Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
ACÓRDÃO
EMENTA
RELATÓRIO
acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que deu parcial provimento
segunda.
A ementa do acórdão recorrido foi redigida nos seguintes termos (e-STJ fls.
851):
jurisprudencial, a violação dos arts. 21, parágrafo único, 461 e 489, § 1º, II, IV, V e
VI, 497 e 499 do CPC, dos arts. 10, 15, 19, 21 e 22 da Lei n. 12.965/14, arts. 14 e
17 do CDC, dos arts. 17, 20, 21, 186, 944 e 927 do CC e dos arts. 102 e 103 da Lei
deixado de adentrar na discussão acerca do fato novo; b) que, por ter a recorrida
ordem judicial para que o provedor de aplicação remova obra protegida por direitos
autorais; c) que se trata de fotos e de vídeos contendo nudez explícita, razão pela
requerida, que lhe causou danos morais indenizáveis, diante da utilização indevida
à sua imagem; g) que o art. 21 da Lei n. 12.965/14 não exclui as cenas de nudez
realizadas com intuito de lucro, não sendo permitido realizar distinção não prevista
parcial da sentença, decaiu de parte mínima de seu pedido, devendo ser atribuídos
dissídio jurisprudencial, bem como a violação dos arts. 5º, VIII, 15 e 22 do Marco
dados pessoais de usuários cujo fornecimento não está previsto no Marco Civil da
Marco Civil da Internet impôs aos provedores o dever de guarda e sigilo dos
registros de acesso às suas aplicações por parte dos usuários, sendo que tais
fls. 1.136-1.137).
É o relatório.
VOTO
recurso especial interposto por C R C e não deve ser conhecido o recurso especial
interposto por G B I L.
controvérsia.
forma integral a lide, o que, sem dúvida, foi realizado de forma suficiente pelo
Tribunal a quo.
Nesse sentido:
II – Da ausência de prequestionamento
103 da Lei n. 9.610/98 e dos arts. 21, parágrafo único, 497 e 499 do CPC.
tendo o Tribunal de origem emitido juízo de valor acerca das matérias por eles
disciplinadas, ainda que não tenha havido negativa de prestação jurisdicional.
Ocorre que, neste ponto, sequer foi apontado corretamente o dispositivo legal
Com efeito, alegou-se, neste ponto, tão somente a ofensa ao art. 21, parágrafo
único, do CPC/15, norma que não guarda qualquer relação com o quanto discutido
nos autos.
relativas a seu nome nos URLs indicados do buscador da Google, já que estariam a
Nesse sentido:
Cito, por oportuno, doutrina abalizada a respeito do tema (in Marco Civil da
Affonso Souza, Ronaldo Lemos, Celina Bottino – São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2017):
Como regra, portanto, deve ser observada a reserva de jurisdição para que o
representante legal.
tal, deve ser interpretada restritivamente, sendo imprescindível notar que a adoção
excepcional do sistema do notice and take down prevista no art. 21 do Marco Civil
privado.
verdadeiro intuito daquele que dissemina imagens íntimas de forma não consentida
se afigura irrelevante, mas abrange todo e qualquer modo que possa assumir esta
uma tentativa de possibilitar à vítima desse tipo de violência uma remoção mais
3. a violação à intimidade.
sites específicos.
maior seria o benefício econômico auferido pela editora e pela própria autora.
Por fim, não houve violação direta ao direito de intimidade, sendo que, por
disseminação de imagens íntimas não consentidas (NCII), em que a vítima tem sua
configura ato ilícito, não apenas violador de seu direito de imagem, mas
possivelmente também dos direitos autorais de que eventualmente são titulares a
Porém, essa ilicitude, por si só, não autoriza a aplicação do art. 21 do Marco
Civil da Internet, de modo que seria imprescindível uma determinação judicial para
judicial, não se pode decidir com base em valores jurídicos abstratos sem que se
consentimento dado pelo(a) modelo, tarefa que reconhecidamente não lhe pode ser
atribuída.
imagens íntimas (NCII) poderia acabar por desvirtuar a proteção dada às vítimas
Ocorre que os dispositivos legais apontados como violados não foram objeto
Com efeito, embora o Tribunal de origem tenha feito expressa menção ao art.
sobre IP, data, hora, e-mail, dados cadastrais da conta, números de acesso.
Não foi examinada, no entanto, a apontada suficiência dos dados de IP, sendo
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA DESTA CORTE. AÇÃO
INDENIZATÓRIA. PROTESTO INDEVIDO. DANO MORAL.
DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO VERIFICADA. DECISÃO
MANTIDA.
1. O conhecimento do recurso especial pela alínea "c" do permissivo
constitucional exige indicação do dispositivo legal ao qual foi atribuída
interpretação divergente e demonstração do dissídio, mediante verificação
das circunstâncias que assemelhem ou identifiquem os casos confrontados
(art. 1.029, § 1º, CPC/2015).
2. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no AREsp 1948019/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA,
QUARTA TURMA, julgado em 14/02/2022, DJe 17/02/2022)
C.
patrono da parte adversa, passando de 15% para 17% a verba devida por C R C e
de 10% para 12% aquela devida por G B I L, sobre o valor da causa, à luz do art.
É o voto.
Superior Tribunal de Justiça
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : CRC
ADVOGADOS : JULIO CESAR GORRASI - SP338430
VENCESLAU TAVARES COSTA FILHO - PE022407
RECORRENTE : GB I L
ADVOGADO : EDUARDO BASTOS FURTADO DE MENDONÇA - RJ130532
RECORRIDO : CRC
ADVOGADO : JULIO CESAR GORRASI - SP338430
RECORRIDO : GB I L
ADVOGADO : EDUARDO BASTOS FURTADO DE MENDONÇA - RJ130532
SUSTENTAÇÃO ORAL
Dr. JULIO CESAR GORRASI, pela parte RECORRENTE: C R C
Dr. EDUARDO BASTOS FURTADO DE MENDONÇA, pela parte RECORRENTE: G B I L
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
Após o voto do Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, não conhecendo do recurso
especial interposto por G B I L e negando provimento ao recurso interposto por C R C, pediram
vista conjunta a Sra. Ministra Nancy Andrighi e o Sr. Ricardo Villas Bôas Cueva. Aguardam os
Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro.
VOTO-VISTA
- RECURSO ESPECIAL DE C R C
2. Da ausência de prequestionamento.
VII. O acórdão recorrido não decidiu acerca dos arts. 102 e 103 da
Lei nº 9.610/98, dos arts. 14 e 17 do CDC e dos arts. 497 e 499 do CPC/2015, razão
pela qual o julgamento do recurso especial é inadmissível quanto ao ponto (Súmula
282/STF).
VIII. Portanto, no tópico, não conheço do recurso especial.
5. Da sucumbência mínima.
XXXXIII. Este Tribunal Superior consolidou entendimento segundo o
qual não é possível a apreciação da existência de sucumbência mínima ou
- RECURSO ESPECIAL DE G B I L
1. Do conhecimento do recurso especial.
XXXXV. Inicialmente, rogando vênias ao e. Relator, não se vislumbra
óbice ao conhecimento do recurso especial.
XXXXVI. Os arts. 5º, VIII, 15 e 22 do MCI indicados como vulnerados
pela recorrente, tratam dos dados que devem ser armazenados pelos provedores
de aplicações de internet e cujo fornecimento pode ser requerido em juízo, com o
propósito de formar conjunto probatório em processo judicial cível ou penal.
XXXXVII. Nada obstante a matéria não tenha sido analisada de forma
aprofundada no acórdão impugnado, foi objeto de exame, à medida em que a
Corte de origem acolheu o inconformismo deduzido pela recorrida (autora), para
determinar à recorrente (ré) o “fornecimento dos registros cadastrais de criação e
acesso a cada uma das páginas cadastrais de criação e acesso a cada uma das
páginas” (e-STJ, fl. 855). Ao final do acórdão aliás, esclareceu-se que os dados a
serem fornecidos correspondem a “IP, data, hora, e-mail, dados cadastrais da
conta, números de acesso” (e-STJ, fl. 857).
XXXXVIII. Assim, rogando vênias ao i. Relator, conheço do recurso
especial de G B I L e, por conseguinte, adentro a análise do mérito.
- DISPOSITIVO
VOTO-VISTA
VENCIDO
O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA:
Pedi vista dos autos para melhor compreensão da controvérsia.
1. Breve histórico
Trata-se, na origem, de ação de obrigação de fazer c/c indenização por
danos morais e materiais ajuizada por C. R. C. contra a G. B. I. L., em 6/12/2016 (fls.
1-43 e-STJ).
No tocante à obrigação de fazer, pleiteou-se a remoção de várias páginas
de blogs hospedados pela ré que disponibilizavam, de forma gratuita, sem o seu
consentimento ou autorização, ensaio de nudez explícita da autora realizado para uma
revista, bem como excluir os registros eletrônicos desses blogs (URLs) dos resultados
de pesquisa do Google Search.
Quanto ao segundo pleito, indenizatório, postulou-se R$ 40.000,00
(quarenta mil reais) por danos morais, e, relativamente aos danos materiais (lucros
cessantes), mais R$1,00 (um real) por usuário único que tenha visitado o conteúdo, a
partir de 10/8/2016, conforme os dados produzidos pelo Google Analytics, também
requeridos na inicial.
Os pedidos foram julgados improcedentes pela sentença, com a condenação
da ora recorrente ao pagamento das custas e despesas processuais, além de
honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da
causa (fls. 664-667 e-STJ).
Irresignada, a recorrente interpôs apelação perante o Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo que, distribuída à Terceira Câmara de Direito Privado, foi
parcialmente provida, à unanimidade, para:
"(...) restabelecer o v. acórdão proferido pela Câmara em sede de
agravo de instrumento, mas agora para que o Google suspenda,
definitivamente, o acesso às URLs a serem indicadas pela recorrente, de
forma legível e em formato texto, devendo fornecer os registros de criação e
acesso de cada uma das páginas apontadas (IP, data, hora, e-mail, dados
cadastrais da conta, números de acesso), tudo sob pena de multa diária,
arbitrada em R$ 1.000,00 (mil reais) por dia de descumprimento, respeitado
o limite máximo de R$ 50.000,00. Rejeitam-se as demais pretensões
Consequentemente, a apelante será responsável pelo pagamento
de 2/3 das custas e despesas processuais, além de honorários de
sucumbência arbitrados em 15% do valor atribuído à causa, com
responsabilidade do remanescente atribuído ao recorrido (1/3 das custas e
despesas), além de honorários estabelecidos em 10% do valor da causa,
tudo na forma trazida pelo art. 85, par. 2º, do CPC." (fl. 857 e-STJ)
A ementa respectiva ficou assim redigida:
"RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C.C.
INDENIZAÇÃO.
Disponibilização de ensaio fotográfico em blogs hospedados pelo apelado.
Indiscutível relação do conteúdo com a apelante, modelo fotográfica.
Contestação que não refuta a vinculação das imagens à demandante.
Improcedência, assim, que não prevalece. Cessão de direitos autorais que
não contempla a utilização irrestrita das imagens por qualquer interessado.
Prova documental, ainda, que afasta a comercialização do ensaio fotográfico
com terceiros. Suspensão dos conteúdos constantes das URLs hospedadas
pelo Google, à vista da ofensa ao art. 20 do Código Civil, bem como de
fornecimento dos registros cadastrais de criação e acesso a cada uma das
páginas, nos termos admitidos pelo art. 15 do Marco Civil da Internet.
Providências estabelecidas por esta Câmara por ocasião do julgamento do
Agravo de Instrumento nº 2001908-68.2017.8.26.0000, de minha Relatoria.
Procedência da ação, para esse fim, estabelecida. Circunstância, também, a
exigir a observância da jurisprudência do C. STJ: 'A jurisprudência desta
Corte define que: (a) para fatos anteriores à publicação do Marco Civil da
Internet, basta a ciência inequívoca do conteúdo ofensivo pelo provedor, sem
sua retirada em prazo razoável, para que este se torne responsável e, (b)
após a entrada em vigor da Lei nº 12.965/2014, o termo inicial da
responsabilidade solidária do provedor é o momento da notificação judicial
que ordena a retirada do conteúdo da internet' (AgInt no AREsp
1177619/SP, Rel. Ministro RICAR DO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA
TURMA, julgado em 29/10/2018, DJe 08/11/2018). Descumprimento da
decisão judicial que não integra a causa de pedir, a qual insiste na
responsabilidade solidária da parte contrária. Inviabilidade, nesse caso, da
reparação moral e material pretendidas pela autora.
APELO PARCIALMENTE PROVIDO." (fl. 851 e-STJ)
Os embargos de declaração opostos pela recorrente C. R. C. (fls. 1.093-
1.104 e-STJ) foram rejeitados (fls. 1.105-1.110 e-STJ)
Foram interpostos recursos especiais por ambas as partes (fls. 882-929 e
1.033-1.045 e-STJ), ambos admitidos na origem (fls. 1134-1.135 e 1.136-1.137 e-STJ).
Nas razões recursais de C. R. C. (fls. 882-929 e-STJ), sustenta-se, além de
dissídio jurisprudencial, violação do disposto nos arts. 1.022, I, II e III, do Código de
Processo Civil de 2015; 10, 15, 19, 21 e 22 da Lei nº 12.965/2014 (Marco Civil da
Internet); 20, 186, 927 e 944 do Código Civil de 2002; 14 e 17 do Código de Defesa do
Consumidor; e, 102 e 103 da Lei nº 9.610/1998.
Aduz, preliminarmente, a nulidade do acórdão recorrido, pois o Tribunal de
origem, apesar de instado em embargos de declaração, permaneceu silente quanto a
omissões, obscuridades e ao erro material oportunamente apontados (fls. 900-903 e-
STJ).
No mérito, alega-se, em suma: (i) a necessidade de arbitramento de danos
materiais e morais, diante da violação dos direitos de imagem, intimidade, vida
privada e honra da recorrente; (ii) a aplicação do art. 21 da Lei nº 12.965/2014 ao
presente caso, por se tratar de fotos contendo nudez explícita de caráter privado; (iii) a
condenação da recorrida à integralidade dos ônus sucumbenciais, pelo fato de ter
decaído em parte mínima do pedido.
Requereu, ao final, (a) a complementação do julgamento dos pontos
destacados nos embargos de declaração opostos ao acórdão recorrido; (b) a aplicação
do CDC à espécie; (c) a responsabilização do provedor que, notificado do conteúdo
ilícito, não o suspendeu; (d) a exclusão das URLs indicadas dos resultados de busca
do Google Search; (e) a exclusão da das URLs indicadas da plataforma Blogspot; (f) a
condenação da recorrida ao pagamento de danos materiais e morais; (g) a atribuição
dos ônus sucumbenciais à recorrida.
As contrarrazões foram apresentadas às fls. 1.115-1.132 (e-STJ).
Nas razões recursais de G. B. I. L. (fls. 1.033-1.045 e-STJ), alega-se, além
de dissídio jurisprudencial, violação do disposto nos arts. 5º, VIII, 15 e 22 da Lei nº
12.965/2014 (Marco Civil da Internet).
Sustenta-se, em suma, a inexistência de obrigação legal para o
fornecimento de outros dados para a identificação de usuários que não o IP.
Requereu a reforma do acórdão recorrido, afastando-se a condenação ao
fornecimento de dados de identificação além do IP dos usuários responsáveis pelo
conteúdo impugnado.
Não foram apresentadas as contrarrazões (certidão à fl. 1.133 e-STJ).
Os recursos especiais foram admitidos pela instância de origem (fls. 1.134-
1.135 e 1.136-1.137 e-STJ).
Na sessão da Terceira Turma realizada em 29/3/2022, o Ministro Paulo de
Tarso Sanseverino, Relator, proferiu voto para não conhecer do recurso especial
interposto por G. B. I. L. e para conhecer em parte e negar provimento ao recurso
especial interposto por C. R. C..
O voto de Sua Excelência está sintetizado na ementa seguinte:
"RECURSO ESPECIAL DA AUTORA. DIREITO DIGITAL. MARCO CIVIL DA
INTERNET. RESPONSABILIDADE DE PROVEDOR DE APLICAÇÃO POR ATOS
DE SEUS USUÁRIOS. REMOÇÃO DE CONTEÚDO DA INTERNET. NEGATIVA
DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE
PREQUESTIONAMENTO. ART. 19 DA LEI N. 12.965/14. RESERVA DE
JURISDIÇÃO. EXCEÇÃO PREVISTA NO ART. 21. DESNECESSIDADE DE
ORDEM JUDICIAL. NOTICE AND TAKE DOWN. CENAS DE NUDEZ E DE
ATOS SEXUAIS QUE DEVEM SER DE CARÁTER NECESSARIAMENTE
PRIVADO. INAPLICABILIDADE A FOTOGRAFIAS E DEMAIS MATERIAIS
PRODUZIDOS EM ENSAIO FOTOGRÁFICO COM INTUITO COMERCIAL E
DESTINADOS À CIRCULAÇÃO.
1. Violação do art. 489, § 1º, II, IV, V e VI, do CPC não configurada, uma vez
que o Tribunal de origem manifestou-se de forma clara e suficiente acerca de
todas as alegações relevantes à solução da lide.
2. Ausente o prequestionamento quando o Tribunal de origem não emite juízo
de valor acerca dos dispositivos legais apontados como violados, ainda que
não tenha havido omissão relevante ou mesmo negativa de prestação
jurisdicional. Aplicação da Súmula 211/STJ.
3. Mostram-se deficientes as razões do recurso especial quando, ao
impugnar a distribuição dos ônus de sucumbência, alega-se a violação de
dispositivo legal que não guarda qualquer relação com a questão. Aplicação
da Súmula 284/STF.
4. Acórdão recorrido que, ao afastar a possibilidade de restrição de busca em
provedor de pesquisa, foi proferido em consonância com a jurisprudência
deste Superior Tribunal, que tem entendimento pacífico no sentido de que os
provedores de pesquisa não podem ser obrigados a eliminar de seu sistema
os resultados que apontem para uma foto ou texto específico,
independentemente da indicação do respectivo URL. Aplicação da Súmula
83/STJ.
5. A responsabilidade do provedor por atos de seus usuários, como regra,
apenas se verifica quando há descumprimento de ordem judicial de remoção
de conteúdo. Inteligência do art. 19 do Marco Civil da Internet, que prevê a
reserva de jurisdição.
6. Excepcionalmente, em casos de divulgação, sem consentimento, de cenas
de nudez ou de atos sexuais de caráter privado, há possibilidade de remoção
de conteúdo mediante simples notificação da vítima. Inteligência do art. 21
do Marco Civil da Internet que, em excepcional sistema de notice and take
down, prevê a responsabilidade do provedor pela omissão diante de simples
notificação do ofendido para retirada do conteúdo ofensivo.
7. Para a aplicação do art. 21, mostra-se imprescindível i) o caráter não
consensual da imagem íntima; ii) a natureza privada das cenas de nudez ou
dos atos sexuais disseminados; e iii) a violação à intimidade.
8. Exceção prevista no art. 21 que se destina a proteger vítimas de um tipo
de violência digital conhecido como disseminação de imagens íntimas não
consentidas, também conhecida pela sigla NCII (da expressão em inglês non-
consensual intimate images)
9. Modelo que tem suas fotografias sensuais indevidamente divulgadas de
forma pirata não pode ser equiparada à vítima de disseminação de imagens
íntimas não consentidas, que tem sua intimidade devassada e publicamente
violada e cuja ampla e vexaminosa exposição de seu corpo de forma não
consentida demanda remoção mais célere do conteúdo que viola de forma
direta, pungente e absolutamente irreparável o seu direito fundamental à
intimidade.
10. Equiparação indevida que poderia acabar por desvirtuar a proteção dada
às vítimas de divulgação de NCII, diminuindo o grau de reprovabilidade
desse tipo de conduta e diluindo os esforços da sociedade civil e do
legislador no sentido de aumentar a conscientização acerca dessa nova
forma de violência surgida com a internet.
11. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO EM PARTE E DESPROVIDO.
RECURSO ESPECIAL DA RÉ. DIREITO DIGITAL. MARCO CIVIL DA
INTERNET. DEVER DE FORNECIMENTO DE REGISTROS DE ACESSO A
APLICAÇÕES. INCLUSÃO DE DADOS PESSOAIS DE USUÁRIOS. ALEGADA
VIOLAÇÃO DOS ARTS. 5º, VIII, 15 E 22 DO MARCO CIVIL DA INTERNET.
AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E 356/STF. DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL.
AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA.
1. Ausente o prequestionamento quando o Tribunal de origem não se
manifesta, sequer implicitamente, acerca da questão suscitada por meio dos
dispositivos legais apontados como violados. Aplicação das Súmulas
282/STF e 356/STF.
2. Conhecimento do recurso especial pela alínea c do permissivo
constitucional que pressupõe a expressa indicação do dispositivo legal a
respeito de cuja interpretação haveria divergência entre o acórdão recorrido e
o julgado apontado como paradigma.
3. Dissídio jurisprudencial que não está demonstrado, porquanto ausente a
similitude fática entre o acórdão recorrido e o julgado apontado como
paradigma.
4. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO."
Após o voto do Ministro Relator, a Ministra Nancy Andrighi formulou pedido
de vista, ao qual eu aderi.
Feito esse resumo, passo a votar.
O acórdão impugnado pelos recursos especiais em apreciação foi publicado
na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e
3/STJ).
2. Do recurso especial de C. R. C.
2.1. Da inexistência de nulidade no acórdão recorrido e do
conhecimento parcial do recurso especial
Em primeiro lugar, acompanho integralmente o eminente Ministro
Relator para afastar a preliminar de nulidade do acórdão recorrido por negativa
de prestação jurisdicional e para conhecer parcialmente do recurso especial
interposto por K. R. S. (reconhecendo a falta de prequestionamento do disposto nos
arts. 14 e 17 do CDC; 102 e 103 da Lei nº 9.610/1998; 21, parágrafo único, 497 e 499
do CPC/2015; e, também, a aplicação da Súmula nº 284/STF quanto à alegação de
sucumbência mínima).
2.2. Da falta de interesse recursal quanto à exclusão/deleção dos
resultados de pesquisa do provedor de busca recorrido
A recorrente postula ao final das suas razões recursais:
"Que seja a apelada condenada a EXCLUIR/DELETAR do Google
Search as URLs indicadas no item (d) da inicial (CONCORRÊNCIA DESLEAL
E DEVIO DE CLIENTELA) - Não se tratando de fiscalização prévia ou
obrigação impossível dado que as URLs foram inequivocamente indicadas e
a Editora Rickdan já afirmou que não são autorizadas a republicar a obra da
recorrente (revista sexy)" (fl. 929 e-STJ)
No ponto, entretanto, observa-se que a apelação da ora recorrente foi
parcialmente provida pelo acórdão impugnado, para, segundo o comando da sua parte
dispositiva:
"(...) restabelecer o v. acórdão proferido pela Câmara em sede de
agravo de instrumento, mas agora para que o Google suspenda,
definitivamente, o acesso às URLs a serem indicadas pela recorrente,
de forma legível e em formato texto, devendo fornecer os registros de criação
e acesso de cada uma das páginas apontadas (IP, data, hora, e-mail, dados
cadastrais da conta, números de acesso), tudo sob pena de multa diária,
arbitrada em R$ 1.000,00 (mil reais) por dia de descumprimento, respeitado
o limite máximo de R$ 50.000,00." (fl. 857 e-STJ - grifou-se)
Como se observa, não remanesce interesse recursal quanto ao tema.
De todo modo, é importante notar que há diferença ontológica entre
desindexação de resultados de busca e remoção/exclusão de conteúdo específico
constante de páginas precisamente indicadas pelos URLs.
Por um lado, o entendimento desta Corte Superior tem repudiado a primeira
- desindexação de resultados de busca - , como bem observa o voto do eminente
Relator (Capítulo IV). Mesmo antes do advento da Lei nº 12.965/2014 (Marco Civil da
Internet), a orientação jurisprudencial já era no sentido de que "os provedores de
pesquisa não podem ser obrigados a eliminar do seu sistema os resultados da busca de
determinado termo ou expressão" (AgInt no REsp 1.593.873/SP, Terceira Turma, Rel.
Ministra Nancy Andrighi, DJe de 17/11/2016).
Por outro lado, excepcionalmente, tem sido admitida a segunda -
remoção/exclusão de conteúdo específico constante de páginas precisamente
indicadas pelos URLs - , em situações como as verificadas nos casos de aplicação do
art. 21 do MCI.
A propósito:
"CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE
INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. AÇÃO DE
OBRIGAÇÃO DE FAZER. RETIRADA DE CONTEÚDO ILEGAL.
PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. PROVEDOR DE PESQUISA.
FILTRAGEM PRÉVIA DAS BUSCAS. IMPOSSIBILIDADE. RETIRADA DE
URLS DOS RESULTADOS DE BUSCA. POSSIBILIDADE. EXPOSIÇÃO
PORNOGRÁFICA NÃO CONSENTIDA. PORNOGRAFIA DE VINGANÇA.
DIREITOS DE PERSONALIDADE. INTIMIDADE. PRIVACIDADE. GRAVE
LESÃO.
1. Ação ajuizada em 20/11/2012. Recurso especial interposto em
08/05/2015 e distribuído a este gabinete em 25/08/2016.
2. Na hipótese, o MP/SP ajuizou ação de obrigação de fazer, em defesa de
adolescente, cujo cartão de memória do telefone celular foi furtado por colega
de escola, o que ocasionou a divulgação de conteúdo íntimo de caráter
sexual, um vídeo feito pela jovem que estava armazenado em seu
telefone.
3. É cabível o recurso especial contra acórdão proferido em agravo de
instrumento em hipóteses de antecipação de efeito da tutela, especificamente
para a delimitação de seu alcance frente à legislação federal.
4. A atividade dos provedores de busca, por si própria, pode causar
prejuízos a direitos de personalidade, em razão da capacidade de
limitar ou induzir o acesso a determinados conteúdos.
5. Como medida de urgência, é possível se determinar que os
provedores de busca retirem determinados conteúdos expressamente
indicados pelos localizadores únicos (URLs) dos resultados das
buscas efetuadas pelos usuários, especialmente em situações que: (i)
a rápida disseminação da informação possa agravar prejuízos à
pessoa; e (ii) a remoção do conteúdo na origem possa necessitar de
mais tempo que o necessário para se estabelecer a devida proteção à
personalidade da pessoa exposta.
6. Mesmo em tutela de urgência, os provedores de busca não podem ser
obrigados a executar monitoramento prévio das informações que
constam nos resultados das pesquisas.
7. A 'exposição pornográfica não consentida', da qual a 'pornografia de
vingança' é uma espécie, constituiu uma grave lesão aos direitos de
personalidade da pessoa exposta indevidamente, além de configurar uma
grave forma de violência de gênero que deve ser combatida de forma
contundente pelos meios jurídicos disponíveis.
8. A única exceção à reserva de jurisdição para a retirada de conteúdo
infringente da internet, prevista na Lei 12.965/2014, está relacionada a
'vídeos ou de outros materiais contendo cenas de nudez ou de atos sexuais
de caráter privado', conforme disposto em seu art. 21 ('O provedor de
aplicações de internet que disponibilize conteúdo gerado por terceiros será
responsabilizado subsidiariamente pela violação da intimidade decorrente
da divulgação, sem autorização de seus participantes, de imagens, de vídeos
ou de outros materiais contendo cenas de nudez ou de atos sexuais de
caráter privado quando, após o recebimento de notificação pelo participante
ou seu representante legal, deixar de promover, de forma diligente, no âmbito
e nos limites técnicos do seu serviço, a indisponibilização desse conteúdo').
9. Na hipótese em julgamento, a adolescente foi vítima de 'exposição
pornográfica não consentida' e, assim, é cabível para sua proteção a ordem
de exclusão de conteúdos (indicados por URL) dos resultados de pesquisas
feitas pelos provedores de busca, por meio de antecipação de tutela.
10. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido."
(REsp 1.679.465/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA,
julgado em 13/3/2018, DJe 19/3/2018 - grifou-se).
Feitas essas considerações, apesar de concordar com o voto do eminente
Relator quanto à tese da impossibilidade de se impor aos provedores de busca os ônus
de filtragem ou desindexação de pesquisa, não conheço do recurso especial, diante da
falta de interesse recursal.
2.3. Da extensão da proteção conferida pelo art. 21 do Marco Civil da
Internet: reserva de jurisdição x notice and takedown
Cabe registrar, inicialmente, que o debate acerca da extensão da proteção
conferida pelo art. 21 do Marco Civil da Internet teve início, no âmbito da Terceira
Turma, por ocasião do julgamento do REsp nº 1.930.256/SP, concluído em
7/12/2021.
Na oportunidade, proferi voto oral para acompanhar a corrente minoritária
capitaneada pela Ministra Nancy Andrighi, Relatora originária.
Ficou relator para o acórdão o Ministro Marco Aurélio Bellizze, que foi
acompanhado pelos votos dos Ministros Paulo de Tarso Sanseverino e Moura Ribeiro.
Diante da relevância da matéria, da existência de correntes de
entendimentos divergentes no âmbito da Terceira Turma e da constatação de que
ainda não houve pronunciamento da Quarta Turma acerca do assunto, registro
expressamente o meu posicionamento quanto à discussão central nesse processo,
isto é, definir a extensão da proteção conferida pelo art. 21 do Marco Civil da
Internet (Lei nº 12.965/2014), nos casos em que há exposição de nudez ou
mesmo de pornografia consentida num primeiro momento, ainda que para fins
comerciais.
O texto do referido dispositivo é o seguinte:
"Art. 21. O provedor de aplicações de internet que disponibilize
conteúdo gerado por terceiros será responsabilizado subsidiariamente pela
violação da intimidade decorrente da divulgação, sem autorização
de seus participantes, de imagens, de vídeos ou de outros materiais
contendo cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado
quando, após o recebimento de notificação pelo participante ou seu
representante legal, deixar de promover, de forma diligente, no âmbito e nos
limites técnicos do seu serviço, a indisponibilização desse conteúdo.
Parágrafo único. A notificação prevista no caput deverá conter,
sob pena de nulidade, elementos que permitam a identificação específica do
material apontado como violador da intimidade do participante e a
verificação da legitimidade para apresentação do pedido." (grifou-se)
É um debate muito pertinente porque está em jogo, na realidade, o futuro
do modelo de reserva de jurisdição adotado pelo art. 19 do Marco Civil da Internet.
Há pelo menos dois recursos extraordinários que discutem essa questão no
âmbito do Supremo Tribunal Federal e que lá deverão ser julgados depois de
audiências públicas que até o momento não foram realizadas, sobretudo em virtude da
pandemia da COVID-19. Refiro-me ao RE nº 1.037.396, Rel. Ministro Dias Toffoli
(Tema nº 987 da Repercussão Geral) e ao RE nº 1.057.258/MG, Rel. Ministro Luiz Fux
(Tema nº 533 da Repercussão Geral).
Então, provavelmente, não teremos tão logo um desfecho dessa discussão
na Suprema Corte quanto à constitucionalidade do art. 19.
Esse debate procura contrastar alguns modelos que existem no mundo.
O modelo de reserva de jurisdição é defendido pelas plataformas de
tecnologia e pelos provedores de aplicativos na internet, como o Google, porque os
exime de exercer um papel que é entendido por eles como de censura, uma função
censória que recusam. Segundo defendem, só poderiam agir para a retirada de
conteúdo da internet mediante ordem judicial expressa nesse sentido.
Mas há outros países em que o modelo adotado é o de imputação direta
de responsabilidade aos provedores de aplicativo pela seleção do conteúdo que
veiculam, já que eles obtêm proveito econômico com essa atividade. É o modelo
chamado notice and takedown que, basicamente, significa que o provedor de
serviços não será responsabilizado pela publicação do conteúdo protegido se,
notificado pelo legítimo interessado, imediatamente providenciar a sua remoção.
Esse foi o modelo adotado no art. 21 do Marco Civil, em razão dos valores
que são muito caros a nossa ordem constitucional, como a preservação da intimidade
e da vida privada, num dos seus recônditos mais importantes, que é a questão da
nudez e da sexualidade.
Segundo o eminente Relator, no entanto, não estariam presentes os
elementos essenciais para a aplicação do aludido art. 21 na espécie, quais sejam, (a) o
caráter não consensual da imagem íntima; (b) a natureza privada das cenas de
nudez ou dos atos sexuais disseminados; (c) a violação à intimidade.
Para tanto, o voto de Sua Excelência registra que a realização e a divulgação
do material foram consentidas, sendo os direitos de imagem respectivos cedidos a
terceiros, com intuito exclusivamente comercial, já que destinado precipuamente
à circulação, e, por isso, sem violação do direito à intimidade da recorrente, que,
por meio desta demanda, busca apenas reparar os lucros cessantes decorrentes da
disseminação gratuita do material em que ela figura.
Esclarece o Ministro Relator que não se pode conferir interpretação
excessivamente extensiva ao art. 21 do Marco Civil da Internet, sob pena de se
acarretar ao provedor de aplicação a responsabilidade de examinar cláusulas
contratuais de negócios jurídicos envolvendo terceiros com o intuito de se averiguar se
o consentimento dado pela modelo estaria a permitir a publicação de ensaio sensual
em determinado blog, rede social ou página da internet.
Salienta também que equiparar casos como o presente - de divulgação
pirata de fotos sensuais de caráter comercial - a casos de disseminação não
consentida de imagens íntimas (NCII - non-consensual intimate images) poderia
desvirtuar a proteção dada às vítimas dessa violência surgida com a internet.
Peço a mais respeitosa vênia, no entanto, para divergir do entendimento do
eminente Ministro Relator, pois, no meu ponto de vista, estão presentes os requisitos
essenciais para a aplicação do art. 21 do Marco Civil.
Em primeiro lugar, anoto que, para o deslinde de controvérsias dessa
natureza, o exame da violação à intimidade deve partir da análise da extensão do
consentimento da(o) ofendida(o).
Nesse aspecto, considero, pois, que é necessário o consentimento da
vítima para cada uso, não importando que a captação da foto, da imagem ou do vídeo
tenha sido feita com consentimento ou de forma sub-reptícia, ainda que para fins
comerciais, o que não lhe retira o caráter privado nem autoriza que terceiros que
tenham tido acesso a esse tipo de material sensível, ainda que licitamente, passem a
divulgá-lo de forma irresponsável na rede mundial de computadores.
O que importa sobremaneira é que o uso dessa imagem, a disponibilização
dessa mídia ou conteúdo em espaço público, seja feito sempre com o consentimento
da vítima, o que justificaria, portanto, o emprego do art. 21 não apenas para a
chamada pornografia de vingança (revenge porn), mas também para os usos não
consentidos de imagens de caráter íntimo, ainda que a captação da imagem tenha
sido feita mediante consentimento.
No sentido de definir essas hipóteses como "exposição pornográfica não
consentida", a jurisprudência da Terceira Turma tem se apresentado da seguinte
forma:
"CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE
INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. AÇÃO DE
OBRIGAÇÃO DE FAZER. RETIRADA DE CONTEÚDO ILEGAL.
PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. PROVEDOR DE PESQUISA. FILTRAGEM
PRÉVIA DAS BUSCAS. IMPOSSIBILIDADE. RETIRADA DE URLS DOS
RESULTADOS DE BUSCA. POSSIBILIDADE. EXPOSIÇÃO PORNOGRÁFICA
NÃO CONSENTIDA. PORNOGRAFIA DE VINGANÇA. DIREITOS DE
PERSONALIDADE. INTIMIDADE. PRIVACIDADE. GRAVE LESÃO.
1. Ação ajuizada em 20/11/2012. Recurso especial interposto em
08/05/2015 e distribuído a este gabinete em 25/08/2016.
2. Na hipótese, o MP/SP ajuizou ação de obrigação de fazer, em defesa de
adolescente, cujo cartão de memória do telefone celular foi furtado por colega
de escola, o que ocasionou a divulgação de conteúdo íntimo de caráter
sexual, um vídeo feito pela jovem que estava armazenado em seu
telefone.
3. É cabível o recurso especial contra acórdão proferido em agravo de
instrumento em hipóteses de antecipação de efeito da tutela, especificamente
para a delimitação de seu alcance frente à legislação federal.
4. A atividade dos provedores de busca, por si própria, pode causar
prejuízos a direitos de personalidade, em razão da capacidade de
limitar ou induzir o acesso a determinados conteúdos.
5. Como medida de urgência, é possível se determinar que os
provedores de busca retirem determinados conteúdos expressamente
indicados pelos localizadores únicos (URLs) dos resultados das
buscas efetuadas pelos usuários, especialmente em situações que: (i)
a rápida disseminação da informação possa agravar prejuízos à
pessoa; e (ii) a remoção do conteúdo na origem possa necessitar de
mais tempo que o necessário para se estabelecer a devida proteção à
personalidade da pessoa exposta.
6. Mesmo em tutela de urgência, os provedores de busca não podem ser
obrigados a executar monitoramento prévio das informações que
constam nos resultados das pesquisas.
7. A 'exposição pornográfica não consentida', da qual a 'pornografia
de vingança' é uma espécie, constituiu uma grave lesão aos direitos
de personalidade da pessoa exposta indevidamente, além de
configurar uma grave forma de violência de gênero que deve ser
combatida de forma contundente pelos meios jurídicos disponíveis.
8. A única exceção à reserva de jurisdição para a retirada de
conteúdo infringente da internet, prevista na Lei 12.965/2014, está
relacionada a 'vídeos ou de outros materiais contendo cenas de
nudez ou de atos sexuais de caráter privado', conforme disposto em
seu art. 21 ('O provedor de aplicações de internet que disponibilize conteúdo
gerado por terceiros será responsabilizado subsidiariamente pela violação da
intimidade decorrente da divulgação, sem autorização de seus participantes,
de imagens, de vídeos ou de outros materiais contendo cenas de nudez ou de
atos sexuais de caráter privado quando, após o recebimento de notificação
pelo participante ou seu representante legal, deixar de promover, de forma
diligente, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço, a indisponibilização
desse conteúdo').
9. Na hipótese em julgamento, a adolescente foi vítima de 'exposição
pornográfica não consentida' e, assim, é cabível para sua proteção a ordem
de exclusão de conteúdos (indicados por URL) dos resultados de pesquisas
feitas pelos provedores de busca, por meio de antecipação de tutela.
10. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido."
(REsp 1.679.465/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA,
julgado em 13/3/2018, DJe 19/3/2018 - grifou-se).
Nesse contexto, a divulgação de ensaio sensual com cenas de nudez para
outros destinos que não aqueles para os quais a recorrente tenha consentido expõe de
forma indevida a sua intimidade, reclamando a aplicação do art. 21 do MCI.
Assim, uma vez reportado ao provedor de aplicação que os limites desse
consentimento foram ultrapassados, a retirada de material, requerida nos termos
excepcionais dos art. 21 do MCI, deve ser atendida de pronto, sob pena de sua
responsabilização (notice and takedown), sem que haja a necessidade de se examinar
cláusulas contratuais de negócios jurídicos envolvendo terceiros.
Nesse passo, não se trata de conferir interpretação extensiva ao art. 21, na
medida em que a linguagem do dispositivo consagra a ideia de quais são os valores
constitucionais a proteger, motivo por que ali se encontra uma exceção ao modelo da
reserva de jurisdição, a qual deve ser interpretada à luz do texto constitucional.
E, sob esse prisma, não há dúvidas de que a exegese que mais se coaduna
com os valores em jogo deve ser a da máxima proteção efetiva dos direitos individuais
garantidos constitucionalmente, em especial a intimidade e a vida privada dos
legítimos interessados, consoante o disposto no art. 5º, X, da Constituição Federal.
Desse modo, tendo como pressuposto que o consentimento deve ser aferido
a cada uso, a pessoa que tem fotos sensuais, ainda que de caráter comercial,
indevidamente difundidas é também vítima da violência resultante da divulgação não
consentida de imagens íntimas e, por essa razão, deve merecer a especial proteção do
art. 21 do MCI.
Por último, além dos lucros cessantes, saliente-se que também foi postulado
pela recorrente reparação por danos morais (fl. 42 e-STJ).
Em conclusão, voto pelo parcial provimento do recurso especial
interposto por C. R. C., para condenar a recorrida G. B. I. L. ao pagamento de
indenização pelos danos morais, no importe de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).
Fica ressalvado, por fim, a quem de direito demandar a exclusão do material
indevidamente divulgado nas páginas específicas diretamente contra os seus
titulares/proprietários, bem como a buscar a reparação pelos alegados danos
materiais (lucros cessantes) decorrentes da utilização indevida da imagem, com
violação dos direitos resguardados pela Lei nº 9.610/1998, os quais extrapolam o
âmbito de abrangência da proteção conferida pelo art. 21 do Marco Civil da Internet
contra a ora recorrida nesta ação.
3. Do recurso especial de G. B. I. L.
Nas razões recursais de G. B. I. L. (fls. 1.033-1.045 e-STJ), alega-se, além
de dissídio jurisprudencial, violação do disposto nos arts. 5º, VIII, 15 e 22 da Lei nº
12.965/2014 (Marco Civil da Internet).
Sustenta-se, em suma, a inexistência de obrigação legal para o
fornecimento de outros dados para a identificação de usuários que não o IP.
Nesse aspecto, acompanho integralmente o voto do eminente Ministro
Relator para não conhecer do recurso especial, tendo em vista a falta de
prequestionamento dos dispositivos legais apontados como violados (aplicação das
Súmulas nºs 282 e 356/STF) e, quanto ao dissídio jurisprudencial, diante da falta de
indicação dos artigos tidos por afrontados (aplicação da Súmula nº 284/STF) e ainda
pela ausência de similitude fática entre os julgados confrontados.
4. Do dispositivo
Ante o exposto, não conheço do recurso especial de G. B. I. L. e conheço
parcialmente do recurso especial de C. R. C. e, nessa extensão, respeitosamente,
peço vênia ao Ministro Relator para divergir, dando-lhe parcial provimento para
condenar a recorrida G. B. I. L. a pagar danos morais à recorrente C. R. C., arbitrados
em R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).
Condeno a recorrida G. B. I. L. ainda ao pagamento das custas processuais
e de honorários advocatícios, estes últimos fixados em 10% (dez por cento) sobre o
valor da condenação.
Na origem, os honorários advocatícios arbitrados em favor dos patronos da
recorrente C. R. C. foram estabelecidos em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa
(fl. 857 e-STJ), os quais devem ser majorados para 15% (quinze por cento), em razão
do não conhecimento do recurso especial de G. B. I. L., nos termos do art. 85, § 11, do
CPC/2015.
É o voto.
Superior Tribunal de Justiça
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : CRC
ADVOGADOS : JULIO CESAR GORRASI - SP338430
VENCESLAU TAVARES COSTA FILHO - PE022407
RECORRENTE : GB I L
ADVOGADO : EDUARDO BASTOS FURTADO DE MENDONÇA - RJ130532
RECORRIDO : CRC
ADVOGADO : JULIO CESAR GORRASI - SP338430
RECORRIDO : GB I L
ADVOGADO : EDUARDO BASTOS FURTADO DE MENDONÇA - RJ130532
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
Prosseguindo no julgamento, após os votos-vistas da Sra. Ministra Nancy Andrighi e do
Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, a Terceira Turma, por maioria, não conheceu do recurso
especial interposto por G B I L e negou provimento ao recurso especial interposto por C R C, nos
termos do voto do Sr. Ministro Relator. Vencidos a Sra. Ministra Nancy Andrighi e o Sr. Ministro
Ricardo Villas Bôas Cueva. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram
com o Sr. Ministro Relator.