Misturando ficção à realidade, a obra nos mostra a
PALHA DE ARROZ, Fontes Ibiapina
Prof. Jorge Alberto
I. RESUMO BIOGRÁFICO:
João Nonon de Moura Fontes Ibiapina nasceu na cidade
de Picos, em 1921.
Foi jornalista, professor e magistrado, tendo sido juiz
de direito em várias cidades interioranas do Piauí. Pertenceu
à Academia Piauiense de Letras ( cadeira no 9), foi membro
do Conselho Estadual de Cultura do Piauí, além de ser um
dos fundadores e primeiro presidente da Academia
Parnaibana de Letras.
Faleceu em Parnaíba, no ano de 1986.
II-OBRA:
Romances:
· Palha de Arroz (1968)
· Sambaíba (1971)
· Tombador (1971)
· Vida Gemida em Samambaia (1984, Prêmio Clube
do Livro)
· Nas Terras de Arabutã (1984)
· Curral de Assombrações (1985)
Contos:
· Chão de Meu Deus (1958)
· Brocotós (1961)
· Pedra Bruta (1964)
· Destino de Contratempos (1974)
· Quero, Posso e Mando (1976)
· Eleições de Sempre (1986)
Folclore:
· Paremiologia Nordestina (1975)
· Mentiras Grossas de Zé Rotinho (1977)
· Passarela de Marmotas (1982)
III. CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE O
AUTOR:
Contista, romancista e estudioso das tradições
populares e do folclore piauiense, é apontado pela crítica
como herdeiro do Romance de 30. Sua obra é permeada de
“casos populares”, fixando aspectos do homem comum e
regional. O conto se destaca como sua melhor forma de
expressão.
De linguagem simples, com tom coloquial e
humorístico, reproduz e transforma a linguagem interiorana,
utilizando-se de provérbios, modismos, máximas, dizeres
regionais, oralidades, clichês e lugares comuns. É o mundo
sertanejo marcado em sua obra - quadros naturais, sociais,
lingüísticos e culturais.
Seus enredos organizam-se de forma tradicional
(princípio-meio-fim). As personagens, via de regra, são
planas. Não possuem grande complexidade, permanecendo
uniformes no transcorrer narrativo.
Embora tenha se destacado como escritor regionalista,
mesclando folclore e ficção, desenvolveu o romance urbano
- Palha de Arroz. É a sua obra mais conhecida, adaptada
para o cinema em 1979, com o título de A Solução Final.
PALHA DE ARROZ
1-INTRODUÇÃO
Palha de Arroz vem a ser o segundo romance da
literatura piauiense a trazer um perfil detalhado da sociedade
teresinense (antecedido por Um Manicaca, de Abdias
Neves).
capital piauiense na década de 1940, nos apontando uma
sociedade atrasada, “imersa na escuridão”. O enfoque são os
bairros pobres, com seus desempregados, suas prostitutas e
seus malandros. A promiscuidade é intensa, a começar pelo
nome dos prostíbulos: “Curral-das-Éguas”, “Balança-Cu”,
“Pau-Não-Cessa”, dentre vários. Em uma época em que os
geradores de eletricidade eram desligados às 22:00h, dava-se
início ao movimento nos prostíbulos. É um mundo
degenerado, como se pode perceber nos fragmentos abaixo:
“(...) da Barrinha para Palha de Arroz, quase que
ninguém falava outro português. Era mesmo só aquele deboche
sem cabimento. Só aquele linguajar depravado do negro
Parente. Com cada palavrão que, com poucos minutos de
palestra, não ficava um ente da família que não pegasse da sua.
(...)”
ou ainda:
“(...) Barrinha e Palha de Arroz estavam cheias de
homens depravados. Homens debochados a ponto de nada para
eles existir além de mulher. (...)”
Aqui, as personagens são impelidas à criminalidade
como tentativa até mesmo de sobrevivência. Note-se tal fato
no personagem principal – Chico da Benta. Com os pais
mortos e não podendo concluir os estudos, tenta obter
emprego. Embora bem classificado nos concursos que
realizou, nunca era chamado. Inicia-se no mundo de crimes
para não morrer de fome com a família. Outro exemplo é o
personagem Parente. Era “pescador de defuntos” do rio
Parnaíba. Ingressa na criminalidade (assassino de aluguel)
como forma de compensar os períodos escassos de resgates
no rio. Todavia, é Parente que rompe com essa sociedade ao
abandoná-la para tentar melhorar seu padrão de vida (o que
de certa forma acontece). Chico da Benta, ao ficar em
Teresina, não consegue romper com seu estado de
marginalização social. É a sociedade que se fecha para os
menos desfavorecidos. Neste ponto, há uma semelhança
entre Palha de Arroz com o romance Beira Rio Beira Vida,
de Assis Brasil.
Outros aspectos sociais da época ainda são resgatados
na obra. Os incêndios criminosos predominantes nos
subúrbios, provocando pânico na população:
“O fumo subia. Subia dos tetos, em rolo escuro e denso.
Aquilo já ia para um bocado de tempo. Casas e mais casas de
palha se queimando. Sem ninguém saber de onde vinha o fogo. (...)
Todavia, de qualquer maneira, incêndios metidos a misteriosos.
Quase que todo santo-dia dois, ou até mais, incêndios na cidade.
Sem distinção de bairro.”
Há ainda o descaso da saúde pública. O Hospital
Getúlio Vargas (que tinha sido fundado na época, pelo
interventor Leônidas de Castro Melo, retratado na obra como
Lucídio Costa Meira) só ampara a população rica. Parente,
que fora queimado em um incêndio, só consegue ser
atendido graças ao intermédio de um representante comercial
que pagara por isto. Esse descaso ainda evidencia-se na
proliferação da tuberculose – “Teresina estava cheia até a
tampa de tuberculosos (...)”.
No aspecto sócio político, o que se tem é o
autoritarismo policial no período Vargas. Isso se constata
ainda na construção de uma Escola de Menores
Abandonados feita pelos presos, figurando como um campo
de trabalhos forçados:
“E mais sofreram outros. Muito mais sofreram outros.
Deles que até morreram. Com aqueles dois olhos que a terra há
de comer, viu a morte de Zeca Palito. Depois de uma grossa
tunda, enterraram-no em pé, até à altura dos peitos. Só dos
ombros pra cima de fora. Aí chegou um oficial, farda da Polícia
Militar, com um bocado de galões nos ombros. Só que ninguém
podia saber quem era. Mascarado. Mas, de tenente para baixo,
que estavam ali, fizeram continência a ele. E ficaram em
posição de sentido até segundas ordens:
-À vontade!
A seguir, pergunta o que ele havia feito. Vai um feitor e
responde que fora flagrado tentando fugir. Então o desgraçado
meteu o bico da botina nos queixos de Zeca palito, que foi só a
conta. Só fez descangotar. Morreu na mesma da hora.
E diz que do mesmo jeito morreu Feitosa. E muitos outros.
Uns dessa, outros de outra natureza, de outra maneira. O certo
é que muitos brasileiros estão sepultados ali nas Ilhotas – sem
cemitério, sem cruz, sem nada.
Custou muito suor, muito sangue, muitas vidas aquele
prédio bonito das Ilhotas onde diz que hoje é uma Escola de
Menores Abandonados. Estava lá agora até um filho de Zeca
palito. Coitado! ... sofrendo naquele mesmo lugar onde seu pai
sofrera até a morte.”
O interventor federal no Piauí é descrito como
indiferente aos dramas vivenciados nos subúrbios
teresinenses. A oposição política é representada pelo jornal
O PIAUÍ (jornal da época, fundado em 1933, ligado ao
Partido Liberal), tendo a personagem Juliano em foco.
2. ENREDO
Pau de Fumo (Chico da Benta), ao roubar um barbeiro,
refugia-se da polícia na casa de Maria Preá (prostituta),
passando a noite em seu barraco. Sua esposa, Genoveva, é
presa autoritariamente, forçando Pau de Fumo a se entragar
para que ela fosse solta.
Incêndios criminosos aterrorizam os subúrbios da
cidade. A casa de pau de Fumo é incendiada enquanto
estava preso. Morre sua filha mais nova, Zefinha. Genoveva,
não aceitando a morte da filha, fica louca.
Conceição foge com o namorado (Zé Remador) por não
agüentar os maus tratos da madrasta (Maria Gorda). Seu pai
(Fabrício) a amaldiçoa.
Morte no Parnaíba de dois garotos. Pedro Tampa e
Parente tentam o resgate. Pedro Tampa morre. Os três corpos
são resgatados.
Parente recebe uma proposta de Caitano para matar
Chico Papagaio. Este (assassino conhecido) teria matado o
filho de Caitano por causa de uma mulher. Parente fica
indeciso a princípio. Chama Pau de Fumo para a empreitada,
que recusa, pois limitava-se somente a furtos. Parente faz
uma emboscada, matando Chico Papagaio e cortando sua
orelha como prova da tarefa cumprida. Chega a fazer outros
assassinatos, sempre tendo receio de ser descoberto.
Os abusos da polícia se fazem cada vez mais intensos.
O exército intervém socialmente tentando acabar com o
autoritarismo policial e estabelecer a ordem.
Novo incêndio. Diante do tumulto, Genoveva desacata
a polícia, sendo presa.
Conceição retorna viúva de Amarante três anos após a
sua fuga. Zé Remador havia morrido afogado. Não
encontrando amparo de seu pai, passa alguns dias na casa de
Maria Preá, indo posteriormente na casa de Pau de Fumo.
Chico da Benta abandona a vida de furtos ao encontrar
uma carteira de carregador. Assume a profissão, passando a
ter um relacionamento amoroso com Conceição e três filhos
com ela.
Maria Preá vai embora para a Bahia com um motorista
de caminhão. Parente também abandona a vida de assassino,
indo se aventurar nos garimpos de Mato Grosso. Manda
notícias a Chico, prometendo busca-lo com a família, além
de seu filho, Antônio. De lá, parte para Uruguaiana (Rio
Grande do Sul), reencontrando Maria Preá ainda prostituta.
Genoveva se suicida. Chico da Benta casa-se com
Conceição. Com a vida cada vez mais difícil, Chico da Benta
acaba reassumindo a identidade de Pau de Fumo. Rouba um
comerciante de Picos. Chega a comprar passagens para se
encontrar com Parente em Uruguaiana, mas é preso na
véspera da viagem. Conceição e os filhos passam fome,
esmolando durante o dia. Ao ser solto, Pau de Fumo recebe
uma intimação de Epitáfio, comissário de polícia, para ir
embora de Teresina, sob pena de ser morto. Quando era
escoltado no trem rumo a Timon por dois policiais, suicida-
se, jogando-se no rio Parnaíba.
3. PERSONAGENS
3.1- PRINCIPAIS
 Pau de Fumo
É Francisco Clemente Pociúncula. Chamado de Chico
da Benta, torna-se conhecido popularmente como Pau de
Fumo (alcunha que ganha de um policial).
Estudou no colégio Diocesano até o quarto ano
ginasial, possuindo certa erudição. Com a morte dos pais,
não consegue concluir seus estudos, caindo na exclusão
social. Vai morar no subúrbio, convivendo com pessoas
simples, prostitutas e marginais.
Inicia-se na prática de furtos como forma de
sobrevivência, assumindo a identidade de Pau de Fumo.
Vive um conflito interno diante das duas personalidades:
Chico da Benta (trabalhador honesto) e Pau de Fumo
(ladrão). Não conseguindo sair da marginalização, suicida-
se.
3.2-SECUNDÁRIOS
 Genoveva
Primeira esposa de Pau de Fumo. Embora tenha
passado por várias dificuldades enquanto o marido estava
ausente (ou preso ou fugindo da polícia), nunca se
degenerou. Enlouquece com a morte da filha (Zefinha) em
um incêndio. Acaba se suicidando.
 Conceição
Não suportando os maus tratos de Maria Gorda (sua
madrasta), foge para se casar com Zé Remador. Fica viúva,
tornando a se casar com Pau de Fumo, de quem seria mais
uma vez viúva e com cinco crianças para cuidar.
 Parente
Melhor amigo de Pau de Fumo. Resgatava afogados no
rio Parnaíba como meio de vida. Envereda-se na
criminalidade, tornando-se assassino de aluguel. Chega a ser
preso por roubar algumas jóias da irmã (Maria Piribilo) . Sai
do Piauí tentando vida melhor.
3.3-TERCIÁRIOS
 Antônio
Único filho de Parente. Acaba assumindo o lugar do pai
na profissão de “pescar defuntos”. Quando Parente vai
embora, deixa-o sobre os cuidados de Chico da Benta.
 Juliano
Jornalista de oposição ao governo. Era bahcarel em
Direito e lecionava no Liceu Piauiense.
 Maria Piribido
Prostituta e irmã de Parente.
 Epitácio (chefe de polícia), Eugênio (comissário de
polícia) e Capitão Vilmar
Representam a opressão policial para com os menos
favorecidos.
 Pedro Tampa
Era casado com Maria Preá, abandonando-a com um
filho e grávida de outro. Morre afogado.
4. TEMPO
Cronológico – década de 40. O enredo é linear, com
presença de flash-back em alguns momentos.
5. ESPAÇO
A narrativa é centrada nos bairros suburbanos de
Teresina, em especial Palha de Arroz e Barrinha, nas
proximidades do rio Parnaíba.
6. NARRADOR
De terceira pessoa, com alguns instantes psicológicos.
7. EXERCÍCIOS:
01. Sobre o romance Palha de Arroz, de Fontes Ibiapina,
marque uma única alternativa errada:
a) O romance é de tempo cronológico, de enredo
linear e flashback. É um romance de formação
educacional, psicológico e intimista.
b) Pau de Fumo / Chico da Benta é o personagem
central Francisco Clemente Pociúnculo, que havia
estudado no Colégio Diocesano, mas não progredira
na vida. Ficou na marginalidade até o suicídio no
Rio Parnaíba.
c) O romance traz como espaço a cidade de Teresina,
cujo o ambiente são os bairros miseráveis da palha
de Arroz, Barinha, ...
d) O romance denuncia a vida miserável dos
habitantes de bairros pobres que sofrem constantes
perseguições por parte dos policiais, além dos
incêndios criminosos de suas casas de palha.
e) Através de personagens marginalizados, Fontes
Ibiapina denuncia ações criminosas do Estado,
como perseguições, torturas, prisões, mortes, ...
02. Assinale a alternativa que exponha, de forma incorreta,
o destino final dos personagens do romance Palha de
Arroz, de Fontes Ibiapina:
a) Maria Piribido – continua na prostituição, indo
morar no sul do país.
b) Negro Parente – sai de pescador de defuntos para
assassino profissional, indo embora do Piauí.
c) Antônio – segue a profissão do pai de “pescar
defuntos” no rio Parnaíba.
d) Pedro Tampa – abandona Maria Preá grávida e
morre afogado.
e) Conceição – depois de ficar viúva de Zé Remador,
casa-se com Pau de Fumo, enviuvando novamente.
03. Não é tema presente no romance Palha de Arroz, de
Fontes Ibiapina:
a) A denúncia das arbitrariedades das autoridades para
com os menos favorecidos socialmente.
b) A miséria a que estava submetida a maior parte da
população teresinense.
c) Os incêndios criminosos que aterrorizaram a cidade
de Teresina na década de 40.
d) A visão social de uma Teresina que, mesmo imersa
no subdesenvolvimento, dá oportunidades à
melhoria das condições sociais de sua população.
e) A devassidão e a promiscuidade em que estava
inserida a parcela miserável de Teresina.
Leia o texto abaixo para responder as 09
questões abaixo:
Teresina, 20 de março de 1947
Meu prezado e caro Amigo,
Negro Parente:
Recebi sua carta com os duzentos bicos de coruja.
Muitos obrigado, mais uma vez, por uma mais uma ação sua
para com este seu velho amigo e criado de ontem, hoje e
sempre.
Antonino vai bem de vida. Como você sabe, pobre bem
de vida é com apenas saúde, que vida de pobre de maneira
alguma é boa. Cresceu. Já fala grosso – está roncando no
fueiro como se diz. E homem e tanto. Com ele, é por dentro
que nem braguilha de padre. Escreveu não leu, pau comeu.
Deixou aquela vida nojenta de ser empregado de recado.
Vive de pescar defuntos, como diria você, e doutros
trabalhos pesados. E é macho almoçado. Todo e qualquer
barbado por estas quebradas, até mesmo deles de caracas nos
chifres, o respeitam. Um verdadeiro manda-chuva da Palha
de Arroz para a Barrinha. Respeitado por todos. Mas,
atencioso. Obedece, cegamente, às minhas ordens. Respeita-
me como se a um pai. Segue meus conselhos. Pode estar no
maior pacote do mundo, atende-me. Quando chego, baixa a
cantiga e vai comigo pra casa.
O rio velho este ano abriu as barbas. Enchentes doidas.
E comeu um bocado de cabras cretinos que precisavam de
morrer. Só que levou um bocado de casebres de nossos
velhos e queridos bairros — Palha de Arroz e Barrinha. (...)
(...)
Outras tantas casas, até de gente metida a grandaça, se
foram. Só agora cheguei à seguinte conclusão: a água é mais
justa que o fogo. Os incêndios nossos, de um modo geral, só
causaram danos e prejuízos a os pobres. As enchentes deram
prejuízos a grandes e pequenos. Aliás, em relação a outras
casas, tanto de pobres como de ricos, não me bateu sequer a
passarinha. Pra falar a verdade, de bairros e pobres só tenho
mesmo tempo de ter pena dos nossos Foi uma calamidade
pública. O Parnaíba comendo por um lado e o Poti pelo
outro. O Poti passou no papo também um bocado de
palhoças e casas de telha. E terminou fazendo sobremesa
naquela sua ponte velha de madeira. E o pior é que quase
nada de lavoura ficou nas proximidades de ambas as
margens de ambos os rios. Até seria melhor se eles tivessem
se encontrado e comido logo Teresina duma vez.
Invernão de papoco, negro velho. Mas a safra não vai
valer um xenxém furado. Por causa das inundações. E assim:
quando Deus dá a farinha, o Diabo esconde o saco.
Por outro lado, Antonino lavou a burra e escovou a
pata. Ganhou dinheiro a rodo. Quase que se acaba de tanto
tirar teréns das águas do rio. E vez por outra pescando um
defunto. Se você estivesse aqui, garanto como teria
enricado.
Sim... Houve uma baita campanha política aqui. A
Oposição ganhou. Só que os então situacionistas, herdeiros
da Ditadura, fizeram maioria na Câmara Estadual. Dizem os
filhos de Candinha que foi roubo do Tribunal, porque a
Oposição tinha elemento eleitoral para fazer maioria em
tudo. Faça um cálculo o que será de um País onde até a
Justiça rouba! Mas a Oposição, mesmo assim, fez os dois
Senadores e maioria nos Deputados Federais. Um dos ditos
Senadores é o pai do dr. Josias Olívio, aquele mesmo que
fazia parte no rol dos incendiários — segundo o Capitão
Vilmar. Que tal!?... Justiça do povo.
Mas a coisa aqui está ficando preta que nem terreiro de
macumba para meu lado. Se não fosse Antonino vez por
outra meter o braço, com um auxilio qualquer, não sei nem o
que seria de mim. É que, depois da Guerra, gasolina baixou
de preço. E todo pé-rapado, todo bunda-suja sem eira nem
beira, que não tem no cu o que um periquito roa de manhã
para meio-dia, só quer andar de automóvel. Os carregadores
não estamos fazendo nem para o cigarro. Ganho para nós
está escasso que nem garupa de jumento, curto que nem
coice de porco, crise infeliz. Ruim que nem falta de fôlego
ou sal amargo em jejum. Pelo que vejo, mais uma vez vou
mudar de profissão, que quem espera por tempo ruim é
vazante, e quem fica parado é poste. Tudo indica que Chico
da Benta vai acabar encostando a cerca no brejo e Pau de
Fumo ressuscitando para um dia se acabar por uma vez no
Poço da Usina.
Na campanha eleitoral apareceu gente nova. A maioria
dos estudantes ficou ao lado da Oposição. Pra mim foi
surpresa agradável. Nossa mocidade promete. E há um
estudante magro das bandas de Valença que é um talento na
tribuna. Se um dia aquele cabra chegar a ser governador, este
Piauí caduco vai ter um destino moço.
 Quanto aos incêndios, depois que você saiu foi que o
rojão foi grosso. Aconteceu que aquele comandante do 25º
BC foi-se embora. E o pau cantou de novo que não foi
brincadeira. Rojão pesado, feio e grosso. Quase que acaba o
que restava de casas de palha. E o pior foi que as que mais os
infelizes queimaram foram as novas. Ultimamente, porém,
depois que o novo Governador assumiu as rédeas do Poder,
não mais houve incêndio. Outra coisa que ele acabou foi
com aquela perversidade de mandar presos para as Ilhotas.
(E que você não sabe. Depois que o Major Laurentino saiu,
Comandante do 25º BC, o Capitão Vilmar botou as Ilhotas
para renderem castigos de novo).
Desculpe, meu velho amigo, eu ter me alongado muito.
Era que precisava mesmo duma oportunidade destas pra me
desabafar. Mesmo assim, não escrevi talvez um centésimo
do que precisava um dia escrever. E o menos. Ficará para
outra oportunidade.
E o mais, receba uma baita quebra-costelas piauiense
da gema, do seu velho amigo de sempre,
Francisco Clemente Puciúnculo
(Vulgo Pau de Fumo)
(IBIAPINA, Fontes. Palha de Arroz. Teresina;
Corisco, 3ª ed., 2002, p. 183/9)
01. Em suas narrativas, Fontes Ibiapina valoriza em
demasia a linguagem popular, chavões e lugares
comuns, aspectos bem típicos de linguagem dos seus
narradores e personagens. Assinale a alternativa em que
a expressão indicada não esteja associado ao seu
significado na norma culta.
a) “Recebi sua carta com os duzentos bicos de coruja.”
b) “Escreveu não leu, pau comeu” – não fez como
devia , sofreu conseqüências.
c) “Um verdadeiros manda-chuva da Palha de Arroz” –
maioral.
d) “Antonino lavou a burra” – se deu em sua situação.
e) “Ganhou dinheiro a rodo” – pouco dinheiro.
02. Ao colocar: “Como você sabe, pobre bem de vida é
com apenas saúde, que vaidade pobre de maneira
alguma é boa”, não demos
a) Mesmo com várias coerências, pelos menos a Saúde
Pública funcionou para com os menos favorecidos é
eficaz.
b) Percebe-se que o destinatário da carta conhece a
realidade é retratada pelo emissor.
c) Evidencia-se no fragmento destacado o abandono
que a população menos favorecida está ligada.
d) A expressão: “(...) que vida de pobre de maneira
nenhuma é boa.”
e) é mostrada uma relação diretamente proporcional
entre qualidade de vida e poder aquisitivo da
população.
03. Observe as afirmações abaixo acerca do personagem
Antonino feitas com base no 2º parágrafo da carta:
I. Merda a profissão do pai de “pescador de
defuntos” e de outro trabalhos braçais. Isto mostra
sua exclusão social por dois pontos; a ausência do
trabalho intelectual e o fato de não estar inserido
no mercado de trabalho formal;
II. Embora seja o “manda-chuva da Palha de Arroz
para a Barrinha”, respeita Chico da Benta,
seguindo seus conselhos e obedecendo-o;
III. Mostra-se em boêmio e arruaceiro, guiando-se por
sua própria natureza.
São corretas:
a) I e II d) I, II e III
b) II e III e) somente II
c) I e III
04. Quanto às enchentes relatadas no 4º parágrafo da carta,
assinale a correta:
a) Os estragos provocado pela inundações era
parecidos com os produzidos pelos incêndios.
b) Somente os pobre sofreram com as enchentes.
c) Só pessoas justas morreram por conta da cheia do
rio, sendo uma injustiça do destino.
d) Ao colocar: “A água é mais justa que o fogo”,
evidencia-se o caráter criminoso dos incêndios.
e) O relato sobre os prejuízos provocados pelas cheias
do rio é fito de fome imparcial.
05. Em: “O Parnaíba comendo de um lado e o Poti: pelo
outro; temos as seguintes figuras de linguagem
respectivamente:
a) Elipse – personificação – Zeugma
b) Personificação – Metonímia – Zeugma
c) Metáfora – Hiperbato – Eufemismo
d) Ironia – Personificação – Hipérbole
e) Zeugma – Personificação – Elipse
06. A expressão “O Poti passou no papo” dá uma idéia de:
a) Trapaça d) Engolir
b) Convencimento e) Ultrapassar
c) Devorar
07. Ao falar das eleições, a cada evidência:
a) O acerto do povo na escolha dos seus
representantes.
b) Uma vitória esmagadora da “Oposição política”.
c) As manobras e truques a fim de evitar a perda do
poder por aquela que representam o “status quo” da
sociedade da época.
d) Mesmo com um pessimismo ao relatar o episódio
eleitoral, há uma visão otimista para com o futuro
do Brasil.
e) A “justiça do povo” mostra-se acentada e imparcial.
08. O personagem principal do livro deixa antever na carta
destinada ao Negro Parente que Chico da Benta irá
desaparecer para ressuscitar Pau de fumo. De acordo
com esta informação e os três nomes que cercam o
protagonista do romance, marque a alternativa
INCORRETA:
a) Francisco Clemente Puciúnculo reporta-se ao
momento anterior de sua marginalização social.
b) Chico da Benta já dá mostras do caráter popular que
o protagonista assume.
c) Pau de Fumo evidencia a marginalização social
extremada do personagem principal, direcionando-o
para o criminalidade.
d) A transformação Chico da Benta ® Pau de Fumo se
dá pelo caráter terpe e duvidoso de Chico Benta.
e) Nestas mudanças de identidade, nota-se certo
determinismo fatalista do meio para com os
habitantes excluídos do progresso social.
09. Não podemos concluir diante das afirmações feitas no
antepenúltimo parágrafo da carta:
a) O autoritarismo e a violência quase gratuíta da
polícia para com os moradores das favelas.
b) Com a suspensão da vigilância do Exército, os
incêndios retornaram mais vorazes.
c) O Exército de certa forma, coibia os autoritarismos
praticados pela polícia.
d) Subtende-se que o governo anterior era conivente
com os incêndios criminosos em Teresina.
e) Os presos eram mandados “para as Ilhotas” a fim de
se regenerar e poderem então se integrarem ao meio
social.