cenário paradisíaco, idílico, de écloga.

A alegoria: com um arrojo inesperado para um maneirista, Camões descreve o


encontro dos nautas com as ninfas que os esperavam, industriadas por Vénus. O
amor que experimentam é de paixão: imediato, arrebatado e carnal. E fica dado
o recado aos que condenam a expressão mais física do amor: «Melhor é
experimentá-lo que julgá-lo, Mas julgue-o quem não pode experimentá-lo.»

A recompensa dos portugueses tem um sentido alegórico: «Que as Ninfas do


Oceano, tão fermosas, Tethys e a Ilha angélica pintada, Outra cousa não é que
as deleitosas Honras que a vida fazem sublimada» (estrofe 89). A terminar o
canto, dirigindo-se ao leitor, reforça a intenção alegórica e incita aos feitos de
valor: «Impossibilidades não façais, Que quem quis sempre pôde: e numerados
Sereis entre os heróis esclarecidos E nesta Ilha de Vénus recebidos».
Leonardo: Camões, o indefectível cantor do amor, não quis, e se calhar não
pôde, evitar que isso se reflectisse n'Os Lusíadas. Se os amores mal sucedidos
do Adamastor deixam entrever o caso real do poeta, Leonardo (estrofes 75 a
82) aqui representa a consumação do seu sonho. Repare-se que as queixas
deste navegante recordam as do poeta na lírica e como é um lamento delicado e
belo.

Canto X - As Ninfas oferecem um banquete aos portugueses. Após uma


invocação do poeta a Calíope, uma ninfa faz profecias sobre as futuras vitórias
dos portugueses no Oriente. Tétis conduz Vasco da Gama ao cume de um monte
para lhe mostrar a Máquina do Mundo e indicar nela os lugares onde chegará o
império português. Os portugueses despedem-se e regressam a Portugal.

O poeta termina, lamentando-se pelo seu destino infeliz de poeta


incompreendido por aqueles a quem canta e exortando o Rei D. Sebastião a
continuar a glória dos Portugueses.

Estrutura externa da obra

É um poema dividido em Cantos, 10 cantos. As estrofes são todas oitavas, ou


sejam, possuem 8 versos, que são na sua grande maioria decassílabos heróicos
(acentuados na sexta e décima sílabas métricas).

Relativamente à rima, percebemos que ela não só existe como é


simultaneamente cruzada e emparelhada, obedecendo ao esquema: a b a b a b
c c (rima cruzada nos seis primeiros versos, e emparelhada nos dois últimos).

Esta estrutura externa é semelhante à das epopeias clássicas.

Estrutura interna da obra

É na sua estrutura interna, isto é, no desenvolvimento do assunto, que Os


Lusíadas se revelam mais claramente como uma epopeia clássica apresentando
a seguinte estrutura:
Proposição

Canto I, estrofes 1-3, em que Camões proclama ir cantar as grandes vitórias e


os homens ilustres - “as armas e os barões assinalados”; as conquistas e
navegações no

Oriente (reinados de D. Manuel e de D. João III); as vitórias em África e na Ásia


desde D. João a D. Manuel, que dilataram “a fé e o império”; e, por último,
todos aqueles que pelas suas obras valorosas “se vão da lei da morte
libertando”, todos aqueles que mereceram e merecem a “imortalidade” na
memória dos homens.

A proposição aponta também para os “ingredientes” que constituíram os quatro


planos do poema:

O plano da viagem. Não podemos esquecer que foi esta aventura marítima
que, acima de tudo, serviu de pretexto à elaboração da epopeia. Neste plano
somos confrontados com a narração dos acontecimentos mais significativos da
viagem de Vasco da Gama, desde a partida de Lisboa em meados de 1497, até
ao momento do regresso. Pelo meio ficam as aventuras sofridas em Mombaça,
Melinde, Calecute.

O plano da história de Portugal. Camões aproveita esta oportunidade para


fazer uma revisão e uma síntese dos momentos que considera mais importantes
e marcantes na história do seu País. Essa história é-nos narrada em ocasiões e
por narradores diferentes: primeiro, é Vasco da Gama que conta alguns
episódios ao rei de Melinde; segue-se Paulo da Gama que, em Calecute, faz o
mesmo em relação ao Catual; depois, os acontecimentos posteriores à viagem
são-nos narrados por meio de sonhos e profecias. Este plano é compreensível,
na medida em que a intenção do poeta era enaltecer todo o povo português, e
não apenas algumas figuras ou episódios.

O plano dos deuses e da mitologia. Camões imaginou uma forte presença


dos deuses pagãos, que rivalizariam entre si e interfeririam na viagem dos
portugueses.

O plano do poeta. Luís de Camões não se inibe de expressar opiniões e


conselhos, avisos e reprimendas, lamentações e comentários, muitas vezes
falando na primeira pessoa. As considerações pessoais aparecem normalmente
no final dos cantos e constituem, de um modo geral, a visão crítica do poeta
sobre o seu tempo.

Invocação
Canto I, estrofes. 4-5, o poeta pede ajuda a entidades mitológicas, chamadas
musas. Isso acontece várias vezes ao longo do poema, sempre que o autor
precisa de inspiração:

. Tágides ou ninfas do Tejo (Canto I, est. 4-5);

. Calíope - musa da eloquência e da poesia épica (Canto II, est. 1-2);

. Ninfas do Tejo e do Mondego (Canto VII, est. 78-87);

. Calíope (Canto X, est. 8-9);

. Calíope (Canto X, est. 145).

Dedicatória

Canto I, estrofes 6-18 - o poeta Camões dedica o seu texto ao monarca D.


Sebastião, a quem tece inúmeros elogios e oferece alguns conselhos
(particularmente no sentido de prosseguir as campanhas militares contra os
infiéis, não só para que o triunfo da Fé e do Império sejam indiscutíveis, mas
para que o próprio D. Sebastião se torna digno de ser cantado). Por outro lado,
era no monarca que recaíam todas as esperanças e expectativas para dissipar
quaisquer prenúncios de decadência.

Narração

Começa no Canto I, estrofe 19 e constitui a acção principal que, à maneira


clássica, se inicia “in medias res”, isto é, quando a viagem já vai a meio, “Já no
largo oceano navegavam”, encontrando-se já os portugueses em pleno Oceano
Índico.

Este começo da acção central, a viagem da descoberta do caminho marítimo


para a Índia, quando os portugueses se encontram já a meio do percurso do
canal de Moçambique vai permitir:

. A narração do percurso até Melinde (narrador heterodiegético – 3ª pessoa,


não intervem na acção).

. A narração da História de Portugal até à viagem (por Vasco da Gama narrador


heterodiegético);

. A narração da viagem (acção central) por Vasco da Gama, este é narrador


homodiegético (personagem participante).

. A narrativa organiza-se em quatro planos: o da viagem, e o dos deuses, em


alternância, ocupam uma posição importante. A História de Portugal está
encaixada na viagem. As considerações pessoais aparecem normalmente nos
finais de canto e constituem, de um modo geral, a visão crítica do poeta
sobre o seu tempo.

Mitologia

Os seguintes tópicos pretendem fazer um resumo sobre o porquê da presença


da mitologia em Os Lusíadas:

. É uma prova, não só da grande admiração que Camões nutria pela


Antiguidade Clássica, como ainda do profundo conhecimento que dela
possuía. É de facto evidente que o autor desta epopeia estava a par de todos
os mais importantes episódios da mitologia, e que conhecia com algum
pormenor as figuras do panteão greco-romano

. É um dos traços inerentes a qualquer epopeia e que, como tal, Camões não
ousou dispensar;

. Tinha como função embelezar os versos do poema e criar um novo motivo de


interesse, não deixando que a descrição da viagem se tornasse demasiado
enfadonha, ou se aproximasse excessivamente de uma crónica de história;

. O uso da mitologia devia também ser encarado como forma de conseguir um


discurso mais culto e erudito, capaz de impressionar os leitores e de
evidenciar as capacidades intelectuais e artísticas do poeta;

. As figuras mitológicas proporcionam um encadeamento lógico à acção, ao


mesmo tempo que desempenham um papel da maior importância no
desenrolar da viagem dos portugueses. Eles são, pois, intervenientes sempre
activos na acção, ora oferecendo a sua ajuda aos incautos viajantes, ora
conspirando para que tudo termine da forma mais inglória;

. As figuras divinas são uma forma de compensar as personagens “vazias” e


“desumanizadas" que são os marinheiros (personagens sem rosto e sem
nome, que só têm existência enquanto parte do grupo, e de quem nada
sabemos a não ser o resultado do seu esforço).

. Através da dicotomia figuras divinas e figuras humanas, o poeta consegue de


forma ainda mais indiscutível realçar os grandiosos feitos dos portugueses. A
coragem que demonstraram e o empenho que imprimiram à sua missão
teriam sido de tal amplitude que eles foram capazes, não só de triunfar sobre
as forças da natureza, como ainda de ultrapassar e secundarizar os
imponentes senhores do Olimpo;
Depois de tudo o que foi dito, resta-nos apenas acrescentar uma ideia. Para
além de incluir na sua obra a presença e a actuação dos deuses antigos, naquilo
a que designamos por maravilhoso pagão, o poeta fez também questão de focar
o maravilhoso cristão. Este é evidente em pelo menos duas passagens do texto
(uma no Canto II, estrofe 30; outra no Canto VI, estrofe 81), quando Vasco da
Gama dirige súplicas à sua Divina Guarda.

Conclui-se assim que, embora em proporções diferentes, existe a conjugação da


vertente pagã com a vertente cristã.

Júpiter: na mitologia latina era o soberano dos deuses. Sendo também o deus
dos trovões. Filho de Saturno e de Cibele, conseguiu sobreviver à ambição
implacável do seu pai (que devorava todos os filhos que Cibele dava à luz).

Neptuno – Deus supremo do mar. Era invocado pelos navegadores antes das
expedições marítimas e estes ofereciam-lhe sacrifícios. Irmão e Júpiter. Aparece
nu, de barba, com um tridente na mão e sobre um coche.

Plutão: irmão de Júpiter e de Neptuno, era o deus que controlava os infernos.

Marte - Filho de Júpiter e de Juno, Deus da guerra. Era representado na figura


de um guerreiro, completamente armado, com um galo junto de si.

Vénus - Filha do Céu e da Terra. É a Deusa do Amor e da beleza. Vulcano


recebeu-a por esposa, como prémio de haver fabricado os raios de que Júpiter
necessitou, quando os Gigantes quiseram expulsá-lo do Céu. porém, não
conseguindo suportar a fealdade do marido, logo procurou a companhia de
outros deuses, nomeadamente Adónis, Anquises (de quem teve Eneias) e Marte
(de quem teve Cupido).

Vulcano - Filho de Júpiter e de Juno, Deus do fogo. Sua considerável feldade


aumentou com um pontapé recebido do próprio pai, de que resultou ficar coxo.

Mercúrio - Filho de Júpiter e de Maia. Deus da eloquência, do comércio e dos


ladrões. Era o mensageiro dos deuses, particularmente de Júpiter, que lhe
pegara na cabeça e nos calcanhares asas para as suas ordens serem executadas
com uma maior rapidez.

Apolo: fruto de um relacionamento entre Júpiter e Latona, Apolo era venerado


como deus do sol, das letras e das artes. Era ainda ele quem presidia todas as
nove musas.
Diana - Filha de Júpiter e de Latona, irmã de Apolo. Deusa da caça e da
castidade. O seu poder permitiu que metamorfease Actéon em veado por a ter
visto banhar-se.

Baco: ainda antes de nascer, Baco foi retirado do ventre da mãe (Sémele) por
Júpiter, que o colocou na barriga da sua perna. Aí viria a completar o período de
gestação. Mais tarde, Baco haveria de dominar o Egipto e a Índia, tendo lá
introduzido a agricultura e a vinha. Era por isso venerado como o deus do vinho.

Cúpido - Filho de Marte e de Vénus. Presidia aos prazeres e era representado na


figura de um menino nu, com arco e alojava cheia de setas.

Próteu: deus marinho e protector dos peixes. Tinha o dom de tomar todas as
formas possíveis.

Atlante: este era o gigante que transportava o mundo às costas.

Calíope: musa da eloquência e da poesia épica. Era filha de Júpiter, tal como
Clio (musa da História), Éroto (musa da poesia lírica), Euterpe (musa da dança).

Orfeu: filho de Calíope e Apolo. Tocava lira, e as suas melodias eram tão belas
que até as árvores e as pedras se moviam para o escutar.

Morfeu: deus dos sonhos na mitologia grega.

Tethys - Tethys é uma das divindades primordiais das teogonias helénicas.


Personifica a fecundidade “feminina” do mar. Nascida dos maiores de Ouganos e
Gaia, é a mais jovem das Titânides.

Thetis - Thetis é uma das Nereidas, filha de Nereu, o velho do mar, e de Dóris.
É por consequência uma divindade marinha e imortal e é a mais célebre de
todas as Nereidas.

Dóris: filha do Oceano e de Tethys, casou com Nereu de quem teve as


Nereidas.

Hércules - Filho de Júpiter e de Alcmena. O pai dos Deuses, para enganar


Alcmena, tomou a forma do marido, Anfitrião, na ausência deste. Juno,
justamente indignada, conseguiu que Euristeu, rei de Micenas, obrigasse
Hércules a doze trabalhos perigosíssimos, com o desejo de vê-lo morrer em um
deles. Hércules porém venceu.

Tifeu: gigante que transformou Vénus e Cúpido em peixes.

Galateia: uma das Nereidas.


Mitificação do herói

Os Lusíadas celebram os Portugueses enquanto nação, colectividade. Para isso,


o poeta desenvolve uma história de Portugal como epopeia, seleccionando os
episódios e as figuras, de modo a fazer avultar o lado heróico e exemplar da
História, cantando-a. Por outro lado, o poema tende à universalidade, louva não
só os Portugueses mas o homem em geral: a sua capacidade realizadora,
descobridora.

A empresa das descobertas é a grande prova dessas capacidades: a de se impor


à natureza adversa, de desvendar o desconhecido, de ultrapassar os limites
traçados pela cultura antiga e pelo conceito tradicional do homem e do mundo,
que estavam dogmatizados e eram difíceis de superar. Os Lusíadas celebram a
capacidade de alargar e aprofundar o saber; a realização do homem no que
respeita ao amor e, por fim, talvez o mais importante, o poder de edificar a vida
face ao destino.

O Homem, «bicho da terra» tão pequeno, conseguiu conquistar o mar que o


transcendia - espaço de transgressão -, vencendo as forças, personificadas pelos
Deuses. Conseguiu isso pela ousadia, pelo estudo, pelo sacrifício, por querer
superar-se a si próprio.

Os homens tornam-se deuses, fazendo cair do pedestal as antigas divindades. A


recepção dos nautas pelas ninfas significa a confirmação dos receios de Baco: de
facto, os navegantes cometeram actos tão grandiosos que se tornam amados
pelos deuses; e, de certo modo, divinizam-se também.
Mais do que explorar os mares, a viagem traduz em si mesma a contínua
procura de verdade, pois é sempre mais belo viajar do que chegar. Desta
viagem resulta a passagem do conhecido para o desconhecido, das trevas para a
luz, de uma ideologia confinada para outras e diversas realidades. Os olhos dos
eleitos que viram o raiar da aurora e a água pura das fontes ou que tiveram o
privilégio de contemplar a «máquina do Mundo» exprimem a metáfora da luz
numa nova época do conhecimento. O deslumbramento dos nautas pelo
erotismo da «ilha» simbolizará também a necessidade de uma comunhão dos
homens com o divino na procura da suprema harmonia.

Assim se consubstancia a narrativa que na Ilha dos Amores revelará ao mundo


que a única via para o Futuro é o Amor e o Conhecimento. A superação advém
dessa interiorização, dos perigos e contrariedades. «Vede» -depois de tantos e
tantos perigos, chegámos aqui para voltar com o conhecimento. A descoberta
verdadeira foi que o caminho marítimo (ou terreno) é através do Amor e do
Conhecimento. O desconhecido torna-se conhecido e o mistério é desvendado,
os nautas divinizados.

Reflexões do poeta

Na primeira reflexão d’Os Lusíadas, sobre a insegurança da vida, Camões reage


à traição protagonizada por Baco, lamentando-se da personalidade escondida
dos seres humanos. Estabelece um paralelismo entre os perigos encontrados no
mar e em terra, verificando que em nenhum dos ambientes há segurança
absoluta. Na sequência disto, reflecte sobre a posição do ser humano face à
natureza, já que na sua fragilidade e insegurança é capaz de atravessar mares e
conquistar povos, ultrapassando com sucesso os diferentes obstáculos.

A reflexão sobre a dignidade das Artes e das Letras é um episódio


marcadamente Humanista. Isto é observável noutras partes da obra pela
demonstração da vitória do Homem sobre a Natureza e a vontade de saber e
descobrir.

Camões alegra-se ao verificar que na Antiguidade sempre houve personagens


protagonistas de feitos heróicos e simultaneamente autores capazes de os
cantar condignamente. Em oposição, lamenta-se do facto de, apesar de os
portugueses terem inúmeros feitos passíveis de serem louvados, não ser
prezada a poesia, tornando-o num povo ignorante. Na sequência disto, caso
continue a não haver em Portugal uma aposta nas artes, nunca ninguém
exaltará os feitos dos portugueses.
No final do canto VI, Camões apresenta-nos o seu conceito de nobreza,
recorrendo para isso à oposição com o modelo tradicional. Desta forma, o poeta
nega a nobreza como título herdado, manifestada por grandes luxos e
ociosidade. Propõe então, como verdadeiro modelo de nobreza, aquele que
advém dos próprios feitos, enfrentando dificuldades e ultrapassando-as com
sucesso. Só assim poderá superiorizar-se aos restantes homens e ser
dignamente considerado herói. O estatuto será adquirido ao ver os seus feitos
reconhecidos por outros e, mesmo contra a sua vontade, ver-se-á distinguido
dos restantes.

Na reflexão que faz no início do canto VII, Camões faz um elogio ao espírito de
cruzada e critica os que não seguem o exemplo português. Isto porque, para
Camões, a guerra sem pretensões religiosas não faz sentido, visto ser apenas
movida pela ambição da conquista de território. Assim, recorre ao exemplo do
Luteranismo alemão.

Dirige-se depois aos ingleses, que deixam que os Muçulmanos tenham sob
controlo a cidade de Jerusalém e preocupa-se apenas em criar a sua nova forma
de religião (anglicanismo). Também os franceses, ao invés de combaterem os
infiéis, aliaram-se aos turcos para combater outros cristãos. Nem os próprios
italianos passam impunes, ao ser-lhes criticada a corrupção. Para incitar à
conquista de povos não - cristãos, visto esta causa não ser suficiente, Camões
lembra as riquezas da Ásia Menor e África, incitando desta forma a expansão.
Termina elogiando os portugueses, que se expandiram por todo o mundo tendo
como fim primário a divulgação da fé.

Na segunda reflexão que faz no canto VII, Camões critica os opressores e


exploradores do povo. Começa por uma retrospectiva da sua própria vida, com
etapas como a pobreza, a prisão, o naufrágio, …, fazendo destas um balanço
negativo. No entanto, para ele a maior desilusão continua a ser o facto de não
ver a sua obra devidamente reconhecida. Alerta portanto para o facto de os
escritores vindouros se poderem também sentir desta forma, desencorajando a
escrita e a exaltação dos heróis.

No final do canto VIII, Camões centra a sua reflexão nos efeitos perniciosos do
ouro. Lista todos os efeitos do metal precioso, desde traições à corrupção da
ciência, ao afirmar que o ouro pode fazer com que os juízes dêem demasiada
importância a uma obra pelo facto de terem sido remunerados para tal.

No final da obra, Camões lamenta-se do facto de não estar a ser devidamente


reconhecido, já que a sociedade se rege somente pelo dinheiro, decidindo por
isso pôr-lhe termo. Não deixa no entanto de louvar os portugueses e todos os
perigos por eles ultrapassados (definição camoniana de nobreza). Elogiando os
heróis passados, alerta os homens do presente que a vida nobre não passa pelo
ouro, cobiça e ambição. Exorta D. Sebastião a valorizar devidamente aqueles
que pelos seus feitos se puderem considerar nobres. Correspondendo à visão
aristotélica da epopeia, remata com novas proposição e dedicatória e incita o rei
a feitos dignos de serem cantados.

Epopeia

As epopeias são narrativas de feitos extraordinariamente notáveis e invulgares,


perpetrados por um herói singular ou um herói colectivo. São o motivo de
orgulho de todo um povo ou grupo, que com eles se identifica e a quem recorre
no momento de tirar elações e ensinamentos de vida (função pedagógica).

Poema épico - Trata-se de uma modalidade de narração em verso. Com uma


acção grandiosa em que contracenam heróis grandiosos e representativos de um
povo (neste caso, Vasco da Gama e outros heróis portugueses, representantes
do peito ilustre Lusitano). Que contracenam também com personagens humanas
e mitológicas num espaço vasto no caso, Europa, África, Ásia e num período de
tempo.

Ideologia política

São várias as passagens do texto que nos fornecem pistas sobre a ideologia
sociopolítica de Camões. Será extremamente interessante observar os pontos de
vista presentes em Os Lusíadas, compará-los com a corrente dominante do
pensamento da época, presenciar o quanto se afasta ou aproxima da
mentalidade moderna e do humanismo.

O poeta começa por fazer referência a uma série de qualidades, que julga
indispensáveis na personalidade de qualquer monarca. Temos como exemplos “a
bondade”, “a piedade”, “o sublime coração”… em suma, uma série de atributos
que deverão fazer dele um verdadeiro exemplo de virtudes.

“A Rei não obedece nem consente


Que não for mais que todos excelente.”

(Canto III, 93)

Em seguida, alerta-nos para o facto de nem todos os monarcas possuírem


realmente essas qualidades, o que inevitavelmente se traduzia em problemas
maiores. Ele recorda os casos de D. Sancho II e de D. Fernando, cujos maus
predicados governativos originaram largas e nefastas consequências, tanto para
a figura do rei como para o seu povo. Relativamente ao primeiro, diz-nos que foi
deposto do seu cargo pela passividade e inércia que sempre demonstrou.

“Morto depois Afonso, lhe sucede

Sancho segundo, manso e descuidado;

Que tanto em seus descuidos se desmede

Que de outrem quem mandava era mandado”

(Canto III, 91)

Afirma que a tarefa de reinar é extremamente exigente e que não pode nunca
ser descurada. Nem durante o sono devem os monarcas esquecer as suas
responsabilidades para com os destinos do reino, e isso mesmo é dito em
relação a D. Manuel:

“Estando já deitado no áureo leito,

Onde imaginações mais certas são,

Revolvendo contino no conceito

De seu ofício e sangue a obrigação,

Os olhos lhe ocupou o sono aceito,

Sem lhe desocupar o coração”

(Canto IV, 68)

Sublinha que a prosperidade de um povo está intimamente relacionada com o


desempenho do seu governante máximo:

“Que um fraco Rei faz fraca e forte gente”

(Canto III, 138)


Considera que a glória do povo português passa pela continuação da dilatação
da Fé e do Império. Daí que faça um apelo aos futuros governantes,
nomeadamente a D. Sebastião, de quem espera o:

“… aumento da pequena Cristandade;

Vós, ó novo temor da Maura lança”

(Canto I, 6)

Revela a sua crença na teoria do direito divino, segundo a qual o poder do


monarca era proveniente de Deus, tornando-se ele o seu representante na
Terra.

“Por isso vós, ó Rei, que por divino

Conselho estais no régio sólio posto”

(Canto X, 146)

Salienta a importância das leis, que no entanto só têm validade se forem


convenientemente elaboradas e cumpridas. E como isso nem sempre tem
acontecido, o poeta sente-se na obrigação de criticar:

“Leis em favor do Rei se estabelecem,

As em favor do povo só perecem.”

(Canto IX, 28)

Defende a existência de um bem público, um bem comum que ao rei compete


garantir, e ao qual todos se devem subordinar. Esta ideia vai no seguimento
daquilo que a generalidade dos humanistas defendiam… Em relação a todos
aqueles que continuam a privilegiar os seus interesses particulares, em prejuízo
desse bem comum, Camões lança severas críticas:

“A quem ao bem comum e do seu Rei

Antepuser seu próprio interesse”

(Canto VII, 84)

O poeta desvaloriza todos aqueles que rodeiam o rei e que, em lugar de se


empenharem na boa governação, apenas procuram saciar a sua ambição
pessoal, não hesitando sequer no momento de recorrer a intrigas, corrupção ou
hipocrisia.
“Nem, Camenas, também cuideis que cante

Quem, com hábito honesto e grave, veio,

Por contentar o Rei, no ofício novo,

A despir e roubar o pobre povo!”

(Canto VII, 85)

Ainda no seguimento dos tópicos anteriores, Camões avisa para os perigos de


determinadas atitudes e comportamentos. Por exemplo, no que diz respeito à
sede de dinheiro, anuncia que:

“… este faz e desfaz leis;

Este causa os perjúrios entre a gente

E mil vezes tiranos torna os Reis.”

(Canto VIII, 99)

Não concebe Portugal como uma realidade distinta da Europa. Isso mesmo se
pode deduzir da descrição geográfica que faz do nosso País:

“Eis aqui quasi cume da cabeça

De Europa toda, o Reino Lusitano,

Onde terra se acaba e o mar começa

E onde Febo repousa no Oceano.”

(Canto III, 20)

As fontes d’Os Lusíadas

A epopeia tem origem na Antiguidade Clássica e possui algumas regras,


generalizadas a partir dos modelos clássicos:

Epopeias gregas:

. Ilíada (VIII a. C) – Homero

. Odisseia (VIII

Epopeia romana:
. Eneida (I a. C) – Virgílio

Para além destas fontes literárias, outras são tidas como fontes históricas, como,
por exemplo, as Crónicas de Fernão Lopes, de Rui Pina, de Duarte Galvão, A
História do Descobrimento e Conquista da Índia de Lopes de Castanheda.

Importância do título

Os Lusíadas têm como fontes obras da Antiguidade Clássica, nomeadamente a


Ilíada e a Odisseia. No entanto, o herói dessas epopeias era individual: no
primeiro caso, Aquiles e, no segundo, Ulisses. N’Os Lusíadas, o herói é colectivo,
ou seja, o povo português.

Ora, a palavra “Lusíadas” devirá do Luso, filho de Líber (deus que, mais tarde,
foi confundido com Baco) ou companheiro de Baco. Nasceu e povoou a parte
mais ocidental da Ibéria, a que se chamou Lusitânia, como explica Camões:

Esta foi Lusitânia, derivada

De Luso ou Lisa, que de Baco antigo

Filhos foram, parece, ou companheiros

(Canto III, estrofe 21)

Este vocábulo foi usado, já antes de Camões, pelo antiquário e escritos, cónego
de Évora, André de Resende, no seu livro Carmen eruditum et elegans…
impresso em 1531. Trata-se, portanto, de um neologismo, criado por imitação
de Virgílio que, Eneias, formou Eneida.

Ao contrário de Homero e Virgílio, Camões não escolheu um herói individual que


motivasse o título da sua obra, mas procurou que a sua epopeia anunciasse a
história de um herói colectivo – o povo português.

Mensagem vs Os Lusíadas

Relação intertextual
Semelhanças:

Diferenças
Resumindo:

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