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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS


INSTITUTO DE ECONOMIA

FERNANDA PIM NASCIMENTO SERRALHA

O difícil encontro entre a autonomia para arrecadar


recursos próprios, versus a rigidez orçamentária das capitais
brasileiras, período: 1995 a 2010

Campinas

2018
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS


INSTITUTO DE ECONOMIA

FERNANDA PIM NASCIMENTO SERRALHA

O difícil encontro entre a autonomia para arrecadar


recursos próprios, versus a rigidez orçamentária das capitais
brasileiras, período: 1995 a 2010

Prof. Dr. Francisco Luiz Cazeiro Lopreato – orientador

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento


Econômico do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do
título de Mestra em Desenvolvimento Econômico, na área de Desenvolvimento Regional e
Urbano.

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À


VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO
DEFENDIDA PELA ALUNA FERNANDA PIM
NASCIMENTO SERRALHA, ORIENTADA
PELO PROF. DOUTOR FRANCISCO LUIZ
CAZEIRO LOPREATO

Campinas
2018
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Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): Não se aplica.

Ficha catalográfica
Universidade Estadual de Campinas
Biblioteca do Instituto de Economia
Mirian Clavico Alves - CRB 8/8708

Serralha, Fernanda Pim Nascimento, 1972-


Se68d SerO difícil encontro entre a autonomia para arrecadar recursos próprios,
versus a rigidez orçamentária das capitais brasileiras, período : 1995-2010 /
Fernanda Pim Nascimento Serralha. - Campinas, SP : [s.n.], 2018.

SerOrientador: Franscisco Luiz Cazeiro Lopreato.


SerCoorientador: Sulamis Dain.
SerDissertação (mestrado) - Universidade Estadual de Campinas, Instituto de
Economia.

Ser1. Autonomia. 2. Responsabilidade fiscal. 3. Finanças municipais. 4. Política


fiscal. 5. Transparência no governo. I. Lopreato, Francisco Luiz Cazeiro, 1952-.
II. Dain, Sulamis, 1942-. III. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de
Economia. IV. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: The difficult meeting between the autonomy to colletct owm
resources, versus the budgetary rigidity of the brazilian capitals, period : 1995 to 2010
Palavras-chave em inglês:
Autonomy
Fiscal responsability
Municipal finances
Fiscal policy
Transparency in government
Área de concentração: Desenvolvimento Regional e Urbano
Titulação: Mestra em Desenvolvimento Econômico
Banca examinadora:
Francisco Luiz Cazeiro Lopreato [Orientador]
Geraldo Biasoto Junior
Sulamis Dain
Data de defesa: 12-09-2018
Programa de Pós-Graduação: Desenvolvimento Econômico
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ECONOMIA

FERNANDA PIM NASCIMENTO SERRALHA

O difícil encontro entre a autonomia para arrecadar


recursos próprios, versus a rigidez orçamentária das capitais
brasileiras, período: 1995 a 2010

Prof. Dr. Francisco Luiz Cazeiro Lopreato – orientador

Defendida em 12/09/2018

COMISSÃO JULGADORA

Prof. Dr. Francisco Luiz Cazeiro Lopreato - PRESIDENTE


Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)

Prof. Dr. Geraldo Biasoto Junior


Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)

Prof.ª Dr.ª Sulamis Dain


Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ)

A Ata de Defesa, assinada pelos membros


da Comissão Examinadora, consta no
processo de vida acadêmica da aluna.
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AGRADECIMENTOS

Caminhos do Coração
Luiz Gonzaga

Há muito tempo que eu saí de casa


Há muito tempo que eu caí na estrada
Há muito tempo que eu estou na vida
Foi assim que eu quis, e assim eu sou feliz
Principalmente por poder voltar
A todos os lugares onde já cheguei
Pois lá deixei um prato de comida
Um abraço amigo, um canto prá dormir e sonhar
E aprendi que se depende sempre
De tanta, muita, diferente gente
Toda pessoa sempre é as marcas
Das lições diárias de outras tantas pessoas
E é tão bonito quando a gente entende
Que a gente é tanta gente onde quer que a gente vá
E é tão bonito quando a gente sente
Que nunca está sozinho por mais que pense estar
É tão bonito quando a gente pisa firme
Nessas linhas que estão nas palmas de nossas mãos
É tão bonito quando a gente vai à vida
Nos caminhos onde bate, bem mais forte o coração
E aprendi...

E agradeço a Deus pela oportunidade de buscar o conhecimento. Agradeço aos meus


familiares, aos meus amigos e professores, em especial aos meus Professores
Orientadores Dr. Francisco Lopreato e Dra. Sulamis Dain.
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Resumo

No período estudado, 1995 a 2010, compreendeu uma nova agenda fiscal do


Estado brasileiro, com estratégias que contribuíram para suprimir parte da autonomia da
arrecadação das 26 capitais, a partir de interferências que ocorreram dentro da mais pura
legalidade e permitiu a ausência dos governos superiores nas competências comuns de
responsabilidade dos três entes federativos.
Ou seja, sob o âmbito dos limites fiscais estabelecidos, em boa medida, a forma
de efetivarem as ações constitucionais e as ações municipalizadas se deram,
minimamente, através dos convênios e ou transferências discricionárias, instrumento
que desencadeou incertezas para o ciclo orçamentário municipal.
Que somado aos efeitos da desindustrialização e da guerra fiscal, e, sobretudo, das
contrapartidas exigidas do orçamento próprio, ficaram impedidas e sem nenhum diálogo
federativo para planejar ações locais necessárias para assegurar uma infraestrutura
mínima.
Diante disso, os centros urbanos mais populosos, sede de regiões metropolitanas,
endividados e polos provedores dos principais programas nacionais, sofreram com os
efeitos desse modelo. Por um lado, administravam o hiato entre os valores recebidos dos
governos superiores, defasados e ou insuficientes para financiarem os acordos
celebrados; e de outro, criaram inúmeros desafios para a gestão e fiscalização das ações
dos convênios que foram municipalizadas a partir da terceirização.
Nesse formato, a partir de um conjunto de instruções normativas e portarias que
regulamentaram as transferências discricionárias, o orçamento municipal permaneceu
submetido às decisões das esferas superiores de governos.
E parte substancial dos recursos próprios e de livre alocação, fundamental no
financiamento do desenvolvimento urbano foram alocados como contrapartidas das
transferências discricionárias. Nesse sentido, as ações locais foram sendo subtraídas da
estrutura orçamentária, e os recursos acabaram sendo direcionados para as ações que
deveriam se sustentar pelo financiamento tripartite.
A redução dos recursos livres na estrutura orçamentária municipal ocorreu sem
nenhum diálogo federativo democrático e articulado com a sociedade, e, na maioria das
7
vezes, desprovidos de mecanismos e instrumentos de controle que prejudicaram a
atuação e gestão dos principais polos provedores das políticas públicas nacionais.
Essas características, a meu juízo, comprometeram não apenas a autonomia
municipal, mas o processo da nossa descentralização fiscal, desde então, com pactuação
confusa. A federação brasileira passou a conviver com disputas de recursos; com
omissão de responsabilidades nas ações metropolitanas; com atrasos nos repasses
financeiros necessários para assegurar as ações de programas nacionais
descentralizados, além das inúmeras restrições fiscais.
Os desequilíbrios ocasionados são incalculáveis e comprometeram os direitos à
cidadania. Dessa forma, torna-se essencial pensar a gestão local, a partir de uma
combinação de esforços entre as três esferas, com políticas redistributivas e com
estratégias não excludentes, que acolham as necessidades locais.
E, acima de tudo, a política nacional precisa assegurar condições para a
implantação e o funcionamento dos programas que incorporem as necessidades
metropolitanas das cidades mais populosas do País. Não há dúvida de que a federação
precisa de um ajuste urgente nas relações federativas e não de um ajuste fiscal.
Além disso, essa pesquisa destacou a necessidade de revermos as metodologias
da distribuição dos recursos constitucionais, que tem contribuído para ampliar as
assimetrias nos valores per capitas entre os municípios brasileiros, e que tem contribuído
para agravar a rigidez orçamentária vigente.
A partir dessas questões, o estudo procurou contextualizar a atual crise federativa,
decorrente de um modelo que se mostrou impotente para edificar uma sociedade em
bases democráticas e de direitos universais.
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Abstract

In the period studied, from 1995 to 2010, it comprised a new fiscal agenda of the
Brazilian State, with strategies that contributed to suppress part of the autonomy of the
collection of the 26 capitals, from interferences that occurred within the purest legality,
and allowed the absence of governments common powers of responsibility of the three
federative entities.
That is to say, under the fiscal limits established, to a great extent, the way of
carrying out the constitutional actions and the municipalized actions were, minimally,
through the agreements and / or discretionary transfers, an instrument that triggered
uncertainties for the budget cycle of the municipality.
In addition to the effects of deindustrialization and the fiscal war, and especially
the required counterparts of the own budget, they were impeded and without any
federative dialogue to plan local actions necessary to ensure a minimum infrastructure.
As a result, the most populous urban centers, home to metropolitan areas, indebted
and poles providers of the main national programs, suffered from the effects of this
model. On the one hand, they managed the gap between the amounts received from
senior governments, lagged and insufficient to finance the agreements reached; and on
the other, created numerous challenges for the management and control of the actions
of the agreements that were municipalized from outsourcing.
In this format, the municipal budget, based on a set of normative instructions and
ordinances regulating discretionary transfers, remained subject to the decisions of the
higher spheres of governments. And a substantial part of the own resources and free
allocation, fundamental in the financing of urban development were allocated as
counterparts to the discretionary transfers. In this sense, the local actions were
subtracted from the budget structure, and the resources directed to the actions that should
be supported by tripartite funding.
The reduction of free resources in the municipal budget structure occurred without
any federative democratic dialogue and articulated with society, and, most of the times,
deprived of mechanisms and instruments of control that hampered the performance and
management of the main poles providers of national public policies.
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These characteristics, in my judgment, have compromised not only municipal
autonomy, but also the process of our fiscal decentralization, since then, with confused
pacts. The Brazilian federation has come to live with resource disputes; with an omission
of responsibilities in the metropolitan actions; with delays in the financial transfers
necessary to ensure the actions of decentralized national programs, in addition to the
numerous fiscal restrictions.
The resulting imbalances are unreckoned and have compromised the rights to
citizenship. In this way, it is essential to think of local management, based on a
combination of efforts between the three spheres, with redistributive policies and with
non-exclusionary strategies that accommodate local needs.
And, above all, national politics need to ensure conditions for the implementation
and operation of programs that incorporate the metropolitan needs of the most populous
cities in the country. The federation undoubtedly needs an urgent adjustment in federative
relations, not a fiscal adjustment.
In addition, this research highlighted the need to revise the methodologies of the
distribution of constitutional resources, which contributed to widen the asymmetries in
per capita values among Brazilian municipalities, which in turn contributed to aggravate
the current budgetary rigidity.
From these questions, the study sought to contextualize the current federative
crisis, emerged from a model that proved incapable to build a society on democratic
bases and universal rights.
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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Evolução da COFINS e IPI ......................................................................... 78


Figura 2- Evolução do Coeficiente de Endividamento do município mais endividado
do país, a cidade de São Paulo, período: 2001-2010.................................................... 94
Figura 3- Evolução funcionais do gasto público: 1996-2001, em % ......................... 153
Figura 4 - Evolução funcionais do gasto público: 2002-2010, em % ........................ 155
Figura 5 - Receitas Correntes Próprias Municipais .................................................... 193
Figura 6 - Transferências da União: Constitucionais e Convênios ............................ 194
Figura 7 - Transferências correntes MULTIGOVERNAMENTAIS: União e Estados
.................................................................................................................................... 194
Figura 8 - Transferências do Estado: Constitucionais e Convênios ........................... 195
Figura 9 - Transferências Instituições Privadas e Receitas de Capital....................... 195
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LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Evolução do número de municípios por regiões do País 60

Tabela 2-Participação média das principais receitas orçamentárias, por intervalos


populacionais, anos: 1998, 2004 e 2010, em % 61

Tabela 3- Receita Total, Transferências Correntes e FPM per capita, por intervalo
populacional, em R$ 62

Tabela 4 - Participação média das principais categorias da despesa pública no


orçamento total dos municípios brasileiros – Anos: 1998; 2004; e 2010, em % 64

Tabela 5 - Evolução Receita Disponível por esfera de governo, em % 68

Tabela 6 -Evolução da participação do estoque da dívida de longo prazo das 26


capitais no total do estoque da dívida municipal, período: 2000 a 2010 90

Tabela 7 - Evolução média da participação das despesas por Categoria Econômica, 26


capitais: 2002-2010 92

Tabela 8 -População Ocupada Urbana versus PEA: 2000/1991 101

Tabela 9 - Evolução Dívida Interna Líquida do Setor Público em relação ao PIB:1995


a 2010 – em % 102

Tabela 10 - População das 26 capitais versus a População Total de cada Estado, ano
2010 111

Tabela 11 - Evolução da participação média das Categorias Econômicas na Receita na


Receita Orçamentária Total, 26 capitais– em % 113

Tabela 12 - Participação da Receita Própria no Orçamento Corrente das 26 capitais:


1998; 2002; 2006 e 2010 – em % 117

Tabela 13 - Participação em % das Transferências Correntes no total das Receitas


Orçamentárias – 26 capitais 120

Tabela 14 - Participação média das principais transferências constitucionais correntes


dos municípios brasileiros agrupados por intervalos populacionais. Anos: 1998; 2004 e
2010 - em % 121

Tabela 15- Participação em % das Transferências Constitucionais no Total das


Transferências Correntes: anos 1997; 2004; e 2010 123

Tabela 16 - Índice de Participação na Cota parte do ICMS de 14 capitais, anos: 1995 e


2010 132

Tabela 17 Evolução da Participação das Transferências Discricionárias no total das


Transferências Correntes das 26 capitais, em % 138
12

Tabela 18 - Participação dos principais programas nacionais: FUNDEF/FUNDEB e


SUS no orçamento corrente das 26 capitais, anos: 1998; 2002; 2006; 2010-em % 141

Tabela 19 - Fonte de financiamento da Saúde nas 26 capitais, média do período: 2002-


2010, em % 143

Tabela 20 - Fonte de financiamento da Educação nas 26 capitais. Média para o


período: 2002 – 2010, em % 148

Tabela 21 - Funcionais infraestrutura, e Encargos Especiais (despesas financeiras) das


26 capitais e por intervalos populacionais – ano 2010, em % 157

Tabela 22 - Participação média por categoria econômica e natureza de despesa, por


intervalo populacional dos 5560 municípios, anos: 1998; 2004 e 2010 - em % 159

Tabela 23 - Participação média da natureza de despesa Outras despesas Correntes nas


despesas correntes, anos: 1995; 2005 e 2010 - em % 161

Tabela 24 - Participação de alguns elementos que compõem a natureza Outras


Despesas Correntes, 26 capitais: Ano 2010 em % 162

Tabela 25 - Principais naturezas das despesas, 26 capitais, ano 2010, em % 165

Tabela 26 - Investimento per capita médio das capitais e por agrupamento


populacional, ano 2010, em valores reais 168

Tabela 27- Evolução da população urbana brasileira, em %, período: 1872 – 2000 189

Tabela 28 - Despesas da União por Função União: 1995-1999 189

Tabela 29 - Despesas da União por Função: 2000-2010 190

Tabela 30 - Estoque do Exigível de longo prazo municipal e das 26 capitais: 2000-


2010 191

Tabela 31 - Estoque do Exigível de longo prazo das 26 Capitais, ano 1998, anterior à
renegociação da dívida 192

Tabela 32 - Investimento per capita por intervalos municipais com maior e menor
população federativa 196

Tabela 33 - Evolução do Investimento no orçamento total, 26 Capitais, anos:


1995;2001;2005;2009 e 2010, em % 197

Tabela 34 - Resultado Primário do Governo Central. Em R$ Milhões - Valores de


Março 2018 / IPCA 198
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ARO – Antecipação de Receita Orçamentária


BACEN (ou BC ou BCB) – Banco Central do Brasil
BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento
BIRD – Banco Mundial
BM – Banco Mundial
BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
BNH – Banco Nacional da Habitação
BOVESPA – Bolsa de Valores de São Paulo
BRIC – referência às economias emergentes de Brasil, Rússia, Índia e China
CAE - Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal
CEF – Caixa Econômica Federal
CEPAL – Comissão Econômica para América Latina e Caribe
CIDE – Contribuição de intervenção no domínio econômico incidente sobre
combustíveis e remessas para o exterior
CMN – Conselho Monetário Nacional
COFINS - Contribuição social dos empregadores para o financiamento da
seguridade social incidente sobre Receitas e Faturamento
CONFAZ - Conselho Nacional de Política Fazendária Coord. - Coordenadores
COPOM – Conselho de Política Monetária
CPMF – Contribuição provisória sobre movimentações financeiras
CSLL - Contribuição social sobre o Lucro Líquido
DCL - Dívida consolidada líquida (LRF)
DLSP – Dívida líquida do setor público
DPMFi – Dívida pública mobiliária federal
DRU – Desvinculação das Receitas da União
EC – Emenda Constitucional
Ed – editores
Et al. (et alli.) – e outros
EU – União Europeia (European Union)
EUA (USA) – Estados Unidos da América
FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador
FAS – Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social
FED – Banco Central dos EUA (Board of Governors of the Federal Reserve
System)
FEF – Fundo de Estabilização Fiscal
FBKF – Formação Bruta de Capital Fixo
FBK – Formação Bruta de Capital
FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
FGV – Fundação Getúlio Vargas
FHC – Fernando Henrique Cardoso
FINAME – Agência Especial de Financiamento Industrial
FNAS- Fundo Nacional de Assistência Social
FNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
FINBRA – Finanças do Brasil (título de levantamento estatístico da STN)
FMI (IMF) - Fundo Monetário Internacional (International Monetary Fund)
FNDU – Fundo Nacional de Desenvolvimento Urbano
FPE - Fundo de Participação dos Estados
FPM - Fundo de Participação dos Municípios
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FSE – Fundo Social de Emergência
FUNDEB – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de
Valorização dos Profissionais da Educação
FUNDEF – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e
de Valorização do Magistério
HBC – Hard Budget Constraint
IBAM – Instituto Brasileiro de Administração Municipal
IBGE- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas
IAPs - Institutos de Aposentadorias e Pensões
ICM – Imposto de Circulação de Mercadorias
ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
IGP-DI – Índice Geral de Preços – Disponibilidade InternaIGP – Índice geral de
preços
II - Imposto sobre importação
INSS- Instituto Nacional do Seguro Social
IOF - Imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro e sobre operações
relativas a títulos e valores imobiliários IAPS - Institutos de Aposentadorias e
Pensões
IPCA – Índice de preços ao consumidor amplo
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IPI - Imposto sobre produtos industrializados
IPMF – Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira
IPTU - Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana
IPVA - Imposto sobre a propriedade de veículos automotores
IR - Imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza
IRPF - Imposto sobre a renda de pessoas físicas
IRPJ - Imposto sobre a renda de pessoas jurídicas
ISS - Imposto sobre serviços de qualquer natureza
ITBI - Imposto sobre a transmissão "intervivos" de bens móveis
ITR - Imposto sobre a propriedade rural
IUCL – Imposto Único sobre Combustíveis e Lubrificantes
IVA – Imposto sobre o Valor Adicionado
IVC – Imposto sobre Vendas e Consignações
LDO - Leis de Diretrizes Orçamentárias
LOA – Lei Orçamentária Anual
LRF – Lei de responsabilidade fiscal (Lei Complementar n.101, 4/5/2000)
LFT – Letras Financeiras do Tesouro
LTN – Letras do Tesouro Nacional
M – Meios de pagamento
MF (MINIFAZ) – Ministério da Fazenda
MP – Ministério do Planejamento
MPS – Ministério da Previdência Social.
NFSP – Necessidades de Financiamento do Setor Público
OCDE (OECD) - Organização para a Cooperação do Desenvolvimento
Econômico
PAC – Programa de Aceleração do Crescimento
PAI – Programa de Ação Imediata
PASEP - Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público
PEA – População Economicamente Ativa
PIB - Produto Interno Bruto
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PIS - Programa de Integração Social
PF – Pessoa física
PJ – Pessoa jurídica
PNB - Produto Nacional Bruto
PIS – Programa de Integração Social
PND – Plano Nacional de Desenvolvimento
PND – Plano Nacional de Desestatização
PROER – Programa de Estímulo à reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema
Financeiro Nacional
PROES – Programa Incentivo à Redução do Setor Público Estadual na Atividade
Bancária
PPA - Plano Plurianual
PPP – Parcerias público e privada
RCL – Receita corrente líquida
RLR – Receita Líquida Real
RFB – Secretaria da Receita Federal do Brasil
RGPS – Regime Geral de Previdência Social.
RLR – Receita Líquida Real
RPPS – Regimes Próprios de Previdência Social de Estados e Municípios.
SBC – Soft Budget Constraint
SELIC – Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (taxa overnight)
SFN – Sistema financeiro nacional
SIAFI - Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal
SOF – Secretaria de Orçamento da União
SPE – Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda
STN - Secretaria do Tesouro Nacional
SUS – Sistema Único de Saúde
RCL - Receita Corrente Líquida (LRF)
TCE – Tribunal de Contas dos Estados
UN – Nações Unidas (United Nations)
UNCTAD – Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o
Desenvolvimento (United Nations Conference on Trade and Development)
UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas
16

Sumário
Introdução ................................................................................................................................. 17
Capítulo 1: Do Estado Intervencionista econômico ao descompromisso Social ...................... 24
1.1 Introdução ....................................................................................................................... 24
1.2 Marco teórico do gasto público descentralizado............................................................. 31
Capítulo 2: A Crise federativa: marcada pela crise do endividamento do setor público; pelo
modelo da descentralização fiscal; e as severas imposições fiscais aos governos subnacionais
.................................................................................................................................................. 48
2.1 Introdução ....................................................................................................................... 48
2.2 Colapso do projeto desenvolvimentista do Estado autoritário e os primeiros reflexos da
crise fiscal na década de 80 .................................................................................................. 50
2.3 Mudança Política e a Descentralização Fiscal ................................................................ 53
Capítulo 3: Os percalços dos 1990: ajuste fiscal combinado com descompromisso social ...... 74
3.1 Introdução ....................................................................................................................... 74
3.2. Os impactos da política fiscal dos anos 90 nas finanças públicas das 26 capitais
brasileiras .............................................................................................................................. 76
3.3 A construção da nova Ordem Fiscal: equilíbrio ou observa-se o aprofundamento dos
desequilíbrios fiscais? ........................................................................................................... 99
Capítulo 4: Autonomia ou rigidez orçamentária municipal? .................................................. 106
Análise das 26 capitais no período1995 a 2010 ...................................................................... 106
4.1 Introdução ..................................................................................................................... 106
4.2.O Aumento da participação na Receita Disponível se traduziu em autonomia
orçamentária?...................................................................................................................... 112
4.3 A rigidez na estrutura orçamentária municipal ............................................................. 151
5. Conclusão final da Dissertação........................................................................................... 170
6. Bibliografia ......................................................................................................................... 177
7. Anexos ............................................................................................................................ 189
Anexo 01............................................................................................................................. 189
Anexo 02:............................................................................................................................ 189
Anexo 03..............................................................................................................................190
Anexo 04:............................................................................................................................ 191
Anexo 05..............................................................................................................................192
Anexo 06:............................................................................................................................ 193
Anexo 07..............................................................................................................................196
Anexo 08:............................................................................................................................ 197
Anexo 09..............................................................................................................................198
17
Introdução
Meu interesse pelo tema das finanças públicas das 26 capitais brasileiras, surgiu
a partir da vontade de entender a ideia de autonomia federativa municipal conquistada
após a promulgação do texto constitucional de 1988, das cidades mais populosas do
País.
De forma quase unânime, os estudos sobre o federalismo brasileiro apontavam
a esfera municipal como a vencedora do processo da descentralização fiscal. No início
da pesquisa, minha percepção era de que, os centros urbanos mais populosos e
dinâmicos, contabilizavam uma capacidade para arrecadar recursos próprios acima da
média do País.
Isto era condizente com a ideia de ganho de autonomia para planejar a aplicação
dos recursos orçamentários nas ações dos programas locais, viabilizando também, nas
ações tripartites, um conjunto de pactuações propostas no texto constitucional.
Com essa expectativa iniciei o estudo, a partir da hipótese de que o aumento na
participação da receita corrente disponível do País teria permitido aos centros mais
populosos e de maior dinamismo econômico, a assunção de suas responsabilidades
constitucionais e o enfrentamento das complexidades sociais e de infraestrutura que
caracterizavam a história da urbanização da maioria das capitais do País.
Ao mesmo tempo, o aumento na receita disponível em mais de 60 pontos
percentuais se contrapunha à ausência e a omissão de inúmeras políticas públicas, que
podia ser sentida em cada esquina das grandes cidades do País. Esta situação
acrescentaria muitas questões complexas à hipótese inicial desse estudo.
Compreender a trajetória fiscal dos centros mais populosos do País e com maior
capacidade para arrecadar recursos próprios seria condição necessária, mas não
suficiente, para responder às questões que caracterizavam a realidade desses centros
urbanos.
Diante dessa realidade, era necessário entender a participação no financiamento
tripartite dos inúmeros programas que estavam sendo descentralizados, e a colaboração
técnica federativa entre eles, a partir das regulamentações elaboradas e promulgadas de
forma centralizada, sem nenhum diálogo federativo franco e claro com os governos
subnacionais e sociedade.
18
Nos mais diversos setores foram sendo definidos direitos sociais. Porém, a
definição das responsabilidades comuns aos três entes de governo era caracterizada por
muitas lacunas e sobreposições.
Os desafios gerados pelo modelo federativo a ser implantado eram difíceis de
serem percebidos, pois, apesar do aumento das receitas, as atribuições de cada esfera de
governo não eram facilmente identificadas. A maioria das capitais havia herdado os
equipamentos dos Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAPs), e se transformado em
sede de região metropolitana, e, portanto, em polos provedores de serviços, responsáveis
por atenderem a população dos municípios do entorno.
Tal cenário, de aumento de responsabilidades, será posto em xeque pela ausência
de um modelo claro de cooperação técnica e de financiamento tripartite, e pelas
exigências fiscais.
No decorrer da década de 90, uma nova disciplina fiscal, progressivamente
implantada pelo governo brasileiro,
contribuiu para justificar o desmonte e a omissão das instâncias superiores de
governo nas políticas municipalizadas e ou descentralizadas. As políticas liberais em
curso suprimiram parte dos direitos constitucionais assegurados em 1988.
No quadro de desindustrialização e privatizações, o governo central
recentralizou sua participação na receita disponível, ocasionando perdas irreparáveis em
vários setores que tinham sua participação na arrecadação dos impostos definida
constitucionalmente. Tais receitas eram fundamentais para compor e abastecer os
fundos de participações dos governos subnacionais que o pacto federativo havia
proposto.
De um modo geral, os governos das capitais começaram a conjeturar o impacto
da queda das transferências constitucionais, além das perdas na arrecadação própria,
devidas ao processo de desindustrialização e à guerra fiscal. Simultaneamente
contabilizavam um aumento da necessidade de recursos próprios como contrapartidas
das transferências discricionárias regulamentadas.
Como se não bastassem essas questões, os municípios endividados eram
submetidos a diversas restrições fiscais, tais como o teto de gastos com pessoal e a
renegociação do estoque da dívida pública municipal.
No momento da renegociação da dívida, final dos anos 90, mais de 70 pontos
percentuais do estoque da dívida municipal pertenciam ao passivo permanente das 26
capitais. Um paradoxo estava criado entre o exercício da autonomia e a responsabilidade
19
federativa, assegurando a realização de políticas públicas descentralizadas e ou
municipalizadas, e o cumprimento de metas fiscais e condicionalidades estabelecidas
no contrato da renegociação da dívida.
Esta contradição inspirou a definição do recorte temporal da pesquisa, que visou
analisar as finanças públicas das 26 capitais, de 1995 a 2010, nos 6 exercícios anteriores
à vigência da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF)1, e nos 10 anos após a mesma.
Esse recorte permite revelar a mudança ocorrida na evolução do gasto público
dos governos capitais, mediante a vigência das cláusulas pétreas da LRF, que além dos
tetos definidos paras as despesas correntes, assegurou recursos orçamentários e
financeiros para o pagamento das despesas financeiras decorrentes das cláusulas
contratuais.
A LRF também definiu a metodologia do resultado primário e nominal, além de
estabelecer aos municípios um coeficiente de endividamento, que, a meu juízo, trouxe
enormes prejuízos para o arranjo federativo, dificultando a coesão social nos grandes
centros urbanos endividados.
Nesta problemática inspira-se a construção dos quatro capítulos da pesquisa. O
primeiro capítulo apresenta algumas das principais premissas da corrente hegemônica
do federalismo fiscal, que apontam para as condições necessárias para que uma
federação possa desfrutar da autonomia federativa decorrente da descentralização fiscal.
O segundo capítulo contextualiza os entraves e desequilíbrios orçamentários que
impactaram as finanças públicas das 26 capitais, ocasionados pela adoção dos critérios
de partilha adotados em 1988, que favoreceram os municípios menos populosos,
contribuindo para aumentar o número de municípios.
Trata também das consequências da Operação Desmonte2 que permitiu a
recentralização das receitas disponíveis na esfera federal, em pleno processo de
descentralização das atribuições e ou municipalização das políticas públicas aos centros
mais populosos. Ou seja, o movimento condenou as 26 capitais a executarem as ações
dos programas descentralizados em meio a um volume crescente de exigências de
contrapartidas de recursos subtraídos dos orçamentos próprios, comprometendo as
atribuições de competência exclusiva municipal.

1
Lei Complementar nº 101, maio de 2000.
2
O movimento da “operação desmonte” foi idealizado e colocado em prática no governo Sarney.
20
O terceiro capítulo procura considerar as medidas fiscais que consolidaram a
rigidez orçamentária, a partir das restrições fiscais e da própria configuração que o pacto
federativo, como estabelecido e regulamentado.
O quarto capítulo aborda a necessidade de estimular novos instrumentos de
arrecadação própria, para inclusive compensar as perdas de recursos constitucionais e
minimizar o aumento do custo orçamentário das contrapartidas exigidas pelas
transferências voluntárias. Também aborda o tema do ônus, para os municípios, das
frequentes decisões do judiciário, mais conhecida como judicialização, que, na sua
realidade, interfere no dia a dia da execução do planejamento orçamentário próprio das
26 capitais do país.
A partir dessas questões, as interrogações postas na pesquisa estavam definidas:
como executar as ações próprias diante da autonomia federativa assegurada no texto
constitucional em meio às diversas restrições fiscais e das medidas liberais? Estava
criado o roteiro do difícil encontro entre a autonomia para arrecadar recursos próprios,
versus a rigidez orçamentária das cidades mais populosas e dinâmicas do País.
O conjunto dessas questões conduziu à temática da dissertação permitindo
caracterizar o difícil encontro. Com essa problemática se alinha a reflexão das
consequências herdadas do rápido processo de urbanização.
Questões que acrescentam um grau de dificuldade para entender a crise urbana
que caracterizam as regiões metropolitanas.
O êxodo, justificado pelo progresso da indústria e pelo progresso técnico de alguns
setores agrícolas atraíram um número expressivo de pessoas que migraram da zona rural
para os grandes centros urbanos a procura de empregos urbanos.
Porém, conforme Santos (2008), parte substancial da população que migrou do
campo para as cidades brasileiras, passou a fazer parte apenas da economia informal e
a conviver com as carências de políticas públicas, pois as estruturas urbanas não estavam
preparadas para receber o grande contingente populacional que passaram a abrigar de
forma precoce e rápida. O anexo 1, apresenta a tabela 27 que mostra a evolução da
população urbana do País, no período de 1872 até 2000.
Para Cano (1989), a evolução da urbanização gerou um caos urbano, pois além da
deficiência na interação da indústria e dos serviços, as cidades conviviam com o inchaço
populacional, enquanto as políticas públicas permaneciam inseridas em um quadro que
fragmentava o acesso.
21
Ou seja, o processo desnudou a miséria, nos centros urbanos faltavam luz, água e
habitação. A oferta de bens e serviços públicos não acompanhava a demanda. E,
considerando a postura autoritária do governo, as questões sociais permaneciam
relegadas à segundo plano, e parcela expressiva da população urbana permanecia
ignorada e marginalizada do processo de cidadania.
Assim, os grandes centros urbanos se tornaram sinônimos de desigualdades e de
abomináveis condições de vida, o traslado humano provocado pela urbanização encheu
as cidades de pessoas que permaneceram à margem da sociedade capitalista.
De acordo com Cano (1989), os “de cima” representavam 20% do contingente
humano que acresceu a urbanização, e os 80% “de baixo” foram obrigados a se
instalarem nas periferias das cidades, com precária infraestrutura, falta de saneamento e
débil serviço de transporte. Como não podiam pagar à especulação imobiliária, se
dispuseram a receber o precário atendimento dos serviços públicos, que os impedia de
ter acesso às melhorias no padrão de vida.
Foi um período de intenso crescimento das cidades, acompanhado da especulação
e da multiplicação dos assentamentos humanos nas periferias. O trabalhador foi
obrigado a se distanciar mais do centro urbano e do seu trabalho.
Cabe observar que a própria política do Banco Nacional de Habitação (BNH), o
acesso ao financiamento era quase que restrito à classe média e alta, e, sem dúvida,
contribuiu para o processo de especulação imobiliária e de “periferização” das grandes
cidades. Ou seja, a urbanização resultou na formação das periferias urbanas nas
metrópoles. A valorização imobiliária nos centros metropolitanos só permitiu a
permanência das pessoas que tivessem renda elevada, e os indivíduos e famílias de renda
baixa eram expulsos para a periferia.
Com o passar dos anos, os grandes centros estavam deformados pelos altos índices
de miséria, desigualdade de renda, desemprego, violência, e necessidades básicas como
saúde, educação, cultura, saneamento, transporte e habitação.
Ou seja, a crise do Brasil urbano não é nova e tem raízes históricas. E a
urbanização acelerada e desprovida de um planejamento urbano e orçamentário,
contribuiu para o descontrole das finanças públicas locais que estavam sob condições
autoritárias e submissas aos interesses do capital.
22
As políticas do Estado brasileiro, como bem observou Fiori (1989), estimulou a
acumulação politizada3, e promoveu um arrocho salarial como justificativa de conter a
inflação. Por meio de medidas fiscais autoritárias e centralizadas, a carga tributária
cresceu a partir de sucessivas cobranças dos tributos indiretos que incidiam sobre o
consumo, da cobrança de contribuições sobre a folha salarial que confiscava parte
significativa da renda da classe trabalhadora.
Tínhamos um Estado que além de regular a cidadania e produzir intensa
fragmentação ao acesso às políticas públicas, privatizou o espaço público e construiu
políticas e programas voltados aos interesses particulares, empresariais e clientelistas.
Assim, atender às exigências do Brasil urbano em meio à construção de programas
contaminados pelos interesses regressivos, restringiram às oportunidades de enfrentar
os desafios urbanos.
Muitos governos locais saíram em busca do endividamento público como
alternativa de financiamento para determinadas políticas públicas, mas, mediante as
sucessivas crises econômicas e fiscais, os avanços foram inexpressivos. O modelo
engendrou uma ampla e profunda crise fiscal e de endividamento.
A partir destas breves considerações, é fácil entender que administrar e planejar
um orçamento de um centro urbano populoso e endividado, não tem sido tarefa fácil. A
carência de estrutura urbana e social, somada às dificuldades de financiamento e às
condicionalidades da nova disciplina fiscal, caracterizam os principais desafios
orçamentários das 26 capitais que serão contextualizados nessa pesquisa.
Dessa forma, tenho como hipótese central que a trajetória da rápida urbanização,
aliada às confusas relações federativas e somadas às restrições fiscais, dificultaram
qualquer possibilidade de planejamento que se propusesse enfrentar às dificuldades da
estrutura urbana e social de uma grande cidade.
A bem da verdade, apesar da carta magna criar um capítulo para tratar dos desafios
urbanos, os encaminhamentos que ocorreram, autorizar a criação de regiões
metropolitanas, na prática, contou com pouca efetividade para atuar, protelando a
possibilidade de integração e cooperação necessária entre os municípios metropolitanos.

3
Segundo Fiori (1989:105), as contradições embutidas nos compromissos assumidos pelo Estado
brasileiro, utilizou-se da sua autoridade e do seu poder de coordenação da economia para favorecer
determinados grupos, caracterizando o processo que denominou de “acumulação politizada”, por
responder e atender muito mais às regras de mercado, mediante ações que estiveram submetidas às
imposições e interesses de capitais e blocos de poder regional, e se tornou incapaz de impor uma agenda
com políticas que atendessem a heterogeneidade socioeconômica com ações de caráter atuação
distributivo.
23
Acredito que as metrópoles brasileiras permaneceram mergulhadas em uma armadilha
que as impedem de exercer de fato a sua autonomia e soberania federativa.
Dessa forma, me parece que as relações atuais se tornaram extremamente custosas
e confusas, e as responsabilidades descentralizadas aos principais polos provedores dos
serviços públicos, as 26 capitais, acarretaram uma rigidez orçamentária que, de certa
forma, impediu os governos de exercerem a responsabilidade federativa anunciada no
texto constitucional de 1988.
Realidade que se traduz pelas palavras de Prud’homme (1995), quando comparou
o processo da descentralização a uma droga potente, quando usada no momento
apropriado e na dose correta teria um efeito saudável e desejável, em circunstâncias
erradas poderia acarretar conflitos em vez de ajudar.
Toda essa problemática abordada nos remete, necessariamente, a uma análise dos
compromissos da descentralização fiscal frente aos atuais compromissos fiscais do
Estado brasileiro. Que, para Stiglitz (2000), em sua “mea culpa” em relação ao ideário
neo-liberal, a promoção do desenvolvimento sustentável só se daria por meio de um
caminho voltado para a construção de uma sociedade mais igualitária e mais estável do
ponto de vista político, isto requereria a promoção da educação, o fomento à tecnologia;
o investimento em infraestrutura, a prevenção à degradação ambiental e a criação e
manutenção de uma rede de seguridade social.
Porém, tais premissas nos parecem distantes, como veremos, ainda hoje, nos
centros urbanos mais ricos do País, a população permanece desprovida de um padrão de
vida urbano que lhe assegurasse a coesão social.
24
Capítulo 1: Do Estado Intervencionista econômico ao
descompromisso Social

1.1 Introdução

Conforme observou Oliveira (2012), de tempos em tempos ocorreram mudanças


no comando político do País, mas os interesses do capital permaneceram blindados.
Quando se estuda as decisões e ações que conferiu ao País o status de “Estado
Desenvolvimentista”, enquanto financiador e organizador o processo de
industrialização, percebe-se um modelo de acumulação que colocou a proteção social
apenas como uma possibilidade para os indivíduos que não estavam inseridos na
meritocracia.
Nossa história federativa, segundo Vianna apud CARDOSO (2010, p. 783),
imprimiu um caráter conservador e autoritário que limitou e impediu o acesso à proteção
social, excluiu parte da massa dos trabalhadores urbano e rurais que não estavam
enquadrados nas categorias e ou classes reconhecidas pelo Estado getulista.
A expectativa de acesso à proteção social, de fato, marginalizou parcela
expressiva da população, e a distribuição dos benefícios permaneceu quase sempre
restrita aos empregados do chamado mercado formal de trabalho, combinação que
acarretou resultados de segregação e ampliou a concentração de renda e a desigualdade
regional na federação.
Dessa forma, o Estado brasileiro por meio da sua própria estrutura administrativa
priorizou os interesses privados e escolheu os seus parceiros, protegeu o capital
oligopolístico e concentrou riqueza. Para Fiori (1994), essa arbitragem tornou-se um
processo complexo, na medida em que o poder da burocracia foi usado como argamassa
para soldar seus compromissos e acordos que não lograram acolher a coletitividade.
Diferentemente, o Estado do mundo desenvolvido assumiu um papel de árbitro entre os
diversos interesses, e por meio da sua institucionalidade estatal condensou os conflitos
das classes e a competição dos capitais e resguardou a capacidade operacional da
burocracia estatal.
Ou seja, nosso modelo assegurou que os interesses privados se enraizassem com
uma íntima relação com a burocracia estatal. E a expansão dos programas sociais
ocorreu de forma centralizada, com um indesejável distanciamento entre os
25
formuladores, os executores de políticas e os seus beneficiários; consequentemente,
permitiu práticas fraudulentas e clientelísticas. Conforme Draibe (1985:20):
De uma à outra fase da industrialização, com autonomia, força e
capacidade de iniciativa, o Estado brasileiro planejou, regulou e interveio
nos mercados e tornou-se ele próprio produtor e empresário; através de
seus gastos e investimentos, coordenou o ritmo e os rumos da economia
e, através de seus aparelhos e instrumentos, controlou e se imiscuiu até o
âmago da acumulação capitalista. Do ponto de vista social e político,
regulou as relações sociais, absorveu no interior de suas estruturas os
interesses sociais e se transformou numa arena de conflitos, todos eles
“politizados”, mediados e arbitrados pelos seus agentes.

Nesse sentido, ampliou o poder político da burocracia, sobretudo mediante


situações nas quais, precariamente, estava estruturado o sistema de representação de
interesses de uma sociedade civil desarticulada.
Para Martins (1985), o Estado serviu para garantir dividendos ao setor privado,
onde a produção, em parte, encontrava-se nas mãos de atores internacionais, e em parte,
nas mãos de um Estado que agia em nome dos interesses de uma classe dominante.
Assim, o Estado atuaria no sentido de compatibilizar, em nível mais alto, a forma
pública e a forma privada da exploração empresarial capitalista.
A coordenação estatal avançou a partir de fortes ações em vários setores
econômicos, com programas e políticas destinadas a incentivar e a proteger o
investimento privado. Segundo Cardoso de Mello (1982:118)
A ação do Estado foi decisiva, em primeiro lugar, porque se mostrou
capaz de investir maciçamente em infraestrutura e nas indústrias de
base sob sua responsabilidade (...). Coube-lhe, ademais, uma tarefa
essencial: estabelecer as bases da associação com a grande empresa
oligopólica estrangeira, definindo, claramente, um esquema de
acumulação e lhe concedendo favores.

Ou seja, com uma estrutura burocrática administrativa baseada no nível do


executivo central, a elaboração do planejamento orçamentário4 era construída de modo
centralizador e autoritário. E, naquele momento, o Brasil estava inserido em um modelo
em que predominava a cidadania regulada5. A maioria dos programas do governo mais
contribuía para acentuar a acumulação do capital, em detrimento das demandas sociais

4
Segundo Draibe (1985), foi a partir de 1939 que se iniciou a distinção de categorias de despesas entre o
custeio e investimento público.
5
Para Luciano Martins (1977), a cidadania regulada era resultado do modelo de acesso fragmentado,
associado a sistemas de força, barganhas e privilégios e a um baixo grau de universalização e
uniformização dos benefícios sociais ofertados pelo Estado brasileiro.
26
da massa populacional que permaneciam fora da estrutura do planejamento
orçamentário do governo central.
Com a intensificação do processo de industrialização e urbanização, as cidades
passaram a receber e a sediar milhares de cidadãos em busca de trabalho, de uma vida
melhor. Enquanto isso, poucos foram os esforços realizados para garantir a reprodução
da força de trabalho e promover políticas de inclusão social.
A tradição e o compromisso do nosso Estado era direcionar grande parte dos
recursos do orçamento fiscal para políticas públicas voltadas para a acumulação do
capital, e, portanto, as questões sociais ficavam submetidas à lógica do mercado. A
prioridade conferida à acumulação politizada, era justificada pelo baixo nível de
desenvolvimento das forças produtivas e pela necessidade de garantir seu avanço, como
condição para libertar o País da situação de atraso econômico, desemprego e pobreza da
população, que impedia que nele se construísse um Estado do bem-estar, como ocorreu
nos Países desenvolvidos (OLIVEIRA, 2012).
Esse modelo assegurou a concentração da renda, a partir de uma poderosa barreira
protecionista que muito contribuiu para a formação de oligopólios dos novos setores
industriais. Os departamentos da economia priorizados não foram capazes de criar
automaticamente meios de pagamentos aos credores internacionais, pois a demanda
interna frente à capacidade instalada não havia sido assegurada, o mercado interno foi
incapaz de gerar as divisas necessárias para cobrir o hiato criado na balança de
transações correntes e assumir o financiamento de longo prazo, variáveis suficientes
para deflagrar a crise fiscal das décadas seguintes.
A implantação desse modelo foi possível dadas às condições político-econômicas
favoráveis na época, quando o financiamento no mercado internacional se encontrava
abundante e barato, que colocou o País em uma condição de recorrentes desajustes, e
absorvia fatias significativas das receitas orçamentárias, via incentivos, isenções,
benefícios fiscais, subsídios creditícios e investimentos para a indústria e setores da
infraestrutura.
Com capacidade fiscal no limite a solução adotada para cobrir as contas
deficitárias e dar continuidade ao modelo de expansão econômica foi o financiamento
inflacionário, o Estado passou a emitir moeda e a se endividar cada vez mais no âmbito
externo.
27
Cabe observar que, a reforma tributária6 ocorrida em 1966, não aumentou a
tributação sobre as classes de renda média e alta, apenas eliminou a cobrança em cascata
e introduziu mudanças que contribuíram para aumentar a carga tributária sobre o
consumo e a classe trabalhadora, com o discurso de que era necessário ampliar os
recursos para dar sustentação aos propósitos do crescimento econômico, a cobrança
recaiu sobre os tributos indiretos dos bens de consumo e na folha de salarial.
Não houve preocupação com as imperfeições do sistema, não foi adotada
nenhuma mudança comprometida com a justiça fiscal e/ou progressividade na
tributação. E, como bem destacou Oliveira (1995), o governo lançou mão de
instrumentos que centralizaram a arrecadação e submeteu os estados e municípios à
relação de dependência do poder central para a obtenção de recursos necessários ao
desempenho de suas tarefas, liquidando qualquer possibilidade de autonomia federativa,
tornando-os inoperantes e submissos ao governo central.
Segundo dados da secretaria do Tesouro Nacional, a evolução da centralização
dos recursos na esfera federal foi significativa: em 1967, a participação na receita
disponível das esferas central, estadual e municipal era de 36%; 46,4% e 17,6%; em
1974, a participação era, respectivamente, 50,5%; 36%; e 13,5%. A partir de 1967, o
governo central passou a manipular a receita disponível dos estados7 e municípios, que
foram obrigados a ceder participações nas redistribuições de recursos à esfera central8.
Em 1968, o Ato Complementar n. 40 enfraqueceu ainda mais a força do
instrumento de partilha de recursos entre os governos subnacionais. Sob o argumento
de combate à inflação, foi reduzido drasticamente o percentual das alíquotas de vinte
para doze pontos percentuais, e depois para cinco pontos percentuais dos recursos que
eram destinados para o Fundo de Participação Estadual (FPE) e Fundo de Participação
Municipal (FPM), e dois pontos percentuais destinaram-se para um Fundo Especial. Por
conseguinte, foram sendo integradas àquela estrutura tributária novas fontes de
arrecadação, pautada em uma abundante base de incentivos e subsídios9 que favoreciam

6
Segundo Oliveira (2010), a reforma tributária teve início com a Emenda Constitucional n. 18, de
01/12/1965, e completou-se com a aprovação do Código Tributário Nacional (CTN), pela Lei n. 5.172,
de 25/10/1966.
7
O governo central passou a definir alíquotas de impostos, como a alíquota do Imposto sobre o Consumo
de Mercadorias (ICM)
8
A participação do governo central na arrecadação do imposto sobre combustíveis e lubrificantes passou
de 40% para 60%, e reduziu a dos estados e municípios de 60% para 40% (32% para os estados e 8% para
os municípios).
9
Por exemplo: para impulsionar o mercado de ações, formaram-se fundos de investimentos abastecidos
a partir de deduções no IR.
28
a concentração da riqueza no País. Ações que não permitiram a modernização e o
fortalecimento do federalismo.
Entretanto, contribuíram para transformar o sistema tributário brasileiro em uma
poderosa ferramenta do processo de acumulação, adequando as receitas do Estado à
nova estrutura de produção, com a preeminência sobre alguns setores da economia, e as
necessidades dos governos subnacionais permaneciam submetidas às vontades e
determinações do governo central.
Cumpre lembrar que, mesmo no auge do período de crescimento acelerado do
País, de 1968 a 1973, a política social permaneceu prejudicada. Com condições
econômicas favoráveis para uma descompressão salarial10 e social, amparadas por
recursos fiscais abundantes, lucros generosos das empresas, o resultado social não
poderia ter sido pior, forte deterioração da distribuição de renda e piora das condições
de moradia e dos serviços públicos marcaram a vida nos centros urbanos. De um modo
geral, nas grandes cidades, as populações de baixa renda eram vitimadas pela piora das
condições de vida.
Baixa prioridade para os programas habitacionais voltados para a população de
baixa renda, apenas 20% dos investimentos do Sistema Financeiro de Habitação (SFH)
foram destinados às famílias com renda inferior a cinco salários mínimos. Enquanto que
famílias com renda mais elevada, superior a 10 salários mínimos, tiveram participação
em mais de 60% dos programas do SFH. Cenário que mostra o caráter regressivo, elitista
e excludente das políticas sociais do governo militar (Revista PMDB, 1982).
Outros expedientes passaram a consumir crescente parcela do gasto público,
voltados para as necessidades colocadas pelo novo padrão de acumulação e para os
interesses políticos das classes dominantes, como por exemplo, o sistema nacional de
crédito rural (SNCR); as obrigações reajustáveis do tesouro nacional (ORTN); os títulos
da dívida pública de rendimento variável do Banco Central, Conselho Monetário
Nacional (CMN), e Banco do Brasil (LOPREATO, 1993).
A acumualação do capital ainda foi favorecida pela Lei n. 4.131 de 1962, que
passou a permitir o endividamento direto das empresas no exterior, porém com anuência
do Bacen. Com condições externas de créditos volumosos, ágeis e baratos, ocorreu a

10
O modelo de desenvolvimento penalizou fortemente o crescimento dos salários reais dos trabalhadores,
não houve ganho real dos salários, uma política que inclusive contribuiu para expandir a dívida externa,
pois financiava as remessas crescentes dos lucros para o exterior, o denominado capital forâneo, que
estimulava as empresas a exportar o excedente. A esse respeito, ver Belluzzo e Almeida (2002).
29
institucionalização de canais de ingresso de capitais externos, que se constituiu a partir
dos últimos anos da década de 1960, em uma das peças fundamentais da alavancagem
dos setores público e privado.
Estava introduzida a indexação financeira por meio da criação do índice de preços,
como forma de tentar regularizar os contratos e evitar o risco do credor face à
desvalorização da moeda. A indexação permitiria neutralizar certos tipos de riscos nos
contratos a prazo, o denominado risco do credor. O risco era tanto maior, quanto mais
alta fosse a taxa de inflação, face a possibilidade de dispersão de preços e rendimentos.
Segundo Belluzzo e Almeida (1992), os únicos agentes dispostos a assumir o novo risco
do credor foram as agências públicas de financiamento, que organizaram sistemas de
indexação nos empréstimos a longo prazo que reduziam o risco para o devedor.
Assim, o Estado passou a financiar diretamente a expansão da acumulação do
capital, acentuando a desigualdade social do País. Segundo Fiori (1994), o projeto
progressista que denominou de Fuga Para Frente11, assegurou o endividamento externo
e a expansão da economia brasileira, porém, desconsiderou uma possível crise cambial
e financeira.
Lembrando que, desde o início dos anos 70 o estoque de endividamento do setor
público sofreu mediante às crises do petróleo, e no final da década de 197012, somado à
crise econômica da primeira metade dos 1980, o resultado das contas públicas passou a
ser insustentável do ponto de vista do financiamento externo.
Dessa forma, os movimentos da política econômica do País, de um modo geral,
cunharam as dificuldades fiscais das contas públicas, e reforçaram e ampliaram as
desigualdades de renda e aumentaram os níveis de pobreza urbana do País.
De acordo com Fiori (1994), as ações do Estado responderam, em sua trajetória,
às regras do mercado, aos interesses do capital e blocos regionais de poder, deixando de
lado os mais fracos economicamente.
Em vez de um Estado de bem-estar social, tivemos um modelo que combinou
paternalismo e repressão, que assegurou a desigualdade social por sua própria ação que

11
Para definição da Fuga Para Frente, ver Fiori (1994).
12
Com a decisão unilateral do governo americano de suspender a convertibilidade e desvalorizar a sua
moeda, o governo rompeu com as regras estabelecidas em Brettton Woods, depois da segunda Guerra
Mundial. Mediante a quebra do padrão monetário internacional pelos países centrais, o mundo assistiu a
uma fuga em massa de capitais em direção a Wall Street e a Londres, em um processo denominado de
desregulação competitiva. Logo depois, essa medida se estendeu por boa parte do mundo capitalista, e os
países latino-americanos aderiram às políticas liberalizantes, pressionados pela crise econômica mundial
e pela renegociação das suas dívidas externas (Fiori, 2001).
30
penalizou a grande massa urbana, a fração mais fraca, porém, significativa da sociedade
civil, que não exercia nenhum poder de veto sobre as decisões dos já vitoriosos.
Passamos a conviver com uma crise política, aceleração inflacionária, redução da
atividade econômica e com uma profunda crise fiscal, com aumento dos custos das
despesas públicas e com queda das receitas tributárias, o que quadruplicou o estoque de
endividamento público.
Dessa forma, o ambiente de crise fiscal e política, abriu caminho para a ideia de
que era necessário rever os arranjos federativos e exigir mudanças no formato das
decisões políticas para um projeto de desenvolvimento de âmbito nacional, pensamento
que ganhou força em todas as regiões da federação.
O processo da descentralização13 fiscal passou a ser considerado uma
possibilidade para o resgate da democracia e autonomia usurpada das esferas
subnacionais pelo governo central durante os 21 anos de ditadura militar. Inclusive,
apostando que a descentralização fiscal poderia enfrentar os desequilíbrios regionais,
resultantes de medidas associadas ao Estado da acumulação politizada14.
Ou seja, a descentralização fiscal seria um instrumento importante para o
fortalecimento do poder local e de melhorias na gestão pública. Premissas que
coincidem com os anseios do processo da redemocratização do Brasil. Por todos os
cantos da federação, os movimentos de lutas sociais se multiplicavam e clamavam por
uma ruptura com aquele modelo centralizador, fragmentador e autoritário.
A agenda se pautava por meio da possibilidade de construção de um pacto
federativo que permitisse o desenvolvimento da nação de forma democrática,
comprometido com a redução da heterogeneidade econômica e social, não só entre, mas
intra regiões, com políticas harmônicas e cooperativas que assegurassem a
universalidade da proteção social aos brasileiros.
Conforme Almeida (1996), a agenda estava aliada à proposta de descentralização
fiscal do setor público, que efetivamente passou a ser defendida como resposta e crítica
ao regime autoritário, parecia inevitável a ideia de descentralizar as ações do Estado.

13
Conforme Silva e Costa (1995:262), a noção de descentralização comporta vários significados. A
literatura internacional dá esse mesmo nome a processos muito distintos, tanto no que concerne à natureza
dos fenômenos observados, como às suas trajetórias históricas. Assim, aparecem como processos de
descentralização tanto movimentos de desconcentração de poder de tomada de decisão sobre a alocação
de recursos estatais no interior de uma mesma instância governamental, quanto processos mais estruturais
de transferência de recursos e de poder – de um nível de governo a outro, entre poderes do Estado-Nação
(Executivo, Legislativo e Judiciário), ou ainda do Estado para a sociedade civil.
14
A esse respeito, ver Fiori (1994).
31
Porém, a ideia de que a descentralização fiscal reforçaria a autonomia do poder
local compunha as premissas do discurso liberalizante que se alastrava pelo mundo, ao
mesmo tempo, era colocado a necessidade de restringir o papel do Estado. Na verdade,
a proposta predominante era pôr fim às políticas keynesianas e abrir espaço para uma
atuação mínima do Estado.
O discurso neoliberal anunciava que as exigências excessivas feitas ao Estado
desde o pós-guerra eram responsáveis pela ingovernabilidade das economias
endividadas. O principal elemento introduzido pelo Welfare State Keynesiano, deveria
ser substituído pelo Estado regulador, da lógica da maximização e eficiência na provisão
dos bens e serviços públicos por meio de estruturas mínimas e descentralizadas. Pois,
acreditava-se que, para alcançar o equilíbrio e a eficiência no setor público e restaurar o
dinamismo econômico, o Estado deveria encolher seu tamanho, reduzir suas atividades,
desmontar os mecanismos da segurança social e flexibilizar o direito adquirido no
passado, ou seja, estreitar as bases de financiamentos para ajustar o déficit público.
Dessa forma, os instrumentos utilizados pelo processo da descentralização fiscal
brasileira em curso desde os anos 80, defendido pelos organismos internacionais - Banco
Mundial, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BIRD) - ocorria em um ambiente de desequilíbrio fiscal, que por sua
vez, legitimava o discurso quanto à necessidade da realização de um ajuste fiscal.
Para entendermos o atual encontro cravado entre a disciplina fiscal e o texto
constitucional vigente, que culminou em uma rigidez orçamentária versus a autonomia
na arrecadação própria dos grandes centros mais dinâmicos do País, ainda que de forma
breve, torna-se fundamental entender os objetivos e premissas das correntes liberais que
se abateram sobre o mundo naquele momento.
Necessidade que se faz, a partir da ideia disseminada de que a descentralização
fiscal deveria assegurar um processo de redistribuição de recursos, espaços de decisões,
competências, atribuições e responsabilidades (SILVA e COSTA, 1995).

1.2 Marco teórico do gasto público descentralizado

As finanças públicas são abordadas pela corrente hegemônica neoclássica a partir


da ideia do individualismo metodológico, da racionalidade do agente, da escassez dos
recursos, onde o preço sinalizava a escassez e deveria garantir a concorrência perfeita
32
dos mercados através do ponto de equilíbrio entre a oferta e demanda, mais conhecido
como ponto de equilíbrio geral15.
A partir do reconhecimento da existência de falhas do mercado essa visão foi
superada, e abriu espaço para a Síntese Neoclássica consolidar a importância da
combinação do pensamento keynesiano com alguns novos pensadores neoclássicos, que
reconheceram a importância da presença do Estado na economia para além da correção
das markets failure16, coadunando-se com a expansão da atuação estatal tanto na forma
do Welfare State, quanto nos Estados desenvolvimentistas da periferia mundial.
Ou seja, o mercado não estaria pronto para resolver determinadas funções, dada a
complexidade do sistema capitalista. Assim, as finanças públicas no mundo acadêmico
se transformariam em uma nova disciplina, a Economia do Setor Público, a partir de
funções interventoras, a alocação17 bens e serviços públicos, distribuição18 renda e
estabilização19 da economia.
A evolução do pensamento da teoria tradicional, o federalismo fiscal20 postulou
um novo papel para o Estado, especialmente no que se refere à descentralização das
funções entre as esferas de governos. Para o mainstrean, os problemas cotidianos
deveriam ser enfrentados pela esfera de governo subnacional, e, quanto maior o nível
da descentralização, maior a possibilidade de se maximizar o bem-estar de maneira
eficiente21, entretanto, não entrou no mérito e nas especificidades características de cada
nação.

15
Ótimo de Pareto é uma suposição abstrata de situação de concorrência perfeita, segundo a qual não é
possível melhorar a situação de algum indivíduo, sem prejudicar outro. Nesse sentido, o ótimo não tem
condições de melhorar o bem-estar de um agente econômico sem piorar a situação de outro. A teoria do
equilíbrio geral parte do pressuposto de Pareto, de que o mercado levaria livremente a uma situação de
concorrência perfeita entre a oferta e demanda, por meio do mecanismo de preço, e utilidade marginal,
que seria o guia para maximizar o bem-estar.
16
Segundo Musgrave (1980), as Markets failure são indivisibilidade de produtos que não permitiria o
ótimo paretiano; criação de externalidades negativas, casos em que as empresas poderiam causar danos
sobre as demais empresas; mercados imperfeitos (monopólios e oligopólios); além de riscos e incertezas
na oferta de determinados bens que levaria a imperfeição e incertezas.
17
Função alocativa destinada a assegurar a alocação de recursos para a oferta de bens públicos puros,
como segurança, justiça, meio ambiente etc.
18
Função distributiva destinada a auxiliar na distribuição da renda e riqueza, como a oferta de bens, como
saúde, educação, assistência e transferência de renda.
19
Função estabilizadora, destinada a garantir a estabilização econômica, implementando políticas fiscais,
restritivas e ou expansionistas, de arrecadação de receitas, gastos e endividamentos públicos voltados a
combater o desemprego, inflação, com a finalidade de alcançar o equilíbrio macroeconômico interno e
externo.
20
A esse respeito, ver Musgrave (1959); Wallace Oates (1972); Rezende (1983) e Bird (1993).
21
Adequação da oferta de bens e serviços públicos e o nível de tributação afetam a soberania do
consumidor na medida em que a relação entre bens e serviços públicos e privados que serão consumidos
dependem da oferta desses bens e dos seus preços. No caso dos bens públicos, são expressos nos níveis
33
Para Musgrave (1980) o Estado deveria corrigir as falhas do mercado e traçar
regras e princípios que auxiliassem em uma conduta eficiente da economia. E, maior
conhecimento e esclarecimento da estrutura do gasto público possibilitaria um
planejamento orçamentário que identificasse as principais necessidades, caso ocorresse
restrição de recursos orçamentários.
Por sua vez, Wallace Oates (1991), reforçou a ideia de que a descentralização
fiscal deveria ser entendida como um instrumento para garantir a eficiência das unidades
fiscais e maximização das funções do setor público. Pois, acreditava que a
descentralização seria uma oportunidade para determinar o ótimo paretiano da unidade
pública, com vistas às demandas individuais e alocação da oferta do bem público
adequadamente às preferências e quantidades.
A principal preocupação era responder sob quais condições a descentralização
acarretaria melhoria na qualidade da capacidade governativa, ou seja, de que forma os
gastos se tornariam mais efetivos. Quanto à arrecadação dos recursos financeiros,
acreditava-se que o governo intermediário poderia ter melhor desempenho na
arrecadação voltada para o consumo; ao passo que o governo local deveria arrecadar a
receita sobre a propriedade imobiliária ou taxas de uso de serviços.
Por sua vez, o governo central deveria exercer um papel arrecadador dos tributos
sobre a renda, e indicar as situações nas quais se manifestassem externalidades na
produção local de bens, compensando os governos descentralizados com subsídios
unitários, levando-os a internalizar os benefícios provenientes dos transbordamentos
entre jurisdições ocorridos na oferta de bens públicos locais. Esses subsídios unitários
encorajariam uma oferta em níveis eficientes pelos governos descentralizados.
Mecanismo que, segundo Vargas (2006) equivaleria às transferências fiscais,
instrumento-chave nas relações intergovernamentais para complementar as receitas dos
governos subnacionais, e garantir uma oferta eficiente de bens públicos nessas esferas.
Ou seja, a partir do princípio da subsidiariedade, os níveis de governo que
estivessem acima deveriam ajudar a financiar quem estivesse abaixo, para corrigir as
imperfeições provocadas pela conduta humana e alcançar a eficiência do setor público.
Nesse quadro teórico, caberia ao governo central definir as atribuições de funções, as
competências tributárias, e os recursos complementares na forma de transferências, que
se tornaram questões centrais do Federalismo, para se obter eficiência na gestão pública.

de tributações e no quanto esta afeta a restrição orçamentária dos consumidores. Na verdade, a “razão
para a ação orçamentária é corrigir a escolha individual” (Musgrave, 1973:30).
34
Enquanto que algumas questões, como a exclusão social e a concentração populacional,
pouca ou quase nenhuma atenção receberam nesse debate.
Dessa forma, a descentralização fiscal e as transferências fiscais se notabilizaram
como aspectos cruciais da perspectiva teórica do Federalismo Fiscal. Affonso (2003)
destaca, que a partir dessa visão, o Federalismo se reduzia ao Federalismo Fiscal, e este
último, à questão da descentralização fiscal.
A Lei de Wagner, tentou contribuir com explicações empíricas, apoiadas nas
estatísticas da evolução dos gastos públicos em Países industrializados. Porém, não
tratou das restrições orçamentárias, mediante o aumento da demanda por bens e
serviços, e não se preocupou com as forças políticas, econômicas e sociais que
influenciavam as decisões de gastos do Estado, o que a impediu de perceber, não
somente como as demandas eram colocadas para o Estado por meio da acumulação de
capital, como não deu respostas às demandas oriundas de outros setores e camadas
sociais que influenciavam a composição da despesa pública.
Mesmo sabendo, que as funções estatais decorrentes do avanço do capitalismo, do
crescimento demográfico, aumento do grau de urbanização, da renda per capita da
população, motivariam a ampliação da demanda por bens e serviços públicos ofertados
pelo Estado, essas questões permaneceram excluídas da argumentação teórica da Lei de
Wagner.
Por sua vez, outros autores como Peacock e Wiseman procuraram elementos que
suprissem a limitação da tese de Wagner, e se voltaram para o incremento da carga
tributária, alegando que a sociedade estaria disposta a arcar com o ônus em momentos
de perturbações de ordem socioeconômica, causadas por depressões econômicas,
guerras, calamidades. A elevação dos gastos públicos para os autores, foi denominada
de “efeito translação”.
Diferentemente, no que tange à questão da atuação ativa do Estado nas economias
capitalistas, o referencial teórico keynesiano, reconheceu que para amortecer os efeitos
de crise econômica, alimentar as forças de acumulação, e garantir um mínimo de coesão
social para a reprodução mais harmônica do sistema capitalista, era necessário
disseminar políticas distributivas e estabilizadora na estrutura do planejamento
orçamentário.
O Estado deveria assumir um papel intervencionista, capaz de adotar um
comportamento ativo no âmbito da dinâmica econômica e social, promovendo políticas
e ações indutoras do bem-estar econômico e social. Muitos Países obtiveram resultados
35
favoráveis no combate à recessão econômica a partir do uso do gasto público, e o déficit
público tornou-se uma alternativa aos governos que se encontravam politicamente
pressionados por quadros recessivos e de elevado desemprego. E, quando necessário, a
pressão política o colocaria como um ator protagonista da estabilização.
Portanto, a atuação governamental a partir da política fiscal transformou-se em
um instrumento, por excelência, para enfrentar a crise econômica. E, a ideia de
orçamento equilibrado perdeu espaço, tendo em vista a atuação do Estado, direta ou
indiretamente, por meio de ampla utilização de políticas de demanda efetiva e do
crédito, bem como as políticas de desenvolvimento nacional.
Enquanto que para O’Connor (1977 apud Oliveira 2012), o crescimento e a
composição dos gastos do Estado capitalista foram decorrentes de duas funções básicas.
A primeira, estabeleceu que o Estado deveria garantir a reprodução a longo prazo da
acumulação, que constitui as próprias bases de seu poder de arrecadação; a segunda, a
de legitimação para garantir a coesão e o consenso das classes e frações de classes em
torno de um projeto econômico hegemônico. Considerando que a evolução e as
necessidades históricas colocadas pelo sistema, explicariam no tempo, o crescimento
dos gastos estatais, bem como sua composição.
E, como haveria uma multiplicidade de agentes envolvidos nessas trocas e todos
gostariam de maximizar suas utilidades, prestígio, votos etc., a limitação orçamentária
do Estado poderia ser desrespeitada e o déficit público criado. Cenário em que a
economia passaria a conviver com ondas permanentes de instabilidade econômica e
financeira.
Entretanto, a partir da decisão do governo norte-americano de elevar de maneira
significativa a taxa de juros, e da liberalização cambial nas economias de maior peso,
foram desencadeadas muitas turbulências que transformaram e limitaram o
funcionamento da esfera pública.
As ideias conservadoras passaram a ganhar espaço, e a crise mundial era atribuída
às políticas de bem-estar social e keynesianas até então praticadas. O cenário de crise
permitiu que algumas novas contribuições teóricas fossem reconhecidas a partir de teses
de que haveria necessidade de reduzir as funções do Estado. Um conjunto de reformas
foi proposto, em diferentes planos, com ampla desregulamentação dos mercados e
privatizações do Estado, o que resultou em uma nova ordem fiscal. Estava rompida a
visão positiva do Estado na macroeconomia.
36
Essa ruptura de pensamento, foi marcada por severas restrições fiscais, a partir
dos anos 1980, empreendidas pela visão das expectativas racionais, tornando-se
hegemônica na Macroeconomia mainstream22. Naquele momento, as restrições fiscais e
financeiras passaram a ser o foco no trato da atuação de um governo.
As propostas chanceladas pela visão liberal, propunham privatizar e reduzir o
papel do Estado. A escola Public Choice defendia a eficiência e eficácia na alocação da
oferta dos bens e serviços públicos, pois o Estado representava quase um sinônimo de
desperdício, responsabilizado pelo crescimento do gasto público e sua composição,
contribuindo para geração de déficits e riscos para sua capacidade de reprodução.
Sua atuação se mostrava mais ineficaz do que o mercado, o que justificaria sua
condição mínima. A escola se fundamentava no agente individual, guiado pela
racionalidade econômica e pelo comportamento maximizante. A descentralização era
qualificada como um instrumento fundamental para promover a eficiência.
A teoria da Public Choice se amparou na restrição do uso das políticas e procurou
explicar como deveria se dar a composição dos gastos públicos, e apontar os elementos
capazes para compreender a multiplicidade das funções assumidas pelo Estado. A
evolução dos gastos públicos ora justificada pelas falhas de mercado, ora pelas questões
que influenciaram as decisões governamentais frente a racionalidade econômica dos
agentes.
Dessa forma, passou a disseminar a necessidade de estabelecer limites
constitucionais aos poderes governamentais e impor regras rígidas para o
comportamento dos políticos e da burocracia estatal, visando a combater o desperdício
e a recuperar a confiança do povo nas instituições políticas tradicionais.
Esse pensamento se consolidou por meio do processo das privatizações, iniciado
nos Países desenvolvidos a partir da década de 1980, e avançou sobre os Países em
desenvolvimento na década de 1990, perdendo força nos 2000, quando os efeitos dessa
política resultaram em crises financeiras que demandaram novamente a intervenção
estatal.
Para Affonso (2003), o objetivo maior do pensamento da Public Choice era a
preservação da riqueza, a partir da prevalência de uma visão de austeridade fiscal. Isso
correspondeu, no âmbito dos governos, ao paulatino desmonte da institucionalidade
regulatória estatal, à intensificação dos processos de privatizações, ao desmonte das

22
A esse respeito, ver Lucas e Krugman (1997b).
37
redes de proteção social, e à desregulamentação pública da atividade econômica. O
mercado passou a ser visto como a esfera capaz de promover a eficiência e a
concorrência.
Essa vertente do federalismo fiscal, ainda acreditava que todos os governos
subnacionais passariam a concorrer entre si, por meio de incentivos e de oferta dos bens
públicos. E, como os agentes eram indivíduos racionais, deveriam decidir que mais lhe
interessassem através das escolhas individuais. O papel do governo central seria apenas
de regulador do processo.
Ou seja, os interesses e satisfações individuais encontravam-se no processo
político, mais especificamente no voto individual, traduzido no comportamento dos
agentes individuais, participantes de um jogo de uma sociedade democrática, composta
por indivíduos racionais e livres, na qual todos os jogadores poderiam realizar escolhas
e definir preferências, por meio do deslocamento de uma jurisdição para outra. Para essa
teoria, enquanto alguém ganha, outro perde; para ela, não haveria resultado e soluções
cooperativas.
A concepção individualista da sociedade era retratada pelos votos, que deveriam
expressar e revelar as preferências individuais não homogêneas, mas que, quando
agregadas, alcançariam a completa função do bem-estar social. Ao revelar as
preferências dos indivíduos por bens e serviços públicos através do voto se constituiria
a tese principal dessa escola, de que o Estado, sozinho, não seria suficiente para tomar
decisões, identificar e garantir as preferências do indivíduo consumidor e eleitor.
Apenas a partir das escolhas dos indivíduos racionais seria possível um
comportamento maximizador, e a coletividade, por sua vez, exigiria de volta todos os
tributos pagos através da alocação correta dos benefícios públicos desejados e
esperados.
Acreditavam que haveria uma possibilidade de se maximizar a função alocativa,
pois, dada a proximidade entre os governos subnacionais e o consumidor contribuinte,
a eficiência na oferta e no controle dos bens e serviços públicos seria maior.
Essas premissas enfatizaram a importância de que a tomada de decisão por parte
dos governos subnacionais preconizaria melhores condições de identificar as
preferências locais no que tange os serviços e bens públicos, financiados com
arrecadação de tributos locais, e fiscalizados pelos cidadãos contribuintes, desprezando-
se por completo as questões de desigualdades econômicas e sociais entre e
intrarregionais de cada País.
38
A tese central era que quanto maior a área do território, maior deveria ser o ganho
de eficiência com a descentralização fiscal, pois os governos subnacionais atenderiam
com mais facilidade e eficiência as características regionais existentes nas demandas.
A síntese era transferir para os cidadãos contribuintes no nível local a
responsabilidade do agente fiscalizador das instituições envolvidas no processo da
descentralização fiscal. Pois o pressuposto era de que, quanto mais se pagasse de
tributos, mais participativo o contribuinte seria, e, portanto, maior a governabilidade.
Acredito que a crítica a esse modelo deva se pautar, principalmente, nas questões
de Países caracterizados por acentuadas desigualdades econômicas e sociais, entre e
intrarregionais, onde a função alocativa desempenhada pelos governos subnacionais
sofre forte variação de um local para outro, o que pode desencadear prejuízos para o
desenvolvimento econômico e social de toda a nação.
E a relação estabelecida entre esforço fiscal local com governabilidade, acredito
que levou a um reducionismo dos conceitos de controle social do dinheiro público, e de
participação política cidadã, pois passaram a ser definidos por meros critérios fiscais,
deixando de fora o aspecto humano, desprezando por completo a possibilidade da
universalidade dos direitos sociais.
Segundo os críticos, o modelo levaria a uma competição predatória entre as
jurisdições, pois a ideia de alocar os bens e serviços públicos distintos entre as unidades
fiscais, financiados pelos cidadãos contribuintes que as consumissem, do ponto de vista
sociológico, induziria o desenvolvimento de uma política de segregação social.
Entretanto, a convicção era de que, por mais imperfeito que fosse o mercado, ele
seria mais eficiente que o Estado, formado por burocratas com interesses individuais, os
denominados rent seekers23, que atuariam conforme seus lobbies e interesses, por meio
de políticas de regulação de monopólios e oligopólio, do comércio exterior, direitos de
propriedade, e que não tomariam decisões com a preocupação do resultado de soma
positiva para coletividade.
Conforme Vargas (2006), a Public Choice foi uma referência para as iniciativas
concretas de redução dos mecanismos típicos do Welfare State, bem como de desmonte
dos Estados desenvolvimentistas, sancionando a minimização da atuação
governamental em amplas esferas e a extinção de restrições às atividades privadas,
notadamente na esfera financeira.

23
Representavam grupos de interesses individuais em detrimento da coletividade.
39
Chancelou uma ampla abertura de espaço para a atuação das forças de mercado,
relegando ao Estado o papel de promotor da desregulamentação, da liberalização, da
privatização e da descentralização, em um ambiente de mínima intervenção estatal, onde
foi assegurado o funcionamento do mercado político.
Dessa forma, a existência de transferências intergovernamentais, do ponto de vista
teórico, se justificava em termos verticais, para complementar o déficit de financiamento
dos governos subnacionais, uma vez que a teoria normativa recomendava que a
competência de tributação dos governos locais se restringisse a tributar apenas bases
imóveis, como as propriedades.
A eficácia seria medida, por meio de custo mínimo possível, para o máximo de
benefício possível (Figueiredo e Figueiredo, 1986), aplicada no sentido de avaliar se as
políticas públicas descentralizadas com metas estabelecidas, sob a análise da relação
ótima entre o custo da implantação da política e o número de benefícios derivados dos
seus resultados, atingiram seus objetivos.
A corrente da Public Choice abriu espaço para os questionamentos, e o
pensamento Neoinstitucionalista24 avançou naquele momento, pois acreditava-se que o
mercado não seria eficiente frente aos problemas de informações, de risco moral, de
mercados incompletos. O Estado, peça indispensável para garantir a continuidade e
reprodução do sistema capitalista, deveria criar condições para promoção de uma nova
disciplina fiscal e reformar as instituições, as quais deveriam assegurar que o
funcionamento do mercado fosse menos imperfeito possível, com maior interação com
a conduta humana.
Caso contrário, acreditavam que o nível de instabilidade levaria a um ambiente
internacional extremamente volátil, de crescente instabilidade das taxas de câmbio e das
taxas de juros, com tendência à ocorrência de choques e sobressaltos financeiros.
Assim, caberia ao Estado definir regras claras, equilibrar as finanças públicas e
assegurar solidez às instituições tornando-as confiáveis, capazes de garantir o
pagamento das dívidas contraídas e, ao mesmo tempo, assegurar a preservação da
riqueza financeira privada (Oliveira, 2012: 133).
Ou seja, o compromisso fiscal dos governos com políticas de preservação da
riqueza financeira era o principal programa na estrutura orçamentária. Tese que de
alguma forma ganhou força nos anos 90, pois, reforçava a ideia de que os Países mais

24
A esse respeito, ver Wiesner (1996) e Riker (1987).
40
endividados, e com maior necessidade de financiamento, poderiam gerar riscos e perdas
em escala global.
Dessa forma, as nações endividadas foram submetidas às regras orçamentárias e
financeiras rigorosas, garantidas por meio de um regime de austeridade fiscal. Para
Blanchard (1990), a sustentabilidade dos Países periféricos endividados seria alcançada
por meio da formação de um resultado primário e nominal.
Lembrando que compõem o resultado primário a diferença entre as receitas
primárias e as despesas primárias. As receitas primárias são predominantemente as
receitas correntes (exceto receitas de juros), decorrentes do próprio esforço de
arrecadação das unidades orçamentárias, dos convênios e outras.
Cabe observar que, as receitas financeiras não contribuem para o resultado
primário no exercício financeiro correspondente, uma vez que criam uma obrigação ou
extinguem um direito, ambos de natureza financeira, junto ao setor privado interno e/ou
externo, alterando concomitantemente o ativo e o passivo financeiros. Como por
exemplo, a emissão de títulos, a contratação de operações de crédito por organismos
oficiais, as receitas de aplicações financeiras (juros recebidos, por exemplo), as
privatizações, amortização de empréstimos concedidos e outras.
Enquanto que a despesa primária registra o total das despesas, deduzidos os juros
e encargos da dívida e a amortização da dívida pública.
Para a apuração do resultado nominal observou-se à variação da dívida consolida
líquida em cada período, ao nível corrente da relação dívida/produto. Dessa forma, um
resultado nominal negativo indicaria que houve uma diminuição da dívida consolidada
líquida, já um resultado positivo indicaria que houve um aumento.
Nesse sentido, foram atribuídas às metodologias de apuração dos resultados
primário e nominal tendências opostas, ou seja, quanto mais positivo for o resultado
primário, menor, ou até mesmo negativo seria o resultado nominal.
Os juros passivos tenderiam a aumentar o resultado nominal, dado que aumentam
o montante da dívida consolidada líquida. Enquanto que o resultado primário e os juros
ativos tendem a diminuir o resultado nominal, visto que reduzem o montante da dívida
consolidada líquida.
Em resumo, caso o resultado primário somado aos juros ativos fosse maior que os
juros passivos, a dívida líquida diminuiria e resultado nominal seria negativo. Caso os
juros passivos fossem maiores que a soma do resultado primário com os juros ativos, a
dívida consolidada líquida aumentaria, e o resultado nominal seria positivo.
41
De certa forma, a metodologia de apuração dimensionaria o tamanho do ajuste
fiscal necessário para impedir que a dívida se tornasse insustentável, configurando de
forma objetiva os parâmetros de austeridade fiscal que seriam impostos ao mundo em
desenvolvimento e endividado, a partir dos anos 1990.
O relevante para essa visão consistia na possibilidade da comparação entre a
capacidade dos governos de geração no tempo de fluxos de superávits primários,
descontados em valor presente pela diferença entre a taxa real de juros e a taxa de
crescimento da economia, e o nível inicial da dívida.
O objetivo era que os níveis de superávits assegurassem os pagamentos da parcela
de juros reais. O serviço da dívida não deveria ser pago com nova dívida. A elevação da
carga tributária e a redução das despesas primárias eram fundamentais para resultar e
garantir os sucessivos superávits exigidos pelos organismos de controle.
Dessa forma, o esforço fiscal, na tentativa de garantir a sustentabilidade
intertemporal da política fiscal passou a ser definido, regulamentado e fiscalizado pelos
organismos internacionais. Em escala mundial, as economias mais vulneráveis foram
submetidas a nova disciplina fiscal, que intensificou as restrições fiscais para esses
Países.
Como bem destacou Vargas (2006), o uso desses indicadores de sustentabilidade
da dívida dos Países pelas agências de classificação de risco, no bojo do processo de
globalização e da ampla liberalização de capitais, tendeu a se disseminar como uma
referência importante nas decisões de investimentos dos aplicadores financeiros de peso.
Pode-se dizer que essa visão não rompeu com a ideia do critério da escolha
racional, porém introduziu a percepção de que existiriam limites à racionalidade dos
agentes, conceito denominado bounded rationality, pois as soluções dos problemas das
sociedades seriam resultantes de processos específicos de cada uma delas, e as soluções,
não necessariamente, levariam uma situação de ótimo paretiano.
A construção abstrata de um modelo que levasse ao ótimo paretiano não foi
perseguida a qualquer custo por essa escola que reconhecia que os mercados
econômicos e políticos não eram esferas que atuavam isoladamente, dada a presença
dos rent seekers, e que os fatores políticos afetariam os fatores econômicos e por eles
seriam afetados.
Dessa forma, os neoinstitucionalistas não negaram a importância do mercado, pois
acreditavam que as ações racionais individuais visavam eliminar a concorrência, e as
ações racionais coletivas, através das instituições dispunham-se a protegê-las, gerando
42
prosperidade para a sociedade. Os neoinstitucionalistas reintroduziram a necessidade de
atuação ativa do governo, ao manter a ênfase nos processos decisórios envolvidos nas
políticas públicas, e a preocupação com atuação dos rent seekers.
Para Wiesner (1996), apenas o Estado poderia assegurar o bom funcionamento
das escolhas efetuadas pela sociedade, e por meio das instituições e das políticas
públicas descentralização, o governo atuaria de forma eficiente, garantindo a
governabilidade de um País. A ideia de operacionalizar políticas de forma
descentralizada aparecia intrinsecamente relacionada com a questão da governabilidade,
pois acreditavam que, quanto maior fosse participação política resultante do esforço
fiscal na comunidade, maior seria a governabilidade.
Ou seja, na linha de defesa das restrições fiscais e financeiras dos governos
subnacionais, a descentralização ficou ainda mais fortalecida para essa visão, a qual
recebeu nova qualificação, que a colocou como instrumento central na construção da
nova disciplina fiscal que se configurava.
A descentralização se tornaria mais viável mediante a construção de
institucionalidades voltadas para mitigar seus riscos e metas nas esferas fiscal e
financeira. Ideia que foi plenamente incorporada pelas agências multilaterais ao final da
década de 1990. Esse argumento dissolveu a dicotomia, que explicitava o velho trade
off entre descentralização e centralização num formato diferente, que destacava a
contraposição entre accountability25 que os sistemas descentralizados promoveriam e a
maior coordenação que os sistemas centralizados embutiriam (OATES, 1994).
A introdução de indicadores fiscais nos cálculos de risco País passaram a orientar
as movimentações financeiras globais e, na prática, funcionou como um enquadramento
direto das políticas fiscais dos Países e dos entes subnacionais. Dessa forma,
estabeleceu-se uma relação entre o perfil de política fiscal dos governos e os fluxos de
capital, em graus variáveis, segundo as particularidades de cada País.
A necessidade de submissão das contas públicas à disciplina fiscal justificava-se
para evitar fuga de capitais. Nesse contexto, toda a exigência de geração de superávits
primários pelos Países e esferas governamentais endividados derivava dessa concepção,
amplamente disseminada pelo Fundo Monetário Internacional e pelo Banco Mundial.

25
Segundo Aghón (1993), a accountability é definida como uma noção abrangente que vai além de
prestação de contas à sociedade pelos gestores da coisa pública e de sua tradução literal, que é a de
responsabilidade, sendo considerada a essência da eficiência de decisões descentralizadas.
43
A capacidade de geração continuada de superávits primários pelos governos
sintetizava a questão da credibilidade do governo junto aos aplicadores em títulos
públicos. Os bons fundamentos fiscais seriam condição necessária de atuação dos
governos centrais, inclusive as esferas subnacionais ganharam crescente importância, e
passaram a considerar as despesas financeiras como a prioridade número um na
execução orçamentária. Essa concepção gerou pressões para o enquadramento das
esferas subnacionais, especialmente em Países federativos mais descentralizados, caso
emblemático do Brasil.
Conforme Vargas (2006), o resgate do governo como um ator ativo resultou em
mudanças na forma de pensar a noção de disciplina fiscal, estando ele voltado para um
quadro mais abrangente da ordem financeirizada. Para tanto, o governo delineou novas
ações e regras de ouro que se tornaram linhas mestras da nova disciplina fiscal. O
objetivo central era cumprir as exigências e controlar as restrições fiscais e financeiras
das esferas subnacionais descentralizadas. Vale observar que tais linhas se deslocaram
do embate que existia entre descentralização versus centralização, para um redesenho
cada vez mais específico de restrições e metas fiscais nas relações intergovernamentais.
Cabe ressaltar que, o governo central tornou-se o formulador das políticas
descentralizadas, de forma a condicionar e estabelecer a regulação dos governos
subnacionais, tanto nas esferas fiscal, financeira e previdenciária, quanto nas despesas
discricionárias, ampliando sobremaneira sua autonomia federativa.
Nesse processo, remodelou algumas institucionalidades, que ganharam papel
importante na qualificação da accountability e na coordenação de cada exigência. Um
conjunto de linhas de abordagem das esferas subnacionais se desenvolveu, denominado
por Oates (2004) como a segunda geração do Federalismo.
Dessa forma, ocorreu uma redefinição teórica da descentralização, para a Países
periféricos endividados, sob o âmbito do modelo do Soft Budget Constraint,
disseminado a partir de fins dos anos 1990. Se consolidou uma nova abordagem para
orientar diretamente a reconstrução institucional e promover a disciplina fiscal em
esferas subnacionais endividadas, sob a égide de restrições orçamentárias fortes, em
contextos descentralizados.
Spanh (1998), um defensor radical da descentralização, acreditava que o processo
poderia ser amplo, inclusive fora da função estritamente alocativa, envolvendo também
as funções estabilizadora e distributiva. Porém, exigiria ações coordenadas de diversas
ordens que assegurassem determinado grau de restrição fiscal e financeira nas esferas
44
subnacionais. Reconhecia, no entanto, que a descentralização poderia gerar problemas
caso a gestão dos orçamentos subnacionais e o controle de acesso dos mercados de
capitais não ocorressem.
Em síntese, mesmo os descentralistas mais radicais passaram a aceitar a
ponderação de que era necessário qualificar a descentralização, construindo elementos
adicionais para que ela promovesse a eficiência, e, ao mesmo tempo, evitassem efeitos
danosos sobre a esfera macroeconômica.
As condições de autonomia fiscal e accountability, se dariam a partir da
adequação da tributação de impostos, e do uso mínimo de dependência das
transferências intergovernamentais, que minimizaria a necessidade de transferências
voluntárias, e das pressões por socorro do governo nacional, posto que, uma adequada
distribuição de atribuições e ou encargos e das competências tributárias, os riscos sobre
a esfera macroeconômica seriam mitigados.
Dessa forma, a noção de disciplina fiscal que se consolidou nos anos 1990
qualificou a descentralização, a partir do conceito de accountability e de coordenação,
ultrapassando os limites da esfera fiscal. Assim, a descentralização fiscal juntamente
com esforço tributário local, passaram a ser sinônimos do termo denominado
accountability.
Em outras palavras, o financiamento das políticas públicas, preferencialmente,
deveria se dar no local da ação, para garantir governabilidade democrática, considerada
um dos principais objetivos da descentralização fiscal, política e administrativa.
E, mediante a atuação dos agentes do FMI nos processos de ajuste fiscal estrutural
nos anos 1990, as restrições fiscais e financeiras aos governos subnacionais dos Países
periféricos se aprofundaram. A orientação era que a partir de regras de austeridade
fiscal, e de um mecanismo de controle hierárquico, haveria um enquadramento
macroeconômico.
A visão geral era de que os Países em desenvolvimento endividados, em especial
os com maior nível de descentralização fiscal e de liberdade financeira, requeriam um
redesenho institucional mais cuidadoso. Alguns argumentos defendiam a necessidade
de se redesenhar as instituições, rever a descentralização das atribuições de receitas e
das despesas, assim como o poder de tomar empréstimos das esferas subnacionais.
O modelo de disciplina fiscal, o Hard Budget Constraint (HBC), tinha como
elemento central a construção de uma engenharia de fortes restrições fiscais aos
governos subnacionais. Ou seja, quando os comportamentos das instituições pudessem
45
gerar riscos para a atividade econômica, interferindo nos elementos de alocação e
seleção providos pelo mercado, as institucionalidades e seus agentes sofreriam
penalidades.
Dentre os mecanismos institucionais criados para o controle e a coordenação
fiscal, no Brasil, ganhou destaque as regras da Lei de Responsabilidade Fiscal, que
determinou restrições que impactaram no processo da descentralização fiscal e nas
relações intergovernamentais.
Em termos gerais, alguns dos principais mecanismos propostos pelo modelo HBC,
foram os instrumentos criados para responsabilização das esferas subnacionais, por
meio da regra de orçamento equilibrado; limitações do estoque da dívida, a partir da
definição de um coeficiente de endividamento; regras para novos empréstimos
concedidos apenas para financiar as despesas de capital (regra de ouro); e o teto
estipulado para a realização de gastos com pessoal. Imposições justificadas pela
necessidade de se honrar o serviço da dívida passada, por meio do cumprimento de meta
de superávit primário e resultado nominal.
O modelo permitiu que as despesas financeiras com pagamento de juros da dívida
pública crescessem de forma exponencial na estrutura orçamentária, pois se alinhava
com os interesses do capitalismo financeiro globalizado. Nesse sentido, se necessário, o
Estado deveria comprometer e/ou sacrificar políticas essenciais para o desenvolvimento
sustentável. Os acordos e alianças entre unidades federativas permaneceriam sob ação
do governo federal, cada vez mais forte e indutor, em um ambiente de austeridade fiscal.
A responsabilidade fiscal era avaliada como fundamental para o modelo HBC. E,
sistemas federativos descentralizados, principalmente aqueles sustentados pelas
transferências intergovernamentais, sem regras claras, poderiam gerar desdobramentos
perigosos macrofiscais. Dessa forma, deveria se potencializar a base de arrecadação da
receita própria das esferas subnacionais, considerada como necessária para o alcance de
uma posição que identificaria a autonomia dos entes federativos com independência
fiscal, ou mesmo uma quase autossuficiência fiscal e financeira.
No caso do brasileiro, acabávamos de mudar o regime, recuperamos a democracia
e aprovamos a Constituição Cidadã em 1988, que garantiu a universalidade. Mas já no
início dos 90, submetemos o país a um severo ajuste fiscal.
Como veremos, permanecemos praticamente imobilizados pelas determinações
da nova disciplina fiscal. As questões urbanas e sociais de competências exclusivas
46
municipais, pactuadas no texto constitucional permaneceram subtraídas da agenda de
desenvolvimento.
E, os municípios, apesar de reconhecidos como entes federativos autônomos,
poucas oportunidades foram viabilizadas para pensar-se o planejamento e
desenvolvimento local. Pois, o aumento dos recursos disponíveis não atendeu às
atribuições descentralizadas, principalmente no caso das 26 capitais, sede de regiões
metropolitanas do País.
Lembrando que, não apenas as restrições fiscais, mas a tradição de indefinições
das fronteiras de atuação de cada esfera de governo, mantida no texto constitucional,
tem permitido a omissão, sobreposição e ausência de cooperação de ações entre os entes
de federativos, comprometendo a construção de um pacto federativo autônomo,
descentralizado e cooperativo.
Segundo Affonso, (1995:57) o pacto federativo brasileiro “(...) consiste, na
verdade, em um conjunto de complexas alianças, na maioria pouco explícitas, soldadas
em grande parte por meio dos fundos públicos”.
A partir daí a federação brasileira travou uma batalha entre as premissas do
pensamento hegemônico versus o pacto social universal e descentralizado vigente,
pactuado por meio de mecanismo de transferências constitucionais e de transferências
voluntárias.
Em um ambiente de restrição fiscal e financeira, as imposições invadiram os
orçamentos dos governos subnacionais, e poucas oportunidades nos restaram para
superarmos o atraso econômico, concomitante com desenvolvimento social,
comprometendo a autonomia federativa, principalmente dos centros urbanos mais
populosos e endividados do País, conforme veremos nos capítulos 3 e 4.
Essa breve reflexão, nos permite construir uma das hipótese desta pesquisa, de
que a experiência da descentralização fiscal brasileira tenha sido uma combinação das
abordagens acima, a descentralização fiscal brasileira mais se pareceu com um
movimento de desconcentração de tarefas e compromisso fiscais, que permitiram a
omissão dos governos superiores nas suas respectivas atribuições, do que propriamente
uma ideia de autonomia fiscal, bem diferente do conceito de descentralização fiscal
definido nas palavras de Silva e Costa (1995:263) como: “um processo de redistribuição
de recursos, espaços de decisões, competências, atribuições e responsabilidades”.
Veremos mais à frente que, a federação brasileira não encontrou um caminho que
permitisse reproduzir de fato autonomia nas relações federativas, a formulação da
47
política pública se encontra centralizada na esfera federal face às exigências dessa nova
disciplina fiscal em cursos desde os anos 90.
Inseridos em um modelo de constrangimentos fiscais, os grandes centros urbanos
permaneceram mergulhados numa série de dificuldades econômicas e sociais, expressas
a partir do processo de desindustrialização do País e da guerra fiscal. Ao mesmo tempo,
aumentaram sua participação na receita disponível do País, porém, com o avanço do
processo da descentralização fiscal e omissão das esferas superiores de governo, o hiato
entre a capacidade e necessidade de investimentos tem sido aprofundado.
48
Capítulo 2: A Crise federativa: marcada pela crise do
endividamento do setor público; pelo modelo da
descentralização fiscal; e as severas imposições fiscais aos
governos subnacionais

2.1 Introdução

Esse capítulo se propõe a recuperar as dificuldades e mudanças que ocorreram


na federação brasileira a partir do início dos anos 80, e que acarretaram enormes desafios
e impasses às relações federativas pactuadas ao longo das últimas décadas, com atenção
especial para a situação fiscal dos grandes centros urbanos - as 26 capitais - objeto de
estudo dessa pesquisa.
Mergulhados em um ambiente de crises fiscal e política, agravadas a partir dos
efeitos da crise econômica, ganhava as ruas o desejo de redemocratizar o País. O
processo se intensificou a partir da insatisfação popular no final do período militar, por
meio do movimento Diretas Já em 1985.
A luta pelos direitos se confundia com a luta por mais recursos financeiros. As
pressões dos governos subnacionais se propagavam frente às tensões sociais espalhadas
por todas as regiões do País. O rearranjo das forças políticas em curso, desde o início da
década 80, colocava em curso o processo da descentralização de recursos e de
responsabilidades, que serão consolidadas a partir da universalização dos direitos e da
criação do orçamento da Seguridade Social em 1988.
Passamos a construir um pacto de relações que nem sempre esteve acompanhado
de ações harmônicas e cooperativas entre as esferas de governos subnacionais. A
operação desmonte avançou e as atribuições descentralizadas ampliaram-se. Entretanto,
na maioria das vezes, as atribuições descentralizadas vieram desacompanhadas de um
planejamento que pensasse o desenvolvimento regional e local, que estava ameaçado
mediante o processo de desindustrialização da econômica brasileira. E os esforços do
governo, em sua maioria, ficaram submetidos apenas às exigências da nova disciplina
fiscal dos anos 90.
Situação que permitiu que cada governo subnacional saísse em defesa dos seus
próprios interesses e de forma predatória, abriu-se espaço para uma guerra fiscal entre
eles. Fenômeno que trará desafios para muitas regiões metropolitanas, principalmente
para as capitais mais industrializadas do País, a partir de inúmeros leilões fiscais, ofertas
49
generosas de isenção de tributos e até espaço físico, em troca de algum investimento.
Esse movimento gerou prejuízos para todas as instâncias federativas.
A busca de interesses isolados se acirrou, por exemplo, alguns estados reduziram
as alíquotas do ICMS26, movimento que comprometeu não apenas o volume de recursos
partilhado com os centros urbanos que mais geravam o valor adicionado, mas prejudicou
o fundo da educação do país, que teve seu orçamento restringido frente às isenções ou
reduções de alíquotas do ICMS.
Ou seja, as 26 capitais perderam importantes empresas que geravam o valor
agregado, consequentemente perderam participação no índice da Cota parte do ICMS27,
responsável pela distribuição dos recursos em cada estado, conforme veremos no
capítulo 4.
Ainda hoje, podemos dizer que não conseguimos construir conduzir um pacto
composto por as ações de cooperação e responsabilidade financeira tripartites entre
União, estados e os municípios metropolitanos, principais polos provedores das políticas
públicas descentralizadas. E mais, passado 30 anos da vigência da Constituição de 1988,
carecemos de uma consciência metropolitana.
A realidade fiscal das capitais que administravam uma economia em processo de
desindustrialização e desemprego, sofria também com a queda da arrecadação própria,
e ao mesmo tempo, como aumento das demandas sociais.
Todas essas questões quando adicionadas às exigências do novo regime fiscal,
culminaram na mais grave crise fiscal e urbana na história do federalismo brasileiro. Ou
seja, as consequências da crise de endividamento que o País atravessava desde o início
dos anos 80, estava entrelaçada com a dificuldade de captar recursos no exterior, cenário
que de alguma forma permitiu que as esferas federal e estadual se ausentassem de muitas

26
A esse respeito, ver Cavalcanti e Prado (1998).
27
Segundo Afonso; Soares; e Castro (2013) desde a época de sua criação, em 1967, até as novas
disposições de 1972, a cota-parte do ICMS era essencialmente devolutiva. Com o Decreto-Lei nº
1.216/72, a transferência foi normatizada a partir do conceito de Valor Agregado (VA), bem próxima a
um esquema devolutivo, o que beneficiava municípios de maior base tributária, principalmente industrial.
Em 1980 (Emenda Constitucional nº 17/80), o uso do VA foi limitado a 75% dos recursos da cota-parte,
passando está a ter caráter híbrido, pois os 25% restantes poderiam ser distribuídos segundo critérios
dispostos na lei estadual. A Constituição de 88 manteve esse modelo de cota-parte, apenas aumentando
de 20% para 25% a parcela do ICMS destinada aos municípios. • Origem dos recursos: 25% da
arrecadação do ICMS pelos estados. Destino dos recursos (regime de partilha): 75% dos recursos
retornam ao município onde foram arrecadados, de acordo com o conceito de VA, e 25%, segundo
critérios definidos em lei estadual. Os critérios mais utilizados nas leis estaduais têm sido o número de
habitantes, a área do município e um coeficiente linear.
50
de suas responsabilidades constitucionais, e as relegassem aos cuidados da esfera
municipal, principalmente para as administrações dos grandes centros urbanos.
A partir daquele momento, muitas questões responsabilidades constitucionais
deixaram de ser tratadas no âmbito federativo e passaram a ser ignoradas no contexto
restritivo das medidas do ajuste fiscal dos anos 90. Realidade que nomeio de difícil
encontro entre a autonomia federativa municipal assegurada no texto constitucional de
1988 versus a rigidez orçamentária cravada nos orçamentos das 26 capitais, não apenas
pelo modelo de barganha do pacto federativo, mas pelas exigências de uma nova
disciplina fiscal que invadiu os anos 1990.
O capítulo discutirá os principais elementos que conformaram a situação das
capitais brasileira durante a década dos 80. A crise econômica, desencadeada a partir do
problema da dívida externa, gerou uma crise fiscal sem precedentes e o colapso do
padrão de financiamento definido desde às reformas de 1964.
A situação financeira das capitais, neste contexto de desestruturação do quadro
econômico, beneficiou-se das mudanças no sistema de partilha resultado das alterações
do pacto político, e simultaneamente, sofreu com as medidas do processo de
descentralização de encargos e das restrições no manejo do orçamento municipal, que
passaram a comprometer a capacidade de as cidades responderem satisfatoriamente ao
crescimento das demandas que recaiam sobre elas, reforçando o movimento
contraditório presente na monopolização desigual do capital e na marginalização do
compromisso social que se consolidou nos grandes centros urbanos no País.

2.2 Colapso do projeto desenvolvimentista do Estado autoritário e os


primeiros reflexos da crise fiscal na década de 80

A evolução das finanças públicas das capitais brasileira em um primeiro plano,


precisa se entendida como parte do quadro mais geral da crise da economia brasileira,
que teve origem com a crise de endividamento externo. Ou seja, o problema criado no
balanço de pagamentos após a falência do modelo de endividamento externo provocou
o sobreendividamento do Estado brasileiro e explicitou o paradoxo criado desde o fim
dos anos 60.
A evolução do estoque de endividamento externo brasileiro, justificado pela
ideia de potencializar o crescimento econômico, revelou seu contrário, mostrou seu
51
efeito como um elemento fortemente agudizador das dificuldades fiscais, que o Estado
terá que enfrentar nas décadas de seguintes.
Para Belluzzo e Almeida (1992), a economia brasileira, mais especificamente o
setor público, passou a enfrentar a mais grave crise de financiamento desde o pós-guerra.
Na visão dos autores, a relação entre o processo de endividamento externo e a crise
fiscal dos 1980 começou a ser estabelecida ainda durante o período de fluxos líquidos
positivos de financiamento, quando a capacidade da arrecadação das receitas tributárias
e, sobretudo, a capacidade de autofinanciamento das empresas públicas já estavam se
atrofiando na segunda metade dos 1970.
O setor público havia se transformado em um agente devedor líquido da
economia, efetivamente, fez com que ele não conseguisse mais honrar a carga de juros,
que passou a ser continuadamente rolada, e a base de sustentação política do modelo
estava comprometida (OLIVEIRA, 1991). Cenário que, de um modo geral, propagou
dificuldades para as três esferas de governo.
O Estado brasileiro decidiu assumir o passivo externo do setor privado que
oputou por pré-pagar suas dívidas externas, realizando depósitos de seu contravalor em
moeda doméstica no Banco Central, que se valia desses montantes para cobrir parte da
expansão das necessidades de financiamento geradas pelas transferências de recursos ao
exterior para o pagamento dos juros.
Isso ocorreu, após os primeiros sinais da crise internacional e da mudança na
indexação cambial no final dos anos 1970, as grandes empresas e bancos, inclusive as
famílias de mais alta renda, puderam gerar a liquidez interna necessária para reduzir
seus níveis de endividamento, cancelando dívidas passadas, no processo denominado de
estatização da dívida.
Na prática, o Bacen remanejou recursos e financiou parte dos juros pagos pelo
setor público. O pré-pagamento realizado pelo setor privado abriu a possibilidade de
manejar a composição das contas ativas sem alterar o passivo dolarizado. A própria
orientação da política macroeconômica de ajustamento, voltada para a produção de
exportação contribuiu para ampliar o estoque da dívida pública, na medida em que o
governo brasileiro estimulava e dava incentivos para o setor privado liquidar seus
compromissos de dívida externa junto ao Bacen.
O governo voltou-se para o mercado doméstico e a necessidade de financiamento
do setor público passou a ser amparada pela captação de recursos internos, por meio da
emissão de títulos públicos, que se tornou um instrumento especulativo. As grandes
52
empresas e bancos direcionavam seus excessos de caixa para compra de títulos públicos,
atraídos pela elevada taxa de juros das aplicações financeiras e, de outro lado, as
empresas deficitárias e os agentes financeiros com problemas de liquidez se abasteciam
desses recursos.
O processo estimulou as grandes empresas nacionais e estrangeiras a recompor
suas estruturas com corte de investimento fixo, redução do nível de atividades,
enxugamento brutal dos estoques de matérias primas e de produtos acabados, elevações
dos preços acima da média da inflação. Enquanto que o Estado, com suas bases
financeiras corroídas, comprometeu gravemente a capacidade de investir e de sustentar
o crescimento ao longo das décadas seguintes. Era o fim da euforia do período de alto
crescimento econômico, e início do processo de crises para a nação brasileira.
Segundo Belluzzo e Almeida (1990), a financeirização dos preços estimulou o
processo de aceleração da inflação, no contexto de restrição externa, o ajustamento
realizado na economia provocaria efeitos deletérios para a arrecadação tributária,
decorrentes da perda de dinamismo da atividade produtiva, e do aumento da participação
das exportações isentas da tributação.
Sem dispor de condições políticas para realizar reformas e reestruturar o
mecanismo de financiamento interno, a política econômica começou a desmontar as
estruturas de incentivos fiscais que haviam sustentado a expansão econômica da década
de 1970 e a compensar o efeito da queda da atividade econômica com a elevação dos
impostos internos, não só pelo aumento de suas alíquotas em geral, como também por
meio da criação de novas imposições tributárias. A consequência das políticas de ajuste
recessivo conduziu o Estado autoritário a perder apoio de suas bases políticas de
sustentação.
A deterioração progressiva da situação financeira do governo e de suas empresas
conduziu o debate sobre as condições das finanças públicas. Inevitavelmente, as
relações fiscais intergovernamentais sofreram prejuízos.
O governo adotou um conjunto de medidas recessivas, entre elas elevou as taxas
de juros internas; expandiu a carga tributária; e reduziu os gastos públicos e os
dispêndios das empresas estatais. Para as áreas sociais, segundo Fagnani (2005), o
estreitamento da intervenção estatal era nítido, pois a recessão debilitou principalmente
os setores cujos mecanismos de financiamento eram baseados nas contribuições sociais,
como a previdência, a atenção médica, a assistência social, a habitação e o saneamento.
53
A partir daquele momento, o País empobreceu, o desemprego e a informalidade
aumentaram, e as demandas urbanas foram relegadas a um segundo plano. Incapazes de
cumprir os compromissos sociais, a desigualdade social alcançou níveis sem paralelos,
e enorme parcela da população permaneceu à margem do processo de desenvolvimento
social e econômico.
O movimento por reinvindicações das esferas subnacionais ganhou força, no
sentido de que fosse realizada uma reforma na partilha dos recursos tributários da
federação, dada a situação de penúria em que se encontravam as finanças públicas dos
governos subnacionais.

2.3 Mudança Política e a Descentralização Fiscal

A crise de ingovernabilidade mobilizava o País. Em meados dos anos 80,


liderada pelos governadores, partidos de oposições, sindicatos e associação de classes,
a denominada campanha “Diretas Já” ocupou as ruas, e clamava pelo restabelecimento
do Estado de Direito com eleições diretas para presidente, exigindo a ruptura com a
longa tradição de políticas centralizadas, elitistas e autoritárias.
Um Estado com uma trajetória marcada por escolhas de seus parceiros, quase
sempre de forma cooptada com a acumulação da riqueza, que excluiu o povo das
decisões e o deixou, praticamente, sem vida federativa, sem participação política, sem
partido político, sem legislativo independente, atuante e forte.
O desejo da redemocratizar a política era aclamado por todos os cantos da
federação. As organizações coletivas floresciam e se fortaleciam por toda parte e
demandavam providências imediatas. A estruturação dos partidos políticos mostrava o
desejo de muitos segmentos da sociedade, dos movimentos sociais e dos sindicatos, por
participação política nas decisões nacionais.
Em novembro de 1982, o partido de sustentação do regime militar perdera a
maioria absoluta na Câmara dos Deputados, e dez governadores, prefeitos e vereadores
pertencentes aos quadros da oposição venceram a eleição por meio do voto direto
(Revista do PMDB, 1982). A vitória ilustrava a desintegração do Estado autoritário que
perdia forças e o apoio da classe média e do empresariado que estava descontente com
os rumos da economia.
54
Parecia que o caminho não estava mais livre para o governo central tomar
decisões segundo seus próprios interesses e das poucas forças que ainda o apoiavam. O
Congresso começava a recuperar forças no debate político, e o povo reivindicava a
democracia nas ruas. A mobilização do País pela universalidade dos direitos sociais se
se confundia com a necessidade de relações mais cooperativas e harmônicas entre as
esferas federativas.
Conforme Oliveira (1995), o desejo da população era construir uma sociedade
digna e civilizada, e contra o espírito autoritário e centralizador do regime militar. Luta
que se confundia com o anseio de autonomia aspirada pelos governos subnacionais.
Praticamente, direita e esquerda política, governos subnacionais, legislativo, oposição e
sociedade defenderam de forma quase que unânime, o movimento da descentralização
fiscal, independentemente das questões ideológicas e políticas de cada governo na
época.
As pressões por mais recursos, levaram o poder central a iniciar o processo de
descentralização fiscal28 para contornar a demanda dos governos subnacionais em busca
de maior participação na distribuição da receita tributária. A partir da Constituinte de
1988 a esfera municipal passou a ser reconhecida como um membro autônomo da
federação, recebeu direitos e assumiu responsabilidades.
Particularmente os municípios sede de regiões metropolitanas passaram a
assumir de forma bastante peculiar inúmeros deveres decorrentes da necessidade de
ajustar as finanças públicas do País e por herdarem as estruturas dos IAPs.
Para Affonso (2000), o movimento da redemocratização se confundiu com o
processo da descentralização fiscal. Enquanto que para Fiori (1995), a iniciativa de
colocar em curso a descentralização fiscal respondia muito mais a uma manobra do
governo central para vencer os entraves criados pelo autoritarismo, do que propriamente

28
A descentralização de recursos do poder central em prol dos estados e municípios entrou em curso, e
uma das primeiras mudanças ocorreram a partir das manifestações e atuações da oposição político
partidária no Congresso, foi a aprovação das emendas Passos Porto e João Calmon, números 23 e 24,
respectivamente, em dezembro de 1983. A emenda n.23 aumentou a participação dos estados e municípios
na receita disponível por meio da elevação das alíquotas do fundo de participação estadual (FPE) e do
fundo de participação municipal (FPM), e a participação dos governos subnacionais no Imposto Único
sobre Combustível e Lubrificante também foi ampliada, além de incluírem a alíquota do IPI na base de
cálculo do ICM que incidia sobre cigarros. E a emenda n.24 definiu que a União aplicasse o percentual
mínimo de 13%, e estados e municípios, o percentual mínimo de 25% das receitas de impostos com
educação. E, para que esses direitos fossem assegurados por meio do modelo de gestão descentralizada,
a partilha dos recursos era crucial, não só para o financiamento das políticas da proteção social, mas
principalmente para o revigoramento do pacto federativo, que deveria representar o fortalecimento técnico
e político entre as esferas subnacionais, além de uma possível eficiência na gestão dos recursos públicos,
um caminho para a cristalização do equilíbrio federativo.
55
um pacto que revigorasse as relações federativas, que acabaram repletas de vazios e
sobreposições de papéis, dificultando o entendimento da função de cada ente de
governo.
Vale lembrar que as forças conservadoras haviam escolhido democraticamente
Fernando Collor de Mello para governar o País. Com medidas restritivas aprofundou o
desmonte do organograma da administração federal, e interrompeu a construção das
políticas urbanas, principalmente, dos setores de transporte, saneamento e habitação.
Na sequência iniciou-se o processo das privatizações das empresas públicas; e
da captura dos recursos da seguridade social; aliado ao aumento da carga tributária não
partilhada com os governos subnacionais. A expectativa da governabilidade social
soprada pelo texto da Constituição Cidadã parecia inviabilizada.
Ou seja, apesar do projeto de Estado aprovado no texto Constitucional de 1988
representar o desejo do povo brasileiro, as indefinições e ausências de ações e
investimentos necessários para o desenvolvimento local e regional, aliada à retórica
liberal do governo Collor, permitia o avanço da operação desmonte, a abertura
econômica sem nenhum planejamento.
As regiões mais industrializadas do país sofreram as consequências da
liberalização econômica e passaram a conviver com desemprego, e a guerra fiscal
declarada entre regiões e municípios do País. Todos endividados e de joelhos com o
pires na mão, os governos subnacionais saíram em defesa dos seus próprios interesses
de forma predatória.
As medidas do novo modelo fiscal criaram muitos desafios aos governos
subnacionais, ficava evidente que os interesses do FMI se encontravam acima das
conquistas que a nova República havia assumido.

2.3.1 O objetivo e o alcance da descentralização fiscal brasileira: mudar o modelo para


nada mudar
56
As demandas reprimidas por políticas de inclusão social eram aclamadas e foram
contempladas no orçamento da seguridade social29, estruturadas financeiramente pelas
contribuições sociais.
Por todas as regiões da federação muitos outros temas permearam o debate da
construção do novo pacto federativo, como a política salarial, crescimento do emprego,
condições de trabalho, educação, reforma agrária, reforma tributária, reforma financeira,
política urbana, habitação popular, saneamento básico, política de transporte coletivo,
desenvolvimento tecnológico e regional, meio ambiente, energia, reestruturação das
relações com o exterior, entre outros.
Entretanto, o capítulo II da Seguridade Social, que prometia mudar a história do
Estado brasileiro a partir do acesso universal e igualitário de direitos individuais e
coletivos, parecia complexo e contraditório com a agenda do governo escolhido.
Para Dain (1995) uma primeira dificuldade da reforma de 1988 foi desconsiderar
a dinâmica populacional daquele momento e ignorar os problemas sociais que gritavam
principalmente nas regiões metropolitanas. A descentralização das políticas sociais foi
promovida de forma irracional na fixação dos critérios de partilha. Ou seja, as alterações
estruturais verificadas na configuração das competências tributárias e na definição dos
encargos mais pareciam um movimento meramente reativo ao processo de centralização
tributária do período autoritário.
Os encaminhamentos da descentralização fiscal estavam baseados na
preocupação com a equalização, em favor dos governos subnacionais na participação na
receita tributária, a partir do aumento dos índices de participação nos fundos destinados
aos dos estados (FPE) e municípios (FPM).

29
Capítulo II da Constituição Federal. Seção I, Disposições Gerais, artigo, 194. A seguridade social
compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas
a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base
nos seguintes objetivos: I - universalidade da cobertura e do atendimento; II - uniformidade e equivalência
dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais; III - seletividade e distributividade na prestação
dos benefícios e serviços; IV - irredutibilidade do valor dos benefícios; V - equidade na forma de
participação no custeio; VI - diversidade da base de financiamento; VII - caráter democrático e
descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos
empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados. (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 20, de 1998).
57
Em simultâneo, com o discurso que as demandas da agenda social recaíram
fortemente sobre o orçamento federal, o governo buscou recompor a sua base tributária
com a criação de mais contribuições sociais que permitiriam a recentralização da
participação federal na receita disponível, ao mesmo tempo em que transferia parte das
atribuições antes concentradas na esfera federal para os estados e municípios, ou
simplesmente a política pública deixava de ser oferecida ao cidadão.
Como já abordado, naquele momento o Brasil vivia um encolhimento de sua
base de arrecadação, mediante a abertura econômica e à política tributária de isenção e
desoneração para alguns setores. Dessa forma, a arrecadação das rubricas de receitas
que compunham os fundos de partilha era prejudicada, porém, fundamentais para
assegurar as políticas descentralizadas.
Com regulamentação do financiamento tripartite pouco definida, as decisões
administrativas e o nível de provisionamento de serviços públicos locais tiveram
resultados bastante diferentes por regiões e localidades.
De um modo geral, a federação construiu relações e políticas descoladas do
princípio de solidariedade, na contramão do fortalecimento das relações federativas,
apenas atrelado ao jogo de interesses privados e do descompromisso social para a
maioria da população. Silva e Costa (1995), observaram que na trajetória do Estado
brasileiro, o viés clientelista corporativista de apropriação privada do espaço público
por segmentos específicos da sociedade sempre prevalecera.
Dessa forma, retomo a problemática central: o arranjo federativo de 1988,
desalinhado com a agenda liberal, não permitiu que as cidades sedes das regiões
metropolitanas que abrigavam e atendiam um terço da população brasileira,
enfrentassem as complexas questões urbanas sociais e de infraestrutura que
contabilizavam. Conforme Oliveira (1995:10):
A verdade é que, embora a reforma de 1988 se tenha colocado uma
importante oportunidade para a remoção de várias mazelas do sistema,
de concreto não se haviam registrado mudanças suficientes na
correlação das forças sociais que assegurassem a sua reconstrução em
bases mais justas e civilizadas, ao contrário do que parecia indicar, a
alternância de poder ocorrida entre o regime militar e civil. O fato é
que as mudanças que se processaram nas relações de forças políticas,
à época, parecem ter restringido seu raio de ação à garantia da troca
de comando do País, mas não à edificação de uma sociedade assentada
em outras bases. Desse processo, emergiu um quadro de transição
pactuada que, por um lado, garantiu importantes espaços para os
atores que ocupavam a cena anterior e, por outro lado, indicou à
sociedade que se caminharia em direção à reprodução da farsa
leopardesca de mudar alguma coisa para nada mudar. Essa, a razão
58
que levou à frustação de expectativas criadas em torno de soluções
para as distorções do sistema, verbi gratia a da iniquidade, presentes
e ampliadas durante o período autoritário do País.

Para Francisco de Oliveira (2006), a nova República institucionalizou a


redemocratização sob a forma de uma transição feita por cima, prussianamente, pois o
controle da redemocratização permaneceu nas mãos dos mesmos que se salvaram do
incêndio. A continuidade da manutenção do arranjo federativo gestada nos governos
autoritários, verdadeiros feudos regionais, vinculados a interesses específicos de direção
política estava intacta.
Do ponto de vista tributário, segundo Oliveira (1995), até foi sugerido que se
fizesse uma reforma que convocasse mais setores e atores para participar do ônus
tributário, porém o texto optou pela inércia do sistema tributário anterior, sem alterar a
essência do modelo regressivo na tributação.
A descentralização unilateral de despesas, levou o governo a evadir-se das
funções compartilhadas, mais para se desonerar de algumas delas do que para resolver
os conflitos. Não houve uma solução satisfatória para a distribuição de encargos e
ampliaram-se as críticas acerca da sobreposição de responsabilidades entre governos
municipais, estaduais e federal.
Ao optar por cortes de gastos, a União se omitiu do papel que lhe foi designado
na carta magna, principal provedor do capital social básico. Ou seja, governo federal ao
livrar se de algumas responsabilidades, simplesmente saiu de cena, e determinou que
fossem excluídas da agenda nacional algumas políticas setoriais.
Por outro lado, ao adotar medidas para expandir sua arrecadação, e aprofundar a
regressividade do sistema tributário brasileiro, a partir da evolução da participação das
contribuições sociais cobradas sobre o ombro dos mais fracos, iniciou o processo para
recompor sua participação na receita disponível30. Sem qualquer discussão, o desenho
das relações federativas acabou não estabelecendo um nível de participação da receita
disponível adequado à proporcionalidade necessária para as atribuições
descentralizadas.
E, mesmo diante da ampliação da cobrança de contribuições sociais, o governo
federal promoveu cortes nas despesas com investimentos e custeio na área social,

30
Para esta pesquisa, receita disponível é a receita total, excluídas as operações de crédito e as deduções
da receita corrente.
59
justificados em parte pela redução do nível de atividade econômica e pela necessidade
de reduzir o nível do déficit público.
Podemos dizer que a ação do governo era orquestrada com objetivo de manter o
controle político e operacional da descentralização para que seu poder de influência não
fosse reduzido. A lógica e procedimentos de articulação dos interesses não havia sido
alterada, e permitiu que a luta de interesses regionais e negociações varejistas
beneficiassem poucos e potencializassem os conflitos federativos.
Acredito que os ingredientes estavam postos para a consagração da crise
federativa. Ainda que os governos estaduais e municipais tenham sido favorecidos por
meio da participação na receita disponível, porém, insuficente para financiar de forma
satisfatória a universalidade dos direitos que o País aguardava.

2.3.2 Fortalecimento do poder local ou perpetuação das distorções e rigidez orçamentária


municipal?

Um olhar mais cuidadoso para o processo decisório que reformulou a


distribuição dos recursos fiscais, marcado por uma temática regional, pode nos ajudar a
compreender a problemática, de um modo geral, vivida pelos centros urbanos mais
populosos do País. Muitos dos critérios de partilha foram definidos a partir de um viés
redistributivo de renda, o denominado de Fundo de Participação de Municípios31 (FPM).
As regras de repartição do FPM incentivaram o movimento de emancipação
municipal após a Constituição Federal de 1988 (CF/88). Para Gomes e MacDowell
(2000) a metodologia de partilha do FPM reduziu a eficiência da economia como um
todo e, por vezes, privilegiou os pequenos municípios ricos.
Ou seja, acreditava-se que a metodologia de partilha do FPM pudesse criar
condições que fortalecessem a economia de gestões municipais com pouca dinâmica
econômica. Na prática, o fenômeno da emancipação de os antigos distritos, garantiu a
concessão de mais recursos financeiros aos municípios menores. Conforme dados do
IBGE, em 1980, a federação reunia 3.974 municípios; em 1990, esse número já
ultrapassava 4.490; e em 2007, superou 5.560 municípios, ou seja, houve um aumento
de quase 25%, conforme mostra a tabela 1.

31
Os fundos de participações são transferências constitucionais, determinadas no texto constitucional,
artigo 159, inciso I, letra b, que definiu como base para formação dos fundos a arrecadação de impostos
federais (IPI e IR), com princípio de promover a redistribuição desigual da receita às unidades menos
privilegiadas. Os coeficientes de participação dos estados e distrito federal estão definidos em Afonso
(2000).
60
É preciso reconhecer que o resultado da metodologia da partilha do FPM,
seguramente ampliou o volume de receitas disponíveis na esfera municipal, ao mesmo
tempo, contribuiu para que os novos municípios absorvessem considerável fatia da
receita do município do qual se desmembrou, de modo que a população que permaneceu
no município de origem sofreu com a redução per capita dos recursos, passando a
receber menor valor para o atendimento das demandas locais.

Tabela 1 - Evolução do número de municípios por regiões do País


Evolução do número de municípios no Brasil por região
1980 1990 2007 Variação 2007 / 1990
Brasil 3.974 4.491 5.564 24%
Norte 153 298 449 51%
Nordeste 1.375 1.509 1.793 19%
Sudeste 1.410 1.432 1.668 16%
Sul 719 873 1.188 36%
Centro-Oeste 317 379 466 23%
Fonte: IBGE. Elaboração Própria.

E, em muitos casos, os municípios menos populosos, apesar de receberem um


volume maior de recursos por habitante continuaram a demandar os bens e serviços
públicos nos grandes centros urbanos, sem nenhuma compensação e contrapartida
harmoniosa de recursos entre eles. Além disso, os novos e pequenos municípios
aplicaram parte expressiva dos recursos recebidos com as despesas da nova estrutura
administrativa do executivo e legislativo, que proporcionalmente passaram a custar
mais, quando comparada às estruturas administrativas dos municípios maiores.
Lembrando que é o Tribunal de Contas da União é quem efetua o cálculo das
quotas e fixa os coeficientes de participação de cada município na distribuição de
recursos do FPM, fiscaliza a entrega dos recursos e acompanha, junto aos órgãos
competentes da União a classificação das receitas responsáveis pela origem do Fundo.
A fixação dos coeficientes individuais de participação dos municípios no FPM é
efetuada com base nas populações de cada município brasileiro enviadas ao Tribunal
pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) até o dia 31 de
outubro de cada exercício e na renda per capita de cada Estado, também informada pelo
IBGE.
A partir dessas informações, o Tribunal de Contas da União calcula o fator
população e o fator renda per capita. Dessa forma, o valor do FPM para cada município
específico varia não apenas com a faixa populacional, os valores transferidos variam de
61
acordo com a unidade federativa. Com esse valor, extrai-se o fator correspondente a
partir da Tabela FPM, consoante ao CTN, art. 91, § 1º.
No caso da apuração do índice das capitais, o critério de divisão dos recursos do
Fundo determinou que 10% do total deveria ser enviado aos municípios das capitais, e
90% aos demais Municípios. E com relação aos dois critérios, a participação da
população da capital na população total das capitais, e a renda per capita do Estado, faz
com que as capitais de estados mais ricos recebam relativamente menos que as capitais
mais pobres. Ou seja, a distribuição dos 10% entre as capitais faz-se na razão direta da
população do Município e na razão inversa da renda per capita do Estado.
Dos 90% destinados aos demais Municípios, retira-se, inicialmente, uma parcela
de 3,6% para aqueles com mais de 142.633 habitantes; e os demais são enviados para
os chamados de “classe interior”, que auferem 86,4% do total. Ou seja, o regime de
partilha atual direciona 10% dos recursos às capitais de estado; 86,4% aos municípios
do interior; e 3,6% aos municípios mais populosos do interior.
O critério do FPM prejudica justamente os municípios dormitórios e os mais
populosos, ou seja, quando o município atrai mão-de-obra, cresce a taxa de demografia,
por sua vez, recebe menor transferências per capita de FPM.
Nesse sentido, os centros mais populosos e que crescem a taxas crescentes,
recebem menos recursos para custear minimamente os bens e serviços públicos que lhes
são demandados. A tabela 02 mostra a evolução da participação em pontos percentuais
das principais receitas que compõem o orçamento, por intervalo populacional dos
municípios brasileiros. É possível identificar que para os municípios com mais de 1
milhão de habitantes, a participação do FPM tem pouca representatividade na estrutura
da receita corrente, quando comparados com os demais intervalos populacionais.

Tabela 2-Participação média das principais receitas orçamentárias, por


intervalos populacionais, anos: 1998, 2004 e 2010, em %
População RC / RT RecTributária Própria/ RT IPTU / RC ISSQN / RC *Transf Corrente / RT FPM / RC ICMS / RC
MUNICIPIO
1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010
acima de 1 MILHÃO 23% 23% 20% 86% 97% 89% 35% 35% 36% 11% 12% 11% 19% 16% 19% 45% 43% 39% 4% 3% 4% 20% 17% 15%
500 MIL - 1 MILHÃO 8% 9% 8% 98% 97% 93% 24% 22% 23% 8% 7% 6% 10% 10% 10% 61% 59% 55% 7% 8% 6% 27% 24% 20%
300 MIL - 500 MIL 8% 9% 8% 92% 98% 92% 25% 24% 22% 10% 9% 6% 9% 10% 10% 59% 56% 56% 7% 7% 7% 24% 22% 19%
100 MIL - 300 MIL 17% 17% 17% 95% 97% 94% 20% 17% 18% 8% 6% 5% 7% 7% 9% 67% 62% 62% 14% 12% 11% 27% 23% 20%
50 MIL - 100 MIL 12% 11% 12% 95% 97% 94% 14% 14% 13% 6% 5% 3% 4% 5% 6% 75% 69% 71% 19% 16% 16% 28% 24% 19%
30 MIL - 50 MIL 8% 8% 9% 93% 96% 94% 11% 11% 11% 5% 4% 3% 3% 3% 5% 80% 76% 75% 27% 22% 20% 24% 19% 18%
795 - 30 MIL 25% 23% 24% 91% 96% 92% 5% 6% 6% 2% 1% 1% 2% 2% 3% 88% 83% 80% 40% 33% 31% 23% 21% 17%
Média 100% 100% 100% 91% 97% 92% 21% 20% 19% 7% 7% 5% 9% 9% 10% 66% 62% 61% 17% 14% 14% 24% 21% 18%
FONTE: STN/FINBRA, anos: 1998, 2004 e 2010.
OBS: *Já descontadas as deduções para formação do Fundef/Fundeb.
62

As transferências constitucionais criaram uma discrepância de recursos per capitas


na federação. Entretanto, é preciso lembrar que as perdas de recursos pelos municípios
mais populosos, com população acima de 500 mil habitantes, não foram apenas oriundas
do critério de partilha do FPM, mas do processo de desindustrialização32, das
consequências da guerra fiscal e da recessão econômica que podem ser observadas na
participação da Cota parte do ICMS na receita corrente.
Por exemplo, as informações da tabela 3, no ano de 2006, os municípios com
população de até 5 mil habitantes, receberam de FPM per capita, em média, R$ 1.449,12
(um mil quatrocentos e quarenta e nove reais), em valores atualizados de março de 2018.
Enquanto os municípios com população acima de um milhão de habitantes, receberam
de FPM per capita, em média, R$ 79, 21 (setenta e nove reais). É o mesmo que afirmar
que os municípios menos populosos da federação receberam de FPM per capita18 vezes
mais que os municípios que reuniram mais de 1 milhão de habitantes.

Tabela 3- Receita Total, Transferências Correntes e FPM per capita, por intervalo
populacional, em R$
População
Municípios por intervalo Transferências
por Receita Total FPM (*)
populacional Correntes (*)
intervalo
Até 5 Mil Habitantes 3.937.734 R$ 3.143,01 R$ 2.699,31 R$ 1.449,12
5-10 Mil Habitantes 7.835.424 R$ 2.073,55 R$ 1.729,66 R$ 678,34
10-20 Mil Habitantes 16.020.674 R$ 1.765,92 R$ 1.470,44 R$ 538,67
20-50 Mil Habitantes 27.230.905 R$ 1.631,01 R$ 1.284,89 R$ 397,77
50-100 Mil Habitantes 19.598.930 R$ 1.675,56 R$ 1.210,65 R$ 283,06
100-500 Mil Habitantes 44.076.746 R$ 1.812,95 R$ 1.129,08 R$ 202,61
500 - 1000 Mil Habitantes 15.511.967 R$ 1.775,23 R$ 1.077,02 R$ 140,58
Mais 1000 Milhão Habitantes 36.108.737 R$ 2.416,00 R$ 1.029,39 R$ 79,21
Fonte: Finbra 2006. Elaboração Própria.
(*)Valores já descontados as Deduções para formação do FUNDEF.
Valores Corrigidos IPCA IBGE, março de 2018.

É bem verdade que o processo da descentralização fiscal tinha essa tarefa de lançar
mão de instrumentos redistributivos e alocativos de recursos, voltado para os
desequilíbrios inter e intrarregionais, ou seja, os descompassos na capacidade de
tributar. Porém, Prado (2004:37) observa que:
(...) a partir de 1989, os fundos de participação deixaram de ser um
sistema redistributivo minimamente consistente, tornando-se apenas
um mecanismo rústico de compartilhamento de dois impostos federais
– IPI e IR –, com estados e municípios, a partir de percentuais fixos.

32
A esse respeito, ver Carneiro (2002).
63

Isso porque, a metodologia para a distribuição respeitou apenas a necessidade de


se aprimorar o instrumento de transferência de recursos para regiões e municípios menos
consolidadas economicamente, medida necessária para um País que buscava o
desenvolvimento sustentável.
Prado (2004) destacou que, em 1965, quando foi construído o sistema de fluxos
redistributivos, com critérios distintos para estados e municípios, de alguma forma, o
critério era flexível e dinâmico. Já em 1989, o sistema foi destruído integralmente no
que tangente à sua parcela que denominou de “boa”, pois perdeu a capacidade de se
adaptar dinamicamente à evolução da renda e ao crescimento populacional, e tal
adaptação era um requisito fundamental de sistemas que pretendiam exercer uma função
redistributiva.
Prado ainda observou que no caso dos estados, as distorções do critério de
distribuição eram menores, pois ocorreu algum impacto redistributivo, porque os
percentuais congelados beneficiaram as regiões mais pobres do País. Contudo, não
permitiram a flexibilidade de adequação às dotações de recursos, à medida que as
diferenças em nível de desenvolvimento e de população se manifestassem.
Dessa forma, o critério do FPM desencadeou distorções, que traduzem a
circunstância criada pelo pacto vigente. Cenário que permitiu que o percentual apurado
com despesas de investimentos com relação ao total das despesas orçamentárias dos
municípios mais populosos seja menor, conforme mostra tabela 4.
Ou seja, embora os municípios menos populosos tenham contribuído com apenas
6% de receita tributária própria na composição do orçamento total, a capacidade para
investir foi superior à capacidade dos municípios com mais autonomia para tributar.
A maior participação dos investimentos na estrutura orçamentária ocorreu em
cidades menos populosas, o que sugere uma ausência na correlação direta entre
arrecadação tributária própria e alocação de recursos, e, por sua vez, autonomia
orçamentária.
Dessa forma, no período analisado, os centros urbanos mais populosos do País,
conviveram com os menores volumes de investimentos em termos percentuais das
despesas totais realizadas. Inclusive registraram valores inferiores ao intervalo dos
menores municípios, ou seja, aqueles que apresentaram maior nível de dependência dos
recursos intergovernamentais.
64
Tabela 4 - Participação média das principais categorias da despesa pública no
orçamento total dos municípios brasileiros – Anos: 1998; 2004; e 2010, em %
Intervalo Despesas Correntes Despesas de Capital
População
populacional: 5560 Pessoal / DT Juros / DT Outros Custeios /DT Investimento/DT Amortizações/ DT
Municípios 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010
acima de 1 MILHÃO 23% 23% 20% 47% 43% 36% 3% 5% 4% 27% 40% 46% 8% 10% 8% 12% 2% 3%
500 MIL - 1 MILHÃO 8% 9% 8% 59% 44% 43% 2% 1% 1% 28% 42% 45% 9% 11% 9% 1% 2% 2%
300 MIL - 500 MIL 8% 9% 8% 59% 45% 41% 3% 1% 1% 27% 42% 43% 9% 10% 13% 2% 2% 2%
100 MIL - 300 MIL 17% 17% 17% 54% 44% 45% 2% 1% 1% 29% 40% 41% 13% 13% 12% 2% 2% 2%
50 MIL - 100 MIL 12% 11% 12% 55% 45% 48% 1% 1% 0% 29% 40% 40% 13% 13% 10% 2% 2% 2%
30 MIL - 50 MIL 8% 8% 9% 52% 44% 47% 1% 0% 0% 31% 41% 39% 13% 13% 11% 2% 2% 2%
795 - 30 MIL 25% 23% 24% 49% 44% 46% 0% 0% 0% 33% 44% 39% 16% 11% 13% 1% 2% 1%
Média 100% 100% 100% 51% 44% 43% 2% 2% 1% 29% 41% 42% 11% 11% 11% 5% 2% 2%
FONTE: STN/FINBRA, anos: 1998, 2004 e 2010.
Legenda: Depesas Totais (DT).

Realidade que nos mostra que a descentralização brasileira se contradiz com a


premissa da teoria do federalismo fiscal, de que maior a participação dos recursos
próprios na estrutura orçamentária, maior deveria ser a autonomia municipal para
planejar e decidir sobre os investimentos locais.
Em valores per capita, corrigidos pelo IPCA IBGE de março de 2018, a tabela 32
do anexo 7 mostra que os munícipios que reuniram menor número populacional, e que
concentraram pouco mais de 12 milhões de pessoas, investiram em média per capita, no
ano de 2010, R$ 442 (quatrocentos e quarenta e dois reais). Se a aferição for realizada
através do valor máximo investido per capita, foi apurado um montante de R$ 16.330
(dezesseis mil, trezentos e trinta reais) anualmente.
Ao contrário dos municípios com maior esforço fiscal, maior participação da
receita própria na composição do orçamento total, e, mais importante, com maior
adensamento populacional de quase 55 milhões de pessoas, o valor médio de
investimento per capita foi de R$ 289 (duzentos e oitenta e nove reais) ao ano. Quando
analisado pelo maior valor realizado nesse intervalor populacional, os investimentos per
capita realizados não passaram de R$ 1002 (um mil e dois reais) ao ano, praticamente,
dezesseis vezes menor comparado ao intervalo com menor população municipal.
Dessa forma, acredito que a conquista da autonomia orçamentária atribuída aos
municípios a partir do processo da descentralização fiscal não pôde ser igualmente
experimentada por todos os municípios brasileiros. Ainda que os municípios menos
populosos e com menor dinâmica econômica não sejam formuladores e financiadores
das políticas públicas de interesse local, fica a impressão de que têm mais autonomia
para elaborar programas na estrutura orçamentária face às condições fiscais que reúnem.
65
Nesse sentido, acredito que ganha importância e urgência a necessidades de
mecanismos que consigam assegurar parte das demandas dos grandes centros urbanos,
a partir de uma ação cooperada e coordenada por uma instituição metropolitana, vis-à-
vis a condição fiscal em que as capitais se encontram.
E, conforme informado pelo IBGE (2007), nos últimos anos a população
metropolitana tem crescido mais que o restante do País. Segundo o levantamento, a
população das metrópoles brasileiras aumentou em torno de 6,5 milhões de habitantes.
Isso representou um aumento relativo de aproximadamente 10%, enquanto a população
do restante do País teve um acréscimo de 6,5% desde o início da década até hoje.
Sabemos que uma região metropolitana, embora situada dentro da estrutura do
Estado federado, tem funções distintas, de nível municipal, e de nível estadual ou
macrorregional. Porém, o resultado mais frequente tem sido as regiões metropolitanas
administrarem a fusão de complexos problemas de uso do solo, transportes, saneamento
e meio ambiente. Na prática, os municípios de variados portes de uma região
metropolitana têm sido afetados por um mesmo problema metropolitano.
Segundo Alves (2016), as funções públicas de interesse comum, caracterizadas
pelo regime de direito administrativo, que abrangem questões metropolitanas e ou
regionais podem implicar não só os chamados serviços ou funções de interesse local,
como uma possível articulação ou complementação com outros serviços ou funções,
tendo em vista seu tratamento em nível regional, por razões de ordem dimensional,
social, institucional, geográfica, natural, econômica ou técnica.
Ou seja, há funções que podem ser identificadas como regionais, como por
exemplo a captação e tratamento da água na região metropolitana, os transportes
suburbanos ou o tratamento dos esgotos da metrópole.
Dessa forma, temos primeiramente que reconhecer a existência da dificuldade de
conceber e implantar ações de interesse comum, ainda que claramente caracterizadas
como ações regionais, não contemplam uma divisão de funções distribuídas entre as três
esferas federativas.
São funções que compreendem a natureza de interesse local dos municípios
metropolitanos, o que justifica a participação destes nas decisões sobre sua organização,
planejamento e execução orçamentaria e financeira. Por isso essa questão não pode ser
solucionada adequadamente dentro do quadro institucional tradicional. O interesse
metropolitano não é privativo do local, reclamando uma legislação e participação
estadual ou nacional.
66
Em segundo lugar, é preciso reconhecer que ainda não existe na federação uma
consciência metropolitana que pudesse conduzir essas ações de forma integrada e
cooperativa, a partir do financiamento tripartite entre União, estados e municípios. O
atual federalismo fiscal brasileiro não responde aos desafios do fenômeno
metropolitano.
A necessidade de investimento e custeio em infraestrutura pública de alto custo
(trens urbanos, metrôs, projetos de despoluição, entre outros) demandada pelos
moradores dos vários municípios que integram uma região metropolitana, na maioria
das vezes, permanecem sem fontes de financiamento definidas, e, portanto, desprovidas
de ações.
De modo geral, as condições fiscais das sedes de regiões metropolitanas são
apresentadas como uma das principais dificuldades para implementar políticas sólidas
e coordenadas no âmbito metropolitano.
Enquanto isso as capitais conservam-se imersas em um conflito federativo e fiscal
que dificilmente se resolverá no curto prazo, pois exige um equilíbrio nos arranjos do
pacto federativo vigente.
E, justamente, as transferências redistributivas que prevaleceram na barganha
federativa não contemplaram os desafios metropolitanos. Assim, a expectativa que
havia em relação ao enfretamento das questões sociais do passado, em função da
ausência de políticas públicas integradas entre as três esferas de governo, permaneceu
relegadas a um segundo plano nas cidades sedes de regiões metropolitanas. Resultado
que aprofunda as lacunas nas relações federativas dos grandes municípios.
Acredito que para enfrentar essa problemática, o diálogo federativo torna-se
fundamental, assim como conhecer identidade e indicadores sociais e econômicos de
cada local, e respeitar a capacidade fiscal e técnica de uma região metropolitana. Se
observadas essas questões, a chance de sucesso de atuação de uma região metropolitana
certamente teria sido maior. Inclusive reduzindo a chance do oportunismo, de ações
predatórias atendidas em detrimento das necessidades de ações coletivas.
Cumpre lembrar que a função pública de interesse comum metropolitano deve ter
solução para determinados problemas comuns, por meio de um relacionamento entre os
municípios interessados e os governos superiores, na solução de determinados
problemas de cunho regional comum. Para Alves (2016), tal relacionamento geralmente
se concretiza através de convênios ou consórcios, tradicionalmente colocados à
disposição das unidades políticas para a realização de propósitos comuns e que não
67
exigem tratamento compulsório. Grande parte da matéria relativa a esse tratamento está
definida na competência comum prevista na Constituição Federal, objetivando a
cooperação entre os entes governamentais federados, e os interesses comuns.
Acredito que essas questões são fundamentais para a formatação de um pacto
harmônico e cooperativo, vital para a federação. Há necessidade de substituirmos o
modelo atual, que mais contribuiu para agravar, principalmentes, as disputas fiscais
horizontais entre eles, que aprofundaram o desequilíbrio entre as necessidades de gastos
e a capacidade de financiamento dos grandes centros urbanos, do que propriamente
fortalecer as ações metropolitanas.
A cada processo orçamentário é possível identificar que os critérios de
distribuição de receita permaneceram ineficazes e, que, sozinhas, as 26 capitais, sede de
regiões metropolitanas, permaneceram praticamente desprovidas de programas e ações
que contemplem às questões metropolitanas.
Prova disso é ausência de dialógo entre os municípios vizinhos, e as inúmeras
lacunas e vazios nas ações cooperativas urbanísticas e sociais que permanecem
excluídas da agenda federativa, além do próprio acirramento do conflito por disputas de
receitas.
Alinhado com essas questões, persisto na hipótese de que o movimento de
descentralização das receitas disponíveis, conforme mostra tabela 5, tem sido
insuficiente para acomodar as responsabilidades que as 26 capitais assumiram, ainda
que não fossem competências exclusivas delas.
Rezende (1995) destacou que a melhor posição relativa dos estados e municípios
na repartição das receitas tributárias não foi suficiente para impulsionar um processo
abrangente e organizado da descentralização do gasto público, em parte, justificado
pelas competências concorrentes33 designadas às três esferas federativas, e que ainda
aguardam as regulamentações.

33
O título VIII da Constituição, expresso nos artigos 193 a 225, determinou as competências concorrentes,
e que a competência da União seria restrita às normas gerais sobre os temas repartidos, o que, sem dúvida,
gera dificuldades na identificação exata dos limites em que pode atuar tal ente federado sem invadir a
parcela de competência dos Estados, Distrito Federal e Municípios. De um modo geral, ficou assegurado
que a promoção da seguridade social, deveria ter suas ações e financiamentos integrados entre os três
níveis de governo; e ficou estabelecido que a educação; desporto; proteção do meio ambiente; promoção
de programas de moradia e saneamento básico e integração social também seriam políticas no âmbito das
competências concorrentes.
68
Tabela 5 - Evolução Receita Disponível por esfera de governo, em %
Receita Disponível por Esfera de Governo - em %
ANO União Estados Municípios
1960 59,4 34,0 6,6
1980 69,2 22,2 8,6
1988 62,3 26,9 10,8
1991 56,3 27,4 16,3
1997 56,3 27,1 16,6
1998 59,2 25,0 15,8
1999 60,0 24,7 15,3
2000 59,7 25,3 15,0
2001 56,4 27,1 16,5
2002 57,1 26,6 16,3
2003 57,4 26,4 16,2
2004 58,2 25,7 16,1
2005 57,9 25,8 16,4
Fonte: Estudo da Receita Federal, vários anos.
Elaboração Própria.

A indefinição de papéis no financiamento e prestação dos serviços públicos


inseridos no rol das competências concorrentes, pode ter sido uma estratégia que
favoreceu à política restritiva adotada pelo governo central, posto que não agredia seus
interesses políticos e o deixava em situação confortável para buscar a estabilização
monetária e o ajuste fiscal das contas públicas.
Dessa forma, podemos afirmar que, ao contrário das expectativas, o aumento não
conseguiu atender aos desafios urbanos, principalmente dos centros mais populosos do
pais.
Todavia, reconheço que o texto constitucional aprovado definiu que o
financiamento fosse cooperativo entre os entes, mas na prática, a ausência da
regulamentação permitiu um comportamento mais competitivo do que cooperativo.
Isso porque, não houve preocupação em discriminar a ordem social prevista no
Título III, da Organização do Estado, Capítulo II da União, as competências comuns 34,

34
O Artigo 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
- zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas e conservar o patrimônio
público;
- cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;
-proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos,
as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;
- impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico,
artístico ou cultural;
- proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação, à ciência, à tecnologia, à pesquisa e à inovação;
- proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;
- preservar as florestas, a fauna e a flora;
- fomentar a produção agropecuária e organizar o abastecimento alimentar;
69
especialmente às atribuições do artigo 23, parágrafo único, foram transferidas para
regulamentação de Lei Complementar.
Diante desse comportamento, os grandes centros urbanos sofreram ataques a sua
autonomia federativa em função da ausência de regulamentação de muitos setores, e das
imposições da nova disciplina fiscal adotado pelo governo brasileiro nos anos 90.
Enquanto que, ficou estabelecido que as responsabilidades de competências
exclusivas35 municipais definidas no artigo 30 da Constituição Federal, deveriam ser
financiadas apenas com recursos próprios e transferências constitucionais.
O resultado dessa estratégia era interessante para o governo central, que
discriminou quais deveriam ser as tarefas dos municípios, ao mesmo, não definiu quais
recursos deveriam financiar as ações descentralizadas, comuns aos três entes federados.
Estratégia que justifica a demora para regulamentar assuntos fundamentais e de
interesse da nação, adiados para a segunda metade dos anos 90. Por exemplo, o antigo
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do
Magistério (FUNDEF), que se transformou em dezembro de 2006, no atual Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais

- promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de


saneamento básico;
- combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização, promovendo a integração social dos
setores desfavorecidos;
- registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos
e minerais em seus territórios;
- estabelecer e implantar política de educação para a segurança do trânsito.
Parágrafo único. Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em
âmbito nacional.
35
O Artigo 30 definiu as competências exclusivas municipais:
- legislar sobre assuntos de interesse local;
- suplementar a legislação federal e estadual no que couber;
- instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da
obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;
- criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;
- organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de
interesse local, incluído o transporte coletivo que tem caráter essencial;
- manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação pré-escolar
e de ensino fundamental;
- prestar, com cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da
população;
- promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso
do parcelamento e da ocupação do solo urbano;
- promover a proteção do patrimônio histórico-cultural, observadas a legislação e a ação fiscalizadora
federal e estadual.
70
da Educação (FUNDEB)36, foi regulamentado quase 10 anos da vigência do texto
constitucional de 1988, por meio da Emenda Constitucional 14, publicada em 1996.
Não foi diferente para definir os critérios de repasses e aplicações dos recursos do
Sistema Único de Saúde (SUS), que foram regulamentados apenas no ano de 2000, por
meio da Emenda Constitucional 2937. Após quase 20 anos da publicação do texto
constitucional, em 2006 foi criado o Centro de Referência da Assistência Social
(CRAS), que ainda é uma realidade em poucas cidades do País.
Esses fundos passaram a ser criados para garantir recursos mínimos para essas
áreas. Porém, a nação brasileira ainda aguarda a regulamentação de métodos que
estabeleçam metas mínimas de melhoria a serem alcançadas, no sentido de enfrentarmos
o atraso no padrão dos serviços prestados.
Ou seja, podemos dizer que a falta de comprometimento dos governos superiores
nas responsabilidades descentralizadas permitiu que o hiato orçamentário persistisse
representado entre a necessidade e capacidade dos governos subnacionais assumirem
suas responsabilidades constitucionais.
Não demorou muito, os municípios capitais começaram a registrar sucessivos
aumentos no déficit público. Segundo as palavras de Maciel (1998:03):
“Estados e municípios, vencedores – em princípio – da batalha da
descentralização promovida pela Constituição de 1988, estão
assistindo a uma deterioração do resultado primário ano após ano:
saíram de um superávit de 1,5% do PIB em 1991 para um déficit de
0,74% em 1997”.

Dessa forma, a postura de recentralizar recursos, desmontar programas, e não


regulamentar outros, fazia parte das ações realizadas pelo governo central, que de
alguma forma impediram a efetivação dos novos direitos constitucionais 38. A bem da
verdade, as expectativas de enfrentamos a desigualdade social ruíram.
Fomos impedidos de implantar qualquer mecanismo de cooperação e harmonia
entre as três esferas de governo para garantir a oferta de políticas públicas. A seguridade
social se chocou com o discurso neoliberal, que desrespeitou e abocanhou parte do seu
financiamento, e o direcionou para o orçamento fiscal, mais especificamente para a

36
A Emenda Constitucional n. 14, de 12 de setembro de 1996, modificou os Artigos 34, 208, 211 e 212
da Constituição Federal e deu nova redação ao artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias.
37
A Emenda Constitucional n. 29, de 13 de setembro de 2000, alterou a Constituição Federal, instituindo
a vinculação de recursos da União, dos Estados e dos Municípios para o custeio de ações e serviços
públicos de saúde, no § 2º do artigo 198 da Constituição Federal.
38
A esse respeito, ver Azeredo (1990) e Fagnani (1997).
71
funcional encargos especiais, onde são empenhadas e pagas as despesas com juros e
amortização do principal da dívida pública.
Conforme Villaça (2003), passamos a ser governados pelo mundo do pensamento
único, do Consenso de Washington, o mundo perdido, sem rumo, sem paradigma e sem
futuro, com homens incapazes de encontrar a solução para os problemas.
Mudamos o regime, a liderança política, mas nada foi alterado. Desde a sua
criação, a proteção social passou a disputar recursos com o orçamento fiscal, exatamente
como no passado, sufocada pela operação desmonte e por severas restrições fiscais
implementadas pelas medidas liberais dos anos 1990.
É possível afirmar que a esfera municipal ficou sobrecarregada com as
consequências desse modelo, com desaparecimento da oferta de alguns serviços federais
e estaduais. As prefeituras metropolitanas foram forçadas a assumir novas funções e
municipalizar muitos programas, que ampliaram a necessidade dos gastos correntes e
de investimento em infraestrutura.
Vencer os desafios criados a partir dessas mudanças consistiria em superar a
questão que não aparece no debate, permitindo que a transferência de responsabilidades
ocorresse repleta de vazios e lacunas de financiamento39.
Acredito que tenham sido esses os principais fatores que iniciaram a crise
federativa e fiscal dos grandes centros urbanos, que ainda se encontram incapazes de
assumirem problemas que estão cristalizados no âmbito urbano e social, mesmo diante
do aumento da receita disponível ao longo do período estudado, conforme veremos no
capítulo 4.
Assim, pode se dizer que a disponibilidade financeira definida no texto
constitucional não guardou uma relação condizente com a natureza das demandas e com
o desenho demográfico intrarregional do País, e pode ser vista e sentida nas 26 capitais.
Acredito que o desequilíbrio federativo emergiu a partir do agravamento das
assimetrias verificadas não só no volume dos recursos disponíveis, mas também na atual
divisão das responsabilidades, que não nos permite – ou é quase impossível – identificar
uma hierarquia das responsabilidades correspondentes de cada ente federativo.
Passados quase 30 anos da promulgação da Constituinte, permanecemos
desprovidos desse debate, o resultado é uma insatisfação generalizada dos cidadãos,
com crise de funções, uma briga de todos contra todos nas estruturas da federação, e

39
Para a análise do comportamento do gasto social no período posterior à Constituição de 1988, ver
Medici (1995), e Afonso e Raimundo (1995).
72
ninguém parece ter razão. Esses acontecimentos sinalizam que existem prioridades a
serem debatidas no processo da descentralização fiscal, que foi incapaz de promover
uma configuração das ações federativas harmônicas e transformadoras que o País tanto
clamou.
Entendo que dividir responsabilidades e ser por elas justamente remuneradas é
direito não só das esferas de governos, mas, acima de tudo, interesse dos cidadãos
brasileiros, já que são os municípios que poderiam garantir maior agilidade e qualidade
de atendimento da prestação dos serviços públicos, pois é a esfera que oferece melhores
condições para um efetivo controle social dos recursos públicos, e conhece
profundamente as demandas locais.
Existe a necessidade de se estabelecer um pacto com a necessidade de cobertura
dos gastos de determinados programas, de modo que as demandas possam ser atendidas
de uma forma mais equilibrada. Aliado a isso, é imprescindível deixar de lado o discurso
de que existiria uma incapacidade financeira e técnica dos governos municipais.
Me parece mais correto para entender essa configuração, como bem disse Affonso
(2000), que a partir da redemocratização do País, continuamos mergulhados em uma
gestão de Estado voltada quase que inteiramenre aos compromissos associados à
valorização do capital, prevalecendo a balcanização do poder.
Ou seja, mais uma vez, a reprodução das condições sociais e os interesses das
classes mais fragilizadas continuaram sem voz política e foram marginalizados na plena
vigência da Constituição Cidadã. A ampliação da desigualdade econômica e social inter
e intrarregional se expressa por todas as regiões do País, principalmente, nos grandes
centros urbanos, que passaram a conviver, lado a lado, com a acumulação do capital e
da pobreza.
Acredito que este capítulo observou questões que caracterizaram as dificuldades
estruturais decorrentes a partir do processo da descentralização fiscal, sob o âmbito de
pouca coordenação financeira e orçamentária, e de poucos avanços nas regulamentações
do papeis de cada esfera de governo, que reforçou o jogo de interesses privados,
enquanto que os interesses coletivos permaneceram desconectados de qualquer
possibilidade de construirmos ações integradas que nos direcionem para uma coesão
social.
Vem à tona a necessidade de uma reflexão que nos permita um debate fiscal,
capaz de enfrentar os conflitos federativos, as indefinições e vazios de competências
73
governamentais, o clientelismo e corporativismo presentes nas ações dos órgãos
responsáveis pela implementação das políticas públicas no País.
Fica evidente que a federação precisa de um ajuste forçado nas políticas
descentralizadas, capaz de resolver os conflitos, as indefinições e os vazios de
competências, e de fato selar compromissos com seus cidadãos, estabelecer e assumir
as confusas tarefas constitucionais, com regulamentações cristalinas, inclusive retomar
o debate sobre o papel da Região Metropolitana.
É impossível continuar com precarizações dos serviços sociais, indefinições e
ausências de papéis, em um modelo no qual perguntas, como: “Quem faz o quê? ”,
“Com quais recursos? ”, “E para quem faz? ”, ainda não têm respostas claras e simples,
mesmo diante de um processo de descentralização em curso há quase três décadas.
74
Capítulo 3: Os percalços dos 1990: ajuste fiscal combinado com
descompromisso social
3.1 Introdução

Mesmo com a autonomia federativa assegurada aos governos subnacionais e a


universalidade garantida a todos os brasileiros, no capítulo anterior observamos que
muitos foram os desafios decorrentes das relações pactuadas a partir de 1988.
Com um resultado econômico praticamente estagnado, decorrente da interrupção
e redução do volume de investimento público, tecnologia defasada, crise inflacionária,
queda da receita tributária, a expectativa de que a redemocratização e o movimento da
descentralização fiscal devolvesse ao País as oportunidades para o desenvolvimento
econômico e social foram sendo frustradas, à medida que uma nova institucionalidade
fiscal era imposta à federação brasileira.
As transformações que ocorreram nas relações fiscal e financeira, entre
Municípios, Estados e União na primeira metade dos anos 90, materializava-se contrária
ao desejo da construção de cidadania, e cedeu espaço para o fortalecimento da nova
ordem econômica e fiscal que invadiu o País.
Os desejos e interesses da elite do capital por meio do movimento da rápida
abertura comercial e financeira e das ações de austeridade fiscal do Estado brasileiro,
recaíram e impediram a promessa de gerar empregos e combater a desigualdade social
econômica inter e intrarregional.
Circunstância que contribuiu para degradação do mercado de trabalho, o aumento
da informalidade e contenção salarial. Nesse cenário, os investimentos não apenas do
governo federal, mas dos governos subnacionais sofreram cortes substanciais e muitos
despareceram da agenda do governo.
Ao mesmo tempo, os municípios capitais passaram a contabilizar o peso da
necessidade de financiamento para os investimentos sociais e urbanos, mediante os
avanços do processo da descentralização fiscal, bem como da operação desmonte do
Estado e dos próprios efeitos do aumento do desemprego.
Esse capítulo tem o proposito de recuperar as principiais medidas e consequências
do ajuste fiscal dos 90 para os grandes centros, sede de regiões metropolitanas. Isso
porque, os efeitos da política econômica do plano Collor, promoveram a retração do
valor agregado nos centros mais industrializados, que era fundamental na formação do
75
índice de participação, principal rubrica de receita constitucional para as 26 capitais, a
denominada cota parte do ICMS, de livre alocação e basilar para financiar o pacto
federativo vigente, sofreu enormes prejuizos com os efeitos gerados a partir da
desindustrização, e na sequencia pela guerra fiscal.
Dessa forma, a redução no volume das transferências constitucionais, como
também no fato gerador das receitas próprias, sobretudo a partir das consequências
decorrentes da falência das empresas locais e do desemprego, foram predatórias para os
centros mais populosos do País.
Outra questão que observaremos, reconhecendo que as 26 capitais são titulares
dos principais polos provedores municipalizados da proteção social, a partir da
recentralização da receita disponível na esfera federal, por meio da desvinculação da
receita da União - FSE/FEF/DRU-, os prejuízos orçamentários para as políticas da
seguridade social foram expressivos.
Novamente serão citadas, em um contexto de omissão federativa dos governos
superiores, a regulamentação das regiões metropolitanas. E mediante o processo das
privatizações dos bancos e empresas estaduais, outras dificuldades surgem para
viabilizar os programas de infraestrutura nas capitais.
E por fim as dificuldades e limites fiscais decorrentes da renegociação da dívida
pública municipal, que estabeleceu limites para o endividamento público, e as restrições
da Lei de Responsabilidade fiscal definiram tetos de gastos com pessoas, e impôs a
necessidade de cumprir-se metas de superávit primário e nominal.
Como bem observou Oliveira (2012), a partir daquele momento o governo operou
para cumprir as metas fiscais e garantir a capacidade financeira para honrar os serviços
da dívida na estrutura do orçamento público, conforme mostra tabela 23, anexo 09. Na
visão do Estado brasileiro, a reforma liberal40 tornava-se indispensáveis para estabilizar
a relação DLSP/PIB.
Com poucas alternativas para realizarem investimentos e com infraestrutura de
equipamentos públicos insuficiente, as 26 capitais saem em busca da terceirização de
infraestrutura e serviços, conforme veremos no capítulo 4.

40
Ver Carvalho (2000).
76
3.2. Os impactos da política fiscal dos anos 90 nas finanças públicas das 26
capitais brasileiras

O mundo era globalizado já no final de 89, esperava que os Países latino-


americanos restabelecessem relações com os fluxos de capitais privados internacionais.
Expectativa que segundo Belluzzo (2002), refletia a deflação da riqueza mobiliária e
imobiliária daqueles mercados.
Ocasião que exigia uma atuação ativa dos governos latino americanos para que os
interesses da nova ordem econômica e fiscal do mundo globalizado fossem atendidos,
por meio de mecanismos regulatórios e condicionalidades designadas às finanças
públicas desses países.

3.2.1 As implicações do modelo fiscal restritivo para as metrópoles brasileiras

Na primeira fase do plano Collor, o anuncio do bloqueio da liquidez da riqueza


financeira submeteu a economia nacional em um cenário de polítcas monetárias e fiscais
restrititvas. Parte do uso da liquidez retida41 contribuiu para elevar a arrecadação do setor
público, e os recursos retidos puderam ser usados para saldar dívidas tributárias e
bancárias.
Entretanto, as medidas da liberalização econômica42, somadas às restrições
fiscais, fizeram com que os resultados da atividade econômica piorassem, e por sua vez,
a arrecadação das 26 capitais sofria com queda no volume de transferências
constitucionais, bem como nas receitas próprias, e, ao mesmo tempo, os governos
superioes se omitiam de muitas de suas responsabilidades constitucionais.
O governo federal promoveu um contingenciamento drásticos das dotações
orçamentárias, principalmente com as políticas sociais e de investimentos já em
andamentos. O governo central alegava que tais medidas eram necessárias a partir do

41
As empresas e famílias possuidoras de dívidas a pagar – bancárias e tributárias –, em vez de utilizar a
liquidez da nova moeda para realizar os pagamentos, adquiriam de outras empresas e agentes a
titularidade sobre os Valores a Ordem do Banco Central (VOBCs) retidos e com eles realizavam os
pagamentos. Os haveres não utilizados no processo viraram poupança de longo prazo, os denominados
VOBCs, que rendiam correção monetária, mais 6% ao ano.
42
Importante lembrar, que mediante a abertura às importações induziu um ajuste nas empresas que
sentiram a ameaça de acirramento da competição. O ajuste de preço foi superficial e concentrou-se no
corte dos custos, redução dos níveis hierárquicos, contratação dos serviços terceirizados, redução do
escopo das atividades industriais, e recorreu-se à importação dos bens cuja produção havia sido
interrompida, incrementando as compras externas de insumos, componentes e bens de capital, frente à
urgência de aprimorar a qualidade e a atualização tecnológica. As sucessivas medidas liberais resultaram
em um drástico corte de emprego para a indústria brasileira, processo denominado de Desindustrialização.
77
avanço do processo da descentralização fiscal, pois havia perdido participação na receita
disponível, e mediante a instabilidade econômica que afetava o País, a capacidade de
novos investimentos públicos ficava comprometida; e que a partir da redução do déficit
público, o controle da inflação se fortaleceria, permitindo um planejamento da política
financeira necessária para dar lastro às políticas de austeridade fiscal.
Dessa forma, o discurso centrava-se na necessidade de cortes de gastos, inclusive
a partir da venda de patrimônio público, que elevaria a arrecadação do governo.
Lembrando que a receita de alienação de bens públicos não era partilhada com os
governos subnacionais, e muito menos com o orçamento da seguridade social. O valor
deveria ser alocado integralmente para na alocação das despesas financeiras.
Outra forma de compensar a perda na receita disponível43 se deu por meio da
criação de novos tributos, em especial das contribuições sociais e de aumento de
alíquotas de impostos não compartilhados com os governos subnacionais. Ou seja, a
carga tributária aumentou e permitiu um movimento contínuo de recentralização
financeira, porém, sem nenhuma discussão com a sociedade democrática do País.
Estratégia que em nada contribuiu para soldar o pacto federativo, e a qualidade da carga
tributária nacional piorou, e o nível da desigualdade de renda44 aumentou.
Tal investida reduziu a importância dos recursos tributários que compunham as
transferências constitucionais, e que deveriam assegurar a descentralização das
responsabilidades. Começava a ficar evidente que os instrumentos da nova ordem
econômica e fiscal pactuaria apenas com os interesses de poucos. O governo federal,
sistematicamente, implementava medidas que feria o objetivo constitucional selado por
meio contrato social vigente.
A figura 01 nos permite visualizar a evolução da COFINS com relação ao PIB,
que ao longo do período observado foi sofrendo aumentos sucessivos, a alíquota passou
de 0,5%, em 1988, para 2%, em 1990. Enquanto que as receitas dos impostos que
sustentavam as transferências constitucionais perderam fôlego, em função do menor
dinamismo econômico, caso emblemático do IPI, conforme mostra a figura 01.

43
Para esta pesquisa, entende-se por receita disponível todas as receitas advindas de tributos, que ficam
disponíveis a cada esfera de governo, depois de computadas as transferências recebidas e os repasses
feitos às demais esferas de governos.
44
A esse respeito, ver Pochman (2008 e 2014).
78
Ou seja, a base das receitas das transferências constitucionais em 1988
representava 48% do total da receita tributária; em 1990 já havia sido reduzida para 39%
(OLIVEIRA, 1995).
O modelo em curso era desfavorável não apenas para o federalismo, mas de um
modo geral, prejudicava a economia e o contribuinte. O aumento dos tributos
contribuiram para que os preços relativos da economia45 aumentassem, prejudicando a
competitividade nacional.

Figura 1 - Evolução da COFINS e IPI

Evolução IPI e COFINS em % do PIB


Fonte: Estudo da Receita Federal, vários anos
4,5
4,08
4
3,56 3,82
3,98
3,5 3,38 3,97
3,02 3,69 3,73
3
2,47
2,5
2,16 2,08 2,04
2
1,55
1,31 2,14 1,49 1,23
1,5 1,79 1,21 1,23
1,6
1,38
1
1,18 0,99
0,5 0,88

0
1991 1993 1994 1997 1999 2000 2001 2005 2006 2007 2008 2009 2010

IPI CONFINS

E a cada ano, a omissão nas funções constitucionais, em nome das metas de


superávit operacional e primário, e do acordo da renegociação da dívida no início dos
90, permitiu que obstáculos quase que intransponíveis se efetivassem.
Em um gesto de boa vontade e de forma unilateral, o País retomou os pagamentos
dos juros das dívidas em 1991. A tese era de que o governo buscava condições e espaço
para a inserção do País no mundo da liberalização financeira. Em julho de 1992, a
reestruturação da dívida pública nos moldes do Plano Brady46, celebrou o acordo
preliminar com os credores internacionais.

45
O aumento da carga tributária de tributação, principalmente, indireta, garantiria prejuízos para a
competitividade econômica, uma vez que sua sistemática teria incidência cumulativa na formação do
“custo Brasil”, ampliando também a regressividade da estrutura tributária, transferindo um ônus maior
para as camadas mais pobres da população. Vale lembrar que, naquele momento, a federação já sofria
com os efeitos da estagnação econômica, com as altas taxas de juros e com o desemprego.
46
O plano pretendia renovar a dívida externa de países em desenvolvimento mediante a troca por bônus
novos. Esses bônus contemplavam o abatimento do encargo da dívida, por meio da redução do seu
79
O Brasil imediatamente ampliou o montante de recursos orçamentários
comprometidos com o pagamento dos juros vincendos de 30% para 50%. A partir dessa
renegociação os objetivos do liberalismo se fortaleceram, e parte expressiva do
orçamento era drenada para o pagamento dos juros da dívidas públicas federal com o
mundo.
O vazamento desses recursos em nada contribuiu com a geração de emprego
nacional, e muito menos com a promessa de coesão social. A redução do papel do
Estado, alinhado com o resultado da queda da atividade econômica, concomitante à
erosão das suas receitas, aumentou a pressão pelas demandas sociais.
Após o processo de impendimento do presidente Fernando Collor, assume o vice
Presidente da República, que imediatamente priorizou e ampliou os compromissos
fiscais, e na sequencia anunciou um plano estabilização econômica, o Plano Real. O
discurso do governo Itamar Franco era apoiado na necessidade de aumentar as
transferências de responsabilidades para os governos subnacionais e alterar o regime
fiscal, principalmente por meio da recuperação da receita e avanços no programa de
privatização do patrimônio público. Ações que se consolidaram no Programa de Ação
Imediata (PAI)47.
O diagnóstico central era de que o processo inflacionário resultava do
desequilíbrio fiscal. Para o governo, o sucesso da estabilização econômica dependeria,
fundamentalmente da criação de instrumentos que permitissem alcançar o equilíbrio
fiscal. O anuncio do plano de estabilização em 1994, seguia a linha de argumentação do
PAI, apoiada pelo instrumento da âncora cambial, taxa de juros altas, e de realização de
um superávit fiscal.
O Plano Real concentrou-se na aprovação das reformas tributária e a
previdenciária; e propôs a desvinculação de receitas do orçamento da seguridade social,
por meio da Emenda Constitucional que instituiu o Fundo Social de Emergência (FSE)
48
.

principal ou pelo alívio nos juros. Além de emitir os bônus, os países deveriam promover reformas liberais
em seus mercados.
47
Ver Lopreato (2013) e Bacha (1994).
48
O ministro da Fazenda do governo Itamar Frando, Fernando Henrique Cardoso (FHC), em 7 de
dezembro de 1993, anunciou medidas fiscais para reduzir o déficit público. Criou o Fundo Social de
Emergência (FSE), que depois virou Fundo de Estabilização Fiscal (FEF) e deu origem à atual DRU –
Desvinculação de Receitas da União. Esses mecanismos permitiram desvincular 20% das receitas
orçamentárias e direcioná-los para o cálculo do superávit primário.
80
A metodologia do FSE desvinculava 20% dos valores que seriam investidos na
seguridade social e determinava que fossem alocados na composição das metas fiscais
do governo, usados para assegurar o pagamento de juros da dívida pública. Acredito que
essa medida cristalizou os compromissos do governo brasileiro com a agenda liberal.
O aumentou da carga tributária e da centralização dos recursos na esfera federal
se deu também, em 1994, por meio da criação do imposto provisório sobre
movimentações financeiras (IPMF), em 1997, transformado em contribuição provisória
sobre movimentação financeira (CPMF).
O governo prometia que esses recursos seriam investidos no orçamento do setor
da saúde, mas não ficou estabelecido no texto da lei, a condição de que os recursos do
IPMF/CPMF deveriam ser adicionados ao volume de recursos do orçamento que já
vinham sendo direcionado para o orçamento da saúde.
A aprovação dessa nova rubrica de receita pública abriu espaço para que o Tesouro
Nacional remanejasse as fontes de recursos do orçamento que financiavam a saúde
pública para outras áreas, não necessariamente a seguridade social.
Para se ter uma ideia da intensidade da recentralização dos recursos, a participação
das contribuições sociais na carga tributária saltou de cerca de 11,3% do PIB em 1990,
para 19% em 1994.
Num primeiro momento, se dizia que a combinação das políticas de austeridade
fiscal, somadas à sobrevalorização do câmbio administrado, a concorrência da abertura
comercial, e a manutenção de elevadas taxas de juros, juntas contribuíriam para uma
vitória contra a inflação alta.
E os déficits na conta de transações correntes do País seriam facilmente
financiados, a partir de as condições de liquidez internacional, uma enxurrada de
capitais seriam atraídos pelo diferencial da taxa de juros brasileira.
Para Belluzzo e Almeida (2002), o Plano Real “seguiu o método básico para dar
fim à maioria das ‘grandes inflações’ do século 20: recuperação da confiança na moeda
nacional, por meio da garantia de seu valor externo”. Esta forma de alcançar a
estabilidade de preços conhecida como âncora cambial, somente era possível quando
houvesse um financiamento em moeda estrangeira, e uma quantidade suficiente de
reservas internacionais que desestimulasse a especulação contra a paridade escolhida.
As autoridades monetárias controlavam o comportamento da taxa de câmbio
nominal; impediram qualquer reajuste nos salários; e ainda elevaram os juros e adotaram
medidas de restrição ao crédito. Sob essas condições, ao mesmo tempo em que
81
alcançamos a estabilização inflacionária, ocorreu um crescente desajuste fiscal que
caminharam juntos, e eram faces desta mesma moeda, o Real (BELLUZZO, 2002).
Podemos dizer que a formação dos déficits volumosos externos e internos, foram
obras integralmente da engenharia do Plano Real, a partir do crescimento rápido das
dívidas externa (do setor privado) e interna (do setor público).
Com esse espírito, o processo de desmonte dos programas federais avançou, e as
responsabilidades delagadas por meio da descentralização de funções aos governos
subnacionais aumentaram, ao mesmo tempo, parte dos recursos eram desvinculados ou
insuficientes para assegurar o custo, e o impacto das políticas públicas municipalizadas,
principalmente para os municípios polos provedores dos serviços, as 26 capitais.
Rapidamente as finanças públicas dos governos subnacionais passaram a
contabilizar enorme déficit público e sofriam com as quedas expressivas na arrecadação
tributária. Os déficits fiscal e social se agravaram e conduziram a uma forte desigualdade
de condições econômicas e sociais para a grande maioria da população.
Segundo Giambiagi (2008) o período de 1988 até 1994, os municípios eram
superavitários. A partir de 1994, após os sucessivos cortes das despesas no orçamento
geral da União (OGU), a questão do déficit público municipal se agravou. A
recentralização dos recursos na esfera federal foi fundamental para a consolidação
deficitária municipal, principalmente nos centros urbanos que administravam os
maiores prejuízos econômicos e sociais desde o início da década de 90.
Para Abrúcio (1999), a implantação das medidas liberais foram possíveis a partir
da aliança do PSDB e PFL, que juntos atuaram nas lideranças regionais de maior peso,
e os governadores garantiram a aprovação das medidas restritivas e centralizadoras. E,
apesar de muitos estados e municípios do Norte, Nordeste e Centro-oeste, os mais
dependentes de transferências federais sofrerem perdas substanciais de receitas, o
momento de estabilidade na coalização política que sustentava o governo Fernando
Henrique Cardoso, assegurava a aprovação das reformas ocorridas no âmbito do Estado
brasileiro.
Ambiente que permitiu a aprovação da medida que limitou o raio de ação dos
governos subnacionais, a Lei Complementar nº 82, de 27 de março de 1995, que definiu
os limites para as despesas com pessoal ativo e inativo, da administração direta e
indireta.
Ficava evidente que estávamos diante de uma éspecie de ideologia, que assegurou
e legitimou a especulação financeira no País, ao mesmo tempo, contribuiu para o
82
desequilíbrio das finanças públicas. O governo, comprometido quase que
exclusivamente com o segmento financeiro, passou a administrar o País guiado pela
apuração de metas em detrimento de qualquer outra política pública de interesse
coletivo.
A regra básica do programa de estabilização se pautava fundamentalmente na
oferta de ativos atraentes que pudessem ser absorvidos pelo movimento da globalização
-a oferta dos títulos públicos – e que prometessem elevados ganhos de capital e prêmios
de risco em suas taxas de retorno, os denominados spreads.
Conforme Carneiro (2002), a política de esterilização deu origem ao chamado
déficit quase fiscal, decorrente do diferencial entre taxa de juros obtida na aplicação das
reservas, e aquela paga aos detentores de títulos públicos que gerava enormes
constrangimento às finanças públicas, face à excessiva apreciação do câmbio e à
necessidade da constituição de um colchão de segurança contra a fuga de capitais. Na
verdade, o diferencial da taxa representava um pedágio pago pelos Países
subdesenvolvidos para se inserirem na globalização.
O nível de endividamento interno iniciou uma trajetória jamais vista na federação.
O resultado foi uma rápida conversão do superávit de 1994 que o País herdou do
governo Itamar Franco, em déficit do setor público em 1995.
A partir daí, as finanças públicas brasileiras se deterioravam face aos custos das
políticas de juros e do câmbio valorizado. De acordo com Belluzzo e Almeida
(2002:364):
(...) na partida do Plano Real, a situação financeira do setor público era
invejável, uma vantagem que nenhum dos planos anteriores pudera almejar.
O ajuste fiscal e de endividamento público do Plano Real foi feito antes. Em
1993, as contas do governo registravam superávit primário e operacional, e
a dívida líquida total e mobiliária nunca havia sido tão baixa.

Para os autores, a política econômica do governo FHC jogou fora esse trunfo e
depois levou ao limite do insustentável a situação das contas públicas, pois não houve
nenhuma preocupação, nem instrumentos de proteção voltados para as finanças
públicas.
As combinações de câmbio valorizado49 e juros altos, com crescimento medíocre
encarregariam de impulsionar o crescimento da dívida pública interna com relação ao

49
Segundo Belluzzo e Almeida (2002), a recuperação da confiança na moeda nacional ocorreu por meio
da garantia do seu valor externo. A âncora foi a estabilização do câmbio nominal, garantida por meio do
financiamento em moeda estrangeira e por um montante de reservas capazes de desestimular a
especulação contra a paridade escolhida.
83
PIB, enfraquecendo a capacidade do Estado perante as necessidades de políticas de
desenvolvimento.
Na visão de Milton Santos, a globalização do projeto liberal tal como foi vendida,
deveria ser considerada uma fábula perversa, elaborada pela violência da informação, e
que fez com que não discutamos a solidariedade.
Sabemos que toda a discussão do pensamento dominante se fez apenas em bases
contábeis, desconsiderando qualquer possibilidade de coesão social e desenvolvimento
econômico sustentável. A sensação que fica é que os debates ocorreram no campo da
perversidade, naturalizando e cristalizando a desigualdade social para favorecer os
donos do poder.
A engenharia da estabilização do Plano Real alcançou, em um curtíssimo prazo,
aumentos expressivos nas contas do passivo externo e interno e seguiu adiante, pois
atendia aos interesses da riqueza financeira. Com altas taxas de juros e baixo
crescimento do PIB, a relação dívida pública/PIB evoluiu de 30%, em 1994, para 45%,
em 1999. A piora da relação se explica para um mesmo valor de dívida: quanto menor
o denominador dessa relação, no caso, o PIB, maior a relação dela com o tamanho da
economia.
Diante desse cenário, o custo das despesas financeiras no orçamento geral da
União passou a consumir mais da metade da estrutura do orçamento fiscal, recursos que
eram transferidos para a riqueza dos rentistas, contra os interesses coletivos majoritarios
do País. Ficamos sujeitos a esse projeto.
E, com o agravamento dos efeitos desencadeados pela crise mexicana e asiática
na metade dos 1990, todas as condições para uma crise das contas externas estavam
criadas. Por razões comerciais e bancárias, em razão do descasamento de moedas, uma
crise cambial poderia ser deflagrada.
A reversão dos empréstimos bancários externos criava um problema de solvência
doméstica – a reversão do ciclo de ativos – um problema de liquidez externa em razão
das saídas de divisas. Situação que se tornaria insustentável rapidamente.
Em abril de 1996, a taxa de juros real alcançou um nível que provocou o maior
constrangimento de crédito. Naquele momento, cada banqueiro tentou restringir
rapidamente os créditos que haviam concedido ao setor privado. Ocorreu um
movimento de tentar recuperar todos os recursos que as instituições bancárias haviam
postos para fora.
84
Sabemos que, quando esse movimento é realizado por todos, de forma simultânea,
o resultado pode ser uma quebradeira de bancos e empresas, com níveis de
inadimplências muito acima da média. Cenário que submeteria as contas públicas a um
enorme desequilíbrio fiscal. Sem saída para resolver o problema criado pela política
econômica do Plano Real, o governo passou a socorrer bancos com o dinheiro do
orçamento fiscal.
Para o ministro do Planejamento à época, em entrevista ao jornal folha de São
Paulo, 26 de abril de 1996, José Serra defendeu a inclusão das despesas do governo com
o Proer (Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Sistema Financeiro Nacional),
contrariando a versão do Banco Central, de que não haveria custo para o Tesouro, uma
vez que os recursos são colhidos junto ao sistema financeiro, por meio de depósitos
compulsórios.
Para o ministro, o Proer deveria ser incluído em dois itens do Orçamento Fiscal:
como renúncia fiscal e nas despesas financeiras. A renúncia fiscal ocorreu quando
permitiu que o prejuízo do banco quebrado fosse abatido do lucro líquido da instituição
que assumiria o controle acionário. Lembrando que o lucro é a base de cálculo do
Imposto de Renda da Pessoa Jurídica.
Em segundo, a diferença entre o custo de captação dos recursos e a taxa do
empréstimo, o governo usou dinheiro do depósito compulsório dos bancos para
emprestar aos bancos quebrados, e que mudaram de controle acionário. Ao liberar
recursos, aumentou o dinheiro em circulação. Então, o Banco Central emitiu títulos para
enxugar esse dinheiro e aumentou o estoque e o custo da dívida pública.
Para o ministro Serra, as pessoas não se deram conta. Porém, o custo fiscal estaria
justamente na diferença entre as taxas de juros desses títulos (custo de captação) do BC,
e os juros pagos pelos bancos que tomaram recursos do Proer.
Outro custo fiscal estaria na amortização da linha de crédito. Os empréstimos são
concedidos mediante garantia de "moedas podres" (títulos vendidos com desconto de
até 60%). O Tesouro estaria pagando pelo valor de face, o que deveria ter um valor
menor. Segundo o FMI, o PROER custou 4% do PIB em custos diretos, e 10% se forem
considerados os custos indiretos.
Resumindo, a política econômica do plano real criou um desequilíbrio fiscal nas
contas do Estado brasileiro. Redistribuiu renda e riqueza para a elite do capital, de forma
desfavorável à geração de emprego, ao crescimento econômico, e aos salários, além de
85
sacrificar e impedir a participação dos direitos constitucionais na agenda do Estado
brasileiro.
Os objetivos do projeto minimalista de Estado seguiram e conduziram a uma
degradação ainda maior da infraestrutura e da qualidade dos serviços públicos,
agravando as tensões sociais por todas as regiões do País.
No biênio 1997/1998, contabilizamos um dos piores desempenhos do produto
interno bruto do Plano Real, 0,04% e 0,25%, respectivamente, o déficit público foi
agravado. Na avaliação de Oliveira (2010), um dos maiores erros do Plano Real foi
desprezar elementos importantes, como possíveis mudanças nas condições financeiras
internacionais; a sensibilidade dos mercados em relação à situação dos Países devedores
e emergentes; o risco de fuga real diante da desproporção entre a massa de ativos
financeiros domésticos líquidos e as reservas em divisas do País. Sem saída, e como era
de se esperar, o país se rendeu aos braços do FMI.

3.2.2 O ambiente da renegociação da dívida dos governos subnacionais

Pelas razões acima expostas e pelas sucessivas crises do mundo em


desenvolvimento, as avaliações negativas sobre a evolução do regime cambial e
monetário brasileiro deflagraram as vendas em massa e a liquidação de posições na
moeda sobrevalorizada.
Assim uma tendência à desvalorização da taxa de câmbio, envolveria um duplo
risco: o retorno das tensões inflacionárias e a aceleração da fuga de capitais,
magnificando a possibilidade de perdas futuras para os aplicadores em moeda nacional.
O déficit de confiança estava associado pela percepção de que o regime cambial e
monetário havia gerado endogenamente, um desequilíbrio crescente entre o volume de
reservas e a massa de ativos financeiros domésticos, inflados pela elevada taxa interna
de juros.
Conforme Belluzzo (2002), a crescente incerteza dos investidores quanto às
flutuações bruscas nos preços, com risco de enormes prejuízos para os que se
dispuseram a carregar os títulos do governo, forçou os administradores da política
monetária a aceitar progressivamente a substituição de papéis pré-fixados por pós-
fixados.
As autoridades monetárias foram obrigadas a assumir o risco de taxa de juros e o
risco de câmbio. Para a equipe econômica o cenário poderia se traduzir em saques
86
recorrentes de investidores estrangeiros na economia brasileira, com remessas de
dólares para o exterior.
E, quando em agosto de 1998, a Rússia desvalorizou o rublo e decretou
moratória da sua dívida, a crise econômica mundial agravou e as reservas sofreriam
redução de forma substancial, expondo o País a uma crise cambial, que forçou o governo a
elevar as taxas de juros reais, ampliando a fragilidade financeira para todas as esferas de
governo. As reservas cambiais do País, no final de setembro de 1998 era de apenas US$
45 bilhões. Para Conforme Giambiagi (2008), naquele segundo semestre, os “pés de
barro” do plano Real ruíram, chegaria o momento de o Brasil tornar-se alvo dos
especuladores globais.
Falido, o País rendeu-se ao receituário clássico para as situações de desequilíbrio
no balanço de pagamentos, que se dava mediante a desvalorização da moeda, elevação
da taxa de juros e um orçamento fiscal superavitário. Dessa vez, a dura e austera
disciplina fiscal seria imposta aos governos subnacionais endividados.
Os governos subnacionais foram submetidos à restrição orçamentária e, mais do
que isso, inseridos em uma nova institucionalidade, para que todas as decisões
governamentais dentro de cada período fiscal, tivessem compatibilidade com as
exigências estabelecidas pela nova ordem econômica e fiscal.
Conforme destacou Vargas (2006), o movimento teórico já recomendava a
construção de restrições intergovernamentais e redesenho institucional para os cenários
de endividamento profundo. A ação determinante se daria a partir da criação de
instrumentos de responsabilização das esferas subnacionais por suas decisões de gasto
e limitação de endividamento.
Lembrando que o ambiente institucional de atuação e coordenação governamental
era considerado como basilar para a questão da eficiência da sustentabilidade financeira
dos compromissos fiscais. A regra de ouro era de que o endividamento passado fosse
honrado com base em recursos fiscais e não com novo endividamento. Isso implicaria
colocar o pagamento das despesas financeiras como prioridade no orçamento fiscal dos
governos subnacionais.
O governo federal como protagonista do processo, atuou através de suas estruturas
burocráticas, com maior destaque no que tange às relações intergovernamentais para a
Secretaria do Tesouro Nacional (STN), que passou a sistematizar e fiscalizar as contas
subnacionais, inclusive com poderes para constranger o endividamento subnacional de
forma a tornar mais explícita a situação fiscal, e garantir e facilitar, a partir do acordo
87
de renegociação, o pagamento da parcela das dívidas estaduais e municipais junto ao
tesouro federal.
A regras restritivas submeteram os governos subnacionais a cumprirem metas
fiscais, que passaram a ser fiscalizadas a partir dos relatórios elaborados bimestralmente
(Relatório Resumido da Execução Orçamentária) e quadrimestralmente (Gestão Fiscal),
que contém os dispositivos fiscais apresentados na Lei de Responsabilidade Fiscal
(LRF). Imposições que passaram a ser defendias até como justificativa para despolitizar
a relação entre as esferas subnacionais e o governo central.
Acredito que após a vigência da LRF, a forma de atuação dos governos
subnacionais foi restringida, enquanto provedor da oferta das políticas públicas,
contribuindo para o agravamento da atual crise federativa.
Dessa forma, tenho como uma das hipóteses dessa dissertação que, a partir da
renegociação das dívidas dos municípios capitais, responsáveis no momento da
renegociação, por mais de 70 pontos percentuais do estoque da dívida pública
municipal, a restrição da autonomia federativa foi aprofundada.

3.2.2.1 A renegociação das Dívidas e os limites fiscais da Lei de Responsabilidade Fiscal


impostos para as cidades mais endividadas do País

Primeiramente, é forçoso lembrar que os grandes centros urbanos e


industrializados, foram os mais atingidos pela internacionalização da economia,
ocorrida na federação desde o início da década de 90. E, como administravam uma
estrutura orçamentária mais apoiada nas receitas tributárias próprias, lançaram mão de
novas formas de financiamento dos seus gastos, por meio do endividamento de longo
prazo, das operações de crédito e da antecipação de receita orçamentária (ARO),
instrumentos que contribuiram para ampliar o estoque dos passivos municipais.
Ou seja, acredito que a queda na arrecadação tributária própria, ocasionada pela
retração da atividade econômica versus à omissão das esferas federal e estadual nas
responsabilidades que deveriam ter assumido no contexto do processo da
descentralização fiscal, está intimamento relacionada ao agravamento do nível do
endividamento das 26 capitais.
A inadimplência se espalhou por vários setores. Desde a falta de pagamento dos
tributos federais, como o INSS, PASEP e FGTS, além dos calotes que foram
promovidos perante os estoques das dívidas contratuais e mobiliárias.
88
Em algumas circunstâncias, parte do desequilíbrio orçamentário e financeiro era
financiado por meio da ampliação das adesões a determinados programas das empresas
estaduais, mas que impunham contrapartidas de gastos que impactavam nas contas
municipais.
E, como já observado, para obter o pacote emergencial de recursos junto ao FMI
em 1998, a equipe econômica brasileira deveria render-se às exigências, e as cláusulas
do acordo exigiram que os governos subnacionais obtivessem mais receita a partir das
privatizações, e que realizassem uma série de reformas institucionais para reduzir as
despesas públicas e o estoque de endividamento.
Dessa forma, as cláusulas50 que permearam o acordo de renegociação foram iguais
para todos os municípios brasileiros, porém, como as 26 capitais eram responsáveis por
mais de 70% do passivo municipal no momento da renegociação do estoque, foram
esses centros os que mais sofreram com a austeridade fiscal do contrato de renegociação
da dívida pública municipal.
Dentre as diversas cláusulas do contrato de renegociação da dívida pública
municipal brasileira, destaco as principais: toda a renegociação da dívida mobiliária e
contratual entre União e os governos subnacionais se deu em um longuíssimo prazo (30
anos), sob os efeitos das elevadas taxas de juros; comprometeu 13% de sua receita
líquida real (RLR) com prestações mensais e sucessivas, calculadas com base na tabela
price, vencendo a primeira trinta dias após a data da assinatura do contrato, e as
seguintes em igual dia dos meses subsequentes; os juros calculados deveriam ser
debitados mensalmente, à taxa mínima de 6% ao ano, sobre o saldo devedor previamente
atualizado; a atualização monetária deveria ser calculada e debitada mensalmente com
base na variação do Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI),
calculado pela Fundação Getúlio Vargas; e, caso os 13% da RLR não fossem suficientes
para honrar o valor total da prestação mensal, primeiro seria amortizado os juros e
encargos, e o valor do principal retornaria para o saldo devedor.
E, ainda ficou estabelecido que o município, após 30 meses do contrato de
renegociação assinado deveria fazer uma amortização extraordinária de 20% do saldo
devedor, caso não ocorresse tal pagamento, o contrato seria recalculado desde a sua

50
A Medida Provisória n. 2.185-35, de 24 de agosto de 2001, estabeleceu critérios para a consolidação, a
assunção e o refinanciamento pela União da dívida pública mobiliária e outras, especificas de
responsabilidade dos municípios.
89
assinatura, por uma nova taxa de juros que passaria de 6% para 9% ao ano, ou seja,
aumentaria em 50% a taxa de juros.
Essas penalidades desencadearem inúmeros prejuízos para a população urbana
residente nas capitais, que podem ser traduzidas na entrevista de Luís Carlos Afonso,
ex-secretário de Finanças da Prefeitura de São Paulo, publicada em 3 de junho de 2004,
no Diário de S. Paulo:
(...) em maio de 2000, quando o ex-prefeito Celso Pitta negociou a dívida do
município com o governo FHC, as condições foram extremamente
desvantajosas para o cidadão paulistano. Nessa negociação ficou acordado
que, em novembro de 2002, o município desembolsaria, de uma só vez, uma
parcela de R$ 3,095 bilhões, o que corresponderia a 4 meses de arrecadação
da Prefeitura de São Paulo na época, ou ainda, quase o valor total investido
em saúde e educação naquele ano (R$ 3,352 bilhões).
Esse compromisso firmado entre Celso Pitta e FHC era de conhecimento
geral que seria impossível de ser cumprido, sob pena de falência de todos os
serviços prestados à população. A punição pelo não cumprimento dessa
cláusula contratual inexequível elevou os juros em 50%, de 6% para 9% ao
ano (...).

Nesse sentido, mesmo diante do cumprimentos das condicionalidades e dos


sistemáticos pagamentos mensais, o estoque de dívida das capitais51 registraram um
crescimento, conforme os dados da tabela abaixo. Ou seja, mediante as
condicionalidades contratuais impostas, ainda que nenhum novo centavo fosse
adicionado por conta de um novo financiamento, os estoques das dívidas municipais se
multiplicaram.
Apesar do estoque de endividamento das capitais no ano de 2010, ter reduzido sua
participação no estoque total de endividamento municipal, fundamentalmente
ocasionada pela redução da taxa de juros e aumento da receita corrente própria, é preciso
compreender, conforme mostra tabela abaixo, as distorções que o deflator escolhido
causou para o estoque da dívida de longo prazo das 26 capitais.

51
Ver anexo 3, evolução da dívida pública por cada capital.
90
Tabela 6 -Evolução da participação do estoque da dívida de longo prazo das 26
capitais no total do estoque da dívida municipal, período: 2000 a 2010

ANO Total Dívida 26 Capitais (A) Total Dívida Municipal (B) (A/B)
2000 73.541.080.523,16 102.324.547.817,96 72%
2001 78.744.707.243,76 111.005.963.223,67 71%
2002 93.408.507.476,96 127.497.815.136,88 73%
2003 96.009.853.997,97 137.094.069.138,17 70%
2004 105.802.251.073,18 144.684.207.696,33 73%
2005 91.759.083.487,87 141.922.290.449,27 65%
2006 93.090.674.561,51 154.352.095.647,46 60%
2007 100.106.662.650,97 175.717.577.646,21 57%
2008 103.142.421.616,53 179.803.576.204,11 57%
2009 99.881.944.718,60 207.657.035.699,03 48%
2010 110.949.820.261,35 227.774.636.939,32 49%
Fonte: FINBRA Vários anos - STN/CCONT
Valores Corrigidos pelo IPCA-IBGE, março de 2018. Em R$ 1,00.

Em todos os contratos renegociados o indexador aplicado era o Índice Geral de


Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI), e mediante as desvalorizações cambiais
ocorridas durante o auge da desvalorização do real diante do dólar, segundo Mora e
Giambiagi (2005), a indexação da dívida pelo IGP-DI reduziu a importância dos ganhos
reais de receita observados quando deflacionada por outros índices, o que arrefeceu a
capacidade de redução gradual da dívida.
E, ainda que a receita tributária tenha apresentado um desempenho melhor no
decorrer da década de 2000 – seja quando cotejada com o PIB, seja deflacionada pelo
IPCA –, se considerarmos o IGP-DI como indexador do estoque da dívida, constatamos
que a performance Dívida/RLR foi medíocre, pois, a evolução da RLR não conseguiu
acompanhar a evolução do estoque, dado o distanciamento entre os índices IGP-DI e o
IPCA.
Um exemplo, no ano de 2002, o IGP-DI teve uma supervalorização, o acumulado
no ano chegou a 26,41%. Enquanto que, o índice usado para corrigir o lançamento e
cobrança da maioria dos tributos do País, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo
(IPCA) calculado pelo IBGE, o acumulado no ano foi de 12,53%. A variação entre eles
refletiu no crescimento do estoque de endividamento, piorando o saldo do estoque da
relação dívida sem precedentes na história da federação.
Ou seja, em 1998, antes de o acordo de renegociação, em valor atualizado pelo
IPCA IBGE, em março de 2018, o estoque do passivo das 26 capitais somava R$
91
55.580.652.811 (cinquenta e cinco bilhões, quinhentos e oitenta milhões, seiscentos e
cinquenta e dois mil, e oitocentos e onze reais) conforme anexo 5, tabela 31. Em valores
per capita, poderíamos dizer que cada cidadão residente nas 26 capitais, em 1998, tivesse
uma dívida de R$ 1.486, 15 (um mil, quatrocentos e oitenta e seis reais).
A partir da renegocição do estoque da dívida municipal junto a União, o saldo não
parou de crescer, praticamente dobrou em 2010, passou para R$ 110.949.820.261 (cento
e dez bilhões, novecentos e quarenta e nove milhões, oitocentos e vinte mil, duzentos e
sessenta e um reais). Enquanto que, considerando a população residente nas 26 capitais
de 42.895.885 habitantes, o valor da dívida per capita, no ano de 2010, foi elevado para
R$ 2.586 (dois mil quinhentos e oitenta e seis reais).
Aumento que pode ser atribuído, basicamente, às claúsulas contratuais. Isso
porque, os valores enviados mensalmente, os 13% da receita líquida real (RLR), não
foram suficientes para honrar o valor da parcela, na sua maioria, apenas amortizava os
juros e encargos das parcelas, e o valor do principal retornava para o estoque.
Circunstância que não permitiu que muitas capitais, de fato conseguissem reduzir o
saldo devedor, pois não amortizaram o valor do principal da parecla.
Cumpre observar que, a média dos pagamentos com as despesas de juros e
encargos, no ano de 2010, alcançou a 5 pontos percentuais do orçamento fiscal corrente
nas capitais, uma prioridade absoluta da política fiscal subnacional. Enquanto que, a
participação dos recursos usados para amortizar o valor principal da parcela da dívida
pública também se multiplicaram, em 2002, as despesas com a amortização
representavam 12 pontos percentuais, em 2010, essa participação aumentou para 23
pontos percentuais das despesas de capitais, conforme tabela 07.
Outra forma de entender as restrições de endividamento, cabe observar que a
receita corrente passou a representar mais de 87% das despesas totais do orçamento,
devido à interrupção de novas operações de crédito, reduzindo por sua vez, a
importância das receitas de capital na estrutura orçamentária das capitais.
Melhor dizendo, os investimentos perderam importância na estrutura das despesas
de capitais, de 85 pontos percentuais em 2002, representaram apenas 67 pontos
percentuais em 2010. A bem da verdade, as despesas financeiras ganharam espaço na
estrutura do orçamento fiscal em detrimento de os investimentos. Informação que pode
ajudar na compreensão dos desafios urbanos, e à rigidez orçamentária em que as cidades
metropolitanas foram mergulhadas.
92
Tabela 7 - Evolução média da participação das despesas por Categoria
Econômica, 26 capitais: 2002-2010
Média 26 Capitais 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
3. Despesa Corrente 84% 89% 87,87% 91% 88% 87% 86% 88% 87%
1.Pessoal 50% 51% 50,31% 50% 49% 49% 50% 50% 43%
2. Juros 2% 2% 1,90% 2% 2% 2% 1% 1% 5%
3. Outras Despesas Correntes 48% 47% 47,79% 48% 49% 50% 49% 49% 52%
4. Despesa Capital 16% 11% 12,13% 9% 12% 13% 14% 12% 13%
4. Investimentos 85% 80% 82,88% 77% 81% 82% 82% 80% 67%
5. Inversões 3% 4% 3,30% 3% 3% 3% 3% 3% 10%
6. Amortizações 12% 16% 13,83% 20% 16% 15% 15% 16% 23%
Fonte: STN/FINBRA, vários anos.

Questão que está intimamente relacionada com o coeficiente de endividamento


definido para as capitais, quando desenquadradas tornavam-se impedidas de pleitear
novas operações de créditos, e, consequentemente, a receita de capital perdeu
participação na estrutura orçamentária, por sua vez, a realização dos investimentos era
sistematicamente reduzida.
Ou seja, a evolução da participação média, por natureza das despesas públicas
das 26 capitais nos mostra que não bastava pagar em dia as parcelas da dívida
renegociada. Pois o indicador necessário para novas oportunidades de investimento
estava definido na relação estabelecida entre a dívida consolidada líquida (DCL)52 e a
receita corrente líquida (RCL)53, conforme a resolução do Senado Federal n. 40 que

52
Dívida Consolidada Líquida (DCL): de acordo com o Manual de Demonstrativos Fiscais da STN, a
DCL representa o montante da Dívida Consolidada (DC) deduzido o saldo relativo aos haveres
financeiros (disponibilidade de caixa e demais haveres financeiros). Caso o valor dos haveres financeiros
seja inferior aos Restos a Pagar processados (exceto precatórios), não haverá deduções na DC, e logo a
Dívida Consolidada Líquida (DCL) será igual à Dívida Consolidada. Por sua vez, a Dívida Consolidada
(DC) ou fundada, para fins fiscais, corresponde ao montante total das obrigações financeiras, apurado
sem duplicidade (excluídas as obrigações entre órgãos da administração direta e entre estes e as entidades
da administração indireta), assumidas: a) pela realização de operações de crédito com a emissão de títulos
públicos, para amortização em prazo superior a 12 (doze) meses (dívida mobiliária);b) pela realização de
operações de crédito em virtude de leis, contratos (dívida contratual), convênios ou tratados, para
amortização em prazo superior a 12 (doze) meses; c) com os precatórios judiciais emitidos a partir de 5
de maio de 2000 e não pagos durante a execução do orçamento em que houverem sido incluídos; d) pela
realização de operações de crédito de prazo inferior a 12 (doze) meses, que tenham constado como receitas
no orçamento.
53
Receita Corrente Líquida (RCL): de acordo com o MDF da STN, a RCL é o somatório das receitas
tributárias, de contribuições, patrimoniais, agropecuárias, industriais, de serviços, transferências correntes
e outras receitas correntes do ente da Federação, deduzidos alguns itens exaustivamente explicitados pela
própria LRF, não cabendo interpretações que extrapolem os dispositivos legais. Conforme a LRF, em seu
art. 2º, inciso IV: " - receita corrente líquida: somatório das receitas tributárias, de contribuições,
patrimoniais, industriais, agropecuárias, de serviços, transferências correntes e outras receitas também
correntes, deduzidos: a) na União, os valores transferidos aos Estados e Municípios por determinação
constitucional ou legal, e as contribuições mencionadas na alínea a do inciso I e no inciso II do art. 195,
e no art. 239 da Constituição; b) nos Estados, as parcelas entregues aos Municípios por determinação
constitucional; c) na União, nos Estados e nos Municípios, a contribuição dos servidores para o custeio
93
definiu o que o estoque da dívida consolidada líquida municipal ao final do décimo
quinto exercício financeiro, contado a partir do encerramento do ano de publicação da
resolução, não poderia exceder, no caso dos Municípios, a 1,2 (um inteiro e dois
décimos) vez da sua receita corrente líquida.
O cronograma de amortização definido e controlado pelo governo federal, por
meio da Secretaria do Tesouro Nacional adotou muitas medidas para alcançar as metas
definidas, através da elaboração de um relatório quadrimestral da gestão fiscal.
E, por meio das informações do sistema integrado de administração financeira
(SIAFI), em caso de inadimplência dos municípios endividados, o órgão federal poderia
reter as transferências constitucionais.
Porém, poucos foram os intrumentos da política macroeconômica do governo
federal, preocupados com a atividade econômica local, necessária para se ampliar a
arrecadação da receita própria, e, por sua vez, fundamental para a performece do
coeficiente de endividamento.
A figura 2, mostra a trajetória do coeficiente de endividamento da capital mais
populosa e com maior arrecadação própria do país, e, ao mesmo tempo, responsável
pelo maior passivo municipal, a cidade de São Paulo. Sem interromper a parcela de
pagamento do acordo de refinanciamento, praticamente, permaneceu sem nenhuma
capacidade de endividamento após a vigência da LRF, pois não conseguiu enquadrar-se
nos limites exigidos pela lei.

do seu sistema de previdência e assistência social e as receitas provenientes da compensação financeira


citada no § 9º do art. 201 da Constituição.".
94
Figura 2- Evolução do Coeficiente de Endividamento do município mais
endividado do país, a cidade de São Paulo, período: 2001-2010

Dívida Consolidada Líquida (DCL) x Receita Corrente


Líquida (RCL)
300

244,78 246,45
250 236,2
221,15 213,49
203,32 207,98
192,98 196 189,52
200

150

100

50

0
2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

Dessa forma, as cláusulas do acordo de renegociação colocaram as cidades


endividadas, particularmente as 26 capitais, sob o âmbito de uma série de restrições
fiscais que passaram a interferir na autonomia federativa, desconsiderando às
atribuições e necessidades assumidas no pacto federativo vigente.
Acredito que muitas cidades e estados permaneceram desenquadrados do limite
de endividamento estabelecido, não por falta de pagamentos mensais, mas por
consequências das políticas macroeconômicas do governo brasileiro, as altas taxas de
juros, a sobrevalorização do câmbio, e do conjunto de cláusulas que corrigem o estoque
da dívida, perpetuando-as em um quadro de desenquadramento fiscal.
Pode-se afirmar que os municípios que assinaram o acordo de renegociação da
dívida tornaram-se devedores da União pelos 30 anos seguintes, e até lá terão que
administrar um orçamento com pouco capacidade de investimentos.
Para qualquer iniciativa da esfera municipal, desde o pleito de uma operação de
crédito até celebração de um convênio, a União passou a analisar primeiro o coeficiente,
o pagamento em dia das parcelas do acordo, e o cumprimento do cronograma de ajuste,
a partir de metas de resultados primário e nominal estabelecidas a cada ano nos anexos
da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de cada município.
E, ainda definiu regras formais para o gasto de pessoal. Ou seja, quando o art.
19 da LRF estipulou que a despesa total com pessoal, em cada período de apuração não
poderia exceder o percentual da receita corrente líquida dos municípios em 60 pontos
percentuais, de um modo geral, ignorou a necessidade de ampliação das despesas com
95
mão de obra decorrente dos programas municipalizados. A solução deveria se dar por
meio da terceirização dos serviços da política, para que a regra fosse cumprida.
Em outras palavras, a categoria gasto com pessoal não poderia ultrapassar os
limites estabelecidos, e qualquer nova contratação, reajustes de salários, criação de
novos cargos, alteração nos planos de carreira, vale dizer, qualquer movimento do
governo em favor do aumento dos gastos com pessoal passou a ser expressamente
fiscalizado e controlado por meio dos coeficientes54 estabelecidos na LRF.
De um modo geral, acredito que essa questão criou entraves para a questão social
e para o desenvolvimento urbano nas capitais. Houve situações em que os municípios
foram constrangidos e forçados a optar pela contratação de mão de obra terceirizada,
devido a exigência fiscal, pois estavam desenquadrados do teto de gasto com pessoal.
As finanças públicas das capitais endividadas ficaram sujeitas às exigências fiscais
e tiveram sua autonomia federativa limitada, travada pelas condicionalidades do acordo
de renegociação da dívida pública e dos limites estabelecidos pela LRF.
Cenário que adicionou mais ingrediente aos desafios urbanos, a dificuldade da
gestão dos contratos das ações locais, transferidas para o mercado operacionalizar. A
partir daquele momento, sistematicamente o Estado aumentou sua relação com o
privado.
Através de parcerias, concessões, terceirizações, transferiu para o mercado o
direito de explorar setores fundamentais para o bem-estar da sociedade. Porém, vale
observar que até o momento, essa nova forma de atuar não conseguiu impor um modelo
eficiente para a gestão e controle dos contratos terceirizados.
Despesa que é contabilizada na denominada natureza, Outras Despesas
Correntes55. Conta que reúne os gastos com os elementos relacionados à terceirização
dos serviços, como os serviços de consultoria; serviços de terceiros - pessoa física;
locação de mão-de-obra; serviços de terceiros - pessoa jurídica; subvenções
econômicas; transferências a instituições privadas com fins lucrativos; etc.
Alinhado com a ideia de gestão das finanças dos governos subnacionais, acredito
que LRF deveria se propor e exigir um relatório que nos permitisse identificar o preço

54
Ver artigos: 19, 20 e 21 da Lei nº 101, de maio de 2000 que definem os limites de gasto com pessoal.
55
Principais elementos de despesas da natureza Outras Despesas Correntes: Transferências para
Instituições Privadas sem Fins Lucrativos; Diárias – Civil; Material de Consumo; Passagens e Despesas
com Locomoção; Outras Despesas de Pessoal Decorrentes de Contratos de Terceirização; Serviços de
Consultoria; Outros Serviços de Terceiros - Pessoa Física; Locação de Mão de Obra; Outros Serviços de
Terceiros - Pessoa Jurídica; Contribuições; Despesas de Exercícios Anteriores; Subvenções Sociais.
96
unitário da ação terceirizada, o número de pessoas atendidas no bimestre e ou
quadrimestre, para identificarmos, ao menos, o custo e a satisfação de cada usário com
a política terceirizada.
Para o modelo, a ideia de eficiencia e eficácia só abrangueu as metas do resultado
primário e nominal, sem nenhuma preocupação com a gestão da terceirização
impulsionada pela regra de ouro que impos o teto de gasto com pessoal.
A cada ano, as regras imputáveis aos municípios endividados, ao mesmo tempo,
mais autônomos para arrecadar recursos próprios, de alguma forma os impedem de
elaborar e assumir suas responsabilidades federativa.
Questão que nos ajuda na construção da problemática dessa pesquisa: de que os
municípios capitais sofreram restrições fiscais, que interferiram na sua autonomia
federativa, uma vez que a rigidez fiscal limitou suas ações. Fica a sensação de que os
municípios endividados foram obrigados a abdicarem de suas responsabilidades
constitucionais comuns e concorrentes, em detrimento das premissas fiscais da nova
ordem econômica e fiscal.
Resumindo, muitas são as dificuldades colocadas para às finanças públicas após a
renegociação da dívida pública municipal e a implantação da LRF. E, o aumento da
arrecadação própria não tem um significado que possa alimentar uma expectativa para
coesão social, ao contrário, assistimos a uma convulsão social e estrutural dos grandes
centros urbanos.
Outras imposições fiscais da nova disciplina fiscal, tem sido a obrigatoriedade do
pagamento das parcelas dos precatórios56; e permissões frequentes de mandados
judiciais que obrigaram os municípios a realizarem determinados serviços e bens
públicos não planejados. Determinações que contribuíram para restringir ainda mais a
autonomia orçamentária municipal.
Aliado a tudo isso, ainda é preciso apontar que o volume dos recursos fiscais
direcionados para às contrapartidas exigidas pelas transferências negociadas com o
governo federal e estadual, conforme veremos no próximo capítulo, cresceram de forma
substancial, e contribuíram para aumentar a rigidez orçamentária e redução da
autonomia federativa municipal.
Assim, podemos concluir que o ônus pela concordância com o reducionismo do
papel do Estado brasileiro não tem sido pequeno para a federação brasileira, orientado

56
Conforme trata o § 3º do art. 100 da Constituição Federal ou pelo art. 87 da Emenda Constitucional n.
37 de junho de 2002.
97
pelo prisma da garantia do cumprimento das obrigações financeiras prévias, e as
questões que haviam sido descentralizadas e ou municipalizadas pouco foram
respeitadas no contexto de austeridade fiscal.
Segundo os próprios técnicos do FMI, as ações praticadas no universo liberal,
nossa experiência abrangeu e englobou regras mais restritivas, as quais envolveram
limites para os gastos públicos e para o estoque de endividamento, além do controle do
processo orçamentário, desde a formulação até realização das metas primárias e
nominais. Podemos dizer que, nosso modelo de ajuste fiscal, teve forte influência do
modelo Hard Budget Constraint (HBC), abordado no capítulo 1.

3.2.2.2 O distanciamento das relações entre Estados e seus respectivos Municípios, a partir da
renegociação das dívidas Estaduais e das mudanças institucionais da nova disciplina fiscal

Sempre pelo caminho mais fácil, como já observado, o governo federal promoveu
a operação desmonte e se omitiu de muitas funções constitucionais, além de conduzir
uma trajetória de aumento da carga tributária, baseada em tributos indiretos, os quais
não partilhava com os governos subnacionais. Postura motivada e justificada pela
necessidade de se cumprir metas fiscais57.
Com esse mesmo discurso, com vistas a eliminar instituições estaduais, as
privatizações avançaram e permitiram que muitos programas estaduais, fundamentais
para soldar as relações federativas, de alguma forma, fossem extintos da agenda regional
e local.
Isso porque, a partir da privatização dos bancos estaduais, o repasse que era feito
pelas agências oficiais de crédito aos bancos estaduais desapareceram, e as operações
financeiras foram eliminadas. Nesse sentido, a hierarquização das relações entre os
estados e seus respectivos municípios foram sendo prejudicadas.

57
A Lei n. 9.496 de 11 de setembro de 1997 estabeleceu critérios para consolidar e refinanciar pela União
diversas dívidas financeiras de responsabilidade de Estados e do Distrito Federal. O Programa de
Reestruturação e de Ajuste Fiscal foi pautado, em parte, pela lei n. 9.496, de 11 de setembro de 1997,
segundo a qual os Estados se comprometeram a alcançar metas, com destaque para a relação dívida
financeira versus receita líquida real, resultado primário, limite de despesas com funcionalismo público,
alienação de ativos, privatização, permissão ou concessão de serviços públicos, reforma administrativa e
patrimonial, despesas de investimento em relação à RLR. O programa foi aderido por governadores de
25 estados, incluindo Distrito Federal, e apenas o Amapá e Tocantins não aderiram a ele. A cada ano, tem
sido avaliado o cumprimento das metas e compromissos do exercício anterior. A Medida Provisória n.
2.192-70, de 24 de agosto de 2001, que estabeleceu mecanismos objetivando incentivar a redução da
presença do setor público estadual na atividade financeira bancária, dispõe sobre a privatização de
instituições financeiras, e dá outras providências.
98
Mecanismo que desarticulou o que existia entre as esferas subnacionais, e o
volume de recursos financeiros necessários para que o investimento público municipal
fosse realizado, praticamente, desapareceu.
Mecanismo parecido com o que já havia ocorrido no início da implantação do
Plano Real, a desvinculação da receita do orçamento da seguridade social, impediu que
a ações necessárias fossem encaminhadas, desvencilhando os recursos de seus
propósitos e funções, criando um modelo com características pouco cooperativas,
diferente do desenho proposto para às relações federativas comuns as três esferas de
governo.
Dessa forma, a restrição da autonomia dos estados interferiu nas decisões e
escolhas da estruturação dos programas locais, que implicou em dificuldades de acesso
ao crédito. Como bem disse Santos (1996), as respostas às demandas sociais que estados
e municípios tinham sob sua responsabilidade passaram a fazer parte de possibilidades.
Para Lopreato (2013), a partir da renegociação da dívida dos governos
subnacionais, o poder federal se agigantou no controle da política fiscal, e forçou os
entes subnacionais a venderem empresas e bancos. Esse comportamento alterou
características tradicionais do federalismo brasileiro.
Ou seja, a política de impor qual deveria ser o comportamento das finanças
subnacionais, passou a ser condizente com o ajuste macroeconômico do governo
federal. As normas de acesso às operações de crédito e definição das regras de
endividamento permitiram à União ditar o comportamento das finanças dos entes
subnacionais e centralizar o poder da formulação da política fiscal.
“A perda de grau de liberdade forçou governadores e prefeitos a seguirem as
diretrizes fiscais traçadas na esfera federal, alterando relações de poder que
haviam caracterizado o federalismo brasileiro mesmo nos tempos do regime
militar”.

Imposições que conjecturaram na redução dos quadros dos funcionários públicos;


fechamento de muitas instituições, empresas públicas, autarquias e fundações, como a
liquidação dos bancos públicos estaduais que eram os principais responsáveis por
alavancar o volume de recursos financeiros para os investimentos municipais no
passado.
Lembrando que a iniciativa privada não atua no financiamento de longo prazo
para o setor público, restando aos estados e municípios da federação brasileira apenas
um poder residual, que lhes insere numa quase que completa omissão da sua autonomia
99
federativa, a adesão aos programas de recursos vinculados, as denominadas
transferências discricionárias.
Essas medidas, permitiram que a Secretaria do Tesouro Nacional passasse a
comandar as decisões dos gastos correntes e dos investimentos. Interferência e controle
como forma de assegurar o superávit primário necessário ao programa de ajuste fiscal,
mas sem muita preocupação com a gestão de políticas que assegurassem o
desenvolvimento social e econômico para o País (LOPREATO, 2013).
Acredito que as políticas fiscal e financeira, fortemente entrelaçadas com os
interesses do mercado, passaram a reproduzir resultados nefastos para o pacto
federativo, e muitos municípios e estados partiram para políticas isoladas, intempestiva
e predatória e, que, em muitas situações, extrapolaram seu papel de condutor do
desenvolvimento local.
Certamente, todos nós perdemos, e assegurar aos mais de 200 milhões brasileiros
os direitos universais - o acesso a moradia, ao lazer, a segurança, a previdência social,
o transporte, o saneamento, a cultura, educação, saúde, esporte, uma proteção mínima à
maternidade e à infância, à assistência social- passou a ser no mínimo, uma realidade
distante das ações imperiosas da nova ordem vigente.

3.3 A construção da nova Ordem Fiscal: equilíbrio ou observa-se o


aprofundamento dos desequilíbrios fiscais?

3.3.1 A crise econômica e o seu impacto nas finanças públicas municipais

Posteriormente à obsessão fiscal, assistimos nas duas últimas décadas um período


de baixo crescimento, alinhado com uma agenda nacional completamente caótica e
comprometida apenas com os interesses da liberalização econômica.
Permanecemos mergulhados em um desequilíbrio fiscal crescente, cristalizado na
fragilidade financeira e fiscal dos governos subnacionais. Desequilíbrios que adoeceram
as relações federativas. Como bem apontou Fiori (1995:30):
(...) o que parece ter maior importância para a discussão federalista são as
novas regras e tendências que vêm manifestando-se no plano de competição
intercapitalista, no plano de gestão das políticas macroeconômicas nacionais,
e, finalmente no plano da polarização social que vem se agigantando-se à
sombra da globalização”.
100
A mais profunda crise federativa do País, políticas predominantes do salve-se
quem puder, fez ressurgir conflitos horizontais e verticais. Os compromissos
decorrentes do processo da nova ordem econômica, causou prejuízos para as relações
intergovernamentais, e impossibilitou que os governos subnacionais exercessem de fato
sua autonomia federativa para planejar e atender às demandas que permitissem uma
coesão social, conforme estabelecido no texto constitucional de 1988.
A falta de cooperação entre os entes federativos na oferta dos bens e serviços
públicos resultou em prejuízos enormes para autonomia do planejamento e execução do
orçamento público nas 26 capitais.
A necessidade de financiamento para investimentos per capita permaneceu
superior à capacidade de financiamento, e o direito à cidadania58 permaneceu assegurado
apenas no texto constitucional.
Em 1988 partíamos de um cenário que reunia condições estratégicas para o
enfrentamento das desigualdades socioeconômicas do País, por meio da garantia da
universalização da proteção social. Entretanto, a partir do receituário de austeridade
fiscal, nos tornamos uma nação caracterizada pela recessão econômica e desemprego,
aumento da miséria e da desigualdade social.
Ao mesmo tempo, em pleno processo de descentralização fiscal, esse cenário de
crise econômica e social gerava externalidades negativas nas relações federativas.
Ou seja, praticamente 85% das capitais estudadas, que reuniam mais de 93,52%
da população da amostra, sofreram com o desemprego dos anos 90. Os dados do censo
demográfico do IBGE, anos 1991 e 2000, mostram que as pessoas ocupadas urbanas 59
versus população economicamente ativa60 (PEA), em apenas 4 capitais essa relação teve
saldo positivo (tabela 8).

58
Para Maria de Lourdes Manzine Covre (1995), ser cidadão significa ter direitos e deveres e ser
soberano. Cidadania significa que homens são iguais, ainda que perante a lei, sem discriminação de
raça, credo ou cor. E ainda: a todos cabem o domínio sobre seu corpo e sua vida, o acesso a um salário
condizente para promover a própria vida, o direito à educação, à saúde, à habilitação, ao lazer. E mais:
é direito de todos poder expressar-se livremente, militar em partidos políticos e sindicatos, fomentar
movimentos sociais, lutar por seus valores. Enfim, o direito de ter uma vida digna de ser homem.
59
Para o IBGE, pessoa ocupada é quem trabalhou nos últimos 12 meses anteriores à data de referência
do Censo, ou parte deles. A pessoa que não trabalhou nos últimos 12 meses anteriores à data de referência
do Censo, mas que, nos últimos 2 meses, tomou alguma providência para encontrar trabalho, foi
considerada como desocupada.
60
PEA são pessoas que, durante todos os 12 meses anteriores à data do Censo do IBGE, exerceram
trabalho remunerado, em dinheiro e/ou produtos ou mercadorias, inclusive as licenciadas, com
remuneração, por doença, com bolsas de estudo etc. e as sem remuneração que trabalharam habitualmente
15 horas ou mais por semana em uma atividade econômica, ajudando a pessoa com quem residiam ou a
instituição de caridade, beneficente ou de cooperativismo ou, ainda, como aprendizes, estagiárias etc.
Também foram consideradas nessa condição as pessoas de 10 anos ou mais de idade que não trabalharam
101
Cabe observar que a queda da população ocupada na maioria das capitais,
contribuiu para piorar os índices de violência, da informalidade, da inadimplência
tributária, enfim, questões que nos ajudam a explicar a piora do desequilíbrio fiscal.
As informações da tabela foram classificadas em ordem decrescente pela variação
em percentual da relação entre população ocupada urbana versus população
economicamente ativa.

Tabela 8 -População Ocupada Urbana versus PEA: 2000/1991


População Ocupada População Ocupada Variação
26 Capitais
Urbana X PEA 1991 Urbana X PEA 2000 2000/1991
São Luís 32,16% 75,68% 43,52%
Boa Vista 67,52% 83,81% 16,29%
Belém 64,41% 80,54% 16,12%
Palmas 77,63% 81,90% 4,27%
Macapá 79,97% 78,46% -1,50%
Rio Branco 82,22% 77,40% -4,82%
Florianópolis 90,29% 84,94% -5,35%
Goiânia 94,55% 87,51% -7,04%
Porto Velho 77,19% 70,00% -7,19%
Maceió 84,12% 76,46% -7,66%
Teresina 87,68% 79,31% -8,38%
Rio de Janeiro 92,80% 84,13% -8,67%
Curitiba 94,73% 85,92% -8,81%
Cuiabá 92,57% 82,69% -9,88%
Natal 92,22% 81,92% -10,30%
Fortaleza 93,70% 83,08% -10,63%
João Pessoa 93,20% 82,09% -11,12%
Campo Grande 95,30% 84,10% -11,20%
Recife 89,88% 78,60% -11,28%
Vitória 95,19% 83,73% -11,46%
Porto Alegre 94,63% 83,14% -11,49%
Belo Horizonte 94,80% 82,97% -11,82%
Manaus 87,65% 75,72% -11,94%
Aracaju 91,77% 78,94% -12,84%
Salvador 88,78% 75,20% -13,57%
São Paulo 91,57% 77,80% -13,77%
Fonte: IPEADATA, anos 1991 e 2000 - Elaboração própria

Ou seja, enquanto o desemprego se alastrava, a pressão social crescia nos centros


urbanos mais populosos, e os compromissos da democracia com a cidadania, de certa
forma, permaneciam limitados às políticas fiscais restritivas.

nos 12 meses anteriores à data de referência do Censo, mas que, nos últimos dois meses, tomaram alguma
providência para encontrar trabalho.
102
E, mais grave, as imposições fiscais adotadas contribuiram para piorar do perfil
da dívida pública interna, ocasionando uma deterioração das finanças públicas e nas
relações federativas. A dívida interna líquida do governo federal com relação ao PIB em
1993 era da ordem de 7%, uma situação favorável para o governo brasileiro.
A partir do plano Real, com altas taxa de juros e âncora cambial, o aumento da
dívida mobiliária interna passou a ser crescente, com desdobramentos deletérios para a
estrutura produtiva da economia brasileira e para as relações federativas. Ou seja, o
governo federal priorizava cada vez mais, a participação das despesas financeiras no
orçamento fiscal.
A trajetória do estoque de endividamento interno líquido, conforme mostra os
dados da tabela 09, nos permitiu identificar que existe um descontrole de endividamento
interno brasileiro, responsável pela deterioração das finanças públicas do País.

Tabela 9 - Evolução Dívida Interna Líquida do Setor Público em relação ao


PIB:1995 a 2010 – em %
Dívida Liquida do
PIB - preços de
Setor Público (*) (A/B)
Ano mercado ref. 2010
em R$ (milhões) em %
em R$ (milhões) (B)
(A)
1995 208.460,27 705.991,5529 30%
1996 269.193,43 854.763,6078 31%
1997 308.426,25 952.089,1961 32%
1998 385.869,63 1.002.351,0192 38%
1999 516.578,67 1.087.710,4561 47%
2000 563.163,14 1.199.092,0709 47%
2001 677.430,83 1.315.755,4678 51%
2002 892.291,84 1.488.787,2552 60%
2003 932.137,53 1.717.950,3964 54%
2004 982.508,81 1.957.751,2130 50%
2005 1.040.046,12 2.170.584,5034 48%
2006 1.120.052,63 2.409.449,9221 46%
2007 1.211.762,25 2.720.262,9378 45%
2008 1.168.238,34 3.109.803,0890 38%
2009 1.362.710,72 3.333.039,3554 41%
2010 1.475.820,18 3.885.847,0000 38%
Fonte: IPEADATA; Banco Central do Brasil; e IBGE.
(*) Dívida líquida do setor público: Compreende governo
federal e Banco Central, governos estaduais, governos
municipais e empresas estatais (federais, estaduais e
municipais).

Evolução que, segundo Oliveira (2012), pode ser sentida nas despesas correntes.
No ano de 1994, as despesas correntes representaram 66 pontos percentuais das despesas
103
totais. Em 2007, ultrapassaram 80 pontos percentuais. O aumento se traduz pelo custo
dos juros da dívida pública, um dos principais pilares de sustentação do Plano Real. No
orçamento federal, as despesas com os juros e encargos, somadas à amortização do
principal da dívida pública fundada, ultrapassam mais 50 pontos percentuais do
orçamento total.
Considerando o aumento do passivo, mediante o estoque de endividamento
interno a partir da emissão extra orçamentária de novos papeis, usados para a rolagem
do principal da dívida interna, os denominados títulos do Tesouro, somos remetidos a
uma das piores condições das taxas de juros e do grau de desigualdade social.
O mecanismo tem favorecido uma minoria privilegiada, os detentores da riqueza,
pois a elite financeira ganhou e permanece auferindo lucros extraordinários a partir
desse modelo de financiamento do setor público, que seguramente tem contribuído para
acentuar a concentração de renda e a riqueza, e ampliar a tensão social. Em um mundo
globalizado, enterromper essa engenharia fiscal não será tarefa fácil.
Dessa forma, esse programa tem comprometido a agenda nacional e o futuro das
próximas gerações, sem criar oportunidades para que as relações federativas possam ser
revigoradas. Enquanto isso, o contigenciamento das despesas decorrentes do processo
da descentralização fiscal e ou municipalização tem sido justificada pela necessidade de
equilibar as finanças públicas, e os direitos dos cidadão aguardam na fila, sem saber
quando – e se – será realizado, algum dia, um profundo e amplo contrato de
renegociação que possa de fato efetivar a cidadania dos brasileiros.
Isso nos permite dizer que o custo do endividamento interno tem sido
compartilhado com todos os cidadãos, pois estamos pactuados com os compromissos
que atendem apenas aos interesses do capital, a partir da oferta das generosas de taxa de
juros. Nos acostumamos a conviver com possibilidades e precarização dos bens e
serviços públicos.
Fomos submetidos a diversas reformas, sem nenhuma discussão com a sociedade.
A bem da verdade, o projeto minimalista liberal não permitiu que as demandas sociais
e urbanas fossem legitimadas, enquanto as despesas financeiras exercem a soberania na
estrutura orçamentária.
De forma recorrente construímos e ofertamos políticas de educação que pouco
conseguem desenvolver e estimular o conhecimento dos nossos professores e crianças;
temos uma assistência social com pouca regulamentação e acesso; as políticas de saúde
104
e saneamento, gestão ambiental, transporte e habitação permanecem com recursos
insuficientes perante à agenda nacional61.
A realidade hoje é que temos uma federação com atribuições governamentais
descentralizadas e desacompanhadas de recursos financeiros e orçamentários capazes
de garantir a cidadania; e, ao mesmo tempo, um governo central que legalizou a
apuração das metas fiscais em detrimento da universalização dos direitos62.

3.3.2 O desfecho: Crise Federativa

Por meio de um olhar federativo atento, os acontecimentos dos anos 90 não nos
revelou uma oportunidade para garantir a cidadania, nem tampouco revigorar o pacto
federativo e revertermos as patologias do passado.
Os encaminhamentos de imediato favoreceram a ascendente disputa de recursos
financeiros e orçamentários entre os governos subnacionais, em um ambiente de
verdadeiro leilão de vantagens fiscais oferecidas, e eliminou qualquer perspectiva de
aperfeiçoamento nas relações do pacto federativo, mediante o favorecimento de um jogo
de disputas verticais e horizontais entre as unidades federativas.
Guerreando entre si, muitas unidades federativas passaram a renunciar receitas ou
reduzir as alíquotas dos seus tributos para atrair o capital. Um exemplo que trouxe
prejuízos significativos para toda a federação, e que comprometeu o volume arrecadado
e a partilha dos recursos enviados para os grandes centros urbanos, que perderam
participação no índice, e no volume dos recursos que deveriam compor o orçamento das
políticas universais descentralizadas.
Ainda hoje, os grandes centros urbanos são um dos maiores responsáveis pela
geração do valor adicionado. Entretanto, a guerra fiscal reduziu a geração de valor
adicionado, variável fundamental da metodologia que apura o índice que distribuiu os
recursos da cota parte do ICMS.
Rever a importância da variável do valor adicionado na formula de apuração, e
considerar outras variáveis, como a importância da arrecadação do ICMS no município,
torna se fundamental para os municípios capitais, que sofreram perdas expressivas a
partir da desindustrialização e guerra fiscal.

61
A esse respeito, ver Anexo 2.
62
A esse respeito ver Pinto (2017).
105
Lembrando que o princípio da partilha dos recursos do ICMS não teve o caráter
distributivo. Sendo assim, essa correção torna-se necessária na atual economia de
serviços, pois permitirá uma distribuição mais equilibrada dos recursos da Cota parte do
ICMS, fundamentais para compensar e assegurar o desenvolvimento da econômica
local, e reduzir as disparidades de valor per capita entre as cidades, permitindo que os
municípios sede de regiões metropolitanas e polos provedores de serviços tenham
condições de exercer suas responsabilidades, e de assegurar a infraestrutura exigida pela
própria dinâmica econômica local.
Atualmente, com menos recursos disponíveis, as capitais estão inseridas em um
ambiente de aberta regressão social. A carência de bens e serviços está espalhada por
todas as áreas urbanas, e qualquer tentativa de resolver os problemas sociais por meio
de programas específicos tornou-se um esforço inválido.
As medidas fiscais andaram na contramão da agenda consagrada pela Constituição
Cidadã, das lutas políticas e sociais travadas desde o final dos anos 1970. E a extensa
agenda de reformas democráticas, comprometidas com o desenvolvimento social, e que
tinham como condições principais a retomada do crescimento econômico e do emprego,
melhoria nas condições de trabalho, avanços na previdência social, políticas de saúde,
de educação, de abastecimento popular, reforma agrária, políticas urbanas para
habitação popular, saneamento básico e transporte coletivo entre outras, foram
suprimidas da agenda nacional, por meio de contingenciamentos de recursos
orçamentários e omissão federativa.
Acredito que esse capítulo nos ajudou, em parte, a sustentar a principal hipótese
desta pesquisa: que os orçamentos fiscais das 26 capitais se deparam com uma estrutura
orçamentária rígida e com pouca autonomia federativa, mediante as imposições do
ajuste fiscal e da ausência dos governos central e estadual na prestação das suas
responsabilidades, a partir do movimento de reenquadramento dos compromissos sob o
âmbito da ordem econômica liberal.
Passados quase 30 anos da promulgação do texto constitucional, a única reposta
que temos é que a agenda fiscal dos anos 1990, com o discurso de que seria temporária,
assumiu caráter permanente, e os efeitos indesejáveis permaneceram encrustados na
economia nacional, com baixo crescimento econômico, aumento da dívida pública, altas
taxas de juros e mínimos resultados sociais. E, o pressuposto de que a universalidade
aumentaria a permeabilidade às demandas sociais e de investimentos em infraestrutura
não alcançou os anseios da Nova República.
106

Capítulo 4: Autonomia ou rigidez orçamentária municipal?


Análise das 26 capitais no período1995 a 2010
4.1 Introdução

A proposta central do estudo exigiu uma reflexão dos acontecimentos fiscais que
nos permitissem contextualizar a encruzilhada federativa que se encontram os centros
mais populosos do país, de cada estado da federação, as 26 capitais.
Estudo que necessariamente exigiu um olhar para o comportamento das finanças
públicas, leis e instruções normativas publicadas após a promulgação do texto
constitucional, que tinham como prioridade metas e resultados fiscais que interferiram
nas relações intergovernamentais, motivadas pelas regras de ouro do modelo,
justificadas pela necessidade de alcançarmos a estabilidade econômica.
O ajuste fiscal das contas do governo central sobrecarregou as finanças públicas
das capitais, lembrando que o texto constitucional de 1988 reconheceu os municípios
como unidades autônomas, sendo que as capitais deveriam assumir responsabilidades
financeiras e técnicas para a oferta das políticas públicas, algumas de competência
comum às três esferas, outras de competências exclusivas municipais.
E alinhado com o avanço do movimento da descentralização fiscal, e do processo
da municipalização das políticas públicas, as dificuldades orçamentárias e financeiras
das capitais para se cumprir o seu papel constitucional se agravaram.
Submetidas aos compromissos da nova disciplina fiscal e monitoradas a cada
bimestre e quadrimestre pela Secretaria do Tesouro Nacional, as restrições fiscais
impostas aos centros mais endividados, somada a baixa capacidade de investimento, os
forçaram a promover mudanças na forma de prover a oferta da política pública
descentralizada.
Conforme veremos nesse capítulo, o modelo da terceirização avançou de forma
rápida. Acredito que para compreendermos esse resultado, conforme abordamos no
capítulo 3, é preciso reconhecer que as condições que restringiram seu papel, não lhes
permitiram ampliar a infraestrutura urbana, e o número de equipamentos públicos,
necessários para assegurar a oferta de serviços públicos, que sistematicamente tem sido
transferida para o mercado.
Para a minha hipótese, o novo rumo escolhido ainda não assegurou instrumentos
que nos permita fazer a gestão pública dos custos e dos atendimentos terceirizados.
107
Nesse sentido, acredito que sem qualquer preocupação com a gestão dos serviços e a
satisfação dos usuários com a política terceirizada, a direção adotada tem favorecido e
atendido muito mais aos interesses privados, que propriamente a cidadania. Isso porque,
os mecanismos ditos de gestão, negligenciaram a estruturação de parâmetros que
pudessem apurar indicadores que avaliassem a eficiência e eficácia da política oferecida
por meio das terceirizações; parcerias público/privada; leilões; concessões; e
consórcios.
Ou seja, a ausência de instrumentos que de fato nos permita fazer um controle
social do dinheiro público, do preço, da qualidade e quantidade de serviços ofertados
por meio da terceirização, ainda precisam ser regulamentados.
O discurso frequente para abordar essa questão, tem sido atribuído basicamente
à hipótese de que os maiores centros urbanos são autônomos, que arrecadam muito bem,
e que parte da crise na gestão pública é oriunda da falta de competência para
desempenhar funções. É justamente nesse ponto que discordo da tese predominante.
Existe sim a necessidade de buscarmos um aperfeiçoamento da gestão pública
local, e o caminho perpassa pela necessidade de construirmos parâmetros e indicadores
que nos permitam entender os custos, principalmente das ações que deveriam ser
financiada pelo modelo tripartite, e que hoje se encontram no terceiro setor, e exigem a
cada dia mais recursos próprios do orçamentos dos municípios polos provedores de
serviços.
Sem essas informações, a conscientização das responsabilidades e partilhas
federativas, que representariam de fato a coesão social, com a transparência prometida,
permitiria o cidadão participar das decisões de planejamento de cada ação financiada
com o dinheiro público.
Mas, conforme veremos, apesar da maior autonomia de arrecadação própria per
capita, as capitais vêm perdendo autonomia para realizarem ações de responsabilidades
exclusivas municipais, necessárias para enfrentarem as complexidades decorrentes do
processo de urbanização caótica e do próprio modelo da municipalização.
As informações estudadas nos ofereceram pistas das dificuldades federativas,
que podem ser vistas em qualquer esquina de uma grande cidade. Ou seja, os maiores
centros urbanos, apesar da importância da sua arrecadação tributária própria, ficam
sujeitos às limitações fiscais, e às escassas políticas públicas locais voltadas para os
interesses coletivos, não conseguem oferecer serviços sociais e urbanos essenciais para
a população residente.
108
E há fortes indícios que uma combinação de esforços entre as três esferas, com
políticas redistributivas e com estratégias não excludentes, que representassem as
necessidades locais de cada sede de região metropolitana, permanecem fora da agenda
do governo brasileiro.
Para tanto, esse último capítulo fará uma leitura da série histórica da execução
orçamentária dos centros mais populosos do País, que nos indicará que poucas foram as
ações que contemplaram o fortalecimento institucional do município no quadro
federativo do País.
Sabemos que a disciplina fiscal restringiu o acesso ao financiamento, ao mesmo
tempo, as regulamentações que deveriam priorizar a coordenação das ações federativa
por parte dos governos federal e estadual não foram pautadas. Dessa forma, as esferas
superiores de governo participaram só como formuladoras das imposições fiscais, e não
atuaram como provedores das suas responsabilidades constitucionais.
Circunstância que não permitiu que as capitais acolhessem as necessidades de
uma sede de região metropolitana. Sobrecarregadas pelo ajuste fiscal, permanecem
diante de uma crise de funções federativas, onde todos brigam e ninguém parece ter
razão. Enquanto isso, o modelo mostra-se impotente para edificar uma sociedade em
outras bases, comprometida com princípios do federalismo cooperativo, acompanhados
dos compromissos sociais democráticos.
Diante disso, a maioria das capitais enfrenta o dilema posto pelo aumento da
participação dos recursos próprios na estrutura orçamentária e, em paralelo, a
multiplicidade de restrições fiscais que cercam a municipalização das políticas públicas
causando severa rigidez orçamentária.
O custo social e econômico é nefasto e ocorre na mais completa ausência e
abandono de papeis de cada esfera federativa. E, claro, a fatura do descaso é remetida
para a população mais vulnerável e desassistida pelo Estado.
Estas observações nos indicam a urgência com que é preciso discutir
explicitamente esse processo. Reconheço que é mais frequente identificarmos estudos
que mostram resultados opostos, a tese predominante associa os municípios como
vencedores do processo, devido ao volume das transferências intergovernamentais que
passaram a contabilizar. Porém, acredito que é uma hipótese desconectada com a
conjuntura orçamentária dos grandes centros urbanos.
A constante atuação das políticas definidas apenas nas instâncias superiores de
governos, gerou uma hipertrofia da autonomia do exercício das competências
109
municipais, e estimulou a adesão espontânea à municipalização. Por meio da celebração
de convênios, as 26 capitais passaram a executar um volume crescente de orçamento
discricionário, com ações que exigiram um expressivo volume de contrapartidas de
recursos próprios.
Essa hipótese será averiguada a partir do resultado das regulamentações federais
e estaduais, por exemplo, os setores da saúde e educação transferiram um volume
crescente de recursos vinculados, e por meio da exigência das contrapartidas interferem
diretamente no planejamento das ações locais financiadas com recursos próprios.
Faremos essa análise a partir da trajetória das receitas próprias, e das
transferências intergovernamentais no financiamento das políticas públicas ofertadas
pelas 26 capitais, para um período de dezesseis anos, 1995 até 2010. O período definido
e já abordado na introdução da pesquisa, é decorrente das alterações da nova
institucionalidade fiscal que definiu as novas regras para o País.
Não menos importante, o recorte do período do estudo, 16 anos, respeitou as
mudanças contábeis promovidas pela portaria MOG n. 42 de 15 de abril de 1999, que
promoveu alterações nas principais funcionais das despesas públicas.
Essas alterações para a esfera municipal passaram a vigorar em 2002, a partir do
desmembramento de algumas funcionais, como Educação e Cultura, Saúde e
Saneamento, Previdência e Assistencial Social, Habitação e Urbanismo, entre outras.
Todas essas alterações contábeis das despesas públicas coincidiram com o período das
mudanças promovidas pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Dessa forma, a trajetória do gasto público das 26 capitais abrangerá dois
intervalos: de 1995 a 2001, baseado em uma análise das funcionais do gasto mais
agregado e sem a vigência e restrições fiscais da LRF; e 2002 a 2010, compreenderá a
vigência das alterações decorrentes da portaria 42 e da LRF. Para efeito de comparações
entre períodos da análise da despesa pública municipal que compreenda o período que
antecede o ano de 2002, poderá haver algumas discrepâncias que serão apontadas,
conforme a base de dados disponibilizada pela Secretaria do Tesouro Nacional,
Finanças do Brasil (FINBRA).
A base FINBRA reúne a série mais longa de dados disponíveis e sistematizados
dos governos locais. Por meio da consolidação dos demonstrativos financeiros e
contábeis, as informações de receitas, despesas, ativos e passivos são encaminhadas
anualmente pelos governos municipais à Secretaria do Tesouro Nacional, sendo o poder
executivo de cada ente governamental o responsável pela elaboração de cada documento
110
enviado. Contudo, é preciso considerar que pode haver erros de digitação, ou algumas
mudanças na metodologia de consolidação das contas de um ano para outro, além de
reconhecer que em alguns anos, algumas capitais63 não enviaram as informações para a
STN.
Deve-se destacar ainda que, grande parte das informações se refere aos valores
contábeis empenhados64 e podem diferir dos valores efetivamente liquidados na
execução orçamentária.
Reconheço que além dessas questões, outras têm contribuído para diluir a
autonomia federativa municipal, como por exemplo, as constantes determinações e
interferência do judiciário no orçamento local, instrumento conhecido como
judicialização.
A imprevisibilidade daí decorrente tem colocado em risco a continuidade das
políticas públicas, desorganizando e até impedindo a alocação dos escassos recursos
orçamentários e financeiros que administram. Ou seja, a prática tem limitado a execução
do planejamento municipal, a partir dos excessos e da falta de critérios nas decisões
judiciais que vem comprometendo a execução orçamentária, por acarretar uma série de
gastos não previstos na Lei Orçamentaria Anual (LOA).
Para Barroso (2008):
“O sistema, no entanto, começa a apresentar sintomas graves de que pode
morrer da cura, vítima do excesso de ambição, da falta de critérios e de
voluntarismos diversos. Por um lado, proliferam decisões extravagantes ou
emocionais, que condenam a Administração ao custeio irrazoáveis, seja
porque inacessíveis, seja porque destituídos de essencialidade...”.

Todos esses acontecimentos precisam integrar-se ao debate, segundo Pinto (2017)


existe uma dificuldade crescente para se planejar e cumprir as atribuições
constitucionais e municipalizadas que configuram a crise entre os entes federativos.

63
Vale observar que foi identificada ausência de informações de algumas localidades na base FINBRA:
Municípios que apresentaram inconsistência em um ano: 1997: Florianópolis e Palmas
Municípios que apresentaram inconsistência em dois: 1996: Porto Velho; 1998: João Pessoa; e 1999: João
Pessoa e Porto Velho.
64
Segundo a Lei n. 4.320, de 17 de março de 1964, que normatiza a execução orçamentária no caso
brasileiro, o empenho corresponde à emissão de uma nota por meio da qual o ordenador da despesa se
compromete a realizá-la. Por sua vez, a fase seguinte, conhecida como liquidação, é também definida na
Lei 4.320: é uma etapa em que o governo verifica e reconhece o direito adquirido pelo credor, tendo por
base os comprovantes da entrega do bem ou da prestação do serviço. Ou seja, a partir da liquidação da
despesa, o ordenador reconhece sua obrigação em relação ao pagamento. Pode haver diferenças entre os
valores empenhados e os valores que de fato foram realizados, pois o simples fato de a despesa ter sido
empenhada não implica a sua efetiva execução, uma vez que os empenhos podem ser anulados se não
houver a prestação do serviço contratado pelo governo em tempo hábil e, se os bens comprados não forem
entregues, a nota também não será liquidada, e, portanto, o pagamento não será efetivado.
111
Esse cenário confirma a profundidade dos desafios atribuídos aos municípios mais
endividados e populosos, e corrobora com minha hipótese de estudo, que existe uma
rigidez na autonomia orçamentária que implica em dificuldades para planejar ações
estritamente locais, responsabilidade dos governos autônomos.
E considerando que as 26 capitais65 concentraram 25% da população do País, e
acolheram em média, mais de 23% da população residente em seus respectivos estados,
conforme os dados do censo de 2000 e 2010 apresentados na tabela 10, o cenário é no
mínimo conflitante, com prejuízos substanciais para parcela expressiva da população
brasileira.

Tabela 10 - População das 26 capitais versus a População Total de cada Estado,


ano 2010

População Total População População Total Variação Partic. Pop Capital


Estados Estados ANO 26 Capitais Total Capitais Capitais ANO Populacional no total População
2010 (A) ANO 2010 (B) 2000 (C) (B)/(C) Estado(B)/(A)
TO 1.383.445 Palmas 228.332 137.045 67% 17%
RR 450.479 Boa Vista 284.313 200.383 42% 63%
AP 669.526 Macapá 398.204 282.745 41% 59%
AC 733.559 Rio Branco 336.038 252.885 33% 46%
AM 3.483.985 Manaus 1.802.014 1.403.796 28% 52%
RO 1.562.409 Porto Velho 428.527 334.585 28% 27%
SE 2.068.017 Aracaju 579.149 461.083 26% 28%
SC 6.248.436 Florianópolis 421.240 341.781 23% 7%
PB 3.766.528 João Pessoa 723.515 595.429 22% 19%
GO 6.003.788 Goiânia 1.302.001 1.090.737 19% 22%
MS 2.449.024 Campo Grande 786.797 662.534 19% 32%
AL 3.120.494 Maceió 932.748 796.842 17% 30%
MA 6.574.789 São Luís 1.014.837 868.047 17% 15%
CE 8.452.381 Fortaleza 2.452.185 2.138.234 15% 29%
MT 3.035.122 Cuiabá 551.098 483.044 14% 18%
PI 3.118.360 Teresina 814.230 714.583 14% 26%
RN 3.168.027 Natal 803.739 709.536 13% 25%
ES 3.514.952 Vitória 327.801 291.941 12% 9%
PR 10.444.526 Curitiba 1.751.907 1.586.848 10% 17%
BA 14.016.906 Salvador 2.675.656 2.440.828 10% 19%
PA 7.581.051 Belém 1.393.399 1.279.861 9% 18%
SP 41.262.199 São Paulo 11.253.503 10.405.867 8% 27%
PE 8.796.448 Recife 1.537.704 1.421.993 8% 17%
RJ 15.989.929 Rio de Janeiro 6.320.446 5.851.914 8% 40%
MG 19.597.330 Belo Horizonte 2.375.151 2.232.747 6% 12%
RS 10.693.929 Porto Alegre 1.409.351 1.360.033 4% 13%
TOTAL 188.185.639 42.903.885 38.345.321 12% 23%
Fonte: IBGE, Censo 2000 e 2010.
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/contagem2007
Acesso realizado em 26 de janeiro de 2015

65
A amostra do estudo escolheu as 26 capitais, e não considerou o Distrito Federal (DF), pois não é um
estado, nem na dimensão, nem nas suas características fiscais, e arrecada tanto impostos estaduais como
municipais, e recebe tratamento diferenciado nas transferências federais que podem prejudicar a análise
das médias que serão apresentadas apenas para os 26 capitais da federação.
112
Segundo Pinto (2017), as ações descentralizadas e ou municipalizadas nos
municípios mais populosos, somada às restrições fiscais, e a ausência de correlação dos
fluxos tripartite tem impostos inúmeras consequências e desmantelamento de políticas,
e que são agravadas pela judicialização.
Se continuarmos a insistir em soluções míopes e parciais sobre os sintomas de
tamanho desarranjo federativo, e não avançarmos sobre as causas estruturais
dificilmente teremos efetividade e equidade nos direitos sociais. Nesse ambiente o
princípio básico do federalismo fiscal tornou-se quase um desafio, e as políticas
exclusivamente municipais desapareceram da agenda orçamentária local.
Para sustentar a hipótese de autonomia para arrecadar recursos, apresentaremos
no item abaixo, as maiores rubricas de receitas que ilustram a evolução da arrecadação
própria; as principais transferências66 constitucionais e discricionárias; e as receitas de
capital que compuseram o orçamento das capitais.
Na sequência, serão apresentadas as metodologias das transferências de recursos;
as funcionais da despesa pública; as categorias econômicas do gasto por natureza e
elemento da despesa. O estudo apresentará a informação pela média e para cada capital;
e algumas informações serão apresentadas por intervalos populacionais dos municípios
brasileiros.

4.2. O Aumento da participação na Receita Disponível se traduziu em


autonomia orçamentária?

Conforme abordado no capítulo 2, a matéria tributária conferida na Carta


Constitucional de 1988 estabeleceu um arranjo fiscal caracterizado pela distribuição
vertical e horizontal 67 de recursos financeiros entre as esferas federativas.
O arcabouço institucional pretendia dinamizar o sistema de transferências
intergovernamentais redistributivas e compensatórias entre as esferas de governo,

66
De acordo com Arretche (2010), vale lembrar que, desde a Constituição de 1946, foi criado um
mecanismo de transferências intergovernamentais, e os recursos transferidos aos governos subnacionais
passaram a estar crescentemente sujeitos a negociações e barganhas, além de frequentemente vinculados
a prioridades já definidas pelo órgão federal do qual se originaram, e não permitiam a livre alocação local
de receitas transferidas de outras jurisdições, ou seja, a lógica subjacente ao arranjo era limitar as decisões
dos governos locais.
67
Conforme Prado (2013), o equilíbrio vertical refere-se à obtenção de uma distribuição adequada de
recursos entre governo federal e governos subnacionais; enquanto o equilíbrio horizontal refere-se ao à
obtenção de uma distribuição minimamente equitativa dos recursos fiscais entre governos subnacionais
pobres e ricos do mesmo nível.
113
considerando a necessidade de reduzir as desigualdades econômicas e sociais, regionais
e locais da federação. Ou seja, transferir recursos aos governos mais pobres era
necessário, uma oportunidade para que um nível mínimo de serviços fosse assegurado
aos cidadãos das regiões menos consolidadas de um território.
Lembrando que, para a teoria do federalismo fiscal as disparidades territoriais,
econômicas e sociais só poderiam ser vencidas a partir de uma harmonia federativa,
construídas a partir de uma relação de cooperação técnica e financeira, vertical e
horizontal entre os entes federativos.
Como bem disse Prado (2013), o sistema arterial de uma federação deve ser
construído por meio de mecanismos que viabilizassem uma distribuição de recursos
fiscais entre governos autônomos, uma oportunidade para reduzir as disparidades de
capacidade fiscal entre eles.
Reconheço que a pactuação federativa de 1988 depositou nas transferências
intergovernamentais de recursos verticais e horizontais, o papel vital para enfrentarmos
as desigualdades sócio econômicas do País.
No entanto, acredito que a finalidade da partilha dos recursos assegurada no texto
constitucional de 1988 acabou suscitando algumas discrepâncias para os centros mais
populosos, pois o uso de regras generalizadas desconsiderou as alterações ocorridas no
âmbito da dinâmica econômica ao longo do processo da internacionalização da
economia.
Conforme as informações da tabela 11, a evolução da arrecadação dos municípios
capitais mostra que houve um aumento da importância da receita própria, de 38 para 43
pontos percentuais da receita total.

Tabela 11 - Evolução da participação média das Categorias Econômicas na


Receita na Receita Orçamentária Total, 26 capitais– em %
ANO / Total Receita Corrente 1995 1999 2003 2007 2010
Disponível* 26 capitais 54.111.765.327,92 66.776.923.351,91 77.485.809.148,06 108.715.059.008,54 136.147.963.042,66
1. Arrecadação Própria 36% 38% 39% 40% 42%
2. Transferências Correntes (**) 57% 55% 59% 54% 54%
Transf. Constitucionais / (2) n.d 75% 68% 64% 62%
Transf. Voluntárias / (2) n.d 25% 32% 36% 38%
3. Receita Capital 7% 7% 2% 3% 4%
Fonte: FINBRA, STN vários anos.
(*) A preços em março de 2018, IPCA/IBGE.
(**) Já realizado as deduções das receitas correntes.
114
Enquanto que a participação das transferências constitucionais no total das
transferências correntes sofreu redução de 75 para 62 pontos percentuais, queda que está
intimamente ligada ao uso de regras generalizadas que desconsiderou, principalmente,
os efeitos do processo de desindustrialização da economia brasileira, que fomentou a
guerra fiscal e reduziu o valor agregado dos grandes centros. Cenário que comprometerá
o financiamento do pacto federativo estabelecido em 1988, por meio da descentralizadas
dos programas nacionais.
Ao mesmo tempo, as transferências voluntárias ganharam participação, de 25 para
38 pontos percentuais do total das transferências correntes, movimento que mostra a
adesão das capitais aos programas e decisões políticas dos governos superiores,
fenômeno mais conhecido como municipalização das políticas públicas.
As figuras do anexo 06, extraídas do manual do setor público disponibilizado pela
Secretaria do Tesouro Nacional, apresentam quais rubricas de receita compõem cada
bloco da receita pública – a própria; transferências constitucionais e voluntárias, e a
receitas de capital – no período analisado. A partir da lista das fontes de receitas,
razoavelmente extensa, foi possível consolidar a média de participação de cada bloco
de receita disponível, apresentadas na tabela11, na estrutura do orçamento das 26
capitais.
Observo que a receita própria representa o esforço tributário do governo local, é
lançada e arrecadada no município. Enquanto que as transferências correntes são
decorrentes dos recursos transferidos pela União e Estados, a partir de definições do
texto constitucional, e as receitas voluntárias que financiam algum programa específico
e voluntariamente. A receitas de capital, é composta por recursos oriundos,
principalmente das operações de crédito junto ao BNDES, CEF e BID, e das alienações
de bens públicos.
Vale observar que para receber os recursos voluntariamente, algumas
condicionalidades devem ser rigorosamente cumpridas: i) contas do exercício: enviar
suas contas ao Poder Executivo Federal, nos prazos previstos, para fins de consolidação,
nacional e por esfera de governo, das contas dos entes da Federação do exercício
anterior; ii) publicação do relatório da execução orçamentária até 30 dias após o
encerramento de cada bimestre (Constituição Federal, art. 165, § 3º e Lei Complementar
nº 101/2000, art. 52, § 2º c/c 51 § 2º); iii) publicação do relatório de gestão fiscal até 30
dias após o encerramento de cada quadrimestre.
115
Na hipótese de o Estado, Distrito Federal ou Município ultrapassar os limites
definidos para despesa total com pessoal e não alcançar a redução no prazo estabelecido,
o artigo 23 da LRF definiu que, enquanto perdurar o excesso, o ente da Federação não
pode capitalizar de novos recursos.
As restrições fiscais definidas pelas resoluções do Senado Federal números 40 e
41, reforçaram a imposição do artigo 23, e deixou muitas capitais impedidas de
buscarem novos financiamentos de longo prazo. Determinação que se confirma por
meio da queda de participação da receita de operações de crédito na receita total, e ou
aumento da participação das receitas correntes, que representaram 94 pontos percentuais
da receita total para metade dos municípios da amostra.
Ainda considerando as informações da tabela 11, a participação das receitas de
capital antes da vigência da LRF, em 1999, era de 7 pontos percentuais, em 2010, a
participação passou para apenas 4 pontos percentuais na receita total. Queda que se
traduziu em limitações para realizar ampliações e novas ações em investimentos na
infraestrutura urbana.
Questão que é acompanhada pelo seguinte paradoxo: a possibilidade de novos
financiamentos é uma necessidade, mas não uma realidade para os centros urbanos com
maior capacidade e autonomia para lançar e arrecadar recursos próprios, acima da média
municipal, pois estão sujeitos às restrições fiscais que os impedem de pleitear novas
operações de crédito.
Restaram-lhes apenas uma oportunidade, a adesão às transferências
discricionárias, ainda que, parcialmente, tivessem o objetivo de atender o aumento do
crescimento vegetativo e as complexidades urbanas decorrentes do modelo da
descentralização fiscal.
Conforme veremos mais a frente, esse cenário criou uma realidade que tem
produzido enorme assimetria na capacidade de realizar investimento público entre os
municípios brasileiros. Por meio das tabelas 22, 26 e 32, será possível identificar tal
resultado, quando agrupamos as informações das finanças públicas de todos os
municípios brasileiros por intervalos populacionais, os valores destinados para
investimento público, em percentuais e per capita, ficaram comprometidos nos centros
urbanos mais populosos.
Enquanto que os municípios com menor autonomia para arrecadar recursos
próprios, ao mesmo tempo, mais dependentes das transferências de recursos
116
constitucionais, mas não eram polos provedores de serviços dos programas nacionais,
tiveram mais autonomia para realizarem investimentos.
Essa questão é resultante, em parte, dos acontecimentos econômicos e das
restrições fiscais dos anos 90, que licenciaram as 26 capitais, apenas a administrarem
um volume maior de recursos de convênios. Ao mesmo tempo, comprometeu parte
expressiva dos recursos próprios com as denominadas contrapartidas que exigiram,
enquanto principais polos provedores dos serviços dos programas nacionais.
Cenário que prejudicará qualquer possibilidade de financiamento e investimento
voltados para infraestrutura local, reconhecendo que as necessidades, enquanto
principais atores da municipalização se ampliaram no período estudado.
Dessa forma, acredito que o modelo que licenciou as 26 capitais a administrarem
um volume maior de recursos discricionários, ao mesmo tempo, criou um ingrediente
novo para o debate federativo: a rigidez orçamentária para as finanças públicas das
cidades mais populosas, autônomas para arrecadar recursos próprios, porém,
endividadas e impedidas de realizarem os investimentos necessários para enfrentar os
desafios e complexidades urbanas que gerenciam.

4.2.1 O significado das Receitas próprias68

Cumpre observar mais uma vez, que a capacidade de arrecadar de um ente


federativo está intimamente relacionada à dinâmica da economia local, tornando a
arrecadação própria imprescindível para financiar a estrutura do desenvolvimento local.
A evolução da arrecadação dos tributos locais, conforme tabela 12, retrataram o
potencial econômico tributário nos grandes centros urbanos, e, ao mesmo tempo, esse
aumento pode ser interpretado como parte da perda da importância das receitas
constitucionais.
A média da participação da receita própria no orçamento corrente das capitais, em
1998 era de 38 pontos percentuais, e, no ano de 2010, essa participação aumentou para
46 pontos percentuais.
Se a aferição for apresentada pelo valor máximo e mínimo da amostra, no ano de
2010, o município do Rio de Janeiro alcançou maior autonomia na arrecadação própria,
65 pontos percentuais, enquanto Macapá contabilizou a menor participação, apenas 28

68
Definição de Receitas Próprias se constitui da soma das rubricas das receitas apresentadas quadro 01,
do anexo 05.
117
pontos percentuais. Resultado que mostra a desigualdade na capacidade econômica de
gerar própria entre os municípios capitais.

Tabela 12 - Participação da Receita Própria no Orçamento Corrente das 26


capitais: 1998; 2002; 2006 e 2010 – em %
1998 2002 2006 2010
Municípios
UF População Receita Receita Receita Receita
Capitais IPTU ISS IPTU ISS IPTU ISS IPTU ISS
Própria Própria Própria Própria

ARACAJU SE 587.701 43% 25% 44% 56,12% 13% 21% 34% 18% 38% 40% 14% 33%
BELEM PA 1.410.430 28% 17% 41% 32,91% 10% 30% 34% 8% 32% 40% 7% 30%
BELO HORIZONTE MG 2.395.785 45% 28% 31% 51,58% 23% 21% 47% 24% 24% 53% 19% 24%
BOA VISTA RR 296.959 22% 16% 50% 11,61% 13% 50% 14% 9% 26% 29% 8% 22%
CAMPO GRANDE MS 805.397 54% 28% 26% 36,54% 21% 25% 41% 17% 24% 44% 23% 21%
CUIABA MT 561.329 28% 14% 47% 29,41% 8% 38% 31% 10% 45% 38% 7% 37%
CURITIBA PR 1.776.761 58% 13% 21% 63,92% 14% 20% 62% 14% 21% 65% 11% 21%
FLORIANOPOLIS SC 433.158 44% 17% 30% 56,86% 21% 29% 62% 23% 25% 64% 22% 24%
FORTALEZA CE 2.500.194 36% 15% 36% 41,62% 11% 22% 37% 12% 27% 41% 11% 26%
GOIANIA GO 1.333.767 48% 28% 33% 33,78% 26% 32% 47% 25% 29% 51% 19% 26%
JOAO PESSOA PB 742.478 n.d n.d n.d 26,46% 15% 46% 25% 12% 36% 37% 7% 26%
MACAPA AP 415.554 16% 13% 54% 12,00% 3% 56% 18% 4% 36% 28% 4% 20%
MACEIO AL 953.393 29% 23% 31% 27,46% 19% 31% 31% 15% 34% 39% 10% 23%
MANAUS AM 1.861.838 39% 7% 40% 33,34% 6% 44% 32% 7% 49% 38% 5% 38%
NATAL RN 817.590 30% 15% 31% 33,23% 12% 34% 34% 10% 37% 42% 8% 31%
PALMAS TO 242.070 15% 8% 38% 21,00% 8% 41% 20% 6% 35% 35% 6% 23%
PORTO ALEGRE RS 1.416.714 45% 15% 27% 52,07% 13% 22% 58% 14% 24% 61% 13% 24%
PORTO VELHO RO 442.701 n.d n.d n.d 30,27% 4% 25% 28% 4% 30% 52% 2% 51%
RECIFE PE 1.555.039 47% 17% 31% 41,64% 20% 38% 44% 17% 34% 49% 15% 32%
RIO BRANCO AC 348.354 16% 14% 28% 22,88% 7% 23% 25% 5% 21% 39% 4% 19%
RIO DE JANEIRO RJ 6.390.290 64% 20% 35% 58,95% 19% 30% 60% 21% 34% 65% 16% 36%
SALVADOR BA 2.710.968 51% 28% 38% 46,20% 17% 36% 43% 15% 39% 49% 13% 35%
SAO LUIS MA 1.039.610 37% 11% 37% 46,95% 7% 26% 29% 9% 48% 40% 6% 41%
SAO PAULO SP 11.376.685 59% 21% 40% 58,44% 30% 36% 60% 26% 40% 64% 23% 40%
TERESINA PI 830.231 15% 19% 55% 48,88% 5% 13% 19% 9% 34% 35% 5% 20%
VITORIA ES 333.162 36% 11% 54% 45,38% 8% 44% 44% 7% 49% 51% 7% 42%
Média 1.676.083 38% 18% 37% 39% 14% 32% 38% 13% 34% 46% 11% 29%
Funções Mediana 891.812 38% 17% 36% 39% 13% 30% 34% 12% 34% 42% 9% 26%
Estatísticas Mínimo 242.070 15% 7% 21% 12% 3% 13% 14% 4% 21% 28% 2% 19%
Máximo 11.376.685 64% 28% 55% 64% 30% 56% 62% 26% 49% 65% 23% 51%
Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional, base Finbra, vários anos. Elaboração Própria.
Obs: Informação não disponível para João Pessoa e Porto Velho, no ano de 1998.

O fortalecimento da arrecadação da receita própria das 26 capitais, cumpre


reconhecer que se deu mediante um conjunto de ações fiscais empreendidas por cada
administração local. Não há como negar a importância das transferências
intergovernamentais, porém, o resultado da arrecadação própria das 26 capitais, de um
modo geral, mostrou que ocorreram ações voltadas para a melhoria da máquina
fazendária.
Podemos dizer que as questões econômica e populacional, somadas à utilização
de instrumentos de informatização do fisco municipal tem possibilitado o conhecimento
de um conjunto variado de informações sobre os contribuintes municipais, que,
118
continuadamente, alimentados e atualizados, e têm permitido novas formas para
planejar e programar ações fiscais, contribuindo para reduzir a evasão fiscal e aumentar
a arrecadação tributária própria.
Ações como auditorias, programas de parcelamento e a cobrança do estoque da
dívida ativa tributária, revisões das legislações tributárias municipais e da planta
genérica de valores (PGV), foram determinantes para esse resultado. Segundo Afonso e
Araújo (2001), muitos municípios já cobravam IPTU, taxas e até mesmo o ISS, usando
guias de recolhimento com código de barras e leitura ótica, desde os anos 80.
A modernização das legislações tornou a cobrança mais justa socialmente, a partir
dos avanços por meio de alíquotas progressivas dos tributos.
E, a partir da promulgação do Estatuto das Cidades69 estava autorizado o
lançamento da cobrança de outorgas onerosas; certificados de potencial construtivos; e
operações urbanas. Tais instrumentos se transformaram em novas possibilidade de
receitas, principalmente no sentido de organização do território e no combate aos vazios
urbanos. Contudo, uma série de condicionalidades na regulamentação do Estatuto foram
impostas, e talvez justifique as dificuldades de aplica-las.
Enquanto que o desempenho da arrecadação do Imposto Sobre Serviços de
Qualquer Natureza (ISSQN), alinhado com a aprovação da Lei Complementar
116/2003, que ampliou a base do fato gerador dos serviços tributados, no período
estudado, se destacou como a principal rubrica de receita própria dos municípios
capitais.
Outras fontes de recursos contribuíram para o avanço da arrecadação própria,
entre elas a cobrança do IPTU, ITBI, a receita de dívida ativa, as receitas patrimoniais
e taxas. Observo que as contribuições de melhorias ainda merecem mais atenção por
parte dos gestores municipais, tanto na fase do lançamento, como na arrecadação
efetiva, pois apresentaram participação inexpressiva na carga tributária municipal.
Mesmo diante das conquistas tributárias na arrecadação das receitas próprias, a
rigidez orçamentária se consagrou, uma realidade na execução do orçamentária das 26
capitais. Nesse ponto é que ocorre o difícil encontro entre a autonomia na arrecadação
própria, motivada em parte pela modernização do fisco municipal, versus a rigidez

69
Estatuto da Cidade é a denominação oficial da Lei 10.257, de 10 de julho de 2001, que regulamentou o
capítulo “Política Urbana” da Constituição Federal, detalhando e desenvolvendo os artigos 182 e 183.
Seu objetivo é garantir o direito à cidade como um dos direitos fundamentais da pessoa humana, para que
todos tenham acesso às oportunidades que a vida urbana oferece.
119
orçamentária justificada pelos acontecimentos dos anos 90, os resultados da
internacionalização da economia, as restrições do ajuste fiscal, e pelo própria atuação
da municipalização em curso.

4.2.2 O significado das Transferências Intergovernamentais

O primordial nesse subitem será buscar uma compreensão das diferenças e


importância das transferências constitucionais e discricionárias para as 26 capitais. O
anexo 06 - figuras 6, 7, 8, e 9 - apresentaram quais rubricas e ou códigos das receitas
que compõem o grupo das transferências correntes para os municípios.
Algumas transferências intergovernamentais foram definidas no texto
constitucional, outras foram regulamentadas após o período pós-constituinte por meio
dos programas nacionais. Não há dúvida quanto a importância das transferências
intergovernamentais para os municípios brasileiros e para as 26 capitais. Entretanto, o
uso do instrumento que soldou o pacto federativo vigente, merece atenção.
Como observado, acredito que os resultados da modernização tributária da
arrecadação própria, não necessariamente tenham se traduzido em autonomia para
decidir e alocar recursos com a infraestrutura urbana.
Uma das hipóteses é que a modelagem dos programas nacionais e convênios,
decorrentes das transferências discricionárias, tenham implicado em aumento do custeio
na estrutura orçamentária, limitando qualquer possibilidade de realização dos
investimentos.
Observamos também, que as mudanças da própria dinâmica econômica
interferiram no volume das principais rubricas de receitas que compõem as
transferências correntes constitucionais. Cenário que vai acarretar dificuldades para o
exercício da autonomia federativa dos governos das capitais, sabendo da importância
dos recursos constitucionais para o financiamento do modelo da descentralização fiscal
em curso.
De um modo geral, podemos dizer que os municípios brasileiros receberam dos
governos superiores, em média, 56 pontos percentuais, por meio das transferências
intergovernamentais, conforme informações da tabela 13.
120
Tabela 13 - Participação em % das Transferências Correntes no total das Receitas
Orçamentárias – 26 capitais
Transferências
UF População 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
Correntes
ARACAJU SE 587.701 41% 58% 62% 63% 62% 66% 63% 62% 60%
BELEM PA 1.410.430 62% 62% 61% 60% 61% 62% 61% 61% 60%
BELO HORIZONTE MG 2.395.785 48% 47% 47% 47% 50% 48% 49% 48% 47%
BOA VISTA RR 296.959 73% 75% 76% 75% 77% 76% 75% 72% 71%
CAMPO GRANDE MS 805.397 55% 54% 56% 54% 56% 57% 58% 57% 56%
CUIABA MT 561.329 69% 67% 66% 62% 64% 63% 63% 65% 62%
CURITIBA PR 1.776.761 34% 33% 35% 35% 36% 35% 37% 36% 35%
FLORIANOPOLIS SC 433.158 38% 37% 34% 35% 35% 36% 38% 40% 36%
FORTALEZA CE 2.500.194 55% 54% 53% 52% 58% 62% 61% 62% 59%
GOIANIA GO 1.333.767 65% 61% 53% 51% 50% 49% 56% 52% 49%
JOAO PESSOA PB 742.478 64% 67% 53% 65% 69% 66% 80% 63% 63%
MACAPA AP 415.554 80% 73% 75% 73% 74% 73% 71% 73% 72%
MACEIO AL 953.393 67% 67% 64% 63% 63% 63% 62% 62% 61%
MANAUS AM 1.861.838 61% 62% 62% 63% 61% 62% 62% 62% 62%
NATAL RN 817.590 63% 59% 62% 62% 61% 60% 61% 60% 58%
PALMAS TO 242.070 70% 69% 71% 74% 72% 71% 69% 67% 65%
PORTO ALEGRE RS 1.416.714 44% 39% 40% 41% 40% 38% 40% 40% 39%
PORTO VELHO RO 442.701 65% 59% 60% 65% 64% 64% 62% 55% 48%
RECIFE PE 1.555.039 58% 56% 50% 52% 51% 51% 51% 51% 51%
RIO BRANCO AC 348.354 71% 68% 69% 67% 67% 65% 65% 85% 61%
RIO DE JANEIRO RJ 6.390.290 37% 36% 40% 38% 37% 36% 38% 36% 35%
SALVADOR BA 2.710.968 46% 43% 45% 49% 53% 51% 54% 51% 51%
SAO LUIS MA 1.039.610 49% 67% 67% 66% 65% 63% 63% 63% 60%
SAO PAULO SP 11.376.685 39% 39% 41% 38% 37% 35% 35% 37% 36%
TERESINA PI 830.231 47% 64% 56% 59% 74% 73% 68% 66% 65%
VITORIA ES 333.162 50% 52% 54% 51% 50% 50% 52% 49% 49%
Média 1.676.083 56% 56% 56% 56% 57% 57% 57% 57% 54%
Funções Mediana 891.812 57% 59% 56% 60% 61% 62% 61% 61% 58%
Estatísticas Mínimo 242.070 34% 33% 34% 35% 35% 35% 35% 36% 35%
Máximo 11.376.685 80% 75% 76% 75% 77% 76% 80% 85% 72%
Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional, base Finbra, vários anos. Elaboração Própria.

É possível identificar que a participação das transferências correntes na estrutura


orçamentária das capitais mais populosas, tem menor representação. Situação que se
justifica tanto pela importância da arrecadação própria, como pelo processo de
desindustrialização do país e guerra fiscal. E, em parte, pelo próprio movimento da
recentralização dos recursos no âmbito federal.
Quando apuramos essa informação pelo tamanho populacional, considerando
todos os municípios do País, a média da participação das transferências correntes é bem
mais representativa no orçamento corrente, conforme mostra a tabela 14.
121
No final dos anos 90, as transferências constitucionais representaram em média,
66 pontos percentuais do orçamento corrente. No ano de 2010, a participação foi pouco
mais de 60 pontos percentuais das receitas correntes.
E para os municípios com população acima de um milhão de pessoas, a média
de participação no ano de 1998 era de 45 pontos percentuais, em 2010 a participação
era de apenas 39 pontos percentuais, ao passo que nos municípios menos populosos
esses recursos representaram 80 pontos percentuais do orçamento corrente.

Tabela 14 - Participação média das principais transferências constitucionais


correntes dos municípios brasileiros agrupados por intervalos populacionais.
Anos: 1998; 2004 e 2010 - em %
População Transf Corrente / Rec Corrente FPM / Rec Corrente ICMS / Rec Corrente
MUNICIPIO 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010
acima de 1 MILHÃO 23% 23% 20% 45% 43% 39% 4% 3% 4% 20% 17% 15%
500 MIL - 1 MILHÃO 8% 9% 8% 61% 59% 55% 7% 8% 6% 27% 24% 20%
300 MIL - 500 MIL 8% 9% 8% 59% 56% 56% 7% 7% 7% 24% 22% 19%
100 MIL - 300 MIL 17% 17% 17% 67% 62% 62% 14% 12% 11% 27% 23% 20%
50 MIL - 100 MIL 12% 11% 12% 75% 69% 71% 19% 16% 16% 28% 24% 19%
30 MIL - 50 MIL 8% 8% 9% 80% 76% 75% 27% 22% 20% 24% 19% 18%
795 - 30 MIL 25% 23% 24% 88% 83% 80% 40% 33% 31% 23% 21% 17%
Média 100% 100% 100% 66% 62% 61% 17% 14% 14% 24% 21% 18%
FONTE: STN/FINBRA, anos: 1998, 2004 e 2010.
OBS: receitas já contabilizadas as deduções para formação do Fundef/Fundeb

Cenário que sacramentou o pensamento que acreditava que as transferências de


recursos são suficientes para assegurarem as condições técnicas e financeiras para a
realização dos programas universais, e multiplicidade das ações das políticas
descentralizadas.
De acordo com os estudos da Secretaria do Tesouro Nacional e Receita Federal
do Brasil, os municípios arrecadaram em média 5% da Carga Tributária Bruta (CTB), e
apropriam-se de mais 12%, por meio das transferências intergovernamentais, somando
uma receita disponível de 17 pontos percentuais na esfera municipal.
E, como bem observou Afonso (2013) quanto maior a capilaridade dos serviços
públicos, maior será a demanda de autonomia subnacional, ou seja, mais liberdade para
os governos locais na concepção e execução das políticas, já que a proximidade dos
contribuintes aumenta a eficiência e o foco das políticas públicas. A capacidade da
população de monitorar e de cobrar ações do governo local é maior, ampliando a
accountability do sistema federativo.
122
Porém, observo que nossa experiência em meio ao emaranhado de indefinições
nas relações federativas, não tem nos assegurado a realização da gestão dos recursos
tributários próprios, que deveriam ser alocados com o financiamento das competências
exclusivas do município; e muito menos tem nos permitido a participação na concepção
das políticas municipalizadas, limitando a autonomia federativa municipal.
Realidade que justifica rever os critérios e metodologias aplicadas para partilhar
dos recursos na federação. Acredito que essa questão torna-se primordial para
vencermos os atuais entraves e desequilíbrios federativos reproduzidos pelas medidas
em curso.
Isso porque, uma das principais diferenças entre as duas categorias de
transferências, no caso das Constitucionais ou legais, os critérios de partilha
regulamentados constitucionalmente definiram que os recursos poderiam ser aplicados
em qualquer ação dos programas de um governo, ou seja, asseguram um grau de liberdade
alocativa nos orçamentos que as recebem.
Conforme plano de contas, são consideradas como transferências constitucionais
as seguintes rubricas de receitas: FPM; Cota ITR; Cota IOF Ouro; Cota-parte Royalties
Petróleo; Cota Royalties Excedente; Cota Royalties Part. Especial; Cota Petróleo LC
87/96 ICMS; Cota ICMS; Cota IPVA; Cota IPI Exportação; Cota CIDE; Cota Royalties
Produção; Transferências Multigovernamentais FUNDEB. Recursos que deduzidas as
vinculações constitucionais para o setor da saúde e para educação, podem ser alocados
em qualquer função do gasto público, e não exigiram nenhuma contrapartida.
Porém, mais uma vez, é preciso destacar que ao longo do período estudado, as
transferências constitucionais perderam importância na estrutura do orçamento das 26
capitais. Ao mesmo tempo, as responsabilidades das ações da proteção social
municipalizadas foram ampliadas.
No período estudado, 1995-2010, a tabela 15 mostra a perda da participação das
transferências constitucionais no total das transferências correntes para cada capital.
Cenário que tem limitado a atuação dos governos subnacionais, pois quanto maior
a parcela das transferências constitucionalmente garantida, maior seria autonomia
federativa. Nesse sentido, a medida que a participação das transferências constitucionais
foi reduzida, as dificuldades na gestão das políticas públicas se aprofundaram.
123
Tabela 15- Participação em % das Transferências Constitucionais no Total das
Transferências Correntes: anos 1997; 2004; e 2010
1997 2004 2010
Transf. Transf. Transf.
FPM / Transf. ICMS / Transf. FPM / Transf. ICMS / Transf. FPM / Transf. ICMS / Transf.
Constitucional / Constitucional / Constitucional /
Constitucional Constitucional Constitucional Constitucional Constitucional Constitucional
MUNICIPIO Transf. Corrente Transf. Corrente Transf. Corrente
ARACAJU 68% 34% 44% 55% 37% 33% 54% 38% 32%
BELEM 50% 36% 39% 53% 43% 38% 51% 45% 39%
BELO HORIZONTE 39% 18% 48% 44% 19% 53% 51% 16% 41%
BOA VISTA 77% 60% 22% 74% 73% 16% 77% 57% 21%
CAMPO GRANDE 55% 22% 61% 56% 16% 43% 55% 17% 42%
CUIABA 65% 29% 51% 61% 22% 45% 56% 22% 44%
CURITIBA 73% 13% 56% 58% 14% 42% 59% 16% 41%
FLORIANOPOLIS 78% 33% 35% 74% 25% 38% 66% 25% 36%
FORTALEZA 75% 34% 44% 64% 36% 41% 58% 37% 38%
GOIANIA 85% 18% 53% 59% 18% 46% 56% 19% 41%
JOAO PESSOA 63% 39% 42% 86% 44% 33% 54% 43% 38%
MACAPA 84% 21% 62% 77% 55% 20% 68% 46% 25%
MACEIO 80% 42% 36% 58% 52% 27% 58% 49% 31%
MANAUS 79% 8% 72% 79% 12% 60% 74% 14% 57%
NATAL 50% 30% 47% 58% 31% 47% 60% 33% 42%
PALMAS 83% 81% 4% 73% 70% 12% 68% 54% 18%
PORTO ALEGRE 37% 12% 55% 56% 11% 54% 54% 15% 54%
PORTO VELHO 83% 57% 22% 78% 43% 33% 72% 38% 32%
RECIFE 82% 25% 53% 78% 22% 54% 65% 27% 52%
RIO BRANCO 79% 68% 13% 80% 61% 23% 74% 56% 26%
RIO DE JANEIRO 76% 4% 65% 60% 3% 50% 64% 5% 42%
SALVADOR 71% 31% 45% 76% 30% 43% 54% 36% 38%
SAO LUIS 76% 42% 38% 58% 37% 45% 55% 40% 41%
SAO PAULO 82% 1% 64% 73% 1% 57% 73% 1% 55%
TERESINA 47% 39% 46% 69% 41% 38% 58% 43% 36%
VITORIA 79% 12% 65% 81% 12% 65% 77% 12% 64%
Média 70% 31% 45% 67% 32% 41% 62% 31% 39%
Mediana 76% 30% 47% 67% 31% 42% 58% 34% 40%
Mínimo 37% 1% 4% 44% 1% 12% 51% 1% 18%
Máximo 85% 81% 72% 86% 73% 65% 77% 57% 64%
Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional, base FINBRA, vários anos. Elaboração Própria.
Transferência Constitucional: já descontados os valores para formação do FUNDEF/FUNDEB.

Em 1997, os recursos do FPM representaram 31 pontos percentuais das


transferências constitucionais; em 2010 permaneceu com a mesma participação,
considerando que nesse intervalo tempo, no ano de 2005 ocorreu um aumento da
alíquota na partilha dos recursos com compõem do FPM.
O comportamento da cota parte do ICMS perdeu representatividade, em 1998 a
participação média era de 45 pontos percutais, e em 2010, foi de apenas 39 pontos
percentuais. Já observarmos que essa questão está relacionada, principalmente, com a
queda do valor adicionado, que reduziu o índice de participação das capitais,
comprometendo as capacidades orçamentária e financeira, necessárias para os
compromissos selados no pacto federativo vigente.
Diante das sucessivas reduções das participações das transferências
constitucionais, novos desafios se cristalizaram nos grandes centros, polos provedores
das políticas municipalizadas e sede de regiões metropolitanas.
124
A partir daí a queda da participação das transferências constitucionais tem sido
compensada pela categoria de transferências discricionárias. Entretanto, esses recursos
exigiram contrapartidas de recursos próprios e que interferiram diretamente na
autonomia das capitais para planejar e decidir sobre as questões locais, sobretudo,
quando ficaram impedidas de pleitearem novas operações de crédito.
Ou seja, podemos dizer que as transferências Discricionárias70, são recursos
decorrentes de negociações espontâneas entre os governos superiores e o local,
negociadas caso a caso, com o objetivo específico de financiar projetos e atividades
rigorosamente definidos pelas esferas de governos superiores.
A execução do gasto descentralizado exigiu uma contrapartida de recursos de
fonte própria e prestação de contas específicas. Definiu também, que o governo local
precisa, rigorosamente, seguir as instruções normativas específicas de aplicação dos
dispêndios para cada setor e função. Não há dúvidas quanto a importância desses
recursos para os governos subnacionais.
Porém, a cada dia é preciso entender que o alcance do atual modelo de partilha,
como bem disse Prado (2013), precisa responder uma pergunta relevante dos
desdobramentos do atual pacto: “... para o perfil de encargos que estamos criando, qual
é a distribuição de recursos adequada?”. Esse esforço nos ajudaria no enfretamento dos
conflitos e desajustes entre as receitas e os encargos descentralizados.
Sabemos que somos uma federação composta por regiões e municípios
heterogêneos, e o nível de atividade econômica e social se difere de uma região para
outra, e as transferências intergovernamentais tem a responsabilidade de pactuar com as
necessidades de cada região.
Entretanto, é preciso reconhecer que as transferências discricionárias têm
provocado determinada rigidez na atuação do poder municipal mais autônomo. Arrisco

70
A Secretaria do Tesouro Nacional definiu transferências Discricionárias a partir de três categorias: 1)
as voluntárias são aquelas que efetuam a entrega de recursos para Entes Federativos a título de
cooperação, auxílio ou assistência financeira, que não decorrem de determinação constitucional ou legal,
nem sejam destinados ao Sistema Único de Saúde. Elas exigem a celebração de um instrumento jurídico
entre as partes envolvidas e, regra geral, requerem contrapartida financeira do beneficiário; 2) por
delegação são aquelas efetuadas entre entes federativos ou a consórcios públicos visando a execução
descentralizada de projetos e ações públicas de responsabilidade exclusiva da concedente e exigem a
celebração de um instrumento jurídico entre as partes envolvidas. São aquelas cujo atendimento de
requisitos fiscais pelo beneficiário é dispensado por lei, e normalmente estão relacionadas a programas
essenciais de governo. 3) específicas são aquelas que exigem a celebração de um instrumento jurídico
entre as partes envolvidas, e a sua execução orçamentária tem caráter discricionário, apesar de algumas
delas serem definidas como transferências obrigatórias ou automáticas por intermédio de leis específicas.
Acesso em 10/11/2016, sitio http://www.tesouro.fazenda.gov.br/-/transferencias-discricionarias.
125
a dizer que hoje, as decisões orçamentárias locais estão sendo tomadas por outras esferas
de governos, com interesses que não, necessariamente, respondem às demandas
coletivas locais das 26 capitais.
Dessa forma, as estruturas urbanas mais desenvolvidas e que contabilizaram
maior participação da arrecadação própria no orçamento local, sofreram com o atual
modelo de partilha, que não consideraram o alto custo das políticas municipalizadas, as
externalidades negativas geradas pelo processo da concentração econômica e
populacional, e muito menos o engessamento produzido pelas transferências
discricionárias.
Acredito que parte das dificuldades financeiras dos grandes centros urbanos,
sejam decorrentes desse modelo e dos critérios de partilhas das transferências. Trazer
essas questões para o debate federativo, certamente, contribuiria para a revigoração da
autonomia dos governos subnacionais.

4.2.2.1 Transferência constitucional federal71: FPM72

No meio acadêmico, existe a percepção quanto a necessidade de reformas efetivas do


federalismo brasileiro. Porém, do ponto de vista político, determinadas questões ainda
precisam ser vencidas. Até o momento, desconheço qualquer proposta de mudanças para
corrigir as discrepâncias ocasionadas pelo atual sistema de partilha.
Conforme Coelho (2007), por exemplo, o atual critério de rateio do FPM pouco
cumpriu os ditames constitucionais, de reduzir as desigualdades socioeconômicas entre
municípios. Porque o modelo de distribuição foi baseado apenas na população, um
pressuposto que município pequeno é pobre. Acredito que para corrigir o critério, seria
preciso reconhecer que existe município pequeno e pobre, e município pequeno e rico,
e ambos estão sendo igualmente privilegiados na distribuição atual dos recursos.
Consequentemente, municípios maiores, pobres e ricos, são prejudicados pelo critério
de rateio. O sistema não guardou correspondência com as condições sociais, e não
observou a capacidade de gasto do ente federativo.
Assim, os ganhadores e perdedores não são claramente identificados, o que, em
muito, dificulta o conhecimento do próprio sistema e consequentemente a sua mudança.

71
Definição das Transferências Federais se constitui da soma das rubricas das receitas, conforme mostra
o anexo 06, figura 06.
72
Ver Prado (2013) e Coelho (2007).
126
Sabemos apenas, que o sistema privilegia os municípios com menos de cinco mil
habitantes, sendo que muitos não têm escala suficiente para oferecer a maioria dos
serviços públicos.
É razoável lembrar que as transferências intergovernamentais foram introduzidas
no país pela Constituição de 1946. O parágrafo 4º de seu art. 15 estabelecia: § 4º - A
União entregará aos Municípios, excluídos os das Capitais, dez por cento do total que
arrecadar do imposto de que trata o nº IV feita a distribuição em partes iguais e
aplicando-se, pelo menos, metade da importância em benefícios de ordem rural.
E, apenas por meio da Emenda Constitucional n.18 de 1965, a participação dos
municípios das capitais73, entre os beneficiários das transferências do FPM foi assegurada.
Em 1968, o governo central reduziu os 10 pontos percentuais originais das receitas do
fundo para metade. Somente na segunda metade dos anos setenta, a alíquota voltou a
ser ampliada, e ganhou novo impulso nos anos 80. Em 2007, por meio da Emenda
Constitucional n.55, conquistou 23,5 pontos percentuais da arrecadação total do IR e
IPI.
Cumpre lembrar que na trajetória do FPM, durante o período militar, os
municípios eram obrigados a comprometerem 50% dos recursos recebidos com despesas
de capital. Porém, o artigo 160 da CF/88, veda a retenção ou qualquer restrição à entrega
e ao emprego dos recursos, salvo para o pagamento de dívidas para com a União. Dessa
forma, a vinculação dos recursos do FPM, constitucionalmente foi vedada, exceto com as
vinculações da educação e saúde.
Quanto ao critério de rateio dos recursos, nenhuma mudança foi capaz de atender
a necessidade de equalizar um valor mínimo de recursos, que valorizasse os municípios
menos populosos, mas que também considerasse o grau de desenvolvimento e a
capacidade econômica de cada um. Seria oportuno refletir essa questão, necessária para
atenuar as assimetrias per capita geradas a partir do critério aplicado.
Conforme já observamos, a participação das capitais corresponde a 10% do
conjunto dos recursos do FPM. O rateio se realiza entre as capitais conforme a
população e o inverso da renda per capita do respectivo Estado que pertence.

73
"Art. 21. Do produto da arrecadação dos impostos a que se referem o artigo 8º, nº II, e o art.
11, 80% (oitenta por cento) constituem receita da União e o restante distribuir-se-á à razão
de 10% (dez por cento) ao Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal, e 10% (dez
por cento) ao Fundo de Participação dos Municípios.
127
Porém, segundo Coelho (2007), o valor recebido pelo município não é
proporcional a sua população. Por exemplo, no FPM - Interior, as populações
dos respectivos municípios são enquadradas em faixas, que privilegiam municípios
menores. A cada faixa corresponde um determinado coeficiente de participação que
define a parcela de recursos que o município tem direito.
O coeficiente de participação mínimo é de 0,6, que participam todos municípios
que têm população inferior a 10.088 habitantes. Por outro lado, o coeficiente
máximo é 4, com ele participam todos os municípios que têm população superior
a 156.216 habitantes.
Uma vez estabelecidos os coeficientes de participação de cada município, estes
são somados, e a participação de cada município será determinada pela relação entre o
seu coeficiente individual e a soma dos coeficientes. Quando um município é
emancipado, os coeficientes individuais de todos os outros municípios permanecem
os mesmos, no entanto, como o total dos coeficientes aumentou, a participação
percentual de cada município é reduzida.
A Lei Complementar n.62/1989 estabeleceu que a partir de 1990, as alterações
dos percentuais de participação, em decorrência da criação de novos municípios,
deveriam se limitar àqueles municípios pertencentes ao Estado em que foi criado o
município. Até então, quando era criado um município, todos os outros municípios do
país tinham sua participação percentual reduzida, devido ao aumento da soma dos
coeficientes.
E, para satisfazer o estipulado pela Lei, o Tribunal de Contas da União dividiu os
recursos do FPM entre os Estados brasileiros. Para fixar a parte que caberia aos
municípios de cada Estado, utilizou como parâmetro a soma dos coeficientes dos
municípios de cada Estado vigente no final da década de 80. Ou seja, para satisfazer a
Lei Complementar n.62/89, o TCU congelou o percentual que tinha cada município, de
cada Estado da Federação, no total de recursos do FPM.
Coelho (2007) observou que o congelamento das faixas de população, deveria ser
atualizado a cada censo, a partir das mudanças na demografia, buscando estancar a
perda de recursos de municípios que tiveram seus coeficientes congelados, e os
coeficientes fixados por limites de faixas diferentes para municípios novos ou antigos.
Enfim, se o sistema tinha alguma racionalidade, ela foi perdida pela atual
legislação. A Lei Complementar n.91/97 tentou restabelecer critérios de distribuição
válidos para todos os municípios.
128
Ou seja, para 1998 foram mantidos os coeficientes de 1997; e, entre 1999 e 2002,
os coeficientes de 1997 eram comparados àqueles determinados pelo critério padrão,
se superior àquele estabelecido pelo critério padrão, o município permanecia com uma
parcela da diferença, o restante (resíduo) era redistribuído entre os municípios do Estado
que possuíam coeficientes de 1997 inferiores ou iguais ao padrão. Essa parcela foi se
reduzindo de forma que em 2003, todos os municípios teriam sua participação
estabelecida conforme o critério padrão.
A Lei Complementar n.106/2001 manteve a sistemática, mas ampliou o prazo de
adequação até 2007. Ou seja, em 2008 não haveria mais resíduo a ser distribuído. Para
o ano de 2005, o resíduo foi de 70%, ou seja, os municípios que apresentaram
coeficiente de participação inferior ao de 1997 permaneceram com 30% da diferença.
A sistemática foi aplicada na distribuição dos recursos dos três grupos do FPM: Capital,
Reserva e Interior.
Assim, de acordo com as regras, para se distribuir os recursos do FPM entre os
municípios do interior (exceto recursos da reserva), primeiro se repartem os
recursos entre os conjuntos de municípios de cada Estado, de acordo com a Resolução
do TCU n.242/90. E, no âmbito de cada Estado aplicam-se os coeficientes dos
municípios, calculado os resíduos e estes são redistribuídos entre os municípios do
próprio Estado.
Consequentemente, municípios com o mesmo coeficiente de participação, e com
mesma população, poderão ter direito a frações diferentes dos recursos do Fundo,
conforme a participação de seu Estado de origem no FPM - Interior.
Nos Estados em que nos últimos 15 anos foram criados diversos municípios ou
que apresentaram crescimento populacional significativo, o coeficiente de participação se
desvalorizou. Prado, ao analisar o FPM chama atenção aos objetivos de sua criação: "É
muito importante ressaltar o pressuposto básico que orientou o FPM desde a sua origem:
municípios pequenos teriam por princípio, menor capacidade de arrecadação”.
Assim, o fundo tinha um caráter de "renda mínima" fiscal para compensar a
limitação das bases próprias das pequenas localidades. A partir da criação de municípios
após a Constituição, aliada a sucessivas Leis Complementares buscando a conservação
da parcela de recursos do FPM de certos municípios e Estados, a renda mínima para
pequenos municípios variou significativamente entre os municípios de diferentes
Unidades da Federação.
De acordo com a Constituição Federal, os critérios de rateio do FPM tiveram como
129
objetivo a promoção do equilíbrio socioeconômico entre Municípios. Entretanto, com
os critérios atuais esse preceito constitucional não vem sendo cumprido. Há
populações com alto nível de desenvolvimento humano que recebem mais recursos
per capita do FPM, do que populações com níveis de desenvolvimento humano bem
inferiores.
Ao analisar os critérios de rateio do FPM, considerando os valores per capita,
por exemplo, o menor município do país, Borá sediado no Estado São Paulo, possui
818 habitantes. Enquanto o município de Tapiraí, também sediado no Estado de São
Paulo, com 10.025 habitantes recebeu de acordo com as regras do FPM - ambos com
participação no coeficiente de 0,6, o mesmo valor de FPM. Ambos, no ano de 2005,
R$ 2.697.271,41 (dois milhões, seiscentos e noventa e sete mil, duzentos e setenta e um
reais). Portanto, o município de Borá apurou uma receita disponível de FPM de R$ 3.298
per capita, enquanto o de Tapiraí, contou apenas com R$ 269 per capita.
Um caso emblemático da distorção provocada pela importância do FPM na
estrutura orçamentária das capitais, conforme mostrou a tabela 15, se refere a cidade
mais populosa da federação, responsável pelas maiores e mais complexas demandas
sociais e de infraestrutura, contou com apenas 1 ponto percentual de FPM nas
transferências constitucionais. Enquanto a representatividade média para as 26 capitais
alcançou 29 pontos percentuais, e a participação máxima do FPM foi de 57 pontos
percentuais no ano de 2010.
Para Palmas, a capital com menor população, a participação do FPM alcançou 52
pontos percentuais do total das transferências constitucionais. Situação singular e que
confirmar a assimetria dos recursos constitucionais partilhados, um antagonismo para a
revigoração das relações federativas, e para própria municipalização.
Ou seja, os municípios beneficiados pelos critérios de partilha do FPM acabaram
usufruindo de mais autonomia na alocação dos recursos para o atendimento das políticas
locais, quando comparados com cidades que desempenharam maior esforço tributário
próprio, e registaram as maiores demandas sociais, por serem principias polos
provedores das políticas descentralizadas dos programas nacionais.
Diante dessas assimetrias, Prado (2013) acredita que o sistema pode ser
considerado precário e ineficiente desde sua concepção, quando não havia bases
estatísticas fiscais que permitissem uma distribuição mais equânime.
Atualmente, padecemos de uma consciência federativa sobre a necessidade de
construirmos um sistema de equalização dinâmico, frente à desfiguração que o sistema
130
reproduziu, transformando-se num simples compartilhamento estático, onde a
participação de cada governo é fixa e as modificações no grau relativo de
desenvolvimento econômico não se refletem na distribuição dos recursos.
Permanecer com a aplicação do critério meramente populacional, só faria sentido
caso a receita própria dos municípios fosse aproximadamente proporcional ao seu
tamanho, ou seja, os pequenos, necessariamente, fossem os mais pobres.
Contudo, após o próprio movimento da guerra fiscal e da desindustrialização do
país, a realidade não mais atende a essa hipótese. Por exemplo, as cidades dormitórios
que concentram alta densidade populacional, enorme demanda por serviços e uma
atividade econômica relativamente baixa, são prejudicadas pelo critério de partilha e
recebem menor recursos per capita.
Circunstância que tende a direcionar parte da demanda não atendida nas cidades
dormitórios, para os municípios sedes de regiões metropolitanas, face à precária
estrutura que as cidades dormitórios oferecem.
Enquanto que, as pequenas localidades que receberam uma empresa ou indústria,
além de serem contempladas com a metodologia do FPM, geraram valores adicionados,
e, portanto, tiveram maior participação na distribuição da Cota-parte de ICMS e dos
royalties.
Nesse sentido, acredito que seria razoável no mínimo ponderar na fórmula do
critério de distribuição dos recursos do FPM, e considerar que os municípios
responsáveis pelos mais complexos problemas sociais e de infraestrutura recebessem
algum peso relativo no rateio dos recursos per capita.
Vale lembrar que, para as premissas da descentralização dos gastos, era
considerado a necessidade de o recurso transferido constitucionalmente ter correlação
com o grau da descentralização, dado o custo da política e tamanho populacional.
Dessa forma, enquanto houver imobilidade nos instrumentos de partilha, fica
impossível pensarmos em avançar na equalização de recursos per capita a partir do atual
arranjo federativo.
Acredito que ao menos deveríamos lutar para legitimar esse debate junto à
sociedade sobre a disposição atual dos recursos próprios e constitucionais, fundamentais
para o financiamento da oferta das políticas públicas de responsabilidades comuns e
exclusivas dos centros urbanos.
131
74
4.2.2.2 Transferência constitucional estadual : cota parte do ICMS

Com relação às transferências constitucionais estaduais, os governos estaduais e


o distrito federal têm competência para instituir e cobrar o ICMS e IPVA, para depois
partilhar com os municípios. Nesse item, abordaremos apenas o Imposto sobre
Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte
Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), dada a importância da
partilha da cota parte do ICMS na estrutura orçamentária das capitais.
O artigo 158 da Constituição Federal definiu que o critério de partilha da
distribuição decorrente da arrecadação do ICMS, deveria alocar 25 pontos percentuais
aos orçamentos municipais de cada estado que o arrecadou, de acordo com os critérios
definidos em cada legislação estadual. E ficou estabelecido que no mínimo 75 pontos
percentuais deveriam corresponder ao valor adicionado75 que cada município agregou
em seus territórios.
Sabemos que a metodologia para transferir os valores tinha o objetivo de
compensar municípios com maior capacidade de geração de riqueza no âmbito
municipal. “[...] a lógica preponderante desta transferência é a de premiar os municípios
economicamente mais bem-sucedidos” (ABRUCIO; COUTO: 1996).
Diferentemente do FPM, a cota parte do ICMS não tem a função de distribuir
renda entre as regiões menos consolidadas, e sim assegurar o financiamento das ações
necessárias para o desenvolvimento econômico e social dos centros que mais dinâmicos.
Nesse caso, municípios com maior atividade produtiva agregam valor à produção e
alcançam maior participação no rateio.
Como já abordado, a partir do processo de desindustrialização nacional e da
guerra fiscal, as indústrias deixaram as regiões metropolitanas para se instalarem em
outras localidades do interior e ou outros estados, movimento que acarretou sucessivas
perdas na apuração do valor adicionado. Realidade que foi agravada a partir dos efeitos
da crise econômica de 2008. Conforme informações disponibilizadas na tabela 16,
durante o período de 1995-2010, houve queda no índice de participação da Cota do
ICMS nos municípios mais populosos do País.

74
Definição das Transferências Estaduais se constitui da soma das rubricas das receitas, conforme
mostra o anexo 06, figura 08.
75 A Lei Complementar federal nº 63, de 1990, conceituou o valor adicionado como o valor de saídas
menos entradas de mercadorias, mais as prestações de serviços do ICMS.
132
A análise do índice de participação foi realizada apenas para o primeiro e último
ano do período de estudo da pesquisa, 1995 e 2010. A situação apurada em 14 capitais
da amostra evidenciou que ocorreu uma variação negativa em todos os casos analisados.
Observo que, a informação não estava disponível no site dos demais estados e capitais.
Para mais da metade dos municípios capitais ocorreu queda do índice de
participação, com destaque para as mais populosas e abarrotadas de demandas e
profundas transformações sócio espaciais. Ou seja, esses municípios tiveram sua
capacidade de investimento per capita reduzida.

Tabela 16 - Índice de Participação na Cota parte do ICMS de 14 capitais, anos:


1995 e 2010
Indice de Participação ICMS Variação
Municípios
1995 2010 2010/1995
BELEM 39,27 20,52 -48%
BELO HORIZONTE 10,65266812 9,9141559 -7%
CUIABA 18,144163 14,082586 -22%
CURITIBA 18,23651754 13,5176174 -26%
FLORIANOPOLIS 3,84621 3,8039682 -1%
FORTALEZA 45,053353 39,111144 -13%
GOIANIA 27,2476889 17,4228562 -36%
MACEIO 32,8332 31,3988 -4%
MANAUS 65,00030008 62,09362 -4%
PORTO ALEGRE 13,29931 11,46167 -14%
RIO DE JANEIRO 41,179 28,791 -30%
SALVADOR 19,25811 15,5023098 -20%
SAO PAULO 25,68833293 22,97886019 -11%
VITORIA 22,534 20,573 -9%
Fontes: Diversas Secretaria da Fazenda Estadual e Diário
Oficial dos Municípios da amostra, anos: 1995 e 2010

Para melhor compreender o impacto da queda do índice de participação do


ICMS, as informações da tabela 15 mostraram que, em 2010, a cota parte do ICMS
correspondia em média a 39 pontos percentuais das transferências constitucionais, já
descontados os valores das deduções realizadas para formação do FUNDEB. Enquanto
que, em 1997, a participação da cota parte do ICMS para metade dos municípios, teve
participação de 45 pontos percentuais nas transferências correntes.
Resultado que ajuda a interpretar a assimetria per capita, por exemplo, entre a
cidade de Salvador, município populoso, com mais de 2,6 milhões de habitantes,
população oito vezes maior que a cidade de Vitória, pouco populosa. Ou seja, a capital
133
baiana desempenhou uma capacidade de investimento onze vezes menor quando
comparada com a capital capixaba. Assimetria reforçada pelo próprio critério do índice
de participação, quando 75 pontos percentuais da formula devem corresponder apenas
ao valor adicionado da econômica local.
Metodologia que desconsidera as transformações sócio econômicas ocorridas a
partir dos anos 90, a dinâmica que agregava valor adicionado nas capitais, foi substituída
por uma dinâmica de serviços que praticamente não é considerada como critério da
formula que distribui os recursos da cota parte do ICMS.
Dessa forma, seria razoável considerar na formula de rateio, não apenas o valor
agregado, e sim a importância da circulação dos serviços realizados na atividade
econômica local. De alguma forma, essa variável sustentaria a necessidade de recursos
para custear o financiamento da municipalização dos principais polos provedores das
políticas públicas do País.
Essa questão precisa de atenção na agenda federativa, não é possível mais
ignorar a metodologia de partilha dos recursos da Cota parte do ICMS. O atual critério
não responde às expectativas, enquanto instrumento principal para selar o pacto
federativo. Lembrando que a transferência constitucional do ICMS é de livre alocação,
descontado os percentuais para aplicação mínima da saúde, educação e dívida pública.
Sabemos que outras questões econômicas têm responsabilidade no atual
desequilíbrio fiscal, porém, não se pode mais ignorar os efeitos acometidos pelo atual
critério de distribuição da cota-parte do ICMS, para as principais regiões metropolitanas
do País.

4.2.2.3 Transferências Discricionárias:

José Roberto Afonso (2004) observou que, ao longo das últimas décadas, as
transferências de recursos de natureza discricionária tiveram papel de quase verdadeiras
minirreformas tributárias. Sem desrespeitar a autonomia formal dos municípios, o
governo superior formulou políticas setoriais para as quais logrou a adesão dos governos
subnacionais, tornando obrigatória a contrapartida financeira para o financiamento das
políticas descentralizadas.
Para Arretche (1999), a adesão dos governos locais para obter os recursos era
decorrente de duas principais oportunidades: assumir a gestão de determinada política
134
pública no processo de descentralização e, de outro, os benefícios fiscais e políticos
derivados daquela adesão.
Prado (2013), chama a atenção para o modelo, que contemplou muito mais os
requisitos nacionais, do que propriamente às necessidades locais e regionais, e acabou
limitando o raio de ação dos que assumiram as políticas descentralizadas os programas
nacionais descentralizados. Foi construído um arranjo onde a execução dos serviços
coube aos governos subnacionais, enquanto que as normas e natureza das atividades e
serviços eram definidas nas esferas superiores.
Sabemos que o governo central arrecada diretamente a maior parte da carga
tributária nacional e os governos subnacionais se apropriam de uma parcela por meio
das transferências constitucionais, e das transferências discricionárias consideradas
fundamentais no atual pacto federativo.
Dessa forma, a evolução da participação das transferências discricionárias no
modelo de descentralização fiscal brasileira, tem desencadeado determinada rigidez na
estrutura orçamentária, a partir das condicionalidades e contrapartidas exigidas,
decorrentes das transferências discricionárias no orçamento municipal.
E, mediante os frequentes atrasos no cronograma dos desembolsos financeiros
das transferências discricionárias, tem sido acarretado um grau de insegurança fiscal
para a execução das ações planejadas no Lei Orçamentária Anual (LOA).
Como bem destacou Pinto (2017), o cumprimento dos pisos em saúde e
educação, os repasses mensais proporcionais à receita efetivamente arrecadada
deveriam ser assegurados, conforme o mesmo rito dos duodécimos, que ampararam a
autonomia financeira do Judiciário, Legislativo e Ministério Público, já que o preceito
fundamental reside na estabilidade e segurança temporal dos repasses de recursos.
Tal entendimento evitaria que a execução orçamentária, por exemplo, do piso
em saúde fosse adiada mediante a adoção de artifícios contábeis no manejo do art. 24,
II e §1º da LC 141/2000.
Ou seja, os governos superiores, simplesmente contabilizam como ações e
serviços públicos de saúde volumoso saldo de empenhos, gerados em novembro e
dezembro do exercício financeiro, e, formalmente depositam na conta específica do
Fundo de Saúde, em 31 de dezembro de cada ano.
Segundo Pinto (2017), é como se fosse uma conta de passagem do reveillon para
cumprir formalmente o ditame legal, para, após a virada do ano, postergarem o
processamento de tais restos a pagar, e remanejarem os recursos do Fundo de Saúde
135
novamente para a Conta Única do Tesouro, e, literalmente frustrarem a efetividade do
piso da saúde.
Esse comportamento, alinhado com algumas instruções normativas que
regulamentaram as transferências discricionárias, em nada contribuíram para a execução
das políticas públicas municipalizadas, de responsabilidade dos principais polos
provedores da política pública.
Ou seja, em muitos momentos os municípios foram obrigados a suprimirem suas
competências exclusivas da execução orçamentária, e financiarem com recursos
próprios o que deveria ser assegurado pelos recursos das transferências discricionárias.
Resultado que no limite compromete os padrões de serviços oferecidos à população.
Outro exemplo, quanto à determinação de que o débito dos recursos
discricionários na conta corrente do poder municipal, deveria ocorrer antes da ordem de
serviço ser gerada. Mediante aos atrasos constantes, e de situações de urgência, essa
exigência acaba sendo descumprida, em algumas situações, impõem-se a necessidade
de devolução dos recursos aos governos superiores.
Vale destacar que outras questões precisam ser cumpridas, conforme a cartilha
do Tribunal de Contas da União (2000), Lei Complementar n. 101/2000, art. 25, e Lei
n. 9.995/2000, art. 35, listadas abaixo, para o recebimento dos recursos discricionários:
1) regularidade na gestão fiscal – que instituiu, regulamentou e arrecadou todos os
tributos previstos nos artigos. 155 e 156 da Constituição, ressalvado o imposto
previsto no art. 156, inciso III – com a redação dada pela Emenda Constitucional
n. 3/1993 – quando comprovada a ausência do fato gerador (Lei Complementar
n. 101/2000, art. 11, parágrafo único, e Lei n. 9.995/2000, art. 35, I);
2) dotação orçamentária – que existe dotação específica (Lei Complementar n.
101/2000, art. 25, I);
3) despesas – que os recursos não serão destinados ao pagamento de despesas com
pessoal ativo, inativo e pensionista, do Estado, Distrito Federal ou Município
(Constituição Federal, art. 167, X, incluído pela Emenda Constitucional n.
19/1998, e Lei Complementar n. 101/2000, art. 25, § 1º, III);
4) quitação – que se acha em dia quanto ao pagamento de tributos, empréstimos e
financiamentos devidos à União (Lei Complementar n. 101/2000, art. 25, § 1º,
IV, a), mediante a apresentação dos seguintes documentos (IN STN n. 01/1997,
art. 3º): - certidão negativa de débitos, fornecida pela Secretaria da Receita
Federal (SRF), pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) do
136
Ministério da Fazenda e pelos correspondentes órgãos estaduais e municipais; -
comprovante de inexistência de débito junto ao INSS, referente aos três meses
anteriores, ou certidão negativa de débito (CND) atualizada, e, na hipótese de
haver débitos renegociados, também a regularidade quanto ao pagamento das
parcelas mensais; - certificado de regularidade de situação (CRS) junto ao
FGTS, fornecido pela Caixa Econômica Federal; - comprovação de regularidade
do PIS/PASEP.
5) contas: que se acha em dia quanto à prestação de contas de recursos
anteriormente recebidos do ente transferidor (Lei Complementar n. 101/2000,
art. 25, § 1º, IV, a);
6) limites constitucionais – que cumpre os limites constitucionais relativos à
educação e à saúde (Lei Complementar n. 101/2000, art. 25, § 1º, IV, b);
7) limites de dívidas – que observa os limites das dívidas consolidada e mobiliária,
de operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, de inscrição em
restos a pagar e de despesa total com pessoal. O Estado, Distrito Federal ou
Município ficará impedido de receber transferências voluntárias, se a respectiva
dívida consolidada ultrapassar o correspondente limite ao final de um
quadrimestre, e uma vez vencido o prazo para retorno da dívida ao limite – até
o término dos três quadrimestres subsequentes – e enquanto perdurar o excesso
(Lei Complementar n. 101/2000, art. 25, § 1º, IV, e art. 31, § 2º);
8) contrapartida – que existe previsão orçamentária de contrapartida, estabelecida
de modo compatível com a capacidade financeira da respectiva unidade da
Federação beneficiada, tendo como limites mínimo e máximo os percentuais
indicados a seguir (Lei Complementar n. 101/2000, art. 25, § 1º, IV, d, e Lei n.
9.995/2000, art. 35, III): Contrapartida dos Municípios: - 5% e 10%, para
Municípios com até 25.000 habitantes; - 10% e 20%, nos demais Municípios
localizados nas áreas da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste –
SUDENE, da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia – SUDAM e
no Centro-Oeste; - 10% e 40%, para as transferências no âmbito do Sistema
Único de Saúde – SUS, excluídos os Municípios relacionados nos itens
anteriores; - 20% e 40%, para os demais. Contrapartida dos Estados e do Distrito
Federal: - 10% e 20%, se localizados nas áreas da SUDENE e da SUDAM e no
Centro-Oeste; - 20% e 40%, para os demais.
137
A sofisticação das exigências discricionárias definidas pelas regulamentações, e
o detalhamento de quais itens poderiam ser financiados, bem como as normas e
contrapartidas a serem adotadas, é justificada pela necessidade de se impor uma gestão
às políticas descentralizadas.
Mesmo reconhecendo a evolução e necessidade de muitas dessas exigências, não
ficou assegurado uma compreensão do padrão mínimo de serviços a serem ofertado à
sociedade por esse modelo, e muito menos ficou definido quais os parâmetros de custos
reais dos serviços descentralizados.
Ou seja, o debate do financiamento das competências concorrentes permaneceu
confuso e complexo, e, de alguma forma, conferiu profunda rigidez orçamentária, e
incertezas quanto à irregularidade dos fluxos financeiros das transferências de recursos
dos governos superiores para os orçamentos municipais. As consequências são
percebidas, mas precisam ser vencidas, pois, certamente fragiliza as relações e
autonomia federativa.
Como bem destacou Prado (2013), é imprescindível uma medida institucional
que colabore para o desenvolvimento da avaliação dos encargos descentralizados, e que
ofereça uma base minimamente técnica para pautar esse debate.
Sabemos que padecemos de estatísticas que poderiam auxiliar na organização de
métodos mais eficazes de partilha, para estabelecer mecanismos periódicos de
avaliação, e que servissem de instrumentos para negociação da partilha dos recursos
vertical e horizontal para realização do custeio e investimento das políticas
descentralizadas.
Há tempos se fala da necessidade de se construir centros de custos para os
orçamentos dos programas nacionais descentralizados, informações que poderiam gerar
parâmetros mais eficazes na partilha dos recursos, pois revelaria claramente a
necessidade de ajustamentos, de acordo com a demografia e o custo das políticas
públicas descentralizadas, apontando a necessidade de cooperação técnica e financeira
entre as três esferas de governos.
Enquanto nada é feito, as tensões e desequilíbrios fiscais são constantes e
refletem a incapacidade federativa de enfrentar os problemas atuais. Voltamos, então,
ao início da discussão: a descentralização das políticas públicas, e a forte atuação das
imposições fiscais neutralizaram os recursos adicionais conquistados pelo esforço
tributário municipal, a partir da autonomia federativa recebida na Constituição de 1988.
138
A execução orçamentária das 26 capitais, polos provedores das políticas
municipalizadas, apesar da maior participação da receita própria na LOA, permanece
mergulhada numa profunda rigidez orçamentária. E, poucas ações ocorreram no sentido
de assegurar uma cooperação técnica e financeira à luz da municipalização.
A tabela 17, mostra a importância das receitas discricionárias nas transferências
correntes de cada capital. E reforça a hipótese de que as competências comuns aos três
entes federativos, imprimiram uma penhora na estrutura orçamentária local, e
configuraram a atual rigidez orçamentária que suprimiu da agenda local, as
competências constitucionais exclusivas do município.

Tabela 17 Evolução da Participação das Transferências Discricionárias no total


das Transferências Correntes das 26 capitais, em %

Transferências Correntes
População 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
Discricionárias
ARACAJU 587.701 31% 43% 45% 41% 43% 40% 42% 48% 46%
BELEM 1.410.430 40% 44% 47% 44% 47% 47% 45% 49% 49%
BELO HORIZONTE 2.395.785 46% 46% 56% 46% 46% 45% 46% 50% 49%
BOA VISTA 296.959 32% 32% 26% 30% 28% 28% 46% 24% 23%
CAMPO GRANDE 805.397 42% 44% 44% 55% 56% 42% 57% 44% 45%
CUIABA 561.329 36% 36% 39% 36% 38% 40% 43% 45% 44%
CURITIBA 1.776.761 31% 38% 42% 39% 41% 40% 40% 43% 41%
FLORIANOPOLIS 433.158 36% 26% 26% 35% 28% 31% 30% 36% 34%
FORTALEZA 2.500.194 42% 33% 36% 31% 48% 40% 40% 44% 42%
GOIANIA 1.333.767 14% 27% 41% 41% 43% 44% 33% 48% 44%
JOAO PESSOA 742.478 28% 37% 14% 40% 39% 38% 24% 26% 46%
MACAPA 415.554 45% 21% 23% 23% 26% 28% 27% 53% 32%
MACEIO 953.393 48% 42% 42% 38% 37% 37% 38% 42% 42%
MANAUS 1.861.838 36% 20% 21% 17% 20% 27% 21% 27% 26%
NATAL 817.590 46% 33% 42% 39% 36% 38% 42% 43% 40%
PALMAS 242.070 32% 22% 27% 25% 26% 24% 24% 36% 32%
PORTO ALEGRE 1.416.714 36% 44% 44% 43% 46% 46% 44% 47% 46%
PORTO VELHO 442.701 20% 19% 22% 36% 23% 24% 24% 27% 28%
RECIFE 1.555.039 19% 19% 22% 23% 32% 33% 30% 35% 35%
RIO BRANCO 348.354 21% 22% 20% 21% 27% 30% 35% 30% 26%
RIO DE JANEIRO 6.390.290 36% 50% 40% 82% 31% 33% 33% 35% 36%
SALVADOR 2.710.968 5% 22% 24% 26% 52% 44% 43% 48% 46%
SAO LUIS 1.039.610 26% 40% 42% 39% 39% 41% 43% 50% 45%
SAO PAULO 11.376.685 18% 19% 27% 24% 26% 26% 26% 28% 27%
TERESINA 830.231 31% 38% 31% 31% 41% 41% 41% 44% 42%
VITORIA 333.162 18% 17% 19% 18% 20% 19% 21% 23% 23%
Média 1.676.083 31% 32% 33% 36% 36% 36% 36% 39% 38%
Mediana 891.812 32% 33% 33% 36% 38% 38% 39% 43% 42%
Mínimo 242.070 5% 17% 14% 17% 20% 19% 21% 23% 23%
Máximo 11.376.685 48% 50% 56% 82% 56% 47% 57% 53% 49%
Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional, base FINBRA, vários anos. Elaboração Própria
139
Fica a sensação de que as interferências recorrentes e impositivas, representadas
pelas denominadas contrapartidas, contribuíram para erodir a autonomia concedida
constitucionalmente aos governos subnacionais. E o atual arranjo federativo pactuado,
conseguiu assegurar um financiamento cada vez mais regressivo, sob pena de permitir
a omissão dos entes nas suas atribuições e a precarização dos direitos sociais.
Dessa forma, podemos concluir que, ao mesmo tempo em que as 26 capitais
buscaram instrumentos e avanços importantes na arrecadação própria, com ações de
modernização administrativa e tributária76, não podemos afirmar que a evolução da
arrecadação de recursos próprios pudesse ser traduzida como sinônimo de autonomia
federativa para planejar e decidir sobre as diretrizes das políticas locais.
A prática, nos tem mostrado que as características dos mecanismos para transferir
recursos atuaram no sentido de restringir as possibilidades de mudança do status quo,
operando por meio das relações vertical e horizontal, uma contramarcha à ideia central
do federalismo fiscal e do diálogo federativo.
Nas duas últimas décadas, quase 70 emendas constitucionais, por meio da
regulamentação de programas nacionais foram editadas, com interferências diretas no
planejamento e execução das ações no âmbito municipal. A sensação é de que a cada
execução orçamentária, os orçamentos municipais mais autônomos do País, não têm
condições e nem perspectiva para enfrentarem questões cotidianas.
Dizer que a autonomia assegurada aos governos subnacionais no texto
constitucional de 1988 tem sido diluída ao longo das últimas décadas, não nos parece
um exagero, apesar do discurso predominante afirmar que a federação brasileira é uma
das nações com autonomia subnacional mais profunda do mundo.

76
Implantação de cursos voltados para a atualização dos conhecimentos dos servidores públicos;
atualização das legislações tributária e urbanística; modernizações nos sistemas de lançamento e
arrecadação das receitas; implantação da nota fiscal eletrônica municipal; gestão na execução do
orçamento; atualização dos cadastros de compras e folha de pagamento; gestão de controle da folha de
pagamentos; gestão dos almoxarifados e dos contratos, a arrecadação própria foi ampliada.
140
4.2.3.3 Financiamento da Saúde e da Educação

4.2.3.3.1 Saúde

As 26 capitais vêm acumulando papel estratégico no conjunto da oferta de


serviços das políticas descentralizadas de saúde, fundamental para ações mais
humanizada que compõem o Sistema Único de Saúde (SUS).
No entanto, a realização de novos investimentos voltados para a ampliação da
infraestrutura local, enquanto sede de região metropolitana e polos regionais das
principais ações, decorrentes da própria política centralizadora dos antigos Institutos de
Aposentadorias e Pensões (IAPs) do Estado meritocrático brasileiro, tem se tornado um
desafio.
A bem da verdade, raramente, os recursos transferidos para as ações do SUS têm
sido suficientes para financiar as políticas públicas de saúde, pois, o setor encontra-se
com o atendimento sobrecarregado e limitado na maioria das capitais.
As informações da tabela 18 mostraram que ocorreu aumento expressivo dos
recursos descentralizados para a saúde. Em 1998, a participação da receita do SUS no
orçamento corrente, representava 6,6 pontos percentuais. Em 2010, representou 12,62
pontos percentuais do total das transferências correntes.
Aumento que não deve ser traduzido, necessariamente, em recursos per capita
para a prestação dos serviços do setor da saúde. Isso porque, a partir de 2000, a
transferência de recurso SUS ganhou uma fase intermediária, e parte substancial do
aumento das transferências federais para os governos municipais, tem sido apenas
resultado da mudança do ciclo de pagamento aos prestadores privados dos serviços do
SUS.
Ou seja, os recursos do SUS até o ano de 2000, eram transferidos diretamente do
governo federal aos provedores de serviços, incluindo aí os governos subnacionais, mas
basicamente para os prestadores privados. Após esse período, os municípios passaram
a receber os recursos do governo federal para depois transferir para os provedores finais.
Pode se dizer que, mesmo diante do aumento dos recursos do SUS no orçamento
das capitais, praticamente, todas operam com uma estrutura repleta de lacunas, desde a
necessidade de novos investimentos; recursos para a manutenção dos espaços de pronto
atendimento; falta de mão de obra; medicamentos em geral; aparelhos ultrapassados e
outros quebrados; uma realidade que gera um prejuízo para humanização do setor.
141
Tabela 18 - Participação dos principais programas nacionais: FUNDEF/FUNDEB
e SUS no orçamento corrente das 26 capitais, anos: 1998; 2002; 2006; 2010-em %
1998 2002 2006 2010 1998 2002 2006 2010
Municípios FUNDEF FUNDEF FUNDEF FUNDEB
UF População SUS/Rec. SUS/Rec. SUS/Rec. SUS/Rec.
Capitais Líquido/Rec Líquido/Re Líquido/Rec Líquido/Rec
Corrente Corrente Corrente Corrente
Corrente c Corrente Corrente Corrente
ARACAJU SE 571.149 -6% 0,00% 2% -0,14% 0,00% 0% 21% 21%
BELEM PA 1.393.399 2% -2,61% -2% -3,52% 19,84% 22% 20% 17%
BELO HORIZONTE MG 2.375.151 2% 2,51% 2% 1,57% 23,09% 18% 18% 18%
BOA VISTA RR 284.313 4% -6,68% -3% 2,33% 0,00% 10% 5% 5%
CAMPO GRANDE MS 786.797 4% 6,03% -1% 7,38% 0,00% 18% 19% 18%
CUIABA MT 551.098 4% 10,15% 3% 3,34% 22,26% 16% 17% 20%
CURITIBA PR 1.751.907 0% 1,27% 2% 1,71% 0,00% 11% 12% 11%
FLORIANOPOLIS SC 421.240 0% 0,69% 1% 1,81% 0,41% 3% 4% 7%
FORTALEZA CE 2.452.185 1% 0,80% -5% 0,68% 4,51% 9% 15% 16%
GOIANIA GO 1.302.001 -6% 6,45% 4% 2,84% 0,00% 0% 16% 16%
JOAO PESSOA PB 723.515 1,91% 2% -0,08% 0% 21% 22%
MACAPA AP 398.204 0% 2,00% 4% 4,38% 0,00% 7% 8% 8%
MACEIO AL 932.748 1% -1,32% -1% -1,07% 16,06% 20% 17% 17%
MANAUS AM 1.802.014 -5% 3,80% 5% 3,63% 0,72% 4% 3% 4%
NATAL RN 803.739 0% -0,26% 1% 0,35% 19,41% 14% 14% 13%
PALMAS TO 228.332 -11% -0,95% 0% 3,70% 7,34% 6% 8% 7%
PORTO ALEGRE RS 1.409.351 1% 0,24% 1% -0,89% 26,44% 20% 14% 13%
PORTO VELHO RO 428.527 -0,01% 4% 3,68% 6% 6% 7%
RECIFE PE 1.537.704 -6% 0,00% 0% -2,06% 9,29% 9% 9% 10%
RIO BRANCO AC 336.038 2% -0,31% -3% -1,37% 2,40% 3% 4% 5%
RIO DE JANEIRO RJ 6.320.446 3% 5,92% 6% 6,38% 0,00% 10% 3% 8%
SALVADOR BA 2.675.656 -5% -0,44% -4% -0,53% 0,00% 0% 15% 15%
SAO LUIS MA 1.014.837 2% -3,14% -2% -2,03% 0,00% 0% 16% 15%
SAO PAULO SP 11.253.503 2% 3,00% 3% 3,56% 0,00% 2% 5% 4%
TERESINA PI 814.230 -3% -0,01% 0% -0,03% 0,00% 0% 23% 18%
VITORIA ES 327.801 -1% 0,31% 1% 0,15% 0,00% 2% 2% 3%
Média 1.702.723 -0,54% 1,16% 0,77% 1,42% 6,60% 8,29% 12,54% 12,62%
Funções Mediana 932.748 0,65% 0,24% 0,84% 1,57% 0,41% 6,93% 14,25% 13,38%
Estastísticas Mínimo 228.332 -11,06% -6,68% -5,25% -3,52% 0,00% 0,00% 2,84% 3,75%
Máximo 11.253.503 4,22% 10,15% 6,31% 7,38% 26,44% 21,72% 23,42% 22,09%
Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional, base Finbra, vários anos. Elaboração Própria.
OBS: FUNDEF/FUNDEB Líquido: Receita Recebida-Receitas enviados para formação do fundo.
João Pessoa e Porto Velho, ano 1998: valores não disponíveis no banco de dados FINBRA.

E, como bem observou José Saraiva Felipe (2011:32-33), ex-ministro da Saúde


“(...) os municípios já estão sobrecarregados e muitos gastam mais que os 15% da
receita, como define a EC 29”. Mas ressalta que a maioria dos Estados, em levantamento
feito há cerca de dois anos, não investiu nem 6% do orçamento próprio, em vez dos 12%
definidos pela EC 29, e ainda ocorreu maquiagem na prestação de contas.
Sabemos que a participação municipal no financiamento da saúde é crescente.
Nas palavras de Nardi (2011:33-34), presidente do Conselho Nacional de Secretarias
Municipais de Saúde (CONASEMS):
(...) é no município que a saúde acontece e é ele que mais está investindo. O
Sistema de Informação de Orçamento Público em Saúde (Siops) informa que
mais de 95% dos municípios cumprem as regras da EC29 e, desses, grande
parte aplica até mais, média de 20% a 22% na saúde, quando a EC estabelece
15% das receitas. Por isso, não é difícil afirmar que a saúde ocorre na esfera
142
municipal. É na porta do prefeito que o paciente bate, na do secretário
municipal de saúde e na porta da unidade básica.

Os administradores municipais normalmente escolhem sacrificar alguma ação


de outro setor para suplementar o orçamento da saúde, uma necessidade para inclusive
conseguir fixar minimamente os médicos na carreira pública.
Para Pinto (2017), a União quando descentralizou e gerou compromissos
federativos aos entes subnacionais, deveria ter definido melhor as relações federativas
necessárias para pactuação do modelo. Ainda hoje, não conseguimos formular com
segurança jurídica e clareza, os critérios de rateio e as responsabilidades de cada ente a
que se refere o art. 198, §3º, II da Constituição de 1988 e o art. 17 da Lei Complementar
nº 141/2012.
As lacunas normativas, e o contexto de regressividade na participação federal no
volume total de recursos públicos investidos no SUS, remonta à diferença de critério
para a União em seu piso de custeio, tal como foi estabelecida pela Emenda
Constitucional 29/2000, e mais recente agravadas pelas Emendas 86/2015 e 95/2016.
Segundo Pinto (2017), o piso da saúde não pode ser sujeito a contingenciamento
(art. 9º, §2º da LRF e art. 28 da LC 141/2012), ainda que sob a falseada sujeição à
programação financeira (art. 8º da LRF).
Porém, a União desde o advento da EC 29/2000, nos seus decretos de
programação financeira, por meio da previsão de limites de pagamento para as despesas
em ações e serviços públicos de saúde, que mesmo considerando os restos a pagar, os
valores transferidos são substancialmente inferiores aos limites de empenho.
Atuação que justifica o subfinanciamento da saúde pelo Governo Federal, que
nunca teve seu regime de gasto mínimo em ações e serviços públicos de saúde fixado
da mesma forma que o dos entes subnacionais.
O mesmo raciocínio se aplica a alguns dos estados que não cumpriram o
pactuado na Comissão Intergestores Bipartite (CIB). Tal cenário, tem acarretado uma
sobrecarga no orçamento próprio do município, retratado na tabela 19. O resultado
reflete também, as frequentes decisões judiciais que efetivam o direito à saúde, de ações
que não, necessariamente, estejam planejadas como uma atividade do SUS.
143
Tabela 19 - Fonte de financiamento da Saúde nas 26 capitais, média do período:
2002- 2010, em %
Financiamento da Saúde
Média 2002/2010
Municípios
SUS e Convênios saúde:
26 Capitais
Custeio + Investimentos; Receita Própria
Fundo de Saúde Estado

ARACAJU 62% 38%


BELEM 61% 39%
BELO HORIZONTE 55% 45%
BOA VISTA 30% 70%
CAMPO GRANDE 56% 44%
CUIABA 65% 35%
CURITIBA 57% 43%
FLORIANOPOLIS 28% 72%
FORTALEZA 46% 54%
GOIANIA 54% 46%
JOAO PESSOA 48% 52%
MACAPA 42% 58%
MACEIO 63% 37%
MANAUS 22% 78%
NATAL 58% 42%
PALMAS 38% 62%
PORTO ALEGRE 55% 45%
PORTO VELHO 33% 67%
RECIFE 42% 58%
RIO BRANCO 29% 71%
RIO DE JANEIRO 40% 60%
SALVADOR 51% 49%
SAO LUIS 49% 51%
SAO PAULO 23% 77%
TERESINA 49% 51%
VITORIA 13% 87%
Média 45% 55%
Mediana 48% 52%
Mínimo 13% 35%
Máximo 65% 87%
Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional, base de dados FINBRA,
vários anos. Elaboração Própria.

As informações fortalecem a hipótese de que a composição do financiamento da


saúde nas capitais, tem sido sustentada com recursos próprios municipais. Ou seja, uma
competência comum aos três entes de governo, para o período de 2002 a 2010, a
participação média dos recursos próprios municipal no orçamento da saúde representou
55 pontos percentuais. Enquanto que as transferências do governo federal e estadual
144
juntas, financiaram apenas 45 pontos percentuais dos recursos destinados ao setor de
saúde nas 26 capitais.
Segundo Pinto (2017), o desafio consiste em controlar as omissões e ações do
Poder Público que implicaram em uma fragilidade orgânica para o SUS, e o seu
desfinanciamento paulatino promovido pelo federalismo brasileiro. Carecemos de uma
arguição que questione o “Estado de coisas Inconstitucionais” na política pública de
saúde do País.
Infelizmente, esse cenário não nos permite conjecturar que estamos diante de
políticas públicas de saúde eficazes e eficientes nas capitais. Cabe observar que, parte
significativa do orçamento da saúde tem sido direcionada para o elemento de despesa
“serviços de terceiros - pessoa jurídica”, com praticamente nenhuma política de gestão
de contrato e controle de qualidade da política terceirizada. Mais à frente, veremos que
esse foi o elemento da despesa que mais cresceu no período analisado.
Acredito que a falta de gestão e fiscalização dos contratos, além da insuficiente
ou até ausência de cooperação técnica e financeira dos governos superiores, não cumpre
uma oportunidade para um arranjo federativo harmônico, com políticas públicas
humanizadas.
Segundo Pinto (2017), o problema é que o pactuado, do ponto de vista da rede de
serviços já contratados no âmbito do SUS, dos repasses fundo-a-fundo e dos programas
para fins de transferências voluntárias, tem excedido, em valores monetários, o piso
federal estritamente contábil-formal.
E, o Governo Federal tem se negado historicamente a cumprir as regras já
estabelecidas de incentivos, tem deixado de fazer correção monetária dos valores de
referência dos programas, não apenas da tabela SUS, a própria falta dos incentivos e
programas pactuados pela União com os entes subnacionais e com a rede de prestadores
de serviços credenciados ao SUS, decorre em impasses para o custeio.
Dessa forma, o desequilíbrio federativo na política pública de saúde tem se
acirrado, seja por meio da redução proporcional da participação federal no custeio do
SUS, seja por força do adiamento – para formação falseada de resultado primário –
orquestrada pelo Ministério da Saúde. De um modo geral, podemos dizer que os
repasses fundo-a-fundo aos Estados e Municípios chegam atrasados e são insuficientes.
É preciso avançar no controle das omissões, para que o repasse de recursos seja
suficiente e efetivo, necessário para cumprir as atribuições de cada ente no plano
setorial. Ou seja, enquanto os efeitos aplicados pelo art. 160, parágrafo único da
145
Constituição permite a retenção de transferências obrigatórias para assegurar quitação
da dívida, nada é assegurado para os atrasos do piso da saúde.
Enquanto que, o descumprimento do piso da saúde continuar a se cumprir com até
12 meses de inadimplência, com risco de descontinuidade do serviço público, sem que
haja qualquer garantia ou mecanismo de responsabilidade que assegure a manutenção
dos serviços pactuados federativamente e contratados na rede SUS, todos continuaremos
sendo punidos pela omissão de responsabilidade do Estado brasileiro.
Tratamento bem diferente foi assegurado para o inciso que deixou claro que, a
prioridade orçamentária operaria no sentido de evitar a inadimplência do pagamento da
parcela da dívida pública, e que poderia até ocorrer retenções de transferências
constitucionais para os devidos fins. Ou seja, imediatamente ao mês posterior a
inadimplência, a União deveria reter os recursos de forma subsidiária à responsabilidade
que assumiu, como garantidora do acordo de renegociação das dívidas subnacionais
junto às instituições internacionais.
Postura bastante diferente para administrar o passivo da saúde, a União tem
permanecido à sombra da omissão, mesmo com as suas responsabilidades designadas
constitucionalmente, se mostra indiferente com as urgências para uma coesão social.

4.2.3.3.2 Educação

Por meio da Emenda Complementar n. 14, de 12 de setembro de 1996, ficou


estabelecido que o financiamento da educação do País seria amparado pelos recursos do
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do
Magistério (Fundef), contabilizado como uma transferência multigovernamental. Ao
mesmo tempo, foi definido que cada município deveria contribuir com 15 pontos
percentuais de algumas receitas para compor o fundo.
A distribuição dos recursos, definido o piso mínimo por estudante matriculado,
ocorreu de acordo com o tamanho da rede. Cada governo estadual e municipal recebeu
do fundo a quantidade de recursos correspondente ao número de matrículas pelas quais
respondia, multiplicado pelo valor médio apurado para cada estado.
Desse modo, a partir de 1998, a distribuição de recursos por número de
matrícula, implantou uma nova repartição de atribuições aos entes federados que
aderiram à municipalização da escolarização obrigatória.
146
O caráter equalizador do fundo ocorreu apenas no âmbito intra-estadual, porque
o nível médio de gasto per capita por aluno permaneceu diferenciado em todo o País.
A legislação assegurou que a União deveria complementar a dotação para
aqueles estados cuja dotação per capita ficasse abaixo da média nacional, porém,
imprecisões na formulação da lei federal, permitiram uma interpretação por parte da
União que acabou transferindo um volume muito reduzido de recursos.
Podemos dizer que, diferentemente dos objetivos proclamados da
universalização da matrícula e da valorização do professor, os gestores públicos que
municipalizaram a política passaram a conviver com a necessidade crescente de recursos
para financiar a infraestrutura das políticas municipalizadas.
O processo não foi acompanhado de garantia das condições necessárias para
efetivação da escolarização obrigatória. As condições fiscais e administrativas impostas
aos que municipalizaram a educação não foram consideradas.
Lembrando que as esferas subnacionais, naquele final da década dos 90,
assinaram o contrato da renegociação da dívida pública e assumiram diversas restrições
fiscais, situação no mínimo contraditória às exigências da municipalização do ensino,
que requer a ampliação da infraestrutura e o aumento de gastos material de consumo e
com pessoas, limitados pelas regras impostas pela LRF. Cenário perfeito para a
massificação e precarização da política pública educacional.
A partir de 2005, a base77 de cálculo do Fundef foi ampliada e transformado em
Fundeb78. Outros impostos foram agregados e a alíquota de retenção das receitas passou
para 20 pontos percentuais, com o objetivo de enfrentar o déficit da educação infantil
que, historicamente, permanecia negada a maioria das crianças brasileiras.
A participação federal no financiamento da educação infantil passou a ser
obrigatória, a partir da vigência do Fundeb. O montante mínimo deveria ser igual a 10
pontos percentuais dos recursos totais mobilizados pelos governos subnacionais, valor

77
Origem dos recursos do FUNDEB: 20% de cada um dos recursos a seguir: recursos que já integravam
o FUNDEF: 1) Fundo de Participação dos Estados (FPE); 2) Fundo de Participação dos Municípios
(FPM); 3) Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS); 4) Imposto sobre Produtos
Industrializados, proporcional às exportações; e 5) IPI exp Desoneração de Exportações (LC nº 87/96).
Recursos novos: 1) Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCMD); 2) Imposto sobre
Propriedade Veículos Automotores (IPVA); 3) Quota Parte de 50% do Imposto Territorial Rural devida
aos Municípios (ITR); 4) Parcela de 20% do Imposto que a União vier a instituir em razão de sua
competência residual; e 5) Receitas da dívida ativa tributária relativa aos impostos que o compõem, bem
como juros e multas eventualmente incidentes.
78
Vale observar que a Emenda Complementar 53 de 2005, que regulamentou o Fundeb, permitiu incluir
o ensino infantil, que era a principal carência da educação, dentro da conta de aplicação dos 25% da
receita dos impostos municipais.
147
que tem sido utilizado para aumentar os recursos disponíveis per capita aos estados mais
pobres, contribuindo para apurarmos um gasto mínimo per capita nacional maior.
A complementação federal passou a ser compreendida como um instrumento
redistributivo de transferência no âmbito nacional, enquanto o restante dos recursos
mobilizados pelo Fundeb não tinha qualquer efeito para reduzir as diferenças de
capacidade de gasto setorial entre estados.
O objetivo do sistema era apenas equalizar a capacidade de gasto entre os
municípios do mesmo estado, pois, como não ocorriam trocas entre estados, o efeito
relevante do fundo era deslocar receitas entre governos de um mesmo estado.
O saldo das transações líquidas realizadas mostra que, para mais da metade das
26 capitais, os recursos do Fundeb tiveram uma importância pouca expressiva,
sinalizando que as capitais contribuíram para financiar a educação do País,
principalmente por meio do aumento da alíquota de 15 para 20 pontos percentuais das
receitas, que serão deduzidas do orçamento municipal para formação do fundo.
Reconheço que os recursos do Fundeb são primordiais para o financiamento da
educação no País. Entretanto, o atual critério de distribuição dos recursos trouxe
resultados que pouco contribuíram para o financiamento da política educacional nos
municípios mais populosos do País.
Muitas capitais contabilizaram na estrutura orçamentária, participação líquida
negativa dos recursos do Fundeb79. Melhor dizendo, o volume de contribuição de
recursos para a formação do fundo foi maior, quando subtraído do valor recebido por
cada aluno matriculado, mesmo considerando as alterações promovidas em 2005.
Em 2010, a participação média desses recursos em mais da metade das capitais
aumentou, porém, ainda é bastante tímida, representou apenas 1,42 pontos percentuais
do orçamento corrente, conforme dados da tabela 18.
Segundo Prado (2013:238) a equalização plena em sistemas altamente
heterogêneos acaba sendo quase utópica. Não existem bases teóricas sólidas e acabadas
para o assunto, dada a peculiaridade de cada federação, mas, para o autor, a situação
mais provável é que os recursos disponíveis permitam algum grau de redução na
desigualdade.
Além disso, o autor chama atenção para a necessidade de se considerar em um
sistema de equalização, não apenas a capacidade e a necessidade fiscal de cada esfera,

79
A esse respeito, ver Cartilha Tribunal de Contas da União (2008).
148
mas o custo da política ofertada, que deve variar de acordo com cada realidade. De
alguma forma, os municípios capitais que apuraram resultado líquido negativo do
Fundeb, poderiam ter parte da perda compensada pelo custo da política.
As informações da tabela 20 indicam que a educação nas capitais tem sido
financiada, basicamente, por recursos próprios, apesar de ser uma competência
constitucional das três esferas de governo.
Ou seja, considerando a soma dos recursos líquidos do Fundeb, mais as
transferências discricionárias federal e estadual vinculadas à educação, a participação
média desses recursos no financiamento da educação foi de apenas 9 pontos percentuais,
resultado que reforça a necessidade de aprimorarmos os critérios de partilha das
transferências para esses centros.

Tabela 20 - Fonte de financiamento da Educação nas 26 capitais. Média para o


período: 2002 – 2010, em %
Financiamento da Educação
Média 2002/2010
Municípios FUNDEB resultado líquido +
26 Capitais FNDE + Salário Educação +
RECEITA Própria
Convênios Custeio +
Convênios Investimentos
ARACAJU 11% 89%
BELEM 12% 88%
BELO HORIZONTE 5% 95%
BOA VISTA 13% 87%
CAMPO GRANDE 7% 93%
CUIABA 11% 89%
CURITIBA 6% 94%
FLORIANOPOLIS 8% 92%
FORTALEZA 7% 93%
GOIANIA 6% 94%
JOAO PESSOA 7% 93%
MACAPA 16% 84%
MACEIO 13% 87%
MANAUS 7% 93%
NATAL 11% 89%
PALMAS 13% 87%
PORTO ALEGRE 4% 96%
PORTO VELHO 16% 84%
RECIFE 6% 94%
RIO BRANCO 16% 84%
RIO DE JANEIRO 9% 91%
SALVADOR 8% 92%
SAO LUIS 9% 91%
SAO PAULO 6% 94%
TERESINA 12% 88%
VITORIA 7% 93%
Média 9% 91%
Mediana 8% 92%
Mínimo 4% 84%
Máximo 16% 96%
Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional, base Finbra, vários anos.
Elaboração Própria.
149
As informações evidenciam que o financiamento da educação na maioria das
capitais, predominantemente, tem sido sustentado por receitas próprias e recursos
constitucionais, de livre alocação do tesouro municipal. Porém, o custo da política
descentralizada, constitucionalmente permanece designado aos três níveis federativos.
Esse cenário, a participação dos recursos legais e discricionários, transferidos
pelas esferas federal e estadual, versus a participação dos recursos próprios no
financiamento da funcional educação, nos permite afirmar que o orçamento da educação
obrigatória e infantil, a cada ciclo orçamentário, tem sido financiado com recursos do
orçamento próprio municipal.
Nesse sentido, novamente os orçamentos próprios das capitais são marcados pela
ausência federativa, que fragiliza a ideia de financiamento tripartite cooperativo das
políticas descentralizadas. Parece-me que tem ocorrido uma (des)federalização e uma
(des)estadualização das responsabilidades constitucionais, principalmente nas áreas da
educação e saúde.
Situação recorrente em outros setores, como por exemplo, a Emenda
Complementar n. 64 de fevereiro de 201080 que incluiu a alimentação entre os direitos
sociais, e deu origem a novas políticas federais com cooperação financeira federativa.
Mesma situação do direito à moradia, assegurado pelo Programa Minha Casa, Minha
Vida, criado em 2009, que está estruturado com base em uma rede federativa vertical e
com cooperação voluntária dos municípios, que assumiram compromissos financeiros
com a infraestrutura urbanística dos projetos de construções de interesse social.
Ainda é preciso considerar o financiamento das políticas de transferência de renda,
a Emenda Constitucional n. 67, de 22 de dezembro de 2010, prorrogou por prazo
indeterminado o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza, que significa
orçamentariamente que os municípios continuarão comprometendo parte dos recursos
próprios e transferidos para alocação livre com o financiamento da agenda das políticas
sociais descentralizadas.
Outros setores como o saneamento básico, transporte e segurança, sobrecarregam
o orçamento próprio das capitais, em razão da ausência da participação dos governos
superiores no financiamento das políticas descentralizadas.

80
Emenda Constitucional n. 64, de 4 de fevereiro de 2010: “(...) Art. 6º São direitos sociais a educação,
a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à
maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição(...)”.
150
As ações verticalizadas ocorreram mais no sentido de garantir uniformidade da
política e incentivos para a adesão dos governos subnacionais aos programas nacionais,
sem se preocupar com a participação de cada esfera de governo no financiamento da
política pública descentralizada verticalmente.
A ausência de regulamentação quanto ao financiamento tripartite tem permitido o
poder decisório no governo central reconcentrar parte dos recursos financeiros. Além
disso, segundo Arretche (2002), diferentemente das previsões da literatura, o
federalismo brasileiro tem permitido que o poder de veto dos governos subnacionais não
represente um ponto de veto intransponível à implementação da agenda de reformas do
governo federal.
Não nego a importância da descentralização como estratégia potencialmente
relevante para o exercício da cidadania, da execução e controle da política, mas ela
precisa ser aperfeiçoada e acompanhada dos princípios de solidariedade e cooperação
entre os entes federados.
Em resumo o modelo em curso precisa atender às diversidades e necessidade de
cada local e ou território, e não apenas dividir competências de forma horizontal e
vertical.
Assim, atender aos desafios contemporâneos dos centros urbanos mais populosos
de cada região do País não tem sido tarefa fácil, sobretudo quanto a necessidade de
implementar políticas de infraestrutura.
Lembrando que o modelo fiscal vigente limitou a autonomia decisória dos
governos subnacionais, e estabeleceu patamares de gastos. E, conforme Santos (2011),
os formatos das políticas sociais foram desenhados quase que exclusivamente pelo
poder central, e parte significativa do financiamento das ações ficaram sob
responsabilidade da esfera municipal.
Questões que elucidam a real dificuldade de os municípios polos provedores das
políticas públicas, assumirem suas funções exclusivas e construírem um novo modelo
de gestão eficiente, e, sobretudo, que respondam aos anseios da população.
151
4.3 A rigidez na estrutura orçamentária municipal

Diante modelo do pacto federativo e da própria engenharia fiscal, a rigidez


orçamentária dos centros urbanos mais populosos e endividados prosseguiu, e dentro da
mais pura legalidade. O resultado, no sentido exato, tem sido uma diferença entre o
volume de recursos transferidos versus as atribuições descentralizadas ou assumidas.
Parte do hiato orçamentário e financeiro deve-se a falta de clareza da política, e
financiamento tripartite incapaz de sustentar as políticas descentralizadas. Tudo isso tem
ocorrido em meio a um processo de centralização e desvinculação de recursos de
contribuições promovido pela União, e que deveriam financiar a saúde, assistência
social e previdência.
Qualquer tentativa com intuito de revigorar as relações federativas precisa
responder a seguinte pergunta: quem faz o que na federação? Com quais recursos? E
para quem? A pactuação confusa permitiu que todos os níveis de governo
permanecessem responsáveis por quase tudo. E, naturalmente, a conta das demandas
são cobradas nas portas dos governos mais próximos à população.
De um modo geral, pode se dizer que o resultado da confusa relação federativa
e ausência de cooperação financeira, tem aprofundado os problemas de ordem social e
de infraestrutura nas regiões metropolitanas.
São questões que a nova disciplina fiscal, a pesar de prometer a transparência
fiscal, não se preocupou em regulamentar, não definiu metas e muito menos exigiu a
elaboração de relatórios que pudessem apurar indicadores para superarmos essas
questões.
Ou seja, na maioria das cidades da amostra, os desafios federativos são iguais:
esbarram na limitação da capacidade de investimento versus o estoque de
endividamento, e carecem de cooperação financeira tripartite, imperiosa para a
ampliação e manutenção das políticas municipalizadas.
Reconheço que a adesão dos governos subnacionais aos programas do governo
federal e estadual nunca foi obrigatória, porém, o contexto de crise econômica e fiscal
dos anos 1990, provocou não apenas um aumento da inadimplência dos contribuintes
locais, decorrente do nível de desemprego, bem como contribuiu para aumentar as
pressões sociais.
A falta de perspectiva de um plano nacional de desenvolvimento abriu espaço para
que o gestor municipal percebesse a adesão aos convênios como uma oportunidade de
152
garantir um mínimo de incremento de recursos financeiros, fazendo com que as
transferências discricionárias ganhassem participação na estrutura orçamentária. Ao
mesmo tempo, as contrapartidas com recursos próprios evoluíram e contribuíram para
reduzir a autonomia federativa local.
Apesar da importância das transferências intergovernamentais para federação
brasileira, acredito que o sistema não consegue contemplar os desafios metropolitanos,
em áreas e setores estratégicos para o desenvolvimento social e urbano.
A criação de um mecanismo para realizar uma avaliação periódica das variáveis:
demandas; número populacional; recursos transferidos e disponíveis; e custos das
políticas descentralizadas, frente ao endividamento contabilizado, poderiam auxiliar no
enfrentamento dessas questões.
Nesse sentido, a configuração do atual pacto federativo restringiu e limitou a
autonomia da esfera municipal, além de a impedir de elaborar e desenvolver políticas
públicas enumeradas no artigo 30 da Constituição federal de 1988. Os orçamentos das
capitais, atualmente, têm mais compromissos com as atribuições comuns das três esferas
federativas, as responsabilidades municipalizadas, do que com as competências que lhes
são exclusivas, mesmo mediante um processo de fortalecimento da cobrança e
arrecadação da receita própria.
Em tempos de normas fiscais austeras, o ciclo do planejamento orçamentário
democrático perdeu o seu proposito constitucional81, e, como já abordado no capítulo 3,
priorizou apenas o cumprimento de metas do resultado82 primário e nominal.
Enquanto isso, desprovidas do diálogo e da cooperação técnica e financeira entre
os entes federativos, o arranjo da nova ordem econômica dos anos 1990, favoreceu
apenas a recentralização dos recursos financeiros na esfera federal e permitiu a sua
omissão e/ou participação em diversas políticas públicas.
Conforme constatado nas tabelas 19 e 20, a evolução da participação dos recursos
próprios no financiamento das políticas descentralizadas, saúde e educação, ocorreu em
detrimento das políticas locais de competência exclusiva do poder local.

81
Sabemos que o texto constitucional de 1988 atribuiu ao ciclo orçamentário, à luz das três peças de
planejamento, Plano Plurianual (PPA), Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) 81 e a Lei Orçamentária
Anual (LOA), a possibilidade para construção de um Estado democrático. Ficou definido que os
interesses da sociedade democrática seriam contemplados e assegurados no ciclo orçamentário
constitucional, sob a perspectiva de que o executivo deveria planejar os programas e ações, ao mesmo
tempo, fortalecer o papel do poder legislativo por meio da aprovação das ações priorizadas por meio da
participação e decisão da sociedade.
82
A esse respeito, ver a metodologia no site da Secretaria do Tesouro Nacional:
http://www.tesouro.fazenda.gov.br/mcasp
153
Enquanto que os serviços de infraestrutura urbana, como lixo e transporte coletivo
urbano, drenagem, cultura, esporte, entre outros, tiveram queda expressiva na
participação média da estrutura orçamentária das 26 capitais.
Cenário que mostra a necessidade de ampla discussão federativa como objetivo
de assegurar um controle social das responsabilidades de cada governo. Em
praticamente todas as 26 capitais houve retração de recursos no âmbito da política das
responsabilidades exclusivas municipais. A evolução do comportamento das despesas
públicas destacadas nas figuras 3 e 4, sinaliza que as questões urbanas têm sido
desprezadas ao longo do processo da descentralização em curso.

Figura 3- Evolução funcionais do gasto público: 1996-2001, em %

Evolução das principais funcionais da despesa pública para 26 Capitais


Período 1996 - 2001 - Fonte: STN, Finbra vários anos
25%
23%
20%
20%
20% 19% 19%

16%
15% 15%
15% 14% 14%

10% 9%

5%
5%

0%
Educação e Cultura Saúde Saneamento Habitação e Urbanismo Transporte

1996 1999 2001

As despesas com a funcional transporte tiveram retração em 3 momentos: em


1996, a participação média alcançou 15 pontos percentuais das despesas totais; em 2001,
logo após a promulgação da LRF, contabilizou apenas 5 pontos percentuais de
participação no orçamento total. E conforme os dados da figura 4, em 2010, essa
participação foi reduzida para apenas 4 pontos percentuais da estrutura do orçamento
total. Vale observar que, nesse caso, não houve desmembramento da funcional da
despesa.
Enquanto que as ações da funcional urbanismo e habitação totalizaram, em 1996,
participação média de 16 pontos percentuais do orçamento total das capitais, em 2001,
154
foi reduzida para 14 pontos percentuais. Podemos dizer que, diante desse
comportamento, a aprovação da Lei do Estatuto da Cidade, Lei n. 10.257/2001, já
nasceu com pouca possibilidade de aplicação. As palavras de Maricato (2011:03)
resumem bem o descaso com as necessidades urbanas ligadas ao território:
(...) São mais de vinte anos sem política pública de habitação,
saneamento e transporte. Isso passa pelo neoliberalismo e pela década
perdida. São políticas ligadas ao território. Não estou falando de
distribuição de renda. Distribuição de renda não basta para resolver o
problema urbano. Aqui tem de distribuir ativo, que é cidade, é terra
urbanizada. A questão da terra é central na política urbana, pois ela é
dominada por esse mercado restrito, elitista e especulativo. O povo
acaba tendo de se virar... o problema é que a base fundiária permanece
a mesma. Lei nós temos, plano nós temos, mas não aplicamos a função
social da propriedade. O que aconteceu na ditadura, na época do
Banco Nacional da Habitação (BNH)? As fontes de financiamento
eram o FGTS e o SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e
Empréstimo), que é basicamente poupança privada e poupança dos
trabalhadores. O governo colocou um subsídio para baixa renda, de
recurso orçamentário federal. Mas se ninguém nos três níveis de
governo – federal, estadual e municipal – mexeu na base fundiária. Aí
houve uma maior desorganização no mercado de terras, com um
impacto bárbaro sobre os preços.

A evolução média das mesmas funcionais entre 2002 a 2010, período após a
vigência da LRF, permaneceu com a mesma tendência, educação e saúde ganharam
participação na estrutura orçamentária total, e as demais funções do gasto público
perderam orçamento. O avanço dos gastos com os dois setores se justificou em parte,
pela municipalização das políticas, e em parte pela redução dos recursos direcionados
ao orçamento da saúde ocorrido por meio desvinculação da receita da União promovida
ao longo do período.
A alta prioridade conferida aos setores da saúde e da educação, mostrou um
comprometimento de aplicação dos recursos orçamentários muito superior aos limites
definidos constitucionalmente.
Dessa forma, o poder local vem assumindo parte crescente do custeio financeiro
desses setores municipalizados, em meio a um descontrole da gestão, e da falta de
recursos para investir em infraestrutura local, sendo que parte expressiva dos serviços
acabaram sendo terceirizados, circunstância que gerou mais desafios, como por
exemplo, assegurar parâmetros nos preços e na qualidade de cada serviço contratado.
Ou seja, mais vagas, mais leitos, mais exames laboratoriais, sem a gestão e
controle da política pública, infelizmente, não podem ser considerados sinônimos de
eficiência e qualidade a um bom atendimento ao cidadão. A figura abaixo nos permite
155
entender a precariedade da infraestrutura urbanística, da política de transporte,
saneamento e habitação que os grandes centros administram.

Figura 4 - Evolução funcionais do gasto público: 2002-2010, em %

Evolução das principais Funcionais da Despesa Pública das 26 Capitais


Período 2002 - 2010 - Fonte: STN, Finbra vários anos

25%
23% 23%
21%
20% 20%
20%
20%

15% 13%
12%
12%

10% 9%
8% 9%

5% 4%
3% 3% 3%
3% 2%
2% 2%
1%

0%
Saúde Educação Urbanismo Encargos Transporte Saneamento Habitação
Especiais

2002 2005 2010

A figura mostra que os municípios capitais se comportaram como captadores


passivos e apáticos dos recursos das políticas discricionárias dos programas federal e
estadual, em uma circunstância de quase completa perda de autonomia e iniciativas que
considerem e atendam as urgências locais. E a dificuldade da gestão das políticas
descentralizadas e terceirizadas, tem colocado em risco não só a política pública, mas a
vida da população. A única certeza que temos é quanto à necessidade de enfrentarmos
essas questões, dando transparência ao custo e apresentando indicadores de cada
política.

4.3.1 Novos Rumos?

Deveríamos todos estar voltados para um debate federativo, que considerasse as


sincronias reproduzidas pelo arranjo atual, e criarmos mecanismos que garantissem uma
verdadeira cooperação técnica e financeira das três esferas de governos na construção
da gestão de cada política pública descentralizada, como forma de valorar e entender as
necessidades de cada região e de cada localidade.
156
De um modo geral, os programas locais permanecem sem orçamento fiscal para
enfrentarem: as enchentes; os congestionamentos que paralisam a rotina das cidades; o
caos no transporte público; o aumento da violência e criminalidade; desmoronamentos;
poluição do ar e da água; acúmulo de lixos entulhados por todos os cantos das cidades;
violência contra o patrimônio público; especulação imobiliária; fazer drenagem;
permanecem desprovidos de um planejamento de ordenamento territorial e
regularização fundiária; carência de cultura; de esporte.
Enfim, o modelo vigente é engessado e permite o sucateamento de políticas que
terminam por prejudicar o bem-estar de todos. Parece que as políticas públicas de
responsabilidade municipal se tornaram sem importância e inalcançáveis, e o retrato é
um só: o da precariedade social e urbana nas capitais.
Quando analisadas as informações da execução orçamentária, não mais pela
média, mas por cada município capital, considerando o último ano do período, a
realidade é ainda mais desequilibrada. Por exemplo, a cota orçamentária média da
amostra para a funcional urbanismo foi de 12 pontos percentuais do orçamento total,
conforme mostrado na figura 04. Essa participação é igual à dos municípios com menor
população e que tendem a ter menor complexidade e custos nas intervenções urbanas.
Porém, conforme as informações da tabela 21, para as cidades economicamente
fortes, como Belo Horizonte, essa despesa auferiu apenas 5 pontos percentuais dos
recursos orçamentários com infraestrutura. Recursos que dificilmente seriam suficientes
para enfrentar os impasses urbanos que o município contabiliza.
No caso da habitação, os valores mínimos destinados pelas cidades mais
populosas e mais dinâmica economicamente do País, como São Paulo, Rio de Janeiro,
Salvador e Fortaleza, os percentuais foram de apenas 3%, 2%, 0%, e 2%,
respectivamente. Não foi diferente com a política de saneamento, as participações foram
de 1%, 3%, 0%, e 0%, respectivamente.
157
Tabela 21 - Funcionais infraestrutura, e Encargos Especiais (despesas
financeiras) das 26 capitais e por intervalos populacionais – ano 2010, em %

Encargos
MUNICÍPIO População Urbanismo Habitação Saneamento Transporte
Especiais
São Paulo 11.253.503 9% 3% 1% 9% 12%
Rio de Janeiro 6.320.446 13% 2% 3% 1% 15%
Salvador 2.675.656 18% 0% 0% 3% 8%
Fortaleza 2.452.185 14% 2% 0% 0% 4%
Belo Horizonte 2.375.151 5% 4% 7% 2% 6%
Manaus 1.802.014 24% 1% 0% 0% 4%
Curitiba 1.751.907 27% 1% 3% 0% 3%
Recife 1.537.704 16% 1% 1% 0% 2%
Porto Alegre 1.409.351 3% 2% 21% 0% 6%
Belém 1.393.399 19% 1% 2% 1% 9%
Goiânia 1.302.001 1% 0% 8% 3% 3%
São Luís 1.014.837 6% 1% 9% 7% 2%
Maceió 932.748 4% 1% 9% 0% 2%
Teresina 814.230 10% 2% 2% 0% 1%
Natal 803.739 20% 1% 0% 0% 4%
Campo Grande 786.797 9% 1% 0% 15% 0%
João Pessoa 723.515 9% 1% 1% 2% 3%
Aracaju 571.149 20% 2% 1% 0% 2%
Cuiabá 551.098 12% 1% 0% 0% 9%
Porto Velho 428.527 26% 3% 0% 1% 6%
Florianópolis 421.240 9% 0% 12% 0% 2%
Macapá 398.204 3% 2% 0% 2% 2%
Rio Branco 336.038 27% 0% 7% 1% 4%
Vitória 327.801 19% 3% 5% 0% 3%
Boa Vista 284.313 17% 1% 10% 4% 3%
Palmas 228.332 13% 1% 3% 1% 5%
Média das 26 Capitais 42.895.885 12% 2% 3% 4% 9%
FONTE: STN/FINBRA, anos: 2010

A política de transporte, para o conjunto das 26 capitais, teve uma média apenas
de 4 pontos percentuais. Vale lembrar que todos os dias milhões de pessoas sofrem com
a questão da mobilidade urbana, realidade que atinge todos os cidadãos,
independentemente de renda e região. Cidades mais populosas, como Rio de Janeiro,
Salvador e Belo Horizonte, alocaram na funcional transporte apenas 1, 3 e 2 pontos
percentuais do orçamento total, respectivamente.
Enquanto que a média com o pagamento de juros e amortização do principal da
dívida pública foi de 9 pontos percentuais, as cinco cidades mais populosas destinaram
as maiores participações, 12, 15, 8, 4 e 6 pontos percentuais do orçamento total,
respectivamente. Gastos que justificam a baixa capacidade de investimento dos centros
urbanos mais populosos e endividados do País.
Em condições opostas, os municípios menores, favorecidos pelos critérios das
transferências intergovernamentais e com baixo nível de endividamento, conseguiram
158
registrar maior capacidade de investimento, mesmo com baixa arrecadação de recursos
próprios.
Em quanto os municípios populosos, com alta capacidade de arrecadação de
recursos próprios, porém, endividados e impedidos de realizarem operações de crédito,
comprometeram parte expressiva dos seus orçamentos com as despesas financeiras, e,
na maioria das vezes, permaneceram sobrecarregados pelas atribuições da
municipalização dos serviços, por meio da terceirização.
Vale observar que para proteger algumas áreas de maiores intervenções e
restrições federativas, muitas capitais criaram alguns fundos especiais na tentativa de
assegurarem algum recurso do orçamento fiscal para suas responsabilidades exclusivas
municipais, para as quais não haviam sido garantidos os recursos constitucionalmente,
nem por meio de convênios ou de programas nacionais.
Apesar de a medida ter sido usada com frequência, as dificuldades econômicas
restringiram a possibilidade de se reservar recursos próprios para esses fundos. Porém,
muitos não cumpriram seus objetivos estabelecidos na lei orgânica municipal, pois não
conseguiram planejar qualquer oferta de política pública por meio desse instrumento,
frente à impossibilidade de reservar e efetivar o orçamento desses setores.
Dessa forma, o processo orçamentário caminhou no âmbito de transferir parte das
responsabilidades das políticas descentralizadas para as organizações não
governamentais (ONGs), e administração indireta – fundações, autarquias e empresas
públicas.
As informações da tabela 22, apesar de não nos permitirem identificar quais ações
dos programas foram executadas pelos centros urbanos mais autônomos, mostraram a
execução por categoria econômica e natureza das despesas orçamentárias83.
As naturezas das despesas com pessoal e investimentos registraram queda nos dois
intervalos de municípios mais populosos, onde se encontram mais da metade das
capitais. Ao passo que os intervalos que reuniram os municípios com menor população
obtiveram uma participação maior dessas despesas na estrutura orçamentária. Em parte,

83
A categoria da despesa corrente recebeu o código 3 na Lei 4.320/64 e agrega três naturezas de despesas
com os respectivos códigos: 1. Pessoal e Encargos Sociais; 2. Juros e Encargos da Dívida; 3. Outras
Despesas Correntes. Essas despesas são realizadas para garantir o funcionamento da administração
pública e a oferta dos bens e serviços públicos. O código 4 é aplicado para a categoria econômica de
capital e reúne três naturezas de despesas com os respectivos códigos: 4. Investimentos; 5. Inversões
Financeiras; e 6. Amortização da Dívida.
159
o resultado da queda da participação dos gastos com pessoal e investimentos, nos
permite compreender a causa do sucateamento da política pública nos grandes centros.
Nos dois primeiros intervalos com maior número populacional, onde se encontram
a maioria das capitais, é possível observar o crescimento da natureza Outras Despesas
Correntes, que agrupa os serviços da terceirização. Em 1998, a participação dessa
despesa no intervalo mais populoso representava 27 pontos percentuais, em 2010 a
participação saltou para 46 pontos percentuais do orçamento total.

Tabela 22 - Participação média por categoria econômica e natureza de despesa,


por intervalo populacional dos 5560 municípios, anos: 1998; 2004 e 2010 - em %

Intervalo População Despesas Correntes Despesas de Capital


populacional dos Pessoal / Desp Total Juros / Desp Total Outros Custeios /Desp Total Investimento/Desp Total Amortizações/ Desp Total
5560 Municípios 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010 1998 2004 2010
acima de 1 MILHÃO 23% 23% 20% 47% 43% 36% 3% 5% 4% 27% 40% 46% 8% 10% 8% 12% 2% 3%
500 MIL - 1 MILHÃO 8% 9% 8% 59% 44% 43% 2% 1% 1% 28% 42% 45% 9% 11% 9% 1% 2% 2%
300 MIL - 500 MIL 8% 9% 8% 59% 45% 41% 3% 1% 1% 27% 42% 43% 9% 10% 13% 2% 2% 2%
100 MIL - 300 MIL 17% 17% 17% 54% 44% 45% 2% 1% 1% 29% 40% 41% 13% 13% 12% 2% 2% 2%
50 MIL - 100 MIL 12% 11% 12% 55% 45% 48% 1% 1% 0% 29% 40% 40% 13% 13% 10% 2% 2% 2%
30 MIL - 50 MIL 8% 8% 9% 52% 44% 47% 1% 0% 0% 31% 41% 39% 13% 13% 11% 2% 2% 2%
795 - 30 MIL 25% 23% 24% 49% 44% 46% 0% 0% 0% 33% 44% 39% 16% 11% 13% 1% 2% 1%
Média 100% 100% 100% 51% 44% 43% 2% 2% 1% 29% 41% 42% 11% 11% 11% 5% 2% 2%
FONTE: STN/FINBRA, anos: 1998, 2004 e 2010.

A escassez do quadro de servidores públicos, aliada às dificuldades com relação


ao reajuste salarial e ao sucateamento da estrutura dos equipamentos públicos,
dificultaram a reposição de diversas das carreiras, que tem se dado por meio da
contratação dos serviços de terceiros de pessoa física, e, principalmente, pessoa jurídica,
contabilizados na categoria econômica Outras Despesas Correntes.
Ou seja, acredito que a escolha pela terceirização tem se dado pelos limites fiscais
definidos para as despesas com pessoal do executivo municipal, que poderiam
representar 54 pontos percentuais da sua receita corrente líquida.
Alinhado, seguramente, com a escolha pela terceirização e pela baixa capacidade
de investimento, limitadas pelo coeficiente de endividamento que impediu a realização
de operações de crédito para realização de novos investimentos locais, as 26 capitais
terceirizaram as políticas descentralizadas.
Acredito que as imposição fiscais interferiram na autonomia municipal sob muitos
aspectos, desde a possibilidade de implantação de um plano de carreira pública,
produtividade, realização de concursos públicos, e até mesmo de a promoção de um
reajuste salarial garantido constitucionalmente, favorecendo uma tendência de queda do
160
gasto de pessoal na maioria das capitais, ao mesmo tempo, assegurou a redução das
despesas primárias, necessárias para financiar as parcelas da dívida renegociada.
Entretanto, observo que a gestão e controle dos contratos terceirizados, ainda
aguarda métodos para serem fiscalizados com nitidez. Nem o ordenador da despesa
pública, nem o cidadão conseguem de fato fiscalizar e mensurar o custo, quantidade,
qualidade da maioria dos serviços terceirizados.
Com isso, o controle do dinheiro público não tem sido uma tarefa fácil de ser
realizado, permitindo inclusive que os contratos, frente ao emaranhado de interesses que
esse tema capitaliza, acomodassem interesses individuais e políticos, e que não
necessariamente contribuem para a realização das demandas coletivas.
Os dados da tabela 23 mostraram que, em 1995, a natureza Outras Despesas
Correntes, para metade dos municípios da amostra, comprometia em média 30 pontos
percentuais do orçamento corrente; em 2010 atingiu mais de 48 pontos percentuais.
O crescimento da participação dessa natureza de despesa, pode ser considerado
como um resultado do aumento dos gastos com as contratações de serviços de
consultoria, serviços de terceiros pessoas física e jurídica, locação de mão de obra,
transferência às instituições privadas, subvenções sociais84 e contribuições85.
Comportamento que confirma a tendência da terceirização da política pública para a
maioria das capitais.
Forçoso lembrar que a LRF não impôs nenhum limite e/ou restrição à
terceirização, o que sugere que ela tenha sido elaborada mais para atender aos interesses
do mercado do que propriamente para o ajuste das finanças públicas.
E, a gestão e fiscalização dos contratos, em muitos setores tem apresentado
fragilidades, permitindo que o mercado se encarregasse de aferir seus interesses, sem
dificuldade e ou sem restrição fiscal, a partir da solicitação de um realinhamento de
preços durante a execução dos serviços.
Dessa forma, a responsabilidade constitucional do Estado para assegurar os
direitos aos cidadãos tem sido de forma sistemática transferida ao mercado, sem um
controle eficaz, dando a sensação de que a importância do Estado tem sido aniquilada

84
Subvenções Sociais: conforme portaria 163/2001, despesas orçamentárias para cobertura de despesas
de instituições privadas de caráter assistencial ou cultural, sem finalidade lucrativa, de acordo com os
artigos 16, parágrafo único, e 17 da Lei n. 4.320/1964, observado o disposto no art. 26 da LRF.
85
Contribuições: conforme portaria 163, de 2001, despesas orçamentárias às quais não correspondam
contraprestação direta em bens e serviços e não sejam reembolsáveis pelo recebedor, inclusive as
destinadas a atender a despesas de manutenção de outras entidades de direito público ou privado,
observado o disposto na legislação vigente.
161
em detrimento das próprias instruções normativas e das imposições fiscais da LRF, que,
de certa forma respaldou o modelo, definindo limites de gastos com pessoal, por
exemplo, e nenhum teto foi definido para as terceirizações.

Tabela 23 - Participação média da natureza de despesa Outras despesas


Correntes nas despesas correntes, anos: 1995; 2005 e 2010 - em %
Evolução da Partipação das Outras Despesas Correntes/
Despesas Correntes
MUNICIPIO População 1995 2005 2010
ARACAJU 571.149,00 26% 45% 45%
BELEM 1.393.399,00 39% 49% 51%
BELO HORIZONTE 2.375.151,00 11% 49% 55%
BOA VISTA 284.313,00 39% 50% 34%
CAMPO GRANDE 786.797,00 nd 55% 53%
CUIABA 551.098,00 35% 43% 46%
CURITIBA 1.751.907,00 30% 74% 64%
FLORIANOPOLIS 421.240,00 38% 39% 44%
FORTALEZA 2.452.185,00 48% 44% 46%
GOIANIA 1.302.001,00 34% 52% 43%
JOAO PESSOA 723.515,00 18% 47% 46%
MACAPA 398.204,00 22% 35% 40%
MACEIO 932.748,00 40% 50% 54%
MANAUS 1.802.014,00 39% 30% 47%
NATAL 803.739,00 22% 48% 39%
PALMAS 228.332,00 52% 42% 41%
PORTO ALEGRE 1.409.351,00 24% 59% 58%
PORTO VELHO 428.527,00 32% 43% 46%
RECIFE 1.537.704,00 22% 51% 48%
RIO BRANCO 336.038,00 23% 41% 47%
RIO DE JANEIRO 6.320.446,00 18% 31% 34%
SALVADOR 2.675.656,00 16% 57% 59%
SAO LUIS 1.014.837,00 26% 56% 46%
SAO PAULO 11.253.503,00 43% 49% 61%
TERESINA 814.230,00 8% 54% 52%
VITORIA 327.801,00 33% 49% 52%
Média 1.649.842 30% 48% 48%
Mediana 873.489 30% 49% 46%
Mínimo 228.332 8% 30% 34%
Máximo 11.253.503 52% 74% 64%
FONTE: STN/FINBRA, vários anos. Elaboração própria.

As informações da tabela 23, nos confirmaram que a experiência das 26 capitais


ampliou de forma expressiva a participação das Outras Despesas Correntes, sustentadas
por meio da contratação dos serviços terceirizados.
E, os gastos com a terceirização, conforme tabela 24, tiveram representatividade
expressiva em todas as 26 capitais do País. A rubrica serviços de terceiros pessoa
jurídica alcançou, em metade dos municípios da amostra, uma participação de 55 pontos
162
percentuais dos gastos da natureza de despesa Outras Despesas Correntes. O valor
mínimo, no ano de 2010, representou 36 pontos percentuais da natureza Outras
Despesas Correntes, enquanto a participação máxima de 74 pontos percentuais.
Dessa forma, embora tenha ocorrido um aumento de gastos com serviços de
terceiros, não é possível assegurar que houve ampliação do número de bens e serviços
disponíveis à população, pois o custo do serviço pode ser maior, mediante o lucro
aspirado pelo capital. Questão que nos leva a refletir sobre a representatividade
progressiva desse modelo na estrutura orçamentária.

Tabela 24 - Participação de alguns elementos que compõem a natureza Outras


Despesas Correntes, 26 capitais: Ano 2010 em %

Outras Desp Correntes


Material de Outros Serviços Outros Serviços Transf Inst Priv s
MUNICIPIO População (ODC)/Despesas
Consumo/ODC Terceiros PF/ODC Terceiros PJ/ODC Fins Lucr/ODC
Correntes
ARACAJU 571.149 45% 6% 5% 74% 0%
BELEM 1.393.399 51% 7% 5% 64% 1%
BELO HORIZONTE 2.375.151 55% 3% 1% 47% 14%
BOA VISTA 284.313 34% 22% 2% 53% 2%
CAMPO GRANDE 786.797 53% 11% 2% 63% 6%
CUIABA 551.098 46% 11% 1% 70% 1%
CURITIBA 1.751.907 64% 10% 0% 59% 3%
FLORIANOPOLIS 421.240 44% 10% 1% 43% 8%
FORTALEZA 2.452.185 46% 8% 4% 57% 11%
GOIANIA 1.302.001 43% 10% 2% 73% 2%
JOAO PESSOA 723.515 46% 19% 2% 67% 0%
MACAPA 398.204 40% 10% 9% 42% 9%
MACEIO 932.748 54% 5% 7% 64% 0%
MANAUS 1.802.014 47% 9% 1% 58% 4%
NATAL 803.739 39% 8% 3% 57% 8%
PALMAS 228.332 41% 11% 4% 40% 8%
PORTO ALEGRE 1.409.351 58% 5% 1% 46% 7%
PORTO VELHO 428.527 46% 19% 1% 48% 5%
RECIFE 1.537.704 48% 12% 2% 54% 0%
RIO BRANCO 336.038 47% 19% 6% 59% 1%
RIO DE JANEIRO 6.320.446 34% 12% 1% 60% 10%
SALVADOR 2.675.656 59% 7% 1% 41% 18%
SAO LUIS 1.014.837 46% 11% 1% 54% 1%
SAO PAULO 11.253.503 61% 4% 1% 45% 13%
TERESINA 814.230 52% 10% 2% 54% 10%
VITORIA 327.801 52% 6% 3% 36% 11%
Média 1.649.841,73 48% 10% 3% 55% 6%
Mediana 873.489,00 46% 10% 2% 55% 5%
Mínimo 228.332,00 34% 3% 0% 36% 0%
Máximo 11.253.503,00 64% 22% 9% 74% 18%
FONTE: STN/FINBRA, ano 2010

Outro elemento de despesa que tem conquistado participação crescente na


estrutura das despesas são as transferências às instituições privadas sem fins lucrativos,
apesar de não serem muito representativas no total, tem sido uma tendência e,
coincidentemente, as capitais que mais firmaram parcerias foram as cidades mais
163
endividadas e sujeitas às restrições fiscais de gastos com pessoal, por exemplo, mesmo
diante do aumento na arrecadação própria.
Por sua vez, o elemento da despesa com material de consumo vem perdendo
participação, na contramão da municipalização das políticas que deveriam exigir
maiores gastos com material de consumo. Apesar do movimento ser contraditório,
mediante o avanço da descentralização, o cenário confirma que é o setor privado que
veem atuando como provedor dos serviços de diversos setores, o que permite corte nos
gastos com pessoal e material de consumo.
Os impasses que se desdobraram dessa relação são complexos. Os frequentes
pedidos e permitidos realinhamento de preços, instrumento onde geralmente acomoda-
se o custo da corrupção e que é de uso comum dentro do setor público, têm corroído
qualquer possibilidade de cidadania aos brasileiros.
Com serviços mais caros e diante de muitos aditivos realizados, o aumento do
custo do serviço terceirizado contribuiu para aumentar a rigidez orçamentária, com
custos maiores, fazendo com que outras políticas públicas sejam subtraídas dos
programas do governo local.
A promessa feita por meio do texto da LRF, de que a partir da publicação das
informações bimestrais e quadrimestrais seria possível uma gestão eficiente e
transparente, de fato, não conseguiu alcançar seu objetivo. A publicação não consegue
traduzir nem o custo da política, e muito menos consegue fiscalizar os contratos e a
qualidade dos serviços.
Há bem da verdade, nem os Tribunais de Contas tem conseguido traduzir e
fiscalizar os inúmeros contratos. Por exemplo, quais e quantos atendimentos de cada
ação (projetos e atividades) foram realizados no âmbito dos contratos terceirizados são
informações não divulgadas, o que dificulta o controle social do dinheiro público.
As audiências públicas realizadas a cada quadrimestre para fazer um balanço
financeiro e orçamentário das contas do setor público apenas conseguem mensurar se
ocorreu um déficit ou superávit primário e nominal, resultados que interessam a nova
disciplina fiscal, porém, não tem convergência com a ideia de cidadania definida no
contrato social vigente.
Dessa forma, aqueles conceitos de Value for Money e da Accontability que
compõem o pensamento liberal, segundo os quais, por meio da terceirização deveria se
alcançar qualidade, principalmente, pela agilidade na compra e o acesso mais fácil à
tecnologia e profissionais especializados disponíveis no mercado, resultando em menor
164
preço e mais pontualidade no processo de execução, no mínimo, me parece que para a
federação brasileira tem sido uma opção tortuosa.
Existem resultados nefastos que nos mostram ausência de gestão quase que
completa desse modelo, que abriu espaço para que a corrupção contaminasse a
administração pública num nível jamais visto.
Entretanto, cabe ressaltar que o descontrole das políticas públicas terceirizadas
não ocorre apenas no âmbito da amostra, as 26 capitais, ele está espalhado por muitos
contratos e convênios em todo o setor público do País. Modelo que, na minha avaliação,
mais imprimiu a possibilidade de contratos com preços superfaturados e serviços
precários e muitos inacabados, do que a prometida eficiência e eficácia assegurada pela
LRF e pelas premissas da visão liberal.
Assim, muitas capitais se encontram em uma encruzilhada: cumprir o papel que
lhe foi atribuído no texto constitucional ou atender as exigências fiscais? Com certeza,
a responsabilidade fiscal é algo a ser considerado no trato das contas públicas, mas
gostaria de chamar a atenção que em nenhuma das instruções normativas dos convênios,
por exemplo, que descentralizaram as ações, exigiu-se que fossem apurados resultados
e parâmetros quanto à satisfação dos usuários da política. Talvez avaliar eficiência e
eficácia dos serviços públicos terceirizados nesse novo rumo seguido na administração
pública não seja uma prioridade.
Nesse sentido, acredito que a partir da exigência fiscal imposta pela LRF, sem
qualquer contrapartida em relação ao controle dos serviços terceirizados, levou a
trajetória da despesa pública a favorecer os interesses privados e a negligenciar a
estruturação de parâmetros que pudesse apurar indicadores de avaliação da eficiência e
eficácia da política descentralizada por meio dessas novas relações – terceirizações;
parcerias público/privada; leilões; concessões; e consórcios.
Parece-me que a partir desse modelo, em que prevalece a execução de ações
terceirizadas, ocorreu, de um modo geral, o descontrole na gestão das políticas públicas.
Isto impôs mais um novo desafio para o Estado e a sociedade brasileira combater: a
seletividade dos parceiros e dos interesses dos aliados do governo que seguem se
cooptando com poucos, de acordo com os interesses do capital.
Estas questões precisam ser debatidas e revistas, caso contrário, permaneceremos
governados por um condomínio de interesses, fabricados pelas premissas liberais e pelo
mercado. O controle das contas públicas fica restrito à necessidade de reduzir as
165
despesas primárias, o programa central de uma administração pública, com destaque
para os gastos com pessoas e investimentos, sob a ameaça de punições severas.
Dessa forma, as capitais mais populosas e com maior autonomia na arrecadação
dos recursos próprios, porém, endividadas, e carregadas de contrapartidas
orçamentárias, ficaram submetidas a uma rigidez orçamentária e fiscal.
A tabela 25 mostra a participação por natureza de despesa no orçamento total, no
ano de 2010. Para metade dos munícipios da amostra, a participação da natureza Outras
Despesas Correntes obteve, praticamente, a mesma média de participação quando
comparada com as despesas com pessoal.

Tabela 25 - Principais naturezas das despesas, 26 capitais, ano 2010, em %


Outras Despesas Depesas Investimentos/
Pessoal/Orçamento
26 Capitais População Correntes/Orçamento Financeiras*/Orçamento Orçamento
Total
Total Total Total
SAO PAULO 11.253.503 26% 53% 9,60% 8,25%
RIO DE JANEIRO 6.320.446 47% 27% 14,72% 10,93%
SALVADOR 2.675.656 35% 54% 5,68% 4,79%
FORTALEZA 2.452.185 47% 41% 2,27% 9,23%
BELO HORIZONTE 2.375.151 38% 47% 3,78% 11,15%
MANAUS 1.802.014 43% 38% 2,36% 15,53%
CURITIBA 1.751.907 34% 61% 1,72% 3,35%
RECIFE 1.537.704 47% 43% 2,30% 7,05%
PORTO ALEGRE 1.409.351 36% 51% 2,93% 8,49%
BELEM 1.393.399 44% 46% 1,38% 8,27%
GOIANIA 1.302.001 52% 40% 2,07% 5,57%
SAO LUIS 1.014.837 47% 40% 1,61% 0,00%
MACEIO 932.748 41% 50% 3,82% 4,82%
TERESINA 814.230 43% 46% 0,92% 9,06%
NATAL 803.739 57% 37% 1,32% 4,67%
CAMPO GRANDE 786.797 38% 43% 1,94% 17,04%
JOAO PESSOA 723.515 46% 40% 2,61% 11,02%
ARACAJU 571.149 50% 42% 1,44% 6,81%
CUIABA 551.098 46% 42% 5,99% 5,34%
PORTO VELHO 428.527 40% 34% 1,56% 23,79%
FLORIANOPOLIS 421.240 48% 38% 2,06% 11,55%
MACAPA 398.204 56% 38% 0,03% 5,46%
RIO BRANCO 336.038 45% 40% 4,14% 11,48%
VITORIA 327.801 39% 42% 1,59% 17,11%
BOA VISTA 284.313 46% 24% 2,89% 27,31%
PALMAS 228.332 52% 37% 1,28% 9,30%
Média 44% 42% 3% 10%
Mediana 45% 41% 2% 9%
Mínimo 26% 24% 0% 0%
Máximo 57% 61% 15% 27%
FONTE: STN/FINBRA, vários anos. Elaboração própria.
* Despesas Financeiras: Juros + Amortizaçao da dívida Pública

Enquanto que as despesas financeiras para os municípios mais populosos e mais


endividados da amostra, São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador, tiveram maior
representatividade na estrutura orçamentária, ao mesmo tempo, essas cidades
contabilizaram maior esforço na arrecadação das receitas próprias.
166
86
A natureza de despesa investimento se mostrou mais suscetível às limitações e
reduções de recursos orçamentários, principalmente após a vigência das restrições
fiscais impostas pela LRF. Ou seja, a incapacidade desses centros urbanos frente à
rigidez orçamentária e às restrições fiscais, resultaram em dificuldades concretas para
os centros mais autônomos assuam as atribuições descentralizadas e o papel que lhes
foram atribuídos constitucionalmente.
Permanecer nessa contradição é assegurar que grande massa populacional
continuará excluída do contrato social vigente. Enquanto que os interesses do capital,
por meio de diversos instrumentos e da própria precarização dos serviços, recaem sobre
os brasileiros com menor renda instalados nos grandes centros.
O discurso trivial é de que os maiores centros urbanos são autônomos, que
arrecadam muito bem, o que falta é uma conscientização e competência para
desempenhar funções. É justamente nesse ponto que discordo da tese predominante.
Não parece fácil garantir o mapeamento das responsabilidades e o financiamento da
proteção social assegurada no texto constitucional.
Existe sim a necessidade de buscarmos um aperfeiçoamento da gestão local, por
meio inclusive de parâmetros e custos das políticas públicas de financiamento tripartite,
mas é preciso conscientizar e sensibilizar os entes federativos sobre a necessidade de
uma partilha mais harmônica, a partir da função social assumida por cada polo prestador
dos serviços nas regiões metropolitanas.
Ou seja, a capacidade de investimentos apurada na tabela 26 apresentou uma
assimetria entre os orçamentos das capitais e os intervalos populacionais dos demais
municípios brasileiros.
A tradução do resultado mostra que, os centros maiores e mais populosos, porém,
endividados, perderam capacidade de investimento. Enquanto que cidades menos
populosas e favorecidas pelos critérios de partilha constitucional e guerra fiscal,
registraram participações mais expressivas de investimento no orçamento total.
No ano de 2010, os investimentos realizados pelo município de Vitória tiveram
participação maior no orçamento total de 17 pontos percentuais, quando a média das
capitais foi de apenas 10 pontos percentuais (ver tabelas 25, 26, e anexo 7: tabela 32).
Assimetria que se justifica, principalmente, pelo critério do valor agregado que
compõem o índice de participação da principal transferência constitucional, a cota parte

86
Para o pleito de novos financiamentos necessários para os investimentos locais86, as resoluções 40 e 43
de 2001 do Senado Federal, condenaram essa possibilidade e futuro para muitas capitais.
167
do ICMS de Vitória representou mais de 68 pontos percentuais, enquanto que para a
média demais capitais a participação foi de apenas 39 pontos percentuais.
Quando a análise é apurada pela participação da média dos investimentos per
capita dos municípios do País, agrupados por intervalos populacionais, os municípios
dos intervalos com menor população realizaram investimentos per capita maiores,
conforme informações da tabela 26.
Dessa forma, mesmo sem analisarmos os programas realizados em cada
município, é possível afirmar que muitas das necessidades de infraestrutura são
decorrentes do modelo de partilha, das consequências da desindustrialização dos
grandes centros urbanos, dos efeitos da guerra fiscal, e, por fim dos limites fiscais e
modelo das relações federativas confusas, e que permitiram a omissão dos governos
superiores nas políticas municipalizadas.
Fica evidente que os maiores desafios encontram-se no crescente estrangulamento
financeiro dos centros mais populosos, com poucos recursos para investimentos e sem
capacidade de buscar novos financiamentos, e permanecem sobrecarregados pelas
exigências das contrapartidas, e submetidas aos determinantes da política fiscal
impostos pelos governos superiores.
Reconheço a importância dos menores municípios legitimada no texto
constitucional de 1988, circunstância que estimulou inclusive a emancipação de mais de
1400 novos municípios pequenos, que tiveram participação crescente nas transferências
constitucionais per capita.
Porém, o modelo de pactuação constitucional contribuiu para que o valor per
capita dos recursos disponíveis aos centros urbanos mais populosos e consolidados
economicamente fossem reduzidos. O resultado contribuiu para tencionar as relações
federativas dos centros urbanos mais populosos, que administram as atribuições de um
polo provedor de serviços e as responsabilidades metropolitanas, com poucas ações
cooperativas e solidárias.
168
Tabela 26 - Investimento per capita médio das capitais e por agrupamento
populacional, ano 2010, em valores reais
Investimento
MUNICÍPIO População Investimento * Per Capita
Médio
Vitória 327.801 328.499.242,08 R$ 1.002,13
Boa Vista 284.313 262.997.791,21 R$ 925,03
Porto Velho 428.527 282.702.159,73 R$ 659,71
Campo Grande 786.797 443.543.826,82 R$ 563,73
Belo Horizonte 2.375.151 929.088.781,93 R$ 391,17
Rio de Janeiro 6.320.446 2.416.798.569,37 R$ 382,38
Florianópolis 421.240 159.942.373,33 R$ 379,69
São Paulo 11.253.503 3.674.586.849,59 R$ 326,53
Porto Alegre 1.409.351 444.582.779,29 R$ 315,45
Manaus 1.802.014 555.390.486,54 R$ 308,21
João Pessoa 723.515 194.844.201,25 R$ 269,30
Palmas 228.332 60.237.537,73 R$ 263,82
Teresina 814.230 173.558.520,82 R$ 213,16
Rio Branco 336.038 66.249.856,54 R$ 197,15
Fortaleza 2.452.185 481.295.552,84 R$ 196,27
Recife 1.537.704 263.157.675,76 R$ 171,14
Aracaju 571.149 92.277.749,87 R$ 161,57
Goiânia 1.302.001 197.925.566,70 R$ 152,02
Belém 1.393.399 207.815.131,03 R$ 149,14
Cuiabá 551.098 74.438.674,12 R$ 135,07
Curitiba 1.751.907 217.051.000,78 R$ 123,89
Natal 803.739 83.693.666,97 R$ 104,13
Maceió 932.748 89.341.630,02 R$ 95,78
Salvador 2.675.656 241.311.276,31 R$ 90,19
Macapá 398.204 34.682.072,46 R$ 87,10
São Luís 1.014.837 0,00 R$ -
26 Capitais 42.895.885 11.976.012.973,08 R$ 279,19
500 Mil - Acima de 1 Milhão** 12.829.916 3.575.470.330,09 R$ 278,68
300 Mil - 500 Mil** 13.569.848 4.195.361.504,70 R$ 309,17
100 Mil - 300 Mil** 31.921.042 9.410.856.764,79 R$ 294,82
50 Mil - 100 Mil 21.996.138 4.878.904.716,19 R$ 221,81
20 Mil a 50 Mil 30.487.995 7.820.349.964,08 R$ 256,51
10 Mil a 20 Mil 19.250.170 5.822.748.136,68 R$ 302,48
805 a 10 Mil 12.578.054 5.553.449.816,33 R$ 441,52
FONTE: STN/FINBRA, ano 2010
(*) Valores Corrigidos pelo IPCA-IBGE a preços de março de 2018.
(**) exceto as capitais.

Esse contexto permite de tudo um pouco. A partir da indefinição dos papéis de


cada ente federativo, a descentralização fiscal os induziu a assumirem muitas atribuições
por meio dos programas nacionais municipalizados, que geraram a necessidade de
contrapartidas do custeio. Questão que pode ajudar a justificar as assimetrias de recursos
per capita para investimentos. Prejuízos que são sentidos pelos cidadãos residentes nos
169
grandes centros urbanos, e que poucos entendem a origem do descaso, e o porquê da
ausência de política públicas, decorrentes das relações federativas confusas.
Acredito que só por meio de ações metropolitanas conjuntas e coordenadas, bem
como a formação de consórcios intermunicipais, poderíamos melhor definir as
prioridades e a responsabilidade de cada ente federativo. A atuação de cada esfera
federativa depende de uma harmonização nas relações federativas, necessárias para
corrigir parte dos desequilíbrios observados, e que tem sido ignorada no contrato social
vigente.
Segundo Santos (2011), esse comportamento do governo brasileiro se justificou
pelo fato das decisões centralizadas e das transferências verticais serem mais simples, e
ainda, permitiu que se definisse quais ações seriam realizadas dentro de cada programa
nacional e de convênios.
Entretanto, não criou mecanismos que garantissem a solidariedade e a cooperação
financeira e técnica com atuação integrada dos três níveis de governo, e nem sempre
conseguiu identificar, mensurar e atender as urgências locais. A bem da verdade, não
houve até agora preocupação do Estado brasileiro em demarcar as atribuições
constitucionais e metropolitanas de forma cristalina.
A nosso juízo, seria mais eficaz pensarmos as ações urbanas e sociais de forma
articulada e com a participação popular. Ações metropolitanas conjuntas e coordenadas,
formação de consórcios intermunicipais, de fato poderia identificar as prioridades a
partir da responsabilidade comum assumida por cada ente federativo.
Acredito que só por meio de uma harmonização e atuação de cada esfera
federativa, os desequilíbrios federativos serão vencidos.
170
5. Conclusão final da Dissertação

Em países regidos pelo Estado democrático de direito, a concretização dos


direitos fundamentais é assegurada no orçamento público daquela nação. Porém, nossa
história nos mostra que os direitos universais foram submetidos a uma sucessão de
arranjos fiscais com objetivos conflitantes com o texto constitucional de 1988, que
contribuíram para tencionar as relações federativas e ampliar o descontrole da gestão
das políticas públicas, com reflexo no desequilíbrio social.
No período estudado, 1995 a 2010, as estratégias empreendidas, mais que tudo,
contribuíram para reduzir a participação das transferências constitucionais no orçamento
corrente dos governos capitais, alterou a distribuição vertical das receitas a favor do
governo central, e permitiu a ausência dos governos superiores nas competências
comuns aos três entes federativos.
O Estado brasileiro a partir de uma nova agenda fiscal em curso desde o ano 90,
suprimiu parte da autonomia da arrecadação das 26 capitais, e comprometeu a
capacidade de planejamento local, em detrimento das inúmeras regras fiscais impostas.
Interferências que ocorreram dentro da mais pura legalidade.
Diante disso, os centros urbanos mais populosos, sede de regiões metropolitanas,
endividados e polos provedores dos principais programas nacionais, sofreram com os
efeitos desse modelo. E planejar ações locais, necessárias para assegurar uma
infraestrutura mínima, que somado aos efeitos da desindustrialização e da guerra fiscal,
e, sobretudo, das imposições fiscais e contrapartidas exigidas do orçamento próprio,
ficaram impedidos de estabelecer um diálogo federativo.
Sob o âmbito das exigências da LRF, por exemplo, os limites estabelecidos para
a realização de despesas com pessoal forçaram muitos governos a alterarem, em boa
medida, a forma de efetivarem suas ações constitucionais e as ações municipalizadas,
que se deram, minimamente, através das disputas por recursos discricionários.
Mecanismo que desencadeou certa fragilidade e incertezas para o ciclo
orçamentário municipal, o que, por um lado, aumentou as responsabilidades municipais
no âmbito das políticas descentralizadas e, por outro, os valores financeiros recebidos
dos governos superiores eram defasados e ou insuficientes para os acordos celebrados.
Circunstância que de alguma forma, criou o cenário perfeito para que se
promovessem relações federativas obscuras, confusas, abrindo espaços para
171
subestimarem a capacidade legítima da agenda da constituição cidadã, e os déficits
sociais e urbanos se agravaram.
A prerrogativa da experiência internacional sobre o processo da descentralização
fiscal era de que governos mais autônomos, necessariamente, deveriam honrar as
responsabilidades exclusivas competentes e construir uma relação fiscal sustentada pelo
princípio da solidariedade, cooperação financeira, e técnica entre as esferas de poder, a
partir de mecanismos justos e harmônicos para distribuir recursos.
Porém, nossa experiencia nos mostra que o orçamento municipal foi submetido
aos objetivos e desejos das esferas de governos superiores, exigindo a participação de
contrapartidas financiadas com os recursos próprios municipais. A partir da imposição
de um conjunto de instruções normativas e portarias que regulamentaram as
transferências discricionárias, que interferiram na autonomia municipal e subtraíram
parte substancial do orçamento próprios de livre alocação, fundamental no
financiamento do desenvolvimento urbano.
Nesse sentido, as ações locais foram sendo abatidas da estrutura orçamentária,
enquanto as ações que deveriam ser sustentadas pelo financiamento tripartite ganharam
espaços orçamentários crescentes.
A redução dos recursos livres na estrutura orçamentária municipal ocorreu sem
nenhum diálogo federativo democrático e articulado com a sociedade, e, na maioria das
vezes, desprovidos de mecanismos e instrumentos de controle que prejudicaram a
atuação dos grandes centros, como principais polos provedores das políticas públicas
nacionais.
Sabemos que outros instrumentos fiscais limitaram o financiamento da agenda
local. As imposições do Programa de Reestruturação e de Ajuste Fiscal, promoveram o
reescalonamento das dívidas municipal, que inseriu os orçamentos dos centros urbanos
com mais autonomia para arrecadar, em um modelo de restrição orçamentária, restando
pouco espaço para realizar ações de programas de responsabilidade exclusiva municipal.
Conforme abordado no capítulo 3, e sob o argumento de que os municípios não
se encontravam em condições de resgatar as suas dívidas no prazo determinado, o
governo federal impôs medidas87 aos municípios endividados, nos mesmos moldes das
negociações com os estados, com o objetivo de garantir um fluxo de pagamentos futuros
do estoque de dívidas passadas.

87
Medida Provisória, nº 1.811/1999, a atual 2.185/2001.
172
Ou seja, a partir da renegociação da dívida pública no final da década de 90, a
federação brasileira não encontrou um caminho que permitisse pensar na redistribuição
de recursos necessários para desenvolver os espaços urbanos e as competências
constitucionais de cada esfera de governo.
Lembrando que, o pagamento das parcelas do acordo de renegociação deveria
ocorrer não apenas por meio da tributação, mas por meio da limitação dos gastos.
Constrangimentos fiscais que causaram uma eclosão de dificuldades econômicas, com
pressões sociais que culminaram na mais grave crise social e fiscal do País.
Nossa experiência tem nos mostrado que o Estado tem persistido em um único
objetivo, a redução das despesas primárias para se apurar um superávit primário88. Fica
a sensação de que o Estado assumiu o compromisso apenas com o mercado financeiro
especulativo, em detrimento das garantias sociais asseguradas no texto constitucional e
em função da perda do controle da gestão das políticas públicas.
As características da nossa descentralização e do ajuste fiscal, a meu juízo,
comprometeram a autonomia municipal, pois a cada dia as demandas urbanas foram
preteridas na estrutura orçamentária.
Desde então, com pactuação confusa, a federação brasileira passou a conviver
com disputas de recursos; com a falta de regulamentação de setores e omissão de
responsabilidades nas ações metropolitanas; com atrasos nos repasses financeiros
necessários para assegurar as ações de programas nacionais descentralizados, além das
inúmeras restrições fiscais. Os desequilíbrios ocasionados são incalculáveis, e
comprometeram os direitos à cidadania.
Dessa forma, torna-se essencial pensar a gestão local, a partir de uma combinação
de esforços entre as três esferas, com políticas redistributivas e com estratégias não
excludentes, que acolham as necessidades locais. E, acima de tudo, a política nacional
precisa assegurar condições para a implantação e o funcionamento dos programas que
incorporem as necessidades metropolitanas das cidades mais populosas do País. Não há
dúvida de que a federação precisa de um ajuste urgente nas relações federativas.
Acredito que o Estado precisa de fato selar os compromissos constitucionais,
esclarecer e delimitar as confusas tarefas, a partir de regulamentações cristalinas a cada
esfera de governo, que nos permitissem fiscalizar, acompanhar e cobrar a realização de

88
A esse respeito, ver Ministério da Fazenda (2007), Anexo de Metas Fiscais e Relatório Resumido da
Execução Orçamentária aplicada à União, aos Estados, Distrito Federal e Municípios. 7ª edição
atualizada.
173
cada direito e dever; e, retomar o debate sobre as competências exclusivas definidas no
texto constitucional e do papel da região metropolitana no enfrentamento das
complexidades urbanísticas dos grandes centros urbanos do País.
Além disso, existe a necessidade de revermos as metodologias da distribuição dos
recursos que tem gerado muitas assimetrias nos valores per capitas entre os municípios
brasileiros, com prejuízos para o contingente populacional residente nas capitais.
Os encaminhamentos dessas questões, certamente, poderiam ajudar a desfazer a
rigidez orçamentária vigente, permitindo um equacionamento federativo integrado e
cooperativo, que nos permitissem enfrentar e garantir o acesso à universalidade dos
direitos aos mais de um quarto da população brasileira que ali residem.
A partir dessas questões estudadas, posso concluir que a atual crise federativa tem
identidade clara, e o hiato estabelecido entre necessidade e capacidade de investimento
são perceptíveis, assim como o próprio formato das políticas públicas, contribuíram para
a degradação e a precarização dos serviços, sem nenhum controle, fiscalização e gestão
quanto à qualidade da política pública.
Parece-me urgente a necessidade de uma repactuação que acolha as questões
urbanas e devolva a capacidade de investimentos às capitais que, atualmente, dispõem
de um volume de investimento por habitantes inferior à média do País, e dos municípios
menos populosos e mais dependentes de transferências intergovernamentais.
As informações estudadas nos ofereceram pistas que asseguram a necessidade de
realizarmos uma repactuação federativa. Apesar da importância da arrecadação
tributária própria, as metrópoles brasileiras permaneceram sujeitas às limitações fiscais
que comprometeram a realização de suas responsabilidades, determinantes na melhoria
da qualidade de vida de milhões de pessoas residentes nessas cidades.
Precisamos legitimar o conceito de autonomia na arrecadação própria e o aumento
da descentralização fiscal, para que os governos locais possam exercer sua autonomia
federativa e, por sua vez, orçamentária. Cumpre lembrar que analisamos os municípios
com as maiores capacidades de gerar receita própria, acima de média nacional e, que,
portanto, deveriam, naturalmente, ter autonomia financeira para assegurar as
necessidades dos investimentos locais, mas, de fato, isso pouco refletiu na performance
dos programas orçamentários e nas melhorias na provisão de bens e serviços oferecidos
à população residente nas capitais.
O desafio consiste em “como tratar dos interesses das partes, preservando os
valores do conjunto” (AFFONSO, 2001). As escassas políticas públicas locais voltadas
174
para os interesses coletivos, somadas às políticas monetária e fiscal restritiva, não
conseguiram oferecer de forma adequada os serviços sociais e urbanos essenciais para
grande parte da população que os grandes centros urbanos reúnem.
Precisamos de uma combinação de esforços entre as três esferas, com políticas
redistributivas e de estratégias não excludentes, que representem as necessidades locais
e de cada região, e assegurem um fortalecimento institucional do município no quadro
federativo do País.
Para tanto, é preciso não apenas de recursos financeiros e orçamentários, mas de
uma “coordenação federativa” por parte dos governos federal e estadual, que permitam
a esfera municipal assumir seu papel de provedor das suas responsabilidades
constitucionais.
Podemos dizer que o atual estágio do federalismo fiscal brasileiro manteve o poder
e o controle político e operacional do manejo dos recursos financeiros de forma
centralizada, bem como criou empecilhos para viabilizar qualquer ação que pudesse se
traduzir em redução do poder central. Enquanto isso, a situação atual sobrecarrega as
capitais de atribuições, e nos coloca em uma crise de funções, onde todos na federação
brigam e ninguém parece ter razão.
Embora se reconheça que a descentralização fiscal tem sido um processo
aclamado e defendido, desde o final dos anos 1970, de forma quase unânime pelas três
esferas federativas, legislativos, oposição e sociedade, as mudanças promovidas foram
insuficientes para fortalecer, de fato, a autonomia federativa e orçamentária dos
governos municipais, mesmo diante do amplo processo da descentralização fiscal.
As decisões federativas realizadas de forma centralizada reproduziram inúmeras
incertezas e sobreposições de papéis que não contribuíram em nada para garantir a
autonomia federativa de cada esfera e muito menos assegurou a realização e ou
universalidade dos direitos a todos os brasileiros. Perguntas como “Quem é que faz o
que na federação? ”; “Com quais recursos? ”; “E para quem? ” permanecem sem
respostas, no atual desenho federativo.
Enquanto isso, o modelo mostra-se impotente para edificar uma sociedade em
outras bases, comprometida com princípios do federalismo cooperativo, acompanhados
dos compromissos sociais democráticos.
Os propósitos da agenda do Estado brasileiro, comprometidos com as exigências
da nova disciplina fiscal, nos permitiram uma experiência com poucas oportunidades
para superarmos o atraso econômico e social, intra e enter regiões do País. E, ainda
175
permitiu que as economias urbanas mais populosas e economicamente mais
consolidadas do País, permanecessem mergulhadas em sua fragilidade fiscal.
Não há dúvidas que o momento exige uma considerável revisão da pactuação
das políticas descentralizadas, bem como uma reforma fiscal. Acredito que o custo e as
restrições do ajuste fiscal para os centros urbanos mais endividados do País, são
acontecimentos que configuraram a deformação do pacto federativo.
Diante disso, a maioria das capitais permanece inserida em uma encruzilhada:
enfrentar o dilema entre o aumento da participação dos recursos próprios na estrutura
orçamentária e, em paralelo, a multiplicidade de restrições fiscais e as regulamentações
que cercam a municipalização das políticas públicas, causando severa rigidez
orçamentária, mesmo diante do esforço realizado para o aumento da arrecadação dos
recursos próprios.
Os resultados têm um custo social e econômico nefasto para todas as regiões do
País. Um cenário da mais completa ausência e abandono de muitas políticas públicas de
investimento urbano. E, claro, a fatura do descaso é remetida para a população mais
vulnerável e desassistida pelo Estado.
Dessa forma, sem cooperação e integração federativa, todos os dias, milhares de
demandas batem à porta municipal. Entretanto, as ações realizadas têm sido
insuficientes. Torna-se inadiável uma discussão ampla e profunda sobre a necessidade
de promovermos uma reforma fiscal que seja capaz de discutir o papel do Estado
brasileiro nas políticas públicas.
As 26 capitais, com autonomia orçamentária restringida, têm sido forçadas a
colocarem em segundo plano uma parte das suas atribuições constitucionais, sem que
isso traga à baila a urgência do revigoramento do pacto federativo.
Estas observações nos indicam a urgência com que é preciso discutir o processo
da descentralização fiscal do País, que explicitamente padece de padrões mínimos na
prestação de determinados serviços. Na medida em que o nível mínimo de gasto seja
definido, os governos superiores deveriam ser forçados a buscarem alguma forma de
ajustamento, como por exemplo, transferir mais recursos e auxiliá-los tecnicamente no
tratamento dos setores descentralizados.
Acredito que é necessário repensar a pactuação federativa vigente, criar de fato
instrumentos que possam fazer a gestão das políticas públicas, e retomar o debate que
dê conta de discutir a partilha dos recursos, e a divisão de funções mais clara de cada
esfera de governo na prestação dos serviços públicos, sem sobreposição de tarefas, sem
176
omissão e, acima de tudo, com ações integradas e cooperativas necessárias, com o
cuidado de legitimar o papel das agências metropolitanas. Só então, será possível
enfrentar, em bases firmes, os principais problemas federativos, que hoje, parecem ter
ficado no discurso e na aprovação formatada no texto constitucional de 1988.
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189
7. Anexos
ANEXO 1:

Tabela 27- Evolução da população urbana brasileira, em %, período: 1872 – 2000

POPULAÇÃO URBANA População


ANO
em % Total
1872 5,9 10.112.061
1890 6,8 14.333.915
1900 9,4 18.200.000
1920 10,7 27.500.000
1940 31,24 41.252.944
1950 36,16 51.944.000
1960 45,08 70.191.370
1970 56 93.139.037
1980 67,59% 119.002.706
1990 75,59% 150.400.000
2000 81,25% 169.799.170
Fonte: Santos, Milton (1996:20); IBGE Séries
Históricas e Estatísiticas. Elaboração Própria.
Acesso realizado em 6/01/2009.
http://www.ibge.gov.br/series_estatisticas

ANEXO 2:
Tabela 28 - Despesas da União por Função União: 1995-1999
1

190
ANEXO 3:
Tabela 29 - Despesas da União por Função: 2000-2010
DESPESAS GOVERNO FEDERAL - FUNÇÃO 2.000 2.001 2.002 2.003 2.004 2.005 2.006 2.007 2.008 2.009 2.010
Legislativa 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 0,5% 0,39% 0,45%
Judiciária 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2%
Essencial à Justiça 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0,40% 0,38% 0,43%
Administração 2% 2% 2% 1% 2% 1% 1% 1% 1% 1% 2%
Defesa Nacional 3% 3% 3% 2% 2% 3% 2% 2% 2% 2% 3%
Segurança Pública 1% 1% 1% 0% 1% 0% 0% 1% 1% 1% 1%
Relações Exteriores 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0%
Assistência Social 1% 1% 1% 2% 3% 3% 3% 3% 3% 3% 4%
Previdência Social 30% 28% 28% 29% 30% 31% 27% 29% 28% 27% 31%
Saúde 6% 6% 6% 6% 6% 6% 5% 5% 5% 5% 5%
Trabalho 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 3% 3%
Educação 3% 3% 3% 3% 3% 3% 2% 2% 2% 3% 4%
Cultura 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0,06% 0,06% 0,08%
Direitos da Cidadania 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0,10% 0,10% 0,13%
Urbanismo 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0,12% 0,15% 0,18%
Habitação 1% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0,02% 0,01% 0,00%
Saneamento 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0,05% 0,08% 0,05%
Gestão Ambiental / Desenvolivmento Regional 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0,15% 0,14% 0,19%
Ciência e Tecnologia 0% 0% 0% 0% 0% 1% 0% 0% 0,43% 0,45% 0,51%
Agricultura 2% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 0,83% 1,02% 0,85%
Organização Agrária 0% 0% 0% 0% 0% 1% 1% 0% 0,27% 0,23% 0,21%
Indústria 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0,23% 0,12% 0,14%
Comércio e Serviços 1% 1% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0,15% 0,13% 0,14%
Comunicações 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0,04% 0,03% 0,05%
Energia 0% 0% 2% 1% 0% 0% 0% 0% 0,05% 0,06% 0,05%
Transporte 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 0,52% 0,77% 1,13%
Desporto e Lazer 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0,02% 0,01% 0,02%
Encargos Especiais 42% 46% 45% 47% 44% 42% 50% 47% 50% 50% 42%
SUBTOTAL Orçamento Fiscal (A) 2.612.217.891.177,95 2.738.694.102.760,68 2.476.993.671.381,75 2.329.651.666.290,59 2.217.694.934.897,41 2.215.999.604.362,27 2.738.251.057.185,78 2.487.136.254.392,20 2.573.561.377.420,19 2.756.115.710.224,84 2.399.317.419.243,43
Encargos Especiais - Refinanciamento (B) 2.492.475.949.934,65 1.571.869.312.514,81 1.330.348.454.529,48 1.808.962.319.496,98 1.486.259.228.914,64 1.825.045.075.025,10 1.293.328.267.617,34 1.178.860.280.991,47 779.008.393.341,00 684.698.299.027,21 858.132.166.521,03
Refinanciamento da Dívida Mobiliária 98% 96% 97% 98% 98% 99% 99% 100% 99% 85% 85%
Correção Monetária e Cambial da Dívida Mobiliária 2% 4% 3% 2% 2% 1% 1% 0% 0% 14% 14%
Refinanciamento da Dívida Contratual 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 1% 1% 1%
Correção Monetária e Cambial da Dívida Contratada 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0%
TOTAL (A+B) 5.104.693.841.112,60 4.310.563.415.275,48 3.807.342.125.911,23 4.138.613.985.787,56 3.703.954.163.812,05 4.041.044.679.387,37 4.031.579.324.803,12 3.665.996.535.383,67 3.352.569.770.761,19 3.440.814.009.252,05 3.257.449.585.764,45
Fonte: SIAFI - STN/CCONT/GEINC, vários anos. Elaboração Própria.
Valores atualizados com base no IPCA IBGE de março de 2018.
2

191
ANEXO 04:
Tabela 30 - Estoque do Exigível de longo prazo municipal e das 26 capitais: 2000-2010
MUNICÍPIOS / ANO 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
SAO PAULO 48.799.682.741,32 54.464.282.472,30 64.791.958.612,84 68.672.285.106,48 76.838.509.391,90 65.145.603.074,84 66.145.175.465,04 66.825.713.494,63 70.235.343.783,21 66.624.949.392,38 75.572.849.302,24
RIO DE JANEIRO 13.720.440.681,24 13.807.147.225,41 17.083.298.048,84 15.493.262.838,79 16.018.478.840,86 14.809.434.701,82 14.403.924.224,45 13.866.613.680,20 14.589.398.613,01 13.211.981.297,19 14.712.337.584,74
BELO HORIZONTE 1.862.740.094,92 1.358.169.159,05 1.461.582.615,95 1.257.779.019,17 1.186.163.421,09 1.071.763.985,50 1.024.665.821,94 1.826.841.221,01 2.060.119.344,72 2.191.810.815,14 1.951.574.895,49
BELEM 174.021.995,89 10.110.522,26 2.689.786,00 147.385.036,77 154.690.550,14 228.417.371,34 209.111.483,72 180.800.000,04 2.578.839.101,81 3.379.439.794,83 3.272.527.557,69
SALVADOR 2.370.813.407,62 2.363.416.867,44 3.371.751.431,97 2.915.696.204,58 3.559.935.183,48 2.541.485.761,16 3.312.033.076,68 3.214.940.560,88 3.013.092.946,16 2.739.310.601,14 3.393.913.021,68
TERESINA - - 169.294.081,48 - - 122.822.856,25 360.649.005,47 1.157.918.540,21 2.224.656.178,31 2.250.811.531,19 2.796.293.092,58
MACEIO 1.056.004.534,33 884.852.305,56 - - - 796.495.681,33 729.327.638,85 671.205.158,72 630.059.154,67 427.476.813,05 -
CAMPO GRANDE 251.641.831,88 233.439.614,74 297.244.502,70 346.632.364,06 325.347.496,31 - - - 303.682.776,07 344.381.744,89 352.784.658,35
CURITIBA 1.074.927.459,37 990.207.167,63 1.470.593.568,31 1.272.215.183,36 1.068.283.195,65 813.017.309,35 703.436.334,10 6.317.308.995,69 939.278.450,77 2.053.414.114,77 1.511.670.916,08
PORTO ALEGRE 898.348.426,07 948.767.037,13 1.459.580.760,28 1.304.867.740,01 1.223.303.700,76 1.210.776.923,40 1.164.942.242,47 1.044.350.814,23 1.088.351.034,72 1.141.940.778,69 1.125.539.898,02
PORTO VELHO 39.284.032,39 19.386.650,79 86.243.405,36 720.419.002,91 703.441.237,80 658.340.935,57 493.968.898,91 754.103.164,20 699.952.470,15 891.625.348,62 1.176.406.225,15
RECIFE 745.915.691,54 765.399.817,00 910.622.632,24 877.756.157,83 1.121.045.678,97 1.189.422.115,75 1.249.832.192,41 1.546.070.814,33 1.358.634.365,16 1.326.005.271,51 1.319.805.232,90
VITORIA - 213.583.702,11 209.799.645,24 192.515.371,28 224.490.955,48 196.649.884,11 173.528.350,13 150.387.397,18 137.041.480,18 185.390.766,54 230.707.992,76
GOIANIA - 909.703.071,89 - 832.362.355,11 799.210.357,85 775.874.137,15 786.366.970,09 756.899.125,49 716.581.189,49 692.384.531,44 672.595.353,63
CUIABA 541.721.213,12 560.875.273,93 660.161.324,87 665.403.279,11 755.300.771,94 601.986.694,09 647.651.436,93 - 555.482.078,86 526.110.693,17 494.470.437,68
FLORIANOPOLIS 319.003.958,26 149.860.237,62 170.553.538,19 313.809.776,69 333.723.941,83 327.954.998,87 360.905.354,79 325.621.534,58 382.964.000,12 352.372.432,22 459.208.151,70
MANAUS 354.415.919,46 370.970.626,08 424.508.803,05 322.126.466,64 264.862.882,21 199.438.656,58 198.756.504,04 196.318.859,76 346.838.273,52 394.327.072,40 397.381.152,74
RIO BRANCO 111.942.479,64 147.535.954,91 114.836.409,50 130.691.440,75 121.984.373,12 114.820.233,75 111.950.031,47 140.144.886,22 166.052.470,41 149.061.085,40 140.723.415,45
PALMAS 40.356.672,64 35.664.346,21 30.297.867,14 28.622.741,30 27.980.776,73 33.364.567,09 39.507.984,31 39.278.526,00 34.760.898,60 - 230.200.846,93
NATAL - - 202.920.622,53 - 186.052.257,65 225.873.463,82 249.867.237,14 - - - 323.781.615,18
MACAPA - - - 84.931.487,53 73.986.363,64 62.223.616,32 58.249.820,69 55.764.224,92 53.191.222,24 363.311.416,81 338.217.338,83
ARACAJU 227.518.247,45 122.649.825,85 192.125.150,96 154.947.671,18 135.125.922,82 110.280.732,40 162.373.743,30 140.948.921,50 159.103.695,21 177.147.945,03 213.816.361,35
SAO LUIS 140.260.790,33 159.690.465,54 114.853.304,51 123.902.040,62 109.697.387,18 96.323.818,78 71.593.176,73 84.498.961,58 - - 79.054.439,58
BOA VISTA 33.056.412,98 24.980.277,23 19.921.474,77 - 97.809.480,66 94.929.867,92 90.578.738,52 78.482.595,35 98.826.361,75 - -
FORTALEZA 649.856.446,47 85.142.099,46 55.607.311,54 42.648.094,47 39.635.538,26 31.205.632,46 1.780.266,07 450.778.188,95 522.012.609,32 458.689.263,18 -
JOAO PESSOA 129.125.486,23 118.870.522,62 108.060.576,68 109.592.616,34 433.189.362,86 300.574.463,22 340.496.557,26 281.670.978,31 248.157.110,05 - 183.958.760,60
Total Dívida 26 Capitais (A) 73.541.080.523,16 78.744.707.243,76 93.408.507.476,96 96.009.853.997,97 105.802.251.073,18 91.759.083.487,87 93.090.674.561,51 100.106.662.650,97 103.142.421.616,53 99.881.944.718,60 110.949.820.261,35
Total Dívida Municipal (B) 102.324.547.817,96 111.005.963.223,67 127.497.815.136,88 137.094.069.138,17 144.684.207.696,33 141.922.290.449,27 154.352.095.647,46 175.717.577.646,21 179.803.576.204,11 207.657.035.699,03 227.774.636.939,32
A/B 72% 71% 73% 70% 73% 65% 60% 57% 57% 48% 49%
FONTE: FINBRA, vários anos.
Valores Corrigidos pelo IPCA-IBGE, março de 2018. Em R$ 1,00.
1
192
ANEXO 05:

Tabela 31 - Estoque do Exigível de longo prazo das 26 Capitais, ano


1998, anterior à renegociação da dívida

Estoque de Dívida
MUNICÍPIOS População
Longo Prazo 1998
ARACAJU 460.898 151.692.449,14
BELEM 1.279.861 148.596.491,06
BELO HORIZONTE 2.229.697 1.781.531.776,67
BOA VISTA 200.383 29.938.373,69
CAMPO GRANDE 662.534 251.510.363,54
CUIABA 482.498 316.535.385,34
CURITIBA 1.586.898 -
FLORIANOPOLIS 331.784 231.482.539,65
FORTALEZA 2.138.234 392.844.186,36
GOIANIA 1.090.581 -
MACAPA 282.745 -
MACEIO 796.842 573.472.129,91
MANAUS 1.403.796 309.506.065,08
NATAL 709.422 -
PALMAS 136.554 46.706.565,13
PORTO ALEGRE 1.359.932 693.251.129,11
RECIFE 1.421.947 608.214.400,65
RIO BRANCO 252.800 50.986.385,97
RIO DE JANEIRO 5.850.544 10.375.489.240,66
SALVADOR 2.440.886 2.248.246.069,67
SAO LUIS 867.690 105.266.606,41
SAO PAULO 10.406.166 37.144.374.261,11
TERESINA 714.318 -
VITORIA 291.889 121.008.392,80
TOTAL 26 capitais 37.398.899 55.580.652.811,94
Fonte: FINBRA 1998. Elaboração Própria.
Valores Corrigidos pelo IPCA-IBGE, março de 2018.
2
193
ANEXO 06:

Plano de Contas das Receitas Municipais

Figura 5 - Receitas Correntes Próprias Municipais


1000.00.00 Receitas Correntes
1100.00.00 Receita Tributária
1110.00.00 Impostos
1112.02.00 Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana - IPTU
1112.04.00 Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza - IR
1112.08.00 Imposto sobre Transmissão "Inter Vivos" de Bens Imóveis e de Direitos Reais sobre Imóveis ITBI
1113.05.00 Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISSQN
1120.00.00 Taxas
1130.00.00 Contribuição de Melhoria
1200.00.00 Receita de Contribuições
1300.00.00 Receita Patrimonial
1400.00.00 Receita Agropecuária
1500.00.00 Receita Industrial
1600.00.00 Receita de Serviços
1900.00.00 Outras Receitas Correntes
1910.00.00 Multas e Juros de Mora
1911.00.00 Multas e Juros de Mora dos Tributos
1912.00.00 Multas e Juros de Mora das Contribuições
1913.00.00 Multa e Juros de Mora da Dívida Ativa dos Tributos
1914.00.00 Multa e Juros de Mora da Dívida Ativa das Contribuições
1915.00.00 Multa e Juros de Mora da Dívida Ativa de Outras Receitas
1918.00.00 Multas e Juros de Mora de Outras Receitas
1919.00.00 Multas de Outras Origens
1920.00.00 Indenizações e Restituições
1921.00.00 Indenizações
1922.00.00 Restituições
1923.01.00 Retorno de Investimentos Mediante Participação em Empresas e Projetos
1930.00.00 Receita da Dívida Ativa
1931.00.00 Receita da Dívida Ativa Tributária
1932.00.00 Receita da Dívida Ativa não tributária
1940.00.00 Receitas Decorrentes de Aportes Periódicos para Amortização de Déficit Atuarial do RPPS
1990.00.00 Receitas Diversas
3
194
Figura 6 - Transferências da União: Constitucionais e Convênios
1000.00.00 Receitas Correntes
1700.00.00 Transferências Correntes
1720.00.00 Transferências Intergovernamentais
1721.00.00 Transferências CONSTITUCIONAIS da União
1721.01.02 Cota-Parte do Fundo de Participação dos Municípios - FPM
1721.01.05 Cota-Parte do Imposto Sobre a Propriedade Territorial Rural - ITR
1721.01.12 Cota-Parte do Imposto Sobre Produtos Industrializados – Estados Exportadores de
1721.22.00 Transferência da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Naturais
1721.22.11 Cota-parte da Compensação Financeira de Recursos Hídricos
1721.22.20 Cota-parte da Compensação Financeira de Recursos Minerais - CFEM
1721.22.30 Cota-parte Royalties – Compensação Financeira pela Produção de Petróleo – Lei nº7.990/89
1721.22.40 Cota-parte Royalties pelo Excedente da Produção do Petróleo – Lei nº 9.478/97, artigo49, I e II
1721.22.50 Cota-parte Royalties pela Participação Especial – Lei nº 9.478/97, artigo 50
1721.22.70 Cota-Parte do Fundo Especial do Petróleo – FEP
1721.22.90 Outras Transferências decorrentes de Compensação Financeira pela Exploração de
1721.33.00 Transferência de Recursos do Sistema Único de Saúde – SUS
Registra o valor total dos recursos transferidos do Fundo Nacional de Saúde recebidos pelos
Fundos de Saúde dos Municípios, referentes ao Sistema Único de Saúde – SUS, (Piso de
Atenção Básica – Fixo e Variável, Transferências de Alta e Média Complexidade, Outros
Programas Financiados por repasses regulares e automáticos). Os recursos relativos a
pagamentos diretos da União pela remuneração de serviços produzidos deverão ser
classificados no código 1600.05.00 – Serviços de Saúde.
1721.99.00 Outras Transferências da União
1761.00.00 Transferências VOLUNTÁRIAS - Convênios da União
1761.01.00 Transferências de Convênios da União para o Sistema Único de Saúde – SUS
1761.02.00 Transferências de Convênios da União Destinadas a Programas de Educação
1761.03.00 Transferências de Convênios da União Destinadas a Programas de Assistência Social
1761.04.00 Transferências de Convênios da União Destinadas a Programas de Combate à Fome
1761.05.00 Transferências de Convênios da União Destinadas a Programas de Saneamento Básico
1761.99.00 Outras Transferências de Convênios da União

Figura 7 - Transferências correntes MULTIGOVERNAMENTAIS: União e


Estados
1724.00.00 Transferências CONSTITUCIONAIS Multigovernamentais
1724.01.00 Transferências de Recursos do FUNDEB
1724.02.00 Transferências de Recursos da Complementação da União ao FUNDEB
1724.99.00 Outras Transferências Multigovernamentais
4
195
Figura 8 - Transferências do Estado: Constitucionais e Convênios
1722.00.00 Transferências CONSTITUCIONAIS dos Estados
1722.01.01 Cota-Parte do ICMS
1722.01.02 Cota-Parte do IPVA
1722.01.04 Cota-Parte do IPI sobre Exportação
1722.01.13 Cota-Parte da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico CIDE
1722.01.99 Outras Participações na Receita dos Estados
1722.22.00 Transferência da Cota-parte da Compensação Financeira (25%)
1722.22.11 Cota-parte da Compensação Financeira de Recursos Hídricos
1722.22.20 Cota-parte da Compensação Financeira de Recursos Minerais - CFEM
1722.22.30 Cota-parte Royalties – Compensação Financeira pela Produção do Petróleo – Lei nº7.990/89
1722.22.90 Outras Transferências Decorrentes de Compensações Financeiras
1722.33.00 Transferência de Recursos do Estado para Programas de Saúde – Repasse Fundo a Fundo
Registra o valor de receita da transferência de recursos do Sistema Único de Saúde oriundo
do Fundo Estadual de Saúde para o Fundo Municipal de Saúde (Ações Básicas de Vigilância
Sanitária, Atenção à Saúde dos Povos Indígenas, Programa de Assistência Farmacêutica
Básica, Programa de Combate às Carências Nutricionais, Programa de Saúde da Família,
Programa de Agentes Comunitários, Programa Nacional de Vigilância Epidemiológica e
Controle de Doenças e outros).
1762.00.00 Transferências VOLUNTÁRIAS - Convênios dos Estados
1762.01.00 Transferências de Convênio dos Estados para o Sistema Único de Saúde – SUS
1762.02.00 Transferências de Convênio dos Estados Destinadas a Programas de Educação
1762.99.00 Outras Transferências de Convênio dos Estados

Figura 9 - Transferências Instituições Privadas e Receitas de Capital


1000.00.00 Receitas Correntes
1700.00.00 Transferências Correntes
1763.00.00 Transferências VOLUNTÁRIAS - Convênios dos Municípios
1763.01.00 Transferências de Convênio dos Municípios para o Sistema Único de Saúde – SUS
1763.02.00 Transferências de Convênio dos Municípios destinadas a Programas de Educação
1763.99.00 Outras Transferências de Convênios dos Municípios
1764.00.00 Transferências de Convênios de Instituições Privadas
1765.00.00 Transferência de Convênios do Exterior
1770.00.00 Transferências para o Combate à Fome
1771.00.00 Provenientes do Exterior
1772.00.00 Provenientes de Pessoas Jurídicas
1773.00.00 Provenientes de Pessoas Físicas
1774.00.00 Provenientes de Depósitos não Identificados
2000.00.00 Receitas de Capital
2100.00.00 Operações de Crédito
2110.00.00 Operações de Crédito Internas
2120.00.00 Operações de Crédito Externas
2400.00.00 Transferências de Capital
2470.00.00 Transferências de Convênios
2473.00.00 Transferências de Convênios dos Municípios
2474.00.00 Transferências de Convênios de Instituições Privadas
2475.00.00 Transferências de Convênios do Exterior
2480.00.00 Transferências para o Combate à Fome
2500.00.00 Outras Receitas de Capital
FONTE: MANUAL DE CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PÚBLICO- Portaria STN nº 437/2012/ 5ª Edição. ANEXO VI – DISCRIMINAÇÃO DAS NATUREZAS
DE RECEITA
5
196
ANEXO 07:
Tabela 32 - Investimento per capita por intervalos municipais com maior
e menor população federativa
Investimento
Municípios População Investimentos (*) Per Capita
Médio
26 capitais + municípios acima de 1 Milhão Habitantes 54.710.964 R$ 15.551.483.303
Média 1.272.348 361.662.402 289
Mediana 723.515 R$ 198.477.754 R$ 217
Mínimo 228.332 R$ 34.682.072 R$ 75
Máximo 11.253.503 R$ 3.674.586.850 R$ 1.002
Municípios com 805 a 10 Mil Habitantes 12.578.054 R$ 5.553.449.816
Média 5.140 R$ 2.269.493 R$ 442
Mediana 4.871 R$ 1.835.525 R$ 392
Mínimo 805 R$ - R$ -
Máximo 9.981 R$ 60.307.994 R$ 16.330
FONTE: STN/FINBRA, ano 2010. Elaboração Própria.
(*) Valores Corrigidos pelo IPCA-IBGE a preços de março de 2018.
6
197

ANEXO 08:
Tabela 33 - Evolução do Investimento no orçamento total, 26 Capitais,
anos: 1995;2001;2005;2009 e 2010, em %
Participação dos Investimentos no Orçamento Total - em %
MUNICIPIO 1995 2001 2005 2009 2010
SAO PAULO 26% 5% 4% 8% 8%
RIO DE JANEIRO 17% 7% 7% 4% 11%
SALVADOR 0% 13% 5% 6% 5%
FORTALEZA 12% 11% 3% 8% 9%
BELO HORIZONTE 1% 1% 8% 17% 11%
MANAUS 32% 15% 6% 9% 16%
CURITIBA 16% 4% 4% 5% 3%
RECIFE 2% 3% 5% 7% 7%
PORTO ALEGRE 9% 8% 5% 6% 8%
BELEM 15% 8% 5% 9% 8%
GOIANIA 4% 9% 7% 9% 6%
SAO LUIS 14% 11% 6% 5% 0%
MACEIO 9% 4% 5% 5% 5%
TERESINA 1% 6% 8% 13% 9%
NATAL 2% 8% 7% 12% 5%
CAMPO GRANDE nd 25% 11% 16% 17%
JOAO PESSOA 7% 13% 4% 11% 11%
ARACAJU 8% 8% 10% 9% 7%
CUIABA 8% 9% 4% 6% 5%
PORTO VELHO 10% 14% 6% 17% 24%
FLORIANOPOLIS 8% 14% 9% 10% 12%
MACAPA 6% 8% 7% 8% 5%
RIO BRANCO 7% 19% 12% 20% 11%
VITORIA 19% 13% 8% 17% 17%
BOA VISTA 21% 13% 15% 18% 27%
PALMAS 35% 26% 20% 8% 9%
Média 12% 11% 7% 10% 10%
Mediana 9% 9% 6% 9% 9%
Mínimo 0% 1% 3% 4% 0%
Máximo 35% 26% 20% 20% 27%
FONTE: STN/FINBRA, vários anos. Elaboração própria.
1

198
ANEXO 09:

Tabela 34 - Resultado Primário do Governo Central. Em R$ Milhões - Valores de Março 2018 / IPCA

Discriminação 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
I. RECEITA TOTAL 548.833,1 623.092,1 652.579,3 691.279,8 738.677,7 776.853,5 790.866,2 864.738,5 952.590,7 1.027.680,6 1.120.746,1 1.224.745,7 1.211.048,2 1.422.959,0
II. TRANSF. POR REPARTIÇÃO DE RECEITA 83.677,1 92.203,8 95.181,3 107.926,6 117.615,7 126.260,6 126.423,2 132.171,3 156.655,9 171.005,7 184.721,1 217.969,4 196.358,5 206.612,9
III. RECEITA LÍQUIDA (I-II) 465.155,9 530.888,4 557.398,0 583.353,2 621.062,0 650.592,9 664.443,0 732.567,1 795.934,9 856.674,9 936.024,9 1.006.776,2 1.014.689,7 1.216.346,1
IV. DESPESA TOTAL 458.940,6 505.162,2 494.552,5 521.645,2 561.689,7 573.947,5 577.657,4 630.733,9 693.077,8 764.381,8 831.535,2 860.134,5 949.986,0 1.095.679,6
V. FUNDO SOBERANO DO BRASIL 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 -24.378,0 0,0 0,0
VI. PRIMÁRIO GOVERNO CENTRAL 6.215,3 25.726,2 62.845,4 61.708,0 59.372,3 76.645,4 86.785,6 101.833,2 102.857,1 92.293,1 104.489,7 122.263,7 64.703,7 120.666,5
VII.1 AJUSTE METODOLÓGICO ITAIPU 1 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 5.436,8 4.686,0 4.904,6 3.240,2 2.103,7 2.252,8 2.103,6
VII.2 AJUSTE METODOLÓGICO CAIXA-COMPETÊNCIA 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0
VIII. DISCREPÂNCIA ESTATÍSTICA -14.414,4 -8.608,8 7.816,0 -1.622,2 662,9 829,9 -746,5 845,0 1.305,4 24,2 1,1 -2.326,9 2.680,5 -814,6
IX. RESULTADO PRIMÁRIO GOVERNO CENTRAL (VI + VII + VIII) -8.199,1 17.117,4 70.661,4 60.085,7 60.035,2 77.475,3 86.039,1 108.115,1 108.848,5 97.221,9 107.731,0 122.040,4 69.637,0 121.955,5
X. JUROS NOMINAIS 3/ -65.342,4 -170.245,3 -152.742,0 -133.658,2 -129.066,0 -101.818,4 -224.062,1 -163.907,7 -251.953,3 -238.222,5 -215.767,0 -164.639,9 -245.788,7 -192.884,9
XI. RESULTADO NOMINAL DO GOVERNO CENTRAL (IX + X) 2/ -73.541,5 -153.127,9 -82.080,6 -73.572,5 -69.030,8 -24.343,1 -138.023,0 -55.792,7 -143.104,8 -141.000,6 0,0 -42.599,5 -176.151,7 -70.929,4
Fonte: http://stn.gov.br/web/stn/demonstrativos-fiscais
1/ Recursos transitórios referentes à amortização de contratos de Itaipu com o Tesouro Nacional.
2/ Pelo critério "abaixo-da-linha" sem desvalorização cambial. Fonte: Banco Central do Brasil.

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