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louís

althusser
APARELHOS
IDEOLÓGICOS DE
\ ••
ESTADO
Nota sobre os Aparelhos
.Ideológicos de Estado

320.5 j Introdução Crítica de


I A467a J . Aj G U I L H O N A L B U Q U E R Q U E
1987
Ex.l

í g m f l t Biblioteca de j
* S ^ t v Ciências Sociais
Traduzido do original francês: Posicion.

1? edição: 1983

Direitos adquiridos para o Brasil por:


EDIÇÕES G R A A L L T D A .
Rua Hermenegildo de Barros, 31-A ÍNDICE
Glória — Rio de Janeiro — RJ — C E P : 20241
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1987
Impresso no l i i a s i l I N T R O D U Ç Ã O : A l t h u s s e r , A I d e o l o g i a e as I n s t i -
1'rinleà in liruzii tuições

J . A. G U I L H O N A L B U Q U E R Q U E 7
Revisora: Áurea Moraes Santos
Produção Gráfica: Orlando Fernandes
APARELHOS IDEOLÓGICOS D E E S T A D O

; „ S o b r e a reprodução das condições de produção .. 53


' A reprodução d o s m e i o s d e produção 54
Reprodução d a força d e t r a b a l h o 56
CIP-Brasil. Catalogação-na-fonte
Infra-estrutura e Superestrutura 59
Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ.
O Estado 62
Da teoria descritiva à teoria propriamente dita ... 63
Althusser, Louis, 1918-
Aparelhos Ideológicos de Estado : nota sobre os v ^ O essencial d a t e o r i a m a r x i s t a d o E s t a d o 65
A469a
aparelhos ideológicos de Estado ( A I E ) / Louis Althusser; í Os a p a r e l h o s ideológicos d o E s t a d o 66
tradução de Walter José Evangelista e Maria Laura V i - O q u e são os a p a r e l h o s ideológicos d o E s t a d o
veiros de Castro ; introdução crítica de José Augusto (AIE)? 67
Guilhon Albuquerque. — Rio de Janeiro : Edições Graal, v 5? S o b r e a reprodução d a s relações d e p r o d u ç ã o . . . 73
1985, 2? edição. 0 Acerca d a Ideologia . 81
•y, A I d e o l o g i a não t e m história 82
(Biblioteca de ciências sociais ; v. n. 25) " A Ideologia é u m a "representação"
V 85
^ A I d e o l o g i a i n t e r p e l a os indivíduos e n q u a n t o s u -
Tradução de: Posicion jeitos 93
1. 0 Estado 2. Estado - Teoria I. Título I I . Série U m e x e m p l o : A I d e o l o g i a R e l i g i o s a Cristã 99
N O T A S O B R E OS A P A R E L H O S IDEOLÓGICOS
C D D — 320.1 D E ESTADO '. 109
320.101
C D U — 321
321.01
J3-0350
APARELHOS IDEOLÓGICOS DE ESTADO

'Jj
Tradução
de

MARIA L A U R A VIVEIROS DE CASTRO

Sobre a Reprodução das Condições de Produção 1

Impõe-se q u e t r a t e m o s de u m a questão apenas es-


boçada e m nossa análise, q u a n d o f a l a m o s d a necessi-
dade de renovação d o s m e i o s de produção p a r a q u e a
produção seja possível. E r a apenas u m a rápida i n d i c a -
ção. Considerá-la-emos a g o r a p o r s i m e s m a .
C o m o o d i z i a M a r x , até u m a criança sabe q u e u m a
formação s o c i a l q u e não r e p r o d u z as condições de p r o -
dução ao m e s m o t e m p o q u e p r o d u z , não sobreviverá
n e m p o r u m a n o . P o r t a n t o a condição última d a
2

produção é a reprodução das condições de produção.


E s t a p o d e ser " s i m p l e s " (e então se l i m i t a a r e p r o d u -
z i r as condições pré-existentes de produção) o u " a m -
p l i a d a " ( q u a n d o as a m p l i a ) . D e i x e m o s , p o r h o r a , esta
distinção de l a d o :
O q u e é então a Reprodução das Condições de Pro-
dução?
P e n e t r a m o s a q u i n u m domínio ao m e s m o t e m p o
b a s t a n t e f a m i l i a r , desde o L i v r o I I d o C a p i t a l , e singu-

1 O texto a ser lido se constitui de dois trechos de u m estudo


ainda em curso. O autor fez questão de entitulá-los Notas para
u m a pesquisa. As ideias expostas devem ser consideradas como
u m a introdução à discussão.

2 C a r t a a Kugelmanh, 11-7-1868 (Cartas sobre o Capital, E d So-


ciales, p. 229).

53
ç õ e s ) , i n s t r u m e n t o s de produção ( m á q u i n a s ) , e t c . . . D i - .
l a r m e n t e d e s c o n h e c i d o . As evidências tenazes (evidên-
zemos: q u a l q u e r e c o n o m i s t a , q u a l q u e r c a p i t a l i s t a , en-
cias ideológicas de caráter e m p i r i s t a ) d o p o n t o de v i s t a
quanto ambos expressam o p o n t o de vista d a empresa,
da m e ; a produção e d a s i m p l e s prática p r o d u t i v a (abs-
c o n t e n t a n d o - s e e m c o m e n t a r s i m p l e s m e n t e os t e r m o s
traía e m s i m e s m a c o m relação ao processo de p r o d u -
d a prática f i n a n c e i r a contábil d a e m p r e s a .
ç ã o ) se i n c o r p o r a m de t a l f o r m a à nossa consciência
c o t i d i a n a q u e é e x t r e m a m e n t e difícil, p a r a não d i z e r P o r é m s a b e m o s , graças ao génio de Quesnay — q u e
quase impossível, alcançar o p o n t o de v i s t a d a r e p r o - f o i o p r i m e i r o a f o r m u l a r este p r o b l e m a q u e " s a l t a aos
dução. P o r t a n t o , se este p o n t o de v i s t a não é a d o t a d o , o l h o s " — e ao génio de M a r x — que o r e s o l v e u — q u e
t u d o p e r m a n e c e a b s t r a t o ( m a i s d o q u e p a r c i a l : defor- não é ao nível d a e m p r e s a q u e a reprodução d a s c o n d i -
m a d o ) m e s m o ao nível d a produção, e, c o m m a i s razão ções m a t e r i a i s d a produção p o d e ser p e n s a d a ; p o i s não
a i n d a , ao nível d a s i m p l e s prática. é nesse nível q u e ela existe e m suas condições r e a i s . O
T e n t a r e m o s e x a m i n a r as coisas c o m método. que acontece ao nível d a e m p r e s a é u m e f e i t o , q u e dá
apenas a ideia d a necessidade d a reprodução, m a s q u e
P a r a s i m p l i f i c a r nossa exposição e se c o n s i d e r a m o s não p e r m i t e a b s o l u t a m e n t e p e n s a r suas condições e
que t o d a formação s o c i a l é r e s u l t a d o de u m m o d o de seus m e c a n i s m o s .
produção d o m i n a n t e , p o d e m o s d i z e r q u e o proces-
so de produção a c i o n a as forças p r o d u t i v a s existentes B a s t a r e f l e t i r u m p o u c o p a r a se c o n v e n c e r : o S r . X , ^
e m e sob relações de produção d e f i n i d a s . c a p i t a l i s t a , q u e p r o d u z t e c i d o s de lã e m s u a fábrica, /
deve " r e p r o d u z i r " s u a matéria-prima, suas máquinas, /
Segue-se q u e t o d a formação s o c i a l p a r a e x i s t i r , ao e t c . . . P o r é m q u e m as p r o d u z p a r a a s u a produção são /
m e s m o t e m p o q u e p r o d u z , e p a r a p o d e r p r o d u z i r , deve o u t r o s c a p i t a l i s t a s : o S r . Y , u m g r a n d e c r i a d o r de ove-/
r e p r o d u z i r as condições de s u a produção. E l a deve, lhas d a Austrália; o S r . Z, g r a n d e i n d u s t r i a l metalúr- {
portanto, reproduzir: gico, p r o d u t o r de máquinas-ferramentas, etc, etc, d e v e m /
p o r s u a vez, p a r a p r o d u z i r esses p r o d u t o s q u e c o n d i - /
1) as forças p r o d u t i v a s c i o n a m a reprodução das condições de produção d o l -
S r . X , r e p r o d u z i r as condições de s u a própria produção,
2) as relações de produção existentes e a s s i m i n f i n i t a m e n t e , t u d o isso n u m a proporção t a l
que, n o m e r c a d o n a c i o n a l ( q u a n d o não n o m e r c a d o I
m u n d i a l ) , a d e m a n d a de m e i o s de produção ( p a r a af
A Reprodução dos Meios de Produção reprodução) p o s s a ser s a t i s f e i t a p e l a o f e r t a .

T o d o m u n d o reconhece ( m e s m o os e c o n o m i s t a s P a r a p e n s a r este m e c a n i s m o q u e c o n s t i t u i u m a es-


burgueses q u e c u i d a m d a c o n t a b i l i d a d e n a c i o n a l e os pécie de " f i o s e m f i m " , é necessário s e g u i r a trajetória
m o d e r n o s teóricos " m a c r o - e c o n o m i s t a s " ) , u m a vez q u e " g l o b a l " de M a r x , e e s t u d a r e s p e c i a l m e n t e as relações
M a r x impôs a demonstração n o L i v r o I I de " O Capi- de circulação d o c a p i t a l e n t r e o S e t o r I (produção d o s
t a l " , q u e não há produção possível s e m q u e seja asse- m e i o s de p r o d u ç ã o ) e o S e t o r I I (produção d o s m e i o s
g u r a d a a reprodução das condições m a t e r i a i s d a p r o - de c o n s u m o ) , e a realização d a m a i s - v a l i a , n o s L i v r o s
dução: a reprodução d o s m e i o s de produção. I I e I I I do Capital.
Q u a l q u e r e c o n o m i s t a , q u e n i s t o não se d i s t i n g u e d e N ã o p e n e t r a r e m o s n a análise d e s t a questão. B a s t a -
q u a l q u e r c a p i t a l i s t a , sabe q u e é p r e c i s o a n u a l m e n t e
n o s h a v e r m e n c i o n a d o a existência d a necessidade d a
p r e v e r a reposição d o q u e se esgota o u se u t i l i z a n a
reprodução das condições m a t e r i a i s d a p r o d u ç ã ã ~~
produção: matéria-prima, instalações f i x a s ( c o n s t r u -
55
54
Reprodução da força de trabalho não está apenas d e t e r m i n a d a pelas necessidades de u m
S.M.I.G. " b i o l ó g i c o " , m a s também p o r u m mínimo
C e r t a m e n t e a l g u m a coisa terá c h a m a d o a atenção histórico ( M a r x assinalava: os operários ingleses p r e c i -
d o l e i t o r . R e f e r i m o - n o s à reprodução d o s m e i o s de p r o - s a m de c e r v e j a e os operários franceses de v i n h o ) e,
dução, m a s não à reprodução d a s forças p r o d u t i v a s . p o r t a n t o , h i s t o r i c a m e n t e variável.
O m i t i m o s p o r t a n t o a reprodução d o q u e d i s t i n g u e as
forças p r o d u t i v a s dos m e i o s de produção, a s a b e r a L e m b r e m o s também q u e esse mínimo_é_ d u p l a m e n t e
reprodução d a força de t r a b a l h o . histórico e n q u a n t o não está definidb~pêlas necessidades
históricas d a classe operária reconhecidas pela classe
Se a observação d o q u e o c o r r e n a e m p r e s a , espe- c a p i t a l i s t a , m a s p o r necessidades históricas i m p o s t a s
c i a l m e n t e o e x a m e d a prática f i n a n c e i r a contábil das pela l u t a d a classe operária ( d u p l a l u t a de classes: con-
previsões de amortização-inversão, p o d e dar-nos u m a t r a o a u m e n t o d a j o r n a d a de t r a b a l h o e c o n t r a a d i m i -
ideia a p r o x i m a d a d a existência d o p r o c e s s o m a t e r i a l d a nuição d o s salários).
reprodução, e n t r a m o s a g o r a n u m domínio n o q u a l a
observação d o q u e o c o r r e n a e m p r e s a é, senão t o t a l - E n t r e t a n t o não b a s t a assegurar à força de t r a b a l h o
m e n t e , quase q u e t o t a l m e n t e inútil, e p o r u m a b o a r a - as condições m a t e r i a i s de s u a reprodução p a r a q u e se
zão: a_rej3rodução_da força d e . t r a b a l h o se dá, n o essen- r e p r o d u z a c o m o força de t r a b a l h o . D i s s e m o s q u e a
ciai, f o r a da empresa. força d e t r a b a l h o disponível deve ser " c o m p e t e n t e " , i s t o
é, a p t a a ser u t i l i z a d a n o s i s t e m a c o m p l e x o d o p r o c e s s o
C o m o se assegura a reprodução d a força de t r a b a - de produção. O d e s e n v o l v i m e n t o das forças p r o d u t i v a s
lho? E l a é assegurada ao se d a r à força de t r a b a l h o o e o t i p o de u n i d a d e h i s t o r i c a m e n t e c o n s t i t u t i v o das
m e i o m a t e r i a l de se r e p r o d u z i r : o salário. O salário forças p r o d u t i v a s n u m d a d o m o m e n t o d e t e r m i n a m q u e
c o n s t a n a c o n t a b i l i d a d e de cada e m p r e s a , m a s c o m o a força de t r a b a l h o deve ser ( d i v e r s a m e n t e ) q u a l i f i c a d a
" c a p i t a l mão-de-obra" e de f o r m a a l g u m a c o m o c o n d i -
a e então r e p r o d u z i d a c o m o t a l . D i v e r s a m e n t e : c o n f o r m e
ção d a reprodução m a t e r i a l d a força d e t r a b a l h o . às exigências d a divisão social-técnica d o t r a b a l h o , n o s
seus d i f e r e n t e s " c a r g o s " e " e m p r e g o s " .
N o e n t a n t o é a s s i m q u e ele " a t u a " , u m a vez q u e o
salário r e p r e s e n t a apenas a p a r t e d o v a l o r p r o d u z i d o O r a , v e j a m o s , c o m o se dá esta reprodução d a qua-
p e l o gasto d a força de t r a b a l h o , indispensável p a r a s u a lificação ( d i v e r s i f i c a d a ) d a força de t r a b a l h o n o r e g i m e
reprodução, q u e r d i z e r , indispensável p a r a a r e c o n s t i - c a p i t a l i s t a ? A o contrário d o q u e o c o r r i a nas formações
tuição d a força de t r a b a l h o d o a s s a l a r i a d o ( p a r a a ha- sociais escravistas e s e r v i s , esta reprodução^ d a q u a l i f i -
bitação, vestuário e alimentação, e m s u m a , p r a q u e ele cação d a força de t r a b a l h o t e n d é ^ r t f M ã - s T l í e " u m a l e i
esteja e m condições de t o r n a r a se a p r e s e n t a r n a ma- t e n d e n c i a l ) a dar-se não m a i s n o " l o c a l de t r a b a l h o " ( a
nhã seguinte — e t o d a s as santas manhãs — ao guiché a p r e n d i z a g e m n a própria produção) p o r é m , cada vez
d a e m p r e s a ) ; e a c r e s c e n t e m o s : indispensável p a r a a c r i a - m a i s , f o r a d a produção, através d o s i s t e m a escolar capi-
,ção e educação das crianças nas q u a i s o p r o l e t a r i a d o se t a l i s t a e de o u t r a s instâncias e instituições.
r e p r o d u z ( e m X u n i d a d e s : p o d e n d o X ser i g u a l a 0,1,2,
e t c . . . . ) c o m o força d o t r a b a l h o . O r a , o q u e se a p r e n d e na^escola?) É possível chegar-
se a u m p o n t o m a i s o u menos^^vánçado n o s e s t u d o s ,
L e m b r e m o s q u e esta q u a n t i d a d e de v a l o r ( o salá- p o r é m de q u a l q u e r m a n e i r a aprende-se a l e r , escrever,
r i o ) necessário p a r a a reprodução d a força de t r a b a l h o e c o n t a r , o u seja, a l g u m a s técnicas, e o u t r a s coisas t a m -
bém, i n c l u s i v e e l e m e n t o s ( q u e p o d e m ser r u d i m e n t a r e s
o u ao contrário a p r o f u n d a d o s ) de " c u l t u r a científica"
3 Marx elaborou o conceito científico desta noção: capital va-
riável. o u ''literária" d i r e t a m e n t e utilizáveis n o s d i f e r e n t e s pos-

56 .57
tos d a produção ( u m a instrução p a r a os operários, (os q u a d r o s ) , seja a de g r a n d e s sacerdotes d a i d e o l o g i a
u m a o u t r a p a r a os técnicos, u m a t e r c e i r a p a r a os enge- d o m i n a n t e (seus " f u n c i o n á r i o s " ) e t c . . .
n h e i r o s , u m a última p a r a os q u a d r o s s u p e r i o r e s , e t c . . . )
Aprende-se o " k n o w - h o w " . A reprodução d a força de t r a b a l h o e v i d e n c i a , c o m o A
condição sine quae non, não s o m e n t e a reprodução de /
P o r é m , ao m e s m o t e m p o , e j u n t o c o m essas téc- sua " q u a l i f i c a ç ã o " m a s também a reprodução de s u a l
n i c a s e c o n h e c i m e n t o s , aprendem-se n a escola as " r e - submissão à i d e o l o g i a d o m i n a n t e , o u d a " p r á t i c a " d e s t a \
g r a s " d o b o m c o m p o r t a m e n t o , i s t o é as conveniências i d e o l o g i a , d e v e n d o f i c a r c l a r o q u e não b a s t a d i z e r : " n ã o
que d e v e m ser observadas p o r t o d o agente d a divisão s o m e n t e m a s t a m b é m " , p o i s a reprodução d a q u a l i f i -
do t r a b a l h o c o n f o r m e o p o s t o q u e ele esteja " d e s t i n a d o " cação d a força de t r a b a l h o se assegura e m e s o b as
a o c u p a r ; as r e g r a s de m o r a l e de consciência cívica e f o r m a s de submissão ideológica.
p r o f i s s i o n a l , o q u e n a r e a l i d a d e são r e g r a s de r e s p e i t o
^ C o m o q u e r e c o n h e c e m o s a presença d e u m a n o v a
à divisão social-técnica d o t r a b a l h o e, e m d e f i n i t i v o , re-
r e a l i d a d e : a^ideçílggja.
gras d a o r d e m estabelecida p e l a dominação de classe.
Aprende-se também a " f a l a r b e m o i d i o m a " , a " r e d i g i r F a r e m o s a q u i , d u a s observações:
b e m " , o q u e n a v e r d a d e s i g n i f i c a ( p a r a os f u t u r o s capi-
t a l i s t a s e seus s e r v i d o r e s ) saber " d a r o r d e n s " , i s t o é, A p r i m e i r a servirá para completar nossa aná-
(solução i d e a l ) d i r i g i r - s e a d e q u a d a m e n t e aos operários l i s e d a reprodução.
etc...
A c a b a m o s de e s t u d a r r a p i d a m e n t e as f o r m a s d a
reprodução d a s forças p r o d u t i v a s , o u seja, d o s m e i o s
E n u n c i a n d o este f a t o n u m a l i n g u a g e m m a i s cien-
de produção p o r u m l a d o e d a força d e t r a b a l h o p o r
tífica, d i r e m o s q u e a _reprodução d a força de t r a b a l h o
outro.
não exige s o m e n t e umãTreprodução de sua qualificação
m a s ao m e s m o _ t e m p o u m a reprodução de s u a s u b m i s - P o r é m não a b o r d a m o s a i n d a a questão d a r e p r o -
<; são àsjnormas d a o r d e m vigenteTTstcT~é7'"unm_reprodu- dução das relações de produção. E s t e é u m p r o b l e m a
; çao d a submissão d o s operários à i d e o l o g i a d o m i n a n t e c r u c i a l d a t e o r i a m a r x i s t a d o m o d o de produção. Se o
p o r p a r t e d o s operários e u m a reprodução d a capaci- deixássemos n o silêncio cometeríamos u m a omissão
dade de p e r f e i t o domínio d a i d e o l o g i a d o m i n a n t e p o r teórica — p i o r , u n i grave e r r o político.
p a r t e dos agentes d a exploração e repressão, de m o d o
a q u e eles a s s e g u r e m também " p e l a p a l a v r a " o p r e d o - T r a t a r e m o s p o r t a n t o desta questão. M a s p a r a ob-
mínio d a classe d o m i n a n t e . t e r m o s os m e i o s de fazê-lo, t e m o s q u e n o v a m e n t e d a r
u m a grande volta.
E m o u t r a s p a l a v r a s , a escola ( m a s também o u t r a s
A s e g u n d a observação é q u e p a r a d a r esta v o l t a so-
instituições d o E s t a d o , c o m o a I g r e j a e o u t r o s apare-
m o s o b r i g a d o s a r e c o l o c a r nossa v e l h a questão: o q u e
l h o s c o m o o E x é r c i t o ) e n s i n a o " k n o w - h o w " m a s sob
é u m a sociedade?
f o r m a s q u e a s s e g u r a m a submissão à i d e o l o g i a d o m i -
n a n t e o u o domínio de s u a "prática". T o d o s os agentes
da produção, d a exploração e d a repressão, s e m f a l a r infra-estrutura e Superestrutura
dos " p r o f i s s i o n a i s d a i d e o l o g i a " ( M a r x ) d e v e m de u m a
f o r m a o u de o u t r a estar " i m b u í d o s " desta i d e o l o g i a Já t i v e m o s a o p o r t u n i d a d e de i n s i s t i r s o b r e o
4

p a r a d e s e m p e n h a r " c o n s c e n s i o s a m e n t e " suas t a r e f a s , caráter revolucionário d a concepção m a r x i s t a d o " t o d o


seja a de e x p l o r a d o s (os o p e r á r i o s ) , seja a de e x p l o r a -
dores ( c a p i t a l i s t a s ) , seja a de a u x i l i a r e s n a exploração 4 E m Pour Marx e Lire le Capital. Maspero, 1965.

58 59
d e n t e m e n t e afetados p o r d i f e r e n t e s índices de eficácia.
s o c i a l " , n a q u i l o e m q u e e l a se d i s t i n g u e d a " t o t a l i d a d e "
Q u e t i p o de índices?
h e g e l i a n a . D i s s e m o s , (e esta tese apenas r e p e t i a céle-
b r e s proposição d o m a t e r i a l i s m o histórico) q u e M a r x Pode-se d i z e r q u e os a n d a r e s d j ^ p j e r ^ s t r u t u r a não I
L

concebe a estrutura_de.„,toda...a sociedade c o m o c o n s t i - são d e t e r m i n a n t e s e m última instância, m a s q u e são ;


„tuida p o r " n í v e i s " o u "instâncias" a r t i c u l a d a s ] ^ r " ú m a ^ d e t e r m i n a d o s p e l a eficácia d a base; q u e se eles são a
determinação específica: aj n f r a - e s t r u t u r a o u base eco- seu m o d o ( a i n ^ ã ^ n ã õ ^ e l í m d o T d e t e r m i n a n t e s , apenas
jjômica-ilLunidade^ o são e n q u a n t o d e t e r m i n a d o s p e l a base.
pjodução.),,„e _a s u p e r e s t r u t u r a , jque_ c o m p r e e n d e ^ d o i s
" n í v e i s " o u " m s p a n ^ j ^ T aluríSjço-poíítíca ( o d i r e i t o e S e u índice de eficácia ( o u d e determinação), en-
ò^stssa"<3*T"è ' a J L ^ o j ó ^ c a (as d i s t i n t a s i d e o l o g i a s , r e l i - q u a n t o d e t e r m i n a d o p e l a determinação e m última ins-
giosa, m o r a l , jurídica, política, e t c . . . ) tância d a base, é p e n s a d o p e l a tradição m a r x i s t a sob ,•
d u a s f o r m a s : 1) a existência de u m a " a u t o n o m i a rela- /
A l é m de seu i n t e r e s s e teórico-pedagógico ( q u e a p o n -
t i v a " d a s u p e r e s t r u t u r a e m relação à base; 2 ) a exis-
t a a diferença e n t r e M a r x e H e g e l ) , esta representação
tência de u m a "ação de r e t o r n o " d a s u p e r e s t r u t u r a - s o - '
oferece a s e g u i n t e v a n t a g e m teórica f u n d a m e n t a l : e l a per-
b r e a base.
m i t e i n s c r e v e r n o q u a d r o teórico de seus c o n c e i t o s es-
senciais o q u e d e n o m i n a m o s seu índice de eficácia res-
P o d e m o s então a f i r m a r q u e a g r a n d e v a n t a g e m
pectivo. O q u e se e n t e n d e p o r isto? '
teórico d o tipó d e eficácia " d e r i v a d a " próprio à superes-
Q u a l q u e r u m p o d e f a c i l m e n t e p e r c e b e r q u e a re- fício (base e s u p e r e s t r u t u r a ) consiste e m m o s t r a r ao
presentação d a e s t r u t u r a de t o d a a sociedade c o m o u m m e s m o t e m p o q u e as questões de determinação ( o u de
edifício c o m p o s t o p o r u m a base ( i n f r a - e s t r u t u r a ) s o b r e índice de eficácia) são f u n d a m e n t a i s ; e q u e é a base
a q u a l erguem-se os d o i s " a n d a r e s " d a s u p e r e s t r u t u r a q u e d e t e r m i n a e m última instância t o d o o edifício; c o m o
c o n s t i t u i u m a metáfora, m a i s p r e c i s a m e n t e , u m a metá- consequência s o m o s o b r i g a d o s a c o l o c a r o p r o b l e m a
f o r a e s p a c i a l : u m tópico. C o m o t o d a metáfora, esta
8
teórico d o t i p o de eficácia " d e r i v a d a " próprio à superes-
sugere, faz v e r a l g u m a coisa. O que? J u s t a m e n t e i s t o : t r u t u r a , i s t o é, s o m o s o b r i g a d o s a p e n s a r n o q u e a t r a -
^ á q u e os a n d a r e s s u p e r i o r e s não p o r f e r i a m " s n s t e n t a r - s q " dição m a r x i s t a designa pelos t e r m o s c o n j u n t o s de a u t o -
U n o a r ) p o r s i sós se não s e . a p o i a s s e m s o b r e _ s u a - b a s e . n o m i a r e l a t i v a d a s u p e r e s t r u t u r a e de "ação de r e t o r -
n o " d a s u p e r e s t r u t u r a s o b r e a base.
< \jp A - m e t á f o r a d o edifício t e m então c o m o o b j e t i v o
^ p r i m e i r o r e p r e s e n t a r a "determinação e m última ins- O m a i o r i n c o n v e n i e n t e desta representação d a es-
tância" p e l a base económica. E s t a metáfora espacial t r u t u r a de t o d a a sociedade p e l a metáfora espacial d o
t e m então c o m o r e s u l t a d o d o t a r a base de u m índice edifício está e v i d e n t e m e n t e n o f a t o de ser ela metafó-
de eficácia c o n h e c i d o n o s célebres t e r m o s : d e t e r m i n a - r i c a : i s t o é, àe p e r m a n e c e r d e s c r i t i v a .
ção e m última instância d o q u e o c o r r e n o s " a n d a r e s "
d a s u p e r e s t r u t u r a p e l o q u e o c o r r e n a base económica. Parece-nos desejável e possível r e p r e s e n t a r as coi-
sas de o u t r a m a n e i r a .
A p a r t i r deste índice de eficácia " e m última instân-
c i a " , os " a n d a r e s " d a s u p e r e s t r u t u r a e n c o n t r a m - s e evi- Que sejamos b e m e n t e n d i d o s : não r e c u s a m o s e m
a b s o l u t o a metáfora clássica, já q u e ela m e s m a n o s
5 Tópico, do grego topos: local. U m tópico representa, n u m o b r i g a a superá-la. E não a s u p e r a r e m o s afastando-a
espaço definido, os locais respectivos ocupados por esta ou aque- c o m o caduca. P r e t e n d e m o s s i m p l e s m e n t e p e n s a r o q u e
la realidade: desta maneira o económico está embaixo (a base) ela n o s dá s o b a f o r m a de u m a descrição.
c a superestrutura e m cima.

60 61
Pensamos q u e é a p a r t i r d a reprodução q u e é pos-,, a c o n t e c i m e n t o s " ; e, a c i m a deste c o n j u n t o , o Chefe de
sível e necessário p e n s a r o q u e c a r a c t e r i z a o essencial E s t a d o , o G o v e r n o e a Administração.
d a existência e n a t u r e z a d a s u p e r e s t r u t u r a . B a s t a colo-
car-se n o p o n t o de v i s t a d a reprodução p a r a q u e se es- A p r e s e n t a d a desta f o r m a , a " t e o r i a m a r x i s t a - l e n i -
clareçam m u i t a s questões q u e a metáfora espacial d o n i s t a " d o E s t a d o t o c a o essencial, e não se t r a t a p o r
edifício i n d i c a v a a existência s e m dar-lhes r e s p o s t a c o n - n e n h u m m o m e n t o de d u v i d a r q u e está aí o essencial. O
ceituai. _ - — ' a p a r e l h o de E s t a d o q u e d e f i n e o E s t a d o c o m o força
de execução-e de intervenção r e p r e s s i v a '^servi"çõ~das
S u s t e n t a m o s c o m o tese f u n d a m e n t a l que s o m e n t e classes d o m i n a n t e s " , n a l u t a de classes dá b u r g u e s i a e p ^ " '
é possível l e v a n t a r estas questões (e p o r t a n t o r e s p o n - seus a l i a d o s c o n t r a o p r o l e t a r i a d o é o E s t a d o , e d e f i n e
dê-las) a partir do pontq^dejoista da reprodução. perfeitamente a sua "função" f u n d a m e n t a l .

Analisaremos brevemente o Direito, o Estado e a


i d e o l o g i a a p a r t i r deste p o n t o de v i s t a . E m o s t r a r e m o s Da Teoria Descritiva à Teoria Propriamente^Dita
ao m e s m o t e m p o o q u e o c o r r e a p a r t i r d o p o n t o d e
v i s t a d a prática e d a produção p o r u m l a d o , e d a r e p r o - N o e n t a n t o , c o m o o a s s i n a l a m o s n a metáfora d ó
dução p o r o u t r o . edifício ( i n f r a - e s t r u t u r a e s u p e r e s t r u t u r a ) t a m b é m esta
apresentação d a n a t u r e z a d o E s t a d o p e r m a n e c e d e s c r i -
tiva em parte.
O Estado
C o m o u s a r e m o s c o n s t a n t e m e n t e este a d j e t i v o (des-
/ A tradição m a r x i s t a é f o r m a l : desde o Manifesto e c r i t i v o ) torna-se necessária u m a explicação q u e e l i m i n e
|/ d o 18. Brumário (e e m t o d o s os t e x t o s clássicos poste- q u a l q u e r equívoco.
r i o r e s , s o b r e t u d o n o de M a r x s o b r e a Comuna de Paris
e n o de Lênin s o b r e o Estado e a Revolução), o Estado Q u a n d o , ao f a l a r m o s d a metáfora d o edifício o u d a
A^explicitamente„ concebido^ c o m o u m a p a r e l h o repres- t e o r i a m a r x i s t a d o E s t a d o d i z e m o s q u e são concepções
) s i y o . o E s t a d o é u m a " m á q u i n a " de repressão q u e per-
yX> o u representações d e s c r i t i v a s d e seu o b j e t o , não escon-
m i t e às classes d o m i n a n t e s ( n o século X I X à classe d e m o s n e n h u m a s e g u n d a intenção crítica. Pelo contrá-
b u r g u e s a e à " c l a s s e " dos g r a n d e s latifundiários) asse- r i o , t u d o leva a c r e r q u e os g r a n d e s d e s c o b r i m e n t o s
g u r a r a s u a dominação s o b r e a classe operária, p a r a científicos não p o d e m d e i x a r de p a s s a r p e l a e t a p a q u e
submetê-la ao processo de extorsão d a m a i s - v a l i a ( q u e r chamamos u m a " t e o r i a " descritiva. E s t a seria a p r i -
dizer, à exploração c a p i t a l i s t a ) . m e i r a etapa de t o d a t e o r i a , ao m e n o s n o c a m p o d a ciên-
c i a das formações sociais. C o m o t a l , poder-se-ia, — e n o
O E s t a d o é, antes de m a i s n a d a , o q u e os clássicos nosso e n t e n d e r deve-se — e n c a r a r esta e t a p a c o m o t r a n -
do m a r x i s m o c h a m a r a m de ojiparelho de. Estado. Este sitória e necessária ao d e s e n v o l v i m e n t o d a t e o r i a . A nos-
t e r m o c o m p r e e n d e : não s o m e n t e o a p a r e l h o especiali- sa expressão: " t e o r i a d e s c r i t i v a " a p o n t a este caráter
zado ( n o s e n t i d o e s t r i t o ) , c u j a existência e necessidade transitório ao m o s t r a r , p e l a conjunção d o s t e r m o s em-
^ r e c o n h e c e m o s pelas exigências d a prática jurídica, a sa- p r e g a d o s , o e q u i v a l e n t e a u m a espécie de " c o n t r a d i ç ã o " .
""^"ber: a política — os t r i b u n a i s — e as prisões; m a s t a m - C o m efeito, o t e r m o t e o r i a choca-se e m p a r t e c o m o ad-
bém o exército, q u e intervém d i r e t a m e n t e c o m o força j e t i v o " d e s c r i t i v a " q u e o a c o m p a n h a . I s s o s i g n i f i c a exa-
r e p r e s s i v a de a p o i o e m última instância ( o p r o l e t a r i a d o t a m e n t e : 1) q u e a " t e o r i a d e s c r i t i v a " é, s e m dúvida al-
p a g o u c o m seu sangue esta experiência) q u a n d o a po- g u m a , o começo s e m r e t o r n o d a t e o r i a , p o r é m , 2) q u e
lícia e seus órgãos a u x i l i a r e s são " u l t r a p a s s a d o s p e l o s a f o r m a " d e s c r i t i v a " e m q u e se a p r e s e n t a a t e o r i a exige,

62 63
p r e f e i t o ! " E _ a acumulação de f a t o s , à definição d o ,
8

p e l o efeito m e s m o desta "contradição", u m desenvolvi- E s t a d o , a i n d a q u e m u l t i p l i q u e s u a ilustração, não f a z


m e n t o da t e o r i a que supere a f o r m a da "descrição". c o m q u e esta definição avance, não p e r m i t e r e a l m e n t e
o avanço d a t e o r i a científica d o E s t a d o . T o d a t e o r i a des-
P r e c i s e m o s nosso p e n s a m e n t o v o l t a n d o ao nosso
objeto presente: o Estado. c r i t i v a c o r r e o r i s c o de " b l o q u e a r " o d e s e n v o l v i m e n t o
indispensável d a t e o r i a .
Quando dizemos que a " t e o r i a " m a r x i s t a do Estado
Po r isso a c r e d i t a m o s q u e , p a r a desenvolver a teo-
que u t i l i z a m o s é p a r c i a l m e n t e " d e s c r i t i v a " , isto significa
r i a d e s c r i t i v a e m t e o r i a p r o p r i a m e n t e d i t a , i s t o é, p a r a
e m p r i m e i r o l u g a r e antes d e m a i s n a d a q u e esta " t e o -
m e l h o r c o m p r e e n d e r os m e c a n i s m o s d o E s t a d o e m seu
r i a " d e s c r i t i v a é, s e m dúvida a l g u m a , o início d a t e o r i a
f u n c i o n a m e n t o , é indispensável acrescentar algo à defi-
m a r x i s t a d o E s t a d o , e q u e t a l início n o s f o r n e c e o es-
nição clássica d o E s t a d o c o m o a p a r e l h o de E s t a d o .
sencial i s t o é, o princípio decisivo de t o d o desenvolvi-
mento posterior da teoria.
O essencial da teoria marxista do Estado
D i r e m o s , c o m efeito, q u e a t e o r i a d e s c r i t i v a do Es-
t a d o é j u s t a u m a vez q u e a definição d a d a p o r e l a de
Precisemos inicialmente u m p o n t o i m p o r t a n t e : O x
seu o b j e t o p o d e p e r f e i t a m e n t e c o r r e s p o n d e r à i m e n s a
E s t a d o (e s u a existência e m seu a p a r e l h o ) s ^ t e m s e n - ^
m a i o r a d o s f a t o s observáveis n o domínio q u e l h e con-
t i d o e m função d o poder de Estado. T o d a l u t a política
c e r n e . A s s i m , a definição de E s t a d o c o m o E s t a d o de
das classes g i r a é m t o r n o d o E s t a d o . E n t e n d a m o s : e m
classe, e x i s t e n t e n o a p a r e l h o r e p r e s s i v o d e E s t a d o , elu-
c i d a de m a n e i r a f u l g u r a n t e t o d o s os f a t o s observáveis t o r n o d a posse, i s t o é, d a t o m a d a e manutenção d o po-
n o s d i f e r e n t e s níveis d a repressão, q u a l q u e r q u e seja d e r d e E s t a d o p o r u m a c e r t a classe o u p o r u m a aliança
o seu domínio: desde os massacres d e j u n h o d e 1848 e de classes o u frações de classes. E s t a p r i m e i r a obser-
d a C o m u n a de P a r i s , d o d o m i n g o s a n g r e n t o de m a i o de vação n o s o b r i g a a d i s t i n g u i r p _ p o d e r d e _ E ^ t a d o _ ( m a n u -
1905 e m P e t r o g r a d o , d a Resistência, de C h a r o n n e , e t c . . . tenção o u t o m a d a d o p o d e r de E s t a d o ) , o b j e t i v o d a l u t a
até as m a i s s i m p l e s (e r e l a t i v a m e n t e anódinas) i n t e r - d e classes política de u m l a d o , d o a p a r e l h o de E s t a d o
venções de u m a " c e n s u r a " q u e proíbe a Religiosa de de o u t r o .
D i d e r o t o u u m a o b r a de G a t t i s o b r e F r a n c o ; e l u c i d a
S a b e m o s q u e o a p a r e l h o de E s t a d o p o d e p e r m a n e -
t o d a s as f o r m a s d i r e t a s o u i n d i r e t a s de exploração e
cer de pé, c o m o o d e m o n s t r a m as " r e v o l u ç õ e s " b u r g u e -
extermínio d a s massas p o p u l a r e s (as g u e r r a s i m p e r i a -
sas d o século X I X n a França (1830, 1848), os g o l p e s
l i s t a s ) ; e l u c i d a a sútil dominação c o t i d i a n a aonde se
e v i d e n c i a ( n a s f o r m a s d a d e m o c r a c i a política, p o r exem- de estado ( 2 d e d e z e m b r o de 1851, m a i o de 1958), as
p l o ) o q u e Lênin c h a m o u d e p o i s de M a r x de d i t a d u r a comoções de estado ( q u e d a d o I m p é r i o e m 1870, q u e d a
da burguesia. d a I I I República e m 1940), a ascensão política d a pe-
q u e n a b u r g u e s i a (1890-1895 n a F r a n ç a ) , etc, s e m ser
a f e t a d o o u m o d i f i c a d o ; p o d e p e r m a n e c e r d e p é s o b acon-
E n t r e t a n t o , a t e o r i a d e s c r i t i v a d o E s t a d o represen-
t a u m a e t a p a d a constituição d a t e o r i a , q u e exige ela t e c i m e n t o s políticos q u e a f e t e m a p o s s e d o p o d e r d e
m e s m a a " s u p e r a ç ã o " desta etapa. P o r t a n t o está c l a r o Estado.
q u e se a definição e m questão n o s f o r n e c e os m e i o s M e s m o d e p o i s d e u m a revolução s o c i a l c o m o a d e
p a r a i d e n t i f i c a r e r e c o n h e c e r os f a t o s o p r e s s i v o s e a r t i - 1917, g r a n d e p a r t e d o a p a r e l h o d e E s t a d o p e r m a n e c i a
culá-los c o m o E s t a d o c o n c e b i d o c o m o a p a r e l h o repres-
s i v o de E s t a d o , esta "articulação" dá l u g a r a u m t i p o
de evidência m u i t o especial, a q u e t e r e m o s o p o r t u n i - 6 V e r mais adiante: Acerca da ideologia.
dade de n o s r e f e r i r m a i s a d i a n t e : " S i m , é a s s i m , está
65
64
de pé q u a n d o d a t o m a d a do p o d e r p e l a aliança d o p r o - t o s i m p l i c a m . C o m efeito, suas experiências e p r o c e d i -
l e t a r i a d o e d o c a m p e s i n a t o p o b r e : Lênin o r e p e t i u inú- m e n t o s p e r m a n e c e r a m s o b r e t u d o n o c a m p o da"prática
m e r a s vezes. política. -

Pode-se dizer q u e esta distinção e n t r e p o d e r de Es- N a v e r d a d e , os clássicos d o m a r x i s m o , e m s u a prá-


t a d o e a p a r e l h o de E s t a d o faz p a r t e d a " t e o r i a m a r x i s - t i c a política, t r a t a r a m d o E s t a d o c o m o u m a r e a l i d a d e
t a " d o E s t a d o de m a n e i r a explícita depois d o 18 B r u - m a i s c o m p l e x a d o q u e a d a definição d a " t e o r i a m a r -
mário e das l u t a s de classes n a França, de M a r x . x i s t a d o E s t a d o " , m e s m o c o m p l e t a d o c o m o acabamos-
de fazer. E l e s p e r c e b e r a m esta c o m p l e x i d a d e e m s u a
R e s u m i n d o este aspecto d a " t e o r i a m a r x i s t a d o Es- prática, p o r é m não a e x p r i m i r a m n u m a t e o r i a c o r r e s -
t a d o " , p o d e m o s d i z e r q u e os clássicos d o m a r x i s m o pondente. 7 \
s e m p r e a f i r m a r a m q u e : 1) o E s t a d o é o a p a r e l h o repres-
s i v o d o E s t a d o ; 2) deve-se d i s t i n g u i r o p o d e r de estado Gostaríamos de esboçar m u i t o e s q u e m a t i c a m e n t e
do a p a r e l h o de E s t a d o ; 3) o o b j e t i v o d a l u t a de classes essa t e o r i a c o r r e s p o n d e n t e . C o m este o b j e t i v o p r o p o -
d i z r e s p e i t o ao p o d e r de E s t a d o e c o n s e q u e n t e m e n t e à m o s a s e g u i n t e tese:
\o d o a p a r e l h o de E s t a d o pelas classes ( o u alian-
P a r a fazer avançar a t e o r i a d c r E s t a d o é i n d i s p e n - .
j ças de classes o u frações de classes) q u e detêm o p o d e r
sável t e r e m c o n t a não s o m e n t e a distinção e n t r e poder
; de E s t a d o e m função de seus o b j e t i v o s de classe e 4) o
de Estado e aparelho de Estado, m a s também o u t r a
/ p r o l e t a r i a d o deve t o m a r o p o d e r d o E s t a d o p a r a des-
r e a l i d a d e q u e se m a n i f e s t a j u n t o ao a p a r e l h o ( r e p r e s -
\r o a p a r e l h o burguês e x i s t e n t e , substituí-lo e m u m a
s i v o ) d o E s t a d o , m a s q u e não se c o n f u n d e c o m ele.
; p r i m e i r a etapa p o r u m a p a r e l h o de E s t a d o c o m p l e t a -
C h a m a r e m o s esta r e a l i d a d e p e l o s e u c o n c e i t o : os apa-
/ m e n t e d i f e r e n t e , proletário, e e l a b o r a r nas etapas pos-
relhos ideológicos do Estado. -
/ t e r i o r e s u m processo r a d i c a l , o d a destruição d o E s t a d o
\ ^ ( f i m d o p o d e r d o E s t a d o e de t o d o a p a r e l h o de E s t a d o ) .
O que são os Aparelhos Ideológicos do Estado (AIE)?
A s s i m , deste p o n t o de v i s t a , o q u e p r o p o r i a q u e se
acrescente à " t e o r i a m a r x i s t a " d o E s t a d o já está con- ^ E l e s não se c o n f u n d e m c o m o a p a r e l h o ( r e p r e s s i v o )
t i d o n e l a c o m todas as l e t r a s . P o r é m parece-nos que d o E s t a d o . L e m b r e m o s q u e , n a t e o r i a m a r x i s t a , o apa-
esta t e o r i a c o m p l e t a d a desta f o r m a p e r m a n e c e a i n d a r e l h o de E s t a d o ( A E ) c o m p r e e n d e : o ^ g o v e r n o , a a d m i - " ]
e m p a r t e d e s c r i t i v a , se b e m q u e já c o n t e n h a e l e m e n t o s nistração, o exército, a polícia, os t r i b u n a i s , as prisões, >
complexos e diferenciados cujas regras e funcionamen- etc, q u e c o n s t i t u e m o q u e c h a m a r e m o s a p a r t i r de ago- )
t o não p o d e m ser c o m p r e e n d i d o s s e m o r e c u r s o a u m r a de a p a r e l h o r e p r e s s i v o d o E s t a d o . R e p r e s s i v o i n d i c a
a p r o f u n d a m e n t o teórico s u p l e m e n t a r . \L. q u e o a p a r e l h o ^e Esladó~ém~qúestão~"funciona através
_

d a violência" — ao m e n o s e m situações l i m i t e s ( p o i s
O s Aparelhos Ideológicos do Estado
—-{l>7 Ao que saibamos, G r a m s c i é o único que avançou no caminho
O que deve ser acrescentado à " t e o r i a m a r x i s t a " d o que retomamos. E l e teve a ideia "singular" de que o E s t a d o não
E s t a d o é, então, o u t r a coisa. se reduzia ao aparelho (repressivo) de E s t a d o , mas compreen-
dia, como dizia, u m certo número de instituições da "sociedade
Devemos avançar c o m prudência n u m c a m p o e m civil": a Igreja, as Escolas, os sindicatos etc. Infelizmente
G r a m s c i não sistematizou suas intuições, j r u e j t e r m a n e c e x a m l n o "
que os clássicos d o m a r x i s m o n o s p r e c e d e r a m há m u i t o , estado de anotações argutas rrias parciais (cf. G r a m s c i : Oeuvres
m a s s e m t e r s i s t e m a t i z a d o sob u m a f o r m a teórica os Choisies, E d Sociales, pp. 290, 291 (Nota 3), 293, 295, 436. Cf.
avanços decisivos q u e suas experiências e p r o c e d i m e n - Lettres de la Prison, E d Sociales, p. 313).

66 67
a repressão a d m i n i s t r a t i v a , p o r e x e m p l o , p o d e rev.-;stir- N u m p r i m e i r o m o m e n t o p o d e m o s o b s e r v a r q u e se
se de f o r m a s não^físicas). e^stej^m^paxéYho ( r e p r e s s i v o ) d o E s t a d o , existe uma,
D e s i g n a m o s p e l o n o m e de_aparelhos_ideológicos d o plurálidadè~3e A p a r e l h o s ^Ideológicos d o E s t a d o . Su-
•"Estado U m Certo nÚmfíT" rte.-rpalUifl.rte.»; q u e ppi-PRpn- p o n d o a s u a existência, 1 T u n i d a d e q u e c o n s t i t u i esta
rEãrnJiTão o b s ^ r s a d D r i m e d i a t o s o b a f o r m a d e i n s t i t u i - p l u r a l i d a d e de A I E não é i m e d i a t a m e n t e visível.
ç õ e s d i s t i n t a s e especializadas. P r o p o m o s u m a l i s t a em- ' N u m segundo m o m e n t o , p o d e m o s c o n s t a t a r q u e
-píricã, q u e dèverá'~Tiecessariamente ser e x a m i n a d a e m enquanto que o Aparelho (repressivo) do Estado, uni-
detalhe, p o s t a à p r o v a , r e t i f i c a d a e r e m a n e j a d a . C o m f i c a d o , p e r t e n c e i n t e i r a m e n t e ao domínio público, a
todas as reservas q u e esta exigência a c a r r e t a p o d e m o s , m a i o r p a r t e d o s A p a r e l h o s Ideológicos d o E s t a d o ( e m
p e l o m o m e n t o , c o n s i d e r a r c o m o a p a r e l h o s ideológicos sua a p a r e n t e dispersão) r e m e t e ao domínio p r i v a d o . A s
do E s t a d o as seguintes instituições ( a o r d e m de enu- I g r e j a s , os P a r t i d o s , os S i n d i c a t o s , as famílias, algu-
meração não t e m n e n h u m s i g n i f i c a d o e s p e c i a l ) : m a s escolas, a m a i o r i a dos j o r n a i s , as empresas cultu-
r a i s etc, etc, são p r i v a d a s .
A I E religiosos ( o s i s t e m a das d i f e r e n t e s Igrejas)
D e i x e m o s de l a d o , pelo m o m e n t o , nossa p r i m e i r a
A I E escolar ( o s i s t e m a das d i f e r e n t e s " e s c o l a s " pú- observação. M a s d e t e n h a m o - n o s n a segunda, indagan-
blicas e privadas) do e m n o m e de q u e p o d e m o s c o n s i d e r a r c o m o Apare-
l h o s Ideológicos rio Estado instituições q u e , e m s u a
A I E familiar 8 m a i o r i a , não-_possuem e s t a t u t o público, e q u e são s i m -
plesmr^Hfé^lnslr^iições p r i v a d a s . C o m o m a r x i s t a cons-^
A I E jurídico* cientá,/GràmsciTj^, r ^ s p o n d e r a ^ e s t a _ ^ j e ç a õ . T A ^distin-
ção e n t r e o púKicc "é o p r i v a d o é~úmã~dístinção intrín-
r

A I E político ( o s i s t e m a político, os d i f e r e n t e s Par- seca ao-dk-eíto burguês, e válida n o s domínios ( s u b o r -


tidos) -• d i n a d o s ) aonde o d i r e i t o burguês exerce seus "pode-
r e s " . O domínio d o E s t a d o l h e escapa, p o i s este está
A I E sindical " a l é m d o D i r e i t o " : o E s t a d o , q u e é p E s t a d o da classe
d o m i n a n t e , não é n e m público n e m p r i v a d o , ele é ao
A I E de informação ( a i m p r e n s a , o rádio, a televi- contrário a condição de t o d a distinção e n t r e o público e
são, etc...) o p r i v a d o . D i g a m o s a m e s m a coisa p a r t i n d o d o s nossos
A p a r e l h o s Ideológicos d o E s t a d o . P o u c o i m p o r t a se as
A I E c u l t u r a l ( L e t r a s , Belas A r t e s , esportes, e t c . ,.) instituições q u e os c o n s t i t u e m s e j a m "públicas" o u " p r i -
v a d a s " . O q u e i m p o r t a é o seu f u n c i o n a m e n t o . I n s t i t u i -
N ó s a f i r m a m o s : os A I E não se c o n f u n d e m c o m o ções p r i v a d a s p o d e m p e r f e i t a m e n t e " f u n c i o n a r " c o m o
A p a r e l h o ( r e p r e s s i v o ) d e E s t a d o . E m q u e consiste a A p a r e l h o s Ideológicos d o E s t a d o . S e r i a s u f i c i e n t e u m a
diferença? análise u m p o u c o m a i s p r o f u n d a de q u a l q u e r d o s A I E
p a r a mostrá-lo.

8 A família desempenha claramente outras "funções" que a de I / M a s v a m o s ao essencial. O q u e d i s t i n g u e os A I E


A I E . E l a intervém n a reprodução da força de trabalho. E l a é, j d o A p a r e l h o ( r e p r e s s i v o ) d o E s t a d o , é a seguinte dife-
dependendo dos modos de produção, unidade de produção e (ou) ' rença f u n d a m e n t a l : o A p a r e l h o r e p r e s s i v o d o E s t a d o
unidade de consumo.
1 " f u n c i o n a através dá violência" ao passo q u e os Apa-
9 O " D i r e i t o " pertence ao mesmo tempo ao Aparelho (repressi- r e l h o s Ideológicos d o E s t a d o " f u n c i o n a m através da
vo) do E s t a d o e ao sistema dos A I E . ideologia".

68 69
é este f u n c i o n a m e n t o m e s m o , n a m e d i d a e m q u e a
P o d e m o s p r e c i s a r , r e t i f i c a n d o esta distinção . [ p i r e -
i d e o l o g i a , n a q u a l f u n c i o n a m , está de f a t o s e m p r e u n i -
m o s , c o m efeito, q u e t o d o A p a r e l h o d o E s t a d o , seja ele
f i c a d a , apesar d a s u a d i v e r s i d a d e e contradições, s o b
r e p r e s s i v o o u ideológico, " f t m c i q n a " t a n t o através da
a i d e o l o g i a d o m i n a n t e , q u e é a i d e o l o g i a d a "classe
violência c o m o através d a i d e o l o g i a , m a s c o m u m a dife-
d o m i n a n t e " . Se c o n s i d e r a m o s q u e p o r princípio a "clas-
rença m u i t o i m p o r t a n t e , q u e i m p e d e q u e se c o n f u n d a m ;
se d o m i n a n t e " / detém o p o d e r d o E s t a d o ( d e f o r m a
os A p a r e l h o s Ideológicos d o E s t a d o c o m o A p a r e l h o
c l a r a o u , m a i s f r e q u e n t e m e n t e p o r alianças d e classes
( r e p r e s s i v o ) d o Estadój]
o u de frações de classes) e q u e dispõe p o r t a n t o d o
O aparelho (repressivo) do Estado funciona predo- Aparelho (repressivo) do Estado, podemos a d m i t i r que
1 m i n a n t e m e n t e através d a repressão ( i n c l u s i v e a física) a m e s m a classe d o m i n a n t e seja a t i v a n o s A p a r e l h o s
e s e c u n d a r i a m e n t e através d a i d e o l o g i a . ( N ã o existe Ideológicos d o E s t a d o . B e m e n t e n d i d o , a g i r p o r leis e
a p a r e l h o u n i c a m e n t e r e p r e s s i v o ) . E x e m p l o s : o Exército decretos n o A p a r e l h o ( r e p r e s s i v o ) d o E s t a d o é o u t r a
e a Polícia f u n c i o n a m também através de i d e o l o g i a , coisa q u e a g i r através d a i d e o l o g i a d o m i n a n t e n o s
t a n t o p a r a g a r a n t i r s u a própria coesão e reprodução, A p a r e l h o s Ideológicos d o E s t a d o . S e r i a p r e c i s o d e t a l h a r
c o m o p a r a d i v u l g a r os " v a l o r e s " p o r eles p r o p o s t o s . . esta diferença, — q u e n o e n t a n t o não deve e n c o b r i r a
r e a l i d a d e de u m a p r o f u n d a i d e n t i d a d e . A o q u e sabemos, ^
D a m e s m a f o r m a , m a s i n v e r s a m e n t e , d e v e m o s dizer nenhuma classe pode, de forma duradoura, deter o po-
* q u e os A p a r e l h o s Ideológicos d o E s t a d o f u n c i o n a m p r i n - der do Estado sem exercer ao mesmo tempo sua hege-
c i p a l m e n t e através d a i d e o l o g i a , e s e c u n d a r i a m e n t e monia sobre e nos Aparelhos Ideoló^icos^ão_^staãó.
através d a repressão seja ela b a s t a n t e a t e n u a d a , dissi- C i t o apenas u m e x e m p l o e p r o v a : a l a n c i n a n t e p r e o -
m u l a d a , o u m e s m o simbólica. ( N ã o existe a p a r e l h o p u - cupação de Lênin e m r e v o l u c i o n a r o A p a r e l h o ideológico
r a m e n t e i d e o l ó g i c o ) . D e s t a f o r m a , a E s c o l a , as I g r e j a s de E s t a d o escolar ( e n t r e o u t r o s ) p a r a p e r m i t i r ao p r o -
" m o l d a m " p o r .métodos próprios de sanções, exclusões, l e t a r i a d o soviético, q u e se a p r o p r i a r a d o p o d e r d o
seleção etc... não apenas seus funcionários m a s t a m - E s t a d o , g a r a n t i r n a d a m a i s n a d a m e n o s d o q u e o pró-
bém suas ovelhas. E a s s i m a Família... A s s i m o Apa- p r i o f u t u r o da d i t a d u r a d o p r o l e t a r i a d o e a passagem
r e l h o I E c u l t u r a l (a c e n s u r a , p a r a m e n c i o n a r apenas para o socialismo. 1 0

e l a ) etc.
E s t a última observação n o s p e r m i t e c o m p r e e n d e r
Será p r e c i s o d i z e r q u e esta determinação d o d u p l o
q u e os A p a r e l h o s ideológicos d o E s t a d o p o d e m não
" f u j i c i o j i a m e n t o l ' ( d e f o r m a p r i n c i p a l , de f o r m a secun-
apenas ser os m e i o s m a s também o l u g a r d a l u t a de
dária) através d a repressão o u através d a i d e o l o g i a , se-
classes, e f r e q u e n t e m e n t e de f o r m a s encarniçadas d a
g u n d o a q u a l trata-se o u d o A p a r e l h o ( r e p r e s s i v o ) d o
l u t a de classes. A classe ( o u aliança de classes) n o
E s t a d o o u dos A p a r e l h o s Ideológicos d o E s t a d o , per-
p o d e r não d i t a tão f a c i l m e n t e a l e i n o s A I E c o m o n o
m i t e c o m p r e e n d e r que c o n s t a n t e m e n t e tecem-se s u t i s
a p a r e l h o ( r e p r e s s i v o ) d o E s t a d o , não s o m e n t e p o r q u e
combinações tácitas o u explícitas e n t r e o j o g o d o Apa-
as a n t i g a s classes d o m i n a n t e s p o d e m c o n s e r v a r d u r a n t e
r e l h o ( r e p r e s s i v o ) d o E s t a d o e o j o g o dos A p a r e l h o s
m u i t o t e m p o f o r t e s posições naqueles, m a s p o r q u e a
Ideológicos d o E s t a d o ? A v i d a c o t i d i a n a oferece-nos
resistência das classes e x p l o r a d a s p o d e e n c o n t r a r o m e i o
inúmeros e x e m p l o s , que t o d a v i a d e v e m o s e s t u d a r de-
e a ocasião d e expressar-se neles, u t i l i z a n d o as c o n t r a -
t a l h a d a m e n t e p a r a s u p e r a r m o s esta s i m p l e s observação.

E s t a observação nos p o s s i b i l i t a c o m p r e e n d e r o que


c o n s t i t u i a u n i d a d e do c o r p o a p a r e n t e m e n t e d i s p e r s o io E m u m texto patético, datado de 1937, K r u p s k a i a relata os
dos A I E . Se os A I E " f u n c i o n a m " p r e d o m i n a n t e m e n t e esforços desesperados de Lênin, e o que ela via como o seu
fracasso ("Le chemin parcouru).
através da i d e o l o g i a , o que . u n i f i c a a sua d i v e r s i d a d e

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dições existentes o u c o n q u i s t a n d o p e l a l u t a posições de E s t a d o , q u e não f u n c i o n a m através d a repressão, m a s
combate 10 B L S . da ideologia?

C o n c l u a m o s nossas observações.
Sobre a reprodução das relações de produção];
Se a tese que p r o p u s e m o s t e m f u n d a m e n t o , v o l t a -
m o s , p r e c i s a n d o - a q u a n t o a u m a questão, à t e o r i a m a r - P o d e m o s então r e s p o n d e r à nossa questão c e n t r a l ,
x i s t a clássica do E s t a d o . D i r e m o s q u e p o r u m l a d o é m a n t i d a e m suspenso p o r t a n t o t e m p o : c o m o é asse-
p r e c i s o d i s t i n g u i r o p o d e r d o E s t a d o ( s u a detenção g u r a d a a reprodução das relações de produção?
p o r . . . ) e p o r o u t r o o A p a r e l h o de E s t a d o . M a s acres-
c e n t a m o s q u e o A p a r e l h o de E s t a d o c o m p r e e n d e d o i s N a l i n g u a g e m metafórica d o tópico ( I n f r a - e s t r u t u r a ,
c o r p o s : o c o r p o das instituições q u e c o n s t i t u e m o apa- S u p e r e s t r u t u r a ) d i r e m o s : ela é, e m g r a n d e p a r t e , 1 1

r e l h o r e p r e s s i v o d o E s t a d a , e o c o r p o de instituições assegurada p e l a s u p e r e s t r u t u r a jurídico-política e ideo-


q u e r e p r e s e n t a m o c o r p o dos A p a r e l h o s Ideológicos do lógica.
Estado.
P o r é m , u m a vez q u e j u l g a m o s indispensável u l t r a -
M a s , se é a s s i m , não p o d e m o s d e i x a r de c o l o c a r a passar esta l i n g u a g e m a i n d a d e s c r i t i v a , d i r e m o s : ela é,
s e g u i n t e questão, m e s m o n o estado b a s t a n t e sumário e m g r a n d e p a r t e , assegurada p e l o exercício d o p o d e r
11

de nossas indicações: q u a l é e x a t a m e n t e o p a p e l dos do E s t a d o nos A p a r e l h o s de E s t a d o , o A p a r e l h o (re-


A p a r e l h o s Ideológicos d o E s t a d o ? q u a l é o f u n d a m e n t o p r e s s i v o ) do E s t a d o , p o r u m l a d o , e os A p a r e l h o s Ideo-
de s u a importância? E m o u t r a s p a l a v r a s : a q u e cor- lógicos do E s t a d o p o r o u t r o .
r e s p o n d e a " f u n ç ã o " destes A p a r e l h o s Ideológicos d o R e u n i m o s o que f o i d i t o a n t e r i o r m e n t e nos três
p o n t o s seguintes:
10 bis O que, em breves palavras, se diz aqui acerca da luta de '• 1. T o d o s os a p a r e l h o s do E s t a d o f u n c i o n a m o r a
classes nos A I E não pretende evidentemente esgotar a questão através da repressão, o r a através da i d e o l o g i a , c o m a
de luta de classes.
diferença, de que o A p a r e l h o ( r e p r e s s i v o ) do E s t a d o
P a r a tratar desta questão, deve-se ter presente dois prin- f u n c i o n a p r i n c i p a l m e n t e através d a repressão e n q u a n t o
cípios.
que os A p a r e l h o s Ideológicos do E s t a d o f u n c i o n a m
O primeiro princípio foi formulado por Marx no prefácio p r i n c i p a l m e n t e através da i d e o l o g i a .
da Contribuição: "Quando consideramos tais abalos (uma revo-
lução social), é necessário distinguir entre o abalo material — 2. Ao passo q u e o A p a r e l h o ( r e p r e s s i v o ) do Es-
que pode ser constatado de maneira cientificamente rigorosa
— das condições de produção económicas, e as formas jurídicas,
tado constitui u m todo organizado cujos diversos com-
políticas, religiosas, artísticas ou filosóficas através das quais p o n e n t e s estão c e n t r a l i z a d o s p o r u m a u n i d a d e de d i r e -
os homens tomam consciência deste conflito e o levam até o ção, a d a política d a l u t a de classes a p l i c a d a pelos
fim". A luta de classes se expressa e se exerce portanto nas r e p r e s e n t a n t e s políticos das classes d o m i n a n t e s , q u e
formas ideológicas, e portanto se exerce também nas formas
ideológicas dos A I E . Mas a luta de classes ultrapassa ampla-
detém o p o d e r d o E s t a d o , — os A p a r e l h o s Ideológicos
mente estas formas, e é porque ela as ultrapassa que a luta do E s t a d o são múltiplos, d i s t i n t o s e r e l a t i v a m e n t e au-
das classes exploradas pode se exercer nos A I E , voltando a
a r m a da ideologia contra as classes no poder.
Isto em função do segundo princípio: a luta das classes 11 E m grande parte. Pois as relações de produção são antes de
ultrapassa os A I E porque ela não tem suas raízes n a ideologia, mais nada reproduzidas pela materialidade do processo de pro-
mas n a Infraestrutura, nas relações de produção, que são re- dução e do processo de circulação. Mas não devemos esquecer
lações de exploração, e que constituem a base das relações de que as relações ideológicas estão presentes nestes mesmos pro-
classe. cessos. _

72 73

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