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Safo.

Fragmentos escolhidos

LET311
SEMINÁRIO DE LEITURA: LITERATURA CLÁSSICA
(2021-1)
Gustavo Frade

Hino a Afrodite (fr. 1)


Tradução de Giuliana Ragusa:

De flóreo manto furta-cor, ó imortal Afrodite,


filha de Zeus, tecelã de ardis, suplico-te:
não me domes com angústias e náuseas,
venerando, o coração,

mas para cá vem, se já outrora –


a minha voz ouvindo de longe – me
atendeste, e de meu pai deixando a casa
áurea carruagem

atrelando vieste. E belos te conduziram


velozes pardais em torno da terra negra –
rápidas asas turbilhonando, céu abaixo e
pelo meio do éter.

De pronto chegaram. E tu, ó venturosa,


sorrindo em tua imortal face,
indagaste por que de novo sofro e por que
de novo de invoco,

e o que mais quero que me aconteça em meu


desvairado coração. “Quem de novo devo persuadir
… ao teu amor? Quem, ó
Safo, te maltrata?

Pois se ela foge, logo perseguirá;


e se presentes não aceita, em troca os dará;
e se não ama, logo amará,
mesmo que não queira”.

Vem até mim também agora, e liberta-me dos


duros pesares, e tudo o que cumprir meu
coração deseja, cumpre; e, tu mesmo,
sê minha aliada de lutas.

Tradução de Joaquim Brasil Fontes:


Aphrodite em trono de cores e brilhos,
imortal filha de Zeus, urdidora de tramas!
eu te imploro: a dores e mágoas não dobres,
Soberana, meu coração;
______
mas vem até mim, se jamais no passado
ouviste ao longe meu grito, e atendeste,
e o palácio do pai abandonando,
áureo, tu vieste,
______
no carro atrelado: conduzem-te, rápidos,
lindos pardais sobre a terra sombria,
lado a lado num bater de asas, do céu,
através dos ares,
______
e pronto chegaram; e tu, Bem-Aventurada,
com um sorriso no teu rosto imortal,
perguntaste por que de novo eu sofria,
e por que de novo eu suplicava;
______
e o que para mim eu mais quero,
no coração delirante. Quem, de novo, a Persuasiva
deve convencer para o teu amor? Quem,
ó Psáppha, te contraria?
______
Pois, ela, que foge, em breve te seguirá;
ela que os recusa, presentes vai fazer;
ela que não ama, vai te amar em breve,
embora não querendo.
______
Vem, outra vez – agora! Livra-me
desta angústia e alcança para mim,
tu mesma, o que o coração mais deseja:
sê meu Ajudante-em-Combates!

Tradução de Guilherme Gontijo Flores:


Multifloreamente Afrodite eterna
Zeus te fez ó roca-de-ardis e peço
deusa não permita que dor e dolo
domem meu peito

venha aqui se um dia ao ouvir meu pranto


longe sem demora você me veio
logo que deixava teu lar paterno
plenidourado

sobre o carro atado e velozes aves


te levaram várias à negra terra
numa nuvem de asas turbilhonantes
na atmosfera

junto a mim no instante você sorrindo


deusa aventurada de face eterna
perguntou-me por que de novo sofro
chamo de novo

por que ainda deixo nascerem chagas


sobre o peito quem eu de novo devo
seduzir e dar aos amores? quem ó
Safo te assola?

pois se agora foge virá em breve


se presentes nega dará em breve
se desama agora amará na hora
mesmo que negue

venha agora aqui me livrar das longas


aflições conceda os afãs que anseio
neste peito e seja aliada nesta
linha de luta.

Tradução de Tadeu Andrade:


Imortal Afrodite de vestes variegadas,
Filha de Zeus, tecelã de ardis, imploro-te
Com náuseas e angústias não me domes,
soberana, o ânimo,

Mas vem aqui, se outrora, ainda outra vez,


Ouvindo minha voz ao longe,
Escutaste e, deixando a casa dourada
do pai, vieste,

Tendo atrelado o carro; belos te guiavam


Célebres pardais sobre a terra negra,
Girando densas asas desde o céu,
em meio ao ar resplendente;

Logo chegaram, e tu, venturosa,


Sorrindo com rosto imortal,
Perguntaste o que de novo sofri e por que
de novo chamo,

E o que, enfim, desejo no insano ânimo


Que me ocorra: “Quem de novo, atenden-
do-te, levo a te amar? Quem, ó
Sago, te injustiça?

Pois, se ela foge, logo perseguirá,


Se não recebes presentes, os dará
E, se não ama, logo amará,
mesmo contra a vontade”.

Vem a mim também agora, liberta das duras


Preocupações, cumpre tudo o que meu ânimo
Deseja cumprir e tu própria
sê aluada de armas.

Ode a Anactória (fr. 16)


Giuliana Ragusa:
Uns, renques de cavalos, outros, de soldados,
outros, de naus, dizem ser sobre a terra a negra
a coisa mais bela, mas eu: o que quer
que se ame.

De todo fácil fazer ver a


todos isso, pois a que muito superou
em beleza os homens, Helena, e o marido,
o mais nobre,

tendo deixado, foi para Troia navegando,


até mesmo da filha e dos queridos pais
de todo esquecida, mas desencaminhou-a …

agora traz-me Anactória à lembrança,


a que está ausente, …

Seu adorável caminhar quisera ver,


e o brilho luminoso de seu rosto,
a ver dos lídios as carruagens e a armada
infantaria.

… impossível vir a ser


… humano … partilhar e rezas

e inesperadamente.

Joaquim Brasil Fontes:


É um batalhão de infantes – ou de cavaleiros
– dizem outros que é uma frota de negras naus
a mais linda coisa sobre a terra – para mim,
é quem tu amas.
______
E como é fácil fazer clara essa verdade
para o mundo, pois aquela que triunfou
sobre o humano em beleza, Helena, seu marido,
o mais nobre dos homens,
______
abandonado, para Tróia navegou;
para a filha, os pais queridos nem um só
pensamento voltando: arrastada
[
______
[por Kypris
[
agora, esta lembrança: Anaktória
]daqui tão distante;
______
aquele modo de andar que acorda os desejos
e cambiantes brilhos, mais eu queria ver, no seu rosto,
que soldados com panóplias e carros lídios
[em pleno combate]
]sua parte não pode esperar
]o humano [ ] mas desejá-la.

inesperadamente.

Guilherme Gontijo Flores:


D]izem uns que exércitos e uns que barcos
e uns que carros sejam o se[r] mais belo
s]obre a terra negra — por mim seria o
ser que se ama

c]omo é fácil logo explicar o fato


p]ara t[o]dos pois que já todos sabem
que a [mor]tal mais bela da terra Helena [a]o
[nob]re marido

des[denho]u e foi vele[jar] em Troia


se[m seq]uer lembrar-se da fina [fil]ha
dos queridos [pa]is seduzida pela
. ] ` [. . . . . . ]sa [

pois [ . . . . ] in]flexivel mente


. . . . ] . . (.) levemente e[ . . . . . ] pensa
me] recordo agora da plen[a aus]ência
de Anactór[ia

quero ver passar o [seu] passo amável


quero o lustre intenso que traz no rosto
mais que as carruagens da Lídia e armadas
in]fantarias

]assim não será possível


] . ao morta[l d]esejar a partilha
]e por mim mesma
[

Tadeu Andrade:
[U]ns dizem que a cavalaria, outros, que a infantaria,]
Outros que a frota é, sobr[e] a terra negra,
O que [h]á de mais belo, mas eu, aquilo que
se deseja;

E é [tot]almente fácil fazê-l[o] compreensível


A [t]odos, pois a que muito superava
Os [hu]manos em beleza, Helena, [o] marido
mais [ no]bre […]

Abando[nan]do, foi a Troia navegando


E ne[m] lembrou da filha, nem dos queridos pa[i]s
De to[do], mas a transviou
[…]

[…] pois o [… fl]exível pensamento […]


[…] levemente […] que pensasse
[…] agora me lembro[u] de Anactória,
que [não] está presente.

[Del]a preferiria ver o desejável caminhar


E o esplendor brilhante do rosto
Às carruagens e os [g]uerreiros [de infantaria]
lídios em armas.

[…] não é possível ser


[…] human[o], mas orar para tê-lo
[…] a mim mesma
[…]

Phaínetaí moi (fr. 31)


Giuliana Ragusa:
Parece-me ser par dos deuses ele,
o homem, que oposto a ti
senta e de perto tua doce
fala escuta,

e tua risada atraente. Isso, certo,


no peito atordoa meu coração;
pois quando te vejo por um instante, então
falar não posso mar,

mas se quebra minha língua, e ligeiro


fogo de pronto corre sob minha pele,
e nada veem meus olhos, e
zumbem meus ouvidos,

e água escorre de mim, e um tremor


de todo me toma, e mais verde que a relva
estou, e bem perto e estar morta
pareço eu mesma.

Mas tudo é suportável, se mesmo um pobre homem …

Joaquim Brasil Fontes:


Parece-me ser igual dos deuses
aquele homem que, à tua frente
sentado, de perto, tua voz deliciosa
escuta, inclinando o rosto,
______
e este riso luminoso que acorda desejos – ah! eu juro,
meu coração no peito estremece de pavor,
no instante em que eu te vejo: dizer não posso mais
uma só palavra;
______
minha língua se dilacera;
escorre-me sob a pele uma chama furtiva;
meus olhos não vêem, meus ouvidos
zumbem;
______
um frio suor me recobre, um frêmito do meu corpo
se apodera, mais verde que as ervas eu fico;
que estou a um passo da morte,
parece [
______
Mas [

Guilherme Gontijo Flores:


Num deslumbre ofusca-me igual aos deuses
esse cara que hoje na tua frente
se sentou bem perto e à tua fala
doce degusta

e ao teu lindo brilho do riso — juro


que corrói o meu coração no peito
porque quando vejo-te minha fala
logo se cala

toda a língua ali se lacera um leve


fogo surge súbito sob a pele
nada vê meu olho mas ruge mais ru-
ído no ouvido

gela-me a água e inunda-me o arrepio


me arrebata e resto na cor da relva
logo me parece que assim pereço
nesse deslumbre

tudo é suportável se †até um pobre†

Tadeu Andrade:
Ele me parece ser igual aos deuses,
O homem que está sentado diante de ti
E, de perto, te escuta
falando doce

E rindo desejavelmente; isso, de fato, me


Perturbou o coração no peito,
Pois, quando te vejo brevemente, então falar
torna-se impossível para mim,

Mas, de cima a baixo, a língua se quebra, sutil


De pronto o fogo corre sob a pele,
Com os olhos nada vejo, e zu-
nem as audições,
O suor me transcorre, um tremor
Toda me toma, fico mais verde
que a relva e pareço a mim mesma
pouco distar da morte.

Mas tudo é suportável, pois também um pobre (?)

fr. 96
Giuliana Ragusa:

… Sárdis …
muita vez para cá … ela tendo

… qual deusa manifesta,
e [ela] muito se deleitava com tua dança-canção.

Mas agora ela se sobressai entre Lídias


mulheres como, depois do sol
posto, a dedirrósea lua

supera todas as estrelas; e sua luz se esparrama


por sobre o salso mar
e igualmente sobre multifloridos campos.

E o orvalho é vertido em beleza, e brotam


as rosas e o macio
cerefólio e o trevo-mel em flor.

E [ela] muito agitada de lá para cá a


recordar a gentil Átis com desejo;
decerto frágil peito … se consome …

… canta …

.. .Fácil não … com deusas quanto à forma


amável rivalizar …


… ó Afrodite

… o néctar vertia da
áurea …
… mãos… Peitó, deusa Persuasão
… o Geraístio
… queridas ...

Joaquim Brasil Fontes:


] Sard. [
quantas vezes, para este lugar, em pensamentos voltada
______
...[ ]......[ ]...
como se fosses uma deusa que se desvela;
e com teus cantos mais se alegrava.
______
Agora, rebrilha entre as mulheres lídias,
como, depois do Sol
posto, a Lua, com dedos de rosa,
______
os astros ofuscando, todos, sua luz
derrama sobre o mar salgado
e nos campos constelados de flores;
______
alastra-se lindamente o orvalho;
abrem-se as rosas, o delicado
cerefólio e florido meliloto;
______
ela vagueia sem cessar, recorda-se
de Áthis, a deliciosa, e seu coração
delicado se aflige com tua sina:
______
[
[
[
______
[
mas é difícil, para nós, com deusas
]rivalizar[ ] de Adônis
______
[
[
]Aphrodite
______
] o néctar derrama
áureas [
] Persuasão
______
] Geraístion
] querida
]
______
] eron íkso[m

Guilherme Gontijo Flores:


]Sardes [ . . ]
amiú]de mudando sua [men]te

como [ . . . ] . nós . [ . . . ] . . c[onside-


rou-te igual à famosa deu-
as e adorou o teu canto mais que tudo

ela agora reluz em redor das lí-


dias mulheres tal como ao pôr-
do sol bem dedirrósea leve <lua>

suprimindo as estrelas levando assim


suas luzes ao mar de sal
e ao compasso de multiflóreos campos

eis se espalha o belíssimo orvalho flo-


rescem rosas suaves com
cerefólios e flor de melilotos

sempre que entra em deriva de pronto só


pensa em Átis de fino amor
e o destino [dest]rói [seu] peito frágil

para chegar . [ . . ] . . nós aqui


sobre a mente [ . . ]ist[ . . . ] assim
canta muito [ . . . ]ma[ . . . . . . ] . no meio

não é fácil pra nós igualar a for-


ma fo[rmo]sa das belas deu-
sas [ . . vo]cê levava e[ . . . ] . ônio

]o[ . . . . ]de-
m[ ] . mor
e [ . ]m[ ]o Afrodite

e[ ] néctar derramou
num dourado [ ]a
. . . . ]Sedução nas mãos[

]m[ . . ]rer
inúmer]as
]......e

]para o Geresteu
]queridas
]o ne[nhum

]venh[

Trajano Vieira:
[…]

Não raro move o pensamento em nossa direção…


Idêntica a uma deusa que se descortina,
teu canto, sobretudo ele a extasiava.

Seu destaque entre as lídias de hoje


reproduz o momento em que, sol posto,
a lua dedirrósea

ofusca as estrelas, todas as demais.


A luz se alastra sobre o mar talásseo
tal qual também por campo multiflóreo.

Orvalho goteja beleza, rosas espoucam,


o cerefólio flébil,
ninfeáceas melivicejantes.

Não se assenhora dos passos que divagam


no recordo do desejo:
Átis, solícita Átis!
A sina morde o coração etéreo…

fr. 49
Giuliana Ragusa:

Eu te desejei, Átis, há tempos, um dia…

… criança mirrada e sem graça parecias ser …

Joaquim Brasil Fontes:


53
pequena . . . sem encantos

57
há muito tempo atrás, eu te amei,
ó Átthis

Guilherme Gontijo Flores:


Átis eu te adorei num passado distante sim

***

ah criança aos meus olhos faltavam-te graça e sal

Rafael Brunhara:
Eu te amava, Átis, outrora…
...parecias-me pequenina e sem encantos.

fr. 130
Giuliana Ragusa:
… Eros de novo – deslassa-membros – me agita,
dulciamara inelutável criatura …

… ó Átis, mas a ti tornou-se odioso meu


pensamento, e para Andrômeda alças voo …
Joaquim Brasil Fontes:
] de novo, Eros me arrebata,
ele, que põe quebrantos no corpo,
dociamaro, invencível serpente

] ó Átthis, tu me detestas até na lembrança:


e para os braços de Andromeda voas [

Guilherme Gontijo Flores:


fr. 130

Eis que o Amor solta-membro estremece-me


agridoce intratável reptílico

fr. 131

Átis sei que detesta pensar em mim


e hoje voa no vento de Andrômeda

Rafael Brunhara:
Eros, de novo, que os membros deslassa, perturba-me:
doce e amargo, invencível monstro.

fr. 47

Giuliana Ragusa:
… Eros sacudiu meus
sensos, qual vento montanha abaixo caindo sobre as árvores ...

Joaquim Brasil Fontes:


como o vento se abate sobre os carvalhos na montanha,
[Eros me trespassa]

Guilherme Gontijo Flores:


o Amor me atravessou
a alma como se vento do monte em carvalho cai

Trajano Vieira:
Vento
precípite nos cimos entre pinhos
Eros
seu símile
agita em mim o que é o meu espírito.

fr. 36
Giuliana Ragusa:
… e desejo e enlouqueço …
Joaquim Brasil Fontes:
queimo em desejo
e anseio [por]
Guilherme Gontijo Flores:
eu desejo e muito me abraso

fr. 48
Giuliana Ragusa:
… vieste, e eu ansiava por ti –
me esfriaste o peito que queimava com desejo …

Joaquim Brasil Fontes:


[ vieste: eu esperava por ti;
escorres, como água fresca, no meu coração ardente
Guilherme Gontijo Flores:
†mas† me veio você no momento em que te esperei
pra apagar no meu peito a faísca que me acendeu

Trajano Vieira:
Chegaste.
Em mim me acendia.
Enfriaste-me o âmago
flâmeo do querer.

fr. 51
Giuliana Ragusa:
… não sei o que faço: duas as minhas mentes …

Joaquim Brasil Fontes:


não sei como escolher:
em mim, há dois intentos

Guilherme Gontijo Flores:


eu hesito pois sinto este duplo pensar em mim

Trajano Vieira:
Não sei por onde me propague:
duplo
pensamento

em mim.

fr. 23
Giuliana Ragusa:

… do desejo …

… face a face contemplo …
… Hermíone e tal …
e comparar-te à loira Helena …

às mortais; e isto sabe, em tua
… de todos os meus anseios

… nas margens …

… celebrar um festival noturno …

Joaquim Brasil Fontes:


]…….[ de amor
]
[pois que te vejo face a face
] Hermíone [
] à loura Helena
[comparar-te]
] criaturas mortais
] dos meus sofrimentos
] [ ][ ][
] ……….
]
] [ ]

Guilherme Gontijo Flores:


]do amor esper[
]

pois se vejo]-te cara a car[a


nem sequer] Hermíone se com[para
mas se te aproximam] da loira Helena
nada me espan]to

]às mortais pode [ter] certeza


]de meus tormentos toda
]você[ . . ]´[ . ] me livra
]

]barranco or[valho
]em
noi]te aden[tro

fr. 94
Giuliana Ragusa:

… morta, honestamente, quero estar;


ela me deixava chorando

muito, e isto me disse:


“Ah! Coisas terríveis sofremos,
Ó Safo, e, em verdade, contrariada te deixo”.

E a ela isto respondi:


“Alegra-te, vai, e de mim
te recorda, pois sabes quanto cuidamos de ti;

mas se não, quero te


lembrar…
… e coisas belas experimentamos;

pois com muitas guirlandas de violetas


e de rosas … juntas
… ao meu lado puseste,

e muitas olentes grinaldas


trançadas em torno do tenro colo,
de flores … feitas;

e … com perfume
de flores …
digno de rainha, te ungiste,

e sobre o leito macio


tenra …
saciavas [teu] desejo …

Não havia … nem algum


santuário, nem …
do qual estivéssemos ausentes,

nem bosque …

Joaquim Brasil Fontes:


] que morta, sim, eu estivesse:
ela me deixava, entre lágrimas
______
e lágrimas, dizendo: [
“Ah, o nosso amargo destino,
minha Psappha: eu me vou contra a vontade”.
______
Esta resposta eu lhe dei:
“Adeus, alegra-te! De mim,
guarda a lembrança. Sabes o que nos prendia a ti
______
– se não, quero trazer de novo
à tua memória [ ]
..[ ] as lindas horas que vivemos
______
] de violetas
de rosas e aça[flor]
.. [ ] nós duas lado a lado
______
[ ] tecendo grinaldas
[ ] teu delicioso colo
] flores [
______
[ ] e perfumes
[ ]
] feitos para rainhas;
______
ungias com óleos, num leito [
delicioso [
e o desejo da ausente [
nem ] grutas
] danças
] ou sons

Guilherme Gontijo Flores:


só desejo morrer sem mais
e ela assim me largava com lágrimas

infinitas e ao fim [falou


“ah so[fre]mos a sorte cruel
Safo e meu coração se recusa ao fim”

eu com pressa lhe respondi


“vai alegre mas vai lembrar
de mim sim e sabendo que amei você

mas insisto e desejo só


que nos preze [ . . . . ] . [ . . . ] . . e
..[ ] presa ao maior prazer

as co[roas com açafr]ão


viole[tas e ro]sas vi
que você . . [ ] junto a mim

no pe[scoço sua]ve vão


mais guir[landas inú]meras
consagrando o en[trelace] de fina flor

fartos[ ] . perfumes na
linda face . [ ]ri[ . . ]m
numa tez de ra[inha] você se fez

e num lei[to] sutílimo


com suave . [ ] . . . ão
saciar o des[ejo ] . is

não havia [ n]em


santuário[ ]
nós estáv[amos tão afast]adas dali

nem caverna . [ dan]ças ou


]um som
] . . . ém

Trajano Vieira:
A morte, para ser franca, é o que mais desejo.
Ela me abandonou às lágrimas,

a um caudal de lágrimas, enquanto me dizia:


“Não foi pouco o que ambas sofremos,
Safo. Deixo-te, contrária ao meu coração.”

Segue o que lhe respondi:


“Leva o meu adeus! Preserva-me
em tua memória.
Não ignoras o quanto nos preocupamos contigo.

Caso não (te lembres) … permito-me


rememorar…
… o quanto da beleza provamos juntas.

Guirlandas não faltaram nela rosas


nem violetas…
… rente a mim pusestes,

tampouco grinaldas, inúmeras delas,


cujas tranças enlaçavam o colo frágil,
flores…

e… com o eflúvio
das flores…
que dignificariam uma rainha, te ungiste,

e na maciez do leito
jovial…
satisfazias tua volúpia…

Santuário não havia


um sequer…
em que não nos fizéssemos presentes,

nem bosque… dança… sonoridades…

fr. 168B
Giuliana Ragusa:
Imergiu a lua,
também as Plêiades; é
meia-noite, vai-se o tempo,
e eu sozinha durmo …

Joaquim Brasil Fontes:


a Lua já se pôs, as Plêiades também; é meia-
noite; a hora passa e eu,
deitada estou, sozinha

Guilherme Gontijo Flores:


Agora mergulha a lua
e as Plêiades todas noite
profunda o instante passa
e deito-me solitárias

Trajano Vieira:
A lua se anula, idem, as Plêiades.
Aos dias a noite equidista.
Transcorre a hora.
Na solitude, afundo-me no sono.

fr. 55
Giuliana Ragusa:
Morta jazerás, nem memória alguma futura
de ti haverá, nem desejo, pois não partilhas das rosas
de Piéria; mas invisível na casa de Hades
vaguearás esvoaçada entre vagos corpos …

Joaquim Brasil Fontes:


morta jazendo na terra,
ninguém te lamentará, ninguém vai de ti se lembrar:
das rosas da Piéria não compartilhaste
– invisível na casa do invisível Hades,
entre obscuros mortos uma sombra errante tu serás

Guilherme Gontijo Flores:


mas jaz morta você sem se mover nem restará nenhum
grande anseio ou paixão pelo teu ser já que você não viu
piérides roseirais nem te verão no Hades no negro lar
mas só resta voar voltas sem fim entre cadáveres

Trajano Vieira (duas versões):


Sem vida, hás de jazer vazia de recordos
no tempo do futuro, todo ele,
tampouco existirás na volição de alguém:
careces de vínculo com as rosas da Piéria.
Divagarás invisível na moradia do Hades,
num revôo entre cadáveres sem-contorno.

Quando, sem vida, jazeres,


nenhum registro terás no futuro de alguém,
tampouco perduras em sua volúpia,
estranha que és às rosas da Piéria.
Corpo oco na errância do Hades,
evitarás, etérea, cadáveres vazios de sombra.

Canção da velhice ou Canção de Titono


(fragmento publicado em 2004)
Giuliana Ragusa:
… [das Musas] de violáceo colo dos belos dons, meninas,
… a melodiosa lira, amante do canto;

[tenra] outrora, agora é a pele da velhice,


… os cabelos, de negros [brancos] se tornaram.

Pesado se me fez o peito, e os joelhos não me suportam –


os que um dia foram lépidos no dançar, quais os da corça.

Isso lamento sem cessar, mas que posso fazer?


O não-envelhecer não é possível ao ser humano.

Pois, certa vez, dizem que Eos de róseos braços,


com paixão … carregando Titono aos confins da terra,

belo e jovem que era; mas mesmo a ele alcançou similmente


em tempo a grisalha velhice – a ele que tinha imortal esposa.

Guilherme Gontijo Flores:


vocês deveriam perseguir] dons das vio[le]tas Musas
seguir ó crianças a] testude de cristalocanto

meu corpo passado delica]do se envelhece à pele


grisalhos ficara]m meus cabelos que ondulavam negros

meu [p]eito me pesa ai os joelhos [nã]o se firmam frágeis


tão ágeis que foram para danças como fortes faunos

<assim> eu condenso meus gemidos mas por que motivo?


pois é impossível prosseguirmos ininvelhecíveis

outr[o]ra a Aurora rosibrácea amorosa alçara


Titono em seus braços e o levou rumo aos confins da terra

pois tinha beleza e juventude mas velhice cinza


também o tocou mesmo ao fruir dessa imortal amada

]costumeira
]as companhasse

eu amo a fineza
o amor concedeu todos fulgores que no sol assombram.

Trajano Vieira:
… Das sinuosidades violáceas das Musas, crianças, a beleza das dádivas
… a lira quelônia de som cristal, aos amadores de poesia.

Em mim a pele rija de outrora e não a da velhice dos dias atuais


… tornou-se branco o negro dos cabelos.

Pesa-me o coração, os joelhos não me encaminham,


tão ágeis em danças do passado, iguais aos de uma corça.
Não há fadiga para o lamento, mas como proceder?
Ao homem o não envelhecer é uma impossibilidade.

Consta ter havido um tempo em que Aurora, braços róseos,


num arroubo de erotismo conduziu Títono aonde a terra termina.

Era a beleza em frescor juvenil. Mas tampouco a ele, da velhice grisalha,


Cronos poupou, a ele que tinha como consorte, no leito, um ser perene.

Tadeu Andrade:
Moças, colhei as violetas bonitas das Musas
E a voz da tartaruga apaixonada pelo canto.

Um dia a minha pele foi suave, mas a idade


A levou e, de negro, meu cabelo se fez branco.

O alento agora pesa, meus joelhos não suportam;


Um tempo houve em que dançaram leves feito corças.

Por isso meu lamento não tem fim. Fazer o quê?


Quem quer que nasça humano sempre há de envelhecer:

Conta-se que Titono foi levado ao fim do mundo


Pelos braços rosados de Aurora enamorada:

Era jovem e belo. Mesmo assim, transcorre o tempo,


E a idade encanecida leva o esposo de uma deusa.

fr. 132
Giuliana Ragusa:
Tenho bela criança, portando forma símil
À das áureas flores, Cleis, filha amada,
por quem eu não [trocaria] toda a Lídia, nem a amável …

Joaquim Brasil Fontes:


eu tenho uma linda menina; com flores douradas
ela se parece: minha Kleís, meu bem-querer –
nem pelo reino da Lídia inteiro, nem pela adorada
[Lesbos] eu a trocaria

Guilherme Gontijo Flores:


Eis a minha linda filha que em tudo assim se alinha
junto às flores todas d’ouro é Cleís querida minha
pois por ela nunca troco nem Lídia nem amável …

fr. 98 (A-B)
Giuliana Ragusa:
… pois ela, a que me gerou …

em sua época, era grande


adorno, se alguém tinha os cachos
atados em nó purpúreo;

era isso mesmo …


mas se alguém tinha a coma
mais fulva que a tocha …,

com guirlandas [ornadas]


de flores em flor …
Há pouco, [Cleis], uma fita

furta-cor de Sárdis …
… cidades …

Mas eu, a ti, Cleis, uma fita furta-cor … –


não tenho meios de tê-la;
mas com o mitilênio …

… ter …
… furta-cor …
estas coisas dos Cleanatidas …
o exílio …
memoriais … pois terrivelmente devastado(a) ...

Joaquim Brasil Fontes:


[costumava dizer] minha mãe
________
na sua juventude, era um belo
ornamento ter as tranças
presas numa [fitinha] purpúrea;
________
[
mas a moça de cabeleira
mais loura do que as flamas
________
fica melhor usando grinaldas
tecidas com botões de flores –
uma fita, não faz muito tempo,
________
de cores alegres, vinda de Sardes
] cidades jônias [
[
________
eu não tenho para ti, ó Kleís,
nem sei onde encontrar, uma fitinha
de cores alegres; mas [ ] os mitilenos
________
[
[
[
________
estas memórias dos filhos de Kleánaks
[
terrivelmente devastadas [
Guilherme Gontijo Flores:
a)

. . ] . o pois minha mãe [falou

q]ue no cimo do seu v[igor


n]o enfeite seria só[
enlaçar os cabelos d[e púrpura

atingindo o melhor do[ mel


mas se a moça for inda mais[
clara e loira que o fogo[

a mais justa coroa [traz


entrelace em botões de flor
uma] fita afinada cl[

lá de Sardes em furta[-cor
. . . c]idade da Jônia [

b)

uma fita não posso achar


furta-cor pra você Cleís
mas <ao> bom mitileno será talvez

Trajano Vieira:
Minha mãe tinha por hábito contar

que em seu tempo


era sinônimo de beleza trazer as tranças dos cabelos
no laço púrpura.

As coisas eram assim,


mas se o louro dos fios superava a cor da flama…

flores, quase brotos,


no adorno das guirlandas.
De Sardes proveio uma fita que cintila…
… cidades …

Mas falta-me condição de possuir, Cleis, a fita que cintila,


de tê-la para ti, contudo…

… esses memoriais dos Cleanatidas no exílio… arrasados,


horrivelmente arrasados.
fr. 121
Giuliana Ragusa:
… mas grato me sendo, toma o leito de [outra] mais nova,
pois não suportarei ser a mais velha numa parceria…

Joaquim Brasil Fontes:


se tu me queres bem, amigo,
escolhe uma cama de mais moça,
não nos consigo imaginar, eu,
a mais velha, e, juntos, nós dois!

Guilherme Gontijo Flores:


como adoro você deve deve escolher jovens pro teu amor
pois não quero pra mim ter de viver velha na vida a dois

Trajano Vieira:
Na condição de amigo, encontra um leito mais jovial:
careço de arrojo para o convívio contigo,
em minha idade mais avançada.

fr. 102
Giuliana Ragusa:
Ó doce mãe, não posso mais tecer a trama –
domada pelo desejo de um menino, graças à esguia Afrodite …

Joaquim Brasil Fontes:


Ó mãe querida, não consigo mais tecer a trama:
queimo de amor por um moço, e a culpa é da branda Afrodite

Guilherme Gontijo Flores:


Não posso ó doce mãe mais enredar a minha trama
domada de desejo por criança de Afrodite

Rafael Brunhara:
Doce mãe, já não posso mais tecer a trama
por desejo a um rapaz domada pela esguia Afrodite.

fr. 57
Giuliana Ragusa:
… e quem é a rusticona que encantou a mente …
vestida em rústica veste …
sem saber como ergues seus trapos aos tornozelos?

Joaquim Brasil Fontes:


quem é a camponesa que te enfeitiça a cabeça,
vestida com roupa de camponesa,
não sabendo nem ajustar as vestes
acima dos tornozelos? [

Guilherme Gontijo Flores:


†que garota rural te seduziu . . .
numa roupa rural† . . .
que não sabe sequer como ajustar mantos no calcanhar

Rafael Brunhara:
Que menina tosca encanta tua mente...
...vestindo um vestido tosco...
nem sabe puxar os trapos acima dos tornozelos...

fr. 112
Giuliana Ragusa:
Ó feliz noivo, tua boda, como pediste,
se cumpriu, e tens a virgem que pediste.
Tua forma é graciosa, e … olhos de
mel, e desejo se derrama na desejável face
… honra-te em especial Afrodite …

Joaquim Brasil Fontes (duas versões):


[cumpriu-se, ó noiva, a promessa!
– Ó esposo!
cumpriu-se, ó noivo, o desejo!
– Ó esposa!

ó ditoso noivo, cumpriu-se a demanda!


tens o laço, tens moça que demandas!
Ó noiva cheia de graças, teus olhos [
a doçura do mel; em tua face Eros aflui;
honra-te, acima de todos, Aphrodite

Guilherme Gontijo Flores:


Teu casamento acaba noivo conforme às preces
como pediram chega a virgem das tuas preces

lindo é teu corpo todo todo o olhar <. . . .>


leve de mel e amores descem na doce face

<. . . . . . . . . . . . . > tuas grandes honras por Afrodite

Bodas de Heitor e Andrômaca (fr. 44)

Giuliana Ragusa:
… Veio o arauto …
Ideu…, veloz mensageiro:
“… e do resto da Ásia … glória imperecível.
Heitor e os companheiros a de vivos olhos trazer
de Tebas sacra e da Plácia de fontes perenes – ela,
delicada Andrômaca –, nas naus, sobre salso
mar. E muitos áureos braceletes e vestes
de púrpura fragrantes, adornos furta-cor,
incontáveis cálices prateados e marfins”.
Assim ele falou; e rápido ergueu-se o pai querido;
e a nova, cruzando a ampla cidade, chegou aos amigos.
De pronto os troianos às carruagens de boas rodas
atrelaram as mulas, e nelas subiu toda a multidão
de mulheres e junto as virgens … tornozelos
mas apartadas as filhas de Príamo
e cavalos os homens atrelaram aos carros
… moços solteiros, e por um largo espaço
… os condutores de carruagens
… símeis aos deuses
… sacro, em multidões
rumou … em direção a Ílio
e o aulo de doce som … se misturou
e o som dos crótalos … e então as virgens
cantaram uma canção sacra e chegou aos céus
eco divino …
e em toda parte estava ao longo das ruas
crateras e cálices …
mirra e cássia e incenso se misturavam,
e as mulheres soltavam alto brado, as mais velhas,
e todos os homens entoavam adorável e alto
peã invocando o Arqueiro hábil na lira,
e hineavam Heitor e Andrômaca, aos deuses símeis.

Joaquim Brasil Fontes:


Kypro. [
ei-lo, o arauto the[ ]ele[ . . . ]. theis
e estas palavras Ídaos . . . . [ . . ], o mensageiro da veloz
[

]
e das amplidões da Ásia [ ] glória imortal
“Héktor e seus companheiros, a de olhos cintilantes
trazem, de Thebas, a santa, e de Plakía [das fontes perenes]:
do mar – e bordados de cores cambiantes,
quanto bracelete, vestes purpúreas com perfumes,
copas de prata, inumeráveis; e marfim.”
Assim falou. Vivamente ergueu-se o amado pai,
e Pháma, na cidade de amplas praças, ressoa entre os amigos.
Num ímpeto, os ilíadas atrelam os muros
aos carros de boas rodas: para eles sobem concertos
de meninas e de virgens de [belos tornozelos] [
à parte, as filhas de Príamo [
os corcéis, os varões conduzem aos [carros de guerra]
p[ ] . . . . . muito [
d[ ] aníokhoi ph [ . . . . . ] . [
p[ ] ksa.o [
[
[
[

]iguais dos deuses


]sagrados; re-
unidos todos [ ] para Ílion;
a flauta docissonora e a cítara se mesclam
ao timbre dos crótalos; das virgens, nítida,
a canção sagrada ressoa aos céus etéreos
[
por todos os caminhos [
grandes vasos e copas [
misturam-se mirra, incenso e cássia;
as anciãs lançam no ar um grito agudo de alegria
e os homens, num coro apaixonado, altíssono,
invocam Paion, o Arqueiro da boa lira,
celebrando Héktor e Andromákha, iguais dos deuses:

Guilherme Gontijo Flores:


Chipre . [ ]á
chega o arauto d[ ]ele [ . . . ] . ou
vem Idau mensageiro veloz . . . d[
“ [falta um verso]
na Ásia inteira . [ . ] glória indelével sim
e eis que Heitor e parceir[o]s conduzem a luz-no-olhar
lá de Tebas sagrada e d[as águas de] Plácia
vem Andrômaca bela na barca no sal do mar
junto aos seus [brace]letes dourados e púrpur[as]
vestes nos per[fu]mes com seus variados dons
pratas peças inúmeras [ta]ç[as] ebúrneas”
disse e assim levantou-se veloz o querido p[a]i
e essa fama esvoaça na vasta cidade enfim
eis que ilíades logo enlaçaram as mula[s] em
carros suaves-nas-rodas e junto da multidão
v[ê]m mulheres seguidas de virge[ns] de [tenros] pés
fora as [fi]lhas de Péramo[
e homens prendem cav[alos] nos car[ros
m[ ]s divinos enorme e[
d[ ] . aurigas f[ . . . . . ] . [
p[ ´]a . o[
[faltam alguns versos]

fei]to um deu[s
] santo reúne[m-se
correm [ ]a Ílio[n
o aulo meli[m]elódico e a [cítara] mesclam[-se

Trajano Vieira:
… o arauto chega …
ideu… núncio agílimo: “…
… rumor imorredouro… dos quadrantes da Ásia.
Heitor e os sócios trazem a olhispiralante
da sacra Tebas e, fonte sem tempo, Plácia,
Andrômaca sutil em nave mar adentro,
e numerosos braceletes de ouro, e vestes
de púrpura exalantes, com detalhes furta-
-cor. Não faltavam taças pratas e em marfim.”
Falou assim e o pai se ergueu no mesmo instante.
A novidade alcança amigos da cidade.
Iliádicos atrelam mulas em estáveis
carruagens onde sobe o grupo numeroso
de damas e de moças, belos tornozelos.
Jugem corcéis aos carros as filhas de Príamo
num grupo à parte, elas com os outros homens…
solteiros todos eles…

[…]

A doce flauta, a cítara, o trom do crótalo,


misturam-se as sonoridades. Timbre agudo,
donzelas cantam o sagrado. Alteia ao céu
o eco divino…
e pelas vias, quaisquer que fossem,
crateras e taças…
amalgamas de arômatas: incenso, cássia
e mirra. Anciãs em júbilo ululavam, homens
em grupo retiniam todos o aprazível
peã na invocação do Arqueiro, ás-na-lira:
hinos louvam Heitor e Andrômaca, divinos.

fr. 44A
Giuliana Ragusa:
… a Febo auricomado, a quem […] gerou de Coios …
… unida ao Cronida de grande nome.
… mas Ártemis jurou a grande jura dos deuses:
“… para sempre virgem serei
… sobre os cimos das montanhas
… concede-me este favor”.
… concedeu-o o pai dos deuses venturosos
… fecha-cervos, a selvagem, os deuses
… grande título
[Eros] dela nunca se achega …

… Musas esplêndidas …
faz… das Cárites …
esguios …
a cólera não esquecer …
mortais …

Joaquim Brasil Fontes:


] [
Phoîbos crisoco]mo gerado pela filha de Kêos
unida ao Senhor das Nuvens,] o glorioso Kronida;
mas Ártemis, entre os deuses,] fez um sublime voto:
“Por tua cabe]ça, eu serei eternamente virgem,
indomável; no alto] cimo das montanhas solitárias,
caçadora: vem, coloca-me] a salvo, dá-me esta graça!”
Assim ela disse.] E o pai dos santos deuses concedeu.
Donzela-que-abate]-cervos, virgem selvagem, os deuses
e os homens a chama desde então:] é um nome glorioso.
Eros, que põe quebranto nos corpos,] não se aproxima
[de Ártemis]

Guilherme Gontijo Flores:


fr. 44A (= Alceu 304 LP)

(a) col. i

]nores . . [
Febo de áureos cabe]los que a f[ilha] do grão Coeu
junto ao Crôn]io de enorme renome gerou à luz
enquanto Ártemis] fez a promessa devida a um deus
“pela tua cebeça] eu serei sempre virgem só
indomada no cimo] das serras eu vou caçar
solitária e com isso] eu exijo essa graça em mim”
mal falou e sua graça] lhe deu o divino pai
como virgem que ca]ça e que mata cervídeos
deuses e homens e cha]mam por ótimo título
pois Amor solta-membros] não ousa tocá-la mais
] . [ . ] . . . . temer[ . . ] ´ . ou

(b) col. ii

ser[
e.[
r.e.[
o...[
dons il]ustres das Musas[
faz e logo das Graças[
delicado . [
não se esqueça da cólera . [
aos mortais e porém parti[lhar
]dalio[

Trajano Vieira:
[…]
A Apolo tranças de ouro, prole de Latona
que um dia uniu-se com Zeus de nome altissonante,
aos deuses Ártemis profere a grande jura:
“Por tua cabeça, juro preservar-me virgem
e sem o jugo caçarei pelas montanhas
solitárias. Concede-me, a mim, a graça!”
Falou e a ouve o patriarca dos eternos.
E à donzela do campo, todos denominam
caçadora de cervos. É seu nobre título.
Sequer fazer-lhe o cerco Eros ousa.

fr. 141
Giuliana Ragusa:
… e depois que uma cratera
de ambrosia foi misturada à água,
Hermes, tomando o jarro, vinhoverteu aos deuses.
E todos eles
seguravam cálices,
e libavam, e aguraram bons votos ao noivo …

Joaquim Brasil Fontes:


a ambrosia,
num cântaro transbordando;
Hermas com um jarro serviu os celestes,
E então eles todos,
largas taças nas mãos
fizeram libações e pediram graças
para o noivo

Guilherme Gontijo Flores:


ambrósia na taça
se misturavam
quando Hermes toma o jarro e verte vinho aos deuses
e todos conjuntos
ergueram copos
libando orando todas as bênçãos pelo noivo

fr. 166
Giuliana Ragusa:
… dizem que um dia Leda achou um ovo jacintino
na cor, coberto …

Joaquim Brasil Fontes (duas versões):


diz a lenda que certa vez
Leda encontrou um ovo da cor de jacintos

contam que Leda encontrou


sob folhas de jacinto, um ovo

Guilherme Gontijo Flores:


diz que Leda encontrou o ovo de cor igual
ao jacinto por sob < . . . >

Trajano Vieira:
Segundo consta, Leda teria encontrado
escondido
um ovo da coloração do jacinto.

Canção dos irmãos


(fragmento publicado em 2014)

Tadeu Andrade:
[…]

Mas sempre tagarelas para que Caraxo venha


Com o navio cheio. Eu penso que Zeus o sabe –
e todos os deuses –; mas tu não deves
pensar nisso,

Porém enviar-me e ordenar-me


Suplicar muito à rainha Hera
Para que Caraxo chegue aqui trazendo
o navio a salvo

E nos encontro incólumes. Todo o resto


Entreguemos aos numes,
Pois as calmarias de pronto surgem
de grandes ventanias;

A quem o rei do Olimpo quiser


Que um nume auxiliador os desvie
De seus labores, estes tornam-se venturosos
e muito afortunados.

E nós, se Lárico levantar


A cabeça e enfim se tornar um homem,
Certamente de pronto seríamos libertos
de muitos pesares.

Guilherme Gontijo Flores:


Nosso ]p[ai
[
]Lá[rico
mã[e

mas você diz que hoje Caraxo chega


com seu barco cheio — o que cabe a Zeus só
e outros deuses (creio) porém você nem
pense no assunto

antes me despeça e me peça agora


muitas preces para a senhora Hera
pra que enfim Caraxo por cá nos traga
logo seu barco

nos encontre salvos — e todo o resto


para os santos numes concederemos
pois bons dias de ventania intensa
vêm num instante

mas aquele a quem o senhor do Olimpo


manda um nome para salvar nos mares
certamente mostra-se mais alegre
próspero sempre
quanto a nós se Lárico levantasse
sua testa e então se tornasse um homem
sei que desta enorme tristeza todos
nos livraríamos.

Trajano Vieira:
Ninguém sussure: “Cáraxon voltou,
ele e os navios.” Eis algo da sabença
de Zeus e dos demais eternos. Não
remoas esse pensamento,

mas é preciso que eu me apresse à magna


Hera orar em muitas preces. Queira
trazer de volta a embarcação de Cáraxon
ao porto, bem como zarpou,

e nos encontre em gozo de saúde.


De todo o resto os deuses se encarreguem:
Que ao vento colossal suceda logo
jornadas só de calmaria.

Se é o querer do rei do Olimpo, um dâimone


orienta alguém e o tira do perigo,
e a venturança e a múltipla riqueza
passam a ser o seu quinhão.

E quanto a nós? Se Lárico soerguer a testa,


se um dia um homem ele vier a ser,
do imenso peso que atormenta a ânima
num átimo nos livraríamos.

Gabriel Nocci Macedo:

[1 ou 5 linhas perdidas][…]la[…
[…] tu (?) ma[

Mas tu estás sempre a repetir que Kharaxos vem


com uma nave repleta. Eu penso que Zeus
e todos os deuses sabem disso. E não é preciso
que tu penses nessas coisas.

Mas em vez disso envia-me e comanda-me


a dizer muitas rezas à rainha Hera,
para que Kharaxos retorne, navegando até aqui
em uma nave segura,

E que ele nos encontre sãos e salvos. O resto,


confiemo-lo todo aos deuses,
pois de uma forte ventania
logo advém a bonança.
E aqueles a quem o rei do Olimpo desejar
que uma divindade ajudante ora os desvie
das penas, eles tornam-se felizes
e plenamente abençoados.

E nós, se Larikhos erguer a cabeça


e se um dia se tornar um homem,
do grande e penoso fardo
logo seríamos liberados.

Bibliografia

ANDRADE, Tadeu Bruno da Costa. A referencialidade tradicional na poesia de Safo. Tese


(Dourado). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo,
2019.

ANDRADE, Tadeu; BRUNHARA, Rafael. Um poema grego. Traduções de Rafael Brunhara


(UFRGS) e Tadeu Andrade (UFBA). Disponível em: <https://medium.com/@umpoemagrego>.
Acesso em: 06 de out. de 2021.

FONTES, Joaquim Brasil. “Variações sobre a lírica de Safo”. Eros, tecelão de mitos. Iluminuras:
São Paulo, 2003.

MACEDO, Gabriel Nocchi. A nova Safo: tradução portuguesa do “Poema dos Irmãos”. O Estado
de São Paulo, 9 de dez. de 2017. Disponível em: <https://estadodaarte.estadao.com.br/a-nova-safo-
traducao-portuguesa-do-poema-dos-irmaos/>. Acesso em: 06 de out. de 2021.

SAFO. Fragmentos completos. Organização, tradução, introdução e notas Guilherme Gontijo


Flores. Revisão técnica: Leonardo Antunes. São Paulo: Editora 34, 2017.

SAFO de Lesbos. Hino a Afrodite e outros poemas. Organização e tradução: Giuliana Ragusa. 2ª
edição revista e ampliada. São Paulo: hedra, 2021.

VIEIRA, Trajano. Lírica grega, hoje. São Paulo: Perspectiva, 2017.

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