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Universidade Federal do Amazonas

Programa de Pós-Graduação em História

Trabalho apresentado como requisito


parcial de avaliação da disciplina História e
Imagens Semestre 2022-1

Docente: Prof. Dr. James Roberto Silva

Discente: Iago Almeida Catunda

José Carlos do Patrocínio, Maçom negro e atuante na propaganda


abolicionista no Século XIX.

Introdução
O processo de Abolição da escravidão no Brasil teve um papel funcional da maçonaria na
propagação dos ideais abolicionistas e nas práticas emancipatórias nas províncias. No
Amazonas, Grão-Pará, São Paulo e entre várias outras regiões tiveram a participação de
maçons atuando para que a abolição fosse aderida na respectiva localidade e apoiada pelos
mecanismos legislativos e judiciários da época, utilizando as ferramentas que estavam
dispostas para tal, isto é, utilizando de suas posições dentro da sociedade para legitimar a
causa. Dentre essas personalidades, cabe aqui analisar e discutir acerca de um grupo dentro
da maçonaria essencial, os negros maçons que estavam lutando para que a abolição fosse
aderida na sociedade.
Partiremos de um retrato, a imagem de José Carlos do Patrocínio para a tentativa de recolher
elementos que possam vir a responder e contextualizar quem eram esses homens, quais suas
posições dentro da sociedade da época e suas participações dentro do processo abolicionista.
Todavia, cabe aqui deixar claro que estas perguntas estão subjetivamente intrínsecas no
processo de interpretação do autor, sem a busca direta dessas perspectivas na análise, mas
encontradas no processo posterior da observação da fotografia, seguindo o que é dito em,
“Um historiador que estuda as imagens, dizendo: "E isso que eu estava procurando,
porque essa imagem se inscreve em tal contexto, pertence a tal situação",
naturalmente vai encontrar o que procura, mas não vai encontrar o que não estava
procurando. Por isso, é preciso não procurar nada numa imagem, para ser capaz de
descobrir aquilo em que não estávamos pensando,
que não era imaginável a priori.” (DE MORAES, Marieta apud DUBOIS, Phillipe,
Entrevista, 2003, P.154)

1.1 Características da imagem: o que ela nos informa e o que enxergamos


A princípio, é possível denotar que, há uma postura formal ao mesmo tempo em que, um leve
desprendimento de ajustar a expressão corporal em um módulo rígido para o registro, visto
que, os ombros decaem de um ângulo reto e linear, criando algumas suposições sobre a
persona do protagonista da foto. Há possivelmente uma despreocupação por parte do
fotografado em exercer uma postura imponente, afastando sua imagem de alguém que não
compõe erros em sua personalidade. Podemos também teorizar que, existe um desconforto
no homem fotografado, como se não houvesse um costume de aparecer ou retratar-se para o
público por meio das fotografias, mas que havia uma necessidade externa para que essa
imagem fosse registrada, levando-o a ser capturado pela foto, mas não sabendo como se
adequar fisicamente ao momento. Outra perspectiva é a de que, a postura dos ombros nada
mais são do que um hábito vicioso da época, não sendo um desconforto por conta do registro
ou descaso em parecer alguém imponente e sim uma posição confortável e costumeiramente
utilizada naquele período para ser fotografado, podendo não ser a mais utilizada para as fotos,
mas não necessariamente fugindo do decoro.

Pode ser vislumbrado também a posição social do indivíduo assim que é observado o
conjunto das vestimentas que o cobria. É notório que, o casaco abotoado cobre uma peça
branca e sobrepõe um conjunto social da época utilizado pela elite em festas ou para registro
de imagens, que pode ser o caso da foto. O "terno" utilizado sinaliza que o homem fazia parte
de uma casta social alta, além de ser uma figura importante pela necessidade do registro
fotográfico que foi outrora exposto em jornal. Além disso, a postura ocular do sujeito fitando
o horizonte parece emular o que deveria ser uma tentativa de tornar a foto ainda mais natural,
como se houvesse uma necessidade de suavizar o personagem registrado para quem pudesse
vir a observá-lo.

Entrando no âmbito secular da fotografia, há de ser dito que, a época da foto corresponde a
séculos atrás e as ferramentas para tal tinham um grau de limitação maior do que os atuais,
porém, a etnia do sujeito pode ser observada e nos diz bastante sobre os tantos outros nuances
e elementos já identificados até aqui. A princípio, a configuração corporal desajustada tende
a esclarecer que, a condição do homem parecia ser mais de desconforto do que desleixo para
o registro devido a condições externas da foto, isto é, partindo do princípio que a foto foi
tirado antes da abolição em seu local de origem (nesse casso, o Brasil) não seria tão comum
que um homem preto estivesse em voga para o registro naquelas condições, fazendo assim
uma quebra de paradigma e um ato em contrapartida as práticas da época, mas ao mesmo
tempo gerando esse desconforto do imprevisível que poderia vir com o registro do mesmo.

Analisando características mais técnicas da imagem, o filtro utilizado que demarca o período
do registro também gera uma reflexão sobre de que forma os artistas fotográficos queriam
que observássemos as pessoas da época. Obviamente há um conflito entre possibilidades de
cores em imagem e intenções de manipular uma fotografia. Aqui, o homem que foi registrado,
por mais que fosse inserido a sociedade como um membro da elite, também pode ter sido
“maquiado” pelo filtro na tentativa de embranquecer sua pele ou até mesmo confundir a
tonalidade da mesma para que o observador não consiga distinguir a tonalidade certa da
mesma. Intencional ou não, o fato é que quando visualizado rapidamente, cria-se uma
corriqueira confusão acerca da etnia do homem, mas logo decai quando é visto as
características étnicas, podendo ser o filtro mais um reflexo do que a sociedade empunhava
para o visualmente aceitável do que uma estratégica sistemática e direta de divergir a ideia
sobre o protagonista da foto. Ainda assim, a possível manipulação da foto deve ser levada em
consideração e faz parte da análise, pois nos diz sobre uma tendência ideológica da época, a
exemplo do que é dito no texto de Ulpiano sobre a autenticidade da imagem, podendo ser
visto em,
“E, se caso pudesse ser confirmada a intenção deliberada de produzir uma imagem
voltada para a indução de determinados efeitos ideológicos, isso seria importante,
como já se afirmou acima, para caracterizar práticas (dominantes ou transgressoras)

(...)” (MENESES, Ulpiano, Departamento de história, P.139)

Em Suma, os componentes que se misturam com a clareza e o abstrato da imagem nos


direcionam para a proposta inicial de tentar entender o que a fotografia nos diz sobre um
conteúdo histórico perpassado no texto, ou seja, maçons negros que atuaram na propaganda
abolicionista. Visualmente, não conseguimos assimilar as entrelinhas da história do homem
que cedeu sua imagem na foto, no entanto, ao olharmos para o jornal que também apresenta
a imagem e descrição sobre o personagem, torna-se mais evidente que José do Patrocínio
(descrito na legenda do jornal) era um atuante ferrenho no processo abolicionista, sendo
denominado como “O tigre da abolição”, sendo ao que entendemos uma imagem
representativa para a propaganda. Não há como evidenciar somente pela foto também
qualquer envolvimento com a instituição maçônica, mas há de ser levantado que, seu nome
é citado em boletins do Grande Oriente do Brasil de 1897 na “Apuração

Geral da Eleição de Grão-Mestre Adjunto”, consolidando que a imagem retratada consolida


a participação de homens negros na atuação da abolição da escravatura e dentro da
Maçonaria.

1.2 – O que sabemos e descobrir a partir da imagem fotográfica


Por fim, cabe dizer que José Carlos do Patrocínio não foi apenas fotografado como objeto de
divulgação para uma propaganda, está citado proprietário do periódico “Gazeta da
Tarde” e envolvido em diversos escritos, devido a sua função profissional como Jornalista.
A matéria de jornal junto a imagem se entrelaça e comunica fortemente quem era José do
Patrocínio. Todavia, analisando somente a imagem temos como concluir diversos aspectos
referentes a persona concretizada na mesmo, ainda que, não possamos captar as
subjetividades externas a foto, podemos refletir e recolher diversos materiais para utilizarmos
dentro do campo histórico, sendo a fotografia a fonte primária do processo e os escritos(nesse
caso) um condicionamento complementar para nos comunicar sobre as problemáticas
levantadas, gerando assim, uma tese acerca do indivíduo, uma antítese com as incertezas
sobre a autenticidade das informações e a síntese á partir das mesclas entre os fatos
encontrados da fotografia e as pesquisas nos documentos, seguindo o pensamento de reflexão
e crítica no exemplo do texto de Ulpiano em “O Fogão da Société anonyme du gaz: Sugestões
para uma leitura histórica de imagem publicitária”, que não busca produzir novas
perspectivas e conhecimentos, mas analisa-los, observado em,
“Meu propósito não era produzir conhecimento novo, mas chamar a atenção para a
necessidade de ler as imagens (e, aqui, por felicidade, os textos e as imagens,
conjuntamente) apresentando-lhes questões históricas precisas.” (MENESES,
Ulpiano, 2000, P-117).

(Fonte: Jornal Dom Casmurro, 1937

(Fonte: Domínio Público)

Referências Bibliográficas

MENESES, Ulpiano, A fotografia como documento Robert Capa e o Miliciano abatido


na Espanha: Sugestões para um estudo Histórico, Revista Tempo, Departamento de
História/ FFLCJ/USP, 2002.
MENESES, Ulpiano, O Fogão da Société anonyme du gaz: Sugestões para uma leitura
histórica de imagem publicitária, Projeto História, SP, 2002.
DE MORAES, Marieta, Entrevista com Phillipe Dubois, História e Imagem n.34,

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