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Havia, numa floresta não muito distante da cidade, uma grandíssima árvore, com

galhos tão frondosos e tão longos que tocavam ao céu e, ao balançar, pareciam fazer
carinho nele. Seu tronco não era diferente, tinha raízes largas onde as pessoas
apoiavam-se para descansar depois de um passeio no bosque. Por possuir toda essa
beleza, era chamada de Aisó, palavra que significa formosa em tupi-guarani.
Pelo seu tamanho, as pessoas acreditavam já ser muito velha, a ponto de todas as
outras árvores ao seu redor parecerem suas filhas ou netas. Ela tinha um esplendor
maternal e garantia a paz da floresta, semelhante a uma mãe protegendo seus filhos dos
perigos do mundo.
Quem amava mesmo a árvore era dona Perolina, uma senhora já de idade, colhia
frutas na floresta desde pequena, sempre dando seus cumprimentos à árvore mãe de todas
as outras:

– Bom dia, Aisó, está linda como sempre.

Talvez Aisó a entendesse. Sempre que via dona Perolina chegar, balançava seus
galhos produzindo um som que mais parecia uma música, uma serenata de amiga para
amiga.
Certo dia, um homem ganancioso entrou na floresta. Ele passava por um momento
difícil em sua vida, não possuindo uma só moeda em seu bolso, então, resolveu andar sem
rumo, para talvez ter uma ideia de como resolver seus problemas. O homem, tanto andou
que à primeira sombra de árvore na qual sentou, dormiu. Ao acordar, viu a grande árvore na
sua frente e pensou:

– Sorte a minha! Essa árvore, com seu tronco tão grosso, me renderá tantas tábuas quanto
eu nem posso imaginar, além de sua madeira ser linda e sólida, o que vai me dar ainda
mais dinheiro.

No dia seguinte, o homem trouxe seus amigos para cortar Aisó. Ela não se intimidou, pelo
contrário, parecia mais firme do que nunca, dando imenso trabalho àqueles que tentavam
cortá-la. Mas ela não resistiu, demorou, mas caiu e teve seu tronco levado pelos
madeireiros. As outras árvores desesperaram-se ao ver sua mãe e avó sendo raptada,
desatando, pois, a chorar. Os Ventos conversavam com elas e tentavam acalmá-las, de
pouco servindo, a melancolia era demais para que se resolvesse. O choro era tão alto que
chegou aos ouvidos do Céu, o qual já sentia saudades do carinho de sua amiga.
Enraivecido, gritou ao sol:

– Cansei-me dessas pessoas. Aisó lhes oferecia a sombra para protegê-los de sua luz tão
quente, mas mesmo assim eles a mataram. Peço a ti, Sol, que agora brilhe como nunca,
pois eu não colocarei nuvem alguma para te impedir.

O Sol, vaidoso como era, atendeu ao pedido do vizinho com gosto, porque agora poderia
espalhar seu brilho sem que ninguém o atrapalhasse. Quem sentiu a diferença foi o povo da
cidade, agora em um calor extremo e sem nuvens que pudessem indicar a chegada de
chuvas.
Dona Perolina estranhou essa mudança, ouviu dos Ventos que a árvores estavam tristes e
o Céu enraivecido. Ao saber disso, ela foi à floresta saber porque as pequenas sofriam e
encontrou apenas o toco do belo tronco de Aisó. A senhora não aguentou as pernas; seu
coração, preenchido de uma imensa tristura, era pesado de mais para elas:

– Ah, minha querida! Se soubesse, eu, que fariam isso contigo, não sairia de perto de ti
nunca. Dormiria nas suas raízes e afagaria-lhe todos os dias, desta forma, você ainda
estaria linda como sempre.

Com os olhos meio embaçados pela água que lhes escorria, Perolina viu dois brotos de
galho perdidos entre as folhas secas do chão. A velhinha, astuta como ninguém, teve a
seguinte ideia:

– Plantarei esses brotos de ti, minha amiga, trazendo uma parte do seu esplendor de volta a
esse mundo. Serão filhas tuas, seiva da tua seiva, então se chamarão Aiyras, filhas em tupi.

Perolina enterrou as duas partes de Aisó e, com suas lágrimas, as regou. Talvez os brotos
tenham reconhecido que as lágrimas vinham de uma antiga amiga de sua mãe,
demonstrando um verde único em suas folhas. Voltando à cidade, a velha mulher contou
toda a história aos demais cidadãos que, tomados de uma causa única de justiça, bateram
à porta do madeireiro e pegaram o tronco de volta. O marceneiro e marido de Perolina, Seu
Zequinha, teve a seguinte ideia:

– Façamos, a partir da madeira de nossa amiga, uma enorme mesa na qual todos possam
se sentar e festejar juntos. Ela nos juntava em sua sombra, única proteção do poderoso Sol
acima de nós, então sigamos com seus desejos de união.

A ideia foi aceita e concretizou-se. Ao pé das Aiyras, construiu-se a mesa onde todos se
sentaram e comemoraram. As outras árvores, alegres pela vinda de novas amigas,
arrumaram-se para aparecerem belas como nunca na festa: deram frutos e flores lindas que
decoraram lindamente a floresta. Dos cacaueiros foram colhidos os cacaus para serem
transformados em bolos e barras de chocolate. Dos cajueiros, os cajus para os sucos que
matariam a sede de todos da cidade. Das aceroleiras, as acerolas que garantiam caretas
engraçadas para trazer o riso às pessoas.
O Céu, vendo a algazarra que acontecia, chorou de felicidade, trazendo chuvas para
refrescar a festa e conceder um pouco de sua água às herdeiras do esplendor de Aisó.

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