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AVISOS SUNS!

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autora, de modo a proporcionar ao leitores e também admiradores o acesso à
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livros sem previsão de publicação no Brasil, traduzindo-os e disponibilizando-
os aos admiradores, sem qualquer forma de obter lucro, seja ele direto ou
indireto.
Levamos como objetivo sério, o incentivo para seus admiradores
adquirirem as obras, dando a conhecer os autores que, de outro modo, não
poderiam, a não ser no idioma original, impossibilitando o conhecimento de
muitos autores desconhecidos no Brasil.
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obtenção de lucro direto ou indireto, nos termos do art. 184 do código penal e
lei 9.610/1998.
PREFÁCIO

Caro leitor,

Morally Decadent é o terceiro livro da série Morally Questionable NÃO


é um romance independente.

Por favor, não leia se você não leu Morally Corrupt e Morally
Blasphemous primeiro!

Este livro foi escrito como um complemento para os dois primeiros da


série e, como tal, pressupõe que você já esteja familiarizado com os
personagens, detalhes e pontos da trama. Você não entenderá o enredo
se ler como um independente.

Eu também gostaria de chamar sua atenção para dois dos gatilhos


deste livro: abuso de animais e abuso infantil. Incluí números de
capítulo, caso você queira pular essas cenas.

O abuso de animais descrito não é intencional, mas pode ser


difícil de suportar por alguns leitores, uma vez que os animais são
usados em uma cena de tortura (capítulo dezessete). As cenas de
abuso infantil apresentam abuso sexual, com algumas cenas sendo
mais detalhadas que outras (capítulo catorze). Por favor, continue com
cautela se isso é algo com o qual você não se sente confortável.
Dito isto, Enzo e Allegra são muito queridos para o meu coração e
espero que você aproveite a jornada tanto quanto eu adorei contar a história
deles.

Esteja ciente de que, enquanto o casal neste livro obtém seu HEA, há
um gancho para o próximo livro da série.

AVISO DE GATILHO: abuso de animais, abuso, alusões a distúrbios


alimentares / imagem corporal, tentativa de estupro, sangue (gore), jogos de
sangue, bullying, abuso infantil, morte, termos depreciativos,
consentimento duvidoso, representações extremas de tortura, armas,
violência gráfica, situações sexuais, situações incestuosas, jogo de facas,
manipulação, assassinato, abuso sexual, estupro, ferimentos graves.
PRÓLOGO

Uma névoa vermelha cobre os meus olhos enquanto olho para sua
forma lamentável. Ela deve ter notado a mudança em mim porque está
encolhida no canto, tentando manter uma distância entre nós.

Em dois passos, eu a tenho pela garganta, espremendo a vida dela.


Seria tão fácil. Um pouco mais de pressão e eu a quebraria.

— O que você fez, Allegra? — Eu pergunto a ela através dos dentes


cerrados. Eu já sei a merda que ela puxou, mas quero ouvir de seus próprios
lábios.

— Não posso... respirar... — Ela chia, e eu sinto vontade de apertar


mais forte. Finalmente tirar a sua vida.
— Conte-me. O. Que. Você. Fez? — Eu enuncio cada palavra,
afrouxando meu domínio por tempo suficiente para que ela me responda.

— Ela mereceu, — ela chia e eu a bato contra a parede. Ela choraminga


de dor, mas sua expressão não muda. É uma mistura de desafio e malícia
que me deixa mal do estômago.

Como eu pude viver com ela por tanto tempo?

— Você está morta. Você sabe disso, não é? — O canto do meu lábio se
enrola em escárnio. Ela está morta há muito tempo. Acabei estendendo meu
tempo.

— Você... não pode... — ela gagueja.

— Sério? — Eu pergunto ironicamente, e meus dedos cavam na pele


dela, parando seu fluxo de ar.

— Papai? — Uma voz minúscula me impede de matá-la.

Eu me viro e assisto com horror quando meu filho entra na sala, com o
rosto cheio de preocupação.

— O que você está fazendo? Mamãe?

Eu a solto imediatamente, e ela cambaleia de pé.


— Sua mamãe e eu estávamos apenas tendo uma conversa adulta. —
Eu explico para ele, olhando para ela para ficar de boca fechada.

Ela foi salva agora.

Mas não por muito tempo.

— Por que você não vai para a cama, Luca? Eu vou ler uma história em
alguns minutos. — Eu o enxoto para fora da sala e, felizmente, ele ouve.

Quando ele está fora de vista, eu volto para encará-la — a desgraça da


minha existência.

Ela luta para se levantar e ri de mim.

— Não pode me matar, você pode? O que você dirá ao seu filho? — Ela
tem um olhar presunçoso no rosto, convencida de que Luca a salvaria.

Oh, como ela está errada.

— A verdade. — Eu dou alguns passos em direção a ela. — Que a mãe


dele era uma prostituta e uma traidora.

Sua confiança desaparece e ela instintivamente cai, sua bunda batendo


no chão com um baque. Ela se arrasta para trás, os olhos buscando uma
saída.
— Acho que ele prefere me julgar por não ter matado você mais cedo.
— Um sorriso cruel se estende no meu rosto.

Mais um passo.

Apenas mais um passo.

E ela estará morta.


PARTE I

Se eu pudesse voltar no tempo, escolheria a morte em vez dele.

-Do diário de Allegra


CAPÍTULO UM

9 Anos Atrás

— Mas Senhorita, — Cecilia, minha governanta, exclama, me seguindo


enquanto vasculho o armário do meu primo.

— Você não pode me convencer disso, Lia. Eu estou fazendo isso. — Eu


digo, pegando um par de calças que parecem que podem caber, considerando
que meu primo é quatro anos mais novo que eu e ainda não passou pela
puberdade completamente.

— Mas senhorita, — ela começa, o lábio tremendo um pouco, — seu


casamento é daqui a duas semanas. E se algo acontecer? — Eu abafo o desejo
de revirar os olhos com a menção das minhas próximas núpcias.
— Nada vai acontecer. Eu pensei em tudo. Eu vou embora apenas por
um dia, e voltarei antes da meia-noite.

— Se seus pais descobrirem... — Ela balança a cabeça, já imaginando o


pior.

— Eles não vão, a menos que você diga a eles. — Mãos nos quadris, eu
me viro para ela. — Eles ainda estão na América, e é provável que somente
voltem logo antes do casamento. — Arqueio uma sobrancelha, esperando
que ela me contra diga. Lia sabe que meus pais não se importam comigo,
eles têm minha irmã por isso.

— E se o Signor Franzè descobrir? — Respiro fundo, irritada com a


mera menção ao nome dele.

Achille Franzè é meu futuro marido e Capo crimini do ‘Ndrangheta da


Calábria. Algumas décadas mais velho, ele tem sido meu noivo nos últimos
cinco anos. Só conheci o homem duas vezes, e nas duas vezes fiquei
petrificada com ele. Mas meus pais estão ansiosos por essa aliança, tanto
que o casamento acontecerá no dia em que eu fizer dezoito daqui duas
semanas.

Quando o contrato foi assinado, a escolha foi entre minha irmã e eu.
Achille tinha sido ambivalente; aos seus olhos, qualquer jovem noiva
virginal faria. Meus pais, no entanto, viram uma abertura para se livrar de
mim e salvar sua preciosa filha. Eles sabem que nenhuma felicidade me
espera depois que os votos forem proferidos.
Posso temer o meu futuro, mas também sou inteligente o suficiente
para saber que não há saída. Tantas noites eu tinha planejado como fugir,
obter uma nova identidade e viver feliz para sempre. Mas esses
pensamentos são reservados para quando eu vou dormir, quando posso me
imaginar vivendo uma vida totalmente diferente. No momento em que
desafio meus pais, ou Achille, estou morta.

Eu sei disso, e Lia também, e é por isso que ela está tão preocupada
comigo. Estou resignada com o meu destino, mas ainda sou um pouco
egoísta. Quero uma lembrança para mim, apenas uma para me aquecer pelo
resto da minha vida.

Eu nunca deixei meu vilarejo; eu mal tive acesso à tecnologia; eu nunca


comi boa comida, muito menos comida suficiente. Simplesmente não conheci
nada além dessa mansão sombria que guarda minhas memórias mais
queridas, mas também meus medos mais profundos. É tão ruim querer
experimentar outra coisa apenas por um dia?

Crescendo, os livros eram meu único consolo. Existem apenas alguns


títulos italianos na biblioteca, todos projetados para sufocar meu
conhecimento e me manter em uma bolha ignorante, me converter na noiva
idiota perfeita. A maioria dos livros é em inglês, espanhol ou francês. Mas
meus pais não contavam com uma coisa — meu desespero.

Por acaso, um título duplicado estava disponível em italiano e inglês,


então eu examinei esses textos por dias, meses, anos a fio, comparando
palavras e estruturas de frases, até que eu aprendi o idioma. Com
dificuldade, mudei para outros títulos em inglês, mas quanto mais me
imerso nessa nova língua, mais familiar me tornava com ela. E um novo
mundo se abriu.

Eu li sobre Paris e Nova York, sobre moda e comida exótica; sobre arte
e história. Eram coisas que eu sabia que eram proibidas, mas me deliciavam
mais do que tudo. Acima de tudo, eles me mostraram como as pessoas são
livres. E eu fiquei gananciosa.

Quanto mais meu casamento se aproximava, mais inquieta me tornava,


pensando no desconhecido; sobre as pinturas que eu nunca veria, o chocolate
que nunca provaria; ou a música que nunca ouviria. Essa curiosidade
cresceu a tal ponto que finalmente quebrei. Estudei todos os mapas
disponíveis, distâncias e horários calculados, tudo em direção a um objetivo
— viver: se apenas por um dia.

— Ele não vai. Ele não pode. Eu tenho planejado isso há 1 ano, Lia. Eu
tenho os mapas memorizados; eu conheço as estradas do avesso. Eu posso
fazer isso. Vou para a cidade de manhã cedo e volto antes da meia-noite.

Milena, o vilarejo em que nasci e nunca saí, fica a algumas horas de


Agrigento, anteriormente uma das maiores cidades da Grécia Antiga, e sede
de inúmeras ruínas, museus e restaurantes. A uma curta distância do mar,
o Agrigento cobrirá a maioria dos itens da minha lista de desejos.
— Mas os guardas... — Lia balança a cabeça. Eu sei de onde ela está
indo. Ela sabe o risco que estou assumindo, mas me vejo cada vez mais
imprudente apenas por esse gosto de liberdade.

— Eles vão pensar que estou doente. Eles não saberão que fui embora.
— Vestida como menino, eu saía de casa ao amanhecer e andarei de bicicleta
toda a distância até Agrigento. — Vamos, Lia. Você sabe o quanto isso é
importante para mim. — Eu adiciono um tom suplicante, tentando adoçá-
la. Ela tem sido mais mãe para mim do que a minha própria.

— Você não vai se cansar? Duas horas andando de bicicleta são muito
quando você nunca fez isso antes. — Ela franze os lábios.

— Eu levei isso em consideração. Por que você acha que eu tenho subido
e descido as escadas há meses?

Quando digo que planejei completamente, realmente o fiz. Mesmo algo


tão simples quanto a condição física, eu tinha planejado. Eu arriscava ficar
doente por me exercitar demais sem nutrição suficiente, mas funcionou.

— Não acredito que estou concordando com isso. Oh, que a Virgem
Maria te proteja. — Ela faz o sinal da cruz sobre o meu corpo antes de enfiar
os dedos no avental e me entregar algumas notas.

— Lia... — Gaguejo, lágrimas se acumulando no canto dos meus olhos.


Dinheiro... ela está me dando dinheiro quando tem tão pouco.
— Você deve aceitar isso. Use-o com sabedoria, criança. — Eu não a
deixo terminar enquanto eu a abraço.

— Obrigada.

Embora eu tivesse planejado tudo, fundos insuficientes ainda eram um


problema. Eu tinha resolvido penhorar alguns anéis de ouro, mas agora esse
dinheiro garantiria que eu estivesse segura, mesmo que isso não desse certo.

Quando o grande relógio no grande salão toca três da manhã, estou


pronta. Minha mochila está cheia de todas as necessidades até chegar a
Agrigento: mapas, dinheiro, comida e água. Balanço a mochila por cima do
ombro e na ponta dos pés desço as escadas. Os guardas devem estar
dormindo. Lia me ajudou a embeber a comida e o vinho da noite com
Valerian. O sono deles será ininterrupto e será suficiente para eu escapar.

As roupas que eu roubei do meu primo se encaixavam, nada


surpreendente. Um par de calças cinza, uma camiseta preta justa e uma
camisa branca que eu vestia desde que o ar noturno pode estar frio. Eu
também vesti um boné para esconder meus cabelos compridos. É difícil
acreditar que uma menina de dezoito anos se encaixasse nas roupas de um
garoto de quatorze anos, mas quando alguém faz uma dieta rigorosa nos
últimos quatro anos, com quase nada além de caldo ralo e alguns vegetais,
você tende a ser bem pequeno. Eu estaria disposta a apostar que ninguém
poderia dizer que eu sou uma garota. Não quando sou apenas pele e osso
sem nenhuma forma. Porque, aparentemente, Franzè prefere suas
mulheres muito magras.

Ao longo dos anos, Lia pegou comida aqui e ali, mas mesmo isso era
difícil de fazer, já que ela não estava encarregada das compras ou da
culinária. Meus pais haviam ordenado estritamente que tudo que engorda
fosse removido da casa. Houve algumas vezes em que tentei roubar a comida
dos guardas e, além de ser uma experiência embaraçosa, fiquei de castigo
por uma semana pela primeira vez e um mês toda vez. O castigo tinha sido
ainda menos comida, então eu aprendi rapidamente minha lição.

Eu caminho em direção à parte de trás da casa, onde descobri um


buraco na cerca. Como sou bem pequena, posso me encaixar facilmente na
abertura.

Empurro a mochila primeiro antes de me achatar no chão. Eu rastejo


para a frente e, em alguns movimentos, estou do outro lado. Pegando minha
mochila, não demoro mais e saio do beco.

Planejamos tudo, e Lia havia escondido uma bicicleta velha nos


arbustos algumas ruas abaixo. Pescando a chave do cadeado do meu bolso,
destranco a bicicleta e coloco minha mochila na cesta da frente. Desdobro o
mapa e seguro-o na cesta para que eu possa alcançá-lo facilmente na
estrada. Então eu pulo e começo a pedalar.

O sol está nascendo no céu, e a luz facilita a visualização para onde


estou indo. No caminho, só paro algumas vezes para engolir um pouco de
água e comer alguma comida. Embora minhas pernas estejam doendo, pelos
meus cálculos, eu deveria estar bem perto de Agrigento.

Limpando o suor da minha testa, eu empurro para frente.

Só um pouco mais.

Pedalo e pedalo e, finalmente, posso ver algo à distância. Os edifícios


começam a tomar forma e meu coração acelera só de pensar nisso. Estou tão
perto... Eu pisco duas vezes, meus olhos já estão cheios de alegria e medo.
Eu preciso absorver tudo.

Respirando fundo, paro e verifico meu mapa novamente. Um modelo


mais antigo, já contando que talvez não tenha todos os novos edifícios e
estabelecimentos. Ainda assim, eu fiz um itinerário curto.

Eu entrava em Agrigento, visitava a biblioteca, ia a uma cafeteria e a


um restaurante. Eu reservei um pouco de tempo para passear antes de ir
para as ruínas, a uma curta distância ao sul da cidade. Então eu continuaria
para o sul para chegar à praia. Eu sorrio para mim mesma, o pensamento
de experimentar isso pela primeira vez me fazendo explodir de emoção.
Afastando o mapa, me instalo no assento e continuo minha jornada. A
alguns quilômetros de distância, os edifícios aparecem nos dois lados da
rodovia. Há carros indo na frente e atrás de mim, e apesar de toda a
novidade disso, não consigo reunir nenhum medo. Eu pedalo mais rápido,
sentindo a brisa quente e fria passando pelo meu rosto, arrepios aparecendo
no meu corpo. Aumento minha velocidade, respirando ar fresco.

Livre! Eu me sinto livre!

Meus lábios se estendem para um sorriso largo e eu sorrio como uma


tola. Tantas vezes eu tentei imaginar isso... Olho para a direita e para a
esquerda e imprimo tudo em minha memória. As vistas, os cheiros, a pura
sensação de liberdade. Eu gravo tudo, sabendo que é limitado.

A estrada serpenteia em várias ruas menores e sigo a saída marcada


no meu mapa. Descendo a colina, os prédios ficam mais amontoados, criando
um sentimento urbano com o qual não estou familiarizada.

Minha vila é simples e, além da casa da minha família, que poderia ser
considerada a mais ostensiva da região, o resto das casas são modestas, as
estradas pequenas e descuidadas. Enquanto continuo pedalando, fico
impressionada com as diferentes arquiteturas, as cores dos edifícios e
alguns de seus tamanhos.

Dado que estou na minha bicicleta, é muito fácil abandonar a rua


principal e descer pelos becos. Assim como as ruas, elas são estreitas,
subindo e descendo e seguindo a forma da colina, tornando minha jornada
ainda mais cansativa. Mantendo a estrada marcada no meu mapa,
atravesso alguns becos, indo direto para o centro da cidade.

Poupando um olhar para o meu relógio, percebo que tinha feito um


tempo perfeito, são quase oito da manhã. Passo por algumas lojas e seus
horários mostram que abrem às nove. Estou um pouco decepcionada, porque
é uma hora não contabilizada na minha agenda. Estou sentindo o pânico
surgir, então respiro fundo.

Eu consigo!

Eu pulo da minha bicicleta para andar liderando-a pelo guidão. Indo


para o centro histórico, paro quando chego a uma igreja. Eu procuro um
lugar confortável e sento-me. Tirando o que resta da minha comida, como
enquanto vejo as pessoas entrarem e voltarem pela praça.

É tão estranho... Quanto mais eu sento lá, mais pessoas vejo. Acho que
nunca vi tantas pessoas na minha vida. É como se eu estivesse encantada
enquanto os assistia passar o dia, provavelmente indo para o trabalho.

Quando são quase nove horas, me sacudo das minhas reflexões e


procuro uma loja de penhores. Sou direcionada para uma não muito longe
de mim e sou bem-sucedida em vender os anéis de ouro por um pouco de
dinheiro.

Definitivamente, isso deve ser suficiente por um dia.


Tudo resolvido, olho para minha lista de desejos. O que devo fazer
primeiro?

Estou andando pelo centro da cidade quando um cheiro delicioso me


atinge. Fecho os olhos e respiro, meus pés já me levam até a fonte. Uma
barraca está fritando um pouco de comida, as formas ovais alaranjadas e
crocantes. Eu pisco duas vezes, minha boca já produz uma abundância de
saliva.

Limpo minha garganta e tento mudar minha voz para parecer um


menino.

— O que são esses? — Eu pergunto, meus olhos ainda estão enraizados


nas iguarias na minha frente.

O homem que prepara a comida franze a testa.

— Você não sabe? — Ele parece indignado, com as mãos se movendo no


ar, e eu instintivamente dou um passo atrás. — Garoto, você viveu debaixo
de uma pedra? Isso é arancini, Orgulho siciliano. — Ele balança a cabeça,
claramente indignado pela minha pergunta muito inocente. Bem, seja o que
for, preciso de um pouco.

— Me dê... — Eu paro, tentando pensar quantos eu precisaria, — dez!


— Sim, isso deve funcionar bem. Eles são bem pequenos, afinal.

Murmurando algo debaixo da respiração, o homem faz o que foi dito,


me arrumando dez arancini em um pequeno saco. Eu pago e começo a me
mover, mas um novo cheiro me atinge. Desta vez é doce. Perco todo o sentido
e vou rapidamente para a próxima barraca. Tendo aprendido minha lição,
não pergunto o que são, apenas digo meu pedido com confiança.

— Posso ter cinco, por favor? — Eu decido cinco, pois eles são um pouco
maiores que os arancini.

— Cinco cannoli chegando. — A senhora exclama, e eu aceno para mim


mesma, memorizando o nome.

Quando estou no final da rua, tenho cerca de dez sacolas comigo, todas
cheias de diferentes comidas de rua. Guardo alguns para mais tarde,
enchendo a cesta da bicicleta com as sacolas. Tirando o arancini e o cannoli,
encontro um lugar para me sentar e começo a comer.

Primeiro é o arancini, e oh meu Deus, que combinação saborosa é com


o exterior crocante e o recheio de carne. Eu quase gemo quando toca minha
língua. Quando foi a última vez que tive algo frito? Algo com carne e molho?
Suspiro de prazer, enchendo minha boca com arancini a arancini. Logo, o
saco está vazio.

Mas eu não paro.

Meu estômago está cheio, mas parece impiedoso. Mais, eu preciso de


mais. Caso contrário, nunca mais terei a chance. Estimulada por esse
momento de carpe diem, mergulho nos cannoli. Mordo a bolacha e o creme
explode na minha boca, atacando meus sentidos com uma doçura tão
estranha que é quase insuportável.
— Deus... — Eu sussurro entre bocados, o chocolate esmagando meus
sentidos e me deixando sobrecarregada.

Como isso é possível?

O sabor é tão potente e perfeito que como um após o outro até ficar com
apenas um. Eu coço meu rosto um pouco enquanto olho para ele, meu corpo
inteiro se rebelando ao pensar em comer outro. Mas eu não escuto.

Não... Eu devo ter tudo.

Empurro-o na boca, mastigando lentamente e tentando engolir. Respiro


fundo e fecho os olhos, mas é um segundo depois que tudo volta. Estou
rapidamente nos arbustos, esvaziando meu estômago até o fim. Eu me
inclino até que não haja mais nada, a força disso me faz cair, minha visão
um pouco nebulosa.

— Droga... — Eu murmuro, meu estômago ainda está se rebelando.

Talvez da próxima vez eu deva tentar moderação.

Tomo um momento para me recompor e beber um pouco de água.


Quando me sinto um pouco melhor, continuo com minha exploração. Risco
comida da minha lista e passo para o próximo item — biblioteca. Estou
ciente de que não poderei levar nada comigo, mas pelo menos posso procurar
alguns livros.
Vou à biblioteca local e faço um inventário rápido de seus títulos,
maravilhando-me com as diferentes capas e texturas. A maioria dos livros
em casa são clássicos com capas muito mundanas. Quando pego um livro
com o peito nu, minha boca forma um O e quase o deixo cair.

Um homem nu... em uma capa? Sentindo a proibição, olho para a direita


e esquerda antes de abri-la. Eu rapidamente pego o resumo e percebo que é
uma história de amor.

E se...?

Não preciso levar para casa comigo. Eu posso apenas ler hoje e depois
entregá-lo a outra pessoa, certo?

Eu aceno para mim mesma, satisfeita com minha linha de pensamento


e intrigada com a capa ilícita do romance. Pago e rapidamente enfio na
minha bolsa, garantindo que ninguém possa ver a foto.

Saindo, olho para o relógio e decido seguir para as ruínas, esperando


encontrar mais lojas a caminho. Pulo na minha bicicleta e pedalo
novamente.

Indo para o sul, levo quase uma hora para chegar às ruínas. Mas todo
o esforço vale a pena.

Uau!
É maior do que qualquer coisa que eu já vi. Uma pequena sensação de
emoção floresce no meu peito quando me aproximo das ruínas. Já existem
multidões de pessoas andando por aí, algumas tirando fotos, outras tendo
um guia pessoal explicando o contexto histórico.

Estou admirada ao colocar um pé na frente do outro, minha resposta


automática. Encontro um local para proteger minha bicicleta e, levando
minha mochila comigo, começo pelas paredes indefinidas, acenando com a
mão ao longo da superfície e sentindo a textura, a idade e a história.

Os povos antigos também devem ter tocado nisso!

Minha mente imediatamente grita para mim e eu me torno ainda mais


tonta. Deus, perdi a conta de quantas vezes me imaginei vivendo naqueles
tempos, adormecendo com um livro que mostrava os mitos dos gregos ou
romanos. Eu tinha lido Homero, Heródoto e Tucídides, Cícero, Ovídio e
Marco Aurélio, e minha sede por esse mundo maravilhoso e ainda
desaparecido não tinha limites. Estar aqui... tocar isso... é simplesmente
demais. Eu nem cheguei às principais atrações e me sinto sobrecarregada
de emoção.

Eu vou mais longe, me perdendo em uma multidão de pessoas. Um


sorriso toca nos meus lábios. Isso é tão mundano, mas para mim é tão
especial.

Eu me sinto normal.
Parando com a multidão, eu abafo um suspiro, meus olhos arregalados
enquanto eles se localizam na minha frente. Um amarelo-alaranjado
enferrujado, o Templo da Concórdia se estende diante de mim em todo o seu
esplendor. Um dos templos antigos mais bem preservados, é construído em
estilo dórico. A principal diferença com este templo é que ele é construído
inteiramente de argila, em vez do mármore usual. Eu olho de boca aberta
para ele, absorvendo todos os detalhes, absorvendo a grandeza de estar aqui.

Eu me sinto tão pequena... tão insignificante quanto eu vejo. Quantas


pessoas testemunharam ao longo dos séculos, milênios que esteve aqui?
Todos os meus problemas e minha destruição iminente desaparecem quando
fico enraizada no local.

De alguma forma, eu me faço andar e continuo admirando todas essas


maravilhosas construções da humanidade, até chegar ao outro templo, o
Templo de Hera. As colunas ainda estão de pé, mas basta para dar uma
ideia de como seria o templo em seu auge. Hera... meus lábios se enrolam
com a ironia da situação. Hera, a deusa do casamento e do nascimento. Se
ao menos eu pudesse estender a mão e implorar para ela não abençoar meu
casamento. Balanço a cabeça com a noção, tentando tirar esses pensamentos
da minha mente. Não devo perder tempo pensando no inevitável, não
quando tenho coisas mais importantes a fazer.

Antes de sair, passo uma hora no museu, tentando ver todos os


artefatos. Relutantemente, eu saio, sabendo que o tempo é essencial. São
quase quatro da tarde, e eu tenho que contar o tempo que levarei para voltar
para casa.
Volto para minha bicicleta e, estudando o mapa novamente, sigo as
indicações para ir ao porto.

Engraçado como eu moro aqui a vida toda, mas nunca vi o mar. No


momento em que vejo as duas tonalidades do azul se encontrando na linha
do horizonte, meus olhos se erguem um pouco. Mais uma vez, sinto que
poderia fazer qualquer coisa.

Essa liberdade... é intoxicante e temo estar ficando bêbada. Marco


Aurélio certamente desaprovaria, mas pela primeira vez sua filosofia não
está funcionando para mim. Eu necessito disso para ser feliz. E agora que
provei essa liberdade, temo que nunca seja a mesma.

Deixo minha bicicleta em um local seguro e começo a andar, tentando


memorizar tudo. Existem lojas, restaurantes... tudo. Não consigo nem
decidir o que quero fazer primeiro. Passo um minuto debatendo
mentalmente qual deveria ser meu primeiro destino. Eventualmente, eu
decido ir à praia e mergulhar os dedos dos pés na água — literalmente. Não
sei nadar, então vou me contentar com isso.

As pessoas estão tomando banho de sol, vestidas com quase nada. Meu
primeiro instinto é desviar o olhar, envergonhada, mas como é normal para
eles, eu finjo falsa confiança e avanço. Há até homens nus... ainda mais do
que o cara na capa. Minhas bochechas devem estar queimando de vermelho
e tento olhar em qualquer lugar. Duvido que um garoto reagisse assim.
Eu me concentro em chegar à praia e tiro meus sapatos. Eu pisei na
areia, espantada com a sensação de pedras finas sob meus pés. O calor do
sol me dá um formigamento agradável. Dou alguns passos e, naquele
momento, uma onda cai na costa, a espuma se arrasta lentamente. Chega
aos meus pés e eu mexo os dedos dos pés com sentimento estranho. Uma
risadinha me escapa, e de repente eu corro para a frente, dobrando minhas
calças nos joelhos. Entro na água até que ela chegue às minhas canelas,
sorrindo o tempo todo como uma tola.

Isto!

Isso é vida!

Segurando meus sapatos, um em cada mão, levanto meu rosto, olhos


fechados e me deixo sentir. A água está batendo nas minhas pernas, fazendo
cócegas em mim com os pequenos detritos que produz. O sol está me
envolvendo em seu calor e o vento escova contra minha pele com uma carícia
doce. Meu sorriso aumenta quando eu ignoro todo o resto.

Sou só eu... e o mar.

Não sei quanto tempo me sinto assim. Eu devo parecer louca por todos
os outros. Mas eles não sabem que estou dançando com minha própria
música mental e, pela primeira vez, o exterior reflete o interior.

É só quando algumas crianças passam por mim, rindo alto, que eu sou
novamente trazida de volta à terra.
Verifico meu relógio e suspiro desapontada com a rapidez com que o
tempo está passando. Reunindo meu juízo sobre mim, saio da água, indo a
um dos chuveiros para lavar a areia antes de calçar meus sapatos.

Eu ando de novo, tentando escolher um restaurante para o jantar. Um


fruto do mar chama minha atenção e não posso me ajudar. Quero tentar
algo novo, e isso parece ser uma boa escolha.

Um garçom me senta em uma mesa e faz meu pedido. Não demora


muito para decidir e, depois de fazer algumas contas rápidas sobre quanto
dinheiro me resta, peço um de cada. Não vou cometer o mesmo erro que
cometi no almoço, mas vou dar uma mordida em tudo.

Os pratos chegam e estou me divertindo imensamente. O próximo é


melhor que o anterior. Estou tão profundamente focada no meu paraíso
alimentar que levo um segundo para registrar o que estou vendo.

Dois homens vestidos de preto estão do outro lado da rua. Eles parecem
tensos enquanto examinam o ambiente. Quando alguém olha na minha
direção, eu ofego.

Mario!

Um dos meus guardas. Não...

Meu coração bate alto no meu peito, e toda razão me deixa. Pego um
monte de notas e as deixo em cima da mesa, saindo do restaurante e
correndo na direção oposta.
Eu ouço passos e sei que eles estão seguindo.

Como eles sabiam que sou eu?

Não tenho tempo para me perguntar, enquanto ando pelo porto e corro
em direção aos navios. Mas então eu chego a um beco sem saída.

Não!

Estou hiperventilando enquanto olho freneticamente para a direita e


para a esquerda. A única opção é se esconder em algum lugar. Eu
rapidamente peso minhas opções. São os navios ou... a água. O último é
discutível, já que não sei nadar, então um navio serve. Eu escolho o mais
luxuoso, pensando que eles não ousariam olhar para lá.

Eu tento o meu melhor para subir no navio, indo para um alçapão


aberto e me escondendo lá dentro. Há barulho vindo de fora e eu sei que são
eles. Eu tento regular minha respiração. A única opção é voltar para casa e
negar veementemente que era eu.

Ainda não acredito que eles me reconheceram...

Racionalizando tudo, decido ficar mais tempo para garantir que eles
não estejam por perto. Para acelerar o tempo, abro minha mochila e tiro o
romance. É melhor gastar o tempo com sabedoria.

Não sei quando adormeço, mas um tempo depois sou acordada por um
movimento repentino. Eu pisco duas vezes, tentando me livrar do sono.
Em movimento... o navio está se movendo.

Não!
CAPÍTULO DOIS

Tomando um profundo trago do meu cigarro, inalo a fumaça,


levantando uma sobrancelha para o homem à minha frente.

— Eu duvido. — Eu digo, liberando uma nuvem de fumaça. — A última


transação me deu dois milhões. Foi meio friso do mármore de Elgin que
nunca chegou ao público. — O comprador era um magnata grego que queria
possuir um pedaço de sua terra natal, para uso privado, é claro. Então ele
pagou cada centavo por isso.

— Este é ainda melhor, pelo que ouvi. — Manolo sorri para mim,
encostado no banco. Ele abre a boca para dizer algo mais, seu dente de ouro
brilhando na luz do cassino. — Seis milhões. — Ele levanta o queixo,
provavelmente esperando para ver uma reação.
Seis milhões? Sim, duvido. Existem muito poucas obras de arte por aí
que valem tanto, e de alguma forma duvido que Manolo tenha conseguido
adquirir uma.

— Estou intrigado. — O canto da minha boca se enrola em um desafio.


Estou me sentindo inquieto esta noite, e se Manolo está sondando para me
liderar, ele pode ter uma surpresa.

— Vou checar com meus companheiros nas costas e sinalizarei para


você. — A satisfação está escrita em todo o rosto quando ele se levanta para
sair.

Quando estou sozinho na mesa, meu rosto é redefinido


automaticamente para minha expressão padrão, aborrecimento. Meu lábio
superior está se contorcendo, para uma briga ou mais uísque, eu não sei.

Eu tomo o copo, esvaziando o conteúdo e aproveitando a queimadura.


Pego outro cigarro e acendo-o, olhando para o espaço vazio.

— Sozinho, bonito? — Uma voz me chama da minha direita e meu


aborrecimento aumenta imediatamente. Um toque se segue, e ela não vai
gostar do que desencadeia se não tirar os dedos sujos de mim.

Eu viro minha cabeça levemente, vestindo suas roupas minúsculas


para atrair atenção, seus cabelos falsos e peitos falsos, e tudo o que sinto é
nojo.
Seus dedos continuam a se mover pelos meus antebraços no que ela
provavelmente acha que é uma jogada sexy.

Não é.

— Tire sua mão de mim antes que eu a quebre. — Eu a olho


mortalmente nos olhos enquanto digo isso. Ela apenas ri, um som estridente
que pode até quebrar meu copo de uísque. Ela se aproxima, empurrando
seus peitos para cima de mim ainda mais e eu sufoco o desejo de jogá-la fora
de mim.

— Você é engraçado. — Ela ri. Usando apenas meu polegar e meu


indicador, retiro a mão dela da minha pessoa.

— Você está latindo para a árvore errada cara. — Eu coloco uma ênfase
estranha na palavra cara, mas ela não parece entender seu significado. —
Eu não me importo se você é uma mulher ou não, eu vou quebrar seu pulso.
— Seus olhos se arregalam na compreensão e ela tropeça um passo atrás,
chocada. Eu encolho os ombros e espero que ela rasteje de volta da onde veio.
Tirando um lenço, limpo minha mão e meu terno.

Prostitutas do caralho.

Levanto-me e vou em direção ao bar, pedindo outra garrafa de uísque.


Não sei quanto tempo Manolo se foi, mas preciso de algo para entorpecer
meus sentidos. Quanto mais, melhor, ou então eu posso estalar. Meus olhos
passeiam pela sala, examinando as diferentes figuras familiares. Sim, não
faria bem em quebrar. Isso destruiria minha imagem perfeitamente polida.
Em vez disso, apenas encho meu copo na borda e acendo outro cigarro.

Faz cinco anos desde que assumi esse ramo dos negócios da família. O
comércio de arte e artefatos é uma das vias mais lucrativas, se bem feito.
Existem inúmeras peças que podem parecer lixo para algumas pessoas, mas
são de fato tesouros para outras, e essas pessoas pagarão uma fortuna para
adquiri-las.

Se estou sendo sincero, é algo que gosto. Há alguma satisfação em lidar


com artefatos antigos ou obras de arte de valor inestimável, e quanto mais
eu aprendo sobre isso, mais vejo por que algumas pessoas estão dispostas a
pagar milhões de dólares para adquiri-las. Mas isso é apenas um efeito
colateral. Não, a razão pela qual eu amo tanto esse trabalho é que ele me
permite estar o mais longe possível de casa.

Após o desastre com minha irmã, Catalina, simplesmente não há razão


para ficar por aqui — não quando isso significa ter que suportar o humor de
meu pai ou os comentários de minha mãe. Eles nem sabem que minha única
razão de vir para Nova York é ver minha irmã e sobrinha — todo mundo
pode se foder. Como Lina foi forçada a morar em Sacre Coeur com as freiras,
é ainda mais conveniente, pois nem preciso voltar para casa.

Pego outro trago do cigarro, observando Manolo caminhando em minha


direção, um sorriso tímido no rosto. Meus próprios lábios se enrolam em
resposta, curiosidade transbordando dentro de mim. Seis milhões? Para um
artefato? Estou muito intrigado.
— Venha, — ele dá um tapinha no meu ombro, me levando na parte de
trás do cassino. Pego a garrafa comigo e sigo a liderança dele.

Descemos algumas escadas para um nível ainda mais baixo que o porão.
Parando na frente de uma porta de aço, Manolo usa o dedo para abri-la com
biometria. Entramos e a sala está banhada em luz. Existem inúmeros
artefatos por aí, e até alguns sarcófagos egípcios na parte de trás. No meio
da sala tem uma mesa grande e algumas pessoas se viram para nos olhar
com expectativa.

— Aqui está ele, o herdeiro Agosti. — Manolo exclama, movendo-se em


direção à mesa e acenando para os homens. Eles estão me avaliando
lentamente, seus olhos se movendo sobre o meu corpo de maneira
minuciosa.

— Você acha que ele pode fazer isso? — Um homem levanta uma
sobrancelha, sua voz cheia de ceticismo.

— Eu venho fazendo isso há muito tempo. — Eu respondo, olhando-o


diretamente nos olhos antes de presenteá-lo com um dos meus melhores
sorrisos. Ele não parece imediatamente convencido, mas bufa, deixando o
assunto de lado.

Manolo faz sinal para que eu me sente antes de fazer as apresentações.

— Este é o professor Moore e o Sr. Abruzzo. Eles estão trabalhando na


autenticação deste artefato por muito, muito tempo. — A ênfase de Manolo
sugere que eles levem seu trabalho a sério, e eu devo evitar questionar suas
capacidades acadêmicas. Dou um aceno rápido, meu olhar se fixando na
maleta no meio da mesa.

Manolo aparece e abre a fechadura, levantando a parte superior do


estojo para revelar um pequeno anel de ouro.

Eu imediatamente olho para ele em confusão. Que? Seis milhões de


dólares por um anel? Me chame de cético, mas não vejo como.

— Este aqui é o anel de Edward, the Confessor. — O professor Moore


veste um par de luvas antes de pegar o anel e segurá-lo sob a luz clara.

Não é nada de especial, realmente. Uma grossa faixa de ouro com


alguns lugares vazios que suponho que costumava abrigar pedras preciosas.
Eu quase bufo. Ele nem tem os itens mais valiosos e custa seis milhões?

— O comprador está em Malta e ele exige o item até o meio dia de


quarta-feira, — ele me olha de novo e de novo antes de continuar, — e me
disseram que você é a melhor pessoa para o trabalho.

— Ele é. — Manolo rapidamente os assegura. — Ele é o melhor. Ele


garantirá que o anel chegue ao comprador no horário designado.

— Por que ele está disposto a pagar tanto por um anel? — Eu pergunto.
Talvez algo me escape, mas seis milhões para uma banda de ouro?

Professor Moore sorri.


— Eu acho que você não está familiarizado com a lenda do anel?
Pertencia a Edward, the Confessor, e foi usado para sua coroação. Veja aqui,
— ele aponta para o espaço oco, — costumava haver aqui uma safira que
atualmente faz parte da coroa imperial britânica. Edward foi canonizado, e
foi isso que começou os rumores de que seu anel pode realizar milagres. O
anel desapareceu no século XVI e não foi avistado desde então. É
considerada uma relíquia religiosa e é cobiçada por muitas pessoas ao redor
do mundo.

Eu ouço atentamente a explicação dele e apenas levanto uma


sobrancelha depois que ele termina.

— Se está perdido há tanto tempo, como podemos saber que é o


verdadeiro negócio?

— Nós não sabemos. Fizemos a datação com carbono e realizamos


testes, e ele se encaixa no período.

— Mas você não pode ter certeza. — Eu acrescento, pensando que é


estranho alguém gastar seis milhões na possibilidade de que isso seja falso.

— Não, — ele sorri, — mas isso não é importante. Há pessoas que


acreditam, não importa o quê. — Ele aproxima o anel para olhar para ele.
— O inverso também é verdadeiro. Podemos realizar o maior número
possível de testes e ainda haverá céticos. É a natureza do comércio. — Ele
encolhe os ombros, colocando o anel de volta no estojo.
Vendo que o acordo já está seguro e só preciso fazer minha parte, não
faço mais perguntas. Não é da minha conta se uma pessoa aleatória está
nadando em dinheiro e quer fazer alarde por causa de um anel.

Passamos mais algum tempo negociando a comissão de todos.


Eventualmente, acomodamos um terço cada, e eu recebo o estojo.

O voo está reservado para a manhã seguinte — Palermo para Malta.


De alguma forma, não vejo esse trabalho sendo muito difícil. Terminarei a
entrega amanhã e ainda terei dois dias de sobra até quarta-feira. Posso
passar algum tempo em La Valette, pois eles têm ótimas bibliotecas.

Enquanto gosto de artefatos, meu verdadeiro hobby reside na coleta de


livros antigos. Outra vantagem do trabalho é que sou o primeiro a receber
um alerta se houver uma nova primeira edição sendo vendida em qualquer
lugar do mundo. É também por isso que não posso realmente invejar nosso
misterioso comprador por pagar tanto por uma bugiganga. Também paguei
uma quantia bonita por um livro, uma primeira edição da Bíblia de
Gutenberg. Considerando que havia apenas algumas já impressas, valia
cada centavo.

Colocando a pasta no cofre do hotel, tiro minhas roupas e vou para o


chuveiro. Quando o vapor saúda minha pele, suspiro em alívio, finalmente
me permitindo relaxar um pouco.

Mas mesmo isso é interrompido pelo meu telefone tocando.


Com uma maldição, paro a água e coloco uma toalha na cintura. Chego
ao telefone bem a tempo de ver que é meu pai ligando. Eu reviro os olhos,
mas respondo, como qualquer filho obediente faria.

— Enzo, — começa meu pai, com a voz um pouco mais alta que o
normal. Ele está de bom humor. Aprendi a ouvir suas dicas, então sei
exatamente como lidar com ele. Ele pode se considerar um Capo forte e
inflexível, mas não passa de um tolo orgulhoso.

— Pai, — respondo, ajustando meu tom de acordo para que ele não
pegue o aborrecimento que estou sentindo.

— Notícias esplêndidas! Acabei de me encontrar com Benedicto Guerra.


Decidimos assinar o contrato de casamento em duas semanas, — ele
tagarela alegremente, e eu tenho que morder minha língua para não dizer
algo em troca: — Esvazie sua agenda para que você possa voltar quando
estiver pronto com este trabalho. — Ele continua cantando louvores a
Gianna, enfatizando sua beleza e sua educação. — Se tudo correr conforme
o planejado, você deve se casar até o final do mês. — Eu aperto meu punho,
meus lábios se contorcendo de nojo.

— Perfeito, pai. Mal posso esperar. — Eu digo através dos dentes


cerrados antes de desligar.

Fechando os olhos, conto até dez, sentindo a raiva deixar meu corpo.

Eu sabia que isso iria acontecer, eventualmente. Só não sabia que seria
tão rápido.
Gianna Guerra.

Eu bufo apenas lembrando dela. Eu a conheci uma vez no ano passado,


quando nossos pais decidiram que era hora de ver se nos adequávamos.
Benedicto, por alguma razão insondável, queria a opinião de sua filha.
Talvez porque seu segundo casamento fosse supostamente uma combinação
de amor, ele decidiu tentar o mesmo para sua filha.

Eu cedi ao meu pai e fui para a reunião, mas percebi desde o início que
era um erro. Ela deu uma olhada em mim e se encaixou no meu corpo, de
maneira bastante obscena, devo acrescentar, tentando encontrar tópicos de
conversa. Quando ela não conseguiu nada de mim, ela apenas brincou sobre
algumas coisas mundanas: como suas roupas, suas jóias e outras coisas
materiais. Eu posso ter ouvido apenas com meia orelha, mas de alguma
forma ela pensou que eu era a perspectiva perfeita para um marido. Assim
que me desculpei em sair, ela se inclinou para sussurrar no meu ouvido.

— Estou ansiosa pela nossa noite de núpcias. — Sua mão caiu sobre
minha virilha no que ela provavelmente percebeu como um gesto sedutor.

Eu só estava mais enojado.

Foi só depois que ouvi os rumores flutuando em alguns círculos


restritos. Gianna Guerra tinha uma propensão para banheiros públicos e
foder a bunda. Não que isso tenha sido surpreendente demais, dada sua
crescente prevalência entre os jovens principados italianos. Como a
virgindade ainda é uma mercadoria quente, especialmente entre a classe
alta mais tradicional, eles certamente encontraram uma maneira de
contorná-la. E enquanto os lençóis estiverem manchados de vermelho na
noite de núpcias, algumas pessoas fecham os olhos.

Eu não.

Estive cercado por prostitutas a vida toda; não quero ficar amarrado a
uma para sempre.

E é porque eu sei como essas mulheres da alta sociedade se comportam


e como os homens se aproveitam delas, que tentei proteger minha
irmãzinha. Fiz o possível para abrigá-la e protegê-la, mesmo de nossos
próprios pais. Mesmo assim, não foi suficiente. Ela foi arrancada de seu
porto seguro e conheceu o pior que o mundo tem a oferecer.

E eu falhei com ela.

Ainda tenho pesadelos da noite em que a encontramos na frente da


casa, com o vestido em farrapos; as costas dela destruídas pela lâmina de
algum lunático. Eu a peguei em meus braços e ela choramingou suavemente
de dor — senti meu coração morrer naquele exato momento. Catalina
sempre foi minha única fraqueza, a razão pela qual cumpri as ordens do pai.
E vê-la tão maltratada, tão magoada... Eu tentei o meu melhor para ajudá-
la a se recuperar de sua provação, mas algumas feridas nunca cicatrizam.

Eu deveria saber...
Tudo desabou quando ela descobriu que estava grávida. Esse foi o dia
em que amaldiçoei Deus e todas as outras divindades por aí. Não bastava
que ela tivesse sido contaminada da pior maneira possível, ela teve que
sofrer mais consequências.

Como esperado, nossa família não reagiu bem e o pai estava pronto para
mandá-la para as ruas, especialmente quando ela declarou que queria ficar
com o bebê. Eu improvisei no local sugerindo que ela poderia ir a um
convento.

Sacre Coeur tinha uma conexão estreita com a máfia por gerações, e
pelo menos lá eu estava confiante o suficiente para que ela estivesse segura.
Pelo menos por enquanto. Eu fiz um voto para minha irmã — assim que
meu pai morresse, eu iria buscá-la.

Alguns meses atrás, Lina deu à luz a menininha mais preciosa. Eu


estava lá com ela quando a trouxe para o mundo. No momento em que eu
coloquei meus olhos nela, eu sabia que faria tudo ao meu alcance para
garantir que ela nunca fosse prejudicada. Eu não a falharia como fiz com a
sua mãe.

Olho para o meu telefone, para a foto de Lina e Claudia que eu coloquei
como meu papel de parede. Eles são a única coisa que importa, e se mantê-
las seguras significa que terei que me casar com Gianna, que assim seja. Pai
sabe muito bem que ela é minha fraqueza, e ele vai usá-la contra mim se
precisar.
Mesmo que não fosse Gianna, seria outra garota italiana de criação
impecável e conexões de longo alcance, e eu sei que todos acabam se
comportando da mesma forma, elas olham para mim e me querem como seu
escravo sexual pessoal. Só porque sou homem, acham que qualquer uma
serviria para mim. Porque que homem saudável e são recusaria o sexo
prontamente disponível?

Levantando-me, vou para o espelho do banheiro. Um sorriso cruel se


estende pelo meu rosto. O que eu não daria para pegar um pedaço de vidro
e arruinar esse rosto bonito que todo mundo parece tão apaixonado? Uma
cicatriz tão grotesca que os faria evitar seus olhares em vez de me adorar
abertamente com os olhos. Meus dedos traçam o contorno do espelho, o
pensamento tão atraente, mas tão inacessível. Eu tentei uma vez e saiu pela
culatra. Eu aprendi minha lição naquele dia — podemos querer certas coisas
com todas as nossas forças; isso não significa que vamos pegá-los.

Balanço a cabeça, tentando ignorar esses pensamentos. Nunca me faz


bem quando me entrego a fantasias... no ‘e se’. Porque na minha realidade
alternativa, sou a pessoa mais feia do mundo. Mas pelo menos então eu
posso ver quem é genuíno e quem não é, quem me ama por quem eu sou ou
quem me ama apenas pelo meu rosto.

— Boa sorte, — murmuro para mim mesmo e vou procurar um cigarro.

Na manhã seguinte, pego o estojo e troco a maleta, colocando o anel em


uma pequena caixa. Faço um inventário rápido das minhas armas e depois
saio do hotel.
Ao entrar no meu carro, coloco algumas armas embaixo do assento para
facilitar o acesso antes de chegar no aeroporto. Embora esse trabalho deva
ser fácil, nunca é demais estar seguro, não apenas por causa da minha linha
de trabalho, mas também por quem eu sou. Há poucas pessoas na Sicília
que não saiba quem eu sou, e isso pode convidar inimigos para jogar.

O carro ronrona para a vida e eu rapidamente mudo as marchas até


que eu esteja derrapando pela estrada. Estou vinte minutos no meu passeio
quando noto outro carro logo atrás de mim. Monitoro meu espelho lateral e
observo que eles estão me seguindo. Mantendo distância, eles ainda fazem
todas as curvas que eu faço, mesmo as falsas.

Interessante.

Decido brincar um pouco com eles e começo a surfar nas ruas de


Palermo como um louco. Os bandidos estão seguindo o exemplo, e eu tenho
que dar a eles. Poucas pessoas conseguem acompanhar minha direção.

Estou quase divertido com a situação até que eles decidam puxar armas
para mim, dois homens saindo pelas janelas e apontando AK-47 para mim.

Porra!

Isso não são bandidos comuns.

Eu desvio o carro, mal evitando as balas que chegam. Faço uma curva
rápida em U e evito o carro deles, mas eles são rápidos em seguir.
Merda!

O carro deles também parece ter um teto solar, e um cara é rápido em


subir e mirar em mim.

Bato o pé no freio e as balas passam pela porta do passageiro.

Isso foi perto!

Coloquei o carro ao contrário e, em vez de fugir, vou em direção a eles


a toda velocidade. Já estamos em uma parte isolada da cidade, então há
poucas chances de baixas. Também sei que se não me livrar deles agora,
estarei olhando por cima do ombro a viagem inteira.

E isso é algo que eu não quero fazer.

Coloco o anel no bolso e coloco duas armas no colo, pronto para usá-las.
Empurro o acelerador, ao mesmo tempo em que solto o cinto de segurança.
Quando o carro está se movendo a toda velocidade, pego as armas e abro a
porta, rolando no chão. O carro colide com o deles, mas não antes de alguns
pularem.

Dedos nos gatilhos, eu me escondo de qualquer ataque aberto e atiro.

O som de balas voando para a direita e para a esquerda é ensurdecedor,


e os caras estão se mantendo muito bem. Eu tiro dois deles, e ainda restam
mais dois. Agora eles abandonaram as AKs em favor de pistolas mais úteis.
Eu continuo atirando até ficar sem munição. Faço o possível para
recarregar as armas com velocidade e depois troco de posição.

Eu preciso terminar isso rápido.

Talvez ainda tenha doze balas no total. Vou me dar seis balas por
pessoa, mas isso significa que, pela sexta bala, uma pessoa deve estar morta.
Forçado pelas circunstâncias, eu devo levar isso a sério. Não posso mais
jogar, o que é uma pena, já que precisei desabafar depois da conversa com
meu pai na noite passada.

Entrando em um espaço tenso, ignoro tudo e olho para o meu entorno


como um jogo de tabuleiro, calculando ângulos e distâncias.

Linhas e quadrados aparecem em todo o meu campo de visão e eu


calculo as probabilidades. Para fazer isso apenas um pouco mais divertido,
eu me desafio a limitar o jogo a duas balas por pessoa.

No momento em que vejo uma abertura, corro para fora do meu


esconderijo e do outro lado da rua, me escondendo atrás de outro carro. Sem
dar tempo para eles se reagruparem, eu me viro e miro para o primeiro cara.
Uma bala se aloja na perna enquanto a outra no coração.

Um para baixo!

O outro parece ter se escondido. Examino a área em busca de qualquer


movimento e finalmente o vejo tentando entrar no carro já em ruínas.
Interessante. Ele está procurando por algo.

Meus lábios se enrolam enquanto eu o vejo pegar o estojo vazio,


convencido de que ele deve ter o anel dentro. Passo um segundo em guerra
comigo mesmo. Devo matá-lo ou deixá-lo sair com o estojo vazio?

A decisão é tomada quando ele abre com entusiasmo o estojo para


perceber que não há anel. Melhor ainda, sua impaciência o coloca no meu
ponto de vista, então é preciso apenas um aperto no gatilho para vê-lo cair.

Os alvos derrotados e, com muitas balas restantes, levanto-me aos pés


e limpo meu traje. Retrospectivamente, percebo que talvez não devesse ter
sido tão descuidado com meu carro desde que me vejo sem veículo no
momento.

Paro em uma janela para ter certeza de que pareço apresentável o


suficiente e depois pego um táxi. Eu ainda posso chegar ao meu voo.

Fiel à sua palavra, o motorista do táxi me leva rapidamente ao


aeroporto. No momento em que entro, algo está estranho. Eu posso sentir
na maneira que os guardas estão olhando para mim. Até os funcionários do
aeroporto parecem estar em algum tipo de brincadeira enquanto seguem
todos os meus movimentos.

Estou alerta e um pouco cauteloso, mas minhas suspeitas são


confirmadas apenas quando vejo outras pessoas de terno preto indo em
direção à área de segurança, suas roupas claramente escondendo armas.
Merda!

Quem quer que seja depois deste anel tem todo o aeroporto controlado.
Não há como sair vivo se continuar.

Tento parecer o mais relaxado possível enquanto caminho para o


banheiro. No momento em que estou dentro, tranquei imediatamente a
porta e coloquei um esfregão sob a maçaneta. Então penso nas minhas
opções.

O banheiro tem uma janela que se conecta ao quintal externo. Levanto-


me para examinar a área e não vejo nenhum terno preto. Por enquanto, essa
pode ser minha aposta mais segura.

Eu me seguro no box enquanto me empurro para dentro da janela, me


impulsionando para fora. É preciso um pouco de esforço, considerando o
tamanho da janela. Meus pés batem no chão com um baque e eu corro.

Parando no estacionamento, nem penso quando quebro uma janela e


liguei um velho Fiat.

Se o aeroporto não der, minha única opção é por via marítima. A


questão permanece — quem diabos estaria tão desesperado para colocar as
mãos em um anel maldito?

Pegando meu telefone do bolso, ligo para Manolo. Explico rapidamente


a situação para ele, mas só recebo uma resposta vaga.
— Você sabia no que se inscreveu. — Ele diz, e aposto que ele está se
esquivando de sua responsabilidade. Cerrando os dentes, desligo, o desejo
de esmagar o telefone quase demais.

Sim, esses trabalhos vêm com um certo grau de perigo, mas para
alguém controlar um aeroporto inteiro?

Uma mão no volante, uso a outra para tirar o anel e estudá-lo. Tem que
haver mais do que isso... Curioso, um pouco irritado, mas ainda
comprometido, traço meu curso.

Eu sempre mantenho um iate em Porto Empedocle, então só preciso


chegar lá e zarpar para Malta. Algumas horas no mar, não deve haver
nenhum problema, pelo menos espero.

Troco de carro quando estou fora de Palermo, e só faltam mais algumas


horas para chegar a Agrigento. Paro na cidade para fazer compras. Quando
passo por uma livraria, uma ideia repentina se forma em minha mente.
Talvez eu possa encontrar mais sobre esse anel.

Entro na livraria e navego na seção de história. Encontro alguns títulos


sobre a Inglaterra anglo-saxônica e decido comprá-los. Estou quase no caixa
quando vejo uma criança parecendo bastante escandalizada quando escolhe
um romance erótico, a capa uma indicação do gênero.

Um sorriso puxa o canto da minha boca, e eu assisto divertido quando


ele começa furtivamente a ler as primeiras páginas antes de decidir comprá-
lo. Ele vai ao caixa e coloca o livro de bruços no balcão.
Fico um pouco para trás, observando o nervosismo de seus movimentos.
Ele não pode ter mais de treze ou quatorze anos, sua altura é uma indicação
clara de que ele ainda não passou pela puberdade. Ele deve ter um metro e
meio e suas roupas parecem pendurar sobre sua estatura fina. Depois de
pago, ele coloca o romance dentro de sua mochila e sai correndo da loja.

Eu deslizo meus próprios livros no balcão, o fantasma de um sorriso


ainda nos meus lábios. Sem pensar, pego um pouco de dinheiro da minha
carteira e dou para o caixa. Quando olho para a pessoa atrás do balcão, meu
sorriso cai imediatamente. Ela está mordendo o lábio e olhando para mim
com um olhar chamativo, empurrando lentamente uma nota com o número
dela em cima dos livros.

Eu reviro os olhos e pego os livros, deixando o bilhete para trás.

— Senhor... — Eu a ouço chamar atrás de mim, mas já estou do lado de


fora.

Maneira perfeita de arruinar o meu dia.

Meu lábio se contrai de aborrecimento e puxo meu maço de cigarros,


deslizando um entre os lábios e acendendo-o. Dando uma tragada profunda,
ligo para meu tio para pedir mais algumas armas. Vendo que esse anel pode
ser mais perigoso do que eu pensava anteriormente, preciso estar preparado
para qualquer coisa.

Ele me dá o endereço do armazém e eu vou até lá. Quando chego, sou


recebido pelo meu tio e seus amigos, e eles me convidam para tomar uma
bebida com eles. Por mais que eu queira entrar e sair, sei que será
desrespeitoso para o meu tio se eu fizer isso. Então, para apaziguá-los, fico
na primeira rodada de bebidas.

Quase cinco horas depois, eu digo de que estou com pressa, e eles
relutantemente me deixaram ir com munição suficiente para durar um mês.
Um tempo depois, chego ao meu barco.

O iate tem um quarto com banheiro privativo, cozinha e sala de estar.


Embora a superfície não seja tão grande, ela tem todos os confortos e
funciona de maneira extremamente suave. Eu já o usei algumas vezes antes
para peregrinar no Mediterrâneo.

Também é meu santuário quando visito este lado do país. Ninguém


nunca esteve no meu barco, e enquanto eu estiver vivo, ninguém nunca vai.

Eu carrego as armas dentro da sala antes de abastecer a cozinha com


as compras que eu havia comprado.

Quando tudo está pronto, eu ligo o motor.


CAPÍTULO TRÊS

— Querido Deus, o que está acontecendo? — Eu murmuro para mim


mesma, pânico me segurando. O barulho do motor me faz vacilar e eu pulo,
batendo a cabeça no alçapão.

Uma rápida olhada no meu relógio me diz que dormi demais e são quase
dez. Deus, eu nunca vou voltar a tempo, vou? E o barco? Para onde está
indo?

Levanto lentamente o alçapão e dou uma espiada no convés. Está quase


escuro lá fora, então não consigo entender quem está lá. Eu olho de soslaio
quando vejo algum movimento, mas quando uma figura se move em minha
direção, abro a porta e me enrolo em uma posição fetal.
— Por favor me ignore. — Eu sussurro uma oração, esperando que
quem quer que seja não me encontre. Mas esse é o cerne do problema. Se eu
não disser a eles que estou a bordo, para onde eles vão me levar? Meus olhos
se arregalam na realização. Quem sabe para onde o barco está indo?... e
comigo nele.

— Deus... — Eu digo que quando o alçapão é aberto, uma lanterna


brilha agressivamente para mim. Eu instintivamente fecho meus olhos, a
luz forte demais.

— E quem é você? — Uma voz dura pergunta, o sotaque siciliano polido


me surpreende. Abro lentamente um olho e, em seguida, um segundo, minha
boca formando um O enquanto olho para o rosto mais bonito que já vi na
minha vida.

Isso deve ser ilegal.

Mesmo na escuridão da noite, consigo distinguir os fortes contornos de


seu rosto, as maçãs do rosto cinzeladas e a mandíbula afiada. Seu nariz é
reto, mas parece se curvar levemente na ponta. Combina com o resto dele,
imponente, mas gentil. Mas depois há os olhos dele, um tom profundo de
verde que eu tenho que piscar duas vezes para garantir que não seja a luz
artificial que faz um truque nos meus olhos.

Eu engulo com força e, enquanto continuo minha leitura, sinto algo no


meu estômago. É um sentimento delicado, mas nem um pouco desagradável.
Meus olhos se depositam em seus lábios, tão grossos e cheios, e eu lambo os
meus em resposta.

Ele não pode ser real.

Repito isso para mim novamente, porque realmente, ninguém pode


parecer tão bonito. Posso ter tido contato limitado com pessoas de fora, mas
até eu consigo reconhecer a perfeição quando a vejo.

— Você terminou de olhar, garoto? — Ele pergunta, divertido. Seus


lábios se enrolam para cima em um leve sorriso, e meu coração reage
batendo em um ritmo estranho.

— Eu... Eu sinto muito?

Ele levanta uma sobrancelha para mim.

— Por invadir ou olhar?

Demoro um segundo para pensar, a conversa totalmente fora da minha


zona de conforto.

— Ambos? — Eu pergunto timidamente, e ele ri.

— Venha, — ele estende a mão para mim e, por algum motivo, eu a


agarro, — vamos levantar você e pode me dizer o que o levou a se esconder
no meu navio.
Ele me puxa para cima e eu luto para segurar minha mochila. Quando
eu passo, o livro cai no chão, a capa com o homem nu está com a face para
cima. A mortificação queima nas minhas bochechas quando o homem se
inclina para pega-lo.

— Escolha interessante, — ele comenta, mas não me devolve. Ele não


solta minha mão enquanto me guia pelas escadas e entra em um dos quartos
mais luxuosos que eu já vi. Minha pele está formigando onde toca a dele,
minha mão pequena engolida na enorme. E quando ele finalmente se solta,
me sinto despida.

— Sente-se. — Ele me leva em direção a um sofá, e eu faço como me


disse. Talvez se eu explicar minhas circunstâncias, ele entenderá.

Com esse pensamento em mente, observo quando ele se senta na


cadeira à minha frente, os braços cruzados sobre o peito, a mesma expressão
divertida ainda em seu rosto.

E que rosto.

Balanço a cabeça duas vezes, tentando dissipar esses pensamentos


intrometidos. A prioridade é voltar para a costa e pedalar em casa.

— Quer me dizer o que, — ele começa, seu olhar escaneando minha


forma, — um adolescente está fazendo no meu barco a essa hora? Você fugiu
de casa, garoto?
No momento em que as palavras se registram em minha mente, percebo
o que ele está vendo. Um garoto... um adolescente. Suspiro de alívio, pois
ouvi dizer que os homens nem sempre são gentis com as mulheres. Lia
costumava me dizer que é melhor ser protegida do que deixada sozinha no
mundo sem proteção.

— Eu... — O que devo dizer? — Eu estava brincando de esconde-esconde


com alguns amigos e adormeci. — Eu rapidamente invento a mentira,
aprofundando minha voz para parecer um menino.

— Hmm, — ele dá um tapa no livro em cima da mesa, — brincando de


esconde-esconde, ou apenas se escondendo para que você possa ler isso? —
Ele olha para mim com expectativa e eu engulo, coloco no local.

— Eu estava curioso. — Eu encolho os ombros.

Ele ri, balançando a cabeça.

— Não tenha vergonha, garoto. Você está nessa idade, — ele faz uma
pausa, uma carranca que estraga seus traços antes de mudar de assunto. —
Seus pais devem estar preocupados, por que você não liga para eles? — Ele
pega um telefone do bolso, jogando-o para mim. Eu mal o pego e olho para
ele maravilhada.

Eu nunca usei um telefone celular antes, mas mesmo assim, não tenho
ninguém para ligar.
— Erm... Eu não sei o número. — Mais mentiras. — A que distância
estamos da costa? Você pode virar o barco? Estacionei minha bicicleta nas
docas. Eu vou para casa imediatamente. — Eu o imploro com meus olhos
enquanto digo isso.

Eu nem sei o que vai acontecer comigo. Os guardas já podem ter me


visto e eu claramente não voltarei à meia-noite, como prometi a Lia.

Lia! O que ela vai pensar?

— Saímos do porto trinta minutos atrás, — ele faz uma pausa, olhando
para mim. — Eu gostaria de poder ajudá-lo, garoto, mas estou dentro do
cronograma. — Ele não consegue terminar suas palavras, pois o som de
outro motor parece se aproximar.

Ele murmura algo enquanto se levanta, indo em direção a uma janela


para olhar para fora. Eu imediatamente sigo, e no momento em que olho,
reconheço Mario no outro barco.

— Por favor, não deixe que eles me levem, — meus dedos agarram o
material da camisa dele e eu puxo um pouco. Ele olha para mim, sua
expressão inescrutável. Sua mão desce sobre a minha e ele aperta meus
dedos.

— Você está em perigo? — Ele pergunta, e eu só posso concordar,


esperando que ele me ajude. Ele não foi nada além de gentil comigo até
agora.
— Não se preocupe. — Ele me dá um tapinha na cabeça, por cima do
boné, antes de sair da sala.

A curiosidade me come e eu corro atrás dele. Abro a porta e enfio a


cabeça levemente entre o espaço vazio.

— O que te traz aqui, senhores? — Meu salvador pergunta, sua voz


segurando uma qualidade suave.

— O garoto. Sabemos que ele está aqui. As câmeras o pegaram


furtivamente no seu barco.

— Garoto? Eu não vi nenhum garoto. Eu acho que você está enganado.


— Ele responde com confiança.

— Então você não se importará de procurar no barco, sim? — Mario


pergunta, e por um momento eu tenho medo de ter colocado o bom homem
em perigo.

— Vocês? — O homem pergunta depois de uma pausa, antes de rir. —


Vocês sabem quem eu sou?

— Nós só queremos o garoto, — continua Mario, e estou feliz que ele


não tenha estragado minha cobertura. Mas ele não pode admitir quem eu
sou, não quando isso significaria minha ruína.
— E eu te disse que não há garoto aqui. Vocês precisam sair. Agora. —
A voz do homem tem uma borda afiada, e espero que Mario faça o que foi
dito.

— Escute aqui, garoto bonito, só vou perguntar mais uma vez. Se não...
— Ele sai e eu ouço uma arma disparar.

Não!

E se ele se machucar por minha causa?

Abro a porta e estou prestes a me mostrar quando o homem fala, suas


palavras me enraizando no local.

— E arriscar uma guerra com Agosti? — Ele pergunta, e Mario cuspiu.

— Agosti? — Ele repete, parecendo estupefato.

Eu franzo a testa com o nome desconhecido, mas parece ter um efeito


sobre Mario.

Eu me abaixo e dou alguns passos, querendo ver o que está


acontecendo.

— Guerra com Agosti ou Marchesi em minha cabeça, eu diria que é


quase o mesmo para mim. — Mario finalmente responde, levantando a arma
e apontando para o homem. Ele parece incomodado, enquanto lentamente
balança a cabeça, rindo.
— Você mataria o herdeiro Agosti? Você deve ser muito corajoso ou... —
ele se aproxima, se encaixando na arma, — muito estúpido.

Eles parecem estar envolvidos em uma disputa de encarar antes que


Mario dê um passo atrás, segurando sua arma.

— Isso ainda não acabou, — diz ele, sinalizando para os outros irem.
Há algumas palavras silenciosas trocadas entre eles antes que o outro barco
vire e saia.

Quando vejo o homem voltando, tento voltar para a sala de estar, mas
ele é rápido quando me agarra pela gola, me levantando para que fiquemos
no nível dos olhos.

— Por que Marchesi estaria atrás de você, garoto? — Seus olhos


brilham perigosamente ao luar, e o medo me agarra.

— Eu não sei. — Eu digo, esperando que ele acredite em mim.

— Você não sabe? — Ele sorri, virando-se e me levando para a beira do


barco. Meus olhos se arregalam, pensando que ele não pode...

A mão dele aperta a minha camisa e ele me levanta sobre o parapeito


do barco. Meus pés estão balançando no espaço vazio, o mar olhando
ameaçadoramente para mim de baixo.

— Eles enviaram você para me espionar?


— Por favor, — digo, minha voz mal acima de um sussurro. Estou
petrificada. Por que eu o espionaria? Eu nem o conheço.

— Diga-me a verdade, e eu vou deixar você ir. — Ele continua, com os


olhos frios e sem emoção. É como se o homem de antes desaparecesse no ar.
Quanto mais olho nos olhos dele, mais percebo que simplesmente não há
como sair disso. Ele vai me jogar se eu não responder.

Mas o que posso dizer a ele? Quanto posso dizer a ele?

— Eu... os Marchesi são meus pais. — Eu respondo rapidamente,


apertando meus olhos e esperando que ele seja fiel à sua palavra e me deixe
ir.

— Viu, é possível ser sincero. — Ele faz um som tsk, e eu abro meus
olhos para vê-lo sorrindo. — Continue, — ele me pede, mas eu apenas
balanço minha cabeça.

— É isso.

— Eu me pergunto... — Ele se afasta, com a mão se movendo enquanto


me equilibra de um lado para o outro, a ameaça de se afogar se aproximando
cada vez mais.

— Por favor, — eu choramingo.


— Tudo bem, — ele suspira de maneira entediada. Ele me aproxima da
grade e, quando está prestes a me puxar do outro lado, ouço um som de
estalo.

Não!

Tudo acontece em câmera lenta. Observo horrorizada o material da


minha camisa rasga, um grande pedaço dela permanecendo na mão dele.
Minha boca se abre em um suspiro alto, um pedido de ajuda que não sai.

E eu estou caindo.

Eu quebro a superfície da água com um baque doloroso e depois estou


afundando.

Abro os olhos, meus membros se agitando na tentativa de permanecer


à tona, mas nada funciona. Abro a boca novamente, tentando pedir ajuda,
esperando que ele me ouça. Mas a água me inunda de todas as direções. Há
um silêncio ensurdecedor quando eu caio cada vez mais baixo sob o ataque
impiedoso das ondas. Quanto mais eu luto, pior fica.

Até eu desistir.

Olho para o magnífico azul do mar e digo a mim mesma que talvez não
seja o pior caminho a percorrer.

De alguma forma, estou resignada.


Mas então, uma massa de bolhas sinaliza outra presença, e minha
consciência lentamente deteriorada observa braços fortes segurando-me e
me levando de volta à superfície.

Volto engasgando, água saindo da boca e do nariz e continuo tossindo.

— Calma, garoto. Eu peguei você, — diz ele, cortando a superfície da


água comigo em seus braços até chegarmos ao barco. Ele me empurra para
cima de uma escada, e eu uso toda a minha força restante para subir,
desmoronando nas minhas costas quando chego ao convés.

— Inferno, você me assustou. — Ele respira fundo quando chega ao meu


lado, e eu me viro para olhar para ele.

Seus olhos se arregalam em choque e seu olhar se move do meu rosto e


meu cabelo solto para o meu corpo. Mal estou ciente do que está
acontecendo, mas posso dizer que algo está errado.

Olho para baixo e percebo o que ele está vendo. O que resta da camisa
molhada é moldado no meu corpo, seguindo o contorno dos meus seios, meus
mamilos arrebitados do frio e visivelmente se esforçando contra o material.

— Você é uma garota, — a voz dele está cheia de veneno quando diz
isso. Ele se levanta, sua expressão é de nojo quando olha para mim. — Você
é uma garota, — ele repete, balançando a cabeça e respirando fundo,
aparentemente para controlar sua raiva.
— Uma mulher, — eu o corrijo, levantando-me nos cotovelos. Estou
respirando com força, meus pulmões ainda estão se acostumando a não
morrer, mas isso não significa que vou levar tudo o que ele diz. Eu já quase
me afoguei por causa dele.

— Uma mulher, — ele ri, com os punhos cerrados ao lado.

Sei que estava errada em mentir para ele, mas certamente ele pode
entender o quão perigoso é para uma mulher viajar sozinha.

— Eu estou... — Estou prestes a me desculpar pela minha pequena


mentira quando ele continua.

— Eu deveria saber, — um sorriso amargo aparece em seu rosto, —


apenas uma mulher teria me encarado assim.

— Como o quê? — Eu pergunto, franzindo a testa.

Ele se ajoelha ao meu lado, removendo uma lâmina do bolso. Olho


desconfiada, especialmente quando ele brinca com a ponta.

Instintivamente, tento me afastar dele, mas ele está comigo em


segundos.

— Como você quer me foder, — ele responde, mas as palavras


grosseiras não se registram. Não quando ele está empurrando a lâmina na
minha cara, ameaçando me cortar. Ele lentamente abaixa no meu corpo.
— Chega de mentiras, — seus olhos seguem a lâmina enquanto desliza
pela minha pele, a ponta cavando na minha carne um pouco. Um movimento
repentino e tiraria sangue.

— Me dê uma boa razão para não te matar agora, — ele continua


quando sinto a menor picada embaixo da clavícula. Aterrorizada, olho para
as gotículas de vermelho e paro de pensar. Eu apenas ajo.

Usando minhas pernas, tento chutá-lo, o tempo todo rastejando de volta


nos cotovelos, procurando uma abertura para me levantar e correr.

Ele pega facilmente um pé, me puxando para mais perto dele, mas eu
não paro. Com minha adrenalina, uso minha outra perna para empurrá-lo.
Ele não se mexe. Em vez disso, ele agarra meu quadril, me prendendo no
chão sob seu próprio corpo. Ele paira sobre mim e se encaixa na lâmina bem
debaixo do meu queixo.

— Toda mentira que você conta é igual a um corte. Eu me pergunto...


quantos serão necessários para você morrer? — Meus olhos se arregalam
diante de sua implicação e eu tento lutar com ele. Ele é muito maior e mais
forte que eu que estou simplesmente presa ao chão, e o desespero me
domina.

— Você se acha tão bom só porque tem um rosto bonito? Nem todo
mundo quer f...f... — Não consigo dizer as palavras em voz alta, por isso
continuo com a primeira coisa que me passa pela cabeça. — Você é louco,
sabe disso? Insano! Mentalmente perturbado! Desequilibrado! — Grito com
ele, mas parece apenas diverti-lo.

— Mesmo? — Ele se arrasta devagar. — O quê mais?

— Louco como uma lebre de março! — Eu saí e ele tem a ousadia de rir
na minha cara. Estou apavorada e ele está rindo?

— Não posso dizer que já ouvi isso antes. — Ele ri e a lâmina cava mais
uma vez na minha pele. — Agora, onde estávamos? Sim, você estava me
falando sobre você. Sem mentiras, little tigress1, sem mentiras.

Olho nos olhos inflexíveis e sei que não tenho escolha. Com um suspiro
profundo, começo.

— Eu sou Allegra Marchesi. — Eu dou a ele uma versão curta dos


eventos de hoje, e essa foi minha única chance de liberdade antes do meu
casamento. Depois que termino de contar, observo seu rosto com
expectativa, esperando que minha explicação o satisfaça.

Isso não acontece.

— A pobre menina rica decidiu ter uma noite divertida na cidade? —


Ele me zomba, a faca ainda está tocando na superfície da minha pele. — Eu

1 Na tradução literal, Pequena Tigresa, apelido dado para a Allegra ao longo da narrativa pelo Enzo
conheci seus pais. Casal devasso. Acho que não posso me surpreender que a
filha deles seja a mesma, — ele ri de mim, com os olhos cheios de ódio.

— Não, eu... — Quero explicar a ele que não sou como meus pais, mas
ele não me deixa continuar.

— Oh, eu conheço o seu tipo. Queria pegar um pau antes do seu


casamento? Diga-me, você ia levar na sua bunda para poder fingir que ainda
é uma virgem inocente na sua noite de núpcias? — Ele cospe as palavras,
malícia pingando de todas as sílabas. Eu me encolho nas acusações dele,
especialmente porque nunca ouvi palavras mais desprezíveis na minha
vida.

— Do que você está falando? — A pergunta vem em um sussurro, e eu


enxugo as lágrimas. Ninguém nunca falou assim comigo antes.

Ninguém!

— Acho que sua pequena viagem à cidade das vadias foi interrompida
quando seus guardas a encontraram. E você decidiu se esconder aqui. — Eu
olho para ele e não acredito nos meus ouvidos. Ele está distorcendo tudo o
que eu disse a ele.

— Não, você está errado. — Eu tento protestar, mas a faca pressiona


mais na minha garganta.

Isso dói!
— Estou errado? — Ele levanta uma sobrancelha, com o lábio enrolado
em escárnio. — Se você está tão pronta para se prostituir, então vamos lá,
faça-o. — Ele tira a lâmina da minha garganta, arrastando-a lentamente
pela caixa torácica antes de cortar o material.

Eu ofego quando o que resta da minha camisa cai, separando-me no


meio para revelar meus seios nus. Eu imediatamente me cubro com meus
braços e me recupero.

— Me deixe em paz! Eu já te disse tudo, o que mais você quer? — Grito


com ele, cansada de ser insultada quando não fiz nada errado. Bem, exceto
por invadir o barco dele, uma decisão que já me arrependo profundamente.

Ele ainda tem essa expressão divertida em seu rosto, e isso só serve
para alimentar ainda mais minha raiva.

— Psicopata! Você é um psicopata.

— Eu sou? — Ele inclina a cabeça para o lado, estudando-me. — Talvez,


— ele encolhe os ombros. — Que tal eu fazer um acordo para você? Você me
deixa te foder e eu te levo de volta ao porto.

Não sou tão burra que não entendo o que ele está dizendo. Ele quer que
eu lhe dê minha virtude pela minha liberdade. Eu quase ri alto. Ele pode
ser bonito, mas é um demônio bonito. E você nunca faz um acordo com o
diabo.

— Não.
Seus olhos se arregalam por um momento antes que ele retome a
mesma expressão de escárnio aberto.

— Não? Você tem certeza? Como você vai voltar então? — Ele dobra as
mãos sobre o peito, rindo suavemente de mim.

— Eu vou nadar de volta! — Eu digo antes que eu possa pensar nas


coisas. Ele acha que está no controle, mas eu prefiro morrer do que deixar
esse diabo me contaminar.

Ele começa a rir das minhas palavras, e seu escárnio está me fazendo
querer provar que ele está errado. Ele deve pensar que toda mulher cai aos
seus pés só porque ele é bonito? Posso não ter muito, mas pelo menos tenho
meu orgulho e não vou deixá-lo vencer.

— Preciso lembrá-la que você não pode nadar? Acho que você já provou
isso quando quase se afogou, — ele está segurando o abdômen enquanto
continua rindo.

Minhas mãos se apertam nos punhos e faço uma rápida varredura do


meu entorno. Antes de perder a coragem, corro para o lado do barco e tomo
um colete salva-vidas. Coloco-o em volta do meu corpo e volto para ele; eu
faço a única coisa que consigo pensar.

Eu mostro minha língua para ele, um dedo tocando meu olho em uma
expressão de você vai ver.
Então, sem olhar para trás para ver sua resposta, me jogo no mar.
Desta vez, o colete salva-vidas me mantém à tona, e eu movo minhas mãos
e pés, nadando pela água. Fico feliz quando vejo que estou ganhando alguma
distância, apenas para ter um raio de luz brilhando sobre mim. Paro,
voltando para o barco. Cortando meus olhos, vejo o diabo insuportável ainda
rindo enquanto ele aponta a luz para mim.

— Você já terminou? Ou você precisa de mais tempo? — Ele grita, o som


difundido pelas ondas colidindo com o barco.

Já estou congelando, mas não vou deixá-lo se safar com seu plano
maléfico.

— Eu não serei sua prostituta! — Eu grito com ele, virando-me para a


frente novamente.

Sei que provavelmente não chegarei à costa — nunca. Mas prefiro


perecer por vontade própria do que ser subjugada às artimanhas do diabo.
Assim como Daphne rejeitou Apolo para manter sua virtude, preferindo
derramar sua pele mortal e ser transformada para sempre em uma árvore,
eu preferiria me unir ao mar, minha consciência limpa, minha alma em paz.

Com esse pensamento, tento esquecer o barulho dos meus dentes ou a


maneira como meus membros estão se envolvendo em dormência. Não, eu
continuo.

— Maldita seja, little tigress. Você é louca, não é? — Uma mão forte
agarra o colete salva-vidas, me puxando para trás.
— Deixe. Me. Ir! — Eu tento dizer as palavras, minha boca incapaz de
cooperar.

— Calma, eu não vou fazer nada com você. — Ele continua enquanto
arrasta o colete salva-vidas — e eu — com ele em direção ao barco.

Acho que passo do ponto sem retorno, porque nem percebo quando ele
me puxa para cima e para o convés, deixando-me no chão, uma bagunça
molhada e trêmula perto da hipotermia.

Ele volta, no entanto, e coloca um cobertor em volta dos meus ombros,


segurando-o com força para que eu possa pegar emprestado seu calor.

— Eu não serei sua prostituta. — Sinto a necessidade de repetir.

— Você realmente acha que eu iria te foder? — Ele inclina a cabeça


para o lado, dando-me um olhar cético. — Você se olhou no espelho
recentemente? Desculpe, little tigress, mas meu gosto é para mulheres... —
ele faz uma pausa, me olhando de cima a baixo, — não crianças. — Eu não
consigo nem responder, porque quem eu estou enganando? Eu sei como eu
sou. Ainda assim, de alguma forma, sua piada dói.

Com um último olhar para mim, ele vira as costas para sair.

— Então por que? Por que você me perguntou? — Eu finalmente


encontro minha voz novamente.
— Por quê? — Ele se vira, um sorriso no rosto. — Foi um teste. Eu
queria ver como você reagiria.

Eu franzi a testa com a resposta dele.

— E?

— Você passou. — Suas últimas palavras são quase audíveis.


CAPÍTULO QUATRO

Voltando para dentro do quarto, ligo o aquecimento ao máximo e troco


de roupa rapidamente. Então, sentando-me em uma cadeira, espero.

Allegra.

Eu sorrio para mim mesmo. Ela é pequena, mas com certeza dá um


soco. Eu estava convencido de que ela era um menino até o momento em que
vi seus mamilos espreitando pela camisa.

Droga!

Ela é uma complicação que eu não preciso.


Nunca estive em ótimos termos com os Marchesi. E considerando a
reputação deles dentro de nossos círculos — bastardos gananciosos com
moral promíscua — não é de admirar que eu pensasse que ela era igual.

Desde o momento em que descobri que ela era parente desses lunáticos,
fiz minha missão de empurrá-la, descobrir até onde ela poderia levar. Eu
tinha visto o jeito que ela olhou para mim pela primeira vez, mesmo quando
eu pensei que era um menino. O convite estava lá, da maneira como suas
pupilas se dilataram ou como sua boca se separou de admiração.

Eu posso ser considerado um narcisista, mesmo sendo tudo menos isso.


No entanto, todas as mulheres conhecidas reagiram da mesma maneira,
então aprendi a reconhecer as pistas.

A pequena Allegra me queria e, quando percebi, estalei. Eu tinha sido


insensível com ela, e talvez um pouco cruel demais, mas na minha opinião
ela estava a apenas um segundo de fazer o que todo mundo sempre fazia, se
jogar em mim.

Então, eu tinha provado para mim mesmo que ela era como as outras;
que só precisava de um pouco de cutucada antes de estar disposta a abrir as
pernas para mim, não que eu a aceitasse.

E então eu empurrei, encostei-a em um canto e balancei na frente dela


o que ela mais queria, transporte de volta para o porto. Eu tinha tanta
certeza de que ela iria largar seu ato inocente e cair de joelhos diante de
mim, implorando pelo meu pau.
Mas ela não tinha.

Ela foi... imprevisível. Desde o começo, eu me considerava no controle,


mas ela virou o jogo e me deu um movimento que nunca vi chegando.

Ela prefere morrer a se tornar minha prostituta.

Idiota, mas admirável.

Ela provou que eu estava errado. E isso me deu uma pausa.

Ela passou no teste.

Sou interrompido por minhas reflexões quando uma Allegra murcha


abre a porta, um gemido escapando de seus lábios enquanto ela entra na
sala aquecida.

Por que isso de repente é erótico?

Balanço a cabeça, furioso comigo mesmo por pensar nisso.

— Aqui. — Eu entrego a ela um par de calças e uma camisa nova para


que ela possa se trocar. Ela os vê com suspeita, mas os leva.

— Vire-se. — Ela me move com a mão e minha diversão aumenta


novamente.
— Há algo para ver? — Eu arqueei uma sobrancelha. — Eu pensei que
estabelecemos que não fodo crianças. — Eu digo, mais para provocá-la do
que qualquer coisa.

Eu vi aquelas garras afiadas dela, e talvez eu seja um pouco


masoquista, mas quero que me arranhe novamente.

Ela cora, o vermelho se espalhando pelo pescoço. Ela abaixa a cabeça,


os olhos fixos no chão e, em seguida, sei que o cobertor está fora de seus
ombros.

Meus olhos se arregalam quando ela tira a camisa esfarrapada,


jogando-a no chão, antes de se mover para tirar a calça.

Eu não posso evitar. Meus olhos estão enraizados no corpo dela, uma
mistura de raiva e curiosidade fervendo dentro de mim.

Ela parece incomodada enquanto veste as roupas secas. Eu, por outro
lado, estou muito incomodado.

Porque eu menti.

Ela não parece uma criança. Ela é uma mulher com o corpo de uma
mulher. Um que estava muito nua um momento antes. Eu engulo duro, pego
no meu próprio jogo. Novamente.

Sedutora!
— Obrigada pelas roupas, — diz ela, mantendo-se afastada de mim
enquanto se senta em outra cadeira.

— Prefiro não ter sua morte em minha consciência, — acrescento


casualmente.

— Você não parecia tão preocupado um momento antes, — ela responde


com desdém.

— Bah, é o passado. Eu mudei desde então, — olho atentamente para


ela, esperando sua próxima resposta.

— Claro, — ela estreita os olhos para mim, — como um leopardo muda


de listras.

— Digamos que minhas listras foram geneticamente modificadas. —


Eu me inclino para a frente, o desejo de sacudi-la aumentando a cada
segundo.

Ela zomba, empurrando o nariz delicado no ar, levantando o queixo em


um gesto desafiador. Eu levo um momento para realmente estudá-la. Ela é
pequena e um pouco magra demais.

Seus cabelos negros fluem pelas costas, fios molhados presos à


salinidade da água do mar. Suas sobrancelhas escuras são bem formadas,
dando-lhe uma aparência gentil. Seus olhos são marrom chocolate,
acentuados por cílios grossos. Eles inclinam para cima de uma maneira
felina. O resto do rosto é igual a ela — pequeno e delicado. Ela parece jovem
e inocente e, pela primeira vez, pode ser essas coisas.

— Qual é o seu nome, pelo menos? — Ela pergunta de repente.

— Por quê? — Eu balanço minhas sobrancelhas para ela


sugestivamente. — Você mudou de ideia de repente... — Eu não termino
quando ela joga sua camisa molhada em mim. Eu pego logo antes de atingir
meu rosto.

— Nem tente terminar isso, — ela aponta o dedo para mim tentando
parecer ameaçadora.

Sim, mostre-me essas garras.

— Enzo. Enzo Agosti. — Eu me levanto e faço uma pequena reverência.


— A seu serviço.

Allegra bufa, um pouco de carranca marcando sua testa.

— E você se lembra de ser um cavalheiro?

— Eu nunca não sou um cavalheiro, — eu respondo. Como ela ousa


impugnar meu comportamento cavalheiresco quando eu sempre sou nada
menos que gracioso!

Ela estreita os olhos para mim. — Então, cavalheiros cortam as roupas


das mulheres com um canivete hoje em dia? — Ela faz uma pausa antes de
alterar. — Meu erro, crianças, não mulheres. — Eu posso ver o canto da boca
dela puxando levemente para cima. A sedutora acha que ela me pegou.

Não desta vez.

— O que posso dizer? — Eu encolho os ombros, parecendo totalmente


inocente. — Eu sou um cavalheiro nas ruas e um animal nos lençóis. — Eu
pisco para ela, mas ela apenas revira os olhos, a piada perdendo sua marca.

— Mais como um psicopata com uma faca nos lençóis. — Ela afirma,
inexpressiva, e eu percebo que ela não sabe o quê lençóis significa.

Eu rio. Ainda mais quando o nariz dela se mexe em confusão.

Quando foi a última vez que ri assim?

— Não se preocupe, — ela finalmente fala, um olhar determinado em


seu rosto, — prometo dar o melhor que puder. — Ela afirma com confiança.

— Mesmo? E se eu gostar muito? — Eu evito, desfrutando de sua falta


de noção do que estamos na verdade discutindo.

— Eu posso te dar mais forte. — Ela levanta o queixo um pouco, e mais


uma vez noto esse orgulho silencioso dela... não, é mais do que isso. É
dignidade, e ela carrega como um campeão.

— Entendo. — Eu respondo solenemente. — Eu também gosto de ter


uma audiência. — Eu jogo, curioso para ver com o que ela vai combater.
— Claro. — Ela concorda prontamente. — Uma audiência é necessária
para testemunhar quando você perde, — ela mais uma vez confirma que
está falando sobre outra coisa completamente.

Meu rosto de pôquer ameaça quebrar, risadas borbulhando dentro de


mim.

— E você vai perder, — continua ela, e posso ver que está se tornando
mais confortável comigo. Bom.

— Eu vou? Eu nunca perco, little tigress. Nunca. — Eu meio que minto,


porque sou forte o suficiente para admitir que já perdi para ela — não na
frente dela, é claro.

— Você vai da próxima vez. Você não vai me pegar de surpresa


novamente. — Ela dobra as mãos sobre o peito, a imagem de indignação.

— Oh não, da próxima vez você saberá quando eu vier.

Um sorriso toca nos seus lábios. — Talvez da próxima vez eu venha


primeiro.

No momento em que ouço as palavras dela, um gemido me escapa.


Estou levando isso muito longe? Certamente é agradável demais para
terminar agora.
— Oh, você vai, little tigress. Você definitivamente virá primeiro. —
Minha voz quebra quando eu respondo, e não posso mais conter minha
diversão.

— Por que sinto que você está falando de outra coisa? — Ela se levanta,
mãos nos quadris, olhos atirando punhais em mim. — Você está zombando
de mim, não está?

— Claro que não, — esclareço meus pensamentos, educando meus


traços — Eu estava falando sobre brigar. — Eu minto.

— Estranho, — acrescenta ela pensativamente. — Eu tinha certeza de


que estávamos falando sobre coito, já que você parecia terrivelmente
obcecado por isso.

Meu rosto cai. Minha boca fica aberta em choque. Não porque ela
acabou de chamar o sexo de coito, mesmo que isso seja engraçado por si só.
Mas porque eu fui enganado.

Novamente.

— Como... — Eu paro, e o sorriso dela cresce mais. Ela se encosta à


mesa, regozijando-se da cabeça aos pés. Ela pega o livro que tinha
anteriormente com ela e joga para mim.

— Muito educativo. Você pode aprender uma coisa ou duas. — Ela tem
a ousadia de piscar para mim, e eu estou apenas olhando para ela
estupefato.
Olhando para baixo, o cara nu na capa está olhando para trás, sua
expressão presunçosa silenciosamente tirando sarro de mim.

Enzo Agosti. Traficante de arte internacional. Mafioso.

Derrotado por uma garotinha.

Cansado de vê-la amontoada em um canto e olhando pela janela — me


ignorando — eu a chamo.

— Vou deixá-lo no porto e você pode pegar a próxima balsa de volta à


Sicília. — Ela vira a cabeça levemente para olhar para mim e me dá um
aceno curto.

Onde está a little tigress de antes? De alguma forma, minha consciência


sente a necessidade de aparecer repentinamente enquanto continuo.

— Não deve ser muito difícil. Vou deixar dinheiro para uma passagem.
As balsas correm bem regularmente.

Ela assente novamente, sua expressão entediada.

— Obrigada, — diz ela, e vira a cabeça para olhar pela janela


novamente.
Por um segundo, estou chateado por me ignorar descaradamente, mas
depois me preocupo que algo possa estar errado.

Levanto-me e, em dois passos, estou ao seu lado. Eu levanto meu braço


e toco sua testa com a parte de trás da minha mão, verificando a
temperatura.

Ela se encolhe e se afasta, o gesto a pegou de surpresa. Ela levanta os


olhos para olhar para mim, as sobrancelhas franzindo a confusão.

— Ninguém disse que você poderia me tocar, — ela range os dentes, o


tom da voz uma mistura de aborrecimento e desafio.

— Você está doente? — Eu giro minha mão para agarrá-la pelo pulso,
aproximando-a para que eu possa sentir a temperatura da pele dela.

— Me solta, — ela tenta me empurrar, mas não sou impedido. Com a


mão na sua testa, noto que não está com febre.

— Calma, pequena selvagem. Eu só queria ter certeza de que você não


vai morrer comigo.

Ela fixa os olhos em mim e estou chocado com a quantidade de desdém


que vejo neles. Parece que minha little tigress não me perdoou como lidei
com ela, não que eu tenha me desculpado por isso.

Talvez eu deva me desculpar? Paro para pensar por um segundo. Eu


nunca me desculpei com alguém antes, e ela certamente não será a primeira.
Eu zombei mentalmente disso. Minha cordialidade casual é tudo o que ela
está recebendo.

Só então ouço um som rosnado, como se algo estivesse reverberando no


ar. Eu franzo a testa, preocupado que possa ser outro motor se aproximando.
Mas uma olhada em Allegra me diz que não é o caso. Seus olhos se
arregalam e ela me empurra para dar um passo atrás.

— Você está com fome. — Eu afirmo, e ela faz uma péssima tentativa
de negar.

— Você está com fome, — repito, e sem esperar pelo seu protesto, pego
sua mão e a levo para a cozinha.

— Não, eu não estou, — ela repete, mas nem está me olhando nos olhos.
Por que eu pensei que ela era uma boa atriz antes? Porque ela claramente
não pode mentir para salvar sua vida.

— Sente-se! — Eu empurro os ombros dela para uma cadeira e me viro


para olhar as compras que comprei.

— Você é tão mandão com todo mundo? — Ela murmura baixinho, e eu


não acho que ela se importe se eu a ouvi ou não, porque quando eu me viro
para ela, ela apenas dá de ombros.

— Sim. E geralmente as pessoas me obedecem também.


— Ou o quê? Você as apunhala com sua faca? — Ela pergunta, e mesmo
que eu esteja de costas para ela agora, aposto que está revirando os olhos
para mim.

— Não. Reservo isso para meninas desobedientes. Os outros encontram


o fim da minha arma. — Eu digo casualmente e volto à minha tarefa. Monto
rapidamente um prato com queijo, presunto, salame e pão fresco, e coloco
na frente dela.

Ela é cética quando estreita os olhos na comida, mas também há um


brilho de saudade no olhar. Outro barulho baixo ressoa na pequena sala, e
eu tento o meu melhor para sufocar um sorriso.

Ela está morrendo de fome, mesmo que não queira admitir.

— Você não colocou veneno nisso, colocou? — Ela pega um pedaço de


presunto e o leva ao nariz, cheirando.

— Você sabe, também existem venenos inodoro por aí.

— Uau, obrigada, isso me faz confiar ainda mais em você.

— Por que você não acredita? Eu te salvei da morte. — Eu sorrio para


ela.

— Provavelmente para que você possa me matar mais tarde, — ela


murmura, mas com relutância morde o presunto. No momento em que ela
toma seu primeiro bocado, seus olhos se fecham e ela lança um gemido baixo
na garganta.

Eu tento muito não olhar, mas obviamente estou falhando ao seguir os


movimentos de suas bochechas enquanto ela mastiga e balança a garganta
enquanto engole.

Eu engulo com força.

— Você quer um pouco? — Ela enfia o pão na minha cara, mas eu posso
ver como está tremendo, recuando lentamente como se ela lamentasse sua
explosão repentina.

Tigresa gananciosa.

— Eu estou bem. — Eu digo e me inclino para trás, continuando a


observá-la. Seus olhos se enrolam nos cantos, satisfação escrita em todo o
rosto.

— É tudo para você. — Eu adiciono uma boa medida e estou encantado


com outro olhar de completa felicidade enquanto ela mergulha na comida
mais uma vez, enchendo o rosto com tudo na mesa.

Ela está comendo como se estivesse morrendo de fome há anos.

Eu paro, o pensamento me dando sobriedade. Meus olhos arregalaram


pelo corpo dela e lembro como ela se sentira embaixo de mim, do jeito que
ela mal tinha carne nos ossos. Eu tinha notado até então que era
sobrenaturalmente pequena.

— Quantos anos você tem? — De repente pergunto, temendo a resposta.

— Quase dezoito anos, — ela responde imediatamente, com a boca cheia


de comida. Ela está tão feliz por estar comendo que toda animosidade parece
ser deixada de lado, por enquanto.

Estou chocado. Eu rapidamente educo minhas feições para que ela não
perceba, mas ela não está prestando atenção em mim. Ela só tem olhos para
a comida.

Inferno, tenho certeza que as crianças de dezoito anos não são tão
pequenas ou tão magras.

— Eu não como queijo há tanto tempo, — ela solta um gemido enquanto


dá uma mordida no gorgonzola.

— Por quê?

— Não é permitido, — ela responde quando seus olhos se arregalam em


seu deslize.

— Não permitido? O que você quer dizer? — Eu não deveria me


importar. Não é da minha conta, afinal o que aconteceu com ela ou o que
acontecerá quando estiver fora de minhas mãos. Mas de alguma forma eu
não posso evitar.
— Isso te deixa gorda. — Allegra apenas encolhe os ombros, como se
fosse a coisa mais normal.

— E você não quer ser gorda? — Eu tinha visto as socialites em Nova


York seguirem todo tipo de dieta para diminuir a cintura. Até se tornou uma
competição, quem podia se orgulhar da menor cintura. De alguma forma, a
fictícia cintura de quarenta e três centímetros de Scarlett O'Hara se tornou
o padrão de ouro. Eu nunca fui capaz de entender esse fascínio por tais
extremos. No entanto, vendo a maneira como Allegra está comendo, com
tanto gosto, não acho que ela seja a única a observar sua dieta tão
minuciosamente.

— Não eu, — ela suspira, uma respiração derrotada que faz seus olhos
se inclinarem para baixo em um olhar tão miserável, — meu futuro marido.

Eu franzo a testa. Vendo minha expressão, ela faz uma piada.

— Talvez ele goste de crianças, — ela ri, mas eu não. Não quando a
realidade da questão me atinge na cara.

— E quem é seu futuro marido? — Eu sondei mais, cenários nojentos já


se acumulando na minha cabeça.

— Eu não acho que você o conheça, — ela inclina a cabeça com cuidado,
— Achille Franzè. — Ela nem termina de dizer o nome dele quando eu
congelo.
Franzè, um dos líderes mais temidos do 'Ndrangheta, mas também um
pedófilo conhecido.

Porra!

A atenção de Allegra está de volta à sua comida, mas estou apenas


olhando para ela em choque. Ela nem sabe o quão perto estava com a piada.

— Então você está morrendo de fome? — Minha voz é mais baixa, mais
suave, porque só posso ter pena de quem vai encontrar o destino dela.
Franzè não é de se levar de ânimo leve, e suas muitas esposas mortas são
uma prova de sua crueldade. Porque duvido que elas todas morreram de
causas naturais.

Ela levanta os olhos para conhecer os meus e libera um fôlego: — Eu


apenas como o que posso. — As palavras são ditas descuidadamente, mas
eu posso ler o subtexto, não é dado qualquer comida a ela.

Não respondo, principalmente porque, pela primeira vez, me vejo sem


palavras. Com base em seu sobrenome, eu imediatamente assumi o pior
sobre ela — que ela era uma garota rica e mimada, procurando um bom
tempo.

Eu quase rio para mim mesmo. Considerando o quão terrível Leonardo


e Cristina Marchesi são, não me surpreende que eles abusem de sua própria
filha para alcançar seus objetivos. E certamente, Franzè será um recurso
maravilhoso como genro. Ele será a abertura que eles querem na Europa.
Leonardo nunca deveria se tornar Capo. Caçula de quatro filhos, seu
passatempo incluía prostitutas, jogos de azar e mais prostituições. Ele
dedicou seu tempo apenas à busca do prazer. Quando seu pai e irmãos
faleceram repentinamente em um acidente de avião, ele foi a única opção
para a linha Marchesi continuar. Mas Leonardo não tinha ideia de liderar
um negócio. E assim as empresas da família lentamente se transformaram
em pó. Acho que é por isso que ele está tão interessado em se tornar sogro
de Franzè.

Depois que ela já teve o suficiente, Allegra engole em um copo de água


e se inclina para trás em sua cadeira, com um olhar de puro contentamento
no rosto.

Pego um cigarro e acendo-o. Eu dou uma tragada e movo minha cabeça


um pouco para que a fumaça não vá na direção dela.

— Isso é bom? — Os olhos dela estão fixos no meu cigarro.

— É um gosto adquirido. — Eu encolho os ombros.

— Os guardas estão sempre fumando em casa, — ela franze os lábios,


profundamente pensativa. — Posso tentar?

Minhas sobrancelhas disparam de surpresa.

— Você quer fumar?


Ela assente com entusiasmo e, levantando-se, ela rapidamente vem ao
meu lado. Antes que eu possa dizer qualquer coisa, ela tira o cigarro da
minha mão e o traz para a boca, separando os pequenos lábios para
acomodar a ponta.

Foda. Me.

Ela chupa as bochechas na tentativa de inalar, mas nada acontece. Ela


tem esse olhar de pura concentração no rosto que é simplesmente adorável.

— Como você faz isso? — Ela finalmente me pergunta.

— Assim, — começo, pegando o cigarro na mão. — Você coloca na boca,


— eu paro como faço isso, — e então você chupa, inalando ao mesmo tempo.
— Eu demonstro e ela está assistindo atentamente.

— Ok. Eu posso fazer isso. — Ela está impaciente enquanto pega o


cigarro e envolve os lábios ao redor, inalando. Logo ela começa a tossir, como
eu sabia que ela faria.

— Como você pode fazer isso? É nojento. — Ela estica a língua e faz um
rosto enojado.

— Gosto adquirido. — Eu luto para manter uma cara séria, a expressão


dela muito engraçada. E só para irritá-la ainda mais, sinto a necessidade de
acrescentar. — Você percebe que acabamos de compartilhar um beijo
indireto.
Ela para e seus olhos se abrem.

— Ai credo! — Ela explode em voz alta, limpando os lábios com as costas


da mão. — Bruto.

Não sei como esperava que ela reagisse, mas certamente não com
veemência.

— Você é um pervertido! — Ela grita comigo, virando-se e correndo de


volta para a sala de estar, mas não antes de comer mais pão e presunto.

De indignação de boca aberta em sua explosão a um sorriso divertido,


não sei o que há nessa garota, mas ela é muito cativante.

Balançando a cabeça, vou para a placa de controle e faço a troca do


piloto automático para o manual. Uma rápida olhada no mapa me diz que
faltam meia hora para chegarmos ao porto.

— É assim que você dirige o barco? — A voz dela me pega de surpresa


e, voltando, é vê-la olhando com admiração a vista da frente do barco. Ela
ainda tem um pedaço de pão abrigado com segurança nos braços e está
lentamente mastigando um pouco de comida.

Ainda comendo.

— Você terminou com o mau humor?


— Eu não estava de mau humor, — seus olhos se movem do mar para
mim e ela franze a testa. — Eu estava furiosa, — ela corrige, e seus olhos
brilham com travessuras.

— Furiosa? — Eu pergunto, curioso para ver o que ela vai dizer a seguir.

— O primeiro beijo de uma garota é muito importante. Mesmo indireto.


— Do canto dos meus olhos, eu a vejo cruzar os braços sobre o peito em
indignação.

— Deus, roubei seu primeiro beijo indireto. Eu tirei vantagem de você,


não foi? — Eu jogo junto, minha voz assumindo um tom inocente.

— Quando você não tira vantagem? — ela pergunta com sarcasmo,


levantando uma sobrancelha para mim. — Acho que não tive um momento
de paz desde que te conheci. E faz apenas algumas horas.

— Você está me machucando, little tigress, — faço uma tentativa falsa


de parecer ferido, mas ela apenas dá de ombros.

— Eu queria, — diz ela com um suspiro.

Por que é tão difícil lê-la? Não sei se ela está brincando, fazendo piadas
pelas minhas costas ou realmente me odeia, o que, honestamente, não seria
injustificado. Eu tenho sido um grande idiota para ela. Não mais do que o
habitual, mas neste momento o receptor do meu temperamento
reconhecidamente não tão legal tinha sido inocente.
Maneira de estragar tudo, Enzo.

A garota provavelmente está traumatizada, mas por que não consigo


me arrepender?

Droga!

Não tenho sentimentos e certamente não peço desculpas. Não é como


se nos víssemos novamente depois que eu a deixasse em Malta. Eu vou no
meu próprio caminho, e ela seguirá o dela. Fim da discussão.

Talvez de repente me sinta um pouco culpado, porque nunca conheci


uma mulher como ela antes. Alguém que está disposta a defender seus
ideais e sua dignidade às custas de sua própria vida.

Inferno, eu conheci homens que choram como bebês diante da morte e


preferem seguir o caminho do covarde, traindo seus princípios
fundamentais, apenas por mais um minuto nesta terra.

Allegra não. Ela estava bravamente, mas tolamente pronta para


encontrar seu fim.

Eu tenho que admitir para mim mesmo que algo mudou naquele
momento. Eu tinha visto sua pele quase azul, a maneira como seus dentes
estavam batendo e seu corpo tremia, e ainda assim seus olhos ainda
demonstravam uma determinação de aço. Ela estava a meio caminho do
túmulo, mas teria tomado um atalho de bom grado em vez de se submeter a
mim.
À beira da morte, mas ainda desafiadora, ela incutiu respeito em mim.
Eu nunca vou lhe dizer isso, mas ela pode ser a primeira mulher que eu já
dei meu respeito.

E ela provou que eu estava certo.

Ela pode dar o melhor que ela conseguir. E toda essa briga entre nós
dois tem sido mais do que eu implicando com ela. Eu dei a ela a oportunidade
de interagir como iguais, e ela mais do que aceitou o desafio.

Os cantos da minha boca se erguem em um sorriso sutil, porque


enquanto eu a observo mastigando sua comida, seus olhos se concentram na
vista externa e não em mim, não posso deixar de sentir pena dela e do
destino que a espera.

Mas não é da minha conta.

Vou deixá-la no porto de balsas e ela estará fora de minhas mãos.

— O que é isso? — ela se inclina para baixo, o cabelo escovando no meu


rosto, e eu sinto um cheiro de sal marinho e outro perfume que é apenas ela.
Instintivamente, fecho meus olhos, inalando mais fundo.

— Senhor grande, ruim e assustador, você está me ouvindo? — meus


olhos se abrem e ela está a alguns centímetros do meu rosto. Uma
sobrancelha levantada, ela me olha nos olhos, segurando o contato.
Eu levanto minha mão, meu polegar escovando através do lábio
superior. Como esperado, ela se encolhe, um fogo aparecendo em seus olhos.

— Você come como uma selvagem, — eu seguro a migalha de pão que


eu tirei do seu lábio e ela revira os olhos para mim.

— Isso? — ela já colocou alguma distância entre nós, o dedo apontando


para as telas no painel de controle.

— Alguns são para navegações, enquanto outros são para o feed de


vídeo.

— Por que você precisa disso?

Pressiono alguns botões e as telas ganham vida. Uma tela mostra os


quartos no iate, enquanto outra tem a vista traseira do barco.

— Uau... — ela coça o nariz, olhando maravilhada para o feed. — Somos


nós, — ela aponta para a câmera que está inclinada em direção à sala de
controle. Do jeito que ela está olhando, você pensaria que nunca viu algo
assim antes. Lentamente, ela toca o dedo na tela, rastreando-a com as
pontas. O ângulo muda imediatamente e ela pula para trás.

— Eles são telas sensíveis ao toque, — acrescento, e seus olhos se


arregalam.

— Você quer dizer que eles reagem ao meu toque? — a voz dela é apenas
um sussurro, tão impressionada que ela está com a tecnologia. Quase
relutantemente, ela desliza o dedo na tela novamente e as imagens mudam
mais uma vez. Ela continua fazendo isso até que eu sinta a necessidade de
intervir. Minha mão se fecha em torno do dedo dela e eu a paro.

— Você nunca viu algo assim antes?

Ela balança a cabeça, os olhos ainda focados na tela. Minha mão ainda
está em cima da dela, e ela parece de repente perceber isso porque me
empurra com um bufo.

— Mantenha suas mãos para si mesmo, — ela murmura sob o fôlego,


dando um passo para longe de mim.

Acho que verificamos uma coisa — ela realmente não gosta de mim.

— O que é isso? — Allegra se aproxima mais uma vez, e meu primeiro


pensamento é que tentará brincar com as telas novamente. Mas quando vejo
o que ela está apontando, amaldiçoo em voz alta.

— É outro navio. — Noto a distância entre nós, mas também outra


coisa. Eu rapidamente amplio, e o brilho do aço brilha mesmo no fundo da
noite.

Eu pensei que teria mais tempo.

Mas eu não tinha calculado o problema com minha pequena


clandestina.
Merda!

Quando vi a quantidade de forças que essas pessoas haviam mobilizado


no aeroporto, tive certeza de que não seria a última vez que os veria. Por
isso, decidi concluir a entrega o mais rápido possível, embora tecnicamente
tenha até quarta-feira, daqui a dois dias.

Não sei nem dizer quantas pessoas estão no navio e, com Allegra a
bordo, não sei como vou conseguir.

— Allegra, — começo, abordando-a pelo primeiro nome pela primeira


vez. Ela percebe a diferença também, bem como a seriedade do meu tom,
porque se vira para me encarar, esperando.

— Estamos em perigo. Esse navio não tem boas intenções. — Os olhos


dela se arregalam um pouco, mas ela não diz nada. Levanto-me e,
agarrando-a pela mão, levo-a para onde guardei as armas.

— Você já disparou uma arma? — Ela rapidamente balança a cabeça.

— Não é muito difícil. — Eu tiro algumas Glocks e as coloco na mesa.


Eu rapidamente mostro a ela como carregar a arma.

— Agora, — passo atrás dela, aninhando-a no meu peito enquanto


levanto meus braços para guiá-la. — Certifique-se de que a segurança esteja
destravada antes de realmente atirar. — Cobrindo o dedo dela com o meu,
eu pressiono o gatilho. Como a arma está vazia agora, nada acontece. —
Você quer se manter em linha reta e colocar força na parte superior do corpo.
No momento em que a arma disparar, a força dela a derrubará. — Ela segue
meus passos atentamente.

— Eu tenho que matar alguém? — A sua voz é baixa quando pergunta


isso, e eu tenho que me lembrar que, apesar de toda a coragem dela, ela não
gosta de mim.

— Little tigress, — eu a viro, minhas mãos nos ombros dela. Olhando


nos seus olhos, tento fazê-la entender o quão sério isso é. — Essas pessoas
são assassinas. Eles não vão pensar duas vezes antes de atirar em você.
Agora, você quer sobreviver ou não. Não posso fazer você matar alguém, mas
posso lhe mostrar como lutar.

Ela dá um aceno rápido.

— Por que eles estão atrás de você? — Ela pergunta enquanto eu a vejo
montar e carregar a arma como eu lhe mostrei.

— Eles querem algo que eu tenho. — Eu digo enigmático.

De volta à sala de controle, a tela mostra o navio se aproximando, e eu


sei que o tempo é essencial.

— Vou assumir o comando dessa little tigress e vou nos tirar


manualmente daqui. Eu preciso que você seja meus olhos, e se eles se
aproximarem demais, atire. Você acha que pode fazer isso?
Não sei o que esperar dela. De tudo o que vi até agora, ela foi
extremamente protegida. O que uma garotinha mimada como ela pode fazer
com uma arma? Eu tenho que admitir para mim mesmo que tenho pouca
confiança nela realmente atirando.

Mas ei, um homem pode esperar.

Ela olha de volta para mim, toda a incerteza de antes que se foi. Com
um aceno lento, ela se posiciona, exatamente como eu a havia ensinado.

E eu ligo o navio a toda velocidade.


CAPÍTULO CINCO

Eu me mantenho imóvel, minhas palmas suando sobre o aço da arma.

Eu posso fazer isso!

Mas eu não posso. Na verdade, não. Eu sou apenas uma garota comum.
Alguém que nunca esteve no mundo exterior até hoje. E agora? De repente,
tenho que lidar com tantas coisas que nunca pensei que fossem possíveis.

Começando com o belo diabo. Meus lábios se enrolam de desdém no


momento em que penso nele e em suas táticas suaves. Tenho certeza que ele
esperava que eu caísse de joelhos e o adorasse. Eu tinha visto sua expressão
presunçosa quando pensou que tinha me pegado, e como ela caiu quando eu
ganhei vantagem.
Eu poderia não estar muito no mundo, mas conheço bem o tipo dele. Ele
é como minha família e meu futuro marido — um valentão que se vangloria
da intimidação.

Eu tinha resolvido não dar a ele a satisfação de chegar até mim, e então
eu sempre estive em guarda.

E agora? Olho com incredulidade a arma na mão, ainda sem acreditar


que essa é a realidade em que me encontro.

E de quem é a culpa?

Amaldiçoando entre meus lábios, balanço minha cabeça e tento me


concentrar. Será que fará diferença se eu morrer agora, em vez de uma hora
atrás? Do jeito que as coisas estão indo, devo estar destinada a encontrar
meu fim hoje.

— Pronta, little tigress? — ele me pergunta, e eu lhe dou um aceno. Esse


apelido novamente. Se eu vou morrer hoje, gostaria que ele pelo menos
parasse de me chamar assim. Apenas faz minha pele arrepiar.

Um arrepio desce pelas minhas costas com o pensamento, e eu me


lembro de manter minha cabeça no jogo.

Tomo minha posição na janela do navio e Enzo inicia suas manobras. O


navio treme rapidamente quando ele o vira para fugir do inimigo. Estamos
ganhando velocidade e, por um momento, me sinto tonta, com o vento na
minha cara, a noite fria me fazendo perceptiva.
Mas então abro os olhos e vejo o outro navio logo atrás de nós, a
distância diminuindo a cada segundo. Bem quando eles se aproximam do
nosso barco, uma tempestade de balas começa a chover sobre nós.

— Little tigress, — chama Enzo, com a voz tensa.

Eu faço minhas mãos trêmulas obedecerem e coloco meus dedos no


gatilho. Ajustando tudo, concentro-me no navio que chega e atiro.

— É isso aí. Você pode fazer isso, little tigress. — Acho que o ouço dizer
por trás, mas não paro. Talvez seja a adrenalina, ou talvez de repente eu
queira viver, mas continuo. Não sei se atingi alguém e tento não pensar que
estou na verdade matando uma pessoa.

Não, não sou eu que prejudico outro ser humano. Sou eu que me defendo
e, por extensão, o belo diabo.

Um sorriso se estende pelos meus lábios, mesmo através da minha


concentração.

Ele terá que me agradecer.

O pensamento de ter esse homem orgulhoso se curvando para mim me


deixa ainda mais determinada a fazer um bom trabalho.

A arma logo está sem balas, e eu rapidamente pego outra, continuando


a atirar.
— Isso não está funcionando. — Enzo murmura baixinho, e o barco faz
um movimento repentino para a direita, quase me fazendo perder o
equilíbrio.

— O que está acontecendo? — Grito com ele, meus dedos ainda no


gatilho.

— Estamos sendo atingidos, — ele faz uma pausa, virando-se para


mim. — Eu não acho que o barco vai durar muito mais tempo. — Assim
como as palavras estão fora de sua boca, o som de uma explosão me faz
tropeçar, afastando-me da janela.

— O que... — Eu começo, meus olhos arregalados quando vejo um fogo.

— Merda! Era exatamente com isso que eu estava preocupado. Eles


atingiram o reservatório. — Ele aperta alguns botões antes de se levantar.

Ele tira uma caixa da calça e a abre para revelar um anel.

— Quem pensaria que essa coisinha me traria tanta má sorte, — ele


balança a cabeça, franzindo os lábios. Chegando dentro da camisa, ele pega
um colar e rapidamente desliza o anel na corrente e em volta do pescoço.

Eu apenas fico lá, observando-o, o som de um motor se aproximando


ficando mais alto, com mais e mais balas batendo no barco.

— Aqui, — ele aparece, desfazendo meu colete e tirando-o de mim. Olho


para ele, mas não consigo encontrar forças em mim mesma para reagir.
O que está acontecendo?

Antes que eu perceba, ele está colocando outro colete nos meus braços,
um colete salva-vidas. Ele faz o mesmo para si antes de pegar minha mão e
me levar até a beira do barco.

— Você confia em mim, little tigress? — Seus olhos verdes brilham ao


luar e, no meu estado chocado, apenas aceno.

— Não esperava isso, — ele ri, me trazendo ao peito e me segurando


mais perto.

— Sinto muito por isso. Eu realmente sinto, — diz ele antes de pular
no mar.

Atingimos a superfície da água com força, mas os coletes nos mantêm à


tona. Os braços de Enzo estão me segurando firmemente quando ele começa
a nadar para longe do barco.

— Por quê? — Eu murmuro, o frio da água já está afetando meu corpo.

— Isto... — Suas palavras são silenciadas por uma enorme explosão,


detritos voando no ar e na água.

Enzo me embala mais perto e me protege com seu corpo, me afastando


do barco em chamas.
— Como você sabia? — Minhas palavras saem como um sussurro
enquanto olho para as chamas que envolvem o barco, ou o que resta dele.

— Era apenas uma questão de tempo, — sua voz é grave quando


responde, seu olhar se concentrou no navio que se afastava lentamente.

— Eles foram embora... É isso mesmo?

— Talvez o anel não fosse o que estavam procurando. Talvez só


quisessem me matar, — diz ele de brincadeira, e eu quero dar um tapa nele.
Como pode pensar em brincar em um momento como este?

Usando meu cotovelo, empurro contra ele, a corrente do mar me


impedindo de realmente machucá-lo.

— E agora eu vou morrer também. Por sua causa. Muito obrigada. —


Eu adiciono secamente, mas sou corajosa o suficiente para notar a ironia de
me aproximar e me segurar nele.

Ele sabe nadar.

Sim, de fato. Essa é a única razão pela qual estou me agarrando a ele,
minhas mãos enroladas em seu pescoço, meu rosto a centímetros do seu.

Eu levanto meus olhos para vê-lo me observando atentamente.

— Eu acho que você deveria morrer no mar, little tigress.


— Você vai parar de me chamar assim? — Cerrei os dentes e estou
impressionada com a sua capacidade de me irritar, mesmo quando meu
corpo está se desligando lentamente.

— De fato. Eu deveria te chamar de pequeno leão-marinho agora, certo?


— Ele sorri para mim e eu fecho meus olhos, derrotada.

— Sinto muito, — ele finalmente diz, e sua mão sobe ao meu rosto,
encaixando a palma da mão na minha bochecha. Meus dentes já estão
batendo, e ele não está muito atrás de mim.

— Você sabe que vamos morrer aqui, não é? — Eu pergunto a ele, meu
tom sério desta vez. Ele assente, sua expressão se fechou.

— Vamos chamar uma trégua, sim? Não vamos morrer como inimigos,
— ele acaricia meu cabelo, seu rosto subitamente terno.

— Mas é tudo o que somos, não é? Estamos na garganta um do outro


há horas.

— É tudo o que temos que ser? — O seu polegar circula na minha


bochecha e sobre a minha pele enrugada.

— Tudo bem. — Eu libero uma respiração. — Eu posso fingir... por um


tempo. — O fantasma de um sorriso aparece em seu rosto, e isso também
me desencadeia um sorriso.
Aqui estamos, no meio do nada, e cercados pelo vasto mar. Talvez
possamos fingir, agora, logo antes da morte, que somos algo mais.

— O que você sempre quis? — Eu digo de repente.

— Eu?

Eu aceno.

— Eu nunca pensei nisso. Eu sempre tive tudo o que queria, — afirma


ele com uma carranca.

— Tudo? — Eu levanto uma sobrancelha.

Ele está pensativo por um momento antes de responder.

— Alguém em quem confiar.

— Você nunca confiou em ninguém em sua vida? — Meu tom trai a


descrença que sinto em sua declaração.

Mesmo com meus pais e meu isolamento, eu ainda tinha Lia, e eu


confiava desde o início. Não consigo imaginar não ter alguém para confiar.

Ele balança a cabeça, um sorriso triste nos lábios.

— Todas as riquezas do mundo não nos dão o que mais desejamos.

— E o que é isso?
— Sua vez agora, — ele desvia e eu faço beicinho, ignorando que ele não
respondeu. — O que você sempre quis, little tigress? — a sua mão ainda está
no meu rosto e, usando o polegar, ele inclina minha cabeça para cima, então
estou olhando nos olhos dele.

— Liberdade, — afirmo simplesmente, e suas pupilas parecem crescer.

— Liberdade... — Enzo repete. — E o que você faria com a liberdade?

— Ser quem eu quiser... comer o que eu quiser, vestir como eu quiser,


casar com quem eu quiser, — as palavras se derramam dos meus lábios e a
umidade se acumula nos meus olhos.

Há água suficiente por aqui, não preciso adicionar mais.

Mas não posso me ajudar. Não quando percebo que nunca poderei fazer
nada do que sonhei. Se eles pareciam inconcebíveis da minha gaiola
dourada, agora são impossíveis — a morte é o único resultado.

— Shh, não chore, — ele limpa uma lágrima do meu olho, lentamente
a traz aos lábios e prova. Minha boca se abre em um O, o gesto totalmente
inesperado.

— Também há liberdade na morte, você sabe. Na maneira como deixa


para trás todas as suas preocupações, — o dedo dele continua a acariciar
suavemente minha bochecha, — todos os seus medos. Quem sabe, talvez
nem seja o fim.
— Você acha? — Eu tinha lido as escrituras e seguido a orientação da
igreja porque isso era esperado de mim, mas também havia explorado os
Antigos. Talvez por causa das minhas circunstâncias, eu tenha simpatizado
mais com os ensinamentos de Heráclito — tudo flui. Pois se tudo mudasse,
eu também me tornaria outra coisa e escaparia da minha condição atual.

— Não posso afirmar que sei, — sua boca se levanta em um sorriso


atrevido. — Mas eu vou deixar você saber em breve.

Talvez seja porque estamos chegando ao fim, mas mesmo as piadas


ruins dele não podem mais me dar nos nervos.

— Heraclitus, — respiro fundo. — Nós somos e não somos. Talvez não


seja a morte... apenas mudança. — Eu sussurro, e a intensidade nos seus
olhos parece me engolir inteira.

O mar está inquieto quando as ondas nos carregam, nossos corpos se


encaixam um no outro, nossas respirações se misturando na escuridão da
noite.

— Mudança... Eu gosto disso. Mas ele também disse que o fogo é a


essência de todas as coisas, e isso, — ele assente em direção ao mar, — está
extinguindo nosso fogo.

Pela primeira vez, eu rio. Jogo a cabeça para trás e rio, e ouço Enzo se
juntando a mim também.
— Devemos procurar alimentar o fogo, para que não morra, — comenta
ele, e não sei o que poderia significar.

Eu mal consigo sentir mais meus pés. Até meus braços estão perdendo
a sensação. Olho para Enzo, com os lábios roxos, a palidez nítida.

Estamos quase sem fogo.

— Como? — Eu não ligo para o que ele diz, desde que tire minha mente
do nosso destino iminente. E por um momento estou feliz que ele esteja aqui
comigo, não estamos sozinhos quando encaramos a morte Bem de frente.

O polegar desliza pelos meus lábios, separando-os.

— Que tal um primeiro beijo? Um direto desta vez? — Meus olhos se


arregalam com suas palavras, e meu coração começa a bater alto no meu
peito.

Espera. Estou morrendo. Deve desacelerar.

Empurro meu eu racional para o lado e deixo meu eu espontâneo tomar


as rédeas. Porque a parte do fogo pode ser absurda, mas minha curiosidade
não é.

— Ok, — eu digo, e ele parece tão surpreso com a minha rápida


aquiescência. — Mas depois disso, onde quer que possamos ir, — aceno com
a mão para o céu, — lembre-se de que ainda não gosto de você.
— Como desejar, little tigress. Agora cale a boca e deixe-me te beijar.

Ele coloca minhas bochechas nas palmas das mãos e aproxima meu
rosto do seus. Nossos olhos se encontram e, por um segundo, apenas nos
encaramos, com o frio, o tremor, tudo desaparecendo.

Eu lambo meus lábios instintivamente, e seu olhar diminui, se


concentrando neles.

Eu tento me preparar mentalmente para esse marco, mas sinto a


agradável pressão de seus lábios nos meus e todos os outros pensamentos
me deixam. Eu ofego e ele aprofunda o contato, sua língua saindo pela
minha boca, seu calor interno encontrando o meu.

Fogo. Estamos fazendo fogo.

Eu o seguro ainda mais quando inclino a cabeça para lhe dar melhor
acesso à minha boca. Em todo lugar é congelante, mas não onde nossos
corpos estão se tocando da maneira mais íntima. O golpe da sua língua
contra a minha causa arrepios nas minhas costas, e desta vez não é por
causa da hipotermia que se seguiu.

Eu me entrego a essa sensação.

Quem pensaria que nos encaixaríamos tão bem? Duas pessoas que não
se suportam, mas são muito boas em acender as chamas.
Ele termina o beijo, seu lábio ainda se movendo suavemente sobre o
meu.

— Talvez se tivéssemos nos encontrado em diferentes circunstâncias...


— ele se afasta e uma luz brilha de repente sobre nós. Nós dois apertamos
os olhos quando olhamos para a fonte, um barco de pesca vindo em nossa
direção.

— O que? — Minha boca fica aberta em choque. O barco pára em nossa


localização e dois homens nos ajudam a sair da água. Eles nos envolvem em
cobertores de hipotermia e nos dizem que nos levarão a um hospital.

— Você não poderia ter chegado um minuto antes? — Eu murmuro


debaixo da respiração. Se soubesse que não morreria, de jeito nenhum teria
sucumbido às artimanhas do diabo. Dou um olhar para ele e o encontro
sorrindo, sua expressão cheia de satisfação.

Então eu percebo.

— Você sabia. Você os viu, não viu? Você os viu chegando, é por isso...
— Foi por isso que ele me beijou.

Uma raiva diferente de tudo que eu já experimentei envolve meu corpo,


fazendo todo o gelo derreter.

— Você! — Cerrei os dentes e tenho que conter minha raiva. Eu gostaria


de nada melhor do que jogá-lo ao mar novamente, mas vendo como mal
consigo funcionar sem o cobertor de aquecimento enrolado em mim, me
contento em mostrar meus dentes para ele. — Você me enganou.

— Eu enganei? Você estava muito disposta a me beijar. Devo dizer, little


tigress, você tem um sabor mais doce do que eu imaginava. — Há uma
presunção nele, e eu gostaria de poder tirar esse sorriso estúpido do seu
rosto.

— E você... — Eu paro, de repente, de réplicas inteligentes. Estou tendo


um sério congelamento do cérebro e não sei se é do frio ou dos malditos lábios
venenosos. — Você é desprezível, Enzo Agosti. E espero que seus lábios
murchem e morram, quem sabe onde mais você os colocou. — Faço um rosto
enojado limpando meus próprios lábios com as costas da mão.

Sim, pode ter sido aceitável dar meu primeiro beijo somente na pessoa
disponível antes da minha morte. Mas como estou muito viva e posso estar
por muitos anos, não perdoarei isso facilmente.

— Calma, cara, você pode parecer ciumenta. — Ele ri, alimentando


ainda mais minhas chamas internas.

Sim, estamos fazendo fogo bem, e um de nós vai se queimar.

Não eu, é claro.


Nós somos levados às pressas ao hospital e os médicos de plantão nos
dizem que somos incrivelmente sortudos. Um pouco mais na água fria e
teríamos entrado em território perigoso de hipotermia. Como sou menor,
minha condição parece ser um pouco pior que a de Enzo. Nós dois ficamos
ligados em IVs para aquecer nosso sangue, e eu não sei quais conexões o
Enzo tem, mas somos colocados em um quarto particular.

— Eu quase morri duas vezes por sua causa, — murmuro, olhando para
a agulha enfiada na minha pele. Eu nunca tive um IV antes, nunca fui
levada às pressas para uma sala de emergência. A esse respeito, você
poderia dizer que estou tendo muitas estreias por causa de Enzo, todas
desagradáveis.

Você gostou daquele beijo.

Sim, talvez eu tenha feito. Mas somente quando pensei que estava
morrendo. Agora estou convencida de que não era mais nada além da minha
percepção imprecisa na ocasião.

— De nada. — Ele tem a ousadia de sorrir para mim, e eu nem penso


enquanto avanço por ele. Levando minha bolsa intravenosa comigo, faço
uma tentativa fraca de dar um soco. Ele pega meu punho na palma da mão,
um sorriso astuto tocando nos lábios.
— Agora, little tigress, — ele me puxa para mais perto até que nossos
rostos estejam a milímetros de distância, — você bate, eu revido. — Nossos
olhos se encontram por um segundo, o desafio está claro. Então ele me
empurra de volta e me ignora.

Eu paro. Se ele vai fingir que eu não existo, farei o mesmo. Não demora
muito para que uma enfermeira venha remover nossos IVs e logo recebemos
alta.

Como não pretendo passar outro momento na sua presença, nem olho
para trás quando saio, chegando apenas à entrada do hospital antes de
perceber minha realidade atual.

Estou em um país estrangeiro. Sem dinheiro. E eu não falo o idioma.

— Você é rápida em se livrar de mim, não é? — Eu ouço a voz que eu


tenho medo vindo de trás de mim.

Dou-lhe uma aparência feroz e continuo andando. Já tive o suficiente


dele para durar a vida toda.

— Como você planeja voltar para casa sem dinheiro? — Ele grita para
mim e eu aperto meus punhos com fúria.

Bem, de quem é a culpa que eu não tenho dinheiro?


— Como se você pudesse me ajudar. Você também não tem dinheiro. —
Eu me viro, cruzando meus braços sobre meu peito e levantando uma
sobrancelha para ele.

Estamos no mesmo barco agora, por mais irônico que isso possa
parecer. E enquanto meu próprio desamparo está me deixando em pânico, o
fato de ele estar enfrentando os mesmos problemas é uma pequena
satisfação.

Faço para virar novamente quando um carro para bem na nossa frente.
Um homem vestido de preto abre a porta do motorista e se dirige a Enzo.

— Signor Agosti, — ele se curva para ele, abrindo a porta do passageiro


para que possa entrar. Meus olhos se arregalam um pouco quando olho para
a troca.

— O que vai ser, little tigress? Você vai me deixar dar uma carona até
o porto ou tentará teimosamente fazê-lo, o que devo acrescentar não
funcionará? — Ele olha para mim com expectativa, uma expressão divertida
em seu rosto.

Não respondo a provocação, mas subo no carro ao seu lado.

Eu posso ser mesquinha, mas até eu sei quando conceder a derrota.


Preciso chegar ao porto de balsas, e ele sabe disso.

O carro para quando chegamos ao porto e Enzo enfia algum dinheiro na


minha mão quando estou prestes a sair.
— Para o bilhete. — Acabei de concordar, embolsando o dinheiro.

Afinal, é o mínimo que ele pode fazer.

Nós nos olhamos por um segundo.

— Espero nunca mais te ver.

— Idem. — Ele levanta dois dedos na testa em uma saudação, e eu pulo.


Não olho para trás enquanto vou direto para a cabine de bilheteria.

O som de pneus estridentes me alerta para sua partida e, pela primeira


vez, expiro aliviada.

Ou não.

A próxima balsa sai em duas horas. Respiro fundo, tentando acalmar


meus nervos. O relógio na sala de espera me diz que é quase manhã e o sol
está prestes a nascer.

Senhor, o que eu vou fazer?

Eu estou condenada. Eu sei isso. Posso não ter morrido no mar, mas
minha sorte vai acabar.

Por um breve momento, contemplo fugir. E se eu simplesmente não


voltar para casa?
Mas eu não posso. Não só não tenho mais para onde ir, mas sei que Lia
será a única a pagar se não voltar. Prefiro aceitar o castigo do que algo
acontecer com ela.

Suspirando, tento tirar minha mente disso. Meus pais ou Franzè vão
garantir que eu seja colocada no meu lugar. Agora, quanto ao que isso
implica...

Balanço a cabeça, forçando-me a deixar esses pensamentos de lado. Não


fará bem insistir no inevitável.

E depois há Enzo... aquele maldito diabo que me provou por que o


mundo não é um lugar seguro para uma garota como eu. Ele procurou tirar
vantagem de mim a cada passo. Que eu me safei com minha virtude intacta
é surpreendente, considerando tudo.

Houve um momento em que ele cortou a camisa do meu corpo, que eu


temia o pior. Eu agi de maneira tola, mas me defendi da única maneira que
sabia, assumindo o controle de minha própria morte.

Estou ficando mais irritada quanto mais penso nele e na bagunça em


que me arrastou. Melhor chutá-lo da minha cabeça também. Não é como se
algum dia nos encontrássemos novamente.

A sala de espera é um espaço fechado perto das docas, e eu posso ver os


barcos do meu assento. Estou ficando mais sonolenta, mas não confio em
mim para acordar a tempo da balsa, então forço meus olhos a abrir.
Começo a ver as pessoas irem e virem, e logo já passou uma hora.

De repente, eu me encolho acordada e piscando duas vezes, forçando


meus olhos ficarem abertos.

Não!

Adormeci.

Virando-me para o relógio, respiro aliviada quando vejo que minha


balsa não partiu. Levanto-me e me alongo, pronta para ir em direção às
docas.

Nesse momento, quatro homens de terno preto entram na sala. Todos


eles estão usando óculos escuros, o que é estranho, considerando que o sol
ainda não está totalmente a tona. Eu encolho os ombros e começo a passar
por eles.

Estou passando quando um deles agarra meu braço, me empurrando


para trás com força.

— Você tem certeza que é ela? — Um homem pergunta, tirando os


óculos e me examinando da cabeça aos pés.

— Sim. Foi ela quem atirou em nós. — Ele acena para os outros, e eles
rapidamente agarram minhas mãos.
Começo a lutar e a jogar os pés ao redor, esperando atingi-los e fazê-los
me deixar ir.

— Putinha. — Uma palma se conecta à minha bochecha e eu recuo,


minha visão nadando.

São eles... as pessoas que estavam atrás de Enzo.

— Leve-a. Ela pode ser útil mais tarde. — Ele vira as costas, deixando
dois homens para trás para me arrastar para fora.

— Estou reclamando a prioridade. — O bruto segurando meu braço diz


enquanto vira o rosto para mim, um sorriso que mostra dentes podres me
fazendo recuar com nojo.

Querido Deus!

Um medo diferente de qualquer outro que eu já senti antes se instala


profundamente em meus ossos.

Eu não vou deixar!

Empurrando contra o homem que me segura, uso minhas pernas para


chutar o outro. Lágrimas estão escorrendo pelas minhas bochechas
enquanto uso toda a minha energia restante para lutar. Exaustão, fome e
doença estão convergindo para me segurar, meu corpo minado de toda força.
Um movimento repentino e sou jogada no chão, minha cabeça batendo
em uma cadeira.

Há mais alguém na sala, e ele está lutando contra os dois homens,


aparentemente vencendo.

— Venha, little tigress, — uma voz familiar me ajuda a me levantar. Eu


pisco rapidamente, tentando recuperar o foco dos meus olhos, e Enzo está
olhando para mim, sua expressão cheia de preocupação.

— Você está bem? — Ele pergunta, me puxando para mais perto de seu
corpo e me deixando me apoiar nele.

Por que ele voltou?

Não que eu esteja reclamando, já que ele acabou de me salvar. Mas por
que ele está aqui?

Eu dou um aceno apertado, e ele franze os lábios. Sua mão se estende


para tocar minha testa levemente e eu choramingo de dor.

— Você bateu muito forte com a cabeça, — observa ele, e faz movimento
para me carregar nos braços.

— Estou bem. Eu posso andar. — Ele parece querer discutir, mas


apenas balança a cabeça, pegando minha mão e me levando para fora da
sala de espera.
O sol está nascendo, o céu uma combinação de vermelho e roxo.

— Onde estamos indo?

— Para o meu carro, — ele aponta para a rua onde o carro está
esperando.

Eu me movo devagar e não sei se é do golpe que tomei anteriormente,


ou se estou apenas no meu ponto de ruptura.

Chegamos ao carro em pouco tempo, mas quando estou prestes a entrar,


vejo um homem de antes correr em nossa direção, com a arma levantada, o
objetivo claro.

Talvez mais tarde, quando eu puder refletir com mais clareza, vou me
arrepender disso. Talvez eu até olhe para trás e me pergunte como essa
decisão repentina mudou o curso inteiro da minha vida.

Mas neste momento não estou pensando. Eu só estou agindo. Minha


boca se abre com um aviso e meu corpo empurra contra o dele, a última de
minhas forças esgotadas.

A dor não vem imediatamente. Na verdade, me sinto bastante


entorpecida ao tentar piscar um pouco de clareza nos meus olhos.

Enzo está embalando meu corpo no seu colo, e tenho a vaga impressão
de que estamos em um carro em movimento.
— Por quê? — Sua voz está quebrada quando ele pergunta.

Mas não posso responder.

Eu só posso desmaiar.
CAPÍTULO SEIS

Meus dedos brincam com o anel em volta do meu pescoço, e eu me forço


a não olhar para trás. Eu sabia que esse momento chegaria, que seguiríamos
caminhos separados. Mas por que me sinto estranho com isso?

Eu posso tê-la conhecido por menos de um dia, mas ela cresceu em mim.
Ela é... inesperada. Fresca. E no meu mundo, isso é tão raro quanto dentes
em galinha.

Talvez seja por isso que fiquei tão impressionado com ela e por que ela
persiste em ficar na minha mente. Acabei de conhecer alguém como ela,
então meu cérebro está reagindo à novidade. Não há mais nada nisso.
Satisfeito com a explicação lógica, pego o telefone que meu motorista
havia fornecido e ligo para o comprador, agendando a reunião em menos de
uma hora. Quanto mais cedo eu me livrar desse anel amaldiçoado, melhor
me sentirei.

Ainda não sei se esses homens estavam atrás de mim ou do anel. Mas
é melhor não me arriscar.

Hora e local de reunião, passo por uma loja para me trocar e parecer
mais composto.

Depois, a troca é rápida. No momento em que vejo o valor prometido


depositado em minha conta bancária, entrego o anel e nos separamos em
agradáveis gentilezas. O comprador queria permanecer anônimo e,
portanto, enviou seu assistente pessoal.

Enquanto eu estava curioso sobre o homem que tão facilmente gastou


seis milhões em um mero anel, uma ansiedade profunda e desconhecida me
faz ignorar distraidamente o ofício, meus pensamentos voltando para
Allegra. E quando estamos falando de seis milhões, minha mente não
deveria estar em lugar algum exceto aqui.

Mesmo depois que saio, ainda sinto uma sensação incômoda... alguma
coisa.

Visões dela sendo aproveitada ou morta em uma vala me atormentam


durante todo o passeio de carro. Seus olhos inocentes se abrem, seu corpo
sem vida em uma poça de sangue...
— Foda-se isso! — Eu murmuro, balançando a cabeça. Com um
comando rápido, peço ao meu motorista que vire o carro e volte para o
terminal da balsa.

Só vou garantir que ela embarcou na balsa e depois poderei seguir meu
caminho feliz. É simplesmente irracional, esse medo que estou sentindo,
mas não importa o quanto eu tente, não posso suprimi-lo.

É porque ela é tão protegida... tão ingênua. Ela me lembra minha irmã,
Catalina. E como irmão mais velho, eu não gostaria que nada acontecesse
com ela. Não quando a experiência de ter essa culpa em minha consciência
já é muito pesada.

Sim, é isso mesmo. Ela apenas apela aos meus instintos fraternos. Ela
pode ser minha tigresa, mas para qualquer outra pessoa ela é apenas um
cordeiro implorando para ser abatida. Essa ingenuidade é como um farol de
luz para toda alma depravada por aí... eu incluído.

Depois de garantir que ela está a caminho de casa, posso deixar o


episódio inteiro para trás e seguir em frente.

Quando voltamos ao porto, toda a área está vazia. Examino os


arredores, mas não há vestígios dela.

— Droga, — eu amaldiçoo em voz alta, meus olhos estão alertas para


qualquer tipo de movimento. Ando em círculos um pouco antes de decidir
que devo ir para casa. Um barulho de um galpão próximo me impede de
seguir meu caminho. Eu levanto meu pescoço, ouvindo mais.
Quanto mais eu chego perto da área, mais parece que alguém está
lutando. Abro a porta bem a tempo de ver um homem jogar Allegra para o
chão, a testa batendo com um baque contra os móveis.

Meu olhar volta para os homens, meus punhos apertando ao meu lado.

Eles estão mortos.

Entrando, um homem me ataca, mas eu desvio facilmente os golpes e o


mando voando com alguns socos.

Fácil com uma garotinha. Não tanto com alguém do seu tamanho.

O segundo homem, aquele que ousou colocar as mãos nela, dá um passo


à frente e um soco vem diretamente para o meu rosto. Eu me esquivo
facilmente, movendo-me para a direita, antes de usar meu pé para
interromper seu equilíbrio quebrando o joelho. Ele cai no chão, a boca é uma
linha dura de dor.

Não hesito em chutá-lo novamente, minha tíbia fazendo contato com


sua mandíbula. O golpe o faz recuar, sangue caindo no chão.

Eu me movo rapidamente puxando Allegra para cima.

— Venha, little tigress.

Ela parece um pouco desorientada ao apertar os olhos.


— Você está bem? — Quero perguntar o que aconteceu antes de eu vir,
mas ela não parece adequada para nenhum tipo de questionamento.

Ela assente, e meus dedos vão para sua cabeça, onde uma mancha
vermelha está se formando.

— Você bateu bem forte com a cabeça, — estou me segurando com força,
não querendo assustá-la ainda mais matando os homens. Segurando-a mais
perto de mim, tento levá-la para meus braços.

— Estou bem. Eu posso andar, — ela responde imediatamente, e dá


alguns passos apenas para me mostrar que é capaz de fazer isso sozinha.
Abro a boca para dizer alguma coisa, mas balanço a cabeça.

Agora não!

Pegando a mão dela, eu a conduzo para fora.

— Onde estamos indo? — A voz dela está um pouco acima de um


sussurro, e não duvido que esteja com dor. Com sua estatura frágil e o que
ela resistiu na noite anterior, é uma maravilha que esteja de pé.

Olho para ela e sinto que meu respeito por ela crescer. Ela levou tudo
no tranco, quase nem reclamando.

— Para o meu carro. — Eu tento carregar o peso que ela permitir, sua
postura independente aparentemente ofendida se receber ajuda.
Abrindo a porta do carro, volto um pouco para permitir que ela suba
primeiro.

Ela não entra.

Ela para, erguendo os olhos para me olhar. Ela move a cabeça para o
lado, olhando para trás, antes de me pressionar com tanta força que bato na
porta.

Sua boca forma um O e um grito de gelar o sangue escapa de seus lábios


quando ela cai em meus braços, uma mancha vermelha e úmida se formando
na superfície de sua camisa. Meus olhos se arregalam, mas já estou
acostumado a esses tipos de cenários.

Segurança primeiro!

Eu a pego em meus braços e me empurro no banco de trás, sinalizando


rapidamente para o motorista acelerar.

Seus olhos são brilhantes, olhando-me abertamente com quase nenhum


reconhecimento. A visão que tive antes se manifesta repentinamente na
realidade.

— Por quê? — Eu grito, a noção de que ela levou uma bala significava
para mim quase incompreensível.

Ela não responde, mesmo os poucos choros de dor de antes agora


silenciam.
Eu escovo minha mão sobre a testa já cintilante e um peso
desconfortável se instala no meu peito. Minha outra mão sai coberta de
sangue — o sangue dela.

E eu não gosto disso.

— Shh, eu peguei você. — Eu continuo pressionando o ferimento, o


tempo todo latindo comandos para o meu motorista.

Nós precisamos de um médico. Rápido.

A bala parece ter atingido seu ombro, e não há ponto de saída, então
ainda está dentro. Isso significa que preciso de alguém para operar ela.

Porra!

Há também esses homens, e se suas tentativas na minha vida até agora


são alguma indicação, eles não vão parar. Eu tenho a opção de levá-la para
o meu palazzo em Gozo, mas temo que ela não consiga até chegarmos à ilha.
Não... isso não é uma opção.

Fazendo algumas ligações, convido um cirurgião para nos encontrar em


outro porto, um barco pronto para partir. O palazzo é a localização mais
segura agora.

Eu raramente me importo se alguém vive ou morre, mas quando olho


para a pequena forma em meus braços, já pálida pela perda de sangue, não
consigo imaginar ela morrendo.
— Você não pode morrer por mim. — Eu ordeno, mesmo que ela não
possa me ouvir. Mas se ela não ouvir, haverá um inferno a pagar.

Mal estou respirando, meu coração na garganta enquanto caminhamos


em direção à outra parte da ilha. Quando finalmente paramos, abro a porta
e, segurando-a com força para Allegra, corro em direção ao navio que espera.

No momento em que pulo a bordo, vou diretamente para um quarto no


andar de baixo. Empurrando tudo de uma mesa, eu a deito cuidadosamente
lá.

Ela geme suavemente, e eu engulo com força, quase como se eu pudesse


sentir sua dor. Mas tento banir tudo da minha mente. Eu preciso agir
rápido.

Virando-me, preparo uma grande tigela de água e molho um pano,


arrastando-o sobre o ferimento e absorvendo o sangue.

— Onde está a porra do cirurgião? — Grito com um homem esperando


do lado de fora da porta.

— Ele estará aqui em breve.

Com uma mão, mantenho pressão sobre a ferida, enquanto a outra


verifico o seu pulso.

— Little tigress, se você ousar me deixar, eu te encontro na vida após a


morte e te atormentarei para sempre. Você tem minha palavra.
Seu rosto pequeno, cansado da dor, olha para mim, sem resposta.

Parece que uma eternidade passa antes que o médico finalmente


apareça e o barco esteja em funcionamento. Ele me pede para me afastar e
começa a avaliar seu paciente.

— Eu preciso remover a bala. Parece estar alojada dentro, — comenta


metodicamente, os olhos examinando o corpo frágil de Allegra. — Ela é
pequena. Provavelmente severamente abaixo do peso.

— Isso vai ser um problema?

— Depende. Isso pode atrasar sua recuperação. E se seu corpo


sobreviver.

— O que você quer dizer: E se? E se você quer sair com sua vida, sugiro
que faça certo para ela sobreviver. — Eu levanto uma sobrancelha para ele,
já carregando a arma na minha mão. O médico engole e assente lentamente.

Voltando sua atenção para Allegra, ele administra um anestésico.


Então, ele tira uma tesoura do estojo e começa a cortar a camisa dela.

Fico tenso e, antes que perceba, meus dedos se envolvem em torno de


sua mão, parando seu avanço.

— Ela fica vestida.


— Mas... — Ele começa a discutir, mas eu não estou ouvindo. Sei que
ele não precisa mostrar o torso inteiro para fazer esta cirurgia. A área do
ombro dela é suficiente.

— Ela fica vestida. — Eu digo novamente, desta vez com mais força.
Ele rapidamente assente e trabalha no ombro. Ele desinfeta a área antes de
usar um bisturi e cortar a carne dela.

Estou muito atento, seguindo todos os seus movimentos.

— A bala está alojada na escápula, — diz ele em algum momento,


usando a ponta do bisturi para cavar a bala. — Isso fez uma bagunça no
músculo. Vou precisar consertar, — continua ele, e parece que espera que
eu me afaste.

— Continue. — Enraizado até o local, continuo assistindo com cuidado


tudo o que ele faz. Ele trabalha para ligar o tecido antes de finalmente fechar
o ferimento.

— Eu terminei com a ferida, mas ela perdeu muito sangue. Você precisa
levá-la para um hospital. Ela precisa de uma transfusão de sangue.

Minhas sobrancelhas se encolhem em consternação.

— Você não pode fazer isso aqui? — Eu pergunto, olhando para o kit
médico dele.

— Eu não tenho sangue comigo.


— Use o meu, — respondo imediatamente, segurando meu braço para
ele.

— O que? — ele cuspiu, com os olhos arregalados na cabeça. — Isso não


está certo! Preciso conhecer o tipo sanguíneo dela primeiro e você precisaria
de um exame de sangue... — ele continua divagando, olhando para mim
como um idiota que não entende de ciência.

— Nós dois somos negativos. Está bem. — Eu encontrei esse pedacinho


de informação no hospital e agora estou feliz por isso, pois isso pode salvar
a sua vida.

— Mas... — ele continua, e minha paciência está acabando. Uma olhada


no corpo quase sem vida de Allegra me deixou selvagem em minha resposta.

— Estou limpo. Veja, não há problema. Agora faça! — Ele deve


entender a ameaça não dita, porque vasculha seu kit, removendo um tubo e
personalizando-o para que fique do lado duplo. Ele rapidamente faz alguns
ajustes antes de enfiar uma agulha no braço dela e depois fazer o mesmo
comigo. Ele se atrapalha com o controlador até eu ver o sangue me deixando
lentamente, viajando pelo tubo e entrando no corpo dela.

A intimidade do ato me surpreende, um instinto primitivo despertando


dentro de mim enquanto a observo aceitando meu sangue, tornando-se
assim um.

Minha.
O barco atraca no porto em Gozo. O médico me dá uma lista de
medicamentos para administrar a ela, incluindo antibióticos.

Sou muito cuidadoso ao movê-la para o carro que nos leva até o palazzo.
Todo o caminho continuo monitorando seu pulso, alerta para cada
movimento e para cada som que ela faz.

Ela não vai morrer.

Há apenas alguns funcionários contratados no palazzo, e eles passam o


ano todo lá, mantendo a propriedade limpa e funcionando.

Quando chegamos aos portões, pego Allegra nos braços e vou para a
suíte principal, onde um quarto principal se estende por mais de noventa
metros quadrados. Há uma cama king size no meio do cômodo, e eu
lentamente a deito sobre o edredom.

O médico me disse para esperar febre, calafrios e até delírio. Não estou
exatamente empolgado com nada disso, mas vou garantir que ela esteja
quente e confortável na cama.
Eu me forço a deixar o seu lado por um momento e chamo soldados para
guardar a propriedade. Então, reúno a equipe e dou-lhes suas tarefas. Peço
a uma mulher que compre uma variedade de roupas para Allegra e depois
confio à cozinheira uma longa lista de alimentos líquidos que Allegra poderá
ingerir.

Quando dei algo a todos na casa, volto para o quarto. Verificando


novamente Allegra, fico feliz em ver que ela não está com febre. Grato por
um momento de paz, vou ao chuveiro para lavar o sangue do meu corpo.

Enquanto a água se apega à minha pele, não posso deixar de reproduzir


os eventos do dia.

Tão próximo...

Ela poderia ter morrido. Aquela pequena idiota poderia ter morrido e
por quê? Para me salvar? Eu quase ri do absurdo da situação, embora por
algum motivo seja bom.

Acho que nunca alguém fez isso por mim incondicionalmente. Claro, os
soldados de meu pai me protegeriam com suas vidas, mas apenas porque eu
sou o herdeiro Agosti e, por extensão, o chefe deles. Não passa de tradição e
disparidade de poder. Eles nunca fariam o mesmo por um estranho.

Ela fez.
Não apenas para um estranho, mas para alguém que ela nem gosta.
Estou, novamente, surpreso ao admitir que, pela primeira vez na minha
vida, uma mulher ganhou meu respeito.

Desligo a água e envolto uma toalha na cintura. Voltando ao quarto,


puxo uma cadeira ao lado da cama e sento-me.

Enquanto observo sua forma, lutando bravamente entre a vida e a


morte, de repente fico impressionado com um pensamento.

Ela é exatamente o que eu preciso ao meu lado. Ela é incrivelmente


corajosa; ela segue seus princípios mesmo diante da morte; e é inteligente e
altruísta.

Meus olhos voltam para o rosto dela. Ela definitivamente não é ruim de
se olhar.

E o mais importante, ela é alguém que eu poderia confiar.

Não demoro muito para me convencer de que ela tem todos os atributos
para ser a esposa perfeita, minha esposa perfeita especificamente.

Porque não tem como eu deixá-la ir. Não depois de tudo o que passamos.

Ela tem meu sangue bombeando em suas veias agora, então eu estou
mantendo-a.
Agora, convencê-la disso não será tão suave, um fato que estou
dolorosamente ciente. Não quando ela claramente me odeia. Vou ter que
fazer algo para que ela não tenha outra escolha exceto a mim.

No sono profundo, ela faz um pequeno barulho, a boca se abre


levemente.

Sim, ela é minha. Para sempre minha.

— O que quer dizer que eles estavam tentando parar o casamento de


qualquer maneira, — acrescento com desdém. Um dos meus homens em
Nova York acabara de me informar que, no momento em que começaram os
rumores de que Agosti e Guerra uniriam suas famílias através do
casamento, DeVille, inimigo jurado de Guerra, não recebeu bem a notícia.
Não que alguém pensasse que sim, já que sempre procurou isolar os Guerra.
Mas para eles tentarem me matar apenas para garantir que a união não
ocorra? Muito drástico, mesmo para eles.

Embora eu certamente não aprecie as pessoas tentando me matar, eles


cruzaram uma linha quando feriram minha propriedade.

Bem, minha propriedade a partir de agora.


— Pegue um disfarce para fingir que estou indo para Nova York.
Comercial. E me mantenha atualizado. — Eu desligo bem a tempo de ver
uma empregada trazer uma bandeja de comida.

— Deixa comigo. — Eu a peço para sair.

Quase dois dias desde o ataque e Allegra só acordou algumas vezes.


Cada vez, ela murmurava alguma coisa e depois voltava a dormir. Ela ainda
não teve febre, a única coisa boa.

Andando para cama, pego a tigela de sopa e tomo uma colher pequena
para garantir que não esteja muito quente. Quando estou satisfeito com a
temperatura da sopa, ajudo Allegra a sentar-se e tento abrir os lábios para
colocar um pouco de líquido nela.

O médico havia comentado seu peso e que, se ela não receber nutrientes
suficientes, pode ser difícil para o corpo e isso atrasaria sua recuperação. Eu
comecei com um pouco de água, e ela segurou isso, então a sopa parece um
próximo passo razoável.

A colher mal passa pelos lábios e um pouco de líquido escorre pelo


queixo. Usando um guardanapo, eu limpo com cuidado e seus olhos se abrem
um pouco. Um pequeno gemido escapa dela, mas ela não se mexe.

Eu a alimento com outra colher, e a mesma coisa acontece. É como se


ela estivesse propositalmente tentando fazer uma bagunça. Decido jogar o
seu jogo, especialmente quando vejo os pequenos olhos esvoaçantes sob as
pálpebras.
Limpo seu queixo e dou-lhe mais sopa. Desta vez, não estou surpreso
quando acaba mais no rosto dela do que na boca. Eu não paro. Outra colher
e ainda mais sopa está driblando o queixo.

Voltando um pouco, vejo como ela se esforça muito para fingir que está
dormindo. Acho que ela está blefando. Coloquei a tigela de volta na bandeja
e me inclinei; eu capto as gotas de sopa pingando o seu queixo com a língua.
Fecho meus lábios sobre a pele bem debaixo dos lábios, sugando o líquido.

Ela suspira e tenta fugir, estremecendo quando o ombro dói.

Volto um pouco para encontrá-la olhando para mim, seus olhos


segurando o mesmo fogo de antes.

Eu deveria saber que nenhum ferimento de bala tiraria essa faísca dela.
Meus lábios se estendem para um sorriso lânguido.

— O que você pensa que está fazendo? — Ela pergunta com os dentes
cerrados e até mesmo suas forças minaram com a luta que ela planejava
travar comigo.

— Como é? — Eu levanto minha mão para acariciar sua bochecha. Ela


tenta me afastar, mas sua condição não lhe permite muito movimento.

Ela foi pega.


— Você está machucada. Não se esforce. — Há tanta animosidade
naqueles olhos dela, é como se estivesse me desafiando a continuar
apertando os seus botões.

E nunca deixo passar por um bom desafio.

— Sem defesa... você nem pode me bater, — eu puxo, e ela empurra seu
corpo de volta, fazendo caretas.

— Seja uma boa garota e não lute, — digo logo antes de mergulhar
minha cabeça, minha boca pairando em cima dela.

— Eu vou morder, — ela sussurra, provavelmente esperando que isso


me impedisse.

— Talvez eu esteja esperando que você faça. — Eu respondo com um


sorriso, provocando-a com o fantasma de uma pressão nos lábios antes de
me levantar de repente.

— Estou feliz que você esteja melhor. Agora pode se alimentar. Eu


odiaria ter que cuidar de você até se recuperar.

— E de quem é a culpa, imbecil? — Ela retruca, mais vigor em sua voz


do que antes. Ela aponta para o ombro enfaixado e eu apenas dou de ombros.

— Eu pedi para você levar um tiro?


Muito bem, Enzo. Você deveria convencê-la para se casar com você, não
a antagonizar ainda mais.

— Você poderia pelo menos ter agradecido, — ela murmura sob a


respiração, balançando os pés sobre a cama e se posicionando em direção à
mesa de cabeceira. Usando sua mão boa, ela começa a comer a sopa.

— Calma. — Eu digo quando vejo a velocidade em que está comendo.

— Oh, me desculpe. Você queria que eu olhasse para isso? — Ela revira
os olhos para mim antes de continuar comendo.

Eu acho que isso resolve. Ela não vai morrer.

Quando a verifico mais tarde, ela está dormindo novamente, uma


expressão pacífica em seu rosto. Oh, se ela fosse assim sempre...

Balanço a cabeça com o pensamento, não haveria graça nisso.

Passo o meu dia a maior parte do tempo em telefonemas com contatos


de Nova York e da Sicília, e consigo entender o que os Marchesi planejaram
para Allegra. O casamento, daqui a dez dias, é o culminar da aspiração de
Marchesi de entrar nos mercados do norte da Europa. Com a liderança
atual, estou surpreso que seja uma opção viável. Leonardo Marchesi é
conhecido por seus hábitos gastadores, não por sua previsão. E o
planejamento cuidadoso das núpcias me leva a acreditar que pode haver um
jogador oculto — o cérebro por trás da operação.
É fácil ver o que eles fizeram, mesmo sem uma conta da Allegra. Eles
deviam saber da propensão de Franzè para crianças e resolveram mantê-la
parecendo uma, limitando sua ingestão de comida. Meu palpite é que eles
também tentaram mantê-la isolada.

Quando questionei meu contato sobre Allegra especificamente, ele nem


sabia quem ela era. Ele só conheceu sua irmã, Chiara, que, em suas próprias
palavras, era a menina dos olhos de seus pais.

Parece que eu não estava muito longe na minha avaliação, ela é apenas
um cordeiro sacrificial.

Mas você sabe o que eles dizem, o lixo de um homem é o tesouro de


outro. Vou ter que apagar o senso de dever equivocado que ela tem em
relação à família da mente. E a maneira mais fácil? Fazê-la perder seu
próprio casamento.

— Como ela está, doutor? — Eu pergunto quando o homem está no


quarto dela. Eu encontrei outro médico disposto a cuidar dela durante a
nossa estadia aqui, principalmente porque eu precisava de alguém mais
antiético.

— A ferida está indo melhor do que eu esperava. Ela deve ficar bem,
desde que se cuide.

— E a coisa que eu perguntei antes? — Bato no pé, ansioso para ouvir


a opinião dele.
— Não deve ser muito prejudicial. O sono é benéfico neste momento,
pois a ajuda se curar. — Eu aceno e agradeço. Agora meu plano pode seguir
oficialmente em frente.

Volto para o quarto tarde da noite. Allegra está dormindo


profundamente neste momento. Aproximando-me da cama, abaixo o lençol
pelo corpo dela e escovo minha mão na testa.

Quente... Muito quente.

Ela libera um gemido suave, esticando o corpo para que o lençol caia
completamente. A cama inteira está encharcada, suas roupas molhadas
agarradas à pele. Ela se agita um pouco quando a brisa atinge a pele úmida,
um arrepio envolvendo seu corpo.

Merda!

Foi exatamente contra isso que o médico havia alertado. Abro a gaveta
com o remédio e pego os comprimidos que ele receitou.

— Calma, tigress, — sussurro, ajudando-a para que possa engolir as


pílulas. Ela não está protestando desta vez, e quando seus olhos se abrem,
eles ficam sem dor.

— Frio, — diz ela por gemido que parte meu coração. Eu rapidamente
pego uma tesoura e cortei a camisa do corpo dela, evitando a área lesionada
da melhor maneira possível. Então tiro as calças dela, deixando apenas a
calcinha.
Indo para o banheiro, encho uma bacia com água e a trago para o lado
dela, usando um pano para limpar suavemente o suor da pele.

— Não... não, por favor não. — A mão dela empurra para mim, a pele
coberta de arrepios do frio. Meus olhos brilham sobre seus peitos bonitos,
seus mamilos eretos e de pé em atenção.

Droga...

Eu engulo. Difícil.

— Por favor... — Eu deposito a bacia no chão, deixando o pano dentro.


Levantando-me, me despi, permanecendo apenas de cueca e me juntei a ela
na cama.

O contato pele a pele é a melhor maneira de aquecer alguém,


supostamente. Nesse caso, vou considerar isso como verdade.

Eu a viro do seu lado bom e a aproximo da minha pele. Meu braço se


enrola em volta da cintura para mantê-la nivelada contra mim. Seus
mamilos roçam no meu peito nu e eu fecho meus olhos, disposto a me
acalmar.

— Oh, — ela geme suavemente, ainda tremendo. Ela se aproxima de


mim e joga a perna sobre o meu corpo.

Porra!
Esse movimento repentino acabou de colocar seu centro em contato com
meu pau já rígido, e eu tenho que cerrar os dentes em frustração.

É isso que recebo por tentar ajudar.

Ela parece ter encontrado sua posição e logo está dormindo


profundamente. Eu a seguro e, em algum momento, também me afasto.

É manhã quando sou acordado por um grito feminino. Abro os olhos


para uma Allegra aterrorizada segurando o lençol no peito, com os olhos
cheios de lágrimas.

— Por favor, me diga que você não fez... — Ela segue, e qualquer
tentativa que eu possa ter feito em uma piada é rapidamente esquecida. Ela
parece tão de coração partido que não consigo encontrar em mim para
provocá-la ainda mais.

— Nada aconteceu, — levanto-me, — você estava com febre e eu te


aqueci.

— Nu? — Ela levanta uma sobrancelha para mim, mas não sinto falta
da maneira como os olhos dela caem no meu corpo antes de subir.

— Claro, que melhor maneira de curá-la do que com meu corpo divino?
— Eu lhe dou um sorriso torto e a tristeza parece derreter dos olhos,
substituída por pura raiva.

Eu acho que prefiro a raiva.


— Saia! — Ela grita comigo, jogando um travesseiro na minha figura
em retirada.

Parece que ela finalmente está a caminho da recuperação. E a melhor


hora para colocar meu plano em movimento.
CAPÍTULO SETE

Eu poderia ter julgado mal o diabo. Talvez ele se sinta culpado porque
eu recebi uma bala destinada a ele, mas ele está em seu melhor
comportamento.

Após meu período inicial de convalescença, a dor no meu braço


diminuiu para uma quantidade suportável. Eu até tive coragem de olhar
para a ferida e, enquanto o médico a costurava bem, ela vai me deixar uma
cicatriz.

Um efeito colateral do processo de cura, no entanto, é que estou sempre


com sono. Não sei quantas horas por dia durmo, mas comecei a perder a
noção do tempo, todos os dias se misturando ao outro.
Após o incidente na cama, Enzo não tentou tirar vantagem de mim
novamente. Ele ainda me traz sopa todos os dias e me ajuda com meu
remédio, mas pediu a uma mulher mais velha em sua equipe que me
ajudasse a tomar banho e se vestir. Até suas provocações pararam, e não sei
se devo me preocupar ou não.

— O médico está aqui para remover seus pontos. — Suas palavras me


trazem de volta à realidade. Estou usando apenas uma blusa, então o
médico tem fácil acesso ao meu ombro.

Enzo permanece no quarto, observando todos os movimentos do médico.

O processo é bastante rápido e não tão doloroso quanto eu imaginava.

— Continue mantendo a área limpa, — aconselha o médico quando sai,


parando do lado de fora da porta para ter mais algumas palavras com Enzo.

Já estou com sono, apesar de ter acordado algumas horas atrás. Volto
para a cama, dormindo no momento em que minha cabeça bate no
travesseiro.
— Não pode ser... — Minhas gotas de boca abertas com as palavras de
Enzo. Certamente não...

— Você está fora há uma boa parte do tempo. — Ele aponta, mas ainda
estou em choque.

Porque se o que ele está dizendo é verdade, então... Olho novamente


para a data, atordoada.

Meu casamento deveria ser ontem.

Perdi o casamento.

— Você não entende... — Comecei, mas não consigo nem encontrar as


palavras para explicar o que acontecerá comigo por causa disso. E Lia, ela
ainda está viva?

— Shh, little tigress. Tudo ficará bem. Vou levá-la de volta aos seus pais
e explicar tudo. Eles saberão que não é sua culpa. Além disso, eles devem
estar felizes por sua filha estar viva, certo?

Eu balanço minha cabeça. Ele não entende... não percebe o que vai
acontecer comigo. O simples fato de eu estar sozinha com um homem...

— Confie em mim, — continua ele, usando o dedo para levantar meu


queixo, então estou olhando nos seus olhos: — Conheço seus pais e eles
acreditarão no que lhes digo.
Quero protestar, dizer a ele que isso não importa, mas ele parece tão
seguro de si mesmo que até eu tenho um momento de dúvida. É possível que
ele esteja certo?

Pela primeira vez, decido confiar nele. Porque, realmente, qual é a


alternativa?

Partimos à primeira luz do dia e, em vez de irmos para o porto, vamos


para o aeroporto onde um jato particular nos espera. Em menos de meia
hora, estamos voltando para casa. Um carro preto para na pista de pouso e
somos recebidos lá dentro.

Talvez Enzo seja alguém importante, e talvez convença meus pais. Nós
realmente não conversamos enquanto dirigimos em direção ao vilarejo, mas
a cada segundo nos aproximamos, não posso deixar de sentir um vazio no
estômago — como se eu soubesse que estou indo em direção ao local de
execução.

— Não se preocupe. Eu tenho tudo sob controle. — Enzo me tranquiliza


mais uma vez e eu apenas aceno.

Parando na frente da minha casa, os guardas dão uma olhada em mim


e em Enzo e eles falam algo através de seus comunicadores.

A ansiedade está me matando quando recebemos luz verde para entrar.


Não passamos pelo quintal principal antes que meu pai e minha mãe
estejam correndo para fora.
— Eu... — a palavra nem sai da minha boca quando minha mãe me dá
um tapa, a sua força me empurra para trás. Fecho os olhos e espero o resto
chegar, pois sei o que esperar. Mas isso não acontece.

— Você não bata nela, — a voz severa de Enzo me surpreende, mas não
tanto quanto o olhar de admiração no rosto dos meus pais.

— Vocês... — meu pai engasga, a mão imediatamente vai para a arma


que ele mantém na cintura da calça.

— Eu não acho que você queira fazer isso. — Enzo comenta


arrogantemente, e eu chicoteei minha cabeça para dar uma olhada nele.

Foi assim que ele planejou me ajudar a explicar a situação aos meus
pais?

— Você não sabe o que fez, garota estúpida! — Minha mãe grita comigo,
sua linguagem corporal me dizendo que ela não gostaria de nada melhor do
que me arrastar pelos meus cabelos e me bater até que eu não possa me
levantar. Vejo o desprezo nos seus olhos e sei exatamente o que isso
significa. Depois que Enzo se for, eu estarei morta.

— Tivemos que dar sua irmã a Franzè. Sua irmã! — Ela enfatiza a
palavra como se eu não soubesse o que minha irmã significa para eles. —
Minha doce Chiara! E é tudo culpa sua! — Ela vem em minha direção
novamente.
Não consigo mais reunir o medo. Agora que tenho a confirmação do que
me espera, é apenas uma questão de quando. Se isso afetou Chiara, haverá
um inferno a pagar — por mim.

— Eu não fui claro? — Enzo pisa, colocando seu corpo na minha frente
para que ele esteja me protegendo de qualquer ataque em potencial. — Você
não a toca. Você não grita com ela. Estamos entendidos?

— E quem você pensa que é para me dizer o que fazer? Você acha que
tem alguma influência por aqui? — Minha mãe diz presunçosamente, mas
Enzo encolhe os ombros, aparentemente sem problemas.

Ele pega minha mão na sua, segurando-a com força e levantando-a na


frente dos meus pais. — O futuro marido dela.

— Eu não vou permitir isso! — Pai exclama, sua arma apontada para
Enzo.

— Mesmo? — Enzo se arrasta, e meus olhos se arregalam diante de sua


indiferença. Ele está em menor número, e todos os guardas estão focados em
nós, prontos para tirar suas armas também. — Todo mundo acha que você
já permitiu, — continua Enzo, dizendo ao meu pai para verificar o telefone.

— Você... — ele parece chocado com o que vê no telefone e só consegue


balançar a cabeça. — Você planejou isso, não foi? Por quê? — Estou confusa
com a troca entre os dois, mas fico ainda mais surpresa quando meu pai
aceita relutantemente a afirmação de Enzo.
— Mario, chame o padre! — Ele grita para o guarda. — Temos um
casamento para comemorar, — acrescenta ele, nem um pouco feliz.

— Veja, eu te disse. — Enzo abaixa a cabeça para sussurrar no meu


ouvido enquanto somos guiados em direção à sala de estar.

— Essa é a sua solução? Casar comigo? — Gritei entre os dentes, a


enormidade da situação me ocorreu. Mas por que ele iria querer se casar
comigo? Então eu pergunto a ele exatamente isso. — Por quê?

— Estou pagando uma dívida. Você salvou minha vida e agora eu salvo
a sua. — O seu rosto é inexpressivo e eu percebo que ele não se importava
em se casar comigo.

Atordoada, tento manter a cabeça no jogo. Todo mundo está


extremamente tenso quando entramos em casa, e meus pais não escondem
seu desdém por mim.

— Allegra, vá para Cecilia para ajudá-la a se vestir. Se estamos fazendo


isso, estamos fazendo certo. Você não está nos envergonhando de novo. —
Eu aceno e saio da sala, sem me preocupar em olhar para Enzo. Pelo menos
posso confirmar que Lia está bem.

Mas ela não está. Na verdade, não.

Quando chego ao patamar da escada, vejo as contusões roxas no rosto e


estico meu pescoço, nos limites de suas roupas.
Oh, Lia!

— Senhorita! — Ela vem correndo em minha direção, me abraçando no


peito.

— Sinto muito, Lia. É tudo culpa minha. — As lágrimas estão


finalmente derramando em minhas bochechas. Isso é por minha conta. Eu
sabia que não havia como meus pais a deixarem... Que ela ainda está viva é
uma pequena misericórdia.

— Shh, nada disso. Eu ouvi as notícias. Estou tão feliz por você, minha
filha. Você não terá que se casar com aquele homem bruto.

— Mas Chiara... — Eu deixo escapar, preocupada com minha irmã.


Podemos não ter o melhor relacionamento, mas ela ainda é da família.

— Ela vai conseguir. Ela conseguiu que toda a sua vida fosse a que
estava no topo. — Lia levanta uma sobrancelha para mim, esperando que
eu a contradiga e sabendo que não posso.

Chiara sempre foi a favorita dos meus pais. Foi-me dito inúmeras vezes
que quase matei minha mãe ao nascer e que, em sua mente supersticiosa,
significava que eu era azar.

— Eu deveria ter abortado no momento em que soube que estava


carregando você também. — Minha mãe cuspiu em mim inúmeras vezes.
Por alguma reviravolta do destino, pouco depois do meu nascimento, ela foi
diagnosticada com câncer de mama e passou por uma mastectomia dupla.
Até hoje, ela persiste que a única razão pela qual ela ficou doente foi porque
eu fiz algo com o corpo dela quando nasci. Não sou médica, mas duvido que
os dois estejam conectados. Ainda assim, isso significava que eu tinha sido
a receptora de tais farpas a vida toda.

Minha irmã? Ela era a criança perfeita. Ela era a irmã magra,
obediente e bonita. Ela era tudo o que eu não era e por causa disso, foi ela
quem eles levaram a todos os lugares com eles. A única digna de exibição
pública.

Não posso dizer que meu relacionamento com Chiara sofreu por causa
disso, já que nunca foi ótimo para começar. Mesmo quando criança, ela era
maliciosa e invejosa. Ela sempre encontrava maneiras de se tornar vítima,
e eu acabava sendo a vilã. O número de espancamentos que tomei pelas
acusações mentirosas de Chiara quase destruiu todo o amor fraterno que eu
tinha por ela. Mas isso não significava que eu queria que ela sofresse.

— Melhor ela do que você. — Lia sussurra no meu ouvido enquanto me


leva para o meu quarto. — Você foi punida a vida inteira por pecados que
não eram seus. E não faça de Chiara a vítima, já que sua língua venenosa a
prejudicou mais vezes do que não. Eu nem sei como você está relacionada
com essas pessoas. — Ela balança a cabeça, a voz ainda baixa.

Às vezes, eu também não sei.

Lia vai ao meu armário e tira um vestido branco simples.


— Não é nada de especial, já que Chiara teve que usar seu vestido de
noiva. Mas você ficará linda nele. — O sorriso genuíno em seu rosto me
permite saber que ela não está mentindo apenas para me fazer sentir
melhor.

— Obrigada. — Minha voz está cheia de emoção. Tiro minhas roupas e


Lia fica horrorizada quando vê meu ferimento. Balanço a cabeça para ela,
agora não é hora de entrar em detalhes.

Coloco o vestido e deixo Lia arrumar meu cabelo. Assim que ela está
prendendo o último fio na minha cabeça, minha mãe entra pela porta.

— Você deve estar orgulhosa de si mesmo. — Ela zomba de mim,


fechando a porta atrás dela. — Mas você escolheu o homem errado, minha
querida. — Ela dá uma risada falsa, hostilidade cobrindo suas palavras. —
Eu não sei como você o envolveu nisso, mas não se engane, ele está apenas
te usando. Você será a esposa camponesa feia e despretensiosa que cria seus
filhos em casa enquanto ele se diverte com suas prostitutas.

Meus olhos se arregalam com as palavras dela, mas ela continua.

— Quando você ver sua série de amantes, cada uma mais bonita, mais
jovem, — ela me olha de cima a baixo, — mais magra que você, você morrerá
um pouco por dentro. — Mãe sorri, cruzando os braços na frente dela. — E
eu vou ter uma cadeira na frente do espetáculo que será sua infelicidade.

— Eu não ligo. — Eu empurro meu queixo para cima, tentando mostrar


um pouco de força, mesmo que suas palavras tenham atingido sua marca.
— Você pode não se importar agora, mas vamos ver. Lembre-se das
minhas palavras. Você pensou em sabotar sua irmã e você pagará. E não há
nada pior do que a esperança que se transforma em desespero. — Ela não
espera minha resposta quando sai do quarto.

— Não ligue para ela, senhorita. — Lia tenta me confortar.

Enquanto às vezes eu entretinha meu lado idealista, sou, acima de


tudo, uma realista. E embora eu saiba que ela disse tudo isso para me
machucar, não sou ignorante. Eu sei que ele terá amantes. Eu sei que eu
não importo para ele.

Só espero que ele não importe para mim também.

Com um último olhar no espelho, decido que não deixarei minha mãe
vencer. Se eu tiver que fechar meu coração para tudo, que assim seja.

Mas não vou dar a ela a satisfação de me ver sofrer.

Eu serei feliz. Mesmo que isso me mate por dentro.

Quando terminamos, descemos as escadas e eu tomo meu lugar ao lado


de Enzo. Ele ainda não olhou para mim, sua atenção se concentrou
totalmente em meu pai e no que eles estão discutindo.

Mas fico surpresa quando sinto a sua mão em cima da minha, movendo-
a para entrelaçar nossos dedos. Aceito o toque, tentando tirar da cabeça a
conversa com minha mãe.
Quando o padre chega, somos levados ao pátio onde os moradores estão
rindo e cantando, comemorando o casamento. Há comida e bebida para
todos.

— É isso... — Eu pergunto, impressionada com a exibição.

— Eu tive que forçar a mão do seu pai de alguma forma. Um anúncio


público foi o melhor caminho, pois ele valoriza demais sua imagem. — Enzo
responde, me puxando para mais perto dele e me levando ao padre.

A cerimônia religiosa é curta e no momento em que dizemos Eu aceito


a música começa a explodir da rua, os moradores gritando parabéns para
nós.

— Venha. — Enzo me leva a uma carruagem aberta, me ajudando. —


Precisamos dar um show a eles.

Os cavalos relincham e Enzo toma as rédeas, levando-as para a frente.


Começamos com um trote lento e, quando descemos a rua, todos estão do
lado de fora de casa, aplaudindo e gritando palavras de parabéns, saúde e
amor.

— Quando você conseguiu isso? — Estou admirada. Isso não é algo que
é planejado espontaneamente.

— Eu posso ter sussurrado no ouvido das fofoqueiras da vila há um


tempo atrás. Não demorou muito para que todos seguissem. Afinal, há
comida e vinho gratuitos. — Ele pisca para mim e eu não sei se devo ficar
escandalizada ou impressionada.

Depois de dar uma volta pela vila, estamos de volta à casa. Meus pais
estão se esforçando ao máximo para entreter os convidados com sorrisos
falsos, fingindo que sabiam sobre esse casamento secundário o tempo todo.
Eles só queriam se casar a mais velha antes de prosseguir com a mais nova,
ou assim diz a desculpa deles.

Passamos algum tempo com os convidados, quando de repente estamos


sendo apressados e trancados dentro de uma sala.

— O que... — Olho em volta para o quarto estéril, uma cama de solteiro


com roupa de cama branca no centro.

— Presumo que eles esperem que consumamos o casamento. — Enzo


diz devagar, levantando uma sobrancelha para mim.

— Sim, não, — levantei minha mão, — isso não está acontecendo,


Senhor. — Tiro os sapatos, jogando-os no chão e deito na cama, confusa.

A coisa toda tinha sido um caso de turbilhão que eu nem tinha tempo
para lidar com o que está acontecendo.

Eu sou casada. Com ele.

Eu olho para ele do canto do meu olho. Ele está apoiado de costas contra
a porta, me observando atentamente.
— Por que você fez isso? — Eu me levanto nos cotovelos.

— Eu te disse. Não gosto de ser grato a ninguém. Este casamento


garantirá sua segurança.

— Nada mais? — Eu pergunto, cética. No tempo em que conheci Enzo,


que embora não seja muito, percebi que ele não faz nada sem um motivo
oculto.

— O quê mais? Você levou uma bala por mim, fiz um voto por você. —
Ele tira o terno, descartando-o no chão antes de se juntar a mim na cama.

Eu mexo para me afastar dele, mas ele me coloca no local.

— Onde você está correndo? Temos uma noite de núpcias para


consumar cara. — A sua voz mantém seu charme habitual, e eu reviro os
olhos para ele.

— Você não quer isso mais do que eu, então vamos largar a farsa.

— E você sabe o que eu quero, como? — Levantando uma sobrancelha


para mim, ele pega um fio de cabelo perdido, puxando até que ele
desmorone, meu cabelo fluindo livremente pelas minhas costas.

Eu me viro totalmente em direção a ele.

— Você pode ser um demônio bonito, Enzo Agosti, mas não me engana.
— Eu digo, olhando nos seus olhos. Suas pupilas dilatam, seus olhos
incomumente claros ficam mais escuros. — Eu posso ver o vazio dentro de
você. Você coloca uma máscara e mantém todos à distância. Você flerta, joga
e ultrapassa os limites, mas é tudo para mostrar.

— E de repente você é uma especialista em mim? — Toda diversão se


foi da sua voz, e acho que vislumbrei o verdadeiro Enzo.

— Não. Eu não sou. Mas sou especialista em mim. — Eu me inclino


para ele, nossos rostos se afastam. Estou apenas jogando o seu jogo, e pela
primeira vez é bom ser a única no controle. — E eu estou tão vazia quanto
você. É por isso que sei que nunca podemos ser. Dois vazios não fazem um
todo.

— Não, — sua boca se levanta um pouco, — eles fazem um abismo. O


que você diz, little tigress? Que tal deixarmos ir? Sucumbir a uma queda
livre? — A mão dele ainda está brincando com meu cabelo, seus olhos não
estão mais em mim.

— Não. — Eu balanço minha cabeça levemente. — Cair é perder. E não


pretendo perder. Nunca mais. — Pela primeira vez, vou provar que meus
pais estão errados. Eu farei o melhor dessas circunstâncias... De alguma
forma.

— Então estamos de acordo. — Ele ri, seus traços relaxando, e eu


percebo que ele não tinha intenção de consumar o casamento.

Ele não vê você como uma mulher.


Uma voz minúscula dentro de mim simplesmente não cala a boca. Eu
tento silenciar, porque isso só pode significar que eu estou decepcionada que
não me acha atraente. E esse certamente não é o caso.

Ele vira as costas, olhando para o teto.

— Podemos ser parceiros.

— Parceiros? — Eu ecoo suas palavras, a noção inteiramente estranha.

— Podemos não ser capazes de preencher o vazio um no outro. Mas


podemos garantir que não fique maior.

Eu me inclino para o travesseiro, olhando para o mesmo teto que ele


parece achar tão interessante.

— Ok. — Concordo.

Eu vou ficar bem.

Enquanto minha felicidade não depender dele, nunca precisarei me


preocupar com as palavras de minha mãe.

E pela primeira vez, talvez eu esteja livre.


PARTE II

Ele era tão inebriantemente bonito, mas tão pecaminosamente


perverso. Lamento o dia em que confiei nele com o meu destino.

-Do diário de Allegra


CAPÍTULO OITO

Olhando da janela do avião, mal posso acreditar que estou prestes a


atravessar um oceano e seguir para uma cidade sobre a qual só li.

Depois da noite de núpcias, não tínhamos ficado. Enzo havia


apresentado lençóis manchados de sangue falso, e nos tornamos evasivos
entre os gritos de parabéns e outras palavras obscenas da multidão. Eu nem
tinha falado com meus pais, mas Enzo me garantiu que tinha conversado
com eles e não seriam mais um problema.

Mas conhecendo meus pais... não é exatamente tranquilizador.

Durmo algumas horas antes de ser acordada por Enzo, que me avisa
que chegamos. Passamos pela imigração e logo saímos dos portões e em
direção a um SUV preto esperando por nós.
É quase noite quando estacionamos em frente a uma mansão grande e
opulenta. Enzo me guia para dentro, mas não posso deixar de olhar com
admiração a arquitetura — é como viver na arte.

— Feche a boca, little tigress. O pior apenas começou. — Enzo comenta


quando ele abre a porta de entrada, me levando pelas portas duplas e em
um enorme hall de entrada de mármore. É diferente de tudo que eu já vi.
Até o palazzo em Gozo dele empalidece em comparação. Cada canto da casa
é intrincadamente construído de uma maneira que lembra a arte barroca.
As estátuas douradas, bem como a escada, confirmam meus pensamentos
de que a casa está decorada em estilo barroco.

— Ana, por favor, ligue para meus pais. — A voz de Enzo me assusta e
eu tento me nivelar.

Sentamos no meio do corredor até que um casal de meia idade desça as


escadas. Coloco um sorriso no rosto, esperando causar uma boa impressão.

— Enzo, qual é o significado disso? — A voz culta de uma mulher


pergunta quando chega ao patamar. Ela está vestida com um vestido creme
que parece muito luxuoso para ser usado em casa. Uma mão segura um copo
de bebida enquanto a outra está entrelaçada com o cavalheiro mais velho,
que acho que é o pai de Enzo.

O olhar do casal está fixo na minha pequena bagagem, e os dois fazem


uma careta. Os dois levantam lentamente os olhos para me olhar, seu
escrutínio um pouco perturbador.
— Mãe, pai. Conheça minha nova esposa, Allegra Marchesi. — Enzo é
rápido em fazer as apresentações.

— Prazer em conhecê-los, — tento o meu melhor para responder em


inglês, pois esse parece ser o idioma preferido deles. Mas como nunca falei
o idioma em voz alta, meu sotaque é simplesmente horrível.

Por uma boa medida, amplio meu sorriso, esperando que gostem de
mim.

— Ela? — A mãe de Enzo pergunta com descrença, seu tom curto. Ela
balança o olhar de volta para mim e, por um minuto, não fala enquanto olha
para mim de perto. Então ela simplesmente explode na gargalhada. — Ela?
— Ela repete, rindo. Até o pai de Enzo se junta, rindo.

— Isso deveria ser uma piada, filho?

Eu me viro para Enzo, e mesmo que seu rosto não mostre, ele não está
feliz. Seus punhos estão cerrados e ele força suas palavras.

— Não. Não é uma piada, pai. Allegra é minha esposa oficial. Nós
casamos ontem em Milena.

Seus pais pararam de rir, aparentemente entendendo que não é uma


piada. Mas a expressão em que se estabelecem não me aquece. Não, eles me
olham como se eu fosse a coisa mais desprezível do mundo.
— Você casado. Com ela? — A mãe dele pergunta novamente, um olhar
de choque no rosto. — Bom Deus! — Ela exclama antes de virar as costas e
sair em direção à cozinha.

— Rocco. — O pai de Enzo se apresenta com um aceno de cabeça,


movendo Enzo em direção a outra área da casa.

— Ana, leve Allegra para o meu quarto. — Enzo diz antes de sair com
o pai.

Ana me leva pelas escadas para um quarto grande no primeiro andar.


Ela deixa meus poucos pertences no chão antes de sair.

Olho para o quarto, tão desconhecido, e não consigo abandonar esse


sentimento de desconforto. Não esperava que seus pais me recebessem de
braços abertos, mas também não esperava esse tipo de reação.

Antes de perder a coragem, abro a porta e desço as escadas, virando-me


para a direita, onde vi Rocco e Enzo irem. Quando estou em um corredor
estreito, sigo o som das vozes, até estar na frente de uma porta entreaberta.
O espaço é grande o suficiente para me permitir bisbilhotar, mas pequeno o
suficiente para que eles não possam me ver.

Em qualquer outra circunstância, eu poderia ter me sentido culpada


por espionar, mas esta é a minha vida, e preciso saber exatamente com o
que estou lidando. Especialmente porque Enzo tem sido extremamente
rígido em relação aos pais.
Um barulho alto parecido com um tapa me chama a atenção. Dou um
passo à frente e vejo a cabeça de Enzo virada para o lado. Meus olhos se
arregalam e trago minha mão para a minha boca.

— Você entende o que fez? — Rocco grita com ele, andando pela sala.
— Eu deveria assinar o contrato de casamento amanhã. E você foi se casar
com uma vagabunda da vila sem a minha aprovação. Você percebe o que
fez? Você arruinou nossas chances...

— Pai, — começa Enzo, interrompendo-o, — Allegra não é uma


vagabunda da vila. Ela é uma Marchesi, e você deve respeitar isso.

Rocco zomba, quase rindo. — Respeitar um Marchesi? Você está louco,


filho? Muito sol atrapalhou seu cérebro? Como diabos você acabou
acorrentado com aquela garota? Você fodeu ela? Pelo amor de Deus, poderia
ter pago para ela fazer um aborto, não precisava se casar!

Eu quase ofeguei com a maneira como ele está falando de mim, mas me
vejo sob controle.

Eles não podem saber que estou aqui!

— Não, ela não está grávida.

— Então por que...

Mais uma vez, Enzo não deixa Rocco terminar enquanto continua.
— Fui atacado no caminho para uma entrega. Três vezes. — Ele começa
a descrever seus encontros com aquelas pessoas perigosas, e um sorriso
ameaça me sobrecarregar. Ele vai contar como eu o salvei. Talvez então eles
vejam que eu não sou tão ruim assim.

— Você sabe por que eles queriam me matar? — Enzo faz uma pausa
para um efeito dramático. — Por causa de sua ligação com Guerra. E quem
gostaria de garantir que Guerra permaneça isolado?

— DeVille. — Rocco tosse, quase relutantemente concordando.

— De fato. Parece que eles não estão acima de matar um futuro capo
para garantir que os Guerra não tenham conexões. Você não vê o que teria
acontecido se eu me casasse com Gianna? Eu teria que dormir de olho aberto
em DeVille e seus capangas. E eles nunca teriam parado até nos separarem
dos Guerra novamente. Agora me diga, você ainda me faria continuar com
o contrato?

A voz de Enzo não traiu nenhuma emoção até agora. Ele está usando a
lógica para fazer seu pai ver a razão, mas mesmo que eu admire seus
métodos, não posso deixar de me sentir enganada.

Ele nunca me contou nada disso.

Ele fez parecer que estava se casando comigo para pagar uma dívida,
quando, na verdade, estava fazendo tudo para se beneficiar.
— E a única maneira de você sair desse acordo é que eu me case
imediatamente. Você pode facilmente dizer que não sabia. Que fiz isso pelas
suas costas. Não sei, invente algo. Mas, como vê, resolvi dois problemas. Eu
me livrei do alvo DeVille de nossas costas e me casei. Realmente importa
que não seja Gianna?

— Filho, eu entendo por que você fez o que fez. — Rocco diz
eventualmente. — Mas, na verdade, você não poderia ter escolhido alguém
menos... hedionda?

Eu ofego, mas antes que eu possa ouvir a resposta de Enzo, uma mão
trava no meu cabelo, me arrastando para trás. Eu tropeço, caindo no chão,
apenas para ver a mãe de Enzo olhando para mim com assassinato nos
olhos. Eu grito de dor, mas ela não para enquanto continua me arrastando
pelos meus cabelos.

— Pare, dói! — Eu saí, tentando tirar a mão dela do meu cabelo.

— É por isso que você veio aqui? Para nos espionar? Vaca do caralho!

Sinto uma dor ofuscante no couro cabeludo enquanto ela continua


puxando meus cabelos e lágrimas ameaçam derramar dos meus olhos.

— Não, eu apenas...

— Puta merda! Não sei como você conseguiu se agarrar ao meu filho,
mas não vai conseguir. Como ele poderia trocar alguém angelical como
Gianna por alguém como você? — Ela me joga para a frente, o chão brilhante
me fazendo deslizar até que eu esteja de barriga. Eu gemo de dor, mas ela
não para.

Ela se ajoelha na minha frente e me leva pela nuca, ela me obriga a


olhar para ela.

— Meu filho perfeito nunca se rebaixaria tanto para estar com alguém
como você. — Ela cospe a palavra alguém, como se eu fosse a desgraçada na
terra.

— Deixe-me ir, por favor. — Eu tento argumentar com ela, mas há algo
nos seus olhos que me faz duvidar que ela vai me libertar.

— Diga-me, você deslizou no pau dele apenas para engravidar? É isso?

Ela nem me deixa responder enquanto se levanta, vindo para o meu


lado e me chutando com força no estômago. Eu ofego, e há um momento em
que sinto que não consigo mais respirar, a força do seu pé contra o meu torso
me fazendo morder minha língua com dor.

— Eu vou te ensinar a grávida, sua puta. — A ponta do sapato me pega


bem entre minhas costelas, e a dor é quase demais.

— Não. Grávida. — Eu mal consigo entender as palavras, zunindo por


ter o ar arrancado de mim repetidamente.

Isso parece fazê-la parar e, do nada, ela se ajoelha na minha frente,


acariciando meu cabelo e murmurando palavras suaves.
— O que aconteceu? — A voz de Enzo cresce por trás.

— Coitadinha, ela tropeçou e caiu. Aqui, deixe-me ajudá-la. — Ela


agarra meus braços, me segurando. O tempo todo, só posso olhar em choque
para o ato que está fazendo.

— Não, deixe-me. — Enzo diz, empurrando sua mãe para o lado e me


levando em seus braços.

— Cuide dela, sim, Enzo? Vou pedir para Ana trazer um chá para ela.
— A sua mãe continua a falar e, enquanto Enzo me carrega pelas escadas,
eu posso vê-la sorrir para mim.

Meu Deus, no que eu me meti?

Enzo chuta a porta do quarto e me deposita na cama.

— Você está bem? Onde você está machucada? — Ele pergunta, e talvez
se eu não tivesse ouvido o que ouvi, ou se a mãe dele não tivesse ficado toda
psicopata comigo, eu poderia ter achado isso doce.

— Eu não preciso da sua pena! Podemos voltar a nos odiar? — Eu digo,


ressentimento arranhando meu interior. Ele jogou comigo. Tudo para salvar
sua própria pele.

E o que eu ganho? Nada. Nenhuma família para quem recorrer — não


que eu já tenha uma — e ninguém para se apoiar.
Uma raiva repentina explode no meu peito e, quando olho para o seu
rosto, fico mais frustrada.

— É tudo culpa sua! — Eu solto, meus punhos cerrados batendo no peito


dele. As lágrimas estão finalmente fluindo. Por tudo que tentei manter
minha bravata quando sua mãe tentou me fazer abortar uma criança
inexistente, tudo se espalhou.

— Por que eu? Por que você teve que me envolver em seus malditos
problemas? Por quê? O que eu fiz para você? — Eu lamento enquanto
continuo batendo nele. Meus gritos logo se transformam em soluços, mas
não diminuo a velocidade, e ele não me para.

Não, apenas fica lá, pegando tudo, mas sua inanição está apenas
estimulando a minha.

— Por quê? — Grito com ele, segurando as lapelas da camisa e


sacudindo-o. — Por que você teve que me arruinar? — Desgastada,
finalmente paro, minhas palmas se espalhando por seu peito, meus soluços
um eco implacável.

— Shh, little tigress, shh. — A mão dele vem em volta da minha cintura
e me puxa para o peito. — Eu entendo que é tudo muito estranho. Mas dê
um tempo. Você vai se acostumar com tudo. — Seus dedos acariciam
gentilmente meu cabelo, e me lembro do que sua mãe tentou fazer.

— Por que eu? — Eu pergunto novamente, minha voz rouca de gritar.


Por que ele teve que mexer com a minha vida?
— Eu não sei o que você pensa que ouviu, little tigress, mas deixe-me
esclarecer uma coisa. — Ele agarra meu queixo, forçando-me a olhar nos
seus olhos. — Você é minha. Você carregará meu nome, viverá em minha
casa e dará à luz meus filhos. Não há saída. Você parou de ter uma escolha
no momento em que se colocou na frente daquela bala por mim. — Ele diz,
seu tom sério.

— Eu não entendo... — Eu sussurro, limpando minhas lágrimas com os


olhos voltados para ele. — Deveria ter deixado você morrer? — Eu pergunto,
perplexa.

— Você deveria. Pelo menos então você teria uma escolha. Agora... —
Um sorriso cruel aparece em seu rosto.

— Você disse que seríamos parceiros, ou isso também era mentira? —


Muitas coisas estão subitamente ficando claras, e eu me encontro em uma
situação pior do que antes, se isso for possível.

— É bom se você continuar acreditando nisso. Mas não se engane, não


há como voltar atrás, — a mão dele se move mais baixo em uma carícia
suave, — você é minha. Até a morte nos separar.

— Então é isso... você está apenas me usando. — Eu digo, inexpressiva.


Por que eu não vi isso antes? Estava me encarando bem na cara. — Eu sou
apenas um brinquedo para você fazer o que quiser.

— Querida, — ele começa, sua voz é uma melodia distorcida que puxa
meu coração, apertando-o dolorosamente, — se eu estivesse usando você, eu
já teria te fodido e te descartado... usado como uma prostituta comum, não?
— Cada palavra que ele pronuncia me surpreende ainda mais... Como é o
mesmo homem que cuidou de mim quando eu estava doente?

Mas ele precisava de mim então, não precisava? Agora ele não precisa
mais. Ele pode me mostrar quem ele realmente é.

— Por que não? Eu acho que isso completaria a humilhação; você não
diria? Continue, termine o que você começou. — Eu me levanto e começo a
rasgar minhas roupas até ficar nua na frente dele. — Vamos! Faça! Não é
isso que vocês fazem? Você pega e toma até que não resta mais nada. Venha,
me leve e me faça te odiar ainda mais do que eu já odeio. — Eu grito, minha
voz saindo com guinchos dolorosos.

Uma mão se envolve em volta da minha garganta e eu sou empurrada


na cama, minhas costas batendo nos lençóis limpos.

— É isso que você quer? Você quer que eu te leve como uma puta? — A
voz dele racha, a primeira emoção real que eu vi dele o dia todo.

Seu corpo em cima do meu, ele começa a desfazer as calças.

É isso... É aqui que eu me perco.

Viro a cabeça para o lado, sem querer vê-lo, sem querer sentir nada.
Minhas lágrimas caem no meu rosto, manchando o lençol. E eu apenas
fiquei lá, aguardando a dor... a humilhação... a sensação de ser usada e
descartada.
Mas isso não vem. Tão rápido quanto foi, ele está fora de mim e sai pela
porta, batendo atrás dele.

Só posso virar do meu lado e me enrolar em uma posição fetal,


finalmente deixando ir. Meu corpo inteiro está doendo, mas há um lugar que
ofusca essa dor, meu peito.

Por que me deixei acreditar nele? Porque devo ter, em algum momento,
se estou me machucando tanto. Mas a dor também traz consigo um novo
tipo de lucidez. Olho para o seu comportamento, do jeito que ele me tratou
no palazzo e como garantiu que eu não chegasse ao meu casamento.

Ele planejou tudo desde o começo.

No final, ainda sou um peão. Acabei de mudar de mestre.

Enzo não volta para o quarto, e eu nem quero pensar onde passou a
noite. É melhor se eu o evitar.

Na manhã seguinte, disseram-me que minha sogra está esperando que


eu tome café da manhã. Um pouco assustada, mas principalmente
determinada a não a deixar andar por cima de mim, vou para a sala de
jantar.
Lucia Agosti está sentada em uma das extremidades da mesa, com uma
xícara de café na mão. Quando ela me ouve entrar, levanta os olhos e um
sorriso malicioso puro se espalha por todo o rosto. Há alguns empregados na
sala e, devido à presença deles, essa malevolência parece estar contida em
uma saudação forçada e em uma risada falsa, enquanto ela me pergunta
como eu dormi.

Sento-me longe dela e tento manter a calma.

— Bem, — começo e, olhando para cima, a vejo olhando ansiosamente


para mim. — Eu não sabia que Enzo seria assim... — Eu paro quando vejo
os seus olhos se estreitarem para mim, — exigente. Não na casa dos pais
dele.

Trago o copo de suco de laranja para os lábios, observando debaixo dos


cílios enquanto as mãos dela se apertam de raiva. Acho que isso a atingiu
exatamente onde eu queria.

Se ela estivesse tão preocupada com a gravidez antes, ela deveria


continuar a se questionar, pensando que eu poderia engravidar a qualquer
momento. Não sei qual é o seu problema, além do fato de que ela claramente
favoreceu Gianna Guerra como nora, mas isso não significa que vou deixá-
la me aterrorizar.

Seus olhos me prendem com a intensidade de seu ódio, e ela abre a boca,
prestes a dizer alguma coisa, quando um empregado traz outro prato.
Eu a ignoro enchendo meu prato com comida e continuo comendo em
silêncio.

Quando estou prestes a me ajudar em uma segunda porção, Lucia fala.

— Ana, por favor, pegue o prato de Allegra. Eu acho que ela já teve o
suficiente por hoje. — Olho com admiração quando a mulher tira meu prato,
uma pequena carranca no rosto enquanto vê minha expressão. Mas Lucia
está muito feliz em me ver se contorcer, então eu rapidamente educo minhas
feições.

— Sim, obrigada Ana. Eu devo ter sido voraz depois de todo esse
exercício ontem à noite. — Eu digo, e o sorriso triunfante de Lucia se
transforma em raiva. Tanto que ela se levanta da cadeira e se coloca na
minha frente.

— Eu não sei onde Enzo encontrou você, ou como pode até olhar para
você, — ela coça o nariz com nojo enquanto me olha de cima a baixo. Eu
encontro o seu olhar em silêncio, esperando pelos outros insultos que ela
provavelmente escondeu.

— Mas você não me engana. Você é apenas uma putinha gananciosa


tentando tirar vantagem do meu filho. Não é a primeira ou a última que
tentou tirá-lo de mim e não terá sucesso. Marque minhas palavras: — ela
abaixa a cabeça em minha direção, — sua putinha, você não sobreviverá por
muito tempo nesta casa.

— Isso é uma ameaça, Signora Agosti?


E eu pensei que meus pais eram horríveis. O que há de errado com essa
mulher?

— Não, — ela sorri, cruzando os braços em frente ao peito e olhando


para mim como se eu estivesse abaixo dela, — é uma promessa.

Ela se move para sair, mas não posso deixá-la ter a última palavra.
Então eu digo a única coisa em que consigo pensar.

— Você com certeza se importa muito com seu filho, Signora Agosti. Eu
me pergunto se você não está apenas com ciúmes de mim... — Eu me afasto
sugestivamente, e sua expressão chocada me diz que eu bati na marca. Ela
é rápida enquanto se move na minha frente, com o braço levantado, o tapa
pronto para vir.

Mas eu também estou preparada.

Eu pego o seu pulso, meus dedos enrolando-o em um aperto doloroso.

— Acho que você escolheu o alvo errado para o seu abuso, Signora
Agosti. Não vou ficar quieta nem tolerar esse tipo de comportamento.

— E o que você pode fazer? Me dedurar? — Ela ri, lentamente tentando


tirar a mão do meu aperto.

— Não. Eu não poderia me importar menos com o que seu filho pensa.
Mas também posso me defender, e se você começar uma guerra, não venha
chorar quando for demais. — Eu a empurro para o lado e volto para o meu
quarto.

Estou suando, o preço mental do confronto me fazendo ofegar por ar.

Inferno! Eu estou no inferno.

Respiro fundo e vou para minha mala. Tirando alguns dos meus
pertences, encontro meu diário abrigado no fundo. Há um certo tipo de
catarse em estabelecer seus pensamentos e medos mais íntimos. E meu
diário é meu confidente mais confiável que está comigo há anos.

Começo a anotar meus pensamentos, mas também planos de ataque.


Porque Lucia está errada se acha que pode me intimidar.

Eu posso estar em uma terra estrangeira e entre pessoas estranhas.


Mas não vou desistir.

Passaram dias, ambos cheios de comentários hostis e uma tensão


espessa ao redor da casa. Nem Rocco nem Enzo estão por perto, então Lucia
continua me ofendendo abertamente todas as chances que tem.

Na maioria das vezes, tento ficar no meu quarto para evitar qualquer
confronto, mas quanto mais tempo passa, mais percebo que não posso me
esconder para sempre. Nem posso existir dentro de quatro paredes sem
nada para fazer.

Ao decidir meu próximo curso de ação, sou notificada por um membro


da equipe de que haverá um banquete hoje à noite. Para anunciar
oficialmente o casamento e salvar a cara na frente das outras famílias e
convidados importantes, Rocco decidiu fazer uma festa completa para
apresentar o casamento de Enzo com a pobre garota Marchesi como um
sucesso, uma decisão intencional e nenhuma confirmada por necessidade.

Minha presença é obrigatória, não há mais nada a ser feito senão


aguardar mais uma humilhação. Já posso ouvir os ecos do riso e os olhares
de pena — não é tudo o que já recebi até agora?

Em algum momento da tarde, Ana aparece, me trazendo um vestido


para a noite.

— Signor Enzo me instruiu a lhe dar isso.

Pego a caixa das suas mãos e a coloco na cama. Dentro há um vestido


vermelho brilhante que brilha na luz.

Minha boca se abre em choque quando olho para o vestido mais bonito
que já tive. Não perco tempo em tirar minhas roupas para experimentá-lo,
indo ao espelho e absorvendo a bela cor e corte. É simplesmente elegante.

A área de decote está um pouco exposta demais para o meu gosto, mas
o vestido se molda ao meu corpo, dando-lhe alguma forma.
Eu pareço uma mulher.

Estou impressionada com essa transformação simples. O vestido tem


comprimento que vai até o meio da coxa e, embora eu nunca tenha usado
nada tão curto antes, sei que é moda nas grandes cidades.

Há um par de sapatos também, mas eles são um pouco grandes demais.

Não querendo parecer ingrata ou chorona, vou ao banheiro e procuro


um pouco de gaze para grudar na frente dos sapatos, para que eles não
escapem dos meus pés.

Talvez porque eu esteja me sentindo mais bonita do que nunca, mas de


repente estou tonta e mal posso esperar que Enzo me veja nisso. Afinal, é o
presente dele.

Mais algumas horas se passam, e eu começo a ver carros entrando na


entrada da janela do quarto.

Estou um pouco incerta, porque mais e mais pessoas estão entrando,


mas ninguém me disse para descer ainda.

Quando finalmente estou no fim da minha paciência, Ana aparece mais


uma vez e me convida para o andar de baixo.

Vou andar em linha reta, os sapatos incrivelmente desconfortáveis,


mesmo com o material recheado. Chegamos ao pé da escada e ela me indica
a direção ao salão de baile.
Um pouco decepcionada por Enzo não ter vindo me buscar, eu empurro
meu queixo para cima e entro.

Leva menos de um segundo para perceber que todo mundo está olhando
para mim — e porquê. Todas as mulheres e meninas estão usando vestidos
na altura do tornozelo em tons suaves, com algumas convenções ousadas
para usar preto. Ninguém está mostrando nenhum tipo de pele.

Eu olho nos olhos de Enzo do outro lado da sala e ele está me olhando.
Apenas alguns passos e ele está na minha frente, me levando pelo braço.

— Que porra você está vestindo? Você ficou louca? — Ele ruge no meu
ouvido, sua voz apenas para os meus ouvidos.

— Mas... — Estou prestes a dizer a ele que a culpa é sua, que foi ele
quem me deu o vestido. Mas quando meus olhos se movem pela sala, eu me
deparo com o sorriso satisfeito de Lucia e percebo que fui um alvo de piada.

Toda a humilhação que imaginei já está acontecendo, e Lucia está se


gabando à margem.

Eu deveria ter questionado o pacote.

Eu estava tão encantada com o vestido — o meu primeiro do tipo — que


não parei por um segundo para pensar que poderia ser uma armadilha.

E agora, como todo mundo me olha acusadoramente, tento não bater


meus ombros na derrota, nem abaixar minha cabeça com vergonha.
— Eu gosto do vestido. — Eu digo a Enzo com confiança. Se não posso
escapar do escrutínio deles, posso usar minha vergonha com orgulho. — É
uma cor bonita.

— Isso também faz você parecer uma vagabunda. Deus, Allegra, onde
diabos você conseguiu isso? — Suas palavras estão cortadas, seus olhos
focados no meu decote. — Vá mudar. Não quero que você ande assim. —
Seus dedos apertam meus braços, mas eu o empurro, lançando um sorriso
inexistente no meu rosto.

— Eu já estou usando. E nem todo mundo parece não gostar. — Eu


levanto uma sobrancelha para ele, acenando para os homens olhando para
o meu corpo de maneira apreciativa.

— Sim, mas apenas porque eles estão se perguntando como seria fácil
fazer você abrir as pernas. — Seus punhos estão cerrados ao seu lado, mas
eu o ignoro, caminhando ainda mais para a multidão e me plantando na
frente da minha sogra.

— Obrigada pelo vestido, Lucia. Eu realmente me sinto como a


convidada de honra hoje. — Eu digo docemente, e por um segundo a máscara
dela cai.

— Como assim, Allegra, — ela começa a rir, e as mulheres ao lado dela


estão todas olhando curiosamente.
— Ela deve ter dito para vocês se vestirem de pastel, certo? Ela não
queria roubar meu brilho. Eu sou, afinal, a noiva. — Eu dou a todos um
sorriso deslumbrante antes de me desculpar e voltar para encontrar Enzo.

Mesmo tendo conseguido ter a última palavra nesse confronto em


particular, a noite está longe de terminar.

Ao passar por um grupo de garotas da minha idade, não posso deixar


de ouvir a conversa delas.

— Tão cafona. Eu me pergunto de onde ela conseguiu isso, da Goodwill?

— Talvez da última temporada, — comenta outra e todas riem.

Respirando fundo, decido que não vale meu tempo nem esforço. Estou
quase de volta às portas duplas quando vejo Enzo. Ele está conversando
profundamente com alguém. Dou um passo à frente, mas fico chocada
quando a mulher ao seu lado se vira um pouco e vejo o rosto de um anjo.

Eu paro, enraizada no local. Os dois parecem etéreos. Enzo com sua


aparência perfeitamente cinzelada e aquela mulher com seu rosto doce. E
eu não sou a única que pensa assim, pois os olhares das pessoas são atraídos
para eles, admirando a visão.

Eu não acho que muitas vezes duas pessoas tão bonitas estão de pé uma
ao lado da outra na mesma sala.
— Ela é linda, não é? — Uma voz astuta diz por trás de mim. — Foi ela
que ele desistiu para se casar com você. Dê uma boa olhada e veja por que
ele nunca será seu. Não quando o par dele está a um passo de distância.

Viro a cabeça um pouco e Rocco me dá um pequeno aceno de cabeça. Ele


faz um movimento para eu segui-lo até chegarmos ao lado de Enzo.

— Gianna, esta é minha esposa, Allegra. — Enzo faz as apresentações


e Gianna levanta o queixo levemente.

— Oh, Enzo, que excêntrico! — Ela exclama em um estridente feminino


falso. — Prazer em conhecê-la, Allegra.

— Igualmente, — respondo, mas por causa do meu sotaque, o s parece


um z. Ela lança uma risadinha suave.

— Filho, Benedicto quer uma palavra, — leva Enzo de lado, instruindo


Gianna a me apresentar a seus amigos e me fazer sentir mais bem-vinda.

Como se pudesse.

Eu a sigo até um grupo de garotas, e todas elas estão vestidas com


vários tons de branco e rosa. Sinto-me como uma palhaça entre elas no meu
vestido vermelho. Mas como sempre, não deixo isso aparecer.

— Meninas, esta é Allegra, a nova esposa de Enzo. — Gianna diz, e


todos elas caem na gargalhada.
— Diga-nos, o que você tem sobre eles? — Outra garota, Maria, me
pergunta.

— O que você quer dizer?

— Você deve ter algo em suas cabeças, caso contrário ele nunca teria
abandonado Gianna para se casar com você. Quero dizer... — Ela dá um
passo para trás, olhando de um lado para o outro entre nós duas. — Você
está a quilômetros de distância... se você entende o que eu quero dizer. —
Outra risadinha.

— Nada, — eu encolho os ombros, já procurando uma abertura para


deixar seu grupo.

— Meu pai me contou sobre você. Você deve voltar para sua aldeia,
foder uma vaca ou algo assim, — continua ela, e o riso está ficando mais
alto.

— Sienna! — Giana faz uma demonstração ofegante e escandalizada.

— O que, não é isso que eles fazem no campo? Imagine se o bebê de


Enzo acabar tendo pêlo. — Ela diz, orgulhosa de sua lógica.

Eu reviro os olhos para ela.

— Uma vaca é mulher, antes de tudo, e segundo, não é biologicamente


possível. — Eu inclino minha cabeça para o lado, olhando para elas.
— Você está falando por experiência própria? — Maria ri, e a única que
aparentemente tenta não rir é Gianna. Mas ela já pensa que está tão acima
de todos aqui.

— Não. Estou falando de livros. Você sabe ler. Você deve tentar
algumas vezes. — Eu dou as costas para sair, mas as palavras delas ainda
chegam aos meus ouvidos.

— Lerrrrr, — Maria imita minha pronúncia, zombando do meu sotaque.


— Tenho certeza que ela está montando animais suficientes para saber.2 —
Eu balanço minha cabeça, deixando-as para trás para continuar seu ato
ridículo. Não é como se eu esperasse algo melhor.

Mas, vendo como Gianna é linda, simplesmente não consigo entender


como Enzo poderia ter pensado em se casar comigo e não com ela, mesmo
com esse perigo pairando sobre sua cabeça. Ela é apenas... impressionante.

O desejo de enterrar minha cabeça na areia é quase esmagador demais,


e eu bloqueio tudo, meu único objetivo é sair do salão. Mas quando coloco
um pé na frente do outro, ouço um estalo.

Eu paro, horrorizada. Minhas mãos vão imediatamente para minha


bunda e sinto o rasgo ao longo da linha de costura.

Não!

2 Aqui a autora faz um jogo de palavras entre ‘riding’ (montar) e ‘reading’ (ler). Devido ao sotaque da
protagonista, as palavras acabam sendo pronunciadas de forma semelhante.
Meus olhos vagam loucamente pela sala, desejando que ninguém
notasse. Então, eu me apresso em direção ao banheiro mais próximo,
esperando poder consertar isso de alguma forma.

No banheiro, tiro o vestido e avalio os danos. O rasgo é tão profundo


que não parece apenas um acaso.

Eu não sou tão grande assim...

Não, o vestido se encaixa perfeitamente no meu corpo. Não há como eu


ter esticado até que ele rasgasse.

Lucia!

— Maldita seja! — Gritei os dentes em frustração, sendo esta uma


humilhação demais no mesmo dia.

Saio do box, com a intenção de voltar para o meu quarto, quando


esbarro em Gianna.

Ela olha para mim de cima a baixo, um sorriso satisfeito aparecendo


em seu rosto.

— Você realmente acha que pode agradá-lo? — Ela me pergunta, a


atitude tímida de antes de tudo, mas se foi. — Você acha que pode
acompanhar os... apetites dele? — Ela sorri, a implicação é clara. — Ele vai
ficar entediado com você rapidamente e adivinha para onde ele virá? Não
seria a primeira vez.
Dando um passo à frente, ela está chegando muito perto do meu espaço
pessoal e isso me deixa desconfortável. Ela quer me intimidar — a pobre
garota da vila com sotaque desagradável e vestido berrante. Sou o destaque
do programa para eles hoje à noite e não tenho dúvidas de que continuarei
sendo o alvo de suas piadas nas próximas semanas.

— Realmente? — Eu pergunto, a necessidade de ganhar a vantagem


comendo em mim. Aproximo-me, meu rosto mal pairando acima do dela. —
Por que você não se junta a nós então? Tenho certeza que Enzo não se
importaria e posso assistir... e aprender. — Eu me inclino para ela, pegando
um fio de cabelo entre os dedos, tentando imitar o flerte suave de Enzo.

— O que você quer dizer? — Ela tropeça nas palavras, os olhos se


arregalando.

— Se você é tão boa, talvez eu deva tentar você por mim mesma, não?
— As palavras saem da minha boca assim que ela me empurra para fora,
saindo do banheiro.

Sozinha, finalmente, eu caio no chão de azulejos, minha respiração


esfarrapada. Eu junto meus joelhos no peito e enterro minha cabeça entre
eles.

— Por que eu? — Eu pergunto suavemente, dirigindo a pergunta a


ninguém em particular e a todos.

O que eu fiz para merecer tanto ódio?


É tarde da noite quando sinto Enzo deslizando para a cama ao meu
lado, mantendo-se ao lado dele para não nos tocarmos. Reunindo toda a
coragem que posso obter, começo a falar.

— Não espero que você seja fiel a mim, — respiro fundo, — sei que
casamentos para pessoas como nós não são construídos com fidelidade e
amor. Mas tudo o que peço é que não me envergonhe. Não me deixe vê-las,
ouvi-las ou cheirá-las. Você pode foder quem quiser. Eu realmente não me
importo. Apenas deixe-me manter minha dignidade. — Depois de hoje, nem
sei mais se tenho isso.

Mas é a única coisa que estou disposta a segurar. Eu vou ficar bem,
mesmo que isso me mate. É um voto que fiz a mim mesma e que honrarei.

Ele não fala por um momento.

— Você realmente não se importa? — Ele pergunta baixinho, sua voz


quase inaudível.

— Eu não. — Eu minto.

— Tudo bem, — ele concorda, e por algum motivo sua resposta causa
uma dor no coração. — Não que eu precisasse da sua aprovação, mas
obrigado. Agora poderei conduzir meus negócios com minha mente em paz,
— acrescenta ele com desdém.

— Bom. Então eu confio que você não vai me incomodar. — Eu


respondo, puxando o edredom pelo meu corpo e aninhando dentro de seu
calor.

— Se é isso que você quer. — E com isso, nossa conversa termina.

Não, não é o que eu quero. Mas é o que eu vou conseguir,


independentemente. É melhor se eu puder pelo menos ter algum controle
sobre isso.

Eu sabia no fundo que alguém tão marcante quanto Enzo estaria


envolvido com inúmeras mulheres, sendo a mulher um atributo central dos
homens do nosso mundo.

Mas olhando diretamente para o rosto de um de suas amantes, um rosto


quase tão marcante quanto o dele, eu percebi que estava me enganando
pensando que ele poderia ser diferente. Eu pensei que, porque ele não tinha
me tocado quando teve muitas oportunidades antes, significava que era um
homem honrado, não conduzido por seu pau.

Eu estava errada.

Não era que ele fosse honrado.

É que eu sou muito desagradável para ele.


CAPÍTULO NOVE

A entrada é justa como me lembro, escura e envolta em nuvens de


fumaça de cigarro. Dou um aceno para o guarda externo e depois entro,
passando os barulhos altos vindos dos quartos no primeiro andar. Há
mulheres em todos os estados de nudez, e grunhidos e gemidos masculinos
permeiam o ar. A porta à direita está aberta, mostrando uma orgia total com
inúmeros participantes. Eu mantenho minha cabeça baixa, e as meninas
comuns sabem que não devem me envolver em uma conversa.

Chego no último andar e bato suavemente. Uma voz esfarrapada grita


para eu entrar, então eu entro. Ela está descansando em uma
espreguiçadeira vermelha orientada para as janelas, permitindo que a luz
do sol banhe suas feições.
Ela nem se vira para olhar para mim, mantendo apenas seu perfil —
seu lado bom — inclinado em minha direção.

— Maman Margot, — digo, e um pequeno sorriso se espalha nos meus


lábios. Ela levanta a cabeça devagar, retornando o sorriso.

— Meu garoto, — ela mantém os braços abertos e não hesito em abraçá-


la.

— Você perdeu peso maman. — Acrescento enquanto pego suas


bochechas magras e a pele pálida. Nesse momento, ela começa a tossir,
segurando uma mão para eu deixá-la recuperar o fôlego.

— Me passe esse copo, sim? — Ela aponta para a mesa, e eu


rapidamente pego para ela.

— Maman, isso é vodka? Eu pensei que você desistiu. — Trago o copo


para o nariz e cheiro. Sim, vodka.

— Shh. Ainda não. — Ela acena com a mão com desprezo, tirando o
copo da minha mão e virando o conteúdo.

Maman Margot não teve uma vida fácil, e as muitas coisas pelas quais
ela passou deixaram sua marca em seu corpo, principalmente em seu rosto.

Ela sufoca quando finalmente se vira para mim, com a bochecha


cicatrizada escondida pelo jogo de sombras.
— Eu não esperava você de volta tão cedo. — Eu me acalmo em frente
a ela, finalmente baixando a guarda no que parece uma eternidade.

— Houve alguns acontecimentos inesperados. — Eu adiciono,


suspirando profundamente.

— Quer me contar sobre isso? — Ela sorri, as linhas em seu rosto se


aprofundando.

Maman Margot está na casa dos cinquenta, mas os cabelos brancos e


sua aparência frágil não atestam isso. Ela tinha dezoito anos quando deixou
sua casa em Lyons para vir aos Estados Unidos, querendo tentar a sorte em
Hollywood e apostando nas garantias de um agente desconhecido.

Ela tinha conseguido alguns pequenos shows no começo, mas seus


recursos haviam acabado rapidamente e, portanto, recorreu à única coisa
que poderia mantê-la à tona — prostituição de alto nível. Ela começou com
diretores e produtores de filmes, e sua sorte parecia mudar.

Até que ela conheceu meu pai.

Ela ainda estava com os olhos estrelados, apesar de viver entre estrelas,
e sua paixão rapidamente se tornou obsessão, e então ela deixou LA para
seguir meu pai até Nova York. Rocco também estava bastante apaixonado
pela jovem beleza, e ele a presenteou com um apartamento na 5th Avenue
que começou a frequentar com muita frequência.
Logo, porém, minha mãe soube disso. Ela não teria se importado, pois
não tinha a série de mulheres que vieram antes maman Margot. Mas ela se
importava com uma coisa — a beleza deslumbrante de Margot.

O caso foi interrompido quando, uma tarde, Maman Margot estava


passeando com seus cães, e um agressor misterioso pulou, aproveitando sua
desatenção para marcar permanentemente o lado direito do rosto, jogando
ácido nela.

A polícia não conseguiu pegar o agressor e, quando sua aparência


desapareceu e sua sanidade diminuiu, meu pai também a largou e a instalou
em um dos muitos clubes que ele possuía, onde ela começou a ganhar seu
pão nas suas costas novamente. Mas desta vez, os clientes foram alguns dos
piores resíduos da humanidade.

Maman Margot viu muito em seu longo tempo trabalhando nessas


condições, e ela foi tratada como sujeira com mais frequência do que não.

Aconteceu que uma noite nós dois cruzamos o caminho. Ela me salvou
e depois devolvi o favor.

Eu tinha treze anos quando meu pai me iniciou em nosso mundo. Fiz
um juramento e meu sangue derramado serviu como uma promessa para
sempre colocar a famiglia em primeiro lugar. Rocco tomou muito cuidado ao
me explicar todo o negócio, os restaurantes que servem como frentes para
uma rede mais ampla, o tráfico de pessoas. Acho que não entendi
completamente o que o tráfico de pessoas implicava até que meu pai me
levou pela primeira vez ao clube.

Eu ainda estava lutando com minha maturidade recém-encontrada, e a


puberdade estava lentamente me transformando de criança em homem.

— Estou orgulhoso de você, filho, — meu pai me deu um tapinha nas


costas, mostrando-me dentro de uma sala privada cheia de homens feitos —
homens que mataram e mutilaram pela famiglia.

E eu queria ser como eles. Eu queria ser visto como mais do que apenas
um rosto bonito. Eu era um homem por completo.

Exceto que eu não era.

Todos haviam se juntado rapidamente à celebração, me encantando


com histórias diferentes de seu tempo na multidão, como haviam escapado
da polícia ou como haviam aperfeiçoado suas técnicas de assassinato. As
anedotas me cativaram e ouvi atentamente cada palavra, absorvendo a
aparente sabedoria dos meus anciãos. Porque era exatamente assim que eu
queria ser — temido, para que ninguém mais pudesse me prejudicar
novamente.

Posso ter nascido na máfia, mas abracei a vida de todo o coração quando
soube que o mundo nem sempre é colorido e que tons de cinza podem vacilar
entre branco e preto. Pena que eles se inclinaram um pouco demais para o
lado sombrio.
E assim, diante das pessoas que idolatrava, não procurei mais nada
além de fazê-las gostar de mim. O álcool estava fluindo livremente, e os mais
velhos não gostavam de nada melhor do que me fazer experimentar as
diferentes variedades, rindo quando eu tentava não vomitar no sabor.

Essa foi a noite em que eu também tive meu primeiro cigarro,


engasgando com a fumaça e aumentando a diversão geral.

Mas logo, todos ficaram um pouco perdidos demais. As histórias


degeneraram para falar obscenamente, e logo as palavras se tornaram
realidade.

Eu mal estava acordado quando as mulheres entraram, a pedido


especial de meu pai. Elas rapidamente se misturaram entre os convidados,
cada uma encontrando um homem, e a verdadeira devassidão havia
começado.

Exceto quando aconteceu, eu queria estar em qualquer lugar, menos lá.

— Uau, — alguém sussurrou no meu ouvido, e o cheiro de perfume


barato entupiu minhas narinas, — você não pode ser real. — Mais barulho,
e uma mulher chegou um pouco perto demais do meu espaço pessoal. —
Acho que nunca vi alguém tão bonito quanto você. Quantos anos você tem?
— Ela perguntou, acariciando meu braço para cima e para baixo
sugestivamente.

Eu não conseguia nem responder. O álcool atingiu minha corrente


sanguínea e a sala começou a se mover. Então eu me levantei e fui para a
saída, esperando que um pouco de ar fresco me ajudasse a me recuperar.
Não sei exatamente o que tinha acontecido, mas um minuto eu estava no
corredor, no outro eu estava em um quarto estranho, a sensação de uma
cama macia debaixo do meu corpo.

Fechei os olhos brevemente, o quarto ainda girando comigo. Um


momento depois, ou talvez uma eternidade mais tarde, eu não tinha
exatamente consciência do tempo, senti mãos no meu corpo. A névoa que
cobria minha mente dificultava a noção do que estava acontecendo, então
eu bati minhas mãos contra os toques invasivos, esperando parar quem
estava me incomodando.

As mãos pararam momentaneamente. A próxima coisa que soube foi


que minha camisa estava sendo levantada do meu corpo, minhas calças
retiradas. Meus movimentos foram lentos e descoordenados enquanto
tentava parar quem estava me tocando, minhas mãos empurrando os
ombros.

Não tinha funcionado.

Minha boxer se seguiu e de repente me vi completamente nu. Algo deve


ter clicado em minha mente, e não sei se foi o ar frio escovando contra minha
pele ou os dedos frios acariciando minha carne, mas eu soltei um gemido
estrangulado, a palavra não caindo da minha boca.

— Pare. — O som saiu baixo no começo, mas como senti mais toques
indesejados, comecei a me contorcer, usando minhas pernas para chutar.
Meus olhos estavam vidrados e uma névoa espessa ainda cobria minha
visão, mas eu poderia de alguma forma distinguir duas garotas olhando
para mim, sorrisos satisfeitos em seus rostos.

— Eu vou primeiro. — Lembro-me de ouvir as palavras e, como uma


boca molhada cobria minha pele, eu a perdi. De alguma forma, nos
recônditos profundos da minha mente, eu consegui perceber as intenções
delas, e a ideia de que isso acontecesse novamente me levou a agir.

Eu lutei para me colocar em uma posição sentada e jogar a mulher do


meu corpo, mas no processo eu também caí, meu rosto batendo no chão duro,
minha testa levando o peso da queda.

— Parece que sou o primeiro então. — Não sei se minha mente estava
pregando peças em mim, mas a segunda voz era masculina e,
imediatamente depois, mãos calejadas tocaram minha bunda, movendo-se,
sondando.

— Eu disse que te encontraria garoto bonito. — Alguém comentou, e


um novo tipo de dor me agrediu quando senti um dedo empurrar meu corpo.
Apenas um barulho estrangulado saiu, mas comecei a lutar seriamente,
mesmo que meus membros não me obedecessem.

Um peso se estabeleceu sobre mim, e minha boca só conseguiu formar


duas palavras.

— Me ajude.
Não sei se consegui falar alto ou não, mas do nada o peso havia
desaparecido e vozes elevadas haviam sugerido uma briga. De repente, um
lençol foi coberto sobre o meu corpo e uma voz suave sussurrou palavras de
conforto no meu ouvido.

— Está tudo bem, você está seguro agora. — Isso é o que maman
Margot me disse pela primeira vez. Quando eu fiquei sóbrio e a clareza
voltou, ela ficou de lado, evitando a luz direta que enfatizaria suas
cicatrizes.

Mas para mim, isso não importava. Eu já tinha visto beleza podre
suficiente no meu mundo, e suas imperfeições de forma alguma
prejudicaram sua bela alma. Ela me salvou naquela noite e fiz um
juramento para salvá-la também.

Levei mais tempo, mas eu ganhei dinheiro suficiente para tirá-la do


clube com segurança e encontrar em um belo apartamento. Mas uma vida
tranquila não era para maman, então eu comprei um clube para ela e ela se
tornou a madame chefe. Quase uma década depois, e ela é minha amiga
mais próxima.

— Onde sua mente foi? — Ela balança a cabeça, divertida.

— Na noite em que nos conhecemos. E como nunca lhe agradeci


adequadamente pelo que você fez por mim.

— Mesmo? Enzo, como você chama tudo isso? — Ela se move para seu
apartamento extravagante, mas luxuoso.
— Eu deveria ter feito você deixar essa vida; eu não deveria ter
permitido mais. Agora olhe para você. Toda vez que eu venho, você parece
ainda mais doente.

Um sorriso triste toca em seus lábios e ela solta um longo suspiro.

— Todos nós vamos morrer um dia, Enzo. Mas não vamos nos desviar
para uma conversa mórbida, não. Conte-me sobre esses acontecimentos
inesperados? — Ela muda sua atenção para mim, um sorriso travesso
tocando nos lábios.

— Eu sou casado. — Eu digo, levantando minha mão para que ela possa
ver a aliança.

— Não, c'est pas vrais!3 — Ela exclama, pulando de sua chaise e vindo
em minha direção para estudar meu anel. — Você é mesmo. Ou isso é algum
tipo de brincadeira? Você sabe o quanto eu quero ver o meu petit fils4 antes
de eu morrer? — Ela abaixa a cabeça, apertando os olhos para o anel.

— É real. — Eu confirmo.

— Não, — ela sussurra em descrença. — Diga-me que não é la putain,


como s'apelle elle...5 — Ela faz uma pausa, fechando os olhos em
consternação.

3 Não, não é verdade!


4 Filho pequeno
5 A prostituta, como se chama ela…
— Não, não é Gianna Guerra. É alguém que conheci a caminho de
Malta.

— Enzo... Mon Dieu! — Seus olhos crescem maravilhados. — Conte-


me tudo.

Então eu faço. Reconto toda a nossa jornada e como eu tinha um


profundo respeito por ela. E como minha admiração por sua forte moral me
levou a considerá-la como minha futura esposa e mãe de meus filhos.
Termino com os eventos do casamento, apenas para encontrar maman
olhando para mim curiosamente.

— O que?

— É a primeira vez que ouvi você falar positivamente sobre uma


mulher. Me faz querer conhecê-la.

— Eu a trarei a seguir...

— Não, claro que não. — Maman me interrompe imediatamente. —


Como você pode trazer sua esposa aqui? Não, isso não está certo. Mas estou
feliz que você achou uma garota tão legal. Me conte mais.

— Ela é.... — Eu paro, tentando encontrar as palavras. — Imprevisível.


Não sei o que há com ela, mas ela é diferente de qualquer pessoa que eu já
conheci. — Um sorriso toca nos meus lábios. — Ela não gosta de mim, você
sabia? Eu posso ver o desprezo nos olhos dela, e ainda assim não consigo me
conter.
— Enzo, o que você fez? — Maman pergunta de repente, seus olhos se
estreitando para mim. Ela me conhece muito bem.

— Eu a prendi. — Eu admito e maman levanta uma sobrancelha para


mim. — Eu fiz o que faço melhor. Eu a manipulei para se casar comigo.

— Mas por que?

— É irônico, não é? Passei a vida inteira cuidando de avanços


indesejados das mulheres, e a única mulher que me intriga me odeia. — Eu
me levanto, pegando a garrafa de vodka e derramando em um copo. Maman
me entrega o copo dela e eu também o encho.

Trazendo o copo para os meus lábios, tomo um grande gole, acendendo


um cigarro depois.

— Eu posso ver como ela está infeliz aqui, mas não consigo me conter.
Não sei o que há com ela, mas ela acordou algo primitivo em mim.

— Enzo, você está apaixonado? — Maman inclina a cabeça para o lado,


estudando-me.

Eu ri, porque ela não poderia estar mais longe do alvo.

— Não, não é amor. Eu não acho que sou capaz desse tipo de amor. Não
depois de tudo o que aconteceu. — Maman é a única a par dos meus
segredos mais profundos, minha vergonha mais insidiosa. — Eu quero
possuí-la... domar esse espírito selvagem. Quero escondê-la do mundo para
que ninguém mais possa roubá-la de mim, — as palavras caem dos meus
lábios e sinto um peso sendo retirado do meu peito enquanto confesso isso.

Há semanas que vivo em um estado de puro tormento, o pensamento


de que Allegra escaparia de mim de alguma forma me tortura dia e noite.
Eu tinha planejado tudo perfeitamente, mas então ela teve que ouvir minha
conversa com meu pai. Meus dedos se apertam ao redor do copo de vodka, o
confronto daquela noite ainda está brincando em minha mente. Eu quase
enlouqueci, e meu controle quebrou. Depois de anos de autodisciplina,
parece que finalmente encontrei alguém que pode me fazer reagir.

— Possuí-la? — Ela dá uma pequena risada. — Isso soa bastante


dangereuse6 Enzo. Ela é um ser humano, não um animal de estimação.

— E agora ela é minha. Para sempre. — Eu digo com confiança, a única


coisa que parece me trazer satisfação hoje em dia.

— Hmm, pelo que você está dizendo, ela não parece muito disposta, —
observa ela com consideração.

— Ela vai estar. — E mesmo que não o faça, não há como voltar atrás.

— Nós mulheres, somos seres delicados mon fils. Ela não vai estar
disposta só porque você quer. E vendo que a haste do vidro pode quebrar a

6 Perigoso
qualquer momento, aposto que ela deve ter feito um grande número com
você.

— Tivemos um pequeno desacordo, — dou a ela um esboço rápido de


nossa discussão e os olhos de Maman se arregalam quando ela balança a
cabeça para mim.

— Eu nunca pensei que você seria um grande romântico, Enzo, mas


também não achei que você fosse tão bruto. Deve cortejá-la se quiser que ela
fique. Você não pode simplesmente esperar que ela concorde com suas
demandas de homens das cavernas. Pelo que me disse até agora, ela só viu
seu lado difícil. Mostre a ela que você também pode ser suave. As mulheres
adoram suave.

— E daí, chocolate e flores? — Pergunto com desdém, quase me


arrependendo de ter abordado o assunto.

— Mais bien sur que non7 Enzo. Às vezes esqueço que, apesar de todo o
seu alto QI, sua inteligência emocional é do tamanho de uma ervilha!

— Por quê, merci pour le elogio,8 maman. — Eu respondo ironicamente,


revirando os olhos para ela.

— C'est vrais, n'est pas9? Você precisa fazer mais do que o mínimo
necessário. — Ela levanta um dedo para acariciar seu queixo com cuidado.

7 Mas é claro que não


8 obrigado pelo elogio
9 É verdade, não é?
— Acho bom que você me tem do seu lado. Vou ajudá-lo a conquistar sua
esposa.

— Não tenho certeza se a quero conquistá-la. Não quero que ela


interprete mal a natureza do nosso relacionamento. Eu só a quero mais...
flexível.

— Oh, meu filho, você tem um longo caminho pela frente. A beleza do
romance é que ele não está enraizado na realidade, mas na ilusão. Alimente-
a com a ilusão e você terá uma esposa flexível.

Eu estreito meus olhos para ela, a ideia moderadamente atraente, mas


não sem suas armadilhas.

— Mas e se ela realmente se apaixonar por mim?

— E isso seria tão ruim?

Não respondo, porque não sei a resposta. Parte de mim gostaria de nada
além de ter Allegra apaixonada por mim, porque então ela seria
completamente minha, mas outra parte tem medo de que, uma vez que eu
veja adoração em seu rosto, ela me enoje, como todas as outras antes dela.

Então não, eu não quero o seu amor, mas também não quero o ódio.

Existe um meio termo, eu me pergunto?


Com um pouco de zumbido do álcool, desço as escadas e sou recebido
por Nero, um dos soldados de meu pai.

Embora ele teoricamente responda ao pai, desenvolvemos um respeito


mútuo ao longo dos anos. Ele pode ser a única pessoa na organização em
quem confiaria com meus empreendimentos mais secretos.

Ele veio para servir a famiglia na mesma época em que fui iniciado,
nossa proximidade com a idade nos ajudou a desenvolver um vínculo mais
estreito. Embora seu passado antes da famiglia é um mistério, seu trabalho
foi nada menos que excelente.

Se alguma vez houve alguém simplesmente inabalável pela crueldade


humana, deve ser Nero. E isso faz dele o soldado perfeito.

— Seu pai exige sua presença, — diz ele rigidamente, acenando para o
carro que espera.

Respiro fundo, já temendo a interação. Ele não tinha mostrado muito


exteriormente, mas não estava satisfeito com minha decisão de se casar com
Allegra. Fato de que ele havia deixado dolorosamente claro no banquete,
mesmo elogiando a união com Benedicto Guerra. Ele intencionalmente me
manteve longe do lado de Allegra, essencialmente deixando-a para os lobos.
Também não duvido nem por um momento que ele ou minha mãe
tenham algo a ver com o vestido que ela usava. Mesmo que ela tivesse
desafiado abertamente o código de vestimenta, ela parecia magnífica
naquele vestido vermelho. A maneira como seu decote se esvaía, seus seios
ainda mais enfatizados pelo ajuste apertado do vestido, me fizeram olhar
um pouco mais a noite inteira.

E eu não tinha sido o único.

A raiva fervilha dentro de mim novamente. A maneira como aqueles


homens se inclinaram para ela, olhando para algo que não pertenciam a
eles...

Ela está me deixando louco, e eu preciso me controlar.

O carro pára em frente ao clube do pai e eu saio, indo diretamente para


o escritório dele.

— Meu garoto! — Ele exclama, vindo beijar minhas bochechas antes de


fazer um movimento para me sentar.

— Havia algo urgente, pai?

— Tive uma conversa com Tito e decidi deixar você administrar os


locais de Midtown. — Tito é primo em primeiro grau do meu pai e o
consigliere dele. Sua formação é no mercado de ações e ele garantiu que os
ativos de nossa família se multiplicassem ao longo dos anos, em quantias
insanas.
— O que levou a esta decisão? — Eu pergunto, curioso. As filiais
Midtown do nosso restaurante são as mais famosas e as mais exclusivas. O
fato de o pai ter decidido entregá-los para mim não é pouca coisa.

— Você é finalmente um homem, Enzo. Você tem uma esposa agora,


embora uma que eu não aprove, e em breve terá uma família. Não será
benéfico para você continuar viajando para o seu negócio de arte. Não
quando estou esperando ansiosamente por um neto.

Deixei um sorriso lento envolver minhas feições, mostrando meu apreço


por essa oferta. Mas por dentro, estou pensando no não dito. O que o pai fará
se eu assumir?

— Claro. É muito generoso da sua parte, pai.

— Você deve saber que espero me tornar avô em breve. — Ele reitera
seu argumento, claramente essa é a principal razão para a mudança
repentina na liderança.

Não é a primeira vez que o pai menciona seu desejo por um herdeiro.
Desde que teve um derrame, há alguns anos, ele se depara com sua própria
mortalidade e a possibilidade de sua linhagem desaparecer. Ele
prontamente começou a negociar um contrato com Guerra, seu objetivo de
me casar e ter um filho até o final deste ano. Adiei o máximo possível, em
parte por causa da minha aversão a Gianna Guerra, e em parte porque eu
não queria me casar.

E agora uma criança em cima de tudo?


— Sim, de fato. Tenho certeza de que Allegra conseguirá nos
surpreender em breve, — eu minto, porque como ela poderia quando eu nem
a toquei?

O pai resmunga e o tópico muda rapidamente para a administração dos


restaurantes. Passamos algumas horas descrevendo as diferentes
estratégias, e o pai deixa isso depois que eu lhe der um herdeiro, e só então
ele me incluirá na outra parte dos negócios da família, tudo bem por mim,
já que estou com pressa de fazer também.

É tarde da noite quando finalmente chego em casa. Passamos a tarde


inteira em reuniões com os subordinados do pai, fazendo os planos para
minha futura aquisição.

Dirijo-me para o quarto, meus olhos pesados de sono, minhas mãos


correndo para desabotoar minha camisa e tirar o resto das minhas roupas.
Eu provavelmente não deveria ter consumido ainda mais álcool. Mas
quando os mais velhos bebem, você precisa seguir o exemplo.

Abro a porta lentamente, andando na ponta dos pés pelo quarto. Allegra
já está na cama, e o som suave de sua respiração me avisa que está dormindo
profundamente.

Chutando minhas roupas para o lado, deslizo por baixo do lençol apenas
usando minhas cuecas boxer. Nas minhas costas, respiro fundo, fechando os
olhos e tentando descansar um pouco.
— Mhmmm, — os pequenos sons de Allegra me fazem abrir uma
pálpebra. Alguma mudança e um pouco embaralhada e ela está voltada para
o meu lado da cama, aproximando-se de mim até a perna descansar sobre o
meu corpo, o braço envolto em torno da minha barriga.

Parece que minha little tigress é atraída por mim, pelo menos
inconscientemente. Olho para o seu rosto, tão pacífico e dolorosamente
inocente. Passando minha mão pela bochecha, pego um fio perdido,
movendo-o para trás.

— Mhmmm, — outro som escapa de seus lábios enquanto ela coloca seu
rosto mais fundo na curva do meu pescoço, os pequenos movimentos
delicados que garantem que, enquanto eu estou com sono, outra parte de
mim não.

Droga!

Se ela vai continuar assim, não vou dormir em breve, e uma visita ao
banheiro pode ser feita.

Seus lábios se separam e meus olhos estão atraídos para sua boca
rosada, o pensamento de sua boca enrolada em meu pau me fazendo gemer.

Isso não está funcionando.

Por que eu pensei que seria uma boa ideia dividir uma cama? Não é a
primeira vez que tive essa reação a ela, então devo ser um glutão por
punição. E bolas azuis serão uma constante no menu.
Fecho os olhos e conto até dez.

Allegra levanta o rosto, arrastando o nariz pela clavícula até chegar ao


meu pescoço. Olho para ela e sou recebida pelos olhos dela, bem abertos.

Ela se afasta, como se estivesse queimando, com um olhar de nojo no


rosto.

— Uma coisa que pedi, — ela começa, tensão irradiando de suas feições,
— apenas uma coisa.

— Do que você está falando? — Eu franzi a testa. O que eu fiz dessa


vez? Foi ela quem molestou a mim enquanto dormia. Eu mal consegui
manter minhas mãos para mim e ainda assim, sou o culpado.

— Você cheira a qualquer prostituta que acabou de deixar para trás.


Você nem tem decência de tomar banho antes de subir na cama de sua
esposa? — Ela levanta a voz um pouco, suas mãos minúsculas apertadas em
punhos ao lado.

— Ela não é uma prostituta. — Eu respondo, não pretendendo deixar o


insulto para maman Margot desliza.

— Ela com certeza cheira assim, — ela zomba, inclinando a cabeça para
o lado e cruzando os braços sobre o peito.
— Ah, little tigress, com ciúmes? Eu pensei que tinha sua bênção. —
Estou divertido agora e me movo para o meu lado, descansando a cabeça no
cotovelo e vendo a indignação saindo dela.

— Sim, desde que eu não veja, cheire ou saiba. Claramente, ela está
desgastando tanto você que não conseguiu nem reunir forças para tomar um
banho. — Ela murmura baixinho, ainda não encontrando meus olhos.

— Curiosa? Quer que eu lhe mostre o que está perdendo? — Eu a


provoco, aproximando-me e deixando minha mão vagar por seu corpo, as
pontas dos meus dedos tocando ao longo da curva de sua coxa nua. Sua pele
reage imediatamente, e arrepios se formam sob o meu toque.

Eu tenho que admitir que gosto de irritá-la um pouco demais, então


quando a vejo reagir assim, não posso deixar de empurrá-la ainda mais.

— Pare com isso, — as palavras saem com um sussurro sem fôlego, sem
nenhuma convicção.

Movendo minha mão para cima e sobre a camisola que ela está
vestindo, deixei descansar brevemente na junção de suas coxas, meus olhos
focados em sua expressão. Seus olhos se arregalam e espero que ela afaste
minha mão a qualquer momento.

Exceto que ela não faz.

Nós dois estamos olhando nos olhos um do outro e é como se tudo


desaparecesse. Uma respiração pega em sua garganta, e meus olhos caem
mais para o seu peito, subindo e descendo em câmera lenta, os mamilos
empurrando contra as restrições de sua camisola. A energia entre nós está
escaldando para uma intensidade insuportável.

Sua camisola já estava enrolada em volta dos quadris, sua calcinha está
a apenas um toque de distância. Não sei o que me vem. Era para ser somente
um jogo, mas enquanto eu deslizo sobre a superfície de sua boceta coberta,
me encontro não podendo parar.

Ela lança um barulho estrangulado quando meus dedos caem mais,


roçando contra o clitóris. Seus olhos quase tremulam e seus lábios se
maravilham. Movendo-me para baixo, empurro contra a entrada dela, o
material de sua calcinha já está úmido com a excitação.

Ela está molhada.

Eu deslizo o tecido para o lado, a sensação aveludada de seus sucos


encontrando meus dedos e cobrindo-os como a porra de mel. Eu provoco sua
entrada antes de localizar seu clitóris novamente, acariciando-o
suavemente.

— Eu... — Allegra deixa escapar, os olhos fechados, as costas arqueando


levemente.

Ela geme, o som é pura música para meus ouvidos, mas também uma
cacofonia remanescente, e serve como um pensamento preocupante quando
percebo que estou indo em direção ao caminho sem retorno. Então eu faço a
única coisa que posso.
Abro a boca e estrago tudo.

— Sim, assim mesmo, — começo, aproximando meu rosto do dela,


minha mão ainda entre as suas pernas. — Eu a fodi com os dedos até que
ela estava implorando pelo meu pau, e só então eu empurrei sua boceta
apertada. — Os olhos dela se arregalam por um segundo quando a clareza
se instala, minhas palavras grosseiras ecoando em seus ouvidos. E eu
apenas continuo. — Ela ordenhava cada gota do meu esperma e ainda
implorava por mais. Diga-me, little tigress, você vai me implorar para te
foder também? Se você disser, por favor, eu posso... — Suas mãos disparam
e ela me empurra para fora dela. O lábio se enrola em repulsa e um tapa
alto cai na minha bochecha.

— Fora! Saia e se afaste de mim, seu imbecil! Talvez aquelas


prostitutas que parecem amar tanto seu pau lhe dêem um lugar para
dormir! — Ela grita para mim, me empurrando com os pés até eu cair da
cama.

Bem... Missão cumprida.

Eu mordo minha língua para não deixar escapar meus outros


pensamentos, como o fogo nos olhos dela ou a maneira como está pronta
para lutar comigo com unhas e dentes só está endurecendo meu pau, a
necessidade de prendê-la e mostrar exatamente o que nós dois estamos
perdendo quase esmagadora.

Mas eu não posso.


Não quando trabalho há anos para me controlar, para não me deixar
governar pelos meus instintos mais básicos. E assim, para evitar mais
tentações, eu saio. Pego minhas coisas e vou para o quarto de hóspedes do
outro lado do corredor.

Fechando a porta atrás de mim, deixo minhas roupas em um canto e


me deixo cair na cama.

— Deus! — Eu gemo alto com minha própria estupidez. Porque é minha


culpa levar o jogo longe demais, por gostar demais.

Sem nem pensar, trago meus dedos para a boca, provando sua essência.

Doce, mas picante... assim como ela.

Minha outra mão passa pela banda dos meus boxers para segurar meu
pau terrivelmente duro.

— Porra! — Eu murmuro no minuto em que começo a bombear meu


punho por todo o comprimento.

Acho que nunca fiquei tão duro assim antes.

Leva menos de um minuto para gozar em todo o meu estômago, a


imagem de Allegra com a boca separada, meus dedos aninhados dentro de
sua boceta queimarão para sempre em minha mente.
Devido ao pequeno incidente, eu me mantenho longe dela para não a
fazer me odiar ainda mais. Não que eu não tenha alguém olhando por ela
vinte e quatro horas e sete dias por semana. Mas as palavras de maman
ainda estão tocando nos meus ouvidos, e eu tenho que encontrar uma
maneira de preencher a lacuna entre nós.

A conquiste.

Mas como?

Eu nunca fiz um esforço com uma mulher antes, passando a maior parte
do tempo fugindo delas, em vez de tentar entrar em suas boas graças.
Portanto, não sei como mudar nosso relacionamento quando mesmo os
momentos mais mundanos se transformam em um campo de batalha. Não
que não seja amplamente minha falha, mas acho que não posso me ajudar
no que diz respeito a ela.

— Ela acabou de sair de casa, — a voz de Nero soa do outro lado da


linha.

— Onde ela está indo?

— Compras. Ela tem cinco guardas com ela. — Ele me dá uma breve
descrição do que ela está vestindo, bem como seu humor percebido.
— Me mande o local quando chegar lá, — digo, desligando.

Há uma coisa que aprendi sobre Allegra em nosso curto, embora intenso
relacionamento — ela é muito obstinada e volátil, com uma faixa
independente fervendo logo abaixo da superfície. Uma combinação mortal
para alguém que foi contida como ela, educada a vida inteira. De repente,
encontrando-se em uma cidade grande, infinitas oportunidades na ponta
dos dedos, ela pode pensar que pode fazer o que quiser.

Mas ela não pode.

É o que eu temia o tempo todo, desde o momento em que a conheci e


reconheci seu potencial. Ela era como uma jóia polida, não apreciada e
subestimada, apenas esperando alguém avaliar seu verdadeiro valor.
Depois de estar cercado a vida inteira por mulheres intrigantes e coniventes
que queriam apenas uma coisa de mim, era muito revigorante estar perto
dela.

Tive sorte de chegar até ela primeiro. Mas agora é uma questão de ter
certeza que ninguém a roubará de mim.

É com isso que me preocupei desde o início, e a razão pela qual passei
por tantos problemas para garantir que ela ficaria ligada a mim por toda a
eternidade. Fui apenas o primeiro a vê-la como ela realmente é, mas
certamente não o único.

O pensamento de ela sair sozinha no mundo, onde pode conhecer


alguém — ela pode se apaixonar por alguém — me deixa louco. E com sua
forte aversão a mim, a possibilidade de sucumbir ao charme de alguém é
ainda maior.

Droga, que vá tudo para o inferno!

— Sinto muito por interromper esta reunião, mas há algo mais que
precisa da minha atenção expressa. — Dirijo-me ao conselho de
administração do restaurante, levantando-me e saindo da sala.

Em apenas alguns minutos, estou no meu carro e pronto para ir


aguardando a mensagem de Nero. Estou batendo o dedo no volante e minha
mente continua me torturando com diferentes cenários. De Allegra estar
livre com seus sorrisos com homens desconhecidos, de corar com seus
elogios...

Meu punho bate no volante do carro, assim que meu telefone toca, o seu
destino a alguns quarteirões de mim.

Ligo o carro e dirijo em frente a uma loja de departamentos sofisticada.


Nero está do outro lado da rua e me acena, me movendo em direção à onde
Allegra está.

Ao entrar na loja de departamentos, mantenho-me em segundo plano,


apenas observando seus movimentos.

Ela está olhando algumas roupas, as sobrancelhas juntas em uma


pequena carranca enquanto ela olha os vestidos.
É só agora que percebo que deveria ter prestado mais atenção à falta
de roupas dela. Eu tinha visto a pequena mala que trouxe com ela; com os
poucos pertences que enfiou dentro.

Continuo observando-a enquanto ela tira um vestido da prateleira,


colocando-o contra o corpo e verificando o ajuste no espelho. A mão dela se
põe contra o preço e os olhos se abrem, colocando-o de volta rapidamente.

— Nero, diga a ela que deve comprar o que quiser, independentemente


do preço, — eu o informo por telefone, mas depois paro, pensando em outra
coisa. — Não, melhor ainda, diga a ela que sou um avarento e odeio gastar
demais, principalmente em roupas, e ficaria furioso ao ver a conta.

— Sim, Senhor.

Ele vai para Allegra e sussurra algo no seu ouvido. Sua expressão é um
indício infalível, seus lábios subindo lentamente em um sorriso travesso. Ela
não perde tempo em escolher o vestido novamente, e alguns outros. De fato,
logo seus braços estão cheios de roupas e ela segue em direção aos vestiários.

Ainda me importando com a distância, chego um pouco mais perto, me


escondendo atrás de uma coluna. Ela não deveria poder me ver em sua
localização, mas eu tenho uma visão completa dela.

Nero, que atualmente está esperando por ela, me dá um polegar do


outro lado da sala.
Allegra abre a cortina, incerteza escrita em todo o rosto enquanto ela
pisa na frente do espelho maior do camarim. Ela está deslumbrante em um
vestido preto que é um pouco curto demais para o meu gosto, suas pernas
finas e bem torneadas, destacadas de uma maneira que me deixa
fisicamente desconfortável.

— Nero, — eu o chamo novamente, pronto para tentar a psicologia


reversa mais uma vez, — diga a ela que eu amo vestidos sensuais e que
quanto mais pele eles mostrarem, melhor; também se certifique de que ela
pense que eu não acho roupas conservadoras atraentes.

Nero faz o que foi dito, e Allegra parece pensativa por um momento,
seus olhos ainda permanecem na maneira como o vestido abraça seu corpo.

Olho em volta, temendo o fato de que outras pessoas também podem


vê-la.

Ela finalmente deixa cair as roupas mais reveladoras em favor das


roupas mais horríveis e retas de avó.

Abafo um gemido, satisfeito com a escolha dela, mas sinto muito pelos
meus pobres olhos no futuro próximo.

Deus, ela realmente quer me irritar.

Depois que a conta é paga, eles passam para outra loja e Allegra começa
a olhar para os sapatos, experimentando estilos diferentes.
Estou quase aliviado por esta excursão estar prestes a terminar em
breve, mas pelo canto do olho vejo um assistente de vendas indo em direção
a ela, um assistente de vendas do sexo masculino.

Nero imediatamente vira a cabeça para medir minha reação, e eu


sinalizo para ele prestar atenção nela.

Ela está sentada em uma cadeira de pelúcia, esperando. O assistente


de vendas traz para ela um par diferente, ajoelhado na frente dela e tirando
os sapatos da caixa.

Eu assisto, estupefato, enquanto ele coloca a mão no pé dela, ajudando-


a a calçar os sapatos. Allegra está totalmente focada nos sapatos — sua
única salvação — mas o garoto não esconde sua leitura aberta das pernas,
seu olhar se movendo para cima.

Dou um breve sinal a Nero, e tudo o que ele disser a Allegra a deixa de
pé e correndo de volta para a loja de roupas.

Com a passagem livre, deixo meu local escondido e vou diretamente


para o assistente de vendas que ainda está no chão, com os olhos na figura
em retirada. Sento-me na frente dele, tomando o lugar que Allegra acabara
de desocupar.

— Posso te ajudar? — Ele pergunta quando finalmente percebe que


estou na sua frente.
— Sim, na verdade você pode, — sorrio intensamente para ele,
inclinando-me para sussurrar em seu ouvido. — Toque na dama novamente
e eu vou cortar suas mãos.

Ele se inclina para trás, choque escrito em todas as suas feições. Com
os olhos arregalados, ele começa a gaguejar.

— O-o que... você não pode fazer isso!

— Eu posso, e eu irei. — E só para mostrar a ele que não estou


brincando, tiro uma faca da minha jaqueta, traçando o contorno da camisa
da frente e abrindo um botão. — Ou talvez eu possa fazer pior... — Eu segui,
minha lâmina se abaixou em direção ao pau dele.

— Eu não vou tocá-la, cara. Eu nem vou olhar para ela... — o garoto
choraminga, caindo de bunda, verdadeiro medo escrito em todo o rosto.

— Bom. Então nós estamos entendidos.

Levanto-me e lembro a Nero para excluir as imagens do circuito interno


de televisão antes que ele saia. Assim que retomo meu lugar nas sombras,
Allegra retorna, quase sem fôlego. Ela está tentando explicar a Nero que
não havia esquecido nada no vestiário.

O assistente de vendas já havia se afastado, então continuo assistindo


alegremente o resto sem intercorrências da farra de compras, onde Allegra
gasta alegremente o que deve pensar ser uma fortuna, mas na verdade é
apenas um troco de bolso.
Por fim, ela parece satisfeita com suas compras e decide voltar para
casa.

E eu posso finalmente concentre-me no meu trabalho.


CAPÍTULO DEZ

Me revirando na cama, finalmente desisto da esperança de adormecer


em breve. Pela terceira noite consecutiva, Enzo não voltou para o quarto.
Eu estaria mentindo se uma pequena parte de mim não se perguntasse onde
ele está passando suas noites, ou com quem.

Droga!

Por que ainda me importo com o que esse diabo faz? Mesmo depois que
ele claramente zombou de mim? Eu dei a ele uma abertura, e ele aproveitou
ao máximo.

Eu estava tão encantada com naquela noite que teria deixado ele fazer
qualquer coisa comigo. Mas é claro que não, não quando a única vez em que
pode se interessar por mim é quando ele quer me humilhar. Ele deixou sua
posição muito clara — eu não sou o tipo dele. Eu deveria estar agradecida
por isso, e ainda assim, quando ele me tocou, minha mente ficou
completamente em branco. Eu olhei nos seus olhos e me perdi.

Fraca!

Não importa o quanto eu odeie admitir, Enzo tem um certo magnetismo


sobre ele que não reside apenas em sua aparência perfeita. Não, há algo
mais na maneira como se comporta, ou como sua voz ardente pode derreter...

— Maldito! — Eu murmuro alto, disposta a fazer meu cérebro calar a


boca.

Eu preciso parar de pensar nele e em seu sorriso de cair calcinha.

— Eu certamente estava pronta para largar minha calcinha por ele


naquela noite, — digo para mim mesma, irritada por ter demonstrado tanta
fraqueza quando comecei a me considerar imune a ele.

Meus pensamentos me traindo e meus sonhos me iludindo, decido que


preciso de uma distração. Uma rápida olhada no relógio me diz que é bem
no meio da noite. Não deveria haver ninguém na casa.

Puxo um robe sobre minha camisola e vou para o primeiro andar e para
a bela biblioteca que vi.
A casa inteira está assustadoramente quieta, e faço o possível para não
chamar atenção indesejada enquanto ando pelo corredor e abro a porta da
biblioteca.

Móveis de sândalo enfeitam toda a sala, e estantes altas no teto estão


em cada parede, todas cheias de uma variedade de livros.

Fecho a porta atrás de mim e olho com admiração as lombadas velhas


e desgastadas, mas acima de tudo o fato de que são peças claramente
colecionáveis. Escovando minha mão contra eles, sinto-me quase tonta por
estar na mesma sala com tantos livros.

Faço um inventário rápido dos títulos e observo que a maioria é pré-


século XIX. Algumas seções têm títulos duplicados, em diferentes edições e
vários idiomas. Quando chego ao príncipe de Maquiavel, fico surpresa em
contar mais de vinte volumes, sendo o mais antigo uma edição do século
XVII.

— Deus, isso deve ser caro. — Abro com cuidado, inalando o perfume
do papel usado e permitindo que minhas pontas dos dedos sintam a textura.

Colocando-o de volta na prateleira, passo em frente, observando com


foco esmagador nos autores gregos. Há uma parede inteira dedicada às
obras de Platão, Aristóteles, Eurípides e outros nomes que nunca ouvi antes.
Mas o único livro que chama minha atenção é o Simpósio de Platão, um livro
sobre o qual estudei em ensaios, mas nunca li no original.
Mal consigo conter minha emoção ao escolher a cópia e começar a ler.
Aninhada em uma das cadeiras confortáveis no final da sala me perco nas
páginas do livro.

Estou tão fascinada pelo conteúdo do livro que nem ouço quando
alguém entra na biblioteca. Só noto outra presença quando o livro é
subitamente retirado de minhas mãos.

— O que? — Eu vacilei, assustada ao ver Enzo plantado na minha


frente, o livro agora em suas mãos.

— Escolha interessante, — ele comenta, levantando uma sobrancelha


para mim, — eu deveria saber que seus gostos correm em direção ao... —
um sorriso rasteja em seu rosto, — atrevido.

— Onde está esse atrevido? — Eu franzi a testa para ele, não


planejando lhe dar uma abertura desta vez. — Trata-se de desconstruir o
amor como um conceito filosófico. Em nenhum lugar isso fala sobre sexo.
Mas então eu não deveria me surpreender se sua mente está sempre na
sarjeta. — Eu bato, levantando-me e arrancando o livro da sua mão. — Você
alguma vez não pensa em sexo? — Eu levanto uma sobrancelha para ele,
movendo-me para contorná-lo e deixar a biblioteca.

Não vou me envolver em outro argumento, e o melhor curso de ação é


recuar.

— Você tem certeza disso? — Ele pega meu pulso, me girando, então
estou encostada em uma estante de livros. Seus dedos sobem pelo meu braço
lentamente, e eu luto para não tremer ao toque. Sua palma toca a minha,
quase se juntando a um abraço sutil, antes que o livro saia do meu domínio
mais uma vez.

— Você sabia que no grego original, o Simpósio usa apenas eros para
amor? Agora, por que Platão faria isso quando o grego antigo tem uma
infinidade de palavras para amor, se o objetivo não era enfatizar o amor
como desejo?

— Você está errado. — Eu empurro meu queixo para cima, pronta para
lutar com ele, se for preciso.

— Eu estou? Há uma razão que ele usou eros porque o desejo não é
apenas sexual. Há também o desejo de possuir beleza, para possuir aquilo
que é agradável para nós, — continua ele, seus olhos avaliadores me
estudando atentamente. Eu abafo uma risada.

Claro que ele me ridicularizaria, mesmo que secretamente.

— Mas é exatamente isso, não é? O amor não é atraído pela feiura. —


Cito a passagem que me impressionou, porque justificava as ações de todas
as pessoas que me machucaram nesta vida. E porque, de acordo com essa
lógica, sou muito desagradável para merecer amor.

Mas eu me recuso a acreditar nisso.

— Você pode me insultar o quanto quiser, mas acabei de aturar você.


— Eu cerro os dentes e empurro contra ele.
— Calma, tigress, você está distorcendo minhas palavras. Eu não estou
te insultando. Beleza e feiúra são subjetivas, — ele tenta se explicar, mas
estou cansada dele e de seu mundo superficial.

— Não. Você é quem distorce o significado disso, — agarro o livro, mas


ele não o deixa ir. Nós dois estamos segurando um canto, nossos olhos se
encontrando e tendo sua própria batalha pessoal. — Você está perdendo
completamente o ponto. O tipo final de amor é aquele que o torna inteiro,
não o desejo que é puramente físico. Aqueles que antes eram um foram
separados pelos deuses cruéis, condenados a procurar a outra metade por
uma eternidade, para nunca ficarem inteiros sem eles. — Minha voz treme
com a intensidade da minha paixão. Porque e se houver uma alma gêmea
— minha outra metade? Ele será capaz de aceitar e me amar toda, incluindo
minha feiúra.

— Quem pensaria que você seria tão romântica? Você, a cínica que
proclamou ser tão vazia. O que faria você inteira, eu me pergunto?

— Não você, — as palavras caem acusatoriamente da minha boca e suas


sobrancelhas se levantam em um desafio.

— É mesmo, — aproximando-se e me apoiando ainda mais nos móveis,


as prateleiras cavando dolorosamente na minha pele, — pena que eu sou o
único que sempre vai te encher, little tigress. — A mão dele sobe lentamente
a coluna do meu pescoço, o dedo enrolando na minha garganta e aplicando
uma pressão suave.
— Deixe-me ir! — Minhas narinas se alargam quando minha raiva
aumenta. — Eu não quero as coisas de segunda mão de ninguém. — Eu
gosto da maneira como seus olhos se arregalam, o insulto atingindo a marca.

— Little tigress, parece que estamos em um impasse. — O seu polegar


acaricia minha pele em movimentos circulares, aplicando uma pressão
crescente em seu aperto. — Você precisa aprender quando guardar essas
suas garras, — diz ele enquanto a outra mão agarra o meu pulso, o livro
caindo no chão. — Sou paciente, mas até eu tenho um limite.

— Sério? — Eu pergunto inocentemente, batendo meus olhos nele. —


Eu não tenho medo de você, Enzo Agosti. Então vá em frente, faça o seu pior.

— Faça o meu pior? — ele ri, o polegar subindo e sob o meu queixo,
empurrando-o para cima, então estou olhando diretamente nos seus olhos.
Ele está tão perto que consigo sentir a sua respiração na minha pele. — E
se eu quiser fazer o meu melhor? — A sua pergunta me pega completamente
desprevenida, e meus olhos se arregalam por um segundo antes que eu
perceba sua intenção.

Então seus lábios estão nos meus.

Estou tão chocada que apenas congelo.

Seus lábios são macios e gentis, o completo oposto dele. Ele está
lentamente provocando uma reação de mim, e assim que eu começo a
devolver o beijo, ele para.
— As coisas raramente parecem tigress, — ele dá um passo atrás, com
os olhos ainda enraizados nos meus lábios. — Você é rápida demais para
julgar. Eros é realmente desejo, mas nem sempre é físico, — ele levanta um
dedo na minha testa, — às vezes desejamos a mente de alguém e queremos
possuir o espírito, — sua mão se move para baixo, as pontas dos dedos
roçando no meu peito antes de se estabelecer sobre meu coração. — É fácil
levar o corpo, a alma está sempre fora de alcance.

Eu empurro sua mão.

— Você está certo. Você sempre pode pegar meu corpo à força, mas
nunca terá minha alma. — Eu respondo triunfante.

— Isso é um desafio? — Ele levanta uma sobrancelha, quase divertido.

— É uma previsão. — Eu digo com confiança.

— Allegra, Allegra, — ele faz um som tsk, balançando a cabeça


lentamente, — o que vou fazer com você?

— Me deixar em paz? — Eu pergunto, meu tom é divertido, mas


esperançoso ao mesmo tempo.

— Talvez eu deva, — ele começa, e estou surpresa com sua rápida


concordância, mas depois termina a frase com um encolher de ombros — não
significa que sim, — e meu rosto cai.
Ele se vira para sair, mas não antes que eu pegue a leve puxada de sua
boca, a satisfação de ter a última palavra.

Sozinha na biblioteca, pego o livro novamente, com a intenção de


finalizá-lo. No final, tenho que admitir relutantemente que Enzo pode ter
feito alguma coisa.

O desejo se torna cada vez mais sutil, de superficial a profundo. E, no


final, o amor que é gerado pelo desejo é abrangente. Torna-se todo porque
desejando a alma — a própria essência do ser — tudo fica bonito.

—Você quer que eu desça? — Olho para Ana com descrença.

— Sinto muito, mas a Signora disse que a partir de agora, se você quiser
comer, terá que vir para a sala de jantar. Ela proibiu todos os membros da
equipe de lhe trazer comida.

Eu estava tentando evitar Lucia o máximo possível, preferindo comer


minhas refeições no quarto, em vez de arriscar outro confronto com ela.
Parece que meu plano apenas a irritou ainda mais ao fazer isso.

Aperto os punhos, frustração roendo em mim.

Com Enzo e Rocco desaparecidos na maioria dos dias, somos apenas eu


e Lucia, o que significa que ela não precisa fingir que é outra coisa senão a
bruxa cruel que é. E agora, ameaçando me fazer passar fome se eu não
seguir suas ordens?

Balanço a cabeça, sem saber como proceder. Eu sei que ela está fazendo
isso para me irritar e me deixar em campo aberto para que possa me
atormentar um pouco mais. Pena que não vou permitir isso. Eu só vou ter
que estar em guarda.

Balançando a cabeça para Ana, deixo meu quarto, me preparando


mentalmente para combater o monstro.

— Aí está ela, — minha sogra sorri quando me vê, e noto que não
estamos sozinhas à mesa.

Qual é o seu jogo, Lucia?

— Que bom vê-la novamente, Allegra. Eu pretendia aparecer. Não nos


conhecemos bem da última vez, e eu esperava remediar isso. — Ela vibra os
cílios, sorrindo para Lucia enquanto diz isso.

Também não me escapa que elas estejam falando em inglês, sabendo


muito bem que luto com a pronúncia.

Coloco meu melhor sorriso falso e sento-me à mesa. Meu estômago está
roncando, pois também não comi muito no dia anterior. Olho para a
variedade de comida: bolos, sanduíches, biscoitos, todas as coisas que nunca
comi antes.
— Lucia, acho que Allegra não viu isso antes, — Gianna ri enquanto
me vê olhando para a comida. Eu levanto meu olhar, franzindo a testa.

— É chá da tarde inglês. — Lucia diz, parecendo toda presunçosa.

— Mas não é tarde, — eu franzi a testa.

— Minha nossa, — Lucia coloca a mão na frente da boca, escondendo


um sorriso. — Às vezes eu esqueço que você é do campo. Tenho certeza de
que eles não têm isso lá, — o tom dela revela a satisfação que está sentindo
em apontar minha grosseria.

Mal ela sabe que mal tinha alguma comida no campo, então não é como
se eu fosse virar o nariz para qualquer coisa.

Eu encolho os ombros e começo a empilhar comida no meu prato. Eu


vou comer e sair daqui.

Os sanduíches não parecem tão ruins, então eu dou uma mordida,


surpresa ao me ver gostando do sabor.

— Ela gosta, — afirma Gianna, um sorriso maligno tocando nos lábios.

— Claro que sim, é comida, — digo a ela, revirando os olhos. Ela


provavelmente nunca passou fome um dia em sua vida.

— Oh querida, talvez devêssemos dizer a ela o que é? — Lucia pergunta,


seus olhos se fixaram em mim.
— E arruinar a sua refeição? Não deveríamos. — A falsa preocupação
de Gianna é óbvia, mas ainda mais o fato de elas terem mexido de alguma
maneira com a comida.

Olho para o sanduíche e noto que há algum tipo de pasta dentro. Tem
gosto de carne, então não consigo imaginar o que mais poderia ser.

— Do que você está falando?

— Esse sanduíche que você está gostando tanto é feito com testículos
de javalis. Uma iguaria, ou pelo menos eu ouvi. — O olhar de pura
condescendência no rosto de Lucia me diz que tudo foi de propósito.

Quero dizer, mais uma humilhação, certo? Mas desta vez ela teve que
trazer Gianna Guerra com ela, sua nora perfeita.

Vamos tirar sarro da camponesa!

Não lhes dou a satisfação de mostrar uma reação. Em vez disso, apenas
dou de ombros e continuo comendo.

Comida é comida, certo?

— Uau, muito obrigada! — Eu adiciono, minha boca cheia de comida.


— Você não precisava passar por tantos problemas para me dar uma
iguaria. Eu posso comer qualquer coisa, realmente. — Eu digo quando
mordo novamente no sanduíche.
Suas expressões estão escandalizadas, suas bocas se abrem com nojo
enquanto me vêem devorar o sanduíche com muito gosto.

— Você sabe, na minha aldeia, temos uma iguaria com a língua de vaca.
Eu deveria fazer isso para vocês na próxima vez. Para agradecer por isso. —
Seus rostos caem com a menção da língua de vaca, e eu tento não sorrir. Em
vez disso, continuo.

— Oh, e entranhas. Eu não acho que as pessoas nas grandes cidades


comam mais entranhas. Quero dizer...

— Acho que é o suficiente, — Lucia me interrompe, seu rosto quase


verde. — Ana, por favor, leve a comida embora.

— Mas, — começo, mas percebo que não há raciocínio com ela. Então
eu dobro minha camisa para cima, criando uma pequena bolsa e pegando o
máximo de comida que posso caber em minhas mãos, enfio-a dentro.

Gianna e Lucia estão me olhando com admiração, mas não espero por
outro golpe. Eu me levanto, pronta para ir.

Começo a passar, com a intenção de voltar para o meu quarto, e não


noto Gianna estendendo lentamente a perna. Não até eu tropeçar, caindo de
bruços no chão. A comida derrama da minha bolsa improvisada, rolando no
chão. A comida mais macia se transforma em mingau sob o peso do meu
corpo, e eu sinto que gruda nas minhas roupas.

— Ops, — Gianna ri e Lucia logo se junta, as duas rindo de mim.


Droga!

Eu nem me importo com a humilhação neste momento, mas há uma dor


irradiando do meu joelho. E também no meu ombro, com uma ferida mal
curada. É seguro dizer que não estou indo muito bem.

Minha boca se abre com um gemido baixo de dor, meus olhos se


fechando na tentativa de resistir.

Eu ouço um suspiro, e então braços fortes estão me levantando.

— Você está bem? — Abro os olhos para ver uma expressão preocupada
no rosto de Enzo.

— Que bobagem, você está bem, Allegra? Ela deve ter tropeçado, certo?
Esses pisos são um pouco escorregadios. — Lucia intervém rapidamente,
mas Enzo nem se importa com ela.

— Você está bem? — Ele pergunta novamente e eu lhe dou um aceno


lento.

Sem aviso, ele me aperta em seus braços, e meus braços giram em volta
do pescoço, segurando-o para apoio.

Ele se vira para o par na mesa de jantar, e as palavras que ele diz são
as que eu menos esperava.
— Gianna, você não tem negócios nesta casa e espero que seja a última
vez que te vejo aqui. Mãe, se você quer encontrá-la tanto, faça-o fora de casa.
Ela não é bem-vinda. Esta é a casa de Allegra também agora, e acredito que
você não a deixará desconfortável.

Ele não espera uma resposta enquanto me leva pelas escadas e para o
meu quarto. Ele abre a porta e me deita na cama.

— Onde dói? — Ele se ajoelha na minha frente, me olhando por


ferimentos.

— Estou bem, — finalmente encontro minhas palavras, mas a resposta


não o satisfaz. Ele começa a puxar minha camisa até que a cicatriz da minha
ferida seja visível. Ele se inclina, inspecionando-o, com os dedos pairando
em cima.

— Dói? — Ele pergunta novamente e eu apenas balanço minha cabeça.

— Allegra. Você tem que me dizer se algo dói, caso contrário eu não
posso ajudá-la.

— Por que você faria? — Eu pergunto em uma voz baixa. Não é como
se ele não estivesse me intimidando também. Sua família apenas seguiu um
caminho mais direto.

— Porque fiz um juramento para protegê-la. E é isso que eu vou fazer.


— Realmente? — Eu pergunto ironicamente. — E quem vai me proteger
de você? — Porque enquanto as brincadeiras e piadas de Lucia e Gianna
doem, elas não têm o potencial de me afetar por dentro, como ele.

— Ninguém. Você é minha para fazer o que eu quiser.

— Sim, eu sou, não sou? — Eu bufo. — Eu sou o brinquedo que apenas


você pode quebrar.

— Você está certa nessa frase, little tigress. Exceto que agora eu quero
colar você de volta. Então me diga, onde dói? Ou posso apenas encontrar por
mim mesmo. — Suas mãos vão para a bainha da minha saia, puxando-a
lentamente.

— Pare com isso, — eu tiro a sua mão. Em vez disso, estendo minha
perna e mostro a ele o hematoma no meu joelho.

Seus dedos frios tocam a pele ao redor, e um arrepio desce pela minha
espinha, arrepios se formando por todo o meu corpo.

— Precisamos desinfetar isso. — Ele se levanta e entra no banheiro,


voltando com um pequeno kit de primeiros socorros.

Ele absorve um pouco de gaze no desinfectante e começa a esfregá-lo


em torno da minha carne.

— Aí, — eu vacilo com a picada repentina, mas então sua respiração


quente cobre minha pele, atenuando um pouco da dor.
— Isso já aconteceu antes? — Ele pergunta baixinho, com os dedos
trabalhando na minha pequena ferida.

— Não é nada que eu não possa lidar, — respondo, virando a cabeça


para o lado. Não preciso que ele lute minhas batalhas por mim. Não quando
sou capaz de me defender.

— Allegra... — Ele se inclina para trás, soltando um suspiro profundo.


— Somente... da próxima vez que algo assim acontecer, me diga.

— E o que você pode fazer?

— Enviar minha mãe de volta para a Itália, — ele responde, sua


expressão séria.

Meus olhos se arregalam um pouco com sua resposta, mas decido


mudar de assunto, não querendo ser a causa de uma briga entre mãe e filho.

— Sua mãe e Gianna.... são amigas há muito tempo? — Eu pergunto,


tentando entender a raiva de sua mãe por mim.

— Mãe e Gianna? — Enzo levanta uma sobrancelha, divertido. —


Nunca. Elas não podiam se suportar antes. Mãe costumava sempre falar
mal de Gianna. Até você aparecer, é isso.

— Entendo.
Ela está fazendo o antigo o inimigo do meu inimigo é meu amigo, tudo
para me fazer sofrer. Mas por que?

— Pronto, está feito, — diz ele depois de colocar o band-aid no meu


joelho.

— Obrigada. — Eu coloco a saia de volta na minha perna, de repente


me sentindo um pouco estranha. Deve ser a primeira vez que tivemos uma
conversa decente sem lutar.

— Agora, vá trocar de roupa. Temos um lugar para ir.

—Onde?

— Visitar minha irmã.

Eu olho pela janela do carro, contemplando as paisagens desconhecidas.


Enzo não disse uma palavra desde que saímos de casa e, de alguma forma,
o silêncio é ensurdecedor.

— Por que sua irmã está em um convento? — Eu finalmente pergunto.


Eu sei que ele tem irmãs mais velhas que já são casadas, então fiquei
surpresa ao saber sobre uma irmã que morava em um convento.
Suas feições ficam tensas na minha pergunta, e suas mãos se apertam
mais no volante.

— Ela está criando a filha lá, — a resposta dele é rápida e curta, mas
isso só me deixa mais curiosa.

— E o pai? Ela não é casada?

Ele não responde. Em vez disso, ele empurra o pé no freio, parando o


carro ao lado da estrada.

— Ela não é casada. E eu não quero ouvir você trazendo isso na frente
dela.

Eu franzo a testa, surpresa com a sua reação.

— Mas...

— Ela foi estuprada. Dois anos atrás. Foi assim que ela ficou grávida.
Meu pai não suportava tanta vergonha em sua casa, então ele a enviou para
Sacre Coeur. — Não há dúvida de que Enzo se preocupa profundamente com
sua irmã, não com a maneira como ele mal se mantém unido, pois explica
as circunstâncias do exílio dela.

— Não direi nada, — respondo e ele me dá um aceno forçado, então me


sinto obrigada a me explicar. — Eu não olho para ela com desprezo, você
sabe. Não é vergonhoso que ela quisesse manter sua filha.
Ele me poupa um olhar antes de responder com desdém. — Diga isso a
todas as pessoas que a crucificaram por sua escolha.

— Estou surpresa que seu pai não tenha feito mais. Ele não me parece
do tipo transigente.

Enzo ri, dirigindo o carro de volta à estrada.

— Ele não é. Eu tive que negociar com ele. Uma coisa que você
aprenderá, Allegra, é que meu pai não se importa com ninguém além de si
mesmo, e com dinheiro.

— O que você fez? — Estou quase com medo de perguntar,


especialmente vendo como o seu queixo está travado no lugar, as veias nas
mãos se destacam quando ele agarra o volante.

— Paguei o que ele sentiu que perdeu com ela, — diz ele enigmático, e
eu franzi a testa.

— Eu não entendo.

— Ele ia levar a filha dela e depois vendê-la pelo maior lance, o único
uso que ele ainda tinha para ela. Então eu encontrei uma maneira de fazê-
lo feliz.

Não acho que ele esteja me dando uma imagem completa e, quando não
oferece mais detalhes, deixo o assunto morrer. Acho que é a primeira vez
que vejo Enzo reagir assim... com tanta emoção irradiando dele.
Dirigimos mais um pouco antes de finalmente chegar ao destino.

Sacre Coeur é imponente, cercado por muros altos. Parece mais uma
prisão do que um convento. Estou quase tentada a perguntar se estamos no
destino certo, mas Enzo não parece que seria receptivo a essa piada.

Ele pega minha mão e me leva em direção à entrada. Passamos pela


segurança primeiro e depois somos recebidos por uma irmã que nos mostra
em um dos dormitórios.

Todo o edifício parece um pouco em ruínas do lado de fora, e isso é


confirmado ainda mais quando entramos, subindo as escadas em direção a
uma pequena sala na parte de trás do primeiro andar.

Enzo bate suavemente, e uma mulher bonita segurando um bebê nos


braços abre a porta. Seus olhos — olhos idênticos aos de Enzo — se
arregalam antes que ela dê um abraço, atenta à criança dormindo em seu
abraço.

— Enzo! — Ela exclama, e um olhar de pura felicidade cruza seu rosto.


— Eu senti sua falta.

— Lina, e como está minha sobrinha favorita? — Sua voz muda


completamente quando se dirige à irmã, e de repente me sinto uma intrusa
nessa cena familiar perfeita.

— Finalmente dormindo. Venha, — ela faz movimentos para


entrarmos. O quarto é pequeno, com apenas uma cama e uma cômoda. Há
coisas de bebê por toda parte, e eu tenho que me perguntar como ela
consegue em quartos tão restritos.

Entro e observo Enzo tirar o bebê dos braços de sua irmã, embalando-o
no peito.

— Eu juro que ela fica cada vez maior toda vez que a vejo.

— Ela cresce tão rápido... — Lina balança a cabeça, um sorriso tocando


nos lábios. — E quem... — ela segue, virando-se para mim, uma pequena
carranca marcando sua testa.

A família de Enzo deve ter genes surpreendentes.

Eu notei isso mesmo em Rocco e Lucia. Se não fosse pelos quilos extras
ao redor da barriga, Rocco não pareceria tão gordinho e velho. Mas, mesmo
assim, detectei de onde Enzo deveria ter conseguido alguns de seus recursos.
E depois há Lucia, e por mais que eu admita, ela é uma mulher muito
impressionante.

Mas Catalina... Mesmo que ela tenha herdado a aparência de sua mãe,
não há vestígios de malícia em suas feições. Há apenas um tipo de
serenidade que enfatiza sua beleza.

— Esta é minha esposa, Allegra. — Enzo inclina a cabeça para mim,


mas sua atenção está totalmente focada na sobrinha.
— Prazer em conhecê-la, — inclino-me para beijá-la nas duas bochechas
e fico surpresa quando ela me atrai para um abraço.

— Bem-vinda à família, — ela dá um tapinha nas minhas costas


carinhosamente. Nesse momento, o bebê começa a chorar nos braços de
Enzo, e Catalina rapidamente a tira dele.

— E esta pequena causadora de problemas é minha filha Claudia. —


Ela olha carinhosamente para a filha, arrulhando para fazê-la parar de
chorar. E ela para. No momento em que ela se sente confortável nos braços
de Catalina, uma expressão pacífica se instala em seu rosto, voltando a
dormir.

— Não é você, Enzo, — Lina sussurra para o irmão, vendo sua


expressão abatida, — ela não está acostumada com outras pessoas
segurando-a.

Lina é cuidadosa ao se sentar na cama, a filha nos braços.

— Conte-me mais, — ela olha para nós, — como isso aconteceu? Quando
você se casou?

Abro a boca para responder, mas Enzo começa primeiro, relatando


nosso encontro, mas distorcendo tudo o que aconteceu depois. Lina está
ouvindo atentamente, um olhar sonhador em seu rosto enquanto Enzo
mente entre os dentes dele sobre a nossa grande história de amor.
— Oh, Enzo! Estou tão feliz por você. Não sabe o quanto eu queria ver
você se estabelecer com alguém que você amava. — Catalina continua
jorrando sobre a história fabricada, e Enzo continua a manter seu ardil,
dando-lhe detalhes adicionais sobre o nosso casamento.

Eu apenas sorrio e o deixo falar, pois parece importante para ele que
sua irmã acredite que é casado por amor.

Enquanto observo a interação deles, não posso deixar de sentir que há


um estranho na minha frente. Enzo é tão livre com seus sorrisos, sua voz
tão cheia de carinho. É a primeira vez que vejo esse lado dele e não quero.

Porque se eu souber que ele não é um valentão a toda a hora, eu posso


vacilar.

A visita é interrompida em breve pela Madre Superiora, que nos diz


que é hora de partir. Enzo dá a Catalina outro abraço e beija a testa de
Claudia. Eu também vou e a abraço me despedindo.

Mas antes de eu ir, ela sussurra algo no meu ouvido.

— Seja gentil com ele, ele precisa. — Eu franzi a testa com as suas
palavras, mas não consigo responder, pois somos levados para a saída.

— Sua irmã é maravilhosa, — digo quando chegamos ao carro. Mesmo


nessa pequena quantidade de tempo, pude ver que ela não é nada como o
resto da família.
— Ela é, — ele concorda, ligando o carro e voltando para casa.

— Ela realmente tem que ficar lá? Você poderia alugar um apartamento
para ela. — Eu fiquei indignada com a condição de seus aposentos, tão lotado
e tão degradado. Viver lá com uma criança? Não, não consigo imaginar o
quão difícil isso deve ser.

— Eu queria, — ele responde com desdém, — mas então ela seria um


alvo fácil para todos, inimigos e aliados. E o pai nunca a ajudaria se algo
acontecesse, com certeza. Aqui, pelo menos ela está segura.

Eu aceno, mas por dentro estou horrorizada com o mundo em que


vivemos.

— Por que você me levou lá com você? — Eu pergunto, mesmo que esteja
curiosa sobre o motivo de ele ter mentido sobre o nosso casamento.

— Minha irmã, — ele começa respirando fundo, — ela é romântica no


coração. Ela é inocente demais para este mundo, e eu sei que ela sempre
teme pela minha segurança. Eu faria qualquer coisa se isso significasse que
posso atenuar suas preocupações de qualquer maneira.

Olho para ele do canto dos meus olhos, seu perfil banhado nas sombras
da noite e percebo alguma coisa.

O diabo pode ter um coração.


CAPÍTULO ONZE

Meus planos estão se materializando. Comecei a perceber uma ligeira


mudança em Allegra e, há algumas semanas, nossos confrontos evoluíram
de puramente hostis a provocantemente antagônicos. Considerando o quão
ruim nossos argumentos ficariam no passado, eu diria que é uma grande
melhoria.

O conselho de Maman Margot para deixá-la ver meu lado mais suave
funcionou, e depois que voltamos da visita de Catalina, eu até notei uma
mudança na cadência de sua voz, não mais acusadoramente agressiva,
agora havia uma doçura que era anteriormente inexistente.

E eu gosto disso. Muito.


Minha little tigress tem um comportamento silencioso que brilha
mesmo quando ela não está afiando suas garras na minha pele.

E assim me vejo cada vez mais perto do meu objetivo de torná-la mais
receptiva à minha vontade.

A porta do meu escritório se abre e eu a vejo hesitante em avançar até


que ela esteja no centro da sala.

Quando ela descobriu que a biblioteca que tanto amava era de fato meu
escritório pessoal, ela estava um pouco teimosa, recusando-se a pôr os pés
nela novamente. Mas depois de muita persuasão, consegui convencê-la de
que não há mal em parar e pedir emprestado um livro.

Mal sabe ela que na noite em que esteve aqui, só conseguiu entrar por
causa de um acaso. Eu tinha esquecido de trancar a porta do escritório
quando fui para a cama.

Como a sala abriga minha extensa coleção de livros — a maioria deles


sem preço — ninguém é permitido entrar. Nem mesmo a equipe de limpeza.

Ela é a primeira pessoa a entrar aqui, e a única pessoa que eu deixaria


lidar com meus tesouros. Não porque ela seja importante, mas como posso
ver o cuidado que ela tem pelos livros, a maneira como ela os lida como se
fossem inestimáveis, assim como eu.

— O que vai ser hoje à noite? — Eu passo ao seu lado, juntando-me a


ela na leitura dos títulos.
— Hmm, — ela começa levantando o dedo para acariciar sua mandíbula
pensativamente. — Eu não sei. O que você recomenda? — Ela olha para
mim, com os olhos brilhando na pouca iluminação da sala. Dizem que
marrom é a cor dos olhos mais comum, mas quando olho nos olhos dela, é
como se eu estivesse a vendo pela primeira vez.

Limpo minha garganta um pouco, percebendo que estava olhando.

— O que você está com disposição? Romance?

Ela balança a cabeça.

— História? Filosofia? Eu acho que até tenho algumas peças... — Eu


saio quando a vejo parar na frente da minha coleção Maquiavel.

— Por que você tem tantos desses?

— Você leu? — Eu pergunto, pegando uma das cópias. Ela assente,


aproximando-se de mim para olhar o livro.

— Então você sabe do que se trata. É um guia para ser um governante


forte.

— Sim, eu sei disso. Ainda não entendo sua obsessão por isso. — Ela
coça o nariz em confusão, e o pequeno gesto é adorável.

— É para me lembrar que o poder não pertence ao indivíduo, mas ao


povo.
— O que você quer dizer?

— Posso herdar um império, mas não sou nada sem as pessoas da época
da fundação deste império. O príncipe deve estar em pé de igualdade com
seu povo. — Cito a passagem, observando as pequenas rodas dentro de sua
cabeça trabalhando.

— Como o leviatã? — Ela pergunta, e minha boca se levanta em um


sorriso secreto. Eu não imaginava que ela seria tão versada em textos
políticos, mas ela sempre encontra novas maneiras de me surpreender.

— Não. Há uma diferença central entre Maquiavel e Hobbes. O


primeiro aconselha um governo forte, mas em conjunto com o povo, nunca
os faça odiar você, se possível. O último... faça-os temer você, não importa
se eles te odeiem ao longo do caminho; governe com mão de ferro.

— Eu acho que a abordagem hobbesiana funcionaria melhor, não? Se


as pessoas temem você, não precisa se preocupar com elas te traindo.

— Você está preocupada com alguma coisa, little tigress. Mas o medo só
funciona até certo ponto. Em nosso mundo, o medo governa tudo exceto
lealdade. A lealdade é conquistada através do amor e respeito.

— Então você está tentando ser um governante justo, é o que está


dizendo. — Ela parece ruminar sobre isso, escolhendo suas palavras com
cuidado. — Acho que posso ver como o medo limitaria suas opções. Mas não
é mais difícil fazer as pessoas gostarem de você? O medo é fácil; é instintivo.
Amor? Isso exige trabalho.
— E porque é preciso trabalho, o resultado final é muito mais
satisfatório.

— Às vezes esqueço que estou lidando com um narcisista. É claro que


você prefere ter a adoração deles do que o medo, — ela murmura sob a
respiração.

— Coçando por uma luta, little tigress?

— Agora não, — ela acena a mão com desprezo para mim, — talvez
mais tarde. Agora eu só quero um bom livro. — Ela vira as costas para mim,
movendo-se para a outra parede para ler os títulos. Eventualmente, ela se
instala em um volume de Darwin e se sente confortável em uma cadeira. Eu
continuo a observando, me perguntando se ela entendeu o contexto sutil.

Eu poderia facilmente tê-la governada com medo. E houve um momento


crucial em que a dinâmica de nosso relacionamento poderia ter mudado
irrevogavelmente.

Eu a tinha esparramada na cama e nua debaixo de mim. Teria sido tão


fácil empurrar para dentro de seu corpo, pegar sua inocência e marcá-la
como minha. Eu teria sido um bruto fazendo isso, e embora ela não tivesse
lutado, teria me odiado depois.

Não sei se é por causa da minha história com mulheres, mas não
consegui fazer isso com ela. Não quando isso significaria ver sua expressão
mudar de leve ansiedade para ódio.
Sim, é difícil ganhar o amor de alguém. Mas acho que prefiro me
esforçar para vê-la sorrir para mim do que mostrar os dentes.

Passamos o resto da noite em silêncio agradável, e eu dou uma olhada


de vez em quando para ela, esperando pegá-la fazendo o mesmo. Mas ela
está totalmente imersa em seu livro. É como se eu nem existisse.

No começo, eu o classificaria como refrescante, mas agora está


começando a me preocupar. E se ela realmente não me achar atraente?

Mulheres e homens estão em cima de mim desde antes mesmo eu saber


o que era atração. Na maioria das vezes, eu me encontrava em situações em
que as pessoas não aceitavam o não como resposta. Eu nunca pensei que
encontraria alguém tão imune a mim. Mas, novamente, eu nunca queria
alguém para me achar atraente antes.

É também a primeira vez que me vejo pensando em como seria deixar


ir...

Os dedos de Allegra acariciam a borda da página, os dentes


mordiscando o lábio inferior em concentração. Eu assisto paralisado quando
ela vira a página, seus olhos focados nas palavras.

Sexy. Ela é tão sexy.

E isso é um problema.
Qualquer um que olhasse para ela pela primeira vez encontraria uma
mulher despretensiosa com traços indescritíveis. É preciso apenas uma
interação para ver como todo o seu rosto se ilumina diante de uma discussão,
como a saliência orgulhosa de seu queixo mostra sua dignidade silenciosa,
ou como seus olhos brilham com inteligência.

Sua aparência pode ser comum, mas sua personalidade é tudo menos
isso. Há uma força nela que esconde sua aparência frágil.

E isso a faz bonita.

— O que? — Ela olha para cima e me vê olhando. Tenho vergonha de


admitir que me vejo brevemente perturbado pelo desafio direto nos olhos
dela, mas rapidamente me contenho, provocando-a.

— Eu estava apenas observando uma mulher bonita.

Ela zomba, como eu sabia que faria, balançando a cabeça e


redirecionando sua atenção de volta ao livro.

Ela não acredita em mim. Porque ela só confia naqueles que pretendem
derrubá-la.

E juro a mim mesmo que um dia ela verá a verdade em minhas


palavras.
Colocando o caderno de volta embaixo do colchão, começo a planejar
meu próximo passo. Eu nunca a teria chamado por um tipo de garota de
diário, mas depois que percebi que todos os seus pensamentos estavam no
papel para eu ler, não pude resistir à tentação.

Não quando isso significa que eu posso passar por aquelas paredes
fortes que ela colocou.

Suas entradas desde que nos casamos não foram muito detalhadas,
sugerindo desconforto e medo do desconhecido. Ela não confiava nem em seu
precioso diário seus sentimentos por mim — bons ou ruins.

A principal razão pela qual eu recorri a bisbilhotar foi ver se estou


fazendo algum progresso com ela. Em vez disso, quase não há uma menção
ao meu nome lá dentro. Não é tranquilizador de forma alguma. Isso apenas
confirma minha teoria de que ela não se importava comigo.

Como sempre, a perspectiva de que Allegra esteja realmente imune a


mim faz meu sangue ferver, e fecho brevemente meus olhos, tentando
recuperar meu controle. Tenho alguns outros ases debaixo da manga e logo
ela deve sucumbir ao meu charme.

Embora seus sentimentos por mim não tivessem chegado dentro de seu
caderno, seus desejos mais profundos tinham. Ela criou cuidadosamente
uma lista de desejos — coisas que ela sempre desejou fazer, mas nunca
conseguiu. E felizmente para mim, eu posso dar a ela algumas dessas coisas.
Indo para o seu armário, começo a vasculhar seu novo guarda-roupa,
procurando um vestido elegante adequado para a ocasião que tenho em
mente. Acho um vestido branco suave que parece aceitável e combino-o com
um par de scarpins.

— O que você está fazendo? — Allegra explode pela porta, com as mãos
nos quadris estreitando os olhos para mim.

— Eu estou te levando para sair. Aqui, — eu jogo o vestido nas mãos


dela, — coloque isso e me encontre em dez.

Não espero que ela discuta quando fecho a porta atrás de mim e desço
as escadas.

Eu já estou vestido com um smoking, então faço algumas ligações


enquanto espero para garantir que tudo corra bem. Eu tenho um camarote
reservado no Met Opera para todas as estações. Eu costumo levar maman
Margot, já que ela sempre foi uma amante da ópera, mas como eu estive fora
com mais frequência, ela foi sozinha ou com qualquer amante que tenha no
momento.

Hoje à noite, porém, seremos apenas eu e Allegra.

Allegra, parecendo requintada no vestido que eu escolhi para ela, desce


as escadas. Eu me viro para lhe dar meu braço, mas ela me considera
desconfiada.
— Venha, eu não mordo, — começo, mas não consigo me ajudar, então
acrescento, — por enquanto.

Ela revira os olhos para mim, mas segura no meu braço.

— Os sapatos estão incomodando você? — Eu pergunto, olhando para


ela desajeitadamente tentando entrar nos scarpins.

— Eu não estou acostumada a andar de salto, — ela responde, um tom


de vermelho marchando suas bochechas.

— Você quer mudar para algo mais confortável?

Ela rapidamente balança a cabeça.

— Não com este vestido. Vamos apenas ir.

Um carro está esperando do lado de fora para nos levar à ópera.

— Onde estamos indo? — Ela pergunta, a testa presa à janela quando


as luzes piscantes da cidade começam a nos cumprimentar.

— Surpresa? — Eu tento uma piada alegre, mas o olhar que ela me dá


me faz balançar a cabeça, cedendo e respondendo a ela. — Temos um
compromisso na ópera, — digo, formulando de tal maneira que ache
obrigatório participar.
Enquanto pretendo agradá-la, não posso fazê-lo abertamente, caso
contrário pode pensar que tenho um motivo oculto. Bem, sim, mas é melhor
se ela não pensar isso.

— A ópera? — A falta de ar de sua voz trai a emoção fervendo dentro


dela.

Em seu diário, ela descreveu todas as óperas que deseja ver, todas as
quais só leu em outros textos e a intrigou sobre esse tipo de teatro cantado
— suas próprias palavras. Só espero que, ao realizar esse pequeno sonho
dela, eu possa ganhar um pouco de sua atenção.

— Sim, devemos assistir à estreia desta noite. — Eu minto. Não sei se


é uma estreia ou não, mas se Allegra acredita que é uma ocasião especial e
requer nossa presença, então não suspeitará de mim.

— Eu sempre quis ir à ópera, — ela admite, virando um pouco para que


eu só possa ver o seu perfil. Ela está mordiscando o lábio, e aposto que mal
consegue conter sua emoção.

— Você nunca foi? — Eu pergunto, mesmo que já saiba a resposta. O


seu diário abriu meus olhos para mais do que apenas sua lista de desejos.
Eu também fui capaz de vislumbrar sua vida em Milena, bem como sua fuga
cuidadosamente planejada para Agrigento. Tudo por uma chance de viver,
mesmo que por um dia.

Ela aperta a mão, um sorriso triste tocando nos lábios.


— Eu nunca deixei minha vila. Onde eu poderia ter ido à ópera?

— Por quê? Conheço sua família e eles sempre foram uma grande
presença no cenário social de Nova York, Paris e Milão. Por que eles não a
incluiriam também?

Sua expressão muda e ela move a cabeça um pouco para a direita,


tentando esconder a tristeza escrita em seu rosto.

— Eles tinham outros planos para mim, que você claramente arruinou.

— Não me diga que você preferia se casar com Franzè? — Eu pergunto,


perturbado pela possibilidade.

Sua boca se abre, mas nenhum som sai. Pela primeira vez, ela parece
totalmente sem palavras, e eu não gosto disso.

— Diga-me, — eu sondei mais, querendo saber. Não, precisando saber


se ela teria preferido esse maldito pedófilo a mim.

— Não, — ela finalmente responde, sua voz suave e sem confiança.

Não é suficiente.

Quero sacudi-la, agarrá-la pelos ombros e fazê-la me olhar nos olhos


enquanto responde isso.
— Não? Com certeza não parece. — Eu adiciono sarcasticamente, meu
tom mordaz.

Meus punhos se apertam ao meu lado, e minha mente é subitamente


invadida por imagens indesejadas, de Allegra nas costas, pronta para
Franzè. Dele a agredindo e tratando-a como seu brinquedo sexual pessoal.

— O que você quer que eu diga? Você me forçou a este casamento,


quando você sabia muito bem que me prometeram para outro. — Ela se vira
para mim, com os olhos cheios de fogo.

É a última gota e meu autocontrole se rompe. Agarrando-a pela cintura,


eu a puxo para o meu lado, com o rosto debaixo do meu. Minhas narinas se
alargam quando encontro seu olhar rebelde. Seus lábios são desenhados em
uma linha fina, o desafio é claro.

— É assim, little tigress? Olhe nos meus olhos e me diga que prefere
ficar com Franzè. — Minha outra mão vai para a sua mandíbula, segurando-
a aproximadamente no lugar para que eu possa obter minha resposta.

Ela está quieta, seus olhos silenciosamente furiosos comigo.

— Diga-me que você prefere ter a boca dele em você, — continuo, meus
lábios quase tocando os seus. Minha língua foge e lambo a costura dos lábios
dela. Ela range os dentes, certificando-se de que há uma barreira para parar
meu ataque. Mas eu não paro, não quando as imagens ainda estão frescas
em minha mente. Eu pressiono, minha língua deslizando por entre os dentes
antes de mordiscar o lábio inferior.
— Diga-me, — eu a empurro, meus dedos escovando através dos
mamilos já endurecidos, — você prefere ter as mãos dele em seus peitos
adoráveis? — E só para esclarecer meu ponto, tomo o botão duro entre dois
dedos, aplicando uma leve pressão.

— Eu te odeio, — ela cospe as palavras, e eu aproveito isso para moldar


minha boca na sua, minha língua explorando suas profundezas. Trago
minha mão sobre a sua nuca, segurando-a em mim, tentando fazê-la se
submeter.

Ela não faz.

Os seus dentes apertam minha língua, mordendo com tanta força que
o sangue começa a fluir. Eu recuo, curioso com relação a ela.

— Eu te disse que vou morder, — ela responde presunçosamente.

— E eu te disse que posso querer que você faça. — As sobrancelhas dela


se afastam por um segundo antes que perceba minhas intenções. Em um
movimento fluido, eu a tenho de costas, espalhada pelo assento.

Minha mão começa a brincar com a bainha do vestido, levantando-a


lentamente pelas pernas. Seus olhos fixos em mim, ela está esperando para
ver meu próximo passo. Ela nem está lutando quando seu vestido está
enrolado nos quadris para revelar sua calcinha rosa. Eu empurro ainda mais
até que sua barriga também seja exposta.
— Lutando? — Eu arqueei uma sobrancelha, e ela estreita os olhos para
mim.

— Você me perguntou se eu preferiria me casar com Franzè, — sua voz


é firme, seu olhar sem brilho, — mas como eu poderia ter uma preferência
quando ainda sou prisioneira, independentemente do meu carcereiro.
Realmente importa quem me coloca em uma gaiola? Eu ainda estou
trancada.

Meus dedos cavam na carne das coxas, suas palavras me irritando.

— Eu não sou Franzè, — digo com os dentes cerrados.

— Sério? Eu não tinha notado, — acrescenta ela, com secura, uma


expressão entediada pintada em seus traços.

— Você está errada em brincar comigo assim, Allegra. — Eu digo


enquanto minhas mãos se movem sobre a sua bunda. — E isso me faz querer
mostrar ainda mais a quem você pertence.

— Eu não pertenço a ninguém além de mim mesma, — ela bufa e


empurra meus ombros.

— É aí que você está errada, little tigress. Você é minha. — Eu abro


meus lábios no abdômen dela, logo abaixo do umbigo. Usando minha língua
ensanguentada, giro-a em torno de sua carne virgem, escrevendo a inicial
do meu nome. Marcando-a. A sua pele é minha tela, e o vermelho contrasta
perfeitamente com o branco da barriga. Eu arrasto minha língua para baixo,
contornando logo acima do material de sua calcinha.

— O que você está fazendo? — O grito de indignação é seguido por mais


um empurrão, tentando me tirar dela.

— Você é minha, Allegra. Quanto mais cedo você se acostumar, mais


fácil será para você.

Ela ri, quase com força.

— Para mim ou para você? O que você quer, Enzo? Você quer que eu
me ajoelhe e me submeta a você? Porque isso nunca vai acontecer.

— Vamos ver.

O carro para e eu fico em pé, arrumando minhas roupas. Virando-me


para ela, dou-lhe o meu sorriso mais encantador.

— Vamos?

Porque isso acabou de começar.

Estamos ambos tensos enquanto vamos para o camarote e vê-la tão


chateada me faz repensar minhas ações por um breve momento.
Isso foi tudo para fazê-la feliz. E tudo o que fiz foi deixá-la triste.

Mas quando vejo os olhos de outros homens vagando lentamente por


seu corpo, minha decisão é solidificada. Ela precisa saber que não há mais
ninguém para ela; que nunca pode haver mais alguém para ela.

Se eu fosse um homem normal, talvez essa obsessão, esse vício nela


teria me feito questionar minha sanidade.

Mas eu não sou.

E acho que estou perdendo a paciência com essa abordagem estratégica.

E se ela nunca confiar em mim?

Enquanto nos sentamos no camarote, tento tirar esses pensamentos da


minha mente.

A ópera começa e, enquanto todos estão focados no palco, tenho olhos


para apenas uma pessoa.

As expressões de Allegra são muito mais divertidas do que um


programa que eu já assisti muitas vezes antes. Eu assisto atentamente
enquanto ela se inclina para a frente, com os olhos arregalados para o que
está acontecendo no palco. Ela está totalmente em sintonia com a
performance: rindo, chorando, aplaudindo.

E acho que nunca vi uma visão tão bonita.


Assim que o intervalo é anunciado, eu a guio em direção ao bar e
percebo que ela não está tão tensa quanto antes. Ela não está rejeitando
automaticamente meu toque, então eu decido me colocar em suas boas
graças novamente.

— Vejo que você está gostando da apresentação, — acrescento, os cantos


da minha boca se curvando para cima.

— Sim! É maravilhoso. Não tenho palavras, — ela exclama, e começa a


discutir o enredo da ópera, nossa interação anterior aparentemente
esquecida.

Eu brinco junto, muito feliz por ver tanta alegria em seu rosto.

— Aqui, — ofereço a ela uma taça de champanhe.

Suas sobrancelhas se erguem quando pega a taça.

— Eu nunca bebi álcool antes, — diz ela, mas não faz nenhum
movimento para recusá-lo.

— Tente, mas devagar.

Ela traz a taça para os lábios, bebendo um pouco da bebida


borbulhante.
— Meu Deus! — Seus olhos se arregalam, um som de puro prazer
escapando dela. Esquecendo meu conselho, ela esvazia o copo e me olha para
mais.

— Calma, little tigress.

— Por favor? — Ela bate os cílios e eu quase gemo.

Agora, como posso recusar isso?

Eu peço outra taça de champanhe e, assim como a outra, ela a esvazia


de uma só vez.

— Não mais, — balanço a cabeça quando vejo a sua expressão.

— Mas...

Puxo o cotovelo, guiando-a de volta para o camarote.

O terceiro ato começa, e espero que Allegra volte a me ignorar em favor


da ópera. Mas mesmo que seus olhos estejam focados na peça, seu corpo
parece se aproximar do meu.

A palma da sua mão está subitamente na minha coxa e, pela maneira


como se move, ela definitivamente está lidando com emoção.

— Allegra? — Eu pergunto, e uma pequena risadinha a escapa.


Eu levanto seu queixo e seus olhos estão completamente vidrados.

— Allegra, você está bêbada? — Um sorriso divertido se espalha pelo


rosto.

Suas mãos se estendem agarrar minha camisa, aproximando meu rosto


do seu.

— Você... — ela insulta, um vinco aparecendo entre as sobrancelhas


tentando encontrar suas palavras. — Você diz que eu sou sua, mas... por que
você não pode ser meu também? — Ela olha para mim e um dedo me cutuca
no peito. — Não é justo, — ela continua resmungando.

Estou tentando, mas não consigo não sorrir, a cena é adorável demais.
Mas Allegra bêbada vai um passo além. Seu rosto se contorce de dor
enquanto ela morde a língua. Ela estremece, revelando dentes manchados
de sangue.

— Ei, você está bem? — Eu pergunto, preocupado com seu


comportamento.

— Você... — Ela aponta para mim, seus olhos tentando se concentrar


em mim. — Você é meu. — Ela diz antes de agarrar meu rosto com as duas
mãos e lamber desleixadamente minha bochecha na forma da letra A.

Chocado, eu não consigo nem me mexer.

Eu não esperava isso!


— Agora estamos quites, — ela tem uma expressão satisfeita no rosto,
sangue ainda ao redor dos lábios.

As pessoas estão se calando a nossa volta e, embora seja uma etiqueta


ruim, pego Allegra nos meus braços, deixando a apresentação.

O corredor e a entrada estão vazios e, quando chegamos lá fora, percebo


que está chovendo muito. Nosso carro fica no final da rua, então não há como
chegar lá seco.

— Chuva! — Allegra exclama, pulando dos meus braços e direto para a


chuva.

Balanço a cabeça com seu óbvio entusiasmo — a garota não pode beber!

— Allegra! — Eu a chamo, mas ela está ocupada girando na chuva. O


vestido que está usando já está começando a ficar encharcado, grudando em
suas curvas como uma segunda pele. A cor clara da roupa faz com que pouco
seja deixado para a imaginação.

Seus mamilos estão se esforçando contra o material, enrugado e reto.


Até os contornos do estômago são visíveis, todos levando à calcinha rosa.
Eles são o destaque do show, como um sinal de néon dizendo me foda.

E eu serei amaldiçoado se não funciona.

Corro para o seu lado, agarrando o braço dela e puxando-a para mais
perto, garantindo que ninguém possa vê-la.
— Vamos para casa, — eu digo, mas ela apenas balança a cabeça, um
sorriso bobo no rosto.

— Não! — Ela empurra com força contra o meu peito, conseguindo


colocar alguma distância entre nós. — Livre... Eu estou livre! — Ela grita
alto antes de começar a rir.

— Little tigress, — meus dedos envolvem a sua mão, girando-a até que
suas costas estejam encaixadas na minha frente.

Eu me pergunto se ela pode sentir o contorno do meu pau duro, preso


entre as bochechas da bunda, o material frágil entre nós apenas uma
barreira fraca.

Minha mão está em volta da sua cintura, descansando contra a barriga


e pressionando-a em mim.

— Enzo, — ela libera um gemido gutural, a cabeça caindo para trás, me


dando acesso direto à garganta. Mordendo a pele exposta e ela fica ainda
mais inquieta em meus braços.

— O que você quer, little tigress? — Eu pergunto a ela, enfiando meus


quadris nas suas costas, minha mão girando em círculos sobre a pele
molhada, ficando cada vez mais baixa até ficar sobre a calcinha. — Diga-me,
— pergunto quando um dedo mergulha entre as suas pernas.
Estamos no meio da praça, na chuva torrencial, onde todos podem nos
ver. No entanto, há algo de libertador nisso... sobre o jeito que ela não está
lutando comigo pela primeira vez.

— Eu não sei, — ela sufoca um soluço enquanto sua mão cobre a minha,
implorando para que eu continue tocando.

— Casa... precisamos chegar em casa, — sussurro em seu ouvido e ela


dá um pequeno aceno de cabeça, ainda completamente presa ao meu lado.

Chegamos ao carro e eu instruo o motorista a ser rápido.

Durante todo o passeio para casa, as mãos de Allegra estão brincando


com os botões da minha camisa, o toque é hesitante e inocente, mas eu serei
amaldiçoado se não for a coisa mais quente que já senti.

Quando o carro para eu a carrego nos braços, indo diretamente para o


nosso quarto e ignorando os olhares curiosos dos empregados.

— Enzo, — ela mexe enquanto eu a deito na cama, removendo


rapidamente as roupas molhadas do corpo até que ela fique nua na minha
frente.

Não há vergonha, pois ela arqueia as costas, os calcanhares cavando no


colchão, empurrando a boceta em minha direção

— Eu sei o que você quer, little tigress, e eu vou dar a você, — grunhi
quando rapidamente tiro minha camisa, jogando-a no chão.
As calças ficam porque eu mal confio em mim assim, e sei que ainda
não estamos prontos para esse passo.

Mas isso...

Meus joelhos bateram no colchão e eu espalhei as suas pernas.


Colocando-os em ambos os lados dos meus ombros, eu seguro sua bunda e
trago a boceta para o meu rosto.

Ela está se contorcendo, minha respiração faz cócegas na área sensível.

Eu dei um beijo gentil no topo de seu monte antes de me mover mais


baixo, espalhando seus lábios com minha língua e mergulhando.

Dou-lhe uma longa lambida antes de me acomodar no clitóris, sugando-


o na minha boca. Um gemido alto a escapa, e suas mãos encontram meu
cabelo, segurando-o com força. Continuo mordiscando o seu broto,
alternando entre chupar e circulá-lo com a língua e usando as reações dela
como instruções.

Demora um pouco, mas começo a aprender suas dicas. Como o aperto


das coxas ao redor da minha cabeça significa continuar fazendo o que estou
fazendo ou como a leve força do meu cabelo significa que devo mudar meu
foco.

Minha boca fica mais baixa, provocando sua entrada com a minha
língua. Ela está pingando e o orgulho incha no meu peito ao pensar que sou
eu quem está causando essa reação nela.
Eu empurro minha língua para dentro, acariciando-a profundamente.

— E ... — ela começa seguindo quando eu insiro um dedo, sentindo sua


tensão ao meu redor.

Movo o dedo para dentro e para fora, usando minha língua para brincar
com o seu clitóris.

Seus sucos estão por todo o meu rosto, e meus sentidos estão
completamente sobrecarregados com seu perfume e gosto. Meu pau está se
esforçando contra o zíper da minha calça e sinto gotas de pré-sêmen
vazando, manchando o material. Tentando esquecer minhas bolas doloridas
e o pau desesperadamente duro, concentro-me no seu prazer, seu pequeno
gemido soa melhor do que qualquer orgasmo.

Ela é tudo o que eu já pensei que seria e muito mais...

Continuo a foder ela com meu dedo, minha boca enrolada em seu clitóris
quando sinto suas paredes se apertando.

Suas costas arqueiam e seu corpo tensiona logo antes de me espremer


a vida com as coxas.

— Enzo, — ela choraminga, meu nome nos lábios quando goza é toda a
satisfação que eu preciso.

Eu levanto minha cabeça e vejo seus olhos tremularem, sua boca


aberta, presa em uma nota interminável.
Movendo-me lentamente pelo corpo, dou pequenos beijos por todo o
peito até chegar à sua boca.

Seus olhos se abrem, olhando para mim.

— Me beije, — ela sussurra, e o que posso fazer além de me obrigar a


fazê-lo?

Coloco minha boca na dela, revelando-me com a sensação de tê-la


disposta debaixo de mim, mesmo sabendo que ela pode não ser tão flexível
de manhã.

Então eu apenas aproveito, beijando-a ao máximo, apreciando o leve


pincelar de seus mamilos contra meu peito nu.

— Calma, little tigress, — sussurro contra os seus lábios enquanto sua


boceta continua esfregando contra o meu pau.

Estou a um segundo de explodir e ela não está ajudando meu


autocontrole.

— Mhmmm, — ela choraminga, e eu me movo para o lado, com medo


de que, se isso continuar, eu possa fazer algo que nós dois nos
arrependeríamos.

— Durma, — beijo sua testa, abraçando-a por trás e esperando a culpa


chegar.
Eu cruzei uma linha hoje à noite, estou bem ciente. Eu propositalmente
lhe dei o champanhe, esperando que ela se soltasse um pouco e parássemos
de lutar pelo menos por uma noite. Mas sua reação foi totalmente
inesperada. Ela perdeu todas as inibições e aproveitei ao máximo.

Por mais que eu queira me convencer de que tudo isso foi para ela, uma
parte dentro de mim sabe — era tudo para mim.
CAPÍTULO DOZE

Eu acordo assustada por algo duro cutucando minhas costas.


Momentaneamente confusa, lentamente viro a cabeça e fico surpresa ao ver
Enzo me abraçando por trás, dormindo profundamente.

O que está acontecendo?

Carrancuda, começo a recordar os eventos da noite passada, com o calor


subindo pelas minhas bochechas.

Eu me vejo e, no entanto, não parece comigo mesma.

Eu estava... devassa.

Bom Deus, o que eu fiz? Eu praticamente implorei para ele fazer o seu
caminho comigo.

E eu me lembro... do jeito que ele me tocou, colocou a boca em mim... lá.

Meus olhos se arregalam quando me lembro das sensações que ele


arrancou de mim, como senti coisas que nunca pensei serem possíveis.

E eu me vejo sem saber como reagir.


Não tinha sido ruim... não como Lia me avisou antes do meu casamento.
Não houve dor. Não havia nada além de euforia.

Levanto minha mão para a testa, sentindo se estou com febre. Meu
corpo inteiro está formigando com o mesmo tipo de sentimento da noite
passada, e tudo está centrado entre minhas coxas.

Balanço a cabeça, tentando remover esses pensamentos da minha


mente.

Ele está apenas tentando provocar você. Fazer você largar suas defesas
para que possa levá-la ainda mais ao pecado.

Mas se o pecado parecia assim, não vejo por que resistiria.

— Acordada? — Ele murmura no meu ouvido, sua respiração soprando


quente no meu rosto.

Eu rapidamente me afasto, segurando dois dedos na forma de uma cruz


na minha frente.

— Longe, diabo! — Eu grito com ele. Tudo aconteceu por causa daquela
coisa borbulhante que ele me embebedou. Deve ter havido algo para me
fazer me comportar assim.

Enzo levanta uma sobrancelha para mim, mas ele apenas ri, chegando
a uma posição sentada. Ele está sem camisa, mas suas calças ainda estão
no lugar.
E oh meu Deus, que peitoral!

Deus! Ainda devo estar sob a influência dessa poção. Talvez fosse um
feitiço de amor, caso contrário eu não olharia para ele e ficaria assim...
quente.

— O que você fez comigo? — Cuspi as palavras com nojo, certificando-


me de colocar alguma distância entre nós, não confiando em mim mesma
para não pular nele.

Sim, essa poção era realmente potente.

— O que você quer dizer? — Ele tem a ousadia de perguntar


inocentemente, mas seu sorriso sutil o denuncia.

— O que você me deu ontem à noite? Você me drogou, não foi? Foi uma
poção de amor?

Eles também têm aqueles nas grandes cidades?

Houve muitas vezes na minha aldeia quando um homem sucumbiu às


artimanhas de uma mulher, e Lia me disse que tinha sido todo o trabalho
de bruxaria. Eu não tinha ouvido falar de uma poção para trabalhar em uma
mulher. Talvez eles sejam apenas mais avançados aqui, eles são
definitivamente mais ricos e podem pagar.

— Poção de amor? — Ele ri, olhando para mim com diversão nos olhos.
— Não me diga que você me ama, little tigress.
— Não seja ridículo! — Eu o cortei. — É tudo por causa da coisa que
você me deu para beber! — Eu digo acusadoramente, parando para pensar
na data. Dizem que a bruxaria é mais potente durante um solstício ou
equinócio. Certa vez, li um texto sobre uma bruxa realizando sua magia
maligna na véspera de Todos os Santos, criando um círculo pagão com o
diabo e se envolvendo em fornicação.

— Chama-se champanhe.

— Aha! Eu sabia! Isso mexeu com a minha cabeça. Você planejou isso o
tempo todo? — Eu estreito meus olhos para ele.

Enzo Agosti... Ele é perigoso. Mais perigoso do que eu pensava que


seria.

— Claro que mexeu com sua cabeça! Você ficou bêbada, — ele tenta
explicar, mas eu não estou acreditando.

Eu já vi os guardas bêbados antes. Eu até vi como alguns moradores


são quando eles absorveram o suficiente, e nenhum deles se transformou em
uma bagunça arbitrária. Eles estavam desleixados e desorientados, seu
discurso lento e arrastado. Mas eles não tiraram a roupa e pediram que o
diabo seguisse seu caminho com eles.

— Eu não acredito em você! — Eu respondo, mantendo minha teoria


sobre a poção. É a única explicação viável.
— Allegra, — ele balança a cabeça, os olhos enrugados nos cantos, o
verde de suas íris brilhando à luz do dia fresco e o tornando totalmente
atraente.

Deus! Isso é permanente?

— Por toda a sua inteligência, você é rápida demais para acreditar em


bruxaria. Eu pensei que você era mais sensata que isso.

— Fique longe, — eu seguro meus dedos em posição, a cruz pretendia


manter o diabo longe.

— A bruxaria é muito real! Está documentado há séculos. — Afasto pelo


seu sorriso zombeteiro, começo a listar todas as fontes respeitáveis que
mencionam magia, começando de textos antigos a mais modernos. — Eu li
sobre depoimentos, você sabe. O ocultismo é real e perigoso, e eu exijo que
desfaça qualquer feitiço que colocou em mim.

— Allegra, — ele dá um passo em minha direção, e eu me preparo para


correr. — Não há feitiço, você tem minha palavra. — Ele se planta na minha
frente, com o dedo descendo no meu peito, passando pelo meu mamilo.

É quando eu percebo duas coisas.

Eu tenho discutido com ele nua; e meus mamilos endureceram sob seu
toque, um arrepio descendo minha espinha e me deixando ainda mais
quente.
Meus olhos se arregalam e eu ponho meu olhar mortal nele.

— É a reação natural do seu corpo, little tigress, — ele abaixa a cabeça,


trazendo os olhos para o mesmo nível que os meus.

— E isso significa apenas uma coisa. — Ele não elabora, saindo do


quarto.

Mas ele sabe que vou preencher os espaços em branco.

Eu o quero.

Droga! Por que não poderia ter sido mágico? Pelo menos então eu não
teria sido uma participante disposta.

Suspirando profundamente, deito-me na cama, uma expressão de


desolação envolvendo minhas feições.

É isso... O começo do fim.

Ana me garante que Lucia está com as amigas, então aproveito isso
para sair do quarto. Não é sempre que ela está fora de casa, e às vezes eu
prefiro ficar no meu quarto só para evitar um confronto.
Vou direto para a biblioteca, esperando tirar Enzo da minha mente.
Fechando a porta atrás de mim, solto um suspiro decepcionado.

— Você não deveria estar no trabalho ou algo assim? — Pergunto


quando o vejo descansando em sua cadeira, lendo o jornal. Ele sempre sai
de casa nessa hora, então é uma surpresa vê-lo aqui.

Droga!

Ele é a última pessoa que eu queria ver, depois de Lucia.

— Você teve tempo de se acalmar, tigress, ou está aqui para brigar


novamente? — Ele abaixa o jornal para me considerar divertido, um sorriso
ameaçando ultrapassar todo o rosto.

— Você não poderia ter sido um ogro, — murmuro debaixo da


respiração. Se ele tivesse sido realmente horrível comigo, talvez eu pudesse
odiá-lo de todo o coração. Não gosto que esteja vacilando em minha
convicção.

— O que você disse? — Suas sobrancelhas se levantam, mas eu apenas


balanço minha cabeça e pego um livro aleatório, pronta para sair.

— Não, não, não, — ele acena um dedo para mim como se eu fosse
criança. — Você não pode tirar um livro. Se quiser ler, leia aqui.
Inclino minha cabeça para o lado, irritada com essa regra repentina.
Mas não posso culpá-lo se ele quiser ter muito cuidado com seus livros. Olho
a cópia em minhas mãos, debatendo se devo ficar e ler ou simplesmente sair.

Não vou deixar que ele me intimide.

Com um retumbante humph, eu me coloco na cadeira, abrindo o livro e


começando a ler.

É só quando a sua risada se intensifica que eu olho para cima.

— O que? — A palavra sai um pouco brusca. Ele se levanta, vindo


sentar no apoio de braço da minha cadeira, olhando para o meu livro.

— Vejo que você não tem mais medo de cair no meu feitiço, — ele zomba.

Fecho o livro e coloco-o ao meu lado, virando-o para que eu possa olhá-
lo nos olhos.

— Você se aproveitou do meu estado embriagado, — eu acuso.

— Oh, agora você admite que estava bêbada, não enfeitiçada, — o lábio
dele está tremendo de diversão, e isso só serve para me deixar mais irritada.

— Por que você gosta de me atormentar tanto? — Eu pergunto a ele,


minha expressão séria. Às vezes me vejo exausta por nossas interações.
— Porque você é tão fácil de irritar, — ele me surpreende movendo-se
para o chão, na minha frente. Uma mão vai para o meu rosto, escovando
meu cabelo para o lado. — Por que você gosta de sempre ir contra mim? —
Ele retalia com uma pergunta própria.

— Porque a vitória é doce. — Eu empurro meu queixo para cima, pronta


para não transparecer qualquer fraqueza.

— Você sabe, — ele começa, a mão ainda no meu rosto e segue


suavemente pelo meu pescoço. É como se algo dentro de mim acendesse com
esse mero gesto.

Meu Deus! Meu corpo estragou?

— Submeter-se não é perder. Você verá que o resultado final pode ser
muito mais doce... como ontem à noite, — diz sugestivamente, lambendo os
lábios. Meus olhos se aproximam de sua boca e imagens da noite passada
atacam minha mente e meu corpo.

Sua mão continua a deixar um rastro de chamas, diminuindo, até eu


pegá-la.

— Pare com isso, — sussurro, minha voz carece de convicção.

— Por que você precisa lutar comigo com unhas e dentes? — A


brincadeira se foi, seu tom sério.

E então eu respondo a ele com sinceridade pela primeira vez.


— Porque é a única coisa que posso controlar, — minha voz é baixa
quando admito isso, e seus olhos escurecem. Eu olho para longe, não
querendo que veja a vulnerabilidade refletida no meu olhar.

— Allegra, — a sua mão é gentil na minha mandíbula me persuadindo


a olhar para ele, — o que você quer dizer?

Toda pretensão se foi, e pela primeira vez sinto que ele pode me levar a
sério. Eu respiro fundo.

— Você não tem ideia de como é crescer com más influências, porque só
então você seria puro o suficiente para o seu futuro marido. Ter alguém
restringindo a maneira como você se veste, come e até pensa. Você quer
saber por que todo mundo estava tirando sarro do meu sotaque? Porque
nunca tive uma lição adequada de inglês na minha vida. Tudo o que aprendi
foi lendo, e até isso foi proibido para mim. Meus pais queriam me
transformar na noiva perfeita — infantil e ignorante.

— Eles claramente não tiveram sucesso, — acrescenta Enzo sob o


fôlego, e eu tiro a mão dele. — Desculpe, — diz ele, mas ele não parece nem
um pouco arrependido.

— Eu nunca fui autorizada a fazer o que eu queria.

Enzo parece pensativo por um momento antes de perguntar.

— Então por que você ficou tão desanimada que se casou comigo em vez
de Franzè? Não é como se ele tivesse lhe dado qualquer liberdade.
— Porque pelo menos não teria sido tudo por nada! — As palavras estão
saindo da minha boca antes que eu possa detê-las. — Pelo menos eu teria a
aprovação dos meus pais.

— Você percebe que nada que você fizesse poderia ter conseguido a
aprovação deles. Deus, Allegra, eles só queriam usar você. Acha que eles
teriam feito alguma coisa no minuto em que veriam seu corpo machucado e
agredido, porque confie em mim, Franzè é a coisa mais distante de um
homem gentil. — Reconheço a verdade em suas palavras, mas isso não
melhora.

— Então eu deveria apenas agradecer, é isso, certo? — Eu rio com raiva.


Ele ainda não entendeu.

— Eu não sou seu inimigo, Allegra. Eu nunca fui.

— Mesmo? — Eu me inclino para trás, arqueando uma sobrancelha


para ele, — então parece que estamos em um impasse.

— Nosso mundo não permite muitas liberdades, especialmente para as


mulheres. Mas eu não sou seus pais, nem sou Franzè. Não quero que você
morra de fome e nem quero restringir seus pensamentos, por acaso gosto
deles, — ele me dá um leve sorriso, — estamos no mesmo barco agora e, para
o bem ou para o mal, estamos amarrados para sempre.

— Isso não significa que eu tenho que gostar, — resmungo, minha


reserva de argumentos se esgotando a cada segundo.
— Não, mas talvez possamos tirar o melhor proveito disso. Então, como
uma oferta de paz, diga-me, o que você quer fazer?

Eu olho para ele, minha mente subitamente congelando.

O que eu quero?

— Eu... — Eu começo a entrar em pânico. Eu tenho minha lista de


desejos, certo? Ir à ópera, a um museu, dirigir um carro, comer tudo o que
eu quero... tantas coisas, por que não posso escolher apenas uma?

— Vamos fazer assim, — Enzo coloca minhas mãos nas suas, com os
olhos focados nos meus, — todos os dias faremos algo novo, algo que você
quiser. Como isso soa? — É como se ele estivesse lendo minha mente,
percebendo que há tantas coisas que quero fazer que não posso
simplesmente escolher uma.

— Ok, — aceno devagar, um pouco chocada com o resultado da nossa


conversa. Na melhor das hipóteses, pensei em gritar mais alguns insultos
para ele e, na pior das hipóteses, enfrentá-lo no chão.

— Bom, — ele se levanta e faz outra coisa que me surpreende


profundamente. Ele beija minha testa.

Observo com admiração quando ele volta ao escritório, pegando o jornal


novamente e lendo, como se nada tivesse acontecido. Como se não tivesse
acabado de virar meu mundo inteiro de cabeça para baixo.
Perigoso. Ele é perigoso, e não apenas para o meu corpo, mas também
para o meu coração.

Não quero gostar dele, porque ele representa tudo o que odeio neste
mundo. Mas por que não consigo odiar?

Porque ele não se encaixa dentro da caixa.

Enzo pode ser cruel e arrogante em um momento, mas gentil e


carinhoso no próximo. Há uma dualidade nele que faz pouco sentido.

Você quer conhecer ele.

Não! Eu certamente não. Eu tento empurrar minha voz interior para


fora do caminho. É melhor se eu ficar desapegada. Mesmo quando ele olha
para mim com aqueles olhos sensuais...

Balanço a cabeça, tentando dissipar esses pensamentos. Não me fará


nenhum bem insistir neles.

Pegando o livro, concentro-me em ler novamente. Em algum momento


eu cochilo, porque quando acordo já está escuro lá fora.

Eu estico um pouco e um cobertor cai do meu corpo.

— Levante-se e brilhe, little tigress, — Enzo me cumprimenta, movendo


uma mesa cheia de comida na frente da minha cadeira.
— Para mim? — Peço suavemente enquanto pego tudo na mesa. É um
banquete digno de uma rainha.

— Coma, — ele me pede, mas eu já estou à frente dele, enchendo minha


boca com os pães quentes. — Ei, calma, ninguém está tirando isso de você,
— ele tenta me tranquilizar, mas eu já passei do ponto de parada agora.

Não quando sua mãe se certificou de que eu recebesse apenas o mínimo


necessário para sobreviver.

— Calma, — sua mão acaricia meu cabelo suavemente enquanto ele me


observa comer com gosto.

— Obrigada, — eu consigo dizer entre mordidas. Agora que a reação


inicial está acabando, lembro-me daquela vez em Agrigento e de como fiquei
enjoada depois. E seria uma pena desperdiçar esse alimento...

Eu diminuo a velocidade, mas ainda não paro.

— Por que você está sorrindo? — Eu franzi a testa enquanto o pego


olhando para mim.

— Gosto de ver você comer, — ele responde, e por um momento me


pergunto se isso deveria ser para nós dois. Meus olhos se arregalam de
medo, a perspectiva de ter que compartilhar minha comida me
aterrorizando.
Ele percebe minha reação porque rapidamente altera que é apenas para
mim.

Meus lábios se espalham em um sorriso.

— Você pode ter isso. Somente isto. — Eu relutantemente empurro o


último pão em sua direção.

Suas sobrancelhas disparam na minha oferta, mas ele não a recusa.


Continuo comendo, mas também o vejo morder lentamente o pão, com a boca
se encaixando ao redor.

Ainda estou de boca aberta e assisto ao erotismo desse pequeno gesto.


Isso me lembra a noite passada, a maneira como ele também se
banqueteava...

— Cuidado, — diz ele, com a mão pegando o pedaço de comida caindo


da minha boca.

Bem, se ele não estivesse com nojo de mim antes... ele com certeza está
agora.

No dia seguinte, eu tento encontrar uma boa roupa para o que Enzo
planejou. Eu tinha acordado com uma nota ao meu lado, onde ele detalhava
o que tinha em mente hoje — me ensinar a dirigir. Eu tinha dito a ele
algumas das coisas que sempre quis fazer, mas apesar de toda a sua
conversa doce, não considerava que pudesse me agradar. Especialmente
depois que eu fechei a porta do quarto na cara dele na outra noite.

Podemos estar começando a nos dar bem, mas não vou ceder a ele só
por causa disso.

Acho um par de calças que parece aceitável e adiciono um suéter, pois


está muito frio lá fora. Quando me sinto pronta, saio do quarto, indo para
onde Enzo está me esperando em seu carro.

Quando estou prestes a sair de casa, esbarro em Lucia e meu dia


imediatamente azeda.

Eu tento ignorá-la quando passo, mas ela agarra minha mão, sua boca
perto da minha orelha.

— Você não é a primeira que ele levou naquela cama, — ela sorri para
mim, um sorriso insidioso que me deixa enjoada. Me empurrando, ela sai,
suas palavras ainda cambaleando no meu ouvido.

Do que ela está falando? Como ela sabe?

Ando distraidamente até a frente da casa onde Enzo já está me


esperando.

Eu olho para ele. Ele está vestindo um jeans preto e um suéter de malha
azul marinho. Mesmo no meu estado confuso, posso concordar que Enzo tem
um físico sonhador. Seus músculos estão inchados mesmo através do
material espesso do suéter, com os ombros largos e afinando em uma cintura
estreita. E depois há suas coxas... Meu olhar segue o contorno natural de
seu corpo e engulo com força.

Você não é a primeira que ele levou naquela cama.

— Acabou de olhar? — O canto da sua boca se levanta e ele abre a porta


para eu entrar no banco do motorista.

Eu nem respondo, as palavras de sua mãe brincando em minha mente


em repetição.

O que ela quis dizer?

— Allegra! — As palavras de Enzo finalmente se registram. Ele está


franzindo a testa para mim e eu tento tirar minhas dúvidas.

Pela primeira vez, não quero discutir.

— Você está assustada? Não é muito difícil... — ele explica o que tenho
que fazer, detalhando cada passo. Eu vou me concentrar, acenando com a
cabeça.

— Obrigada, — acrescento quando ele termina, e me presenteia com


um daqueles sorrisos perversos.

Droga! Por que meu coração está ficando louco?


Limpo minha garganta, tentando parecer não afetada. Desde daquela
noite, me vejo tendo pensamentos muito sujos sempre que o vejo.

Ok, mesmo quando estou sozinha, mas eles são mais intensos quando
ele está ao meu lado.

Antes, eu tentava muito desconsiderar sua aparência perfeitamente


esculpida, ou como uma pequena covinha se forma quando ele sorri, ou
mesmo como seus olhos parecem brilhar quando encontra algo divertido, o
verde de suas íris se tornando mais profundo e mais impressionante.

Agora? Eu mal consigo tirar meus olhos de suas mãos, com a maneira
como suas veias se projetam visivelmente quando está flexionando seus
músculos, o ligeiro recuo me fazendo cerrar minhas coxas juntas, a memória
de antes ainda fresca. Aquelas mesmas mãos me acariciaram e passearam
em lugares que eu não fazia ideia que poderiam ser tocados assim. E de
alguma forma ele acendeu um fogo em mim que ameaça se tornar um
inferno.

Deus!

Eu pisco duas vezes, ciente de que ele tem dito algo esse tempo todo e
eu só fiquei olhando para as suas mãos, pensando em como seria ter os dedos
dentro de mim novamente...

— Sim! — Eu bato, meus olhos arregalados na direção dos meus


pensamentos. Deliberadamente, estou me tornando devassa. E o sorriso de
conhecimento que aparece em seu rosto me faz suspeitar que ele sabe
exatamente o que eu estava pensando.

— E você segura com força, envolvendo a mão ao redor da cabeça, — ele


continua e eu apenas aceno, perdida novamente em seus olhos.

— Vamos ver o que você tem. — Isso sai do nada, e eu olho para ele de
surpresa.

Eu mexo no meu assento, colocando o cinto de segurança, e então tento


me lembrar de algumas das coisas que ele estava dizendo. Felizmente, ele
lista suas instruções novamente, e eu sigo.

Meu pé na embreagem, coloquei o carro na primeira marcha,


observando com admiração quando ele começa a se mover. Dirijo-o em
direção aos portões e logo estamos na estrada.

— Gentil com a embreagem, — comenta Enzo, com o olhar focado na


estrada, — agora mude para o segundo.

Faço o que ele diz e, à medida que acelero, consigo colocá-lo na terceira
marcha.

— Uau! — Eu exclamo enquanto sinto a adrenalina correndo por mim.

— Calma, não vamos ficar muito confiantes. — Enzo observa quando


meu pé empurra um pouco demais no pedal do acelerador.
— Isto é... — Eu deixo escapar, palavras falhando. Sinto lágrimas se
acumulando no canto dos meus olhos, sobrecarregadas por sentimentos de
liberdade.

— Eu sei, — Enzo sorri e eu o devolvo timidamente antes de retomar


meu olhar para a estrada.

Do nada, porém, algo aparece no meu campo de visão e eu entro em


pânico, batendo na embreagem e no freio ao mesmo tempo. É tão repentino
que não sei exatamente o que acontece, mas em um momento estamos a toda
velocidade, e no próximo o carro para e eu sou jogada para a frente, o cinto
de segurança é a única coisa que me impede de colidir com o volante.

— Porra! — Ouço Enzo exclamar, mas todo o meu corpo ainda está em
choque, mal se movendo.

— Little tigress? Allegra? — As palavras dele se registram no meu


cérebro, mas é como se eu não pudesse responder. Ele sai do assento, se
aproximando para abrir minha porta e desfazer meu cinto de segurança.
Estou tremendo neste momento, e ele me pega em seus braços, me
abraçando no peito.

— Shh, — ele acaricia meu cabelo com uma mão, o outro braço enrolado
firmemente em volta da minha cintura. — Estamos bem. Nada aconteceu.
— A sua voz é tão suave, tão gentil, e eu o espio através de cílios espessos,
tentando tirar algumas palavras.
— Não fale, — ele sussurra no meu ouvido, seguido por mais palavras
de segurança.

Um minuto se passa, e encontro forças para apertar o material do


suéter nas minhas mãos. Levantando a cabeça, encontro os seus olhos e vejo
genuína preocupação neles.

Ele se importa.

Pode ser apenas um ato, e se é assim, então ele é um ator brilhante.

Mas, ao ver o carinho inconfundível em seu olhar, faço o que mais me


ocorre naturalmente, empurro meus lábios nos seus para um beijo.

Ele se assustou a princípio, mas seus lábios se moldam perfeitamente


aos meus, sua boca se abrindo sobre a minha e aprofundando o beijo.

Ele é... conforto... e algo mais.


CAPÍTULO TREZE

Passam semanas e acho que até as provocações de Lucia se tornaram


sons suaves nos meus ouvidos. Não quando sinto que estou entendendo a
verdadeira felicidade pela primeira vez na minha vida.

Eu estava cética em relação a Enzo desde o começo, principalmente


porque tinha visto o perigo que ele poderia causar ao meu coração. E então
eu me fechei e tentei ignorar esses sentimentos estranhos crescendo dentro
de mim.

Até eu não poder mais.

Quando foi que comecei a vê-lo de maneira diferente?


Foi quando ele me defendeu na frente de sua mãe e Gianna, ou foi
quando seus pequenos gestos de bondade lenta, mas firmes começaram a
fazer meu coração bater mais rápido?

Mantemos nossos quartos separados por enquanto, passamos quase


todos os dias juntos. Até minha lista de desejos está chegando ao fim.

Na última semana, ele me levou ao MET10 e navegamos pelas galerias


juntos por horas. Eu nunca tinha percebido o quão conhecedor ele era na
história, e ele tinha um pequeno comentário para cada artefato que víamos.

Provavelmente a visita mais memorável foi a do Strand11, onde ele me


comprou nada menos que cinquenta livros. Eu enlouqueci quando vi tantos
títulos em um só lugar e não consegui me conter. Ele até me incentivou a
conseguir mais.

Eu tinha passado de um corredor para outro, emoção bombeando pelas


minhas veias enquanto encontrava mais um livro que me interessava. Eu
até peguei alguns romances, e desta vez ele não tinha tirado sarro de mim.

Com tantas coisas boas acontecendo comigo em um período tão curto de


tempo, tenho que me perguntar se não é um sonho. Eu nunca tive alguém
tão gentil comigo antes, com o objetivo de agradar todos os meus caprichos.

10 O Metropolitan Museum of Art, conhecido informalmente como The Met, é um museu de arte localizado
na cidade de Nova Iorque, Estados Unidos, sendo um dos mais visitados museus do planeta.
11 Livraria em New York.
Enzo, apesar de todo o seu charme superficial, é uma pessoa muito mais
complexa do que eu lhe dera crédito. E ainda sinto que mal estou
arranhando a superfície.

— Onde estamos indo? — Eu franzi a testa para ele enquanto me


conduz para fora de casa e em direção ao carro.

— É uma surpresa. — Ele pisca para mim, não tentando se explicar.

Leva um tempo para chegar à cidade e o carro para em frente a uma


loja colorida. Ele me ajuda a sair do carro e me leva para dentro.

No momento em que entro, percebo que é uma confeitaria, mas somos


os únicos clientes.

— O que é isso? — Pergunto quando ele me mostra uma mesa cheia de


doces sortidos, bolos e biscoitos.

— Eu sei o quanto você gosta de doces, então aluguei a loja por um dia.
Você pode tentar de tudo e comer de acordo com sua vontade.

Eu olho para ele maravilhada. Apenas quando pensei que ele não
poderia me surpreender ainda mais; ele vai e faz algo assim. Se ele
continuar sendo tão doce, então eu também poderia comê-lo.

Sentando-me, tenho dificuldade em decidir com o que começar. Eu tento


alguns dos pequenos biscoitos, meus olhos se fechando com um suspiro de
prazer pelo gosto celestial.
— Deus, Enzo, isso é incrível, — gemo dando uma mordida no bolo, o
sabor do chocolate estourando na minha boca.

— Estou feliz que você goste. — Ele está olhando para mim, um olhar
suave no rosto.

— Gostar é um eufemismo. — Eu mudo entre chocolate e baunilha,


tornando-me um pouco mais aventureira e experimentando outros sabores
também. Ele me pegou tudo: manga, framboesa, cereja e até alguns sabores
que nunca ouvi falar.

— Por que você não está comendo? — Pergunto quando vejo que não
tocou em nada.

— Estou esperando minha vez, — seus olhos brilham com travessura.

— Sinto muito, — saí, percebendo que tenho monopolizado tudo. —


Aqui, você pode ter um pouco, — empurro o prato com eclairs em sua
direção.

— Você terminou de comer? — Inclinando a cabeça para o lado, ele


levanta uma sobrancelha para mim, seu olhar quase predatório. Nossa, eu
não sabia que ele estava esperando que eu terminasse. Embora eu tenha
que admitir que é bastante cativante que ele não queira roubar minha
comida.

Tomo um momento para debater se realmente terminei, mas ao olhar


para o resto dos bolos, percebo que não posso dar outra mordida.
Por enquanto.

Acenando, espero que ele pegue. Em vez disso, ele se levanta, vindo
para o meu lado.

— O que você está fazendo? — Eu franzo a testa quando ele pega minha
mão e me puxa para fora do meu lugar. Ele não responde. Em vez disso, usa
um braço para empurrar os pratos para o lado, alguns deles caindo no chão
e quebrando.

Meus olhos se arregalam em choque.

O que ele está fazendo?

Um dedo segue minha perna, pegando com ele minha saia longa e
levantando-a nos quadris.

— Eu disse que é a minha vez agora. — Sua respiração está quente no


meu pescoço, seus lábios deslizando a pele sensível até que levante a cabeça
para me olhar nos olhos. Suas pupilas estão dilatadas, suas íris quase
negras, e eu me perco nessas profundezas.

Seus lábios estão em cima dos meus, permanecendo por um momento


antes de começar sua descida novamente.

— Você... — Eu me afasto quando percebo sua intenção e por que


insistiu que eu usasse a saia longa.
Ele prende os dedos sob a faixa da minha calcinha, deslizando das
minhas pernas e trazendo-a para o nariz, inalando profundamente.

A antecipação se constrói dentro de mim enquanto ele enfia minha


calcinha no bolso, piscando maliciosamente para mim.

Estou quase arrepiada quando minha mão pega sua mandíbula,


aproximando-o. O fantasma de um beijo não me satisfaz, não mais.

Nossas bocas se misturam, línguas lutando pela supremacia, mordendo


os dentes e mordiscando. Seu dedo desliza o creme de um profiterole,
trazendo-o para a minha boca e passando-o sobre o meu rosto. Sua língua é
rápida para limpar a bagunça lambendo e chupando, a frieza do creme
combinada com o calor da boca, melhorando o erotismo do beijo.

A umidade se reúne entre minhas coxas e eu as aperto juntas, querendo


aliviar o desconforto, buscando algo mais, mas sem saber o quê.

Há um vazio flagrante dentro de mim, e eu gostaria de nada melhor do


que ele o preencher.

— Por favor, — eu choramingo, meus punhos fechados em sua camisa,


segurando-o mais perto.

— Por favor, tigress? Eu quero suas palavras.

— Faça a dor desaparecer, — eu sussurro.


— Onde dói? — Suas mãos começam a seguir meu corpo, perto daquele
lugar que mais precisa dele. Uma respiração trava na minha garganta
quando ele para logo acima do meu umbigo.

— Aqui? — Ele pergunta com um tom rouco e eu balanço minha cabeça,


tentando guiá-lo mais baixo.

— Aqui? — Ele se move apenas uma polegada mais baixo e, embora a


provocação possa ser divertida para ele, para mim é pura tortura.

Minha mão desce sobre a dele, colocando-a descaradamente entre


minhas pernas.

— Você quer que eu acaricie sua boceta gananciosa? — As suas


palavras me deixam sem fôlego, e no momento em que sinto seus dedos no
centro, minha cabeça cai com um soluço. Ele está brincando com a minha
umidade, espalhando-a.

— Você está tão fodidamente molhada, tigress, — ele geme, inserindo


um dedo dentro de mim. Meus quadris quase pulam da mesa com a invasão
repentina, minha boca se abre em um gemido agudo. — Diga-me que é para
mim. Só para mim! — Suas palavras estão mordendo meu ouvido, seu tom
severo despertando em vez de me assustar.

— Sim, só para você. Por favor, — respondo prontamente, tudo para


fazê-lo se mover. A compulsão de tê-lo mais fundo, me enchendo ainda mais
me faz empurrar meus quadris contra a sua mão. Ele me deu meu primeiro
gosto de luxúria, e agora eu quero tudo.
Muito cedo, ele saiu do meu corpo. Abro os olhos, sentindo-me
inflamada e desolada. Ele está parado na minha frente, sua expressão uma
mistura de desejo e curiosidade, como se estivesse me vendo pela primeira
vez. Muito rápido isso muda, um sorriso lento e sensual se espalhando por
seus traços.

Ele traz o dedo para a boca, minha umidade ainda cobrindo o dedo. Ele
envolve os lábios em volta, chupando, e acho que nunca vi algo mais
tentador.

Meus mamilos estão dolorosamente eretos, eles também esperando por


sua atenção. Mas, por enquanto, eu só o quero de volta dentro de mim, um
desejo insano de prazer e dor que arrebatam meu corpo.

Deus, o que está acontecendo comigo?

Quero que me destrua, mergulhe em mim e me despedaça apenas para


me recompor. E de alguma forma, quando olho nos seus olhos, sei que ele
sente o mesmo.

— Enzo? — Eu pergunto timidamente quando vejo que ele está apenas


olhando para mim. Quero gritar com ele, implorar para que simplesmente
me leve, mas meu orgulho não me deixa seguir por esse caminho ainda.

Ele está de joelhos na minha frente, separando minhas pernas. Então


sinto sua língua, um longo golpe que me faz contorcer sob seu ataque. Suas
palmas estão na minha bunda, seus dedos cavando na minha carne
enquanto me aproxima para sua boca.
Ele envolve os lábios em volta do meu clitóris, provocando, chupando e
me fazendo me contorcer. Eu aperto seu cabelo, puxando-o enquanto ele
continua seu ataque, meus nervos formigando todas as sensações.

Ele enfia dois dedos em mim, um ataque apertado que me faz ofegar.
Ele os bombeia para dentro e para fora, com os dentes mordiscando o meu
clitóris e uma cascata de sentimentos descem sobre mim. Começa com um
leve tremor que se transforma em um estremecimento eletrizante de todo o
corpo. Eu me aperto ao seu redor, minha respiração arfante enquanto desço
do alto.

Ele não para, embora. Ele continua a trabalhar seus dedos dentro e fora
de mim, e logo eles imitam um movimento de tesoura.

— Auch, — estremeço, sentindo uma dor aguda. Eu puxo seu cabelo, o


prazer se foi e deixando apenas dor em seu rastro. — Enzo, — eu o empurro,
e finalmente ele se levanta, um traço de sangue nos lábios.

— O que... — Eu franzo a testa quando pega seus dedos, ambos cobertos


por uma mistura de minha excitação e sangue, e ele os lambe.

— Você é minha agora, Allegra. — A sua mão agarra minha mandíbula,


trazendo meu rosto a sua frente. — Sua virgindade é minha, — suas
palavras me confundem, mas não tenho tempo para debater sobre o que ele
está falando quando sua boca cai sobre mim. Na língua dele, eu me provo e
um gosto de ferro, o sangue da minha virgindade.
Ele agarra minha nuca e me segura, o ataque selvagem de seu beijo
mexendo com meus sentidos.

Isso deve estar errado.

E, no entanto, não pode ser. Não quando eu devolvo o beijo com força
total, levando-o entre minhas pernas abertas, minhas mãos indo para sua
calça.

Dor... mais dor e mais prazer.

Estou pronta para tudo o que ele tem a oferecer.

Eu cavo meus calcanhares na sua bunda, a protuberância em sua calça


entrando em contato direto com minha boceta encharcada.

— Por favor, — eu imploro, todos os outros pensamentos me deixando,


exceto ele.

Ele ri, com as mãos em cima das minhas para me parar.

— Isso é tudo sobre você, little tigress. Haverá tempo para mais. — Ele
diz, ainda acariciando meu pescoço, e não posso deixar de me sentir um
pouco decepcionada.

Mas ele está certo. Este é apenas o começo. E pela primeira vez, sinto
que talvez tenha sido tudo um jogo do destino, levando-me a esse homem
que eu não sentiria nada além de ódio.
Mas parece que sou obrigada a fazer o contrário.

Apesar de toda a vontade de Enzo para satisfazer todos os meus


caprichos, ele ainda se mantém distante. Claro, passamos um tempo juntos
todos os dias e nossas discussões contornaram tópicos como história, religião
e filosofia. No entanto, ainda não sei nada pessoal sobre ele.

E anseio que me deixe entrar.

Ele está me tratando melhor do que jamais alguém me tratou na minha


vida; melhor do que eu esperava que alguém o fizesse. Ele está
constantemente lá para me ouvir e realizar todos os meus desejos.

Mas e ele? Quem faz isso para ele?

Desde que reiniciamos nosso relacionamento, não falamos sobre


fidelidade, e não quero pensar que ele iria para outra mulher, não depois de
me tocar tão intimamente.

Dado quanto tempo está gastando comigo, eu nem vejo quando ele
encontraria tempo para procurar outra pessoa.

Mas ele não está deixando você tocá-lo...


Balanço a cabeça com os pensamentos intrometidos, a possibilidade
dolorosa demais para considerar.

Enzo está sempre me tocando e me trazendo prazer, mas quando eu


quero fazer o mesmo por ele, me rejeita.

— Apenas a visão de você gozando com meu nome nos lábios é suficiente
para me satisfazer, tigress, — ele sussurrava no meu ouvido antes de me
beijar e me fazer esquecer completamente o assunto.

E se ele não achar que você pode fazer isso?

Meus olhos se arregalam com a realização... E se ele não quiser que eu


toque nele, porque eu não sei como. Ele está buscando prazer nos braços de
alguém mais experiente? Alguém que conhece seu corpo?

Eu engulo com força, o pensamento fisicamente torturante.

Eu não queria admitir isso para mim antes, meu orgulho era o
impedimento número um, mas me apaixonei por ele, mais do que eu jamais
poderia imaginar. Ele começou a plantar as sementes desde que cuidou do
meu joelho ferido. Se meteu dentro do meu coração até permanecer alojado
lá.

E agora?
Agora sinto que posso morrer quando ele não estiver ao redor; quando
ele não estiver me tocando e sussurrando palavras ternas no meu ouvido.
Até seu apelido de little tigress cresceu em mim.

Estou me apaixonando por Enzo Agosti. E isso me assusta.

— Aqui, — ele aparece, passando-me um pouco de pipoca antes de se


instalar no sofá ao meu lado.

Ficamos trancados na sala de cinema o dia inteiro, assistindo a uma


maratona de filmes. Ele me apresentou alguns clássicos cult, e tivemos bons
debates que terminaram apressadamente no momento em que eu comentei
a boa aparência de um ator. Enzo foi rápido em me proibir de dizer o nome
de outro homem novamente.

— Faça isso de novo, little tigress, e talvez eu precise pedir um ataque.


— Eu ri, pensando que ele estava apenas brincando. Mas o olhar sério em
seu rosto me disse o contrário, então eu mudei de assunto.

Sua possessividade irracional pode ter me afastado no passado, mas


agora me vejo corando com suas proclamações de que sou dele. Porque
certamente, isso deve significar que se importa comigo.

— Obrigada, — respondo, deixando minha cabeça descansar em seu


ombro, meu braço entrelaçado com o seu. Ele dá meia volta, dando um beijo
suave na minha testa.

É durante momentos como esses que ele faz meu coração palpitar.
— Você sabe, — eu começo, enterrando nele e envolvendo meu braço em
volta da cintura, — apesar de toda a sua maldade, você pode ser bastante
doce. — Sorrindo timidamente, olho para cima, curiosa para ver sua
expressão.

— É mesmo? — Ele levanta uma sobrancelha, divertido.

— Você é, — acrescento com mais confiança, e ele esboça um sorriso.

— Somente para você, little tigress. Você não tem ideia de como eu sou
com todo mundo.

— Como? — Eu pergunto antes que eu possa pensar. Não quero que ele
me diga como está com outras mulheres. Segurando-me quieta, aguardo sua
resposta.

— Você é a única que consegue ver esse lado de mim, — ele responde
antes de alterar, — a única que merece. — Eu franzi a testa com a escolha
de suas palavras.

Merece.

Estou prestes a perguntar o que quer dizer com isso, mas então ele
continua.

— Os outros pegam o monstro que eles criaram. A única diferença é que


eles nunca vêem isso acontecer.
Suas palavras enigmáticas me dão uma pausa, e eu quero questioná-lo
ainda mais, mas quando o filme começa, fico cativada pela ação na tela.

Mais tarde, a porta da sala de cinema se abre e as luzes se acendem.


Nós dois lutamos para nos levantar, apertando os olhos para nos
acostumarmos com a luz repentina.

Uma sombra riscada de Lucia corre em direção a Enzo, abraçando-o e


chorando. Enzo congela, com as mãos paradas pelo corpo.

Não sei o que está acontecendo, e Lucia não parece dizer muito além de
lamentar e chorar o que quer que esteja a afetando.

Um olhar de puro horror atravessa o rosto de Enzo enquanto ela


continua movendo as mãos por todo o seu corpo, e eu decido que é o
suficiente.

Agarrando o braço dela, eu a puxo dele, tomando meu lugar ao seu lado.
Ele solta um suspiro de alívio e seus músculos relaxam imediatamente, não
que eu não possa me relacionar, já que Lucia não é a pessoa mais agradável.

— O que é, mãe? — A voz dele é grave e afiada quando se dirige à mãe,


e ela rapidamente cai no chão, continuando a chorar.

— Sua irmã... — ela começa soluçando, — Romina está morta.

Enzo congela.
— Como assim, ela está morta?

— Eles a encontraram, — mais soluços, — nua e espancada. O marido


dela está sob custódia.

O rosto de Enzo se transforma diante dos meus olhos, e ele empurra


minha mão para longe, dando um passo para colocar alguma distância entre
nós.

— Você está me dizendo, — a voz dele faz com que um arrepio desça na
minha espinha e eu instintivamente dou um passo atrás. — Que meu
cunhado matou minha irmã?

— O que devo fazer? Minha filha! — Os soluços de Lucia estão ficando


mais altos, mas tudo o que me importa é Enzo, estar aqui para ele.

Enquanto vou em sua direção, para oferecer-lhe algum conforto, ele foge
do meu toque, saindo da sala.

Estou enraizada no local, olhando para a figura em retirada e sem saber


como proceder.

— Vadia, — a transformação de Lucia é repentina quando enxuga as


lágrimas, seu sorriso diabólico retornando com força total.

Deus, esta é uma mulher que acabou de perder sua filha?


Ela me arrasta quando sai, me jogando no chão. Mal tenho tempo de
parar minha queda e meu cotovelo pega em um dos assentos, minha pele
rasgando em uma barra de metal. Meu rosto se contorce de dor e minha mão
vai para a minha ferida recém-sangrenta, tentando aplicar alguma pressão
para aliviar a dor.

— Você acha que ganhou, não é? Mas você não conhece Enzo como eu.
Em breve você estará fora desta casa e nas ruas. — Ela ri da minha
expressão dolorida, e eu mal evito o chute destinado ao meu estômago.

— Vamos ver, Lucia, — grunhido quando ela sai da sala.

Não vou cair facilmente. E quando Enzo estiver de luto por sua irmã
morta, eu estarei lá para confortá-lo.

Eu sinto a chuva nos meus ossos, mesmo que o guarda-chuva faça um


bom trabalho ao proteger meu corpo. À margem, só posso assistir à
cerimônia antes que eles ponham Romina no chão. A família mais próxima
está sentada ao lado do caixão, todos com expressões tristes e desoladas no
rosto. Todos, menos Enzo, é isso. Seu rosto é sombrio, suas feições não
revelam nada.
Comparado com Lucia, que lamentava, ou mesmo com Rocco, você o
consideraria o homem mais insensível presente, o irmão que não derrama
lágrimas por sua irmã.

Mas posso ver que é apenas uma máscara para o mundo. Lá dentro, sua
dor está ameaçando se espalhar e pode ser a dor mais genuína do grupo.

Faz três dias desde o pronunciamento, e eu mal vi meu marido. Todo


mundo esteve em casa, se reunindo para o funeral e acordando e
transformando um evento trágico em um evento alegre.

Eu testemunhei Rocco ficando bêbado com seus amigos, suas vozes


crescendo em casa, a memória de Romina nada mais que um pensamento
passageiro. Ele estava com raiva, mas não porque sua preciosa filha havia
morrido, mas porque os interesses da família haviam morrido com ela.

Valentino Lastra, marido de Romina, havia sido levado para


interrogatório, e espalhou-se a notícia pela casa de Agosti de que eles
estavam oficialmente em guerra com Lastra.

Pelo que eu havia reunido, Rocco costumava fazer isso porque Lastra
era um de seus principais distribuidores, mas as aparências ditavam
respeitar a honra da falecida e vingar sua memória. E, com tanta relutância,
Rocco também seguiu seus colegas ao denunciar Lastra.

Apenas Enzo estava quieto. Observando, mas não realmente


interagindo. Ele foi o primeiro no necrotério e o último a sair depois que o
corpo de Romina foi enviado para a funerária.
E até agora, ele não disse uma palavra.

No entanto, vejo uma profunda decepção brotando dentro dele, e me


sinto impotente para fazer qualquer coisa, exceto esperar e assistir.

Eu tinha visto sua atitude em relação a Catalina e o carinho que ele


tem por ela, então só posso supor que ele tem os mesmos sentimentos por
suas outras irmãs, mesmo as mais velhas.

Os convidados prestam seus últimos respeitos e, finalmente, o caixão


de Romina é abaixado no chão. Lucia corre para o buraco, chorando e
gritando com a injustiça de tudo.

Enzo ainda está enraizado no local, olhando para a terra fresca que
cobre a sepultura. Mesmo quando todo mundo sai, ele ainda está lá, a chuva
caindo lentamente sobre ele.

— Enzo? — Eu ando para o seu lado, preocupação me comendo. Nunca


o vi assim e não sei o que fazer para ajudá-lo.

Ele não responde, nem reconhece minha presença.

Sento-me ao seu lado, a tristeza do clima enfatizando apenas o vazio


interior.

— Eu também falhei com ela, — suas palavras são quase inaudíveis. —


Eu a vi, você sabe... — ele começa a falar, e a dor em sua voz é inconfundível,
— seu corpo estava danificado e cheio de contusões. Eu fiquei pensando...
que louco faria isso com alguém tão doce quanto Romina? — Ele balança a
cabeça, engolindo com força.

— Não é sua culpa. — Como ele poderia pensar em se culpar?

— Não é? Jurei protegê-las e, no entanto, não consegui. Primeiro Lina,


e agora... — ele deixa escapar e quando eu levanto meu olhar para olhá-lo,
ele joga seu guarda-chuva no chão. Cabeça erguida, olhos fechados, chuva
está pingando lentamente por todo o rosto. Mas é apenas chuva, ou também
é...?

Há tanta raiva irradiando dele que tenho medo de me aproximar,


preocupada por poder fazer algo para desencadeá-lo. Mas eu não posso, não
vou. Eu preciso mostrar a ele que não está sozinho.

Ele ainda me tem.

Abandonando meu guarda-chuva no chão, eu me preparo quando as


gotas frias de chuva atingem minha pele, enxarcando no meu cabelo.
Aproximo-me e deslizo a mão na dele.

Leva um segundo, mas ele dá um aperto rápido na minha mão,


levantando-a e trazendo-a aos lábios para um beijo suave.

Ficamos assim por mais tempo, envolvidos um no outro e na chuva, sem


falar. Eu olharia para trás mais tarde e reconheceria isso como o momento
em que Enzo mudou radicalmente.
Eu pensei que tínhamos estabelecido uma conexão, mas com o passar
dos dias, Enzo fica ainda mais fechado. Nas poucas vezes em que o vejo de
passagem, está sempre bebendo.

Quero falar com ele e tirar a mente da dor, mas não sei como.

Suspirando, fecho o livro que estava lendo, levantando-me para andar


em frente à minha janela. Ele provavelmente está escondido em seu
escritório, bebendo ainda mais. Eu ainda não tive coragem de entrar lá, mas,
como ele não tem intenção de me dar uma brecha, terei que fazer uma para
mim.

Eu já tinha devorado a maioria dos livros que compramos do Strand,


incluindo os romances. Agora, pensando no que eu tinha lido naqueles,
minhas bochechas ficam vermelhas, mas minha determinação se fortalece.

Talvez eu não possa fazer nada para tirar o sofrimento dele, mas posso
ajudá-lo a esquecê-lo por um curto período de tempo, como ele fez comigo.

Puxando um robe sobre minha camisola, desço as escadas. A casa está


assustadoramente tranquila, como Lucia e Rocco haviam saído em uma
viagem, então não tenho preocupações de que encontrarei por nenhum
deles.
Esperando que ele tenha deixado a porta destrancada, eu giro a
maçaneta e abro a porta.

Com apenas algumas luzes acesas, a sala está quase envolta na


escuridão. Ao entrar, consigo distinguir o contorno do corpo de Enzo,
encostado na cadeira, uma garrafa de álcool e um copo vazio ao seu lado.

Estou hesitante enquanto ando em sua direção. Ele está olhando para
o espaço vazio e mal reconhece minha presença.

Parando ao lado, coloquei minha mão no seu ombro.

— O que você quer, Allegra? — Sua voz é áspera, seus olhos olhando
para qualquer lugar, menos para mim. Tirando um maço de cigarros, ele
coloca um na boca, acendendo-o e inalando profundamente.

— Eu estava preocupada.

— Preocupada... — Ele sorri cruelmente, pegando três tragos


consecutivos de seu cigarro e soprando uma enorme nuvem de fumaça.

— Vá dormir, Allegra. Isso não lhe diz respeito.

— Enzo... — Eu pego seu rosto em minhas mãos, forçando-o a olhar


para mim. — Não há problema em lamentar, mas por favor não me exclua,
— minha voz treme de incerteza, especialmente quando vejo a desolação nos
olhos dele.
Eu acaricio sua bochecha com ternura, querendo mostrar o quanto ele
significa para mim.

— Você pode se apoiar em mim, — acrescento, quase nervosa quando


ele não responde.

Pego o cigarro da sua mão, colocando-o no cinzeiro da mesa.

Enzo ainda está me observando atentamente, esperando para ver o que


faço a seguir.

Antes de perder a confiança, inclino-me e pressiono meus lábios nos


seus. Ele está imóvel sob mim, então eu tento persuadir uma resposta dele.
Abro a boca e tento aprofundar o beijo. O sabor do uísque e do cigarro reveste
minha língua enquanto eu sondo mais fundo, tentando colocar nesse beijo
tudo o que estou sentindo; tentando tirar sua dor com o meu amor.

Ele ainda não está respondendo, e olhos semicerrados me olham


desinteressadamente.

— Diga-me como posso melhorar, — sussurro entre beijos, — como


posso aliviar a dor.

Inclinando a cabeça para o lado, ele diz as duas palavras que não quero
ouvir.

— Você não pode.


Aproximando meu corpo do seu, não desisto. Enfiei meus braços em
volta do seu pescoço e o montei, uma perna de cada lado. Meu centro está
bem acima da protuberância dele, e posso dizer que ele não está totalmente
afetado. Ainda assim, ele não faz nada além de me assistir, esperando para
ver qual será meu próximo passo. Eu quase choraminguei com o contato,
sentindo-o com força debaixo de mim, mas tento ignorar minha própria
excitação crescente.

Isso é tudo sobre ele.

Sua camisa branca está meio desabotoada na gola, e eu vislumbro seu


peito. Deslizando minhas mãos para baixo, eu me atrapalho com os outros
botões, espalhando minhas palmas sobre a sua pele.

— Você deveria ir, Allegra. — Sua voz está baixa, seus olhos se
desenrolam.

Continuo a beijá-lo, minha boca seguindo uma trilha no pescoço,


imitando o que ele havia feito comigo no passado.

— Deixe-me entrar, — sussurro, mordiscando a orelha dele. — Estou


aqui, Enzo. Me deixe entrar.

Ele ainda não responde. Como uma estátua, imóvel, apenas me observa
com desinteresse.

Tornando-me mais ousada, tirei meu roupão, permanecendo apenas na


minha camisola transparente. Pela primeira vez, detecto um traço de
interesse enquanto seus olhos se concentram nos meus mamilos. Eu me
inclino para a frente, escovando meu peito contra o seu, quase incapaz de
conter um gemido enquanto sinto o leve atrito.

— Vá, — ele diz através dos dentes cerrados, seu corpo rígido contra o
meu.

— Enzo, amore. — Eu sussurro, sofrendo por ele, sofrendo com ele.

Minhas mãos se movem mais baixo, meu único objetivo de dar a ele o
mesmo prazer que me deu inúmeras vezes. Posso não saber o que fazer, mas
tenho certeza de que posso gerenciar alguma coisa. Meus dedos deslizam
sobre o zíper de sua calça, sua dureza inconfundível. Eu abro o zíper e fecho
minha mão em torno dele.

Um suspiro me escapa tentando envolver meus dedos ao redor dele,


surpresa com o tamanho e a textura, veludo quente pulsando contra a palma
da mão. Eu o acaricio levemente, observando seu rosto para qualquer pista.

— Deixe-me fazer você se sentir bem, Enzo, — nossos rostos estão


juntos, nossa respiração se misturando. Mas quando as palavras saem da
minha boca, seus olhos se arregalam, a primeira reação visível. Todo o seu
corpo está sob mim, congelado por um segundo.

Eu franzo a testa, com medo de ter feito algo errado.

Do nada, sua mão dispara, seus dedos enrolando na minha garganta e


parando meu fluxo de ar. Um momento estou no seu colo, no outro estou
contra a parede, meus pés um pouco acima do chão. Lágrimas se juntam no
canto dos meus olhos enquanto eu balanço minhas mãos, tentando tirá-lo de
mim.

Sua boca se enrola nos cantos de uma maneira sádica.

Este não é o Enzo... Este não pode ser o mesmo Enzo!

— Allegra, Allegra, — ele faz um som tsk, mas seu domínio sobre mim
é suficiente para que eu possa respirar corretamente. — Eu realmente
pensei que você seria diferente.

— O que você quer dizer? — Eu digo, e um sorriso cruel se estende por


seu rosto.

— Você é realmente patética, não é? — Ele reflete, me estudando com


nojo. — Eu me perguntei quanto tempo você duraria. Quanto tempo até
abrir suas perninhas sagradas para mim. Mas eu não sabia que bastava um
minúsculo de pouco de atenção.

— Enzo, isso não é engraçado, — acrescento, meus lábios tremendo.


Mas, mesmo que eu espero que seja apenas uma piada de mau gosto, o seu
rosto me diz que não.

E está me matando por dentro.

— Você está tão ansiosa para pular no meu pau que nem é mais
divertido, — ele continua zombando de mim, trazendo um dedo para
acariciar minha bochecha. — Eu não tinha percebido que você seria tão fácil.
Você realmente achou que eu estaria interessado em você? — Ele levanta
uma sobrancelha para mim, mas eu não respondo. Quanto mais ele fala,
mais eu luto para manter minha compostura, para não explodir em lágrimas
e dar a ele a satisfação de me ver machucada. Porque é exatamente isso que
ele está tentando fazer.

— Você realmente achou que eu estaria interessado em uma pobre


garota da aldeia que não passou de uma fonte de vergonha? — Eu balanço
minha cabeça para ele, meus dedos envolvendo sua mão e tentando soltar
do meu pescoço.

Eu não posso ouvir isso...

— Conte-me, esposa, você se olhou no espelho? Você sabe, aquele vidro


reflexivo que mostra como você é, — o seu sorriso aumenta, sabendo que ele
atingiu a marca com uma das minhas inseguranças.

— Sim, e por acaso gosto do que vejo, — respondo, tentando conter toda
a dor que estou sentindo. Não vou deixá-lo vencer.

Ele ri, todo o seu corpo tremendo com uma hilaridade inexistente.

— Você deve ser a única, — ele continua a torcer a faca no meu coração.
Eu pisco duas vezes, as lágrimas quase forçando a saída.
— Eu tenho que dizer, foi divertido enquanto durou, mas não consigo
mais reunir o interesse. Talvez se você mantivesse as pernas fechadas por
mais um pouco... — ele sai, a mão deslizando pelo interior da minha coxa.

Empurro-o, chutando e socando, até que sua mão desapareça da minha


garganta.

Eu caio no chão, minha respiração esfarrapada, meu coração em


pedaços.

Olhando para ele através de cílios enevoados, só vejo um homem


presunçoso se gabando de fazer de boba a camponesa.

— Eu vou te contar algo, — ele se ajoelha na minha frente, o dedo


empurrando minha mandíbula para cima, então eu estou olhando para ele.
— Eu ganhei um iate novinho em folha com sua rendição fácil. Por que você
acha que eu fui tão legal com você? — Ele ri suavemente. — Pensou que
uma mulher como você seria capaz de me interessar?

Divertido, ele balança a cabeça, levantando-se e indo para a porta.

— No lado positivo, eu posso parar de fingir agora e voltar para minhas


merdas regulares, já que, — ele me olha com desagrado, — você nem vale a
pena.

Ele sai da sala em algum momento. Eu permaneço na mesma posição,


olhando para a porta agora fechada.
O que aconteceu?

Mesmo quando tento racionalizar tudo, há apenas uma resposta.

Ele brincou comigo.

Como eu suspeitava que faria. E, no entanto, mesmo com aquela voz


pequena me dizendo que, de fato, por que um homem como Enzo olhava para
alguém como eu, escolhi ignorar tudo.

Pela primeira vez na minha vida, alguém tinha sido gentil comigo e,
como um cachorro vadio, fiquei apaixonada pela mão que me alimentou.

Eu sou realmente patética, não sou?


CAPÍTULO QUATORZE

Deixe-me fazer se sentir bem, Enzo.

As palavras continuam repetindo na minha cabeça, e não importa o


quanto eu tente, não consigo fazê-las parar.

Por que ela teve que dizer essas palavras exatas?... Por quê? Isso
desencadeou algo em mim que eu consegui manter engarrafado por anos.

Eu quebrei. E as palavras saíram da minha boca. Eu queria machucá-


la, alcançá-la profundamente dentro dela e fazê-la me odiar — para sempre.

Mas o seu rosto... tão cheio de desolação, provavelmente me machucou


mais do que ela.
Chegando ao meu quarto, tranquei a porta atrás de mim, me refugiando
prontamente na garrafa de uísque que guardo na gaveta.

Minha única esperança é escapar, mas à medida que bebo cada vez
mais, as memórias ficam mais claras do que nunca.

NOVE ANOS

— Você não está bonito em seu terno? — A senhora na minha frente,


seus olhos vagando avidamente pelo meu rosto e corpo. Inclino a cabeça para
o lado, mas não digo nada. Quando não respondo à sua óbvia tentativa de
obter uma resposta subserviente de mim, ela me dá um tapa na cara.

— Criança podre, você pensa que é muito melhor que todos, não é? —
Seus lábios puxam uma linha fina.

Eu não luto contra isso. Eu aprendi a nunca lutar contra isso. Não é a
primeira vez que ela tenta me causar uma reação com violência.

— Saia da minha vista! Já tive o suficiente de você por hoje. — Ela me


dispensa com um aceno de mão e eu não permaneço.

Sra. Woods não é uma mulher gentil, por tudo que ela gostaria que as
pessoas acreditassem de outra maneira. Todo mundo na escola a ama
porque só vê seu lado encantador. Mas quando alguém a atravessa, ela deixa
de ser legal.

Tudo começou quando eu estava indiferente aos seus elogios. Quando


ela viu que eu não tinha batido um olho, nem disse obrigado ou devolvi o
elogio, ela começou a me insultar. Tornou-se habitual que comentasse sobre
minha aparência, ainda esperando que eu sorria ao seu redor, antes de
terminar tudo com um cenário, exatamente como ela fez agora.

Suspiro enquanto vou para o final da fila.

Não é como se eu fizesse isso de propósito, mas aprendi a diferenciar


quando as pessoas são genuinamente legais comigo ou quando tentam
conseguir alguma coisa. E a senhora Woods gostaria de nada além de estar
nas boas graças dos meus pais.

Todos os meus colegas de classe estão alinhados enquanto nos


preparamos para subir ao palco, nossa peça de final de ano pronta para
começar.

Desde que eu fui rude com ela uma vez antes, me ofereceram o papel
com menos falas. Mas não estou reclamando, pois preferiria não ter feito a
peça. Eu odeio quando os holofotes caem sobre mim, e todo mundo começa a
elogiar meu rosto.

É como se eles nunca vissem qualquer coisa exceto meu rosto.


Sou o melhor aluno da minha turma, mas ouvi os rumores — meus pais
pagaram por isso ou os professores me favorecem. Nunca é por causa de
minhas próprias realizações.

A peça vai bem, assim como ensaiamos. Mas é no final, quando nos
curvamos ao público que ouço as palavras sempre familiares.

— Uau, que criança linda. Ele será um homem tão bonito quando
crescer.

— Você viu os olhos dele? Eu nunca vi essa sombra antes.

— Ele com certeza ganhou na loteria genética.

Mais e mais comentários desse tipo, e depois há minha mãe, sentada


na primeira fila com um sorriso satisfeito no rosto.

Ela acabou de mostrar seu precioso filho.

Ao lado dela está minha irmãzinha, Catalina, vestida com um vestido


rosa que a faz parecer uma boneca, o próximo projeto da mãe.

Nós seguimos para trás novamente, e minha mãe e minha irmã estão
me esperando.

— Enzo! — Lina sorri para mim, soltando a mão da mãe para vir
correndo em minha direção.
Eu a pego em meus braços e a balanço, beijando suavemente sua testa.

— Ainda não acredito que ela não lhe deu o papel principal. Vou ter que
falar com ela, — a mãe resmunga baixinho e suspiro profundamente, não
querendo me envolver em outro conflito.

— Está bem. Eu não queria o papel principal. — Eu digo a ela,


esperando que uma vez ela me escute e deixe pra lá.

— Se ao menos seu pai não fosse tão contra, — ela faz um som tsk
olhando para o meu rosto, — você seria o rosto de todos os anúncios de
modelagem. Com sua irmã ao seu lado, — ela balança a cabeça, a decepção
clara em seu rosto, — você tomaria o país de surpresa.

Não é a primeira vez que ouvi a mãe dizer isso. Desde que eu tinha
idade suficiente para entender a conversa de adultos, percebi que minha
mãe tinha grandes aspirações por crianças bonitas. Ela queria nos levar
para Hollywood, fazer com que todos nos olhassem como se fossemos alguns
objetos, não humanos. Mas é claro que seus sonhos foram rapidamente
anulados por meu pai, que não queria nada disso.

Isso não impediu a mãe de nos levar a todos os lugares com ela como
suas bonecas.

Voltamos para casa e eu me apresso para o meu quarto, os eventos do


dia já me afetando.
Indo ao banheiro, olho-me no espelho, imaginando o que exatamente
faz com que todos fiquem obcecados com meu rosto.

Levantando minha mão, traço os contornos do meu rosto, procurando


qualquer imperfeição, mas não encontrando nenhuma.

E se eu tivesse uma?

E se eu não fosse tão perfeito. As pessoas parariam de me encarar?


Talvez isso possa resolver todos os meus problemas.

Eu nem penso quando aperto minha mão com o punho apertado,


direcionando-a diretamente para o espelho. Não quebra, não
imediatamente. Mas enquanto eu continuo batendo nele, pequenos
fragmentos aparecem no chão.

Ignorando a dor na mão, concentro toda a minha energia em um pedaço


de vidro. Pegando na minha mão, trago-a na minha bochecha.

Um corte.

E eu pararia de ser tão perfeito.

Estou prestes a cavar a ponta afiada na minha pele quando minha mãe
entra no quarto e dá um tapa na minha mão.
— O que você está fazendo? — Ela grita para mim, com os olhos
arregalados de horror. Não reajo quando ela começa a me bater, sempre meu
corpo, nunca meu rosto. Eu apenas a deixei fazer isso até que se canse disso.

— Não ouse fazer isso de novo! — Ela continua repetindo tudo de novo,
e mesmo que eu acene com as suas palavras, eu sei que eu vou fazer de novo
no momento que puder.

Não sei se é a minha expressão que não é convincente o suficiente, mas


ela acrescenta algo que me dá uma pausa.

— Todo corte que você fizer na sua cara, eu farei o mesmo com sua irmã.
Você quer que ela seja feia e com cicatrizes? Quer que ela chore de dor? Por
sua causa? — Eu olho nos olhos de minha mãe, esperando que seja tudo uma
piada.

Não é.

— Eu não vou fazer isso de novo. — Eu digo em voz baixa, convencido


de que ela irá cumprir suas ameaças.

— Bom. Agora venha, deixe Maria limpar você. — Ela me entrega para
minha babá e sai da sala.

Minha mãe volta mais tarde, como eu sabia que faria. Esse tipo de
comportamento não desaparece impune.
— Você sabe que eu não posso simplesmente deixar você ficar, —
explica ela, sua expressão estóica ao me considerar.

Eu aceno.

— Eu não quero fazer isso, mas preciso, — continua ela, como se fosse
uma dificuldade para ela me punir. Ela franze os lábios, me olhando para
cima e para baixo.

— Seu castigo será não se mover e ficar em silêncio. — Eu franzi a testa


com o castigo estranho, mas não digo nada. Para mim, parece bastante fácil.

Ela me leva para o seu quarto e caminha para o closet. Abrindo a porta,
ela me empurra para dentro, me dizendo.

— Mãos nos joelhos, olhos para a frente, e não ouse se mover ou emitir
um som. — Eu cumpro, dobrando minhas pernas debaixo de mim e
colocando minhas palmas nos joelhos.

Mãe me dá um sorriso de aprovação antes de empurrar a porta atrás


dela. Ela não fecha todo o caminho, e há um pequeno espaço que permite
uma visibilidade perfeita dentro do quarto.

Eu me pergunto quanto tempo devo sentar aqui. Geralmente seus


castigos são corporais. É a primeira vez que me faz fazer algo assim.

Eu ouço a porta de entrada do quarto e vejo o pai entrar. Ele suspira


profundamente e começa a tirar a roupa. Minha mãe é rápida em oferecer-
lhe uma massagem no ombro e, quando meu pai se senta na cama, ela
começa a amassar sua carne.

Acho que não devo ver isso.

Mas a cena muda rapidamente quando a mãe rasteja de joelhos na


frente do pai, e coloca a boca no seu pênis.

Meu primeiro instinto é desviar o olhar, mas depois me lembro das suas
palavras.

Olhos para a frente.

Temendo outra surra, continuo assistindo.

Logo a mãe está de joelhos e o pai está empurrando nela por trás, suas
respirações desiguais enquanto ele resmunga alguns palavrões. Os olhos da
mãe estão focados em mim o tempo todo. Gemidos altos escapam de sua boca
enquanto ela pede ao pai que vá mais rápido e mais forte. O som de um tapa
na carne da mãe me faz vacilar, mas ela continua me encarando, com a mão
entre as pernas.

— Estou indo! Mais forte! — Ela grita, seu corpo tremendo por toda
parte. Ainda assim, o seu olhar não vacila de mim.

Isso continua pela próxima hora. Não importa o que o pai faça com ela,
seus olhos não se movem de mim.
Ela está se certificando de que não estou olhando para longe.

Quando finalmente acaba e o pai sai do quarto, a mãe vem até mim,
ainda nua, e abre a porta.

— Bom garoto, — ela se abaixa de joelhos na minha frente, com os seios


baixos e balançando no meu rosto. Ela se inclina para mim para beijar meu
rosto, seus lábios deslizando na minha boca.

— Agora você pode brincar, — diz ela, me levando para fora do quarto.
Dói quando me levanto, meus pés quase paralisados por ficarem na mesma
posição por muito tempo. Mas estou feliz demais por estar fora de lá, então
manco.

É tarde da noite quando a primeira visita acontece. Estou na minha


cama, dormindo, quando me assusto com o farfalhar dos lençóis, a cama
abaixando para acomodar outra pessoa. Eu mantenho meus olhos fechados,
convencido de que é um sonho.

Não existem monstros, certo? Estou velho demais para acreditar nisso.

Mantendo-me quieto, sinto uma respiração na minha bochecha quando


uma mão começa a arrastar pelo meu braço. Eu olho um olho aberto e,
mesmo nas sombras da noite, consigo reconhecer o perfil de minha mãe. Ela
parece encantada enquanto acaricia minha pele. Seus dedos se depositam
na minha mão e ela puxa suavemente em sua direção.
Ela molda os dedos nos meus, a palma da mão descansando em cima da
minha mão enquanto ela alcança a perna. Ela arrasta minha mão para cima
da coxa, pressionando meus dedos na sua carne. Sinto umidade cobrindo as
pontas dos meus dedos, e ela continua a usar minha mão, movendo-a em
círculos e ficando cada vez mais molhada.

Sua respiração trava na garganta quando os movimentos ganham


velocidade.

Eu tento não recuar com nojo, especialmente quando ela pega minha
mão inteira e a enfia em uma abertura apertada. Paredes quentes cercam
minha pele, e ela a move para dentro e para fora de seu corpo.

Estou calado, disposto a desconsiderar o que está acontecendo,


esperando que seja tudo um pesadelo.

Tudo para apenas quando ela libera um suspiro semi-alto, e sinto que
meus dedos estão sendo engolidos inteiros por alguma coisa.

— Bom garoto, — ela se aproxima do meu rosto, a boca perto do meu


ouvido. — Em breve, — é tudo o que diz antes de partir.

Algum tempo depois, abro os olhos para me encontrar sozinho no


quarto. Não há evidências de que ela esteja lá, exceto por um forte odor
vindo dos meus dedos.

Sinto-me fisicamente enjoado e, mesmo em minha mente jovem, sei que


isso está errado.
Tudo está errado.

— Não é tão bonito? Mamãe fez isso especialmente para mim.


Nenhuma outra garota tem um igual. — Lina se aproxima em seu vestido
novo, girando na minha frente com um enorme sorriso no rosto.

Eu também forço um sorriso, mesmo que a menção à mãe seja suficiente


para me fazer querer vomitar.

— Você parece uma princesa, Lina, — eu a elogio e ela se diverte, me


pegando pela mão para me mostrar sua coleção de bonecas. Eu escuto com
atenção, e quando ela me pede para brincar com ela, não tenho coragem de
negá-la.

Passamos o dia inteiro com suas bonecas, colocando-as em diferentes


cenários. Embora a atividade em si não seja para mim, a visão de Lina
sorrindo tão sinceramente é a única coisa que importa, porque ela é a única
que pode me fazer feliz.

É tarde da noite que eu temo o que está por vir. Quando fecho os olhos
e finjo que estou dormindo.
As visitas das mães não são diárias. Eu até notei que ela não tem um
certo padrão, suas chegadas são caprichosas. Tentei entendê-los, me
preparar. Mas sempre acaba me pegando de surpresa.

Como esta noite.

Pela primeira vez nesta semana, ela vem, encaixando seu corpo perto
de mim, seu hálito quente no meu ouvido. Todo esse tempo e minha atuação
ainda é forte. Ela ainda acha que estou dormindo profundamente e,
portanto, é livre para fazer o que quiser com meu corpo.

Na maioria das vezes, ela apenas empresta meus dedos, usando-os para
se acariciar com o que eu descobri como clímax. Ela sussurra palavras
enquanto se acaricia, meus dedos profundamente dentro de seu corpo, que
somente eu posso lhe dar o que ela deseja, que somente com o meu toque
pode experimentar o céu.

Mas também há momentos em que ela faz mais.

Como esta noite.

Eu posso sentir isso da maneira como as mãos dela se movem mais


baixo, passando pela cintura da parte de baixo do meu pijama e dentro da
minha cueca. Ela envolve a mão em volta do meu pênis, seu toque suave e
invasivo, suas carícias não desagradáveis, mas revoltantes.

Não sei o que ela pretende alcançar com isso. Os seus dedos se envolvem
em torno da minha carne, o polegar circulando a cabeça do meu pênis. Ela
continua empurrando a mão para cima e para baixo, e os movimentos
dificultam o meu fingimento que estou dormindo.

— Venha, meu garotinho, — a voz dela é melodiosamente baixa, —


deixe-me fazer você se sentir bem, Enzo, — suas palavras, assim como suas
ações, são estranhas para mim.

Porque não importa o que ela faça comigo, nunca é bom.

DOZE ANOS

Algumas pessoas crescem temendo os monstros debaixo da cama. Eu


cresci temendo aquele em minha casa.

É difícil acreditar que a mãe não percebe que estou acordado o tempo
todo que ela está lá... me tocando. Mas se percebe, nunca deixou
transparecer.

À noite, ela era uma pessoa, mas durante o dia era completamente
diferente. No escuro, eu era o objeto que lhe dava prazer, enquanto durante
o dia eu era o filho bonito que podia orgulhosamente mostrar ao mundo.

Mas algo começou a mudar.


Eu via isso no leve estreitar dos seus olhos, como alguém me olhava ou
me elogiava demais; ou a maneira como ela amaldiçoaria as garotas da
minha escola que ousavam me dar atenção.

Eu deveria ser dela — apenas dela.

— Pegue minha mão, Lina, — estico minha mão na sua frente quando
saímos do carro.

Minha irmã mais velha, Romina, vai se casar hoje e toda a família está
participando.

Eu seguro Lina e fazemos o nosso caminho para dentro do local. Após a


cerimônia da igreja, a celebração é continuar com mais comida e bebida.
Mas, considerando quantos estranhos existem, não vou deixar Lina sozinha
nem por um momento.

Eu, melhor do que ninguém, sei do que os adultos são capazes e prefiro
morrer do que ter a mesma coisa com minha irmãzinha.

Ela me dá um sorriso e continuamos lá dentro, ocupando nossos lugares


designados.

Romina parece incrivelmente feliz ao olhar para o marido, Valentino.


Enquanto o casamento deles é arranjado, eles desenvolveram sentimentos
um pelo outro durante o namoro. Romina costumava brincar que tinha sido
amor à primeira vista. Mas quando olho para as suas interações, como
Valentino a está girando na pista de dança, o amor deles parece muito real.
— Você verá quando encontrar alguém que ilumine seu mundo inteiro,
— ela jorrou, tentando explicar os sentimentos que Valentino despertou
nela.

Eu apenas assenti, acompanhando-a, já que o assunto era claramente


querido por seu coração. Não queria dizer a ela que acho que algo assim
nunca aconteceria comigo. Não quando tudo o que sinto é nojo quando penso
em uma mulher me tocando.

— Você tem chocolate no queixo, boba, — olho para Lina. Ela abaixa o
bolo, franzindo a testa tentando limpar o rosto.

— Deixe-me, — digo enquanto pego um guardanapo e gentilmente toco


em sua pele. Minha irmã é a única exceção à regra. Não há ninguém mais
pura e inocente neste mundo do que minha doce Lina, e enquanto ela olha
para mim, com os olhos cheios de amor, não posso deixar de sentir meu
coração estourar no meu peito.

Eu faria qualquer coisa para garantir que ela nunca saiba sobre os
monstros do mundo.

É um voto que fiz para mim há muito tempo. Eu a protegeria até o meu
último suspiro.

— Posso sentar aqui? — Viro a cabeça para ver outra garota apontando
para a cadeira ao nosso lado. Ela tem mais ou menos a minha idade, talvez
alguns anos mais nova.
— Certo! — Catalina exclama, um sorriso se estendendo pelo rosto. —
Você é tão bonita, — Lina a elogia.

— Qual é o seu nome? — Ela se planta na frente da recém-chegada.

— Eu sou Gianna, — diz a garota, sentando ao meu lado.

— Eu sou Catalina e este é meu irmão Enzo, — proclama Lina com


orgulho. Dou-lhe um sorriso apertado, mas não digo nada. Lina adora fazer
novos amigos e, embora eu nunca a impeça de socializar, não está
exatamente no topo da minha lista de prioridades. Na maioria das vezes sou
grato quando as pessoas não me notam.

— Prazer em conhecê-lo, — diz Gianna, e seus olhos saltam para mim


imediatamente. Eu tento não reagir à sua leitura aberta, mas ela não está
sendo muito tímida. Nem mesmo quando ela propositalmente puxa a
cadeira para mais perto da minha e tenta me envolver em uma conversa.

Suspiro, dando-lhe respostas breves e esperando que ela pegue a dica e


nos deixe em paz. Lina, por outro lado, continua fazendo suas perguntas e
liderando a conversa.

— O que? — Gianna pula do assento de repente, a frente do vestido


encharcada. Olho para cima e vejo a mãe parada ao seu lado, um sorriso
insidioso pintado em seu rosto.

— Oh, querida, eu devo ter tropeçado, — ela disfarça seu tom a aparecer
arrependido, mas reconheço a falsidade disso.
Gianna parece perturbada e foge em busca de seus pais.

— Mamma, — Lina pula nos braços da mãe, dando-lhe um abraço


apertado.

Olho para as duas, temendo a situação em que me encontro. Eu sei que


a mãe nunca faria nada com Lina, eu me certifiquei disso. Mas aos olhos de
Lina, nossa mãe é o epítome da perfeição, e sua adoração é escrita em seu
olhar toda vez que olha para ela. Mamãe sabe disso, e ela sutilmente usa
isso em seu proveito para garantir que eu seja flexível.

Porque eu nunca abriria minha boca com acusações quando isso


causaria dor de cabeça à minha irmãzinha.

A maneira como seu rosto se contorce, uma mistura de triunfo e


satisfação, deixa claro que ela atingiu o ponto com o chamado acidente.

O resto da celebração passa em um borrão enquanto tento afastar


outras tentativas de socialização.

De volta à casa, me retiro para o meu quarto. Como o pai está em casa
hoje, não acho que a mãe venha. Talvez eu tenha uma boa noite de sono.

Eu me deixei levar, mas ainda hoje a sorte não está do meu lado.

Sou acordado por uma sensação de umidade ao redor do meu pau. Estou
momentaneamente assustado e, quando abro um olho, vejo a mãe entre os
joelhos, a cabeça dela balançando para cima e para baixo no meu pau.
Aperto minhas mãos nos punhos, tentando me impedir de reagir, de chutá-
la de mim. Mas a vergonha me envolve quando percebo que, pela primeira
vez, estou duro, e a maneira como ela acaricia minha carne ou como me
empurra tão fundo na boca não parece tão ruim assim.

Viro a cabeça para o lado, apertando os olhos e dizendo a mim mesmo


que tudo isso é um pesadelo.

Não é real!

Ela continua a aplicar sucção, a língua fazendo cócegas na área


sensível. Meus músculos estão tensos e sinto um formigamento na espinha.
Não sei o que acontece quando minha mente se aproxima e um sentimento
intenso ultrapassa meu corpo inteiro.

Jatos de algo saem do meu pênis, direto na boca da mãe enquanto ela
continua chupando.

Uma lágrima solitária desce pela minha bochecha quando percebo a


enormidade do que aconteceu... e todo o meu ser se enche de auto-aversão.

Por quê? Por que ela está fazendo isso comigo?

Não é a primeira vez que me faço a mesma pergunta. Noite após noite,
ela apenas sussurrava no meu ouvido que me fazia sentir bem enquanto
trabalhava com as mãos em volta do meu corpo.
Mas é só hoje que entendo qual é o seu ponto de sentir-se bem — o preço
da minha alma.

Estou quase paralisado esperando que ela termine o que está fazendo.
Eu mantenho meus olhos fechados e imagino todas as maneiras pelas quais
eu a faria sofrer — destruí-la para que ela nunca mais se aproximasse de
mim.

E, no entanto, sei que isso nunca pode acontecer... e que amanhã isso
acontecerá novamente.

Com o passar do tempo, fica cada vez mais difícil colocar um rosto feliz
e fingir que sou normal. Até meus amigos da escola me abandonaram
quando perceberam que eu estava muito fechado. Não que eu tivesse me
importado muito, pois significava menos esforço da minha parte, menos
fingimento.

Eu até parei de sair de casa se não fosse completamente necessário,


porque ter um rosto bonito significa que as pessoas vão se aglomerar ao meu
redor com falsas intenções.

Minha única fonte de consolo é minha irmãzinha, a única que ainda


tem o poder de me fazer feliz.

Mas enquanto ela cresce... Eu tenho que me perguntar se ela também


começará a me olhar de maneira diferente... menos fraternal. Mamãe já fez
isso, o que a impede de fazer o mesmo?
As noites continuam como antes, mas logo me vejo melhor em controlar
meu corpo, em não a deixar vencer. Em algum momento, consigo adiar
minha ejaculação e, não importa o quanto a mãe tente persuadir uma reação
de mim, o quanto tenta me fazer sentir-me bem, não funciona mais.

Mas enquanto eu esperava que isso a impedisse, isso só lhe deu outras
ideias.

Foi o que percebi quando, uma noite, me vi preso na cama, com o corpo
nu da mãe na metade inferior.

Não me mexo enquanto vejo as mãos dela trabalharem no meu pau,


toda a minha atenção se concentrou em não mostrar nenhuma fraqueza, em
não dar a ela o que deseja.

Mas desta vez, em vez de tentar me despertar com a boca, ela muda de
tática. Ela mói seu órgão genital já molhado em cima de mim, a sensação
doentia. Mas não importa o quanto ela tente me fazer reagir, meu pau ainda
está mole.

Assim como acho que ela vai desistir e sair, ela sussurra essas temidas
palavras novamente.

— Eu vou fazer você se sentir bem, Enzo. Desta vez, — diz ela me
acariciando, com os dedos enrolando em torno do meu eixo flácido e guiando-
o em direção à sua entrada.
É como se todo o meu cérebro disparasse com avisos de gatilho, o
conhecimento do que está prestes a acontecer surgindo sobre mim.

Pela primeira vez, paro de fingir.

Ela está lutando para me encaixar na sua abertura quando eu arranco


da cama, minhas mãos empurrando seus ombros e empurrando-a de mim.
Meus olhos se arregalam quando a vejo completamente pela primeira vez,
nua no chão, sua expressão pasma.

— Enzo, querido... — ela gagueja, — não é o que parece, — estou


olhando para ela horrorizado, pelo ato que estava prestes a acontecer agora.

— Fora, — minha voz é baixa, quase trêmula, mas como o desgosto me


enche e ameaça transbordar, ganho a coragem de comandá-la, — saia!

Ela volta, pegando o vestido descartado antes de sair do quarto.

E fiquei olhando as sombras na parede...

— Quanto tempo você vai ficar no meu sofá mon cher? — Maman
Margot abre as cortinas e a luz do sol ataca meus olhos sensíveis.
Quanto tempo se passou desde que cheguei à casa dela? Dois dias?
Três? Passei o tempo todo no fundo de uma garrafa, então não tenho
acompanhado.

— Maman, por favor, — gemi, protegendo meus olhos com as costas da


mão.

— Enzo, você sabe que eu te amo mon fils12, mas você precisa ir. Não
vejo Alfredo há alguns dias, e é tudo porque você sitiou o meu boudoir. Eu
entendo que você está frustrado desde então, — ela aperta os olhos, me
considerando com pena, — você não está recebendo nada, mas agora está se
certificando de que eu também não esteja conseguindo.

— Água, — eu murmuro e maman apenas balança a cabeça, jogando-


me uma garrafa de água e um pouco de ibuprofeno.

— No começo eu deixei você ficar desde que pensei que era tudo ta
soeur13, mas não é só isso, é?

Sentando-se na minha frente, ela derrama um pouco de vodka em seu


copo e o leva aos lábios. Maman's sempre começava o dia com uma dose
rejuvenescedora de vodka, mas desta vez acho o cheiro de álcool repulsivo,
meu nariz coçando de nojo.

Talvez porque eu esteja me afogando nele.

12 meu filho
13 sua irmã
Fico em silêncio por alguns segundos, sem saber o que dizer a ela...
quanto dizer a ela.

— Eu pensei que as coisas estavam indo bem com sua esposa. — Ela
toma outro gole, os olhos me observando atentamente.

— Isto é... complicado.

— Complicado minha bunda, Enzo! — Maman revira os olhos para


mim, esvaziando o copo e batendo-o sobre a mesa com força retumbante. —
O que você fez? Fora com isso!

— Eu a fiz me odiar. — Admito com um suspiro, e a lembrança de


Allegra no chão, seus grandes olhos olhando para mim com tanta decepção
faz meu coração se espremer dolorosamente no meu peito.

Eu nunca quis o seu ódio. No entanto, parece que eu devo tê-lo se quiser
que ela seja feliz... segura...

— Por que diabos você faria isso? Mon Dieu Enzo! — Ela me olha
horrorizada, e sua expressão ecoa como me sinto por dentro.

Eu me acostumei a estar com Allegra... conversar com ela, tocá-la.

— Eu congelei... — Eu admito, baixando meu olhar. — Ela disse algo


que me lembrava... — Eu paro, mas maman pega imediatamente.

— Enzo, mon fils, nem todas as mulheres são como sua mãe.
— Eu sei disso, — digo com um sorriso irônico. — Allegra é diferente de
qualquer pessoa que eu já conheci. Ela é apenas... especial.

O seu sorriso, o seu calor, como ela me fez esperar para acordar de
manhã.

— Então por que você não conta o que aconteceu? Se abra para ela?
Tenho certeza que ela entenderia.

Eu respiro fundo.

— Acho que quebrei o seu coração maman, e não tenho certeza se ela
vai me perdoar.

— Enzo... — maman se inclina para trás, seus lábios franziram e eu


finalmente deixei todas as minhas preocupações se derramarem.

— Eu preciso mantê-la à distância. O estupro de Catalina... A morte de


Romina... tudo aconteceu com as pessoas que prometi proteger. Eu não posso
falhar com ela também. — Eu desvio o olhar, a dor ameaçando derramar.

— Mon Dieu, — maman faz o sinal da cruz, — diga-me que você


realmente não acredita que foi sua falha. Você não poderia ter feito nada
para impedir que essas coisas horríveis acontecessem.

— Talvez eu pudesse...
— Enzo! — De repente, de pé, ela se planta na minha frente, levantando
minha mandíbula para que eu possa olhá-la nos olhos.

— Depois de tudo o que aconteceu, a vida lhe deu uma mulher que,
segundo todos os relatos, é o seu par em todos os sentidos. Por que você a
alienaria quando eu posso ver a dor em seus olhos enquanto você diz o nome
dela? Mon fils, uma coisa que aprendi na minha vida... Pessoas de qualidade
não aparecem facilmente. E quando o fazem, você os segura contra todas as
probabilidades. Agora saia daqui e peça desculpas à sua esposa. Talvez ela
ainda te perdoe.

Ela não deixa espaço para discussões enquanto vira as costas para mim,
sentando-se junto à janela.

Pego meu casaco amarrotado e saio, quase com medo de ir para casa.

Faz tanto tempo desde que me lembrei daqueles dias da minha infância
com tanta clareza.

Infância...

Eu quase ri da noção. Parei de ser criança na primeira vez que minha


mãe me tocou de maneira inadequada.

No entanto, apesar de toda a minha imersão entusiasmada na máfia,


por todas as pessoas que matei... ela ainda vive.
Eu tinha treze anos na primeira vez que tentei matá-la, apenas para
ser interrompido por minha irmãzinha chorando por sua mãe.

Eu tinha catorze anos pela segunda vez. Acabei de aprender como era
fácil puxar o gatilho e ver a alma de alguém sair de seu corpo. E, no entanto,
enquanto eu segurava a arma na forma adormecida dela, não consegui fazê-
lo.

Fraco!

Tão fraco... e as memórias continuaram a me atormentar, a ideia de que


todas as mulheres queriam uma coisa de mim firmemente e
irrevogavelmente plantada em minha mente.

Ao longo dos anos, sua presença se tornou mais suportável, embora seu
toque ainda fosse repulsivo. Mas eu consegui, porque ela ainda era mãe das
minhas irmãs.

Agora...

Catalina se foi. Romina está morta. Augusta está longe...

Não há nada me segurando.


CAPÍTULO QUINZE

Meus olhos se abrem quando eu ouço passos pelo corredor. Isso só pode
significar uma coisa.

Enzo voltou.

Três dias ele esteve ausente... três dias em que chorei minhas últimas
lágrimas, pela idiota que fui e pelo brilhante ator que ele acabou sendo.

Não mais!

Saindo da minha cama, abro a porta, ficando cara a cara com o homem
que está me atormentando desde o primeiro dia.

Mas a visão que encontro não é a que eu esperava.


Ele está vestindo a mesma camisa branca e calça preta que usava na
última vez que o vi. Seus olhos se arregalam quando me nota. Meu olhar se
move sobre o seu corpo, e noto as sombras em seu rosto, o ligeiro crescimento
de barba em sua mandíbula...

Ele não parece bem.

Ao dar um passo em sua direção, quase sinto pena.

Talvez tenha sido a dor falando.

Assim como digo a mim mesma, sinto o cheiro do mesmo perfume que
estava agarrado à pele dele da última vez — o perfume de uma mulher.

Ele estava com aquela mulher novamente... Ele fodeu outra mulher.

Eu nem espero que a dor se acalme no meu peito enquanto minha mão
se estende, o eco de um tapa retumbante no corredor. Seu rosto se move para
o lado, mas ele não reage. Ele apenas olha para mim de uma maneira
entediada, toda a sua expressão se fechou.

— Isso foi pela última vez, — começo, desejando que minha voz
permaneça firme. Eu ensaiei tantas vezes as coisas que gostaria de gritar
na sua cara, mas quando olho para ele agora, me vejo um pouco sem
palavras.

— Eu te disse uma vez, Enzo Agosti, que darei o melhor que puder. Se
você pensar em me intimidar novamente, é melhor observar onde dorme.
Ele não reage à minha ameaça, com os ombros inclinados com um
encolher de ombros preguiçoso.

— Faça o seu pior, — diz ele, fechando a porta do quarto na minha cara.

Sem palavras, olho para a porta fechada.

O que aconteceu?

O dia seguinte é ainda pior. Domingo é o único dia da semana em que


todos devemos jantar, o único dia em que o próprio Rocco está presente.

As tensões aumentam quando eu vou para a sala de jantar. Rocco está


sentado em uma extremidade da mesa, com Lucia no lado esquerdo. Enzo
está sentado do outro lado, e eu me sento ao seu lado, como esperado.

Todo mundo fica calado enquanto os pratos são servidos, mas eu detecto
uma presunção silenciosa no rosto de Lucia.

Ela sabe?

Ela deve, caso contrário ela não estaria se gabando assim. Ela também
estava nisso? Zombe da camponesa, ganhe sua confiança e a descarte como
lixo?

Algo estranho parece passar entre Enzo e Lucia, com os olhos


intensamente colados um ao outro. Serve apenas para confirmar ainda que
eu posso ter sido enganada, por todos.
Eu não vou chorar... não mais.

— Pai, — eu me dirijo a Rocco como ele me pediu. Ele para de comer,


abaixando os utensílios e voltando sua atenção para mim. Ele levanta uma
sobrancelha e eu respiro fundo, meu plano está definido.

— Acho que já faz tempo desde o meu casamento com Enzo, e não
precisamos mais fingir ser cordiais. Eu gostaria de me mudar para o meu
próprio lugar. — Eu olho nos seus olhos enquanto digo isso, sem mostrar
fraqueza.

Seus olhos se arregalam e os punhos batem na mesa, sua tigela de sopa


pulando e derramando um pouco de líquido na toalha de mesa. Outro som
da minha direita me diz que Enzo fez a mesma coisa.

— Enzo, o que é isso? Isso é algum tipo de piada? — Rocco engasga


quando olha entre nós dois.

— Não é... — Eu começo, querendo deixar minha posição clara. Mas


uma mão agarra minha perna debaixo da mesa, apertando minha carne com
força.

— Claro que é uma piada, pai. — Enzo altera, dando um sorriso para
completar. Eu tento apertar sua mão, mas seu aperto está em um grau
doloroso.

— Não tem graça, filho. É um insulto que ela sugerisse uma coisa
dessas. — Rocco exclama, claramente irritado.
A hipocrisia não me escapa, como sei muito bem que, como seu filho, ele
passa a maior parte do tempo com prostitutas. O mero lembrete de que Enzo
estava me fazendo de boba enquanto dormia com quem sabe quem me tem
quase irada de raiva. Então eu devolvo o toque amoroso de Enzo, colocando
minhas unhas na sua mão. Quanto mais ele aperta minha coxa, mais
pressão eu aplico, cavando minhas unhas mais fundo em sua pele, o
pensamento de tirar sangue uma pequena satisfação.

— Não se preocupe, pai. Ela não está falando sério. — Enzo continua
rangendo os dentes com dor, e meu desejo de machucá-lo aumenta dez vezes.

Ele sabia o quão cuidadosa eu era com meu coração, e ele se esforçou
muito para obtê-lo e depois pisou nele. A morte é a maior misericórdia para
quem gosta dele.

— Enzo, — Rocco se vira para o filho, sua expressão grave, — sua


esposa não conhece o lugar dela. Ela precisa ser disciplinada. — Ele se vira
para mim com olhos estreitos. — As mulheres precisam saber onde estão e
quanto devem abrir a boca.

— Disciplina? Eu não sou criança. — Eu deixei escapar, incrédula que


ele até sugeriu uma coisa dessas. Os dedos de Enzo se apertam
dolorosamente, mas há muito que me esqueci da dor.

— Cale a boca, Allegra. — Enzo diz através dos dentes cerrados.


— Filho, acho que você precisa mostrar à sua esposa quem é o homem
em casa. — Rocco continua, e Lucia está achando mais difícil esconder sua
felicidade na virada dos eventos.

— O que você faz... — Eu paro quando sinto uma pitada na minha coxa.
Eu me viro para Enzo, mas sua expressão é inflexível.

— Ela precisa saber o que significa respeito. Se você não pode fazer isso
então...

— Eu vou fazer isso. — Enzo responde imediatamente, puxando-me


com força para os meus pés. — Não se preocupe, pai, ela não vai incomodá-
lo novamente.

Rocco cantarola em aprovação.

— Ela precisa aprender com sua mãe — vista, mas não ouvida. Eu acho
que ela precisa de mais alguma coisa naquela boca dela, — os cantos da boca
dele se levantam, a insinuação clara.

Enzo me arrasta para fora da sala de jantar e entra em seu escritório,


fechando a porta atrás dele.

— Você é realmente tão estúpida, Allegra, — ele pergunta, vindo em


minha direção com passos medidos, — para trazer isso à tona com meu pai?

— Bem, isso, — aponto entre nós, — claramente não está funcionando,


então é melhor seguirmos caminhos separados. — Cruzo meus braços sobre
o peito, tomo uma posição defensiva para que ele não veja através da minha
máscara.

— Caminhos separados, — ele zomba, rindo ironicamente de mim. Ele


se aproxima, com a mão segurando meu braço e me trazendo para ele. —
Você esquece um pequeno detalhe esposa. Até que a morte nos separar. Ou
eu morro primeiro ou você morre, não há como voltar atrás. Você é minha
pelo resto dos seus dias, então é melhor se acostumar com isso.

Ignorando suas palavras, eu o empurro, indo para a porta.

— Onde você pensa que está indo? — Suas sobrancelhas se levantam e


ele me olha com diversão irônica.

— Evidentemente em qualquer lugar que você não esteja. — Eu reviro


os olhos para ele.

É mais fácil entrar na ofensiva do que reconhecer a maneira como meu


coração ainda pula uma batida quando estou perto dele.

— Acho que há um problema pendente, — comenta ele casualmente


dobrando as mangas da camisa.

— Não é da minha conta, — eu encolho os ombros.

Eu tento passar por ele, mas de alguma forma nos manobra no sofá no
meio da sala. Eu caio em cima dele, deitada no seu colo. Meu vestido é
subitamente levantado sobre meus quadris, o ar frio batendo na minha pele
e me fazendo contorcer.

— O que... — Eu nem tiro as palavras quando um tapa cai na minha


bunda.

Forte.

Grito de dor com a surpresa.

— Essa boca vai causar problemas, Allegra, — diz ele quando dá um


tapa na minha bunda novamente. E de novo.

— Você deveria estar agradecida, não é o meu cinto que está tocando
sua bunda bonita. — A palma da mão toca minha pele com ternura, seus
movimentos difundem suavemente a dor.

— Mas o pai estava certo. Você precisa de disciplina. — Outra dor forte
enquanto ele continua a me bater, parando de vez em quando para acariciar
meu traseiro machucado.

Lágrimas estão se acumulando no canto dos meus olhos, mas eu evito


gritar, não querendo dar a ele a satisfação de vencer.

Sofro em silêncio até que termine sua sessão de disciplina. Descendo


minha saia sobre minhas pernas novamente, ele me puxa para uma posição
reta no colo.
— Desprezível. você é nojento, — eu ranjo os dentes vomitando o insulto
a ele, sua ereção dura e me cavando.

Ele está aproveitando a minha dor.

Eu me arrasto para os meus pés, querendo ficar o mais longe possível.

— E você faria bem em lembrar Allegra, — diz ele enquanto eu corro


para a porta, abrindo-a para ver Rocco e Lucia esperando do lado de fora,
com o rosto cheio de prazer.

— Estou orgulhoso de você, filho, — ouço as palavras de Rocco enquanto


passo por eles, e meu coração se aperta dolorosamente no meu peito.

Idiota. Eu sou tão tola.

O tempo passa e eu acho que não é tão fácil enterrar meu coração como
eu pensava anteriormente. Enzo e eu nos envolvemos em pequenas partidas
provocadoras, mas mesmo quando ele me irrita, sua presença é
reconfortante. Sinto-me presa entre meu orgulho e meus sentimentos. Meu
orgulho não me deixa dar uma polegada a ele, enquanto meus sentimentos
querem que eu lhe dê todo o meu coração.
Lucia, percebendo a distância entre nós, continua levantando suas
travessuras. Ela sabe que não posso sair, então faz tudo ao seu alcance para
me deixar infeliz.

O auge de tudo foi quando encontrei uma pequena câmera embutida na


parede. Inicialmente, fiquei furiosa, pensando que ela estava me espionando
— a nós — o tempo todo. Mas, como a raiva diminuiu, eu percebi que poderia
usar isso para vencê-la em seu próprio jogo. Eu deixei a câmera lá e mudei
alguns móveis para que obscurecesse a vista da cama.

Vendo que ela não pode mais me monitorar, Lucia se tornou mais
criativa. Caso em questão, a situação que estou encarando agora.

Balanço a cabeça assistindo um rato correndo pelo meu quarto antes de


se esconder debaixo da minha cama.

Ela está tentando, mas isso não significa que ela está tendo sucesso. Os
ratos não me impedem, afinal sou uma camponesa. Estou acostumada a
animais de todos os tamanhos e variedades.

Mas isso não pode ser dito sobre a querida Lucia.

Usando algumas sobras, isco o rato até pegá-lo em uma caixa


improvisada. Então, esperando até Lucia sair para receber as chamadas
sociais da tarde, eu entro furtivamente dentro do seu quarto e deixo o rato
debaixo do travesseiro.
Mais tarde naquela noite, quando ouço um doce som estridente de
pânico ressoar em casa, sorrio para mim mesma.

Camponesa - 1; Sogra perversa - 0.

Os conflitos continuam, e não tenho ideia se Enzo ou Rocco estão cientes


da extensão de nossa inimizade.

Não é como se eu visse meu marido mais de uma vez a cada dois dias...
Nesse ritmo, ele até esquecerá que tem uma esposa, se ainda não o fez.

Uma noite, porém, quando repentinamente vou até a cozinha para


roubar comida, fico cara a cara com meu marido. E eu não posso nem me
gabar da maneira como o encontro.

Suas roupas estão encharcadas de sangue, mais líquido vermelho


pingando da testa e caindo pela bochecha. Sua respiração está esfarrapada
enquanto ele segura sua barriga, seus passos descoordenados.

Eu ofego, minhas mãos vão para a minha boca enquanto meus olhos
avaliam descontroladamente sua condição.

— Enzo, — sussurro, e ele levanta uma mão para me afastar,


caminhando para o quarto.

Pela primeira vez, meu ódio é deixado de lado quando me apresso em


seu rastro, parando no meu quarto para pegar o kit de primeiros socorros.
Ele está sentado na cama, a camisa ensanguentada descartada ao seu
lado, e eu vejo a extensão de seus ferimentos. Cortes de raiva estão por todo
o tronco, todos vazando sangue.

— Enzo, — ajoelhando-me, começo a avaliar os danos. — O que


aconteceu? — Eu pergunto enquanto abro o kit de primeiros socorros,
retirando algumas bandagens e desinfectantes.

Ele apenas encolhe os ombros, como se não fosse grande coisa que ele
voltasse para casa meio morto.

Mantendo-se quieto, ele me observa atentamente enquanto eu cuido


dos seus ferimentos, a torção do nariz é a única indicação de dor.

— Por que você faria isso consigo mesmo? — Eu pergunto, mais para
mim. Continuo limpando a pele dele, mas o sangue não para de derramar
da laceração aberta. Com as costas da mão, tiro uma lágrima do olho,
percebendo tardiamente que estou chorando.

Droga!

— É o caminho do nosso mundo, little tigress, — ele finalmente


responde, mas não está olhando para mim. Ele puxa um maço de cigarros
das calças, acendendo um.

— Tem que ser? — As palavras estão fora da minha boca antes que eu
possa detê-las. — E se um dia você sair e nunca mais voltar? Eu sei que
nosso mundo está cheio de violência? Mas você precisa... — Suspiro,
frustração roendo meu interior. — Olhe para você agora, — aponto para as
feridas ainda sangrando.

— Allegra, — ele abre um sorriso, fumaça saindo da boca e na minha


cara, — você fala como se importasse comigo.

— E daí se eu me importo?

— Não, — ele declara, aquele sorriso sedutor ainda em seu rosto, mas
não alcançando bem seus olhos. Colocando uma mecha perdida atrás da
minha orelha, ele se inclina para mim. Uma mistura de seu hálito quente e
fumaça de cigarro sopra suavemente em meu ouvido enquanto ele sussurra:
— não esqueça que isso nunca foi nada além de eu pagar minhas dívidas.

— O que você está tentando dizer? — Minha voz está clara, meu tom
não é afetado, mesmo que por dentro eu esteja morrendo lentamente.

— Este é um acordo, minha querida esposa. Nunca será nada mais, —


seus olhos vazios olham para mim e neles vejo a confirmação de suas
palavras.

— É por isso que você não me deixa tocar em você? Porque é um


arranjo? Como você me vê? Uma irmãzinha? — A acusação tácita está ai,
sou tão nojenta para ele? Eu devo ser dada a reação dele a mim.

— Você não é minha irmãzinha Allegra e graças a Deus por isso. Você
é minha parceira, minha esposa.
Largo minha mão do torso dele, rindo. Parece que temos duas definições
diferentes de esposa.

— Sério? Então você pode foder suas prostitutas e eu devo permanecer


assim. Solitária e... sozinha. Como isso é uma parceria?

Não é como se fosse a primeira vez que ele mentiu para mim sobre o
chamado parceria. Na opinião dele, sou eu sendo totalmente dócil e
complacente. Ele pega e eu apenas dou...

— Calma, little tigress, guarde suas garras. Quem eu foder não é da sua
conta. Não tente fingir que esperava fidelidade quando é assim há gerações.
Você sabia no que estava se inscrevendo.

Inclino minha cabeça para o lado, estudando-o e sua audácia.

— Eu sabia? Então eu vou encontrar outra pessoa para foder também.

O aperto dos punhos é inconfundível, a maneira como o lábio se contrai


de descontentamento, e eu sei que acertei a marca.

— Escute, little tigress, — ele fala baixo na garganta, a ameaça


subjacente que mexe na espinha. Sua mão vem para deitar na coluna do
meu pescoço, com os dedos acariciando meu pulso. — Você sequer olha para
outro homem e não gostará no que eu me tornarei. Ele será um homem
morto e eu vou garantir que você nunca mais veja a luz do dia. Você está
carregando meu nome, o que significa que você é minha. Entendido?
Recusando-me a mostrar qualquer sinal de fraqueza, eu o olho bem nos
olhos.

— E as mulheres? — Eu pergunto, é necessário irritá-lo crescendo


dentro de mim.

— Eu sou um dos poucos que não diferencia querida. Se alguém tocar


em você, deixará de existir. Eu juro. — O seu rosto torce em um sorriso cruel,
os lábios quase sem fôlego dos meus.

— Então por que você não faz isso? Por que você não dorme comigo? —
Eu poderia ter parecido mais patética? Ainda assim, eu preciso saber...

— Honestamente, querida, você seria uma péssima merda. — Ele sorri,


me liberando e se levantando, desaparecendo no banheiro.

Curiosidade satisfeita.

Fecho os olhos e, com um suspiro profundo, levanto-me, saindo do


quarto sem olhar para trás.

Semanas passam e lentamente percebo que Enzo realmente não quer


nada comigo. Eu tento preencher meu tempo com coisas significativas, mas
até meus passeios se tornaram muito distantes. Comecei a escrever mais, e
meu diário se tornou uma janela para minha alma. Toda coisinha que
acontece encontra seu caminho para dentro.

Ultimamente, tem sido principalmente minhas brigas com Lucia, mas


à medida que o próximo evento se aproxima, eu não consigo nem reunir
forças para lutar.

O aniversário de Enzo está chegando, e me disseram repetidamente que


evento importante é — que eu não deveria envergonhar a família. Após o
conflito com Rocco, percebi que preferia engolir meu orgulho em vez de
conseguir outra sessão de disciplina.

E então eu aceitaria relutantemente ir me arrumar para um vestido


adequado e fazer minha maquiagem e cabelo.

Lucia estava no comando dos detalhes, e enquanto eu estava cética


sobre isso, com Rocco na sombra, ela não ousou fazer nada impróprio.

— Você nunca usou maquiagem antes? — A maquiadora me olha


maravilhada, e eu só posso balançar a cabeça. Ela franze os lábios, os olhos
estudando meu rosto.

— Não se preocupe. Vou deixa-la muito bonita, — diz ela antes de


começar a trabalhar. Duvido que ela possa fazer maravilhas, mas sento-me
pacientemente na cadeira. Sei que nunca fui abençoada pela aparência, por
isso não tenho esperança de que de repente me torne bonita. Eu não acho
que alguém tenha esse tipo de habilidade.
Leva mais de uma hora para ela terminar, mas de repente ela me diz
para abrir meus olhos e olhar no espelho. Faço o que foi dito, mas quando
me vejo, não posso deixar de ofegar.

— Essa sou eu? — Eu sussurro, meus olhos já estão molhados.

Droga! Não posso estragar essa maquiagem.

Olho para cima, piscando com força e esperando o momento passar.

— Isso é maravilhoso, — olho com admiração o meu reflexo. Pela


primeira vez, vejo algo diferente. Eu não sou de forma alguma bonita — não
da maneira que Gianna Guerra é — mas assim, eu me sinto bonita.

— Obrigada, — as palavras saem da minha boca e eu pego as mãos da


maquiadora na minha, tentando transmitir o quanto isso significa para
mim. — Obrigada, — repito, e sinto lágrimas me sobrecarregarem
novamente.

Ainda estou estupefata com minha nova transformação e estou pronta


para o vestido, um vestido preto de festa desta vez com material suficiente
para cobrir minha pele.

Quando o vestido também está pronto, o cabelo é a última parada. Mas


isso prova ser um pouco mais difícil, pois me envolvo em uma discussão
acalorada com o cabeleireiro sobre o comprimento do meu cabelo. Eu nunca
cortei meu cabelo antes, apenas o corte quando necessário. O fato de ele
insistir em um corte de cabelo na altura dos ombros me deixou irritada.
— Não, não, — levantei minhas mãos.

— Sim, sim, — ele tira sarro de mim antes de me colocar na cadeira e


cortar meu cabelo.

Aparentemente, Lucia tem sido muito rigorosa com suas instruções.

Tento não lamentar meu cabelo enquanto o vejo se acumular no chão.


O resultado final, porém, me surpreende.

Quem sabia que o cabelo poderia mudar todo o meu visual?

Estou de volta em casa bem a tempo de começar as celebrações. Ainda


não há vestígios de Enzo.

Perdendo-me através da multidão de convidados, começo a socializar e


mergulhar na conversa. Para o meu espanto, a maioria das pessoas
presentes fala italiano, então não preciso me fazer de boba com meu sotaque
péssimo.

E então eu começo a me divertir. Champanhe flui livremente e as


discussões são abundantes. A festa de aniversário está a todo vapor, exceto
que o aniversariante está ausente.

Mas eu não me importo mais. Desta vez, vou me divertir.

Foda-se Enzo e foda-se sua família.


— Não, eu discordo, — digo ao aceitar outra taça de champanhe de um
garçom, — veja, não há provas científicas para a praga de Atenas. Poderia
ter sido simplesmente um dispositivo metafórico para ilustrar sua
desaprovação a Péricles. Péricles ele mesmo foi a praga. — Eu tomo outro
gole de champanhe, pronta para defender fervorosamente meu argumento.

Quando foi a última vez que me senti livre?

— Linda e inteligente, — o homem na minha frente me elogia e eu coro.

Eu nunca fui chamada de bonita antes.

Então eu deleito em sua bajulação, minha risada ficando estridente com


a bebida borbulhante.

— Está um pouco quente aqui. Por que não saímos na varanda e você
pode me contar tudo sobre Péricles, — diz ele, que já está me levando para
as portas duplas.

Não me importo com a mudança de cenário, meu cérebro apenas se


concentrou na discussão em questão.

— Ele foi exilado. Ele não era exatamente o maior fã de Péricles, —


continuo tentando tornar meu argumento o mais convincente possível. Não
é sempre que alguém fala comigo sobre tópicos mais intelectuais,
especialmente um homem. Então, sinto que preciso mostrar a ele que não
sou uma cabeça de vento. Que eu posso pensar por mim mesma.
— Isso é muito interessante. Diga-me mais, — ele me incentiva, e um
enorme sorriso se espalha pelo meu rosto.

O champanhe não faz nada além de aprimorar minhas habilidades


sociais, e continuo divagando sobre Péricles e a praga, sem perceber como
ele continua se aproximando de mim. Ou como suas mãos roçam contra
meus braços nus, a palma da mão descendo lentamente pelas minhas costas
e por cima da minha bunda.

É um pensamento preocupante o suficiente para tentar colocar alguma


distância entre nós. Mas ele não está colaborando.

Encaixando-me contra o parapeito da varanda, estamos longe da


multidão que ninguém pode nos ouvir e isolado o suficiente para que
ninguém possa nos ver.

— Se você me der licença, — digo, e me movo para passar por ele, a


situação é desconfortável demais para o meu gosto.

— Agora, onde você pensa que está indo, princesa, — ele sussurra no
meu cabelo, perto o suficiente para que eu possa sentir sua respiração na
minha pele.

— Deixe-me ir, — eu cerro os dentes, surpresa que ele tentasse algo


assim em minha própria casa, com tantas outras pessoas presentes.
— Não seja tímida agora, — diz ele enquanto seus lábios caem na
minha bochecha. Estremeço com a sensação nojenta de saliva contra minha
pele e continuo empurrando-o.

Então ele se foi.

Meus olhos se arregalam quando vejo um Enzo aterrorizante agarrar o


homem pela gola, arrastando-o para o centro do salão.

Não... ele não faria...

Eu corro atrás deles, apenas para testemunhar uma cena feita para
filmes de terror.

Enzo começa a bater no homem no chão, com os nós dos dedos


manchados de sangue enquanto continua batendo. O rosto do homem se
transforma de humano em uma bagunça irreconhecível, suas palavras se
transformando em grunhidos incoerentes de dor.

Suspiros nos cercam, com pessoas pedindo para ele parar, mas nenhum
ousando intervir.

Ele não para.

Ele continua batendo nele até o homem parar de se mover. Os olhos de


Enzo estão em branco quando ele puxa uma arma da cintura da calça,
apontando para a cabeça do homem.
Meus olhos se fecham instintivamente quando o tiro ressoa na sala,
apenas para abrir para um mar de vermelho. Uma poça de sangue se
acumula ao redor do corpo, ficando cada vez maior até atingir meus pés.

Dou um passo atrás, me sentindo um pouco tonta, tanto do champanhe


quanto de testemunhar o massacre na minha frente.

— Você vem comigo madame. — Eu ouço a voz dura de Enzo nos meus
ouvidos, e antes que eu perceba, sou jogada por cima do seu ombro enquanto
ele deixa o salão de baile.
CAPÍTULO DEZESSEIS

— Me deixe ir, — eu chuto nas suas costas, mas seu aperto é muito
firme no meu corpo. É só quando chegamos ao meu quarto que ele me deixa
na cama, virando para trancar a porta atrás dele.

O sangue está por toda a camisa branca, espalhado pelo rosto e


agarrado pelas juntas dos dedos. Ele levanta as costas da mão no rosto,
manchando-a em volta do queixo. Ele dá passos medidos em minha direção,
suas feições desprovidas de qualquer emoção.

Este lado de Enzo me assusta...

Apertando meu vestido, saio da cama e tento passar por ele. Não quero
estar perto quando ele está assim.
— O que eu te disse? — Sua voz é baixa, perigo inconfundível
reverberando.

— Enzo, você bebeu demais? — Eu tento difundir a situação e, quando


me aproximo dele, sinto o cheiro do álcool em sua respiração. Mais do que
tudo, posso ver que seus olhos não são o verde surpreendente habitual que
eu adoro, mas uma cor esmeralda tumultuada, suas pupilas negras se
expandindo e engolindo o que resta das íris.

Ele não parece bem. Após a exibição no salão, ele não está bem.

— O que eu te disse, Allegra? — Ele agarra meu pulso, me trazendo


contra seu peito.

Eu bebi champanhe suficiente para que subisse à minha cabeça, mas


quando olho nos seus olhos, o perigo irradiava, minha mente limpa
instantaneamente.

— Deixe-me ir, Enzo. Podemos conversar amanhã. — Minhas palavras


são suaves, e espero alcançar aquele lado dele que não se foi completamente.

— Qualquer um toca em você e eles deixam de existir, — ele repete a


promessa de antes, seu tom agudo, mas preguiçoso, quase como um
predador brincando com sua presa.

— O que eu não te disse... — ele se afasta e sua mão ensanguentada


segue meu pescoço e meu rosto, manchando de vermelho, — é o que eu faria
com você se isso acontecesse.
Ele dá um passo à frente e sou forçada a dar um passo atrás. Uma valsa
de medo ocorre quando procuro uma saída, mas ele não me dá uma.

Uma mão envolve meu pescoço enquanto a outra tira uma faca do bolso.

Meus olhos se arregalam de medo quando o vejo testar a lâmina,


movendo-a suavemente pela minha pele.

— Acho que não te disse esposa, — seu tom está zombando quando ele
olha para mim, a crueldade se estendeu sobre suas feições, — mas você está
extremamente bonita esta noite, — a faca continua sua ascensão na minha
pele, passando pela barreira das roupas, a borda fria da lâmina cavando
lenta, mas firmemente na minha pele sem rasgar a superfície.

Eu paro, um arrepio descendo pelas minhas costas.

Quem é esse Enzo?

— Diga-me, — ele se arrasta, inclinando a cabeça para o lado para me


avaliar, estudando o terror no meu rosto enquanto o lado afiado finge
penetrar na minha pele apenas para ele mudar para o lado sem corte, —
para quem você vestiu isso? — Ele acena em direção ao meu vestido. — E
essa porra de maquiagem que você colocou no seu rosto? Para quem você
colocou? — Suas palavras estão ficando cada vez mais acentuadas, um sinal
de que ele está se exaltando.

E é a última coisa que quero, não com uma lâmina na garganta.


— Eu mesma. Eu fiz tudo por mim. — Eu levanto meu queixo para ele,
usando minha confiança recém-encontrada com orgulho. É pedir muito um
dia... apenas um dia para se sentir bonita?

— É mesmo? — Há uma diversão sinistra atrás de sua voz, mas eu sou


a única que não entende a piada.

— Sim. Está correto.

— Você quer me dizer que não pretendia foder quem quer que seja? O
que você disse?... — Ele franze a testa teatralmente, — você estava solitária,
— ele faz beicinho, zombando de mim mais uma vez. — Você quer que eu
acredite que não pretendia abrir as pernas para aquele homem se eu não
tivesse aparecido convenientemente?

Levando minha mão para cima, eu lhe dou um tapa forte no rosto. Sua
única resposta é uma risada irônica, antes que me atinja mais uma vez, seus
dedos como uma gaiola apertada no meu pescoço.

— Onde ele tocou em você? Seja honesta esposa, e podemos terminar


isso mais rápido. — A raiva que irradia dele é quase palpável e, embora
meus membros tremam em resposta, tento não mostrar meu medo.

— Em nenhum lugar, — mal digo as palavras antes que a sua mão se


mova, segurando minha mandíbula entre dois dedos, forçando-me a olhar
para ele.
— Com certeza parecia diferente de onde eu estava de pé, — comenta,
seus traços se transformando novamente de raiva em uma indiferença mais
relaxada.

— Quão ruim você quer ser fodida? — A sua faca está de volta ao
trabalho, desta vez cortando minha pele logo acima da minha clavícula. Eu
não estremeço, embora eu queira. Simplesmente não deixo meu olhar
vacilar do seu.

Não mostre medo!

— Eu não quero. Mas obrigada pela oferta. — Eu respondo de volta,


tentando recuperar um pouco de controle.

Sinto um pequeno fio de sangue fluir pela minha pele. Enzo mergulha
a cabeça para baixo e sua língua foge para pegar as gotículas, aspirando a
ferida, queimando-a com uma lambida.

Choque é um eufemismo para o que sinto, especialmente quando ele


levanta a mão para o meu rosto, com a palma da mão voltada para a frente
e cortando uma linha reta através da pele. Uma fenda aparece quando a
pele rompe e o sangue escorre imediatamente.

A palma da mão cobre minha boca, o líquido viscoso escorrendo pelos


meus lábios.

— Chupe, — ele comanda, e eu apenas balanço minha cabeça. — Chupe,


— ele diz novamente, com mais força, sua mão passando pela barreira dos
meus lábios. Algumas gotas de sangue entram na minha boca, mas quando
ele desliza a mão para baixo, eu a cuspo de volta na cara dele.

Bem feito, imbecil!

Ele não reage como eu espero. Não, sua língua passa por seus lábios
para lamber a mistura de sangue e cuspir em seu rosto, sua expressão me
desafiando a fazer mais.

Então sua mão desliza ainda mais baixo até cobrir o corte que ele
acabou de fazer.

— Você era minha no momento em que injetei meu sangue em seu


corpo, little tigress. Eu te dei minha força vital e, em troca, amarrei você a
mim. Isso significa que ninguém, absolutamente ninguém, toca em você.

A palma da mão se move em movimentos circulares, esfregando o


sangue na minha ferida, misturando nossos líquidos.

Só posso olhar com admiração para ele... neste louco diante de mim.

— Eu pensei que poderia deixar você ir, — sua voz é quase audível, pois
ele parece se fundir. Ele cava a faca sob o corpete do meu vestido, cortando
efetivamente o material.

— O que? — Meus olhos se arregalam quando o vejo me abraçar com


uma mão e cortar as roupas do meu corpo com outra.
— Você queria ser fodida, little tigress. Parabéns, você finalmente
conseguirá o que deseja.

Com um último puxão, ele tira o vestido de mim, rasgando-o por todo o
caminho. Sua mão não está mais em mim, então eu aproveito, recuando
lentamente.

Mas ele é um predador à espreita, e logo fica claro que, não importa o
que eu faça, não poderei afastá-lo.

Meus joelhos bateram na cama e eu caio de costas.

Ele está em mim de uma vez, e sua lâmina corta o último pedaço de
material que cobre meu corpo.

Nua... Estou completamente preparada para ele. À sua mercê.

Seus olhos vagam loucamente pelo meu corpo, permanecendo na


cicatriz do tiro e depois no novo corte que ele me deu. Eles vão mais baixo,
sobre meus seios, meu estômago e sobre meu lugar mais particular.

Me sentindo nervosa com sua leitura, puxo o lençol da cama para me


cobrir.

— Você pode correr, mas não pode se esconder. — Enzo diz, sua
expressão sem emoção. Ele faz um trabalho rápido com a camisa e calça, e
em pouco tempo ele está tão nu quanto eu. Seu pau se projeta
orgulhosamente entre as pernas, sua ereção enorme.
Meus olhos se arregalam com a realização.

Eu estou fodida. Literalmente.

Eu volto para a cama, mas meus esforços são em vão quando ele envolve
as mãos em volta dos meus tornozelos, me puxando para baixo em sua
direção.

Ele cobre seu corpo sobre o meu, pele a pele. Seu nariz começa a roçar
minha pele, viajando para cima e para baixo do meu pescoço. Eu congelo,
sem saber o que esperar.

— Enzo, por favor não. Não é assim, — eu pego seu rosto em minhas
mãos, esperando que veja o pedido nos meus olhos.

Ele não parece me ouvir enquanto separa minhas pernas, se


estabelecendo contra mim.

E eu o sinto lá — quente, pulsante, ameaçador, mas emocionante.

Deus, eu estou doente.

E ele está tão doente quanto eu enquanto avança, deslizando em mim


com um impulso. Olhos fechados, minhas costas arqueiam e um suspiro
escapa dos meus lábios. Minhas paredes se estendem e se abrem tentando
acomodar seu tamanho, deixando uma sensação de queimação para trás.
Minhas mãos agarram seus ombros, minhas unhas cavando sua pele.
Dói, mas é bom.

Ele está tão dentro de mim; eu gostaria que ele nunca fosse embora.

Sinto sua respiração quente no meu rosto, seu rosto contorcido em algo
semelhante a dor.

— Você se sente como um saqueador agora? Tomando o que não é seu


para levar? — Eu pergunto a ele, as palavras destinadas a condená-lo, mas
meu corpo só deseja que ele se mexa — me foda tanto que eu me machuque.

— Não, — ele acaricia meu cabelo, uma aparência de emoção em seus


olhos, — me sinto o único homem que estará dentro de você. O único homem
que sempre vai saber como é, — ele faz uma pausa, deslizando para fora de
mim antes de voltar, — para foder sua boceta apertada.

Dedos na minha bunda, ele me traz para ele, seu pau empurrando
profundamente dentro de mim e provocando um gemido involuntário.

Mas a expressão em seu rosto, tão presunçosa e superior... Não consigo


me ajudar quando levanto minha mão e bato nele, pegando o lábio com o
anel no meu dedo — ironicamente, minha aliança.

— Eu te odeio, — cerro os dentes, disposta a não gostar disso, mas


falhando miseravelmente enquanto ele me acaricia até minha alma.

Sangramento labial, ele não para o ataque, entrando e saindo de mim.


— Eu sei que sim, little tigress, — diz ele antes de sitiar meus lábios,
persuadindo-os a abrir, alimentando-me de seu sangue mais uma vez.

Talvez eu deva me sentir enojada. Talvez.

Mas quando o sinto ganhar velocidade, envolto minhas pernas em volta


dele, segurando-o com força contra mim e devolvendo o beijo. Nossas línguas
estão se movendo loucamente uma contra a outra. Eu o respiro e o deixo me
respirar.

Uma troca de almas.

Membros enredados, movimentos bruscos e duros, estamos tão


envolvidos um no outro que nada mais importa, apenas ele me fodendo, seu
pau entrando e saindo de mim, carne batendo contra carne, meus sucos
cobrindo seu eixo enquanto ele me empala novamente.

— Mais, — eu deixo escapar, seus lábios moldados no meu pescoço,


chupando, lambendo. Seus dedos estão brincando com meus mamilos,
mexendo e apertando-os.

— Quem está te fodendo, little tigress? — ele de repente exige, parando


no meio da pressão. Meus calcanhares cavam em sua bunda enquanto eu o
exorto, já bêbada com a sensação.

— Você, só você.
— Bom, — ele diz antes de levar um mamilo na boca, os lábios enrolados
no broto apertando. Eu grito, as sensações combinadas me enviando para
uma espiral de felicidade.

— Agora me diga, — um sorriso maligno toca em seus lábios, um dedo


circulando meu clitóris. Estou tão perto... Eu posso sentir isso. Mas então
ele de repente para. — A quem você pertence? — Ele se mantém quieto,
esperando minha resposta.

Idiota!

— Eu, — respondo, capturando seus lábios com os meus, meus


músculos se apertando ao seu redor.

— Little tigress, — ele geme, e suas mãos estão novamente estimulando


esse ponto.

Sinto uma intensidade desabando sobre mim de olhos fechados, procuro


montá-la.

— Abra seus olhos, — eu os abro para encontrá-lo olhando para mim.


Minha boca forma um O, minha boceta se contraindo ao seu redor,
ordenhando-o.

Sua expressão reflete a minha, enquanto eu o sinto me enchendo,


atirando sua semente dentro de mim.
Nós olhamos nos olhos um do outro e pela primeira vez não há ódio,
nem animosidade.

É apenas... nós.

Eu acordei em algum momento no meio da noite, e um olhar para o


corpo nu de Enzo ao meu lado me faz lembrar de tudo. Claridade retorna
lentamente e os eventos da noite passada parecem totalmente diferentes.

Lembro-me claramente de como Lucia havia me apresentado a esse


homem, como ela não tinha nada além de boas palavras para dizer sobre
ele, e no meu cérebro cheio de champanhe ele parecia um maravilhoso
parceiro de conversa.

Mas também me lembro de outra coisa. Como antes de irmos para a


varanda, ele acenou para alguém ao lado.

Lucia, Lucia, o que você esperava?

Ela achou que Enzo também me mataria?

Provavelmente.
Mas parece que ela não conhece muito bem o filho. Ele ainda é um
assassino a sangue frio — bem, a temperatura é discutível — mas ele parece
ter uma fraqueza pelas mulheres ou, neste caso, esta mulher.

Enquanto eu junto tudo com as não coincidências da noite anterior,


uma ideia toma forma em minha mente.

Sem vergonha...

Eu posso estar sem vergonha, mas parece que Lucia precisa de outra
lição. E que melhor maneira de ensiná-la do que mostrar exatamente o que
o filho está fazendo comigo.

Balançando as pernas da cama, vou para a parede voltada para o norte


e afasto a cômoda que usei para cobrir a câmera.

O olhinho da lente volta à vida e um sorriso desonesto se espalha pelos


meus lábios.

— Allegra? — A voz de Enzo me chama, e eu me viro para encontrá-lo


sentado na cama, com os olhos escurecendo quando o olhar acaricia meu
corpo nu.

Caminhando em direção à cama, ondulo meu corpo em uma dança


sedutora, esperando despertar seu interesse.

— Enzo, — pergunto em um tom sem fôlego, me abaixando na cama e


rastejando em sua direção.
— O que é, — ele pergunta, já duro e pronto para ir.

— Eu preciso de você, — eu choro, escovando meus seios contra o peito


dele.

— Minha tigress precisa de mim, — seus dentes pegam meus lábios, e


ele me dá um beijo retumbante antes de me virar de bruços. — Diga-me o
que você precisa, tigress, e eu darei a você, — sua respiração toca meu
pescoço enquanto ele geme e arrepios cobrem meu corpo inteiro.

— Você, eu quero você, — ronrono, metade pela câmera, metade porque


ele me faz sentir selvagem na minha própria pele.

— Detalhes, eu quero detalhes, — seus dedos esculpem uma trilha


ardente na minha espinha, alcançando minha bunda e me dando um tapa
forte.

— Eu quero seu pau dentro de mim, — digo as palavras em voz alta, e


um rubor envolve meu rosto.

— Uma garota tão travessa, — Enzo repreende um tom divertido, com


os dedos mergulhando entre as bochechas da minha bunda e me
encontrando encharcada. Eu enfio minha bunda na sua mão,
choramingando enquanto ele brinca comigo.

— Eu amo seus sons, minha tigress perversa, a maneira como você


mexe quando eu acaricio sua linda boceta, — suas palavras servem apenas
para me despertar ainda mais, e logo esqueço tudo sobre a câmera, seu toque
especialista me fazendo me contorcer e gritar. em prazer.

— Foda-me, — digo novamente quando desço do meu orgasmo.

— Se você implora tão bem... — ele se afasta e eu o sinto na minha


entrada, empurrando e me enchendo.

— Porra! — Enzo resmunga quando está dentro de mim. Mãos na


minha cintura, me arrasta em sua direção até minhas costas estarem contra
seu peito. Sua boca está no meu pescoço, me mordendo em uma alegação
animalesca enquanto ele bombeia seus quadris dentro e fora de mim.

— Você se sente tão bem enrolada em volta do meu pau, tigress, — a


voz dele é áspera contra a minha pele, suas mãos inflexíveis explorando meu
corpo, torcendo todo prazer dele. — Juro que poderia passar uma eternidade
enterrado dentro de você, — continua ele, com a boca ao lado do meu rosto,
as palavras apenas para os meus ouvidos.

— Sim, — sussurro, uma mão no quadril enquanto o encorajo.

— Você é perfeita. Tão fodidamente perfeita que não sei o que fiz para
merecer você, — as palavras dele dão uma guinada inesperada, mas a
intensidade de suas emoções serve apenas para me deixar mais afinada com
as minhas.

— Minha tigress, porra! — Sua boca está de volta à marca da mordida,


mordiscando e provocando a pele. Seus dentes estão raspando contra a
ferida, perfurando minha carne várias vezes enquanto ele se move dentro
de mim, dor e prazer se misturando para me fazer ofegar em rendição.

Sei que ele tirou sangue novamente e usa a língua para espalha da
ferida no meu pescoço, deixando pequenas mordidas no rastro antes de
chegar ao meu queixo. Ele me agarra pelo pescoço, me virando um pouco
para que ele possa ter acesso à minha boca.

— Você é minha, droga, — diz ele contra a minha boca, lambendo um


rastro de sangue pelos meus lábios, empurrando a língua para dentro.
Apertando forte quando me obriga a provar meu próprio sangue, me fodendo
com a boca e o pau.

Eu desisto, empurrando meus quadris contra ele para levá-lo mais


fundo, agarrando a mão onde ele se cortaria e devolvendo o favor. Passo a
língua sobre o corte antes de tentar abri-lo novamente com os dentes.

Eu não deveria ser a única a sentir a dor.

— Você é um pouco selvagem, não é? — ele pergunta, olhos entreabertos


olhando para mim. Em vez de tirar a mão, ele a pressiona ainda mais na
minha boca, pedindo que eu o prove. Eu colo nele, e ele geme no meu ouvido,
o som reverberando por todo o meu ser.

Eu me aperto ao seu redor, uma antecipação de merda me envolvendo.


A outra mão dele já está me tocando, acariciando meu clitóris até eu gozar.
Seus impulsos ganham força, seu toque se contorce ao lançar sua
libertação em mim.

Nós dois caímos na cama, envoltos um no outro. Ficamos assim até


ouvir suas respirações constantes e sei que ele está dormindo.

Eu me desembaraço dele, dando um beijo na sua testa antes de sair da


cama.

De pé, sêmen começa a vazar pelas minhas pernas. Não me importo


quando me planto na frente da câmera. Deveria ter capturado tudo
perfeitamente.

Lucia deve ter um assento na primeira fila e ver quanto seu filho me
odeia.

De frente para a câmera, deslizo um pouco do esperma do interior das


coxas e trago-o para a boca, lambendo o dedo com um gemido.

— Manda ver, vadia! — Deixei o aviso falar por si mesmo quando volto
para a cama e sucumbo ao sono.

Sim, eu posso não ser a mais bonita, ou mais culta, ou mesmo a mais
experiente.

Mas não vou deixar alguém andar por cima de mim.

Meu marido incluso.


CAPÍTULO DEZESSETE

Que porra aconteceu?

Abrindo os olhos, gemi com a forte dor de cabeça que me atinge.


Olhando em volta, franzi a testa, surpreso por me encontrar no meu antigo
quarto.

Estou sozinho na cama, mas a forma de outro corpo está impressa nos
lençóis ao meu lado, evidência do que aconteceu na noite anterior. Allegra
não está por perto, mas ouço a água correndo no banheiro.

Não querendo ficar cara a cara com ela, pego minhas roupas e tropeço
para o quarto do outro lado do corredor.
Porra!

Pedaços e imagens estão voltando para mim, e nenhum delas me pinta


sob uma boa luz.

— Enzo, por favor não. Não é assim.

Essa frase continua repetindo na minha cabeça, e tento lembrar como


chegou a esse ponto.

Eu estava atrasado para a festa, retido por uma reunião com os russos.
Desde que cortamos nossos laços com os Lastra, não conseguimos encontrar
um novo provedor para os clubes. Rocco me colocou no comando e eu me
encontrei com o atual Pakhan para discutir um novo acordo.

Muita vodka depois, e as conversas pareciam promissoras. Eu


certamente tinha saído com um bom pressentimento sobre essa parceria e
um pouco tonto do álcool.

Quando cheguei em casa, meu primeiro pensamento foi encontrar


Allegra. Sabendo quantas pessoas estranhas estariam presentes na festa,
eu não queria arriscar que nada acontecesse com ela. Se eu fosse honesto
comigo mesmo, não queria arriscar que ela interagisse com alguém que
pudesse ela pudesse achar interessante.

Às vezes, o mero pensamento de que alguém pudesse arrancá-la de mim


me deixa tão bravo que mal consigo ver direito.
Então, eu fui direto ao salão, me desculpando das pessoas que me
impediram de me desejar um feliz aniversário. Mas assim que entrei no
salão, minha mãe e seu grupo de amigas me pararam.

— Não é educado não fazer um brinde, Enzo, — disse minha mãe,


concordando rapidamente com suas amigas. — Você é o aniversariante,
afinal. — Eu me abstive de revirar os olhos e, pegando a taça de champanhe
que a mãe havia oferecido, eu joguei no chão.

— Ótimo, agora se você me der licença, — tentei passar por elas, mas
mais uma vez me pararam para que pudessem me abraçar e beijar minhas
bochechas.

Mais de dez pessoas haviam se alinhado para me desejar um feliz


aniversário e, quando comecei a procurar Allegra novamente, minha visão
começou a desaparecer, minha adrenalina bombeando.

Eu parei no meio do salão, um pouco desorientado, uma raiva fervente


logo abaixo da superfície.

Alguém me guiou em direção à varanda onde eu tinha visto minha


esposa no abraço de outro homem.

Meu cérebro parou de funcionar naquele momento. Só me lembro de


uma raiva diferente de tudo que já senti em minha vida queimando em
minhas veias, procurando ser libertada.
E então eu agarrei o homem e não parei até que o sangue dele estivesse
quente em minhas mãos. Mas mesmo assim, não foi suficiente. Eu colocaria
uma bala no seu crânio, não me importando com as reações ao meu redor.

Minha mente se fixou em uma coisa: alguém tocou minha esposa. E


havia um inferno a pagar.

Agarrei Allegra e a trouxe para o quarto. E depois...

As imagens são confusas, e eu só me lembro de trechos, não de uma


narrativa coerente.

Mas uma coisa é certa.

— Enzo, por favor não. Não é assim.

Se Allegra não me odiava antes, ela com certeza o faz agora. E eu? Eu
ficaria feliz em colocar uma arma na mão dela para que pudesse receber sua
retribuição.

Ainda não entendo como poderia fazer algo assim. Eu vi minha irmã e
as consequências de seu estupro.

Inferno, eu tenho meus próprios demônios para lidar.

E por causa disso, eu sei que eu nunca a teria levado contra sua
vontade. Deus, eu tinha me esforçado bastante para não transar com ela.
Puxando meu telefone, ligo para um contato que trabalha em um
laboratório de toxicologia.

— Eu preciso de um exame de sangue, — dou alguns detalhes a ele.


Tomo banho rapidamente e troco de roupa antes de ir para a sua casa.

Eu me sentia tão irritado de maneira não natural, que sei que estava
perto de assassinatos em massa, especialmente quando vi as mãos daquele
homem em Allegra. Que eu acabei com ele foi uma maravilha. Inferno, que
Allegra está ilesa é um milagre.

Espera... Ela está bem?

A vergonha queima profundamente no meu estômago ao pensar em vê-


la olhar para mim com nada além de ódio em seus olhos.

Eu mereço mais? Os flashes que me lembro da noite passada são


suficientes para me tornar o vilão da história, o monstro que não parou
quando disse que não.

Deus, Allegra... O que mais eu fiz para você?

Estou quase com medo de descobrir.

Quando estou prestes a sair, vejo Ana sair do quarto, então a puxo para
o lado e a questiono sobre o estado de Allegra.
— Ela parecia bem para mim. É uma maravilha que ela tenha
aguentado por tanto tempo, — ela balança a cabeça diante dos olhos,
percebendo que deixaria algo escapar.

— O que você quer dizer? — Eu pergunto imediatamente, assegurando


que nada lhe acontecerá. — Eu só quero a verdade.

— Signora Lucia está um pouco... — ela olha em volta antes de abaixar


a cabeça para sussurrar para mim.

Eu ouço com o coração pesado enquanto ela conta todos os casos que
testemunhou, da mãe intimidando e ridicularizando Allegra de propósito.
Lentamente, uma imagem se pinta na minha mente, e não é bonita.

Agradeço a Ana por sua sinceridade e saio de casa.

— Porra! — Eu bati meu punho contra o volante. — Porra! Porra! Porra!

O que eu fiz com ela?

Não é à toa que ela queria ter lugares separados. Ela está vivendo no
inferno.

E eu apenas... deixei acontecer.

Eu tiro meu sangue e meu contato me avisa que levará algum tempo
até que os resultados estejam disponíveis, mas ele voltará para mim assim
que os tiver.
— Pelo que você me disse, porém, é bem claro que alguém drogou você,
— ele menciona quando eu saio. — Agora é apenas uma questão de descobrir
quais drogas foram usadas.

Sua própria hipótese confirma o que eu já pensava, então, quando volto


para casa, meus únicos pensamentos são sobre como enfrentar Allegra.

Querendo tirar tudo do caminho, decido um confronto direto.

Batendo na porta, abro-a para encontrá-la na penteadeira, penteando


os cabelos levemente molhados.

Passando atrás dela, pego o pente das suas mãos e enfio-o no cabelo.
Ela está me observando atentamente pelo espelho quando finalmente tenho
coragem de falar.

— Gostava do seu cabelo antes, — é a primeira coisa que sai da minha


boca e quase gemo com a minha escolha de palavras.

— Sua mãe estava certa. Eu precisava de uma mudança, — ela


responde, mas seu rosto não trai nenhuma emoção.

Meus olhos avaliam secretamente seu corpo, procurando por sinais de


que eu poderia ter sido muito duro com ela.

Porra! Se ao menos eu pudesse me lembrar...


— Você nunca deveria ouvir minha mãe, — digo, e seus olhos se
estreitam. — Você ainda é linda. — Eu rapidamente altero, não querendo
que ela pense que estou criticando sua aparência.

A sua mão cobre a minha sobre o pente, e ela me para, virando-se para
que possa me olhar nos olhos.

— Você não precisa mentir para mim, Enzo. Isso é uma coisa que você
nunca deve fazer, — os seus dedos roçam os meus enquanto ela retira a mão,
mas eu rapidamente a pego, me ajoelhando na sua frente. Pego as duas
mãos nas minhas e as trago para os meus lábios.

— Você é linda para mim, Allegra, — digo-lhe sinceramente. A mais


bonita, — Não duvide disso...

Ela zomba, um sorriso irônico desenhando suas feições.

— É a culpa falando? Pelo que você fez? — Ela inclina a cabeça para o
lado, sobrancelha levantada, me estudando. — Não se preocupe. Eu vou te
perdoar se você nunca mais falar essas mentiras para mim.

Meus olhos se arregalam um pouco quando ela menciona casualmente


a noite passada como se não fosse nada, suas feições são tão sem emoção.

Deus... ela deve realmente me odiar.

Antes que eu possa responder, ela me sacode e se levanta, indo para o


guarda-roupa.
— É tarde, você provavelmente tem um lugar para estar, certo? — Ela
pergunta sem sequer olhar para mim, sua atenção se concentrou nas roupas
diante dela.

Eu posso reconhecer que estou sendo dispensado. Mas o fato de sua voz
ser tão sombria... Eu balanço minha cabeça. Como eu teria preferido que ela
lutasse comigo. Se ela desse um tapa ou me amaldiçoasse. Mas isso?

— Como quiser, — respondo, saindo do quarto e deixando-a sozinha.

O que eu fiz para você, Allegra?

Sua apatia é mais poderosa do que qualquer bala que possa ter colocado
no meu coração. O pensamento de que eu poderia ter matado algo dentro
dela com meu comportamento... imperdoável.

Leva alguns dias para que os resultados voltem, e a longa lista de


substâncias nem me surpreende.

— Foi um forte coquetel de anfetaminas e MDMA14. Teria feito


qualquer um explodir. — O técnico de laboratório passa a me dizer que essa
mistura de substâncias é conhecida por causar raiva irracional e paranóia
que poderiam facilmente levar ao assassinato.

— Obrigado, — digo quando desligo, minhas mãos se apertaram em


punhos.

14 A 3,4-metilenodioximetanfetamina, conhecida pelo termo impreciso ecstasy.


Droga!

Eu deveria ter me livrado dela anos atrás. Mas eu colocaria a felicidade


de minha irmã acima da minha sede de vingança. Como elas teriam reagido
se a mãe que elas tanto amavam e adoravam fosse uma pedófila?

Mas isso é a gota d’água.

Tranco a porta do meu escritório, pronto para confrontar minha mãe


quando ouço Ana gritar lá de cima. Eu corro em direção ao barulho para ver
Allegra agachada no chão, o braço em volta da cintura enquanto ela esvazia
o conteúdo do estômago. Sangue está saindo do seu nariz.

— Que porra é essa? — Eu amaldiçoo em voz alta, vindo em seu auxílio


imediatamente. Ana está ligando para o 911 enquanto eu tento acalmá-la.

— A comida, — ela sussurra, apontando para a tigela meio vazia de


comida na mesa, e eu imediatamente suspeito do pior.

Veneno.

Eu a seguro enquanto ela continua vomitando, esfregando uma toalha


fria na testa.

A ambulância chega rapidamente e eu a seguro enquanto ela está sendo


carregada para o carro. A jornada para o hospital é um dos piores momentos
estressantes da minha vida, enquanto eu seguro a mão fria, esperando que
o veneno seja lento e que não seja tarde demais.
Esperando na sala de emergência enquanto os médicos a atendem,
tenho tempo suficiente para perceber exatamente quem está por trás disso,
a mesma pessoa que me drogou.

Tudo faz sentido. A mãe deve ter pensado que ver Allegra com outro
homem prejudicaria meu orgulho siciliano o suficiente para que eu matasse
os dois de uma vez. E quando isso não aconteceu, ela decidiu terminar o
trabalho sozinha.

O médico assistente confirma que ela foi envenenada e me disse que


teve sorte de exibir os sintomas mais cedo porque eles bombearam seu
estômago antes que o veneno entrasse em sua corrente sanguínea.

Com um suspiro de alívio, agradeço ao médico e vou ver minha esposa.

Ela está pálida, deitada na cama com os olhos semicerrados.

— Como você está se sentindo, little tigress? — Eu pergunto, pegando


sua mão na minha.

— Como merda, obviamente, — ela tenta fazer uma piada, mas depois
estremece de dor.

— Porra, você está bem?

— São apenas algumas cãibras no estômago. Os médicos dizem que eu


ficarei tão boa quanto nova. — Um sorriso fraco se estende por seu rosto e
meu coração vibra.
Ela está bem.

— Bom, — eu digo, levantando-me para sair. — Ana ficará com você até
que eles a liberem, — acrescento, e ela apenas assente. Talvez eu esperasse
que ela ficasse um pouco decepcionada por eu não ficar, mas o seu rosto não
revela nada.

Relutantemente, eu me viro para ir, mas apenas porque eu tenho


alguém para cuidar.

Chego a casa em tempo recorde e vou diretamente para o quarto de


minha mãe. Não me incomodo em bater enquanto abro a porta.

Ela está na cama, seminua e se masturbando em um vídeo que está


sendo exibido na TV na parede. Chocado, paro no meu caminho, virando a
cabeça quando ouço minha própria voz saindo da TV. Meus olhos se
arregalam quando me vejo empurrando agressivamente em Allegra por
trás.

Que porra é essa?

— Enzo, — minha mãe luta para se cobrir, usando o controle remoto


para parar o vídeo.

— Você nos filmou? — Eu pergunto com descrença.

— Enzo... — O seu lábio treme, sabendo que foi pega.


— Oh, então é você que está comemorando a morte de Allegra, não é?
— Quero ver sua máscara escorregar, sugiro que o número dela em Allegra
tenha sido bem-sucedido. Assim como eu imaginava, um olhar de puro
triunfo se espalha pelo seu rosto, um que está me deixando mal do estômago.

Semelhante a uma confissão, nem preciso ouvir as palavras de


confirmação da sua boca. Pego o seu pulso, contendo meu desgosto pelo
contato, e a levo comigo.

— Onde...

— Cale a boca e siga-me, — minha voz é baixa o suficiente para colocar


o medo nela, então quando eu a empurro no banco do passageiro do carro,
ela não luta muito.

Dirijo-nos rapidamente a um de nossos armazéns fora da cidade e a


arrasto comigo para dentro do lugar desolado.

O acerto de contas chegou.

— Enzo, qual é o significado disso? — Ela franze a testa olhando em


volta do armazém em ruínas.

Enquanto esperava os resultados dos testes, tive tempo suficiente para


pensar em todas as maneiras pelas quais a faria pagar — porque, na minha
opinião, ela era culpada desde o início. Mas agora posso ficar um pouco mais
inventivo.
Ela ousou tocar Allegra.

E isso significa que sua morte não será rápida.

Tranco a porta no armazém e sento-me em uma cadeira, observando.


Ela sabe que algo está prestes a acontecer. Eu posso ver a inquietação logo
abaixo de sua fachada calma.

— Você pode desistir do ato, — começo, — eu sei exatamente o que você


fez.

Ela ri, girando para olhar para mim.

— Enzo, você não deve ouvir essa cadela. Ela não sabe sobre o nosso
vínculo. — Ela tem a ousadia de sorrir, lentamente se aproximando de mim.

— Por quê? — Eu não elaboro, e ela sabe exatamente do que estou


falando.

— Eu não podia deixar sua semente se enraizar no corpo dela, — ela


coloca as mãos sobre os meus ombros. Eu continuo assistindo, o desejo de
acabar com ela aqui e agora me esmagando. Mas ainda não...

— Então você decidiu envenená-la.

— Claro. Agora se ela morreu... — um sorriso toca nos seus lábios.


— Ela está viva e bem, mãe, — eu a informo, e seus traços se
transformam em raiva cruel.

— O mesmo não pode ser dito sobre você, — levanto-me, com os dedos
circulando os pulsos e arrastando-a para a mesa no centro. Somente quando
ela vê as algemas na mesa começa a lutar do meu aperto.

Mas é tarde demais.

A parte de trás da minha mão se conecta com sua bochecha e ela cai,
tropeçando na mesa. Momentaneamente confusa com o tapa, ela nem se
mexe quando eu coloco os pés na mesa, um em cada lado.

Faço o mesmo com as mãos e, pela primeira vez, vejo algum medo real
no seu rosto.

— Sabe, mãe, fui informado de tudo o que você tem feito com Allegra e,
— deixei isso afundar antes de continuar, — não estou satisfeito.

— A cadela mereceu! Como alguém como ela poderia estar com alguém
como você? Meu lindo bebê precisa de alguém muito superior, não média
como ela. — Ela cospe as palavras e eu começo a ver a raiz de seu ódio por
Allegra.

— Hmm, e quem pode ser? Aquela pessoa superior de quem você fala?
— Eu finjo curiosidade ao dar um passo atrás da mesa, avaliando-a. Seus
membros estão espalhados em um X, seu vestido subiu os quadris no que
certamente ajudaria no meu plano.
Olho por olho.

Um sorriso maníaco aparece em seu rosto e eu já posso antecipar sua


resposta.

— Eu! Eu te dei a luz para que você só possa ser meu. Não há ninguém
mais digno.

— Realmente, — eu falo, com nojo profundamente no meu interior


quando me lembro de como ela tinha direito a mim e ao meu corpo. — É por
isso que você continuou tentando me foder enquanto dormia?

— Não é como se você não gostasse, — ela levanta uma sobrancelha. —


Ainda me lembro do gosto do seu esperma na minha boca, — ela faz um
barulho doentio com a boca e eu já sinto vontade de tirar minha arma e
atirar nela.

Ainda não!

— Você está doente. — Eu balanço minha cabeça em descrença.

— Imagine os filhos perfeitos que poderíamos ter! — Ela continua


tagarelando, mais absurdos saindo de sua boca.

Neste ponto, só posso concluir que ela é a mais depravada do mundo ou


é apenas mentalmente instável.

Ou talvez os dois.
Tirando meu telefone, eu ligo para Nero.

— Entre, — digo a ele, e ele logo aparece de uma porta escondida do


armazém carregando duas pequenas gaiolas.

— Eu sempre soube que ia te matar um dia, mãe, — eu círculo


casualmente a mesa, e ela me olha com suspeita. Ela não tem
absolutamente nenhuma ideia do que a espera. — Eu só me afastei por
causa de minhas irmãs, mesmo que você nunca tenha sido a mãe exemplar
para elas. Mas você teve que tocar Allegra, — eu faço um som tsk quando
paro ao lado da sua cabeça. — Você vê, ela pode ser média para você, mas
para mim ela é tudo. — Seus olhos se arregalam diante da minha ênfase na
palavra tudo.

— Você não pode dizer isso, — ela sussurra e, pela primeira vez, a
desolação destrói suas feições.

— Ah, mas eu digo, — dou a ela um meio sorriso me inclinando para


sussurrar em seu ouvido, — e isso significa que eu não mostrarei
misericórdia. — Eu ouço sua pequena respiração, e ela deve perceber que
estou falando sério.

— Mas seu pai... ele não vai permitir, — ela engasga, e eu só posso rir.

— Até onde todos sabem, agora você está em um voo para a Sicília para
férias prolongadas. Você realmente acha que meu pai vai sequer lembrar de
você? Haverá alguns cartões postais aqui e ali, é claro, mas fora isso, ele não
se importará que você partiu.
Ela empalidece com minhas palavras, principalmente porque sabe que
estou certo. Durante o casamento, ele não escondeu seus muitos assuntos
ou amantes, ou o fato de que simplesmente perdeu o amor por ela.

— Vou mostrar exatamente o que parece estar preso em sua própria


pele, sem controle sobre o que acontece com seu corpo. E não pense que não
tenho carinho por você, — acrescento, e uma faísca aparece nos seus olhos
apenas para ser esmagado quando termino minha frase, — passei muito
tempo pensando na maneira perfeita de acabar com sua existência. É
verdade que tive mais de uma década para pensar em detalhes do que faria.
Mas isso? — Eu inclino minha cabeça para onde Nero está, — é para Allegra,
com amor.

Levanto-me e acendo um cigarro, latindo minhas primeiras ordens.

Eu escolhi Nero para esse empreendimento específico porque tinha


visto como ele poderia ser confiável. Ele também é um bastardo psicótico e
frio. Eu não acho que ele tenha limites para o que pode fazer com outro ser.
E assim, a diversão pode começar.

Nero vai para a mesa e gira uma roda pequena, inclina-a quarenta e
cinco graus, a cabeça da mãe orientada para o chão enquanto seus pés estão
no ar.

Ele abre uma mochila cheia de ferramentas e tira um espéculo.


— O que? — Os olhos da mãe se arregalam quando ela vê, e ela começa
a se debater de suas restrições. Não ajuda, já que eu tinha me assegurado
do ajuste apertado.

O rosto de Nero está profissionalmente em branco quando ele joga a


saia da mãe sobre os quadris e tira a calcinha.

Então, ele empurra o espéculo na vagina, ampliando a abertura.

Pego a última tragada do meu cigarro antes de jogá-lo no chão e acender


outro, movendo-me para obter a experiência completa das emoções da mãe
enquanto ela experimenta a violação de seu corpo.

Só que não sou tão horrível em usar estupro. Pelo contrário, meus
sentidos cavalheirescos me dizem que eu deveria ser mais gentil que isso.
Ela é minha mãe biológica, afinal.

Deixando o espéculo no lugar, Nero apresenta um frasco com uma


substância amarela dentro.

Eu o instruí a fazer uma mistura muito particular. Admito que me


inspirei muito na antiga prática do escafismo, mas fiz alguns ajustes para
acomodar um meio diferente e alguns outros participantes.

Ele abre o pote e começa a derramar o conteúdo na sua vagina.

Uma mistura de manteiga de amendoim, mel e ovos de larva, diluídos


com um pouco de leite para dar uma consistência mais leve.
Mãe começa a gritar quando o líquido entra no útero, o mel grudando
nas paredes uterinas; os ovos se incorporando em um ambiente muito
quente e acolhedor — o lugar perfeito para eles crescerem até a idade
adulta. Devido à gravidade e sua posição, nenhum canto do útero
permanecerá intocado.

Dou um sinal a Nero e nós dois recuamos por algumas horas, tempo
suficiente para os ovos começarem a se mover.

Quando voltamos, a mãe está chorando, a pele está vermelha e quente.


Uma rápida olhada e posso ver algumas larvas se movendo.

Não é uma coincidência, já que alguém colhe esses ovos há um tempo,


brincando com a temperatura do ambiente para garantir que eles estariam
maduros para o prazer da mãe.

— Por favor, — ela choraminga quando me vê, mas eu apenas dou de


ombros.

Este é apenas o começo.

Eu me pergunto como é ter seu corpo invadido por objetos estranhos —


se movendo, se contorcendo dentro de você...

Enquanto assisto a agonia refletida em seu rosto, não consigo reunir


qualquer pena.
Ela tentou matar minha tigress, e isso é o suficiente para mim. Já não
sei se ela pode me perdoar pelo que aconteceu naquela noite. Se estou sendo
sincero comigo mesmo, duvido que as drogas tenham sido inteiramente
responsáveis pelo meu comportamento. Não quando eu reprimo meu desejo
por ela há tanto tempo, assustado com a intensidade das emoções que ela
desperta em mim.

E agora? Aconteceu e eu mal me lembro.

Eu aceno para Nero e ele pega uma das gaiolas menores, abrindo-a para
revelar alguns ratos famintos. Levando-os pela cauda, ele os empurra
lentamente no corpo da mãe, os roedores se arrastando para dentro da
vagina em busca da doçura da manteiga de amendoim e do mel.

A mãe já começa a gritar de dor, e acho que eles estão mordendo mais
do que o seu quinhão, mordiscando as paredes dela.

O tempo todo, os ratos comem vorazmente por dentro, e eu assisto suas


expressões faciais, e a maneira como a agonia está inscrita em seu rosto.

Mais... ela merece muito mais...

Mas não tenho tempo para isso. Não quando minha esposa está fraca e
debilitada, se recuperando de um ataque de veneno.

Fase dois concluída, Nero começa a fase três.


Usando um instrumento semelhante a um bisturi, mas por mais tempo,
ele começa a cortar as paredes uterinas da mãe, levando diretamente para
o intestino. O líquido do útero flui livremente para a cavidade recém-vazia
e, com ela, os ratos se enterram mais dentro dela.

Sua voz está esfarrapada, quase sem força. Mas ela ainda está
acordada.

Acendo outro cigarro, liberando uma nuvem de fumaça estudando suas


feições. Ela é resistente, dou-lhe crédito. Mas isso está apenas me ajudando
e o que planejei para ela ainda mais, com a fase quatro.

— Faça isso agora, — instruo Nero, com medo de que, se esperarmos


muito mais, ela possa desmaiar com a dor.

Seus olhos estão meio fechados e vidrados, e não importa o quão forte
ela seja diante da dor, nem ela pode levar ratos literalmente comendo suas
entranhas enquanto viva.

Nero abre a segunda gaiola, lidando com muito mais cuidado que a
primeira.

Dentro há uma píton verde-amarela de tamanho médio. Igualmente


faminta, Nero é particularmente cuidadoso com a boca, segurando o focinho
fechado com as mãos.
Mãe, mesmo em seu estado lânguido, abre a boca para exclamar sua
descrença ao ver. Medindo mais de dois metros, a píton parece ameaçadora,
especialmente por sua condição atual.

Seus olhos se arregalam diante de suas sobrancelhas e eu sei que ela


percebeu o propósito da cobra.

Com muito cuidado, Nero facilita a píton dentro de sua vagina e,


quando está bem dentro, ele deixa ir. A cobra desliza seu caminho mais
fundo, a fome a atormentando enquanto ela procura sua presa.

É bastante óbvio quando a primeira alimentação ocorre, à medida que


o estômago da mãe se expande com as mandíbulas da píton enquanto ela
engole um rato, engolindo lentamente inteiro e deixando seus agentes
digestivos trabalharem na dissolução da matéria orgânica.

O corpo inteiro da mãe começa a convulsionar, e os cantos da minha


boca se levantam levemente à vista.

A píton também deve ter fome o suficiente para o segundo rato e ainda
mais, garantindo que ele esteja engolindo alguns dos órgãos da mãe até o
final. Outro boato que aprendi em minha pesquisa é que as cobras digerem
melhor os alimentos quando estiverem mais quentes, então o corpo da mãe
deve ser o ambiente perfeito para garantir uma fome quase sem fim.

Bem, se isso não a matar, pode haver hemorragia, sepse ou até um


ataque cardíaco pela dor.
— E agora, mãe, acredito que minha esposa está me esperando em casa.
Certificarei de enviar seus cumprimentos, especialmente quando a
engravidar de nosso primeiro filho, — levo minha mão a uma saudação
simulada, mas seus olhos quase mortos mal reagem.

Satisfeito com a virada do evento e sabendo que ela não vai durar muito
mais, instruo Nero a me avisar quando ela finalmente morrer e a jogar seu
cadáver no Hudson depois. Não seria justo excluir predadores aquáticos.
Todo mundo deveria tentar com ela.

Hmm, eu era muito fácil com ela? Talvez eu devesse ter leiloado partes
do corpo dela na dark web.

É tarde quando finalmente chego em casa, e Ana me informa que


Allegra está dormindo em seu quarto, se recuperando da experiência
traumática de ter o estômago bombeado. Peço que ela me mantenha
atualizado, não querendo me intrometer onde sei que não sou procurado.

— O que você quer dizer você que precisa engravidá-la? — Maman


Margot pergunta, escandalizada.

Eu me endireito ao pensar em uma maneira de explicar isso a ela sem


parecer o pior.
— Ela precisa de um motivo para ficar, — acrescento bastante
fracamente.

As consequências do meu comportamento atroz e do envenenamento


dela não foram muito bem. Fiquei obcecado em mantê-la segura, escondida
do mundo para que ninguém possa prejudicá-la; mas também para que
ninguém possa roubá-la de mim.

Eu comecei com pouco. No começo, eu simplesmente a impedi de sair,


mesmo com seus guarda-costas. Vê-la agachada no chão com dor e
ensanguentada tinha feito uma marca em mim. De repente, comecei a ter
visões recorrentes dela entrando em um acidente de carro, ou pior, sendo
morta por um louco.

As visões se transformaram em pesadelos, e eu mal dormir por medo de


que algo pudesse acontecer com ela e tirá-la de mim.

Eu instalei câmeras em toda a casa, alternando meu tempo entre as


reuniões de negócios necessárias e observando-a.

Ela sentiu a mudança em mim e se tornou ainda mais distante.

Detesto admitir, mas o ódio que eu instilei nela pode ter começado a
piorar... e eu só tenho que me culpar.

— Como assim, não tenho permissão para ir em qualquer lugar? — Ela


perguntou, indignada, quando eu me recusei a permitir que ela fosse ao
supermercado.
— É perigoso. — Eu menti para ela, mesmo sabendo que o perigo é
somente na minha mente paranóica.

— O que há de errado com você? — Ela sussurrou, os olhos cheios de


dor.

— Estou apenas cuidando de você, — minha resposta não teve efeito


sobre ela e, desde então, nossas conversas se tornaram cada vez mais tensas.

É só à noite que parecemos nos dar bem, e foi totalmente surpreendente


que ela não tivesse rejeitado meus avanços, considerando tudo.

Diante da evidência do que eu tinha feito, eu tinha receio de chegar


perto dela. Mas uma noite, quando bebi demais, me vi batendo na sua porta.

Eu não estava bêbado o suficiente para não me lembrar disso no dia


seguinte, e eu saboreei a sensação dela em meus braços, a maneira como
sua expressão mudou em um momento de prazer.

Mas por mais que eu tivesse começado a me sentir mais confiante em


relação ao nosso relacionamento, fora do quarto a situação havia piorado.

— E daí, — ela arqueou uma sobrancelha para mim, — só porque sou


uma mulher não posso gostar de sexo? Eu preciso tirar pelo menos algo
desse relacionamento... se você pode chamar assim, — ela revirou os olhos
para mim.
— Então é isso? Você está apenas me usando? — Eu fiquei surpreso
com o comentário.

Ela deu de ombros. — Você não pode me oferecer nada além de uma boa
foda, Enzo. Não vamos nos iludir de que há algo mais profundo no que
fazemos. Nós fodemos. Duro, rápido, como animais. Não há nada terno ou
amoroso, — ela parou, estudando minha reação. — E eu estou perfeitamente
bem com isso. Eu não acho que você tem isso para me dar mais, — com um
tapa amigável no ombro, ela foi ao banheiro, me deixando sozinho na cama
e olhando para a figura em retirada. Ela pegou minhas palavras de antes e
as torceu, e eu percebi como era estar no lado receptor de tanta zombaria.

Foi nesse momento que eu sabia o quão errado nosso relacionamento


havia se tornado. Ela até parou de discutir comigo, e a apatia estava me
matando.

E assim nossa estranha dinâmica persistiu — à noite, encontraríamos


prazer nos braços um do outro; e durante o dia nos ignoraríamos.

Há um mês, porém, Allegra se tornou mais secreta do que o habitual.


Então eu bisbilhotei o seu diário — novamente.

Mas o que eu encontrei me abalou profundamente.

Minha little tigress estava planejando me deixar. Ela fez planos


detalhados, acompanhando a mudança de guardas e o horário dos ônibus na
estação próxima. Ela tinha sido extremamente minuciosa em suas
observações, e eu sabia que era apenas uma questão de tempo até que
executasse seu plano perfeitamente, me deixando para sempre.

— Enzo... — Maman Margot balança a cabeça para mim, e eu posso ver


a decepção nos seus olhos, — o que você fez?

— Eu só preciso que ela fique, — repito, uma pitada de desolação na


minha voz.

Eu sei que poderia trancá-la, isolá-la ainda mais do que já tenho. Mas
isso a faria me odiar ainda mais.

E agora mais do que tudo eu quero que ela não me odeie.

Não, preciso que ela queira ficar por vontade própria. E eu sei que uma
criança seria a razão perfeita para ela ficar.

— Você tem tido relações? — Maman sondas, e eu aceno. — Protegido?


— Ela acrescenta, e eu franzi a testa.

— Não, nunca usamos proteção.

Maman restringe os olhos em consternação.

— Nunca? Há quanto tempo vocês dormem juntos?

— Quase um ano agora.


— Deus, Enzo... é difícil acreditar que ela não tenha concebido até
agora. Talvez um de vocês tenha problemas de fertilidade... — Ela segue. —
Mas também, talvez ela esteja tomando algo para evitar a gravidez?

Ainda assim, a ideia é absurda no começo, mas começando a fazer


sentido quanto mais penso sobre isso.

— Certamente, pode haver problemas de fertilidade, mas... — De


repente, fico impressionado com um pensamento. — Ela está sempre
tomando uma pílula às 15h. Eu perguntei a ela sobre isso e me disse que
eram vitaminas. — Eu digo e maman apenas franze seus lábios.

— As vitaminas não precisam ser tomadas na mesma hora todos os


dias. Contraceptivos precisam.

— Porra, — murmuro baixo e tento lembrar como ela os teria


conseguido em primeiro lugar.

Ana...

É ela quem entrega suas vitaminas todos os meses.

Porra!

Como eu não vi isso? Ela está planejando tudo, não está?


— O que eu posso fazer maman? Não posso perdê-la, — a dor na minha
voz deve ser palpável porque maman me dá uma solução, mesmo que ela
não concorde com isso.

— É melhor você tratar bem essa garota, Enzo, — ela me avisa quando
eu saio.

Depois de fazer minha pesquisa sobre as pílulas, troco furtivamente por


placebos, esperando que não demore muito até que eu veja os resultados.

Tarde da noite, quando vou para o seu quarto, já a encontro dormindo.


Tirando minhas roupas, deslizo entre os lençóis, abraçando-a para mim.

Começo a beijar seu pescoço, seus ombros, alcançando seus seios


enquanto a sinto despenteada contra mim, suas mãos me puxando para
mais perto, suas pernas se envolvendo ao meu redor.

— Mhm... — ela choraminga quando meus dedos acariciam seu clitóris,


mergulhando mais baixo para entrar em seu corpo. Ela está confortável em
volta dos meus dedos quando eu os coloco dentro e fora dela.

Eu traço minha língua sobre o seu peito até chegar aos seus lábios,
beijando-a com uma intensidade que nos deixa sem fôlego. Suas paredes
apertam meus dedos e eu engulo seu gemido na minha boca, continuando a
provocá-la até que ela esteja me implorando para parar.

Só então eu me enterro dentro de seu corpo, o calor apertado de seu


canal me faz estremecer de puro prazer.
— Porra, — murmuro contra a sua boca quando começo a entrar e sair
dela, meu pau batendo na parte de trás do útero e fazendo-a choramingar.

— Você é tão boa, little tigress. O ajuste perfeito.

Meu ajuste perfeito.

É apenas em momentos como este, quando nós dois abaixamos nossas


guardas, que eu posso revelar algumas das coisas que ela me faz sentir.

Se eu dissesse alguma coisa durante o dia, ela me chamaria de


mentiroso ou riria e as jogaria na minha cara.

— Enzo, — suas unhas caem pelas minhas costas, a pressão tão forte
que sei que ela tirou sangue.

— Minha pequena selvagem, — eu mordo o mamilo, e ela convulsiona


ao meu redor, sua boceta me agarrando tão forte que eu tenho que me
segurar para não gozar.

Ainda não.

Eu arrasto minha boca para cima, meus dentes raspando na pele do


pescoço dela até atingir o pulso dela. Lambendo o ponto sensível, eu o chupo,
deixando minha marca nela antes de lambê-lo com os dentes, rasgando a
pele.
O sangue flui na minha boca e eu me deleito com o sabor metálico, a
maneira como nos tornamos um.

Suas mãos puxam meu cabelo, me trazendo para encará-la. Olho nos
olhos enquanto ela se inclina para mim, sua língua dançando em cima dos
meus lábios, lambendo seu próprio sangue antes de aprofundar o beijo.

Eu aumento minha velocidade, meus dedos apertando nos seus quadris


enquanto trabalho meu pau dentro e fora.

— Mais rápido, — ela me ordena, e eu só posso me obrigar a fazer isso.

Deslizando brevemente para fora dela, eu a viro de barriga, agarrando


a sua bunda e mergulhando nela mais uma vez, mais profundo e forte.

Essa é a maneira animalesca que nossos acasalamentos geralmente


terminam.

Pego o seu cabelo, puxando-a em minha direção, enquanto minha outra


mão circunda o pescoço. Continuo lambendo a ferida aberta no ombro dela,
Allegra choramingando tanto no prazer quanto na dor.

Ela goza, gritando meu nome, suas paredes se apertando ao meu redor.
Eu a empurrei mais algumas vezes antes de me esvaziar dentro dela. A
satisfação transborda dentro de mim imaginando meu esperma cobrindo seu
ventre, impregnando-a.

Porque ela é minha.


E ela só pode para sempre ser minha.
CAPÍTULO DEZOITO

Eu larguei a pequena pá no chão, e me levanto, já precisando


urgentemente de um copo de água e um pouco de sombra. Eu deveria ter
percebido que a jardinagem ao meio-dia de agosto não seria uma boa ideia,
mas depois de ficar sem coisas para fazer, não é como se eu tivesse uma
escolha. É isso ou... tédio completo.

É possível morrer de tédio?

Porque sinto que em breve morrerei.

Após minha visita de emergência ao pronto-socorro no ano passado, as


coisas mudaram. Dramaticamente, pode-se dizer.

Um dia, Lucia estava rindo de mim de sua torre elevada, no outro ela
se foi. De repente, decidiu visitar a Sicília para umas férias prolongadas.
Quando ouvi isso, fiquei extasiada. Finalmente, eu teria uma pausa nas
batalhas em andamento nesta casa.

Embora eu sentisse uma merda por ter esvaziado meu estômago, ainda
achava dentro de mim me alegrar com o pensamento de passar um dia —
apenas um dia — em paz.

E para minha alegria eterna, ela ainda não voltou.

Mas Enzo...

Seu comportamento mudou completamente após esses incidentes. Foi-


se o safado brincalhão, substituído por um bastardo frio e insensível.

Bobo, mas eu pensei que dormir juntos mudaria nosso relacionamento


para melhor. Em vez disso, Enzo havia se tornado mais taciturno, às vezes
mal me olhava. Se isso não bastasse, ele começou a me proibir de sair,
mesmo com guardas armados.

Em pouco tempo, passei de esposa relutante para prisioneira


amargurada.

No primeiro mês, tentei me acostumar com a ideia. Afinal, o que mais


há para mim?

Mas eu provei a liberdade e agora sei o que o mundo tem a oferecer,


então não estava disposta a deixar outro homem me prender.
Um pequeno lampejo de esperança começou a crescer dentro de mim, e
eu sabia que não podia simplesmente aceitar o seu abuso.

Enquanto no começo tudo tinha sido noções fantasiosas — os sonhos de


que se — depois de testemunhar um novo lado do meu marido, eu me
tornava cada vez mais certa de que não podia ficar.

Uma noite, Enzo tropeçou no meu quarto e começamos a arranhar um


ao outro como dois animais no cio. Ficamos fora de controle a noite toda,
nossos corpos conversando em vez de nossas bocas. Tinha sido o paraíso... e
inferno.

Porque quando a luz do dia chegou, ele voltou ao seu eu indiferente. Era
como se eu não importasse. Foi quando eu percebi o quão fácil é para ele
atirar sua luxúria no meu corpo, mas fingi que não existo quando não
precisa de mim.

Eu tinha percebido o quão patética eu me tornei.

Tão faminta que eu estava por qualquer migalha de afeto, que mais
uma vez permiti que meu coração derretesse um pouco por ele.

Não mais.

Desde que vi que seu único uso para mim era o sexo, decidi tratar nossos
encontros entre os lençóis com a mesma indiferença que ele. Todo mundo
faz sexo, certo? Eu não deveria dar importância a isso.
Eu me forcei a fechar meu coração para ele e fazer o que os homens são
tão bons em fazer, tratar nosso caso carnal sem amarras.

Levei um tempo para parar de ansiar, para parar de sentir essa


pontada no meu coração sempre que o via.

Mas eu fiz isso.

E assim outro plano começou a tomar forma — liberdade.

Não quero ser prisioneira a vida toda. Eu sei que há uma vida para mim
lá fora, longe da máfia e longe de Enzo.

Então comecei a planejar, observar, inventar.

Usei meu diário para escrever todas as minhas ideias, criando


estratégias como um general de guerra experiente. Observei a posição dos
guardas, os tempos entre os turnos e as características individuais de todos
os homens ao redor da casa. Observei onde estão as fraquezas na segurança
e pretendo aproveitar totalmente isso quando chegar a hora.

Eu também escondi coisas para penhorar, coisas que me ajudariam a


me levantar quando estivesse o mais longe possível daqui.

Eu estava tão orgulhosa de mim mesma, quase um ano se passou, mas


estava confiante de que meu plano teria sucesso.
Agora, com menos de um mês restante até o dia, me sinto um pouco
nostálgica. Ainda estou firme em minha convicção de que eu preciso partir.
Mas à noite, eu me pego ansiando mais por Enzo, procurando o calor de seu
corpo, deixando-o me levar com força e rapidez de uma maneira que me
manda para o limite, rindo no precipício, sabendo que se eu realmente cair,
posso nunca me recuperar.

Porque enquanto eu reprimia meus sentimentos por ele, ainda estou


preocupada que um dia chegue e o selo se quebre, minha emoção se
derramando com uma intensidade que eu não estou pronta para enfrentar.

Sentindo-me um pouco tonta, pisquei meus olhos duas vezes, tentando


recuperar meu equilíbrio.

Água... Eu preciso de água.

Dirijo-me para a cozinha, derramando-me um copo e encontro Enzo.


Seu rosto tão sem emoção quanto eu esperava, ele se aproxima de mim, uma
carranca que combina com seus traços perfeitos.

Mas, assim como ele está a menos de um pé de distância, um cheiro


picante me atinge — aquele perfume. Meus olhos se arregalam por um
momento antes que tudo o que eu comi naquela manhã volte correndo. Eu
chego à pia em tempo recorde, esvaziando o conteúdo do meu estômago e o
do meu coração.

Ele estava com ela... de novo.


É sempre o mesmo cheiro, então eu sei que tem que ser a mesma
mulher.

Ele a ama?

Ele deve, já que está com ela desde o início.

Ela sabe que ele também está dormindo comigo? O pensamento quase
me faz rir, se eu não estivesse nessa posição embaraçosa, curvada sobre a
pia, a torneira correndo enquanto eu coloco água no meu rosto.

Mas eu não ligo, certo? Eu tenho meus próprios planos, e logo ele será
uma reflexão tardia, nada mais.

— Você está bem? — Ele pergunta, tentando me ajudar a sentar em


uma cadeira.

— Sim, eu estou bem agora.

— Isso já aconteceu antes?

— Não, — digo a ele bruscamente.

É tudo por causa do perfume barato da sua prostituta.

Mas não digo isso em voz alta. Não, isso significaria que eu me importo.
Reunindo minhas forças, levanto-me, meu único pensamento para ficar
o mais longe possível dele. Talvez seja o movimento repentino, ou apenas o
enjoo persistente, mas quando me levanto, uma onda de tontura me domina
e quase caí no chão.

Os braços de Enzo estão apertados ao meu redor enquanto ele me


esconde no peito.

— É isso. Nós estamos indo para o hospital. — Ele diz, mas neste
momento estou fraca demais para discutir.

Minhas pálpebras tremulam e mal estou ciente do caminho para o


hospital.

Enzo me pega em seus braços, me levando para o pronto-socorro.

— Ela está se sentindo enjoada e quase desmaiou. — Ele explica a


situação para uma enfermeira, e eu começo a me levantar, o enjoo
retornando.

— Aqui, aqui, — sou colocada em uma cama e uma enfermeira está


dizendo alguma coisa.

— Vamos dar a ela alguns líquidos por enquanto. Temos que perguntar,
há alguma chance de ela estar grávida?

— Não, — sussurro, ao mesmo tempo que o — Sim — de Enzo


Eu franzo a testa, mas mesmo no meu estado confuso, sei que não pode
ser verdade. Tomo a pílula desde que foi prescrita durante minha primeira
visita de emergência. Eu não posso estar grávida.

— Vamos fazer um teste então, — continua a enfermeira, mas eu coloco


meus dedos em volta do pulso dela, parando-a.

— Não é necessário.

— Mas é. É um protocolo padrão. Não se preocupe, não é nada invasivo.

Ela sai e eu estou sozinha com Enzo, que está olhando para mim com
um olhar estranho nos olhos.

— Shh, está tudo bem, eu estou você, — ele pega minha mão na dele.

— Eu não estou grávida. — Eu digo a ele, convencida de que isso deve


ser algum tipo de erro.

Certamente o universo não seria tão cruel...

Uma rodada de testes mais tarde, e a enfermeira volta com os


resultados.

— Parabéns, — ela começa, mas minha mente já se esvai depois dessa


palavra.

Grávida... Estou grávida...


— Você tem certeza? — Eu pergunto quando ela está prestes a sair.

— Os testes de sangue são os mais precisos e seus níveis de HCG são


altos, o que significa que você está grávida. Vou enviar meu colega para
fazer um ultrassom e você pode ver de quanto tempo está.

Um bebê... Estou grávida....

E presa.

Viro a cabeça para o lado, não querendo enfrentar ninguém, muito


menos Enzo. Lágrimas estão se acumulando nos cantos dos meus olhos
percebendo a enormidade disso.

O médico roda em uma máquina e a mão de Enzo cobre a minha,


segurando-a com força. Seu rosto acende quando o médico inicia o monitor
e prepara tudo para o ultrassom, sem perceber o que isso significa para mim.

O fim de todos os meus sonhos.

Talvez eu ainda possa fazer isso — fugir.

Mas isso seria egoísta da minha parte. O que eu poderia oferecer a um


bebê? Eu mal teria dinheiro para me cuidar e planejava trabalhar em
trabalhos estranhos para sobreviver até que eu pudesse me inscrever em
alguns cursos.

Um bebê...
Eu não posso fazer isso.

A médica assume que minhas lágrimas são porque estou


emocionalmente sobrecarregada. Mas estou apenas de luto pelo meu futuro.

Eu sou obrigada a ser sua prisioneira, para sempre.

Assim como essa decepção ameaça ultrapassar todo o meu ser, a médica
espalha um gel fresco no meu estômago.

— Isso pode estar um pouco frio, — alerta ela antes de tocar minha
barriga com o dispositivo.

Viro a cabeça lentamente na tela e assisto maravilhada quando algo


pequeno aparece na tela.

— É isso... — Eu sussurro, palavras simplesmente falhando comigo.

— Sim, é o batimento cardíaco. Tudo parece normal. Seu bebê tem cerca
de seis a sete semanas de idade.

Eu ouço o pequeno, mas firme thump como som, e sinto Enzo me


abraçando.

— Estamos tendo um bebê, tigress, — ele sussurra no meu ouvido, sua


voz cheia de emoção.
— O que foi? — Enzo rapidamente vem para o meu lado, pegando
minha mão e me levando para a mesa. Se você visse como ele se comportou
comigo, pensaria que eu sou feita de vidro.

Mas, vendo como ele está feliz com o bebê, não é de admirar que queira
ter certeza de que está tudo bem.

— Estou bem. Só um pouco cansada. — Suspirando profundamente, eu


sento. Ele está ao meu lado em um segundo, oferecendo-me água e remédios.

— Não, — eu os deixo de lado, — estou bem, sério. — Eu garanto


novamente.

Entrando na décima semana de gravidez e minha náusea melhorou,


mas meus níveis de energia caíram. Surpreendentemente, Enzo tem sido
uma constante em casa.

Seu pai era o mais feliz e passou a informar todos os seus parentes que
ele terá um neto em breve, não que o sexo tenha sido confirmado ainda.

Mas pela primeira vez na história, Rocco tinha sido legal comigo.

— Você precisa de alguma coisa? — Seus olhos estão cheios de


preocupação quando ele olha para mim, seu dedo desenhando círculos na
minha pele.
— Eu tenho um favor que gostaria de pedir... — Tenho coragem de
perguntar, sabendo que essa não é uma tarefa pequena.

— Qualquer coisa, — responde Enzo.

— Gostaria que Lia viesse ficar comigo durante a gravidez e após o


nascimento. Ela sempre foi como uma mãe para mim e...

— Feito! — Enzo me interrompe, e estou surpresa com sua resposta


resoluta.

— Sério? — Eu pergunto com admiração. Eu estava preparada para


lutar com ele por isso.

— Eu te disse, Allegra. Tudo o que você quiser, basta perguntar.

Qualquer coisa para o bebê...

O pensamento estranho entra em minha mente e mais uma vez me


deparo com a decepção. Por que ninguém pode gostar de mim? Eu?

— Você realmente quer esse bebê, não é? — Eu me viro para ele, e suas
sobrancelhas se juntam em uma carranca.

— Claro, não é? — Sua resposta é imediata quando um sorriso puxa


seus lábios.
— Claro, — eu também fingi um sorriso, mesmo que por dentro eu
definitivamente não esteja sorrindo.

Ele me leva pelo ombro, me trazendo para ele, o topo da minha cabeça
descansando bem debaixo do queixo.

— Devemos começar a pensar em nomes.

— Não é muito cedo?

— Não. Não quando mal posso esperar para conhecer a vida que
criamos, little tigress. — Sua voz mantém uma certa melancolia.

Uma coisa é certa: Enzo já ama essa criança profundamente. O


problema é que, não importa o quanto eu tentei, também me apaixonei pelo
meu pequeno todos os dias. O som do batimento cardíaco me chocou, mas
também me encantou inexplicavelmente.

As semanas passam e minha náusea desaparece lentamente. Ainda


estou facilmente cansada, mas tenho dormido mais e limitado meus
movimentos.

Quando a náusea finalmente desaparece, os desejos começam. E outra


coisa também...

Desde que a gravidez foi confirmada, Enzo mal me tocou, com medo de
prejudicar o bebê. Embora eu seja grata por sua consideração, isso está me
matando. Mais ainda, à medida que avanço para o segundo trimestre da
gravidez.

Estou constantemente pensando em sexo e me vejo molhada com mais


frequência do que não, uma necessidade quente queimando dentro de mim.
Mas não importa o quanto eu tentei fazê-lo me foder, ele simplesmente não
quis.

— E se machucarmos o bebê? — ele empurrava meus ombros depois de


uma sessão pesada de amassos.

— Podemos ir devagar, — acrescentaria, embora nunca tenhamos feito


isso antes. De certa forma, posso ver por que ele seria tão cauteloso.

No check-up inicial, a médica me puxou para o lado para me perguntar


se eu estava em uma situação abusiva. Acho que ela viu os machucados e as
marcas de mordida no meu pescoço, não que eu tivesse feito muito para
escondê-los. Eu fiquei extremamente envergonhada ao explicar a ela como
consegui essas marcas, mal me abstendo de dizer a ela que o corpo de Enzo
é ainda pior. Neste ponto, não tenho dúvidas de que suas costas estão
permanentemente cicatrizadas das minhas unhas.

Mas quando eu contei a Enzo sobre isso, ele parecia perturbado.

— Porra! Não achei que pudesse afetar o bebê! — Ele exclamou, antes
de declarar que não me tocaria mais.
Eu estava pasma, mas pensei que era uma fase passageira para ele, e
que não se comprometeria com isso. Bem, ele me surpreendeu quando
persistiu com sua ideia maluca.

Ainda dormimos na mesma cama, porque ele precisa estar perto para o
caso de algo acontecer, mas ele se certifica de colocar uma barreira na forma
de um travesseiro entre nós à noite, para que nem sequer nos toquemos.

Ele percebe o número de vezes que eu soquei o travesseiro neste


momento?

Estou perto do meu ponto de ebulição e aumento da libido juntamente


com desejos insatisfeitos são iguais a uma Allegra muito irritadiça.

— Droga, — eu chuto meu pé contra a mesa, irritada e querendo gritar


com alguém. São quase três da manhã e eu tenho saqueado todos os cantos
da cozinha tentando encontrar algo para amenizar minha gula.

Mas estou desejando bolo de cereja... e não há nada remotamente


semelhante ou satisfatório.

— Little tigress, — viro-me para ver um Enzo sonolento entrar na


cozinha. Ele está usando apenas uma calça de moletom para que seu peito
fique nu, musculoso e ah...

Aperto minhas coxas, mais uma vez atingida por uma combinação de
luxúria e fome, mas agora é bolo e sexo combinados.
Droga!

— O que está errado? — Ele imediatamente vem ao meu lado,


ostentando uma carranca preocupada. — É o bebê? Você está se sentindo
mal? Eu posso ligar para o 911, — ele continua falando e meu aborrecimento
aumenta.

— Pare, — coloquei uma mão no seu braço, apertando-o e uma na


minha testa, massageando minhas têmporas.

Naquele momento, meu estômago rosna de fome. Os olhos de Enzo se


arregalam antes que um sorriso se estique em seu rosto.

— O que você quer comer? — Ele pergunta, divertido.

— Bolo de cereja, — resmungo, sabendo que não há bolo de cereja. Meu


olhar abaixa no peito e na calça de moletom... Eu lambo meus lábios. — Mas
eu posso me contentar com outra coisa, — eu digo, mas ele apenas ri. Me
balançando no ar, ele me planta em cima da mesa.

— Bolo de cereja então, — ele pisca antes de olhar através dos armários
em busca de ingredientes.

— Mas não temos cerejas, — suspiro, decepcionada.

Ele franze os lábios e, tirando o telefone, late alguns comandos.

— Nós os teremos daqui a pouco, — ele me garante.


E ele está certo. Uma demanda de cerejas chega nem trinta minutos
depois que ele desliga.

Enzo me obriga a permanecer onde estou, dizendo que vai cuidar de


tudo. Ele lava as cerejas com cuidado, após isso começa na massa.

— Você sabe o que está fazendo? — Eu pergunto enquanto ele parece


perplexo com os ingredientes.

Ele encolhe os ombros, puxando o telefone para pesquisar no Google


uma receita.

— Não pode ser tão difícil. — Ele responde arrogante.

Uma hora depois e duas massas fracassadas, é tão difícil.

Observo com prazer enquanto ele luta com a consistência certa. A


cozinha inteira está uma bagunça, e há farinha no chão, no balcão e no
próprio Enzo.

Todo o seu peito é pintado de branco e metade do rosto também.

— Você tem certeza de que não precisa de ajuda?

— Eu entendi, — ele estreita os olhos para o telefone. — Acho que sei o


que deu errado.
Ele volta a misturar a massa, e eu não posso mais esconder minha
diversão quando o segundo saco de farinha explode no fundo, o conteúdo
caindo sobre ele.

— Você claramente não sabe. — Eu pulo da mesa para ajudá-lo.

— Não, você não deve se esforçar, — ele é rápido em me parar, mas eu


bati suas mãos de lado.

— Enzo, estou irritada e com fome e você parece que nunca esteve em
uma cozinha antes. — Um sorriso envergonhado aparece em seu rosto no
meu discurso, então eu levanto uma sobrancelha. — Você não esteve,
esteve? — Eu quase gemi.

— Culpado. Mas não pode ser tão difícil.

— Você se viu nas últimas duas horas. Isto é tão difícil. Para você. Agora
afaste-se: — Eu brinco com ele com a bunda, afastando-o quando começo a
montar os ingredientes novamente.

— Assista e aprenda, garoto da cidade.

Começo com os ovos, adicionando um pouco de açúcar e batendo juntos


até ter uma consistência agradável e espessa.

— Veja, não é tão difícil, — ele observa ironicamente quando termino


de misturar todos os ingredientes de modo certo.
Inclino a cabeça enquanto o estudo. — E ainda alguém não conseguiu
acertar nem na terceira tentativa.

— Ei! Eu peguei as cerejas, — ele se defende, mão em seu coração como


se eu tivesse machucado seu orgulho viril.

Terminando tudo, coloquei a forma de bolos no forno.

— Agora esperamos. — Sento-me em uma cadeira, meu olhar fixo no


relógio do forno.

Só mais um pouco...

Minha boca já está salivando ao pensar em derreter o bolo esponjoso na


minha boca. Fechando meus olhos, um gemido suave me escapa.

Mas então abro os olhos para encontrar Enzo de joelhos diante de mim,
a mão na minha barriga, uma expressão de admiração no rosto.

Ele encaixa a palma da mão sobre a pequena protuberância.

— Cresce tão rápido, — diz ele, quase sem fôlego.

É também a primeira vez que ele me toca assim em semanas.

— Você sabe, — começo, meus dedos arrastando por todo o rosto e


limpando a farinha ao redor, — eu não sou feita de vidro. Eu não vou
quebrar se você... — Eu paro, o súbito escurecimento de seus olhos me
dizendo que não é por falta de desejo.

— Eu não quero te machucar, — ele sussurra, a sua mão caindo mais


baixo. Uma respiração pega na minha garganta, emoção se acumulando
dentro de mim.

— Você não vai. O médico disse que está tudo bem se formos cuidadosos.

Seu rosto se aproxima do meu, e eu molhei meus lábios, prontos para o


beijo tão esperado. Estamos a um mero fôlego quando o alarme no forno soa.

Droga...

Enzo sorri para mim colocando uma luva e pega o bolo e o coloca na
mesa.

Impaciente demais, tiro-o da forma e corto-o em pedaços, pegando um


e soprando nele. Enzo é rápido em tirar da minha mão, balançando a cabeça
para mim.

— Espera. Está muito quente. — Eu bato nele.

Relutantemente, espero alguns minutos, mas meu olhar nunca se


afasta do bolo. Mais uma vez, Enzo me surpreende ao testar o bolo antes de
me dar sua aprovação.
— Finalmente, — suspiro de prazer enquanto mordo o bolo. Eu devoro
um pedaço, depois outro.

Enzo está me encarando com uma expressão estranha no rosto


enquanto eu mastigo o bolo, então me pergunto. — O que?

— Você é tão bonita quando está feliz, — as suas palavras me


surpreendem, principalmente porque eu não detecto nenhuma mentira no
seu rosto. — E antes que você me ataque, — continua ele, — não estou
mentindo ou tentando te irritar. É simplesmente a verdade.

— Então por que você não faz algo sobre isso? — Eu pergunto,
descaradamente.

— Deus, eu quero... — ele geme, dando um passo à frente. Envolvendo


meus braços em volta do pescoço, levanto-me na ponta dos pés para dar um
beijo nos lábios.

— Você sabe, — começo, acariciando seu rosto com o meu, a farinha


levemente abrasiva contra a minha pele, — as mulheres grávidas têm
necessidades.

— Elas têm, — ele coloca minhas bochechas nas mãos, o nariz


esfregando no meu em um gesto doce. — O que minha mulher quer, eu vou
ter que dar. — Suas palavras dão um arrepio nas minhas costas,
principalmente pelo fato de ele me chamar de sua mulher.
— Me beije, droga... — Eu não termino minhas palavras com sua boca
na minha. Suas mãos se movem pelo meu corpo até que ele agarra minha
bunda, me levantando. Envolvendo minhas pernas em volta do tronco, seu
comprimento duro entra em contato com o meu centro, um pingo de
consciência se transformando em uma montanha de sensações.

— Droga, dormir ao seu lado e não tocar em você foi pura tortura, —
ele admite, sua voz áspera.

— Você não é o único.

E também tenho hormônios da gravidez que me fazem uma bagunça


com tesão. Mas evito dizer isso em voz alta.

Ele me coloca em cima da mesa, com os dedos deslizando lentamente


pelo interior das minhas coxas antes de tirar minha calcinha das minhas
pernas.

— Lento... precisamos ir devagar, — ele murmura, quase como se


estivesse tentando se convencer disso.

Ele me encontra lisa e molhada, mas enquanto brinca comigo, acho que
não tenho paciência para as preliminares.

Puxo sua calça, empurrando-a pelos quadris e envolvendo minha mão


em volta do pau.
— Dentro. Agora. — Eu o exorto, guiando-o em direção à minha
entrada.

— Seu desejo é uma ordem. Sempre, — ele sussurra no meu cabelo


enquanto a cabeça se aproxima do meu calor. Ele está me provocando
acariciando seu pau ao longo da costura da minha boceta, cobrindo-o na
minha umidade.

— Porra, minha little tigress, — ele range os dentes afundando em mim


devagar, centímetro por centímetro.

Nós dois gememos com a sensação, nossas bocas se fundiram. Ele me


segura perto do peito empurrando todo o caminho, estabelecendo-se
profundamente dentro de mim.

Olhando nos olhos um do outro, ele me empurra lentamente, e eu sinto


cada pedaço dele quando me completa. Sua mão está acariciando minha
bochecha, seu polegar separando meus lábios e esgueirando-se para dentro.

Eu chupo na minha boca, o tempo todo não tirando meus olhos dele.

Não sei se são as emoções da gravidez que estão simplesmente fora de


controle, mas senti-lo tão profundamente me faz chorar. Eu viro para evitar
meu rosto, envergonhada por essa explosão repentina.

— Shh, menina. Estou aqui com você, — suas mãos mantêm minha
cabeça no lugar, seu olhar inabalável. — Deixe tudo sair, — seu tom é gentil
e, de alguma forma, tudo cai.
Envolvo minhas mãos em volta do pescoço, meus calcanhares cavando
na sua bunda o estimulando.

As lágrimas fluem livremente quando meu corpo inteiro é inundado de


amor, por ele e por nosso bebê.

— Ah, Enzo... — Comecei antes que eu possa me parar, — como eu


queria que você fosse todo meu, — amor não correspondido e saudade
impregnam minhas palavras de desesperança.

— Eu sou, little tigress. Todo seu, — ele responde, seus lábios seguindo
em volta da minha bochecha, beijando as lágrimas.

— Eu gostaria de poder acreditar em você, — sussurro, um caroço


apertado se formando no meu peito.

— Confie em mim, — seus dedos agarram minha bunda, me empalando


com um impulso duro. — Você tem tudo de mim, — ele coloca a testa em
cima da minha, os quadris ainda estão entrando e saindo de mim.

Sinto o momento próximo e agarro seus ombros, segurando-o perto e


absorvendo o significado de suas palavras.

Eu realmente gostaria de poder acreditar nele.

Mas eu não acredito.


Meu corpo inteiro convulsiona quando eu o aperto, lágrimas ainda
vazando dos meus olhos. Minha boceta o agarra com força e ele logo segue,
derramando-se dentro de mim.

Em uma respiração irregular, a euforia do orgasmo o faz sussurrar


palavras doces nos meus ouvidos.

Eu mantenho essas palavras, apegando-me a uma esperança fútil que


ainda existe em meu coração.

Miserável é quem ama, mas nunca pode ser amado de volta.

Mesmo sabendo que suas palavras são mentiras, eu as aceito. Vou ficar
em minhas algemas enquanto assisto as ilusões sombrias tocarem na parede
e, de alguma forma, vou me fazer acreditar que são verdadeiras.

Porque a alternativa é uma morte longa e sufocante da minha alma.


CAPÍTULO DEZENOVE

Incrivelmente, Enzo continua a me surpreender. Depois da nossa


aventura noturna na cozinha, ele começou a aprender a assar o bolo perfeito
e adora me surpreender de vez em quando com uma nova receita.

Não percebi isso acontecendo, mas nos estabelecemos em uma rotina


confortável. Ele passa a maior parte do tempo em casa, comigo, só indo
trabalhar quando é chamado para uma emergência.

Retomamos nossas sessões na biblioteca e, com o tempo, comecei a


relaxar ao seu redor.

Ainda estou um pouco cautelosa com ele e suas intenções, mas estou
tentando aproveitar minha gravidez.
— Olhe para o nosso pequeno, — ele olha com amor para o ultrassom,
traçando as feições do nosso bebê com os dedos.

— Não acredito que estamos tendo um menino, — ele sussurra, quase


reverentemente.

— Eu sabia desde o início, — provoco. Desde o começo eu disse que


queria um menino enquanto ele compartilhava que queria uma garota.

— Outro filhote de tigress para se juntar à nossa família. Assim como


ela mamãe, — ele diria.

— Agora teremos outro demônio bonito como o papai. — Eu me


aproximo dele, descansando minha cabeça no seu ombro.

— Eu gostaria que ele não o fizesse, — diz ele, tão suavemente que mal
consigo ouvi-lo. Viro a cabeça em sua direção, minhas sobrancelhas
franzindo em confusão.

— O que você quer dizer?

O tique na mandíbula me avisa que esse é um assunto delicado.

— Ser bonito não garante nada, exceto duvidar das intenções de todos
em relação a você. — Ele diz enigmático.

— Eu não entendo...
— Lembra-se do Symposium? — ele pergunta, e eu aceno. — É fácil
desejar a carne, é inata. É da natureza humana ser atraída pela beleza. É
mais difícil, no entanto, desejar a alma, porque você primeiro fica
deslumbrado ou repelido pela carne, — ele faz uma pausa, com a mão
acariciando suavemente meu cabelo. — Mas quando todos desejam a carne,
como você sabe quem deseja a alma?

— Então você prefere ser repulsivo? — Eu contraponho, porque nossas


experiências são opostos polares. — Não é o mesmo ao contrário? Quando
todos são repelidos pela carne, como você consegue alguém para lhe dar uma
chance? — Ele pode ter crescido bajulado por todos ao seu redor, mas eu
cresci sendo desprezada por todos, para que eu possa atestar que também
não é divertido.

— Eu prefiro ser... normal, — diz ele com um suspiro. — Médio... o tipo


de pessoa que você passaria na rua e não olharia duas vezes.

— Prefiro ser bonita também. Todos queremos o que não podemos ter.

Seus dedos de repente agarram meu queixo me obrigando a olhar em


seus olhos.

— Você é. Para mim, você é a mulher mais bonita, — diz ele, e pela
primeira vez não discuto. Em vez disso, sorrio, subindo na ponta dos pés
para lhe dar um beijo casto. E daí se ele estiver mentindo? Pela primeira
vez na minha vida me sinto bonita, e suas palavras me trazem ainda mais
alegria.
— Obrigada, — sussurro contra os seus lábios.

Abstenho-me de dizer a ele que não estou com ele por causa de sua
aparência, e que são os vislumbres em seu coração que me fizeram me
apaixonar. Porque isso significaria admitir meus sentimentos, e não quero
lhe dar nenhuma influência futura.

Estamos bem assim, amando, mas sem palavras de amor. Estávamos...


confortáveis.

Minha próxima consulta com o médico chega e nos preparamos para ir


juntos. No caminho para o hospital, Enzo recebe um telefonema sobre uma
situação urgente em Sacre Coeur, onde sua irmã mora.

— Eu não quero deixar você sozinha, — diz ele com relutância, e posso
dizer que sente muito por ter que perder a consulta.

— Vá ajudar sua irmã. Haverá mais consultas, — eu empurro nele de


brincadeira.

Um pouco depois e ele finalmente decide ir, mas não antes de me


atribuir o dobro do número de guarda-costas.

Quando chegamos ao hospital, convido meus guarda-costas a esperar


do lado de fora da seção de ginecologia, sem querer incomodar ninguém com
cinco homens ameaçadores.
Entro no corredor e sento-me na área de espera. Estou um pouco
adiantada, então a enfermeira me informa para esperar até que meu nome
seja chamado.

Escolhendo uma das revistas por aí, tento mergulhar na leitura,


esperando que o tempo passe mais rápido.

Percebo, no entanto, do canto do olho, um homem sentado ao meu lado.


Eu franzo a testa, observando todos os outros lugares vazios ao redor.

Estranho.

Tentando ignorá-lo, volto para minha revista.

— Bom tempo para novembro, — fala o homem, e eu percebo que ele


está se dirigindo a mim.

— Desculpe, sou casada, — digo rapidamente, mostrando meu dedo


anelar. Já experimentei o ciúme de Enzo antes e não quero repetir.

Em vez disso, levanto-me para me mover de assento.

— Não é uma cantada, Sra. Agosti. — O conhecimento dele do meu


nome me deixa imediatamente em alerta.

— Agente Especial McNaught, — ele abre um pouco a jaqueta,


mostrando-me o distintivo. — Por favor, sente-se.
— Sinto muito, acho que você pegou a pessoa errada. — Eu digo,
respirando fundo e tentando me acalmar.

— Seu marido é Enzo Agosti, filho de Rocco Agosti. Por favor, sente-se.
Você pode estar interessada no que tenho a dizer.

Não sei o que me leva a fazer isso, mas retomei meu lugar. Estou ciente
de que Rocco e Enzo operam fora da lei, mas nunca ouvi detalhes.

— O que você quer? — Eu pergunto, mantendo meu olhar para frente.

— Estamos estudando a família do seu marido há um tempo. É uma


surpresa poder encontrá-la aqui. Sabemos da sua existência há alguns anos,
mas você mal foi avistada na cidade antes.

— E?

— Só posso supor que seu marido está mantendo você escondida. — Ele
diz, e ele não está muito errado. Ainda assim, não confio nele.

— Não sei como isso é da sua conta, agente. — Eu murmuro, um pouco


em choque pelo seu tom.

— Não sei se você está ciente, mas seu médico assistente quando teve
sua visita de emergência em agosto notou possíveis abusos domésticos em
seu arquivo. Foi assim que você apareceu pela primeira vez.
— Expliquei ao médico e explicarei o mesmo para você. Não foi, e nunca
foi abuso doméstico. — Eu cerro meus dentes.

Por que as pessoas são tão rápidas em assumir coisas?

— Você sabe o que a família do seu marido faz, Sra. Agosti? — O agente
continua, e eu tenho uma ideia para onde isso está indo.

— Sim. Eles possuem uma cadeia de restaurantes. — Eu respondo com


sinceridade.

— O restaurante é uma fachada para vários clubes que facilitam


drogas, tráfico de pessoas e prostituição.

Não respondo, porque o que se pode dizer quando se depara com esses
fatos?

— E? Vá direto ao ponto, agente.

— Acho que podemos nos ajudar. Sabemos da existência desses clubes,


mas não sabemos os locais exatos. Se você pudesse descobrir isso para nós,
então...

Inclino minha cabeça para o lado, uma expressão entediada no meu


rosto.
— Nós vamos ajudá-la a sair. Podemos transferi-la para um programa
de proteção a testemunhas. Você e seu filho estariam seguros. — Ele acena
em direção à minha barriga.

Eu sorrio para ele docemente. É interessante como, alguns meses antes,


eu teria aproveitado essa oportunidade. Mas desde então decidi dar uma
chance a Enzo e a maternidade. E meu bebê terá ambos os pais.

— Isso soa como uma história interessante, agente. Para quem for
acreditar em você. — Eu começo e olho para ele do canto do meu olho. Seus
punhos estão cerrados.

— Sra. Agosti, — a enfermeira chama por mim e eu me levanto para ir.


Mas sinto a necessidade de esclarecer uma coisa.

— Apenas para constar, agente. Eu não estou em um relacionamento


abusivo, e meu marido é um homem maravilhoso. Se você me der licença, —
começo a caminhar em direção ao consultório, quando o agente me agarra
pela mão.

Estou pronta para ficar na defensiva, mas ele só coloca um cartão de


contato em minhas mãos.

— Se você mudar de ideia, — ele acena para mim antes de desaparecer


no corredor.
Embora o encontro com o agente me sacudiu, tentei tirar isso da cabeça.
Não valia a pena perder energia com isso. Mas, por algum motivo, depois
que cheguei em casa, parti imediatamente para encontrar a localização
desses clubes. Levei algumas semanas, algumas bisbilhotices estratégicas e
escutando telefonemas, mas eu tinha feito isso.

Vantagem.

Foi o que eu disse a mim mesma. Afinal, nada é certo neste mundo, e
não vou me arriscar com meu bebê.

Só consegui descobrir onde estão dois clubes, mas tenho outra lista com
propriedades pertencentes à Rocco sob diferentes pseudônimos. Se algo
acontecesse, eu estaria pronta.

Mas estar ao lado de Enzo é muito intoxicante, e a culpa está começando


a me comer viva. Ele tem sido tão atencioso, tão carinhoso que, ao fazer isso,
sinto que estou traindo sua confiança.

Após a consulta inicial perdida, Enzo priorizou não perder nenhuma


das outras

Atualmente, com trinta e seis semanas de gravidez me sinto como uma


baleia.
— É tudo culpa sua. — Resmungo quando voltamos para casa após o
último exame. — Você está me alimentando com muito bolo.

Ele realmente se tornou um mestre em confeitaria. Eu sempre brincava


com ele que poderia deixar sua vida de crime e apenas conseguir um
emprego como chef em um de seus restaurantes.

— Meu garoto precisa de sua força, — ele brinca, me puxando para o


peito e beijando o topo da minha cabeça. — Agora me diga honestamente,
— ele fala entre pequenos beijos, — o que você quer no seu aniversário? Você
pode ter qualquer coisa que quiser.

— Qualquer coisa? — Eu levanto uma sobrancelha, brincando.

— Qualquer coisa, então manda.

— Hmm.... — seu amor, — nada. Eu tenho tudo o que quero. Ou eu


vou, uma vez que este pequeno decida que é hora de vir ao mundo.

— Só mais algumas semanas até a data de nascimento, tigress, e nós


encontraremos nosso bebê. — Ele se inclina para a frente para beijar minha
enorme protuberância.

— Luca, você pode parar no posto de gasolina. Eu preciso pegar alguns


cigarros. — Enzo instrui nosso motorista.

Olho para trás e vejo o outro carro ainda atrás de nós.


— Realmente precisamos de muitos guarda-costas quando saímos? —
Eu pergunto, principalmente por curiosidade.

— Eu nunca estou me arriscando com sua vida, little tigress. Além


disso, eles sempre mantêm distância para não a incomodar muito.

Eu aceno distraidamente, sabendo que suas tendências


superprotetoras só podem piorar após o nascimento.

Entramos em um posto de gasolina e Enzo corre para dentro para pegar


seus cigarros. Pego meu telefone e começo a navegar pelos nomes dos bebês.
Conversamos sobre nossas escolhas, mas decidimos adiar a escolha de um
nome até conhecermos nosso garotinho.

Estou rolando uma lista de nomes quando um barulho repentino me


assusta. Levantando o olhar, vejo Luca sendo segurado à mão armada
quando ele sai do carro.

Ao mesmo tempo, a porta à minha direita está aberta e eu estou sendo


arrastada para fora. Começo a gritar, minhas mãos imediatamente vão para
proteger minha barriga.

O homem me empurra para o chão e eu caio de joelhos, o frio do inverno


me atingindo de repente, a neve gelada sob meu corpo amortecendo um
pouco minha queda.
— Cale a boca, vadia! — Ele amaldiçoa e as costas da mão pegam minha
mandíbula, batendo meu rosto para o lado com uma força que me faz ver
estrelas.

Não... meu bebê.

Meus braços estão enrolados em volta do meu corpo tentando protegê-


lo.

O outro homem leva Luca para frente, e seus movimentos são tão
rápidos que não posso seguir, mas de repente Luca está na minha frente,
levando uma bala no peito.

Uma bala direcionada para mim.

Meus olhos se arregalam, minha boca se abre em um grito que não virá.

Outro tapa e me sinto escorregando.

— Essa cadela não tem nada nela. Sem dinheiro, sem objetos de valor,
— ouço um homem falar pouco antes de outro tiro. E outro.

Abro os olhos para ver os dois homens no chão, sangrando


profusamente.

Um Enzo enlouquecido corre em minha direção, me pegando em seus


braços e balançando comigo.
— Estou bem, — minha voz treme enquanto tento garantir a ele. — O
bebê está bem.

Levando meu rosto em suas mãos, ele coloca beijos por toda a minha
pele.

— Deus, Allegra. Por um momento pensei ter perdido você. — Ele sai
correndo, com os olhos enevoados.

Outro carro pára no estacionamento e vejo o resto de nossos guarda-


costas correndo em nossa direção.

Tarde demais.

A expressão de Enzo muda imediatamente. Longe está o amante


preocupado, substituído por um assassino frio. Mesmo no meu estado
chocado, posso ver que ele não está pensando direito.

— Enzo, não. Por favor, não, — imploro, reconhecendo que ele está
prestes a estalar. — Eu estou bem, sério. Deixa pra lá.

Mas ele não faz.

Ele me levanta e me coloca no assento do carro, trancando as portas


quando sai.
— Enzo, não! — Bato meus punhos na janela enquanto o vejo caminhar
em direção aos homens — seus homens — com passos medidos. Um sorriso,
e ele sacou sua arma.

Os homens, três no total, mal têm tempo para reagir quando Enzo os
executa no local.

Continuo gritando e chutando a porta, mesmo que seja fútil.

Por quê?

Depois de chorar demais, continuo soluçando observando com


consternação como Enzo enfia os corpos dentro do outro carro antes de
retornar. Ele assume a posição de Luca no banco do motorista, e só posso
olhar em choque para o homem diante de mim.

Quem é você?

Eu pensei ter visto um lado cruel de Enzo quando ele matou um homem
a sangue frio só por me tocar. Mas isso... Simplesmente não há desculpa
para isso.

— Isso tinha que ser feito, little tigress. — Ele angula o espelho para
olhar para mim.

Só há nojo quando olho para ele tão aborrecido, tão despreocupado por
ter acabado de matar cinco pessoas.
— Por quê? — Minha voz soa quebrada sob o peso de muitas lágrimas.

— Eu não espero que você entenda. Tudo tem consequências em nosso


mundo. Vida na famiglia... — ele deixa escapar, mas já ouvi o suficiente.

A famiglia, a sempre importante famiglia que valoriza a crueldade


sobre a humanidade.

Quando outro carro chega, Enzo finalmente começa a dirigir, deixando


para trás a cena do massacre.

Olho pela janela, minhas lágrimas secaram, meu coração em


frangalhos, decepcionada, desolada e com o coração partido.

Mas não é até sentir uma súbita umidade escorrendo pelas minhas
coxas que começo a entrar em pânico, percebendo que, de fato, todas as ações
têm consequências.

E o meu marido será recompensado como tal.

— Enzo, hospital, rápido! Minha bolsa rompeu! — Eu respiro


profundamente, tentando me acalmar.

— O que? — Seus olhos se arregalam, mas ele já está dando marcha ré.
— Você está bem? Você disse que estava tudo bem!

Eu não respondo, em vez disso, focando em regular minhas respirações.


— Enzo, — finalmente falo, entre suspiros, — se algo acontecer com
esse bebê, você está morto para mim. — Quase histérica neste momento,
mantenho minhas mãos sobre a barriga, rezando para que tudo fique bem.

Meu Deus, se meu bebê estiver bem, eu o farei. Eu aceito o acordo. E irei
o mais longe que puder daqui.

Qualquer coisa para garantir que meu filho não se torne como seu pai.
Porque então... meu coração estaria morto e enterrado.

Posso amar Enzo, mas amo mais meu bebê.

No momento que paramos na vaga de estacionamento, Enzo me pega


nos braços, correndo em direção ao pronto-socorro

Estou hiperventilando, pensando que algo pode ter acontecido com meu
bebê. Sua data de nascimento é daqui a algumas semanas. Não era assim
que tudo deveria acontecer.

Fui levada para a maternidade, onde me disseram que eles precisam


induzir trabalho de parto para garantir que o bebê esteja bem.

Aterrorizada, agarro-me à mão de Enzo.

— Meu bebê... — Eu clamo, o pensamento de que algo poderia ter


acontecido com ele me matando.
— Ele ficará bem. — Enzo tenta me garantir, mas já superei o ponto de
reação.

— É tudo culpa sua, — eu choramingo enquanto eles me ligam a


algumas máquinas para acompanhar meus batimentos cardíacos.

— Querida, você precisa se acalmar. Seu pulso está no teto e não é bom
para o bebê, — diz uma das enfermeiras, ensinando-me algumas técnicas de
respiração.

Começo a respirar dentro e fora ainda não deixando Enzo ir. Ele está lá
comigo durante toda a provação — eu o xingando, dizendo que ele deveria
morrer e que eu o detesto com todo o meu ser.

Ele não responde. Ele continua me segurando e sussurrando palavras


encorajadoras no meu ouvido.

Mesmo quando meu trabalho começa, ele não se move do meu lado.

— Você pode fazer isso, little tigress. Você pode fazer isso, — de alguma
forma sua voz me acalma, mesmo quando minha mente está longe dessa
realidade.

Em algum momento eu começo a pressionar.

Pelo que parece horas ou dias, estou em um estado de confusão, tensão


física e emocional. Meu corpo se sente no limite e minha mente está prestes
a quebrar.
Minha respiração esfarrapada, o suor agarrado à minha pele e as
lágrimas secam nas minhas bochechas, continuo empurrando.

Até ouvir um pequeno choro.

— Parabéns Sr. e Sra. Agosti. — Ouço o médico dizer antes que um


pequeno humano seja colocado no meu peito.

— Você pode ter alguns momentos antes de pesá-lo e garantir que ele
esteja saudável, devido ao parto prematuro.

Eu aceno distraidamente. Pela primeira vez, minha mente limpa


quando olho para o rosto doce do meu filho. Ele está se movendo no meu
peito, os olhos fechados, a boca meio aberta, quase como se tentasse
entender alguma coisa. Do canto do olho, vejo Enzo se aproximando,
oferecendo seu dedo mindinho para ele se segurar.

— Obrigado, — a voz dele é baixa e cheia de emoção, lágrimas nos


cantos dos olhos. — Obrigado pelo presente mais maravilhoso, little tigress.

Não reconheço suas palavras. Em vez disso, meu foco está no meu
pequeno humano.

— Como você o nomeará? — Uma enfermeira vem nos checar.

As sobrancelhas de Enzo se afastam, já que ainda não decidimos.


— Luca, — digo de repente. — Para o homem que nos salvou. — Enzo
congela quando ouve isso, entendendo o duplo significado das minhas
palavras. Enzo pode ter sido o único a nos salvar, mas ele desencadeou um
banho de sangue desnecessário. O sacrifício de Luca tinha sido heróico e
desprovido de crueldade.

— Luca então, — ele assente, e eu detecto uma pitada de dor em sua


voz.

— Nome maravilhoso. Vou levar o pequeno Luca para limpá-lo antes


de fazermos o exame de saúde.

Quando o médico nos informa que Luca está bem, Enzo e eu respiramos
aliviados. E com esse feliz petisco de informação, finalmente consigo
adormecer.

É só quando acordo que percebo que Enzo deve ter chamado Lia para
ficar comigo. Ela está apoiada em uma cadeira, quase cochilando.

— Senhorita, — ela se senta na cadeira imediatamente quando me vê


acordada, correndo em minha direção para me dar um abraço. — Oh,
Senhor, não acredito que você é mãe agora, — ela continua beijando minhas
bochechas, fazendo uma breve oração por mim.

— Eu também não, Lia. — Eu sorrio para ela, feliz por tê-la ao meu
lado.
Pelo menos Enzo foi fiel à sua palavra e ele fez Lia morar conosco
durante a minha gravidez. Eu não acho que poderia ter feito isso sem ela,
não quando comecei a entrar em pânico com tudo.

— E o Signor Enzo te adora. Quem pensaria que um desastre se


tornaria um milagre? — Ela continua jorrando, e eu me abstenho de dizer a
ela que é o oposto. O que havia começado como um desastre havia se
transformado no inferno.

— Ele faz, não é? — Eu murmuro, mas Lia não percebe a ironia


pingando das minhas palavras.

Um tempo depois, uma enfermeira volta com Luca, e eu coloco seu


corpinho no meu peito, tentando alimentá-lo do meu peito.

É assim que Enzo me encontra, nua da cintura para cima, a boca de


Luca presa a um peito, mamando. Ele para em seus passos e seus olhos se
erguem sobre nossos corpos, um sorriso satisfeito que se estende por seus
traços.

— Esta é a visão mais bonita, — ele sussurra quando se aproxima,


escovando a mão sobre a testa de Luca.

— Você quer segurá-lo? — Eu pergunto quando Luca fez a alimentação,


já dormindo profundamente.

— Eu posso? — A incerteza está escrita em todo o rosto enquanto ele


olha entre Luca e eu. Eu aceno, no fundo, pensando que ele não terá muitas
chances de fazê-lo no futuro. E quando o vejo cuidadosamente erguer o
pequeno embrulho em seus braços, com os olhos tão cheios de amor, vacilo.
Só um pouco.

Meu Deus, estou fazendo a coisa certa?

Ele anda pelo quarto com Luca nos braços, sussurrando palavras de
amor em seu ouvido.

Lágrimas de repente inundam meus olhos e eu desvio meu rosto.

— Ei, você está bem? — Ele rapidamente vem ao meu lado, acariciando
meu cabelo.

— Sim, não é nada, — fungo, — apenas hormônios.

Isso e ver Enzo com nosso filho está partindo meu coração,
especialmente considerando a decisão que tomei.

Os próximos dias são os mais difíceis. Meu corpo teve um preço com o
nascimento e mal estou começando a me recuperar. Enzo é uma presença
constante no hospital, por isso não me dá uma brecha para entrar em
contato com o agente.

Quando, no meu último exame, o médico me declara apta para receber


alta em alguns dias, aproveito e peço a Enzo que me traga algumas roupas,
dizendo que só confio nele. Quando ele finalmente se foi, peço a Lia que me
traga comida muito específica, garantindo que ela se vá por um tempo. Não
quero envolvê-la nisso, e é melhor se ela não souber de nada.

O quarto finalmente está vazio, eu pego meu telefone e ligo para o


agente McNaught.

Luca está dormindo pacificamente em meus braços, e seu rostinho puro,


do jeito que ele ainda é inocente dos males do mundo, fortalece minha
determinação. Não posso deixar meu filho ser criado em uma cultura que
menospreza as mulheres e glorifica a matança a sangue frio.

Não vou deixá-lo acabar como seu pai.

O agente responde no primeiro toque.

— A oferta, — começo a fingir uma confiança inexistente, — eu aceito.

— Você está fazendo a coisa certa, senhora Agosti, — ele me garante


depois de divulgarmos alguns detalhes.

— Estou no hospital agora, mas tenho a lista de locais em casa. Posso


levá-la assim que sair do hospital.

— Você pode fazer isso? Com segurança?

— Não se preocupe com meu marido, agente. Eu posso lidar com isso.
— Eu respondo.
Ele passa a me contar sobre o nosso local de encontro e que eu serei
levada sob custódia protetora imediatamente.

— Somente... Eu preciso que meu filho esteja seguro.

— Ele estará Sra. Agosti. Eu prometo.

Hesitante, eu saio de cama e coloco Luca em seu pequeno berço. Um


sorriso puxa meus lábios observando sua expressão sonolenta. Meus dedos
traçam suas feições, percebendo Enzo e eu nele. Eu sei que os olhos dos
bebês tendem a mudar de cor, mas os de Luca parecem ser o mesmo verde
profundo da primavera como o seu papai. De alguma forma, isso puxa as
cordas do meu coração, pois percebo que verei Enzo para sempre em Luca.

Quando ele for mais velho, talvez ele me entenda e por que eu tive que
fazer isso. Talvez ele me odeie, mas talvez um dia me perdoe.

Pelo menos ele nunca se tornará um criminoso.

Dou um beijo na sua bochecha e volto para minha cama, parando


quando alguém entra no meu quarto.

— O que você está fazendo aqui? — Eu pergunto, chocada ao ver a única


pessoa que deveria ter sido minha querida amiga, mas acabou sendo minha
pior inimiga.
CAPÍTULO VINTE

Rocco decreta que eu preciso ir para Nova Jersey, assim como Allegra
está prestes a receber alta do hospital. Como ele não aceita o não como
resposta, eu rapidamente ligo para ela para que ela saiba.

— Sim, — ela responde, sua voz estranha.

— Eu vou ficar fora por alguns dias. Mas eu vou te ver em casa, ok?

— Tome seu tempo, — ela responde, sem fazer perguntas. Eu franzi a


testa, mas encolho os ombros.
Faço meu trabalho, com o objetivo de terminar as reuniões mais
rapidamente e chegar em casa mais cedo. Eu já sinto falta de Luca, e faz
apenas meio dia desde que o vi.

Com o nascimento de Luca, Rocco havia me iniciado oficialmente na


parte desagradável dos negócios da família. Vendo que vou assumir os
clubes em Midtown, decidi surpreender Allegra com nosso próprio
apartamento, longe de meu pai e de todos os outros da famiglia.

Sei que estraguei tudo quando matei aqueles homens na frente dela e
duvido que me perdoe tão cedo. Mas ainda farei o possível para fazê-la ver
que tudo o que faço é por ela.

Tudo.

O pensamento de que algo poderia ter acontecido com ela me paralisou


com um medo que eu nunca tinha conhecido antes. Eu reagi da única
maneira que sabia — com derramamento de sangue.

Eu preciso compensar isso com ela.

Assim que volto para casa, vou para o nosso quarto, procurando Allegra
e Luca. O quarto está vazio, exceto por um berço no canto. Eu dou alguns
passos.

Certamente ela não faria.


Mas quando chego à pequena cama, vejo Luca dormindo
profundamente, completamente sem vigilância.

— Que porra é essa, — eu amaldiçoo, levantando-o em meus braços e


segurando-o perto.

Levando-o comigo, encontro Ana e exijo saber onde Allegra está.

— Ela está tomando chá com seu pai no conservatório. — Ela diz, e eu
sinto minha raiva aumentando.

— E quem estava assistindo Luca?

Ela encolhe os ombros.

— Eu pensei que a Signora Allegra estava.

Dirijo-me ao conservatório, chocado ao ver Allegra e meu pai discutindo


como se fossem amigos perdidos há muito tempo.

— Allegra, — eu chamo, minha voz é curta.

— Filho, aí está você. Estávamos conversando sobre meu neto. — Ele


gargalha de maneira falsa.

— Enquanto ele estava sozinho no quarto?


— Bem, nada aconteceu, ele está bem, — Allegra finalmente fala,
olhando o bebê nos meus braços pela primeira vez. Eu me viro para ela,
apenas para ser atingido por um desgosto tão forte quanto entendo suas
feições — estranhamente presunçosas e sem coração — ou a maneira como
sua linguagem corporal me diz que ela não se importava com Luca.

— Ele não está. Por que não deixar Lia vê-lo se você precisava de um
tempo a sós? — Eu sondei mais, irritado que ela achasse que não há
problema em deixar um recém-nascido — prematuro — sozinho e sem
vigilância.

— Oh, você não ouviu? — Ela inclina a cabeça para o lado, os olhos
levemente estreitos como se estivesse tentando fingir preocupação. — Ela
teve uma emergência familiar na Itália e teve que ir. Eu não poderia mantê-
la aqui. Não quando a família dela precisava mais dela do que eu.

— Por que eu não fui informado disso? — Em que tipo de realidade


alternativa eu entrei?

Ela acena a mão com desdém.

— Você sabe agora, — diz ela, e meu pai interrompe ao mesmo tempo.

— Vamos, filho, nenhum dano causado. Deixe-me dar uma olhada no


meu neto. — Ele se levanta do assento, vindo ao meu lado para espiar Luca.

— Ele se parece com você, — ele comenta, e eu apenas grunho, chateado


com tudo.
Allegra também se levanta, e eu ofereço Luca a ela, sabendo que ele
gosta de sentir o calor de sua mãe. Ela faz uma cara estranha, mas o pega
desajeitadamente nos braços.

Assim que ele se estabeleceu contra o seu peito, ele acorda e começa a
chorar.

— Acho que ele está com fome, — acrescento, e Allegra me surpreende


empurrando Luca de volta ao meu peito.

— Dê a ele algo para comer então.

— O que? Ele precisa de leite materno, Allegra. De você. — Eu quase


reviro os olhos para ela.

É assim que ela me castiga pelos meus erros? Porque definitivamente


está funcionando. Mas ela não deve envolver Luca quando isso é
estritamente entre nós.

— O médico disse que meu leite não era bom o suficiente e que
deveríamos mudar para a fórmula, — ela brinca, fazendo beicinho enquanto
suas sobrancelhas sobem em inocência professada.

— Realmente? — Eu desenho, estreitando meus olhos entre os dois.

Com Luca ainda chorando em meus braços, volto para dentro de casa,
com a intenção de encontrar alguma fórmula para alimentá-lo.
E assim como eu pensei, não há.

Que porra é essa!

— Shh, pequenino, — tento arrulhar para ele ligando para Nero para
obter um suprimento vitalício de fórmula.

Felizmente, ele é rápido e logo posso alimentar Luca.

Como chegou aqui?

Estou segurando meu filho de duas semanas enquanto ele chupa sua
mamadeira, todos ao meu redor completamente desinteressados, incluindo
sua mãe.

O comportamento estranho persiste, e é como se Allegra não pudesse


olhar para Luca. Ela sempre encontra uma desculpa para sair da sala
quando me vê com ele.

É ainda pior durante a noite, como ela declarou desde o início que não
está dormindo no mesmo quarto que ele, porque isso perturbaria seu horário
de dormir.

Eu a encarei estupefato, convencido de que havia algo seriamente


errado com ela.

No entanto, eu levei Luca para o meu quarto e comecei a alimentá-lo a


cada duas horas, mal conseguindo dormir.
Em algum momento, cansado dessa nova atitude dela, eu a confrontei,
apenas para ser recebido com uma risada suave e irônica. Ela disse que eu
estava imaginando coisas.

A internet tinha sido um pouco mais esclarecedora, e eu comecei a


acreditar que talvez ela estivesse sofrendo de depressão pós-parto. Por que,
com esse evento traumático e o nascimento subsequente, não a culpo. Então
eu decidi dar a ela um pouco de espaço para respirar, esperando que em
algum momento voltasse para nós.

Ainda assim, isso significa que estou cuidando de Luca em tempo


integral.

— Filho, você está me ouvindo, — meu pai me sacode e meus olhos se


abrem.

Quando foi a última vez que tive uma noite inteira de sono?

— Desculpe, você pode repetir isso?

— Você precisa contratar uma babá. Você não pode continuar assim,
Enzo. — Meu pai me olha ceticamente.

— Não. Não confio em mais ninguém com Luca. — Eu respondo conciso.


Qualquer um, menos Allegra, mas hoje em dia eu também não confiaria
nela.
— Filho, este é o trabalho de uma mulher. Você tem coisas mais
importantes a fazer. A reunião com os russos é em breve. Não me diga que
você vai levar seu bebê para a reunião? Todos vão rir na sua cara e se
despedir.

— Eu vou conseguir, ok?

— Não, você não vai. Você está contratando uma babá e é isso. Não
quero que meu herdeiro seja alvo de piadas, porque ele insiste em bancar a
ama de leite.

— Ele é meu filho, pai. — Eu cerro os dentes, tentando me impedir de


explodir.

— Ele também pode ser seu filho à distância. — Pai balança a cabeça,
empurrando os óculos pelo nariz para estudar alguns documentos, um sinal
de que fui dispensado.

À tarde, levo Luca para ver maman Margot e eu estou feliz em vê-los
se dando tão bem, já que ela será um elemento importante na vida dele.

— Quero que você seja madrinha dele, — pergunto a ela enquanto


segura Luca nos braços, olhando amorosamente para ele.

Como Allegra deveria ter feito.

Não vai lá.


— Claro que eu vou. Ele é meu anjinho, — ela se inclina para beijar seu
nariz, antes de se virar para mim novamente. — Como está sua esposa. O
trabalho de parto é difícil para as mulheres, você sabe. Espero que você não
a esteja pressionando... — ela segue quando eu começo a rir.

— Essa é a última coisa com que você deve se preocupar maman. —


Não é apenas sua súbita mudança de atitude, mas também há algo
fisicamente desconcertante nela. No momento em que ela recebeu alta do
hospital, não tive um pensamento lascivo sobre ela, mesmo que sua figura
seja mais gorda, mais encantadora com a plenitude da maternidade.

Eu olho para ela e não sinto qualquer coisa.

Eu tinha vergonha de mim mesmo, pensando que ela passou por uma
provação para me dar Luca, e agora estou com nojo do seu corpo.

— Seja gentil com ela. Ela provavelmente está fraca agora, tanto física
quanto emocionalmente.

Eu ouço atentamente o conselho de maman, prometendo me comportar


e estar atento ao estado mental de minha esposa.

Mas quando chego em casa, fico mais uma vez impressionado com a
diferença comportamental em Allegra. Ela está latindo ordens para Ana e
os outros funcionários, sua voz cheia de superioridade irada.

— Allegra, — começo, e ela finalmente se vira para mim, — cale a boca.


— Eu digo, a agarrando pela mão para levá-la para cima.
— O que? — Ela tem a audácia de bater seus cílios em mim, como se eu
me apaixonasse por esse truque.

— Eu entendo que você está passando por algo, mas isso não significa
que pode abusar da equipe. — Eu digo a ela e ela apenas encolhe os ombros.

— Vou colocar Luca na cama, — não me incomodo em olhar para trás


enquanto vou diretamente para o meu quarto, banhando-o e vestindo-o com
roupas limpas antes de deitar na cama com ele.

Achei mais fácil dormir com ele ao meu lado do que ir e voltar entre a
cama e o berço.

É só quando Luca apresenta um caso grave de cólica que finalmente


aceito e contrato uma babá, passando horas examinando os currículos e
entrevistando todas as candidatas em potencial antes de aprovar a Sra.
Marshall, uma senhora de trinta e poucos anos que parece ter um jeito com
os bebês.

A adição de uma babá chega no momento perfeito para o batizado de


Luca, e o pai deixou claro que isso é mais um negócio do que qualquer coisa,
já que os russos estarão presentes.

No dia anterior à festa de batizado, vou para a cama esperando ter uma
noite inteira de sono. Eu mal cochilo quando sinto alguém deslizar sob os
lençóis ao meu lado.
Eu acordo e vejo Allegra olhando para mim sedutoramente, sua língua
saindo furtivamente para lamber seus lábios enquanto seu olhar ruma sobre
meu peito nu.

— Volte a dormir, Allegra, — digo a ela, sem disposição para nada. Ela
faz beicinho, vindo em minha direção até que sua mão esteja sobre meu peito
e se arrastando para baixo.

Pegando, eu a empurro para longe.

— Eu disse para você voltar a dormir. — Por que eu olho para ela e
ainda não sinto nada?

— Você não me quer mais? — Ela me olha por baixo dos cílios tentando
colocar uma expressão de mágoa.

— Você ainda está se curando. — Eu respondo com sinceridade, não


querendo insistir muito na minha falta de atração por ela, ou no fato de que
a sinto como uma completa estranha.

— Vá dormir. — Eu repito.

— Eu posso fazer você se sentir bem, — a mão dela vai para as minhas
calças, mas eu pego o pulso no ar, apertando forte em volta da mão até que
ela esteja com dor.
— O que você não entendeu quando eu disse para dormir? Agora! — Eu
a jogo da cama, e ela parece receber a mensagem enquanto se afasta, suas
narinas dilatando-se para mim.

Porra, como é essa minha Allegra?

Esse é o meu último pensamento, pois a exaustão me reivindica e eu


adormeço.

No dia seguinte, a festa está a todo vapor, com parentes dos quais nunca
ouvi falar, todos vindo beijar minhas bochechas e me parabenizar pelo meu
filho. Mas o que eu mais odeio é que Luca está sendo exibido como um
maldito objeto.

Mesmo tendo que interagir com todos, incluindo os russos, meus olhos
seguem a sra. Marshall enquanto ela carrega Luca de convidado para
convidado.

— Preciso falar com Vlad, — digo ao segundo em comando quando o


vejo. Como o novo Pakhan, Vlad é o único que pode tomar as decisões sobre
a mercadoria e, como tal, a única pessoa que preciso convencer.

— Ele está no jardim. — Ele diz, e eu aceno para ele antes de ir em


busca de Vlad.

Há muitas pessoas aqui, então levo um tempo para sair. Ainda é


inverno e não vejo por que alguém iria de bom grado para fora nesse clima.
Mas quando abro a porta do jardim, ouço uma voz familiar.
— Ele nem saberá, — diz ela, e enquanto dou mais alguns passos, tenho
uma imagem clara da situação em questão.

Allegra está um pouco perto demais de Vlad, com as mãos tocando no


seu cinto.

— Que porra é essa? — Eu murmuro depois de garantir que minha


visão não esteja me enganando.

Vlad a empurra para fora do caminho.

— Você deveria ensinar algumas maneiras à sua esposa. Ela não é


exatamente... domesticada. — Ele acrescenta ironicamente, e eu soltei
minha raiva enquanto lhe dou um soco na cara.

— Porra, Agosti, cuidado, — suas mãos voam para o nariz, — a cirurgia


plástica é cara. — A indiferença dele está apenas alimentando ainda mais
minha raiva, então eu pulo nele, dando um soco.

Desta vez, ele espera e começa a se defender, dando alguns golpes no


meu rosto e no meu estômago. É só quando meu pai tem homens nos
separando que paramos.

— Acho que o acordo está fechado? —Vlad limpa um pouco do sangue


do rosto, os olhos escurecendo enquanto ele olha para ele. Ele não espera a
resposta de ninguém, pois diz: — Eu pensei assim, — antes de dar de ombros
e sair.
Meu pai segue rapidamente, com a intenção de consertar qualquer dano
que eu causei, mas meus pensamentos estão centrados apenas em Allegra,
e na porra da sua audácia.

Ela está encolhida em um canto e, quando me percebe perseguindo-a,


dá alguns passos para trás, batendo na parede.

— Se importa em me dizer o que foi aquilo? — Eu pergunto, estreitando


meus olhos para ela.

Ela está tremendo, e não tenho certeza se é por medo ou pelo frio, mas
quando me aproximo, ela evita o rosto.

Pego o seu queixo, forçando-a a olhar para mim.

— Eu queria deixar você com ciúmes, — ela sussurra, mas tenho


dificuldade em acreditar nas suas palavras.

— É mesmo? Bem, você conseguiu. Além disso, você arruinou um acordo


de um milhão de dólares. — Cuspo as palavras, apertando meus punhos ao
meu lado.

Respirando fundo, me afasto, voltando para a festa. Receio que, se a vir


na minha frente novamente, eu possa explodir e realmente machucá-la.

Nos dias seguintes, mergulho em uma nova rotina, visitando maman


com Luca e me familiarizando com o negócio de restaurantes — ou melhor,
o que se esconde por trás dele. Eu tento ignorar Allegra o máximo possível,
culpando a mim e ao meu comportamento por ela ter se manifestado.

Não faz um mês, eu estava ao lado da sua cama enquanto ela


amamentava Luca, uma felicidade indescritível refletida em seu rosto. E
agora? Ela mal consegue olhar para ele.

Eu tento o meu melhor para preencher a lacuna deixada por sua mãe,
ainda esperando que ela apareça em algum momento.

Eu posso tê-la levado ao seu ponto de ebulição.

Olhando para o nosso relacionamento e todas as nossas interações, não


posso deixar de sentir que poderia ter feito melhor — confiasse mais nela,
fazendo com que visse o quanto eu me importo com ela.

O que você colhe é o que planta.

Quantas chances ela me deu no passado, comigo continuamente


estragando tudo? Eu a machuquei, a humilhei e a despojei de sua liberdade.
Tudo para satisfazer essa fome insana que tenho por ela, saber que ela está
perto de mim o tempo todo, longe de perigos ou tentações.

Então, por que vê-la com Vlad não me afetou do jeito que costumava?
Recuso-me a acreditar que tinha sido o acordo de um milhão de dólares no
caminho de Vlad e uma bala. Não... algo está errado.
Voltando para casa, deixo Luca com a Sra. Marshall para que possa
cuidar da sua refeição, e eu vou ao meu escritório, com a intenção de fazer
algum trabalho.

Estou perto da porta quando ouço os barulhos. Gemidos. Gemidos altos


e estridentes vindo do meu escritório.

Porra, inferno!

Eu disse ao meu pai várias vezes para manter suas prostitutas na


cidade, não em casa. E definitivamente não no meu escritório.

Minha mão está na maçaneta da porta pronta para interromper a festa


alegre quando eu ouço a voz dela.

— Mais forte!

Abrindo a porta, olho em choque para Allegra, nua, curvada sobre a


mesa do escritório, com um dos guardas entrando e saindo dela.

Suas mãos estão cavando nos seus quadris enquanto ele a fode em carne
viva, seu pau entrando e saindo agressivamente.

Há apenas um destino — para ambos.

Pego minha arma e miro. Primeiro no filho da puta desleal.


Ele resmunga, a mão segurando o peito onde uma mancha vermelha de
sangue está se formando.

Allegra grita, um som estridente irritante que me faz querer prolongar


ainda mais sua morte. Porque é exatamente isso que ela merece por matar
meu coração.

Olho por olho.

Ela se afasta do corpo morto, e meu lábio fica com nojo quando vejo gozo
seco no interior de suas coxas.

Quantas vezes? Quantas pessoas ela fodeu?

Entre minha culpa e Luca, eu só queria dar espaço a ela. E é assim que
ela me paga?

Eu levanto minha arma, apontando direto para a sua testa. Ela está
chorando neste momento, nem se preocupando em esconder sua nudez.

Ela cai de joelhos na minha frente, implorando para que eu a poupe,


milhares de promessas vazias cruzando seus lábios.

Meus olhos estão sombrios, minha alma inteira se despedaçou


enquanto eu a encaro.

Eu me abaixo, envolvendo minha mão em volta da sua garganta, o cano


da minha arma se conectando com a sua têmpora.
— Sinto muito, desculpe, — ela soluça, os olhos nublados de lágrimas.
Eu cavo a arma mais fundo na sua cabeça, uma necessidade ardente de
rasgar seus membros e a incendiar crescendo dentro de mim.

Suas mãos começam a empurrar para o meu braço, e é só então, por


acaso, que olho para os ombros nus dela.

Meus olhos se arregalam por um momento e pisco duas vezes, querendo


ter certeza de que não estou vendo errado.

Sem cicatriz.

Nenhuma cicatriz da bala que ela levou em Malta.

Meu olhar volta para o seu rosto e eu a olho estupefato.

Como isso é possível?

Não há outra diferença, exceto pela falta de cicatriz....

Eu a arremesso de mim, determinado a chegar à raiz disso.

— Luca salvou você. Não deixarei meu filho sem mãe, — minto, vendo
sua forma lamentável se enrolar de medo. — Da próxima vez que foder
alguém, não faça isso em casa e não me deixe ver.
Antes eu não estava dormindo porque eu estava cuidando de Luca,
agora não podia, porque essas ideias malucas não paravam de se formar em
minha mente.

O comportamento. Sua nova amizade com Rocco. Ela fodendo qualquer


um indiscriminadamente.

E sem cicatriz.

Mesmo antes de perceber essa diferença flagrante, eu poderia dizer que


não era a Allegra pela qual me apaixonei. E assim minha mente suspeita
me obrigou a descobrir o que diabos aconteceu.

Na manhã seguinte, aproveito a hora inicial para plantar escutas em


toda a casa. Se algo está acontecendo — como já suspeito — Allegra falsa
deve contar a alguém sobre o nosso pequeno encontro.

E então eu espero.

Não demora muito para que Rocco e Allegra fechem-se no escritório de


Rocco. A primeira coisa que ouço é um tapa retumbante.

— Puta do caralho! Você está comprometendo tudo, — ele assobia para


ela.

— Eu? Você me disse que ele não se importa com sua esposa e ele não
notaria a diferença.
— Você é estúpida? Qualquer homem se importaria com a esposa
fodendo outro homem em sua própria casa, — ele grita com ela.

— Pelo menos agora sabemos que ele realmente não se importa. — Ela
retorce, claramente irritada. — Você me garantiu que eles mal interagem
em casa, mas ele ainda esperava que eu cuidasse desse pirralho, — ela
amaldiçoa e Rocco faz um som tsk.

— Conhecendo Enzo, eu estou realmente surpreso por você estar viva,


— suas palavras estão cheias de nojo enquanto ele pronuncia isso. —
Primeiro você estraga nossos planos no hospital e agora está cometendo
erros após erros. Eu deveria saber que não se deve confiar em um Marchesi.

— Sério? Preciso lembrá-lo qual era a alternativa? Minha irmã teria


entregue você aos federais e você teria passado o resto da vida atrás das
grades. Não vamos nos enganar aqui. Você precisava de mim, — ela anda
por aí, — e não o contrário.

— Droga! E eu pensei que sua irmã era difícil de lidar.

Irmã?

Lembro-me de Allegra mencionando uma irmã, Chiara, a pessoa que se


casara com Franzè, mas ela esqueceu de mencionar um pequeno detalhe —
que elas são gêmeas.

Mas se esta é a gêmea de Allegra, então onde está minha Allegra?


— Oh, vá se foder, — continua meu pai, — como se seus pais não se
aproximassem de mim para se equilibrar em Nova York. Depois que Franzè
deixou todos vocês sem dinheiro, você vai sentar lá e mentir na minha cara
que nunca teve um motivo oculto?

— É chamado de subproduto, — brinca a irmã de Allegra


sarcasticamente.

— Estou impressionado com a sua falta de vergonha. Como se você não


tivesse acabado de matar sua irmã por riqueza e conexões, — o pai joga nela
e eu congelo.

Matado...? O que ele quer dizer com isso... Não... Não pode ser.

— Eu queria matar aquela cadela há anos. Dessa vez, tive a bênção dos
meus pais. Você deveria tê-la visto me implorando por sua vida, — ela ri e
Rocco se junta.

Ainda estou congelado, sem palavras, mas me forço a ouvir... entender.

Minha little tigress não pode estar morta. Ela não pode.

— Eu adoraria ver isso. Eu nunca gostei daquela merda. Muito


atrevida.

— Bem, você não está feliz por me receber agora? Sou ainda melhor com
a boca.
Eu ouço roupas agitadas, o barulho irritante dos lábios batendo juntos.

— Você tem certeza de que se livrou do corpo corretamente? Não


precisamos de surpresas neste momento, — o pai murmura entre o que eu
suspeito que sejam beijos.

— Claro. A larguei no necrotério, — responde Chiara em um tom


ofegante, antes que a dinâmica mude completamente.

— Você é uma prostituta suja, não é? — Pai geme e meu estômago cai.

— Prostitutas aceitam dinheiro por isso. Minha moeda é orgasmos.


Quantos você vai me dar hoje, daddy? — A voz de Chiara toma um tom
meloso.

— Quanto mais você quiser. Porra, — ele geme e os sons desleixados de


um boquete permeiam a sala.

Paro o áudio, incapaz de aguentar mais.

Allegra está morta.

Levanto-me com as pernas trêmulas, indo para o quarto de Luca e


dispensando a Sra. Marshall por algumas horas.

Levando-o em meus braços, eu o abraço no meu peito, finalmente


deixando as lágrimas caírem.
Como ela pode estar morta? Como? E como eu não sabia?

Não, não pode ser. Recuso-me a acreditar que Allegra está morta.
Minha Allegra está viva e bem e eu a encontrarei. Mas, enquanto tento me
convencer disso, a maneira como Chiara falou sobre sua irmã... sobre matá-
la.

Meu coração se parte em um milhão de pedaços quando começo a


racionalizar que talvez nunca mais veja minha tigress. Nunca poderei
abraçá-la ou dizer o quanto a amo.

Eu já disse a ela?

— Deus, — eu gemo alto, o pensamento nauseante.

Eu nunca disse a ela como me sentia. Como ela se esculpiu em meu


coração quase desde a nossa primeira interação, e como eu só me apaixonei
cada vez mais por ela. Como ela é a única mulher que eu já deixei perto de
mim, a única que eu já amei.

E agora ela nunca saberá. Ela morreu pensando que eu sou um


monstro.

Olho para Luca e vejo o garotinho que nunca conhecerá sua mãe. Ele
nunca vai se lembrar do seu calor ou da maneira como ela o amava com o
coração inteiro.
Passo algum tempo apenas segurando-o, balançando para frente e para
trás, perdido em minhas emoções.

Estou segurando a última parte de Allegra neste mundo.

O pensamento me quebra de novo, e não consigo me impedir de soluçar.


Só muito mais tarde, quando a dor se transforma em fúria insaciável, eu
reajo novamente, sabendo o que tenho que fazer.

Beijando a testa de Luca, eu o deito de volta no berço, dizendo à Sra.


Marshall para observá-lo bem.

Pego duas armas, ambas totalmente carregadas, e me amarro com


facas.

Porque eu tenho uma missão.

E ninguém vai sair vivo.

Eles pegaram meu coração; agora eu vou pegar o deles — literalmente.


CAPÍTULO VINTE E UM

Eu seguro a arma com força na minha mão, como imagino o


derramamento de sangue, um rio de sangue para pintar toda a casa de
vermelho.

Eles foram para a única coisa que importava na minha vida e, assim
como a mãe, suas mortes não serão rápidas. Não, vou garantir que eles
sofram por dias em tortura inconsolável, sangrando, mas não morrendo.

Assim como eu estou agora.

Vivo, mas morrendo lentamente por dentro, Luca é a única razão pela
qual não termino tudo aqui e agora, no que acabaria como um assassinato-
suicídio icônico.
Mas não posso fazer isso com meu garotinho. Não quando ele é o único
elo que me resta com Allegra.

Ando devagar, com passos medidos, o tempo todo imaginando as piores


mortes possíveis para esses pedaços de merda.

Devo esfolá-los vivos?

Cortar os membros um de cada vez?

Ou talvez eu deva preservar quimicamente Chiara para ainda poder


olhar para o rosto da minha Allegra...

Mas não seria ela.

Eu senti isso antes de conhecê-la, que nunca funcionaria. Ela nunca


poderia substituir meu coração, mesmo no nível mais físico, onde elas são
idênticas.

Será tortura.

Agonia pura.

Eu engarrafo a dor por um momento, precisando do meu juízo sobre


mim para vencê-los no seu próprio jogo. Eles provavelmente estão fodendo
até agora.
Ah, mas não seria legal se Chiara engasgasse com o pau do pai, depois
que ele fosse cortado do corpo, é claro. Eu gostaria de ver o seu rosto então,
quando os faria comer as entranhas um do outro e engasgar com bile podre;
regurgitasse apenas para ingerir novamente.

Minha boca se enrola em um deleite pecaminoso.

Estou no topo da escada, minha determinação firme, meus dedos


coçando para tirar sangue.

Até o meu telefone tocar, e um olhar relutante me diz que é Lia.

Ela sabe?

Estou dividido entre ignorar a chamada dela e continuar no caminho


da destruição; mas o outro lado de mim me diz para responder; descobrir
exatamente o que essas pessoas fizeram e fazer um castigo ainda pior.

— Sim, — respondo, meu tom é curto e duro.

— Signor Enzo, — diz Lia, sua voz arfante e assustada.

— O que foi, — eu lati, um pouco duro demais.

— Eu... podemos nos encontrar? Há algo que você precisa saber, — ela
parece incerta o suficiente para me deixar intrigado.
— Você não está na Itália? — Eu pergunto com desdém, já antecipando
a resposta.

— O que? Não, claro que não, — ela responde imediatamente, e sua


confirmação é suficiente para me impedir — parar momentaneamente meus
planos assassinos. Porque eu preciso da imagem completa.

Eu necessito saber o que aconteceu com minha little tigress, então eu sei
exatamente o quanto vou punir aqueles malditos bastardos.

— Tudo bem, — digo a ela onde me encontrar, o único local seguro neste
momento, lugar de maman.

Com um olhar de decepção, eu saio com algumas das minhas armas em


casa, antes de levar Luca comigo e seguir para maman.

Sabendo o que sei, não posso deixar meu filho ficar sem vigilância sob
esse teto.

Quando eu chego no apartamento da maman, eu me encontrei com uma


Lia soluçando se confortando nos seus braços.

— Shh, querida, deixe tudo sair, — maman murmura e Lia chora ainda
mais.

Minhas próprias lágrimas estão secas, mas quando olho para o rosto
dela devastado pelas lágrimas, sinto meus olhos ficando úmidos novamente.
— Lia, — eu a chamo, e seus olhos se arregalam quando ela me vê com
Luca amarrado na minha frente.

— Signor Enzo e bebê Luca, — ela se levanta para se apressar em


minha direção, com os olhos avidamente se movendo sobre a forma
adormecida de Luca.

— Ele está bem? — ela pergunta, sua voz sem fôlego, mas também cheia
de alívio.

— Ele está. — Eu aceno para os assentos. — Eu acho que você sabe


alguma coisa.

Ela se senta, as mãos inquietas no colo, a expressão cheia de


preocupação e tristeza.

— Você também? — Ela pergunta devagar, e eu me pergunto o quanto


posso revelar. Mas lembro o quanto Allegra confiava nela e o quanto ela a
amava como figura materna.

— Eu descobri recentemente. — Eu admito e a mão dela voa para a


boca, abafando um grito.

— Alguém por favor me diz o que está acontecendo? — Maman


interpõe, e eu proponho que Lia continue, já que ela provavelmente tem
mais informações do que eu.

— Eu nem sei por onde começar, Signor, — ela suspira profundamente.


— O que aconteceu no hospital? — Eu pergunto, sentindo um nó na
garganta. Não quero ouvir sobre a morte da minha Allegra, mas preciso me
fortalecer. Irônico que, para alguém acostumado à dureza da vida, a matar
sem se importar, esse pequeno detalhe possa me fazer desmoronar.

— Foi o dia em que você saiu, Signor. Ela estava se comportando um


pouco estranha, então eu estava preocupada. Eu continuei tentando mimá-
la, pensando que talvez ela estivesse se sentindo um pouco sobrecarregada.
Mas então ela me pediu para comprar alguns doces para ela. Ela era muito
específica em sua demanda e pediu algo que ela sabia que eu não
encontraria facilmente. — Ela limpa os olhos.

— Felizmente, eu comprei e voltei dentro de uma hora. Bem a tempo de


ver a senhorita Chiara entrar em seu quarto.

— Ela nunca mencionou que ela e Chiara são gêmeas, — interponho.

— É claro que ela não faria, — diz a expressão de Lia, — quando todas
as suas vidas foram mais como estranhas do que irmãs que compartilharam
um útero. E seus pais contribuíram em grande parte para isso, sempre
colocando as meninas umas contra as outras, fazendo-as competir por seus
afetos. Mas Chiara não era como minha senhorita Allegra. Ela não tinha
calor e bondade, e nunca jogou limpo. Já era bastante difícil que a Signora
Marchesi culpasse Allegra pelas complicações em seu nascimento, mas à
medida que as meninas cresciam, ficou claro que elas favoreciam uma sobre
a outra.
— Mas elas são gêmeas. — Eu adiciono, quase indignado. Eu sabia que
a infância de Allegra não tinha sido feliz, mas que ela seria excluída de todos
é uma pílula difícil de engolir. Eu tive minhas irmãs e, embora haja uma
diferença de idade, todos nós estivemos perto.

— Isso realmente não importava para eles, — continua Lia, respirando


fundo. — À medida que o favoritismo aumentava, o mesmo acontecia com
os esquemas. Eles finalmente perceberam que tinham sorte de ter gêmeas,
uma garota para guardar e outra para vender.

— Franzè.

Ela assente. — Ele era o alvo perfeito, com sua riqueza e conexões em
toda a Europa. Eles decidiram cedo que Franzè seria o genro perfeito, então
eles conseguiram transformar Allegra na noiva perfeita. A maioria dos
quais, como você bem sabe, envolvia passar fome e mantê-la em uma bolha.
Enquanto minha senhorita estava tendo dores de fome, sua irmã estava
viajando de luxo em todo o mundo. Ela era amada e celebrada por seus pais
e eles nunca lhe negaram qualquer coisa. — Mais lágrimas descem pelas
bochechas dela e maman oferece-lhe um guardanapo.

— Eu sempre soube que senhorita Chiara odiava senhorita Allegra,


principalmente porque, apesar de todas as suas maquinações malignas
serem sempre as melhores, ela sabia que nunca poderia se comparar a sua
irmã. Ela sempre tentou intimidar minha senhorita, mas você conhece
Allegra, — ela sorri com carinho, — ela não recua sem lutar.
Eu aceno com a cabeça, tentando manter minha cabeça no jogo e não
sucumbir à minha dor.

Mas Lia está certa. Essa é exatamente a beleza de Allegra. Não importa
quantas vezes ela seja derrubada, sempre se levanta mais forte.

Minha little tigress...

— Você pode imaginar minha surpresa ao vê-la no hospital. Sabendo o


quanto elas se odeiam; não achei que a senhorita Chiara se importasse com
o nascimento da senhorita Allegra. Então eu esperei, desconfiando da sua
visita.

Meus músculos estão tensos enquanto espero que ela continue.

— Ela ficou lá por muito tempo. E em algum momento, outro homem


entrou. Mas foi quando ele saiu que eu sabia que algo estava acontecendo,
— ela funga, a boca entupida.

— Ele estava carregando uma daquelas camas portáteis do hospital, e


mesmo à distância eu podia ver que havia um corpo nele, apenas um lençol
cobrindo, — ela faz uma pausa e meu coração cai. Porque eu posso imaginar
o que se segue. Minhas mãos vão automaticamente aos ouvidos de Luca,
esperando que ele não ouça os detalhes horríveis do assassinato de sua mãe.

— Eu o segui até o necrotério do hospital, onde ele largou o corpo.


Quando ele saiu, eu entrei. Minha... — a voz dela quebra, — minha
senhorita estava deitada ali, ensangüentada e imóvel... Metade do rosto dela
foi esmagado em pedaços e eu mal consegui reconhecê-la.

Eu olho para longe, esse detalhe ameaçando quebrar o controle rígido


que tenho sobre minha raiva.

— Eu não sabia o que fazer. Comecei a chorar e lamentar no seu corpo.


Mas então eu notei algo. Ela ainda estava respirando — fraco, mas estava
lá.

Eu chicoteei minha cabeça mais rápido que um projétil, minhas mãos


caindo dos ouvidos de Luca.

— Você quer dizer... ela está viva? — Eu mal confio em mim mesmo
para falar, me sentindo como uma caixa de emoções de pandora aberta
dentro de mim.

Lia assente.

— Onde? Onde ela está? — Eu me levanto, pronto para ir aonde quer


que minha little tigress esteja.

— Ela não está... bem.

— O que você quer dizer?

— Consegui tirá-la de lá e pedir ajuda médica mentindo que ela era


minha filha, mas... os Marchesi estão me procurando. Eles enviaram alguém
para onde eu estava hospedada e tenho certeza que eles não descansarão
até que eu morra.

— Não se preocupe com isso. Nada vai acontecer com você, — garanto
a ela, um pouco impaciente. — Allegra. Onde está Allegra?

— Ela está em coma Signor. Mudei-a para uma casa de idosos e eles a
ligaram em máquinas, mas. eles não sabem quanto tempo mais....

— Não, — eu sussurro. — Ela não pode morrer. — Não quando eu a


recuperei. — Vamos para onde ela está e podemos discutir um plano mais
tarde.

Lia parece insegura enquanto olha entre mim e maman.

— É exatamente por isso que eu não vim até agora, Signor. Não sei se
posso confiar em você. Sei que minha senhorita precisa de mais cuidados, e
é imperativo que seja transferida para uma instalação melhor, mas... você
vai salvá-la ou matá-la?

Ela olha para mim diretamente nos olhos e eu faço a única coisa em que
consigo pensar.

Eu caio de joelhos na frente dela.

— Por favor, — começo, minha voz trêmula, — eu a amo mais do que


qualquer coisa neste mundo. Por favor... deixe-me salvá-la. — Eu a imploro,
usando todas as minhas emoções para imbuir minhas palavras e esperando
que seja suficiente.

— Eu estava certa na minha avaliação inicial de você, Enzo Agosti. —


Ela finalmente fala, levantando-se.

— Vamos buscar sua esposa.

Trocamos dois carros antes de chegarmos ao local, com o objetivo de


impedir que alguém nos siga.

Quando finalmente entramos, Lia agarra meu braço para me avisar.

— Ela não se parece com a Allegra que você conhecia.

Não coloco muito peso nas suas palavras, pois nunca me importei com
a aparência de Allegra. Eu a amaria de qualquer maneira, feição ou forma.
Porque ela é simplesmente minha Allegra.

Se ela reencarnasse em um gato, um cachorro ou um pássaro, ela ainda


teria minha devoção. Seríamos como Tesla e seu pombo branco, e nosso amor
não teria limites. E talvez além de nossas algemas carnais, possamos nos
fundir em um, nos tornarmos um andrógino primitivo: duas partes de um
todo, juntos, a união final de almas.

Porque ela é isto para mim, nesta vida ou em qualquer outra que possa
seguir.
Deixando Luca com maman do lado de fora, eu lentamente entro no
quarto.

Allegra está ligada em todos os tipos de máquinas de apitar, com a


cabeça inteira enfaixada, metade do rosto destruído. Eu engulo um gemido
doloroso enquanto olho para a bochecha e a testa machucadas, e não posso
deixar de quebrar.

Sentando-me ao lado da cama, pego a sua mão na minha, revelando o


calor que atesta que ainda está viva.

— Deus, meu Deus, — sussurro, meus olhos se concentraram no rosto


dela e nos tubos saindo da boca.

— Juro-lhe, little tigress, que ninguém, absolutamente ninguém,


permanecerá impune pelo que eles fizeram com você. — Eu levanto a mão
dela para os meus lábios, esperando poder tirar a sua dor, desejando que
fosse eu em vez dela. — Juro que farei tudo para garantir que você acorde
no mundo perfeito, e seremos uma família novamente. Você, eu e nosso filho.

Porque está é o alerta, eu precisava perceber que minha little tigress


não pertence a uma gaiola. Ela merece a verdadeira liberdade, e eu farei o
que for preciso para lhe dar isso quando ela acordar. Mesmo que isso
signifique enfrentar toda a Cosa Nostra.

— Eu nunca te disse o quanto te amava... — Eu segui, meus olhos


enevoados, — o quanto você significa para mim. Mas eu vou te mostrar.
Somente... fique boa logo.
Passo mais tempo com ela, me sentindo em casa pela primeira vez em
semanas. Em algum momento maman traz Luca e eu o coloco no peito de
sua mãe, esperando que ela possa senti-lo e ver o quanto precisamos dela de
volta.

— Volte para nós, little tigress. Nós precisamos de você. Nós dois. — Eu
dei um beijo em sua bochecha imaculada, meu coração se partindo
novamente ao pensar em deixá-la.

Mas até o final da visita, uma coisa está clara. Vou desencadear o
inferno para todos os envolvidos, e há quatro pessoas que conseguirão
assentos na primeira fila: Rocco, Chiara, Leonardo e Cristina Marchesi. Não
será uma morte fácil, nem mesmo uma longa sessão de tortura. Não, eu vou
atingi-los onde dói — vou destruir o que eles mais valorizam. Para Rocco, é
a família e o império que ele construiu. Para Marchesi, são suas riquezas e
conexões.

No final, eles não terão nenhum.

— Conversei com o médico dela, — levo Lia de lado, — e ele recomendou


uma série de cirurgias cerebrais, além de uma cirurgia reconstrutiva para o
lado esquerdo. Eu cuidarei de qualquer coisa e arranjarei duas novas
identidades para que você possa se mover sem ser detectada.

Lentamente, um plano começa a se desenrolar em minha mente.

— Depois das cirurgias dela, mudaremos vocês duas para Sacre Coeur,
onde está minha irmã, e terei uma equipe médica à mão vinte e quatro por
sete. Eu preciso tê-la por perto, mas também em um local secreto. — Eu
acrescento, explicando meu processo de pensamento.

Se Rocco ou Marchesi descobrissem que Allegra ainda estava viva, eles


tentariam matá-la novamente. Em seu estado vegetativo, ela é um alvo fácil
para que tudo possa acontecer. A melhor maneira é mantê-la perto de mim,
mas também em algum lugar seguro. Como estou visitando Catalina
regularmente no Sacre Coeur, ninguém iria se importar com isso. E eu sei
que a segurança deles é de primeira qualidade, então isso é um bônus
adicional.

Vai demorar, muito suborno e chantagem, mas eu vou fazer isso


acontecer.

As próximas semanas são uma provação. Estou muito tenso entre as


cirurgias de Allegra, Luca e os negócios. Estou feliz que maman ofereceu
cuidar de Luca às vezes, desde que me tornei cada vez mais paranóico com
todos ao meu redor.

Mas à medida que meu filho cresce a cada semana que passa, o
prognóstico de Allegra piora.

— Sinto muito, não tenho ótimas notícias, — disse o médico após sua
terceira cirurgia, — conseguimos consertar os danos ao cérebro dela, mas
simplesmente não há como saber quando ela acordará... — ele segue, as
palavras não ditas — se acordar.
— Ela vai, — digo com confiança, porque sei que ela o fará. É apenas
uma questão de tempo, e posso esperar o tempo que ela quiser.

— Se ela tivesse conseguido ajuda imediata, talvez seu prognóstico


fosse melhor. A partir de agora, eu realmente não posso fazer promessas.

Eu aceno e agradeço ao médico por seu esforço, mesmo que por dentro
eu esteja quebrando.

Porra!

Desde o início, esse foi o meu pior pesadelo, que alguém machucasse
minha little tigress e a levasse para longe de mim. Porque eu sabia, mesmo
assim, que a vida sem ela não seria nada além de um inferno.

Agora estou vivendo isso.

Com Allegra e Lia instaladas em Sacre Coeur, acho mais fácil continuar
com meus negócios, além de planejar a queda de Rocco.

Eles tiraram a coisa mais importante de mim, então vou retribuir o


favor.

A criptonita de Rocco é seu império, e ele sempre declara


orgulhosamente que elevou a famiglia para um status diferente com sua
perspicácia nos negócios. Então, eu vou ter que enganá-lo nisso.
Pode levar algum tempo, e dado o estado vulnerável de Allegra, alguma
farsa de alta qualidade agindo por minha parte. Mas quando tudo estiver
dito e feito, a queda de Rocco da graça será a melhor coisa a testemunhar.

A atuação não deve ser muito difícil, já que as pessoas já têm uma ideia
preconcebida sobre mim — o indolente playboy que confia em sua boa
aparência para conseguir tudo na vida. Eu sei o que as pessoas vêem quando
olham para mim, exatamente como eu sei que elas me julgam antes mesmo
de me conhecerem. Então, vou brincar com o viés deles e me transformar no
filho pródigo perfeito.

Eu já tinha conversado com maman sobre isso, e ela prometeu me


emprestar algumas de suas garotas para ajudar a melhorar essa imagem.
Eu tinha um pedido, todas as garotas que ela escolheu para mim tinham
que ser lésbicas.

Eu não gostaria de nenhuma complicação, como se alguém estivesse


realmente obcecada por mim. Estive lá, fiz isso, e acho que já tive mulheres
obsessivas o suficiente por toda a vida. Também me ajudará quando chegar
a hora de explicar à minha little tigress que nunca na verdade estive
envolvido com essas mulheres.

Considerando a propensão de Chiara a pau, mesmo velho e murcho


como o de meu pai, tenho que torná-lo crível que eu não cuido dos assuntos
dela, porque estou cuidando muito dos meus. Um casamento moderno
completamente.
E lentamente, vou mudar este mundo de dentro para fora. Eu nunca
realmente questionei meu papel na máfia. Sempre foi meu direito de
primogenitura. Mas ver a expressão aterrorizada de Allegra quando matei
aqueles homens, a maneira como ela me amaldiçoou me machucou como
nada antes. Não apenas isso, mas seu diário confirmou sua reunião com os
federais e, embora ela não tivesse expressado seu desejo de me deixar por
escrito, ela tinha compilado as evidências como último recurso.

Ela nunca confiou em mim para fazê-la feliz.

Então, darei a ela o que sempre quis — liberdade e um mundo em que


ela possa viver pacificamente e com o desejo de seu coração.

— Shh, — tento acalmar Luca uma noite e depois de fazer tudo:


alimentando, tomando banho e trocando, nada funciona.

Estou perto de desistir quando outro pensamento passa pela minha


cabeça.

Puxando meu computador, navego por alguns dos vídeos que tirei de
Allegra, escolhendo um em que ela estava tentando cantar uma música de
um comercial, mas falhando bastante miseravelmente. Toco o som e assisto
com admiração os ouvidos de Luca se animarem, sua atenção se concentrou
apenas no vídeo. Ele bate as mãos no teclado na tentativa de se aproximar
da tela, seus gritos agora abafados.
— Mamma. — Eu digo quando aponto para Allegra, esperando
imprimir em sua mente jovem que está é sua mãe de verdade, não a
impostora dormindo no corredor.

Ele franze as sobrancelhas olhando para Allegra, já mais calmo do que


antes. Quando o vídeo termina, o choro começa de novo, então eu apenas o
coloco em um loop.

Hipnotizado, Luca continua assistindo as travessuras de sua mãe, e eu


também me perco na presença dela.

Se ao menos ela estivesse aqui...

Eu dei uma tragada profunda no meu cigarro tentando parecer


entediado, contando o tempo todo as cartas para garantir que eu ganhe mais
uma rodada.

Nada como um trapaceiro para fazer o grande chefe mostrar seu rosto.

Gemidos permeiam o ar quando eu coloco minhas cartas, um royal


flush. Puxo as fichas em minha direção, tentando ignorar a mulher ao meu
lado. Afinal, ela está desempenhando um papel e eu também.
O próximo conjunto de cartas é distribuído, e continuo fumando em
cadeia e contando as cartas. Não demorará muito até que a gerência perceba
que há algo errado comigo, e minha mão bastante afortunada.

Faz quase dois anos desde o acidente de Allegra, e meus planos


começaram lentamente a se materializar. Eu fiz cálculos abrangentes para
atingir onde dói mais, começando com Rocco.

Agora, a melhor maneira de derrubar um império é tirar seus recursos.


No caso de meu pai, seus negócios lucrativos — drogas e tráfico de pessoas.
Seus muitos clubes em Manhattan atendem aos piores vícios e às elites mais
corruptas. O que ele diria quando seu fluxo de clientes diminuir, seu fluxo
de prostitutas para e seu lucro diminuir? Afinal, nada pode colocá-lo na
ponta dos pés como uma competição antiquada.

Mas acima de tudo, o que ele dirá quando perceber que seu império não
é mais dele?

Dizer que tem sido difícil chegar aqui é um eufemismo. Sinto vontade
de morrer por dentro quanto mais vejo minha Allegra definhando lá em um
estado de estar, mas não de ser. Ela está no suporte de vida e saber que
alguém pode entrar e puxar o plugue me deixa perpetuamente inquieto.

Eu a visito semanalmente, mas não é suficiente. Nunca é suficiente. Eu


a quero ao meu lado e na minha cama. Quero adorar o seu corpo e fazer
amor com ela como nunca antes.

Eu quero mostrar a ela meu amor.


Eu nunca tinha me masturbado com a foto de uma mulher antes dela.
Mas às vezes o desejo se torna demais, e me vejo gozando com o nome dela
nos meus lábios, revivendo as muitas vezes que eu a fodi com força e rapidez,
mas também nas outras vezes, durante a gravidez, quando tínhamos ficado
tão agonizantemente lentos, explorando os corpos um do outro e conectando-
se ao nível da alma.

— E eu ganho, — sorrio, — de novo, — puxo as fichas em minha direção,


observando algumas pessoas me olhando de perto do lado de fora.

Com certeza, um deles vem até mim, falando baixo no meu ouvido que
o chefe dele quer me ver. Eu encolho os ombros e, aparentemente, muito
complacente, eu o sigo.

Ele abre uma porta para eu entrar antes de fechá-la em seu rastro.

Parece que estou encantado com uma audiência privada.

A sala é escura, uma lâmpada baixa na mesa atrás, permitindo apenas


luz suficiente para ver a silhueta de um homem. A fumaça vem do que eu
suponho ser um charuto, e olhos brilhantes me observam atentamente.

— Você está tentando chamar minha atenção há um tempo, Agosti, —


ele ronca, uma voz profunda e áspera de décadas de tabagismo.

— Eu diria que funcionou. — Eu brinco.


É imperativo manter minha máscara divertida, mesmo que eu suspeite
que o homem na minha frente possa saber a verdade.

— Sente-se, — ele se move na frente dele e eu obedeço.

Ele não era um homem fácil de encontrar, e essa não foi minha primeira
tentativa. Mas valeria a pena no final, mesmo que eu esteja vendendo minha
alma ao diabo.

— Estou surpreso que você tenha mordido a isca dessa vez, — inclino a
cabeça, acendendo um cigarro.

— Eu senti pena de você, garoto. Você já esteve no quê? Dez dos meus
cassinos no ano passado? E você está sempre contando cartas... tsk, tsk. Eu
pensei que você teria aprendido sua lição após o tiroteio ou os
espancamentos, mas aqui está você, de novo. — O seu tom está cheio de
diversão, então eu sei que, embora sejamos tecnicamente inimigos, ele pode
admirar minha perseverança.

— Você sabe, — ele continua recostando-se nas sombras, —


inicialmente pensei que isso fosse sobre sua irmã. Mas não é, é?

— Não. Não é, — respondo, mesmo que seja preciso tudo para tirar esse
pedacinho de informação da minha mente. Tinha sido ainda mais difícil
deixar de lado minha sede de vingança para que eu pudesse negociar com
ele. Mas acho que por Allegra não há nada que eu não faria.

Até dando as mãos à pessoa que matou minha irmã.


Ele é o único com interesses e recursos para me ajudar a alcançar o que
eu quero — total aniquilação do império Agosti.

— Claro, — ele sorri, — você não estaria sentado tão calmamente em


frente a mim. Mas eu pensei nisso antes de convidá-lo. Veja, você me fascina,
Sr. Agosti.

— Eu faço?

— Há algo em você que não se encaixa no molde. Devo dizer que


raramente sou surpreendido pelas pessoas. Mas você conseguiu fazer
exatamente isso, — ele se levanta do assento, de costas para mim enquanto
olha pela janela durante a noite. — Sua esposa vale tudo isso? — Ele
pergunta, e eu estou momentaneamente atordoado. Mas então percebo com
quem estou falando, um dos traficantes mais esquivos da América. Claro
que ele teria ouvidos em toda parte.

— Ela vale. Ela é meu coração. — Eu respondo, sem vergonha do que


Allegra significa para mim.

— Eu te invejo. Talvez se meu coração estivesse vivo, eu também não


estaria aqui... — ele segue. Respirando fundo, ele se vira para mim, saindo
das sombras, para que eu tenha meu primeiro vislumbre dele.

Ele é um homem bonito, mesmo na casa dos cinquenta anos, com um


físico forte e olhos astutos que parecem ver tudo.
— Vamos conversar sobre negócios, vamos? — O convite aberto dele é
tudo o que eu precisava para colocar minha oferta na mesa.

— Eu vou direto ao ponto. Vou te dar Nova York, desde que você me
ajude a derrubar Rocco e Marchesi. Quero que eles nunca vejam isso, bater
onde dói.

Depois de descobrir as circunstâncias da morte de Romina, consegui


juntar o porquê ela teve que morrer. E as listas de suspeitos haviam
diminuído significativamente.

Mas há apenas uma pessoa poderosa o suficiente para ousar algo assim,
e desesperada o suficiente para tentar, Arturo Jimenez.

Ele assumiu corretamente que a morte de Romina criaria uma barreira


entre Agosti e Lastra, e deixaria ainda mais as cinco famílias em frangalhos,
indo para a garganta um do outro e sem perceber uma presença menor
lentamente entrincheirada em seus territórios.

Jimenez queria há muito tempo mudar seus negócios para Nova York,
e eu vou tornar seu sonho realidade.

— Essa é uma oferta bastante generosa, — ele levanta uma


sobrancelha, com dúvidas claras em seu olhar.

— Eu não me importo com a fome enquanto me vingar, — acrescento.


— Hmm, — ele estreita os olhos para mim. — Os homens feitos que
encontrei no meu tempo preferem morrer uma morte dolorosa do que trair
a famiglia. Por que eu deveria confiar em você? Isso poderia muito bem ser
uma armadilha.

— Não estou buscando nenhuma retribuição pela morte de Romina. Eu


acho que isso deve ser prova suficiente.

Ele me considera silenciosamente por um momento.

— Então eu aceito sua oferta, garoto. Mas saiba que no momento em


que sinto que você pode estar me enganando... — ele acende um fósforo,
segurando o fogo na frente do rosto antes de acender o charuto novamente,
— não será você que eu vou atrás, — ele deixa a ameaça pendurada. Não
serei eu; será Allegra.

— Eu nunca brincaria com a vida dela, — garanto a ele, e começamos


a discutir negócios.

— Teremos que fazer uma transição perfeita para que seu pai não
perceba o que está acontecendo debaixo do nariz. — Jimenez comenta, e logo
elaboramos um plano.

Tudo estaria sob o disfarce de uma parceria com a família irlandesa de


Boston. Jimenez tem uma grande participação em seus ringues de combate
subterrâneos e está muito próximo da família Gallagher. Dado o conflito em
curso com Lastra, estaríamos procurando em outros lugares por recursos,
que é quando os Gallaghers entrariam.
Eles ofereceriam seus serviços em troca do uso de alguns de nossos
locais como arenas de combate, trazendo assim os ringues subterrâneos
para Nova York e estabelecendo as bases para a transição de Jimenez.
Quando o pai menos esperar, ele é atingido por traição de todos os lados, e
todos os seus negócios transferem a propriedade para Jimenez. Ele ficaria
desamparado ao ver o trabalho de sua vida desperdiçado. Só posso imaginar
sua expressão quando ele perceber que foi seu amado filho que colocou tudo
em movimento e o enganou por tanto tempo.

— Faça Martin Ashby investir. Ele é um tolo ganancioso e, se a oferta


for atraente, ele será o primeiro a mergulhar. Além disso, ele está na minha
lista negra, — Jimenez ri e começa a me contar seu passado tumultuado
com Martin, bem como as razões pelas quais ele o quer morto — ainda não.

— A hora dele chegará, obviamente. Mas, como você, tomo meu tempo
com vingança.

A informação mais interessante deve ser a identidade de Theodore


Hastings, comissário-chefe da polícia de Nova York, e as características de
Jimenez se transformam imediatamente quando ele fala sobre ele, sua
expressão cheia de orgulho.

— Ele é meu herdeiro, mas está muito definido em seus caminhos


justos. Preciso dar um empurrãozinho para que possa tomar seu devido
lugar quando chegar a hora.
— Então você quer que eu o chantageie, — eu acaricio meu cigarro
tentando entender qual é a finalidade do jogo de Jimenez.

— Sim, há muito nele. Sua identidade anterior como Adrian Barnett,


por exemplo; ou a verdadeira identidade de sua esposa, — Jimenez desliza
uma pasta em minha direção.

— A sua esposa? — Eu levanto uma sobrancelha, abrindo o arquivo


para ler seu conteúdo. Possui informações detalhadas sobre Bianca Ashby,
também conhecida como Artêmis. — Isso é muita coisa, — eu rio da ironia.
— E ele não sabe que mora com uma assassina?

Jimenez balança a cabeça, um sorriso tocando nos lábios.

— Eu não acho que meu filho suspeitaria se você jogasse na cara dele.
É assim que ele está apaixonado por ela. Mas por causa disso, é todo o
incentivo que ele precisará para chegar ao lado sombrio.

— Entendo, — respondo.

Os Gallaghers se insinuariam no negócio de Agosti até que pudessem


roubá-lo debaixo do nariz de Rocco. Então Jimenez entraria e assumiria o
império e o pai veria o trabalho de sua vida destruído. Ele morrerá de um
ataque cardíaco, ou eu farei as honras.

— Agora para o Marchesi, — começo e planejamos mais alguns anos de


antecedência.
Engraçado como agora eu tenho todo o tempo no mundo.

— Papa, quem é essa? — Olho para meu filho de quatro anos enquanto
ele mexe as sobrancelhas em confusão.

— Esta é amiga do papai e ela está muito doente. — Eu explico,


sentindo uma pontada de tristeza pelo fato de ele não reconhecer sua própria
mãe.

Quando ele cresceu, eu parei de trazê-lo comigo para visitar Allegra,


com medo de que pudesse contar a alguém sobre a mulher que se parece com
a mãe dele.

Enquanto Luca acha que Chiara é sua mãe, eu tentei manter suas
interações extremamente curtas. Tempo suficiente para que Allegra não
seja uma estranha para ele quando acordar, mas também curto o suficiente
para evitar a má atitude de Chiara. É ainda melhor que Chiara não pareça
ter nenhum interesse em ser mãe. Nos últimos anos, ela se tornou o centro
da vida social de Nova York. Na maioria das vezes, ela nem está em casa,
preferindo passar o tempo festejando ou fodendo quem sabe quem.

Observando o comportamento dela por tanto tempo, percebi que ela


sofre de vários vícios: álcool, sexo e cocaína. Adicione uma personalidade
ruim e você terá uma combinação vencedora. As histórias que ouvi sobre ela
me deram tanta dor de cabeça, principalmente porque quando Allegra
acordar, será sua reputação que ela teria arruinado.

Mas não posso fazer nada a respeito e ainda manter meu ato.

E até isso me preocupa. O que minha little tigress pensará quando


acordar apenas para ver numerosos artigos de tabloides comigo e com
mulheres diferentes? Temo o dia em que terei que ver a tristeza em seu rosto
tentando provar a ela que nunca houve mais ninguém.

Tomando Luca nos meus braços, eu me sento ao lado de Allegra. Ao


longo dos anos, sua saúde melhorou um pouco e agora ela é capaz de respirar
sozinha. Ainda assim, não há garantia quando ela vai acordar.

— Por que ela está doente?

— Ela sofreu um acidente e agora está dormindo. — Luca acena para


mim, com o olhar dele na forma de Allegra. Não há absolutamente nenhum
sinal de reconhecimento em seu olhar. Não quando Allegra parece tão frágil
e pálida, completamente diferente da glamourosa Chiara que Luca está
familiarizado.

Eu gostaria de poder dizer a ele que ela é sua verdadeira mãe, que ela
o ama mais do que tudo. Mas isso apenas confundiria sua pequena mente.

Como qualquer criança indisciplinada, Luca está ficando cada vez mais
inquieto, então eu o envio para maman Margot, que está esperando lá fora.
Ele pula dos meus braços, correndo para ela. Ela concorda comigo que eu
posso tomar meu tempo, então eu devolvo minha atenção a Allegra.

É estranho como o tempo passa. Estamos cada vez mais perto da marca
de cinco anos e minha little tigress ainda está dormindo.

Pego a sua mão na minha, trazendo-a para os meus lábios.

— Little tigress, — começo, e a visão dela tão desamparada, tão


vulnerável, nunca deixa de chegar até mim: — Não sei se você pode me
ouvir. Ou se você ouviu alguma coisa que eu disse nos últimos anos. Mas
estou mais perto do que nunca de cumprir minha promessa a você. E quando
eu terminar, a família criminosa Agosti deixará de existir. — Eu engulo com
força, um nó se formando na garganta.

— Quando você acordar, prometo que deixarei tudo para trás.


Somente... volte para mim. Posso esperar para sempre por você, mas quanto
mais cedo você se recuperar, melhor, — tento uma piada alegre.

Curvando-me, pressiono meus lábios contra os seus em um breve beijo.

— Eu te amo, — sussurro contra a bochecha dela antes de me levantar


para sair.

— Papa, posso ir à Casa de maman Margot? Ela tem biscoitos! — Luca


me ataca quando saio do quarto. Eu o levanto nos braços e franzo uma
sobrancelha para maman.
— Oh, vamos lá, Enzo. Um biscoito não pode doer. Vou trazê-lo amanhã
d’accord?

— Tudo bem, você pode ir para a casa de maman. — Eu cedi, sabendo


que tenho alguns negócios excelentes para cuidar.

Depois de deixá-los na maman, eu vou ao clube de Rocco para uma


reunião.

A sala está escura e cheia de fumaça de cigarro. Em um sofá, Rocco está


conversando profundamente com Matthew Gallagher. Calças ao redor dos
tornozelos, eles definitivamente estão misturando negócios com prazer.
Duas garotas estão de joelhos na frente deles, sugando-os, seus gemidos
falsos ecoando na sala.

No outro canto, Martin Ashby está entrando e saindo de Chiara, latindo


o tempo todo alguns comandos no telefone. Eu imediatamente desvio o
olhar. Enquanto eu não ligo para quem Chiara fode, ela ainda é a gêmea
idêntica de Allegra, e eu não quero ter a imagem da minha esposa sendo
levada por trás por qualquer outro homem.

O caso de Chiara e Martin começou logo depois que o convidamos para


participar de nosso empreendimento comercial, e está se fortalecendo desde
então. Pode até fazer fronteira com a monogamia, que seria a primeira vez
de Chiara.

Eu me mudo para o outro canto da sala, onde Quinn está sentado


sozinho, observando os outros com olhos estreitos.
— Não está participando? — Sento-me ao lado dele, pegando a garrafa
de uísque da mesa e me derramando um copo. Acendendo um charuto, tomo
um grande gole, esperando que sentidos entorpecidos ajudem meus olhos a
lidar com a cena diante de mim.

— Não, — ele abaixa o próprio copo, colocando-o na mesa e empurrando


a mão em minha direção. — Casado, — diz ele, seu sotaque irlandês ainda
mais espesso do álcool.

— Não nos impede, — encolho os ombros, tomando minha bebida e


colocando meu melhor charme.

— Então por que você não participa? — Ele levanta uma sobrancelha
para mim, avançando em direção à stripper dançando no poste, cuja atenção
está atualmente em mim.

— Eu não gosto... de exibicionismo, — respondo. É tecnicamente


verdade, já que eu nunca permitiria que outra pessoa visse minha little
tigress. Ela é apenas para os meus olhos.

Ele resmunga, voltando sua atenção para a garrafa de uísque.

— Não deveríamos conversar sobre a próxima etapa? — Eu pergunto,


um pouco desanimado pela orgia na minha frente. Tenho certeza que eles
poderiam ter encontrado qualquer outra hora para foder. Talvez eu esteja
um pouco impaciente, mas meu plano está muito perto de ser finalizado.
Já montamos duas arenas de combate em Midtown, e Rocco e Martin
ainda estão alheios à armadilha em que estão mergulhando de cabeça. Em
breve, ambos acabarão quebrados e mortos, a ordem discutível.

— Minha filha e o marido estão chegando amanhã. — Martin é o


primeiro a falar, trocando de posição para que Chiara agora o chupe. —
Precisamos colocá-los a bordo com isso. A influência de Theodore ajudará a
garantir que as arenas tenham espectadores suficientes, mas não a polícia,
— diz ele, sua voz flutuando com as cuidadosas ministrações de Chiara. Eu
quase reviro os olhos para isso.

O único alívio é que Chiara recentemente pintou o cabelo, então não é


exatamente como o de Allegra.

— Fácil, — diz meu pai, puxando o pau para fora da boca da prostituta
e virando-a para que ele possa ficar com a bunda dela. É tudo um pouco
ofensivo, realmente. Tento não mostrar o quão enojado estou, especialmente
quando ele cospe na mão e passa no pau, empurrando-o na bunda da
prostituta sem preparação ou proteção. A garota solta um gemido dolorido
que ela finge ser de prazer, mas ela não faz protestos quando Rocco começa
a foder sua bunda em carne viva.

Eu nem quero saber que tipo de doenças eles têm, já que claramente
meu pai não é um grande fã de preservativos. Pelo menos Matthew coloca
preservativo antes de foder sua prostituta.
— Você realmente me ligou para vir aqui para assistir você foder? —
Eu pergunto, eventualmente, irritado que eles estejam perdendo meu tempo
e que não estamos fazendo nenhum progresso.

— Podemos foder e conversar, — meu pai pisca e todo mundo começa a


rir.

Todos, menos eu e Quinn, que parecem ter terminado a garrafa de


uísque e mal está acordado.

— Como vamos fazer com que Hastings cumpra? — Pergunto a Martin,


tentando ver o que ele tem debaixo da manga.

— Eu vou usar minha filha. Ela é a fraqueza dele. — Ele sorri


insidiosamente.

Claro que ele jogaria sua própria filha debaixo do ônibus. No tempo em
que conheci Martin, percebi por que ele estava na lista negra de Jimenez. O
bastardo é um cachorro traiçoeiro, abanando as caudas para quem mais o
lucra.

Ele se abstém de dizer exatamente como a usará, na esperança de


manter algum segredo. Eu posso arriscar um palpite sobre qual é o grande
segredo, desde seus laços com a Bratva russa até sua contagem de mortes,
eu diria que há muito para chantageá-los.

Eu quase gemo alto quando percebo que vou ter que fingir flertar com
ela, conforme as instruções de Jimenez. Em suas próprias palavras, ele quer
que seu filho seja verdadeiramente encurralado, e aparentemente algum
bom e velho ciúme fará o truque. O único fato tranquilizador é que, segundo
todos os relatos, ela está completamente apaixonada pelo marido, então há
menos chances de me levar a sério.

No dia seguinte, nosso objetivo é alcançado, e Theodore Hastings está


oficialmente sob nosso controle. Agora, para a peça central — a queda de
um império.
CAPÍTULO VINTE E DOIS

— Você quer dizer que eles sabem? — Eu me tranco no meu escritório,


com cuidado para evitar olhares ou ouvidos curiosos.

— Eles de alguma forma encontraram minha foto e juntaram dois e


dois, — resmunga Jimenez, e posso dizer que ele não está satisfeito com essa
mudança de eventos.

Logo depois de termos recebido uma boa parte da fortuna de Martin,


Jimenez decidiu que era hora de despachá-lo. Ele escolheu ninguém além
da minha casa para fazê-lo, o próprio escritório em que estou.

Agora, Jimenez, apesar de toda a vontade de compartilhar informações,


não havia me dito um pequeno detalhe. A pessoa que matou Martin era
alguém que Theodore Hastings conhecia desde seu tempo como Adrian
Barnett.

No espírito de cooperação cordial, enviei a Hastings e sua esposa as


imagens daquela noite, com a certeza que não encontrariam nada suspeito
que pudesse ligar o assassino a Jimenez.

Bem, eles tinham.

E assim uma caça às bruxas havia começado por Jimenez. Só que não
achamos que chegaria tão longe.

Anos atrás, em sua tentativa de se aproximar de seu filho mais velho,


Jimenez havia emprestado a identidade do irmão falecido de Matthew,
Andrew Gallagher. E assim, durante anos, ele treinou seu próprio filho em
combates subterrâneos até a morte, tentando criar a máquina de matar
perfeita.

Só que ele falhou.

Hastings é um daqueles mocinhos que pensam que podem carregar o


peso do mundo inteiro em seus ombros. Bem, dada a propensão de sua
esposa por matar sem remorso, eu diria que ele está com o prato cheio.

É claro que Hastings reconheceria seu mentor há muito perdido. E


agora ele pode ligá-lo aos Gallaghers e... a mim.

Porra!
— Você percebe o que isso significa? — Disse entredentes, meus planos
ameaçando desmoronar. Tudo o que eu trabalhei ao longo desses anos será
para nada.

— Sim. Preciso recalcular tudo, — responde Jimenez, e sufoquei o


desejo de jogar meu telefone pela sala.

Porra, inferno!

Não, não posso deixar isso acontecer. Eu preciso me reagrupar e


descobrir algo rápido. Nesse ritmo, Rocco deve descobrir que os Gallaghers
estão trabalhando para o inimigo o tempo todo. E embora esse tenha sido o
plano o tempo todo, é muito cedo! Ainda temos que fazer uma fusão completa
com os Gallaghers para cair tudo nas mãos de Jimenez.

Não, algo precisa ser feito.

— De fato, — eu digo, e desligo. Não consigo encontrar em mim me


preocupar com as sensibilidades de Jimenez agora que estou em risco de ser
descoberto, e minha vingança será inútil se isso acontecer.

Massageando minha têmpora, começo a pensar. Rápido.

Esse pequeno golpe está precipitando meus planos, e eu tenho que


pular meses de planejamento perfeito

— O que diabos eu vou fazer? — Eu murmuro para mim mesmo,


olhando sem rumo pelo meu escritório, esperando que uma ideia se forme.
Neste ponto, não se trata de obter a vingança perfeita. Trata-se de
garantir a morte do pai — de maneira apropriada e satisfatória — mas
também de autopreservação. Isso deve ser feito de uma maneira que não o
faça desconfiar de qualquer pessoa da família. A última coisa que preciso é
de um alvo nas minhas costas.

Meus olhos se voltam para o meu calendário e vejo a data da luta de


inauguração de uma das arenas. Faltam apenas alguns dias e, enquanto eu
me dedico a isso, um plano começa a se formar em minha mente.

Eu só preciso de um momento preciso e de um público perfeito. As rodas


estão virando na minha cabeça e logo tenho um plano de ação abrangente.
Um que pode não ser tão satisfatório quanto assistir a expressão do pai
diante de seu império em ruínas, mas que pelo menos garantirá sua morte.

Fazendo algumas ligações, certifico-me de ter olhos em Hastings e sua


esposa o tempo todo.

Alguns dias depois, a sorte acaba por estar do meu lado, quando ouvi
dos meus homens que os Hastings deixaram o apartamento.

Parece que não preciso convencê-los a se esconder.

Este plano necessita da sua presença por várias razões. Eles agirão
como testemunhas e como ajuda quando chegar o momento. E, conhecendo
a verdade, eles suspeitarão imediatamente que Jimenez está agindo com
medo de que ele tenha sido descoberto.
Olho para o corpo aos meus pés, irritado por ter que me livrar dele
rapidamente. Eu vim aqui para fazer Matthew concordar com o meu plano,
mas, em vez disso, ele foi inflexivelmente contra, dizendo que isso arruinaria
os negócios.

— Pareço que me importo com os negócios? — Eu respondi e meu dedo


apertou rapidamente o gatilho, atingindo Matthew direto no peito. Ele havia
respirado mais algumas vezes antes de sucumbir à morte.

— Piedade, — eu me inclino, avaliando a bagunça que fiz. Tirando meu


celular, ligo para Nero, pedindo que ele descarte o corpo.

—Corte-o, tire os dentes e queime as impressões digitais, depois jogue-


o no rio, — digo antes de ir ao banheiro de Matthew para me limpar. É
melhor que a identidade dele nunca seja confirmada. Não preciso de mais
inimigos no momento.

Enquanto Nero lida com o corpo de Matthew, faço uma rápida viagem
ao meu carro para trocar de camisa.

Maman já está me esperando, uma loira esbelta vestida com um vestido


de noite ao seu lado.

— Essa é Angelique. — Maman faz as apresentações após as quais nós


dois procuramos a localização de Hastings.

Para deixar claro a importância do evento, eu havia contratado uma


limusine para nos levar até lá.
— Nada vai acontecer com você, mas no momento em que você ouvir
tiros, eu quero que você corra. Compreende? — Eu digo a Angelique
enquanto estacionamos em frente a um restaurante.

Segurando meu braço para ela, entramos. Eu vejo Hastings e sua


esposa imediatamente, então nos aproximamos deles para iniciar uma
conversa amigável antes de lentamente seduzi-los a nos seguir até a arena.

— É a primeira partida de Quinn, afinal, — dou a eles o meu sorriso


mais encantador quando entramos na limusine, o próximo destino a arena.

Estou tenso quando ocupamos nossos lugares na seção VIP. Meu pai já
está lá com sua última amante, e ele parece estar de bom humor, com a mão
entre as pernas dela. Balançando a cabeça com nojo, me movo ao seu lado,
Angelique ao meu lado e Hastings e sua esposa atrás de nós. Não os quero
perto de meu pai, caso um deles decida ser magnânimo e derramar a
verdade sobre Jimenez.

A luta logo começa, e meu cronômetro também. Quinn está dando um


bom show para o público, e todo mundo está fascinado pela violência no
palco.

Olhando para o meu relógio, acompanho o tempo. Quando vejo que há


mais alguns minutos até o ataque, me inclino e sussurro para meu pai.

— Eu sei o que você fez. — Ele congela, seu rosto ainda está para a
frente.
— Do que você está falando?

— Chiara, — digo a única palavra e seu rosto fica em branco.

— Não se preocupe, no entanto. Eu me acostumei com isso. — Eu


continuo querendo lhe dar uma falsa sensação de segurança. Seu rosto
parece relaxar.

— Eu sabia que você veria a razão, filho. Aquela cadela, Allegra, estava
em contato com um federal. Você sabe o que fazemos com traidores.

— De fato, — aperto meu punho ao meu lado, esperando meu tempo.


Não posso deixar minha raiva obscurecer meu julgamento, mesmo que o
simples fato de ele ter chamado Allegra de cadela me faz ver vermelho.

— Além disso, não é como se você se importasse com ela, — ele zomba,
— você acha que eu não sei quanto tempo você gasta naquele maldito bordel,
— continua ele. Ele não parece perceber que o bordel em questão pertence
à maman Margot. — Ela era substituível e, felizmente, Chiara teve a
gentileza de nos ajudar a salvar a cara.

— Salvar a cara, pai? Você a viu? Ela já fodeu metade de Nova York
agora. — É ridículo como Rocco pode ser hipócrita. Só é certo quando serve
aos propósitos dele. Chiara é sua marionete para que ela não possa fazer
nada errado.
— Vamos, Enzo. Você sabe que ela só transa com pessoas importantes,
— continua Rocco, e não sei se devo gemer com sua mentalidade mercenária
ou rir de sua estupidez. Então ele praticamente a está cafetando?

— Eu não sabia que o jardineiro era tão importante. Ou seus guarda-


costas. Ou até o maldito padre no funeral de Martin. Você sabia sobre esse.
— Eu pensei que talvez ela tivesse algum sentimento por Martin, porque
ela certamente exibiu cenas dignas de um Oscar no túmulo dele? Mas depois
do funeral, eu a deixei descansar apenas para encontrá-la desossando o
padre.

Pai gagueja um pouco, preso em sua própria ilusão.

Eu sei exatamente o que aconteceu. Ele pensou que poderia controlar


Chiara e até usá-la como sua lixeira pessoal. Mas então ele não tinha
antecipado a natureza inconstante de Chiara, ou o fato de que ela poderia
chantagear sua bunda gorda até a submissão. Quero dizer, o comportamento
dela nos últimos anos não foi nada menos que indecente, mas Rocco ainda
encontra maneiras de defendê-la quando, se houvesse mais alguém, ele teria
se preocupado em manchar a honra da família.

— Ela está sozinha. Você não deu atenção a ela, — eu quase ri na cara
dele.

— Sinto muito se não quero sua boceta usada pelo meu pai, — reviro os
olhos para ele. — Mas estou curioso, — continuo, querendo investigar um
pouco mais, o relógio na minha mão me dizendo que tenho mais tempo, — o
que exatamente os Marchesi ganharam?

Seus olhos se arregalam na minha pergunta e ele leva um segundo para


responder.

— Controle sobre nossos negócios italianos, — sua voz é instável


quando admite isso, porque, em geral, o controle sobre a Itália é o controle
sobre a Europa.

— Realmente? Você valorizava tanto sua liberdade que abandonaria


metade de seu poder? — Eu tinha passado por todos os documentos, mas
nenhum deles havia sugerido uma fusão ou mesmo uma transferência de
poder, o que significa que ele está usando diferentes conjuntos de
procuradores para garantir que o acordo permaneça oculto. Inteligente, mas
também estúpido. De repente, faz sentido porquê nosso lado europeu está
perdendo dinheiro.

Marchesi do caralho.

— Era necessário, — ele estremece, o rosto ficando vermelho pelo


esforço.

Mais dois minutos.

— Obrigado por me esclarecer, pai. Agora, por que não digo alguns fatos
interessantes também? — Minha mão agarra seu braço rechonchudo, meus
dedos cavando sua gordura. — Os Gallaghers nunca foram nossos aliados.
Quinn dá um soco em seu oponente, e toda a multidão se alegra.

— Você sabe com quem eles estavam trabalhando? — Eu continuo


vendo seus olhos se arregalam com a realização. — Sim, de fato. Jimenez
e... eu.

— O que... — Ele gagueja, parecendo ter visto um fantasma.

— Ah, acho que você não viu isso acontecer, — continuo e, pela primeira
vez, ele parece realmente perdido. — Você estava errado em mexer com
Allegra, pai, mas ainda pior pensar que eu não seria capaz de saber.

— Mas... porque...

— Você sabe o que prometi a Jimenez por sua ajuda para destruí-lo? —
Eu pergunto sarcasticamente, e ele pode ver para onde isso está indo. —
Tudo o que você possui.

De repente, ele fica tenso, virando-se para me encarar, com o rosto cheio
de raiva.

— Você não vai se safar, — ele range os dentes olhando para mim, uma
veia estalando na testa.

Isto... era isso que eu queria ver.


— E se eu já fiz? — Os ponteiros do relógio se alinham e, naquele
momento, os tiros começam a chover sobre a multidão. Ou melhor, eles estão
focados em nossa seção.

Rocco, em sua fraca tentativa de escapar de sua morte, enfia sua


amante na frente de uma bala. Mas ele não consegue, pois os próximos se
enterram através dele, sangue derramando por toda parte.

Olhos para a frente, sinto uma bala entrar no meu lado, em algum lugar
no meu abdome inferior. Eu pisco a dor, mas outra bala me bate no peito, a
força me impulsionando para trás e me fazendo cair.

Não deveria ser duas balas...

Eu mal consigo me mover enquanto o sangue continua fluindo de mim


livremente, e uma névoa lenta envolve meu cérebro. Sinto Bianca ao meu
lado, pressionando a ferida, e Hastings latindo ordens ao fundo, ligando
para o 911 — a razão pela qual eu tinha me assegurado de que ele estivesse
aqui em primeiro lugar.

Mas não importa o quanto eu esteja lutando para ficar acordado, não
posso.

Pouco antes de perdê-lo, pronuncio a única coisa que importa.

— Conte... Allegra... amor, — não posso reunir mais forças para


terminar a frase, mas espero que Bianca entenda.
Porque se eu realmente morrer aqui hoje, quero que Allegra saiba que
a amava e continuarei a amá-la.

Mas então tudo desaparece.

— Você teve sorte, — o médico me diz olhando para o meu prontuário.


— As balas não atingiram nenhum órgão vital. Poderia ter sido muito pior.

Maman é uma das minhas primeiras visitantes e ela continua


lamentando o quão ruim eu parecia e como ela pensou que eu não
conseguiria. Foi-me dito que Chiara tinha vindo visitar, mas ela não ficou
muito tempo.

Ela veio para ter certeza de que estou morto?

— Qu'est ce que tu como fait, mon fils15?— Maman grita e eu estremeço.

— Estou bem maman. — Sou rápido em garantir a ela, mas como a


vejo tão preocupada, de repente tenho outra ideia.

Como todos os meus planos foram sabotados, precisarei de uma


alternativa para fazer o Marchesi pagar. Eu deduzi de minhas fontes que
Jimenez e seu filho Carlos estão mortos. Toda a sua organização está

15 O que você fez, meu filho?


morrendo, e eu já posso prever diferentes cartéis lutando pela supremacia.
Isso não vai me afetar muito, já que de alguma forma acabei com o dinheiro
de Martin e os investimentos de Jimenez. A única desvantagem é que estou
preso a um império ainda próspero.

Quanto a Marchesi... agora que Jimenez não pode mais me ajudar, terei
que pensar em outra coisa. E eu posso ter exatamente a coisa...

— Maman, preciso fazer com que todos acreditem que sou pior do que
realmente sou, — digo a ela, explicando meu raciocínio.

Se os Marchesi pensam que estou à beira da morte, eles serão rápidos


em vir para Nova York e se afirmarem como governantes de fato da família
Agosti. Eles provavelmente dirão que estão fazendo isso até Luca atingir a
maioridade, planejando matá-lo antes que isso aconteça.

O pensamento apenas estimula meu ódio ainda mais, e eu peço a


maman para entrar na casa com Luca para garantir que ninguém o toque.

Mais três pela frente. Mais três para cair. Mais três para sofrer.

O jogo está apenas começando.


PARTE III

Coisas boas acontecem para quem espera — ou permanece em coma


por cinco anos. E agora é hora de pegar meu pedaço de carne.

-Do diário de Allegra


CAPÍTULO VINTE E TRÊS

Presente,

Um sorriso tocou nos meus lábios, segurar firmemente na caneta


enquanto cruzo desleixadamente o nome de Rocco da minha lista. Meus
movimentos ainda estão um pouco tensos, mas é de se esperar depois de
passar tanto tempo não me movimentando.

— O que fez você feliz, senhorita? — Lia senta-se ao meu lado, esticando
o pescoço para olhar para a minha lista.

— Rocco está morto. — Eu digo a ela. Acabei de ver a notícia sobre isso,
e uma alegria inexplicável se formou dentro de mim.
Afinal, há justiça.

Quase cinco anos. Há quanto tempo estou definhando aqui, quase


apodrecendo nesta maldita cama e para quê? Para alguns bastardos
gananciosos acumularem ainda mais riqueza?

Meu filho tem quase cinco anos e, na última vez que o vi, ele tinha
menos de uma semana. Como qualquer coisa disso é justa?

Como uma idiota, a vida tinha que realmente bater na minha cabeça
até eu perceber nada disso é justo. O que eu considerei correto é apenas uma
pilha de porcaria. O mundo não gira em torno da justiça. Não, gira em torno
do poder. E aqueles que o possuem estabelecem o padrão de justiça.

— Oh meu Deus, — a mão de Lia vai para a boca, choque envolvendo


suas feições.

Abstenho-me de acrescentar que Enzo também se machucou, já que ela


é sua fã número um desde o momento em que acordei. Demorou muito
convencê-la antes que ela concordasse em me ajudar a fingir que ainda estou
em coma.

Por mais fraca que eu ainda seja, não posso dar ao luxo de dar a alguém
uma abertura para fazer mais mal. E antes de me mostrar eu necessito me
tornar mais forte.

Eu já comecei a fisioterapia, forçando meu corpo e empurrando-o até


seus limites, tudo para que eu possa colocar meu plano em movimento.
Olho para minha lista novamente, para os quatro nomes ainda não
riscados. Chegará a hora deles, e desta vez não mostrarei misericórdia.

É engraçado como eu julguei Enzo por seus métodos cruéis, mas o


mundo continua me provando que não posso vencer de outra maneira. Então
eu vou ter que mudar de tática também.

Eu vou me tornar a mais cruel.

Eles deveriam ter me matado quando tiveram a chance, porque agora


estou atrás de sangue. Perdi quase cinco anos da vida do meu bebê, cinco
anos que nunca voltará. E nada dói mais do que o conhecimento que ele
chama aquela cadela de mamãe.

— Você pode me ajudar, — pergunto a Lia, balançando lentamente as


pernas sobre a cama antes de me abaixar no chão. Ela segura no meu braço
enquanto eu pouso nos dois pés, um pouco trêmula, mas me mantendo em
pé.

— Eu preciso me vestir, — digo a ela, e ela franze a testa para mim.

— Mas senhorita...

— Eu preciso ir ao hospital. Ver com meus próprios olhos que ele está
de verdade morto, — eu minto para ela. O que eu realmente quero é ver
Enzo e o estado em que ele está — quem sabe, talvez eu risque um segundo
nome hoje.
— Mas... — Lia continua protestando, então eu olho bruscamente para
ela.

— Eu vou, — afirmo, meu tom é um pouco mais severo do que o


pretendido. Ela suspira profundamente, mas me ajuda a vestir algumas
roupas.

Eu já fiz pequenas viagens antes, mas não tinha ido longe demais. Tudo
estava na tentativa de recuperar alguma aparência de independência, de
me sentir viva novamente.

Organizamos minha roupa de maneira a se parecer com a de Lia. A


única maneira de entrar e sair de Sacre Coeur é fingindo ser ela.

— Tem certeza? Você sabe que eu não posso ir com você, — continua
ela, uma carranca que estraga suas feições. Como temos apenas um cartão
de identificação, apenas uma de nós pode sair ao mesmo tempo.

— Eu vou conseguir. — Eu digo quando ela desliza uma jaqueta leve


sobre meus ombros.

— Aqui, — ela me passa minha bengala, um telefone e algum dinheiro.


— Me ligue se alguma coisa acontecer.

— Não se preocupe, Lia. Não sou a mesma pessoa que era antes, —
respondo. — Eu não sou mais tão ingênua.
— É isso que eu tenho medo, senhorita, — ela sussurra, mas eu não me
importo com ela quando saio do quarto, indo para a saída.

Lia notou a mudança drástica em mim desde que acordei e ela tem sido
muito vocal sobre isso. Ela continua dizendo que eu deveria deixar o passado
para trás e aproveitar minha segunda chance na vida.

Eu digo que esses bastardos façam suas últimas orações porque não vou
parar até que todos os nomes dessa lista sejam riscados.

Lia acha que sabe o que aconteceu comigo, mas não faz ideia. Eu ainda
tenho pesadelos sobre Chiara e o que fez comigo, minha própria gêmea me
espancando até a morte.

Eu apenas coloquei Luca para dormir quando ela entrou, sua expressão
repugnantemente presunçosa enquanto ela me olhava de cima a baixo.

— Ainda uma cadela gorda, vejo, — comentou ela, um sorriso cruel se


espalhando pelo rosto. Eu tentei ser a pessoa melhor e não respondi à sua
provocação.

— O que você está fazendo aqui, Chiara? — Ela era a última pessoa que
eu esperava vir me parabenizar pelo nascimento do meu filho.

— O que mais, — ela deu alguns passos para dentro, olhando em volta,
os olhos se estreitando em Luca. Eu me coloquei na frente dele, não
querendo que ela estivesse perto do meu bebê. Prefiro morrer a ter essa
piada de um ser humano com qualquer coisa com meu precioso menino. —
Eu queria ver seu pirralho.

— Você viu. Agora você pode ir.

— É assim que você cumprimenta sua irmã? Depois tive que me casar
com Franzè por sua causa. Pelo menos você tem um gostoso. Eu tenho um
que mal conseguia levantar o pau dele. E mesmo assim eu mal senti.

— Não seja grosseira, — meu rosto estava com aversão. — Estou


surpresa que Franzè não tenha matado você, já que nós duas sabemos que
você não foi virgem para suas núpcias.

Chiara riu na minha cara. — Acho bom que ele gostou mais da minha
bunda do que da minha boceta, mas mesmo assim era como ter um dedo...

— Pelo amor de Deus, Chiara, é por isso que você veio aqui? — Eu
perguntei, exasperada.

— Não, — ela parou na minha frente, e foi como se estivesse olhando


no espelho. — Eu vim aqui para lhe dar um pequeno aviso. Sua pequena
façanha com os federais vai te matar.

Meus olhos se arregalaram de consternação.

— Como...
— Como? Imagine minha surpresa quando eu passeava casualmente
pela cidade e um certo agente especial McNaught se aproxima de mim, me
chamando de Sra. Agosti e me perguntando se eu reconsideraria sua oferta.

— Então você sabe que eu não aceitei a oferta dele, — eu disse minha
frase com cuidado, tentando fazê-la recuar.

— Sim, mas nossos pais não.

— O que você quer dizer? Você disse a eles? — Eu explodi, preocupação


me comendo.

— Eles e... — Ela fez uma pausa, satisfação preenchendo seus traços
enquanto me observava lentamente perder minha calma. — Rocco.

— O que... porque... — Eu gaguejei, de repente percebendo para onde


tudo estava indo.

— Porque, querida irmã, — ela deu um passo à frente, com o dedo no


meu peito, — você está vivendo a vida que eu deveria viver. E pretendo
remediar isso.

— Você não pode fazer isso, — eu enrolei meus dedos em volta da mão
dela, torcendo-a para longe do meu corpo. — Enzo não vai deixar você fazer
isso.
— Não vai deixar? Ele propôs toda a ideia desde então, vamos encará-
la. Eu não sou apenas mais bonita, — ela fez uma pausa, olhando para mim,
— mas também fodo melhor.

— Eu não acredito em você, — eu respondi, minha mão procurando meu


telefone. — Por que não ligamos para ele então. Ele pode confirmar como
você é uma ótima leiga, — eu decidi jogar o seu jogo, sabendo que Enzo
nunca me trairia assim.

E eu estava certa. Assim que eu corri para o telefone, Chiara deu um


pulo, me derrubando no chão. Meu corpo ainda estava se recuperando do
nascimento, então a queda foi dolorosa.

— Puta do caralho, — o soco dela foi para o meu rosto, os nós dos dedos
pegando o lado esquerdo do meu rosto. Um gemido baixo de dor havia me
escapado, e eu reuni todas as minhas forças restantes para tentar afastá-la
de mim.

Mas eu não pude.

Mais alguns socos e eu já estava tonta com a dor acumulada.

Em algum momento, ouvi Luca chorar, mas fui imobilizada no chão,


incapaz de fazer qualquer coisa.

— Luca, — eu choraminguei, ainda sob uma enxurrada de socos.


— Adivinhe quem seu maldito pirralho vai chamar de mamãe, — ela
riu de mim, me provocando ainda mais.

Olhos arregalados de medo, pele rompida e sangrando, eu tentei


revidar. Qualquer coisa para voltar ao meu bebê e segurá-lo no meu peito,
sussurrar palavras amorosas e garantir que ele estivesse seguro.

Mas assim que comecei a ganhar terreno quando devolvi seus socos, ela
parou de se segurar. Envolvendo uma mão em volta do meu decote, ela
arrastou meu corpo pelo chão até chegar a uma mesa.

Eu estava tão maltratada que apenas sons inarticulados escaparam dos


meus lábios. Ainda assim, eu tentei argumentar com ela, implorar para que
me deixasse.

Meu bebê... Luca...

Meu único pensamento foi Luca e o que aconteceria com ele quando eu
fosse embora. E assim meus olhos se voltaram para ele quando Chiara
envolveu os dedos nos meus cabelos, as unhas cavando no meu couro
cabeludo. Arrastando minha cabeça em sua direção, ela aplicou a força
máxima ao me empurrar de volta para a perna da mesa. Um lado do meu
rosto tomou o peso da força e eu me senti escorregando.

Vez após vez, ela bateu meu rosto contra a mesa até que eu sabia que
não estava mais inteira. Através de algum tipo de castigo divino, senti tudo.
Senti a pele se romper, o osso esmagando e cavando minha carne. Eu senti
o sangue derramar de mim e eu sabia naquele momento.
Eu estava morrendo.

Ela continuou até eu parar de me mover completamente, meus


membros paralisados, uma dor diferente de qualquer outra que enchesse
todo o meu ser.

— Você não é tão forte agora, — ela cuspiu em mim antes de se levantar
para fazer uma ligação.

Em um estado entre a vida e a morte, eu só podia esperar a escuridão


chegar. Pensei brevemente em Luca e Enzo, as duas pessoas que amava
mais do que qualquer coisa.

E quando eu estava morrendo, esperava encontrá-los novamente.

Mas eu não morri.

Posso ter perdido cinco anos da minha vida e da do meu bebê, mas estou
longe de estar morta. Ao contrário, estou determinada.

Pelo que Lia me disse e pelo que vi online, ficou claro que ninguém
sentiu minha falta. Chiara está em casa disfarçada e, apesar de todos os
protestos de Lia, Enzo com certeza parece confortável fodendo por toda a
cidade, até tendo a audácia de exibi-la publicamente.

Além de Luca, ele foi a primeira pessoa que eu queria ver quando
acordei. Mas quanto mais eu navegava nos eventos desses últimos cinco
anos, mais decepcionada me tornava. Vi inúmeras fotos dele com mulheres
bonitas, todas em ambientes íntimos e, às vezes, até fora de hotéis. Meu
coração teve um grande golpe quando percebi o quão rápido ele tinha sido
para me descartar.

Se eu estivesse pronta para olhar além de sua natureza brutal, nunca


conseguiria olhar além de suas infidelidades. E daí se ele não tivesse
contribuído diretamente para eu passar meia década em coma? Ele havia
habilitado as pessoas que o fizeram, e isso tornou as coisas ruins.

Não, piorou. Porque ele tinha meu coração — e ele o destruiu.

Lia tentou sugerir que ele poderia ter suas razões para fazer isso, e eu
deveria ouvi-lo primeiro. Eu recusei. Não é como se fosse a primeira vez que
ele se desviava.

No começo, eu tinha dito a mim mesma para fechar os olhos, afinal, não
estávamos em boas condições e eu não podia esperar que ele fosse fiel a uma
esposa indesejada. Mas com o passar do tempo e nosso vínculo se
aprofundou, meus sentimentos e expectativas também. Toda vez que eu
cheirava aquele perfume nele tinha sido como ser esfaqueada no coração,
violenta e repetidamente.

Foi apenas durante a minha gravidez que pensei que ele poderia
finalmente ser meu, e fiquei satisfeita com quaisquer migalhas de carinho
que me desse.
Eu tinha acabado de engarrafar tudo — a negligência, a traição, o amor
não correspondido — tudo por uma questão de harmonia e a perspectiva de
uma família. Eu tinha dado tudo de mim e ele simplesmente aceitou.

Não mais.

Minha bengala bate na calçada enquanto eu saio lentamente do táxi.


Percorro em direção à entrada do hospital, passando por um par de portas
duplas espelhadas. Eu tento ignorar meu reflexo, e a maneira como meu
rosto se sente estranho, mesmo que seja o mesmo.

Ouvi de Lia que Enzo havia contratado os melhores cirurgiões plásticos


para reconstruir meu rosto, e ele insistiu que eles se certificassem de que eu
parecesse a mesma que antes.

Embora pareça a mesma, me sinto uma pessoa completamente


diferente.

Por que ele passou por todo esse problema apenas para me trair de
novo? Era a consciência dele? Ele não queria que a mãe de seu filho
parecesse um monstro?

Preencho o formulário e confirmo minha identidade na recepção antes


de ser levada por uma enfermeira ao quarto de Enzo.

— Ele ainda está apagado da cirurgia, — ela menciona antes de me


deixar sozinha. Ela me garantiu que não havia complicações e ele estava
fora da zona de perigo.
Colocando minha bengala contra uma mesa, dou alguns passos
trêmulos até chegar à sua cama, me levando a uma cadeira próxima.

Eu percorro suas feições, inalteradas mesmo depois de todo esse tempo,


e meu coração dá um aperto doloroso.

— Por que você não poderia me amar como eu te amava, — minhas


palavras saem como um sussurro, minha voz ainda esfarrapada por não
usar, minhas cordas vocais permanentemente marcadas por terem tubos
respiratórios na garganta. — Isso tornaria tudo muito mais fácil, —
continuo, tendo a coragem de tocar sua mão na minha. Pele com pele, o
contato é sublime, um arrepio descendo pelas minhas costas quando meu
corpo se lembra dele.

Mas era tudo mentira.

Por um momento, apenas por um momento, sinto-me aliviada por saber


que ele está bem, e admito para mim mesma que estava preocupada com
ele.

Apenas um momento em que me levanto, debruçada sobre ele para


colocar meus lábios em cima dos seus em um beijo muito casto, um adeus ao
meu coração.

— É melhor você sobreviver a isso, Enzo Agosti. Porque sua morte será
por minha mão.
Pegando minha bengala na saída, entro na agitada vida da cidade de
Nova York e respiro fundo.

Allegra Agosti morreu há cinco anos. Eles não apenas mataram meu
corpo, mas meu coração, meu espírito e minha moral. Agora, sou apenas
uma concha com um propósito — recuperar meu filho.

E ninguém pode me parar.

Colocando minha bengala em um recanto do lado de fora da cerca da


casa, endireito minhas roupas, sentindo-me desconfortável com o vestido
chamativo. Meu rosto também está cheio de maquiagem na tentativa de
imitar as fotos que eu tinha visto de Chiara online.

Ela certamente não havia perdido tempo para entrar na sociedade.

Tablóides após tablóides haviam documentado suas aventuras malucas


e seus amores descartáveis, todos eles de alguma forma desculpando o fato
flagrante de que ela já é casada. Suas escapadas sexuais são tão famosas
que há até vídeos dela em sites pornográficos, com a porra da minha cara.

Por que Enzo não pôde pedir aos médicos que me dessem uma nova
cara? Pelo menos não precisaria andar por aí sabendo que Chiara destruiu
minha vida inteira.
Mantendo minha cabeça erguida, tento imitar os maneirismos de
Chiara, principalmente o jeito esnobe. Entro na casa sem fazer contato
visual com ninguém e sem reconhecer a equipe. Afinal, Chiara não se
importa com as pessoas mais baixas que ela.

Quando entro com sucesso em casa, de repente fico impressionada com


a familiaridade de tudo.

Casa... Já estive em casa.

Respirando fundo, me recuso a me deixar habitar na melancolia. Eu


tenho um propósito.

Mas enquanto vasculho a casa, percebo que não tenho ideia de onde fica
o quarto de Luca. É só quando ouço uma pequena risadinha que meu coração
se apodera e agarro esse som, seguindo-o até chegar ao segundo andar. A
porta está entreaberta e eu paro do lado de fora para espiar a sala.

Luca, meu lindo garoto, está no chão tentando construir algo com Lego.
Há mais alguém com ele, provavelmente sua governanta, e ela o está
ajudando a escolher suas peças com cuidado.

Eu levanto minha mão para a boca, abafando um soluço enquanto


assisto meu bebê, tão crescido, tão bonito. Ele se parece com Enzo, e você
mal consegue ver um traço de mim nele. Com seus cabelos escuros e seus
olhos verdes, ele é como uma boneca que ganha vida.
Lágrimas estão se acumulando no canto dos meus olhos, emoções
engarrafadas ameaçando transbordar.

Um suspiro me escapa e a governanta de Luca me nota parado na porta.

— Signora, — ela começa, seu tom não é muito agradável.

— Meu marido está no hospital. Eu vim ficar com Luca um pouco, — eu


minto entre os dentes, esperando que eu seja boa o suficiente como atriz
para fazer isso.

— Hospital? O que aconteceu? — Ela se levanta, sua expressão


preocupada.

Não é muito jovem, mas também não é muito velha, a governanta não
é ruim de se olhar. Mas sua súbita preocupação é interessante.

Meu Deus, ele também a fodeu?

Não quero insistir nessa questão, pois me forço a parecer normal.

— Houve um tiroteio. Ele está bem por enquanto. — Eu explico um


pouco, o tempo todo meus olhos se concentraram no garoto de fundo que está
me olhando curiosamente.

— Você pode fazer uma pausa para o almoço enquanto eu vou ficar com
Luca. Não demorarei muito, — assumo outro compromisso, sabendo que
Chiara nunca passaria muito tempo com uma criança.
— Eu não sei... — ela olha entre nós dois. — O Signor Enzo me disse
para sempre sentar com Luca, mesmo quando você está em casa, — continua
ela, parecendo conflituosa.

— Apenas um quarto de hora. Não vou mencionar se você não quiser,


— tento um sorriso, implorando aos deuses por um milagre.

— Acho que eu poderia fazer uma pausa para o almoço adiantado, —


ela finalmente cede e empurra a porta mais para eu entrar. — Eu voltarei
em quinze.

Apenas quinze minutos, mas serão os quinze minutos mais felizes da


minha vida.

— Oi, Luca, — digo, lutando para agachar no chão. Minhas pernas


parecem de madeira, como eu quero que dobrem adequadamente, a tensão
de andar sem bengala já me afetando.

— Oi, — diz ele em voz baixa, segurando um pequeno pedaço de Lego


no peito.

— O que você está construindo? — Eu mudo para a base que ele já


construiu.

— Uma réplica da casa, — ele responde timidamente, abaixando o


queixo para olhar em qualquer lugar, menos para mim. Ele está se
comportando como se eu fosse uma estranha...
— Luca, você sabe quem eu sou? — Eu pergunto, querendo saber
quanto torturar Chiara antes de sua morte por usurpar meu lugar tão
descaradamente... por levar meu filho.

— Sim, — ele sussurra, vermelho se espalhando do pescoço para as


bochechas. — Você é minha mamãe. Mas papai diz que não devo chamá-la
assim. — Essa pequena admissão parte meu coração.

Posso sentir pena de mim mesma por não estar lá nos primeiros anos
de vida do meu bebê, mas e ele? E o garoto que não tinha mãe? Porque tenho
certeza que Chiara é tão maternal quanto uma víbora.

— Você pode me chamar mamãe se você quiser. Será o nosso pequeno


segredo, — digo, gananciosa ao ouvir aquela palavra que eu esperava por
tanto tempo. Eu imaginei ele me chamando assim desde o momento em que
estava no meu ventre. Eu passava as noites com a mão na minha barriga,
imaginando segurando meu pequeno nos braços.

— Realmente? — Ele ainda parece inseguro, então garanto que apenas


se ele estiver confortável.

— Está bem, mamãe, — ele me dá um sorriso tímido e tento piscar as


lágrimas, falhando completamente.

— Por que você está chorando? — ele pergunta, subindo rapidamente


de seu assento e vindo em minha direção. Ele está parado na minha frente,
com as sobrancelhas pequenas balançando em confusão. — Você está triste?
Eu balanço minha cabeça. Como eu poderia explicar a ele o que esse
momento significa para mim?

— Estou feliz, — digo, sorrindo através das minhas lágrimas. — Muito,


muito feliz. E você sabe o porquê?

Ele balança a cabeça, ainda me olhando com seus grandes olhos


luminosos.

— Porque Luca, você está aqui, ao meu lado. E isso me deixa muito
feliz, — digo a ele, minhas mãos tremendo no meu colo com a necessidade
de tocá-lo, meus olhos ainda vazando como uma cachoeira.

— Mas você está chorando. — Ele franze a testa para mim. — Eu só


choro quando machuco, — afirma ele solenemente.

— Às vezes, as pessoas também choram quando estão felizes.

— Você precisa de um abraço então? Papai sempre diz que abraços


tiram a dor. Mas se você não estiver machucada... — ele deixa escapar,
visivelmente confuso.

— Eu adoraria um abraço, Luca. Se você quiser me dar um, — respondo


rapidamente, impressionada com a oportunidade à minha frente. Eu
estendo meus braços para ele me abraçar, antecipando a construção dentro
de mim.
Seus lábios se estendem em um sorriso e ele desliza sem esforço entre
meus braços, seus minúsculos braços enrolando em minha caixa torácica
enquanto ele coloca a cabeça no meu peito.

A última vez que o senti tão perto foi quando ele estava chupando meu
peito.

Fecho meus braços em volta dele, agarrando-o ao meu peito e colocando


todo o meu amor nesse abraço. Uma mão sobe, segurando a cabeça para que
eu possa dar um beijo na sua testa.

— Mamma ama você, Luca, — digo, minha voz entupida de emoção, —


muito.

Ele não responde, e estou bastante aliviada por ele não responder,
porque isso significaria que ele ama aquela mulher, e não eu.

Ele recua um pouco, com os olhos astutos me avaliando.

Finalmente cedi ao meu desejo e toquei minha mão na sua bochecha,


sentindo seu calor.

— Você é um garoto tão bom, Luca. Seu papai deve estar orgulhoso de
você. — Eu o elogio, trazendo a conversa para um tópico mais confortável.

— Ele está, — ele responde imediatamente. — Ele sempre me diz que


está orgulhoso de mim. — Pela primeira vez, Luca me dá um sorriso
completo, seus pequenos dentes brancos brilhando à luz do sol.
— Eu também tenho orgulho de você, você sabe. — Seus olhos se
arregalam de admiração, e me sinto obrigada a continuar. — Eu posso
nunca dizer isso, mas eu tenho. Você é meu querido garoto, — eu circulo
meu polegar pela bochecha dele, imprimindo esse momento na minha
memória.

Será minha âncora quando eu voltar para tudo o que eles roubaram de
mim.

— Signora, — a voz da governanta me assusta. Largo a mão de Luca e


digo um pequeno adeus.

Ele está rapidamente imerso em seus Legos novamente e nem parece


me notar saindo.

Ignorando as cãibras nas minhas pernas, seguro tudo enquanto coloco


minha melhor expressão indiferente, limpando as lágrimas do meu rosto
para garantir que não pareça estranha.

— Obrigada. Vou sair agora, — digo antes de relutantemente tirar meu


olhar de Luca e sair do quarto. Saio devagar, segurando o corrimão da
escada para evitar mais ferimentos nas minhas pernas.

O tempo todo sinto algo novo florescendo dentro do meu peito. Algo
familiar, mas estranho.

Ele me chamou de mamãe.


Ainda estou chocada, repetindo sua voz suave na minha cabeça, como
ele disse a palavra.

É tudo o que eu precisava para avançar.

Espere por mim, Luca... Mamãe está voltando.


CAPÍTULO VINTE E QUATRO

Agachando-me na frente de Luca, eu o ajudo a calçar os sapatos. O


tempo e a determinação teimosa garantiram que minhas pernas
recuperassem sua mobilidade. Sou quase tão flexível quanto era pré-coma,
e isso me deixa ainda mais feliz quando posso colocar minha liberdade física
recém-encontrada para usar com Luca.

Eu aproveitei o máximo das vezes em que pude entrar e encontrá-lo, e


há semanas Luca e sua governanta descongelaram um pouco em minha
direção. Acho que tenho sorte que Chiara esteja longe e Enzo esteja tão
ocupado com o que está fazendo ou com quem quer que esteja fodendo que
não esteja em casa durante o dia.

— Você gosta dos sapatos? — Eu pergunto a ele depois que termino de


amarrar seus cadarços. Ele espia os tênis azuis da marinha, mexendo os
dedos dentro deles. Um movimento lento de sua cabeça mostra sua
aprovação e um sorriso se espalha pelo meu rosto.

O primeiro par de sapatos que eu comprei para ele.

O primeiro de muitos.

Tentei não exagerar nas minhas demonstrações de afeto ou presentes


porque não queria confundi-lo — um minuto ele tem uma mãe descuidada,
quase inexistente, e no outro ela é obsessiva. Tem sido difícil me moderar,
quando tudo que eu quero é levá-lo comigo, longe de todas essas pessoas.

Mas eu não posso. Ainda não de qualquer maneira.

— Eles se sentem bem, — comenta ele pulando do banco, caminhando


alguns passos antes de decolar em uma corrida em direção à parte de trás
da casa.

— Ei, espere por mim, — eu chamo, divertida. Começo a correr, devagar


no começo, ganhando velocidade à medida que minhas pernas se acostumam
ao movimento.

Ele ri, um som que é como um bálsamo para o meu coração, correndo
em círculos ao redor de uma árvore.

— Você não pode me pegar mamãe, — ele olha para trás, com o cabelo
ao vento, um sorriso despreocupado no rosto.
— Me observe, — finjo indignação ao mudar de direção, correndo em
direção a ele por trás. Ele me vê e, rindo alto, consegue evitar minhas mãos
delicadas.

Ele é sorrateiro, me esquivando deslizando por meus braços e fazendo


uma curva em U para me empurrar para o chão, o alvo se tornando o
responsável por fazer cócegas.

— Luca, — eu choramingo, rindo enquanto ele tenta me torturar com


suas mãozinhas.

— É isso aí, garoto, você é meu agora, — digo a ele, minha voz
ameaçadoramente divertida. Pegando as mãos nas minhas, trago-o ao meu
peito, beijando sua testa. — Eu disse que te amo hoje?

— Hum, duas vezes, — diz ele com vergonha.

— Mais uma vez então. Eu te amoooooooo, — eu professo com uma voz


cantada, levando-o a rir um pouco mais.

— Que porra é essa? — Eu olho para cima e me deparo com as


características severas de Enzo enquanto vê a cena diante dele.

— Luca, vá para o seu quarto, — sua voz cresce e Luca se encolhe,


escavando um pouco mais perto dos meus braços.

— Você não deveria falar assim com ele, — acho minha voz, mesmo que
por dentro tenha pavor do que vai acontecer.
Eu estava tão feliz por estar perto de Luca que não tinha pensado em
tudo completamente. Como o que aconteceria se Enzo me pegasse.

— Então agora estou tendo lições de você sobre como criar meu filho?
— A voz dele está cheia de raiva e nojo e não posso deixar de tremer do
veneno que me enviou, mesmo sabendo que não sou tecnicamente o
destinatário designado.

— Luca, — afago o seu cabelo, deixando cair a voz para que ele possa
me ouvir, — faça o que seu pai diz. Brincamos mais tarde, — garanto a ele,
e seus olhos verdes se voltam para mim, olhando para mim quase
questionando, a incerteza escrita na maneira como sua testa se move para
cima e para baixo. Meu coração se parte ao pensar em trair a confiança frágil
que construímos nas últimas semanas.

— Está tudo bem, — garanto novamente, e com um aceno de cabeça ele


se levanta. Ele para brevemente na frente de seu pai e eles têm algumas
palavras antes de Luca correr em direção à casa.

— E você... — ele balança a cabeça para mim, o nariz franze, — nunca


pensei que você se rebaixasse tanto.

Agarrando meu pulso, ele me força a me levantar, me arrastando em


direção à casa.

— Onde você está me levando?


— Precisamos ter uma discussão, você e eu, e não quero que ninguém
testemunhe o que isso pode gerar, — diz ele, com a boca torcida em um
sorriso cruel. Seus dedos estão cavando na minha pele, seu domínio
descuidadamente doloroso.

— Deixe-me ir, — aperto minha mão, tentando fazê-lo me libertar, —


você está me machucando, — lamento na tentativa de imitar Chiara.

Não posso esquecer que ele pensa que eu sou minha irmã.

— E eu vou fazer muito pior, — ele menciona, e passamos pela entrada


quando ele me leva ao escritório, trancando nós dois lá dentro.

Merda! Eu preciso fazer algo sobre isso.

Uma pequena bolha de pânico entra em erupção dentro de mim


pensando em alguma maneira de sair disso. Não posso fazer com que ele
descubra sobre mim, não quando trabalhei tanto até agora para elaborar
meus planos com cuidado.

Fui tola, sei que fui, meu coração ganancioso sendo incapaz de ficar
longe de Luca. E então eu arrisquei tudo, incluindo minha vingança.

Mas porque ele é a minha razão de tudo o que estou fazendo, não posso
desistir. Em breve, ele será meu — apenas meu, e nós iremos para longe
deste lugar esquecido por Deus.
Quando entramos, Enzo me empurra para o chão, e eu mal consigo
amortecer minha queda.

— O que há de errado com você? — Eu pergunto, impressionada com


essa demonstração de crueldade. Meus olhos o acolhem, tão arrojados, mas
tão perigosos. O tique na mandíbula me diz que ele está a um segundo de
explodir.

— O que há de errado comigo? — Sua voz parece incrédula. — Eu


pensei que te disse uma vez que se eu te ver perto de Luca novamente, vou
explodir sua porra de cérebro, não é? — Ele não perde tempo desarrumando
a arma e empurrando-a entre os meus olhos.

Estou congelada no local, aterrorizada que um movimento errado leve


à minha morte prematura.

— Eu estava apenas ajudando ele. Eu pensei que ele tinha caído, e eu


tinha medo que você ficasse com raiva se algo acontecesse com ele enquanto
eu estava em casa, — eu minto, inventando a desculpa e esperando que ele
a comprasse.

— Você? Ajudando-o? — Ele zomba de mim, a arma cavando ainda mais


na minha pele. Autopreservação, tento não me concentrar no barril de aço
atualmente aninhado entre meus olhos. Em vez disso, olho-o diretamente
nos olhos, improvisando.

Pense... Aja como Chiara faria.


— Eu também posso ser humana, — eu continuo — às vezes, —
acrescento por uma boa medida. — Ele ainda é meu sangue, não é? E o
futuro desta família.

Sim é isso. Mercenária... Minha irmã é completamente mercenária.

— É mesmo? — Ele ainda não está convencido olhando para mim, com
os olhos duros e inflexíveis.

— O que eu ganho se algo acontecer com ele? — Eu brinco, esperando


estar certa e que Chiara nunca faria nada com Luca.

— De fato, — sua mão relaxa um pouco na arma, mas seus olhos ainda
estão céticos.

Fazendo mais um show, levanto minhas mãos para cima, pegando o


cinto dele.

— Eu posso te chupar se você me deixar ir, — eu desenho um tom


sedutor. Suas feições se revelam com nojo e ele rapidamente se distancia
entre nós.

— Porra, — ele amaldiçoa, — não me diga que você ficou sem pau?

Eu expiro, aliviada, a arma não está mais na minha cara. O fato de ele
estar tão claramente repelido por minha irmã de alguma forma faz meu
estômago dar um salto mortal, um prazer indesejável me enchendo por
dentro.
Não! Não posso me aquecer com ele!

— Se é tudo, — eu dou de ombros, arrumando minha camisa sobre o


jeans e me movendo para sair.

— Não, — ele chama, já se estabeleceu em seu escritório. — Mais uma


coisa, — ele começa, com os olhos me examinando de cima para baixo. —
Verifique se seus pais estão vindo para o baile. Nossa família precisa estar
unida em tempos como esses, não? — Ele pergunta sarcasticamente, e eu
apenas levanto uma sobrancelha para ele.

— O que você quiser, sua alteza, — respondo automaticamente,


fingindo uma reverência. Saindo da sala, eu quase corro para fora, a
necessidade de estar tão longe dele queimando para mim.

Por quê?

Por que ainda sou tão fraca quando se trata dele? Você pensaria que,
com todas as evidências que tenho de sua traição — evidência fotográfica —
eu ficaria um pouco mais firme em meu desdém por ele.

Há uma linha tênue entre amor e ódio.

E ainda estou oscilando naquele limite fino entre eles, incapaz de me


comprometer firmemente com os dois lados.
Eu realmente sou uma vadia patética por toda a minha vida? Só porque
ele foi o primeiro a me alimentar, eu tenho que continuar correndo de volta
para mais, mesmo quando ele bate onde dói mais?

Eu gostaria que houvesse uma resposta para isso. Uma maneira de


simplesmente desligar o amor para que eu pudesse me concentrar apenas
no ódio.

— Depressa, — digo quando eu tiro o jeans das minhas pernas para que
eu possa colocar o pijama. Lia está segurando a blusa sobre minha cabeça e
eu rapidamente deslizo minhas mãos através dela enquanto ela a puxa para
baixo.

— Ele não me disse que viria hoje, — aparece uma carranca de


consternação no rosto dela enquanto me ajuda a entrar na cama,
enganchando meu dedo na máquina e organizando coisas ao meu redor para
que tudo fique impecável.

Enzo geralmente liga para informar Lia quando esperar por ele, mas
desta vez tivemos que ouvir Fred, um dos amigos de Lia da segurança, que
acabou de lhe dar um aviso.
— Não importa, estamos bem, — digo rapidamente, sabendo que ele
chegará a qualquer momento. — Apenas acalme-se, Lia. — Eu digo e um
momento depois a porta se abre.

Aperto prontamente meus olhos, disposta a relaxar meu corpo. O sinal


sonoro do meu pulso não está ajudando quando ouço Enzo entrar.

— Você não ligou, Signor, — começa Lia, parecendo um pouco agitada.

Droga, Lia! Aja de maneira natural!

— Eu tenho um voo amanhã e queria vê-la antes de sair. — Sua voz


profunda ressoa no quarto. Privada da minha visão, só posso confiar na
minha audição e me concentro na cadência de seu tom. — Qualquer
mudança? — Ele pergunta puxando a cadeira ao meu lado, com a mão
escovando a minha.

— O mesmo de sempre, — diz Lia.

— Deixe-nos, — ele decreta, não deixando espaço para discussão. Há


algumas mudanças no quarto antes de ouvir a porta se fechar.

— Little tigress, — ele começa levantando minha mão na boca. Fico


quieta, apesar de um arrepio cair na espinha com o nome do animal de
estimação e o fato de ele estar me tocando com tanta ternura. — Está ficando
cada vez mais difícil ficar longe de você, — seus lábios roçam para frente e
para trás na parte de trás da minha mão, sua respiração quente
atormentando meus sentidos. Arrepios espalhados por toda a minha pele.
Espero que ele não perceba a mudança, ou o fato de eu tremer um pouco
toda vez que ele escova o polegar sobre o meu pulso.

Por que ele tem que ser tão sedutor? Tão magnético?

— Todo ano eu espero que seja o último e você finalmente vai acordar.
Mas... — ele faz uma pausa e um líquido escorre pela minha mão. Leva um
momento para perceber que são lágrimas, pois sons abafados acompanham
a umidade.

Ele está... chorando? Por mim?

Ele vem visitar semanalmente, mas até agora ele só falou comigo sobre
Luca — ele me contou sobre seus hobbies, como ele está realmente gostando
de suas aulas de piano e como seu primeiro pequeno show foi um sucesso.
Suas conversas nunca tocaram em nada sensível, e eu fiquei agradecida por
isso. Acima de tudo, fiquei feliz em ouvir mais sobre meu bebê, detalhes que,
de outra forma, eu nunca teria conhecido.

— Você sabe, quando pensei que sua irmã tinha matado você, eu estava
pronto para destruir cada um deles. Eu tinha minha arma carregada e não
teria hesitado em criar um banho de sangue. Pior do que qualquer coisa é
isso... — outra pausa enquanto ele respira fundo, as costas da minha mão
contra sua bochecha molhada, — se não fosse por Luca, eu também teria me
matado. — As palavras são suaves, pouco acima de um sussurro.

Meu coração para no meu peito, suas palavras me batem com tanta
força que quase ofego alto. Mas eu seguro tudo.
— Nesse momento, tudo o que vi foi vingança. Porque eles te tiraram
de mim antes que eu conseguisse mostrar o quanto você significa para mim.
— Ele aperta minha mão, sua voz quase quebrada enquanto ele continua.
— E às vezes, como hoje, me pergunto se vale a pena... E se... — A garganta
dele entope, e a minha também, quando meus olhos ficam úmidos atrás das
minhas pálpebras, — se você nunca acordar. O que vou fazer se você nunca
acordar?

— E então eu pensei em algo. Quando Luca tiver idade suficiente para


sair por conta própria, posso me juntar a você.

É preciso tudo dentro de mim para não reagir a essa afirmação, mas
quando ele começa a entrar em detalhes sobre seus planos, incluindo os
locais que ele escolheu onde podemos ficar juntos para sempre — sono
criogênico que ele chama — meu coração começa a bater fora de controle.

Os bipes no monitor refletem a mudança repentina, os sons ficam mais


curtos em intervalo.

— Tigress, — ele pergunta, sua voz pouco acima de um sussurro,


incredulidade pingando daquela palavra.

Ele deve ter notado meu batimento cardíaco também.

Droga!

Mas como eu não devo reagir quando ele está dizendo coisas assim?
— Você pode me ouvir? — a voz dele é tão suave, a sua respiração
soprando sobre a minha pele quando ele começa a beijar o meu ponto de
pulso.

Ele teve que ir para aquele lugar? Porra, está ficando um pouco quente
aqui.

Não respondo, esvaziando minha mente e tentando acalmar meu


coração errático.

— Deus, se você pode me ouvir, por favor, volte para mim. Eu farei o
que você quiser; eu juro. Eu nunca vou matar outra pessoa na minha vida,
se é isso que você quer. Podemos nos mudar para outro lugar. Qualquer
coisa, little tigress. Apenas por favor, volte para mim.

Seu grito dolorido me toca profundamente em minha alma, e não sei


como consigo mantê-lo unido. Ele continua a falar comigo sobre essa vida
perfeita que teríamos junto com Luca e outras crianças, sobre como ele
nunca mais me perturbaria.

E eu vacilo.

Há tanta sinceridade em sua voz, uma sinceridade tão emotiva que mal
me impedi de pular da cama e em seus braços.

Mas isso seria fraco.


Quantas vezes eu cedi a ele antes? Apenas para ficar desapontada de
novo e de novo?

A vida perfeita de que ele fala com tanto carinho seria apenas uma
ilusão. Uma que acabaria estilhaçando e eu ficaria como antes, espancada e
sangrando e pegando os pedaços do meu coração partido.

Essa determinação é a única coisa que ajuda a bloquear tudo, até o doce
beijo que ele dá nos meus lábios enquanto se levanta para sair.

— O que aconteceu, — Lia explode pela porta um tempo depois.

Movendo-me para uma posição de pé, limpo os olhos, ofegando o


pequeno fio de umidade que descia pelas minhas bochechas.

— O Signor parecia tão mau. Ele disse alguma coisa? O que aconteceu?
— Ela continua a sondar, mas eu apenas balanço minha cabeça.

— Nada, — aceno minha mão com desprezo. — Vamos começar a


planejar.

Enzo pode esperar.

Minha família não pode.


— Você verificou a parte de trás? — Pego a peruca na testa, ajustando
a linha do cabelo?

— Está feito, — diz Lia tirando os cachos para verificar se está seguro
no lugar.

Hoje é o baile que Enzo falou e, para minha grande surpresa, é de


máscaras. Isso significa que ninguém saberá quem eu sou, e eu posso me
misturar entre os convidados. E se o que ele disse sobre meus pais estarem
presentes estiver certo... então acho que é a oportunidade perfeita para ter
uma festa com meus progenitores.

Eu tive muitos problemas para garantir que ninguém pudesse ver


através do meu disfarce. Meu rosto inteiro está coberto de maquiagem e Lia
me ajudou a marcar uma consulta com um profissional. O maquiador me
deu uma definição de bochecha e mandíbula para que, quando finalmente
colocar minha máscara facial, não me parecerei em absoluto comigo mesma.

Feita inteiramente de renda preta, a máscara é maleável e se encaixa


perfeitamente na metade superior do meu rosto, protegendo minha
identidade. Eu também colocaria um par de lentes de contatos azuis, por
precaução.

— Se eu não soubesse que era você... — Lia deixa escapar, os olhos dela
descendo pelo meu vestido bastante escandaloso, um vestido preto de Lolita.
Um espartilho aperta minha cintura e empurra meus peitos para cima, com
a saia mal cobrindo minha bunda.
Ninguém jamais acreditaria que a velha e chata Allegra usaria algo
assim. É muito mais indicativo do guarda-roupa de Chiara. Mas para este
evento eu tenho que ser tão improvável quanto posso.

Porque não posso ter nada me incriminando.

Adicionando algumas ferramentas pequenas a uma bolsa preta


simples, me preparo para sair.

— Você tem certeza disso, senhorita? Você ainda pode recuar... deixar
para lá, — diz Lia enquanto eu vou em direção à porta. Eu sei que ela quer
dizer bem, e porque ela tem um coração tão puro, não pode compreender que
há uma necessidade fervente em minhas veias de ver a justiça feita. Acho
que nunca poderei perdoar ninguém e ainda me olhar no espelho.

Durante toda a minha vida, sofri o desprezo das pessoas pensando que
talvez houvesse algo em falta sobre mim que trouxesse o pior dos outros.
Talvez eu fosse alguém que provocasse apenas desdém. E eu estava bem em
me afastar, permanecer no meu próprio mundo e ignorar as farpas ao meu
redor. E provavelmente, se ainda fosse somente eu teria continuado assim.

Mas eles envolveram meu filho nisso, e eu nunca os perdoarei.

Ainda me lembro do momento de seu nascimento, ou dos dias em que o


segurava no peito, sussurrando palavras doces para ele e imaginando o
futuro. Pela primeira vez eu fiquei otimista sobre o meu próprio destino. Eu
estava simplesmente ansiosa para viver, ver os primeiros passos do meu
bebê ou ouvir suas primeiras palavras. Esses marcos pareciam tão fáceis na
época, tão inocentes.

Mas aqui estou eu. Cinco anos depois e eu não tenho nada disso. Eles
roubaram cinco anos da vida do meu filho e, por isso, pagarão.

— Eu vou ficar bem, — digo a ela bruscamente, sinalizando que não há


como voltar atrás.

Logo, me vejo passando pelos portões da casa e entrando na atmosfera


animada. Ao meu redor, todo mundo está usando uma máscara, alguns até
optando por fantasias completas.

Vejo piratas, fadas e vampiros.

Talvez eu pudesse ter me vestido um pouco melhor.

Faço uma rodada do salão, tomando um copo de ponche e fingindo


beber. Meus olhos estão atraindo todos que entram e saem, prontos para
agir.

Enzo certamente não poupou despesas para este baile, já que também
há uma orquestra ao vivo no canto que atualmente se prepara para iniciar
uma valsa.

— Acho que não tive o prazer, — diz uma voz suave por trás de mim.
Eu me viro um pouco, apenas para me encontrar com o olhar penetrante do
meu marido, sua máscara frágil fazendo pouco para esconder sua
identidade.

— Não, não acredito, — respondo em inglês.

Eu tinha me preparado para essa eventualidade. Como Enzo e eu só


conversamos em siciliano, seria mais fácil mascarar minha identidade dessa
maneira. Sem o conhecimento dele, meu inglês também melhorou e
ninguém mais pode tirar sarro do sotaque de camponesa.

— Por que você não me diz seu nome, linda, — o seu charme é rápido
no trabalho e sinto uma pontada no meu coração. Claro que ele é um
flertador inato.

— Que tal eu não dizer? — Eu respondo descaradamente, retornando o


flerte, — isso é tudo sobre sigilo, não é?

Esta noite nunca foi sobre Enzo, mas olhando para seus olhos
encantadores, não posso deixar de lembrar as lágrimas que ele derramou na
minha cabeceira há pouco tempo.

O riso borbulha dentro de mim quando percebo que há alguns dias ele
estava me prometendo a eternidade, e agora está aqui tentando marcar com
outra mulher.

Oh, a ironia!
E eu fui mais uma vez a garota burra que acreditava que suas palavras
doces estavam cheias de arsênico.

Talvez isso seja tudo por uma razão. Finalmente apagá-lo do meu
coração para sempre.

Ele claramente não sabe quem eu sou, então essa não seria a melhor
maneira de testar sua lealdade?

— Dance comigo, — ele não me dá tempo para reagir, pois literalmente


me tira dos pés, me levando com ele na pista de dança.

A valsa está a todo vapor, e sua mão atinge as minhas costas, me


segurando perto dele enquanto me leva para a dança. Meus braços o
rodeiam, segurando-o, tão perto e ainda tão longe.

— E se eu tivesse dito não? — Eu pergunto atrevidamente,


determinada a ver até onde está disposto a levar esse encontro.

— Você faria?

— Sim. Sou casada, entende? — Digo suavemente, minhas palavras


terminam em um triste suspiro.

— É tão ruim? Você não parece muito apegada ao seu marido, — ele me
gira uma vez antes de minha frente entrar em contato com a dele mais uma
vez, desta vez mais perto, nossos corpos alinhados perfeitamente.
Uma respiração trava na minha garganta quando a mão dele fica um
pouco mais baixa. Viro os olhos para os dele, curiosa para ver o que se
esconde em seu olhar quando ele está encantando outras mulheres e não a
sua esposa

— Ele não é muito apegado a mim, — viro a cabeça para o lado, fingindo
decepção. — Ele é um mafioso que não se importa com os meus sentimentos.

— Como alguém pode não se importar com seus sentimentos, cara?


Você é simplesmente requintada, — sinto a respiração dele logo abaixo da
minha orelha, quente, pecaminosa e convidativa.

— Diga isso a suas muitas amantes, — eu respondo ironicamente.

— Ele é um tolo, se não sabe o que tem, — seus dedos estão brincando
com os meus em uma pose que enviaria um instrutor de dança clássica em
um frenesi. Movendo-se lentamente para baixo, eles escovam meu pulso
antes de pegá-lo e trazê-lo para a boca.

— Qual seria o melhor castigo para um adúltero? Na sua opinião? —


Eu tento ignorar a maneira como minha pele reage ao seu toque ou como
meu coração se parte ao vê-lo fazer com outra todas as coisas que ele fez
comigo.

— Hmm, — ele começa, e abaixa o rosto para que quase não haja
distância entre nós. — Uma faca no coração?

Não posso evitar, pois jogo a cabeça para trás e rio. Quão apropriado.
Eu posso aceitar sua oferta. Em breve.

Mas, por enquanto, vou aproveitar essa interação.

Vamos Enzo, mate meu coração para que eu possa matar o seu.

— Exatamente, — exclamo, — imagine como ele se sentiria se eu me


envolvesse nos mesmos... assuntos. — Eu jogo a ideia para ele, querendo ver
sua reação.

— Não muito bem. Eu sei que eu não faria. Se eu tivesse alguém como
você, — ele sussurra, sua mão ainda fazendo amor com a minha, — eu me
seguraria tão forte que nunca a deixaria ir.

— É mesmo, — pergunto em tom ofegante, levantando a cabeça para


provocá-lo com os lábios próximos à bochecha e depois aos lábios. — Então
talvez eu deva fazer exatamente isso. Dê a ele um gostinho de seu próprio
remédio.

A mão nas minhas costas aperta, me trazendo junto contra ele, tão
perto que posso sentir sua crescente excitação.

— Realmente? — ele pergunta, sua voz enviando arrepios pelas minhas


costas. Há uma tensão repentina na maneira como se apega a mim e, por
um segundo, me preocupo que ele possa me quebrar.

— Diga-me, senhor, — digo com a minha voz mais inocente, — você me


foderia para que eu pudesse voltar para o meu marido?
— É isso que você quer linda? Ser fodida por um estranho só para se
vingar?

— Oh, — eu ri levemente, — é apenas o começo da vingança. Mas vai


funcionar muito bem.

Ainda me segurando, ele me leva para fora do salão e para o jardim.


Apesar de todo o burburinho lá dentro, quase não há pessoas lá fora.

Ele me apóia em um canto escuro até minhas costas baterem contra a


parede da casa.

Isso vai ajudar? Se eu tiver certeza, ele vai foder qualquer mulher?

Sim, vai. Minha mão não treme no gatilho quando eu miro em seu
coração.

— Cordeirinho, cordeirinho, com os lobos, — diz ele, com os lábios


escovando contra os meus, mas não exatamente.

— Ajoelhe-se, — ele comanda, e eu franzi a testa, olhando


questionadora para ele.

— Ajoelhe-se. Você queria ser fodida por um estranho, e você vai. Mas
fazemos do meu jeito.

Ele empurra meus ombros até eu me encontrar de joelhos na sua frente,


olhando para ele de baixo.
A sua mão cobre minha mandíbula, o dedo acariciando ao longo da
minha mandíbula.

— Você quer brincar no escuro, cordeirinho, não é? — Ele pergunta,


suas palavras não fazem muito sentido.

Suas mãos deixam meu rosto quando ele desfaz as calças, tirando o pau
duro e acariciando-o na minha frente.

Deus, eu estou realmente fazendo isso?

Eu volto, de repente enojada comigo mesma por contemplar essa


loucura, nunca pensei em deixar isso chegar até aqui.

Mas a mão dele está de volta no meu queixo, forçando-me a olhar para
ele.

— Ah, já desistiu? — ele zomba, mas o tom que ele está usando faz o
oposto, me faz querer provar que ele está errado.

Eu tiro meu rosto das suas mãos e me movo de joelhos até ficar no nível
dos olhos com o pau dele.

Nunca fizemos isso antes.

Ele nunca me deixou dar um boquete antes, e não por falta de tentativa.
Ele sempre me distraía afundando em mim ou apenas fodendo meu cérebro.
O fato de ele estar fazendo isso com outra mulher só faz o abismo no
meu peito fissurar ainda mais.

Tomando o seu pau na minha mão, mergulho minha cabeça, escovando


meus lábios contra ele, minha língua acariciando a parte de baixo.

Ele assobia, afastando-se do meu cabelo.

— Sim, cordeirinho, chupe esse pau muito bem, — ele geme quando
abro a boca para levar mais dele para dentro.

Mas isso é muito errado, porque não apenas o pau dele está na minha
boca, quase batendo na parte de trás da minha garganta, mas também me
sinto ficando molhada quando deveria ser qualquer coisa.

Usando minhas mãos, eu o acaricio para cima e para baixo enquanto


chupo a cabeça, meus lábios se envolvendo em torno de sua circunferência,
minha língua batendo nele.

— Porra! — Ele amaldiçoa, e sua mão vai para a parte de trás da minha
cabeça, me empurrando em sua direção até que seu pau me faça engasgar.

— Eu vou gozar, cordeirinho, e quero que você engula cada última gota.
Você acha que pode fazer isso por mim? — Ele pergunta, seu polegar
acariciando minha bochecha carinhosamente.
Eu aceno com a cabeça e antes que eu saiba, isso estimula seu esperma
disparar na minha boca. Eu engulo tudo e o encontro olhando para mim,
ainda massageando ternamente minha bochecha.

— Foda-se se você não é o sonho molhado de todo homem, — ele geme


e suas palavras são como um banho frio, dissipando o feitiço em que me
encontrei e me acordando com a realidade preocupante, ele está sendo mais
gentil com uma estranha do que nunca foi comigo.

Seu pau ainda pulsando na minha boca, um pensamento repentino


entra em minha mente.

Eu deveria morder. Certificar-me de que ele nunca o colocará em mais


ninguém.

Olhando sedutoramente para ele através dos meus cílios, aproveito sua
névoa pós-orgástica para envolver minha boca ao redor do eixo e levá-lo mais
fundo na minha boca antes de prender com os dentes no comprimento.

Tome isso seu filho da puta adúltero!

Ele lamenta de dor e sinto um fio de sangue na minha língua. Antes


que eu possa causar mais danos, ele está fora da minha boca e me segura
pela garganta, com os olhos brilhando perigosamente no escuro.

Eu fui longe demais?


— Um pouco com sede de sangue, não estamos? — Ele levanta uma
sobrancelha para mim.

Eu luto contra o seu domínio, mas só consigo dar um passo antes de me


encontrar encostada na parede. Enzo está nas minhas costas, com a mão
viajando pela minha coxa e pegando minha calcinha.

— Esse era o seu plano o tempo todo, um pouco selvagem? Tenha-me à


sua mercê para que você possa me fazer sangrar? — Sua respiração está
quente no meu pescoço enquanto ele rasga minha calcinha com um puxão.

Droga! Eu esqueci o quão perigoso ele pode ser.

— É por isso que você usava esse vestido frágil, não é? Isca de pau, não
é você? — Ele pergunta, sua voz esfarrapada arrastando os dedos pelas
minhas dobras encharcadas.

— Porra, você está encharcada, — eu o sinto nas minhas costas,


empurrando seu corpo para dentro de mim, seu pau ensanguentado bem
entre minhas bochechas.

— Deixe-me ir, — digo a ele, enviando meu cotovelo para o intestino.

— Você não veio para ser fodida? Eu não faço as coisas pela metade,
cordeirinho, e parece que você tem sido uma garota muito travessa.
Brincando comigo assim... Foi divertido? — Ele pergunta, um dedo se
instalando no meu clitóris.
Um gemido me escapa com a sensação.

— Seu corpo está pedindo para ser fodido neste momento. Sua boceta
está implorando pelo meu pau, não é? — ele continua, seu dedo ainda está
brincando com o meu clitóris.

— Você quer que meu pau sangrento a encha, não é pequena selvagem?
Sinta como meu sangue e esperma se misturam em sua boceta pingando, —
seus movimentos no meu clitóris aceleram e eu quase me perco. Mas mesmo
assim eu sei que não posso permitir isso, então tento me afastar, qualquer
coisa para escapar de seu domínio.

Suas mãos apertam minha cintura, seu corpo alinhado com o meu
contra a parede. Então o pau dele está cutucando a minha entrada, a cabeça
mal consegue entrar antes que eu já esteja convulsionando, minhas paredes
se fechando sobre ele.

Um impulso e ele está lá dentro, me esticando e me enchendo ao mesmo


tempo. Sinto a viscosidade do sangue associada aos meus sucos quando ele
começa a entrar e sair.

— Talvez isso não seja um castigo suficiente para você, — diz ele com
os dentes raspando a pele logo abaixo da orelha. — Talvez eu deva levar sua
bunda a seguir. — Suspiro com as palavras dele e começo a lutar. Mas não
posso fazer nada, pois ele me mantém ainda mais apertada, com os quadris
entrando e saindo de mim com mais agressão.

Deus, eu deveria odiar isso... Eu realmente deveria.


Mas meu corpo faminto está encontrando cada um de seus impulsos,
absorvendo todo prazer que ele pode me dar. Minha alma, por outro lado,
fica mais sombria.

Você está satisfeita agora, Allegra? Você tem toda a prova de que precisa
de que seu marido é um bastardo nojento — e um traidor.

Admitindo para mim mesma que sou uma bagunça patética que está
muito acima da cabeça dela, paro de lutar.

Eu apenas o deixei me foder, sentindo cada golpe de seu pau e a


maneira como ele me segura junto ao peito, enquanto seus quadris se
movem contra mim, seu pau entrando e saindo.

Quando ele finalmente encontra sua libertação em um gemido


irregular, aproveito sua guarda abaixada para empurrá-lo, endireitando
minha saia e fugindo de sua presença.

— Corra cordeirinho, corra, — sua voz zombeteira me segue quando eu


viro a esquina e entro na casa novamente. Sinto a mistura de sangue e gozo
vazando lentamente de mim e encontro um canto isolado para me limpar.

Acabei de receber provas irrefutáveis de que meu marido é um


degenerado.

Respiro fundo, tentando me acalmar.

Eu não vou chorar. Não mais.


Em vez disso, eu me coloco contra qualquer emoção. E por alguma sorte
desconhecida, quando volto para a festa, vislumbro minha mãe.

E ela também está facilitando meu trabalho enquanto vai para o


banheiro. Acho que agora não preciso tentar deixá-la sozinha.

Eu sigo trás, meus passos me aproximando do meu objetivo da noite.


Ela entra no banheiro e eu pego a porta, trancando-a atrás de mim.

Ela está em um box fazendo seus negócios, então eu me apoio no balcão,


olhando para o espelho, nos olhos estranhos olhando para mim.

A porta da cabine se abre com um clique e ela vem à pia para lavar as
mãos. Eu vejo do canto dos meus olhos enquanto ela parece tão
despreocupada, tão blasé enquanto sua filha lutava entre a vida e a morte
nos últimos anos.

Como ela é mãe?

Ela sai e eu finalmente falo.

— Você não me reconheceu mamãe? — Imito a voz aguda de Chiara.

— Oh meu Deus, você me assustou. — Ela se vira, me avaliando. Ela


estreita os olhos para mim antes de quebrar um sorriso. — Agora isso é uma
fantasia. Eu não sabia dizer que era você, — ela vem, a mão dela se movendo
sobre o meu rosto carinhosamente.
Ela nunca me tocou tão ternamente antes.

Estou imóvel enquanto a vejo exibindo tanto cuidado pela primeira vez.
Ela ainda está alheia à minha identidade, seus dedos se movendo ao redor
do meu corpo enquanto ela tenta consertar minhas roupas.

Como uma mãe deveria.

— Com quem você dormiu agora? — ela pergunta, seus olhos seguindo
pelas minhas pernas, onde a grama ainda está impressa nos meus joelhos.
— Eu disse para você diminuir. Não queremos que as pessoas duvidem da
paternidade de Luca quando finalmente nos livrarmos de Enzo, — diz ela,
com a voz levemente repreendedora, mas cheia de indulgência amorosa.

— Eu estava pensando em minha irmã hoje à noite, — eu viro a


conversa para um território desconfortável, precisando ver sua reação. Suas
feições mudam imediatamente e seu sorriso amoroso anterior agora está
cheio de malícia.

— Não! — O tom dela é nítido. — Lembre-se, você nunca teve uma irmã,
— continua ela, suas palavras perversas me doendo ainda mais.

— Talvez ela não tivesse que morrer, — continuo investigando,


querendo que sua feiúra saia.

— Chiara! — Ela exclama, dando um passo atrás, sua expressão


indignada. — O que aconteceu com você? Ela nunca fez parte da família! Ela
era apenas alguém que poderíamos usar e descartar. Deixe isso afundar na
sua cabeça. Ela era um meio para atingir um fim. — Ela ri. — Certamente
nos deu tudo isso, — ela balança a mão.

— Desculpa, mamãe, estou um pouco introspectiva hoje à noite. Somos


gêmeas idênticas... Eu estava pensando que poderia ter sido facilmente eu
quem era o pária e ela sua amada filha.

Suas mãos agarram meus ombros e seu olhar encontra o meu. Vejo
determinação e uma convicção inabalável.

— Não, querida. Ela nunca poderia ter tomado o seu lugar. Eu sabia
desde o momento em que vocês duas vieram ao mundo que meu coração só
podia amar uma filha. Você era tão preciosa... — Ela suspira, — você me
levou imediatamente, me abraçando e oferecendo seu amor incondicional.
Sua irmã, — suas narinas se erguem, os olhos se estreitam, — além do fato
de que ela quase me fez sangrar, ela também teve a audácia de chorar
sempre que eu tentava tocá-la. Ela me odiou desde o início. Minha nonna
tinha me avisado que ela era azar e comecei a ver o quão ruim ela era.

— Você é tudo o que um pai poderia querer, minha querida Chiara, —


ela me pega em seus braços, me dando meu primeiro abraço parental.

Sou estranhamente indiferente ao perceber que o que mais ansiava não


passava de uma ilusão. Por que eu sempre desejei o carinho dessa mulher?
Olho para ela e quase sinto vergonha de ter feito qualquer coisa para obter
sua aprovação, incluindo me entregar como um cordeiro sacrificial a Franzè.

Pelo menos agora terei uma consciência limpa.


— Obrigada, mamãe, — eu digo, deixando-a ter um momento para
absorver essa interação antes de estourar sua bolha.

Ela se vira para o espelho para arrumar o cabelo, o tempo todo falando
sobre algumas bobagens da moda. Movendo-se atrás dela, minhas mãos já
estão enluvadas e minha pequena bolsa tem todas as ferramentas
necessárias para tornar essa experiência inesquecível.

Deixando minha mão na parte de trás da cabeça, simplesmente aplico


pressão suficiente para que um segundo ela esteja ereta e olhando no
espelho, no próximo o rosto dela faça contato com a borda do balcão.

A música é alta e está tocando por toda a casa. Mas mesmo assim o
barulho de osso contra mármore faz um baque retumbante.

— O que... — ela gagueja.

— Oh, mãe querida, mas eu esqueci de lhe contar um detalhe. Eu não


sou Chiara, — sussurro em seus cabelos e observo o espelho para a mudança
em sua expressão, autoconfiança se transformando em medo.

— Você não pode... você está morta, — ela continua repetindo, com os
olhos arregalados.

— Eu me sinto muito viva, — digo com um encolher de ombros,


provando meu ponto de vista batendo a cabeça contra o mármore
novamente.
— Como... como você pôde... — a sua voz já está quebrada e cheia de
dor. Sei muito bem porque também tive meu rosto esmagado contra uma
superfície dura. — Eu sou sua mãe! — Ela grita.

— Minha mãe? — Eu bufo, meus dedos apertando seus cabelos. — O


título de mãe não é apenas de nascimento, — eu ri dela, uma tempestade
violenta se formando dentro de mim, — tem que ser conquistada. O que você
fez para eu te chamar de mãe? Me vendeu? Me matou?

Ela choraminga, as mãos se movendo loucamente ao seu lado, tentando


me agarrar.

Mudando de tática, eu a arrasto para um dos boxes, ainda a segurando


pelos cabelos. O rosto dela está sangrando um pouco, mas este é apenas o
começo.

Empurrando a cabeça no fundo do vaso sanitário, eu me deleito com os


sons de asfixia, levantando-a apenas para ver a expressão aterrorizada em
seu rosto.

— Obrigada por esclarecer o que eu sempre quis saber, — acrescento,


chutando-a nas costelas quando ela começa a se mover. — Mas ainda não é
suficiente. Como você acha que uma criança se sente quando as pessoas que
deveriam tê-la amado acabaram odiando-a? Você já me poupou um
pensamento? Não, vejo no seu rosto que você não fez. Você me desprezou
tanto que imediatamente assinou minha morte. Para quê? Dinheiro? Fama?
Dar o centro das atenções a Chiara?
Eu a submerso na água até que bolhas estejam surgindo na superfície,
me dizendo que ela já está sufocando.

Agarrando-a pela nuca, eu a apoio contra a parede, estudando-a.

— Você... você é um monstro, — ela grita comigo, puro terror em seu


olhar.

— Vamos lá, não seja hipócrita! — Eu reviro os olhos para ela. — Você
não pode criar o monstro e depois reclamar quando ele é solto.

Removendo uma faca pequena da minha bolsa, eu a arrasto pelo rosto


dela.

— Você sabe o que sua querida filha fez comigo? — Eu pergunto e ela
engole, engolindo com força. — Ela me desfigurou. Você pode imaginar como
é ter a carne do rosto pendurada, a dor tão surpreendente que você mal
consegue se mover?

Minhas palavras a acordam e ela começa a lutar novamente. Uma mão


segurando sua garganta, eu seguro a faca com força e corto cuidadosamente
um contorno ao redor do rosto. Ela grita de dor; as pernas chutando debaixo
de mim.

Aplicando mais pressão, continuo cortando sob a pele, tirando retalhos


de carne e destacando-os do músculo. Sua expressão está presa em um grito
perpétuo, sua boca aberta na forma de um O.
Ela deveria ter desmaiado da dor.

Sentindo o pulso raso com a mão, volto a cortar a carne até que toda a
pele seja separada do rosto.

Mutilada assim, ela quase parece humana. Eu nem estou com nojo
quando tomo a vermelhidão de seus músculos e carne, o sangue lentamente
se acumulando em seu rosto.

A feiúra interior agora é a feiúra aqui fora.

Tomando a carne frágil, coloco-a na mão direita. Então eu envolto a


outra mão em volta da lâmina, trazendo-a lentamente até a garganta.
Apertando os dedos na faca, eu enfio o ponto afiado em sua pele. Filetes de
sangue começam a sair lentamente da ferida.

Dou um passo atrás, querendo evitar os jatos de sangue quando a


pressão na ferida diminui.

— Outro, — murmuro para mim mesma, aproveitando um momento


para me vingar.
CAPÍTULO VINTE E CINCO

Cruzando meus braços no meu peito, assisto enquanto carregam


Cristina em uma maca e saem do banheiro.

Quantas pessoas mais têm que morrer sob o meu teto?

Eu a tinha visto antes que os limpadores chegassem ao local e, apesar


de toda a tristeza da cena, não podia ter pena dela.

Allegra, Allegra, o que vou fazer com você?

Eu estava ficando desconfiado há um tempo agora, e no momento em


que a peguei com Luca, exibindo uma expressão tão despreocupada, tão
diferente de Chiara, eu sabia que algo estava errado. Eu tentei empurrá-la
para ver até onde ela levaria o ardil, mas ela manteve a cabeça erguida e
mal vacilou em seu ato.

Minhas suspeitas foram confirmadas mais tarde no hospital quando vi


como o coração dela reagiu às minhas declarações. Embora tudo o que eu
disse fosse verdade, eu também escolhi minhas palavras com cuidado para
obter uma resposta dela.

Eu levei Lia de lado alguns dias depois e consegui tirar a verdade dela.
Allegra estava acordada e bem, mas também queria se vingar. E eu era um
dos alvos dela. Ela também me informou de seus planos para o baile, então
eu fui junto com o seu ato.

Se ela quer se vingar, então ela vai conseguir. Eu disse que faria
qualquer coisa por ela e se é isso que ela mais deseja, então será dela.

Dizer que estou com o coração partido, no entanto, é um eufemismo.


Segurando-a em meus braços e vendo o desdém em seus olhos, do jeito que
ela falou sobre o marido apaixonado dela, me fez duvidar de tudo o que fiz
até este momento.

Eu tomei a decisão certa?

Mas quando ela começou a falar sobre foder outro homem, eu


simplesmente quebrei. Eu queria deixar minha marca nela de tal maneira
que nunca consideraria deixar outro tocá-la.

Droga!
Eu estraguei tudo porque não conseguia tirar minhas mãos dela. Cinco
anos e nunca senti o desejo antes, mas um minuto com as mãos na sua pele,
meu pau na boca e eu explodi — primitivo animalesco e adoração obsessiva
me enchendo de uma necessidade de marcá-la novamente.

Eu provavelmente teria parado com isso também, já que não tinha


planejado transar com ela. Aquela pequena selvagem, eu deveria saber que
ela nunca recuaria sem lutar, especialmente porque acha que eu a traí.

No momento em que ela mordeu meu pau... Deus, mesmo agora a dor
me faz estremecer. É como se eu tivesse perdido. Um momento eu tinha sido
equilibrado, então no outro eu queria transar com ela sangrando.

Porra, inferno!

Perdi a cabeça e fui longe demais. E agora ela provavelmente me odeia


ainda mais.

Meus punhos se apertam de frustração quando percebo o quanto


estraguei tudo.

Eu ensaiei tantas vezes as coisas que diria a ela quando acordasse,


variando de desculpas profusas a promessas de amor eterno. Todos eles me
envolveram ajoelhando-me na frente dela e pedindo perdão, e o que eu fiz?
Eu a fiz ajoelhar-se para mim.

Eu sou um idiota.
Acho seguro dizer que deixei minha outra cabeça pensar por um bom
minuto.

Vendo os extremos que ela fez para se vingar, fica claro que um pedido
de desculpas não será suficiente, não importa quanto tempo eu gaste de
joelhos. Não, eu vou ter que me vingar, e espero que talvez ela tenha isso
em seu coração para me poupar.

Neste ponto... duvidoso.

Com os faxineiros ocupados em seu trabalho, Chiara finalmente desce


as escadas, parecendo tão desgrenhada como sempre.

— O que aconteceu? — Ela estreita os olhos para os homens que


carregam sua mãe.

Eu encolho os ombros, não com vontade de lidar com os teatros dela.


Seguindo o caminho de como ela reagiu à morte de Martin, não quero outra
sessão de histeria na minha mão.

— Você pode querer checar, — eu inclino minha cabeça em direção ao


corpo. — Parece que sua mãe levou o baile de máscaras para outro nível, —
digo antes de passar por ela para subir as escadas. Ela concentra os olhos
em mim, mas não comenta quando desce.

Estou quase no topo da escada quando os gritos começam. Balançando


a cabeça, vou para o quarto de Luca, pegando-o nos braços e finalmente
deixando os sentimentos de alegria se espalharem por mim.
— Em breve, sua mamãe estará de volta. — Eu sussurro em seus
cabelos, sabendo muito bem que quando ela o fizer, terei que rastejar até
suas boas graças.

Infelizmente, coisas boas vêm para quem trabalha duro.

E não pouparei esforços para garantir que minha little tigress mereça
seus felizes para sempre. Mesmo que isso signifique ajudá-la a conduzir uma
adaga pelo meu coração.

— Eu a peguei, Lia não se preocupe. — Eu digo a ela e desligo.

Estaciono meu carro nos arredores do condomínio de Leonardo. Meu


painel de controle inteiro é composto de telas mostrando todos os ângulos de
sua casa.

Eu disse que a vingaria, e é exatamente isso que estou fazendo.

Eu tenho estado em constante contato com Lia, seguindo todos os


passos de Allegra e acompanhando sua trama. Logo ficou muito claro o que
ela quer — fazer seus pais sentirem exatamente o que ela sentiu quando
estava à beira da morte.
Sua mãe conheceu sua morte sem o rosto, e agora seu pai morrerá preso
dentro de seu corpo, incapaz de se mover, mas ainda consciente o suficiente
do que está acontecendo ao seu redor.

Enquanto eu fazia qualquer coisa pela minha little tigress, também me


preocupo com as repercussões de suas ações em sua alma.

Eu nasci neste mundo, então nunca fui um estranho para o lado


violento dele. Enquanto Allegra crescera em total negligência, ela nunca
tinha visto o lado feio do mundo até... eu. Suas ações drásticas e sede de
sangue repentina são compreensíveis, mas o que acontece quando tudo é
dito e feito?

Ela não ficará mais feliz.

Sou hipócrita por dizer isso, já que estou no mesmo caminho de


vingança há anos. Mas a diferença entre nós é que eu posso carregar esse
fardo comigo. Afinal, eu já matei meu pai e minha mãe.

Ela?

Ela nunca matou uma alma antes. Então, como ela está racionalizando
matar seus parentes de sangue?

Minha little tigress, apesar de toda a sua bravata e garras afiadas, não
passa de uma alma pura, uma que foi encurralada sem escapatória. Eu
posso entender sua posição, mas também me preocupo que ela não seja a
mesma.
Minha cabeça se sacode quando vejo uma parada de táxi em frente ao
prédio, Allegra saindo do carro. Ela está vestida como Chiara, seu vestido
um pouco curto demais; os saltos estão um pouco altos demais e ela tem
dificuldade em andar neles enquanto atravessa a calçada e entra no prédio.

Sem o conhecimento dela, eu escolhi a data, o local e lhe forneci a


munição para cumprir sua morte.

Agora eu só tenho que assistir, pronto para intervir se as coisas ficarem


fora de controle. Embora pelo que ouvi sobre a morte de Cristina, eu diria
que minha garota já descobriu tudo.

Não deveria me deixar tão satisfeito em ver minha little tigress querer
sangue, tão pronta para acabar com uma vida, mas foda-se se não é quente.
Eu gemo alto com o pensamento, imagens dela sendo manchada com o
sangue de seus inimigos e eu transando com ela, nossos fluidos corporais se
fundindo em uma mistura sublime de luxúria e selvageria.

Porra! Eu já estou duro.

Preciso me controlar, pois não estou assumindo riscos com minha


garota.

Voltando aos monitores, observo Allegra entrar cuidadosamente na


casa de seu pai.
Eu tenho vigiado Leonardo e Cristina desde que eles apareceram em
Nova York, convencidos de que eu morreria e pronto para tomar posse do
império.

E essa convicção garantiu que eles haviam rasgado seus recursos com
a velocidade da luz. Eles nem haviam se estabelecido bem antes do início
dos gastos.

Leonardo com suas escoltas de alta classe, bebidas e jogos de pôquer e


Cristina com sua alta costura e jóias caras.

Alguns meses e já milhões pelo ralo.

Leonardo a recebe em sua sala de estar, deixando de lado seu copo meio
vazio de álcool. Eles começam a falar, então eu aumento o volume.

— Você não disse que estava vindo, — ele se coloca no sofá, uma
expressão entediada no rosto.

Allegra logo perceberá que seu pai se foi um pouco demais, e duvido que
o que ela tenha em mente seja tão eficaz quanto ela imagina. Afinal, Leo
está acostumado a estar em um estupor bêbado o tempo todo.

— Deveríamos estar aqui um para o outro papai, — ela diz, imitando


perfeitamente o tom mais alto de Chiara. — Mamma acabou de morrer e
você está aqui sentindo pena de si mesmo, — continua ela, pegando duas
garrafas de álcool da mesa na frente dela e depositando-as em uma gaveta.
— Eu sei que você está sofrendo, — ela começa, mas Leo apenas ri.

— Sofrendo? Eu? Fico feliz que a cadela se foi. Bom Deus, nunca pensei
que me livraria dela... e tão fácil. Quem a matou recebe meus
agradecimentos, — ele responde presunçosamente, adquirindo outra
garrafa de rum por trás do sofá.

— Papai, — Allegra exclama em choque fingido, — como você pode dizer


isso?

— Essa cadela estava ansiando para me pegar. — Ele balança a cabeça,


pegando o pescoço da garrafa e derrubando-o por um longo gole, — ela
conhecia nosso segredo.

Allegra franze a testa, e eu também. Que segredo?

— O que você quer dizer? — Ela pergunta, acrescentando, — como? —


para mascarar o fato de que ela não tem ideia do que ele está falando.

Little tigress inteligente.

— Fiquei bêbado demais, — ele encolhe os ombros, tomando mais um


gole, — e acabei dizendo a ela que tirei sua virgindade no seu décimo quarto
aniversário. — Ele solta um longo suspiro, mas Allegra está apenas olhando
para ele horrorizada, sua máscara escorregando por um bom segundo.

— Você disse? — Ela tenta jogar, rindo nervosamente.


Que porra é essa?

Eu sempre soube que Leonardo era um imoral da pior ordem, mas isso...
Eu quase sinto muito por Chiara. Mas então me lembro do que ela tem feito
nos últimos anos e balancei a cabeça. Ela é tão ruim quanto ele.

— Tentei explicar a ela que estava bêbado, — continua ele, e reviro os


olhos para sua explicação, — e que você veio dormir comigo uma noite e as
coisas aconteceram... Nós dois sabemos que eu não te forcei. — Seus olhos
pousam nela, buscando sua aprovação.

— Claro, — ela responde imediatamente. — Isso aconteceu, — sua


expressão ainda está chocada, mesmo que tente se apegar à personalidade
de Chiara, à maneira como seus olhos se arregalam um pouco ou como sua
boca se enrola levemente ao virar de lado.

Para mim pelo menos.

— Exatamente, mas então ela teve que arruinar minha noite, irritante
e inconveniente, perguntando se isso aconteceu mais de uma vez e todo essa
besteira. Francamente, estou tão aliviado por me livrar da boca dela. Ainda
está me dando pesadelos, — acrescenta ele com um estremecimento falso.

— E o que você disse a ela, — sonda Allegra, colocando alguma


distância entre eles.

— A verdade. Que isso aconteceu apenas mais algumas vezes, mas


apenas quando estávamos bêbados. Quero dizer, vamos ser sinceros, você
não é muito exigente quando se trata de quem você fode e eu também não.
— Ele balança a cabeça, como se fosse tão simples.

— Ela não entendeu.

— Não! Ela começou a dizer o quão errado era e que, se eu quisesse,


poderia ter fodido Allegra. Mas então, eu lembrei a ela que ainda
precisávamos dela intacta para o casamento.

Meus punhos já estão cerrados de fúria quando ouço Leonardo falando


tão descaradamente sobre foder sua própria filha. Pelo amor de Deus, o que
há de errado com esta família?

— Você teria? — Allegra fala depois de uma pausa, seu rosto levemente
enrugado de nojo. Não quero nada além de entrar lá, segurá-la no meu peito
e garantir que ninguém nunca mais a tocará.

— Nah, — Leo acena com a mão, os cantos da boca se abaixando. — Ela


é muito peixe frio. Você, por outro lado, — o olhar dele viaja pelo seu corpo
de uma maneira que os cabelos do meu braço se levantam.

Não ouse, porra!

Mas Allegra está determinada a se mudar para a morte dela, e eu


assisto frustrado quando ela se aproxima dele, sua mão já está escondendo
a agulha. Ela dá um abraço, as mãos de Leo vagando lascivamente por suas
costas.
Leva tudo em mim para não correr lá e tirá-lo dela, mas preciso confiar
nela.

A sua mão desce sobre o pescoço dele, enfiando a agulha profundamente


na pele e esvaziando o conteúdo da seringa no corpo.

Ele rapidamente a empurra para o lado, com os olhos arregalados em


choque.

— O que... — ele só consegue dizer uma palavra quando seu corpo


começa a se espalhar. Ele cai do sofá na tentativa de alcançar Allegra e,
segundo após segundo, seus músculos começam a falhar.

Como Allegra queria que eles sentissem o que sentira quando morria,
sugeri a Lia que ela usasse uma neurotoxina com efeito rápido. Eu tinha
adquirido a toxina para ela, e agora ela pode assistir o pai enquanto ele dá
o último suspiro, sabendo exatamente como é estar preso em seu próprio
corpo, apenas esperando sua morte.

— Você é ainda mais doente do que eu imaginava, — ela move a mesa


para o lado para ter melhor acesso ao corpo de Leonardo.

Parando, ela diz algo em seu ouvido, e seus olhos se arregalam um


pouco — o máximo que ele pode se mover no momento — antes de se
levantar e esvaziar a bolsa ao lado dele.

Facas de todos os tamanhos e formas caem no chão, e eu tenho que


ampliar para ver o que ela planejou.
Tomando uma lâmina de tamanho médio, ela abre a camisa dele,
jogando o material para o lado.

Minha little tigress ostenta uma expressão que eu nunca vi antes em


seu rosto, é como se ela estivesse presa entre um vazio e um dilúvio de
emoção, ambos em uma batalha perpétua por domínio total.

Parece vitória quando ela empurra a lâmina em sua pele, bem debaixo
das clavículas. Um movimento em zigue-zague e ela posiciona a faca no
centro do peito, uma linha reta tomando forma enquanto ela a empurra mais
fundo na carne dele, arrastando-a até atingir o umbigo.

— Eu deveria avisar você, — ela inclina a cabeça para ele, — eu não


sou médica.

Juro que poderia beijá-la neste momento.

Eu enfio minhas mãos nas calças enquanto a vejo escolher entre as


diferentes facas, estabelecendo-se em uma grande lâmina de açougueiro.

Porra!

Eu pensei que não poderia me sentir mais atraído por ela, mas neste
momento, quando ela enfia a lâmina contra o esterno de seu pai, eu quase
gozo nas minhas calças. Não preciso de mais incentivo ao abrir meus botões,
me acariciando da base à ponta.
As duas mãos estão enroladas no cabo da faca, e ela a levanta sobre a
cabeça, ganhando força, antes de esmagar as costelas com a força que puder
reunir. Ela continua esfaqueando, sangue, pele e osso pulando e espalhando
ao seu redor.

Não sei se seu pai ainda está vivo, provavelmente não, mas ela não
para. Ela concentra toda a sua raiva no corpo até que quase não haja mais
nada reconhecível dele.

Limpando a mistura de suor e sangue da testa, ela suspira


profundamente, e fecho meus olhos em um gemido enquanto me aperto
firmemente, a visão de sua boca se separando um pouco, sangue na pele
dela, e crueldade em seu rosto me fazendo ficar tão duro que começo a ver
estrelas.

Porra. Ela me pegou pelas bolas.

Não há outra explicação para isso. É como se meu pau fosse propriedade
pessoal dela porque somente reage a ela. Pelo amor de Deus, passei os
últimos cinco anos me masturbando em fotos e vídeos dela.

Pego um guardanapo para me limpar, meus olhos ainda estão no feed


de vídeo. Ela também está limpando, descaradamente tomando banho no
apartamento dele para se livrar dos detritos. Quando vejo a água escorrendo
por sua pele nua, sinto-me crescendo novamente.

Confirmado.
Simplesmente não há lado dela que eu não ame. Nem mesmo a parte
assassina que agora temos estranhamente em comum.

Quando ela termina, silenciosamente veste um par de roupas limpas,


ensacando as evidências e levando-as com ela.

Boa menina.

Mas não é exatamente necessário, pois terei alguém limpando o local


depois que ela se for.

Ela sai do prédio com um sorriso no rosto, e é como ver a velha Allegra
novamente.

— Tem certeza que você está bem, cara? — Eu tiro o cabelo do rosto da
minha irmã. Ela está amontoada sob os cobertores em um dos quartos
porque não queria incomodar a filha que está dormindo em seu antigo
quarto.

— Sim. Estou um pouco decepcionada por ele não me deixar entrar, —


diz Lina quando ela se aproxima de mim, permitindo que eu a abrace.

— Vai levar tempo. Há fodido e depois há Marcello. Eu nem sei como


ele permaneceu são até agora
Em uma estranha reviravolta, o irmão de Marcello, Valentino, atirou
em Jimenez antes de se matar. E depois de dez anos de ausência na família,
Marcello decidiu voltar como Capo e me procurou para uma aliança.

Agora, sabendo como são os Lastra, particularmente conhecendo a


reputação de Marcello no passado, eu relutava em dar a mão de Lina em
casamento. Mas algumas complicações no Sacre Coeur forçaram minha
mão, e eu tive que tomar uma decisão rápida.

— Prometi que esperaria por ele, — ela sussurra, respirando fundo


para evitar chorar novamente.

Segundo Catalina, Marcello não é tão ruim. Mas, novamente, ela está
apaixonada por ele, então não posso confiar exatamente no seu julgamento.

— Tudo vai ficar bem. Caso contrário, você sempre tem uma casa aqui
comigo e com Luca.

Se não bastasse que o passado de Marcello estivesse encharcado de


pecado, seus inimigos também teriam que atacar Lina. Eu fiquei louco de
preocupação quando percebi que ela havia sido sequestrada por um louco, e
estou feliz por termos chegado lá a tempo antes que algo acontecesse com
ela.

Mas imagine minha surpresa quando Lina me contou quem orquestrou


seu sequestro.

Porra, Chiara.
Aparentemente, a cadela louca havia colocado na cabeça que a razão
pela qual eu sempre a rejeitei era por causa de Lina. Como estou visitando
Allegra semanalmente no Sacre Coeur, posso ver por que, em sua mente
distorcida, pensou que estou apaixonada por minha própria irmã.

Francamente, depois de ouvir a confissão de seu pai, muitas coisas


estão começando a fazer sentido, como sua obsessão por homens velhos. E
desta vez, ela foi e fodeu o tio de Marcello.

Enquanto meu pai estava vivo, ele tinha uma regra para ela — foder
quem quer que seja, mas nunca um conflito de interesses, como uma
famiglia concorrente.

Parece que agora ela realmente ficou desonesta. E eu mal posso esperar
para me livrar dela de uma vez por todas.

— Não se preocupe comigo, Enzo. Estou bem, sério. Eu só queria estar


ao lado dele... Ele está sozinho... sofrendo, — ela funga e eu a puxo para
mais perto.

— Ele pode cuidar de si mesmo. Por que você não se concentra em você?
Você é livre para fazer o que quiser, Lina. Não deixe Marcello, ou alguém
limitar seu potencial.

— Você está certo... Eu deveria, — ela inala profundamente, com os


olhos se fechando. — Obrigada, — ela murmura com sono.
Beijando sua testa, fecho a porta atrás de mim, checando as crianças
antes de ir para o meu próprio quarto.

Chiara deve ter percebido que estragou tudo porque está desaparecida
desde então.

Mas estou esperando. E logo ela seguirá seus pais até o túmulo.

É tarde da noite quando a vejo entrando furtivamente dentro de casa.


Ela acha que está sendo astuta, mas eu estive esperando por ela o tempo
todo. Saio do meu quarto e entro no corredor, ouvindo seus passos enquanto
ela saqueia a casa por objetos de valor. Ela deve ter ficado sem dinheiro se
estiver tão desesperada para vir aqui.

Eu a observo de perto enquanto ela pilha o que pode, enchendo uma


bolsa com ela.

— Encontrou o que você está procurando? — Eu finalmente falo e ela


se assusta, largando a bolsa com um baque. Seus olhos se arregalam de
medo e ela recua.

Ando vagarosamente em sua direção, chutando a bolsa de lado.

Mas como eu a vejo melhor na luz, seu rosto é tão parecido com o de
Allegra, mas tão diferente que não posso deixar de estalar. Ela está com
medo, e uma névoa vermelha cobre meus olhos quando olho para sua forma
lamentável. Ela deve ter notado a mudança em mim, porque agora está
encolhida no canto, tentando manter uma distância entre nós.

Em dois passos, eu a tenho pela garganta, espremendo a vida dela.


Seria tão fácil. Um pouco mais de pressão e eu a quebraria.

— O que você fez? — Eu pergunto a ela através dos dentes cerrados. Eu


já sei a merda que ela puxou, mas quero ouvi-la de seus próprios lábios.

— Não posso... respirar... — Ela chia, e eu sinto vontade de apertar


mais forte. Finalmente tirar a sua vida.

— Conte-me. O que. Você. Fez? — Eu enuncio cada palavra, afrouxando


meu domínio por tempo suficiente para que me responda.

— Ela mereceu, — ela chia e eu a bato contra a parede. Ela choraminga


de dor, mas sua expressão não muda. É uma mistura de desafio e malícia
que me deixa enjoado.

Como eu poderia viver com ela por tanto tempo?

— Você está morta. Você sabe disso, não é? — O canto do meu lábio se
enrola em escárnio. Ela está morta há muito tempo. Acabei de ganhar meu
tempo.

— Você... não pode. — Ela gagueja.


— Sério? — Eu pergunto ironicamente, e meus dedos cavam na pele,
parando o seu fluxo de ar.

— Papai? — Uma voz minúscula me impede de fazer meu caminho e


matá-la.

Eu me viro e assisto com horror quando meu filho entra na sala, com o
rosto cheio de preocupação.

— O que você está fazendo com a mamãe?

Eu a solto imediatamente, e ela cambaleia de pé.

— Sua mãe e eu estávamos apenas tendo uma conversa adulta. — Eu


explico para ele, olhando para ela para ficar de boca fechada.

Ela foi salva agora.

Mas não por muito tempo.

— Por que você não vai para a cama, Luca? Eu vou ler uma história em
alguns minutos. — Eu o enxoto para fora da sala e, felizmente, ele ouve.

Quando ele está fora de vista, eu volto para encará-la, a desgraça da


minha existência.

Ela luta para se levantar e ri de mim.


— Não pode me matar, você pode? O que você dirá ao seu filho? — Ela
tem um olhar presunçoso no rosto, convencida de que Luca a salvaria.

Oh, como ela está errada.

— A verdade. — Eu dou alguns passos em direção a ela. — Que a mãe


dele era uma prostituta e uma traidora. — Eu minto. Ah, acho que ela
nunca descobriu que eu sei quem ela é de verdade.

Sua confiança desaparece e ela instintivamente cai, sua bunda batendo


no chão com um baque alto. Ela se arrasta para trás, os olhos buscando uma
saída.

— Acho que ele prefere me julgar por não ter matado você mais cedo.
— Um sorriso cruel se estende no meu rosto.

Mais um passo. Apenas mais um passo. E ela está morta.

— Realmente? — Ela se arrasta, seu rosto se transformando de medo


em confiança. — Você não deveria tê-lo enviado para o quarto dele. Agora
você será responsável pela morte dele.

Suas palavras me impedem de seguir meu caminho.

— O que você quer dizer? — Não me incomodo em esconder o terror


repentino na minha voz. Afinal, Luca é onde eu traço a linha.
— Vamos apenas dizer que eu não vim somente para a prata da família,
— comenta ela, levantando a mão presunçosamente para me mostrar um
pequeno controle remoto.

Eu estreito meus olhos e lentamente me dou conta do que ela quer dizer.

Não... Não...

Dou um passo atrás e outro, e então estou correndo em direção ao


quarto de Luca a toda velocidade. Eu atravessei a porta e o agarrei,
segurando-o firmemente no meu peito, pouco antes de um barulho alto
surgir do lado de sua cama, a explosão poderosa o suficiente para me
impulsionar para a frente, mas fraca o suficiente para ser contida apenas
no seu quarto.

— Está tudo bem, Luca. Papai está aqui. — Eu escovo minha mão em
seu rosto, beijando suas bochechas e sussurrando palavras calmantes.

Porra, inferno!

Eu subestimei Chiara, e isso é minha culpa. Mas da próxima vez que


nos cruzarmos, mostrarei a ela o quanto pode me empurrar até que eu me
torne seu próprio pesadelo personificado.
CAPÍTULO VINTE E SEIS

Derrubando meu tablet, escondo quando percebo que todos esses


métodos de tortura exigem muito instrumentos que não tenho como
adquirir. Porque Chiara merece o melhor, e pretendo dar a ela exatamente
isso.

Ela finalmente pagará pelo que fez comigo, e eu verei sua dor enquanto
a vida drena de seu corpo.

— Senhorita, o que é isso? — O rosto de Lia fica horrorizado ao ver a


imagem no meu tablet. Suas mãos se movem para fazer o sinal da cruz, e eu
me abstenho de revirar os olhos.

Lia é inocente demais para o seu próprio bem.


— Isso, — começo, pescando na tela para que ela possa ter uma visão
melhor, — é um touro siciliano. — Explico que era usado nos tempos antigos
para levar lentamente as pessoas até a morte.

Como queimar vivo pode ser apenas uma das maneiras mais dolorosas
de morrer, terei que pensar em como usá-lo em meu proveito, já que não
estou nadando exatamente em recursos.

Há apenas um pequeno problema — ninguém sabe onde Chiara está.

Lia me deu um resumo do que havia acontecido com a irmã de Enzo,


após isso Chiara desapareceu imediatamente. Faz quase dois meses desde
que alguém a viu e isso me afeta de várias maneiras, não posso me vingar,
mas também não posso representá-la para visitar Luca.

Meu pobre bebê. Faz muito tempo desde a última vez que o vi e está me
matando lentamente. Sei que, no final de tudo, estaremos juntos, e essa é a
única coisa que me mantém em movimento. Mas até então...

Pego algumas fotos que tirei dele e sorrio olhando para o seu rosto doce.

Em breve.

Mas não tão em breve.

— Você acha que poderia me arrumar um aquecedor forte aqui? — Eu


me viro para ela, de repente pensando em alguma coisa.
— Talvez por quê... — Os olhos dela se arregalam quando percebe meu
propósito. — Não me diga que você...

— Por favor. Se você puder. — Eu adiciono, batendo meus cílios


suavemente.

— Verei o que posso fazer, — concorda ela com relutância. Eu aceno,


agradecendo.

Agora só tenho que pensar em como atrair Chiara.

Estreitando meus olhos enquanto peneiro ideias, saio da cama para


olhar as coisas que tirei da casa de meu pai. Talvez tivesse sido minha
curiosidade, mas eu queria ver exatamente pelo que eles trocaram minha
vida. Eu tinha pegado alguns eletrônicos, incluindo um telefone e notebooks.
Até agora, nada havia se destacado, mas também porque os dispositivos
estão todos bloqueados e não consegui descobrir as senhas.

Tirando o telefone, ligo-o e começo a pensar novamente em diferentes


combinações. Eu só tenho algumas tentativas antes que fique bloqueado e
depois tenho que esperar novamente.

Eu já tinha tentado tudo relacionado a aniversário, e isso foi um


fracasso completo. Acrescento mais algumas combinações, todas erradas.

Mais uma tentativa.


Não é como se eu tivesse algo a perder neste momento. Vou tentar
novamente amanhã.

Penso em todas as minhas interações com meu pai enquanto me deparo


com qualquer pista. Depois, há também a noite em que finalmente o matei
e Deus... Acho que estou doente porque acho que nunca gostei de nada mais
de esmagar meu próprio pai em pedaços.

Há uma certa liberdade em matar para cortar minhas conexões com


minha vida passada, literalmente.

O sangue, a maneira como seu rosto estava congelado de terror, suas


pupilas a única parte do corpo ainda capaz de se mover.

E ele apenas assistiu.

Ele assistiu, desamparado, enquanto eu cortava sua pele, quando


cheguei ao osso apenas para pegar uma faca maior e esmagá-lo em pedaços.
Ele estava vivo o tempo suficiente para ver sua caixa torácica destruída, seu
coração visível através da bagunça.

E como a cadela doente que eu sou, porque acho que ninguém


relacionado a eles é normal de qualquer maneira, eu assisti paralisada
quando seu coração degenerado bombeava uma vez, duas vezes, até que não
tinha mais força — os destroços de seu corpo levando à queda.

Tinha sido uma experiência tão inebriante, quase viciante de certa


forma.
É assim também para Enzo? Quando ele tira uma vida?

Talvez eu tenha sido rápida demais para julgá-lo no passado, já que do


meu assento mais justo do que o dele, ele parecia o vilão. Mas existe
realmente uma coisa dessas? Vilão? Não é tudo apenas perspectiva?

Talvez agora que minhas mãos estejam com um pouco de sangue, eu


possa entender melhor sua perspectiva.

Às vezes você tem que mergulhar e correr o risco de ser o vilão.

Embora eu possa simpatizar melhor com seu papel, isso não o torna
menos um vagabundo traidor.

Ficando irritada com o simples pensamento de Enzo, devolvo minha


atenção ao telefone, conectando-o em uma data, mas não esperando que
funcione.

— O que... — meus olhos se arregalam em choque ao ver a tela acender,


os aplicativos carregando.

Funcionou.

O dia em que meu pai tirou a virgindade de minha irmã é a senha. Isso
não é apenas nojento, mas agora tenho que me perguntar que tipo de
relacionamento doente eles tiveram todos esses anos.
Tirando isso da cabeça, começo a navegar no menu do telefone,
percebendo muitas chamadas perdidas de um determinado número.
Existem também centenas de mensagens do mesmo número.

Talvez...

Começo a passar por todos eles e logo fica claro quem é o remetente. E
Chiara parece não saber que nosso pai está morto.

— Bingo, — sussurro para mim mesma.

Acho que finalmente tenho o caminho para atraí-la.

Eu rapidamente trabalho, estudando o padrão de texto deles para poder


imitá-lo antes de começar a enviar pequenos textos, fingindo que o pai está
sob coação. Logo, um fio inteiro de conversas começa e meu plano está
oficialmente em movimento.

Alguns dias de falsificação de conversas com Chiara, tudo está


preparado para a armadilha. Eu pensei em todos os detalhes, incluindo as
consequências e como eu pegaria Enzo de surpresa.

— Não se preocupe, Lia. Eu serei capaz de lidar com ela. — Eu digo a


ela tentando convencê-la a sair. — Por favor, lembre-se do que você me
prometeu. Nem uma palavra para Enzo sobre se estou viva ou não. — Eu
adiciono enquanto a vejo ir até a porta.

— Sim, mas ainda assim. Não me sinto bem com isso, senhorita.

— Tudo vai ficar bem. Chiara finalmente conseguirá o que merece e em


breve estarei livre, — respiro fundo, fechando os olhos e imaginando o futuro
que me espera.

— Mas Signor Enzo... — ela segue, sem saber.

— Ele nem saberá o que o atingiu. E eu gostaria de mantê-lo assim.

É preciso um pouco mais de persuasão, mas finalmente a convenço a


sair.

Eu tinha planejado tudo, desde a morte de Chiara até como eu faria


parecer que era eu quem morreu aqui — tudo para pegar Enzo quando ele
menos esperasse, enfiar uma faca em seu coração traiçoeiro e levar meu
bebê comigo.

Se não fosse por Luca, eu simplesmente desapareceria depois que


terminasse com Chiara, para nunca mais ser vista. Mas vendo como meu
bebê é meu único propósito, só há mais um encontro — meu marido.

É quase meia-noite, e todo mundo foi para casa. Eu pedi a Lia para se
livrar das pessoas encarregadas dos meus cuidados, e de alguma forma ela
conseguiu isso.
Agora eu apenas espero.

Eu simplesmente plantei a ideia na mente de Chiara de que a irmã dela


não está realmente morta, mas está em coma. Eu também a tinha dado a
localização exata, sabendo que viria aqui para me matar de uma vez por
todas.

Mas desta vez não serei enfraquecida pelo nascimento, nem serei
ingênua o suficiente para não a ver planejando a uma milha de distância.

Não, desta vez ela está entrando na minha armadilha e estará


brincando com minhas regras.

Eu rapidamente me deito na cama, me ligando às máquinas e


esperando Chiara chegar. Sua língua estava muito frouxa com o papai
querido, e ela derramou absolutamente tudo o que queria fazer comigo,
assim como o dia em que faria isso.

Então eu apenas espero.

Como cronometrei tudo de acordo com o plano, não preciso ficar na


cama por muito mais tempo. A porta do quarto se abre lentamente, e eu sei
exatamente quem é.

Ela trava a porta atrás dela, como eu sabia que faria, e dá um passo à
frente. Segurando meus olhos fechados, confio nos meus ouvidos para ouvi-
la a cada movimento.
Ela verifica as máquinas antes de se instalar ao lado da minha cama.

— Puta merda, você tem nove vidas ou o quê? — Ela ri, as mãos indo
para os monitores. Eu ouço o sinal sonoro enquanto ela brinca com as
configurações, pensando que elas vão me causar danos.

É claro que o impulso seria me desconectar de todas as máquinas, e é


exatamente isso que ela faz depois que percebe que não consegue entender
como os monitores funcionam. Ela passa a tirar os fios do meu corpo às
pressas, quase como se mal pudesse esperar para me ver morrer.

Podemos nos encontrar no inferno, irmã!

Quando ela termina, dá um passo atrás, esperando.

Mas então, percebe que eu ainda estou respirando, então a única outra
opção é me sufocar com um travesseiro. Clássico, certo?

Bem, devemos ter assistido as mesmas novelas, porque é exatamente


isso que ela tenta fazer.

No momento em que o travesseiro está no meu rosto, eu rapidamente


movo minha mão, injetando-a com um sedativo. Assim que a agulha perfura
sua pele, eu empurro contra ela até que esteja no chão.

O sedativo é rápido em agir, e seus movimentos são lentos enquanto ela


olha horrorizada para mim.
— Surpresa? Irmã? — Pergunto no mesmo tom presunçoso que ela
usou antes de esmagar meu rosto contra a mesa.

Com seus movimentos restritos, ela tenta escapar se arrastando no


chão. Eu medi meus passos, então estou avançando lentamente, fazendo-a
sentir o medo dez vezes maior.

— O que? Gato comeu sua língua? — Eu levanto uma sobrancelha para


ela, levantando o queixo com o polegar.

— Foda-se, — ela cospe em mim, e eu viro minha cabeça para o lado


bem a tempo de evitá-la.

— Bem, acho que agora é a minha vez de dizer isso, não é? — Meu
sorriso cresce mais, assim como seus olhos mostram mais medo.

Percebendo que não há saída, não com o sedativo em seu sistema, ela
começa a rir nervosamente.

— E daí se você estiver viva? Ninguém quer você! Por que você acha
que foi tão fácil substituí-la? Nem mesmo seu marido ou seu pirralho sabem
quem eu sou.

— Você tem tanta certeza? — Eu balanço minha cabeça, minha voz


pautada. Ela é a pessoa sem saída e eu não vou deixá-la me abalar.
— Quem você acha que me trouxe aqui? — Eu pergunto, e a realização
está bem no rosto dela. — Ah, você está montando as coisas, não é? Enzo
sabia desde o início.

— Realmente? — A sua boca se transforma em uma linha cruel, —


tenho certeza que ele sabia quando estava me fodendo, me chamando pelo
seu nome.

Eu realmente esperava que ela não dissesse isso?

— Não perca o fôlego, não é como se eu fosse acreditar em algo que sai
da sua boca. — Eu digo a ela, levantando-me e voltando para a cama.

— Você deveria saber, — paro, girando, — que mãe e pai estão mortos.

Seus olhos se arregalam com a declaração, então eu lhe dou um sorriso


radiante — Certamente foi bom fazê-los sangrar. Agora para você...

— Você? — Ela pergunta incrédula.

Eu apenas aceno, tirando a roupa de cama e travesseiro até que seja


apenas a armação de metal. Felizmente, a moldura desta cama não tem
quaisquer espaços vazios, por isso será adorável para a querida Chiara.

Depois de jogar tudo no chão, volto para ela.


Estou relaxada, mesmo que algo esteja fervendo nas minhas veias —
aquele gosto de vingança que finalmente vou ter. Mas é tão leve que não
posso me apressar.

Eu preciso saborear. Não ter pressa.

Chiara está apoiada contra a parede, já apagada. Eu a pego pelos braços


e a arrasto para a cama, amarrando as mãos e os pés em cada extremidade
com arame farpado.

Então eu espero.

Ela acorda algumas horas depois, e eu estou no meio do meu capítulo.


Li rapidamente a última frase antes de colocar o marcador dentro e voltar
minha atenção para minha irmã.

— O que... — ela gagueja quando vê a situação em que está.

Sento-me ao seu lado, pronta para o que vem a seguir, mas não
exatamente.

— Eu sei sobre você e Leonardo, — afirmo, recusando-me a reconhecer


esse bastardo como meu pai.

— O que você acha que sabe? — Ela responde de forma beligerante.


Ela tem outro humor além de agressão? Acho que não tivemos uma
conversa normal em nossas vidas. Todas elas eram gritando comigo ou me
acusando de algo e me causando problemas.

— Que você o fodeu? — Eu pergunto divertida.

— Sim, claro, nós fodemos, e daí? — Ela revira os olhos para mim.

— E daí? Chiara, talvez eu nunca tenha gostado de você, mas isso é


uma merda. Você tinha quatorze anos! — Eu digo, um pouco indignada.
Posso matá-la lenta e dolorosamente nas próximas horas, mas isso não
significa que não reconheço que o que Leonardo fez com ela estava
completamente errado.

— E? Eu fui até ele. Eu sabia no que estava me metendo.

— Você tinha quatorze anos, — repito, ainda admirada por achar que
era normal.

— Não é como se eu não tivesse visto ele foder as outras antes. Eu


estava curiosa. — Não há emoção no seu rosto enquanto ela admite, e eu
apenas balanço minha cabeça.

Meus pais não falharam comigo apenas. Eles falharam com ela
também.

— Sinto pena de você, — acrescento, — mas não lamento o suficiente


para esquecer tudo o que você fez comigo.
— O que, você vai me sufocar com um travesseiro também? — Ela
zomba, rindo ironicamente de mim, mesmo que atualmente esteja
completamente imobilizada.

— Não, será muito, muito pior. — Eu digo a ela antes de encher a boca
com um pano.

O que tenho em mente a fará gritar de dor.

Colocando alguns fios no peito, vejo um monitor ganhar vida com o


pulso. Então, dando um passo atrás, uso um controle remoto para ativar o
radiador embaixo da cama. Movendo minha cadeira ao lado da janela e longe
da cama, apenas espero.

O calor vermelho do radiador está logo abaixo da estrutura metálica da


cama, um condutor principal para o calor.

Leva algum tempo até o ferro da cama esquentar, e Chiara começa a se


mover na cama, tentando se levantar para não entrar em contato direto com
o metal quente.

Lágrimas estão reunidas no canto dos olhos, pois ela não consegue mais
se levantar, caindo na cama quente, a garganta entupida com gritos que não
saem.

O cheiro de carne queimada já está no ar, e eu simplesmente assisto


quando a pele nas costas começa a derreter, algumas delas até fluindo —
uma mistura de vermelho e amarelo que quase me faz piscar duas vezes com
nojo.

Ela ainda está se debatendo contra a restrição, a pele vermelha com


calor, esforço e desesperança enquanto a cama continua ficando mais
quente.

O odor que vem de sua pele derretida está me deixando enjoada, e abro
a janela um pouco, ainda no meu lugar. Não posso me dar ao luxo de perder
isso depois de planejar há tanto tempo.

Em algum momento, Chiara para de se mover. Aproximo-me para ver


que ainda há um pulso. É muito fraco, mas está lá.

Desligo o aquecedor e espero.

Mais algumas horas, e Chiara está de volta, seu pulso disparando com
o despertar. Aperto o botão e os radiadores começam novamente.

Sua garganta deve estar dolorida e sangrando agora, já que ela está
tentando gritar contra o pano o tempo todo.

Mas enquanto eu assisto mais pele derreter em seu corpo, algumas


ficam pretas por serem queimadas na superfície da cama, enquanto outras
gotas de sangue e gordura caem no chão.
Desta vez, não paro os radiadores, deixando-os correr na temperatura
mais alta até que toda a parte das costas esteja vermelha e retorcida, osso
visível através da pele com bolhas.

O monitor também para de captar seu pulso. Finalmente, chego perto


dela, cortando suas restrições com um alicate, o metal maleável o suficiente
para ceder no primeiro corte. Eu me livro deles para que não haja nada de
estranho quando as autoridades descobrirem o seu corpo. Depois, viro a
cama e pego a roupa de cama e os travesseiros, jogando-os em cima dela e
observando o material se agarrar à carne queimada, juntando-se para criar
um cheiro ainda pior.

Com o material debaixo do braço, acendi uma pequena chama ao lado


dos aquecedores.

Um último olhar, e estou fora do quarto.

Atrás de mim, não demora muito até ouvir o som de uma explosão,
sinalizando que meu plano foi bem-sucedido.

Eu saio furtivamente, tirando as roupas que Lia havia escondido para


mim em um canto no convento, e então consigo sair mostrando uma
identidade falsa da equipe

Enquanto todo mundo está correndo em direção ao fogo, eu estou me


afastando.

Mais um nome.
Em breve.
CAPÍTULO VINTE E SETE

Eu olho solenemente para o caixão de mogno que está sendo colocado


no chão. Mal tem restos no interior, já que tudo foi incinerado no local do
acidente.

O cemitério está vazio, e apenas algumas pessoas estão por perto para
o funeral de Chiara, porque eu me recuso a acreditar que o corpo nessa caixa
é de Allegra.

Eu simplesmente recuso.
Há dias que tentei entrar em contato com Lia para obter confirmação
de que minha little tigress está viva, mas foi tudo por nada. É como se ela
desaparecesse no ar.

Enquanto o silêncio é estressante, está me dando esperança de que


Allegra esteja viva e ela esteja apenas ganhando tempo até que sua última
vítima abaixe a guarda. Porque que melhor hora para atacar do que quando
alguém está no seu nível mais baixo.

Olho em volta para as pessoas presentes, minha irmã com o marido e


alguns funcionários. Eu não tinha conseguido esconder isso deles quando as
notícias começaram, mas eu consegui pelo menos atrasar todo mundo
conhecido.

Minha esposa não está morta.

— Enzo, — Lina vem pegar minha mão, olhando para mim com
preocupação nos olhos.

— Estou bem, — acrescento, minha voz é um pouco brusca. Acho que


não posso lidar com essas pessoas que me oferecem suas condolências
quando minha little tigress ainda está viva.

— Se você precisar de alguma coisa, — continua ela, mas eu apenas


balanço minha cabeça, me livrando de seu aperto.
— Eu só preciso encontrar Luca, — é tudo o que digo, e me mudo para
sair, meus olhos encontrando os de Marcello quando ele vem abraçar Lina.
— Cuide dela, sim, — eu me dirijo a ele pouco antes de voltar para casa.

Maman Margot está brincando com Luca na sala de estar, e no


momento em que ele me vê, corre em minha direção, abraçando minhas
pernas.

— Papa, — ele exclama, com os olhos brilhantes cheios de energia


alegre.

— Como está meu garoto? — Pergunto o levantando em meus braços,


beijando a coroa de sua cabeça.

— Bom, maman brincou comigo a manhã toda, — ele começa a me


contar sobre o seu dia, conversando alegremente.

Maman está em um canto, olhando para mim com uma expressão


estranha no rosto.

Pouco tempo, Luca começa a bocejar e eu sei que é hora de tirar uma
soneca, então eu o levo para o quarto para colocá-lo na cama. Passando no
meu próprio quarto, tiro meu blazer e desfiz minha gravata.

— Você não está bem, Enzo. — Maman diz quando desço, meus dedos
enrolados no pescoço de uma garrafa de Jack.
— Estou bem, maman. Eu te disse assim como contei a todos. Eu estou
realmente bem. — Eu respondo enquanto me coloco em uma cadeira,
retirando um cigarro do meu bolso e acendendo-o.

— Você não está. Qualquer um pode ver que você não está. Allegra...

— Não era Allegra, — eu a interrompo de maneira agressiva. — Allegra


está viva e bem e ela voltará, — digo com toda a convicção que posso reunir.

Porque não consigo me permitir pensar nem por um momento que ela
se foi. De novo não. Não posso passar por isso de novo, porque desta vez
temo poder fazer algo estúpido... E ainda há Luca a considerar.

Não, eu simplesmente não posso descer pela toca do coelho.

— Enzo, você tem que enfrentar a possibilidade que talvez...

Eu balanço minha cabeça vigorosamente.

— Ela está viva e eu sei que ela virá atrás de mim. Se me mata ou me
ama, eu não me importo. Ela pode atirar em mim quantas vezes quiser,
desde que eu tenha provas tangíveis de que ela está viva, — murmuro, não
fazendo muito sentido. — Ela está apenas tentando me fazer sofrer.

— Enzo, — maman começa, seu tom preocupado: — você está sendo


ilusório, — continua ela, tirando a garrafa de mim. — Este não é o caminho
a seguir.
— E o que eu devo fazer? — Eu pergunto, minha voz esfarrapada, as
palavras quase quebradas, — aceitar que ela morreu? Porque eu não posso.

Quanto mais tento forçar as palavras, mais meus olhos ficam molhados,
a umidade ameaça derramar em minhas bochechas. Limpo-o com as costas
da mão, respirando fundo e tentando me acalmar.

— Ela está viva, — digo novamente, tentando me convencer mais do


que qualquer coisa.

Maman balança a cabeça, vindo lentamente em minha direção.

— Mon cher. Eu sei que você a ama, mas, — ela envolve os braços em
volta de mim, me dando um abraço.

— Sem, mas maman. Acho que não posso continuar se ela realmente se
foi. De novo não, — minha voz está abafada quando algumas lágrimas
finalmente descem pela minha bochecha.

— Você precisa. Por Luca. — Ela enfia os dedos no meu cabelo em um


gesto de conforto.

— E se eu não puder? — Eu sussurro, envergonhado de mim mesmo.

— Você é forte, mon cher. Mais forte do que qualquer um que eu


conheça. E eu vi o quanto você ama esse garoto; demais para deixá-lo
desamparado neste mundo.
Ela está certa. Eu nunca deixaria racionalmente Luca se virar sozinho.
Mas esse sofrimento opera em um nível irracional, e a única coisa em que
consigo pensar é em Allegra.

Minha little tigress.

— Ela está viva, — afirmo, desta vez sem sombra de dúvida.

— Mon cher, — maman faz um tsk soar, decepcionada por não estar
vendo nenhuma razão. — Eu não gosto disso. Vou levar meu afilhado comigo
até você se recompor. Não me sinto confortável em deixá-lo com você assim...
— Ela suspira profundamente. — Eu te conheço e em breve você procurará
conforto no fundo de uma garrafa. Não, este não é um ambiente produtivo
para uma criança.

— Tudo bem, apenas... me dê um dia ou dois, — respiro fundo,


reconhecendo que maman está certa, mesmo que eu não goste do
pensamento de Luca estar fora.

Mas agora... Eu não quero que ele veja este lado de mim.

— Eu vou pegá-lo. — Ela dá alguns passos antes de se virar


bruscamente em minha direção. — Não faça algo estúpido, ok?

Eu levanto meus olhos para ela e aceno devagar.

Então, sozinho mais uma vez, de fato, encontro conforto no fundo de


uma garrafa.
Meu olhar está embaçado quando eu abro meus olhos. Mas não há como
confundir a mulher determinada na minha frente, ou a maneira como ela
está usando uma faca longa e pontuda. Ela está vestindo um jeans escuro,
juntamente com um suéter de lã cinza, e ela parece gostosa enquanto
balança os quadris, suas intenções assassinas apenas a tornam mais sexy.

— Eu sabia, — as palavras caem da minha boca, a névoa alcoólica


levantando.

— Seu filho da puta, — seus olhos estão brilhando de fúria enquanto


ela me ataca. Eu a pego pelos braços, segurando-a no lugar enquanto nós
dois caímos no chão.

— Bastardo, — ela continua a vomitar seus insultos, tentando libertar


a mão da faca.

— Little tigress, — mal consigo falar da felicidade que está surgindo do


fundo de mim.

Ela está viva. Eu sabia que ela voltaria para mim.

— Solte-me seu imbecil, — ela luta no meu aperto, mas eu apenas


aperto meus braços ao seu redor.
— Apenas um momento. Deixe-me abraçá-la por um momento: — Eu
digo roucamente, desesperado para sentir seu calor, seu perfume — a prova
de que eu precisava desesperadamente saber que ela está viva.

— Shh, — sussurro em seus cabelos, revelando-me em sua presença.

Quantos anos eu sonhei com isso? Segurando-a assim?

Ela ainda está lutando, e sua faca aperta meu peito, a ponta
arranhando a superfície da pele. A dor repentina me surpreende e ela
aproveita para pular dos meus braços.

— Seu desgraçado. Você não podia mantê-lo em suas calças, mesmo no


meu funeral? — Ela olha para mim com nojo e eu não posso deixar de franzir
a testa em confusão.

— Do que você está falando?

— Você acha que eu não me lembro desse perfume maldito? — Ela


balança a cabeça, dando um passo para trás, — está impresso em minha
memória desde a primeira vez que cheirei em você, — a cabeça dela se move
para frente e para trás pela sala como se estivesse procurando por algo.

— Onde ela está? Onde você a escondeu? — Ela continua, e levo um


momento para perceber que ela está falando do perfume de maman.

— Você está errada, — começo, tentando decidir a melhor forma de


explicar maman para ela.
— Estou errada? — As sobrancelhas dela se arqueiam, — como estou
errada quando é a mesma pessoa desde o início? — Ela faz uma pausa,
olhando para mim como se tivesse sido atingida. — Você a ama? — Ela
pergunta em voz baixa, seus traços desenhados na dor. — É isso aí, não é?
Você a amou o tempo todo.

— Não, — respondo, lutando para escolher minhas palavras com


cuidado. — Ela é uma amiga querida e nada mais. Ela é madrinha de Luca,
— digo, e seus olhos se arregalam de horror.

— Você deixou aquela prostituta perto do meu filho? — ela grita,


lançando-se para mim mais uma vez, a ponta da faca descansando logo
acima do meu coração.

— Ela não é uma prostituta, — eu cerro os dentes, sabendo que em sua


volatilidade ela poderia facilmente me esfaquear, mesmo que
acidentalmente. — Ela é amiga. Uma amiga idosa. — Eu acrescento, só para
garantir, mas a suspeita não desaparece dos olhos dela.

— Quantas vezes? — Ela pergunta com desdém, sua voz estalando. —


Quantas vezes você me traiu?

A faca continua cavando na minha pele e sinto um fio de sangue


chegando à superfície.

— Nenhuma, — levanto minha cabeça para olhá-la nos olhos,


esperando que veja a sinceridade nos meus olhos.
— Não minta para mim! — Ela grita, a faca cavando mais fundo e a dor
se intensificando.

— Eu não estou, — respondo com calma, minhas mãos cobrindo o seu


rosto. Há tanto ódio nos seus olhos, e tudo isso é direcionado a mim.

Eu fodi tudo.

— Me mate se é isso que você quer, mas juro que nunca te traí na minha
vida. — Envolto minhas mãos sobre as dela no punho da faca, ajudando-a a
levá-la para frente no meu peito.

Ela balança a cabeça para mim, as bochechas manchadas de lágrimas.

— Não minta para mim. Uma coisa que pedi, nunca minta para mim,
— ela murmura, frenética e perturbada.

— Eu não estou. Não desta vez. — Eu menti muitas vezes para ela no
passado, e é por isso que estamos aqui. Se eu pudesse ter sido mais aberto
para ela... mais honesto... nada disso teria acontecido.

— Eu não acredito em você, — ela soluça, com as mãos ainda na faca.

Fecho meus olhos brevemente, o doloroso conhecimento de que eu a


levei a esse ponto, me fazendo me odiar ainda mais.

O que eu fiz com você, little tigress?


— Então faça, — eu me vejo dizendo, minhas mãos se apertando sobre
a faca. — Me mate. Vingue-se. — Eu digo a ela enquanto a ajudo a me
esfaquear mais profundamente. — Apenas diga a Luca que eu o amo, —
sussurro meu último desejo.

Sinto a pele rasgando sob a lâmina da faca, a dor física embotada pela
dor da minha própria alma.

— E você, little tigress. Eu sempre vou te amar, — murmuro logo antes


de dar um empurrão no punho, ofegando com a dor.

Mas assim que a pressão da faca atinge um ponto insuportável, ela se


foi.

Allegra tropeça para trás, caindo de bunda, os olhos selvagens


enquanto ela pega meu peito sangrando e as gotas de sangue que agora
permanecem na lâmina.

— Não minta para mim, — ela sussurra, atordoada no local, seus olhos
nunca deixando minha ferida.

Não me importo com a dor ao me mover para uma posição sentada.


Minha mão vai para o buraco aberto no meu peito, profundo, mas não com
risco de vida. Meus dedos estão encharcados de sangue e eu faço um
trabalho rápido da minha camisa, tirando-a e pressionando-a sobre a ferida.

— Eu nunca mentiria para você. Não sobre isso.


— Deus, — ela dá uma risada maníaca, os olhos mais uma vez cheios
de desdém, — é ainda pior. Diga-me, onde estava esse amor quando você
estava transando com outras pessoas pelas minhas costas? Você acha que
eu não vi todas as evidências? Senti na minha própria pele?

— Não é o que parece, — começo, tentando me defender, — e na festa


eu sabia que era você.

Ela franze a testa, suas sobrancelhas bonitas se reunindo no centro.

— O que? Não pode ser. — Ela estreita os olhos para mim, negando
veementemente a possibilidade.

— Eu sei que era você desde que você visitou Luca. Também sei que
você foi quem matou Cristina e Leonardo, — acrescento, e o choque envolve
seus traços.

— O que... Como... Você não deu nenhuma indicação... — ela pronuncia,


confusa e com razão.

— Lia. Eu a convenci a me ajudar. Eu sabia que você ansiava por


vingança e queria que a tivesse. Então eu fiz alguns ajustes nos bastidores.

— Você... — Eu posso ver a realização surgindo sobre ela. — Mas por


que? — ela sussurra, seus traços ainda mergulhados em consternação.

— Porque eu te amo e eu faria qualquer coisa para te ver feliz. Incluindo


deixar você empurrar essa faca no meu coração — para sempre desta vez.
— Não, isso não é verdade, — ela continua repetindo, e eu me sinto
compelido a me aproximar dela.

Deixando a camisa no chão, levo as mãos dela nas minhas. A faca cai
com um baque, mas eu a puxo para dentro de mim antes que ela possa pegá-
la novamente.

—Little tigress, me escute, por favor. Vou lhe contar tudo o que quer
saber e depois, se você ainda quer meu sangue, é seu.

Ela não se move, seu rosto sem expressão olhando para mim.

Esta é a minha deixa.

— Eu... — Foda-se, eu sou um covarde. Depois de tudo o que aconteceu,


ela está viva e bem e na minha frente, mas não consigo encontrar as
palavras para garantir minha devoção.

Seus olhos tremeluzem um pouco quando ela levanta uma sobrancelha,


desafiando-me a dizer minha parte e acabar com ela. De repente, é tão
irritante sabendo que minhas próximas palavras ditarão o futuro do nosso
relacionamento.

— Eu te amo, — no momento em que as palavras saem da minha boca,


a sua cabeça se inclina para o lado em um gesto de ‘é só isso?’. Não deixo que
isso me impeça enquanto continuo, finalmente revelando tudo: — Acho que
me apaixonei por você após nossa primeira interação. Você era tão diferente
de qualquer pessoa que eu já conheci antes que não pude deixar de ser
atraído por você, — respiro fundo, — não sabia na época porque
simplesmente nunca me senti assim antes e, na metade do tempo, eu não
sabia se deveria estrangulá-la ou fazer amor com você, — digo e o seu rosto
se transforma em uma carranca questionadora.

Ótima escolha de palavras, Enzo!

— Então você se coloca na frente daquela bala por mim, e eu a


racionalizei como um sinal de que estávamos perfeitamente combinados. —
Levando uma mão, eu coloco um fio atrás da sua orelha. — Você é o epítome
de tudo o que admiro: corajosa, de princípios, gentil e honesta. Como
ninguém mais podia ver que tesouro você é, está além de mim, — paro
quando a vejo estreitar os olhos para mim e sei que elogios não vão me tirar
dessa bagunça; mesmo que não sejam nada além da verdade.

— O que você me ouviu contar ao meu pai sobre o nosso casamento foi
simplesmente o quê ele precisava ouvir na época. Eu decidi que você seria
minha esposa antes que eu soubesse que era outra famiglia me querendo
morto. Eu propositalmente fiz você perder seu casamento para que eu
pudesse ter você só para mim.

Embora nunca a tenha traído, certamente a manipulei o suficiente para


conseguir o que queria — ela. E não sei como ela vai reagir com esse aspecto.

Desta vez, porém, vou deixá-la decidir tudo — incluindo o meu destino.

— Mas você não suportava a minha visão, — ela finalmente fala,


pegando minha mão com a dela e tirando-a do rosto.
— Deus, — eu gemo alto, chateado com a minha própria estupidez.

Eu estava tão focado em fazê-la minha que não me incomodei em ver


como isso afetaria ela. E quando se tornou minha, tentei lutar contra minha
obsessão por ela porque estava me deixando absolutamente louco. Eu não
poderia nem estar ao lado dela sem imaginar milhares de maneiras pelas
quais eu exploraria seu corpo, o desejo de provar seus lábios muito fortes.
Para alguém que se orgulhava de seu autocontrole, ela certamente destruiu
qualquer aparência de autonomia que eu tinha.

— A culpa é minha, admito. — Eu digo, apertando a sua mão. — Eu


não gostei do que você despertou em mim. Eu tinha esse desejo constante de
estar perto de você; com você, em você... Eu não tinha controle quando se
tratava de você.

— Realmente? — Ela pergunta com desdém, — é por isso que você foi
às suas prostitutas? Porque eu era demais para você? — O tom dela é
acusatório, mas eu posso detectar a dor por baixo.

Uma dor que eu coloquei lá. Porra!

— Little tigress, — movo minha mão sangrenta para a sua bochecha,


movendo o seu rosto bem na frente do meu. — Juro que nunca fui infiel a
você. Nunca traí nossos votos de casamento, no corpo ou na alma. Eu sei que
é difícil de acreditar, mas...

— Difícil de acreditar? — Ela zomba. — Tente impossível.


— Mas é verdade. — Minha testa tocando a sua, fecho meus olhos,
respirando fundo e desejando com toda a minha força que eu possa convencê-
la de que estou falando a verdade.

— Eu sei que é minha culpa por provocá-la e nunca esclarecer suas


suposições. Mas naquela época eu pensei que era melhor mantê-la à
distância. É a única coisa que me arrependo, porque foi o começo de toda a
sua desconfiança em mim.

— Enzo, — afirma ela em tom morto, — esse é um bom discurso e tudo,


mas você realmente espera que eu acredite que nunca dormiu com outra
mulher nesses cinco anos. Digamos que você mentiu para mim durante o
nosso casamento e foi realmente fiel, — ela pausa revirando os olhos, —
embora isso também seja altamente discutível. Mas eu acho extremamente
difícil de acreditar que um homem com sua libido ficaria sem sexo por tanto
tempo.

— Fiquei sem vinte e quatro anos, cinco anos não é nada, — murmuro
baixinho, sem pretender que ela ouvisse isso. Mas sua súbita respiração me
diz que ela realmente me ouviu.

— O que você quer dizer? — As palavras dela saem por um gemido


enquanto os olhos procuram os meus, procurando confirmar a veracidade da
minha afirmação.
— Você é a única mulher que já toquei, Allegra. Nunca. — Eu confesso.
Antes dela, eu nunca quis estar perto de uma mulher, o pensamento de tocar
uma me enchendo de náusea e nojo.

Não minha little tigress. Ela abriu caminho no meu coração e eu não
pude não tocar nela. É uma das razões pelas quais tentei colocar alguma
distância entre nós, lutando para lidar com o fato de que eu desejava uma
mulher, em todos os sentidos.

Eu fiquei impressionado com a reação do meu corpo a ela, mas ao


mesmo tempo fiquei com medo das implicações.

Seu rosto treme um pouco, seus olhos se arregalando em descrença.

— O que... o que você acabou de dizer? — Ela pergunta, sua voz


instável.

Ela não acredita em mim.

— Eu nunca estive com outra mulher, little tigress. Antes ou depois de


você.

Eu me preparo para as suas perguntas, pronto para contar a ela todas


as partes do meu passado vergonhoso e espero que não me olhe de maneira
diferente.
CAPÍTULO VINTE E OITO

— Eu nunca estive com outra mulher, little tigress. Antes ou depois de


você.

Olho em choque para Enzo e sua última mentira, tentando processar


como, no inferno, ele poderia ter inventado algo assim. É tão ridículo que eu
faço a única coisa natural.

Eu rio.

Curvando-me, aperto minha barriga com risadas, espantada com o que


ele poderia inventar.

Ele acha que eu sou tão idiota?


Mas quando minha risada para e eu pego sua ferida, ainda vazando
sangue pelo peito, tenho que admitir para mim mesma que eu sou uma
idiota.

Eu vim aqui com o propósito expresso de pôr um fim ao nosso


relacionamento miserável e cortar laços para sempre. Eu estava decidida a
enfiar a faca no coração dele, como ele fez comigo tantas vezes no passado.
O plano tinha sido bastante fácil, especialmente quando eu cheirava aquele
perfume nele e minha raiva disparou.

Deveria ter sido fácil!

Exceto que não era.

Só dei uma olhada nele, um sussurro para me fazer vacilar.

Eu não poderia matá-lo.

Então ele teve que ir e me dizer que estava me ajudando nos bastidores?
Quanto do que ele está me dizendo é a verdade?

Devo admitir que fiquei cética em relação à maneira como Lia me


ajudou a montar tudo, e retrospectivamente faz sentido que eu possa ter tido
alguma ajuda externa. Mas por que?

Tantas coisas não fazem sentido, e agora ele tem que lançar outra
bomba em mim.
— Você espera que eu acredite nisso? — Eu levanto uma sobrancelha
para ele, vendo a desesperança envolver todo o seu rosto.

Ele parece cansado e arrasado, e de alguma forma isso puxa as cordas


do meu coração.

— Acho que mereço isso, — ele responde com um suspiro, recuando e


encostado no sofá, a cabeça inclinada em ângulo, o sangue ainda escorrendo
do ferimento.

A ferida está doendo? É sério?

Deus, eu sou tão patética.

Ele vasculha as calças até tirar o telefone, discando para alguém.

— Quem você está chamando? — Eu pergunto acusadoramente.

— A dona do perfume, — diz ele. — Talvez ela possa esclarecer nossa


situação e você possa começar a ver que nem tudo o que digo é mentira.

Ele coloca o telefone entre nós e o coloca no viva-voz.

— Mon cher o que aconteceu? — Uma voz acentuada responde, e eu


instintivamente me encolho com a maneira como ela se dirige a ele? Uma
imagem repentina de uma francesa glamourosa me agride, e eu mal me
mantenho unida a imaginando usando sua sedução no meu marido.
— Você finalmente ficou sóbrio? — ela pergunta com desdém antes que
ele tenha a chance de responder. — Não se preocupe, Luca está dormindo
pacificamente na minha casa, — ela continua e meus olhos ficam assassinos
quando percebo que meu filho está com essa mulher.

— O quê, — a palavra cai da minha boca, minha mão de repente


procurando a faca.

— Maman, — Enzo se dirige a ela e eu paro, franzindo a testa com sua


denominação.

Por que ele a está chamando de mãe?

Seus olhos deslizam para os meus enquanto ele continua.

— Minha esposa tem algumas perguntas para você.

Eu? Maneira de me jogar debaixo do ônibus.

— Mon fils, — ela exclama, quase maravilhada, — você quer dizer que
ela está...

— Sim, — ele responde com desdém, — ela está viva e aqui para me
matar. E sua resposta pode salvar minha vida.

— Enzo, não brinque com essas coisas! — Ela faz um som de indignação
antes de fazer uma pausa. — Allegra? Você está aí? — Ela chama meu nome
e não sei por que de repente estou um pouco envergonhada.
— Sim, — eu limpo minha voz, curiosa para ver o que ela poderia me
dizer sobre Enzo que eu ainda não sei.

— Mon Dieu! C'est un milagre. Enzo, tu como beaucoup de chance. Ah,


é incroyable16.

— Maman, inglês por favor, — ele diz a ela, um pouco divertido.

— Ah, oui, oui. Minha querida, não acredito que isso esteja
acontecendo. Eu pensei que Enzo estava louco quando ele continuou me
dizendo que você estava voltando. E aqui está você, — ela lança um suspiro
sonhador, e eu tenho que admitir com relutância que a conversa dela é
cativante.

— Allegra, o que você queria perguntar? Não se preocupe com seu filho,
ele está em boas mãos. Eu amo esse anjinho mais do que tudo, — continua
ela e minha animosidade parece diminuir.

Mas não posso me deixar me amarrar nas mentiras deles.

Então eu vou direto ao ponto.

— Qual é o seu relacionamento com Enzo?

16 Meu Deus! É um milagre. Enzo, você tem muita sorte. Ah, é incrível.
— Meu relacionamento com Enzo... — ela segue, como se a pergunta
fosse absurda, — entendo, você está com ciúmes, — afirma ela à queima-
roupa e me sinto colada no local, novamente.

— De fato, maman, minha tigress é tão ciumenta que está afiando suas
garras na minha pele. Seria muito bom se você pudesse garantir a ela que
nosso relacionamento é puramente platônico. — Ele responde, um sorriso
subindo pelo rosto.

— Mas é claro. Allegra, querida, não se preocupe, nosso relacionamento


é puramente platônico. — Ela diz, reiterando as palavras de Enzo
literalmente.

— Que convincente, — murmuro.

— Ele é trinta anos mais novo, mon Dieu. Eu nunca seria uma papa
anjo, — ela continua com uma voz enojada! — Nós nos conhecemos há quase
duas décadas e ele tem sido como um filho para mim.

— Você certamente foi a mãe que eu nunca tive, maman, — acrescenta


Enzo com carinho.

— Ah, mon cher, você está me fazendo chorar. — Ela faz uma pausa
enquanto embaralha algumas coisas antes que eu ouça um fungo, e eu
percebo que ele a fez chorar.

Quem é essa mulher?


— Enzo, tenho sua permissão para contar a ela como nos conhecemos?

— Continue. Não quero mais segredos, — afirma ele enquanto me olha


nos olhos.

— Vou falar claramente então, querida. Eu era prostituta em um dos


clubes de Rocco, muitas, muitas luas atrás. Eu era sua amante primeiro,
mas aquela cadela Lucia contratou alguém para arruinar meu rosto. Sei que
não está confirmado, mas tenho certeza de que era ela, — respira fundo
enquanto sua voz está elevando.

— Depois que eu não tinha mais nenhum apelo a Rocco, ele me enviou
a um de seus estabelecimentos para trabalhar. Foi também onde eu conheci
Enzo. Eu acho que ele tinha doze ou treze anos, o pobre garoto. Derramaram
álcool na garganta de uma criança e depois o deixaram por conta própria. E
você o conhece.... Mon Dieu, conheci muitos homens em minha vida, atores
e modelos proeminentes, mas nenhum tão marcante quanto ele. Estou
dizendo isso de maneira mais objetiva, querida, por favor, não se ofenda, —
ela faz uma pausa para me dizer, e eu não posso deixar de quebrar um
sorriso.

— Não ofendeu, — eu respondo.

— Bom, eu sei que ele é todo seu, mas todo mundo com dois bons olhos
pode ver que ele é um homem muito bonito. Mesmo naquela época, ele era
tão bonito que doía olhar para ele. E isso levou as pessoas a se aproveitarem
dele, — ela faz uma pausa em um triste suspiro.
— O que você quer dizer? — Estou quase com medo da resposta, porque
uma criança bêbada e aproveitada só pode significar uma coisa. Eu virei
minha cabeça para Enzo e ele tem um olhar grave no rosto.

— Não sei exatamente o que aconteceu antes de chegar. Enzo nunca me


disse os detalhes. Eu estava andando pelo corredor do clube quando ouvi um
grito de ajuda estrangulado. Eu nem pensei, apenas entrei pela porta e a
cena inteira foi horrível, — sua voz pausa, e ela é claramente afetada pelo
que está dizendo, de jeito nenhum alguém pode fingir isso.

— O pobre Enzo estava nu, de bruços no chão, e um velho estava em


cima dele, montando-o e... — Ela deixa escapar e eu ouço um soluço.

A expressão de Enzo ainda não mudou, e eu mal me impeço de estender


a mão para confortar.

— Graças a Deus cheguei lá pouco antes do pior acontecer. Ele estava


tão desorientado, tão vulnerável, e meu coração se partiu por ele. De alguma
forma, depois do fato, Enzo entendeu que ele tinha que me pagar, então ele
fez exatamente isso.

— Comprei um clube para ela, — interrompe Enzo, a aparência de um


sorriso tocando nos seus lábios.

— Somos amigos há tanto tempo, mas, na verdade, eu o vejo como o


filho que nunca tive, — ela fala e um rubor rasteja pelo pescoço de Enzo.

— Obrigado maman, — acrescenta ele com genuíno carinho.


Conversamos um pouco mais e ela me conta algumas histórias de Enzo
ao longo dos anos, e quando estamos prestes a terminar a conversa, ela
acrescenta algo.

— Por favor, pegue leve com ele e ouça tudo o que ele tem a dizer. Sei
que tudo aponta para o contrário, mas posso garantir com a minha vida que
meu filho te ama mais do que qualquer coisa no mundo. Dê a ele uma
chance, por favor.

— Vou deixá-lo falar, — eu me pego concordando.

Maman me garante que ela deixará Luca no dia seguinte antes de


desligar.

Enzo embolsa o telefone e fico sem palavras olhando para ele.

— Eles fizeram... — Eu não consigo nem fazer a pergunta. Ele balança


a cabeça.

— Foi por pouco, mas maman estava lá para me ajudar, — ele responde,
e não acho que ele perceba como sua mão instintivamente pega a garrafa de
bebida na mesa.

— Enzo, eu ...

— Há mais, — ele me interrompe, tomando um gole de álcool. — Eu


nem sei como dizer isso... Além de maman eu nunca contei a ninguém. —
Sua voz quebra e ele fecha os olhos, a mão esfregando nas têmporas.
O que poderia ser pior que isso?

Aproximo-me dele, cobrindo a sua mão com a minha. Ele olha para o
contato e aperta os olhos, movendo a cabeça para o lado.

— Antes do clube, — ele começa, com a voz baixa e áspera, — minha


mãe tinha uma obsessão antinatural por mim.

Meus olhos se arregalam e eu me encolho em choque.

— E-e-ela, — gaguejo, minha mente rapidamente reúne tudo: seu


ciúme, seu comportamento em relação a mim.

Não... não isso. Por favor, diga-me que não é o que estou pensando...

— Eu tinha nove anos quando ela começou a entrar no meu quarto. Ela
pensou que eu estava dormindo quando usou minhas mãos para gozar.

Suspiro e minha mão vai para a minha boca, mas não falo. Não quando
Enzo parece lutar para me dizer isso. Eu apenas o deixo continuar.

— Continuou algumas vezes por semanas até não ser mais suficiente.
Ela começou a me tocar, tentando me masturbar. Eu nem sabia o que era
aquilo na época, — ele ri nervosamente, — mas mesmo assim eu sabia que
estava errado. Durou anos até eu começar a passar pela puberdade e... —
Ele deixa escapar e meu coração se parte por ele.

Eu me aproximo, pegando a sua mão e trazendo-a para os meus lábios.


Deus, eu sabia que Lucia estava com falta de um parafuso, mas nunca
imaginaria que ela seria tão... repugnante. O próprio filho — uma criança.

Talvez minha vingança não tenha acabado.

Oh, como eu adoraria torturar aquela cadela, fazê-la se arrepender no


dia em que olhou para o filho com outra coisa senão o amor materno. Mas
duvido que ela tenha tido isso.

— Está tudo bem, — exorto-o gentilmente a continuar admirando sua


coragem. Não pode ser fácil confessar nada disso.

— Comecei a ter ereções aleatórias, como qualquer adolescente. Mas


uma noite, acordei com ela me chupando, — sua voz se quebra e eu engulo
com força, já lutando contra as lágrimas.

— Eu gozei, — suas palavras estão um pouco acima de um sussurro. —


Eu nem sabia o que estava acontecendo, mas gozei pela garganta da minha
mãe. Quão fodido é isso? — Ele balança a cabeça, um sorriso cínico nos
lábios.

— Mas eu continuava fingindo que estava dormindo. Eu sempre fingi,


esperando que ela finalmente me deixasse em paz. Até... uma vez eu não
conseguia mais fingir.

— Acordei uma noite com ela me montando e tentando se foder no meu


pau. Eu também estava mole, mas isso não a impediu.
Eu fungo um soluço. Quão doente você precisa estar para fazer isso com
seu próprio filho? Estou simplesmente sem palavras enquanto assisto Enzo
lutar para recontar sua experiência, sentindo sua dor como minha e
querendo torná-lo melhor.

— Eu a joguei de mim, e depois disso ela nunca mais voltou.

— Quantos anos você tinha?

— Quando parou? Não sei, doze ou treze.

— Deus, Enzo, — minha mão se move para cima e para baixo do braço
em uma carícia suave. — Você percebe que nada disso foi culpa sua. Ela é
uma mulher muito doente.

— Foi, — ele corrige, o fantasma de um sorriso em seu rosto. — Eu a


matei depois que ela tentou envenenar você.

— Quando ela foi para a Sicília, — lembro-me de sua partida repentina.


— Oh Enzo, — eu balanço minha cabeça e o que ele passou, minha alma
está doendo por ele. Chegando perto, tento tocá-lo e oferecer-lhe meu
conforto.

— Eu não disse isso para você ter pena, little tigress, — ele se vira para
mim, com os olhos sombrios. — Eu quero que você entenda porque eu nunca
beijei outra mulher antes de você. Toda a minha vida todo mundo tentou me
foder, de um jeito ou de outro. Mulheres, homens, todos tentaram, na
maioria das vezes não aceitando não como resposta.
— Acho que fiquei velho muito jovem, mas eu desprezo vendo aquele
olhar de desejo no rosto das pessoas. Isso me lembra demais da minha mãe.
E eu estaria bem sem nunca fazer sexo, se eu for honesto. Até eu te conhecer.

Meus cílios tremulam rapidamente, sua confissão me pegou de


surpresa.

— Enzo, — o nome escapa dos meus lábios enquanto eu tento aceitar o


que ele me disse. Pensando bem, posso ver os sinais e como sempre me
tocava sem esperar nada em troca.

Ele não queria ser tocado.

— Não, deixe-me dizer isso. Admito que não lidei bem com meus
sentimentos, principalmente porque você estava pirando de medo de mim.
Você era tão bruta e única e meu Deus, tão extraordinária, — ele se vira
para mim, levando meu rosto em suas mãos.

— Por favor, nunca duvide disso. Para mim, você é a mulher mais
bonita do mundo e não é por causa do seu rosto, — ele sorri sorrateiramente,
— embora eu também goste particularmente disso, mas por quem você é.
Você é simplesmente você. — O polegar acaricia meu rosto em movimentos
circulares, as pupilas dilatadas com a intensidade de suas emoções.

— Você é minha tigress e nada e ninguém pode substituí-la. — Ele se


inclina para a frente para pressionar um beijo na minha testa.
Não aguento mais. Eu simplesmente começo a chorar, apoiando-me
nele enquanto ele envolve os braços em volta do meu corpo. Estou chorando
e tremendo — pelo menino que cresceu temendo as sombras e pelo homem
que evitou a intimidade por tanto tempo por causa de seu trauma.

— Por que você não me contou antes? — Eu pergunto através de


soluços.

— Eu tinha vergonha, — ele admite, com a voz baixa no meu ouvido. —


Eu não queria que você me visse como... menos.

— Oh, Enzo, — minhas palmas vão para as suas bochechas, e eu o trago


para mim, esmagando meus lábios nos dele. — Eu nunca poderia vê-lo como
nada além de meu, — digo contra ele, deixando de lado o último
ressentimento.

— Tigress, — ele me puxa para trás, — há mais que preciso lhe contar,
— respira fundo, com os traços cansados. — Eu sei que me comportei mal,
mas eu estava com tanto medo que você me deixaria e eu estava tão
apaixonado por você que continuei fazendo coisas estúpidas.

— Está tudo bem, — sou rápida em garantir, mas ele balança a cabeça.

— Não está tudo bem. Eu te tratei como uma prisioneira e eu ... Deus,
eu até bisbilhotei em seu diário para tentar fazer você se apaixonar por mim,
— ele admite e minha boca se abre em choque.
— O pior é... Eu li que você queria me deixar e eu, — ele respira fundo,
suas narinas brilhando, — Droga! — Ele amaldiçoa, o rosto enrugado de dor,
— eu troquei suas pílulas anticoncepcionais para engravidar, pensando que
um bebê a manteria ao meu lado.

— Você o que? — Eu deixei escapar, surpresa com sua confissão.

Não posso dizer que não suspeitava que ele tivesse a ver com a gravidez
surpresa, especialmente porque ele tinha certeza da gravidez antes mesmo
de recebermos a confirmação do médico. Mas eu nunca teria imaginado que
ele mesmo admitiria.

— Eu sei que estava errado, mas não pude deixar você ir embora. Porra,
inferno! Depois que basicamente te estuprei, sabia que você só me odiaria
mais, e fiquei com tanto medo que me deixasse que comecei a me tornar
insuportavelmente controlador. — As palavras estão saindo de sua boca a
tal ritmo, só posso assistir perplexa enquanto as revelações continuam
rolando.

— Você não me estuprou, — eu franzi a testa, reforçando essa palavra.


— Por que você pensaria isso?

— Porra! Não me lembro muito daquela noite, mas lembro de você


dizendo não. E eu estuprei você.

— Enzo, você não me estuprou, — digo a ele novamente. Ele pode ter
me assustado com sua agressão, mas eu aceitei todas as suas atenções.
— Mas você disse que não, — repete, com o rosto parecido com o de um
filhote triste.

— Se bem me lembro, eu disse não é assim, mas eu queria você tanto


quanto.

Ele parece processar minhas palavras, suas sobrancelhas subindo e


descendo.

— Por que você não se lembra? — Eu pergunto de repente. Até meu eu


bastante embriagado conseguiu reter a maioria dos detalhes da noite.

Seus lábios se esticam em uma linha fina.

— Lucia me drogou. Ela provavelmente esperava que eu te matasse no


meu estado maníaco, mas claramente, mesmo drogado, eu nunca levantaria
uma mão contra você, — acrescenta ele com desdém.

Agora, seu comportamento depois daquela noite começa a fazer sentido.


Ele estava distante, mas cada vez mais restritivo. Tudo porque pensou que
tinha me levado contra a minha vontade.

Oh, Enzo!

— Você pensou que eu te odiava, — afirmo, a realização me atormenta.

Ele apenas assente, sua expressão aberta e vulnerável.


— Eu não sabia como mantê-la comigo, — diz ele em um sussurro, e eu
me inclino para ele, beijando sua bochecha.

— Você poderia ter me dito que me amava e eu nunca teria pensado em


ir embora.

— Eu estraguei tudo; eu sei. Olhando para trás, não tenho desculpa


para isso além de estar com medo. Com medo do que eu sentia por você, com
medo de me deixar, com medo de me odiar, eu apenas pensei que um dia
você teria ido embora, e eu me vi e o que me tornei sem você, e confie em
mim, não é bonito.

— Enzo... — Eu inclino minha cabeça para o lado, estudando-o e


acolhendo esse novo homem diante de mim. Porque ele nunca me deixou
entrar assim antes.

— E Chiara, então? E as fotos? — Eu pergunto, com medo da resposta,


mas provisoriamente confiando nele.

— Você pode pensar que estou mentindo, mas sabia que algo estava
errado com ela desde o momento em que a vi, — ele passa a me contar tudo
sobre as primeiras semanas e como ele cuidava de Luca por conta própria,
com medo de deixá-lo sem vigilância, mesmo que por um momento. Ele conta
como se sentiu quando descobriu o que Chiara havia feito comigo e que
estava pronto para matar todos, tão enlouquecido de tristeza que estivera.

— Tenho vergonha de dizer que poderia ter seguido você, — ele confessa
e meu coração se parte por ele e pelo que passou.
Eu era egoísta por não ouvir o lado dele mais cedo?

Eu tinha acabado de me decidir sobre a traição dele e estava decidida a


fazê-lo pagar.

Mas enquanto ele continua me falando sobre seu plano, sua parceria
com Jimenez e, finalmente, a morte de Rocco, uma nova imagem começa a
surgir.

— Enzo, — sussurro, — o que você fez?

— Eu vendi a famiglia. Sou praticamente um traidor, mas de alguma


forma ninguém sabe, — ele ri, mas não atinge seus olhos.

— Por mim? — Minha voz quebra porque eu nunca esperaria que


alguém fizesse algo assim por mim.

— Por você e por o nosso filho. Eu queria me livrar da famiglia e


oferecer uma vida normal quando você acordasse. Sem violência... apenas
uma vida normal, — ele suspira. — Quando descobri que você estava em
contato com o FBI, percebi até onde eu tinha te levado.

— Acabei de dar à luz e fiquei aterrorizada, Enzo. Tudo o que importava


naquele momento era Luca e me certificar que ele estava seguro. Eu não
podia pensar em mais alguma coisa, — explico. Se ele é um traidor, eu
também, porque eu estava pronta para vender todos para proteger meu
bebê, independentemente das consequências para mim. — Você se... — Eu
deixo escapar, sem saber como perguntar se ele se ressente de mim por
minha escolha.

Ele rapidamente balança a cabeça, quase como se estivesse lendo


minha mente.

— Não posso culpar você por tentar partir. Não quando eu estava
cegamente sufocando você com minha obsessão, — ele faz uma pausa, me
dando um sorriso triste. — Quando vi o olhar em seus olhos depois que matei
aqueles guardas... algo clicou dentro de mim. Eu sabia que estava no ponto
de não retorno e não fazia ideia como consertar.

Levando minhas mãos nas dele, ele as leva aos lábios.

— Então eu parti para lhe dar o que você queria. Uma vida normal.

Seus planos não foram exatamente do jeito que ele queria, pois ele
atualmente possui o império Agosti e metade dos negócios de Jimenez.

Ele acaba me dizendo tudo o que fez nos últimos anos, chegando a pegar
um documento de nomes de todas as mulheres com quem ele foi visto e
entregá-lo para que eu possa me convencer de que nunca tocou em nenhuma
delas.

— Eu nunca estive tentado, little tigress. Nem uma vez, — ele admite
quando eu o questiono mais, já que eu tinha visto o quão lindas eram essas
garotas.
— Não sei o que dizer, Enzo, — falo depois de um longo momento de
silêncio. — É muito para absorver.

— Eu sei, — ele assente, franzindo os lábios. — Eu te prejudiquei


muitas vezes. Mas por todos os meus pecados, por favor, saiba que eu nunca
menti sobre amar você ou ser fiel. Você é a única para mim, little tigress, —
ele me dá um sorriso torto se inclinando para pegar a faca, envolvendo
minhas mãos em volta dela.

— E se você ainda quer sua vingança, é sua. — Ele aponta a faca em


direção ao peito nu, a ferida sangrenta que eu causei antes me encarando e
me fazendo estremecer.

— Você me ama? — Eu levanto meus olhos para os dele, querendo a


confirmação de seus lábios.

— Sim, Allegra. Eu te amo mais do que qualquer coisa no mundo. — A


sinceridade crua escorre de suas palavras, e o gelo ao redor do meu coração
derrete um pouco.

— Eu também te amo, Enzo, — digo a ele pouco antes de posicionar a


ponta da faca sobre seu coração.

— Para sempre, — sussurro empurrando para a pele dele.


CAPÍTULO VINTE E NOVE

Eu fechei meus olhos, esperando pela morte que está por vir. Se foi isso
que minha little tigress decidiu, então eu vou aceitá-lo.

Sinto a faca cavando na minha pele, mas é apenas o nível da superfície.

— Feito, — ela brinca, me levando a abrir meus olhos. Eu franzi a testa


para ela, minhas mãos vão para o meu peito. Há um pouco de sangue
pingando na minha pele, mas quando sinto ao redor da ferida, noto as
bordas.

— É um A. Agora você é meu para sempre. — Ela levanta o queixo um


pouco, desafiando-me a discutir com ela.
Rindo, só posso concordar com ela.

— Se estou vivo, sou seu e se estou morto também sou seu. De qualquer
maneira você vence, — acrescento brincando, mas a expressão dela se torna
séria.

— Como eu poderia te matar se isso significaria matar meu próprio


coração? Eu não poderia te matar quando pensei que você tinha me traído,
muito menos agora, quando sei a verdade.

Ela deixa cair a faca, movendo-se de joelhos até que estamos separados
por meras respirações.

Suas mãos se estendem para acariciar minha mandíbula, os olhos


voltados para baixo e melancólicos.

— Eu te amo há tanto tempo, Enzo, — ela começa, e essas palavras se


apertam no meu coração como nada mais. Foda-se se eu nunca sonhei em
ouvi-la dizer isso para mim tantas vezes ao longo dos anos.

— Mesmo quando eu não entendi o que era o amor, — continua ela, o


canto dos lábios puxando para cima, — você era muito especial para mim.
Você me tratou como uma rainha e, pela primeira vez, pensei que talvez
valesse algo mais.

Saber que ela não reconhece seu próprio valor me dói mais do que tudo,
porque significa que não fiz meu trabalho direito.
— Você é minha little tigress. Para mim você vale tudo.

E juro que, a partir deste momento, farei ver o quanto você é um tesouro.

— Mas você também me machucou, — ela respira fundo, baixando os


olhos, — tantas e tantas vezes... Eu estava pronta para lhe oferecer meu
coração já atingido e você jogou na minha cara. Eu estava pronta para abrir
minha alma, e sua primeira rejeição doía tanto que acho que nunca mais
baixei a guarda, com medo de que você acabasse comigo.

— Eu sinto muito! Porra! Palavras nunca podem expressar o quanto


sinto muito pelo meu péssimo comportamento. Só peço que me dê outra
chance. Deixe-me amá-la e provar a você que seu coração está seguro
comigo, exatamente como o meu está seguro com você, — levo minha mão
para tirar um pouco de sangue do meu peito e borrar bem no coração dela.

Ela sorri, o primeiro sorriso genuíno que eu já vi desde sempre, e sinto


vontade de chorar ao ver.

— Ok, — ela sussurra, e eu não perco tempo puxando-a para mim,


envolvendo minhas mãos em volta da caixa torácica e trazendo a sua boca
para a minha. Eu provoco seus lábios abertos, deslizando minha língua para
dentro e devorando-a como o homem faminto que sou.

— Little tigress, — eu a respiro, inalando sua essência, — lembra de


quando você me acusou de enfeitiçar você? — Eu pergunto a ela, divertido
com a memória. — Deve ser eu acusando você de bruxaria, porque não acho
que exista algo mais potente do que o que sinto por você. É simplesmente...
Eros.

O amor que supera tudo.

Seus olhos se arregalam na compreensão, a boca se abre em um


pequeno gemido.

— Eu também. Mesmo quando eu queria te odiar, eu te amava tanto,


que pensei que meu coração iria explodir, — ela balança a cabeça, o rosto
cheio de emoção. — Você é o único para mim, Enzo. Você sempre foi, — ela
me dá um sorriso malicioso, os dedos acariciando minha mandíbula, — você
percebe que eu nunca olhei para outro homem.

— E isso, — digo, dando-lhe um selinho rápido, — me faz o homem mais


feliz. Porque confie em mim, se você tivesse, eles não estariam vivos, de
qualquer maneira.

— Selvagem, — ela ri, levantando uma sobrancelha para mim.

— Mas é verdade, — afirmo, incapaz de tirar os olhos dela.

Um sonho tornado realidade.

— Uma última pergunta, — diz ela, olhando com tristeza. — Você


sente... — a sua respiração trava na garganta e ela libera uma pequena
tosse, — sente nojo de mim agora que matei minha própria família? — Ela
não encontra meu olhar, então eu uso meus dedos para virar o rosto para
mim, persuadindo-a a me olhar nos olhos.

— Não tenha vergonha de nada, little tigress. Não comigo. — Rastreio


o contorno de suas bochechas, me perdendo na clareza de seus olhos, — como
eu poderia me sentir enojado por você quando fiz o mesmo com os meus.
Somos mais parecidos do que você imagina, — dou a ela um sorriso
encorajador, — duas peças quebradas de um todo que finalmente se fundem
novamente. Se existem almas gêmeas, você é minha. Nunca duvide disso.

— Você é um demônio de língua prateada, — ela murmura sob a


respiração, mas os cantos da boca estão se levantando, ela está tentando
lutar contra um sorriso.

— E você é minha tigresa sangrenta, e eu tenho que admitir que foi


quente vê-la esfaqueando seu pai até a morte.

— Você estava assistindo? — Os olhos dela se arregalam e pega minha


mão com a dela.

— Claro. Eu nunca me arriscaria com sua segurança. Dito isto, eu


queria que você assumisse o controle de seu próprio destino, — eu pisquei
para ela.

— Obrigada, — ela suspira profundamente, — eu precisava fazer isso.


Precisava recuperar minha própria independência e tudo o que roubaram
de mim. Eu sei que está fodido, mas.
— Não, sem, mas little tigress. Não duvide de você mesma. — Ela franze
os lábios, mas acena devagar, com os olhos nos meus.

Continuo tocando-a, a sensação dela em meus braços vale todos os anos


de saudade. Minhas mãos estão por toda parte em seu corpo enquanto eu a
trago contra mim, inalando seu perfume e me divertindo com esse sonho que
se tornou realidade.

— Enzo, — ela de repente chama meu nome, sua expressão bastante


atenciosa.

— Hum? — Eu pergunto, meus lábios já traçam a coluna do pescoço


dela, famintos, inquietos por ela.

— Faça amor comigo, por favor, — ela sussurra suavemente, um


pequeno ponto vermelho manchando suas bochechas.

— Você não precisa perguntar duas vezes, tigress.

Estou tentando muito me controlar e dar a ela uma experiência lenta e


sensual. Após o fracasso da última vez, quero que sinta todo o meu amor.

Eu roço parte de baixo dos seios com a mão, pegando o suéter e


puxando-o para fora dela. Ela não está usando sutiã, e a visão de seus peitos
está fazendo minha boca ficar salivando.

— Caralho, apenas a visão de você assim, — balanço minha cabeça,


palavras me faltando.
Mas pretendo adorar o corpo dela hoje, para que não tenha dúvidas dos
meus sentimentos.

Seus dedos traçam minha ferida, as sobrancelhas juntas.

— Dói? — ela pergunta, inclinando-se para beijá-la. Sua língua foge e


ela traça o contorno do corte, lambendo o sangue. Sinto uma sensação de
formigamento no local, mas sua boca é como um balsamo, tirando toda a dor
e deixando apenas a felicidade para trás.

Ela se move lentamente, lambendo o caminho pelo meu pescoço até


chegar à minha mandíbula, uma centelha de malícia nos olhos.

— Você vai ser uma tigress travessa hoje? — Eu pergunto e ela ri, seus
braços enrolados ao meu redor, seus lábios procurando os meus.

Eu a beijo como se ela fosse a costa e eu fosse o mar, as ondas que


engolem a areia acolhedora, esquecendo onde um termina e o outro começa.
Forjado no fogo, mas temperado na água, o yin e o yang do ser.

Porque somente em seus braços eu realmente me sinto inteiro.

Eu a seguro com força enquanto nossas bocas se fundem, seus mamilos


roçando no meu peito, meu sangue manchando ainda mais sua pele
intocada.

Mordiscando nos lábios, eu me movo para a sua bochecha, arrastando


minha língua em direção à orelha dela.
— Abismo, — sussurro contra a pele dela, — como um poço sem fundo,
meus sentimentos por você não têm limites. Vazio ou infinito, é apenas uma
questão de perspectiva.

Ela vira a cabeça em minha direção, suas pupilas dilatadas pelo desejo,
suas íris afogadas pela excitação, — infinito, — ela sorri: — Eu gosto disso,
— diz ela e seus lábios estão nos meus mais uma vez.

Deitei-a devagar, meu corpo cobrindo o seu, minhas mãos vagando por
toda a pele nua. Mergulhando minha cabeça para baixo, movo minha boca
pelo pescoço, alcançando seus peitos. Pego um broto na boca, girando a
língua em volta enquanto massageio o outro com a mão.

Ela arqueia as costas, trazendo a metade inferior para mim e eu a


provoco.

— Enzo, — seu som ofegante é todo o incentivo que preciso para


continuar.

Mãos no meu cabelo, ela está pressionando meu rosto nos peitos, um
arranhão de dentes contra o mamilo, fazendo-a gemer de rendição.

Depois de oferecer as mesmas ministrações ao outro mamilo, eu me


movo mais baixo, minhas mãos correndo para abrir as calças e puxá-las das
pernas.

Ela está usando um pedaço de tecido como calcinha, o contorno de seus


lábios da boceta visível através do pano branco encharcado.
Enterro meu nariz entre as pernas dela, inalando seu perfume
almiscarado. Quando uso minha língua para dar-lhe uma longa lambida, ela
choraminga, levantando os quadris para encontrar minha boca.

Tigress gananciosa.

— Porra, amor, você está pingando, — eu corro contra sua carne


sensível, soprando ar quente e fazendo-a se contorcer debaixo de mim.

Ela envolve as pernas em volta do meu pescoço, me trazendo junto


contra ela.

— O que você precisa, little tigress? Diga-me: — Exijo, usar um dedo


para torturá-la através do material frágil.

Olhos fechados, ela lança um gemido estrangulado quando deixo meu


dedo deslizar cada vez mais baixo.

— Sua boca, — ela solta, suas coxas se apertando ao meu redor.

— Minha boca, — continuo acariciando-a com o dedo, querendo ouvi-la


pedir, — onde você quer minha boca?

— Aí, — ela geme suavemente, moendo-se em mim, — na minha boceta.

Eu aperto a calcinha dela e puxo para fora, arrancando o material,


finalmente tendo acesso à sua linda boceta.
Mergulhando um dedo entre os lábios, eu a encontro pingando e pronta,
sua excitação agarrada ao meu dedo como um creme doce.

Vê-la toda molhada e pronta é suficiente para aguçar meu apetite já


voraz. Envolvo minha boca em torno de seu clitóris em um beijo aberto,
minha língua acariciando como ela gosta. Ela começa a se contorcer debaixo
de mim, e eu dou uma longa lambida da bunda para o monte, usando minha
língua para sondar em sua entrada, provocando e mordiscando até que
esteja espasmando, suas coxas se apertando em torno da minha cabeça, suas
mãos cavando no meu couro cabeludo.

Morrer adorando sua boceta pode ser apenas o melhor tipo de morte.

— Enzo, — ela grita, puxando meu cabelo, sua respiração esfarrapada


enquanto ela alcança aquele nível alto, — eu estou vindo.... Eu estou... —
ela segue, sua boceta me inundando com seus sucos e eu a colo em mim,
afogando-me em sua essência.

Ela já está mole, gasta após o orgasmo enquanto eu dou um beijo na


boceta dela, lentamente subindo até a barriga, os seios e o pescoço antes de
finalmente beijar a boca.

Com um sorriso malandro, ela empurra meus ombros, rolando comigo


até que eu esteja de costas. Montada em mim, ela tem um brilho perigoso
nos olhos enquanto pega a garrafa de uísque e a derrama lentamente no
peito, o líquido âmbar fluindo em um rio hipnotizante entre o vale de seus
seios. Levanto-me, pegando-a pela cintura e aproximando-a, minha boca
aberta para absorver seu néctar.

Algumas gotas de uísque caem na minha ferida, e a combinação de dor


e prazer me faz assobiar.

— A dor, — ela começa deixando o líquido pingar no meu estômago, —


é por partir meu coração, — sua voz está cheia e rouca, e nenhuma dor no
mundo impediria meu pau de endurecer apenas com esse som.

Colocando a garrafa ao meu lado, ela me empurra para o chão antes de


lamber as gotas de uísque com a língua.

Ela se move mais baixo até chegar às minhas calças. Levantando a


cabeça um pouco, ela me olha nos olhos, a pergunta não dita.

Tigress atenciosa.

Ela deve ter entendido por que eu sempre evitei esse ato em particular,
mas desde que larguei minha mãe no fundo do Hudson, comecei a perceber
que eu poderia de fato deixar o passado para trás.

— Desta vez sem dentes, — digo a ela, minha voz rouca, meu pau duro
já se esforçando contra o zíper.

Ela ri suavemente, balançando a cabeça.


— Somente prazer desta vez, — sua bochecha está bem acima da minha
protuberância, enquanto ela está traçando o contorno do meu pau com a
boca entreaberta, — por colocar meu coração de volta.

Seus dedos ágeis são rápidos em trabalhar o zíper, abaixando-o até que
ela faça contato com minha carne quente. Ela libera um suspiro suave
tentando envolver a mãozinha ao meu redor, os dedos não se encontram
exatamente enquanto ela me acaricia para cima e para baixo.

Eu expiro com força, meus olhos se fecharam enquanto me concentro


em seu toque inocente.

— Tigress, — eu gemo quando seus dedos escovam a parte de baixo, o


polegar na cabeça do meu pau, passando a umidade e usando-a como
lubrificante — você está me matando, — mal posso falar enquanto ela
abaixa a mão para minha base antes de arrastá-la para cima novamente.

— Eu amo seu pau, — ela sussurra, inclinando a cabeça para me dar


uma lambida provisória, provando as gotas de pré-sêmen vazando da ponta.
Ela dá um beijo antes de soprar e fazer os pelos do meu corpo se arrepiarem,
minhas bolas doendo de antecipação.

— Eu nunca vou lhe causar dor novamente. Promessa, — ela me dá um


sorriso travesso e então sua boca está em mim, aberta e convidativa
envolvendo os lábios ao redor da cabeça, me chupando.
— Porra, — uma respiração e ela sabe que me tem à sua mercê. Ela me
dá uma lambida lenta da base à ponta, o tempo todo olhando para mim com
uma centelha desonesta nos olhos.

— O que você está fazendo comigo, little tigress, — mal forço as palavras
enquanto ela me leva mais fundo, sua boca quente envolvendo meu
comprimento até que a cabeça do meu pau bata na parte de trás da
garganta. Suas mãos estão massageando suavemente minhas bolas, seu
toque tão eficaz quanto dinamite.

— Porra, inferno, — assobio, mãos nos seus cabelos enquanto empurro


na boca dela, meus músculos tensos, o prazer intenso demais.

— Você gosta do meu pau na garganta, não é, minha tigress travessa?


— Eu raspo enquanto ela gira a língua bem embaixo da ponta.

Puta que pariu! Como eu tive tanta sorte?

O que quer que ela esteja fazendo comigo funciona, porque logo sinto
um formigamento na espinha e sei que estou perto.

— Estou vindo, — tento avisá-la, mas ela continua trabalhando comigo


até eu simplesmente explodir. Ela está lá para pegar enquanto engole cada
gotinha, olhando descaradamente para cima e lambendo os lábios como se
fosse a sobremesa mais deliciosa.
— Você é a melhor, — eu a arrasto pelo meu corpo para beijá-la,
provando-me nela como pode provar a mim. E porra se isso não me deixa
duro novamente.

Ela me empurra para baixo, olha para mim procurando algo. Um


pequeno sorriso aparece em seu rosto enquanto ela se move um pouco para
pegar a faca antes de me montar mais uma vez, meu pau descansando bem
entre os lábios de sua boceta.

— Allegra? — Eu pergunto enquanto a vejo deslizar a faca sobre a


palma da mão antes de arrastá-la pelo meu peito.

— Sua vez, — diz ela, sua voz melodiosa fascinante.

Eu nem pergunto o que ela quer dizer quando ela envolve meus dedos
sobre o punho, apontando a ponta da faca logo acima do peito.

— Faça de mim sua, — ela sussurra, empurrando para a frente até que
perfure a pele.

— Você é minha de qualquer maneira, — respondo, o pensamento de


machucá-la me deixando doente.

— Faça, — ela pede, apertando os dedos em cima dos meus.

Um olhar nos seus olhos e vejo a convicção — mas mais do que tudo,
vejo o seu amor.
Eu arrasto a faca para baixo em uma linha reta, aplicando a pressão
mais forte para romper a pele, o sangue cobrindo a lâmina, mas ainda não
o suficiente para machucá-la.

Sua respiração para e ela treme levemente em meus braços enquanto


eu gravo minha inicial em sua pele, excitação pingando de sua boceta
enquanto ela lentamente se move para frente e para trás em cima do meu
pau. Eu já estou duro, seus sucos cobrindo meu eixo, o aumento do atrito
pura tortura.

— Feito, — digo, soltando a lâmina e inclinando-se para sugar o sangue


escorrendo.

A parte de trás da sua mão vem na minha bochecha para uma carícia
doce.

— Eu quero te foder, Enzo, — ela sussurra no meu ouvido, — você me


deixa?

— Use-me, — digo a ela, — use-me e tenha prazer, little tigress eu sou


todo seu.

Um sorriso satisfeito aparece em seu rosto enquanto ela me dá um


empurrão suave. Eu caio nos cotovelos, o tempo todo observando-a,
encantado por seus movimentos sensuais e pela sexualidade fluida que
pinga dela. Eu sabia desde o início que sob tanto fogo só poderia haver uma
paixão vulcânica esperando para ser despertada.
Ela se levanta um pouco, movendo os quadris em uma dança sensual,
me provocando com o mero toque de sua boceta na minha pele. Meu pau está
duro e se esforçando por atenção.

Não importa o quanto eu gostaria de coloca-la de costas e mergulhar


nela, preciso esperar.

Este é o momento dela.

Ela mergulha a mão entre as pernas, juntando a umidade e


manchando-a no meu eixo. Fecho os olhos, reconhecendo que já perdi este
jogo.

Ela me tem na palma da mão e só consigo me concentrar em não me


derramar no local, o estímulo visual de seu corpo, tão sedutor — o epítome
da feminilidade — já me levando à beira.

Finalmente, tendo piedade de mim, ela me captura na mão,


posicionando a cabeça na entrada e lentamente se abaixando no meu pau.
Olhos entreabertos, boca aberta — rosa e molhada — ela geme quando eu a
encho, suas paredes engolindo meu pau com aconchego. A sensação é
diferente de qualquer outra. O canal dela me agarra com força, o calor me
recebe em casa.

— Little tigress, — eu deixo escapar quando ela se empalou ao máximo:


— Eu te amo.
Todo o rosto se acende, lágrimas se acumulando no canto dos olhos
quando ela retorna as palavras.

— Eu também te amo, Enzo. Para sempre.

Mãos no meu peito, logo abaixo do meu corte, ela se empurra para cima,
meu pau escorregando quase completamente dela antes de cair novamente.
Ela leva um momento para encontrar seu ritmo, mas logo está me montando
como fizemos isso um milhão de vezes no passado.

Ela dá um pequeno gemido quando meu pau atinge seu lugar. Minhas
mãos nos quadris, os próprios dedos brincando com os mamilos, ela está
totalmente no controle me fodendo com uma entrega total.

Eu a deixei tomar as rédeas até que ela estivesse me apertando, sua


boceta me segurando mais forte que uma luva. Seu rosto se abre, sua boca
se separando em um gemido crescente enquanto ela encontra sua libertação.

— Enzo, — ela choraminga, e é todo o incentivo que preciso para mudar


de posição, deitá-la de costas e bater nela.

Meus dedos cavando em sua pele, eu empurro profundamente nela,


empurrando com todo o desejo reprimido, fodendo-a como um homem louco.
Ela me encontra golpe a golpe, girando os quadris e apertando ao meu redor,
as mãos enroladas no meu pescoço e me trazendo para ela para um beijo.

— Você é perfeita, — eu gemo assim que gozo, meu pau empurrando


dentro dela e enchendo-a com minha semente.
Caio em cima dela, eu nos rolo para que ela esteja deitada no meu peito.
Eu a seguro em meus braços beijando sua testa, meu pau ainda se
contorcendo dentro dela.

— Então, — ela começa, sua voz um pouco insegura. — Acho que talvez
seja a hora de lhe contar uma coisa, — diz ela timidamente, enterrando o
rosto na curva do meu pescoço.

— O que é? — Minhas sobrancelhas se levantam de repente, com medo


roendo em mim.

— Hum... lembre-se daquela noite no baile? — ela levanta a cabeça


levemente para me espiar.

— Merda! — Eu exclamo, lembrando meu comportamento atroz. — Eu


fui muito duro com você? — Eu pergunto, com medo de tê-la machucado
acidentalmente.

Ela balança a cabeça.

— Não, claro que não, — ela é rápida em dizer, e um rubor envolve suas
feições.

Ela se levanta um pouco até que sua boca esteja ao lado do meu ouvido.

— Estou grávida, — ela pronuncia suavemente, seu tom incerto.


Mesmo antes de poder digerir completamente as informações, meus
lábios se estendem para um sorriso flutuante.

— Grávida, — repito, uma sensação de admiração me envolvendo. —


Tigress, essa é a melhor coisa que você poderia ter me dito. — Eu digo a ela
sinceramente, beijando seu nariz pequeno e atrevido.

— Meu Deus, outro bebê, — digo maravilhado.

Como eu me tornei tão sortudo?


CAPÍTULO TRINTA

Um mês mais tarde

— Posso ter outro, mamãe?

Viro-me para ver Luca segurando seu prato vazio e olhando para mim
com olhos de cachorrinho, esperando que isso lhe desse outra fatia de bolo.

— Claro que você pode, — eu arrumei o seu cabelo, pegando o prato dele
e cortando outra fatia.

— Aqui está, — eu entrego a ele, vendo a felicidade brilhar em seu rosto.

Como eu amo esse garoto!


— Obrigado, — ele sorri para mim, e não posso deixar de devolver o
sorriso.

— Você vai me dar um beijo, Luca? — Eu pergunto, apontando para


minha bochecha. Ele parece atencioso por um momento antes de sorrir
timidamente, me bicando na bochecha e fugindo.

Rindo de suas travessuras, volto para o bolo, cortando mais duas fatias
e levando-as comigo no sofá.

Enzo está no sofá, examinando alguns arquivos enquanto Luca está no


chão, assistindo seu desenho animado favorito e comendo bolo.

— Quer um pouco? — Eu empurro o prato em sua direção, mas ele


balança a cabeça, uma pequena carranca marcando a testa.

— Preciso terminar isso, — ele murmura, rapidamente me dando um


beijo antes de voltar sua atenção para os documentos.

Coloquei o prato dele na mesa e começo a comer o meu.

No período desde o funeral, tivemos que fazer algumas mudanças, uma


delas ser realocada.

Saímos da casa Agosti e entramos em um apartamento Midtown. Enzo


me disse que tinha construído este apartamento especificamente para nós,
com um forno industrial para o nosso passa tempo favorito e com espaço
suficiente para criar nossos filhos. Ele queria total autonomia de sua
família, mesmo assim.

Luca havia se dado muito bem com a mudança e estamos nos


aproximando todos os dias. Ainda não consigo acreditar que meu bebê tenha
quase cinco anos, flashes dele quando um bebê ainda passa pela minha
mente. Nós dois estamos nos conhecendo e meu coração está cheio de amor
por esse garoto, tão educado e bem comportado.

Eu sei agora que é tudo Enzo. Por tanto tempo, ele foi mãe e pai e
dedicou todo o seu tempo a garantir que nosso Luca crescesse amado e bem
ajustado.

Eu ouvi todas as histórias de maman Margot e ela não se esquivou de


me dizer o quão dedicado Enzo tem sido ao pequeno Luca, de trocar as
fraldas, acordar a cada poucas horas para alimentá-lo durante a noite ou
simplesmente levá-lo com ele em todos os lugares, com medo de deixá-lo
sozinho, mesmo que por um segundo.

Eu nunca pensei que poderia amá-lo mais, mas quando descobri tudo o
que ele fez por mim e por nosso bebê, meu coração se encheu de tanto amor
que eu caí em lágrimas.

— Mamma, — o pequeno Luca vem correndo em minha direção, um


pequeno livro em suas mãos. — Você pode ler isso pra mim?
— Claro, — concordo plenamente, dando um tapinha no local ao meu
lado para ele se sentar. — Vamos ver, — digo enquanto tiro o livro de suas
mãos.

Ele se aproxima de mim, com os olhos cheios de curiosidade enquanto


olha para as animações acompanhadas de texto.

Começo a ler e ele segue atentamente. Logo percebo que ele está
tentando combinar meus sons com as letras, e gentilmente pergunto se ele
quer tentar.

— Eu não sei... — Ele traz o polegar para a boca, parecendo pensativo.


— Suponho que posso tentar, — ele encolhe os ombros.

Abro os braços e ele se instala no meu colo, meu queixo descansando em


cima da sua cabeça enquanto eu o peço para começar.

— O coelho azul...

Apesar de toda a sua relutância tímida, suas habilidades de leitura são


excelentes, especialmente para alguém da sua idade. Eu tento corrigi-lo
suavemente quando ele pronuncia algo errado e o elogio quando ele acerta,
ganhando um sorriso triunfante a cada vez.

O livro é pequeno e não demora muito para terminá-lo de uma só vez.

Enquanto ele lê a última palavra e fecha o livro, ele está quieto, as


sobrancelhas franzidas em uma pequena carranca.
— Luca, há algo errado? — Eu escovo minha mão através dos cachos
dele, preocupada que eu possa tê-lo chateado.

Como sou relativamente nova nessa coisa de ser mãe, sempre tenho
medo de fazer algo errado, mesmo que Enzo tenha me garantido que é
impossível.

— Não, eu estava pensando, — ele vira o rosto pequeno em minha


direção, com os penetrantes olhos verdes me segurando no local.

Deus, ele realmente é a imagem cuspida de seu pai.

— O que você estava pensando?

— Eu gosto de estar com você mamãe, — ele começa, com suas feições
sérias, — você pode, por favor, não me deixar de novo?

Essa pergunta parte meu coração e eu o trago ao meu peito, segurando-


o enquanto me aperto. Lágrimas já estão caindo dos meus olhos e eu abafo
um soluço enquanto limpo minha garganta para falar.

— Eu prometo a você, Luca. Eu nunca vou te deixar de novo. Eu te amo


demais e nunca poderia deixar você, — digo a ele do fundo do meu coração.

Seus olhos procuram no meu rosto por qualquer sinal de engano e,


quando ele não encontra, me dá o sorriso mais brilhante que eu já vi.
— Promessa de dedinho? — Ele segura o dedo mindinho e eu envolto o
meu em volta do dele.

— Promessa, — declaro, dando rapidamente um beijo estalado na testa.

— Eu te amo mamãe, — diz ele quando pula do sofá e corre para o


quarto.

Fico ali, boca aberta, tão chocada, mas tão feliz que nem consigo
encontrar a reação certa.

Meu garotinho disse que me ama.

Eu posso ter perdido os outros marcos de sua infância e, embora ainda


haja muitos por vir, acho que posso ter experimentado o mais importante.

Ele me disse que me ama.

Eu nem percebo quando Enzo me atrai para o peito, me abraçando


enquanto soluço, compartilhando comigo esse momento incrível.

— Esse é o nosso garoto, tigress, — ele sussurra no meu cabelo. — Nós


o criamos juntos.

— Nós fizemos, — eu concordo, encostado nele. — Ele não é


maravilhoso? — Eu fungo, ainda chorando incontrolavelmente.

— O melhor. E você sabe o porquê? — Eu balanço minha cabeça.


— Porque ele faz parte de você. E você é o meu melhor, — ele beija
minha têmpora, me segurando perto enquanto me acalmo.

É muito mais tarde, quando estamos sozinhos na cama, cansados com


o ato sexual, que finalmente temos uma discussão que está na mente de
Enzo há muito tempo.

— Eu posso desistir de tudo, você sabe, — diz ele enquanto eu deito em


seu peito, seu pau ainda estava dentro de mim. — O império, o negócio...
tudo. Podemos nos afastar e começar uma nova vida.

Fico em silêncio por um digerindo o que ele está dizendo. Eu sei que ele
faria. Ele está tentando fazer isso nos últimos cinco anos. Mas isso não
significa que a máfia dará a ele privilégios.

— Não, — finalmente falo. — Eu não quero que você faça isso, Enzo.

— Por quê? Estaríamos a salvo e longe de uma vida de crime.

— Não estaríamos realmente seguros, e você sabe disso. — Eu


respondo.

Já tive tempo suficiente para lidar com muitas coisas, uma das quais é
o mundo em que vivemos.

— Se há algo que aprendi nesses últimos anos, — começo, um pouco


preocupada de poder chocá-lo com minha perspectiva alterada, — é que você
não pode fazer nada sem poder. Aqueles sem poder buscam mais poder, e
aqueles com poder se esforçam para mantê-lo. Sempre seríamos um
trampolim para as pessoas que desejam ganhar poder, quer queiramos ou
não.

O único fato de ele ser o herdeiro Agosti faria dele um alvo em todo o
mundo, sem mencionar o que os italianos fariam com ele por trair Cosa
Nostra.

— Não quero que nossos filhos sejam impotentes, porque vi exatamente


como o mundo trata aqueles que não têm nada de valor a oferecer. Quero
que eles estejam no topo, e podemos dar isso a eles.

— Little tigress, você percebe o que isso significa... — ele deixa escapar,
respirando fundo. — Luca terá que seguir meus passos um dia.

— Ele terá sua orientação. E confio que, com você como modelo, ele se
tornará um jovem honesto.

— Você tem muita confiança em mim, amor.

— Porque eu te conheço, Enzo. E a família vem primeiro. Para mim,


também, a família é sempre a primeira, e isso significa reconhecer que não
estaremos melhor se deixarmos a famiglia. Nós nunca teremos paz.

— Você está certa, mas eu não quero que você sacrifique seus valores
só por causa disso.
— Enzo, — eu me viro para ele para que possa ver meus olhos e a
convicção por trás deles, — meus valores morreram no momento em que
toda a minha família planejava me matar por um pedaço extra de pão. Eu
não sou a mesma pessoa que eu era antes. Eu aprendi a me adaptar a este
mundo.

Eu estendo a mão para acariciar seu rosto.

— Há um espectro para a moralidade, querido marido. E acho que estou


bem em estar na zona cinzenta.

— Tigress, — ele geme, trazendo minha mão aos lábios para um beijo
suave. — Você é meu coração, — diz ele antes de me puxar para mais perto,
com a boca na minha. — Nós faremos do seu jeito. Mas sempre que você
quiser sair, terei um plano de contingência em vigor. Eu te disse, desta vez
você toma as rédeas.

— Oh Enzo, acho que você não percebe o quanto eu te amo, — murmuro


contra os seus lábios.

— Sim, little tigress, sim. Porque eu te amo tanto, — ele envolve os


braços em volta do meu torso, seu pau pulsando para a vida dentro de mim,
e ele passa a me mostrar o quanto.
Eu puxo Luca para mais perto de mim enquanto caminhamos pelo
corredor e para nossos locais designados. Enzo está conversando
profundamente com Marcello e noto Catalina do outro lado, tentando
acertar o vestido da filha.

— Lina, — eu chamo, e ela olha para cima, acenando para nós.

Catalina tinha sido extremamente compreensiva quando contamos a


história toda, e ela foi rápida em me garantir que está lá para mim se eu
precisar de uma amiga. Dado que Luca e Claudia, sua filha, já são bons
amigos, nos encontramos algumas vezes no último mês para tomar um café.

Ter uma amiga é... incomum. Mas não desagradável.

Eu também conheci sua cunhada, Assis, a noiva de hoje, e ela tinha sido
igualmente graciosa em me receber no grupo delas.

Eu não tinha ouvido muito sobre o noivo, Rafaelo, exceto que ele é o
favorito de Benedicto Guerra, apesar de ter sido o segundo nascido. Olhando
em volta, fico feliz por não encontrar Gianna, mas desde que ouvi dizer que
ela fugiu com o guarda-costas alguns anos atrás, não é tão surpreendente.

— Estou tão empolgada com Sisi, — digo quando a alcanço.

— Eu também. Depois de seu inesperado aborto, estou tão feliz que


Marcello permitiu que ela se casasse com seu amado.
O aborto espontâneo de Assis aconteceu logo antes do funeral de
Chiara, e Lina me confidenciou que Sisi nunca mais foi a mesma desde
então.

— Ela estava tão cheia de vida antes... tão travessa. Ela era a rainha
das brincadeiras. Agora... mal podemos tirá-la da cama. — Lina me disse
com tristeza. Ela está preocupada com Sisi desde então.

— Ela vai ficar bem, você verá. Quando se casarem, tudo ficará bem, —
sou rápida em garantir a ela, mesmo que meu próprio casamento não tenha
sido um passeio no parque.

Como Sisi e seu noivo já se amam, estou confiante de que ela não
encontrará os mesmos problemas que eu.

Os convidados começam a entrar e todos nos sentamos. Eu mantenho


Luca perto de mim enquanto me encaixo contra Enzo, sua irmã e sobrinha
do outro lado.

Como Marcello é o irmão mais velho de Sisi, ele é quem a leva pelo
corredor.

Nós nos acomodamos bem e observamos o padre tomar sua posição, com
o noivo se colocando em frente ao altar.

Rafaelo parece elegante em seu smoking preto e cabelo com gel, mas
mesmo assim há algo estranho nele.
Ele parece nervoso enquanto espera Sisi no altar, batendo
continuamente no pé no chão.

Benedicto se inclina para sussurrar algo em seu ouvido e interrompe


brevemente seus movimentos erráticos, mas assim que a música de órgão
começa a tocar, ele volta a bater os pés.

Marcello e Sisi entram, de braços dados, e viro a cabeça para olhar o


vestido de Sisi.

Ela está deslumbrante em branco, seu véu de diamante


complementando requintadamente seus cabelos loiros claros.

Sua expressão, no entanto, é tudo menos feliz. Sua boca é desenhada


em uma pequena carranca, sua testa vincada no meio como se estivesse se
esforçando muito para se lembrar de um movimento ensaiado.

Ela certamente não parece uma mulher prestes a se casar com o amor
de sua vida.

— Enzo, — sussurro quando me viro para ele. — Você tem certeza que
é um casamento de amor? — Eu pergunto, confusa.

— Aparentemente, — ele encolhe os ombros. — Pelo que Lina me disse,


Assisi jurou de um lado para o outro que Rafaelo é o homem que ela ama e
quer se casar, — continua ele.
— Isso, — eu aceno para Assisi atualmente tomando seu lugar ao lado
de Rafaelo, — não parece uma mulher apaixonada.

— E como seria uma mulher apaixonada? — Ele pergunta, quase de


brincadeira.

Dou-lhe um pequeno empurrão antes de mergulhar minha cabeça para


sussurrar.

— Como eu olho para você, — eu imediatamente me viro, com um rubor


manchando minhas bochechas.

A mão dele pega a minha e me dá um aperto rápido.

O padre se lança em seu sermão, e mesmo agora posso ver como Sisi
está gelada enquanto ela se segura no braço de Rafaelo.

Estou prestes a me apoiar em Enzo para comentar novamente quando


de repente a sala inteira é inundada de fumaça.

Meu primeiro instinto é agarrar Luca e pegá-lo em meus braços. Enzo


coloca os braços sobre mim, empurrando-nos para o chão e protegendo-nos
com o corpo. Marcello faz o mesmo com Catalina e sua filha.

Disparos aleatórios começam a soar, com pessoas gritando e correndo.


A histeria dura uns bons cinco minutos até que a fumaça comece a se
dissipar. Todo mundo está no chão, subindo lentamente para ver o que havia
acontecido.

Rafaelo está sozinho no altar, olhando em volta desorientado. O padre


se levanta de debaixo da mesa, parecendo igualmente perplexo.

— Sisi, onde está Sisi? — A voz de Marcello cresce na igreja, e todo


mundo parece se encolher quando se enfurece.

Ele marcha para o altar, agarrando Rafaelo pelas lapelas e levantando-


o no ar.

—Onde diabos está minha irmã? — Ele grita com o pobre garoto.

— Eu-eu-eu ... — Rafaelo gagueja, — n-n-não s-s-sei. E-e-l-l-ela estava


aqui.

— Droga! — O punho de Marcello acerta na mesa do altar, quase


quebrando-a.

— É DeVille, — intercepta Benedicto, —só pode ser!

Considerando que DeVille havia tentado interromper uma fusão da


Agosti-Guerra no passado, seria lógico que eles tentariam o mesmo com
Lastra.

Mas como eles fizeram isso?


Enzo é rápido, dizendo para eu ficar parada enquanto oferece sua ajuda
a Marcello.

Todo mundo está tão confuso quanto olha ao redor da igreja.


Simplesmente não há vestígios de Assisi. É como se ela tivesse desaparecido
no ar.

— Espere, — chama Enzo, curvando-se para pegar um pedaço de papel,


— há uma nota, — ele levanta o papel — uma nota amarela — lendo em voz
alta o conteúdo.

Parece que perdi minha propriedade.

Não se preocupe, agora eu a recuperei.

Até mais,

XOXO
EPÍLOGO

Cinco Anos Depois, Shanghai, China,

— O que você disse que foi, erro? — Olho para Luca enquanto ele coloca
sua lupa sobre o pedaço de jade que acabamos de adquirir.

— Jade do imperador. Faz parte de uma máscara mortuária.

— Máscara mortuária? — Minha little tigress pergunta, entrando na


sala com uma caixa enorme nas mãos.

— Deixe-me ajudá-la, — imediatamente estendi a mão para tirar a


caixa das mãos dela.
— Onde você aprendeu essas palavras complicadas, garoto? — Ela
pergunta, agitando o cabelo dele enquanto ela se inclina para olhar a pedra
preciosa.

— Eu li sobre isso ontem à noite, — Luca suspira, já sabendo o que está


por vir.

— Ontem à noite, como quando você deveria estar dormindo? — Ela


arqueia uma sobrancelha para ele, mas ele apenas encolhe os ombros,
continuando o exame do pedaço de jade.

Uma coisa que Luca herdou de sua mãe é sua sede de conhecimento. O
garoto está lendo tudo o que consegue, às vezes até coisas muito acima do
nível da série.

Eu pisco para Allegra, movendo-a para o lado.

Ao abrir a caixa, faço um inventário rápido de nossas armas. A troca


deve ser pacífica, mas aprendemos a nunca subestimar a situação.

Embora Allegra e eu tivéssemos concordado em continuar nossas vidas


na família, eu me retirei lentamente da cena pública de Nova York,
deixando Nero, minha mão direita de confiança, lidar com tudo o que estava
do lado do Estado. Em vez disso, começamos a passar mais tempo na
Europa, mudando-se permanentemente para o meu palazzo em Gozo.

Allegra foi rápida em mergulhar no mundo do tráfico de arte e gosta de


passar seu tempo pesquisando artefatos e potenciais compradores.
Enquanto fazemos a maior parte das negociações nos bastidores, em algum
momento gostamos de nos envolver pessoalmente em uma troca, como
agora.

Como eu havia avaliado essa missão como de baixo risco, também


levamos Luca conosco.

Ele pode ter apenas dez anos, mas ele é o nosso pequeno Indiana Jones
em formação, sua paixão por antiguidades rivaliza com a de sua mãe.

— Deveríamos deixar Luca no hotel, — minha little tigress se inclina


para sussurrar para mim.

— Você acha que ele vai nos deixar? — Eu pergunto com desdém. Ele
precisa estar presente onde está a ação, de uma maneira ou de outra. Se não
o levarmos conosco, podemos encontrá-lo no porta-malas do carro. — Você
sabe que ele tem o que quer, — continuo em voz baixa.

Allegra está checando as armas em busca de munição, olhando de vez


em quando para Luca.

— Eu sei, mas e se isso ficar perigoso? — Ela suspira, abaixando a


pistola e descansando a cabeça no meu ombro.

— Até agora, tivemos apenas boas experiências, mas estamos em um


país estrangeiro, um em que nunca negociamos antes. Só não quero
surpresas.
— Eu sei, little tigress, eu sei. Mas é melhor se o levarmos conosco nos
nossos termos, em vez de acordar com ele lá, no meio da ação. — O que não
duvido que aconteça.

Apesar de todo o seu comportamento silencioso, Luca é muito astuto e


sua capacidade de ler uma sala é incomparável. Mesmo agora, embora ele
pareça fascinado pelo jade, tenho certeza de que está avaliando nossa
linguagem corporal, suspeitando do que estamos planejando algo.

— Dê uma arma para ele, — digo a ela e seus olhos se arregalam em


choque.

— Enzo! — Ela exclama, enfurecida, mas ainda sussurrando.

— Ele sabe atirar. Dê a ele uma, apenas por precaução, e então podemos
estar mais em paz.

Ela franze os lábios, estreitando os olhos para mim, mas ela finalmente
concorda.

Allegra pode ser a mãe galinha, mas ela também está ciente do que o
futuro de Luca implica, então ela tentou não o mimar demais. Ainda atento
à sua segurança, sempre tento empurrá-lo além dos limites. Certamente
além do que qualquer outro pai normal permitiria. Mas ela foi a primeira a
apontar que é melhor encoraja-lo a tentar coisas em um ambiente
controlado, em vez de fazê-lo fazer tudo sozinho e potencialmente se
machucar porque não estamos lá para supervisionar.
E não posso deixar de ficar encantado com ela. Ela nunca deixa de me
surpreender com sua força e coragem. Provavelmente serei eternamente
grato a DeVille por tentar me matar, porque se isso não tivesse acontecido,
nunca teria conhecido minha little tigress.

Eu dei um beijo na sua testa, e nós dois nos preparamos para a troca.

— Mal posso esperar para voltar para minhas garotas, — ela solta um
suspiro triste enquanto veste o colete à prova de balas.

Diotima, a mais velha, tem quatro agora, enquanto Nerissa, a mais


nova, tem apenas dois. Ambas estão atualmente com maman Margot e Lia.
Elas foram nossas babás em momentos como este, e acho que não
conseguiria confiar nas minhas meninas com mais alguém.

— Eu também, little tigress. Eu também, — respondo, abotoando a


camisa e beijando rapidamente os seus lábios. Eu faria muito mais, já que a
ver com uma arma amarrada na coxa só está me deixando
desconfortavelmente duro. Seria tão fácil dobrá-la e deslizar dentro dela...

— Tira a mente da sarjeta, senhor, — ela ri de mim, apontando para


minhas calças já com uma tenda.

— Você sabe que eu não posso evitar, — eu reclamo, fazendo beicinho


para ela, para que pelo menos me desse um beijo para durar até hoje à noite.

Ela tem pena de mim e se levanta na ponta dos pés para encaixar a
boca na minha.
— Precisamos nos apressar. — Luca passa casualmente por nós para
pegar uma arma menor.

— Se você diz filho, — eu limpo minha garganta, desejando que minha


ereção desapareça.

A troca é realmente bastante pacífica, e o pedaço de jade da dinastia


Han nos dá um belo dinheiro.

Só mais tarde, quando voltamos ao hotel, levo meu filho de lado para
conversar um pouco.

— Esse dinheiro é seu, Luca, — digo, mostrando a ele a conta que abri
em seu nome. — Você ainda não poderá acessá-lo, mas fez a maior parte do
trabalho de pesquisa para esta venda, por isso é justo que você obtenha a
maior fatia.

Explico a ele como o dinheiro estará lá até a maioridade, e todo trabalho


para o qual ele contribuir lhe dará mais dinheiro.

Ele assente com cuidado.

— Obrigado papa, — ele responde, me dando um abraço antes de se


instalar no seu quarto.

Quando também vou para o meu quarto, me deparei com minha little
tigress espalhada na cama e sorrindo para mim.
— Eu já te disse que você é um ótimo pai? Não, não é ótimo, o melhor,
— ela envolve os braços em volta do meu pescoço quando eu me junto na
cama.

— É mesmo? — Eu pergunto, braços em volta da sua cintura e trazendo-


a para mim.

— É importante que ele reconheça o valor do dinheiro e que tenha que


trabalhar primeiro. Então, sim, você é o melhor pai, — ela leva meus lábios
para um beijo.

— Devemos... — Eu paro, minha mão na barriga dela, — tem outra?

Ela inclina a cabeça para o lado, estudando-me.

— Agora não, — ela sussurra, a mão acariciando minha bochecha, —


talvez quando Luca e as meninas estiverem mais velhas.

— Seu desejo é uma ordem. Sempre.


Um Ano Depois, Gozo, Malta

Fechando meus olhos, respiro a brisa da manhã e o cheiro do mar.

— Ei, você vai pegar um resfriado, — Enzo vem por trás, enrolando um
cobertor em volta dos meus ombros.

— Às vezes eu gostaria que nunca saíssemos daqui, — digo quando seus


braços se aproximam de mim, me segurando.

— Eu também, little tigress, mas precisamos do mundo tanto quanto


ele precisa de nós, — sinto o hálito contra a minha pele e um arrepio desce
pelas minhas costas. Ele nunca deixou de me fazer sentir assim, não importa
quantos anos se passem.
— Você pode acreditar que é o nosso décimo quinto aniversário de
casamento? — Ele pergunta, olhando para o horizonte.

— Quem pensaria que estaríamos aqui hoje? — Eu murmuro em voz


alta.

Certamente não eu, dado o começo difícil do nosso casamento ou os


problemas subsequentes que encontramos. Mas avançamos e, contra todas
as probabilidades, conseguimos construir uma vida para nós mesmos.

— Mamma, — Eu me viro para ver Diotima seguida por Nerissa


enquanto elas correm em nossa direção. Luca está lentamente atrás delas,
com o olhar no livro nas mãos.

— Venha aqui, — eu me inclino para pegar Diotima nos meus braços


enquanto Enzo pega Nerissa.

— Como é que vocês duas acordaram tão cedo? — Eu levanto uma


sobrancelha para elas.

— Rissa estava entediada, — aponta Diotima para a irmã.

— Eu não! — Ela é rápida em se defender. — Dio queria sair, — nossas


filhas mais jovens, parecendo tão inocentes, mas tão astutas.

Dirijo-me a Enzo e vejo que ele está lutando para não sorrir.
Segundo nossas garotas, é sempre a outra que instiga tudo. Tivemos
experiência suficiente com suas travessuras para perceber que geralmente
é de comum acordo. Elas apenas gostam de provocar uma a outra para ver
quem tem mais chances de ter problemas.

— Devemos ir para o café da manhã agora que você está pronta, — dou
um passo à frente, Enzo seguindo com Rissa.

Luca fica para trás, uma pequena carranca de consternação em suas


feições.

— Luca? — Paro para perguntar, percebendo que ele não vem.

— Eu entendi agora, — diz ele, piscando duas vezes.

— O que é, querido?

— Diotima. Eu sei onde você conseguiu o nome, — diz ele, levantando


o livro para que possamos ver o título.

Olho para Enzo e, pela primeira vez, noto a presença de um leve rubor
nas bochechas.

— Está certo, filho, — ele responde, com os olhos procurando os meus.

— Por quê? — Luca pergunta, sua curiosidade inocente, quando a


resposta é tudo menos.
— Enzo, por que você não leva as meninas para dentro e eu vou
conversar com Luca, — o empurro gentilmente, depositando Diotima em
seus braços.

— Boa sorte, — ele me dá um beijo rápido antes de sair, aliviado por


não ter que explicar.

Colocando minha mão nas costas de Luca, tento encontrar as melhores


palavras para descrever a situação, principalmente porque este não é um
texto para alguém da idade dele.

— Aqui, — aponto para o livro dele, — Diotima é a última a falar, e a


ideia dela de amor é que tudo é abrangente.

Ele assente, me observando atentamente.

— É assim que papai e eu sentimos um pelo outro. E sua irmã é o


resultado desse amor, então, como homenagem, nós a nomeamos como
Diotima.

Ele me considera pensativo, digerindo as informações.

— Você ama papai muito? — Ele pergunta de repente, e um sorriso se


espalha no meu rosto.

— Muito é um eufemismo. — Eu digo a ele. — Seu papai é a minha


segunda metade.
Luca franze os lábios, estreitando os olhos para mim antes de assentir
lentamente.

— Entendo, — ele responde, inclinando a cabeça para o lado. — Eu


quero isso também... uma segunda metade.

Lutando contra lágrimas de felicidade, eu o trago ao meu peito para um


abraço, já muito orgulhosa dele.

— Você também encontrará a sua, querido. Apenas mantenha seus


olhos abertos. Às vezes acontece quando você menos espera.

Eu nunca imaginei que estaria aqui hoje quando disse Eu aceito na


frente daquele padre, quinze anos atrás. Mas, apesar de toda a dor, abuso e
perda que sofri, também recebi o maior presente de todos — o amor. Entre
Enzo e as crianças, sou simplesmente mimada por amor.

Se uma vez eu fui a garota mais miserável do mundo, agora sou


simplesmente a mais sortuda.

FIM

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