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“Mensagem” é uma coletânea de poemas em que a inteligência poética do autor surge associada à realidade
histórica de Portugal (o livro esteve, justamente, para ser intitulado “Portugal”), embora segundo uma
conceção que podemos considerar simultaneamente mística e mítica. Designando-se um “nacionalista
místico, um sebastianista racional”, Pessoa faz coincidir o aparecimento do livro, como ele próprio afirma,
“com um dos momentos críticos (no sentido original da palavra) da remodelação do subconsciente
nacional”.
A obra é constituída por 44 poemas, quase todos breves e com uma estrutura formal alicerçada na lírica
tradicional (como é típico da maior parte da poesia de Pessoa ortónimo), e divide-se em 3 partes:
Esta primeira parte conta com cinco subdivisões, que correspondem aos elementos da bandeira nacional: Os
Campos; Os Castelos; As Quinas; A Coroa; O Timbre. Iniciando-se com o poema “O dos castelos”, onde se faz
uma descrição antropomórfica da Europa, sendo Portugal o “rosto” com que a Europa “fita” o Ocidente e o
futuro, e depois de um poema dedicado ao herói grego Ulisses (segundo a lenda, terá fundado Lisboa), nesta
parte vão desfilando as mais conhecidas figuras da História de Portugal, de Viriato a D. Sebastião.
Não tem subdivisões e os seus doze poemas prendem-se todos com a gloriosa época dos Descobrimentos e
da expansão ultramarina (século XV e primeira metade do século XVI). O Infante D. Henrique, bem como os
navegadores Diogo Cão, Bartolomeu Dias, Vasco da Gama e Fernão de Magalhães são os heróis da conquista
do “Mar Português”, esses que, segundo Camões, deram “novos mundos ao mundo”. Pertencem a esta
parte alguns dos mais conhecidos poemas da obra, como “O Infante”, “Horizonte”, “O Mostrengo” ou “Mar
Português”.
A última parte subdivide-se em três grupos: Os Símbolos, Os Avisos; Os Tempos. Trata-se da parte em que o
pensamento místico sobre o destino português e o profetismo sebastianista se inscrevem mais
acentuadamente, através da exploração dos mitos do Encoberto e do Quinto Império. Já no poema “Prece”,
o último da segunda parte, se aludia à decadência de Portugal após a época áurea dos Descobrimentos
(“Restam-nos hoje, no silêncio hostil, / O mar universal e a saudade.”), para se apelar depois a um
movimento de regeneração (“E outra vez conquistemos a distância”). Já em 1912, Pessoa escrevia, como
que anunciando a chegada do Quinto Império: “E a nossa raça partirá em busca de uma Índia Nova, que não
existe no espaço, em naus que são construídas ‘daquilo de que os sonhos são feitos’. E o seu verdadeiro e
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supremo destino, de que a obra dos navegadores foi o obscuro e carnal ante-remedo, realizar-se-á
divinamente.”
Às três partes da obra podem associar-se três fases da História de Portugal e do destino do povo português.
A primeira fase corresponde ao nascimento e formação do país. A segunda parte é a realização, sendo
inteiramente dominada pela empresa dos Descobrimentos. O seu elemento dominante – o mar – estabelece
a passagem do império material e terreno para o império espiritual. A última parte, partindo da constatação
da decadência, aponta para o renascimento da nação.
A obra termina com o poema “Nevoeiro”, que remete diretamente para a redenção da pátria (segundo o
mito do Sebastianismo, seria, justamente, numa manhã de nevoeiro que D. Sebastião regressaria para
resgatar a independência de Portugal), depois de um período de decadência. O nevoeiro é uma atmosfera
de opacidade, de indefinição, de interregno, a que se seguirá uma nova atmosfera luminosa que traga a
regeneração da pátria. Daí que, no final do poema, surja uma apóstrofe a Portugal, logo seguida de frase
exclamativa em tom de apelo:
É a hora!
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A “Mensagem” contém alguns versos que, pela sua força aforística, merecem incorporar a memória dos
portugueses cultos. Eis alguns exemplos de entre os mais significativos:
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No entanto, entre as duas obras as diferenças são também muito significativas. Vejamos:
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Conceção dinâmica Conceção (quase sempre) estática
Herói coletivo: o povo português (“eu canto o Heróis individuais
peito ilustre lusitano”)
Heróis ativos e de “carne e osso” Heróis mitificados, (quase sempre)
contemplativos e carregados de dimensão
simbólica
Predomínio do narrativo Pendor interpretativo
Predomínio do factual Predomínio do simbólico
A viagem, a aventura, o dinamismo, o conflito A quietação, a contemplação, o sonho
O império terreno O Quinto Império (espiritual)
D. Sebastião é ainda uma esperança viva (a D. Sebastião transfigura-se no mito do
obra é dedicada ao rei) Sebastianismo
Aponta-se como saída para a decadência um Profetiza-se a chegada do Quinto Império,
novo empreendimento africano (na parte que vai regenerar Portugal, devolvendo-lhe o
final da obra camoniana, exorta-se D. seu destino universal, mas, desta feita, a
Sebastião a voltar-se para o Norte de África). grandeza será espiritual e não terrena.