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UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA

CAMPUS I
CENTRO DE EDUCAÇÃO
CURSO DE HISTÓRIA – LICENCIATURA PLENA
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

EMERSON MARCELINO ALVES SILVA


MAYKON DOUGLAS SOUSA GOUVEIA

FORMAS DE SE PENSAR O TEMPO NO ENSINO DE HISTÓRIA

CAMPINA GRANDE
2019
1

EMERSON MARCELINO ALVES SILVA


MAYKON DOUGLAS SOUSA GOUVEIA

FORMAS DE SE PENSAR O TEMPO NO ENSINO DE HISTÓRIA

Trabalho de pesquisa científica do curso de


Licenciatura Plena em História, da
Universidade Estadual da Paraíba, apresentado
na I SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA DA
UEPB: História, Interdisciplinaridades e
Cultura.

CAMPINA GRANDE
2019
2

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................ 03
O Tempo e suas Interações no Ensino de História ........................................ 04

Quem São os Ouvintes? Aplicações Didáticas a Vida Cotidiana ................. 05


Relações Passado-Presente como Recurso Didático ...................................... 06

Utilização das Linhas Temporais no Ensino de História .............................. 09

CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................... 10

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA ............................................................. 11

RESUMO
O presente artigo tem como pretensão refletir maneiras possíveis de aprimorar o uso da temporalidade
no ensino de história, visto que a metodologia positivista de linha do tempo é cronológica e aos
moldes eurocêntricos, que permeia a didática dos professores e está longe da realidade do aluno.
Conectando o aluno e sua realidade a grade curricular é compreender que das poucas informações que
tem, situa-lo em um tempo distante da sua noção ao invés de ensina-lo, promoveremos uma confusão e
com ela muito preconceito para com a disciplina de História. Aproximar o aluno passo a passo, ano
letivo a ano letivo, para que entenda fatos do seu cotidiano, e depois, afastá-lo repentinamente a uma
temporalidade distante na tentativa de entender os porquês do seu presente é um movimento difícil e
gera resultados que podem na verdade instigar o desinteresse pelo próprio futuro. Assimilar o passado
é também interpretar o presente e conceber o futuro, esse é o movimento natural da vida. Porque não
inverter essa lógica de linha temporal cronológica e linear. Se nossa compreensão de tempo é
geralmente crescente, nascemos, passamos pela infância, adolescência, juventude fase adulta,
envelhecemos e ao fim falecemos, mas antes do nosso igualitário destino, destinamos muito do nosso
tempo revisitando o passado a partir da memória para que essa influa no presente ou até no futuro.
Afinal o mundo moderno trouxe o anseio pela preservação das memórias, a necessidade de narrar o
passado está presente ao redor dos alunos em filmes, séries e novelas com teor histórico, sendo
importante expor aos alunos como a história os cercam e está sempre sendo reapresentada no presente,
não somente no passado “obsoleto” e fatigante dos livros didáticos como também sua própria história.
É com ela que damos continuidade ao oficio do professor, que para além de uma mera reprodução de
conteúdo é lecionar em prol de uma nova história, que não seja meramente decorativa no que diz
respeito a ornamentação, mas também no sentido de fixar na memória e que seja proveitoso e usual na
rotina do aluno. É a partir dessa visão que pretendemos discutir como essa inversão da linha temporal
comumente usada nos livros didáticos pode ser mais inteligível ao aluno, tornando-o crítico e também
construtivo, mantando os valores que são aprendidos, mas, na medida do possível, levantando
questionamentos e o próprio aluno buscando a solução.

Palavras-chave: Ensino. Metodologia. Tempo. Linhas Temporais. Lecionar.


INTRODUÇÃO
3

Lecionar é uma atividade que, desde os tempos mais remotos, vem possibilitando e
desenvolvendo a evolução humana, notabilizando conhecimentos, até então, não descobertos
ou produzidos. A curiosidade pelo desconhecido, o fato de querer explorar o inexplorado, é
um movimento que está intrínseco ao ser humano no que implica, na maioria dos casos, uma
reflexão sobre si, do tempo vivido e aonde está inserido, gerando uma busca por melhorar sua
vida cotidiana. No filme “Os Croods” (2013), numa representação da vida pré-histórica, onde
uma família “menos evoluída” interage com outro indivíduo mais versado no conhecimento e
experiências, e na trama esse sujeito começa a compreensão de como poderiam melhorar suas
vidas a partir de outras perspectivas práticas do cotidiano. A essa família é proporcionado um
descortinar dos seus olhos, introduzindo o “novo” em suas rotinas que lhes renderiam uma
melhor compreensão do que antes não conseguiam enxergar. Não seria exagero reproduzir
este cenário na educação básica, o professor como o sujeito que instrui a família pré-histórica
representada na animação e a família os alunos. Principalmente, quando se trata do ensino de
história o aluno ainda não percebe que a história tem implicação direta em sua vida. E como
trazer à tona um fato que parece tão distante da sua realidade? Como atrai-lo para perto dessa
compreensão fazendo-o participante? Esses são questionamentos vitais onde o discente tem
por obrigação refletir sobre as formas de pedagogizar o conteúdo de história.
A proposta do artigo é a de esclarecer sobre a temporalidade como instrumento viável
ao ensino de História dentro do âmbito escolar, utilizando recursos e métodos para não só
cativar o aluno, mas também envolvendo-o e fazendo-o interagir, tornando-o parte da história
afastando os preconceitos e o anacronismo.

O TEMPO E SUAS INTERAÇÕES NO ENSINO DE HISTÓRIA.

Empreender nas futuras gerações a noção do quão necessário é refletir sobre seu
tempo, é uma responsabilidade incumbida ao historiador. Perante esse ofício, em específico,
esta intrínseco a tarefa do educador, a está função, respeito e admiração sempre foi atribuída,
a exemplo do próprio D. Pedro II que em José Murilo de Carvalho manifesta seu desejo pela
profissão, “Alegou que se os brasileiros não o quisessem como imperador iria ser professor”
1
reforçando o quão notável é o valor dado ao profissional do ensino, os Griots mesmo na
figura de um ancião que estava responsável por manter viva a história da tribo nas sociedades
africanas, também exerciam o papel de educadores levando em consideração que as
1 CARVALHO. 2012, p. 110.
4

experiencias vividas por eles eram de grande valia, tanto para os jovens, como para a
comunidade. Contudo, as dificuldades encontradas no passado, até mesmo hoje no nosso
tempo presente, são questões para além do plano físico das quatro paredes da sala de aula, na
verdade perpassa, alcançando o lado emocional desses profissionais que por muitas vezes
adentram madrugada horas a fio na tentativa de conciliar sua vida individual e os desafios no
decorrer do ano letivo escolar.
Importante salientar que essas dificuldades possuem braços, e se estendem até o
aluno, esse que é receptor tanto do conhecimento passado pelo professor quanto é filtro das
adversidades passadas por eles, observam a realidade enfrentada pelos profissionais em
momentos tendem a ajudar, outros não demonstram interesse algum. Quanto a rede pública, a
má infraestrutura oferecida é um dos fatores que os profissionais sondam meios para
contornar, pois é um limitador cruel no emprego de novas perspectivas e métodos para o
ensino. O aluno inicia o processo de aprendizagem na infância e se estende até a vida adulta
(em menor proporção), e a percepção do tempo e do espaço advém das experiências vividas
durante este período, sejam elas experiências de outros sujeitos ou convividas dentro do
próprio âmbito familiar. A memória passa a ser construída por intermédio da oralidade ou da
observação visual. E essas memórias exercem um papel fundamental de inclusão social, a
partir dela revisitamos fatos passados rememorando e perspectivando-o de modo a estabelecer
interação com o tempo vivido, que o tempo presente. Afinal, ao lecionar história o professor
precisa sondar entraves que estão além das dificuldades físicas do seu ofício, prevendo o
comportamento do aluno ao se deparar com o conteúdo abordado, questionando a si mesmo se
será de fácil absorção o conteúdo? O aluno tem algum conhecimento prévio? Se sim, como
foi construído esse assunto? Se não, como é possível aborda-lo de maneira prática? É com o
emprego da memória que aproximamos o aluno da sua própria realidade e existência,
respondendo muito dos questionamentos que são construídos pela observação cotidiana do
seu próprio meio social. O ensino de História é norteado pela base comum curricular que
durante o período da redemocratização é discutido a participação do aluno no processo
educacional, como também a necessidade de objetivar alunos que possuam senso críticos,
construindo um cidadão ativo e consciente sobre sua realidade, como também a do outro.
Todavia, conectar o passado a o presente é uma missão árdua e tempestuosa, tendo em
vista a pré-conceituação da disciplina de História como sendo uma disciplina essencialmente
informativa, levando uma leitura meramente decorativa, que “só fala de pessoas mortas”,
sobre “o que já passou” e isso nada tem a ver com o presente ou a realidade.
5

Levando em consideração, a variedade cultural existente em uma sala de aula onde


cada indivíduo presente pensa de um modo e convive em múltiplos meios sociais, o ensino de
história tem um grande desafio que é a de estabelecer conexão entre a história e as realidades
que cada indivíduo vivencia dentro e fora da sala de aula, principalmente fora, prospectando
um ensino que amarre e cative o aluno a compreender questões que tenham aplicabilidade
direta ao seu cotidiano, construindo uma noção do tempo dos fatos.
Nesta dualidade temporal o aluno apega-se ao tempo cronológico, onde em alguns
casos, acabam projetando uma barreira mental que dificulta a interação com o tempo histórico
em sua noção de tempo. Imagine uma aula onde o professor aborda temas sobre cultura
(material ou imaterial), seria mais interessante ensinar ao aluno que, a cultura é tudo aquilo
que o ser humano cria, enfatizando festividades locais, como por exemplo, e após abrir o
discernimento do aluno sobre o tema, analisar as grandes festas que estão longe da sua
perspectiva habitual, mas que podem ter traços que coincidem com ela.
Nesse sentindo, ao aproximar o aluno da noção de um tempo fatídico, propiciara sua
inclusão na história narrada, tornando-se participante em sua construção e compreensão.
Contudo, é importante ter ciência dos perigos anacrônicos que podem surgir, pois o passado
tem suas particularidades que só pertencem a ele e projetar o fato e suas consequências no
presente pode se causar uma confluência temporal não existente.
O tempo cronológico é demarcado pela contagem linear e progressiva do tempo, cada
sociedade lança seu olhar sobre o tempo de forma distinta sendo vital destacar que, por mais
que o tempo seja contado ele não é contado da mesma maneira como hoje usamos, dentro de
um sistema métrico universal de unidade de medida que por décadas foram sendo
aprimorados. Um exemplo dessa noção temporal é o caso das tribos indígenas que
demarcavam sua temporalidade com eventos naturais, cheias e secas do rio, migração das
aves, fases da lua, etc. Por mais que o tempo cronológico seja o mais habitual entre o aluno (o
tempo do relógio), ele não é o único a ser abordado, assim, no ensino de história as noções de
tempo devem unir a cronologia com o tempo histórico que é o marcador das atividades do
homem no tempo e espaço.
O meio social como bem discute os sociólogos é primordial para a construção do
homem, a exemplo dos moldes do Jean-Jacques Rousseau onde afirma que “o homem é bom
por natureza. É a sociedade que o corrompe” (ROUSSEAU. 1762.), já que o meio social
influência diretamente na construção da noção de certo e errado, condicionando a tomar
decisões com base em valores e crenças construídas pelo seu próprio meio social.
6

A base educacional aplicada no meio escolar, hoje, tem por ênfase no ensino de
história a construção de um aluno cidadão, construtor do seu próprio tempo diferenciando-se
das diretrizes educacionais pregadas até meados do século XX. Essa realidade distancia-se do
ideal de que o ensino de história é a porta de entrada para o questionamento do presente
vivido, projetando uma reflexão sobre os erros e acertos do passado. Sob essa análise, o
tempo cronológico e o tempo histórico andariam de mãos dadas, levando em consideração
que o ensino de história não pode ser meramente factual, e sim explicativa, sintetizando um
senso crítico.

QUEM SÃO OS OUVINTES? APLICAÇÕES DIDÁTICAS A VIDA COTIDIANA

[...] Permita ao indivíduo a indagação sobre o passado de forma que a resposta lhe
faça algum sentido no presente e que de alguma maneira esse sujeito encontre uma
orientação histórica para a sua vida cotidiana 2.

O ambiente escolar inclui livros, sala de aula, diretores, coordenadores, pedagogos,


educadores, e o aluno claro, afinal qual seria a função do professor sem o seu educando para
fazer sentido ao esforço diário da produção do conhecimento. Mas para além da escola existe
todo um universo paralelo ao aluno que o faz pensar e construir sua visão de mundo associada
principalmente às noções familiares, ela é essencial para as primeiras impressões de mundo
que estão se organizando na mente da criança. Contudo, algumas situações no cotidiano do
próprio aluno dificultam sua motivação pela aprendizagem. Quantas vezes a célebre frase:
“Estude para ser alguém na vida” já foi dita por um adulto a uma criança na tentativa de
incentivá-las a compreender a necessidade de se ter conhecimento para posteriormente
alcançar os seus objetivos. Uma frase que por tantas vezes ser dita, em alguns casos, começa a
perder seu efeito. Neste contexto a escola tem a função de submergir o aluno no mundo que
nos rodea e retirá-lo da inércia e introduzindo-o no caminho do conhecimento.
Outro fator que é motivo de reclamação pelos alunos são as aulas desmotivantes
principalmente da área de humanas. No caso da disciplina de história, parece irrelevante a um
aluno da periferia estudar o período das expedições marítimas sendo que esse nada a ver com
a sua realidade, então como é possível alinhar o ensino de história conciliar passado, presente
e realidade social? Essa tarefa torna-se complicada, afinal nem tudo na história pode ser
relacionado com o presente, daí surge à necessidade de não somente aglutinar passado e

2 RÜSEN, 2007. p.133.


7

presente, como também problematizar questões do passado projetando no aluno um senso


crítico e investigativo na busca de solucionar os porquês presentes na história.
A história problema tão enfatizada na metodologia de ensino, ao mesmo tempo em que
serve de questionamentos a termo ou situações do passado, também pode ser uma reflexão do
presente. Um exemplo sobre a história problema pode ser tratado em relação às diferenças
raciais vivenciadas em nossa sociedade. Ao salientar essas desigualdades, podemos buscar
entender esse pensamento ao regredir a recortes de tempo como o tráfico negreiro atividade
essa assegurada pelo pensamento denominado eurocentrismo onde segregava o branco, cristão
e europeu como um homem puro e deixando as margens o negro, qualquer visto como um
produto que poderia ser trocado ou vendido afinal não se tinha valor. Essa reflexão faz-se
necessária para compreender que muito dos estigmas do passado perpassaram o tempo, sendo
presentes até os dias de hoje ao se julgar um livro pela capa, ou seja, ao julgar um ser humano
pela sua tonalidade/pigmentação de pele.

RELAÇÃO PASSADO-PRESENTE COMO RECURSO DIDÁTICO

De acordo com Thompson (1998), as organizações sociais têm diferentes tipos de


percepções do passado. Sob essa ótica, as sociedades tradicionais (ou sociedades
camponesas) percebem o passado e, também o tempo, de maneira cíclica. Portanto o
passado se reconfigura, e “reacontece” em ciclos. Já as sociedades modernas (ou
sociedades urbano-industriais) adquiriram uma compreensão linear do tempo. Nesse
sentido, nas sociedades modernas, o passado é percebido como algo imutável,
perdido no tempo. 3

A visão de que o passado é retrógrado se configura numa tentativa de desvinculo das


noções tradicionais de tempo e um convite ao buscar o “novo”, analisando mais a fundo
percebemos que haver um “novo”, isto é, uma mudança da mentalidade, é necessário um
intercâmbio de experiências, aprimorando a vida cotidiana com base no passado do outro (até
então desconhecido). Contribuindo com um modelo de saber que conflua na interação de
outros indivíduos e perpassando o tempo da sua geração, pensando diferentemente de antes,
tornando útil e aplicável o conhecimento já incluso na rotina diária, pois esse movimento é de
singular importância a evolução humana. Essa percepção de que o tempo é cíclico já vem
sendo posta à prova por não comtemplar as singularidades da temporalidade, os estratos como
Reinhart Koselleck afirma; "Tais estratos permitem, condicionam e limitam as possibilidades

3 FORNECK. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ensino de História da Universidade


Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 2017. p. 16.
8

das ações humanas e, ao mesmo tempo, as geram." 4. O estudo sobre as singularidades do


tempo auxiliam na análise sobre os fatos evitando equívocos que podem vir a surgir no
decorrer da aula, atuando como um agente limitante, lançando os olhares para os contextos e
consequências aprimorando a visão crítica do aluno.
Até meados do século XX, a História tinha o papel de reafirmar a ideal de um passado
imutável, como se o tempo fosse progressivo e homogêneo, essa era as noções habituais sobre
o tempo e as utilizavam como ferramenta de ensino, perpetuando-se durante muito tempo no
imaginário social. A afirmação de um tempo imutável, homogêneo e cíclico, nos remete a
antigas civilizações, como a egípcia onde o tempo era marcado por um retorno aos mesmos
eventos antepassados, e esses eventos eram descritos como se ocorressem pela intervenção
dos deuses.
Mas de onde será que veio essa compreensão cíclica? A resposta não seria tão simples
se não nos remetêssemos a nossa própria experiência de vida, muitos dos nossos familiares
ainda preservam noções de tempo que são reações da atuação da natureza em suas rotinas
diárias. Se adentrarmos a cultura tradicional camponesa, nos depararíamos com um “certo”
lado místico de antecipação dos eventos naturais, tendo ligação direta quanto ao tratamento
com a campo. Para o camponês, o tempo é uma ressignificação do movimento da natureza e
esses são cíclicos, mesmo no advento do relógio, essa cultura permanece forte até nossos dias
e este também faz parte do tempo dos fatos, isto é o tempo histórico, mas não possuem a
mesma compreensão e podem servir como marcadores. Como nos referenciais teóricos usados
por Koselleck, ele afirma:

[...] os tempos históricos podem ser distinguidos claramente dos tempos naturais,
embora ambos se influenciem reciprocamente. O percurso regular e repetitivo do
Sol, dos planetas, da Lua e das estrelas, assim como a rotação da Terra, remetem a
medidas temporais constantes - anos, meses, dias e “constelações” -, bem com o à
sucessão das estações do ano. Todos esses decursos de tempo foram impostos ao ser
humano, mesmo que ele tenha aprendido a interpretá-los e, sobretudo, a calculá-los
graças a realizações culturais e intelectuais. 5

Consequentemente, o ato de lecionar, seja ele pelo professor ou até mesmo pela
família, está intimamente ligado às experiências vividas, notavelmente a noção de tempo será
cíclica, e a partir dessa ideia que pode vir a surgir o anacronismo. O ser humano tende a dar
ênfase aquilo que é de prioridade, naturalmente quando ocorrem mudanças climáticas, como
na passagem das estações do ano nos vestimos de acordo o clima, nos preparamos porque
4 KOSELLECK, 2014, p.13.
5 KOSELLECK, 2014, p. 9.
9

temos um conhecimento prévio do que a de acontecer, mesmo assim cada inverno, por
exemplo, tem suas particularidades e nem sempre são notadas e é oficio do historiador
entender essas peculiaridades. O historiador precisa recorrer ao uso da metáfora, sendo esse
uma ferramenta interessante que nos propicia um passeio pelo tempo sem destruir as
representações pelos movimentos em unidades espaciais 6 que já vivemos.

O historiador precisa servir-se dessas metáforas retiradas da noção espacial se quiser


tratar adequadamente as perguntas sobre diferentes tempos. A história sempre tem a
ver com o tempo, com tempos que permanecem vinculados a uma condição espacial,
não só metafórica, mas também empiricamente. 7

Nesse sentido, Immanuel Kant em 1755, ano de publicação da sua obra “Allgemeine
Naturgeschichte und Theorie des Himmels” (História Natural Genérica e Teoria dos Céus),
fez uma analogia interessante sobre a exuberância das montanhas na transcrição de um fato
temporal.
Para que se alcance a perfeição, decorrerão milhões e montanhas de milhões de
séculos, durante os quais sempre surgirão novos mundos e novas ordens cósmicas
nos âmbitos naturais mais distantes. 8

Perceba que ele utiliza um misto de cronologia (séculos), unidades (milhões), metáfora
(montanhas de milhões), para intensificar e cativar o leitor a observação dessa perfeição quase
“inalcançável” tanto quanto o pico de uma montanha que, às vezes, nem é possível alcançá-lo
fitando os olhos no horizonte de tão alta. Com todo esse esboço teórico, é importante
aproximar a leitura temporal do aluno, na perspectiva que ele tem de tempo. Pode não ser uma
“montanha”, mas pode ser algo ainda mais próximo do aluno, como o uso de termos regionais
em sua fala, a descrição de objetos antigos, cultura familiar e tantos outros meios que podem
fazer esse movimento, atraindo o aluno a compreensão histórica.
Cainelli e Schmidt (2009) nos traz uma classificação da relação entre passado-presente
em duas dimensões. A primeira com a ideia de que o passado ajuda a explicar o presente.
Explicar os fatos históricos é um meio eficaz porque torna acessível à compreensão do aluno
para questões do tempo presente, no entanto, deve ser utilizado com atenção. Alertam sobre a
utilização dessa primeira ideia Cainelli e Schmidt (2009)9 onde, “à proporção que o ensino
factual predomine sobre o explicativo, há o perigo de se utilizar a inteligibilidade do presente

6 KOSELLECK, 2014, p. 9.
7 KOSELLECK, 2014, p. 9.
8 KANT. 1755. p. 335.
9 CAINELLI. SCHIMIDT. 2009. p. 99.
10

para explicar ou ilustrar o passado e deslizar para o senso comum”. A segunda é a de respeitar
a peculiaridade do próprio passado, não significando que os fatos passados devam ser
remetidos ao presente. Uma forma de evitar essa confusão na cabeça do aluno, como as
autoras apontam, é fazendo-o se interessar por outras civilizações, entendendo suas diferenças
e evitando o anacronismo e analogias duvidosas, ensinando-o a contextualizar as informações
e incluir-se nela. Ressaltando essa ideia afirmam que “na verdade é importante entender a
originalidade de civilizações em que as representações coletivas e a mentalidade não podem
ser comparadas as nossas. (CAINELLI. SCHIMIDT. 2009. p. 100). É importante frisar quanto
ao uso dessa segunda ideia o seguinte, o aluno precisa entender sua própria realidade, de onde
veio e onde está inserido e os porquês disso, e só após essa compreensão de si, partir para
conhecimentos externos a sua realidade. Esse movimento acaba fomentando no aluno a
alteridade, o respeito, empatia e interesse pelo outro, construindo um discurso que
desprivilegie a figura do vencedor e do correto. Essa perspectiva promove um movimento
facilitador a compreensão do aluno, principalmente quanto as noções de sucessão, durações,
simultaneidade, mudanças e permanências. Tendo em vista que a construção de imagens
representativas e os eventos, que dentro de um tempo cronológico são de número limitado,
acabam ganhando um reforço no discurso histórico.
Imaginemos que fatores biológicos, genéticos e comportamentais já são um grande
“fio da meada” para discutir sobre o local social do aluno. Questões como sobrenomes,
sotaque e cultura são também elementos que interessam, inserem e cativam a atenção. A
compreensão do termo “justiça”, como por exemplo, sempre foi usada por diversos povos,
essa como uma das instituições humanas mais antigas, no entanto, a diferença situava-se no
senso de justiça, pelas experiências vividas e observações de si próprios e do outro,
influenciados pelos modos operantes divinos, essas civilizações criavam um código de
conduta a ser seguido, tanto por eles quanto pelas futuras gerações. A essência do termo
permanecia, no entanto, as noções do que seria e de quem seria submetido a aplicação dessa
justiça mudavam de civilização para civilização. Outra questão, são as apropriações, como no
exemplo do termo “burguês”, uma classe que surgiu na transição entre a Idade Medieval para
a Idade Moderna. O termo é usado para julgar a ação de qualquer indivíduo que esteja
ostentando, ou não, um bem recém-adquirido, mas o termo que de fato é utilizado no tempo a
que pertence não tem nada a ver com o que hoje é compreendido, e é um anacronismo.

UTILIZAÇÃO DAS LINHAS TEMPORAIS NO ENSINO DE HISTÓRIA


11

O exercício de construção das noções de temporalidade, em Cainelli e Schmidt


(2009)10 é indicado a partir dos primeiros anos afirmando que; “com alunos dos anos iniciais,
por exemplo, atividades de observação de dois objetos iguais, de épocas diferentes, podem ser
úteis para desenvolver essas noções.”. Fotos, figuras, ilustrações, filmes, o fato narrado,
propriamente dito, palavras-chaves como por exemplo: “durante”, “enquanto isso”, “por
enquanto”, são todos instrumentos que podem ser usados em sala de aula. Em Huerta (1999)
, “a linha do tempo estabelece a relação entre o tempo e seus conteúdos.”. É pela linha
11

temporal que é possível compreender a medida e as mudanças do tempo e fazer relação com
as informações. Geralmente, utilizando apenas como suporte pedagógico, os gráficos das
linhas temporais têm maior eficácia, salientando que o aluno assimila as imagens e as
proporções com maior facilidade. Promovendo a capacidade de identificação histórica, uma
visão mais sensível e o aprimoramento da compreensão de fatos que já foram compreendidos
no passado.
Os calendários, um instrumento a ser utilizado na construção da noção temporal,
ajudam-nos a entender a necessidade de relativizar e discutir os períodos, é importante
mobilizar o tempo para que haja a compreensão das durações. Como em Braudel (1990), onde
as durações são estabelecidas numa divisão tripartite da noção temporal, o primeiro como um
tempo estrutural, longo, imóvel e duradouro relacionando com a história das mentalidades;
conjunturais e médias, a exemplo da história da vida social, constituído pelas ciclicidade da
história e por último episódicas e curtas, como na história das biografias e acontecimentos
cotidianos.
Muitas vezes, o aluno está limitado as descrições perceptíveis do passado como se esse
passado fosse estático e sem interação alguma com o presente, consequentemente não
conseguem estabelecer qualquer diálogo. Nos anos iniciais, como aponta Cainelli e Schmidt,
o aluno tem a percepção de um passado fixo, a medida que vai sendo trabalhado essa
percepção o passado passa a ser melhor interpretado e, mais à frente nos últimos anos, esse
passado deve tomar um caráter reconstruído e interagido com o presente, ao menos essa é a
proposta. Mas essa percepção precisa ser aguçada de modo que primeiramente ele
compreenda a si e seu próprio passado. Como entender a si e seu próprio passado, a História
Local pode ser um ponto de partida, pois já é exercitada no âmbito social e familiar. Incitar

10 CAINELLI. SCHIMIDT. 2009. p. 100.


11 HUERTA. 1999. p. 57-59.
12

sobre sua genealogia, buscar no aluno um espirito pesquisador, fazendo-o entender que os
sujeitos que ele tanto preza fazem parte da história assim como ele próprio, isto é, seus pais,
avôs, bisavôs, etc. Todos esses podem contribuir com o entendimento/construção dessa
história. Após entender os contextos da sua localidade ligando seus pares, isto é, a própria
família a história da sua localidade, a História Nacional pode trazer respostas as
peculiaridades do tempo. Esses assuntos abordados passando pela História Contemporânea
para que se entenda o local onde aluno está situado, tanto geograficamente quanto temporal.
Adentrando a História Moderna, o aluno passa a entender de como e onde viveram seus
antepassados (bisavós) e quais costumes e contribuições trouxeram seus familiares ao âmbito
nacional, traços culturais que ainda permanecem. Já na História Medieval ele entende como
questões esses traços foram fixados com o passar do tempo. Na História Antiga o aluno
entende como esses traços foram constituídos. Por último, o aluno compreende como essa
jornada é extensa e que ela está intrinsecamente ligada a ele, e é com a Pré-História, que ele
entende como esses traços culturais se fundamentaram. E todo esse processo evolutivo trouxe
peculiaridades importantes a sobrevivência, e que se mantiveram até hoje.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Compreender a temporalidade e suas particularidades implica na construção da relação


entre passado, presente e futuro, isto é, entender a importância do ensinar História
promovendo no aluno um reconhecer de tempos distintos, personagens singulares,
experiências coletivas, práticas socioculturais, cotidiano e valores que perpassaram milênios e
ainda mantem traços preservados (mesmo que fora da vida cotidiana contemporânea). Esses
são revisitados pelos alunos de forma imprecisa, sendo necessário a inclusão desse aluno para
que perspectivem a temporalidade de modo a evitar equívocos quanto a leitura do tempo.
Ao discente é função essencial intermediar essa conexão do tempo vivenciado, tempo
presente com o passado, tendo em vista a unicidade do passado e suas características socio-
individualizantes que por si já o distingue do presente, todavia fatos ocorridos nesse contexto
adquirem formas enraizadas na sociedade e algumas delas sobressaem ao tempo e configuram
ativamente no presente, a exemplo disso, as grandes invenções do período renascentistas que
marca um novo olhar para o homem sobre si mesmo e o que se passa ao seu redor. Nesse
sentido, a conceituação e compreensão do tempo no ensino prioriza que o alunado situe-se
13

nele e atente as particularidades de cada momento sem deixar de reparar naquilo que respinga
sobre o mundo ao qual ele vivencia cotidianamente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRAUDEL, Fernand. História e ciências sociais. Lisboa: Presença, 1990.


CAINELLI, Marlene; SCHMIDT, Maria Auxiliadora. Ensinar História. Editora Scipione: São
Paulo, 2009.
CAINELLI, Marlene; SCHMIDT, Maria Auxiliadora, Educação histórica, Teoria e pesquisa,
Ijuí: Ed.Unijuí, 2011.
CARVALHO, José Murilo de. A vida política. História do Brasil Nação (1808-2010), v. 2, p.
83-130, 2012.
FORNECK, Mara Betina. ENSINO DE HISTÓRIA, TEMPO E TEMPORALIDADES: UMA
EXPERIÊNCIA DE FORMAÇÃO CONTINUADA COM PROFESSORES DE HISTÓRIA
DE ARROIO DO MEIO/RS. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em
Ensino de História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 2017.
HUERTA, Mireya L. La temporalidad y ias lineas dei tiempo en la ensefianza de ia historia.
Iii: TERRAZAS, L. H. G.; HUERTA, Mireya L. Un Reto: La ensnfiana de la historia hoy.
México: Instituto Superior de Ciencias de ia Educacíón de Estado de México/Sindicato de
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ROUSSEAU. Jean-Jacques. Contrato Social, 1762.
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Editora Universidade de Brasília, 2007.

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