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A morte e a morte de Quincas Berro D´Água – Jorge Amado

A morte e a
morte de
Quincas Berro
D´Água
Jorge Amado

I-RESUMO BIOGRÁFICO:

Jorge Amado de Faria nasceu em 1912, em


Ferradas, hoje município de Itabuna, Bahia. Filho de
comerciante sergipano que se tornou produtor de
cacau, fez seus estudos em Ilhéus, Salvador e Rio. Nos fins da década de 20, levou vida de jornalista boêmio, na
capital baiana, onde participou de grupos literários e da efêmera "Academia dos Rebeldes", uma das primeiras
manifestações de oposição ao Modernismo, no nordeste. Em 30, foi para o Rio estudar Direito. Nessa cidade,
colaborou em jornais, fez parte de grupos literários e publicou, em 1931, O País do Carnaval, o que o tornou
conhecido. “Sou apenas um baiano romântico e sensual”.
A notoriedade chegou com os dois romances seguintes: Cacau e Suor, publicados em 33 e 34. Em 1932,
aproximou-se dos grupos políticos de esquerda, apresentado por Rachel de Queiroz. Participou do movimento de
frente popular da Aliança Nacional Libertadora, conhecendo as agruras da prisão, em 36 e 37. Perseguido,
exilou-se em Buenos Aires, Argentina, de 1941 a 1943, período em que publicou a biografia de Carlos Prestes e
escreveu Terras do Sem Fim.
Em 1946, com a redemocratização, elegeu-se deputado federal pelo Partido Comunista Brasileiro. No
ano seguinte, perdeu o mandato, quando o partido foi considerado ilegal. Em 1947, deixou o país por alguns
anos, morando na França e em vários países socialistas da Europa. A partir de 1958, sua produção metódica tem-
lhe permitido viver exclusivamente de literatura. Em 1959, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras. É,
sem dúvida, o autor mais popular da literatura brasileira; seus livros foram traduzidos para mais de 40 línguas,
sendo por isso conhecido mundialmente. É o escritor mais amado pelo público e o menos amado pela crítica.

II-OBRA:

Romance
O País do Carnaval (1931); Cacau (1933); Suor (1934); Jubiabá (1935); Mar Morto
(1936); Capitães da Areia (1937); Terras do Sem Fim (1943); São Jorge do Ilhéus (1944);
Seara Vermelha (1946); Os Subterrâneos da Liberdade (1954); Gabriela Cravo e Canela
(1958); Os Pastores da Noite (1964); "As Mortes e o Triunfo de Rosalinda" in Os Dez
Mandamentos (1965); Dona Flor e Seus Dois Maridos (1966); Tenda dos Milagres (1970);
Teresa Batista Cansada de Guerra (1972); Tieta do Agreste (1977); Farda, Fardão e
Camisola (1979); O menino Grapiúna (1982); Tocaia Grande -A Face Obscura (1984); O
Sumiço da Santa (1988); A Descoberta da América pelo Turcos (1994).

Novela
Os Velhos Marinheiros: A Morte e a Morte de Quincas Berro D'água, A Completa Verdade
Sobre as Discutidas Aventuras do Comandante Vasco Moscoso de Aragão, Capitão-de-
Longo-Curso (1961); O Compadre de Ogun (1995).

Teatro
O Amor de Castro Alves (1947) reeditado como O Amor do Soldado.

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A morte e a morte de Quincas Berro D´Água – Jorge Amado

Poesia
A Estrada do Mar (1938).

Outras
ABC de Castro Alves (1941); O Cavaleiro da Esperança (1942); O Mundo da Paz (1951); O
Gato Malhado e Andorinha Sinhá (1976); O Milagre dos Pássaros (1997).

Guia
Bahia de Todos os Santos (1945) (guia da cidade de Salvador).

 A morte e a morte de Quincas Berro D'Água

1-INTRODUÇÃO:

A obra de Jorge Amado está inserida na segunda fase do Modernismo (o intitulado


“Romance da Seca”). Os autores desta geração priorizaram a problemática ruralista do Nordeste,
evidenciando os contrastes e as explorações sociais sofridas pelos sertanejos.
Jorge Amado popularizou-se em criar tipos sociais, abusando da espacialidade e exotismo da Bahia,
gerando um ambiente propício para que seus personagens possam agir livres, entregues ao universo que os
circunda. É neste universo que esta novela de Amado se desenvolve. Os becos, as ruas, os espaços habitados pela
gente pobre, humilde, feliz e excluída da velha São Salvador são dissecados aos olhos do leitor que necessita de
uma certa malícia, ironia e humor para compactuar com o escritor que lida de forma divertida, dolorida e irônica
com a morte.
Autor dos mais respeitados na literatura brasileira, desde os anos trinta, Jorge Amado tem pontificado
e feito sucesso de crítica e de público. Sua obra explora os mais diferentes aspectos da vida baiana: a posse
violenta da terra, com as conseqüências sociais terríveis, como ocorreu na colonização da zona cacaueira do Sul
da Bahia, está magistralmente imortalizada em Cacau, São Jorge de Ilhéus, Gabriela, Cravo e Canela e Terras do
Sem Fim. Os tipos folclóricos das ladeiras de Salvador estão presentes em Tenda dos Milagres, Capitães da
Areia, Mar Morto. A literatura engajada, comprometida com a ideologia política do Autor faz-se presente em Os
Subterrâneos da Liberdade, O Cavaleiro da Esperança. Os perfis de mulheres extraordinárias que comovem e
seduzem estão em Tieta do Agreste, Dona Flor e seus Dois Maridos, Gabriela e muitos outros...
Primeiro é preciso que se tenha em mente o "descompromisso" do Autor com o registro formal culto,
para se entender melhor o comentário que se faz constantemente sobre seu "estilo". Jorge Amado já se
autoproclamou "um baiano romântico e sensual". É o que a crítica costuma rotular de contador de estórias.
Não segue, intencionalmente, o rigor da técnica de construção literária e nem dá a mínima para as
normas gramaticais e ortográficas. Incorpora, com a maior naturalidade, à língua escrita, termos e expressões
típicas da língua oral e de sua Bahia idolatrada. Não espere o leitor, portanto, defrontar-se com um texto
primoroso, regular, pausterizado. Entretanto, quem se aventurar nos meandros de suas páginas, esteja preparado
para o deguste de um texto saboroso e suculento que transpira a trópico, a calor, a vida. Suas histórias são
tramadas sobre o povo simples e rude, numa língua que esse povo fala e entende.
A morte e a morte de Quincas Berro D'água é, antes de tudo, uma crítica azeda aos comportamentos
burgueses. A par disso, Jorge Amado soube colocar sua imaginação a serviço do humor e da ironia: criou, nas 12
partes da novela, um homem, Quincas, que, mesmo morto, vai ter sua noite de almirante.

2. ENREDO COMENTADO

A novela, dividida em 12 capítulos, retrata a morte do rei dos malandros Quincas Berro
Dágua e toda a magia do ambiente baiano que circunda as histórias fantásticas dos cantadores de
feira, do povo humilde que se utiliza da oralidade, da notícia que ainda se leva de boca em boca.
No primeiro capítulo, o narrador nos antecipa os mistérios e as lacunas que permaneceram sem
explicação na morte de Quincas Berro Dágua. Também ficamos sabendo que Quincas já teria outra morte, o que
aconteceu quando abandonou a família para viver de malandragem. A filha e o genro anteciparam para a
próxima geração que o avô Joaquim, homem respeitável, já havia falecido. Então, Joaquim, ao se transformar em
Quincas, teria a sua primeira morte, ao se desligar da família. Se a morte não foi física, pelo menos foi moral.
Quincas era uma vergonha para a família. Ficamos sabendo também que de fato o personagem seria um
recordista de morte, somando ao todo pelo menos três. E o narrador nos adverte: "Não sei se esse mistério da
morte ( ou das sucessivas mortes) de Quincas Berro Dágua pode ser completamente decifrado. Mas eu o tentarei,
como ele próprio aconselhava, pois o importante é tentar, mesmo o impossível."

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O capitulo II vemos o perfil de Joaquim Soares da Cunha, segundo a família: de boa família, exemplar
funcionário da Mesa de Rendas Estadual, ouvido com respeito, todo burguês, jamais visto em botequim. Este é o
Quincas que existia, quando resolveram decretá-lo morto para a sociedade. Quando a filha Vanda ou o genro
Leonardo sabiam alguma notícia de Quincas através de vizinhos ou terceiros era como se um morto se levantasse
do túmulo. Neste capítulo, também a família fica sabendo através de um santeiro que Quincas estava espichado,
morto em uma pocilga miserável. A família suspirou com alívio, poderia falar do Joaquim exemplar: bom pai,
bom esposo. Fora encontrado por uma nega vendedora de mingau. Encontrou-o com o dedão do pé direito fora
da meia rasgada e de sapato roto no chão. O santeiro espanta-se ao ver onde a família de Quincas morava e
pergunta o motivo dele se encontrar naquela miséria: se foi traição da mulher. O genro retruca que a sogra, a
Dona Otacília, era uma santa. Porém, na fotografia de Otacília, o santeiro vê um osso duro de roer. A família
começa a tomar as providências para o velório.
No capítulo III, a filha Vanda chega à pocilga, e recorda do quanto tentara trazê-lo de volta em vão. O
defunto "era um morto pouco apresentável, cadáver de vagabundo falecido ao azar, sem decência na morte, sem
respeito, rindo-se cinicamente, rindo-se dela (...) Cadáver para necrotério, para ir no rabecão da polícia servir
depois aos alunos da Faculdade de Medicina(...) Era o cadáver de Quincas Berro Dágua, cachaceiro, debochado
e jogador, sem família, sem lar, sem flores e sem rezas. Não era Joaquim Soares da Cunha, correto funcionário
da Mesa de rendas Estadual(...)", aposentado, bom esposo. Vanda indaga-se como pode um homem, aos
cinqüenta anos, abandonar tudo e começar nesta idade "a vagabundear pelas ruas, beber nos botequins baratos,
freqüentar o meretrício, viver sujo e barbado, morar em infame pocilga, dormir em um catre miserável?" Por
mais que tentasse não conseguiria compreender. Loucura de hospício não era. Assim, nem Quincas havia dado o
último suspiro, a família já o iria transformar em Joaquim Soares da Cunha.
No capítulo IV, a família vê-se às voltas com a vergonha e como evitá-la. Para isso, qual seria a melhor
forma de se livrar do defunto? Neste capítulo também tem a chegada do médico para o óbito. E o médico
conclui: "- Ele está rindo, hein! Cara de debochado. Vanda fechou os olhos, apertou as mãos, o rosto vermelho
de vergonha."
No capítulo V, a família entrega o corpo para uma funerária, tentando gastar o mínimo possível:
compram tudo novo, menos a cueca, pois é desnecessária. Em um almoço de família, comendo uma peixada,
Vanda, Leonardo, o irmão de Quincas, Eduardo, e a gordíssima tia Marocas, encontravam um solução para se
livrar do incômodo da forma mais barata, rápida e discreta possível. Decidiram velá-lo na pocilga mesmo e
diriam que ele morreu no interior. Convidariam para a missa de sétimo dia.
O capítulo VI está às voltas com as soluções práticas da família para resolver o problema. Iriam velar o
defunto só os quatro familiares, revezando-se em turnos. E lá estava Quincas na esquife, severo e nobre. "Duas
velas enormes (...) lançavam uma chama débil, pois a luz da Bahia entrava pela janela (...) Tanta luz do sol, tanta
alegre claridade, pareceram a Vanda uma desconsideração para com a morte, faziam as velas inúteis, tiravam-lhe
o brilho augusto. Vanda, velando o pai, começa a restaurar o homem bom da infância ." Neste capítulo também
somos informados como Quincas abandonou tudo: "A verdade é que Joaquim só começara a contar em suas
vidas quando, naquele dia absurdo, depois de ter tachado Leonardo de 'bestalhão', fitou a ela e a Otacília e
soltou-lhes na cara, inesperadamente: - Jararacas!
E, com a maior tranqüilidade desse mundo, como se estivesse a realizar o menor e mais banal dos atos,
foi-se embora e não voltou." Contava Quincas com cinqüenta anos, perambulou pela felicidade durante dez anos.
No silêncio fúnebre, Vanda ouvia o pai dizer jararaca, ela empalideceu. A tia chega. O defunto alegra-se com a
brisa do mar que entra e apaga as velas, sorrindo e ajeitando-se melhor no caixão.
O capítulo VII esta todos às voltas com a tristeza causada em todos os miseráveis da cidade. Passamos a
conhecer o Quincas Berro D’água e o quanto era querido. Os amigos estavam inconformados por ter morrido em
terra, um homem que se dizia velho marinheiro, mesmo sem nunca tê-lo sido. Era herança que herdara de
família, dizia. Seu corpo, por sua vontade, pertencia ao mar. Também neste capítulo somos informados do
apelido Berro D’água, agregado a Quincas. O espanhol o enganou e ofereceu-lhe água, em lugar de cachaça. Ao
perceber o engodo, Quincas deu um berro fenomenal "- Äguuuuua!", chamando a atenção de meio mundo, sendo
ouvido até no elevador Lacerda. A partir de então, transformou-se em Quincas Berro D’água. Todos sofriam a
morte de Quincas. O povo estava de luto. Começa a aparecer as bondades do velho e bom malandro Quincas
Berro D’água.
No capítulo VIII, conhecemos os quatro melhores amigos de Quincas: Curió, Negro Pastinha, Cabo
Martim e Pé-de-vento. Também estes personagens são caracterizados. O capitulo XIX faz-se pelo
enfrentamento dos amigos da malandragem, citados no capítulo anterior e a família de Quincas.
No capítulo X, continua o velório e os quatro amigos em voz baixa disputam o amor da amante de
Quincas, a Quitéria do Olho Arregalado. Agora, era turno do irmão de Quincas, o Eduardo, que iria passar a
noite, mas decide deixar o irmão com os amigos e ir descansar um pouco. Aí os amigos eram os verdadeiros
donos do defunto. Organizaram um velório decente, com cachaça, salame. Tentaram rezar, começaram a beber e

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dar bebida ao defunto que sorria e devolvia um pouco da cachaça, lambuzando o paletó. Os amigos tiraram as
roupas artificiais de Quincas e colocaram os velhos trapos e o defunto ficou deles. Levaram cada um uma peça
para si, pois defunto não precisa dessas coisas. E saíram agora com o defunto vivo para a peixada no saveiro:
"Curió e Pé-de-vento saíram na frente. Quincas, satisfeito da vida, num passo de dança, ia entre Negro Pastinha e
Cabo Martim de braço dado.
No capítulo XI, a cidade neste dia está de luto e quieta. Nem as prostitutas abriram para o ofício. Os
amigos e Quincas saíram acordando todo mundo para a peixada, pois era aniversário do Quincas. Fizeram o que
faziam todas as noites: farra, bebedeira, confusão... Até chegarem ao saveiro e saírem para a peixada no mar. Em
alto mar, Quitéria do Olho Arregalado e Quincas não comiam. Quincas olhava o céu, ouvindo Maria Clara
cantar. De repente, o anúncio de tempestade, mas não respeitaram, retardaram a volta, aproveitando mais o
momento. A tempestade chegou e ninguém sabe como Quincas pôs-se de pé e "no meio do ruído, do mar em
fúria, do saveiro em perigo, à luz dos raios, viram Quincas atirar-se e ouviram sua frase derradeira.
Penetrava o saveiro nas águas calmas do quebra-mar, mas Quincas ficara na tempestade, envolto num
lençol de ondas e espuma, por sua própria vontade.
"No capítulo XII, sabemos que o caixão encontra-se na loja de Eduardo, esperando um defunto de
segunda mão. "Quanto à frase derradeira há versões variadas." Afinal, quem poderia ouvir direito no meio de
tamanho temporal? "Segundo um trovador do Mercado, passou-se assim:

No meio da confusão ouviu-se Quincas dizer:


”Me enterro como entender
na hora que resolver.
Podem guardar seu caixão
Pra melhor ocasião.
Não vou deixar me prender
Em cova rasa no chão.'
E foi impossível saber
O resto de sua oração."

Talvez a frase derradeira possa ser a que abre a obra: "Cada qual cuide de seu enterro, impossível não
há”.(frase derradeira de Quincas Berro D’água segundo Quitéria que estava ao seu lado.)

3 - PERSONAGENS:

Quincas Berro D’água âantes era o respeitável Joaquim Soares da Cunha, exemplar funcionário
público; depois de aposentar-se tornou Quincas Berro D’água, cachaceiro, debochado e jogador por
dez anos; a alcunha Berro D’água deu-se ao beber um gole de cachaça e gritar por água;
Vanda â “a filha envergonhada”; religiosa;
Leonardo Barreto â humilhado genro de Quincas;
Tia Marocas â gordíssima; “Saco de peidos”.
Tio Eduardo â irmão de Joaquim; deixa o velório e dá dinheiro aos amigos de Quincas.
Quitéria do Olho Arregalado â prostituta que mantinha relações com Quincas (Berrito);
Curió, Negro Pastinha, Cabo Martim e Pé-de-Vento â amigos íntimos de Quincas; beberam e fumaram
no velório; levaram Quincas para passear na velha Salvador; depois foram para o veleiro onde Quincas
em meio a uma tempestade atirou-se no mar.

4-TEMPO:

Cronológico. A narrativa se dá em 20 horas.

5-ESPAÇO:

A velha Salvador – a cidade baixa - seus bêbados, vagabundos e suas prostitutas.

6-NARRADOR:

3º pessoa – onisciente.

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III- CONSIDERAÇÕES FINAIS:

A Morte e a Morte de Quincas Berro d'Água é uma das melhores narrativas publicadas por
Jorge Amado. Veio a lume em 1958 e conquistou desde logo a admiração de quantos dela se
aproximaram. Nitidamente imbricada no Realismo Mágico, mistura sonho e realidade; loucura e
racionalidade; amor e desamor; ternura e rancor, de forma envolvente e instigante: Joaquim Soares
da Cunha foi funcionário público, pai e marido exemplar até o dia em que se aposentou do serviço público. A
partir daí, jogou tudo para o alto: família, respeitabilidade, conhecidos, amigos, tradição. Caiu na malandragem,
no alcoolismo, na jogatina. Trocou a vida familiar pela convivência com as prostitutas, os bêbados, os
marinheiros, os jogadores e pequenos meliantes e contraventores da ralé de Salvador. Sua sede era saciada com
cachaça e seu descanso era no ombro acolhedor da prostituta. Fez-se respeitado e admirado entre seus novos
companheiros de infortúnio: era o paizinho, sábio e conselheiro, sempre disposto a mais uma farra ou bebedeira.
Sua opção pela bandalha representa o grito terrível do homem dominado e cerceado por preconceitos de
toda sorte e que um dia rompe as amarras e grita por liberdade. Morreu solitariamente sobre uma enxerga
imunda e sua morte detonou todo o processo de reconhecimento/desconhecimento por parte da família real e da
família adotada. Os amigos durante o velório se embriagam e resolvem, bêbados, levar o defunto para um último
"giro" pelo baixo-mundo que habitavam. O passeio passa pelos bordéis e botecos, terminando em um saveiro,
onde há comida e mulheres. Vem uma tempestade e o corpo de Quincas cai ao mar.
Ao renunciar à família, mudar de ambiente e de costumes, Quincas morreu pela primeira vez; na
solidão de seu quartinho imundo, envolvido por farrapos e curtindo a última bebedeira, morreu pela segunda
vez; ao cair ao mar, não deixando qualquer testemunho físico de sua passagem pela vida, morreu pela terceira
vez. A narrativa poderia chamar-se A morte e a morte e a morte de Quincas Berro D'Água, acrescentando-se
uma morte ao protagonista, que ficaria bem de acordo com a progressão da trama.

QUESTÕES PARA ESTUDO Considerando as três afirmativas, é verdadeiro


dizer que:
01. Sobre a vida e obra de Jorge Amado, analise as
afirmações abaixo:
a) Somente as afirmativas I e II são corretas.
I- O escritor foi preso junto com outros b) Todas as afirmativas são corretas.
intelectuais na ditadura Vargas; c) Somente as afirmativas I e III são corretas.
II- Suas obras são classificadas pela temática: d) Somente as afirmativas II e III são incorretas.
ciclo social, ciclo político, ciclo do cacau e e) Somente a afirmativa II é correta.
ciclo das mulheres (crônicas de costumes);
III-Seu primeiro romance, O país do carnaval,
escrito aos 19 anos, foi bem aceito pela crítica 03. Sobre a novela A Morte e a Morte de Quincas
e se enquadra no chamado ciclo do cacau com Berro d'Água de Jorge Amado, assinale a
os romances Terras do sem-fim e São Jorge de alternativa CORRETA:
Ilhéus.

Quais são corretas? a) É uma novela urbana que enfatiza os aspectos


psicológicos de um homem abandonado pela
a) Apenas I é verdadeira. família que busca na religião sua salvação.
b) Apenas II é verdadeira. b) Trata-se da história de um sonhador e
c) Apenas III é verdadeira.
d) Apenas I e II são verdadeiras. visionário que queria mudar o estado da Bahia
e) Apenas II e III são verdadeiras. com suas idéias revolucionárias.
c) A história gira em torno de Quincas Berro
02. (UESPI-2002) Sobre o Jorge Amado pode-se D’água, homem casado, que deixa a família
afirmar que:
para viver com sua amante no subúrbio de
I- Revelou regiões inteiras do País, mostrando a Salvador.
dura realidade brasileira e criou uma galeria d) O protagonista Joaquim Soares da Cunha que
memorável de personagens; junto dos seus amigos bêbados fazem arruaças
II- Confessou que deixava em segundo lugar o
na velha Salvador sendo presos pela polícia
trabalho da linguagem, preocupando-se mais
com os enredos; local.
III-Saindo da primeira fase de sua literatura com e) Nesta novela aparecem personagens populares,
romances de rebeldia e denúncia, evolui para a como marinheiros, vagabundos, contraventores,
segunda fase, caracterizada pelos “romances prostitutas, como, aliás, acontece em praticamente
proletários”, cada vez mais imbuídos de
ideologia. toda a obra do escritor baiano.

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04. (UESPI-2002) Jorge Amado escreveu a novela A
Morte e a Morte de Quincas Berro d'Água, onde o 05. As atitudes de Quincas em seu velório revelam:
protagonista, morto num dia qualquer:
a) Um desvio de comportamento do protagonista,
a) Foi também protagonista do livro de memórias que em vida fora sempre amável e educado.
do autor Navegação de Cabotagem. b) Indignação do protagonista diante da morte.
b) Teve seu enterro “módico, mas respeitável”, c) Uma forma muito particular de carinho para
feito pela família. com os familiares, diante de situação tão
c) Não aparentava ser cômico. trágica.
d) Trocara uma existência pacata pela boêmia. d) A mágoa alimentada pelo protagonista,
e) Não prezava a liberdade. conseqüência do desprezo da família.
e) A personalidade anárquica, irreverente e
(CEFET-PI / 2002) O texto que se segue é um contestadora do protagonista.
fragmento da obra “A morte e a morte de Quincas
Berro D’água. Leia-o atentamente antes de 06. Sobre a posição de Vanda em relação a Quincas, é
responder às questões de 05 a 14. VERDADEIRO:

E Vanda ouviu, as sílabas destacadas com a) Vanda escandalizava-se com o comportamento


nitidez insultante, no silêncio fúnebre: do pai, pois em nada se assemelhava às suas
- Jararaca! atitudes em vida.
Assustou-se Vanda, seus olhos fuzilaram b) Vanda não estranhava o comportamento do pai
como os de Otacília mas seu rosto tornou se depois de morto, pois achava divertido o modo
pálido. Era a palavra que ele usava, como uma como agia.
cusparada, quando, no início dessa loucura, c) Vanda conhecia bem a personalidade e o
buscavam, ela e Otacília, reconduzi-lo ao conforto comportamento do pai, a ponto de prever suas
da casa, aos hábitos estabelecidos, à perdida atitudes.
decência. Nem agora, morto e estirado num d) Vanda não se importava com as atitudes
caixão, com velas aos pés, vestido de boas roupas, grosseiras do pai depois de morto, pois sabia de
ele se entregava. Ria com a boca e com os olhos, seu sincero arrependimento.
não era de admirar se começasse a assoviar. E, e) Vanda é indiferente às atitudes do pai, o que o
além do mais, um dos polegares – o da mão incentiva a debochar cada vez mais das
esquerda – não estava devidamente cruzado sobre pessoas.
o outro, elevava-se no ar, anárquico e
debochativo. 07. O texto permite inferir, a respeito da voz de
- Jararaca! – disse de novo, e assoviou Quincas que:
gaiatamente.
Vanda estremeceu na cadeira, passou a a) A realização física da fala não ocorre, mas
mão no rosto – Será que estou enlouquecendo?- Vanda e Marocas podem compreender o que
sentiu faltar-lhe o ar, o calor fazia-se insuportável, ele quis dizer.
sua cabeça rodava. Uma respiração ofegante na b) Quincas fala, mesmo depois de morto, podendo
escada: tia Marocas, as banhas soltas, penetrava ser ouvido por qualquer pessoa.
no quarto. Viu a sobrinha descomposta na c) Quincas realmente fala, mas somente Marocas
cadeira, lívida, os olhos pregados na boca do pode ouvi-lo.
morto. d) Não estando realmente morto, Quincas pode se
- Você está abatida, menina. Também com comunicar normalmente com a irmã e a filha.
o calor que faz nesse cubículo... e) Não tinha realização física concreta, sendo
Ampliou-se o sorriso canalha de Quincas percebida apenas por Vanda.
ao enxergar o vulto monumental da irmã. Vanda
quis tapar os ouvidos, sabia, por experiência 08. A loucura de Quincas, para Vanda, representa,
anterior, com que palavras ele amava definir EXCETO:
Marocas, mas que adiantam mãos sobre as orelhas
para conter voz de morto? Ouviu: a) A perda da decência, caracterizada pelo
- Saco de peidos!
abandono do lar.
Marocas, mais descansada da subida, sem
olhar sequer o cadáver, escancarou a janela: b) A vida mundana com as mulheres na ladeira do
- Botaram perfume nele? Está um cheiro Tabuão.
de tontear. c) O rompimento com os padrões preservados
Pela janela aberta, o ruído da rua entrou, pela sociedade, na época.
múltiplo e alegre, a brisa do mar apagou as velas
d) A liberdade, a adesão à vida simples, sem as
e veio beijar a face de Quincas, a claridade
estendeu-se sobre ele, azul e festiva. Vitorioso pressões e imposições sociais.
sorriso nos lábios, Quincas ajeitou-se melhor no e) A vida de jogos e bebida, sem as
caixão. responsabilidades de um pai de família.
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09. A cena representa no texto permite inferir que 14. Sobre a obra em questão, é CORRETO afirmar
Quincas tem com a família uma relação de: que:

a) Retrata de forma impiedosa a classe média, que


a) cordialidade
elege como valores a propriedade, o dinheiro, a
b) menosprezo hipocrisia.
c) afeição b) Quincas, protagonista da história, tem como
d) complacência características principais a inocência e o
e) amabilidade instinto primitivo.
c) A ligação do autor com o Partido Comunista
10. As relações familiares associam-se, em um determina a temática da obra.
contexto mais amplo, com: d) É um relato autobiográfico que reproduz a luta
de Jorge Amado por uma cadeira na Academia
Brasileira de Letras.
a) Os conflitos sociais, manifestos nas lutas de
e) É constituída, em sua maioria, por depoimentos
classes travadas entre os personagens. líricos dos marinheiros do cais da Bahia.
b) Os conflitos raciais, próprios de uma cidade
multirracial como Salvador. 15. Sobre a novela A Morte e a Morte de Quincas
c) A convivência pacífica de raças e de credos na Berro d'Água, analise as afirmações abaixo:
sociedade baiana da época.
d) A estabilidade social, fundamentada na I- A novela foi publicada a princípio com outra
religiosidade do povo baiano. novela sob o nome de Os Velhos marinheiros;
e) Os conflitos sociais, frutos de crenças políticas II- Quincas resume a nova ideologia do escritor
baiano: “o povo é que sabe viver”. O texto
e filiações partidárias diferentes nos
destaca-se também pela economia de estilo;
personagens. III-O protagonista tem na verdade três mortes:
uma quando renunciou a família, a outra
11. Quanto à natureza dos fatos narrados no texto, é quando estava sozinho e bêbado em seu
CORRETO afirmar: quartinho e a última quando se jogou ao mar.

a) Não são reais nem aceitáveis, quer se considere Quais são corretas?
a narrativa histórica ou a literária.
b) Trata-se de uma narrativa que tende para o a) Apenas I.
b) Apenas I e II.
irreal, característica do realismo mágico.
c) Apenas I e III.
c) São reais e inquestionáveis, quer se considere a d) Apenas II e III.
narrativa literária ou histórica. e) I, II e III.
d) São reais, do ponto de vista histórico, mas
irreais do ponto de vista literária.
e) Trata-se de uma narrativa que tende para o
fantástico, característica do realismo científico.

12. Assinale a opção correta quanto ao emprego da


expressão “Saco de peidos”.

a) sentido conotativo – linguagem coloquial.


b) sentido denotativo – linguagem técnica.
c) sentido conotativo – linguagem formal.
d) sentido denotativo – linguagem coloquial.
e) sentido conotativo – linguagem técnica.

13. No período “a brisa do mar apagou as velas e veio


beijar a face de Quincas” (último parágrafo),
aparece a seguinte figura de linguagem:

a) antítese
b) pleonasmo
c) onomatopéia
d) metáfora
e) prosopopéia
7 Literatura – Prof. Jorge Alberto

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