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Mensagem de Fernando Pessoa

 Portugal estava estagnado, assente numa economia agrária e dependente das colónias. Criou-se o
Estado Corporativo, que contava já com Salazar na pasta das Finanças e organizador do Estado
Novo.
 Mensagem foi a única obra completa de Pessoa publicada em vida.
 Esta obra é composta por 44 poemas escritos entre 1913 e 1934.
 Apresenta uma estrutura tríade ou tripartida, traduzindo a evolução do Império Português:
o 1ªparte- Brasão (desfile dos fundadores da pátria, os construtores de um Império, “O Pai”,
nascimento - desenha o Portugal erguido pelo esforço dos heróis e destinado a grandes
feitos), que está também dividida em 5 partes:
 I. Os Campos (2 poemas);
 II. Os Castelos (8 poemas);
 III. As Quinas (5 poemas);
 IV. A Coroa (1 poema);
 V. O Timbre (3 poemas).
o 2ªparte- Mar Português (retrata a conquista marítima e a luta contra os mares, ou seja, Os
Descobrimentos, “O Filho", símbolo da realização e da vida), que conta com 12 poemas. Em
“Mar Português”, podemos encontrar a evocação da viagem dos navegadores pelo
desconhecido e a consequente descoberta de novas terras e aquisição de novos
conhecimentos há a descrição de um mundo novo através de uma visão paradisíaca de um
espaço até então desconhecido. O poema “Horizonte” surge como símbolo da
representação da ambição e da expectativa.
o 3ªparte- O Encoberto (nesta parte dá-se a morte do Império material português, havendo
por isso uma mágoa, pois “falta cumprir-se Portugal” e a ressurreição do Império Mítico,
simbolizado por D. Sebastião, “O Espírito Santo"), que está dividida em 3 partes (a primeira
manifesta a esperança e o sonho, pois o atual império encontra-se moribundo; a segunda
define os espaços de Portugal e a terceira traduz-se na ansia e saudade daquele Encoberto
que virá edificar o V Império.
 I. Os Símbolos (5 poemas);
 II. Os Avisos (3 poemas);
 III. Os Tempos (5 poemas).
o “Brasão” simboliza a independência, o orgulho da raça e o génio criativo que permitiu, ao
longo de séculos, a preparação da gloriosa obra das descobertas. “Mar Português” simboliza
essa obra de tão alto valor cultural e científico, período áureo da nossa história. Por fim, o
“Encoberto” é o período que vem desde a partida do Rei ido (D. Sebastião) e irá até ao seu
regresso, tendo toda a carga de ardente esperança de quem tanto esperou o seu rei.
 A Mensagem é composta por nacionalismo místico, é um livro patriótico. Neste livro, Fernando
Pessoa exalta os heróis e os mitos nacionais, tal como o potencial daqueles que se foram e
deixaram legado, que será maior ainda no futuro. Valoriza todas as figuras nacionais.
 A poesia da Mensagem é épico-lírica, não só pela forma fragmentária como pela atitude
introspetiva, de contemplação no espelho da alma, e pelo tom menor adequado. De um modo geral
interioriza, mentaliza a matéria épica, integrando-a na corrente subjetiva, reduzindo essa matéria a
imagens simbólicas pelas quais o poeta liricamente se exprime.

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 Discurso épico:
o Tom maior;
o Mitificação de um herói;
o Importância atribuída a acontecimentos marcantes da história;
o Uso narrativo da 3ª pessoa;
o Discurso direto.
 Discurso lírico:
o Tom menor;
o Dimensão simbólica dos heróis;
o Expressão de emoções e da subjetividade;
o Uso da 1ª pessoa.
 Este livro tem uma elevada intertextualidade com os Lusíadas, ambos falam sobre os heróis
mitificados portugueses e como Portugal têm a missão de vir a ser o V Império, sendo o dos
Lusíadas físico e o da Mensagem espiritual. Camões conta o Portugal que foi, Pessoa narra Portugal
que há de haver. E ainda em Os Lusíadas Camões canta os feitos gloriosos lusos que deram inicio ao
grande império que se estendeu pelo diversos continentes, enquanto Pessoa canta o fim do
império territorial, procurando incentivar o aparecimento de um império de língua, cultura e de
valores.
 Reavivando o mito sebastianista e anunciando o Quinto Império, Pessoa procurou, tal como
Camões, ser a voz da consciência da identidade de que Portugal necessitava e necessita. Procurou
mobilizar o povo para a importância da ação.
 Camões, em Os Lusíadas, e Fernando Pessoa, em Mensagem, cantam, em perspetivas diferentes,
Portugal e a sua história, realçando a expansão marítima e o alargamento da Fé. Enquanto o
primeiro celebra o apogeu e pressente a decadência do Império, o segundo retorna às origens e às
descobertas marítimas, mas situa-se na fase terminal do processo de dissolução do mesmo Império.
 Pessoa é o cantor épico-lírico que canta o Império "à beira-mágoa", procurando despertar os
espíritos para a necessidade do seu ressurgimento. Se nas duas primeiras partes de Mensagem é
possível uma aproximação a Os Lusíadas, na terceira parte, Pessoa sente-se investido no cargo de
anunciador do Quinto Império, que não pode ser material, mas civilizacional.
 Camões, para cantar o povo intrépido, narra a viagem de Vasco da Gama e as descobertas; Pessoa
prefere cantar Portugal e o Império, propondo uma interpretação dos seus sonhos, símbolos e
mitos, e :tentando despertar o povo para a crença de que o Messias, "O Encoberto", está a chegar.
 Em Mensagem os números tem uma grande simbologia:
o “1”- Único, individualidade, Deus (para os cristãos), união, harmonia, perfeição;
o “2”- Dualidade, confronto de opostos, companheirismo;
o “3”- Perfeição, união corpo-espírito-mente, nascimento-morte-ressurreição, união deus-
universo-homem;
o “5”- Centralidade, união, harmonia, equilíbrio;
o “7”- Tragédia, azar, semana, medo do desconhecido;
o “9”- Gestação humana;
o “12”- Meses do ano, horas do dia e da noite, número dos apóstolos de cristo, signos.
● Poema “O dos Castelos” (primeiro poema de Mensagem): país dos Castelos é Portugal, que pela sua
localização tem uma missão (a de conquistar o Ocidente através da sua cultura e guiar a Europa

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para a frente, de modo a que a mesma se erga, esta é representada como uma figura feminina
neste poema, sendo Portugal a cabeça).
● O poema “Ulisses” pertence a “Os Castelos” da primeira parte da Mensagem intitulada "Brasão".
Nesta há um desfile de personalidades reais ou lendárias responsáveis pela fundação da
nacionalidade. Ulisses é apresentado como o herói que inicia a árvore genealógica da nação
portuguesa, sugerindo que os portugueses estão, por isso, predestinados a uma ação pioneira na
expansão ultramarina. Assim, ele surge como uma força mágica que teve a grandeza de criar a
cidade de Lisboa. Neste poema é ainda referido que “O mito é o nada que é tudo”, o nada é porque
não tem existência real, mas são o tudo porque tem essa capacidade de criação. O mito é, também,
considerado vida porque se não existir certas coisas, como a cidade de Lisboa morrem (a vida sem o
mito, força mágica, é menos que nada e o seu destino é a morte”.
● No poema “Viriato”, o mesmo representa a coragem, a força, a luta. Viriato que tornou possível a
criação de Portugal. Viriato, como outras figuras carismáticas têm potencial para ser mitificado
todas as personalidades históricas que, de uma forma ou de outra, engrandeceram a pátria que
ajudaram a criar, vão ser mais ou menos envoltas por uma auréola mítica. 0 potencial mítico das
várias figuras históricas presentes em Mensagem constitui “A verdade da mentira”, pois tem a
função social da despertar e conduzir os homens para o futuro grandioso- o Quinto Império.
● No poema “D. Dinis”, são apresentadas duas facetas do rei D. Dinis, a de poeta e a de lavrador.
Existe uma metáfora recorrente ao longo do poema que acentua a ação de D. Dinis ter mandado
plantar o pinhal de Leiria, sendo esta ação que permitiu a construção do Império Marítimo (o pinhal
surge como o principal alimento do Império, já que daqui saiu a madeira para as naus). Este poema
surge estruturado com base na articulação do campo lexical de mar e do campo lexical de terra,
que muitas vezes se unem.
● No poema “Nun’Álvares Pereira”, que é um escolhido para realizar feitos grandiosos, através da
espada e da aréola (já que o mesmo foi santificado). Este homem fez possível que Portugal
acontecesse e o fará novamente com a sua luz que nos iluminará para a construção do V Império.
● Há nos dois poemas apresentados acima (“D. Dinis” e “Nun’Álvares Pereira”), uma atitude
introspetiva presente na reflexão sobre o valor fecundador deste dois mitos. D. Dinis e Nun’Álvares
Pereira surgem como personagens simbólicas, descritas liricamente com recurso a metáforas,
interrogações retóricas e associados a determinados símbolos como a espada, no caso do herói
guerreiro. Os poemas também estão escritos com um tom menor, reflexivo e contemplativo,
quando comparados com o tom maior, de exaltação épica, presente nos Lusíadas. Recorrendo a
estas figuras lendárias, Pessoa escreve um novo tipo de epopeia não sobre o que foi a história de
Portugal mas sobre o sonho e aquilo que vai ser o Portugal místico, a cabeça de um Império
Espiritual, o V Império.
● No poema “D. Sebastião, rei de Portugal”, foi investida toda a potência dos sonhos e desejo mítica
do povo português. A loucura, de que os sonhos são feitos, é sinal valorativo do herói que persegue
o impossível. D. Sebastião é Portugal. Com o seu desaparecimento Portugal ficou dependente e
iniciou-se o seu processo de decadência, com a sua vinda, a pátria conseguiria a sua libertação
espiritual- o Quinto Império. O mais importante mito de Pessoa é o do D. Sebastião. Dele o poeta
disse: “Temos, felizmente, um mito sebastianista com raízes profundas no passado e na alma
portuguesa (...) não temos que criar um mito, senão que o renovar”. Explicou ainda: "No seu
sentido simbólico D. Sebastião é Portugal. Portugal que perdeu a sua grandeza e que voltará a tê-la
com o regresso dele, regresso simbólico”. Nos últimos três versos é apresentada a ideia de que sem

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a loucura o ser humano não é nada mais que uns animais saudáveis, nada mais que um cadáver que
apenas erra a morte, que apenas procriam (“Sem a loucura que é o homem/Mais que a besta sadia
(saudável),/Cadáver adiado que procria?”).
● No poema “O Infante” reforça-se a ideia de que é necessária loucura e vontade divina para
concretizar os sonhos (“Deus quer, o homem sonha, a obra nasce”). Aborda-se também o facto de
o Império português ter sido criado, após a conquista dos mares, mas que o mesmo morreu. No
último verso apela-se a Deus para que deixe que haja um novo Império, o V Império, (“Senhor, falta
cumprir-se Portugal”).
● A primeira estrofe de “Horizonte” evoca a viagem dos navegadores pelo desconhecido e a
consequente descoberta de novas terras e aquisição de novos conhecimentos. Já a segunda sextilha
descreve um mundo novo através de uma visão paradisíaca de um espaço até então desconhecido.
Por fim, a terceira estrofe interpreta simbolicamente o Horizonte enquanto representação da
ambição, da expectativa e do sonho de grandes conquistas. O último verso deste poema, “Os beijos
merecidos da Verdade”, foi retirado d’Os Lusíadas, mais concretamente da Ilha dos Amores, este
afirma que quem teve as recompensas (os beijos) foram aqueles que tiveram loucura e perderam
os seus medos.
● No poema, “Mar Português”, mostra-se quais os sacrifícios inerentes à conquista do mar e tecem-
se considerações sobre a ambição humana. Afirma-se que os perigos são bens necessários para a
descoberta, que “a alma não” ser “pequena” é uma condição necessária para a grandeza e que para
a mesma acontece é necessário estar acima da dor (“Quem quer passar além do Bojador/Tem que
passar além da dor.”).
● No poema “Mostrengo”, estão presentes características épicas e líricas que, mais uma vez,
evidenciam a natureza épico-lírica de Mensagem. Quanto às características épicas, elas são visíveis
no relato de um episódio da história de Portugal, passagem do Cabo das Tormentas. Para tal
acontecimento, foi necessária a ousadia e a coragem do herói face às forças adversas da natureza.
Através da sua ação temos o enaltecimento do povo português que assim ergue o Império. Já as
características líricas evidenciam-se pelo tom introspetivo e subjetivo pautado pela expressão dos
sentimentos e pelo acentuar de um clima de terror e de violência.
● No poema “A última nau”, podemos encontrar características quer do discurso épico, quer do
discurso lírico. Como característica do discurso épico, podemos apontar a mitificação de um herói
(“Deus guarda o corpo e a forma do futuro,/Mas Sua luz projeta-o, sonho escuro/E breve"). Em
relação ao discurso lírico está presente a expressão da subjetividade do sujeito poético, evidente na
utilização da primeira pessoa (“minha alma”, “vejo”) e no uso da interjeição (“Ah”).
● O poema “O Quinto Império” dirige-se, num momento inicial, aos burgueses acomodados, aqueles
que não têm loucura (sonhos, desejos, ambições, vontades), aos que não procuram grandeza.
Retoma a ideia exposta nos últimos versos de D. Sebastião. Para o sujeito poético “Ser descontente
é ser homem”, é uma característica intrínseca para as conquistas. Na última quintilha, faz-se
referência aos antigos Impérios (I-Império Grego, II-Império Romano, III-Império da Cristandade, IV-
Império Europa) que já se foram. Este poema acaba com uma interrogação retórica (que prova a
liricidade do mesmo), “Quem vem viver a verdade/Que morreu D. Sebastião?”. O Quinto Império, o
Império Português, será concretizado com o regresso de D. Sebastião, terá um carácter universal.
Trata-se de um Império não material, mas civilizacional, cultural e espiritual, marcado pelo domínio
da língua portuguesa. Fernando Pessoa tem um fervor patriótico que é típico de muitos
modernistas, e o seu nacionalismo é um tema que aprofunda, sobretudo, na última parte da sua

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obra. A este facto não é alheia uma forte ideia de regeneração por vir, que tem a sua manifestação
mais clara no Sebastianismo e na ideia de um Quinto Império, a concretizar pela Língua Portuguesa.
● Reativar o mito ou os mitos profundos do povo português, eis o objetivo de Fernando Pessoa, que
na Mensagem se faz o profeta (mas um profeta angustiado, torturado e saudoso) do regresso de D.
Sebastião e da instauração do Quinto Império, embora um D. Sebastião e um Quinto Império muito
diferentes da tradição comum.

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Dimensão Simbólica do Herói

O conceito de herói em Mensagem é indissociável da intervenção divina que o "sagrou"; é uma figura que,
com trabalho e esforço, percorre um caminho sofrido. Assim, o objetivo é colocar em destaque o heroísmo
de todos os que ajudaram a construir, alargar e consolidar o império português. O herói coletivo sofreu,
lutou e saiu engrandecido das tarefas das conquistas e dos Descobrimentos. Mais tarde, num presente de
decadência, de mágoa e de saudade, o povo há-de recordar esse passado grandioso e desejar construir um
futuro renascido pela sua grandeza espiritual.

Se o herói camoniano é guerreiro, o herói pessoano é contemplativo, embora manifeste capacidade de


sonhar; é um mito (porque foi capaz de criar a realidade) e tem por missão combater a estagnação em que
o país se encontra. A conceção de herói é, pois, messiânica, numa conjugação dos planos espiritual e
humano. Em Mensagem, o herói é escolhido por Deus e é-lhe confiada uma missão; por isso o herói é
alguém que é capaz de interpretar a vontade divina e que aceita a missão que superiormente lhe foi
confiada. A sua grandeza de alma alia-se à vontade de se distinguir pelo espírito, razão pela qual não
conhece os limites da condição humana, como acontecia com os heróis dos Descobrimentos.

Exaltação Patriótica

Mensagem celebra as qualidades dos portugueses que, no passado, ajudaram a construir um país e que,
no futuro, o deverão ajudar a reerguer-se. Há assim, uma voz saudosa e magoada do passado, mas ao
mesmo tempo, há o sonho de um novo império, alimentado pelo sentimento sebastianista.

De facto, a obra destaca os heróis (D. Afonso Henriques, D. Dinis, D. João l, Nun' Álvares Pereira, o infante
D. Henrique) que, com sacrifício, conquistaram, defenderam ou desvendaram territórios, mares, cidades,
levando a claridade "até ao fim do mundo".

Não se limitando, como Camões, ao elogio do português que desvendou novos mundos e que "se mais
mundos houvera, lá chegara", Pessoa destaca ainda a força de outrora de um povo dominador, possuidor
de um império territorial espalhado por vários continentes. Tudo isto aconteceu porque houve vontade,
esforço, dedicação e capacidade de sofrimento. Na verdade, quando se consegue conjugar o que "Deus
quer" com o que "o homem sonha", então aí "a obra nasce!

Agora, para que esse elogio continue a ser merecido e para que "possa cumprir-se Portugal", cabe a este
país e a este povo guiar a Europa e o Mundo, até atingir um novo Império, que terá de ser cultural e
civilizacional.

O poeta relembra, de forma fragmentária e numa atitude introspetiva, o império territorial passado
conquistado através do heroísmo, e que contrasta com o presente de declínio e a necessitar de força
anímica. Assim, Pessoa ousa profetizar, numa perspetiva messiânica, um futuro que cumpra Portugal -
Quinto Império.

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