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Círio de Nazaré: história e imagem em Belém do Pará

Nalton Rodrigues Caminha1

Minha análise se inicia pela palavra “Círio”, em destaque na parte


superior do cartaz, que remete à Nossa Senhora de Nazaré e sua procissão.
Aqui a categoria movência é inaugurada e perpassa nos demais elementos que
compõem a imagem em questão.
As folhas garantem movimento às aves e à imagem da santa, que se
conectam com o cenário paraense, enfatizado pela fauna amazônica, e
movem-se “para o mundo”, como direciona o slogan do cartaz.
A expressão “riqueza do Pará para o mundo” pode ser analisada
primeiramente pelo próprio Círio, como a procissão religiosa que mais
movimenta a economia local, como também ao minério, um dos principais
produtos de exportação do estado.
A pedra que está sob a imagem da santa pode ser entendida como um
pedestal ou mesmo berlinda, adereço importante na procissão ao garantir
proteção e destaque no percurso.
Dentre as cores apresentadas, enfatizo que o tom alaranjado no canto
superior esquerdo do cartaz sinaliza o calor característico do verão amazônico
e a luz amarela que emana da santa representa santidade, riqueza e o círio
(vela).
Vianna (1900) demonstra em seu estudo que desde o período colonial a
Amazônia é vista como terra dos tesouros, lendas e imaginários, por onde
navegações se faziam necessárias para desbravar o desconhecido, onde a
mitopoética da santa encontra-se aglutinada no contexto dos achados, como
reafirmado no enunciado do cartaz:

Em 1700 o caboclo Plácido encontrou a imagem da santa na beira de


um rio. Ele levou para casa por duas vezes, mas no dia seguinte a
imagem voltava para o mesmo lugar onde foi achada. Plácido
resolveu construir no local uma pequena capela. E foi assim que
começou o Círio, essa riqueza da fé paraense que conquistou o

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Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do
Pará (PPGED/UEPA). Bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (CAPES). Membro do Grupo de Pesquisa História da Educação na Amazônia
(GHEDA).
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mundo. Hoje, reconhecido pela UNESCO como Patrimônio Cultural


Imaterial da Humanidade. O Simineral deseja um feliz Círio a todos!
(VALLE, [s.d]).

Os rios são as rotas, caminhos da floresta. As canoas, meio de


transporte. A água representa fluidez, movência, vida, conexão, comunicação
entre os povos e etnias de uma Amazônia múltipla.
A mesma corda que amarra a canoa no local de embarque e
desembarque puxa a imagem da santa durante a procissão. Uma relação direta
com paragem e movência. Enquanto os nós presentes na corda representam
fé, promessa, mas também dificuldade.
O caboclo é representado como protagonista num cenário devocional do
catolicismo popular envolvido pela riqueza da fauna e flora amazônica, mas
esse mesmo envolvimento é preservado em relação a divisão dos lucros com a
comercialização dos minérios? A indumentária e o papel do ribeirinho na
Amazônia, apesar de estarem estigmatizados no cartaz, sinalizam um retrato
atemporal de como vivem os povos da floresta.
Outras dúvidas recaem sobre o sindicato e as empresas de minério, a
exemplo do preço que a exportação das riquezas amazônicas para o mundo
ocasiona. Afinal, os impactos socioambientais são levados em conta a ponto de
serem pensadas soluções com a comunidade nativa? Tais impactos são
minimizados de alguma forma? As comunidades tradicionais, bem como seus
conhecimentos são preservados e agregados, a fim de trazer integração e
sustentabilidade à ação mineradora?
O último ponto levantado diz respeito à intencionalidade do cartaz.
Desde a escolha da tipografia utilizada, variando entre fontes cursivas (casuais,
populares) e sóbrias (impessoais, formais), a quem coloca a santa e o caboclo
em destaque. Esses e outros detalhes refletem a complexidade da imagem e
as possibilidades de leitura e análise.

Referência
VALLE, Roni. Simineral. [s.d]. Disponível em:
https://br.pinterest.com/pin/simineral--776026579523060780/. Acesso em: 20
de jun. de 2022.
VIANNA, Arthur. Monographias Paraenses. Revista do Instituto Historico
Geographico e Ethnographico do Pará, Belém: Imprensa Official, v.1, n.2,
p.115-147, 1900.
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Anexo 1

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