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(ARIANO SUASSUNA)
ARIANO SUASSUNA
“Que bem precisada anda disso. Saia e vá rezar lá fora. Muito bem, com
toda essa gente morta, o espetáculo continua e terão oportunidade de
assistir seu julgamento. Espero que todos os presentes aproveitem os
ensinamentos desta peça e reformem suas vidas, se bem que eu tenha
certeza de que todos os que estão aqui são uns verdadeiros santos,
praticamente da virtude, do amor a Deus e ao próximo, sem maldade,
sem mesquinhez, incapazes de julgar e de falar mal dos outros,
generosos, sem avareza, ótimos patrões, excelentes empregados,
sóbrios, castos e pacientes. E basta, se bem que seja pouco.”
A função cênica do Palhaço – porta voz do autor – é abrir e fechar o
espetáculo.
O Palhaço tem também a função de descrever, de forma antecipada e
didática, o clima da peça, apresentar atores, assim como despertar a
curiosidade da platéia sobre o desfecho e adverti-la para que mantenha
distanciamento crítico e consciência crítica.
O Palhaço irá esboçar, enfim, a finalidade primordial do espetáculo que é a
intenção moralizante e crítica do autor, respaldada na religiosidade cristã,
católica.
No Auto da Compadecida, portanto, percebe-se uma função metateatral
(metalingüística), exercida pelo Palhaço, que conduz o espetáculo à maneira
circense:
“Ele se dirige ao público, anunciando o que está por vir e fazendo comentários.
Na sua qualidade, ele não se mistura à ação da peça. Aparece, sim, no
prólogo do início de cada ato e no epílogo. Porém, em uma de suas
intervenções torna-se também ator, ou melhor, curinga, pois participa da
cena do enterro de João Grilo”.
Os personagens simbolizam pecados (maiores ou menores), que recebem o
direito ao julgamento, que gozam do livre-arbítrio e que são ou não
condenados.
No Auto da Compadecida, enfim, Ariano reescreve e recontextualiza
gêneros medievos em produtos culturais populares nordestinos,
questionando procedimentos de exclusão social, política e religiosa, por
meio de personagens de extração popular.
Dessa forma, poder-se-ia concluir que o autor trabalha dentro de um
enfoque eminentemente regionalista.
Entretanto, cabe observar que o próprio Ariano não propõe, nas
indicações que servem de base para a representação, nenhuma
atitude expressiva que seja amplamente regionalista, nordestina.
Apenas quatro personagens ligam-se a determinantes regionais: João
Grilo, Chico, Severino do Aracaju e o Encourado que, como justifica o
próprio autor, “segundo uma crença do sertão do Nordeste, é um
homem muito moreno, que se veste como um vaqueiro”.