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ÁLVARO DE CAMPOS

1ª FASE: DECADENTISTA

 Esta fase poética traduz-se por sentimentos de tédio, enfado, náusea, cansaço, abatimento e

necessidade de novas sensações. Tal é o reflexo da falta de um sentido para a vida e a

necessidade de fuga à monotonia. Esta fuga era feita habitualmente à base de

estupefacientes, como era o caso do ópio. Um dos poemas mais exemplificativos desta fase é

o Opiário, escrito por Fernando Pessoa em 1915 para o primeiro número do Orpheu, todavia,

foi datado de março de 1914 para documentar, mistificando, uma primeira fase de Campos.

  2ª FASE: FUTURISTA E SENSACIONISTA

 A fase futurista-sensacionista assenta numa poesia repleta de vitalidade, manifestando o

poeta a predileção pela civilização mecânica, pelo belo feroz que virá contrariar a conceção

aristotélica de belo ("Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto, / Para a beleza

disto totalmente desconhecida dos antigos". - Ode Triunfal).

Campos adotou, para além do verso livre, um estilo esfuziante, torrencial, espraiado em longos

versos de duas ou três linhas, anafórico, exclamativo, interjetivo, monótono pela simplicidade

dos processos, pela reiteração de apóstrofes e enumerações, mas vivificado pela fantasia

verbal duradoura e inesgotável.

Álvaro de Campos, além de celebrar o triunfo da máquina, da energia mecânica e da civilização

moderna, canta também os escândalos e corrupções da contemporaneidade, em sintonia com

o futurismo. O ideal futurista em Álvaro de Campos fá-lo distanciar-se do passado para exaltar

a necessidade de uma nova vida futura, onde se tenha a consciência da sensação do poder e

do triunfo.

Esta fase também está marcada pela intelectualização das sensações ou pela sua desordem.

Como verdadeiro sensacionista, procura o excesso violento de sensações. Contudo, o seu

sensacionismo distingue-se do seu mestre Alberto Caeiro, na medida em que este considera a

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sensação captada pelos sentidos como a única realidade, mas rejeita o pensamento. O mestre,

com a sua simplicidade e serenidade, via tudo nítido e recusava o pensamento para

fundamentar a sua felicidade por estar de acordo com a Natureza; já Campos, sentindo a

complexidade e a dinâmica da vida moderna, procura sentir a violência e a força de todas as

sensações ("sentir tudo de todas as maneiras").

O poema Ode Triunfal  exemplifica claramente esta fase poética do heterónimo Álvaro de

Campos. O título sugere logo qualquer coisa de grandioso, não só no conteúdo como na forma.

A irregularidade métrica e estrófica, típicas da poesia modernista, afastam logo o poema da

lírica tradicional portuguesa. Este ritmo irregular traduz a irreverência e o nervosismo do

próprio poeta. A nível estilístico, sobressaem inúmeras metáforas, comparações, imagens,

apóstrofes, anáforas (entre outras), a fim de realçar o sensacionismo de Campos.

Há que destacar que nem tudo é entusiasmo nesta ode. Assim, logo no início, o poeta escreve

"À dolorosa luz das grandes lâmpadas elétricas da fábrica" e tem "febre". Ao longo do texto há

um desfilar irónico dos escândalos da época: a desumanização, a hipocrisia, a corrupção, a

miséria, a pilhagem, os falhanços da técnica (desastres, naufrágios), a prostituição de menores,

entre outros. O poeta tanto manifesta o desejo de humanizar as máquinas, através dos

apóstrofes ("Ó rodas, ó engrenagens, ó máquinas!..."), como também de se materializar ao

identificar-se com elas ("Ah! poder eu exprimir-me como um motor se exprime! Ser completo

como uma máquina!").

O mais surpreendente no poema é que, depois de o poeta ironizar os ridículos da sociedade

moderna, ele identifica-se com eles ao exprimir ("Ah, como eu desejava ser o souteneur disto

tudo! “).

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3ª FASE: INTIMISTA

Esta fase caracteriza-se por uma incapacidade de realização, trazendo de volta o abatimento.

O poeta vive rodeado pelo sono e pelo cansaço, revelando desilusão, revolta, inadaptação,

devido à incapacidade das realizações. Após um período áureo de exaltação heroica da

máquina, Álvaro de Campos é possuído pelo desânimo e frustração. Parece apresentar pontos

comuns com a 1.ª fase - a decadentista -, contudo, há que sublinhar que a intimista traduz a

reflexão interior e angustiada de quem apenas sente o vazio depois da caminhada heroica.

este Campos decaído, cosmopolita, melancólico, devaneador, irmão do Pessoa ortónimo no

ceticismo, na dor de pensar e nas saudades da infância ou de qualquer coisa irreal, é o único

heterónimo que comparticipa da vida extraliterária de Fernando Pessoa, afirmando o próprio

"eu e o meu companheiro de psiquismo Álvaro de Campos".

Em Lisbon revisited  (1923), o poeta debate-se com a inexorabilidade da morte, desejando até

morrer ("Não me venham com conclusões! / A única conclusão é morrer."). Todo o poema

é disfórico, daí a acumulação de construções negativas. Recusa a estética, a moral, a

metafísica, as ciências, as artes, a civilização moderna, apelando ao direito à solidão,

apontando a infância como símbolo da felicidade perdida ("Ó céu azul - o mesmo da

minha infância - / Eterna verdade vazia e perfeita!").

Nesta fase, Campos sente-se vazio, um marginal, um incompreendido ("O que há em mim

é sobretudo cansaço -"; "Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles: / Porque eu amo

infinitamente o finito, / Porque eu desejo impossivelmente o possível"). A construção

antitética destes versos é, sem dúvida, o espelho do interior fragmentado do poeta.

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