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Projeto Diretrizes

Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina

Transplante
Tratamento
Renal: da
Complicações
Fase Aguda
do Acidente Vascular
Não - Cirúrgicas
Cerebral

Autoria: Sociedade Brasileira de Nefrologia


Academia Brasileira
Sociedade dede
Brasileira Neurologia
Urologia
Elaboração Final: 24
30 de Julho
junho de
de 2001
2006
Autoria: Gagliardi
Participantes: Noronha IL,
RJ,Ferraz
RaffinAS,
CN,Silva
Fábio
APSRC
Filho, Saitovich D,
CarvalhoA,DBM,
Colaboradores: Bacellar LongoPaula FJ, Campos
AL, Massaro AR,H,Moro CHC,
André
Ianhez C,
LE,Nóvak
GarciaEM,
VD,Dias-Tosta
Camargo E,
LFAYamamoto FI,
Damiani IT, Maciel Jr JA, Fernandes JG, Vega MG,
Fukujima MM, Lanna MA, Oliveira RMC, Melo-
Souza SE, Novis SAP, Tognola WA

O Projeto Diretrizes, iniciativa conjunta da Associação Médica Brasileira e Conselho Federal


de Medicina, tem por objetivo conciliar informações da área médica a fim de padronizar
condutas que auxiliem o raciocínio e a tomada de decisão do médico. As informações contidas
neste projeto devem ser submetidas à avaliação e à crítica do médico, responsável pela conduta
aaser
serseguida,
seguida,frente
frenteààrealidade
realidadeeeao
aoestado
estadoclínico
clínicode
decada
cadapaciente.
paciente

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DESCRIÇÃO DO MÉTODO DE COLETA DE EVIDÊNCIA:


O presente texto, que faz parte das diretrizes para condutas em transplante
renal, é o resultado de extenso trabalho de consenso formado por represen-
tantes do Departamento de Transplante da Sociedade Brasileira de Nefrologia
(SBN) e da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO).
As recomendações apresentadas são baseadas em estudos publicados em
revistas conceituadas e especializadas, assim na vasta experiência clínica
dos envolvidos no preparo deste manual. Cada capítulo foi analisado por
todos os integrantes desta diretriz, sendo que os pontos discordantes foram
discutidos até se chegar a um consenso final que está sendo apresentado
neste material.

GRAU DE RECOMENDAÇÃO E FORÇA DE EVIDÊNCIA:


A: Estudos experimentais ou observacionais de melhor consistência.
B: Estudos experimentais ou observacionais de menor consistência.
C: Relatos de casos (estudos não controlados).
D: Opinião desprovida de avaliação crítica, baseada em consensos,
estudos fisiológicos ou modelos animais.

OBJETIVO:
Apresentar recomendações para a prática de transplante renal, baseadas em
evidências publicadas na literatura e na experiência clínica.

CONFLITO DE INTERESSE:
Os conflitos de interesse declarados pelos participantes da elobaração
desta diretriz estão detalhados na página 9.

2 Transplante Renal: Complicações Não-Cirúrgicas


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COMPLICAÇÕES NÃO-CIRÚRGICAS

I NFECÇÃO POR CITOMEGALOVÍRUS

O citomegalovírus é um vírus pertencente à família


Herpesviridae. Na maioria das espécies animais estudadas foi
possível o isolamento de pelo menos um tipo de herpesvírus.
Oito herpesvírus foram, até o momento, isolados em seres
humanos (vírus herpes simplex 1 [HSV-1], vírus herpes simplex
2 [HSV-2], citomegalovírus humano [CMV], vírus varicella-zoster
[VZV], vírus Epstein-Barr [EBV], o herpesvírus huma-
no 6 [HHV6], o herpesvírus humano 7 [HHV7] e o herpesvírus
humano 8 [HHV8]).

Acredita-se que os seres humanos são o único reservatório


para o CMV. A transmissão pode ser vertical ou horizontal. Esta
última ocorre após contato interpessoal direto ou indire-
to. Várias são as vias de transmissão. A disseminação oral e a
respiratória parecem ser dominantes, entretanto, existem evi-
dências para a transmissão sexual e através do leite materno,
assim como por transfusões sangüíneas e órgãos e tecidos trans-
plantados. Como conseqüência, é uma infecção endêmica e de
alta prevalência na população em geral.

A infecção primária em indivíduos saudáveis apresenta-se


tipicamente como uma síndrome “mononucleose-like” (mal-
estar, mialgias, febre, anormalidades das provas de função
hepática, linfocitose com excesso de linfócitos atípicos [10%-
50%]), mas com ausência de linfadenopatia e dor de garganta,
e com monoteste negativo. Esta costuma ser seguida de infec-
ção persistente. A recorrência clínica é geralmente causada por
reativação; reinfecção também ocorre, possivelmente devido à
diversidade antigênica do CMV e, na grande maioria dos casos,
é subclínica.

A infecção pelo citomegalovírus é importante em transplante


renal por sua alta prevalência, pela gama variada de síndromes
clínicas associadas e pela capacidade imunomoduladora do
vírus, assim como pela morbidade e mortalidade que podem dela
resultar.

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Definições hepatite ou ulcerações gastrointestinais,


A fim de facilitar a compreensão e, conse- pancreatite, pneumonite e, mais raramen-
qüentemente, o manejo desta infecção, é ne- te encefalite. Em transplante renal, a úni-
cessário que sejam estabelecidas algumas ca manifestação inicial pode ser a
definições. disfunção do enxerto;
• Profilaxia anti-CMV: Indicada em casos
• Infecção primária: Primeiro episódio de in- de D+/R- ou quando indicado tratamen-
fecção pelo CMV que ocorre em indivíduo to com drogas antilinfocitárias (qualquer
com sorologia anti-CMV previamente ne-
que seja a combinação D/R. Na ausência
gativa. Geralmente ocorre positivação da
de profilaxia, a incidência de infecção por
sorologia (IgM e IgG) anti-CMV e da
CMV pós-transplante de órgãos sólidos
antigenemia para CMV;
• Infecção secundária: Pode ser dividida em: varia de 80% a 100% em combinações
 Reativação (quando a cepa viral laten- D+/R- (ou seja, doador positivo e recep-
te se manifesta clinicamente), ou tor negativo, sorologicamente para
 Reinfecção (quando indivíduo porta- CMV). Na profilaxia da doença CMV
dor de infecção latente por determina- (necessária na combinação D+/R-, D+/
da cepa do CMV é infectado com uma R+ ou D-/R+), várias abordagens podem
segunda cepa do mesmo vírus). Esta ser empregadas. A imunização passiva
também é denominada de superinfec- com gamaglobulina humana ou com
ção. Ocorre em indivíduos com globulina hiperimune anti-CMV tem sido
sorologia IgG anti-CMV positiva; ge- empregada com relativo sucesso. A segun-
ralmente ocorre positivação da da é preferível por conter títulos mais
sorologia IgM anti-CMV e/ou eleva- altos de anticorpos anti-CMV. O maior
ção do título sérico de IgG anti-CMV. problema com estas preparações é o alto
Outros testes que evidenciam a presen- custo. Profilaxia com drogas antivirais
ça viral (como a pesquisa da anti- (ganciclovir e valaciclovir) também tem
genemia para antígeno CMV pp65)
sido empregada com relativo sucesso
também costumam ficar positivos;
(retardo de infecção por CMV e preven-
ção de CMV doença). Neste caso, a terapia
• Infecção latente: Persistência viral, de for-
antiviral é empregada desde o momento
ma latente, em diversos tecidos do hospe-
deiro. Estes indivíduos tipicamente apresen- do transplante em grupos considerados de
tam sorologia IgG anti-CMV positiva. Os risco para o desenvolvimento de CMV
demais testes (IgM e antigenemia para doença. O tempo de tratamento profi-
antígeno CMV pp65) são negativos; lático é variável, mas a duração é, em
• Infecção ativa (ou CMV doença): Manifes- média, de 4 a 12 semanas. Mais recente-
tações clínicas secundárias à infecção mente, tem sido indicado valganciclovir,
pelo CMV, primária ou secundária. Estas que apresenta biodisponibilidade 10x
podem variar de febre, com ou sem maior que o ganciclovir oral, além de
leucopenia, a mialgias e mal-estar até posologia mais simples.

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• Tratamento pré-emptivo: É uma forma broncoscopia com lavado e biópsia transbrôn-


mais específica de profilaxia. Neste caso, quica), a fim de elucidar a etiologia e iniciar
são realizados testes para detectar a pre- prontamente o tratamento específico.
sença de viremia (antigenemia pp65), pe-
riodicamente, em pacientes previamente Do ponto de vista laboratorial, inicia-se
negativos, para detectar precocemente a com a realização dos testes sorológicos, que
multiplicação viral. Uma vez positivos, po- são principalmente empregados para indicar
dem indicar o tratamento pré-emptivo, até latência viral nos candidatos a receptor e do-
a negativação do teste. ador. Sua sensibilidade está muito diminuída
no período pós-transplante devido à
Diagnóstico imunossupressão induzida por drogas. Portan-
O médico transplantador deve sempre to, enquanto a positivação de IgM e/ou a ele-
considerar a possibilidade da infecção vação dos títulos (em pelo menos quatro ve-
citomegálica ser a responsável direta ou de zes) de IgG indicam infecção primária ou se-
forma subjacente por um determinado qua- cundária, a não positivação destes testes não
dro clínico. Tipicamente, a doença se mani-
descarta tais diagnósticos. Frente a uma sus-
festa entre o primeiro e o sexto mês pós-
peita clínica de citomegalovírus e sorologia
transplante. O paciente pode apresentar-se
negativa, devemos proceder a um dos seguin-
com um ou com diferentes combinações dos
tes testes: antigenemia pp65 (avaliada em
seguintes sinais e sintomas: febre, fraqueza,
leucócitos de sangue periférico) ou PCR para
indisposição, cansaço, dores musculares e/
CMV-DNA. O primeiro é preferível devido à
ou articulares, elevação de creatinina, leuco-
penia, linfopenia, anemia, plaquetopenia ou sua alta sensibilidade e especificidade. O
infecções oportunísticas por fungos, vírus ou segundo, apesar de sensível, é pouco específi-
parasitárias (por exemplo, pneumonia por co, não distinguindo vírus latente de ativo.
aspergilose invasiva associada à viremia ou à Novos testes moleculares, como RT-PCR,
pneumonia CMV). A elevação de creatinina teste da captura híbrida direta do CMV-DNA
pode dever-se tanto a uma lesão diretamente ou teste da amplificação de ácido nucleico ba-
atribuída ao vírus (que melhora com terapia seada em seqüência (NASBA) ainda encon-
anti-viral) ou à rejeição aguda (efeito imuno- tram-se em fase de avaliação.
modulador do vírus). Além disso, a infecção
pelo CMV também é um fator de risco para o O diagnóstico pode ser feito também pela
desenvolvimento de doença linfoproliferativa demonstração do vírus (ou de sua repercussão)
pós-transplante associada ao vírus Epstein- em tecidos obtidos por biópsia (estômago, có-
Barr. Finalmente, doença órgão-específica pode lon, esôfago, pulmão e bexiga, entre outros).
ocorrer: pneumonia, hepatite, miocardite,
retinite e/ou úlceras gastrointestinais. Na R ECOMENDAÇÕES
suspeita de doença órgão-invasiva (por exem-
plo, pneumonia), deve-se submeter o pacien- O status sorológico deve sempre ser verifi-
te, sem perda de tempo, a procedimentos cado no doador e no receptor antes do trans-
invasivos diagnósticos (por exemplo, plante (ELISA sensível para anticorpo IgG

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específico anti-CMV). Tal avaliação permite me- ou policlonais (ALG, ATG) para terapia de
lhor aferição do risco de infecção/doença por indução ou para a reversão de rejeição aguda
CMV após o transplante, assim como o uso mais esteróide-resistente, deve receber profilaxia anti-
adequado de profilaxia1,2(D). CMV2(D)7,8(B).

Devido à alta prevalência de infecção por A profilaxia anti-CMV deve ser selecionada a
CMV após o transplante renal, vigilância siste- partir de uma das seguintes opções9,10(A)11-18(B):
mática para a sua detecção se justifica em todos
os receptores nos três primeiros meses. Esta in- • Globulina hiperimune administrada sema-
vestigação deve ser repetida caso ocorra qual- nalmente por seis semanas (dose alta) ou por
quer episódio febril ou sinal sugestivo de doen- 16 semanas (dose baixa);
ça por CMV (trombocitopenia ou elevação das • Aciclovir oral na dose de 3.200 mg/dia (800
enzimas hepáticas)1,2(D). mg 4x/d), por 12 semanas, com ajustes re-
gulares para a função renal;
A investigação para infecção por CMV • Valaciclovir oral na dose de 8.000 mg/dia
deve incluir a detecção viral nos leucócitos (2.000 mg 4x/d), por 90 dias, com ajustes
do sangue periférico através da técnica de regulares para a função renal;
antigenemia pp65 ou outra mais sensível. • Ganciclovir endovenoso na dose de 5 mg/
Em urina, a técnica de cultura rápida é uma kg/dia (2,5 mg/kg 2x/d), por pelo menos 14
opção. Sorologia seriada deve ser feita para dias, com ajustes regulares para a função
a detecção de soroconversão de status nega- renal;
tivo para positivo e/ou da produção de IgM • Ganciclovir oral administrado por período
para IgG3-6(B). mais longo (2 a 12 semanas) na dose de
3.000 mg/dia (1.000 mg 3x/d), com ajus-
Para que se diminua o risco de infecção por tes regulares para a função renal;
CMV em receptores soronegativos, estes devem • Valganciclovir 900 mg/dia por 12 semanas,
receber produtos sangüíneos seguros (produtos com ajustes para a função renal.
sangüíneos selecionados de pessoas CMV
soronegativos ou filtrados após depleção Todo o receptor com CMV doença deve re-
leucocitária), quando indicado2(D)7(B). ceber um tratamento curativo. Até o presente
momento, o único tratamento validado é
Todo o receptor soronegativo para CMV que ganciclovir endovenoso, na dose de 10 mg/kg/
recebe um rim de um doador soropositivo (D+/ dia (5 mg/kg 2x/d), por pelo menos 14 dias,
R-) ou de um doador não sorotipado deve rece- com ajustes regulares para a função
ber profilaxia iniciada no momento da renal19(C)20(B).
cirurgia2(D)7(B).
Alternativamente, estes pacientes (com CMV
Durante o primeiro ano pós-transplante, doença) podem receber ganciclovir endovenoso por
todo receptor soropositivo para CMV que rece- cinco dias, seguido de ganciclovir oral na dose de
ber anticorpos antilinfocitários, mono (OKT3) 3.000 mg/dia (1.000 mg 3x/dia), ou valganciclovir

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com ajustes regulares para a função renal, por pe- ano23,24(D)25(B). Pela dificuldade de se separar
ríodos mais longos (de 2 a 12 semanas)20(B). o componente de agressão imunológica que
levaria à rejeição crônica de outros fatores de agres-
Todo o paciente com infecção CMV são ao enxerto não imunológicos, a designação
assintomática, mas com evidências que nefropatia crônica do transplante tem sido mais
sugiram atividade viral (positivação de anti- utilizada recentemente23,24(D). Existem vários
corpos IgM e/ou elevação dos títulos de fatores de risco associados ao aparecimento da rejei-
IgG em pelo menos quatro vezes e/ou ção crônica, mas o papel exato de cada um destes
antigenemia positiva e/ou positivação do PCR fatores ainda não está esclarecido. Destacam-se
para CMV) em exames de rotina realizados entre eles a condição do órgão doado (idade
no período inicial após o transplante renal, do doador, causa de morte encefálica, condição
devem receber um tratamento pré-emptivo de hemodinâmica, tempo de isquemia fria e co-
forma a evitar a proliferação viral e, conse- morbidades presentes), o esquema imunos-
qüentemente, o quadro de CMV doença. Este supressor utilizado e a presença e intensidade
tratamento pressupõe o emprego precoce de episódios de rejeição aguda23,24,26(D)25(B).
da terapia curativa validada, conforme A tendência atual de maior uso de órgãos
descrito acima21(A). “limítrofes” com o objetivo de aumentar a oferta
de órgãos para transplante deve aumentar o risco
e a incidência da rejeição crônica.
Episódios de rejeição aguda estão clara-
mente associados com CMV infecção ou Quadro Clínico, Definição e Impac-
doença. Nestas situações, o tratamento da to23,24(D)25(B):
CMV infecção ou doença deve ser o objetivo • Piora progressiva da função renal;
inicial, através de ganciclovir endovenoso,
• Presença de proteinúria, menor que 1,0 g/
conforme acima descrito. Caso seja necessá-
dia em 50% dos casos;
rio, pulsoterapia com metilprednisolona deve
• Presença de hipertensão arterial (> 90%);
ser empregada. Anticorpos antilinfocitários
• Manifestações clínicas usualmente ocorrem
(ALG/ATG/OKT3) devem ser evitados
após seis meses de transplante;
sempre que possível22(C).
• Alterações histológicas típicas: hiperplasia
fibro-intimal das artérias, atrofia tubular e
Em casos de infecção citomegálica resis- fibrose intersticial e glomerulopatia do trans-
tente ao ganciclovir, deve-se empregar Foscarnet. plante;
• Principal causa de perda do enxerto após um
R EJEIÇÃO CRÔNICA EM TRANSPLANTE ano (responsável por 20% a 70% das perdas).
RENAL ( N E F R O PA T I A C R Ô N I CA DO Muitas vezes, pelo quadro clínico é difícil
TRANSPLANTE ) a separação entre os quadros de rejeição agu-
da tardia, nefrotoxicidade por ciclosporina ou
A rejeição crônica do transplante é a princi- tacrolimus, recidiva ou GN de novo e rejei-
pal causa de perda do enxerto após o primeiro ção crônica.

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Fatores de Risco e, às vezes, pode ser difícil se separar a lesão


• Imunológicos27(A)23,24(D): que ocorreu no doador de um processo pro-
 Episódios de rejeição aguda; gressivo que esteja ocorrendo no receptor. A
 Baixa compatibilidade HLA; intensidade de fibrose túbulo-intersticial e
 Rejeições subclínicas24(D); atrofia tubular observada em biópsias proto-
 Imunossupressão insuficiente (geralmen- colares, isto é, em pacientes com função re-
te por baixa aderência ao regime nal estável, se correlaciona com o desenvolvi-
terapêutico). mento de rejeição crônica na evolução. Este
dado sugere que a lesão histológica pode estar
• Não imunológicos25,28,29(B)30(A): presente antes da deterioração da taxa de fil-
 Idade do doador, desproporção do tama- tração glomerular.
nho entre doador (pequeno) e receptor
(grande); Tratamento
 Raça do receptor; • Tratamento com imunossupressão23(D)31(B):
 Necrose tubular aguda (função retarda-  Após 10 anos de uso de ciclosporina,
da do enxerto); 100% dos pacientes apresentam evidên-
 Nefrotoxicidade; cia cistológica de nefrotoxicidade
 Diminuição de massa renal; crônica32(B). Desta forma, a menor
 Hipertensão arterial; exposição do enxerto a esta droga con-
 Hiperlipidemia; tribui para melhor sobrevida do enxerto
 Infecção por CMV. a longo prazo.
 Pacientes em uso de esquema tríplice
O conhecimento dos vários fatores de risco deve [ciclosporina (CSA), azatioprina
(AZA), predinisona (Pred)]:
ser utilizado com o objetivo de se intervir precoce-
Diminuir ou suspender a dose de CSA
mente em cada um deles para evitar o aparecimen-
(120 a 80 ng/ml) e substituir AZA
to da rejeição crônica23,24(D)25,29(B).
por mofetil micofenolato (MMF) (2,0
gr/dia)33(C)34(B).
Diagnóstico24,26(D)  Pacientes em uso de CSA e Pred:
• Suspeita clínica; Diminuir dose de CSA (120 a 80 ng/
• Confirmar diagnóstico com biópsia renal; ml) e associar MMF (2,0 gr/dia)33(C).
• Diagnóstico diferencial: rejeição aguda,  Pacientes em uso de AZA e Pred:
obstrução ureteral, estenose da artéria re- Substituir azatioprina por MMF (2,0
nal, pielonefrite aguda, nefrotoxicidade por gr/dia)33(C).
ciclosporina ou tacrolimus, recidiva da  Outros esquemas imunossupressores:
doença primária, doença linfoproliferativa Diminuir ou suspender a dose de
pós-transplante e infecção por poliomavírus. inibidores de calcineurina e associar
MMF, caso não esteja sendo usado. Uma
O diagnóstico deve sempre ser confirma- opção é usar tacrolimus no lugar da
do por biópsia renal. A intensidade das alte- ciclosporina, e vice-versa. Pode-se tam-
rações túbulo-intersticiais pode variar muito bém substituir o inibidor de calcineurina

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por rapamicina, associado ao MMF e cialmente nefrotóxicas (ciclosporina, tacrolimus,


Pred. A eficácia destes tratamentos pro- etc). Dados de modelos experimentais de rejeição
postos ainda não está comprovada, mas crônica e de modelos de progressão de insuficiên-
eles podem se adotados. cia renal demonstraram bons resultados com a as-
• Tratamento não imunossupressor28(B)23,24,35(D): sociação de MMF e inibidores da ECA37,38(C) ou
 Controle rigoroso da hipertensão ar- antagonistas de receptores de AII35(D).
terial, utilizando preferencialmente
CONFLITO DE INTERESSE
inibidores da enzima conversora da
angiotensina (ECA) ou antagonistas
Silva AP Filho: recebeu honorários para con-
da angiotensina II (AII)28(B);
ferências do laboratório Roche e do Laboratório
 Controle da dislipidemia29(B)36(A);
Selofarma e financiamento para pesquisa do
 Dieta hipoproteica. Laboratório Novartis. Carvalho DBM: recebeu
Não existe nenhuma terapêutica que reembolso por acompanhamento a Simpósio do
comprovadamente bloqueie a progressão da rejei- Laboratório Novartis e financiamento para pes-
ção crônica, mas existe um consenso em se dimi- quisa do Laboratório Wyeth Wayerst Phar-
nuir os fatores que propiciam sua evolução, como maceutical, Laboratório Roche, Laboratório
hipertensão arterial, hiper-colesterolemia, diminuir Novartis, Astellas Pharma Us, Inc e Laborató-
ou retirar drogas ou associações de drogas poten- rio Bristol - Myers Squibb Farmacêutica Ltda.

Transplante Renal: Complicações Não-Cirúrgicas 9


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