CAMINHOS DO REALISMO Cesário Verde | Cânticos do Realismo
SÍNTESE DOS CONTEÚDOS
O imaginário épico em “o sentimento dum ocidental”
“O SENTIMENTO DUM OCIDENTAL”
“É a epopeia moderna possível depois de Camões.”
O poema é longo (como um poema épico breve), apresentando elementos de
estrutura poético-narrativa. Está organizado em quatro partes que evidenciam indicações espácio-temporais:
Parte I – ao anoitecer Parte II – já noite Parte III – noite fechada Parte IV – alta noite
A ação heroica é a transformação interior do poeta ocorrida aquando da sua
deambulação pela cidade de Lisboa. Nesta viagem no tempo e no espaço, o poeta capta a realidade e põe as personagens em ação (carpinteiros, varinas, calafates…).
A subversão da matéria épica
Oposição passado/presente: às glórias do passado, das “crónicas navais” da aventura marítima, opõe-se um presente estagnado e às avessas, de dor e de sofrimento. O poeta, na sua deambulação pela cidade, procura a sua identidade e sonha com um futuro melhor. Procura a libertação, a imortalidade e a perfeição. A viagem é a do poeta pela cidade, menos heroica, menos aventurosa, mas propiciadora do desejo de partir. A perspetiva da partida dá corpo ao sonho libertador da melancolia estagnada associada a um destino sem futuro. As personagens refletem o vitalismo dos heróis. São robustas, dinâmicas, fortes e anónimas. A odisseia do poeta de “O sentimento dum ocidental” é a odisseia de toda a humanidade que sofre e vive aprisionada na cidade que esmaga e oprime. A representação da cidade e dos tipos sociais Cesário Verde é o poeta de Lisboa do final do século XIX, cidade que evidencia:
✓grandes contrastes e injustiças sociais: ricos ociosos/trabalhadores explorados;
✓desenvolvimento e progresso, mas também doença e dor; ✓heterogeneidade de figuras sociais: aristocratas, operários, pedintes, atrizes, varinas, costureiras… cruzam-se nas ruas da cidade de Lisboa; ✓vícios morais, desvios religiosos, miséria; ✓artificialidade e desumanidade.
Lisboa adquire uma carga negativa: a cidade perturba-o, enjoa-o, aprisiona-o,
provocando-lhe um cansaço e um mal-estar cada vez mais intenso e despertando-lhe um desejo de evasão. O olhar do poeta recai frequentemente sobre os mais desfavorecidos, os mais humildes e desamparados por quem demonstra solidariedade e simpatia. A questão social aparece, assim, como tema recorrente na sua poesia, aliada à ironia que acompanha a sua visão crítica da sociedade que parece esquecer os mais fracos e valorizar o supérfluo. O campo aparece, então, por oposição “à capital maldita”. É um espaço de liberdade, de fertilidade, de saúde, de produtividade, de vida. É um espaço sem dor, sem sofrimento, sem humilhação e, muitas vezes, associado a figuras femininas e à sua sensualidade.
Perceção sensorial e transfiguração poética do real
A poesia de Cesário Verde sintetiza as suas experiências percetivas: olhar, ver e observar, captar, ouvir, entender, cheirar, sentir, apreciar… provocam no poeta impressões que ele transpõe para os seus versos. Poetização do real – jogo objetividade/subjetividade O sujeito poético fala daquilo que o rodeia: a realidade objetiva e quotidiana da cidade e do campo. Apreende a realidade através dos sentidos: vê, observando os pormenores, as atmosferas exteriores e interiores que o circundam; absorve-lhes os cheiros, capta- lhes os ruídos, sente-lhes o frio e o calor. São essas perceções sensoriais que Cesário depois transmite nos seus versos, criando verdadeiros quadros com letras. Capta com objetividade e pormenor a realidade concreta e, através da sua sensibilidade poética, transfigura-a. Exprime a realidade objetiva através das impressões íntimas que essa realidade desperta na sua alma de poeta. É como a reação imediata dos seus sentimentos aos estímulos daquilo que o rodeia. Valorizando a impressão, dá-nos uma visão pictórica, cheia de referências cromáticas das pessoas e das coisas que se cruzam e coexistem nos espaços por onde deambula. O caráter pictórico e sensorial, aliado à deambulação tão presente na produção literária de Cesário Verde, confere- -lhe o visualismo, marca particular da sua poesia. Os poemas de Cesário documentam as transformações da cidade de Lisboa da segunda metade do século XIX: a evolução da indústria e dos transportes com a revolução introduzida pelo vapor, o desenvolvimento da técnica e as suas repercussões nas ruas e nas casas, a iluminação pública, o surgimento do proletariado… A imagética feminina A figura feminina aparece, muitas vezes, retratada na poesia de Cesário Verde, que ora lhe atribui uma carga positiva, ora um valor mais negativo. A mulher simples e ingénua, pura e quase angelical, capaz de modificar para melhor aqueles com quem interage é descrita, normalmente, como frágil, mas dotada de força e de vitalidade. Com origem no campo e uma forte ligação à natureza, opõe-se-lhe a mulher fatal e sedutora, arrogante, fria e distante, dominadora e reveladora de uma insensibilidade que atinge o sujeito poético, que por ela se sente atraído, de forma negativa, humilhando-o. Este tipo de figura feminina está associado à cidade e à ideia de miséria e de infelicidade que esta assume, frequentemente, nos poemas de Cesário. CESÁRIO VERDE Parnasianismo Impressionismo √ Busca a beleza da forma, o rigor, o exato. √ Utilização de impressões cromáticas, criando √ Regularidade métrica, rimática e estrófica. diferentes tonalidades de cores vivas que sugerem √ Recurso ao prosaísmo. pinturas de grande expressividade e cheias de movimento. √ Jogos de luz e sombra.
Linguagem, estilo e estrutura
✓Poemas que refletem o deambulismo do sujeito poético. ✓Prosaísmo. ✓Vocabulário concreto. ✓Linguagem coloquial. ✓Recursos expressivos: a comparação, a enumeração, a hipérbole, a metáfora, a sinestesia. ✓Recurso à ironia e ao diminutivo. ✓ Utilização expressiva do adjetivo, do advérbio e do verbo. ✓ Uso do assíndeto, que resulta da técnica de sobreposição das perceções do sujeito poético. ✓Busca da perfeição formal. ✓Regularidade métrica, rimática e estrófica. ✓Versos decassilábicos e alexandrinos (verso de doze sílabas).
Cesário Verde é um poeta à frente do seu tempo.
Cesário Verde é o grande percursor da moderna poesia portuguesa.