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CONTRIBUIÇÃO DA ESCOLA PARTICULAR

BRASILEIRA PARA O EXAME NACIONAL


DO ENSINO MÉDIO - ENEM

ANÁLISE SOBRE O ENEM:


(SUGESTÕES, ELOGIOS E
CRÍTICAS)
Sumário

Apresentação ...................................................................................... 03

Análises................................................................................................ 05

Linguagens, Códigos e suas Tecnologias............................. 06

Matemática e suas Tecnologias............................................ 08

Ciências da Natureza e suas Tecnologias............................ 11

Ciências Humanas e suas Tecnologias................................ 27

Conclusões.......................................................................................... 34

Equipe de análise................................................................................ 38
3 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

Apresentação

É louvável a preocupação do Ministério da Educação em obter mais


informações sobre o ENEM, visto que a vida de milhões de pessoas tem sido
influenciada anualmente por esse exame e 112 instituições federais e
estaduais de ensino superior utilizam as notas obtidas pelos candidatos em 26
estados e no Distrito Federal.
O ENEM, transformado em grandioso processo seletivo, deve também
ter como objetivo balizar e nortear todo o ensino da Educação Básica. Nesse
sentido, MEC e INEP podem e devem promover uma ampla discussão sobre o
estabelecimento de um programa curricular unificado para todo o território
brasileiro. Essa discussão precisa contemplar opiniões não apenas de mestres
e doutores em metodologia e didática, mas também de professores que estão
no dia a dia com os alunos. Quais são os conteúdos, habilidades e
competências relevantes? Quais assuntos que podem ser postergados para o
Ensino Superior? Essas são algumas das importantes questões que precisam
ser urgentemente respondidas.
Uma das nobres metas do ENEM é influir e orientar a melhoria do
Ensino Médio, servindo também como um eficiente processo de seleção para o
acesso à Educação Superior, sendo também um dos propulsores de uma
grande mudança na educação nacional, embora alguns ajustes ainda possam
ser feitos. Em comparação com a maioria dos vestibulares do país, o ENEM
mostra-se superior em diversos aspectos, mas isso não significa que não deva
ser aprimorado.
Com o intuito de auxiliar na melhoria do Exame Nacional do Ensino
Médio, apresentamos a seguir algumas análises das 4 grandes áreas por ele
exploradas (Linguagens e Códigos, Matemática, Ciências da Natureza e
Ciências Humanas). Foram realizadas considerações a respeito das matrizes
de referências (competências, habilidades e objetos de conhecimento), das
qualidades e falhas de algumas questões apresentadas nos últimos exames,
de características da prova de redação, entre outras.
Obviamente, as naturais diferenças entre as disciplinas que compõem
cada uma das 4 áreas exploradas no ENEM fizeram com que as análises
4 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

apresentassem ideias e formatos diferenciados. Acreditamos que o


estabelecimento de um padrão único para a apresentação desses pareceres
engessaria o trabalho das pessoas que se debruçaram em apresentar suas
opiniões sobre o Exame Nacional do Ensino Médio.
5 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

Análises

1) Linguagens, Códigos e suas Tecnologias


Propósito, planejamento e consecução (aqui entendida como a aplicação
e a correção de provas) são as etapas essenciais de qualquer exame que se
proponha a avaliar e selecionar candidatos em qualquer área. No ENEM, no
caso da prova de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, incluída aí a
Redação, aquilo que chega aos alunos é digno de elogio, principalmente se
comparado à maioria dos vestibulares brasileiros.
A questão é o que antecede e o que sucede uma prova como essa. A
preparação, os temores, a expectativa e a decepção que vêm caracterizando o
exame de nossa área nos últimos anos precisam ter uma resposta digna por
parte de quem idealiza o processo.

O ENEM, na área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, como


alternativa que se pretende aos exames tradicionais, atinge os propósitos
verificados no rol de competências e habilidades.
O fato, porém, é que, além desse papel de norteador de caminhos, é
necessário que a eficiência seja respaldada pela clareza de orientações, pela
transparência dos objetivos da prova e, principalmente, por uma resposta
explícita à comunidade estudantil, aos professores, à sociedade enfim, de
como uma área tão singular como a de Linguagens, Códigos e suas
Tecnologias concorrerá para uma avaliação que prime não só pela
inventividade de suas questões, mas também pela objetividade de seus
critérios de avaliação.
Antes de trabalhar esse aspecto, que tem se mostrado falho no caso do
exame de redação, pontuemos apenas alguns itens relacionados à nossa
matriz de referência. A extensão deste trabalho não nos permite uma análise
mais detalhada, por isso, seguem aqui somente determinados tópicos de um
conjunto maior:

em alguns pontos da lista de habilidades, quando se utiliza


“reconhecer” e “identificar”, a impressão dada é a de que não há
6 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

propriamente uma diferença entre alguns itens, aproximando


sobremaneira o limite entre o que poderia estar em mais de uma
habilidade.
essa sensação de uma proximidade extrema é o que se observa, por
exemplo, entre as competências de área (1) e (9);
a competência de área (5), que menciona “recursos expressivos das
linguagens”, tem as habilidades estritamente voltadas à literatura, o
que limita o seu campo de aplicação; observe-se que na competência
de área (6) há menção aos “sistemas simbólicos das diferentes
linguagens”, e isso poderia remeter, portanto, ao caso das
habilidades da área (5) e, muito mais claramente, aos da área (3) –
linguagem corporal – e (4) – artes.
a competência de área (8) passa a impressão de ser aquela voltada
a uma abordagem linguística que “flerte” com enfoque mais
tradicional ou ligado à norma culta, algo mais palpável ao professor
que está em sala de aula e tem o livro didático como referência.
Nada contra as habilidades indicadas nessa área (8), mas elas
seguramente poderiam aparecer nomeadas em muitas das outras
competências de área, e sua inclusão específica, portanto, remete
àquele caráter limitador;
Assim, as fronteiras muito frágeis entre certas competências de áreas e
os rótulos advindos da nomeação de algumas habilidades podem resultar em
imprecisão no momento em que se pretende estabelecer um padrão de
questionamento mais arejado, inovador.
À crítica de alguns, que entendem as competências e habilidades como
algo asfixiante, limitador de “conteúdos”, poderia haver como resposta
justamente a explicitação dos propósitos de cada questão. Não nos
esqueçamos de que um exame nacional em um país com a dimensão do Brasil
implicará o trabalho de professores e escolas de realidade distintas, extremas,
e o próprio exame poderia, per si, se prestar a uma tarefa didática: por que não
indicar, questão a questão, a competência de área e a habilidade que
inspiraram o questionamento? Para muitos docentes, esse seria um norte
concreto daquilo que a prova de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
pretende.
7 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

Nesse sentido, a prova de redação segue o mesmo tom, uma vez que as
suas orientações ganham ares de generalidades quando não há uma
explicação mais detalhada, precisa, daquilo que orientará o exame.
Convenhamos: as informações disponibilizadas no site oficial da prova em
2011, dada a superficialidade, mais confundiam do que transmitiam clareza e
segurança ao candidato.
Os temas, por sua vez, respondem a demandas importantes e
interessantes com relação à realidade que vivemos. São instigantes, permitem
abordagens amplas, valorizam um aluno crítico.
O que não se pode mais admitir, em hipótese alguma, é a mesma
tragicomédia ano a ano: os alunos parecem valorizar mais o exame de redação
do que a própria logística do exame, tamanhos são os absurdos que envolvem
o pós-prova, notadamente no momento da correção. Desnecessário lembrar os
casos que pontuaram o ano de 2011, mas uma medida que amenizaria a
sensação de que “tudo vale” na prova de redação do ENEM, bastando para
isso um recurso junto à justiça, seria a divulgação imediata, logo após a
avaliação, dos critérios de correção do tema. Naturalmente, de forma
detalhada, pública, para que a regra fosse conhecida por todos. Essa é a
transparência que desmontaria, inclusive, todo o mito, senão “folclore”, em
torno de uma prova que precisa ser, basicamente, clara e efetiva em sua
intenção de avaliar a competência escrita do candidato, sem que se criem
monstros em torno de um momento tão crucial para o estudante.
Apesar de reconhecer a importância da redação e de saber que as
instituições de ensino utilizam de forma diferenciada as 5 notas geradas no
ENEM para cada candidato, deve-se mencionar que é excessivo o peso dado à
redação na nota geral dos alunos divulgada pelo MEC. Sem desmerecer a
relevância de conseguir produzir um bom texto, isso não corresponde de forma
alguma (e nem deveria) a 50% do que se é trabalhado em sala de aula com os
alunos. Talvez algo entre 20% e 30% da nota global, seja um percentual mais
adequado e equilibrado para valorar a redação.
8 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

2) Matemática e suas Tecnologias

O presente texto não tem por objetivo analisar se o ENEM pode ou não
ser o instrumento de avaliação para o ingresso em universidades brasileiras.
Pretende sim, principalmente, fornecer elementos para uma reflexão sobre
como a disciplina de Matemática está sendo abordada nesse exame.
Analisando os dois últimos anos da prova de Matemática do ENEM, é
possível constatar diversos descuidos que poderiam (e devem) ser evitados:
distribuição inadequada entre as habilidades, apesar do grande número de
questões na prova; similaridade entre muitas questões; tendência para um
nível cada vez mais baixo quanto ao grau de dificuldade das questões;
questões contextualizadas de forma frágil e/ou forçada, contrariando a
orientação da utilização de contextos reais; ausência de assuntos significativos;
existência de quantidade considerável de questões que contemplam assuntos
do Ensino Fundamental, deixando de lado aspectos importantes e
exaustivamente trabalhados no Ensino Médio.
Vale ainda enfatizar que não há atualmente no Brasil um programa
unificado da área do conhecimento Matemática para o Ensino Médio. Isso pode
ser constatado pela simples observação da existência de determinados
conteúdos em alguns livros e a sua completa exclusão em outros. Exemplos:
“cônicas”, “limites” e “derivadas”. Apenas constatar é insuficiente. É necessário
que isso seja modificado visando a melhorias no processo educacional.
No início dessa análise sobre o ENEM, foi comentado que esse exame
deve assumir como um de seus objetivos balizar e nortear todo o ensino da
Educação Básica. A propósito, o Exame Nacional do Ensino Médio poderia ser
o ponto de partida para o estabelecimento de um programa de Matemática
unificado para todo o Brasil. De antemão, é possível afirmar que o conteúdo
programático proposto pelo ENEM em seus objetos de conhecimento é
excessivo. A exemplo do SAT norte-americano, a grade curricular poderia ser
reduzida em aproximadamente 20% ou 30%, eliminando-se subitens de todos
os capítulos da Álgebra, Geometria e Trigonometria.
O principal objetivo dessa proposta de redução programática é evitar
que diversos temas sejam tratados superficialmente ou sem relação com o
9 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

cotidiano dos educandos. É essencial tratar de uma quantidade menor de


temas, para que possam ser abordados com maior qualidade, aplicabilidade e
profundidade, transformando a Matemática em objeto de estudo significativo e
apreciado pelos estudantes. Nenhum educador sério pretende fazer com que o
aluno do Ensino Médio estude menos, e sim, que empregue honestamente o
seu tempo, preparando-se melhor para as elevadas exigências futuras:
raciocínio lógico, boa escrita e oralidade, cultura geral, cidadania, valores,
respeito ao meio ambiente, aptidão às tecnologias, etc.
A seguir, é apresentado um exemplo para reformulação dos objetos de
conhecimento. Nesse caso, o tema escolhido foi funções, em que dos 10 itens
citados, 4 foram excluídos e os outros 6 foram mais bem descritos:

a) Notação e definição de função.


b) Valor numérico. Representação no sistema cartesiano. Raízes de uma
função. Domínio e imagem.
c) Função do 1.º grau. Definição. Representação gráfica. Crescimento e
decrescimento. Estudo do sinal.
d) Função do 2.º grau. Definição. Representação gráfica. Vértice da parábola.
Crescimento e decrescimento. Estudo do sinal.
e) Função modular (Excluir do programa)
f) Inequações modulares (Excluir do programa)
g) Funções pares e funções ímpares (Excluir do programa)
h) Funções sobrejetoras, injetoras e bijetoras (Excluir do programa)
i) Função inversa. Definição. Obtenção da inversa. Representação gráfica.
j) Função composta. Definição. Obtenção da função composta.
Representação no diagrama de Venn e no sistema cartesiano.

O zelo no detalhamento mais primoroso dos conteúdos do programa do


Ensino Médio, evita que o professor ministre funções sobrejetoras, injetoras,
bijetoras; pares e ímpares; funções e inequações modulares. São temas
complexos, desmotivantes e que não servem de pré-requisitos aos cursos das
áreas biológicas e humanas. Alguém poderia contra-argumentar que interessa
aos cursos das áreas exatas! Sim, para isso há a cadeira de Cálculo Diferencial
e Integral no primeiro ano desses cursos.
10 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

Discutido e aprovado esse programa unificado, o passo seguinte seria


elaborar uma Matriz de Referência à luz dos assuntos constantes no programa.
As chamadas habilidades e competências externariam não apenas como
seriam avaliados esses assuntos, mas também mostrariam ao professor e
aluno, de forma mais clara, como poderia ser o ensino e de que forma se daria
a aprendizagem.
11 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

3) Ciências da Natureza e suas Tecnologias


A área denominada Ciências da Natureza e suas Tecnologias engloba
os conhecimentos fundamentais da Química, da Física e da Biologia desejáveis
para que um estudante exerça a sua cidadania e, com espírito crítico, possa
entender, interpretar e participar ativamente das mudanças sociais,
econômicas, políticas e tecnológicas do mundo em que está vivendo.
Separadas por áreas do conhecimento (assim como estão os objetos de
conhecimento na matriz de referência) seguem algumas reflexões que podem
oferecer subsídios para a melhoria desse exame.

Física
É inegável: no que diz respeito aos conhecimentos relacionados à
Física, os testes aplicados no ENEM geralmente são bem formulados e
compatíveis com a matriz de competências e habilidades que norteia a prova.
Mas, apesar dos justos elogios que esse exame merece, acreditamos ser
possível melhorá-lo.
Os vestibulares, em especial os das universidades públicas, motivam
muitos alunos de ensino médio a se dedicarem mais aos estudos. Esses
exames também norteiam as ações de professores engajados em ajudar os
educandos a desenvolverem habilidades para serem bem sucedidos. É por
isso que sugerimos que o ENEM evite desviar-se da característica mais
marcante e positiva que essa avaliação sempre manteve desde que foi
instituída: ser uma prova para fazer o aluno pensar. Assim, questões como as
que envolveram gráficos em 2011e só podem ser respondidas mediante
análise e reflexão, são bastante desejáveis. Observe:

QUESTÃO)
Para que uma substância seja colorida ela deve absorver luz na região do
visível. Quando uma amostra absorve luz visível, a cor que percebemos é a
soma das cores restantes que são refletidas ou transmitidas pelo objeto. A
Figura 1 mostra o espectro de absorção para uma substância e é possível
observar que há um comprimento de onda em que a intensidade de absorção é
máxima. Um observador pode prever a cor dessa substância pelo uso da roda
12 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

de cores (Figura 2): o comprimento de onda correspondente à cor do objeto é


encontrado no lado oposto ao comprimento de onda da absorção máxima.

Qual a cor da substância que deu origem ao espectroda Figura 1?


A) Azul.
B) Verde.
C) Violeta.
D) Laranja.
E) Vermelho.

QUESTÃO)
O processo de interpretação de imagens capturadas por sensores instalados a
bordo de satélites que imageiam determinadas faixas ou bandas do espectro
de radiação eletromagnética (REM) baseia-se na interação dessa radiação com
os objetos presentes sobre a superfície terrestre. Uma das formas de avaliar
essa interação é por meio da quantidade de energia refletida pelo objeto. A
relação entre a refletância de um dado objeto e o comprimento de onda da
REM é conhecida como curva de comportamento espectral ou assinatura
espectral para objetos comuns na superfície terrestre.
13 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

De acordo com as curvas de assinatura espectral apresentadas na figura, para


que se obtenha a melhor discriminação dos alvos mostrados, convém
selecionar a banda correspondente a que comprimento de onda em
micrômetros (μm)?
A)0,4 a 0,5.
B)0,5 a 0,6.
C)0,6 a 0,7.
D)0,7 a 0,8.
E) 0,8 a 0,9.

Levando-se em consideração a quantidade de questões e o tempo para


se responder a prova, os textos apresentados poderiam e deveriam ser mais
objetivos. Nota-se que, em muitas questões são contadas “histórias”
irrelevantes na tentativa de contextualizar. Em alguns casos, seria possível até
retirar parágrafos inteiros sem qualquer prejuízo na compreensão. No exame
de 2011, em uma questão que tratava da comparação entre dois chuveiros
elétricos, o segundo parágrafo é um bom exemplo disso: além de poder ser
suprimido sem prejuízo do entendimento ou contextualização, sua exclusão
também evitaria desviar a atenção do aluno para aspectos que não eram
relevantes. Observe:

QUESTÃO)
Em um manual de um chuveiro elétrico são encontradas informações sobre
algumas características técnicas, ilustradas no quadro, como a tensão de
alimentação, a potência dissipada, o dimensionamento do disjuntor ou fusível,
e a área da seção transversal dos condutores utilizados.

Uma pessoa adquiriu um chuveiro do modelo A e ao ler o manual verificou que


precisava ligá-lo a um disjuntor de 50 amperes. No entanto, intrigou-se com o
14 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

fato de que o disjuntor a ser utilizado para uma correta instalação de um


chuveiro do modelo B devia possuir amperagem 40% menor.
Considerando-se os chuveiros de modelos A e B, funcionando à mesma
potência de 4 400 W, a razão entre as suas respectivas resistências elétricas,
RAe RB, que justifica a diferença de dimensionamento dos disjuntores, é mais
próxima de:
A) 0,3
B) 0,6
C) 0,8
D) 1,7
E) 3,0

As habilidades descritas na matriz proposta pelo ENEM são


abrangentes, pertinentes e favorecem a elaboração de uma prova capaz de
selecionar alunos com um perfil interessante para frequentar a vida acadêmica.
Apesar de reconhecermos que, devido à limitação do número de questões, é
difícil abordar toda a matriz, observamos um procedimento que julgamos
inadequado: cobrar, em uma mesma prova, repetidas vezes uma determinada
habilidade em detrimento de outras. Como exemplo, destacamos que na prova
de 2009 havia duas questões (a da usina termossolar e a da gasolina) que
exigiam as mesmas habilidades. Assim, mesmo que ambas sejam questões
excelentes, que exigem raciocínio e conhecimento teórico, acreditamos que
apenas uma delas seria suficiente. Observe:

QUESTÃO)
O Sol representa uma fonte limpa e inesgotável de energia para o nosso
planeta. Essa energia pode ser captada por aquecedores solares, armazenada
e convertida posteriormente em trabalho útil. Considere determinada região
cuja insolação — potência solar incidente na superfície da Terra — seja de 800
watts/m2. Uma usina termossolar utiliza concentradores solares parabólicos
que chegam a dezenas de quilômetros de extensão. Nesses coletores solares
parabólicos, a luz refletida pela superfície parabólica espelhada é focalizada
em um receptor em forma de cano e aquece o óleo contido em seu interior a
400 °C. O calor desse óleo é transferido para a água, vaporizando-a em uma
15 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

caldeira. O vapor em alta pressão movimenta uma turbina acoplada a um


gerador de energia elétrica.
Considerando que a distância entre a borda inferior e a borda superior da
superfície refletora tenha 6 m de largura e que focaliza no receptor os 800
watts/m2 de radiação provenientes do Sol, e que o calor específico da água é 1
cal g-1oC-1 = 4.200 J kg-1oC-1, então o comprimento linear do refletor parabólico
necessário para elevar a temperatura de 1 m3 (equivalente a 1 t) de água de 20
°C para 100 °C, em uma hora, estará entre
A) 15 m e 21 m.
B) 22 m e 30 m.
C) 105 m e 125 m.
D) 680 m e 710 m.
E) 6.700 m e 7.150 m.

QUESTÃO)
É possível, com 1 litro de gasolina, usando todo o calor produzido por sua
combustão direta, aquecer 200 litros de água de 20 °C a 55 °C. Pode-se
efetuar esse mesmo aquecimento por um gerador de eletricidade, que
consome 1 litro de gasolina por hora e fornece 110 V a um resistor de 11 Ω,
imerso na água, durante um certo intervalo de tempo. Todo o calor liberado
pelo resistor é transferido à água.
Considerando que o calor específico da água é igual a 4,19 J g -1 °C-1,
aproximadamente qual a quantidade de gasolina consumida para o
aquecimento de água obtido pelo gerador, quando comparado ao obtido a
partir da combustão?
A) A quantidade de gasolina consumida é igual para os dois casos.
B) A quantidade de gasolina consumida pelo gerador é duas vezes maior que a
consumida na combustão.
C) A quantidade de gasolina consumida pelo gerador é duas vezes menor que
a consumida na combustão.
D) A quantidade de gasolina consumida pelo gerador é sete vezes maior que a
consumida na combustão.
E) A quantidade de gasolina consumida pelo gerador é sete vezes menor que a
16 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

consumida na combustão.
É sabido que um professor pode ensinar qualquer tema, usando
estratégias variadas. No caso, por exemplo, do Teorema de Arquimedes, ele
pode focar-se nos conceitos, de maneira que o aluno possa entender a razão
de um corpo afundar ou flutuar ou pode ater-se a, simplesmente, ensinar
métodos para cálculo da intensidade das forças que atuam em corpos em
equilíbrio em um fluido. Como o mesmo tema pode ser tratado com
abordagens diferentes, a opção feita pelo professor pode ser influenciada pelas
questões presentes nos vestibulares. Assim, acreditamos que, ao utilizar testes
que não estimulam somente a habilidade mnemônica, o ENEM, indiretamente,
ajuda a promover reformas no currículo do Ensino Médio.
Diferente do que se esperava, a questão a seguir, do exame de 2011,
podia ser solucionada por um aluno que simplesmente memorizou algoritmos
para resolver os famosos problemas de “bloquinhos”, herança dos vestibulares
dos anos 70. Apesar de esse tipo de teste ainda ser frequente em alguns
vestibulares atuais, é incapaz de mensurar o conhecimento científico dos
alunos e, consequentemente, não combina com o estilo e a qualidade do
ENEM. Observe:
QUESTÃO)
Em um experimento realizado para determinar a densidade da água de um
lago, foram utilizados alguns materiais conforme ilustrado: um dinamômetro D
com graduação de 0 N a 50 N e um cubo maciço e homogêneo de 10 cm de
aresta e 3 kg de massa. Inicialmente, foi conferida a calibração do
dinamômetro, constatando-se a leitura de 30 N quando o cubo era preso ao
dinamômetro e suspenso no ar. Ao mergulhar o cubo na água do lago, até que
a metade de seu volume ficasse submersa, foi registrada a leitura de 24 N no
dinamômetro.
17 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

Considerando que a aceleração da gravidade local é de 10 m/s 2, a densidade


da água do lago, em g/cm3, é
A) 0,6.
B) 1,2.
C) 1,5.
D) 2,4.
E) 4,8.

Apesar de a lista de Objetos de Conhecimento apresentada anexa à


matriz de referência das Ciências da Natureza constituir uma evidente evolução
em relação aos extensos programas apresentados pela maioria dos
vestibulares, acreditamos ainda ser possível e desejável eliminar alguns itens.
Essa posição é corroborada pelo prêmio Nobel de Física, Richard Feyman
(1918-1988), que em certa ocasião visitou o Brasil, para investigar o nível de
conhecimento dos nossos alunos. Em um de seus livros, Feyman relatou que,
entre estudantes do mundo inteiro, os brasileiros eram os que mais estudavam
Física no Ensino Médio, mas os que menos aprendiam essa disciplina.
Pensando nessa redução de programa, sugerimos retirar da lista de
Objetos de Conhecimento os seguintes itens:
Noção de sistemas de referência inerciais e não inerciais.
Influência na Terra: marés e variações climáticas (gravitação).
Concepções históricas sobre a origem do universo e sua evolução.
Lei de Coulomb.
Campo elétrico e potencial elétrico.
Linhas de campo.
Superfícies equipotenciais.
Poder das pontas.
Blindagem.
Comportamento de Gases ideais
Apesar de cada um desses temas possuir sua importância dentro das
Ciências da Natureza e em especial na Física, entendemos que já são
estudados em outras disciplinas, ou podem ser abordados apenas em cursos
universitários voltados às ciências exatas. Com isso, os assuntos restantes
18 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

nortearão escolas de todo o país a reescreverem seus currículos, para que


finalmente nossos alunos aprendam de Física tanto quanto lhes é ensinado.

Química
Uma análise inicial da lista de Objetos de Conhecimento anexa à
matriz de referência das Ciências da Natureza evidencia que pouca (ou
nenhuma) inovação foi introduzida nos títulos, temas e itens elencados. Quem
trabalha há muito tempo com a Química do Ensino Médio percebe a presença
dos velhos, discutíveis e intercopiados programas de secretarias estaduais e
municipais de ensino, de livros didáticos e de vestibulares em geral.
Acreditamos que está na hora de o ENEM influenciar inovando, criando,
incluindo, enxugando, enfim, propondo temas realmente relevantes e que toda
disciplina oferece. Para isso, deve-se estabelecer uma estrutura de tópicos cuja
organização encaminhe uma linha de desenvolvimento capaz de conduzir a um
aprendizado eficaz e atraente.
A Química tem a sua própria linguagem, que é muito rica e precisa ser
conhecida. Os fenômenos químicos têm características singulares e a
compreensão delas deve ser a meta. As situações-problema com que
diariamente nos deparamos pedem que a preparação dos alunos privilegie
diferentes formas de representação, organização e interpretação, típicas da
disciplina. A construção da argumentação passa pelo conhecimento das
situações concretas que devem ser devidamente exploradas nos conteúdos
desenvolvidos. Assim, um programa bem detalhado e claro seria essencial
para orientar alunos e professores. Seria, então, interessante uma orientação a
respeito de quais habilidades poderiam ser exploradas no estudo de objeto de
conhecimento.
Comentando partes do programa vigente, alguns importantes reparos
poderiam ser feitos:
No início da citação dos objetos de conhecimento, menciona-se
Transformações Químicas – Evidências... e logo em seguida, como
se estivéssemos tratando do mesmo assunto, aparece Sistemas
gasosos, Lei dos gases.
A interdisciplinaridade é evidente entre os ramos das Ciências da
Natureza, mas a programação deve ressaltar isso de forma mais clara.
19 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

Esse é um bom momento para se reformular a Matriz de Referência, a


fim de ficar compatível com o que o próprio Comitê de Governança do
Ministério da Educação por meio do INEP preconizou: “...expressar
integração crescente entre as três áreas...” ao se referir à Química,
Física e Biologia.
A clareza, sem redundâncias, deve ser perseguida. Parece repetitivo
mencionar “Natureza elétrica da matéria. Modelo atômico de
Thomson, Rutherford,...”, pois estudar esses modelos é estudar
progressivamente a natureza elétrica da matéria, contextualizando o
progresso da ciência com os acontecimentos históricos, situação
geográfica e social. Nesse ponto, vale salientar também a existência de
uma grande lacuna: o conceito científico de Modelo. Em outras
palavras, faltou dar destaque ao raciocínio indutivo, aos métodos, às
ferramentas, enfim, aos complexos caminhos da ciência para se
estabelecer modelos e saber fazer uma análise dos limites e da validade
da cada um.
Química orgânica é o capítulo mais longo da Química, afinal, sob esse
título, qualquer coisa da área poderia fazer parte do exigível. O que deve
ser feito é a especificação somente daquilo que é mais adequado e
próprio ao Ensino Médio. No lugar de “Principais funções orgânicas”,
melhor seria destacar: Hidrocarbonetos, Álcoois, Fenóis, Aldeídos,
Cetonas, Ácidos Carboxílicos, Ésteres (e não genericamente
“Compostos orgânicos oxigenados”), Aminas, Aminoácidos. Seria
interessante também propor como o título Principais Hidrocarbonetos
e suas estruturas, especificando em cada um o que é adequado
conhecer: Alcanos, Alquenos, Ciclanos, Benzeno e os Aromáticos. Toda
a química dos compostos do carbono pode ser construída a partir dessa
importante função.
Sobre a estrutura das substâncias, propor um destaque especial para o
estudo do comportamento físico, químico e fisiológico. Isso seria mais
prazeroso, motivador, e por que não dizer correto, à luz da análise
estrutural de substâncias quaisquer. Aqui, a integração das áreas fica
evidente e atraente ao estudante. Caberiam subitens como a variação
das propriedades físicas com a geometria estrutural, efeito detergente,
20 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

solubilidade, classificações com base nas estruturas (sem retirar as


históricas: ácidos, bases, sais, óxidos,...). O estudo da isomeria deve
reforçar essa abordagem incluindo desde as diferenças acentuadas
entre alguns compostos de mesma composição molecular, passando
também pelas distinções sutis de alguns casos de isomeria espacial e
chegando às diferenças importantíssimas que a bioquímica e a
fármacodinâmica destacam na isomeria óptica.
“Compostos de Carbono” - esse tema (tão genérico e vago quanto o
antigo “Química Orgânica”) poderia ter algum item relacionado ao
estudo minucioso do próprio carbono, elemento químico conhecido pela
sua capacidade ímpar no poder e versatilidade ligante, e que vem nos
últimos anos mostrando essa propriedade nas suas incontáveis
substâncias simples que vieram a se somar ao diamante e ao grafite (a
famosa Alotropia). Primeiro apareceram os Fulerenos, depois os
Nanotubos, e mais recentemente os Grafenos. Não nos esquecendo de
que no meio “desse caminho” há uma infinidade de substâncias
químicas formadas somente de átomos de carbono com diferentes
números de átomos e estruturas espaciais. Esse é um novo campo de
pesquisa que está em franco desenvolvimento. Esses materiais estão na
linha de frente de avanços tecnológicos já conquistados que prestam
serviço à medicina moderna e à química dos materiais, até aos novos
componentes de hardware produzindo progresso profundo na área da
informática de processamento de dados, das máquinas digitais, como
fotográficas, filmadoras, celulares, robôs, aparelhos diagnósticos da
medicina e os de pesquisa laboratorial.
No capítulo sobre polímeros deveriam ser incluídos os mais modernos,
desde os usados na fabricação de recipientes diversos, passando pelas
resinas, fibras sintéticas, lacas e polímeros condutores. Todos eles
ocupam lugar de destaque nos avanços tecnológicos conseguidos nos
últimos tempos. Os mais tradicionais devem ser mantidos, mas não
como únicos mencionados.
No importante item Relações da Química com as Tecnologias, a
Sociedade e o Meio Ambiente, os conteúdos descritos, da forma como
foram apresentados, fazem lembrar o cartaz daquela padaria que dizia
21 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

“pão sem química”, como se a Química fosse algo que acontece


exclusivamente em laboratórios ou indústrias. A Química não está no
cotidiano: ela é o nosso cotidiano. O ser humano pensante, a fauna e a
flora, o ar, os mares, os rios, o solo, o subsolo são a Química em ação.
Até em nossos sentimentos a ciência mostra a interferência química.
Esse capítulo é um bom momento para ousar, para fazer a diferença,
para conquistar essa geração que dispõe de recursos inimagináveis ao
seu alcance. Para isso, deve-se expor de forma mais evidente a
presença da Química em tudo aquilo que a afeta, que a preocupa e que
lhe interessa.
Temas como Reciclagem e Sustentabilidade deveriam ser
mencionados explicitamente, sendo que poderiam ser incluídos no final
da matriz de referência no item Energias Químicas no Cotidiano. A
análise das diferentes e variadas fontes de combustíveis e a geração de
energia a partir delas, merecem um destaque compatível com a grande
complexidade e importância desses assuntos.

Biologia
Um mérito importante das questões envolvendo a disciplina de Biologia
nas provas do ENEM é a contextualização e atualidade com os grandes temas
que esta ciência tem revelado. A desvalorização da memorização e da
reprodução de uma infinidade de termos e conceitos biológicos que, na maioria
das vezes, não apresentam a menor noção de aplicabilidade é outra qualidade
desse exame.
A concepção de um ensino que busca desenvolver habilidades e formar
competências tem-se refletido na forma como as questões de Biologia se
apresentaram no ENEM em 2010 e 2011. Este fato deve ser ressaltado, pois
uma prova bem estruturada também funciona como um orientador, para que as
escolas destaquem a importância de o aluno ter um papel atuante nos
processos de aprendizagem. Além disto, os modelos de questões de Biologia
deste biênio norteiam práticas pedagógicas e didáticas aos professores. Isso é
essencial, visto que cabe a eles a função de estimular o desenvolvimento tanto
particular como coletivo de seus alunos.
22 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

Verifica-se, também, por intermédio da riqueza de infográficos, gráficos,


tabelas, esquemas e figuras apresentados nos testes, o destacado papel da
Biologia em contribuir para o desenvolvimento do domínios das diferentes
linguagens. O que se percebe ao longo das questões, não é apenas o estímulo
às linguagens técnicas, mas também a análise de textos e a valorização da
leitura crítica, uma vez que a complexidade variável dos enunciados apela para
uma interpretação holística e integradora de conhecimentos de diferentes
áreas. Este aspecto, verificado de forma mais intensa nos exames de 2010 e
2011, reforça a necessidade de as escolas reestruturarem suas atividades.
Questionamentos como os verificados nestas duas provas, orientam para um
trabalho pedagógico e didático que vise estimular a leitura, a produção de
textos e relatórios, a realização de atividades experimentais e o
desenvolvimento de atividades em grupo.
A seguir é apresentada uma questão da prova de 2011 e que serve de
exemplo da necessidade de uma boa leitura crítica. Nesse teste, o
conhecimento de fundamentos da Biologia nos processos de decomposição da
matéria orgânica, bem como uma adequada compreensão do texto, são
essenciais para se encontrar a alternativa correta:
Questão)
Para evitar o desmatamento da Mata Atlântica nos arredores da cidade de
Amargosa, no Recôncavo da Bahia, o Ibama tem atuado no sentido de
fiscalizar, entre outras, as pequenas propriedades rurais que dependem da
lenha proveniente das matas para a produção da farinha de mandioca, produto
típico da região. Com isso, pequenos produtores procuram alternativas como o
gás de cozinha, o que encarece a farinha.
ma alternativa viável, em curto prazo, para os produtores de farinha em
Amargosa, que não cause danos à Mata Atlântica nem encareça o produto é a
A) construção, nas pequenas propriedades, de grandes fornos elétricos para
torrar a mandioca.
B) plantação, em suas propriedades, de árvores para serem utilizadas na
produção de lenha.
C) permissão, por parte do Ibama, da exploração da Mata Atlântica apenas
pelos pequenos produtores.
23 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

D) construção de biodigestores, para a produção de gás combustível a partir de


resíduos orgânicos da região.
E) coleta de carvão de regiões mais distantes, onde existe menor intensidade
de fiscalização do Ibama.
Outro aspecto importante verificado nas questões de Biologia do ENEM
no biênio 2010 – 2011é uma melhoria significativa na adequação delas às
competências propostas na matriz de referência. Isto porque, a efetiva
compreensão de fenômenos naturais se apresenta como uma das
competências mais evidentes a serem buscadas no processo de ensino e de
aprendizagem das Ciências da Natureza. Nesse sentido, o ENEM tem
apontado para os educadores de ciências a necessidade de colocar os
procedimentos técnicos em seu devido lugar de importância, qual seja: o
conhecimento das técnicas, não como um fim teórico em si mesmo, mas, sim,
como um meio de se acessar, conhecer e compreender os fenômenos naturais.
No aspecto referente à problematização do conhecimento científico,
verificamos também um grande avanço no sentido de corresponder à
expectativa gerada pela matriz de referência. É também justamente neste
momento em que a tão propagada e questionada interdisciplinaridade entra em
campo e mostra seu potencial. Na apresentação de soluções às situações-
problemas, todo o potencial inventivo e a capacidade de fazer relações entre
diferentes conhecimentos do estudante são postas à prática. Enunciados
envolvendo atualidades científicas publicadas pela mídia, em geral, foram
muito bem utilizadas. Enunciados relativamente mais curtos e objetivos em
relação a anos anteriores também valorizaram as questões de Biologia das
últimas versões do ENEM. Enfim, todas as capacidades cognitivas voltadas,
não apenas para a compreensão dos fenômenos, mas também para a
aplicabilidade a problemas reais e presentes nas demandas de nossa
sociedade como, por exemplo, questões de destinação do lixo, produção de
energia e relacionamento com os demais organismos da biosfera, etc..
Observe um exemplo:
24 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

Questão)
O controle biológico, técnica empregada no combate a espécies que causam
danos e prejuízos aos seres humanos, é utilizado no combate à lagarta que se
alimenta de folhas de algodoeiro. Algumas espécies de borboleta depositam
seus ovos nessa cultura. A microvespa Trichogramma sp. introduz seus ovos
nos ovos de outros insetos, incluindo os das borboletas em questão. Os
embriões da vespa se alimentam do conteúdo desses ovos e impedem que as
larvas de borboleta se desenvolvam. Assim, é possível reduzir a densidade
populacional das borboletas até níveis que não prejudiquem a cultura.

A técnica de controle biológico realizado pela microvespa Trichogramma sp.


consiste na
A) introdução de um parasita no ambiente da espécie que se deseja combater.
B) introdução de um gene letal nas borboletas, a fim de diminuir o número de
indivíduos.
C) competição entre a borboleta e a microvespa para a obtenção de recursos.
D) modificação do ambiente para selecionar indivíduos melhor adaptados.
E) aplicação de inseticidas

Apesar do grande avanço que houve nas provas do ENEM do último


biênio em relação a anos anteriores, convém destacar um ponto importante em
que o INEP deveria dar atenção no sentido de melhorar a qualidade do exame
em relação aos conteúdos de Biologia: esporadicamente os temas de Biologia
envolvem assuntos ligados aos programas de saúde (verminoses,
protozoonoses e algumas viroses típicas do território brasileiro).
Dada a importância e os aspectos midiáticos que envolvem a prova do
ENEM, tem-se um momento adequado para se discutir questões de saúde
ligadas aos hábitos alimentares e ao padrão de vida moderna, especialmente,
ao modo de vida urbano. Muitas doenças que castigam nossa sociedade e
oneram os cofres dos serviços de saúde pública (doenças vasculares, enfartos,
AVC, diabetes, doenças neurológicas e renais) se desenvolvem desde a
infância por causa de maus hábitos e falta de conhecimento das funções
orgânicas básicas do corpo humano. Questões que explorassem o aspecto
biológico das principais doenças na raiz de suas causas serviriam como um
25 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

forte estímulo para as escolas calibrarem seus currículos no sentido de


trabalhar tanto o conhecimento das ciências biológicas, como o
desenvolvimento de uma consciência corporal mais prática, saudável e
objetiva.
Na questão a seguir, da prova de 2011, temos um exemplo em que foi
desperdiçada uma bela oportunidade de se discutir aspectos da genética,
saúde humana e hábitos modernos. A questão se debruça em analisar apenas
aspectos de teoria pura do DNA. Observe:

Questão)
Nos dias de hoje, podemos dizer que praticamente todos os seres humanos já
ouviram em algum momento falar sobre o DNA e seu papel na hereditariedade
da maioria dos organismos. Porém, foi apenas em 1952, um ano antes da
descrição do modelo do DNA em dupla hélice por Watson e Crick, que foi
confirmado sem sombra de dúvidas que o DNA é material genético. No artigo
em que Watson e Crick descreveram a molécula de DNA, eles sugeriram um
modelo de como essa molécula deveria se replicar. Em 1958, Meselson e Stahl
realizaram experimentos utilizando isótopos pesados de nitrogênio que foram
incorporados às bases nitrogenadas para avaliar como se daria a replicação da
molécula. A partir dos resultados, confirmaram o modelo sugerido por Watson e
Crick, que tinha como premissa básica o rompimento das pontes de hidrogênio
entre as bases nitrogenadas. (GRIFFITHS, A. J. F. et al. Introdução à Genética.
Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002)

Considerando a estrutura da molécula de DNA e a posição das pontes de


hidrogênio na mesma, os experimentos realizados por Meselson e Stahl a
respeito da replicação dessa molécula levaram à conclusão de que

A) a replicação do DNA é conservativa, isto é, a fita dupla filha é recém-


sintetizada e o filamento parental é conservado.
B) a replicação de DNA é dispersiva, isto é, as fitas filhas contêm DNA recém-
sintetizado e parentais em cada uma das fitas.
C) a replicação é semiconservativa, isto é, as fitas filhas consistem de uma fita
parental e uma recém-sintetizada.
26 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

D) a replicação do DNA é conservativa, isto é, as fitas filhas consistem de


moléculas de DNA parental.
E) a replicação é semiconservativa, isto é, as fitas filhas consistem de uma fita
molde e uma fita codificadora.

Numa questão como esta, o mesmo objeto de conhecimento poderia ser


cobrado, porém, num contexto diferente. Este seria um bom momento de
discutir a duplicação semiconservativa do DNA, tendo como pano de fundo os
problemas associados aos conservantes químicos utilizados em alimentos
industriais e seus efeitos prejudiciais na estrutura dos ácidos nucleicos.
Envelhecimento precoce, degeneração genética, Alzheimer, mal de Parkinson
e outros problemas modernos poderiam ser relacionados com a duplicação
semiconservativa.
Um aspecto importante no sentido de melhorar cada vez mais a
qualidade da prova é uma compatibilização plena do programa cobrado com os
diversos currículos estaduais. Percebe-se que diferentes estados da federação
abordam de forma diferenciada os programas de ensino de Biologia. Assim,
fica evidente um desequilíbrio na capacidade da prova avaliar estudantes de
diferentes regiões do país. Neste sentido, espera-se uma maior cooperação
técnica entre o INEP que produz a prova e órgãos de comando do MEC para
melhor orientar as políticas estaduais de ensino e democratizar cada vez mais
o acesso à Universidade.
Outra melhoria importante refere-se ao aumento do tempo para solução
da prova. Os relatos apresentados pela mídia revelam uma visão quase
unânime entre os estudantes: não há tempo suficiente para ler, pensar, avaliar,
ler novamente, e finalmente, apresentar a solução para os problemas
propostos ao longo das 90 questões de cada dia de prova. Observa-se isso
especialmente nas questões que envolvem temas de Biologia. Por vezes,
apresentam-se questões com enunciados e alternativas demasiadamente
extensos. Ainda que esse aspecto já tenha apresentado uma evolução nos
últimos exames, ainda há espaço para um maior aperfeiçoamento.
27 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

4) Ciências Humanas e suas Tecnologias


Na matriz de referência de Ciências Humanas, as competências são
expressas por verbos e que se desdobram em habilidades, igualmente
expressas em verbos.
Assim, nas competências da área de Ciências Humanas, o verbo
associado é COMPREENDER (sendo entender na competência 4, sem motivo
aparente. Já na competência 5, escreve-se UTILIZAR, mas logo depois
explicita: PARA COMPREENDER).
Logo, o MEC entende que um aluno competente é o que
COMPREENDE. Pressupõem-se que, compreendendo como funciona, como
se constitui, como se transforma, como se estabelece, como se processa, o
aluno estaria apto a responder às demandas cotidianas referentes às questões
sociais, políticas, econômicas, culturais e técnicas que se lhe imporão.
Importante ressaltar, o que não acontece a contento, que as questões
deveriam focar essa capacidade de compreensão. Muitas questões mantêm
em um nível de exigência intelectual muito aquém da exigência cognitiva
desenhada pela matriz para alunos de Ensino Médio.
Para demonstrar ser competente em algo, o MEC entende que o aluno
deve manifestar aptidões ou habilidades específicas e as expressa em cada
competência. Curioso que algumas dessas habilidades são mais complexas do
ponto de vista cognitivo que a própria competência a ser alcançada. Assim,
para compreender, o aluno deve saber “avaliar criticamente”. Ora, a
compreensão é categoria cognitiva anterior à capacidade de avaliar
criticamente um objeto de estudo.
Para exemplificar, na competência 1, busca-se verificar se o aluno é
capaz de compreender os elementos culturais que formam as identidades.
Para isso o aluno deve ser capaz de:
- Identificar
- Associar
- Comparar
- Interpretar
- Analisar
28 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

Mas o documento do MEC não dispõe estas habilidades


necessariamente nesta ordem. Ora, sabemos que cognitivamente esta seria a
ordem crescente de dificuldade de comandos de aprendizado. Esta ordem não
é percebida nas matrizes e as habilidades como estão dispostas constituem
uma lista, mas não um todo coerente. Somando-se ao fato de algumas
habilidades serem mais sofisticadas que a competência esperada, temos um
conjunto de exigências de formação que poderia ser bastante aprimorado.
Observe o que acontece nas demais competências propostas para a
Matriz de Referência das Ciências Humanas e suas Tecnologias:

Competência 1 - Compreender os elementos culturais que constituem as


identidades

H1 - Interpretar historicamente e/ou geograficamente fontes documentais


acerca de aspectos da cultura.
H2 - Analisar a produção da memória pelas sociedades humanas.
H3 - Associar as manifestações culturais do presente aos seus processos
históricos.
H4 - Comparar pontos de vista expressos em diferentes fontes sobre
determinado aspecto da cultura.
H5 - Identificar as manifestações ou representações da diversidade do
patrimônio cultural e artístico em diferentes sociedades.

A sequência correta seria: H5, H3, H4, H1, H2. A presença desses
comandos na sua expressão de dificuldade correta seria um fator de definição
do nível de dificuldade de uma questão e da proporção mais adequada no
conjunto da prova. Caso contrário, apesar deste avanço, o nível de dificuldade
acaba recaindo no maior ou menor grau de densidade do conteúdo escolhido
para compor a questão, o que não diferencia muito dos vestibulares
tradicionais.

Competência 2- Compreender as transformações dos espaços geográficos


como produto das relações socioeconômicas e culturais de poder, a ordem
crescente adequada do nível de dificuldade dos comandos das habilidades
29 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

seria: H7, H10,H9, H6 e H8

Competência 3 - Compreender a produção e o papel histórico das instituições


sociais, políticas e econômicas, associando-as aos diferentes grupos, conflitos
e movimentos sociais,a ordem adequada seria : H11, H14, H12, H13 e H15,

Competência 4 - Entender as transformações técnicas e tecnológicas e seu


impacto nos processos de produção, no desenvolvimento do conhecimento e
na vida social, a ordem adequada seria: H16, H19,H20,H18 e H17.

Competência 5 - Utilizar os conhecimentos históricos para compreender e


valorizar os fundamentos da cidadania e da democracia, favorecendo uma
atuação consciente do indivíduo na sociedade, a ordem adequada seria
H21,H25,H24, H23 e H22.

Competência 6 - Compreender a sociedade e a natureza, reconhecendo suas


interações no espaço em diferentes contextos históricos e geográficos,a ordem
adequada seria: H26, H29, H28, H30 e H27.

Sobre os Objetos de Conhecimento propostos para História e Geografia,


verifica-seque os eixos norteadores da definição deles prende-se a um
trinômio: cultura, resistência e transformações. Pena não serem explicitados e
organizados assim. Temos um conjunto de expressões cuja coerência pode ser
apenas deduzida, embora lacunas sejam inexplicáveis. Só para dar um
exemplo: Por que é importante para o aluno saber sobre a cidadania e
democracia na Antiguidade, mas nada sobre a assim denominada Idade
Média?
Agora observe estes dois tópicos:
- História cultural dos povos africanos. A luta dos negros no Brasil e o negro na
formação da sociedade brasileira.
- História dos povos indígenas e a formação sócio-cultural brasileira.
No primeiro caso é necessário que o aluno estude TRÊS aspectos da
história dos negros: sua história cultural (vastíssima!), as lutas no Brasil e seu
papel na formação da sociedade brasileira. Pergunta: Pode-se deduzir que o
30 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

papel do negro no desenvolvimento econômico do Brasil deve ser relevado?


No segundo caso há apenas UM conteúdo a ser estudado: a história dos
povos indígenas NA SUA RELAÇÃO com a formação sócio-cultural brasileira.
Isso é o que depreende a análise do texto. Será isso mesmo?
Há ainda outro aspecto que merece uma reflexão urgente: a
concatenação entre os objetos de conhecimento e os descritivos de
competências e habilidades da matriz de referência. Um exemplo: um dos
objetos de conhecimento apresenta o seguinte texto:“A luta pela conquista de
direitos pelos cidadãos: direitos civis, humanos, políticos e sociais. Direitos
sociais nas constituições brasileiras. Políticas afirmativas.”. Considerando que
as políticas afirmativas são objeto de opiniões divergentes na sociedade
brasileira, qual a forma isenta de abordá-las: Identificando, comparando,
associando, interpretando ou analisando criticamente? Na última edição do
ENEM, uma das questões sofreu uma crítica contundente do sociólogo
Demétrio Magnoli, publicada na Folha de São Paulo, por causa de um deslize
de isenção.
Outro ponto a ser levantado é que há construções confusas e que dão
margem para compreensões ambíguas, o que é desnecessário. Por exemplo
no seguinte objeto de conhecimento: “Os sistemas totalitários na Europa do
século XX: nazi-fascista, franquismo, salazarismo e stalinismo. Ditaduras
políticas na América Latina: Estado Novo no Brasil e ditaduras na América.”.
Ora, é sabido que a expressão nazi-fascismo é típica da Alemanha, o
salazarismo de Portugal e o franquismo da Espanha. No Brasil, o modelo mais
próximo (sem ser propriamente) de um Estado dessa natureza foi justamente o
Estado Novo. Mas, e a Itália? Não será abordada? Deve-se intuir? Mas se é
para intuir, não seria mais adequado utilizar a expressão mais genérica? Por
exemplo: Os governos fascistas na Europa e América Latina. No entanto, ao
excluir a Itália e colocar somente o Estado Novo na rubrica “Ditaduras Políticas
na América Latina”, deve-se intuir a inclusão ou exclusão do Regime Militar
(1964-1985)?
Sobre as questões da última edição, a principal preocupação com a
prova, são as variáveis TEMPO X COMPREENSÃO DOS ENUNCIADOS X
PROPORÇÃO DE CONHECIMENTOS EXIGIDOS E NÍVEIS SOLICITADOS.
A prova de História e Geografia neste sentido foi bastante competente mas
31 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

apresentou algumas ambiguidades desnecessárias. Considerando o


cruzamento adequado das competências, habilidades e objetos de
conhecimento, promovendo uma distribuição razoável dos conteúdos sugeridos
e dos níveis descritos e mantendo a objetividade dos questionamentos, sem
induções ou defesas de teses ou posições políticas e ideológicas, a prova pode
atender plenamente ao fim a que se propôs.
Alguns exemplos a serem evitados:

QUESTÃO)
O brasileiro tem noção clara dos comportamentos éticos e morais adequados,
mas vive sob o espectro da corrupção, revela pesquisa. Se o país fosse
resultado dos padrões morais que as pessoas dizem aprovar, pareceria
mais com a Escandinávia do que com Bruzundanga. (FRAGA, P. Ninguém é
inocente. Folha de S. Paulo. 4 out. 2009)
O distanciamento entre “reconhecer” e “cumprir” efetivamente o que é moral
constitui uma ambiguidade inerente ao humano, porque as normas morais são
A) decorrentes da vontade divina e, por esse motivo, utópicas.
B) parâmetros idealizados, cujo cumprimento é destituído de obrigação.
C) amplas e vão além da capacidade de o indivíduo conseguir cumpri-las
integralmente.
D) criadas pelo homem, que concede a si mesmo a lei à qual deve se
submeter.
E) cumpridas por aqueles que se dedicam inteiramente a observar as normas
jurídicas.

A análise do texto é muito mais condizente com o conceito expresso na


alternativa B do que com o da resposta apontada pelo gabarito, isto é, a C.
32 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

QUESTÃO)

O espaço mundial sob a “nova desordem” é um emaranhado de zonas, redes e


“aglomerados”, espaços hegemônicos e contra-hegemônicos que se cruzam
deforma complexa na face da Terra. Fica clara, de saída, a polêmica que
envolve uma nova regionalização mundial. Como regionalizar um espaço tão
heterogêneo e, em parte, fluído, como é o espaço mundial
contemporâneo?(HAESBAERT, R.; PORTO-GONÇALVES, C.W. A nova
desordem mundial. São Paulo: UNESP, 2006.).
O mapa procura representar a lógica espacial do mundo contemporâneo pós-
União Soviética, no contexto de avanço da globalização e do neo-liberalismo,
quando a divisão entre países socialistas e capitalistas se desfez e as
categorias de “primeiro” e “terceiro” mundo perderam sua validade explicativa.
Considerando esse objetivo interpretativo, tal distribuição espacial aponta para
A) a estagnação dos Estados com forte identidade cultural.
B) o alcance da racionalidade anticapitalista.
C) a influência das grandes potências econômicas.
D) a dissolução de blocos políticos regionais.
E) o alargamento da força econômica dos países islâmicos.

O mapa muito confuso e as alternativas amplas levaram muitos alunos a


“chutar” esta questão. Não faz sentido na prova do ENEM questões que
estimulem o “chute” por falta de clareza e/ou compreensão.
33 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

Questão)

Que aspecto histórico da escravidão no Brasil do séc. XIX pode ser identificado
a partir da análise do vestuário do casal retratado acima?
A) O uso de trajes simples indica a rápida incorporação dos ex-escravos ao
mundo do trabalho urbano.
B) A presença de acessórios como chapéu e sombrinha aponta para a
manutenção de elementos culturais de origem africana.
C) O uso de sapatos é um importante elemento de diferenciação social entre
negros libertos ou em melhores condições na ordem escravocrata.
D) A utilização do paletó e do vestido demonstra a tentativa de assimilação de
um estilo europeu como forma de distinção em relação aos brasileiros.
E) A adoção de roupas próprias para o trabalho doméstico tinha como
finalidade demarcar fronteiras da exclusão social naquele contexto.

Tema relevante, mas tratado a partir de um preciosismo desnecessário


para aferir o grau de compreensão e conhecimento de uma maioria composta
por jovens de 16 a 20 anos a respeito do tema.
34 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

CONCLUSÕES
Depois dessa breve análise das 4 grandes áreas envolvidas no ENEM,
seguem algumas considerações finais que podem servir como sugestões para
a melhoria dos exames futuros e do processo avaliativo como um todo:
a) Muitos são os países que adotam provas e currículos unificados para o
ingresso em suas universidades. O ENEM, como exame de referência,
pode dar o passo inicial nesse sentido, visto que as mudanças
implementadas por ele norteiam outras provas e, principalmente, o
currículo do ensino Médio e os processos de ensino nas escolas
brasileiras.
b) Apesar de todo o prestígio de que ainda goza o ENEM, as últimas
edições apresentaram problemas como desonestidade defraudadores
(vazamento de questões da prova), falhas na encadernação de algumas
provas e troca de cabeçalhos no cartão resposta. Ainda que um exame
de tal magnitude esteja sujeito a inúmeras falhas, é essencial que todo o
processo logístico seja reavaliado, para que elas sejam minimizadas.
c) A respeito do vazamento de questões quando da realização do pré-teste
delas (fato ocorrido em algumas escolas do Ceará na última edição), a
solução está no aumento significativo e urgente do banco de questões
do INEP. Cada uma das 4 áreas do conhecimento exploradas no ENEM
(Linguagens e Códigos, Matemática, Ciências da Natureza e Ciências
Humanas) deveria ter pelo menos entre 10 mil e 15 mil questões pré-
testadas em seu banco. Isso impossibilitaria que o vazamento (ou a
memorização) de algumas dessas questões pudesse estatisticamente
constituir vantagem competitiva a algum aluno ou colégio.
d) É louvável que o Ministério da Educação esteja realizando oficinas em
24 Universidades do país para aumentar o banco de questões do
ENEM, contudo sugerimos que as questões a serem produzidas possam
também ser elaboradas por professores atuantes no Ensino Médio.
Cremos na capacidade dos professores do Ensino Superior, mas em
muitos casos eles estão distantes e desconexos da realidade da
Educação Básica.
35 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

e) Para conseguir aumentar substancialmente o banco de questões do


ENEM e poder contar com a colaboração de professores do Ensino
Médio e Superior, sugerimos a adoção de um sistema computacional
para recebimento de novos itens. Nesse sistema, professores do país
inteiro se cadastrariam (com informações profissionais relevantes a seu
respeito) e poderiam postar questões de autoria própria. Nessas
postagens, os professores deveriam classificar as questões quanto ao
nível de dificuldade e quanto à(s) habilidade(s) envolvida(s) na
resolução. Além disso, o professor deveria enviar também a resolução
da questão com seu respectivo gabarito. Uma comissão do Ministério da
Educação ou do INEP administraria o sistema, receberia as questões
enviadas, faria a avaliação delas e selecionaria as que atendessem ao
padrão de qualidade do ENEM. Nesse caso, o professor autor seria
remunerado por sua contribuição conforme valores estipulados com
antecedência. Para evitar que os professores soubessem quais de suas
questões foram aprovadas, poderiam ser estabelecidas regras como:
cada professor que quiser participar deve enviar, por exemplo, no
mínimo 5 questões. Entre essas, seriam aprovadas, por exemplo, no
máximo 3. Com esses critérios e o volume de questões enviadas, o
sigilo do banco de questões seria naturalmente preservado.
f) Apesar das diferenças entre as 4 áreas exploradas no ENEM, parece
ser comum, um dos questionamentos levantados por todos os tipos de
alunos e professores: o tempo de prova é insuficiente para que todas as
questões possam ser resolvidas. Se a intenção é que a administração
do tempo seja uma das “habilidades” avaliadas, que isso seja divulgado
em diversos meios de comunicação. Caso contrário, o número de
questões deve ser reduzido ou o tempo de prova deve ser aumentado
(essa segunda não parece ser a melhor alternativa, pois os alunos já
reclamam de exaustão no tempo que lhes é concedido).
g) Com o intuito de também reduzir o problema do tempo insuficiente para
a resolução das questões do ENEM, sugere-se um maior cuidado na
elaboração das questões em dois aspectos: contextualização e
pertinência dos enunciados. Por vezes, com o intuito de contextualizar,
as questões apresentam dados completamente irrelevantes e que
36 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

apenas atrasam a leitura dos alunos e os desvia do foco principal do


texto. Fato similar ocorre com informações cuja pertinência é discutível e
que apenas alongam os enunciados das questões sem trazer qualquer
benefício à resolução delas. Sanar esses problemas já diminuiria a
sensação de o exame ser demasiadamente longo para o tempo
proposto para a sua consecução.
h) Outro ponto que parece ser comum às 4 áreas do conhecimento
exploradas no ENEM, é o volume de objetos de conhecimento listados
nas matrizes de referência. Todos os professores consultados são
unânimes em sugerir uma redução no programa do Ensino Médio, visto
que muitos temas são tratados superficialmente e sem oferecer reais
benefícios aos alunos. Para se conseguir a mudança de paradigma em
que as habilidades passem a ser o foco do ensino e os conteúdos
programáticos sejam o pano de fundo para desenvolvê-las, esses
conteúdos precisam ser mais criteriosamente selecionados e descritos
nas matrizes de referência do ENEM.
i) Sobre as inúmeras demandas judiciais de alunos que pediram a revisão
de suas redações, deve-se entender que o julgamento do texto de um
aluno deve ser feito exclusivamente pelos corretores contratados e
treinados para esse fim. Não é competência de magistrados julgar se a
nota conferida à redação de um aluno está ou não adequada. Para
solucionar esse problema, os critérios objetivos de correção das
redações devem ser amplamente divulgados, diminuindo ou até evitando
reclamações futuras.
j) Outra reclamação comum entre os professores é o fato de algumas
habilidades serem exploradas em diversas questões do mesmo exame,
enquanto outras acabam sendo negligenciadas. Deve-se tomar cuidado
para que a prova tenha sempre uma distribuição adequada entre as
habilidades e também entre os objetos de conhecimento.
k) Sugere-se também rever o peso da redação na nota final dos alunos,
visto que hoje a prova de redação vale tanto quanto as outras 4 provas
juntas. Considerando o tempo que é acrescido no dia de prova em que a
redação é realizada e o tempo destinado à elaboração de textos em
37 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

salas de aula do país, perceberemos que o restante do exame (180


questões) deve ser mais valorizado.
l) A respeito do SISU, algo a se pensar seria fazer inicialmente uma
regionalização para seleção de alunos (abrindo para todo o país apenas
as vagas remanescentes). É comum ver alunos que, apenas para não
perder a vaga, se matriculam em universidades em locais distantes de
seu estado de origem. Com o passar do tempo, as dificuldades
(financeiras e psicológicas) de se morar longe de casa durante a
juventude fazem muitos abdicarem de suas vagas. O número
significativo de vagas ociosas nas universidades públicas é um dos
legados mais negativos do modelo atual.
m) Vale ainda ressaltar que, muitos alunos que saem do Sul e Sudeste do
país para cursar uma universidade no Norte ou Nordeste do país não
pensam em continuar trabalhando nessas regiões após se formarem. Ao
contrário, pensam em concluir seus cursos por lá, mas pretendem voltar
às suas cidades de origem. Com isso, o modelo atual do SISU pode
ocasionar um aumento na carência de mão de obra especializada
nessas regiões, que, nesse aspecto, já são carentes o suficiente.
n) O Ministério da Educação deveria organizar oficinas de formação para
ensinar/explicar a metodologia do ENEM para professores de Ensino
Médio. Hoje há um hiato monstruoso entre a prova, o que muitos
professores pensam da prova e a prática em sala de aula. Como
consequência, os alunos é que acabam ficando à deriva.

Esperamos que nossas experiências em sala de aula, com a autoria de


materiais didáticos e periódicos especializados no tema possam contribuir para
que o Ministério da Educação mantenha tudo o que já existe de elogiável no
ENEM e ainda promova possíveis aprimoramentos.
38 Análise sobre o ENEM: (Sugestões, elogios e críticas))

Equipe de análise
Adilson Longen: doutor em Educação Matemática pela UFPR, professor de
Matemática do Ensino Médio e autor de materiais didáticos.

Daniel H. Medeiros: doutor em Educação Histórica pela UFPR, pesquisador do


laboratório de pesquisa de materiais didáticos de História do setor de pós-
graduação em Educação da UFPR, prof. de História, Filosofia do Ensino Médio
e autor de materiais didáticos.

Elaine Bueno Silva: comunicóloga, pedagoga especialista em Administração


Escolar e Tecnologias Educacionais. Autora de materiais didáticos e
paradidáticos. Consultora educacional e palestrante sobre o ENEM.

Euler de Freitas Silva: administrador de empresa, professor de Física do


Ensino Médio e autor de materiais didáticos.

Jacir J. Venturi: diretor de escola, palestrante, autor de livros e professor de


Matemática da UFPR, da PUC-PR e do Ensino Médio em escolas públicas e
privadas.

João P. A. Mateos. professor de Química do Ensino Médio e autor de materiais


didáticos .

Luis F. Cordeiro: mestre em educação pela UFPR, professor de Física do


Ensino Médio e autor de materiais didáticos.

Ricardo L. de Mello: professor de Biologia, Filosofia do Ensino Médio e autor de


materiais didáticos.

Yeso Osawa Ribeiro: professor de Língua Portuguesa do Ensino Médio e autor


de materiais didáticos.

Rogério Verderoce Vieira: especialista no desenvolvimento de sistemas e


Objetos Educacionais Digitais (OEDs) para Educação Básica e ENEM.

Convidado especial

Haroldo Meira Teixeira Junior: professor de Química do Ensino Médio e autor


de materiais didáticos.

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