ARTIGO ERGONOMIA

Mais respeito à anatomia

Assentos com encosto convexo inovam
o conceito de ergonomicamente correto

E
m um trabalho pioneiro, aprofun-
damos estudos da biomecânica
humana na posição sentada, do-
cumentados através de estudos ra-
diográficos específicos, ajustando
com precisão os graus, ângulos e curvaturas
da coluna junto ao encosto das cadeiras.
O artigo refere-se ao projeto que desen-
volvemos sobre disposição construtiva a-
plicável à cadeira para escritórios, consul-
tórios, bancos de carro e outros ambientes
onde as pessoas permanecem na posição
sentada por um período de tempo mais pro-
longado, cuja finalidade é oferecer maior
proteção à coluna vertebral, e diminuir a
fadiga da musculatura paravertebral e a pres-
são dos discos intervertebrais.
Na posição sentada, o peso de uma pes-
soa é dividido em três forças: apoio dos
pés, das coxas e do quadril, sendo que a
parte principal do peso corporal é transfe-
rida para o assento. Quando se está sentado
corretamente, 16% do peso corporal é des-
carregado nos pés, 34% na região pos-
terior da coxa e a maior parte, 50%, é distri-
buído pelo quadril. Daí a importância de
uma cadeira ergonomicamente correta.
Uma pessoa sentada em uma cadeira ade-
quada, isto é, com apoio correto, mantém
suas curvaturas anatômicas originais seme-
lhantes às de uma pessoa em pé. Ao contrá-
rio, no caso de uma pessoa sentada sem a-
poio dorsal ou em cadeira que não permita
um posicionamento adequado - na qual o
apoio é torácico e não lombar - ocorre, não
apenas a perda, mas a inversão da curvatura
lombar. Isso faz com que a coluna seja pro-
jetada para trás, formando uma cifose lombar
única, o que aumenta a pressão nos discos.
Se o ângulo do encosto da cadeira for de
90º, isto é, encosto reto, as costas ficarão
apoiadas, mas não haverá distribuição de
peso pelo encosto, sobrecarregando o qua-
dril. Conseqüentemente, a coluna tem que
aumentar o esforço para manter-se nessa
situação desarmônica.
Em um assento adequado, o encosto deve deve manter-se em ângulo de flexão de 90º) vem para trás, giram e balançam para as la-
apoiar por inteiro a curvatura da coluna lom- e o quadril devem ficar bem alinhados, e os terais de forma imprópria. Tudo isso resulta
bar, deixando toda a extensão da coluna pés apoiados. em constantes agressões, gerando dores e
vertebral bem alinhada. Para isso, o encosto No entanto, a fabricação de móveis ge- tratamentos intermináveis.
não deve estar muito afastado; o joelho (que ralmente não respeita conceitos primários
de qualidade quanto à ergonomia. No caso ENCOSTO CONVEXO
Gilberto Fonseca específico de cadeiras, desde os modelos A tecnologia foi produzida no intuito de
Consultor ergonômico em ambientes de trabalho mais comuns e populares até os mais mo- desenvolver uma cadeira que alie conforto
sentado, pesquisador da biomecânica humana. dernos e sofisticados, a grande maioria apre- e posicionamento adequado dos usuários,
E-mail: gilberto@ergomtec.com
Home-page: www.ergomtec.com
senta características bastante agressivas em apresentando, entre outras características
relação ao sistema músculo-esquelético das inéditas, encosto convexo, de encaixe per-
Sérgio Sá costas. Então, temos cadeiras com variações feito na região lombar. Em outras palavras,
Fisioterapeuta e pesquisador da biomecânica de encosto que vão do encosto excessiva- esse projeto leva em conta o tamanho exato
humana – consultor ergonômico – Pirapora/MG mente alto, sem curvaturas adequadas, ao do arco e o grau acentuado de curvatura des-
E-mail: ergom@uai.com.br encosto rígido, com ângulo de 90º, que reti- sa região do corpo. Isso, portanto, evita a
Home-page: www.ergomtec.com fica a lordose. Há ainda cadeiras que se mo- agressão aos discos intervertebrais lomba-
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Desenho 1 - Comparações radiográficas Os estudos foram realizados no Departa-
mento de Ergonomia do Hospital São Se-
bastião e contaram com a parceria da Funam
- Fundação Educacional Alto-Médio São
Francisco (Escola Técnica).

GRÁFICO
A partir de uma pesquisa dos notáveis
(Akerblom, Nachemson & Morris e Ander-
son), apresentamos um estudo deduzido da
pressão intradiscal em posição sentada na
cadeira ergonômica (observe segundo qua-
drante do Gráfico 1).
O Gráfico 1 apresenta, no primeiro qua-
drante, uma pessoa deitada, indicando os
mais baixos índices de pressão intradiscal
por não transferir o peso do corpo para a
coluna.
No segundo quadrante, a cadeira ergo-
nômica, estudada e projetada em laborató-
Observe as radiografias acima. Na cadeira à esquerda, a radiografia destaca como a coluna torna-se
reta ao acompanhar a trajetória do encosto, que é reto. Na cadeira à direita, a radiografia constata rio, preenche todo o arco da coluna lombar,
como o encosto acomoda com precisão as curvaturas lombares. Conclusão: coluna reta = fadiga perfazendo um ângulo em torno de 42,5°,
muscular, pressão intradiscal aumentada, sujeita a dores e pinçamentos de raízes nervosas. Já no sendo responsável pelo segundo menor ín-
encosto que acompanha com precisão a curvatura da coluna, houve proteção e respeito ao desenho da dice de pressão discal.
anatomia, melhor acomodação da musculatura paravertebral, menor pressão intradiscal e maior esta-
bilidade e segurança no ato de sentar-se.
(Estudos de ângulos e graus através de radiografias – Laboratório de Ergonomia, Hospital São Sebas- ESTUDO RADIOGRÁFICO
tião, Sérgio Sá e Gilberto Fonseca, 2001). Nos estudos realizados no Laboratório de
Ergonomia do Hospital São Sebastião, foi
res, que são capazes de irradiar dor para os pesquisados. Esse índice de aceitação dos constatado, pelos raios-x, alterações signifi-
membros inferiores. participantes da pesquisa mostra dados fa- cativas que ocorreram durante a passagem
As características construtivas, inovações voráveis para o aprimoramento no merca- da posição de pé para a sentada.
e os benefícios resultantes da cadeira pode- do de cadeiras. Também foi analisado como o esqueleto
rão ser perfeitamente compreendidos atra-
vés do estudo radiográfico apresentado no Gráfico 1 - Pressão intradiscal
Desenho 1.

TESTES E ADAPTAÇÕES
Nesse estudo, foram testadas a qualidade
de diversas cadeiras encontradas no merca-
do para o desenvolvimento de um novo tipo
de assento.
Paralelamente, foram adaptados e adequa-
dos vários tipos de cadeiras: para digitador,
para executivo, para sala de jantar e para
restaurante, cadeira para bar, poltrona e ban-
co de carro, variando dos assentos mais sim-
ples aos mais sofisticados. A maioria das
cadeiras encontradas no mercado tem o
encosto ora muito afastado, ora retificando
a coluna. Além disso, muitas apresentam
alturas e ângulos indesejáveis, causando
desconforto ao usuário.

RESULTADOS
Foram confeccionadas e testadas 700 ca-
deiras ergonômicas para digitadores e exe-
cutivos. Os testes foram realizados durante
dois anos com período médio de seis meses
para cada usuário. O público alvo foram os
portadores de dores lombares e aqueles que
permanecem grande parte do tempo traba-
lhando sentados. Dos 700 entrevistados,
68% estavam queixosos de desconfortos ou
dores lombares posturais. Destes, 90% sen-
tiram alívio com o uso das novas cadeiras,
provando que cadeira com apoio lombar
adequado diminui substancialmente a pres-
são dos discos intervertebrais, além de re-
laxar e acomodar a musculatura paraverte-
bral. O relato de mais conforto e bem-estar
com o uso da cadeira partiu de 96,6% dos
N (Newtons)
No terceiro quadrante, a pessoa está em pé. O peso do tronco se projeta sobre a coluna distribuído
equilibradamente nas suas curvaturas.
No quadrante seguinte, é notória a pressão discal muito aumentada por se tratar de uma cadeira anti-
ergonômica, com encosto reto. A tendência da coluna é procurar se adequar ao alinhamento do
encosto.
Para essa mudança ocorrer, a coluna é forçada a se retificar, perdendo sua curvatura fisiológica.
O último quadrante mostra uma pessoa sentada, sem apoio para as costas, tendo a maior pressão discal
entre todas as citadas. Sem apoio, a pessoa se projeta para frente, as curvaturas naturais da coluna em
forma de “S” se desfazem por completo, formando uma grande cifose em forma de “C”.
Isso vem comprovar a importância de se conseguir uma cadeira com encosto fiel à curvatura lombar,
deixando a coluna alinhada em seu trajeto fisiológico.

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ARTIGO ERGONOMIA
Desenho 2 - Cadeira com encosto reto
Observe como a coluna desfaz suas curvas e se
modela ao trajeto da cadeira. A coluna se retifica
por completo e o sacro se alinha. Sentado em uma
cadeira reta, a 90º, ocorrerá uma fadiga muscular
postural e a pessoa tende a relaxar, formando uma
cifose compensatória. (Laboratório de Ergonomia
do Hospital São Sebastião, Sérgio Sá e Gilberto
Fonseca, 2002).
Desenho 3 - Encosto curvo (cadeira
ergonômica)
Com apoio integral da profundidade lombar, essa
cadeira foi confeccionada e testada em laborató-
rio. Percebe-se como a curvatura lombar foi mol-
dada e preservada, mantendo suas curvas no seu
desenho anatômico, próximo ao original. O sacro
também acompanhou essas variações.
Com esse estudo, constatou-se que as cadeiras com
encosto convexo (42,5º) preenchem integralmente
a coluna lombar e interferem de forma significati-
va na preservação das quatro curvaturas da colu-
na humana.
Desenho 4 - Banco de carro
Fizemos, também, estudos radiográficos em ban-
cos de carros convencionais. Na sua maioria, são
retos e não possuem apoio lombar adequado de
modo que retificam, por completo, as curvas da
coluna. Estudamos, analisamos e adequamos
modelos variados de bancos, buscando a preser-
vação das curvaturas fisiológicas, conforme figu-
ra acima. O resultado foi o relato de um maior
conforto e alívio no ato de sentar, aliado a um
melhor posicionamento do motorista. (Laborató-
rio de Ergonomia do Hospital São Sebastião, Sér-
gio Sá e Gilberto Fonseca, 2001).
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se comporta em vários tipos de assentos, os
movimentos e graus de curvaturas, com raio-
x panorâmico, que mostra todo o trajeto da
coluna: da cervical até o cóccix.
- Raio-x em pé: temos bem definidas as
quatro curvaturas: lordose cervical, cifose
torácica, lordose lombar e inclinação sacral.
Todas essas curvas formam um conjunto
harmônico de distribuição de forças, equilí-
brio e peso em uma pessoa em pé.
- Transição da posição em pé para a sen-
tada: na passagem de em pé para sentada,
caso não se tenha um apoio preciso e uma
consciência corporal, a coluna pode ser
modificada de forma radical. O formato da
coluna, que se assemelha a um “S”, trans-
forma-se rapidamente em “C”, aumentan-
do em muito as pressões dos discos inter-
vertebrais. Com isso, modifica o centro de
gravidade e o equilíbrio, descaracterizando
a harmonia de curvaturas.
NÃO INDUÇÃO
Para comprovação dos nossos estudos, foi
proposto pelo ergonomista Hudson de Araú-
jo Couto que fizéssemos uma pesquisa não
induzida, ou seja, que o usuário que utili-
zasse as cadeiras não soubesse detalhes so-
bre elas.
Já quanto à metodologia utilizada, cons-
tou do teste de duas cadeiras giratórias, sem
apoio de braço, ambas idênticas na aparên-
cia externa, sendo que em uma delas havia
a adaptação no encosto com ângulo conve-
xo em cerca de 42,5° denominada apenas
de cadeira B e a outra, a convencional, com
encosto reto original designada cadeira A.
As duas foram igualmente reguladas, adap-
tando-se à região lombar. Pediu-se ao usuá-
rio que utilizasse uma cadeira a cada vez e
que observasse e anotasse diferenças per-
cebidas durante o uso delas.
Há que se registrar a observação comenta-
da pela maioria de que, nos dois primeiros
dias, ele, o usuário, percebeu a diferença da
cadeira B (depois desse prazo é que se ini-
cia a adaptabilidade do corpo ao novo en-
costo). Outro registro importante, “fruto de
nossa busca”, é o de que os portadores de
dores lombares perceberam, com maior ni-
tidez, o conforto postural e a diminuição
das dores após o uso contínuo da cadeira
adaptada.
O índice de aceitação da cadeira adapta-
da foi de 80%. Os participantes foram tra-
balhadores, cuja função exige a média de
oito horas/dia na posição sentada.
O desenvolvimento do estudo de um
novo modelo de cadeira contou com al-
guns parceiros. Ergom, Funam (Funda-
ção Educacional Alto-Médio São Fran-
cisco), Ine (Incubadora de Empresas),
Banco do Nordeste, Sebrae e Hospital
São Sebastião contribuíram para a
concretização do projeto. Trabalho de
pesquisa publicado, na íntegra, no li-
vro “Ergonomia, a Grande Aliada”, de
Sérgio Sá e Gilberto Fonseca.
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