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O das Quinas  sistematização

O poeta faz uma série de afirmaçõ es paradoxais – “Os deuses vendem


quando dã o” -, ou baseadas em jogos de palavras – “Baste a quem basta o que lhe
basta” – com um ú nico objetivo: mostrar que para se atingir a grandeza, para se
conquistar a gló ria é indispensá vel estar disposto a sofrer – “Compra-se a gló ria
com a desgraça”.
Qual será , pois, o destino do Homem, mais particularmente o do Homem
português? O mesmo de Cristo: tal como Ele, os portugueses só ascenderã o a um
plano superior, transcendendo-se, superando as limitaçõ es da pró pria vida, por
natureza efémera – “A vida é breve, a alma é vasta”.
Estã o, entã o, traçadas as potencialidades da alma portuguesa, uma alma
que se afirma “vasta”, grande – será esta grandeza de alma que presidirá todos os
heró is de Mensagem.
Se se descodificar o título do poema, “as quinas” correspondem à s cinco
chagas de Cristo, símbolo do sofrimento e morte redentores da humanidade. Por
conseguinte, as quinas sã o, desde logo, a expressã o de que só o sacrifício conduz
à redençã o e à gló ria, projetando a missã o de Portugal para um plano de espiri-
tualide.

D. Afonso Henriques  sistematização

D. Afonso Henriques é apelidado pelo poeta de “Pai”. Ele é, simultanea-


mente, “Pai” e “cavaleiro” – Pai, porque fundador da nacionalidade e, por isso, pai
dos portugueses; cavaleiro, porque, com a “espada”, defendeu e conquistou o ter-
ritó rio português, mas também se assumiu como defensor da fé. Entã o, o poeta
pede-lhe que, nos dias de hoje, ele sirva de exemplo aos portugueses e que a sua
força inspire a uma açã o que vença os “novos infiéis”, ou seja, todos aqueles que
se opõ em à missã o espiritual e providencial de Portugal que, para o poeta, é uma
certeza inabalá vel.

Espada:
 Confere luminosidade (tudo à sua volta se torna claro);
 Defesa dos valores (morais, religiosos, nacionais);
 Símbolo de cavalaria  uniã o mística entre o cavaleiro e a espada;
 Valor profético;
 Símbolo: Da Guerra Santa (guerra interior); Do verbo, da palavra; Da
conquista do conhecimento; Da libertaçã o dos desejos; Da espiritualidade; Da
vontade divina;

D. Dinis  sistematização

Pessoa evoca a figura histó rica de D. Dinis, monarca português da 1ª di-


nastia, filho de Afonso III. A sua prioridade enquanto rei foi administrar e organi-
zar o Reino português e nã o guerrear, tendo assinado a paz com Castela em
1297. Foram-lhes atribuídos os cognomes “O Lavrador” e “O Trovador”, tanto
pelo impulso que deu ao desenvolvimento da agricultura, como pelo apreço ma-
nifestado pelo culto da arte de fazer poesia e pela elevaçã o do português como
língua oficial.
Os dois primeiros versos do poema remetem, de imediato, para essa du-
pla faceta – D. Dinis “escreve um seu Cantar de Amigo” e é “plantador de naus a
haver”, sendo estas construídas com o produto dos pinhais por ele mandados
semear. D. Dinis representa, pois, aquele para quem a poesia terá , entre outros,
como objetivo cantar o império português e aquele que lançará a semente de fu-
turos impérios.
Nos restantes versos, destaca-se toa uma serie de vocá bulos que expri-
mem sons, vozes, rumores, como se de uma profecia se tratasse (“marulho obs-
curo”; “fala dos pinhais”; “o rumor dos pinhais”). Todos eles profetizam a grande
epopeia marítima portuguesa dos séculos XV e XVI.
D. Dinis é, entã o, o profeta que sabe intuir, de forma sibilina (enigmá tica), o
grande império das descobertas. Assim, o que se preconiza é o sonho fundador
que permita a construçã o de um tempo futuro.

O Mostrengo – sistematização

Este poema simboliza a interminá vel e difícil tarefa da conquista do mai, o


poeta narra o encontro – aquando da primeira passagem do cabo das Tormentas
em 1488 – entre a figura horrenda do Mostrengo e o homem do leme, represen-
tante de todos os protagonistas da aventura marítima, os navegadores portugue-
ses.
Numa relaçã o clara de inferioridade física com o monstro marinho, o ho-
mem do leme nã o se deixa intimidar, e lança-lhe o seu desafio: dar cumprimento
à vontade inflexível de D. Joã o II.
Ao dominar o Mostrengo, o homem do leme protagoniza a vitó ria dos na-
vegadores portugueses sobre todos os obstá culos que o mar oferecia: os medos e
os inú meros perigos.

Poema cuja extensã o parece querer simbolizar o longo e difícil processo de


conquista do mar:
 O cará ter narrativo do poema;
 O dialogo a três vozes: sujeito poético, Mostrengo e homem do leme;
 A simbologia do Mostrengo: todos os perigos, medos e obstá culos;
 A dimensã o simbó lica do homem do leme: anó nimo que dá voz ao sentir e à
ousadia de um povo;
 Poema eco da tradiçã o lendá ria: o desafio do homem face aos limites da sua
condiçã o humana;
 A insistência no numero três e sua simbologia.

O Mostengo:
 Revela atitudes intimidató rias, ameaçadoras, amedrontadoras;
 É informe (nã o tem uma forma concreta);
 Está carregado de conotaçã o negativa;
 É pouco definido, pouco descrito (nã o tem identidade);
Simboliza os perigos do mar, os obstá culos, as adversidades e os medos.

Prece – sistematização

Trata-se do ú ltimo poema da segunda parte de Mensagem, Mar Português,


onde sã o exaltados os acontecimentos e o heró i das descobertas marítimas por-
tuguesas, constituindo, também, um prenuncio da linha temá tica estruturadora
da ultima parte de Mensagem – o Encoberto.
O poema é, sem dú vida, um apelo a uma entidade divina e superior – “Se-
nhor” – em quem o sujeito poético deposita a esperança de um futuro redentor.
Se, na primeira quadra domina um sentimento de desencanto e a disforia se tor-
na notó ria, no resto do poema sucede a certeza de que nem tudo é irremediá vel e
de que é possível restaurar a grandeza perdida, ou, pelo menos, conquistar uma
outra grandeza – o poeta acredita que é possível recuperar o passado grandioso
e avançar para um futuro promissor e positivo. Assim, para ele, a esperança ain-
da sobrevive, a chama da vida ainda nã o está completamente extinta, ela apenas
dorme debaixo do “frio morto em cinzas”.
O que é preciso, entã o? Basta que a “mã o do vento” a erga, basta apenas
um golpe de vontade e, uma vez levantado “o sopro, a aragem”, o esforço ganhará
forma e, de novo, haverá a certeza de conquistar a “Distâ ncia”. Esta distâ ncia nã o
tem necessariamente que ser a do mar, mas será , sobretudo, “nossa”, ou seja, se-
rá a condiçã o redentora do desencanto do povo português. O tom das duas qua-
dras é, pois, a de um choro apelo à açã o, numa antevisã o de um novo império, o
Quinto Império – um império nã o mais material porque eterno.

D. Sebastião – sistematização

Este poema, que abre a terceira parte de Mensagem, utilizando um dis-


curso na primeira pessoa, inicia-se com um apelo do rei aos portugueses, a quem
o monarca transmite a esperança de um futuro promissor. Para o rei, a “hora ad-
versa” do presente nã o é mais do que o “intervalo” necessá rio para o início da
realizaçã o de um grande sonho universal e eterno – “é o que eu me sonhei que
eterno dura” – que ultrapassará a precariedade do momento em que o D. Sebas-
tiã o histó rico, aquele que desaparecer na batalha de Alcá cer Quibir, caiu no areal.
A derrota, em Alcá cer Quibir, assim, apresentada como “um mal neces- sá rio” para se
ultrapassar a dimensã o material e efémera do império português – “o areal e a morte e a
desventura” – e se começar a construir uma outra grandeza possuidora de uma dimensã o
espiritual e eterna, o Quinto Império, inspirado na figura do rei – “É esse que regressarei”.
O rei assume-se como uma espécie de messias, um enviado de Deus – “Que Deus concede
aos seus”; “Se com Deus me guardei?” –, um salvados que conduzirá o seu povo à gló ria
eterna.

Terceiro – sistematização

Este é o ú nico poema de Mensagem que nã o apresenta título, sendo, por


esse facto, considerado como aquele em que o discurso se identifica com o pró -
prio Pessoa.
O poema estrutura-se em torno do desencanto e da má goa do poeta que
sente os seus “dias vá cuos”, o vazio que subjaz à ruína do império, e que anseia
pela chegada de um messias, de um salvador, que possa restituir a Portugal a
grandeza perdida – “Quando virá s, Ó Encoberto, /Sonho das eras português”.
O predomínio das interrogaçõ es revela essa dor do presente e a â nsia da
chegada da “Nova Terra” e dos “Novos Céus”. Atende-se, ainda, na identificaçã o
realizada pelo sujeito poético entre o sonho e a entidade divina inspiradora –
“Quando, meu Sonho e meu Senhor?” – que o torna uma das forças impulsiona-
doras da vontade humana.
Horizonte – sistematizaçã o

O horizonte é símbolo do indefinido, do longe, do mistério, do desconhe-


cido, do mundo a descobrir, do objetivo a atingir.
Através da apó strofe inicial, "Ó mar anterior a nó s", o sujeito poético diri-
ge-se ao mar desconhecido, ainda nã o descoberto/navegado.
Na 1ª estrofe encontramos uma oposiçã o implícita. A oposiçã o refere o
mar anterior aos Descobrimentos portugueses ("medos", "noite", "cerraçã o",
"tormentas", "mistério" - substantivos que contêm a ideia de desconhecido, que
remetem para a face oculta da realidade) e o mar posterior a esse feito ("coral e
praias e arvoredos", "Desvendadas", "Abria", "´Splendia" - palavras que contêm a
ideia de descoberta).
A expressã o "naus da iniciaçã o" (v. 6) é uma referência à s naus portugue-
sas que, impulsionadas pelos ventos do "sonho", da "esp'rança" e da "vontade",
abriram novos caminhos e deram início a um novo tempo.
A segunda estrofe é essencialmente descritiva. Essa descriçã o é feita por
aproximaçõ es sucessivas, de um plano mais afastado para planos mais pró ximos:
a "Linha severa da longínqua costa" (o horizonte);"Quando a nau se aproxima,
ergue-se a encosta / Em á rvores"; "Mais perto", ouvem-se os "sons" e percebem-
se as "cores"; "no desembarcar" veem-se "aves, flores".
O sujeito poético, na ú ltima estrofe, apresenta uma definiçã o poética de
sonho: O sonho é ver o invisível – “o sonho é ver as formas invisíveis” –, isto é,
ver para lá do que os nossos olhos alcançam (ver longe); o sonho é procurar al-
cançar o que está mais além (é esforçar-se por chegar mais longe); o sonho é al-
cançar/aceder à Verdade, sendo que esta conquista constitui o prémio de quem
por ela se esforça. De salientar, aqui, o uso do presente do indicativo - "é" - que
confere, a estes versos, um cará ter intemporal e programá tico.
Nos versos 16 e 17 é reforçada a passagem do abstrato ao concreto. Essa
passagem é reforçada pela acumulaçã o, no verso 17, de nomes concretos, prece-
didos de artigos definidos: "A á rvore, a praia, a flor, a ave, a fonte", que têm uma
simbologia muito peculiar.
Este poema apresenta-nos o sonho como motor da açã o dos Descobri-
mentos. É o sonho que, movido pela esperança e pela vontade, desperta no ho-
mem o desejo de conhecer, de procurar a Verdade – etapa ú ltima de qualquer
demanda.
O título "Horizonte" evoca um espaço longínquo que se procura alcançar
funcionando, assim, como uma espécie de metá fora da procura, como um apelo
da distâ ncia, do "Longe", à eterna procura dos mundos por descobrir. Assim, este
é um dos poemas que demonstram um Pessoa nacionalista místico, que respira
um patriotismo de exaltaçã o e de incitamento.

A Última Nau – sistematização

“A ú ltima nau” aparece como uma espécie de lead-in, de introduçã o à Ter-


ceira Parte de Mensagem, que ainda nã o se iniciou. É este um período intermédio
de poesia, palavras de anoitecer, saindo da luz (a vida) do que é conhecido em
que fomos ainda guiados pelos sentidos, para entrarmos na escuridã o completa
da noite (a morte), onde apenas os símbolos nos vã o guiar.
Na primeira estrofe ele encarna os que ficaram na praia a ver a expediçã o
de D. Sebastiã o partir. “A ú ltima nau”, que s~o todas as naus e nenhuma, “levan-
do a bordo El-Rei D. Sebastiã o (…) Erguendo (…) alto o pendã o / Do Império, /
Foi-se / (…) entre choros de â nsia e de pressá gio”. A cena surge-nos aos olhos da
alma, que se enchem de lá grimas, como aqueles que viam partir o Rei e com ele o
Império Material. Novamente a dor, a pró pria morte sã o enaltecidas como ne-
cessá rias para o renascimento, para a revelaçã o do “Mistério” que ficou, quando
o Rei se foi com a ú ltima nau.

“A que ilha indescoberta / Aportou? Voltará da sorte incerta / Que teve?”


– Pessoa invoca aqui, como o fez por exemplo no seu drama está tico O Marinhei-
ro, a mesma ilha misteriosa, na qual é possível aquilo que agora é impossível. É a
mesma ilha longínqua que Jacinto do Prado Coelho identifica na Mensagem, di-
zendo-nos – lembrando Castro Meireles – que Pessoa desenha também “a histó -
ria trá gico-marítima de si pró prio”.

O regresso de D. Sebastiã o – que Pessoa chega a considerar realmente


possível pela transmigraçã o das almas – parece, de certa maneira, irrelevante
porque “Deus guarda o corpo e a forma do futuro”. No entanto, se o Destino está
certo, ele está guardado em mistério – “Sua luz projeta-o, sonho escuro / E bre-
ve” nos homens, que têm de o revelar. Nem todos o vã o conseguir fazer.

A terceira estrofe é verdadeiramente confessional esta passagem. Aqui


derrama Pessoa a sua frustraçã o com a maneira como a sociedade de Portugal
está estagnada e em decadência social, econó mica e cultural – “Quanto mais ao
povo a alma falta, / Mais a minha alma atlâ ntica se exalta / E entorna”.
De novo Pessoa pega num negativo (morte) para que surja um positivo
(vida).
Ele vê-se a si mesmo claramente como alguém capaz de operar – ou pelo
menos ter um grande papel – nesta regeneraçã o nacional. Ele diz: “E em mim (…)
Vejo (…) teu vulto baço / Que torna”. É ele – Fernando Pessoa – que vê, como vê
um profeta, um Bandarra, um Vieira. Vê claramente o “vulto baço" como se fosse
certo o regresso do rei, embora fosse desfocado “o (seu) corpo e a (sua) forma”.

A certeza de Pessoa acha aqui nobre conclusã o. “Nã o sei a hora, mas sei
que há a hora”. De maneira perentó ria o poeta nã o deixa dú vidas ao leitor – o re-
gresso de D. Sebastiã o será uma realidade. Mas num futuro incerto.
Como tem ele tanta certeza? É fá cil esconder a certeza em ambiguidade:
“Demore-a Deus, chame-lhe a alma (…) / Mistério”. “Mistério” é afinal uma pala-
vra que pode tomar diferentes significados. A certeza é uma certeza interior, fir-
mada numa convicçã o de “iniciado”.

“Surges ao sol em mim e a névoa finda” – eis um bom exemplo do que


acabá mos de dizer. O sol (conhecimento) surge dentro dele (“em mim”) e a “né-
voa finda” (a ignorâ ncia). Simples e linear, embora esotérica, a linguagem de
Pessoa é clara. A nau que ele vê, agora já totalmente simbó lica é “a mesma”, que
traz “o pendã o ainda / Do Império”. Ou seja, o passado regressa igual, mas já mi-
to, nã o para ser o mesmo, mas para alimentar uma nova realidade.

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