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Fernando Pessoa – A Mensagem

O poeta vivera sempre à procura da sua identidade, desse eu perene (eterno) que

incessantemente lhe fugia. Agora essa identidade é, de novo, procurada e encontrada, pela

união com a pátria. Assim ela surge na Mensagem, onde Fernando Pessoa assume o que ele

considerava o mais alto ministério do homem: ser criador de mitos. E poder-se-á dizer que na

Mensagem ele expressou poeticamente os mitos que os Descobrimentos tinham expressado

sob a forma de acção.

O poeta curvar-se-á a partir dos primórdios da sua pátria, no mesmo movimento para

captá-la desde as origens, tal como fará na sua aventura espiritual sobre si mesmo, na mesma

finalidade de tentar captar a sua identidade.

Assim este curvar-se sobre um ser em transformação incessante, a pátria na sua

história, não implicará em si um propósito e uma visão puramente ou intencionalmente

historicista.

A Mensagem poderá ser vista como uma epopeia, porque parte de um núcleo histórico

mas a sua formulação, sendo simbólica e mítica do relato histórico, não possuirá a

continuidade. Há na Mensagem uma transcrição da história de uma nação, mas transfigurada.

Uma transfiguração dos personagens históricos em míticos.

Em Mensagem, Pessoa assume-se como cantor do fim do Império


Português, como Camões se havia imortalizado como cantor do seu início. Um e
outro colocam-se numa posição simétrica em relação ao Império: Camões, um
pouco depois do Império se ter levantado e Pessoa um pouco antes de ele se
desmoronar. Mas, apesar dos paralelismos entre ambos os “épicos” deverão
estabelecer-se entre eles algumas diferenças consideráveis. É que Pessoa já
não canta, como Camões cantou: o Império real, o expansionismo material para
oriente, a cruzada religiosa contra os infiéis, a ultrapassagem dos obstáculos
físicos que se erguiam aos portugueses por terra e por mar. O Portugal que
ele antevê no futuro situa-se além do material, não será grande em domínio
territorial, mas em valores espirituais e morais e irá cumprir-se talvez como o
Império de Língua Portuguesa.
Para realizar o “novo” sonho português e devolver à pátria a grandeza
perdida, Pessoa fala da vinda de um outro Camões, um Supra-Camões (que
seria por certo ele mesmo) e que viria proporcionar à literatura portuguesa
um período de superior grandeza.
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O título escolhido para o livro Mensagem é já por siso significativo das intencionalidades
do poeta. É na verdade uma mensagem que ele pretende comunicar – a que Portugal está
incumbido de uma missão profunda, não material, ou seja recuperar a grandeza perdida, mas
agora no âmbito espiritual.

Estrutura tripatidada Mensagem

Os 44 poemas que constituem a Mensagem encontram-se agrupados em três partes, ou


seja, as etapas da evolução do Império Português – nascimento, realização e morte.

Na primeira parte de Mensagem - “Brasão” há a referência a mitos e figuras da

história de Portugal até D. Sebastião. Personagens marcadas pela coragem e pelas forças

sobrenaturais que lhes permitiram contribuir para a grandeza de Portugal. É uma certa

imagem de Portugal que se pretende transmitir – um Portugal erguido à custa do esforço de

muitos heróis, um Portugal predestinado a grandes feitos. Aqui é feita a localização de

Portugal na Europa e em relação ao Mundo, procurando atestar a sua grandiosidade e o valor

simbólico do seu papel na civilização ocidental

Na segunda parte de Mensagem - “Mar Português” – o poeta vai referir

personalidades e factos dos descobrimentos portugueses, sempre encarados na perspectiva

de missão que competia a Portugal cumprir. É posta em destaque a projecção universal que os

descobrimentos portugueses implicaram e os esforços sobre-humanos que foi preciso

desenvolver na luta contra os elementos naturais hostis e desconhecidos.

Na terceira parte de Mensagem - “Encoberto” – o poeta quer referir que Portugal

parece estar encerrado numa “prisão servil”, parece estar envolto em trevas, estar a

entristecer. Mas apesar disso, um novo império se erguerá, anunciado pelos símbolos e pelos

avisos. O Portugal que hoje é nevoeiro regenerar-se-á. O povo que hoje se mostra entristecido

transmutar-se-á, num outro povo que erigirá uma outra pátria. Mostra a fé de que a morte

contem em si o gérmen da ressurreição. Nos três avisos define os espaços de Portugal; com os

cinco tempos traduz a ânsia e a saudade daquele Salvador/Encoberto que, na Hora, deverá

chegar, para edificar o Quinto Império, cujo espírito será moral e civilizacional.

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