Você está na página 1de 12

Tópicos História da Física

Os Primeiros Termoscópios

Alexandre Medeiros (PhD, University of Leeds – Professor de


Física e Astronomia, UFRPE)

A invenção do termômetro é algo polêmico. Não se sabe, ao


certo, qual a primeira pessoa que teria inventado esse
instrumento tão importante para o estudo dos fenômenos
relacionados ao calor. Existem divergências entre os
historiadores da ciência sobre a justeza de conceder
legitimidade a um relato histórico por vezes escassamente
documentado. Isso tem levado alguns historiadores a não
creditarem a primazia de uma descoberta ou de uma invenção
a um determinado indivíduo sem claros e confiáveis registros
escritos. Observaremos tal polêmica no relato histórico que se
segue.
Para além, no entanto, desta questão de confiabilidade das
fontes históricas, existe ainda algo igualmente importante
envolvido nesse debate. O que está em jogo numa tal disputa é
algo mais complexo que simplesmente procurar o primeiro
indivíduo que tenha construído um instrumento que se
assemelhe ao nosso termômetro atual. A questão envolve a
nossa própria conceituação do que possa, ou não, ser tido
como um termômetro. Além disso, a própria idéia de invenção
requer uma intencionalidade da parte do inventor, no nosso
caso uma intencionalidade em construir um instrumento para
medir, ou ao menos avaliar, temperaturas, que precisa ser
cuidadosamente analisada.

Algumas informações históricas sobre os


primeiros termômetros são um tanto
imprecisas. Robert Fludd (1574-1637),
alquimista inglês, por exemplo, fez
referência, em sua obra Philosophia
Moysaica a um certo instrumento, que
poderia ter servido para medir
temperaturas e que, segundo ele, havia visto descrito em um
manuscrito, já então, com mais de quinhentos anos.
É certo, que já na Antiguidade grega, Philo de Bizâncio, por
volta do século I AC e Heron de Alexandria, no século I da
nossa era, haviam construído curiosos instrumentos, baseados
na dilatação do ar, que poderiam ter sido os primeiros
instrumentos destinados a avaliar, ou mesmo medir, os
aquecimentos.

O aparelho de Philo era constituído


simplesmente de um tubo de vidro em
U com um dos seus ramos penetrando
até o fundo de uma esfera oca de
chumbo. O outro ramo do tubo era
mergulhado num vaso com água.
Vedando-se o encaixe do tubo com a
esfera e aquecendo-se a mesma,
surgiam bolhas de ar no vaso com água.
Na verdade, o ar aprisionado na esfera dilatava-se escapando
como bolhas através do vaso com água. O tubo ao ser
posteriormente resfriado causava a contração do ar fazendo
com que a água do vaso subisse pelo tubo. Era um aparelho
muito interessante, cujo funcionamento dependia
essencialmente das variações de temperatura.
 Observar um tal instrumento com o nosso conhecimento atual
pode levar-nos a imaginar que, sem dúvida, as variações dos
níveis da água poderiam ter sido utilizadas como uma forma de
medir a temperatura. Embora esta possibilidade pudesse
efetivamente ter sido desenvolvida, isso, no entanto, jamais
ocorreu a Philo ou a qualquer outro filósofo grego da
Antiguidade. Há várias razões para isso. Em primeiro lugar, a
preocupação dos gregos era, aparentemente, com os efeitos
misteriosos produzidos pelo instrumento, não lhes tendo
ocorrido, jamais, a idéia de associar tais efeitos como uma
forma de medir a temperatura.
Heron chegou a desenvolver uma grande variedade de
instrumentos, principalmente fontes, cujos misteriosos
funcionamentos envolviam, certamente, noções intuitivas de
hidrostática e de dilatação dos fluidos. Tais instrumentos,
porém, foram utilizados principalmente para a produção de
efeitos ilusórios, aparentemente mágicos, nos templos do Deus
Serápis. Serápis era um novo Deus, inventado pelos
conquistadores gregos de Alexandria, em substituição aos
velhos deuses Egípcios e posteriormente identificado pelos
dominadores romanos com Zeus, o Deus dos deuses. Os efeitos
ilusórios produzidos pelos instrumentos, aparentemente
inocentes, de Heron, que ainda hoje nos causam admiração,
devem ter desempenhado um papel importante para a classe
dominante romana de Alexandria.

Quando olhamos atentamente certos


dispositivos da antiga Alexandria, como as
variadas fontes e principalmente a aeolipila
de Heron, (figura ao lado), espécie de
turbina a vapor primitiva em forma de esfera
oca com saídas laterais que girava
rapidamente com a dilatação da água nela
contida, damo-nos conta de quão próximos
estiveram os antigos gregos, do ponto de
vista técnico, da invenção da máquina a
vapor e portanto do desenvolvimento de uma ciência do calor.
Numa sociedade escravista, porém, como a da antiga
Alexandria, na qual a mão de obra era farta e barata, não
parece ter ocorrido a nenhum filósofo a idéia de utilizar aqueles
instrumentos para substituir o trabalho humano. A função da
ciência, segundo as expectativas da classe dominante, não
poderia mesmo ir além da produção de mágicas e efeitos
ilusórios.
O desenvolvimento da máquina a vapor e de uma decorrente
ciência do calor tiveram de esperar quase dois mil anos até
que se produzissem condições sociais nas quais novos
problemas viessem a dar um novo impulso ao desenvolvimento
científico. O final da Idade Média coincidiu com uma época na
qual  as grandes navegações , a invenção das armas de fogo e
a difusão dos livros impressos trouxeram uma grande
modificação na mentalidade européia. Problemas como o
esgotamento das minas, a previsão do tempo, o controle da
febre trazida pelas novas doenças, a expansão dos gases
dentro das armas de fogo e principalmente o posterior
desenvolvimento da produção nas fábricas, fazem parte de um
conjunto complexo de influências sócio-econômicas que
pavimentaram o novo caminho que a ciência viria a trilhar. O
século XVII, caracterizado pela Revolução Científica, foi, neste
contexto, o cenário inicial de transformações mais profundas
que viriam a ocorrer no século seguinte com a Revolução
Industrial. De modo análogo, o desenvolvimento da
termometria no século XVII e início do século XVIII, constituiu-
se na ante-sala do desenvolvimento da calorimetria no século
XVIII e da termodinâmica no século XIX.
Retomemos, portanto, a problemática de como os antigos
instrumentos de Philo e de Heron poderiam ser interpretados
em épocas distintas. Não tendo sido utilizados com a finalidade
específica de medir, ou ao menos avaliar, temperaturas,
aqueles aparelhos não podem ser tidos como verdadeiros
termômetros, mas apenas como precursores e inspiradores dos
mesmos.
Uma invenção não ocorre necessariamente quando um novo
instrumento é construído, mas quando uma nova possibilidade
do mesmo, é explorada. É o tipo de uso que se faz de um certo
instrumento que caracteriza, ou não, a presença de um
elemento novo e criativo. Neste sentido, os antigos
instrumentos gregos, construídos por Philo e Heron, não podem
ser tidos como legítimos aparelhos de medida, pois lhes faltou
a intenção de utilizarem tais dispositivos  para avaliarem as
temperaturas. A simples idéia de que uma temperatura
pudesse ao menos vir a ser medida era algo totalmente
estranho à Antiguidade e à Idade Média. É inegável, no
entanto, o papel exercido por tais instrumentos gregos como
fontes inspiradoras para novas formas de uso nos séculos XVII
e XVIII. Neste sentido, por exemplo, a célebre obra de Heron
Os Pneumáticos, que foi traduzida e publicada em latim em
1575 e em italiano em 1589, viria a constituir-se num ponto de
partida para os novos estudos e descobertas sobre o calor e a
temperatura no século XVII.
Normalmente, entende-se como descoberta o encontro de um
fato novo. No entanto, a idéia relacionada a este fato é que
constitui, na realidade, a verdadeira descoberta. Toda iniciativa
experimental inclui necessariamente uma idéia. É
precisamente esta idéia que dá origem à experiência e confere
significado à mesma. Deste modo, uma descoberta não é feita
necessariamente quando um novo fato é encontrado, mas,
sobretudo, quando fatos já conhecidos são vistos de uma
maneira totalmente nova.
Foi dentro dessa perspectiva de descoberta que se deu a
releitura e as novas interpretações de antigos conhecimentos
gregos e que teve início a moderna história da termometria.
Levando-se em conta o caráter da experiência ser carregada
de uma reflexão teórica, poderíamos questionar a quem teria
ocorrido, primeiramente, a utilização de um instrumento com o
propósito deliberado de medir temperaturas. Vários indivíduos
têm sido apontados como responsáveis por este salto
conceitual, dentre eles Galileu Galilei (1564-1642), Francis
Bacon (1561-1626), Sanctorius Sanctorius (1561-1636),
Robert Fludd (1574-1637), Jan Baptista van Helmont
(1577-1644) e Cornelius Van Drebbel (1572-1634).

Provavelmente, no início do século XVII, os primeiros


instrumentos concebidos para medirem a temperatura
surgiram mais ou menos simultaneamente e em locais
variados.
Este é um exemplo, dentre vários outros que podem ser
encontrados na história da ciência, de descobertas
simultâneas. Uma certa temática, ligada muitas vezes a uma
determinada expectativa social, aparece em certas ocasiões
como um verdadeiro problema de pesquisa. Esta temática,
transformada, então, em um problema a ser resolvido, é
atacada simultaneamente por várias pessoas, em vários locais,
muitas vezes isoladamente umas das outras. Nestas
circunstâncias, os tipos de abordagens adotados, e não
exatamente a primazia cronológica das descobertas, é que se
constituem em objetos de estudo historicamente mais
relevantes.
De um modo geral, aqueles primeiros instrumentos eram todos
imprecisos, sujeitos às influências da pressão atmosférica,
servindo mais para indicar variações de temperatura que
marcações precisas da mesma. Apenas a partir de 1617 é que
tais instrumentos passaram a ter a denominação específica de
termoscópios. A denominação de termômetros, que viria a
tornar-se dominante, é um pouco posterior, tendo sido utilizada
pela primeira vez apenas em 1624 pelo matemático francês
Jean Leurechon (1593-1670), em sua obra intitulada La
Récréation Mathématique, na qual introduziu o vocábulo
francês termomètre.

Ainda assim, dada a imprecisão daqueles primeiros


instrumentos, a denominação mais propícia, segundo nosso
conhecimento atual, teria sido, apesar de não ter sido utilizada
àquela época, a de termobaroscópios, para assinalar a
influência da pressão atmosférica, até então desconhecida.
Apesar da denominação de termômetro ter vindo a tornar-se
de uso indiscriminado na segunda metade do século XVII, o
primeiro instrumento que viria realmente a merecer tal
denominação, segundo a nossa compreensão atual da
necessidade de conter uma escala precisa, viria a ser
construído apenas em 1714, por Daniel Fahrenheit, como
veremos mais detalhadamente na sequência deste texto.
Note-se que a influência da pressão atmosférica nas marcações
dos primeiros termoscópios era algo impossível de ser
observado no início do século XVII, pois o próprio conceito de
pressão atmosférica ainda não existia.
A ideia revolucionária de que a atmosfera
exerce uma pressão sobre os corpos nela
imersos só viria a ser introduzida na física
por Evangelista Torricelli em 1643, como
uma tentativa arrojada de compreender e
solucionar o problema do limite da altura
alcançada pela coluna de água nas bombas
de sucção utilizadas nas fontes.
Esta questão da pressão atmosférica serve
igualmente para ilustrar o quanto as observações são
carregadas de teoria.
Durante quase dois séculos, do final do século XVI até meados
do século XVIII, os estudos sobre o calor e a temperatura, e
mais especificamente sobre os problemas da medida da
temperatura, estiveram diretamente relacionados às questões
da saúde e do clima. Não é, portanto, surpreendente que tais
estudos, tenham sido conduzidos inicialmente por indivíduos
ligados à prática da medicina ou da meteorologia. As idéias
de temperatura e calor ainda não estavam, à época,
bem distintas uma da outra, fato que, como já assinalamos,
só viria a ter início com os trabalhos de Joseph Black, na
metade do século XVIII e que marca o início de um novo ramo
da física, a Calorimetria, cujo estudo pormenorizado está fora
do escopo deste presente trabalho. Cabe salientar, entretanto,
que até meados do século XVIII, ainda sob a influência
remanescente do pensamento aristotélico, muitos referiam-se,
de forma não diferenciada, a graus de calor, temperamento
do calor ou temperatura. A medida da temperatura era
vista, deste modo, como dando conta de tudo o que poderia
ser medido nos fenômenos térmicos.
Só com os trabalhos de Black é que a temperatura começaria a
ser vista como a  intensidade do calor, para diferenciá-la  da
quantidade de calor. Foi a possibilidade de medir
quantidades de calor, vislumbrada por Black, por volta de
1754, como algo bem diferente das medições de temperatura,
que levou à invenção de um  novo instrumento, o calorímetro,
e deste modo à invenção da nova ciência da Calorimetria.
Para que isso, no entanto, viesse a ocorrer em meados do
século XVIII, foi preciso que antes termômetros mais precisos
viessem a estar disponíveis, o que nos remete a retomar o
curso do seu desenvolvimento histórico.
Possivelmente, o primeiro instrumento científico construído
especificamente para medir temperaturas foi inventado por
Galileu, por volta de 1592, logo após a tradução, para o
italiano, dos trabalhos de Heron. Galileu não parece, no
entanto, ter atribuído ao seu instrumento o merecido valor,
pois não são conhecidas afirmações escritas, do próprio
Galileu, dando conta da construção do instrumento. A invenção
do termoscópio foi creditada a Galileu principalmente pelos
seus discípulos, pois seus próprios escritos contêm apenas uma
única referência ao princípio desse instrumento.  Embora
Sagredo, numa carta ao seu amigo Galileu,  datada de 1615,
tenha atribuído ao mesmo a invenção do termômetro, o próprio
Galileu afirmava apenas ter melhorado uma forma primitiva
desse instrumento.  Tal afirmação parece confirmar a influência
grega acima mencionada. Em apenas uma ocasião Galileu fez
referência escrita ao uso do instrumento, sem reivindicar,
entretanto, a autoria do mesmo.

A versão da invenção do
termoscópio, por Galileu,
em 1592, pertence a
Viviani (1622-1703), outro
de seus discípulos e primeiro
biógrafo do grande mestre
italiano. Por outro lado, a
célebre descrição do
termoscópio dada por
Castelli (1578-1643) está contida numa carta que este
discípulo de Galileu escreveu a Cesarini em 1638 na qual
afirmava ter visto seu mestre usar o instrumento nas suas
aulas em 1603.
Segundo Castelli, "Galileu
tomou um vaso de vidro
aproximadamente do
tamanho de um ovo de
galinha e ajustou-o a um
tubo da largura de um
canudo com cerca de 18
polegadas de
comprimento; ele
aqueceu o bulbo de vidro
em suas mãos e inverteu o tubo mergulhando-o num
outro vaso com água. Tão logo o vaso resfriou-se a água
subiu no tubo até a altura de 9 polegadas acima do
nível do segundo vaso. Ele usou este instrumento para
investigar os graus de calor e frio”. Note-se que os
deslocamentos da coluna líquida eram causados, no
termoscópio de Galileu, não pela dilatação do líquido, mas pela
dilatação do ar contido na ampola de vidro.
Deste modo, o ar era a verdadeira substância indicadora da
temperatura, ou substância termométrica, como
denominamos atualmente, e a dilatação do ar servia como
propriedade indicadora da temperatura, ou propriedade
termométrica.
Esta contribuição conceitual era de grande importância, mas
Galileu não apenas não deu grande valor ao seu instrumento
como não parece, sobretudo, ter tido a clareza do salto genial
que havia dado ao usar tal instrumento para medir
temperaturas. Apesar disso, a genialidade de Galileu está em
ter interpretado, intencionalmente, as alturas da coluna líquida
como possíveis medidas das temperaturas que a elas pareciam
associadas. Assumiu Galileu, portanto, o pressuposto de que
a cada valor de temperatura corresponderia um e apenas um
comprimento da coluna de água.
Esta ideia brilhante não era de todo verdadeira, no caso do seu
instrumento, pois sendo o mesmo aberto, as variações da
pressão atmosférica faziam com que para uma mesma
temperatura fosse possível, em diferentes ocasiões,
observarem-se diferentes alturas da coluna líquida. Galileu não
parece ter-se dado conta deste detalhe, apontado
posteriormente por Robert Boyle após os trabalhos de
Torricelli, Pascal e Guericke sobre a pressão atmosférica. De
todo modo, esse seria um problema que viria a ser superado,
de formas variadas, ao longo dos desenvolvimentos posteriores
da termometria.
Mesmo desconhecendo a falha do seu instrumento, e
conseqüentemente sua possível solução, Galileu assumiu a
conjectura arrojada de que haveria uma e apenas uma
altura da coluna de água para cada valor de temperatura. Tal
conjectura, que hoje pode parecer simples à primeira vista,
corresponde, na verdade, a um enorme salto conceitual. Ela
equivale ao reconhecimento tácito de que a temperatura é um
tipo de propriedade da natureza diferente, por exemplo, do
comprimento.
Tomemos um exemplo para esclarecer a questão. Suponhamos
que temos dois bastões de madeira, um  com dois metros de
comprimento e o outro com três. Se colocarmos um no
prolongamento do outro, poderemos formar um novo bastão de
cinco metros, ou seja, o novo comprimento será o resultado da
adição das extensões anteriores. O mesmo dá-se com a massa.
Se colocarmos cem gramas de água numa panela e em
seguida mais duzentos gramas, teremos no total trezentos
gramas de água na panela. Esse caráter aditivo faz com que
possamos medir os valores de tais grandezas por
comparação direta com um valor padrão daquela
mesma grandeza.
Podemos, deste modo, imaginar um comprimento de cinco
metros como resultado da adição de cinco comprimentos de
um metro, o mesmo raciocínio valendo para a massa.  Isso
pode, atualmente, parecer-nos óbvio, pois estamos tão
acostumados com esses fatos, que a familiaridade faz com que
não reflitamos sobre eles. Tomamos como naturais idéias que
nos vêm apenas da tradição de pensar de um certo modo. Mas
será que todas as grandezas físicas podem ser medidas do
mesmo modo que massas e comprimentos, ou seja, por
comparação direta com um valor padrão? Em outras palavras,
será que todas as grandezas físicas, podem ter esse caráter
aditivo de seus valores, característico dos comprimentos, das
extensões?
Vejamos um outro exemplo. Se colocarmos um copo com água
a 10oC numa panela e logo após outro copo d'água, também a
10oC, será que teremos como resultado que a água da panela
atingirá os 20o? A experiência mostra-nos que não. Ou seja, a
temperatura não é uma grandeza do mesmo tipo que o
comprimento ou a massa. Ela não possui esse caráter aditivo
direto, característico das massas e dos comprimentos. Assim
sendo, as medições de temperatura não podem ser feitas por
comparações diretas, como no caso das extensões.
Daí a importância de enfatizarmos a interpretação da
temperatura como algo semelhante a uma intensidade de
calor, diferentemente da conceituação mais antiga de simples
graus de calor, que não fazia distinção entre calor e
temperatura. Tal conceituação, no entanto, como dissemos
anteriormente, viria a ser construída apenas nos tempos de
Black, mais de cento e cinqüenta anos após a invenção de
Galileu.
Ainda, no entanto, que esse caráter intensivo da
temperatura só tenha vindo a ser revelado explicitamente
por  Black, ele já estava contido de forma implícita e
embrionária na intenção de Galileu de medir as temperaturas
de uma forma indireta, fazendo recurso ao tipo de associação
acima discutido: para cada valor de comprimento da coluna
líquida do termoscópio deveria existir, a princípio,  um e
apenas um valor da temperatura.

Galileu não parece, porém, ter estado em


alerta para a utilidade da marcação de
temperaturas de referência na calibração do
seu instrumento. Desta maneira, não
introduziu nenhuma verdadeira escala,
contentando-se em subdividir
aleatoriamente o comprimento do tubo em
divisões do mesmo tamanho. Com efeito,
Galileu parece ter adicionado ao seu
termoscópio, uma escala que consistia apenas de uma longa
tira de papel fixada ao tubo de vidro e marcada arbitrariamente
com oito longos espaços, cada um dos quais, divididos em
sessenta intervalos menores, ou graus. Uma tal escala, parece
inspirada nas graduações adotadas em instrumentos
astronômicos em graus e minutos.
A falta de testemunhos escritos mais pormenorizados tem
levado alguns historiadores a creditarem a outros, e não
apenas a Galileu, a invenção do primeiro termoscópio.
Cornelius van Drebbel (1572-1634), por exemplo, tem sido
por vezes mencionado como tendo construído, em 1621, um
termoscópio no qual a dilatação de uma certa massa de ar
elevava uma coluna de água. Semelhante ao instrumento de
Galileu, este também dava indicações errôneas devido às
variações da pressão atmosférica. Drebbel, um construtor de
instrumentos holandês, fixado na Inglaterra, ficou mais
conhecido, no entanto, pela invenção do primeiro protótipo de
um submarino, que navegou pelo rio Tamisa, em Londres, em
1624.
Jan Baptista van Helmont (1579-1644), médico e alquimista
flamengo, mais ou menos à mesma época, utilizou, também
termoscópios para medir a temperatura dos corpos.
Analogamente, Francis Bacon (1561-1626), já em 1620,
descreveu um instrumento muito parecido, tendo igualmente
uma tira de papel fixada ao tubo de vidro contendo uma escala
com as mesmas limitações daquela utilizada por Galileu.

Próximo texto deste série: O Termômetro Clínico de


Sanctorius.

 
PARA CITAR ESTA FONTE: Medeiros, Alexandre. Os
Primeiros Termoscópios. BLOG Física e
Astronomia_Alexandre Medeiros, BLOG.
http://alexandremedeirosfisicaastronomia.blogspot.com/
2011/10/alexandre-medeiros-phd-university-of_19.html.
Acessado em 19 de Outubro de 2011. (atualizar a data).

Você também pode gostar