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TESTE DE AVALIAÇÃO (12º ANO)

Mestre, são plácidas O tempo passa,


Todas as horas Não nos diz nada.
Que nós perdemos, Envelhecemos.
Se no perdê-las, Saibamos, quase
Qual numa jarra, Maliciosos,
Nós pomos flores. Sentir-nos ir.

Não há tristezas Não vale a pena


Nem alegrias Fazer um gesto.
Na nossa vida. Não se resiste
Assim saibamos, Ao deus atroz
Sábios incautos, Que os próprios filhos
Não a viver, Devora sempre.

Mas decorrê-la, Colhamos flores.


Tranquilos, plácidos, Molhemos leves
Tendo as crianças As nossas mãos
Por nossas mestras, Nos rios calmos,
E os olhos cheios Para aprendermos
De Natureza... Calma também.

À beira-rio, Girassóis sempre


À beira-estrada, Fitando o sol,
Conforme calha, Da vida iremos
Sempre no mesmo Tranquilos, tendo
Leve descanso Nem o remorso
De estar vivendo. De ter vivido.

Ricardo Reis, in "Odes"

1. Caracterize a relação entre “nós” e o “Tempo”.


2. Explicite um dos efeitos de sentido produzidos pelas formas verbais “saibamos”(vv. 10 e 28),
“Colhamos” (v. 37) e “Molhemos” (v. 38).
3. Interprete o valor simbólico das referências às “flores” (vv. 6 e 37), aos Girassóis” (v. 43), aos “rios”
(v. 40).
4. Refira a importância, no texto, do vocabulário relativo à ideia de calma.
5. Sintetize a filosofia de vida expressa no poema.

II

Fazendo apelo à sua experiência de leitura, explicite o modo como Ricardo Reis perspectiva a passagem
do tempo e as implicações daí decorrentes.

Escreva um texto de oitenta a cento e trinta palavras.


Correcção

1. Assunto

Neste poema, o sujeito poético dirige-se ao seu “Mestre”, Alberto Caeiro, como que
partilhando os seus pensamentos. Há, neste “desabafo”, uma série de aconselhamentos
dirigidos a um “nós”, no qual o sujeito poético se inclui, e, simultaneamente, um conjunto de
máximas, que contêm ensinamentos de vida, facto que confere ao texto o estatuto de
proposta de uma filosofia geral de vida. (Para estes aspectos contribuem,
indubitavelmente, as formas verbais no imperativo e/ou presente do conjuntivo, com valor
imperativo/optativo).

2. Relação entre nós” e o Tempo (caracterização)

O sentido da relação entre “nós” e o tempo está representado na referência à figura


mitológica de “Cronos”, o deus que devorava os filhos: o “Tempo” é assim definido como o
pai e, simultaneamente, o devorador, aniquilador do “nós”.
A consciência do carácter inevitável desse facto exige a aprendizagem da sua total
aceitação, por parte do “nós”, de modo a saber conformar-se às leis do tempo (ao devir da
vida, à inscrição do tempo em nós: “Envelhecemos”).

3. Valor simbólico da referência às flores, girassóis e rios

Estes elementos presentificam a “Natureza” como a realidade com que o “nós” se


identifica,
tendo cada um deles valores simbólicos. Assim sendo:
_ Flores é representam a vida perecível (mortal);
_ Girassóis (que mudam de orientação, acompanhando o movimento do Sol) é
representam a vida iluminada, regida pela luz do Sol;
_ Rios é representam, a passagem das horas, do TEMPO.

4. Importância do vocabulário relativo à ideia de calma

Os adjectivos [“plácidas” (v.1), “Tranquilos” (v. 14 e 16), “plácidos” (v.14) , “calmos” (v. 40)]
e os nomes [“descanso” (v. 23), “Calma” (v. 42)] tornam recorrente, no poema, a ideia de
calma e serenidade.
Contribuem, assim, para afirmar a centralidade do tema do sossego absoluto, sem
qualquer perturbação, entendido como ideal a atingir na vivência do “Tempo”.

5. Filosofia de vida expressa no poema

É a defesa da arte de viver sem envolvimento emocional com o presente e sem


expectativas de futuro, por forma a chegar à morte sem sobressalto e com o mínimo de
sofrimento (“Não a viver”, v. 12; “tendo / Nem o remorso / De ter vivido”, vv. 46-48).
O sujeito poético aspira a “decorrer” a vida, isto é, a atingir a sensação elementar de existir,
aceitando voluntariamente o seu destino, aprendendo a viver em conformidade com as leis
da Natureza, aceitando, com calma lucidez, a relatividade e a fugacidade de todas as
coisas, recusando “tristezas” e “alegrias”, na busca da indiferença à dor, ao desprazer, a
qualquer sentimento extremo.

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