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CONTEXTUALIZAÇÃO

Romantismo - Movimento artístico que se manifestou ao longo da primeira metade do século XIX e que se caracteriza pela
aceitação de uma estética que valoriza a liberdade criadora, a subjetividade e o sonho, que exprime as tensões ideológicas e
sociais do artista no seio da sociedade burguesa e que advoga o regresso às tradições medievais.
 Arte fundada no instinto, no sentimento.
 Afirma a total liberdade de criação, recusa regras, cria géneros mistos: prosa poética, drama, romance; consegue a
libertação da linguagem, que se torna coloquial; mistura níveis de língua; digressões; pontuação expressiva.
 Apresenta uma natureza triste, escura, dinâmica, tempestuosa, outonal, crepuscular (“locus horrendus”).
 Arte de inspiração cristã; introduz mitologias nacionais.
 Arte que reabilita e celebra a Idade Média.
> O herói é desequilibrado, impetuoso, insatisfeito, melancólico, revoltado; herói que procura evadir-se no sonho, no tempo e no
espaço; herói fatal que traz a perdição a quem o ama; por vezes, suicida.
> Apresenta uma nova visão da mulher: anjo redentor ou demónio que leva à perdição (mulher fatal); quase sempre vítima do
herói fatal.
Dimensão patriótica
 Mito do sebastianismo cujos porta-vozes são Maria e Telmo. Cf. Retratos de D. Sebastião, Camões, D. João de Portugal
 Incêndio do palácio por D. Manuel de Sousa Coutinho, como forma de resistência aos governadores de Lisboa/à ocupação
espanhola.
Expressão simbólica (situação nacional, sentido de ser português)
 D. João de Portugal: símbolo da Pátria humilhada e cativa.
 D. Sebastião, associado à esperança da recuperação da independência;
 Camões, associado à grandeza da pátria;
 Atitude de D. Manuel (incêndio do palácio): patriotismo e nacionalismo.
 Maria: ideologias políticas nacionalistas (combate à tirania dos governantes). Maria, com o seu entusiástico sebastianismo,
representa a esperança da nação oprimida que um dia se libertará do domínio estrangeiro.
 Valor simbólico dos retratos
Dados históricos:
 Morte de D. Sebastião em Alcácer Quibir (1578) e consequente perda da independência.
 Anexação de Portugal pela Espanha em 1580 /perda da independência.
Ficção:
 Associação da figura de D. Sebastião à de D. João de Portugal, desaparecido em circunstâncias similares.
 Acreditar no retorno do rei sugere a crença no regresso do primeiro marido de Madalena, razão pela qual esta rejeita a
«voz do povo» e os desejos de Telmo e Maria.
 A exploração da temática do Sebastianismo na perspetiva do «antirregresso»: a figura desejada que regressa (D. João),
mas que não encontra lugar no presente e conduz à catástrofe.
Sebastianismo em Frei Luís de Sousa (ficção)
 Tema decorrente do contexto histórico da ação (ocupação espanhola).
 Telmo acredita neste mito e transmite-o a Maria, para terror de D. Madalena, que vê nele o regresso de D. João de
Portugal, seu primeiro marido.
 Com implicações na intriga (regresso de D. Sebastião ↔ regresso de D. João).
DIMENSÃO TRÁGICA - Apesar de ser classificada como drama romântico, a obra Frei Luís de Sousa apresenta características da
tragédia clássica.
 Subordinação ao Destino inexorável.
 Protagonista como pessoa justa, sem culpa, que cai num estado de infelicidade.
 Personagens em número reduzido de estatuto nobre (social e moralmente);
 Ação simples, num crescendo de intensidade confluindo para o desenlace trágico (catástrofe final);
 Presença de indícios trágicos.
 Vislumbre do coro da tragédia clássica em Telmo e Frei Jorge (por vezes anunciam e comentam a ação);
 Concentração do espaço (marcado pelo progressivo fechamento e escurecimento do espaço da ação) - aproximação à
unidade de espaço)
 Concentração do tempo (marcado pela progressiva especificação das marcas alusivas a anos, dias e horas) - aproximação à
unidade de tempo;
Elementos da tragédia clássica:
 D. Madalena apaixona-se por D. Manuel quando ainda era casada com D. João de Portugal; D. Manuel incendeia o palácio
(desafio/hybris).
 Temor de D. Madalena quanto ao regresso do seu primeiro marido.
 Conflito (agon) interior de D. Madalena, que se intensifica ao longo da ação.
 Agouros de Telmo que alimentam a ideia desse regresso.
 Fragilidade física de Maria.
 Incêndio do palácio de Manuel de Sousa Coutinho.
 Chegada do Romeiro (peripécia), portador da desgraça, e reconhecimento (anagnórise) da sua identidade.
 Morte de Maria, separação da família e entrada de D. Madalena e D. Manuel no convento (catástrofe).
Concentração do tempo

Concentração do espaço

Indícios trágicos (exemplos)


 Coincidências temporais; referências à sexta-feira; simbologia dos números três e sete (mistério e fatalidade).
 Presságios/agouros e pressentimentos.
 Sebastianismo de Telmo e de Maria.
 Doença de Maria (tuberculose).
 Perda do retrato de D. Manuel vs. preponderância do retrato de D. João.
 Referências à vida conventual (exemplo de D. Joana de Castro) e à morte.
LINGUAGEM, ESTILO E ESTRUTURA
Frei Luís de Sousa (representado pela primeira vez em 4 de julho de 1843)
LINGUAGEM E ESTILO
 Frequentes repetições, hesitações e frases que omitem o verbo.
 O discurso apresenta elevado número de reticências, interrogações e exclamações.
 Em alguns diálogos, surgem construções do registo social (familiar) e noutros aparecem construções clássicas já caídas em
desuso, no século XIX.
Modo literário: Modo dramático - modo em que a ação é representada pelas personagens.
Elementos constitutivos
 Estrutura externa: três atos, subdivididos em cenas. (mudança de ato  mudança no local da ação)
 Texto principal: falas/réplicas das personagens diálogos, monólogos, apartes.
 Texto secundário: didascálias (ou indicações cénicas).
Género literário: Drama romântico - drama principalmente histórico, que reflete o culto dos sentimentos fortes, mesmo
violentos, próprio do Romantismo.
 Três atos, em prosa.
 Tema de influência nacional.
 Atribuição de sentimentos violentos às personagens (culto da honra, patriotismo, terror provocado sobretudo pela crença no
sobrenatural, efeitos trágicos dos sentimentos).
 Características românticas: temas românticos;
 Ausência do coro (embora as personagens Telmo e Frei Jorge comentem, por vezes, a ação);
 Incumprimento da lei das três unidades (não existe homogeneidade de ação, de tempo e de espaço), respeitada na tragédia
clássica.

Tratamento de temas românticos:


 Mitificação da figura de Camões;
 Valorização do sentimento – autenticidade e a intensidade (força do amor);
 o individualismo: o confronto «eu»/sociedade e a revolta contra as normas sociais constritoras da liberdade e da felicidade
individual - conflito entre a liberdade individual e as imposições exteriores.
 a identidade e os valores nacionais (patriotismo, nacionalismo e sebastianismo);
 a História e a cultura de Portugal (temas e figuras do imaginário colectivo; crenças e agouros populares);
 tema da morte (como liberdade).
 Importância do oculto e da dimensão mística;
 Conceção cristã da existência (religiosidade);
 mito do escritor romântico;
ESTRUTURA DA OBRA
Estrutura externa: Divisão em três atos – Ato I (12 cenas); Ato II (15 cenas); Ato III (12 cenas) - texto organizado de forma
tripartida, regular e harmoniosa.
Momentos importantes:
 Ato I, Cena XII: Manuel incendeia o seu palácio.
 Ato II, Cena XV: O Romeiro descreve-se como «Ninguém», apontando para o retrato de D. João.
 Ato III, Cena XII: Morte de Maria.
Estrutura interna: divisão tripartida da ação dramática
Exposição Ato I, Cenas I a IV Através das falas das personagens tomamos conhecimento dos antecedentes da ação que explicam
as circunstâncias atuais; conhecemos igualmente as personagens e as relações existentes entre elas.
 D. Madalena casa com D. João de Portugal (tinha ela 17 anos).
 D. João de Portugal desaparece na Batalha de Alcácer Quibir.
 D. Madalena procura D. João de Portugal durante sete anos.
 D. Madalena casa com D. Manuel de Sousa Coutinho.
 Nasce Maria.
 Telmo, antigo escudeiro de D. João de Portugal, serve a família de D. Madalena.
Conflito Ato I, Cena V a Ato III, Cena VIII Desenrolar gradual dos acontecimentos, em que se vivem momentos de tensão e de
expetativa – no caso de FLS, desde o conhecimento de que os governadores espanhóis escolheram o palácio de Manuel de Sousa
para se instalarem até ao reconhecimento do Romeiro (Clímax) – e que desencadearam uma série de peripécias.
 Os governadores decidem ir para o palácio de D. Manuel para se afastarem da peste que há em Lisboa.
 D. Manuel incendeia o próprio palácio e muda-se com a família para o palácio de D. João.
 D. Manuel e Maria vão a Lisboa, deixando D. Madalena sozinha com Frei Jorge.
 Chega o Romeiro, que transmite a D. Madalena o recado de que D. João de Portugal está vivo – o seu primeiro marido.
 Conhecendo a verdade, D. Manuel e D. Madalena decidem professar votos religiosos.
 Dilacerado por um conflito interior, Telmo conversa com o Romeiro e reconhece a sua verdadeira identidade.
Desenlace Ato III, Cenas IX a XII Desfecho motivado pelos acontecimentos anteriores – dá-se a consumação da tragédia familiar
em que Maria morre e os seus pais se vêem obrigados a separar-se, morrendo um para o outro assim como para a vida terrena
com o ingresso na vida religiosa.
 Dá-se início à cerimónia da tomada de hábito por D. Manuel e D. Madalena (morte social).
 Maria morre (morte física).
CARACTERIZAÇÃO DE PERSONAGENS
D. Madalena de Vilhena
 Personagem que vive numa grande angústia e agitação emocional.
 Consciente — desde o monólogo inicial, em que há uma comparação com Inês de Castro — da sua condenação à
infelicidade pela culpa e pelo sentido de dever.
 Pertencente à nobreza, casada com D. João de Portugal (1. o casamento) e com D. Manuel (2.o casamento).
 Romântica, íntegra, supersticiosa, frágil, emotiva, vulnerável, sentimental, dedicada e zelosa do bem estar da filha,
pecadora (apaixonou-se por D. Manuel quando ainda estava casada com D. João de Portugal), atormentada pelo passado,
com pressentimentos.
 Dominada pelo terror e pelo medo, teme o regresso de D. João e vive com a ideia de pecado (a traição de ter amado
Manuel de Sousa Coutinho ainda casada com D. João).
 Representa a heroína romântica, com um passado que a atormenta e que lhe traz infelicidade quando D. João de Portugal
regressa disfarçado de Romeiro.
A dimensão do terror em que vive é acentuada:
 pelas palavras de Telmo;
 pelo sebastianismo de Telmo e Maria;
 pela crença no oculto/irracional (agouros, significado da mudança de casa, coincidência de datas).
D. Manuel de Sousa Coutinho
 Aristocrata culto e apreciador das letras.
 Pertencente à nobreza (cavaleiro de Malta), casado com D. Madalena.
 Racional, objetivo, sensível, bondoso, altruísta, seguro, corajoso, decidido, patriota, nacionalista, honrado, vulnerável,
desapegado de bens materiais e da própria vida.
 Encarna o amor à pátria e à liberdade e o mito do escritor romântico.
 Personagem com traços psicológicos complexos, quase contraditórios:
Dominado pela racionalidade  Apesar da dor, aceita, no final, o ingresso numa ordem religiosa.
 Recusa crer nos agouros.
Afetado pelo sentimento
 Age sem hesitação.
 Considera a possibilidade de morrer como o pai.
 Exprime o pensamento num discurso equilibrado.
 Revela desagrado quando é mencionada a figura de D. Sebastião.
 O seu comportamento, no final do Ato I, revela patriotismo, coragem e determinação.
 Maria descreve-o como «um português dos verdadeiros» (Ato I, Cena VII).
Maria
 Representação da mulher-anjo romântica.
 De origem nobre, filha de D. Manuel e de D. Madalena, com 13 anos.
 Bela, frágil (doente de tuberculose), perspicaz, inteligente, meiga, bondosa, sensível, sentimental, emotiva, supersticiosa,
patriota, carinhosa e pura.
 Culta e com um espírito curioso e indagador.
 Contemplativa e propensa ao sonho.
 Com o dom da intuição e da profecia.
 Aceitando a sabedoria do povo, crê na verdade do sebastianismo (como Telmo).
 Ligada ao culto de Camões e de D. Sebastião.
 Ativa, com desejo de agir (combater, ter um irmão, ver a tia Joana).
 Simbolicamente associada ao presente, por oposição ao passado personificado por D. João de Portugal
 A sua condição física de tuberculosa estimula a sua curiosidade e torna-a ainda mais apta para um conhecimento especial
das coisas quase místico, muito pouco comum para a sua idade.
 Vítima do erro dos pais e das convenções sociais, que determinam a sua ilegitimidade após o regresso do 1º marido de Madalena
 No final, apesar de morrer de vergonha, o seu discurso é mais do que uma voz individual: é uma crítica contundente às
convenções sociais e religiosas.
 vítima inocente de um Destino implacável.
Telmo Pais:
 É o escudeiro que acompanha a família há décadas (também criou D. João); representa o conselheiro fiel.
 Servidor das famílias de D. João de Portugal (passado) e de D. Manuel de Sousa Coutinho (presente).
 É confiável, nobre de carácter, honrado, dedicado, humilde, sensível e atormentado (com e após o regresso de D. João).
 Protetor de Maria, sobre quem tem grande influência.
 Desempenha, junto de D. Madalena, o papel de voz da consciência (no que se aproxima do coro da tragédia grega),
revelando-se severo e inflexível.
 Confidente de D. Madalena, mas crítico do seu comportamento.
 Com o regresso de D. João (Ato II), revela o profundo conflito que o atormenta: a sua fidelidade morreu.
 Dividido/dilacerado entre a afeição antiga (D. João de Portugal) e a afeição recente (Maria).
Frei Jorge
 Irmão de Manuel de Sousa Coutinho, é um amigo, calmo, prudente, conselheiro, sereno, ponderado e confidente (ouve a
confissão de Madalena sobre o seu pecado), desempenhando um papel apaziguador.
 Está presente no momento em que o Romeiro se revela. Os seus comentários são pressentimentos/ /indícios trágicos. O
seu papel aproxima-o da função do coro na tragédia grega.
 Inflexível nos princípios, procura, no final, ajudar a família a manter o equilíbrio e a serenidade possíveis.
O Romeiro / D. João de Portugal
 Nobre (cavaleiro) muito respeitado, foi o amo de Telmo e marido de D. Madalena (Telmo descreve-o como «espelho de
cavalaria e gentileza»).
 Patriota, honrado, destemido, austero, mas cavalheiresco, íntegro, generoso e altruísta.
 Ligado à lenda de D. Sebastião, símbolo da Pátria humilhada e cativa, representa o passado, incompatível com o presente.
 Simbolicamente omnipresente – está permanentemente em cena através das evocações de D. Madalena e do
sebastianismo de Maria e Telmo.
 Regressa do cativeiro que se seguiu à Batalha de Alcácer-Quibir como um romeiro.
 Triste e desencantado no momento do regresso
 Inicialmente severo e vingativo (por se sentir esquecido e inexistente — «Ninguém»), revela-se, depois, humano e
compassivo.
 Pede a Telmo que negue a sua existência de modo a impedir a «morte para a vida» de D. Madalena e Manuel de Sousa
Coutinho.
 Reduzido ao anonimato.
 Catalisador da catástrofe

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