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* A parte II deste artigo apresenta uma versão modificada da conclusão do meu Teses ad Marx: Para uma crítica
ao (não-)pragmatismo de Marx, Cognitio (PUCSP), v. 13, n.1, jan.-jun. São Paulo: 2012, pp. 115-144. A parte
III é uma versão modificada e ampliada do meu "Do Corpo Político ao Corpo Social: o Corpo Transpessoal em
Karl Marx", Revista da Bahia, v. 5, n. 19, p. 60-63, 1980. O leitor interessado no assunto do presente texto pode
querer dar uma olhada também nos nossos "A Filosofia Marxiana da História como Selbsterzeugung do Homem",
em Santos, A. C. História e Ação. São Cristóvão: Ed. UFS, 2006, e "Materialismo e Moral em Friedrich Engels: uma
confusão do século XIX", em Ideação, UEFS, n. 1 (set.), Feira de Santana, 1997, pp. 53-58.
** O autor é professor titular da Universidade Federal da Bahia (UFBA), com estágios de pós-doutorado na Uni-
versidade da Califórnia (Berkeley) e na New School (New York).
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ximidade e até eventual implica- ainda que nossa essência seja defi-
ção entre o Cristianismo e o novo nida como o conjunto de nossas re-
ponto de vista materialista histó- lações sociais, fundamentalmente
rico, ateu, de Marx e Engels. O aquelas desenvolvidas na ativi-
que envolve a pergunta por qual dade prático-produtiva, conformes
é mesmo a compreensão marxi- ao grau de desenvolvimento dos
ana da religião em geral e do cris- objetos /instrumentos que lhe dão
tianismo em particular, incluído suporte, e de acordo com nossa
aí o protestantismo, e por qual é própria compleição corpórea, a do
mesmo a relação (de negação, que organismo que somos. Ao mesmo
seja), para Marx, entre as duas coi- tempo, em associação com isso,
sas: sua concepção e a do cristi- Marx propõe – pelo lado episte-
anismo. O que no fim de contas mológico desse materialismo - que
tem a ver, na minha opinião, com a a objetividade de nosso conheci-
pergunta pelo fundamento forte da mento seja entendida não como
forte dimensão normativa do pen- algo a ser resolvido na teoria (o
samento do autor de O Capital. que para ele seria escolástico), mas
Marx é certamente várias coisas, a ser demostrada na prática. E,
entre elas um materialista prático para culminar esse materialismo
(como ele se autodenomina aí por prático, propõe que a própria ver-
1845-46), junto com - é o que em dade de um pensamento seja com-
geral primeiro se concebe - mate- preendida como sua efetividade e
rialista histórico e dialético. Como poder, justamente demonstrados,
autodenominado materialista prá- de novo, na mesma prática.
tico, e essa é a parte de Marx de que Nosso materialista prático en-
no momento mais gosto, ele pro- tende ainda que é a nossa existên-
põe que a realidade seja apreen- cia (social, prática) que determina
dida não apenas como objeto mas a nossa consciência, e que mesmo
em primeiro lugar como atividade nossas concepções gerais sobre as
prática sensível e como processo, coisas correspondem a pontos de
enquanto propõe que nós próprios, vista (Standpunkten) - práticos, so-
também, sejamos entendidos como cialmente engendrados. Isto é, ele
atividade sensível e como histó- entende, que nosso ser prático e
ricos, como prática. Ele defende social, ativo-produtivo, está ine-
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vitavelmente por trás de nossos gico. Mas como uma teoria social,
pontos de vista, mesmo os mais econômica e histórica abrangente,
filosóficos. Tudo isso para, ao fi- pretensamente científica, uma Ci-
nal, declarar com todas as letras, ência da História e em primeiro lu-
na Ideologia Alemã, de jeito sur- gar do Capitalismo, que incluiria
preendente para quem começa tão com destaque a descoberta da lei
prático, que esse materialismo prá- de sua gênese, desenvolvimento,
tico é sinônimo de comunismo. Ou colapso e superação, o princípio de
seja, que sua compreensão materi- seu funcionamento, de seus efei-
alista e prática, do que somos nós tos e de sua passagem. A obra O
e são as coisas, e do que é conhe- Capital aparece então como o ca-
cimento, conduz a uma conclusão pítulo principal e mais elaborado
prescritiva, comunista, e deveria do materialismo histórico ofere-
orientar a realização desse grande cido por Marx, esse materialismo
Ideal normativo, como um Bem histórico aparecendo como uma
admirável e final: o Comunismo. narrativa geral, com todo jeito de
Quem sabe, também vice-versa: filosofia da história. Ou seja, O Ca-
a declarar que sua posição comu- pital aparece como parte da nar-
nista ativista, revolucionária e ra- rativa de uma sucessão encadeada
dical, pede o materialismo prático de estágios históricos progressiva-
que ele então formula, para tanto mente superiores, que correspon-
devendo ir além do materialismo deriam a diferentes modos de pro-
e do humanismo menos ativistas dução, desde a comunidade primi-
de Feuerbach. E isso tudo quando, tiva original até o Comunismo fi-
paradoxalmente, tal materialismo nal. O qual aparece como o único
– prático-produtivo, poiético - pa- e verdadeiro fim do Capitalismo, e
rece ser a parte mais secularizada, também como Reino da Liberdade,
mais laica, menos especulativa, fim da Pré-História do Homem e
mais empirista, de sua concepção. do Reino da Necessidade. Quase
O marxismo, porém, aparece, como Fim dos Tempos e completa
de saída, e para mais gente, não reconciliação dos homens entre si,
simplesmente como um materia- com seu mundo e com a natureza.
lismo prático geral, digamos, onto- Enfim, o Comunismo como nada
lógico, antropológico e epistemoló- menos do que, diz Marx em outra
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1 O leitor pode sentir falta, nessa parte I, de referências para algumas de minhas afirmações, porém elas es-
tão dadas nas partes II e III, onde as mesmas questões serão retomadas de modo desenvolvido. Fora disso, mais
referências para as posições que defendo aqui estão dadas em diversos outros artigos meus sobre assuntos afins,
oferecidas na Referência ao final do artigo.
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Marx acaba por romper, que as- quando Nietzshe nem era nascido.
sume uma tonalidade, pode-se di- Daí então as diferentes posições
zer, mais protestante, mais subje- desses filósofos hegelianos de es-
tivista (embora, no caso de Bauer, querda, quanto à Crítica, ou seja,
numa perspectiva política não co- quanto ao enquadramento - ge-
munista nem liberal, mas repu- ral, valorativo, por vezes especu-
blicana). Uma perspectiva, a de lativo, sempre filosófico - do Pre-
Bauer, que prefere ir para o lado sente, isto é, do nosso Tempo,
da tradução - ou melhor, dessa vez, como uma época histórica ainda
dissolução – do Cristianismo em não completamente nova: a Mo-
uma consciência universal, autô- dernidade. Tal época coincidindo
noma e soberana, do próprio ho- ainda com um certo desenvolvi-
mem. Deste enquanto indivíduo, mento do Cristianismo, a Reforma
até oposto à “Massa” (a que ape- Protestante, tomada por esses críti-
lam os comunistas), tomada por cos ateus como uma espécie de re-
Bauer na verdade como grosseira caída no Judaísmo latente do qual
e egoísta. Uma transformação do o Cristianismo nunca se teria com-
cristianismo numa autoconsciên- pletamente libertado. Uma época
cia universal a que cada homem de transição semelhante à que deu
poderia / deveria individualmente origem ao Cristianismo, pondo fim
erguer-se pela razão e pelo pen- à Antiguidade. Marx está entre es-
samento, como um ser finamente ses que entendem a Modernidade
autônomo - mais ou menos como protestante, como um retorno (no
na Fenomenologia do Espírito de He- nível cultural ou espiritual, pelo
gel. Só que, agora, por uma supe- menos) ao - e generalização do
ração de toda “substância”, uma – Judaísmo. Ou seja, para ele e
superação mais radical e subjeti- Feuerbach, uma generalização do
vista do que a de Hegel, pelo fim egoísmo, do individualismo, do
completo da religião (como ali- particularismo, do engajamento
enação a outro Ser, como hete- apenas prático vulgar, utilitarista,
ronomia) e pela proclamação da com o mundo - uma generaliza-
“morte de Deus” - anunciada por ção do interesse subjetivo não uni-
Bruno Bauer bem antes de Nietzs- versalizável, enfim. Essa genera-
che, mais precisamente em 1841, lização como tendo sido realizada
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2 Sobre isso, ver, por exemplo, Why did Feuerbach concern himself with Luther? John GLASSE. Revue Internati-
onale de Philosophie. Vol. 26, No. 101 (3), FEUERBACH (1972), pp. 364-385
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3 A tese de que Marx não se submete, nas suas pretensões de conhecimento, à crítica que ele próprio faz do
individualismo abstrato, intuicionista-contemplativo, cartesiano-lockeano - para o qual o indivíduo, teórico, des-
provido de contexto e exterior à realidade, poderia sozinho refletir adequadamente o todo do real social - é apenas
sugerida ao longo desse texto.
4 A Crítica alemã, desenvolvida desde Hegel, deu à filosofia o curioso papel transcendental de decifrar, para a
humanidade toda, seu grande enigma ou segredo, que – sem a ajuda dos filósofos – completamente lhe escaparia.
Marx vai preferir falar do segredo das nossas “representações” como sendo um segredo constituído pela própria
realidade objetivamente alienada, e isso é sua crítica da economia política e do capitalismo - o que aparentemente
deixaria os homens comuns ainda mais à mercê dos homens teóricos.
5 “Humanismo real” é o que Feuerbach põe no lugar do Cristianismo, e que Marx adota e usa como sinônimo de
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manismo real, Marx poderia tam- gundo Marx, algo como sintoma
bém dizer),5 ao revelar que Deus e signo, um fato que “só se ex-
(o fundamento celeste) é apenas plica” – a Tese Quatro trata de
uma projeção de si mesmo do ho- adiantar – “pelo auto-dilaceramento
mem, uma projeção distorcida de e pelo auto-contradizer-se” daquele
sua verdadeira essência (o funda- fundamento aqui embaixo.6 “É tal
mento terrestre). Com essa sua in- fundamento [terreno], portanto, que
terpretação supostamente decifra- tem de ser compreendido em sua
dora, Feuerbach pensaria ter re- contradição” (para Marx, sua ta-
solvido, poe seu humanismo ge- refa teórica, coroada no Capital), e
neroso, o problema do empobreci- principalmente (aqui as Teses co-
mento da vida humana e das re- meçam a introduzir seu dever-ser)
lações entre os homens, como in- “tem de ser revolucionado na prá-
troduzido pela alienação/religião, tica.” Em que direção, Marx ainda
e como prolongado no protestan- não explicita na Tese Quatro, mas
tismo e mesmo no secularismo mo- de qualquer forma esse agora se-
dernos. Mas, para Marx, Feuer- ria o verdadeiro fim da alienação
bach deixaria ainda de fazer o prin- terrena (logo, também da religi-
cipal, que é entender por que o fun- osa, seu sintoma), e é esse o impe-
damento humano abandona esse rativo categórico (como explicita a
mundo, “separa-se de si mesmo, e se Ideologia Alemã) que as Teses têm
fixa num Reino autônomo, nas nu- para oferecer aos homens, na Tese
vens” - autonomizando-se com re- Onze.7 Quanto ao que Marx de-
lação aos homens. fine como fundamento para sua
A religião, porém, seria, se- Grande Prescrição (o Comunismo),
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posso reiterar que não serão pro- Sociedade como uma espécie de
priamente as percepções e aspi- macro-sujeito. Uma perspectiva
rações mundanas dos homens re- tal que, segundo ela, se os ho-
ais (nem mesmo dos trabalhado- mens estão separados e a socie-
res), de dentro da sociedade civil, dade dividida, o homem está sepa-
como tais homens as tenham, em- rado/estranhado de si mesmo, em
piricamente verificáveis, como gos- contradição consigo mesmo, e a so-
tariam filósofos destranscendenta- ciedade (ou o mundo humano) está
lizantes, mesmo que por isso mo- despedaçada-dilacerada e oposta a
deradamente normativos e críticos. si mesma. Assim, homem ou so-
Em vez disso, o fundamento se es- ciedade (aqui, a mesma coisa),
tabelece como transcendente àque- nas atuais condições, literalmente
las aspirações e percepções, apare- auto-contradizem-se a si próprios,
cendo aqui como o que eles (os ho- negam-se a si mesmos. Com o que,
mens) expressam apenas, incons- ao mesmo tempo, fica estabelecida,
ciente e distorcidamente, na reli- por sobre a aparente dispersão dos
gião, isto é, no Cristianismo. Pois é, homens isolados, uma redução “di-
na realidade, pelas “más” relações alética” das diferenças e oposições
que estabelecem na prática pro- sociais a um par único de contradi-
dutora que as circunstâncias hu- tórios. Para o “Idealismo alemão”
manas se autonomizam em relação (com recurso ao qual as Teses se
aos homens, passando a submetê- batem contra a Modernidade como
los e determiná-los - até no próprio empirismo-liberalismo), a unidade
rumo ao Comunismo marxiano.8 (ou totalidade) é pressuposta, e a
O fato de a Tese Quatro re- divisão um erro e uma passagem
correr tantas vezes ao prefixo transitória. A unidade está no co-
“auto-” explica-se por sua pecu- meço, e no fim deve retornar, res-
liar perspectiva teórico-alemã es- tando então a tarefa teórico-prática
peculativa, de totalidade e uni- de eliminar – por um salto dialético
dade para o mundo humano, a - a Grande Contradição (da reali-
8 Marx, ao que parece, galga uma elaboração superior dessa ideia no O Capital, mas uma fórmula aproximada,
dela, é dada por ele já em 1845: “Não se trata de saber que fim um proletário ou mesmo o proletariado inteiro pensa ter
momentaneamente, [mas](...) do que ele será obrigado historicamente a fazer.” (MARX K, ENGELS F. La Sainte Famille.
Paris: Éditions Sociales, 1972, p. 48.
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9 Ver de SOUZA, J. Crisóstomo. Feuerbach, Crítica da Religião, Crítica da Modernidade. InCHAGAS, REDY-
SON e DE PAULA (orgs.). Homem e Natureza em Ludwig Feuerbach. Fortaleza: Edições UFC, 2009, p. 241-270. O
problema de Feuerbach é com a faltade verdadeira religião no mundo moderno, mantida a superficial crença na
existência do Sujeito da religião (o Deus pessoal) mas não a crença efetiva nos valoresdo cristianismo, ou seja nos
predicadosdivinos que seriam os da verdadeira essência do homem projetada em Deus – o amor (ou a solidariedade)
em primeiro lugar, mas também a razão e a vontade, enquanto atributos humanos coletivos, como tais infinitos.
10 Depois das Teses, Marx ainda recorrerá à linguagem da essência (à laFeuerbach), mas preferindo cada vez mais
a da determinação, oculta, do nível da aparência (inversora), à superfície, pelo nível da essência, o da verdade, ao
fundo. Ele dará ao seu “ponto-de-vista da sociedade humana” o caráter de Ciência e definirá a ciência, esdruxula-
mente, como conhecimento da essência (cf. A Ideologia Alemã).
11 A Tese Cinco apenas reitera a preocupação de Marx com a suposta fixação de Feuerbach no paradigma empi-
rista da chamada intuição sensível, em oposição ao da atividade humana sensível cindida. O que mostra como esse
ponto, digamos, de epistemologia política, é central para ele nas Teses.
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12 Marx segue aqui as prescrições da lógica hegeliana: “a essência introduzida na efetividade” é a definição he-
geliana para Substância, e é assim que ele entende o real social, a atividade sensível, com relação aos homens
individuais: mais do que sua essência, sua substância– em passagem pra sujeito, no Comunismo, naturalmente.
Também aqui Marx foge do nominalismo, tomando o ponto de vista, recorrente no pragmatismo, da realidade das
relações e continuidades no mundo que experimentamos (em oposição a Locke e Hume), tanto quanto dos objetos
(que elas de certo modo definem).
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13 Pode-se entender que Feuerbach retira do Cristianismo o Ideal alienado para devolvê-lo, desinflado, aos ho-
mens realmente existentes, mais ou menos à sua medida (de sua razão, sentimentos e aspirações), na forma de
um humanismo sensível, afetuoso, articulado às inclinações não-individualistas já manifestas no mundo vivido.
Enquanto que Marx acha que tal Ideal (ou seu Fundamento real) se manterá ainda, inevitavelmente, como trans-
cendente a esses homens (por injunções materiais), enquanto as relações entre eles (e eles próprios) não forem
radicalmente - entenda-se comunistamente - transformadas.
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14 O ateísmo de Feuerbach quer ser uma passagem do que para ele é o mal-disfarçado egoísmo judeo-cristão (em
que se ama ao seu Deus por amor de si mesmo), abrigado no subjetivismo da religião monoteísta, a um mais efetivo
sentimento de comunidade entre os homens todos.
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15 Para James, ver a primeira conferência, The present dilemma of philosophy, op. cit. Para Peirce, ver o artigo
também já citado, Evolutionary Love. Quanto a Dewey, ver seu A Common Faith, New Haven: Yale University
Press, 1934. A solidariedade é também, como dissemos, o grande motivo do pensamento do neo-pragmatista
Richard Rorty (Philosophy and Social Hope, Londres: Penguin Books, 1999.
16 MARX, Zur Kritik der hegelschen Rechstsphilosophie. Einleitung, inLÖWITH, K., Die hegelsche Linke. Stutt-
gart: Fromman Verlag, 1962, p. 262.
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19 Ef 4:12-13 e 4:13-14.
20 Ver Della Volpe, Rosseau y Marx - y otros ensayos de critica materialista, seção primeira.
21 Rousseau, Du Contrat Social, I, 6; II, 3; II, 4; VII, 1; e I, 8.
22 Thomas Hobbes, Leviathan, II, 17.
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23 Sobre isso, com a liberdade e a agudeza da literatura, Fernando Pessoa, no Livro do Desassossego, entende iro-
nicamente: “A escolha da Humanidade para sucedâneo de Deus, o culto da Humanidade, sendo ela uma espécie animal,
pareceu-me sempre uma revivescência de cultos antigos, em que animais eram como deuses” (p. 40).
24 Feuerbach, “Nécessité d’une Réforme de la Philosophie”, p. 101.
25 Ver sobre isso carta de Marx a Feuerbach, de 11-8-44 (MEW, vol. 27). E o artigo de Hess, “Sobre o Movimento
Socialista na Alemanha” (1844), citado por N. Lobkowicz, “Karl Marx and Max Stirner”, p. 66n.
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26 Max Stirner, Der Einzige und sein Eigentum: “Ich allein bin leibhaftig”, p. 14, e p. 152. Sobre a posição de
Stirner, ver meu “Dominação do Espírito em Plena Modernidade”. /////////////
27 Marx, “Teses ad Feuerbach”, tese n.10.
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32 No campo do marxismo, Lênin, mais do que Gramsci, é a expressão mais clara desse desdobramento. Ver,
no seu Que Fazer?: “Dissemos que os operários não podem ter consciência comunista; esta só pode ser introduzida no
exterior” (p.39); e: “Qual o papel dos comunistas senão de um ‘espírito’ que não só paira sobre o movimento espontâneo,
mas também eleva esse movimento ao nível do ‘seu programa’?” (p. 59). Nesta segunda citação, embora Lênin esteja
parafraseando uma crítica de adversários (daí as aspas), ele assume sem restrições a imagem bíblica do “espírito
pairando sobre o caos informe”.
33 Marx, “Debaten über das Holzdiebstahlsgesetz”, publicado em outubro de 1942, na Gazeta Renana.Marx &
Engels Werke, v. 1, pp. 109-116.
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34 Id., p. 115.
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41 Uma posição nominalista é a que atribui mais realidade ao que é particular, individual, do que ao que é geral,
universal, ideal. No limite, atribui realidade apenas ao primeiro.
42 Die deustsche Ideologie, pp. 20-21.
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