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AS MARCAS DA ESPIRITUALIDADE CRISTÃ SAUDÁVEL

Mateus 17. 1-13 (NVI):


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Seis dias depois, Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João, irmão de Tiago, e os levou, em particular, a
um alto monte.
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Ali ele foi transfigurado diante deles. Sua face brilhou como o sol, e suas roupas se tornaram brancas
como a luz.
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Naquele mesmo momento apareceram diante deles Moisés e Elias, conversando com Jesus.
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Então Pedro disse a Jesus: "Senhor, é bom estarmos aqui. Se quiseres, farei três tendas: uma para ti,
uma para Moisés e outra para Elias".
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Enquanto ele ainda estava falando, uma nuvem resplandecente os envolveu, e dela saiu uma voz, que
dizia: "Este é o meu Filho amado em quem me agrado. Ouçam-no! "
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Ouvindo isso, os discípulos prostraram-se com o rosto em terra e ficaram aterrorizados.
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Mas Jesus se aproximou, tocou neles e disse: "Levantem-se! Não tenham medo! "
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E erguendo eles os olhos, não viram mais ninguém a não ser Jesus.
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Enquanto desciam do monte, Jesus lhes ordenou: "Não contem a ninguém o que vocês viram, até que o
Filho do homem tenha sido ressuscitado dos mortos".

Introdução:

É próprio das pessoas, de todos nós, fazermos julgamentos rápidos fundamentados nas
aparências (1 Sm. 16.7). A cultura midiática prega que “imagem é tudo”. O importante não é o
que você é, mas aquilo que sua imagem propõe. Jesus já havia recomendado aos seus
discípulos: “Não julguem segundo as aparências” (Jo.7.24). Isso porque ele sabia que temos a
tendência de nos encantarmos com a pose, com a casca, com a performance, com o verniz,
com entonação de voz, com a fachada.

Nada mais verdadeiro que o provérbio popular que diz: “as aparências enganam”

Uma pergunta retórica:

É possível alguém aparentar boa forma espiritual, estando, na verdade, doente


espiritualmente? Sim, porque essa foi a constatação, o diagnóstico que Jesus fez á igreja de
Sardes: “Tens fama de que estás vivo, mas está morto” (Ap. 3.1).1

O problema daquele cuja espiritualidade está doente, é que, na maior parte do tempo ele
exibe uma saúde aparente.

Por essa razão, Jesus se valia de um adágio recorrente em sua época: “Não necessitam de
médios os são, mas sim, os enfermos” (Mt. 9.12). À igreja de Corinto, Paulo escreve que
havia entre eles: “fracos, doentes, e outros que haviam dormido” (1Co. 11:30)

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Em outras versões lê-se: “Tens nome”, ou, “tens reputação”
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Uma espiritualidade adoecida é sintomática – tem sintomas. Quais seriam, então, os sintomas
de uma espiritualidade adoecida e adoecedora?

Eis algumas

1. É UTILITÁRIA - A espiritualidade de Jacó ( Gênesis 28.20)


2. É LEGALISTA - A espiritualidade dos escribas e fariseus (Mateus 23.2)
3. É IDÓLATRA - A espiritualidade dos Atenienses (Atos 17. 16,22,23)
4. É CRÉDULA - A espiritualidade do povo de Samaria (Atos 8.9-11)
5. INOPERANTE – Tiago a define como uma espiritualidade de muita fé, de muita
eloqüência, mas sem desdobramentos na prática (Tiago 2.14-26). Era a espiritualidade
dos discípulos – poderosa no monte, mas impotente no vale (Lc. 9.37-45).

Isto posto, pergunto: Quais são as marcas legitimadoras, as características autenticadoras de


uma espiritualidade saudável?

Transição: Hoje, quero olhar para o relato da transfiguração conforme a narrativa de Mateus
como um arquétipo, um da espiritualidade saudável. Meu desafio hoje é o de mostrar quais
os critérios mínimos para avaliarmos uma espiritualidade legítima, autêntica, genuína,
verdadeira e saudável.

Como aferir, discernir a saúde de nossa vida cristã? Sabe-se que uma espiritualidade é
saudável, quando:

1. Discerne a centralidade de Jesus

A Espiritualidade sadia é cristocêntrica

Sabemos que ela é sadia, se é centrada em Jesus. Veja o versículo 8: “E erguendo eles os
olhos, não viram mas ninguém, senão Jesus.”

Moisés e Elias sumiram. Ficou só Jesus. Isso é importante porque estavam ali dois ilustres da
literatura judaica – Moisés e Elias. Moisés foi o maior legislador, e Elias o maior profeta.
Moisés representava a lei, e Elias os Profetas. Mas diante de Jesus eles desapareceram.

E sempre que Ele chega os ilustres, os nobres, os poderosos desaparecem. É ilustre até ele
chegar, é nobre até ele chegar, é grandão até ele chegar. Ouçamos João, o Batista: “Importa
que ele cresça e que eu diminua” (Jo.3:30).

Ele é o elemento fundamental e vital para a fé cristã: “Quanto ao fundamento, ninguém pode
lançar outro que não seja o já posto: Jesus Cristo.” (1Co. 3.11).

Qualquer empreendimento religioso, filosófico, empresarial sobrevive sem seu fundador.


Podemos falar de budismo, sem Buda. Podemos falar de mormonismo sem Josef Smith.
Pode-se falar de Confucionismo sem Confúcio, Islamismo sem Maomé, Platonismo sem
Platão. Mas toda tentativa de articular a fé cristã sem Cristo é uma tarefa impossível.

Qualquer construção teológica por mais bem elaborada e erudita que seja que não tenha o
Cristo como ponto de partida e de chegada de seu labor teológico, não merece crédito.Isso
porque a Cristologia é o coração que bombeia vida para a teologia. Jesus é a lentes
hermenêuticas com as quais se deve fazer teologia.
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Qualquer espiritualidade que não tenha Jesus como modelo, é esoterismo alienante. Sem a
pessoa de Jesus, podemos ter templos suntuosos, credos elaborados, teologias requintadas,
liturgias envolventes, mas nos faltará a vida.

Nunca faltaram a esse mundo grandes homens e mulheres. A história está pontilhada de
nomes como Salomão, Davi, Hamurabi, Ciro, Alexandre o Grande, César, Joana Darc,
Napoleão Bonaparte, George Washinton, Isaac Newton, Florence Nigtingale... a lista continua.
Mas ninguém se iguala a ele.

Ele é o centro do universo, o centro das escrituras, o centro da igreja, e o centro de nossa fé.

Concordo! Agostinho foi maravilhoso, Tomás de Aquino foi fantástico, Calvino um gênio,
Lutero foi brilhante, Finey foi uma brasa viva, Barth foi extraordinário, Daniel Berg e Gunnar
Vingren foram gigantes, mas o centro da nossa espiritualidade é Jesus de Nazaré.

Jesus é inigualável

Os poderosos um dia se dobrarão diante dele – Filipenses 2:9-11:

“Por isso Deus o exaltou à mais alta posição e lhe deu o nome que está acima de todo
nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, no céu, na terra e debaixo da
terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para a glória de Deus Pai.”

Diante dele, Nabucodonosor, o orgulhoso da Babilônia, vai para o pasto comer capim

Erodes, o poderoso, por não dar glória a Deus, morre comido de bichos ( At. 12.19-23)

Ele é o único que abriu o livro e desatou seus selos - Apocalipse 5:1-5:

E vi na destra do que estava assentado sobre o trono um livro escrito por dentro e por fora,
selado com sete selos. E vi um anjo forte, bradando com grande voz: Quem é digno de abrir
o livro e de desatar os seus selos? E ninguém no céu, nem na terra, nem debaixo da terra,
podia abrir o livro, nem olhar para ele. E eu chorava muito, porque ninguém fora achado
digno de abrir o livro, nem de o ler, nem de olhar para ele. E disse-me um dos anciãos: Não
chores; eis aqui o Leão da tribo de Judá, a raiz de Davi, que venceu, para abrir o livro e
desatar os seus sete selos.

Qualquer modelo de espiritualidade que não se amolde em Jesus, que não tenha o rosto de
Jesus; o jeito de Jesus; a fala de Jesus; a proposta de Jesus, é falseada; é embuste, é
engodo, precisa ser descartada e joga no lixo.

Transição: Em segundo lugar

2. A espiritualidade sadia considera a cruz

Não falo da cruz como adereço, ou como ornamento em arquiteturas religiosas e em


lápides, mas como essência da mensagem e da vida da igreja.
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Você pode aferir a saúde de sua espiritualidade se ela considera a cruz. No contexto da
crucificação que Moisés e Elias conversaram com Jesus sobre a cruz! Conversaram sobre
seus últimos momentos em Jerusalém.

Versículo 12: “Mas eu lhes digo: Elias já veio, e eles não o reconheceram, mas fizeram
com ele tudo o que quiseram. Da mesma forma o filho do homem será maltratado por
eles”

Enquanto Jesus é o centro da espiritualidade; a cruz é o tema desta; a cruz é o grande


assunto da espiritualidade cristã. A cruz é o lastro que sustenta; que e dá estabilidade a nossa
espiritualidade.

A espiritualidade é séria, se leva a cruz a sério. Se não houver cruz em sua espiritualidade,
Ela é apenas meditação transcendental. Cristianismo sem cruz é budismo, é Ioga. Sem a cruz
não há espiritualidade sadia, mas misticismo alienado.

Para Paulo, a mensagem da cruz era o tema central em seu ministério - 2 Coríntios 2.2:

“Pois, decidi nada saber entre vocês, a não ser Jesus Cristo, e este, crucificado”

Temos visto hoje no Brasil um evangelho humanista, místico, pragmático, centrado no


homem, que é o evangelho do sucesso e da prosperidade tão propalado em nossa pátria.

O que temos visto por aí é uma pregação que fala apenas de triunfo, de saúde plena e
sempre perfeita, de prosperidade financeira. Um evangelho barateado na feira dos cambistas
religiosos.

Concordo com Dietrich Bonhoeffer, em seu livro “Discipulado” quando diz que Graça barata é
exatamente aquela sem cruz. Ele escreve:

“Graça barata é a pregação do perdão sem arrependimento, é o batismo sem disciplina


comunitária; é a Ceia do Senhor sem confissão dos pecados, é a absolvição sem
confissão pessoal. A graça barta é a graça sem discipulado, a graça sem cruz, a graça
sem Jesus Cristo vivo, encarnado”2

O cristianismo pós-moderno tem açucarado a mensagem do evangelho e o substituído por


outro evangelho: um sub-evangelho; um anti-evangelho, um pseudo-evangelho. Um
evangelho adulterado, híbrido, falseado, paganizado. Isso porque não há cruz nesse
evangelho. O que há é muito misticismo, sincretismo, humanismo, mercantilismo, e nada de
cruz.

Sem cruz não há igreja. Pode haver uma comunidade social, até mesmo religiosa, com tintura
cristã, mas não será a igreja cristã. As origens da igreja estão na cruz. E se ela perder a cruz
de vista não pode ser digna de ser chamada igreja. Será um Rotary Clube, uma ONG, uma
confraria, um mutirão, mas não será uma igreja.

O hino 291 da Harpa Cristã é um dos mais belos do hinário cristão

Rude cruz se erigiu,


Dela o dia fugiu,
Como emblema de vergonha e dor;
2
BONHOEFFER, Dietrich, Discipulado - 8ª Ed. – São Lepoldo: Sinodal, 2004, p. 10
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Mas contemplo esta cruz.


Porque nela Jesus
Deu a vida por mim, pecador.

Sim, eu amo a mensagem da cruz


Té morrer eu a vou proclamar;
Levarei eu também minha cruz
Té por uma coroa trocar.

Portanto, a espiritualidade só se manifesta como sadia se vivenciada na perspectiva da cruz e


das propostas de vida para as quais ela nos desafia.

3. Espiritualidade sadia pratica a oração


Podemos aferir a saúde de nossa espiritualidade, se ela pratica a oração. É o que está dito
em Lucas 9.28-29: “Aproximadamente oito dias depois de dizer essas coisas, Jesus
tomou consigo a Pedro, João e Tiago e subiu a um monte para orar. Enquanto orava
transfigurou-se..”

Esse talvez seja o ponto mais delicado, mais grave quanto à espiritualidade. Porque se não
houver oração, a espiritualidade está trôpega, aleijada e manca. A oração é o oxigênio da
Espiritualidade. Se ela não ora, ela morre.

Quem ora prega diferente, canta diferente, pastoreia diferente, vive diferente

Sem oração todos os nossos esforços serão inúteis; todos os nossos empreendimentos darão
em nada.

A. R. Torrey disse:
“Ore por grandes coisas, espere grandes coisas, trabalhe por grandes coisas, mas
acima de tudo ore”

O segredo dos apóstolos devia-se ao fato de que eles puseram a oração em lugar prioritário
(Atos 6.4)

Há uma afirmação poderosa à respeito da igreja primitiva: ela orava (At.2.42). A primeira
reunião de oração da igreja primitiva foi uma reunião de oração (At. 1.12-14).

Enquanto Pedro estava na prisão, a igreja orava (At.12.5-7)

O milagre na porta do Templo, aconteceu na hora da oração à três horas da tarde (At. 3.1-10).

Jesus apontou o lugar da oração – O tameion –Mateus 5:5,6

Ilustração

A igreja de David Yong Cho em Seul na Coreia do Sul, é maior igreja do mundo com mais de
700 mil mebros. O segredo? Eles oram. Nenhuma igreja na Coréia do Sul é considerada
evangélica se não tiver reunião diária de oração na madrugada. Se um seminarista faltar a
duas reuniões de oração no seminário, disse Yong Cho: “Não serve para ser pastor”.

4. Espiritualidade sadia acontece comunitariamente


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Espiritualidade genuína vive em comunidade porque é comunitária. Versículo 1 diz que


“Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João, irmão de Tiago, e os levou, em particular, a
um alto monte”

Note que Jesus não sobe sozinho ao monte; não quer ter sozinho o privilégio da
transfiguração.

Aí está a marca da espiritualidade saudável; um modo de aferi-la; de ver se ela está presente:
ela não é individualista, mas acontece comunitariamente.

A fé cristã não faz carreira solo. A espiritualidade bíblica é uma espiritualidade de


comunidade. Por essa razão, a carta aos Hebreus ordena: “Não deixemos de nos reunir como
igreja, segundo o costume de alguns, mas procuremos encorajar-nos uns aos outros”
(Hb.10.25).

Ao enviar seus discípulos em missão, Jesus os envia de dois em dois –Lucas 10.1

Salomão disse que é melhor serem dois –Eclesiastes 2:9-12

A pergunta de Deus a Caim foi: “Onde está teu irmão?” –Genesis 4.9

É na experiência comunitária de fé, que a prática da mutualidade do “uns aos outros” se


verifica e se faz perceber.

A espiritualidade cristã tem sua origem e plenitude em um Deus relacional: A trindade é uma
eterna comunhão entre Deus Pai, Deus filho e Deus Espírito Santo. A trindade nos ensina a
verdade que Deus não é um ser solitário. Ele convive em comunidade divina.

5.Espiritualidade sadia é obediente


Versículo 5: “Enquanto ele ainda estava falando, uma nuvem resplandeceu e os
envolveu, e dela saiu uma voz, que dizia: “Este é o meu filho amado de quem me
agrado. A ele ouvi”.

A expressão “a ele ouvi”, no judaísmo é o equivalente de “a ele obedecei”. Para o judeu ouvir
tem o mesmo sentido de obedecer.

Você pode dizer que sua espiritualidade é sadia, se desemboca em obediência ao evangelho.

Estamos vivemos um cristianismo de muito barulho, de muito estardalhaço, de muita emoção,


de muito show, de muita coreografia religiosa, de muita encenação, mas de pouca obediência
ao evangelho

O número dos sem igrejas tem crescido assustadoramente. As pessoas vem à igreja sem
compromisso, se não gostarem, vai à uma outra. Todos querem ser abençoados por Deus,
mas poucos querem obedecer-lhe.

O chamado ao discipulado é um chamado à uma vida de obediência:

Lucas 6:46:

“Por que vocês me chamam Senhor, Senhor e não fazem o que eu digo?
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Em João 15:14:

“Vós sois meus amigos, se fizerdes o que vos mando.”

Vida cristã segundo Jesus, é fazer o que ele manda. E compromisso. Sem compromisso, tudo
o que fizermos aqui é balela. Sem obediência, amor é conversa fácil. Sem obediência, fé não
passa de credo religioso. Sem obediência, oração é apenas uma reza.

6. Espiritualidade saudável é discreta


Podemos aferi a saúde de nossa espiritualidade, se ela valoriza a discrição. Veja o que o
versículo 9: “enquanto descia do monte, Jesus lhes ordenou: “Não contém nada a ninguém
o que vocês viram”.

Essa foi a recomendação de Jesus: “A ninguém conteis a visão”, “não façam alarde daquilo
que vocês presenciaram aqui”. O que Jesus estava pedindo era que eles fossem discretos.

O que temos visto às vezes, é um montão de gente por aí com uma espiritualidade auto
glorificante. Gente que adora mostrar o quanto é espiritual só para ser aplaudido, ovacionado,
reverenciado. Era o caso dos fariseus que gostavam de orar nas praças e, ao jejuar,
mostravam um semblante decaído a fim de mostrarem o quanto eram espirituais:

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