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Mensagem

Fernando Pessoa

Departamento de Língua Portuguesa


2020/2021
FERNANDO PESSOA: SÍNTESE DA UNIDADE

Friso cronológico
Séc. XVII Séc. XVIII e XIX Séc. XIX Séc. XIX E XX
BARROCO ROMANTISMO REALISMO Modernismo

Fernando Pessoa (1888-1935)


Principais linhas temáticas

Estrutura da obra

O imaginário épico
➢ Supra-camões
➢ Obra épico-lírica
Dimensão simbólica do herói.

Exaltação patriótica.
➢ O Sebastianismo
➢ Mito do Quinto Império
➢ O Encoberto
Linguagem, estilo
➢ estrutura estrófica, métrica e rima;
➢ recursos expressivos: o paradoxo/oxímoro, a apóstrofe, a
enumeração, a gradação, a interrogação retórica e a
metáfora.
Título
Título

O primeiro título do livro não era Mensagem, mas Portugal.

• Por sugestão de um amigo - Cunha Dias - Pessoa


reconsidera, mudando o nome. Esse amigo ter-lhe-á
indicado a evidência de que "Portugal" era o nome de uma
loja de venda de sapatos, assim vulgarizado.
• A escolha do título Mensagem é dividida por
Pessoa em 3 partes:

MENS/AG(ITAT/ MOL)EM. • a expressão ENS GEMMA, ou MENSA GEMMARUM,


"Mens Agitat Molem" seja, ente em gema, ou ovo. É ou mesa das gemas.
Portugal em essência, em
Citação tirada de Virgílio na gema. Altar ou mesa onde repousam as
Eneida, que significa a gemas Portuguesas - Portugal - e
mente move a matéria. onde se procede ao sacrifício
para a realização do sagrado
• para os alquimistas o ovo superior.
• O objetivo de Mensagem filosófico é germe de vida
seria impulsionar as mentes espiritual, do qual deverá eclodir
Portugal seria o altar onde os
humanas, através da o ouro da sabedoria. No ovo,
sacrifícios foram realizados em
poesia., incentivando à concentram-se todas as
nome do divino. Como tal, o país
ação. possibilidades de criar, recriar,
está destinado a missões divinas.
renovar e ressurgir. Ele é a prova
e o recetáculo de todas as
metamorfoses.
Portugal teria um desígnio divino a cumprir:

Orientar espiritual e culturalmente as outras nações do mundo,


concretizando, assim, o Quinto Império.

MEA GENS ou GENS MEA


Minha gente ou gente minha,
minha família. Depois das glórias do passado, Portugal teria uma missão mais
ousada, mais nobre, mais sublime: conduzir os povos nas
dimensões espiritual (busca de novos valores – Amor, Fé,
É a raça de heróis com que Patriotismo) e cultural (difusão das múltiplas manifestações da
Pessoa se identifica e que arte – Literatura, Poesia e outras).
nomeia ao longo do texto de
Mensagem.
Supra-Camões
ler pág. 113 do manual
— Fernando Pessoa e a poesia como «passagem a limpo».

— Mensagem é, em certo sentido, uma «passagem a limpo», para uma versão


moderna, d’Os Lusíadas.

Século XIX: época de mitologização da figura de Camões

A publicação do poema Camões (1825),


de Almeida Garrett, marca o início deste
processo de mitologização

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I. Fernando Pessoa e os outros poetas

Em 1912, com 24 anos, Pessoa escreve na revista A águia:

A nossa poesia caminha para o seu auge: o grande Poeta proximamente


vindouro, que encarnará esse auge, realizará o máximo equilíbrio da
subjetividade e da objetividade. [...] Supra-Camões lhe chamamos,
e lhe chamaremos, ainda que a comparação implícita, por muito que pareça
favorecer, antes amesquinhe o seu génio, que será, não de grau superior,
mas mesmo de ordem superior ao do nosso ainda-primeiro poeta.
Fernando Pessoa, «A nova poesia portuguesa»
(A águia, n.os 4, 5, 9, 11 e 12, 2.ª série, Porto, 1912), in Fernando Pessoa.
Textos de crítica e de intervenção, Lisboa, Edições Ática, 1993.

«[…] só a escolha deste Poeta [i. e., Camões] como elemento de comparação
coloca-o [i. e., a Pessoa] no ponto mais alto em relação a todos os que
o precederam e seguiram, até ao momento da enunciação.»
C. Berardinelli, Os Lusíadas e Mensagem: um jogo intertextual (2000).

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II. Mensagem e Portugal

— Mensagem é uma resposta(/leitura) «moderna» ao(/do) Poema de Camões.

— Em Mensagem, Pessoa propõe uma nova forma de pensar o que somos como
Portugueses e o que poderá vir a ser Portugal («Portugal» foi o primeiro título
pensado para a obra Mensagem). Ou seja: aquilo a que chamamos «identidade
nacional» é reavaliado em Mensagem.

Segunda metade do século XIX — momento em que


os escritores refletem seriamente sobre o que é Portugal.
(Cf. Eduardo Lourenço, «Da literatura como interpretação de Portugal», 1975.)

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II. Mensagem e Portugal

— Mensagem é uma resposta(/leitura) «moderna» ao(/do) Poema de Camões.

— Em Mensagem, Pessoa propõe uma nova forma de pensar o que somos como
Portugueses e o que poderá vir a ser Portugal («Portugal» foi o primeiro título
pensado para a obra Mensagem). Ou seja: aquilo a que chamamos «identidade
nacional» é reavaliado em Mensagem.

Segunda metade do século XIX — momento em que


os escritores refletem seriamente sobre o que é Portugal.
(Cf. Eduardo Lourenço, «Da literatura como interpretação de Portugal», 1975.)

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Natureza épico-lírica
Mensagem – O imaginário épico

O imaginário épico
Os Lusíadas Mensagem
Camões Pessoa

Epopeia do Renascimento Canto épico do século XX

Conteúdo maravilhoso, Matéria real: queda do Império


alegórico, mítico e fantástico e perda da identidade nacional

Incentivo dos heróis Valorização do passado e apelo


Valorização dos feitos à esperança no futuro

Cantores do Império
(em momentos distintos da História portuguesa)
Mensagem – O imaginário épico

O imaginário épico
Os Lusíadas Mensagem
Camões Pessoa

Temas comuns
O Passado: O (seu) Presente:
. As Descobertas . Egoísmo mercenário
marítimas . Falta de patriotismo
. A História de Portugal . Deficiência de valores
. Esquecimento do passado áureo
. Descrédito pelas letras
. Falta de identidade nacional
Características do Características do
discurso épico discurso lírico
▪ uso da 3.ª pessoa (narratividade); ▪ uso da 1.ª pessoa (intimismo e
▪ exaltação de ações heroicas com subjetividade);
proteção sobrenatural; ▪ identificação “eu”/pátria;
▪ integração de figuras e ▪ tom emotivo e linguagem
acontecimentos históricos; expressiva;
▪ protagonistas de elevado estatuto ▪ forma fragmentária (44 poemas).
(social e moral);
▪ glorificação e mitificação do herói Ler pág.114 manual
(celebração e recompensa).
Estrutura
IV. A estrutura de Mensagem

«[…] é uma das obras mais perfeitamente realizadas da Literatura Portuguesa


do século XX […]»
C. Berardinelli, Mensagem: poemas in fieri, 2004.

«Estamos perante uma arquitetura pensada e harmónica,


que torna este livro uma constelação de poema»
Fernando Cabral Martins, prefácio à edição de Mensagem, 1997.

Abrindo com uma proposição latina («Benedictus Dominus Deus Noster qui dedit
nobis signum», “Bendito seja o Senhor, nosso Deus, que nos deu um sinal (uma
mensagem)!»), a obra está dividida em três partes:
— Primeira Parte: Brasão nascimento/pai
— Segunda Parte: Mar Português vida adulta/filho
— Terceira Parte: O Encoberto morte e ressurreição/espírito Santo

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Primeira Parte: I – Os Campos
II – Os Castelos
BRASÃO
III – As Quinas
“Bellum sine IV – A Coroa
Bello” V – O Timbre

Segunda Parte:
Estrutura da
MAR PORTUGUÊS 12 Poemas
Mensagem “Possessio Maris”

Terceira parte: I – Os Símbolos


O ENCOBERTO II – Os Avisos
“Pax in Excelsis” III – Os Tempos
Mensagem – O imaginário épico

Estrutura da obra

1.ª Parte – Brasão


• Fundação e consolidação da nacionalidade

2.ª Parte – Mar Português


• Saga das descobertas e concretização do destino
providencialista do país

3.ª Parte – O Encoberto


• Futuro de Portugal e Quinto Império
IV. A estrutura de Mensagem

Primeira Parte: Brasão

Tempo de preparação
— Apresentação de figuras mitológicas e históricas que criaram Portugal).
— Estabelecimento da essência (nobreza) de Portugal.

Esta essência criou obra no passado


(Mar Português) e pode criar
no futuro (O Encoberto)

Tempo da preparação para a construção do Império; a primeira parte da obra


apresenta a «caminhada da terra para o mar» como missão confiada a Portugal
(C. Berardinelli).
 «Bellum sine bello» (A guerra sem guerra)

A epígrafe latina desta primeira parte avisa-nos


que a nova Distância não se alcança pela força.

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IV. A estrutura de Mensagem

Segunda Parte: Mar Português

Tempo de realização e da queda


12 poemas
— Tempo em que se conquista um Império que depois
I. O Infante
se perde.
II. Horizonte
III. Padrão
É preciso buscar uma nova Distância, um outro mar .
IV. O Mostrengo
V. Epitáfio de Bartolomeu Dias
VI. Os Colombos
 Epígrafe latina da segunda parte:
VII. Ocidente
«Possessio Maris» (Posse do mar)
VIII. Fernão de Magalhães
IX. Ascensão de Vasco da Gama
X. Mar Português
XI. A Última Nau
XII. Prece

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IV. A estrutura de Mensagem

Terceira Parte: O Encoberto

Tempo de espera
— Tempo de esperança; espera-se a realização de um projeto indefinível, transcendente,
para lá do espaço e do tempo (Pax in Excelsis), do que é dado à razão humana conhecer.

Terceira Parte / 13 Poemas / Três Partes

I. Os Símbolos II. Os Avisos III. Os Tempos


Primeiro: D. Sebastião Primeiro: D. Sebastião Primeiro: Noite
Segundo: O Quinto Império Segundo: O Quinto Império Segundo: Tormenta
Terceiro: O Desejado Terceiro: O Desejado Terceiro: Calma
Quarto: As Ilhas Afortunadas Quarto: As Ilhas Afortunadas Quarto: Antemanhã
Quinto: O Encoberto Quinto: O Encoberto Quinto: Nevoeiro

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Dimensão simbólica
do herói
V. A visão da História em Mensagem

1. Na História de Portugal, são destacadas «figuras de pensamento»


de contemplação, dotadas de uma capacidade visionária singular.

D. Dinis,
o «plantador
de naus a haver»

2. A História de Portugal é pensada à luz de um plano de divino. O que somos


resulta de um ato de consagração, de algo que é predito por Deus:

O homem e a hora são um só


Quando Deus faz e a história é feita.
O mais é carne, cujo pó
A terra espreita.
Poema «D. João o Primeiro» (vv. 1-4)

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V. A visão da História em Mensagem

3. A figura D. Sebastião, Rei de Portugal

À distância de quase quatro séculos, Pessoa recria a figura/o mito


de D. Sebastião de modo a conciliar a ideia de que o Rei pôs a pátria
em perigo com o enaltecimento da sua loucura.

Em Mensagem, D. Sebastião é o símbolo da loucura positiva, da sede de


infinito que caracteriza o ser humano que pretende ultrapassar a sua própria
natureza.

«Ser descontente é ser homem» (poema «O Quinto Império»)

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V. A visão da História em Mensagem

4. É abandonada a ideia de um novo Império «feito de Matéria» — um império


terreno a alcançar pela ação bélica dos homens.

Num conjunto de textos reunidos sob o nome Sobre Portugal. Introdução


ao problema nacional (1978), encontramos um texto em que Pessoa diz:

«Todo o Império que não é baseado no Império Espiritual é uma


Morte de pé, um cadáver mandado.»

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Dimensão simbólica do herói
▪ A dimensão mítica dos heróis, marcados pela
inspiração divina.

“Deus quer, o homem sonha, a obra nasce” (“O Infante”)

O agente primeiro, A concretização da vontade


que deseja divina e o resultado da

+ ação humana
Teofania:
O receptor da
revelação de uma
inspiração/vontade divina,
intenção divina
que a executa
Dimensão simbólica do herói
Exemplo: “O Infante”
“Deus quer, o homem sonha, a obra nasce”

“Deus quis que a terra fosse “Foste desvendando a


toda uma, / Que o mar espuma”
unisse, já não separasse”

+ “Sagrou-te”

O desejo divino de unir por via marítima a Terra levou à escolha e


sagração do Infante D. Henrique que, com a sua ação, cumpriu a obra
espiritualmente concebida. O Infante é representante de Deus,
concretizador da sua obra.
Sebastianismo
Mensagem – O imaginário épico

Exaltação patriótica

▪ O nacionalismo: Portugal como tema.

▪ O passado de inspiração, o presente de frustração


e o futuro de concretização.

▪ O sentido providencial e messiânico de Portugal:


povo eleito para a instituição do Quinto Império.

Outras Expressões, 12.º ano


Mensagem – O Sebastianismo

Sebastianismo
▪ Da História ao mito: a inspiração providencial da
figura de D. Sebastião.
▪ D. Sebastião e o Encoberto: a dimensão
messiânica de um salvador da pátria.
▪ A mitologia nacional: o Sebastianismo como
crença na regeneração futura de Portugal e
ideologia impulsionadora do Quinto Império.

Outras Expressões, 12.º ano


Mensagem – O Sebastianismo

Sebastianismo

Outras Expressões, 12.º ano


Quinto império
• "A esperança do Quinto Império, tal qual em Portugal a sonhamos e
concebemos, não se ajusta, por natureza, ao que a tradição figura como o
sentido da interpretação dada por Daniel ao sonho de Nabucodonosor.
Nessa figuração tradicional, é este o seguimento dos Impérios: o Primeiro
é o da Babilónia, o Segundo o Medo-Persa, o Terceiro o da Grécia e o
Quarto o de Roma, ficando o Quinto, como sempre, duvidoso.
• Nesse esquema, porém, que é de impérios materiais, o último é
plausivelmente entendido como sendo o Império de Inglaterra. Desse
modo se interpreta naquele país; e creio que, nesse nível, se interpreta
Quinto bem.
• Não é assim no esquema português. Esse, sendo espiritual, em vez de
Império partir, como naquela tradição, do Império material de Babilónia, parte,
antes, com a civilização que vivemos, do Império espiritual da Grécia,
origem do que espiritualmente somos. E, sendo esse o Primeiro Império, o
Segundo é o de Roma. O Terceiro o da Cristandade, e o Quarto o
da Europa – isto é, da Europa laica de depois da Renascença. Aqui
o Quinto Império terá de ser outro que o inglês, porque terá de ser de
outra ordem. Nós o atribuímos a Portugal, para quem o esperamos."

(Textos transcritos por António Quadros, em Fernando


Pessoa, Iniciação Global à Obra)
• Questionado sobre o que calcula que seja o futuro da raça
portuguesa, Pessoa responde: "O Quinto Império. O futuro
de Portugal – que não calculo, mas sei – está escrito já,
Quinto para quem saiba lê-lo, nas trovas do Bandarra, e também
nas quadras de Nostradamus. Esse futuro é sermos tudo.“
Império
Entrevista a Alves Martins (1897-1929)
em Revista Portuguesa, nº 23-24, de 13 de outubro de 1923
• Ao longo da Mensagem, sobretudo da
terceira parte, Pessoa exprime a sua
conceção messiânica da história
Quinto • Pessoa sente-se investido do cargo de
Império anunciador do Quinto Império.
• Este não será mais material, mas
civilizacional/espiritual, por isso mais
valioso e duradouro.

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