Você está na página 1de 82

neuroYciências

iSSN 1807-1058

psicologia
PSiqUiaTRia | PSicOSSOMáTica | PSicOPEdagOgia | NEUROPSicOLOgia | PSicOTERaPia

Neurociências - Volume 7 - Número 3 - Julho/Setembro de 2011


JULHO • SETEMBRO de 2011 • Ano 7 • Nº 3

13 anos

immunology and intentionality - Observing immunologists


Nelson Monteiro Vaz
Psicofármacos para aprimoramento das funções cognitivas
José Luiz Martins do Nascimento, Gilmara de Nazareth Tavares Bastos
Plasticidade sináptica como substrato da cognição neural
Ricardo Augusto de Melo Reis, Mário C. N. Bevilaqua, Clarissa S. Schitine
Fundamentos neurobiológicos da música
e suas implicações para a saúde
Paulo Estêvão Andrade, Elisabete Castelon Konkiewitz
Meu filho é autista e agora?
Sílvia Aparecida Santos de Santana

www.atlanticaeditora.com.br
neuroYciências
psicologia
Sumário
Volume 7 número 3 - julho/setembro de 2011

EDITORIAL
Cognição, Imunologia, Música e Psicologia, Jean-Louis Peytavin ................................... 139

II Jornada Fluminense de Cognição Imune e Neural, Academia Nacional de Medicina


Rio de Janeiro, 11 de agosto de 2011
Organização: Cláudio Tadeu Daniel-Ribeiro e José Luiz Martins do Nascimento

OPINIÃO
Immunology and intentionality - Observing immunologists,
Nelson Monteiro Vaz ................................................................................................... 140

ARTIGOS
Psicofármacos para aprimoramento das funções cognitivas,
José Luiz Martins do Nascimento,
Gilmara de Nazareth Tavares Bastos ............................................................................ 147
Plasticidade sináptica como substrato da cognição neural,
Ricardo Augusto de Melo Reis, Mário C. N. Bevilaqua,
Clarissa S. Schitine ..................................................................................................... 156

REVISÕES
Fundamentos neurobiológicos da música e suas implicações para a saúde,
Paulo Estêvão Andrade, Elisabete Castelon Konkiewitz................................................... 171
Meu filho é autista e agora?
Sílvia Aparecida Santos de Santana .............................................................................. 184

NORMAS DE PUBLICAÇÃO .................................................................................... 215

EVENTOS ................................................................................................................. 217


138 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

neuroYciências
psicologia ISSN 1807-1058

Revista Multidisciplinar das Ciências do Cérebro


Editor: Luiz Carlos de Lima Silveira, UFPA
Editor associado: Cláudio Tadeu Daniel-Ribeiro, Fiocruz
Editor-assistente: Bruno Duarte Gomes, UFPA
Presidente do conselho editorial: Roberto Paes de Carvalho, UFF

Conselho editorial
Álvaro Machado Dias, UNIFESP (Psicologia experimental)
Aniela Improta França, UFRJ (Neurolingüística)
Bruno Duarte Gomes UFPA (Fisiologia)
Carlos Alexandre Netto, UFRGS (Farmacologia)
Cecília Hedin-Pereira, UFRJ (Desenvolvimento)
Daniela Uziel, UFRJ (Desenvolvimento)
Dora Fix Ventura, USP (Neuropsicologia)
Eliane Volchan, UFRJ (Cognição)
João Santos Pereira, UERJ (Neurologia)
Koichi Sameshima, USP (Neurociência computacional)
Leonor Scliar-Cabral, UFSC (Lingüística)
Lucia Marques Vianna, UniRio (Nutrição)
Marcelo Fernandes Costa, USP (Psicologia Experimental)
Marco Antônio Guimarães da Silva, UFRRJ/UCB (Fisioterapia e Reabilitação)
Marco Callegaro, Instituto Catarinense de Terapia Cognitiva (Psicoterapia)
Marco Antônio Prado, UFMG (Neuroquímica)
Rafael Linden, UFRJ (Neurogenética)
Rubem C. Araujo Guedes, UFPE (Neurofisiologia)
Stevens Kastrup Rehen, UFRJ (Neurobiologia Celular)
Vera Lemgruber, Santa Casa do Rio de Janeiro (Neuropsiquiatria)
Wilson Savino, FIOCRUZ (Neuroimunologia)

Neurociências é publicado com o apoio de:


SBNeC (Sociedade Brasileira de Neurociências e Comportamento)
Presidente: Marcus Vinícius C. Baldo
www.sbnec.org.br

Atlântica Editora
e Shalon Representações
Praça Ramos de Azevedo, 206/1910 Editor executivo
E-mail: atlantica@atlanticaeditora.com.br Dr. Jean-Louis Peytavin
Centro 01037-010 São Paulo SP
www.atlanticaeditora.com.br jeanlouis@atlanticaeditora.com.br
Atendimento Editor assistente
(11) 3361 5595 /3361 9932 Guillermina Arias
E-mail: assinaturas@atlanticaeditora.com.br guillermina@atlanticaeditora.com.br
Diretor Direção de arte
Assinatura Antonio Carlos Mello Cristiana Ribas
1 ano (4 edições ao ano): R$ 160,00 mello@atlanticaeditora.com.br cristiana@atlanticaeditora.com.br

Todo o material a ser publicado deve ser enviado para o seguinte endereço de e-mail:
artigos@atlanticaeditora.com.br
Atlântica Editora edita as revistas Fisioterapia Brasil, Fisiologia do Exercício, Enfermagem Brasil e Nutrição Brasil
I.P. (Informação publicitária): As informações são de responsabilidade dos anunciantes.
© ATMC - Atlântica Multimídia e Comunicações Ltda - Nenhuma parte dessa publicação pode ser reproduzida,
arquivada ou distribuída por qualquer meio, eletrônico, mecânico, fotocópia ou outro, sem a permissão escrita do
proprietário do copyright, Atlântica Editora. O editor não assume qualquer responsabilidade por eventual prejuízo a
pessoas ou propriedades ligado à confiabilidade dos produtos, métodos, instruções ou idéias expostos no material
publicado. Apesar de todo o material publicitário estar em conformidade com os padrões de ética da saúde, sua
inserção na revista não é uma garantia ou endosso da qualidade ou do valor do produto ou das asserções de seu
fabricante.
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 139

Editorial

Cognição, Imunologia, Música


e Psicologia
Jean-Louis Peytavin

Temos o prazer de publicar nesta edição a de novos circuitos nos nichos neurogênicos.
primeira parte dos trabalhos apresentados na Agradecemos Nelson Monteiro Vaz para sua
2ª Jornada Fluminense sobre Cognição Imune reflexão sobre o papel da cognição na imuno-
e Neural, promovida pelo Instituo Oswaldo logia, onde ele conta seus trabalhos (e dis-
Cruz e pela Academia Nacional de Medicina, cussões) com grandes nomes da neurociência
e organizada pelos Dr. Cláudio Tadeu Daniel- contemporânea, como Humberto Maturana e
-Ribeiro (IOC/Fiocruz) e Dr. José Luiz Martins Francisco Varela.
do Nascimento (ICB/UFPA) na sede da Acade- Completamos esta edição com uma
mia Nacional de Medicina no dia 11 de Agosto grande apresentação de Paulo Estêvão An-
de 2011. A segunda parte será publicada na drade e Elisabete Castelon Konkiewitz sobre
próxima edição. os fundamentos neurobiológicos da música.
Nas páginas seguintes, apresentamos o Paul Estevão Andrade é um especialista desse
trabalho de José Luiz Martins do Nascimento e tema, que já abordou várias vezes em nossa
Gilmara de Nazareth Tavares Bastos sobre as revista nesses últimos anos.
drogas “inteligentes”, cujo objetivo é melhorar Enfim, agradecemos Sílvia Aparecida
as performances cognitivas, e o de Ricardo Santos de Santana por sua valiosa tentativa
Augusto de Melo Reis, Mário C. N. Bevilaqua de nos fazer entender o autista e sua difícil
e Clarissa S. Schitine sobre a elaboração relação com o mundo e sua família.
140 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

Opinião

Immunology and intentionality –


Observing immunologists
Imunologia e intencionalidade –
Observando os imunologistas
Nelson Monteiro Vaz

Abstract
When we consider the immune system as a cognitive system, as most immunologists do, our questions
and the criteria we use to validate the answers to these questions, will inevitably follow what we understand
as cognition. An alternative is to ascribe cognition to what immunologists do when they operate as human
observers and generate descriptions of immunological activities. In this uncommon way of seeing, which
I prefer, we ascribe the specificity of immunological observations to what we do as humans observers
operating in human language, rather than to what cells and molecules, such as lymphocytes and immuno-
globulins, do as components of the immune system. In this alternative way of seeing, we, immunologists,
are the true cognitive entities in immunology.

Médico, Doutor em Bioquímica e Imunologia, Professor emérito de Imunologia, Instituto de Ciências Bio-
lógicas (ICB), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Position paper to: II Jornada Fluminense
de Cognição Imune e Neural, Academia Nacional de Medicina, Rio de Janeiro, 11 de agosto de 2011

Correspondência: Departamento de Bioquímica e Imunologia, ICB-UFMG, Caixa Postal 486 Pampulha


30161-970 Belo Horizonte MG, Fax: (31) 3499-2640, E-mail: nvaz@icb.ufmg.br
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 141

Oral tolerance unaware of the immense changes this de-


manded from immunologists, “oral toler-
In the late 1970s, I was heading a ance” represented the natural insertion of
small laboratory at CARIH (Children’s the organism in its antigenic environment.
Asthma Research Institute and Hospital) I was then unaware that, although quite
associated to the University of Colorado, young, Francisco was already famous as
in Denver. Together with Donald G. Han- a neurobiologist and “cognitive scientist”,
son and Luiz Carlos Maia, I had literally praised by Gregory Bateson and other gi-
bumped into a phenomenon presently ants on the field. I was also unaware of
know as “oral tolerance”, which consisted the existence of Humberto Maturana, who
in a drastic reduction of specific antibody had been Francisco’s mentor and main
formation - i.e. of lymphocyte specific collaborator.
responsiveness - to proteins previously Francisco summarized and simplified
ingested as food [1,2]. All animals eat his epistemological (cognitive) approach
thousands of different proteins and many in a publication in Co-evolution Quartely,
other proteins produced by the intestinal presented as a conversation with Donna
microbiota; would all the responses to Johnson, entitled “Observing Natural
these proteins be also blocked? This lea- Systems”. In that paper, he dealt with
ds to a picture that simply didn’t fit - and the identity of systems, their wholeness
it still doesn’t - standard immunological - Varela’s main interest throughout his
understanding. We were fabbergasted. career - and claimed that the wholeness
In the more than 30 years that se- of systems may be perceived when we
parate us from those findings, “oral tole- figure their organizational “closure”, i.e.
rance” has generated many hundreds of when we see that, as compound unities
publications, but is still poorly understood (as systems), they are circularly or more
[3]. Current interpretations argue that oral elaborately turned into themselves [8].
tolerance regulates immune responses With these and other arguments,
initiated at the gut because, otherwise, Francisco introduced me to the notion of
progressive (secondary-type) immune systems as “closed” networks. Coinciden-
responses would generate inflammatory tally, Niels Jerne, a leading immunologist
bowel diseases (IBDs) [4]. Although it is of the time, who I greatly admired, had
correct to believe that oral tolerance pre- recently published his theory explaining
vents IBDs, this cannot explain its nature immunological activity as derived from
or evolutionary origin [5-7]. the operation of immunological networks,
created by anti-antibodies (anti-idiotypic
Enters Francisco Varela antibodies) [9]. Antigen-induced anti-
bodies generated anti-antibodies which
Simultaneously with our encounter were sustained each other in a complex
with “oral tolerance”, I had another un- interconnected network; this network em-
foreseen encounter: a fascinating meeting bodied the immune system. This was very
with the young Chilean neurobiologist, similar to what Francisco was telling and
Francisco Varela, who I immediately in- Jerne’s initiative could represent a major
vited to our laboratory and stayed with us theoretical breakthrough, beyond clonal
for about one semester. For Francisco, explanations of immune activity.
142 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

Francisco and I wrote a paper arguing ance”, or the drastic inhibition of immune
that Jerne’s paper, although utterly impor- responsiveness to previously ingested
tant, was incomplete, exactly because it proteins. The analysis of “oral tolerance”
lacked the notion of “closure” (systemic turned out to be a lifelong objective in my
organization), which Francisco deemed own laboratory, but was abandoned by
as essential in the description of any Varela in his future association with im-
system [10]. We sent the paper to Jerne, munological research, in Antonio Coutin-
who praised it. Actually, Jerne himself, ho’s laboratory at the Institute Pasteur,
had formerly claimed that: “...we must in Paris (more on this below).
now accept that the immune system is In retrospect, then, I had stumbled on
essentially “closed” or self-sufficient in a surprising phenomenon that nobody un-
this respect” (in its recognitions and ac- derstands (“oral tolerance”) through which
tivations) [11]. This statement appeared immune responses to foreign proteins is
in Jerne’s internal report as Director of drastically reduced. We could transfer this
the Basel Institute for Immunology but, “tolerance” from “tolerant” mice to normal
to my knowledge, was never published mice with T-lymphocytes [12]. Thus, rather
elsewhere. than being a selective subtraction of im-
Actually, Jerne’s main paper lacked mune responsiveness, oral tolerance add-
this idea of “self-sufficiency”I [9]; he ed to the immune system something we
refers to “a revolutionary new idea that didn’t understand. Concomitantly, through
would change immunology as a whole”, the arguments of Francisco Varela, I was
but fails to describe this idea explicitly. convinced that the immune system oper-
It could not be the idea of (anti-idiotypic) ated as a “closed” network of lymphocyte
anti-antibodies - the links in the immune and antibody interactions. Immunologists
network -, because these connections are mainly concerned with self/nonself
could not be all equal. I believe, as Varela discrimination, but our paper described
also did, that this missing idea was actu- the immune system as a “closed” network
ally the idea of “closure”, or, more simply, of interactions, such that whatever fell
the idea of the inner organization which outside this “closed” domain, was simply
embodies the wholeness of systems. nonsensical. Moreover, the very notion of
Without the idea of an invariant organiza- anti-antibodies (anti-idiotypic antibodies)
tion (of a “closure” onto itself) the idea of [9], that provides an abundant internal con-
anti-antibodies is confusing, rather than nectivity of antibodies and lymphocytes,
clarifying. Thus, we wrote “Self and non- denied in itself the idea of self/nonself
sense: an organism-centered approach discrimination - although Jerne was never
to immunology”. It was rejected by the clear on this point. We also claimed that,
European Journal of Immunology as “too in “oral tolerance”, the immune network
theoretical” - which, of course, it indeed assimilates proteins encountered as food
was - and we published it in Medical Hy- or as products of the gut flora. Thus, in
potheses [10]. addition to the attempt to add the notion
In addition to its network aspect, our of organizational “closure” to Jerne’s
paper was also devoted to “oral toler- (idiotypic) network [9], we proposed that
physiological contacts with potential anti-
I Which is not the idea of organizational “closure”,
but rather a step in a similar direction. gens involved an assimilation, rather than
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 143

a rejection of these materials [10,13]. This can only ascribe the conciliation of these
was a second very important point. opposing views to Varela’s great personal
talent in establishing associations with
Varela, Coutinho & Stewart other scientists.
Here we touch a delicate point be-
In his subsequent association with cause, in his collaboration with Coutinho
immunologists, Varela totally neglected and Stewart, Varela added an important
the relevance of “oral tolerance” [14]. collection of new findings to immune ne-
Curiously enough, he was also able to tworks, but his ideas on organizational
maintain a close collaboration with Couti- closure remained in a low key. What was
nho for many years, in spite of Coutinho’s at stake then? What was behind the titles
explicitly denial of the concept of closure: of Varela’s papers, such as: “What is the
immune network for?” [16]; or, “Immukno-
“I did not agree (and I still do not agree today, wledge: The immune system as a learning
despite many discussions with Nelson Vaz) process of somatic individuation” [17]? A
that their (Vaz-Varela) central claim was right. hint to what might have happened derives
I continue to think that a ‘decision-making from their proposal to divide immune res-
behavior’ naturally emerges from the immune ponsiveness into two immune systems,
system’s development, structure and opera- called CIS and PIS [18]. A central immune
tion, allowing for the differential treatment of system (CIS) would roughly correspond
molecular shapes it identifies either as ‘self’ to Jerne’s idiotypic network, i.e., to a
or ‘nonself.’” [15]. systemic description; and a peripheral
immune system (PIS) was responsible for
However, in our paper we explicitly lymphocyte clonal expansions in specific
claimed that: immune responses, as traditionally stu-
died in immunology - actually, a separation
“... the transformations of the cognitive do- between “local” and “global” events as
main of the immune network in an organism’s is common in connectionist approaches
ontogeny are a combination of its recursivity to cognitive sciences [19].
(its closure) and the fact that it is exposed to In our way of seeing, there is only
random perturbations or fluctuations from the one immune system, but different ways
environment (its openness). In other words, it of seeing and describing its activity. But,
exhibits self-organization, the transformation as it was standard in Varela’s approach
of environmental noise into adaptive functio- to cognition, the human observer, its ope-
nal order, in a manner similar to many other ration in language and its way of seeing
biological systems such as cells, nervous remained hidden. This is in sharp contrast
systems, and animal populations.” [10]. with Maturana’s attitude, who always tries
to make explicit the different phenomenal
Coutinho confounded the idea of “clo- domains which may be described by the
sure” with solipsism and insisted to ‘put observer in his actions in human langua-
the network back into the body’ although ging [20,21].
Varela himself was careful in explaining As almost everybody else, Varela con-
that, although ‘closed’ in its organization, ceived the immune system as a cognitive
the system is ‘open’ for intractions [8]. I system, a self with a defined identity [22].
144 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

In his own words, his main interest was immunologists and has been treated as
the emergence of cognition, which he “degeneracy” [27] or “polyspecificity”
saw emerging everywhere [23]. On the [28]. But, to my knowledge, no one has
other hand, for Maturana, cells, organs, ascribed immunological specificity to what
etc. are totally blind (in cognitive terms) we do, as languaging humans, because
to their respective media; only organis- this may be understood as solipsism and
ms, as wholes, are capable of “effective scientists insist to be dealing with an
actions” that we identify as cognitive objective observer-independent reality.
actions [20]. In Maturana’s publications Maturana advise us about a reality [in
and presentations, the presence of the parentheses] that depends on the history
human observer and the importance of of the human observer, a kind of ‘inter-
human languaging in the construction of -subjectivity” we can build among oursel-
what is experienced as real, are always ves with our actions and beliefs [21].
made explicit. The characterization of
separate domains of description, which Demise and resurrection of immune
are typical of the context established by networks
Maturana in his Biology of Cognition and
Language, which is minimized in Varela’s The prolonged association of Varela
work, is totally absent from current immu- with frontier reasearch in immunology in
nological literature. Coutinho’s laboratory brought forth truly
systemic ideas, mathematical formalism
Enters the immunologist as an and computer modelings to the idiotypic
observer network, which were all lacking in Jerne’s
proposal [9] almost two decades before.
Describing a cognitive immune sys- Coutinho had been an important collabo-
tem is quite different from claiming that rator of Jerne at the Basel Institute and
the immunologist arbitrates which phe- produced an impressive array of experi-
nomena are specific and which are not, mental evidence in favor of the network
tracing a boundary between antibodies model both before, during and after the
and unspecific immunoglobulins, as Jerne association with Varela [29]. The 1980s
[24] and Talmage [25] did in the not so coincided with abundant experimental
distant past. As a consequence, descrip- and theoretical investigations on immune
tions of immunological activities based on networks, leading to the publication of
Varela’s ideas, or based on Maturana’s about five thousand papers. This, howe-
ideas, are significantly different. I have ver, had a negligible impact on the main
recently expanded this discussion and questions of immunology and the interest
argued that the specificity of immuno- in networks gradually waned and disappe-
logical activity resides in immunological ared from sight [30]. Why this happened?
observations, i.e. that the specificity Because only the wrong questions were
derives from what we immunologists do made, i.e. anti-idiotypic antibodies were
as human observers, operating in human seen as subsidiary means to “regula-
languaging [26]. That this specificity is not te” immune responses, when actually
inherent to lymphocytes of antibody mole- the idea of circular networks (systems)
cules is (or should be) consensual among should totally replace ‘cause/effect’ (sti-
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 145

mulus/response/regulation) frameworks. If this minimally fulfill my expecta-


Perhaps the interest in immune networks tions, we may finally abandon the idea of
will resurrect when the right questions immune systems as “cognitive” systems,
are finally made. I foresee different, yet endowed with a memory and the ability to
compatible, pathways to this end. recognize foreign substances, as epitomi-
In one pathway, we should continue zed by Capra in his article “The immune
and improve our analysis of immune ne- system: our second brain” [33].
tworks paying special attention to their
robust stabilizing mechanisms and try to Acknowledgments
define their invariant organization - amid
a ceaseless structural change; i.e., we I am grateful to Roger Harnden for
should find the relations which are kept discussing these ideas.
constant while the individual components
are replaced by equivalent ones. This is References
already being done in several laboratories
[31,32]. 1. Vaz, NM, Maia LCS, Hanson DG, Lynch
Another, more radical pathway invol- JM. Inhibition of homocytotropic antibody
ves recognizing the immunologist as the response in adult mice by previous
human observer responsible for his ob- feeding of the specific antigen. J Allergy
Clin Immunol 1977;60:110.
servations and for the configuration of his
2. Hanson DG, Vaz NM, Maia LCS, Lynch JM.
realities. Immunologists have configured
Inhibition of specific immune responses
many different realities. In clinical and
by feeding protein antigens.III. Evidence
experimental laboratories, in spite of their against maintenance of tolerance to
degeneracy or polyspecificity, antibodies ovalbumin by orally-induced antibodies. J
have been used as if they were invaluable Immunol 1979;123:2337-44.
specific biochemical reagents, which seem 3. Faria AMC, Weiner HL. Oral tolerance.
to be tailor-made by living organisms to Immunological Reviews 2005;206:232-
fit the most diverse configurations. We 59.
should not confuse the use of antibodies 4. Feng T, Elson CO. Adaptive immunity
as biochemical reagents, with the emer- in the host-microbiota dialog. Mucosal
gence of natural immunoglobulins and Immunol 2011;4:15-21.
their spontaneous organization in robustly 5. Vaz NM, Faria AMC, Verdolin BA, Carvalho
CR. Immaturity, ageing and oral tolerance.
stable cellular and molecular networks. Or-
Scand J Immunol 1997;46:225-9.
ganisms produce immunoglobulins which
6. Pordeus V, Ramos GC, Carvalho CR,
we, as human observers, may (legitimately
Barbosa de Castro Jr A, Cunha AP, Vaz
and profitably) use as specific reagents in NM. Immunopathology and oligoclonal
thousands of different applications. The T cell expansions. Observations in
aim of basic immunologists is to investi- immunodeficiency, infections, allergy
gate the organization of these networks, and autoimmune diseases. Current
not the production of specific antibodies, Trends in Immunology 2009;10:21-9.
because the organism does not produce 7. Vaz NM, Mpodozis JM, Botelho JF Ramos
antibodies: it produces immunoglobulins GC. Onde está o organismo? Derivas
that we may use as if they were specific e outras histórias na Biologia e na
antibodies. Imunologia. Florianópolis: UFSC; 2011.
146 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

8. Varela FJ, Johnson D. Observing natural notions in the biology of cognition. Cybernetics
systems. CoEvolution Quarterly Summer & Human Knowing 2002;9:5-34.
1976:26-31. Disponível em URL: http// 21. Maturana H, Poerksen B. From being to
www.wholeearth.com/issue-electronic- doing: the origins of biology of cognition.
edition.php?iss=2010. Heidelberg: Carl-Auer; 2004.
9. Jerne NK. Towards a network theory 22. Varela F, Thompson E et al. The embodied
of the immune system. Ann Immunol mind. Cognitive science and human
1974;125C:373-92. experience. Cambridge, Mass: MIT
10. Vaz NM, Varela FG. Self and nonsense: an Press; 1995.
organism-centered approach to immunology. 23. Varela F. The emergent self. The third
Med Hypothesis 1978;4:231-57. culture. Beyond the scientific revolution. New
11. Jerne NK. Network notions. Annual Report York: Simon & Schuster; 1995. p.209-22.
of the Basel Institute for Immunology. BII Disponível rm URL: http://www.edge.org/
Report; 1974. Disponível em URL: http// documents/ThirdCulture/ t-Ch.12.html.
www.bii.ch. p.6. 24. Jerne NK. The natural selection theory of
12. Richman LK, Chiler JM, Brown WR, antibody formation. Proc Natl Acad Sci
Hanson DG Vaz NM. Enterically-induced USA 1955;41:849-57.
immunological tolerance I. Induction of 25. Talmage DW. Allergy and immunology. An
supressor T lymphocytes by intragastric Rev Med 1957;8:239-56.
administration of soluble protein antigens. 26. Vaz N. The specificity of immunological
J Immunol 1978;121:2429-34. observations. Constructivist Foundations
13. P a r n e s O . F r o m i n t e r c e p t i o n t o 2011;6:334-51.
incorporation: degeneracy and 27. Eisen HN. Specificity and degeneracy
promiscuous recognition as precursors in antigen recognition: yin and yang in
of a paradigm shift in immunology. the immune system. Annu Rev Immunol
Molecular Immunology 2004;40:985-91. 2001;19:1-21.
14. Vaz NM. Francisco Varela and the 28. Wucherpfennig KW, Allen PM, Celada F,
immunological self. Systems Research Cohen IR, De Boer RJ, Christopher Garcia
and Behavioral Sciences; 2011. (in K et al. Polyspecificity of T cell and B cell
press) doi:10.1002/sres.1126. receptor recognition. Semin Immunol
15. Coutinho A. A walk with Francisco Varela 2007;19:216-24.
from first- to second-generation networks: 29. Stewart J, Coutinho A. The affirmation of
in search of the structure, dynamics and self: a new perspective on the immune
metadynamics of an organism-centered system. Artificial Life 2004;10:261-76.
immune system. Biol Res 2003;36:17-26. 30. Eichmann K. The network collective - rise
16. Varela FJ, Coutinho A, Stewart J. What and fall of a scientific paradigm. Berlin:
is the immune network for? In: Stein W, Birkhauser; 2008.
Varela F, eds. Thinking about biology: an 31. Nobrega A, Stransky B, Nicolas N Coutinho A.
invitation to current theoretical biology. Regeneration of natural antibody repertoire
Addison Wesley, New Jersey: SFI Series after massive ablation of lymphoid system:
on Complexity; 1992. robust selection mechanisms preserve
17. Varela F, Coutinho A. Immuknowledge: The antigen binding specificities. J Immunol
immune system as a learning process of 2002;169:2971-8.
somatic individuation. In: J. Brockman J, 32. Madi A, Kenett DY, Bransburg-Zabary S,
ed. Doing science, the reality club. New Merb IY, Quintana FJ, Tauber AI, Cohen
York: Phoenix Press; 1991. p.238-56. IR, Ben-Jacob E. Network theory analysis
18. Varela FJ Coutinho A. Immune networks: of antibody-antigen reactivity data: the
getting on to the real thing. Res Immunol immune trees at birth and adulthood.
1989;140:837-45. PLoS ONE;2011:6, e17445.
19. Whitaker R. The observer web: autopoiesis 33. Capra F. The Santiago theory of cognition.
and enaction; 1998. Disponível em URL: the immune system: our second brain.
http//www.enolagaia.com/AT.html. 1994. Disponível em URL: http//www.
20. Maturana H. Autopoiesis, structural coupling combusem.com/CAPRA4.HTM.
and cognition: a history of these and other
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 147

Revisão

Psicofármacos para aprimoramento


das funções cognitivas
Psychotropic drugs to improvement
of cognitive functions
José Luiz Martins do Nascimento, D.Sc.*, Gilmara de Nazareth Tavares Bastos, D.Sc.**

Resumo
A neurociência moderna tem começado a identificar alguns dos circuitos neurais e os eventos moleculares
e neurotransmissores relacionados à performance cognitiva. Alterações moleculares e celulares são as
bases do entendimento de muitas desordens neurológicas e psiquiátricas. Esse conhecimento é importante
para o desenvolvimento de terapias direcionadas a alvos moleculares. Drogas inteligentes ou também
chamadas de nootrópicas, que incluem modafinil, metilfenidato, propanolol e ampacinas, tornaram-se
populares, porque elas podem aumentar atenção, sociabilidade, habilidade de lembrar eventos e perfor-
mance cognitiva. Essas drogas podem variar em suas ações, propriedades fisiológicas e psicológicas e
outras consequências imprevisíveis.

Palavras-chave: memória, atenção, cognição, drogas nootrópicas, alvos moleculares

Abstract
Modern neuroscience has begun to identify neuronal circuits and molecular/ neurotransmitter events
on synapse formation related to cognitive performance. Molecular and cellular changes are the basis to
understanding many neurological and psychiatric disorders. This knowledge is important to development
of molecular therapies. Smart or nootropic drugs which included modafinil, methylphenidate, propanolol
and ampakines, have become popular, because they enhance attention, sociability, ability to remember
events and cognitive performance. These drugs may differ in their pharmacological properties, physiologi-
cal and psychological effects and unpredictable consequences.

Key-words: memory, attention, cognition, nootropic drugs, molecular targets.

*Professor Associado III do Instituto de Ciências Biológicas, Laboratório de Neuroquímica Molecular


e Celular, Universidade Federal do Pará, Belém, Pará, **Professora Adjunta I do Instituto de Ciências
Biológicas, Laboratório de Neuroinflamação, Universidade Federal do Pará

Correspondência: José Luiz Martins do Nascimento, Laboratório de Neuroquímica Molecular e Celular do


Instituto de Ciências Biológicas, Universidade Federal do Pará, 66075-110 Belém PA, E-mail: jlmn@ufpa.br.
148 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

Introdução [2]. Por essa conduta terapêutica, esses


fármacos tornaram-se populares entre
A palavra performance e/ou aprimo- jovens saudáveis que os usam atual-
ramento está em evidencia. Para isso, mente com o intuito de melhorar suas
existem diversas maneiras para aumentar performances cognitivas.
o desempenho. Na prática esportiva em
grandes competições o uso de anaboli- Figura 1 - O filme Sem limites dirigido
zantes é de uso comum, o Viagra vem por Neil Burger com roteiro de Leslie
sendo usado em grande escala, inclusive Dixon (2011) foi baseado no romance
entre jovens para melhorar a performance The Dark Fields, 2001 de Alan Glynn
sexual. Nessa ultima década, uma de- (1960) [6]. O filme mostra a história de
manda da sociedade que vem aumentan- um escritor mal sucedido, desmotivado e
do exponencialmente o seu consumo são sem habilidades cognitivas para escrever
os aprimoradores de cognição. Existem um livro contratado a uma grande edito-
diversas maneiras de aprimoramento ra, mas que subitamente ao ingerir uma
do cérebro, tais como ambiente enrique- droga nootrópica, passa a redigir sem
cidos, dietas alimentares, vitaminas, parar, focado na elaboração do texto, au-
exercícios físicos e os psicofármacos que mento da memória e com o uso regular
são bastante utilizados na atualidade. A da droga passa a ter grande capacidade
razão para seu uso indiscriminado é que de resolver problemas e outras habilida-
supostamente espera-se uma ação mais des cognitivas.
rápida dessas drogas, na medida que
possam induzir modificações estruturais
e funcionais nas sinapses centrais envol-
vidas nas redes cognitivas [1, 2]
Habilidades intelectuais que envol-
vem pensamento, percepção, atenção,
linguagem, memória, aprendizagem,
criatividade, raciocínio lógico, são ditas
funções cognitivas [3]. Essas funções
supostamente podem melhorar o seu
desempenho pelo uso de fármacos
chamados de neuroaprimoradores ou
nootrópicos. Essas drogas podem variar
em efeitos fisiológicos, psicológicos e
em suas propriedades farmacológicas
[3-5]. Drogas neuroaprimoradoras, que in-
cluem modafinil, metilfenidato, propanol,
amapacinas, memantinas, atomoxetina,
anfetaminas, piracetam, entre outras,
foram usadas inicialmente com o intuito
de restaurar algumas funções cognitivas
e déficit de memória em pessoas envelhe-
cidas e em doenças neurodegenerativas
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 149

Entretanto, é preciso cuidado com o Aprimoradores de cognição e


uso dessas drogas, pois muito desses memória
fármacos ainda não foram avaliados
suficientemente por testes clínicos de Neurobiologia da memória
longa duração em humanos para serem
usados com esse objetivo, sem esquecer De um modo sucinto, aprendizagem
as implicações éticas e sociais sobre seu e memória constituem-se em uma das
uso [1,6,8]. As bases farmacológicas e propriedades mais importantes para as
moleculares da ação dos nootrópicos so- funções cognitivas. O gênero humano se
bre os circuitos neuronais e os sistemas caracteriza por fazer uso intenso dessa
de neurotransmissores envolvidos nas propriedade e através dela pode dese-
funções cognitivas ainda estão em estudo nhar planos de atuação antecipatória.
e é objetivo dessa revisão. A memória tem um substrato molecular
determinado e regulado pelo genoma, mas
Histórico dos psicofármacos que pode sofrer modelagem quanto ao
numero, tipo e função das conexões entre
Desde os anos 50 quando se desco- as sinapses, essa regulação sináptica
briram as potentes ações sedativas da que é intensa durante o período crítico,
reserpina, um fármaco que interfere no chamamos de plasticidade. O termo plas-
armazenamento das vesículas sinápticas ticidade foi cunhado por William James
de varias aminas transmissoras e os em 1890, para descrever a susceptibili-
efeitos antipsicóticos da clorpromazina dade e modificações no comportamento
(que bloqueia receptores dopaminérgi- humano. Liu e Chambers [14] mostraram
cos), a partir dessas duas evidências pela primeira vez a formação de botões si-
farmacológicas, foi sugerida a hipótese nápticos no SNC. A partir dessa evidencia
de que é nas sinapses que nascem a morfológica, tem-se acumulado um grande
maior parte das patologias neurológicas numero de dados na literatura que o SNC
e psiquiátricas e são essas os alvos tem a capacidade de sofrer modificações
biológicos susceptíveis que se modifi- morfológicas e funcionais nas sinapses e
cam por ação dos fármacos. A utilização mais recentemente tem-se demonstrado
clinica dessas drogas no tratamento que as redes neurais dos mamíferos per-
das enfermidades mentais (ansiedade, manecem plásticas durante toda a vida
esquizofrenia, mania, crise do pânico, do organismo, incluindo a produção de
enxaqueca) e neurológicas (Parkinson, novas células neurais [15]. Bliss e Lomo,
Huntington, epilepsias), alem do uso em 1973, demonstraram que estímulos
das drogas nootrópicas no tratamento repetidos no córtex entorrinal de coelhos
da perda de memória que resulta em e registrados eletrofisiologicamente em
doenças como Alzheimer, demência neurônios do giro denteado, produziam
vascular ou traumas craneoencefálicos mudanças na amplitude dos potenciais
e AVC. Portanto, a aplicação dos psico- pós-sinápticos, que foi denominado de
fármacos na neuropsiquiatria é bastante potenciação de longa duração (LTP). Inú-
diversificada, além de seu uso atual na meras evidências indicam que esse fenô-
cognição [9-13]. meno é uma maneira que o cérebro tem
de armazenar memória, particularmente
150 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

no hipocampo [16,17]. Ao se considerar toda a dinâmica dos diferentes tipos de


que as sinapses, onde ocorre LTP são sinapses presentes no SNC, tem permi-
excitatórias e o glutamato é o neurotrans- tido avanços importantes no estabeleci-
missor majoritário, é de se esperar que mento das etiologias e patogêneses das
ao ser liberado pré sinapticamente, esse enfermidades psiquiátricas e neurológi-
neurotransmissor atue em receptores pós- cas. Esse avanço possibilitou o desen-
-sinápticos que coexistem nas espinhas volvimento de novos fármacos e algumas
sinápticas. Esses receptores são do tipo estratégias terapêuticas para contornar
AMPA, que respondem preferencialmente o déficit cognitivo e a qualidade de vida
ao agonista do glutamato chamado AMPA de pacientes com essas desordens [23].
e receptores NMDA que respondem prefe- As doenças neurodegenerativas,
rencialmente ao agonista NMDA [18-20]. como doença de Alzheimer, Parkinson,
Na transmissão sináptica normal, a che- coréia de Huntington, demência senil,
gada de um potencial de ação do terminal doenças vasculares e outras enfermi-
axonal produz a liberação do glutamato dades como epilepsias, depressão,
que interage em receptores AMPA, que desordem do humor, déficit de atenção,
ao serem ativados produzem uma maior entre outros, apresentam em seu estado
densidade de corrente pós-sináptica des- mais grave severa perdas de memórias
polarizante através de canais de sódio. com impedimentos cognitivos. Todas as
Os receptores de NMDA contribuem muito etapas de aprendizado e estocagem de
pouco, nesse momento por encontrarem- informação que vão desde a aquisição de
-se inibidos por íons magnésios. Contudo, informações até memória de longa dura-
na medida em que aumenta a frequência ção estão severamente comprometidas
de estímulos, ocorre uma despolarização em algumas dessas doenças [2,24]. Os
maior da membrana pós-sináptica e o íon mecanismos neurais subjacentes envol-
Mg++ se dissocia do receptor de NMDA, vidos parecem afetar vias preferenciais
que permite a entrada de íons Ca++ e (redes neurais) do sistema límbico, hipo-
ativação de proteína cinase dependente campo e córtex pré-frontal que modulam
de Ca++- Calmodulina e fosforilação, nes- memória explícita [2,23,25,26].
se momento ocorre a inserção de novos No caso particular da doença de
receptores AMPA [2,21,22]. Alzheimer em que ocorre uma perda
A entrada de íons Ca++ também au- acentuada da memória, o tratamento
menta a produção de fosfolipídeos na preconizado inicialmente foi de aumen-
membrana, como o ácido aracdônico tar a concentração de acetilcolina para
e aumento na atividade de NO-sintase melhorar o desempenho cognitivo, já que
neuronal e formação de óxido nítrico. ocorre degeneração das células colinérgi-
Essas moléculas podem ser mensageiros cas no principal núcleo neural que projeta
retrógrados para manter a sinapse ativa para o córtex, chamado núcleo basal de
por muito tempo [2]. Meynert, localizado na substancia inomi-
nata. Esse núcleo recebe inúmeras fibras
Doenças que afetam a memória do sistema límbico e dá origem a quase
totalidade das fibras colinérgicas do cór-
O salto no conhecimento, dos even- tex [5,13,27,28]. Os resultados obtidos
tos moleculares á clínica que mostram ainda são inconclusivos; pois os efeitos
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 151

dessas drogas colinérgicas podem levar pensamento abstrato, associação de


diversas semanas para produzir algum idéias, habilidades e potencial criativo)
efeito e até o momento, não foram regis- [27,32].
trados uma associação entre drogas ini- Esses fármacos atuam preferencial-
bidoras de acetilcolinesterase e melhora mente na dinâmica da sinapse, modifi-
de desempenho cognitivo. Mesmo assim, cando a sua síntese, armazenamento,
inibidores da AChE (tacrina e donepezil) liberação, ação nos receptores, recap-
que permitem um aumento nos níveis ce- tação e degradação metabólica. Esses
rebrais de acetilcolina e recentemente um são os alvos moleculares que estão
antagonista não competitivo de receptor afetados nas enfermidades e como o
de NMDA (memantina), o qual está indi- uso dos psicofármacos podem melhorar
cado para as formas moderadas a graves o desempenho cognitivo. Portanto, existe
da doença, são os únicos fármacos atual- uma razão a priori de se acreditar que as
mente aprovados pelo FDA (U.S. Food and drogas nootrópicas ao atingir seu alvo
Drug Administration) para o tratamento podem ativar vias preferenciais das redes
da doença de Alzheimer [13,20,27-30]. neuronais [33,34].
As duas drogas que são mais usadas
Psicofármacos para a cognição atualmente para fins não terapêuticos
são o metilfenidato e o modafinil.
Os fármacos que afetam o sistema O metilfenidato (Ritalina) é o neuro-
nervoso influenciam a vida de quase todo estimulante mais usado hoje e de maior
o mundo. O que seria da cirurgia moderna eficácia no tratamento do transtorno de
sem os anestésicos, a qualidade de vidas défict de atenção e hiperatividade (TDAH)
de pacientes terminais com câncer sem na redução da sonolência em narcolép-
os opiáceos e seus derivados. Hoje, dis- ticos, diminuição da fadiga e vem sendo
pomos de medicamentos que incremen- usado em grande escala para tratamento
tam a atenção, reduzem ou aumentam o da obesidade [31]. O alvo neuroquímico
sono, reduzem a ingestão de alimentos, primário do Metilfenidato é o transpor-
tratam a depressão, mania, esquizo- tador de dopamina e da noradrenalina,
frenia, transtorno bipolar, ansiedade, essas duas drogas atuam diferentes
convulsões, doenças neurodegenerativas das anfetaminas e não são capazes de
e a consciência. Também é importante se ligarem em receptores pré- sinápticos
observar os efeitos adversos dos psico- aminérgicos, não induzem dependência
farmacos na memória, como é o caso química e não produzem efeitos cardio-
dos diazepínicos que produzem amnésia, tóxicos. Em estudos epidemiológicos
os efeitos adversos dos alucinógenos e recentes com diferentes metodologias
anfetaminas sobre a percepção [31,26]. de analises estatísticas para medir aten-
Os psicofármacos também podem servir ção, humor, memória, vigília, motivação
de opção como ferramentas moleculares e funções executivas mostraram que
importantes para dissecção das vias pre- Metilfenidato em dose única foi capaz de
ferenciais das redes neurais, que cons- melhorar a memória, mas não os outros
tituem os substratos das funções mais parâmetros analisados. Não existem da-
importantes relacionadas a cognição de dos sólidos sobre seu uso por períodos
nosso cérebro (consciência, memória, longos [4,35-39].
152 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

Modafinil foi usado inicialmente para ampacinas estão em fase adiantada


o tratamento do sono excessivo da nar- de testes clínicos e apresentam resul-
colepsia. Depois seu uso foi ampliado tados promissores para o tratamento
para tratamento da síndrome da apneia e de disfunções de memória associadas
hipopneia obstrutiva do sono, desordem ao Alzheimer [2,8,13].
do sono em trabalhadores noturnos,
melhora cognitiva de esquizofrênicos Memantina
[2,31,35,36,40,41].
A ação neuroquímica do modafinil ape- A memantina foi sintetizada e paten-
sar de pouco conhecido, parece atuar prin- teada em 1968 e usada pela primeira vez
cipalmente sobre o transportador de do- para tratar pessoas envelhecidas com
pamina e noraepinefrina.com aumento na déficits de memória e mais recentemente
liberação dessas aminas [35,36,40,41]. na doença de Alzheimer severa. A estra-
Outros sistemas de neurotransmissores tégia é baseada no principio que a droga
são afetados somente secundariamente. só entra em ação em estados patológi-
Parece que existe certa seletividade de cos devido á estimulação excessiva do
ação nas áreas corticais sobre as sub- receptor de NMDA [28,29]. A memantina
-corticais. Em doses terapêuticas parece se liga próximo ao sítio do Mg e bloqueia
melhorara atenção, memória de trabalho a atividade canal do receptor. Ainda não
e memória episódica e outros processos existem dados sobre o efeito dessa droga
dentro do córtex pré-frontal. Esses efeitos na performance de pessoas jovens. Seu
são observados em roedores, indivíduos potencial uso como nootrópico é para aju-
adultos e sadios, bem como em varias de- dar no raciocínio e memória [28,29,41].
sordens psiquiátricas. Contudo em doses
repetidas, modafinil foi incapaz de impedir Drogas que atuam na circulação
a deterioração da performance cognitiva cerebral e como aprimoradores
por um período de tempo mais longo em metabólicos
indivíduos de privados de sono [31,41].
Diferentes das anfetaminas não produzem Existem drogas nootrópicas que po-
dependência química e apresentam pouco dem melhorar a performance cognitiva
efeitos colaterais [32]. atuando na vascularização. Por apre-
sentar uma altíssima taxa metabólica,
Ampacinas o cérebro consome 1/5 da utilização do
oxigênio disponível no corpo, por isso
Outro grupo de moléculas nootrópi- demanda um grande aporte de sangue.
cas são ampacinas que ativam sinapses Portanto, qualquer impedimento no flu-
glutamatergicas excitatorias no córtex xo sanguíneo cerebral e consequente
cerebral. Sua ação é sobre os receptores diminuição no suprimento de oxigênio
AMPA que despolarizam a membrana por podem influenciar as funções cognitivas.
entrada de íons sodio. Essa despolariza- Ginkgo biloba é considerada uma droga
ção ativa receptores de NMDA que podem que pode atuar no leito vascular como
induzir LTP, portanto essas moléculas se- vasodilatadora, alteração na viscosidade
riam importantes para aquisição de novas cerebral e função plaquetária. Essa planta
informações e estocagem de memória. As é usada em muitos países para tratar o
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 153

impedimento cognitivo durante o envelhe- duzindo propriedades estimulatórias. As


cimento, em doenças neurodegenerativas cinases são enzimas envolvidas nas vias
e demências [2,7,42-44]. O piracetam é de sinalização que podem ser bastantes
outra droga usada por muitos anos em di- uteis como alvos de drogas nootrópicas,
ferentes países para tratar impedimentos entre as cinsases mais importantes como
cognitivos no envelhecimento e em doen- alvo de drogas temos a Proteina cinase A ,
ças neurodegenerativas. O seu mecanis- proteína cinase C, proteína cinase ativada
mo de ação foi inicialmente relacionado por Ca++-calmodulina. Entre os fatores de
a modulação dos sistemas colinérgico transcrição mais estudado por sua parti-
e glutamatérgico e com isso melhorar cipação em memória de longo prazo é o
eventos relacionados a neuroplasticida- CREB (cAMP response element-binding).
de. Mais recentemente suas ações foram Manipulações genéticas que levam a um
relacionadas ás propriedades reológicas aumento na função do CREB parecem não
e melhora na fluidez das membranas, interferir na aprendizagem e memoria de
inclusive das mitocondrias de células neu- curto prazo, mas aumentam a memória
ronais. Ao fazer isso, o piracetam poderia de longo prazo, podendo ser um alvo im-
trazer benefícios e contribuir para sua portante para o desenvolvimento de droga
eficácia terapêutica com repercussões aprimoradora de memória [2,49,50].
na captação de glicose e produção de
ATP e melhorar o desempenho cognitivo Conclusão
[2,7,42,45,46]. Substancias naturais e
seus derivados, podem ser usadas com A importância do conhecimento dos
êxito em doenças psiquiátricas e também circuitos neurais, dos eventos molecula-
como drogas nootrópicas, como é o caso res e neurotransmissores relacionados
da glutationa e seus derivados, por suas a performance cognitiva, vai desde a
ações antioxidantes [44,47,48]. função normal do cérebro aos distúrbios
psiquiátricos e neurodegenerativos, per-
Drogas que atuam em mecanismo mitindo que novas drogas aprimoradoras
de transdução de sinal ou nootrópicas sejam desenvolvidas,
como estratégias para exercerem efeitos
As moléculas de sinalização celular específicos e benéficos sobre a cognição
exercem seus efeitos após sua ligação e ajudem pacientes com doenças neurop-
com os receptores expressos nas células- siquiátricas na redução dos sintomas e
-alvos, que, por sua vez, ativam uma serie melhora em sua qualidade de vida.
de alvos intracelulares, como enzimas,
segundo mensageiros, canais iônicos, Referências
transcrição gênica em uma sequência
de reações resultando em mecanismo 1. Langreth R. Viagra for the brain. Forbes
de transdução do sinal. Drogas neuro- Magazine; 2002
aprimoradoras podem afetar de modo 2. Lanni C, Lenzken SC, Pascale A, Del
seletivo essas vias de sinalização. As Vecchio I, Racchi M, Pistoia F, Govoni
S. Cognition enhancers between treating
metilxantinas parecem afetar os níveis de
and doping the mind. Pharmacol Res
AMPc por inibição de sua enzima de de-
2008;57:196-213.
gradação, a fosfodiesterase do AMPc pro-
154 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

3. Sahakian B, Morein-Zamir S. Professor’s 17. Lin L, Chen G, Kuang H, Wang D,


little helper. Nature 2007;450:1157-9. Tsien JZ. Neural encoding of nest in
4. Amadio M, Govoni S, Alkon DL, Pascale the mouse brain. Proceedings of the
A. Emerging targets for the pharmacology National Academy of sciences USA
of learning and memory. Pharmacol Res 2007;104:6066-71.
2004;50:111-22. 18. Lipton SA. Pathologically Activated
5. Racchi M, Mazzucchelli M, Porrello E, therapeutics for neuroprotection. Nature
Lanni C, Govoni S. Acetylcholinesterase Rev Neurosci 2007;8:803-8.
inhibitors: novel activities of old molecules. 19. Dash PK, Moore AN, Kobori N, Runyan
Pharmacol Res 2004;50:441-51. JD. Molecular activity underlying working
6. www.iamrogue.com/limitless/Em cache memory. Learn Mem 2007;14:554-63.
7. Rose SPR. “Smart Drug”: do they work? 20. Kemp JA, McKernan RM. NMDA receptor
Are they ethical? Will they be legal? Nat pathways as drug targets. Nature
Rev Neurosci 2002;3:975-9. Neurosci 2002;1039-42.
8. Farah MJ, Illes J, Cook-Deegan R, Gardner 21. Lee YS, Silva AJ. The molecular and
H, Kander E, King P et al. Neurocognitive cellular biology of enhanced cognition
enhancement: what can we do and 2009;10:126-40.
what should we do? Nat Rev Neurosci 22. Tully T, Bourtchouladze R Scott R,
2004;5:421-5. Tallman J. Targeting the CREB pathway
9. McGaugh JL. Drug facilitation of for memory enhancers. Nat Rev Drug
learning and memory. Physiol Behav Discov 2003;2:267-77.
1973;5:1437-42. 23. Mattson MP. Pathways towards and
10. R u s s e l R W . D r u g s a s t o o l s f o r away from Alzheimer disease. Nature
research in neuropsychobiology: a 2004;430:631-9.
historical perspective. Neuropsychobiol 24. Foster DJ, Wilson MA. Reverse replay of
1987;18:134-43. behavioural sequence in hippocampal
11. Cooper JR, Bloom FE, Roth RH. Amino place cells during the wake state. Nature
acid transmitters. In: The biochemical 2006;440:680-3.
basis of neuropharmacology, New York: 25. Tuner DC, Clark L, Dowson J, Robbins
Oxford University Press; 1991. p.1-6. TW, Sahakian BJ. Modafinil improves
12. Thomas B, Beal MF. Parkinson,s disease. cognition and response inhibition in adult
Hum Mol Genet 2007;16:183-94. attention-deficit/hyperactivity disorder.
13. Selkoe DJ. Alzheimer disease: genes, Biol Psychiatry 2004;55:1031-40.
proteins and therapy. Physiol Rev 26. Neves G, Cooke SF, Bliss Tv. Synaptic
2001;81:741-66. plasticity, memory and the hippocampus:
14. Liu CN, Chambers WW. Intraspina A neural network approach to causality.
sprouting of dorsal root axons. Arch Nat Rev Neurosci 2008;9:65-5.
Neurol Psychiatry 1958;79:46-61. 27. Dunbar G, Boeijinga PH, Demaziers A,
15. B a s t o s G N T , N a s c i m e n t o M V L , Cisterni C, Kuchibhatla R, Wesnes K
Magalhães RC, Reis RAM, Nascimento et al. Effects of TC-1734 (AZD3480),
J LM. N euroinflamação e o nicho a selective neuronal nicotinic receptor
neurogênico. 2011;7(1):35-46. agonist, on cognitive performance and
16. Bliss TVP, Lomo T. Long- lasting the EEG of young healthy male volunteers.
potentiation of synaptic transmission in Psychopharmacology 2007;191:919-29.
the dentate área of the anaesthetized 28. Tzavara ET, Bymaster FP, Overshiner CD,
rabbit following stimulation of the perforate Davis RJ, Perry KW, Wolff M,Mckinzie DL,
path. J Physiol 1973;232:331-56. Witkin JM, Nomikos GG. Procholinergic
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 155

and memory enhancing properties of attention, arousal and learning. Eur J


the selective norepinephrine uptake Neurosci 1997;9:589-98.
inhibitor atomoxetine. Mol Psychiatry 40. Sulzer D, Sonders MS, Poulsen N, Galli
2006;11:187-95. A. Mechanisms of neurotransmitter
29. L i p t o n S A . P a r a d i g m s h i f t i n release by amphetamines: a review. Prog
neuroprotection by NMDA receptor in Neurobiol. 2005;75:406-433.
blockade: memantine and beyond. Nat 41. Teitelman E. Off-label uses of modafinil.
Rev Drungs Discov 2006;5:160-70. Am J Psychiatry 2001;158:1341- 8.
30. Anderson MC, Ochsner KN, Kuhl B, 42. Elsabagh S, Hartley DE, Ali O, Williamson
Cooper J, Robertson E, Gabrieli SW EM, File SE. Differential cognitive effects
et al. Neural systems underlying the of Ginkgo biloba after acute and chronic
suppression of unwanted memories. treatment in healthy young volunteers.
Science 2004;303:232-5. Psychopharmacol(Berl) 2005;179:437-46.
31. Keating GM, Raffin MJ. Modafinil: a 43. Perry EK, Pickering AT, Wang WW.
review of its use in excessive sleepiness Medicinal plants and Alzheimer disease:
associated with obstructive sleep apnoea/ from ethnobotany to phytotherapy. J
hypopnoea syndrome and shift work sleep Pharm Pharmacol 1999;51:527-34.
disorder. CNS Drug 2005;19(9):785-803. 44. 44 Mondadori C. The pharmacology of
32. Greely H et al. Towards responsible the nootropics: new insights and new
use of cognitive-enhanding drugs by the questions. Behav Brain Res 1993;59:1-9.
healthy. Nature 2008;456:702-5. 45. 45 Leuner K, Kurz C, Guidetti G, Orgogozo
33. Morris K. Experts urge smart thinking JM, Müller W. Improved mitochondrial
on cognitive enhancers. Lancet Neurol functionin brain aging and Alzheimer
2008:476-7. disease – the new mechanism of action
34. Sandberg A, Bostrom N. Converging of the old metabolic enhancer piracetam.
cognitive enhancements. Annual N Y Fronteirs in Neuroscience 2010;4:1-11.
Acad Sci 2006;1093:201-27. 46. Winblab B. Pracetam: a review of
35. Minzenberg M, Carter CS. Modafinl: A pharmacological proprerties and clinical
review of neurochemical actions and effects uses. CNS Drug Rev 2005;11:169-82.
on cognition. Neuropsychopharmacol 47. Berk M, Ng F, DEan O Dodd S, Bush AI.
2008;33:1477-1502. Glutathione: a novel treatment target in
36. Repantis D, Schlattmann P, Laisney O, psychiatry. Trends in Pharmacological
Heuser I. Modafinil and Methylphenidate for Sciences 2008;29:346-51.
neuroenhancement in healthy individuals: 48. Fusco D, Colloca G, Lo Monaco MR,
Asystematic review. Pharmacol Research Cesarin M. Effects of antioxidants
2010;62:187-206. supplementation on the aging process.
37. Aouizerate B. Updated Overview Of The Clin Interv Aging 2007;2(3):377-87.
Putative Role Of The Serotoninergic 49. Di filippo M, Sarchielli P, Picconi B,
Treatment, 2005.System In Obsessive Calabresi P. Neuroinflammation and
– Compulsive Disorder. Neuropsychiatric synaptic plasticity: theoretical basis for
Disease And Treatment, 2005 a novel, immune-centred, therapeutic
38. Coult JT. Pharmacological manipulations approach to neurological disorders.
of the alpha 2-noradrenergic system. Trends in Pharmacological Sciences
Effects on cognition. Drugs Aging 2008;29:402-412.
1994;5:116-26. 50. Pliszka SR. Pharmacologic treatment of
39. Coult JT, Frith CD, Dolan RJ, Frackowiak attention-defict/hyperativity disorder:
RS, Grasby PM. The neural correlates of efficacy, safety and mechanisms of
the noradrenergic modulation of human action. Neuropsychol Rev 2007;17:61-2.
156 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

Revisão

Plasticidade sináptica como substrato


da cognição neural
Synaptic plasticity as substratum
of the neural cognition
Ricardo Augusto de Melo Reis*, Mário C. N. Bevilaqua**, Clarissa S. Schitine*

Resumo
O cérebro humano é formado por quase cem bilhões de neurônios cuja organização em redes permite
a execução de inúmeras funções comportamentais. Estímulos ambientais modificam a estrutura dos
circuitos neurais, refinando e tornando as sinapses mais eficientes. O tamanho e a área de superfície
do cérebro de primatas superiores, portadores de cérebros girencefálicos, são fatores determinantes
nas habilidades intelectuais. Neste ensaio serão discutidos como as mudanças plásticas nas sinapses
ocorrem (os pontos de contato entre as células na ordem de centenas de milhares por neurônio) e como
se dá a transferência de informações no sistema nervoso, que tem um papel essencial nos processos
cognitivos. A plasticidade sináptica é discutida do ponto de vista de moléculas (glutamato e seus recep-
tores), células e suas protuberâncias (espinhas dendríticas) e de redes elaboradas a partir da geração
de novos neurônios nos chamados nichos neurogênicos.

Palavras-chave: plasticidade, Hebb, cálcio, cognição, glutamato, sinapse, memória, neurogênese, epi-
genética

*Laboratório de Neuroquímica, **Laboratório de Neurobiologia da Retina, Instituto de Biofísica Carlos


Chagas Filho, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro

Correspondência: Ricardo Augusto de Melo Reis, Laboratório de Neuroquímica, Instituto de Biofísica Carlos
Chagas Filho, CCS, UFRJ, 21949-900 Rio de Janeiro, Tel: (21) 2562-6594, E-mail: ramreis@biof.ufrj.br
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 157

Abstract
The human brain is constituted by almost a hundred billion neurons organized in neuronal-glial networks
that allow a great number of behavioral outputs. The interaction of the environment with the genetic con-
tents of neural cells modifies the structure of neural circuits, refining the synapses into a more efficient
structure. Here we discuss how plastic changes at the molecular, cellular and network levels target the
synapses (the space between neuronal-glial cells that might reach up to 104 per neuron) and how infor-
mation is exchanged in the nervous system, an essential role in cognition. Synaptic plasticity might be
related to distinct mechanisms such as the traffic of glutamatergic receptors, spine volume modification,
integration of novel neurons in established networks and potentiation or depression of synaptic pathways.

Key-words: plasticity, Hebb, calcium, cognition, glutamate, synapse, memory, neurogenesis, epigenetics.

Introdução periores são dois fatores determinantes


nas habilidades intelectuais. A maior
O termo cognição pode ser definido densidade neuronal parece estar
como o ato de adquirir conhecimento, ou relacionada com o aparecimento de um
a faculdade de conhecer. Os que estu- grupo de células progenitoras de rápida
dam a cognição têm associado diversos amplificação, e que durante a evolução,
mecanismos cerebrais subjacentes à gerou uma estrutura neocortical mais den-
percepção, à atenção, à memória e ao sa, com neurônios migratórios cujas tra-
pensamento, com as etapas do desen- jetórias modificadas produziram variantes
volvimento do cérebro pós-natal e a inte- das encontradas nos demais mamíferos
ração com o ambiente durante a infância [4]. O elaborado desempenho cognitivo
e a adolescência. Estudos envolvendo a nos humanos tem sido relacionado com
psicologia do desenvolvimento frequente- parâmetros quantitativos celulares, envol-
mente geram perguntas sobre como as vendo o número de neurônios e de células
redes neurais são refinadas através de não neuronais [5], o volume de massa
experiências sensório-motoras, fruto de cinzenta e de substância branca [6] e com
interações entre o conteúdo genético her- a complexidade e o volume de espinhas
dado e a influência de aspectos ambien- dendríticas de neurônios de vertebrados
tais que resulta na elaboração da riqueza superiores [7], entre outros aspectos.
dos comportamentos. Perguntas do tipo: Estudos recentes referentes ao escalona-
como a consciência surge e se modifica mento do cérebro humano sugerem que,
em meio à interatividade das redes neu- em números absolutos, este órgão apre-
rais? Como a atividade neural origina o senta vantagens na constituição cerebral
sentido de sermos seres conscientes? em relação aos roedores e aos demais
E como o desenvolvimento do sistema primatas, contendo um maior número de
nervoso central (SNC) leva a emergência neurônios [5], e consequentemente de
das faculdades mentais, são chaves no pontos de contatos entre estas células, o
entendimento desse assunto [1-3]. que favoreceria as habilidades cognitivas.
O tamanho e a área de superfície do Registros arqueológicos apontam
cérebro de mamíferos de forma geral e a poucos sinais de inventividade nos homi-
girencefalia, presente nos primatas su- nídeos presentes no período anterior a
158 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

200.000 anos atrás na Africa; porém, com nico Charles Sherrington. Num trecho de
o surgimento do Homo sapiens durante sua obra de 1897, Sherrington atribui aos
o Paleolítico superior, houve um salto na espaços observados entre os neurônios
criatividade por volta de 50.000 anos atrás (visualizados na época por Santiago Ra-
[8]. É possível que substituições de ami- mon y Cajal e outros usando a técnica
noácidos em alguns genes, como do fator de impregnação de prata nos neurônios
de transcrição Forkhead box p2 (Foxp2) desenvolvida por Camilo Golgi), uma im-
envolvido na evolução da linguagem, pos- portante função na troca de informações
sam ter acarretado mudanças cognitivas elétricas no sistema nervoso.
substanciais em nossos ancestrais [9]. A resposta da sinapse é modificável,
É no mínimo tentador correlacionar as o que gera uma plasticidade, que é uma
consequências neurológicas com a pos- propriedade essencial do desenvolvimen-
sibilidade de como a fala, a linguagem to e uma das principais funções cerebrais
e a capacidade cognitiva diferenciaram [11]. É sabido que o cérebro é sensível
os humanos dos demais hominídeos no aos fatores ambientais, seguindo inicial-
passado remoto. Nesse sentido, camun- mente um plano genético durante a fase
dongos com um gene Foxp2 de humanos pré-natal, com a elaboração de gradientes
apresentam maior plasticidade sináptica moleculares especificados no eixo dorso-
e comprimentos dendríticos, pelo menos ventral no embrião. A rápida proliferação
nos circuitos entre o córtex e os núcleos da de células progenitoras gera múltiplos
base analisados. A introdução da versão neurônios e células gliais, através de uma
humana de Foxp2 em camundongos levam orquestração de genes pró-neurogênicos
a alterações na vocalização ultrassônica e gliogênicos [4]. Estímulos ambientais
e no comportamento exploratório desses modificam a estrutura dos circuitos neu-
animais, assim como nas concentrações rais, refinando e tornando as sinapses,
de dopamina cerebral [10]. alvo de ação dos neurotransmissores,
Neste ensaio, discutiremos como as mais eficientes por meio de atividade
mudanças plásticas nas sinapses ocorrem elétrica e mensageiros químicos. Essa
(os pontos de contato entre as células na plasticidade resulta na modificação da
ordem de centenas de milhares por neurô- estrutura e da função do sistema ner-
nio) e como se dá a transferência de infor- voso. A questão de quanto e de como o
mações no sistema nervoso, que tem um ambiente influencia no desenvolvimento
papel essencial nos processos cognitivos. do cérebro é de grande interesse geral,
Abordaremos a plasticidade sináptica do com particular atenção nos campos
ponto de vista de moléculas (glutamato e da neurobiologia do desenvolvimento,
seus receptores), células e suas protube- desenvolvimento infantil, educação e
râncias (espinhas dendríticas) e de redes psicopatologia infantil.
com a geração de novos neurônios nos Inúmeros modelos de plasticidade
chamados nichos neurogênicos. sináptica são observados em diversos
circuitos cerebrais [11]. Nesse sentido,
A sinapse podem ser citadas estruturas como o
hipocampo e a amigdala que estão envol-
O termo sinapse surgiu por volta de vidas com processos de consolidação de
110 anos atrás com o fisiologista britâ- memória espacial e emocional, proces-
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 159

sos associativos nos sistemas límbicos, ou se resulta do produto da interação


pré-frontais e subcorticais, com a partici- entre neurônios e células gliais.
pação de várias moléculas e processos A estrutura pré-sináptica se apresen-
celulares. Durante o envelhecimento pode ta como um sítio de plasticidade quando
ocorrer perda de cognição associada com ocorre um aumento na liberação de vesí-
sinaptotoxinas em desordens neurode- culas contendo neurotransmissores [14],
generativas, como os oligômeros dos processo chave na liberação exocitótica
peptídeos beta-amilóide, encontradas dependente de Ca2+. Diversos sinais con-
na patologia do mal de Alzheimer, e a vergem em sensores de Ca2+ localizados
proteína do príon com a interação em na região pré-sináptica, sendo a proteína
alvos sinápticos. sinaptotagmina a mais importante, indu-
Um dos elementos que reforçam zindo uma liberação de vesículas via o
a atividade sináptica e que só recente- complexo SNARE que é frequentemente
mente adquiriu um status apropriado na modulado [15].
formação dos circuitos neurais é a célula A estrutura pós-sináptica de uma
da glia, em especial os astrócitos, que sinapse excitatória (glutamatérgica) é
juntamente com os neurônios pré- e pós- muito dinâmica e tem grande controle na
-sináptico formam a chamada sinapse densidade de receptores pós-sinápticos,
tripartite [12]. Embora tenham sido des- principalmente os complexos pertencen-
critas há mais de um século, por muito tes às subfamílias de receptores ionotró-
tempo essas estruturas gliais foram apre- picos AMPA e NMDA. Um dos processos
sentadas como tendo um papel meramen- mais implicados com a plasticidade
te acessório no cérebro. A constatação sináptica envolve o tráfego de subunida-
de que a glia contribui para o refinamento des de receptores AMPA (subunidades
sináptico [13], só foi possível a partir da GluAs) de regiões extra-sinápticas para
utilização de métodos apropriados para o as regiões sinápticas, processo esse que
estudo de propriedades encontradas nas requer pelo menos duas etapas, e que
macro- e microglias, como ondas de Ca2+ envolve vias regulatórias e constitutivas,
geradas por transmissores, secreção de dependendo do tipo de subunidade em
fatores tróficos mantenedores de popula- questão [16]. As subunidades GluA1
ções seletivas, potenciação e depressão apresentam uma longa cauda carbóxi
sinápticas, entre outras [12]. Como os (COOH) terminal, e são transferidas do
astrócitos estão associados às sinapses citoplasma para a membrana da região
de forma íntima e compartimentalizada, extra-sináptica por processos regulató-
a integração da informação química e rios, que tem a participação das enzimas
elétrica é frequentemente modificada nos Ca2+ Calmodulina Cinase II e a via da
circuitos por fatores gliais o que leva a Pi3Cinase. Esse processo é dependente
uma intensa modulação neuro-glial. de atividade e fundamental nos períodos
Existem questões em aberto sobre de intensa plasticidade, como no período
os mecanismos e o local exato de ex- crítico [17]. Se a habilidade para mudar
pressão da plasticidade sináptica nos o comportamento depende do fortaleci-
circuitos neurais em desenvolvimento e mento e do enfraquecimento seletivo das
no adulto. Existem dúvidas se ocorrem na sinapses, o incremento de subunidades
estrutura pré-, pós-sináptica, em ambas GluA1 na região extra-sináptica (vindo do
160 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

citoplasma) pode ser o primeiro passo nas redes neurais, o que induz uma
para que estas subunidades atinjam a grande interatividade entre as células
região sináptica e aumentem a densidade e consequente aumento do número de
de receptores, e que uma vez ativados, sinapses. Estudos realizados na década
induzam despolarização, fluxo de Ca2+ e de 1970 em cerca de 2600 cérebros
modificações estruturais com base na autopsiados de um banco de órgãos em
polimerização de filamentos de actina. Washington, EUA, mostrou que durante o
Isso leva a transformação de estruturas desenvolvimento, o crescimento cerebral
imaturas (filopódios) presentes durante aumenta rapidamente entre os primeiros
o desenvolvimento a se transformarem meses e os primeiros anos de vida, e que
em protuberâncias compartimentalizadas a curva (no formato de U invertido) e se
(espinhas) volumosas na forma de co- estabiliza na adolescência [19-20]. Essa
gumelo e em cálice, ricas nos estoques análise foi revisitada recentemente com
intracelulares de cálcio, e que uma vez o imageamento de centenas de cérebros
ativadas, se tornam funcionais (e deixam de crianças, adolescentes e adultos (3-27
de ser silenciosas) [18]. Nesse contexto, anos), com o emprego de uma técnica
é sabido que modelos de plasticidade não invasiva (ressonância magnética
como a LTP (potencialização de longo funcional) e que confirmou a curva em U
termo, discutido em seguida) e a LTD invertida para diversos parâmetros. Po-
(depressão de longo termo) podem ser rém, o estudo mostra que diferentes áre-
expressos com a inserção e a remoção de as cerebrais amadurecem em momentos
subunidades de receptores AMPA, respec- distintos, e que os circuitos neurais têm
tivamente [18] e esse modelo pode ser a diferentes trajetórias durante o desenvol-
base para o estudo de funções cognitivas vimento no que concerne ao volume de
e de disfunção sináptica. massa cinzenta (onde estão os corpos
celulares dos neurônios e astrócitos) e a
Crescimento cerebral pós natal e branca (conjunto de fibras que conectam
plasticidade sináptica as regiões) [6].
Os bilhões de células no cérebro es-
Entre os primeiros dias após o nas- tão conectados de forma a permitir um
cimento e a infância (por volta dos 6 grande repertório de respostas compor-
anos de idade), uma criança sadia está tamentais, desde a execução de padrões
em um período em que apresenta a sua básicos de movimento até na elaborada
maior plasticidade e interatividade com o tarefa de improvisar um longo discurso.
meio e o seu cérebro passa de cerca de Para que os circuitos cerebrais controlem
350 para 1200 gramas, e que chega até essa diversidade de respostas, foram
1400 gramas no pico da adolescência necessárias a proliferação e a diferen-
(um pouco maior nos garotos em função ciação de progenitores no embrião em
do peso corporal e influência hormonal) uma diversidade de neurônios, células
[19]. A atividade neural relacionada gliais e outros tipos, e que atingissem os
com a experiência nos mais diversos locais corretos. No pico da embriogênese,
níveis (sensorial, motora, emotiva e estima-se que cerca de 250 mil neurônios
social) é talvez o principal substrato são gerados por minuto [19] – processo
para o grande aumento dos processos controlado por fatores que se difundem
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 161

ao longo do tubo neural e que ativam ge- psicólogo canadense Donald Hebb. Es-
nes responsáveis por diversas proteínas, sas sinapses hoje são conhecidas como
que regulam a produção da neurogênese. hebbianas, e as regras hebbianas são
Se a produção dos neurônios sofrer uma aplicadas a modelos de aprendizagem no
interferência nessa fase da ação de dro- neocórtex e em estruturas plásticas [22].
gas (canabinóides ou do álcool), de toxi- Estudos recentes mostram que as es-
nas ambientais (como o metil-mercúrio), pinhas dendríticas (em média, com cerca
ou ainda de um particular defeito genéti- de 0,5-2 μm de comprimento, chegando
co, pode ocorrer a formação incorreta da a 6 μm na região CA3 do hipocampo)
estrutura do sistema nervoso. Hoje é acei- são muito dinâmicas, heterogêneas em
ta a ideia que os circuitos cerebrais se forma e estrutura, e modificadas por ex-
transformam através de uma combinação periência e por atividade (alvo de LTP), e
de influências genéticas e ambientais, e que poderia ser o substrato morfológico
que o ambiente e a genética contribuem da plasticidade sináptica. Um neurônio
para a construção cerebral. Os primeiros maduro apresenta de 1–10 espinhas/
eventos no desenvolvimento cerebral (no μm num dendrito, sendo esse o local de
embrião) são grandemente dependentes chegada das informações excitatórias no
dos genes, seus produtos, e do milieu no SNC. Embora o imageamento dessas es-
qual isso ocorre. Em resumo, a interação truturas mostrando a motilidade evidencie
entre a genética e o ambiente conectando o possível impacto funcional no neocórtex
as sinapses mostra-se necessária para a e no hipocampo em neurônios vivos, o
formação dos substratos neurais neces- siginificado da plasticidade das espinhas
sários para a riqueza do comportamento ainda é um assunto polêmico [23].
humano [2].
Plasticidade via novos neurônios no
LTP, Hebb e memória cérebro adulto

O fenômeno de LTP (potencialização Um importante paradigma estabeleci-


de longo termo) foi descrito na década de do há quase um século, e tido como dog-
1970 como uma forma de plasticidade ma até recentemente, dizia que “o núme-
encontrada nos circuitos hipocampais ro de neurônios no cérebro é determinado
[21]. Estímulos tetânicos (de alta fre- durante o desenvolvimento embrionário, e
quência) quando apresentados a uma que durante a vida pós-natal, o cérebro é
via pré-sináptica provocam o aumento incapaz de gerar novos neurônios” [24].
da resposta da região pós-sináptica, em Entretanto, algumas observações iniciais
termos de incremento dos potenciais ex- questionaram este paradigma na década
citatórios pós-sinápticos (PEPS), de forma de 1960, e revelaram uma capacidade
sincrônica e numa escala temporal que até então desconhecida no cérebro de
pode ultrapassar segundos e minutos, vertebrados adultos: a geração de novos
chegando a horas, ou mesmo a dias ou neurônios (neurogênese). Sidman et al.
semanas. Esse modelo de resposta foi [25] desenvolveram a técnica da incor-
logo reconhecido como sendo adequado poração de timidina tritiada, que ao ser
para explicar o processo de memória, incorporada ao DNA durante sua síntese,
algo que foi postulado inicialmente pelo revela células que foram geradas após
162 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

sua administração. Esta técnica sugeriu a desencadeamento desse processo. Duas


geração de novos neurônios, e destacou regiões do cérebro se destacam onde a
uma importante área cerebral pela sua ca- neurogênese é amplamente reconhecida:
pacidade neurogênica: o hipocampo [26]. a zona subventricular (ZSV), situada nas
Nas décadas seguintes, estabeleceu-se paredes dos ventrículos laterais e a zona
que novos neurônios recebem aferências subgranular (ZSG) do giro denteado do
sinápticas e estendem prolongamentos hipocampo (figura 1). Os novos neurônios
[27]. gerados na ZSV migram através de uma
Estudos em pássaros canoros foram rota precisa, a rota migratória rostral
fundamentais para a implicação funcional (RMS) e se estabelecem no bulbo olfa-
da neurogênese adulta. Canários pre- tório, onde continuadamente substituem
cisam aprender novas canções e para interneurônios locais [35]. Os neurônios
isso, novos neurônios são gerados e imaturos gerados no hipocampo adulto,
adicionados aos “centros vocais” desses especificamente na zona subgranular
pássaros a cada ano. A geração desses (SVZ) do giro denteado, migram para o
novos neurônios parece acompanhar interior da zona granular onde se esta-
flutuações hormonais e expressão de belecem e emitem/recebem contatos
fatores de crescimento que ocorrem de sinápticos [36] (figura 1). Os progenitores
forma sazonal [28]. encontrados em ambos os nichos neuro-
A neurogênese adulta foi inicialmente gênicos têm natureza astroglial [37].
vista como um fenômeno exclusivo de ani-
mais evolutivamente menos complexos, Neurogênese na zona subventricular
excluindo, dessa forma, os primatas [29].
Entretanto, a partir dos anos 90, vários A presença de células proliferativas
trabalhos identificaram nichos neurogêni- na ZSV tem sido estudada há bastante
cos no cérebro de mamíferos superiores, tempo e demonstrada em vários verte-
incluindo o homem [30-31], participando brados. Tais células têm características
de processos cognitivos como na memó- astrocitárias, sendo conhecidas como
ria e no aprendizado [32-34]. Atualmente, “astrócitos da zona subventricular”. De
a capacidade neurogênica é uma das fato, tais células expressam marcadores
formas de plasticidade celular, associada de células astrogliais, como GFAP, GLAST
a diversas linhas de pesquisa que pro- e outros [38-39]. Essas células-tronco da
curam identificar as bases, as funções ZSV são conhecidas como “células B”. As
e as implicações da geração de novos células B dão origem a uma população
neurônios no cérebro adulto. de células altamente proliferativas: os
precursores intermediários (PI) conheci-
Circuitos neurais nos nichos dos como células C. As células C têm
neurogênicos importante papel como amplificadoras
do potencial proliferativo do nicho neu-
Os nichos neurogênicos apresentam rogênico. Os precursores intermediários
condições específicas para a geração de dão origem aos neuroblastos (células A).
novas células, como a sua composição As células A migram em cadeia para o
celular e a presença de um ambiente favo- bulbo olfatório onde se diferenciam em
rável contendo fatores essenciais para o interneurônios GABAérgicos (inibitórios)
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 163

e se integram a circuitos previamente capazes de estabilizar os receptores


estabelecidos (figura 1) [40-41]. glutamatérgicos do tipo AMPA no seu
Dados recentes mostram que na ZSV estado aberto, potencializando a resposta
ocorre geração de neurônios glutamatérgi- sináptica excitatória [51]. Esse compos-
cos (excitatórios), e não apenas interneu- to melhora o desempenho em diversos
rônios inibitórios do bulbo olfatório durante modelos em animais com privação de
a fase adulta [42]. Explantes de ZSV sono [51] e em testes de memória em
pós-natal e adulta dão origem a neurônios humanos idosos [52], além de reduzir os
glutamatérgicos quando colocados em sintomas em modelos de Parkinson [53],
contato com a zona ventricular embrionária esquizofrenia e em lesões isquêmicas
[43], evidenciando maior plasticidade des- [51]. Sabendo que as células na ZSV de
sa região em relação ao fenótipo neuronal animais adultos apresentam receptores
gerado. Experimentos de imageamento glutamatérgicos funcionais do tipo NMDA
revelaram ainda que células provenientes e AMPA e que o neurotransmissor gluta-
da ZSV, até a primeira semana pós-natal, mato regula eventos de diferenciação e
apresentam migração para regiões do proliferação na ZSV [39,54], o uso de
cérebro como o córtex, estriado e núcleo ampacinas poderia modular o processo
acumbens, onde se diferenciam em inter- de neurogenêse nessa região. Resultados
neurônios GABAérgicos [44]. Essa migra- do nosso grupo mostram que a ampacina
ção no animal adulto pode ter implicações CX 546 aumenta o número de neurônios
importantes, pois tem sido mostrado que funcionais em culturas de células deriva-
após lesões cerebrais, neuroblastos po- da da SVZ [55].
dem ser direcionados para os locais de Diversos marcadores permitem a
lesão. Esse processo poderia ocorrer após identificação e o acompanhamento das
isquemia estriatal e cortical, assim como células desde o nicho neurogênico (ZSV)
em modelos animais de Parkinson e na até o seu destino final (bulbo olfatório).
doença de Huntington [45-48]. Visando a Enquanto as células progenitoras expres-
plasticidade de circuitos cerebrais, proge- sam marcadores tipicamente gliais como
nitores da ZSV são considerados fonte de a proteína acídica fibrila ácida (GFAP),
células reparadoras, capazes de substituir os neuroblastos expressam a molécula
células de regiões afetadas por lesões de adesão neural associada ao ácido
[49]. Existe ainda uma grande expectativa poli-siálico (PSA-NCAM) e a proteína dou-
em relação aos mecanismos celulares e blecortina (DCX). Após a integração na
moleculares do controle da neurogênese, circuitaria do bulbo olfatório (na camada
face ao contínuo envelhecimento da popu- de células granulares ou na camada
lação mundial e da incidência crescente periglomerular), as células expressam
de doenças neurodegenerativas, que receptores glutamatérgicos dos tipos
permitiriam novas estratégias para tratar AMPA e NMDA. Vale ressaltar que desde
déficits cognitivos. o estágio proliferativo até a integração
sináptica, os novos neurônios expressam
Em busca de compostos pró-cognitivos receptores de GABA [36].
Vários fatores regulam as etapas da
Existe uma família de compostos neurogênese na ZSV. Durante o estágio
pró-cognitivos chamada de ampacinas, proliferativo, a neurogênese é regulada
164 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

por sinalização via ativação de receptores cérebro adulto e as etapas que seguem a
de serotonina, dopamina e acetilcolina. geração desses novos neurônios são bem
Diversas moléculas como hormônio tireoi- conhecidas. Milhares de novos neurônios
diano, prolactina, polipeptídeo de ativa- são diariamente gerados no hipocampo
ção da adenil ciclase pituitária (PACAP), de ratos adultos [58]. No giro denteado,
além de fatores de crescimento como o novos neurônios são originados a partir
fator de crescimento epidérmico (EGF), fa- de progenitores ou precursores locali-
tor de crescimento de fibroblastos (FGF), zados na própria estrutura. As células
fator neurotrófico derivado de gânglio progenitoras hipocampais têm caracte-
ciliar (CNTF) e fator neurotrófico derivado rísticas astrocitárias e são concentradas
de cérebro (BDNF), entre outros, também na chamada “camada de células granu-
atuam modulando a neurogênese na ZSV. lares”. A camada de células granulares
Durante a migração na rota migratória ros- fica localizada entre o hilus e a camada
tral e no bulbo olfatório, a própria migra- molecular, sendo o sítio neurogênico en-
ção e diferenciação celular é regulada via contrado especificamente, na camada de
sinalização GABAérgica e interação com células subgranulares, região adjacente
componentes do microambiente, como ao hilus (Figura 1).
PSA-NCAM, efrinas e neuroregulinas. A No sítio neurogênico, mais especifica-
sobrevivência e a integração dos novos mente na zona subgranular, três tipos de
neurônios no bulbo olfatório podem ser células podem ser identificados: células
afetadas ainda pela ação da acetilcolina, B, células D e células G. As células B são
e de fatores ambientais como atividade astrócitos que são fortemente marcados
sensorial, e a exposição do animal a no- com anticorpos anti-GFAP. Tais astrócitos
vos odores [revisado em 56]. emitem prolongamentos radiais para o
A integração contínua de novos neu- interior da camada de células granulares.
rônios no bulbo olfatório parece ter papel As células B sofrem mitose e podem
importante na plasticidade da discrimi- gerar novas células B ou células D. As
nação de novos odores. Em um estudo células D são amplificadoras e proliferam
realizado com animais com expressão rapidamente, gerando novas células D
deficiente da proteína NCAM (necessária que amadurecem e dão origem a novos
para a migração celular), foi demonstrado neurônios granulares. As células G são
que o número de interneurônios no bulbo neurônios granulares maduros (figura 1)
olfatório foi drasticamente reduzido e que [59].
o animal apresentava dificuldades em Os neurônios imaturos (células D)
discriminar odores semelhantes [57]. estendem um prolongamento apical em
Este estudo sugere que a neurogênese direção a camada molecular, ao mesmo
na ZSV adulta pode ser importante para tempo em que migram para o interior
a função olfativa. da camada de células granulares. Além
disso, estendem axônios em direção aos
Neurogênese no hipocampo adulto neurônios piramidais de CA3 [36]. As cé-
lulas que não são integradas aos circuitos
O giro denteado do hipocampo é são eliminadas por apoptose. A maior
uma das duas regiões cerebrais onde a parte da morte celular parece ocorrer
neurogênese é largamente verificada num quando as células saem do ciclo celular
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 165

Figura 1 - Os nichos neurogênicos são representados pela zona subventricular (ZSV)


localizada nas paredes dos ventrículos laterais e pela zona subgranular (SVZ) do giro
denteado no hipocampo. A presença de células proliferativas na ZSV tem sido demons-
trada em vários vertebrados, com células que mantêm capacidade proliferativa durante
a vida adulta. A geração dos novos neurônios depende de um ambiente favorável con-
tendo fatores essenciais para o desencadeamento desse processo. Os novos neurônios
gerados na ZSV migram através de uma rota precisa, a rota migratória rostral e se es-
tabelecem no bulbo olfatório, onde continuadamente substituem interneurônios locais.
Os neurônios imaturos gerados no hipocampo adulto, especificamente na zona subgra-
nular migram para o interior da zona granular onde se estabelecem e emitem/recebem
contatos sinápticos. Os progenitores encontrados em ambos os nichos neurogênicos
têm natureza astroglial.

e se tornam pós-mitóticas, expressando a geração de milhares de neurônios por


ambos os marcadores DCX e calretinina. dia? Esses novos neurônios substituiriam
Acredita-se que o processo de eliminação outros que porventura morreram durante
das células não integradas aos circuitos o desenvolvimento? Ou mesmo aqueles
seja constitutivo e balanceado por fatores que morreram durante a vida adulta? De
promotores da sobrevivência celular [60]. fato, Gould e colaboradores mostraram
A funcionalidade da neurogênese hi- [61] uma substancial morte de neurô-
pocampal adulta ainda é um assunto bas- nios na camada de células granulares,
tante controverso. Haveria uma razão para especialmente entre os novos neurônios
166 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

nos cérebros de roedores e primatas em do fator Notch1 ativado, aumenta a pro-


situação controlada. Entretanto, sabe-se liferação das células hipocampais e a
que fatores ambientais são responsáveis manutenção da expressão de GFAP pelas
por aumentar o potencial neurogênico células progenitoras [63]. As BMPs são
do hipocampo e a sobrevivência desses moléculas extracelulares que geralmente
novos neurônios [33]. Com base em tais antagonizam a neurogênese [64]. No-
fatos, uma importante questão pode ser ggina, que inibe as proteínas BMP, au-
levantada: seriam as condições expe- menta os níveis de neurogênese [64].
rimentais dos trabalhos em laboratório Shh é uma molécula solúvel que atua
(ausência de estímulos) a razão da morte no desenvolvimento do sistema nervoso
dos neurônios recentemente gerados? e a sinalização mediada por Shh exerce
Será que os animais vivendo em seus importantes funções na expansão e no
habitats naturais apresentariam o mesmo estabelecimento dos progenitores pós-
balanço entre geração e morte de novas -natais do hipocampo [65].
células hipocampais? Outros reguladores relevantes da
A neurogênese hipocampal pa- neurogênese são o estresse e o exercício
rece estar diretamente envolvida em físico. Estresse é um dos mais potentes
processos cognitivos de memória e inibidores da neurogênese hipocampal e
aprendizagem. Sabe-se que fatores que sua ação foi demonstrada em várias espé-
aumentam a neurogênese no hipocampo cies de mamíferos [66]. O efeito deletério
têm importante impacto em tarefas mne- do estresse na proliferação celular foi
mônicas, avaliadas no teste do labirinto evidenciado por diferentes paradigmas,
aquático de Morris [33]. É interessante como por subordinação ou provocado por
notar que o próprio aprendizado tem efei- invasão de um intruso [67], choque, odor
to pró-neurogênico [31]. Além do aprendi- de predadores [68] entre outros [60].
zado em si, a permanência do animal em A duração do estímulo não parece ser
um ambiente enriquecido promove mais relevante nos diferentes protocolos de
oportunidades de aprendizado do que um estresse, já que tanto o paradigma agudo
ambiente padrão. quanto o crônico diminuem a proliferação
celular no hipocampo [66].
Fatores intrínsecos e neurogênese A neurogênese hipocampal é bas-
tante sensível ao aumento dos níveis de
Dentre os fatores intrínsecos que corticóides [66], isto é, tais hormônios re-
regulam a neurogênese hipocampal gulam negativamente a neurogênese. Um
destacam-se a via de sinalização de- estudo recente mostrou que a ablação
sencadeada pelos fatores Wnt, Notch, da neurogênese hipocampal modulou as
a proteina morfogênea óssea (BMP) e taxas de glicocorticóides após um estres-
Sonic hedgehog (Shh). A superexpres- se moderado, mantendo as taxas desse
são de Wnt3 aumenta a neurogênese hormônio altas após o evento estressor
no hipocampo enquanto o seu bloqueio [69]. Existem inúmeras evidências recen-
diminui esse processo [62]. Para uma tes mostrando que o exercício físico além
melhor compreensão desses fatores en- de beneficiar a saúde dos indivíduos,
volvidos com a neurogênese, destaca-se melhora o desempenho cognitivo e outras
o papel de Notch cuja superexpressão funções cerebrais [70]. Em roedores, a
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 167

corrida voluntária aumenta a proliferação Agradecimentos


dos progenitores neurais da zona subgra-
nular do giro dentado em animais jovens Apoio financeiro do INNT-INCT, CNPq,
e envelhecidos [34]. Além disso, a corrida CAPES e FAPERJ.
voluntária aumenta a magnitude da LTP
no giro dentado e aumenta o desempenho Referências
no labirinto aquático de Morris [34].
1. Quartz SR, Sejnowski, TJ. The neural
Perspectivas futuras basis of cognitive development: A
construtivist manifesto. Behav Brain Sci
Inúmeros modelos de plasticidade 1997;20:537-96.
sináptica são observados em diversos 2. LeDoux J. Synaptic self: How our brains
circuitos cerebrais, como no hipocampo, become who we are. New York: Viking;
no córtex, nos sistemas límbicos, e em 2002
3. Oliva AD, Dias GP, Reis RAM. Plasticidade
estruturas subcorticais, com a partici-
sináptica: natureza e cultura moldando
pação de várias moléculas e processos
o self. Psicologia: Reflexão e Crítica
celulares. O rápido envelhecimento da 2009;22:128-35.
população humana e o aumento na in- 4. Lui JH, Hansen DV, Kriegstein AR.
cidência de demências têm preocupado Development and evolution of the human
a todos na busca por mecanismos que neocortex. Cell 2011;146:19-36.
preservem as habilidades cognitivas dos 5. Herculano-Houzel S. The human brain in
animais. Existe uma relação entre a cog- numbers: a linearly scaled-up primate
nição manifestada por mamíferos e pri- brain. Front Hum Neurosci 2009;3:31.
matas superiores e a complexidade dos 6. Giedd JN, Rapoport JL. Structural MRI of
terminais pré- e pós-sinápticos presentes pediatric brain development: what have
nas redes neurogliais. A modificação da we learned and where are we going?
transmissão da informação no cérebro Neuron 2010;67:728-34.
7. S h e n g M , H o o g e n r a a d C C . T h e
conta com a participação de diversas
postsynaptic architecture of excitatory
moléculas interferindo em processos
synapses: a more quantitative view.
de fortalecimento e enfraquecimento da Annu Rev Biochem 2007;76:823-47.
eficácia sináptica. A neurogênese adulta, 8. McBrearty S, Brooks AS. The revolution
vista inicialmente como um fenômeno that wasn’t: a new interpretation of the
em animais evolutivamente menos com- origin of modern human behavior. J Hum
plexos, hoje é tida como processo chave Evol 2000;39:453-563.
na elaboração de novos circuitos nos 9. Enard W, Gehre S, Hammerschmidt
nichos neurogênicos no cérebro de ma- K, Hölter SM, Blass T, Somel M et al.
míferos superiores, incluindo o homem. A humanized version of Foxp2 affects
Atualmente, a capacidade neurogênica é cortico-basal ganglia circuits in mice. Cell
uma das formas de plasticidade celular, 2009;137:961-71.
associada a diversas linhas de pesquisa 10. Enard W. FOXP2 and the role of cortico-
basal ganglia circuits in speech and
que procuram identificar as bases, as
language evolution. Curr Opin Neurobiol
funções e as implicações da geração de
2011;21:415-24.
novos neurônios no cérebro adulto.
168 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

11. Malenka R. Synaptic plasticity. In: Davis 24. Ramon y Cajal S. Degeneration and
KL, Charney D, Coyle JT, Charles Nemeroff regeneration of the nervous system.
C, eds. Neuropsychopharmacology: The London: Oxford University Press; 1913.
fifth generation of progress. American 25. Sidman RL, Miale IL, Feder N. Cell
College of Neuropsychopharmacology; proliferation and migration in the primitive
2002. Ch 11, p.147-157. ependymal zone: an autoradiographic
12. Haydon P. Glia: Listening and talking study of histogenesis in the nervous
to the synapse. Nat Rev Neurosci system. Exp Neurol 1959;1:322-33.
2001;2:185-93. 26. Altman J, Das GD. Autoradiographic
13. U l l i a n E M , S a p p e r s t e i n S K , and histological studies of postnatal
Christopherson KS, Barres BA. Control neurogenesis. I. A longitudinal
of synapse number by glia. Science investigation of the kinetics, migration
2001;291:657-61. and transformation of cells incorporating
14. Levitan ES. Signaling for vesicle tritiated thymidine in neonate rats,
mobilization and synaptic plasticity. Mol with special reference to postnatal
Neurobiol 2008;37:39-43. neurogenesis in some brain regions. J
15. Pang ZP, Sudhof TC. Cell biology of Ca2+- Comp Neurol 1966;126:337-89.
triggered exocytosis. Curr Opin Cell Biol 27. Stanfield BB, Trice JE. Evidence that
2010;22:496-505. granule cells generated in the dentate
16. Ziff EB. TARPs and the AMPA receptor gyrus of adult rats extend axonal
trafficking paradox. Neuron 2007; projections. Exp Brain Res 1988;72:399-
53:627-33. 406.
17. Hensch TK. Critical period regulation. 28. Nottebohm F. From bird song to
Annu Rev Neurosci 2004;27:549-79. neurogenesis. Sci Am 1989;260:74-9.
18. Kessels HW, Malinow R. Synaptic AMPA 29. Rakic P. Limits of neurogenesis in
receptor plasticity and behavior. Neuron primates. Science 1985;227:1054-6.
2009;61:340-50. 30. Eriksson PS, Perfilieva E, Björk-Eriksson
19. Purves, D. Neural activity and the growth T, Alborn AM, Nordborg C, Peterson DA
of the brain. Cambridge University Press; et al. Neurogenesis in the adult human
1994. hippocampus. Nat Med 1998;4:1313-7.
20. Dekaban AS, Sadowsky D. Changes in 31. Gould E, Reeves AJ, Graziano MS, Gross
brain weights during the span of human CG. Neurogenesis in the neocortex of
life: relation of brain weight to body adult primates. Science 1999;286:548-
heights and body weights. Ann Neurol 52.
1978;4:345-56. 32. Lois C, Alvarez-Buylla A. Proliferating
21. Bliss TVP, Lomo T. Long lasting potentiation subventricular zone cells in the adult
of synaptic transmission in the dentate mammalian forebrain can differentiate
area of the anaesthetized rabbit following into neurons and glia. Proc Natl Acad Sci
stimulation of the perforant pathway. J U S A 1993;90:2074-7.
Physiol 1973;232:331-56. 33. Kempermann G, Kuhn HG, Gage FH.
22. Cooper SJ Donald O. Hebb’s synapse and More hippocampal neurons in adult mice
learning rule: a history and commentary. living in an enriched environment. Nature
Neurosci Biobehav Rev 2005;28:851- 1997;386:493-5.
74. 34. van Praag H, Kempermann G, Gage FH.
23. Hering H, Sheng M. Dendritic spines: Running increases cell proliferation and
structure, dynamics and regulation. Nat neurogenesis in the adult mouse dentate
Rev Neurosci 2001;2:880-8. gyrus. Nat Neurosci 1999;2:266-70.
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 169

35. Imayoshi I, Sakamoto M, Ohtsuka T, GABAergic neurons from the postnatal


Takao K, Miyakawa T, Yamaguchi M et subventricular zone. Proc Natl Acad Sci
al. Roles of continuous neurogenesis USA 2008;105:20994-9.
in the structural and functional integrity 45. Tattersfield AS, Croon RJ, Liu YW, Kells
of the adult forebrain. Nat Neurosci AP, Faull RL, Connor B. Neurogenesis
2008;11:1153-61. in the striatum of the quinolinic acid
36. Ming GL, Song H Adult neurogenesis in lesion model of Huntington’s disease.
the mammalian central nervous system. Neuroscience 2004;127:319-32.
Annu Rev Neurosci 2005;28:223-50. 46. O h a b J J , F l e m i n g S , B l e s c h A ,
37. Alvarez-Buylla A, Garcia-Verdugo JM Carmichael ST. A neurovascular niche
Neurogenesis in adult subventricular for neurogenesis after stroke. J Neurosci
zone. J Neurosci 2002;22:629-34. 2006;26:13007-16.
38. Doetsch F, García-Verdugo JM, Alvarez- 47. O’Keeffe GC, Tyers P, Aarsland D,
Buylla A. Cellular composition and Dalley JW, Barker RA, Caldwell MA.
three-dimensional organization of the Dopamine-induced proliferation of adult
subventricular germinal zone in the neural precursor cells in the mammalian
adult mammalian brain. J Neurosci subventricular zone is mediated
1997;17:5046-61. through EGF. Proc Natl Acad Sci USA
39. Platel JC, Dave KA, Bordey A. Control of 2009;106:8754-9.
neuroblast production and migration by 48. Yoshikawa G, Momiyama T, Oya S,
converging GABA and glutamate signals Takai K, Tanaka J, Higashiyama S et al.
in the postnatal forebrain. J Physiol Induction of striatal neurogenesis and
2008; 586:3739-43. generation of region-specific functional
40. Doetsch F, Caillé I, Lim DA, García-Verdugo mature neurons after ischemia by growth
JM, Alvarez-Buylla A. Subventricular factors. Laboratory investigation. J
zone astrocytes are neural stem cells Neurosurg 2010;113:835-50.
in the adult mammalian brain. Cell 49. Cayre M, Canoll P, Goldman JE. Cell
1999;97:703-16. migration in the normal and pathological
41. Belluzzi O, Benedusi M, Ackman J, LoTurco postnatal mammalian brain. Prog
JJ Electrophysiological differentiation Neurobiol 2009;88:41-63.
of new neurons in the olfactory bulb. J 50. Lynch G. Glutamate-based therapeutic
Neurosci 2003;23:10411-8. approaches: ampakines. Curr Opin
42. Brill MS, Ninkovic J, Winpenny E, Pharmacol 2006;6:82-8.
Hodge RD, Ozen I, Yang R, et al. Adult 51. Porrino LJ, Daunais JB, Rogers GA,
generation of glutamatergic olfactory bulb Hampson RE, Deadwyler SA. Facilitation
interneurons. Nat Neurosci 2009;12: of task performance and removal of
1524-33. the effects of sleep deprivation by
43. Sequerra EB, Miyakoshi LM, Fróes MM, an ampakine (CX717) in nonhuman
Menezes JR, Hedin-Pereira C. Generation primates. PLoS Biol 2005;3(9):e299.
of glutamatergic neurons from postnatal 52. Wezenberg E, Jan Verkes R, Ruigt GSF,
and adult subventricular zone with Hulstijn W, Sabbe BGC. Acute effects of
pyramidal-like morphology. Cereb Cortex the ampakine farampator on memory and
2010;20:2583-91. information processing in healthy elderly
44. Inta D, Alfonso J, von Engelhardt J, volunteers. Neuropsychopharmacology
Kreuzberg MM, Meyer AH, van Hooft 2007;32:1272-83.
JA et al. Neurogenesis and widespread 53. Hess US, Whalen SP, Sandoval LM,
forebrain migration of distinct Lynch G, Gall CM. Ampakines reduce
170 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

methamphetamine-driven rotation and 62. Lie DC, Colamarino SA, Song HJ,
activate neocortex in a regionally selective Désiré L, Mira H, Consiglio A et al. Wnt
fashion. Neuroscience 2003;121:509- signalling regulates adult hippocampal
21. neurogenesis. Nature 2005;437:1370-5.
54. LoTurco JJ, Owens DF, Heath MJ, Davis 63. Breunig JJ, Silbereis J, Vaccarino FM,
MB, Kriegstein AR. GABA and glutamate Sestan N, Rakic P. Notch regulates
depolarize cortical progenitor cells cell fate and dendrite morphology of
and inhibit DNA synthesis. Neuron newborn neurons in the postnatal
1995;15:1287-98. dentate gyrus. Proc Natl Acad Sci U S A
55. Schitine CS Agasse F, Xapelli S, Silva 2007;104:20558-63.
AP, Reis RAM, de Mello FG, Malva JO. 64. Fan X, Xu H, Huang Y, Cai W. A combined
Ampakines as proneurogenic modulators in situ hybridization and RT-PCR method
in murine subventricular zone cell to detect spatial and temporal patterns
cultures. San Diego, CA: Society for of Noggin gene expression in embryonic
Neuroscience; 738.10/C22; 2010 and postnatal rat hippocampus. Brain
56. Lledo PM, Alonso M, Grubb MS. Adult Res Protoc 2004;13:99-105.
neurogenesis and functional plasticity 65. Han YG, Spassky N, Romaguera-Ros M,
in neuronal circuits. Nat Rev Neurosci Garcia-Verdugo JM, Aguilar A, Schneider-
2006;7:179-93. Maunoury S et al. Hedgehog signaling
57. Gheusi G, Cremer H, McLean H, Chazal and primary cilia are required for the
G, Vincent JD, Lledo PM. Importance of formation of adult neural stem cells. Nat
newly generated neurons in the adult Neurosci 2008;11:277-84.
olfactory bulb for odor discrimination. 66. M i r e s c u C , G o u l d E . S t r e s s a n d
Proc Natl Acad Sci U S A 2000;97:1823- adult neurogenesis. Hippocampus
8. 2006;16:233-8.
58. C a m e r o n H A , M c K a y R D . A d u l t 67. Gould E. How widespread is adult
neurogenesis produces a large pool of neurogenesis in mammals? Nat Rev
new granule cells in the dentate gyrus. J Neurosci 2007;8:481-8.
Comp Neurol 2001;435:406-17. 68. Tanapat P, Hastings NB, Rydel TA, Galea
59. G a g e F . M o l e c u l a r a n d c e l l u l a r LA, Gould E. Exposure to fox odor inhibits
mechanisms contributing to the regulation, cell proliferation in the hippocampus
proliferation and differentiation of neural of adult rats via an adrenal hormone-
stem cells in the adult dentate gyrus. dependent mechanism. J Comp Neurol
Keio J Med 2010;59:79-83. 2001;437:496-504.
60. Balu DT, Lucki I Adult hippocampal 69. Snyder JS, Soumier A, Brewer M, Pickel
neurogenesis: regulation, functional J, Cameron HA. Adult hippocampal
implications, and contribution to disease neurogenesis buffers stress responses
pathology. Neurosci Biobehav Rev and depressive behaviour. Nature
2009;33:232-52. 2011;476:458-61.
61. Gould E, Tanapat P, Rydel T, Hastings N. 70. Yau SY, Lau BW, So KF Adult hippocampal
Regulation of hippocampal neurogenesis neurogenesis: a possible way how
in adulthood. Biol Psychiatry physical exercise counteracts stress.
2000;48:715-20. Cell Transplant 2011;20:99-111.
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 171

Revisão

Fundamentos neurobiológicos da música


e suas implicações para a saúde
Neurobiological foundations of music and its
implications for health
Paulo Estêvão Andrade*, Elisabete Castelon Konkiewitz**

Resumo
Este artigo apresenta evidências dos fundamentos neurobiológicos e evolucionários da música e suas
implicações terapêuticas. Primeiro, a música é um comportamento universal, presente em toda cultura.
Segundo, apesar de evidências de alguns mecanismos músico-específicos, estudos de lesão e de neu-
roimagem revelam que a música é também altamente supramodal e interage com múltiplos domínios
cerebrais, recrutando ativação bilateral em regiões envolvidas com o processamento linguístico, motor e
espacial. Terceiro, os padrões básicos de organização melódica e temporal da música são compartilhados
entre as culturas, uma propriedade análoga às regras universais da sintaxe compartilhadas por diferentes
línguas. Quarto, as respostas dos ouvintes à música também são universais através das culturas. Quinto,
estudos de neurodesenvolvimento mostram que bebês processam padrões musicais semelhantemente
aos adultos, fornecendo evidências de mecanismos transcendentes à cultura. Sexto, a música evoca
emoções genuínas e fortes, ativando estruturas cerebrais filogeneticamente antigas do sistema límbico.
Finalmente, consideramos uma redefinição da música como uma forma de comunicação baseada no som,
corporificada, não-referencial e polissêmica, cujo conteúdo é essencialmente emocional. Como a música
ativa áreas cerebrais envolvidas no processamento linguístico, espacial, motor e emocional básico, in-
duzindo neuroplasticidade, ela representa uma possibilidade terapêutica de baixo risco e de baixo custo.

Palavras-chave: música, cognição, neurodesenvolvimento, emoção.

*Professor de musicalização no Colégio Criativo de Marília, São Paulo e pesquisador do Grupo de


Pesquisa em Neurociências e Comportamento “Memória, Plasticidade, Envelhecimento e Qualidade
de Vida” da Faculdade de Filosofia e Ciências - UNESP - Campus de Marília, **Médica neurologista e
psiquiatra, professora adjunta da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Grande
Dourados

Correspondência: Paulo Estevão de Andrade, Rua Sperêndio Cabrini, 231, Jardim Maria Izabel II 17516-
300 Marília SP, E-mail: paulo_sustain@yahoo.com, Tel: (14) 3301-7944
172 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

Abstract
This article presents evidence for the neurobiological and evolutionary foundations of music and its
therapeutic implications. First, music is a universal behavior present in every culture. Second, despite
evidence for some music-specific mechanisms, studies by lesioning and neuroimaging reveal that music is
also highly supramodal and interacts with multiple brain domains, recruiting bilateral activation in regions
involved in language, motor and spatial processing. Third, the basic patterns of melodic and temporal
organization of music are shared among cultures, a property that is analogous to the universal rules of
syntax that are shared among different languages. Fourth, the responses of listeners to music are also
universal across cultures. Fifth, neurodevelopmental studies show that infants process musical patterns
in a way similar to that of adults, providing evidence for culture-transcendent mechanisms. Sixth, music
elicits genuine and strong emotions, activating phylogenetically old brain structures of the limbic system.
Finally, we consider a re-definition of music as a sound-based, embodied, non-referential and polysemic
form of communication whose content is essentially emotional. Since music activates brain areas involved
in language, spatial, motor, and basic emotional processing, inducing neuroplasticity, it represents a low
risk and low cost therapeutic possibility.

Key-words: music, cognition, neurodevelopment, emotion.

Introdução humanas, e a similaridade funcional com


que se manifesta, sugere uma profunda
A música sempre esteve presente necessidade humana de criar, ouvir e
em todas as culturas humanas existen- fazer música, e uma natureza humana
tes ou extintas, e sempre associada às profundamente musical.
emoções. Ela deixa as pessoas alegres Entretanto, Geertz [3], propõe uma
ou tristes, calmas ou ansiosas. É inerente abordagem semiótica e interpretativa da
às interações mãe-criança e às tradições cultura na sua famosa frase: “o homem
orais em rituais de música, dança e jogos, é um animal suspenso nas teias de
nas estórias sobre a natureza, sobre rela- significado que ele mesmo teceu” (p.5).
ções interpessoais, sobre heróis e mitos Nesta visão eminentemente culturalista
educativos (incluindo estórias sobre as e antropocêntrica, que negligencia os
origens do grupo), em cerimônias de aspectos neurobiológicos e evolutivos
iniciação para ambos os sexos (à idade do comportamento humano, Abbate [4]
adulta, à caça, etc), em rituais sagrados sustenta que nossa percepção da música
de comunicação com os deuses e os é sempre mediada por fórmulas verbais,
antepassados, em rituais de cura, etc, ideologia e cultura, não havendo nada de
e, finalmente, no dia-a-dia para aliviar as imanente em um trabalho musical a não
tensões [1,2]. ser a realidade material dos sons e dos
Nas sociedades atuais capitalistas escritos. Nessa perspectiva, as emoções
a música é usada de forma semelhante, musicais são dependentes da cultura e,
incluindo em processos educativos e em portanto, não genuínas.
celebrações, mas também como produ- Entretanto, nos últimos 20 anos já
to de consumo, usado no trabalho, em se produziu evidência consistente e sufi-
campanhas políticas e publicitárias. Essa ciente para acreditarmos que a percepção
presença ubíqua da música nas culturas da música, com sua universalidade e seu
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 173

imenso poder emocional, pode ser estu- existência de comportamentos e meca-


dada sob uma perspectiva neurobiológi- nismos cognitivos caracterizados pela
ca. Estes estudos estão revelando que sua universalidade, pela sua presença
a música é um comportamento universal precoce em membros imaturos da espé-
que apresenta uma série de princípios ge- cie e pelo grau de automaticidade com
rais de organização e de processamento que são processados, sugere que os
cognitivo e afetivo, os quais independem mesmos sejam resultado de adaptações
de variações e atribuições culturais. A evolutivamente determinadas [5].
compreensão de que a música é uma A existência de comportamentos dis-
habilidade intrínseca ao homem, ou tintos e universais sugere que sistemas
mais especificamente, intrínseca ao cé- neurais relativamente específicos foram
rebro humano abre possibilidades para selecionados ao longo da evolução.
o estudo do seu processamento, da sua Estudos de lesões cerebrais e de neu-
criação, das suas relações com outras roimagem mostram que uma significativa
habilidades, tais como a linguagem, ou a porção do cérebro humano é devotada
matemática, mas também fornece emba- a comportamentos relevantes para a
samento empírico para a sua utilização, sobrevivência, formando sistemas cogni-
seja na saúde, seja na educação, explo- tivos distintos para o processamento dos
rando tanto seus aspectos cognitivos atributos físicos, biológicos e sociais do
quanto emocionais. meio. Estudos sobre o desenvolvimento
cerebral também respaldam a concep-
Universalidades comportamentais ção de uma estruturação cortical gene-
ticamente determinada e a existência,
Cada vez mais os princípios de sele- desde o nascimento, de áreas cerebrais
ção sexual e natural têm levado em consi- citoarquitetonicamente muito bem defi-
deração as evidências antropoculturais e nidas e distintas, incluindo os circuitos
os estudos psicológicos interculturais que de fibras conectando estas áreas e as
revelam a existência de comportamentos suas respectivas sinapses [6,7], o que
e mecanismos cognitivos universais, sugere que, de fato, certas especializa-
tais como as habilidades matemáticas, ções neuroanatômicas foram moldadas
a música e a linguagem, que, ao que pela evolução biológica. Hoje, a maioria
tudo indica, são adaptações universais dos neurobiólogos concordam em que o
ocorridas durante a evolução. Nesta pers- desenvolvimento pré-natal do neocórtex
pectiva, o processo de seleção natural depende de ambas as influências: das
molda as espécies à sua ecologia não ambientais, através do input talâmico, e
somente nos seus tratos físicos (força, das internas, através das expressões gê-
agilidade, resistência, etc) e fisiológicos nicas específicas de cada região [8-10].
(imunidade, alimentação, etc.), mas tam- A música parece depender cru-
bém nos seus tratos comportamentais, cialmente de circuitos neurais fronto-
como a percepção dos objetos, de sua -temporo-parietais do hemisfério direito,
permanência no tempo e no espaço, de embora envolva extensas áreas dos dois
sua localização e de sua numerosidade, hemisférios compartilhadas com outros
assim como comportamentos sociais domínios como linguagem e cognição
como a linguagem, a música, etc. A espacial [11,12]. A inextricável ligação
174 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

entre biologia e cultura é brilhantemente Cognição musical


discutida por Geary [13,14] que, baseado
em evidências, discute sobre como essas Dois aspectos são fundamentais na
habilidades ‘biologicamente primárias’, estruturação sonora da música: a organi-
como representação e navegação do zação tonal e a organização temporal, as
espaço físico e numerosidade, habili- quais podem ser cognitivamente separa-
dades sócio-cognitivas, dentre outras, das [17]. Assim como a linguagem verbal,
constituem um ‘esqueleto cognitivo’ no a música se organiza em padrões inten-
qual se desenvolvem as habilidades ‘bio- cionalmente estruturados de alturas (va-
logicamente secundárias’ culturalmente riação das frequências fundamentais dos
determinadas, tais como a aprendizagem tons complexos), durações e intensidades
dos símbolos numéricos e algébricos, do (metro e ritmo). Na linguagem, os padrões
uso do sistema decimal, dos cálculos, tonais correspondem à trajetória das fre-
da escrita e da música, respectivamen- qUências fundamentais (fo) das vogais,
te. Embora as habilidades secundárias que originam a entonação da fala [18].
dependam das habilidades biológicas Na música, os padrões tonais são deter-
primárias, o seu desenvolvimento é total- minados pela trajetória das frequências
mente dependente da valoração cultural fundamentais (fo) das notas musicais
e de práticas formais de ensino e treina- que caracterizam as melodias, que, no
mento, as quais, por sua vez, diferem de canto, correspondem à trajetória das fo
uma cultura para outra [13,14]. das vogais nas sílabas [19]. Vale notar
Portanto, é importante frisar que a que todas as línguas do mundo possuem
existência de sistemas neurais relati- uma prosódia (aspectos melódicos e
vamente especializados para o proces- rítmicos da linguagem) tonal e metade
samento de determinadas informações delas, as chamadas línguas tonais, como
relevantes do meio não implica numa o Mandarim, usam a entonação para fazer
visão determinista e estática da cognição distinções léxicas entre as palavras [20].
humana. O contexto ambiental e social in- A dimensão tonal da música, por sua
fluencia sobremaneira tanto a expressão vez, pode ser vista sob três aspectos
genética dos comportamentos evoluídos distintos, embora relacionados: (i) a per-
quanto suas formas de manifestação cepção global da direção geral das notas
[5], através da “plasticidade cerebral”, (do grave para o agudo e vice-versa), que
processo pelo qual regiões neocorticais caracteriza o contorno, (ii) a distância de
e subcorticais exibem mudanças mo- altura exata entre as notas, que define os
leculares e estruturais em resposta a intervalos musicais locais e distinguem
experiências como aprendizado, lesões duas melodias diferentes de contornos
e até terapias comportamentais [15]. A semelhantes, e (iii) a combinação simul-
plasticidade dependente da experiência tânea das notas, que forma os acordes
envolve não somente o fortalecimento [21].
das sinapses, mas também a plastici- Na organização temporal, propõe-se
dade axônica, importante na formação uma divisão conceitual entre métrica glo-
dos circuitos neurais, assim como a bal e ritmo local na música [22]. O metro
plasticidade dendrítica, fundamental na corresponde à percepção global de uma
consolidação da memória [16]. invariância temporal de pulsos/batidas
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 175

recorrentes, as quais fornecem as uni- palavras e uma sequência específica de


dades de duração e funcionam como um palavras determina frases e significados
“relógio cognitivo” que nos permite avaliar específicos, também na música, uma
as durações exatas (em números de bati- sequência específica de notas e suas
das) dos eventos auditivos e estabelecer durações determinam a singularidade de
os ritmos métricos típicos da organização uma melodia. Não é mera coincidência
temporal da música [23]. As batidas do que o ritmo de uma língua se reflete nos
metro se alternam entre fortes e fracas ritmos musicais daquela cultura [19] e
originando a percepção global de marchas que a percepção rítmica é um aspecto
(acento maior na primeira de duas bati- perceptivo essencial na delimitação das
das) ou valsas (acento maior na primeira fronteiras entre as palavras, da segmen-
de três batidas). O ritmo é a percepção tação das palavras em sílabas e da per-
da proximidade temporal, ou grupamento cepção das rimas, e, consequentemente,
temporal de eventos auditivos adjacentes no desenvolvimento das habilidades
que formam unidades maiores, mas cuja fonológicas [25].
percepção independe da avaliação exata Entretanto, há diferenças fundamen-
das durações por meio do metro e, assim, tais entre música e linguagem tanto no
pode ocorrer somente baseando-se na aspecto semântico (significados), quanto
estimativa aproximada da duração das nos aspectos relevantes da percepção
notas [21-23]. auditiva.
É interessante notar que a fala Quanto ao significado, na linguagem,
também possui uma métrica baseada as palavras são referenciais, isto é,
na acentuação silábica, entretanto as representam um significado específico
“batidas” da fala (sílabas fortes) não de algo externo (concreta ou abstrata) e
definem um pulso regular como acontece totalmente diferente delas, além disso,
nas notas fortes da música [24]. De fato, um significado estruturado e embasado
o ritmo da fala é formado pelas “batidas” pela sintaxe: “quem fez o quê a quem”,
ou “ataques” das sílabas, determinados que é a estrutura conceitual de referência
pelo aumento do volume (modulação de e predicação nas sentenças. Em contras-
amplitude) da vogal que a acompanha, te, na música, uma nota ou um conjunto
sendo particularmente forte nas sílabas de notas normalmente não representa
acentuadas [25], cuja sucessão temporal um significado específico e externo a
é bem mais lenta que a dos fonemas e ele, isto é, em grande parte a música
muito semelhante à das notas nas melo- é não-referencial e seu significado é
dias musicais. Por isso, a técnica básica baseado nas características intrínsecas
de se criar uma letra para uma melodia dos padrões tonais, pelas relações de
consiste basicamente no uso de uma tensão e resolução (relaxamento) que as
sílaba para cada nota musical [19]. notas possuem entre si, bem como suas
Por essas semelhanças, as sequên- durações e intensidades [26,27]. São
cias lingüísticas e musicais compartilham estas características intrínsecas tonais
princípios combinatórios que operam em e temporais dos padrões melódicos que
múltiplos níveis [26-29]. Da mesma forma fazem com que percebamos relações
que na linguagem, as sequências especí- hierárquicas e padrões organizados de
ficas de fonemas determinam sílabas e significado [26,29].
176 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

Quanto à percepção auditiva, os pesquisa com bebês ajuda a esclarecer


padrões temporais são muito mais re- as predisposições para o processamento
levantes para a linguagem do que para musical que transcendem a cultura
a música, ao passo que, para esta, os e a descrever como as propriedades
padrões tonais são muito mais relevantes específicas da cultura se desenvolvem,
em comparação à linguagem [30,31]. ao passo que as investigações inter-
Mais especificamente, o aspecto cru- -culturais comparam as respostas de
cial para a discriminação de fonemas ouvintes de contextos histórico-culturais
e, consequentemente, das palavras na diferentes, procurando por fatores trans-
linguagem é a percepção de transições cendentes à cultura e fatores específicos
acústicas rápidas das frequências for- a ela [32,33].
mantes dos tons complexos, que ocorrem Primeiro, com relação à universali-
entre consoantes e vogais (e vice-versa), dade, há evidência de características co-
transições estas que provocam eclosões muns entre todas as músicas do mundo
de ruído num espaço de tempo (ou janela nos princípios subjacentes às melodias
temporal) de apenas dezenas de milisse- tais como: a) a organização das notas
gundos [31]. dentro de escalas musicais com 5 a 7
Mesmo quando a informação espec- tons no intervalo de oitava (escalas dia-
tral (formantes) é grandemente reduzida tônicas consonantes), b) as respostas
em uma fala artificialmente degradada comportamentais diante de consonâncias
(com apenas dois canais espectrais) que, e dissonâncias dos intervalos musicais
porém, preserva as variações temporais, (combinação de duas notas diferentes),
ouvintes adultos e crianças de 10 a 12 e c) a organização temporal com uma
anos são ainda capazes de reconhecer tendência a formação de ritmos métricos
a fala, indicando que a percepção de (durações baseadas numa pulsação re-
mudanças temporais é mais relevante gular) [11,12,30,31]. Há universalidade
para a fala que a percepção das mu- também nas expectativas melódicas dos
danças espectrais [30]. Em contraste, ouvintes, isto é, quais notas são espera-
o aspecto crucial para a discriminação e das, ou melhor se encaixam a uma dada
reconhecimento de melodias é a trajetória sequência de notas antecedentes [34],
das frequências fundamentais (fo) das bem como no julgamento emocional-afe-
notas musicais, que normalmente possui tivo das várias características musicais,
intervalos de tempo muito maiores que como tempo (lento ou rápido), consonân-
100 ms [31]. cia (dissonante ou consonante), comple-
xidade, intensidade, etc [35]. Quanto à
Aspectos universais e inatos da precocidade, hoje sabemos que os bebês
cognição musical processam os padrões musicais de forma
muito semelhante aos adultos, além de
A pesquisa em bebês e as com- possuírem memória de longo prazo para
parações inter-culturais são duas das melodias [30,31].
principais abordagens empíricas para As emoções musicais são diretas e
o estudo da contribuição dos aspectos imediatas, sendo que a maioria das pes-
culturais e universais para vários soas alega ouvir música para evocar emo-
comportamentos, incluindo a música. A ções, ou para aliviar o tédio [36]. Hoje
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 177

também sabemos que a compreensão ou e outros com movimentos de valsa [42].


apreciação emocional de uma música não Após este treinamento os bebês preferi-
depende exclusivamente da apropriação ram ouvir os ritmos correspondentes ao
cultural dos códigos de um determinado balanço a que foram submetidos, olhando
sistema musical, mas que, pelo contrário, por mais tempo a caixa de som quando
a música é capaz de evocar fortes emo- esta tocava os ritmos experimentados
ções de uma forma universal e indepen- corporalmente. Os autores do estudo
dentemente da história sócio-cultural do argumentam que estes resultados ilus-
ouvinte. As fortes emoções musicais são tram as fortes conexões auditivo-motoras
altamente consistentes entre os sujeitos no processamento do ritmo, envolvendo
de várias culturas, tanto em estudos principalmente os sistemas vestibular e
intra, quanto inter-culturais, podendo proprioceptivo, uma vez que não há enga-
ser de valência tanto positiva, quanto jamento de auto-movimento [42].
negativa, na dependência de aspectos De fato, muitos autores defendem a
particulares e universais da estruturação noção de que um dos mais importantes
musical [35,37]. aspectos universais da música é sua
Todas as culturas possuem ritmos capacidade de facilitar a coordenação
com maior ou menor grau de métrica, o e sincronia dos movimentos humanos
que facilita a sincronização dos movimen- envolvidas nas atividades sócio-intera-
tos corporais na dança, no bater de pal- cionistas e coletivas. Cada vez mais se
mas, na marcha, no canto, etc. [29,38]. enfatiza a importância da percepção da
Além disso, diferentemente dos animais, pulsação e sincronização como uma ca-
crianças e adultos humanos apresen- racterística unicamente humana e de alto
tam o comportamento espontâneo de valor adaptativo [24]. Os jogos de imita-
acompanhar a música com movimentos ção com música e dança são universais
corporais, mesmo durante a escuta so- e as próprias danças tribais podem ser
litária. Embora bebês sejam claramente vistas como uma das mais frequentes
atraídos pela música e responsivos formas de jogos de imitação, usadas para
ao seu conteúdo emocional desde as desenvolver o senso de “pertencimento
primeiras semanas de vida [39], suas ao grupo”, ambos os sentimentos de “ser
respostas motoras ao ritmo começam a como o outro” e de o outro “ser como eu”
ocorrer somente por volta de 1 ano com e assim de pertencer a um grupo [1,29].
movimentos de corpo e cabeça. A periodi- Os precursores desenvolvimentais
cidade começa a se desenvolver entre os da música, desde o início da primeira
2 e os 5 anos, estando a sincronização infância, na fase pré-verbal e ao longo de
ainda limitada a uma gama muito restrita toda ela, ocorrem sob a forma de com-
de tempos mais rápidos [40,41]. Bebês portamentos proto-musicais, os quais são
de 7 meses foram balançados no colo exploratórios e cinesteticamente encar-
enquanto ouviam ritmos ambíguos que nados, intimamente ligados a interações
poderiam ser interpretados como marcha controladas no tempo, como brincadeiras
(se acentuados em cada segunda batida) de vocalização e a movimentos corporais
ou como valsa (se acentuados a cada ter- e envolvidos na modulação e regulação de
ceira batida), de modo que alguns foram estados afetivos [43]. Um dos aspectos
balançados com movimentos de marcha mais fascinantes da música é o fenômeno
178 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

interacionista universal do “maternalês”, domínios, principalmente entre a música


a fala dirigia aos bebês, na qual adultos e a linguagem, também sugerem que
de todas as culturas usam uma fala bem pelo menos alguns aspectos da música
mais aguda (1 ou 2 oitavas acima), com correspondem a um sistema neuronal re-
entonações exageradas e de forma muito lativamente autônomo [17]. Em contraste
mais lenta, semelhantes às encontradas à linguagem verbal, que é normalmente
nas cantigas de bebês (acalanto, ninar, prejudicada (afasias de compreensão e
etc.), também universais. Os bebês pre- produção) por lesões envolvendo áreas
ferem a fala musical do maternalês à fala perissilvianas (áreas frontotemporoparie-
normal e o maternalês parece ser essen- tais em volta do sulco de Sylvius que se-
cial na regulação emocional, na formação para o lobo temporal do frontal e parietal)
de vínculos e na orientação da atenção, do hemisfério esquerdo (HE), as amusias
agindo como um sinal social que assiste adquiridas (prejuízos no reconhecimento
ao aprendizado da criança, incluindo a de músicas antes familiares) decorrem
facilitação da percepção dos sons da fala predominantemente de lesões envolven-
e, consequentemente, o desenvolvimento do áreas perissilvianas do hemisfério
fonológico [44]. direito (HD). A amusia congênita, déficit
Devido a essa inextricável ligação genético-neurológico na percepção tonal
entre música e movimento, muitos auto- fina que afeta aproximadamente 5% da
res defendem a noção de que a visão da população, também fornece evidências
música simplesmente como organização para a dissociação entre a música e
dos sons é etnocêntrica, eminentemente outros domínios. Os amúsicos congêni-
ocidental e que o conceito de música tos são musicalmente ineptos, falham
deveria incluir o movimento [1,29]. Há em reconhecer músicas familiares e em
muitas culturas que não fazem a distinção discriminar entre padrões melódicos,
entre música e dança, tais como a tribo têm pouca sensibilidade à consonância/
Igbo da Nigéria onde a palavra Nkwa é dissonância e apresentam atonalia, en-
usada para expressar música-dança [1]. quanto suas outras habilidades parecem
Nesse sentido, há autores que procuram completamente normais, incluindo a
definir a música em termos não somen- linguagem oral e o reconhecimento de
te de som, mas também de movimento todos os outros sons não musicais [45].
[1,29]. De acordo com Ian Cross [1], a Entretanto, estudos mais recentes
música é uma forma de comunicação demonstram que as espetaculares duplas
sonora corporificada, não-referencial, dissociações entre música e linguagem
cujo conteúdo é principalmente, mas não ocorrem, não porque o HD tenha áreas
exclusivamente, emocional, e construída específicas para processar somente es-
a partir da organização dos sons nas di- tímulos musicais e o HE somente para
mensões de altura/tom e tempo. estímulos linguísticos, mas simples-
mente porque o HD é mais eficiente na
Neurocognição musical: percepção tonal fina que é crucial para
modularidade e interatividade a discriminação dos padrões tonais da
música, mas não da linguagem, enquanto
Evidências neuropsicológicas de que o HE é mais eficiente na percepção
dissociação entre a música e outros temporal fina que é crucial na discrimi-
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 179

nação dos sons linguísticos e, conse- envolvendo a audição ativa para a discri-
quentemente, para o desenvolvimento minação de padrões melódicos revelam
das representações morfossintáticas ativação de estruturas cerebrais classica-
da linguagem [11,31]. Análises mais mente tidas como envolvidas na lingua-
detalhadas demonstram que lesões no gem, na motricidade e no processamento
HD também afetam as entonações da lin- visuo-espacial, consistentemente com os
guagem e que os indivíduos com amusia comportamentos musicais universais pre-
congênita também têm dificuldades na viamente descritos. Dentre estas regiões
discriminação tonal fina (capacidade de destacamos a área de Broca e o córtex
discriminar sutis diferenças de frequência parietal inferior esquerdo, conhecidas por
como entre duas teclas adjacentes do seu envolvimento na memória de trabalho
piano) tanto da música, quanto das en- verbal e na sintaxe linguística, os córtices
tonações linguísticas. Entretanto, déficits premotores, e áreas visuo-espaciais como
na percepção tonal fina não prejudicam cúneo e precúneo, dentre outras [11,12].
significativamente a percepção das en- Finalmente, as respostas emocionais
tonações da fala, particularmente a dis- à música são acompanhadas por altera-
tinção entre perguntas e afirmações que ções psicofisiológicas ou autonômicas,
na maioria são variações da ordem de 6 tais como alterações na circulação san-
semitons (a distância entre a primeira e a guínea, na condutividade elétrica da pele,
sexta de seis teclas adjacentes do piano), na temperatura corporal, dentre outras
nem tampouco a percepção fonêmica. [37,46). Essas respostas são geralmente
Se na dimensão tonal a música e lin- descritas pelas pessoas como arrepios,
guagem possuem relativa independência, calafrios, lacrimejamento, etc e estão
na dimensão temporal, particularmente relacionadas a ativações de áreas sub-
no ritmo, há claros indícios de que ambos corticais envolvidas no comportamento
os domínios compartilham mecanismos aversivo (de fuga), tal como o giro pa-
cognitivos e recursos neurais. Déficits rahipocampal e a amígdala, ou de áreas
seletivos no ritmo com preservação da que compõem o circuito de recompensa,
percepção tonal e reconhecimento mu- como o sistema mesolímbico e o córtex
sical, normalmente decorrem de lesões orbitofrontal [47].
ou alterações genético-neurológicas que Argumenta-se que, a despeito de pos-
envolvem áreas parietais e/ou frontais suir alguns aspectos modulares ou domí-
inferiores do HE envolvidas na sintaxe lin- nio-específicos, é a natureza supramodal
guística e na memória verbal de trabalho, e interativa da música, envolvendo muitos
respectivamente, e, além disso, também domínios biologicamente relevantes tais
estão frequentemente associados a sin- como linguagem, motricidade, espaço e
tomas afásicos [11,12]. emoção, que representa sua maior força
Se os estudos de lesão revelam as evolutiva. E não há dúvidas de que são
áreas que parecem ser cruciais para cer- estes os principais aspectos que fizeram
tas tarefas, tais como os córtices perissil- com que a música fosse universalmente
vianos do HD para o processamento tonal, usada pelas diversas culturas como ins-
os estudos de neuroimagem mostram as trumento de cura [1,48], e que atualmente
áreas que estão envolvidas nestas tarefas, suportam uma abordagem musicoterapêu-
não apenas as áreas cruciais. Tarefas tica baseada em evidência [49,50].
180 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

Interface música e saúde ro-frontais do hemisfério direito), a música


é o comportamento que mais envolve áre-
As propriedades universais da músi- as cerebrais distintas, incluindo as áreas
ca também refletem propriedades anatô- linguísticas no hemisfério esquerdo e áre-
micas e fisiológicas de nossos circuitos as visuo-espaciais e motoras em ambos
auditivos, evoluídos para o processamen- os hemisférios [11,12]. Seu amplo espec-
to de eventos acústicos biologicamente tro cognitivo tem efeitos terapêuticos na
relevantes [51]. Segundo Panksepp e melhora da produção verbal em pacientes
Bernatzky [52]: afásicos [54,55], na melhora da qualidade
de vida, da depressão e da ansiedade em
”...nosso amor pela música reflete uma pacientes com demência [56,57], Melho-
habilidade ancestral de nossos cérebros em rias significativas na habilidade de comu-
transmitir e receber sons emocionais básicos nicação em crianças autistas, melhora
biologicamente relevantes e de efetuar ...mo- da função motora após acidente vascular
vimentos rítmicos de nosso aparato motor cerebral [58]. Melhorias significativas na
instintivo/emocional evoluídos para indicar habilidade de comunicação em crianças
certos estados que possam promover ou pre- autistas [59] e habilidades fonológicas e
judicar nosso bem estar” (p.134). de leitura-escrita em crianças disléxicas
também têm sido demonstradas [60]. Os
De fato, os processos neurais sub- seus efeitos motores positivos já estão
jacentes às respostas estéticas à mú- amplamente confirmados em pacientes
sica são muito mais claros e facilmente com a doença de Parkinson [61]. Esses be-
detectáveis cientificamente do que os nefícios provavelmente também se devem
associados às respostas sucitadas pelas ao poder emocional-afetivo da música.
artes visuais [53], provavelmente porque A música desencadeia natural e
a música exerce influências mais diretas automaticamente emoções biologica-
e poderosas nos sistemas emocionais mente primárias, como alegria, tristeza,
subcorticais do que as artes visuais. surpresa, medo, raiva, nojo, etc. Emo-
De fato, há estudos preliminares que ções musicais negativas (principalmente
mostram que drogas como a naloxona e diante de música dissonante) ativam o
a naltrexona, as quais são antagonistas giro parahipocampal e a amígdala e estão
dos receptores opióides, reduzem as associadas à liberação de noradrenalina
emoções e os arrepios evocados pela e a correlatos neurofisiológicos do com-
música [52]. portamento de fuga ou medo. Emoções
Assim, com base nas evidências musicais positivas (principalmente diante
antropoculturais, neurobiológicas, neu- de música consonante) ativam áreas
rodesenvolvimentais e de estudos sobre cerebrais envolvidas no comportamento
o uso da música na saúde, pode-se de- de recompensa/prazer,_ sistema meso-
fender que: límbico e mesocortical com mediação
A música é tanto emocional, quanto dopaminérgica, como a área tegmental
‘corporificada’, envolvendo não somente ventral do mesencéfalo, o nucleus accum-
o som, mas também a ação. bens e o córtex orbitofrontal [46,47,52].
Apesar de possuir substratos neurais Assim, a audição de música relaxante/
relativamente específicos (circuitos tempo- prazerosa (consonante) incrementa a
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 181

recuperação das funções respiratórias in the absence of synaptic release.


e cardiovasculares e diminui o nível de Neuroscience 2004;126(1):115-26.
cortisol após o estresse [46], reduz a 8. Geary DC & Huffman KJ. Brain and
ansiedade, a depressão [49) e possui cognitive evolution: forms of modularity
efeitos analgésicos [62]. and functions of mind. Psychol Bull
2002;128:667-98.
Graças à plasticidade cerebral, a
9. Andrade PE. A teoria sócio-culturalista
música é uma poderosa ferramenta tera-
de Vygotsky e o papel da linguagem na
pêutica de baixo custo e de baixo risco, formação de conceitos: o que a psicologia
com efeitos positivos significativos na experimental e a neurociência têm a nos
própria plasticidade cerebral na atenção, dizer. Neurociências 2006;3:158-78.
no processamento semântico, na memó- 10. A n d r a d e P E . O d e s e n v o l v i m e n t o
ria, nas funções motoras e nas emoções cognitivo da criança: o que a psicologia
[49,50]. A música pode e deve ser usada experimental e a neurociência têm a nos
tanto em casos clínicos de lesões cere- dizer. Neurociências (Atlântica Editora)
brais e doenças degenerativas, como em 2006;3:98-118.
intervenções sobre transtornos do com- 11. Andrade PE, Konkiewitz EC. Brain and the
portamento e emocionais, e, finalmente, music: a window to the comprehension of
em intervenções psicopedagógicas. the interactive brain functioning. Ciências
& Cognição (UFRJ) 2011;16:137-64.
12. A n d r a d e P E . U m a a b o r d a g e m
Referências evolucionária e neurocientífica da música.
Neurociências Brasil 2004;1:21-33.
1. Cross I. Music as biocultural phenomenon.
13. Geary DC. Biology, culture, and cross-
Ann N Y Acad Sci 2003;999:106-11.
national differences in mathematical
2. Wisnik JM. O som e o sentido. In: Uma
ability. In: Sternberg RJ, Ben-Zeev T, eds.
outra história das músicas. São Paulo:
The nature of mathematical thinking.
Companhia das Letras; 1999. p.285.
Mahwah, NJ: Lawrence Earlbaum
3. Geertz C. The interpretation of cultures:
Associates; 1996. p. 145-71.
selected essays. New York: Basic Books;
14. Geary DC. A darwinian perspective
1973.
on mathematics and instruction. In:
4. Abbate C. Unsung voices: opera and
Loveless T, ed. The great curriculum
musical narrative in the nineteenth
debate: How should we teach reading
century. Oxford: Princeton University
and math? Washington, DC: Brookings
Press; 1991.
Institute; 2001. p.85-107.
5. Gazzaniga MS, Ivry RB, Mangun GR.
15. Buonomano DV, Merzenich MM. Cortical
Neurociência cognitiva: a biologia da
plasticity: from synapses to maps. Annu
mente. 2a ed. Porto Alegre: Artmed;
Rev Neurosci 1998;21:149-86.
2006.
16. Lent R. Cem bilhões de neurônios:
6. Verhage M, Maia AS, Plomp JJ, Brussaard
conceitos fundamentais de neurociência.
AB, Heeroma JH, Vermeer H et al.
São Paulo: Atheneu; 2001.
Synaptic assembly of the brain in the
17. Peretz I. Music perception and cognition.
absence of neurotransmitter secretion.
In: Rapp B, editor. The Handbook of
Science 2000;287(5454):864-9.
Cognitive Neuropsychology. Hove:
7. Bouwman J, Maia AS, Camoletto PG,
Psychology Press; 2001. p.519-540.
Posthuma G, Roubos EW, Oorschot
18. Patel AD, Peretz I, Tramo M and Labreque R.
VM et al. Quantification of synapse
Processing prosodic and musical patterns:
formation and maintenance in vivo
182 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

A neuropsychological investigation. Brain recognition with reduced spectral cues


Lang 1998;61 (1):123-44. as a function of age. J Acoust Soc Am
19. Patel AD & Daniele JR. An empirical 2000;107:2704-10.
comparison of rhythm in language and 31. Zatorre RJ, Belin P and Penhune VB.
music. Cognition 2003;87(1):B35-B45. Structure and function of auditory cortex:
20. Patel AD & Iversen JR. The linguistic music and speech. Trends Cogn Sci
benefits of musical abilities. Trends Cogn 2002;6(1):37-46.
Sci 2007;11:369-72. 32. McDermott J & Hauser MD. The origins
21. Peretz I. Music perception and cognition. of music: Innateness, uniqueness, and
In: Rapp B, ed. The Handbook of Cognitive evolution. Music Percept 2005;23:29-59.
Neuropsychology. Hove: Psychology 33. Justus T, Hutsler JJ. Fundamental issues
Press; 2001. p.519-40. in evolutionary psychology of music:
22. Drake C. Psychological processes Assessing innateness and domain
involved in the temporal organization of specificity. Music Percept 2005;23:1-27.
complex auditory sequences: Universal 34. Eerola T. The dynamics of musical
and acquired processes. Music Percept expectancy: cross-cultural and statistical
1998;16:11-26. approaches to melodic expectations.
23. Wilson SJ, Pressing JL and Wales [Tese]. Jyväskylä Studies in Arts 9,
RJ. Modelling rhythmic function in a Jyväskylä; 2003.
musician post-stroke. Neuropsychologia 35. Balkwill LL, Thompson WF, Matsunaga
2002;40(8):1494-1505. R. Recognition of emotion in Japanese,
24. Patel AD. Musical rhythm, linguistic Western and Hindustani music by
rhythm, and human evolution. Japanese listeners. Jpn Psychol Res
Music Percept 2006;24:99-104. 2004;46:337-49.
25. G o s w a m i U . L a n g u a g e , m u s i c 36. Panksepp J. The emotional sources of
and children’s brains: A rhythmic timing ‘chills’ induced by music. Music Percept
perspective on language and music 1995;13:171-207.
as cognitive systems. In: Rebuschat 37. Krumhansl CL. An exploratory study of
P, Rohrmeier M, Hawkins J, Cross I, musical emotions and psychophysiology.
eds. Language and music as cognitive Can J Exp Psychol 1997;51:336-52.
systems. Oxford: Oxford University Press; 38. Brown S. Biomusicology and three
2010. p.292-299. biological paradoxes about music.
26. Lerdahl F and Jakendorff RA. A generative Bulletin of Psychology and the Arts 2003;
theory of tonal music. Cambridge, MA: 4:15-7.
MIT Press; 1983. 39. Trehub SE. The developmental origins of
27. Patel AD. Language, music, syntax and musicality. Nat Neurosci 2003;6(7):669-
the brain. Nat Neurosci 2003;6(7):674- 73.
81. 40. Drake C, Jones MR, Baruch C. The
28. Hauser MD, Chomsky N and Fitch WT. development of rhythmic attending
The faculty of language: what is it, who in auditory sequences: attunement,
has it, and how did it evolve? Science referent period, focal attending. Cognition
2002;298(5598):1569-79. 2000;77:251-88.
29. Fitch T. The biology and evolution of 41. Eerola T, Luck G and Toiviainen P. An
music: a comparative perspective. investigation of preschooler’s corporeal
Cognition 2006;100(1):173-215. synchronization with music. In: Baroni
30. Eisenberg LS, Shannon RV, Martinez AS, M,. Addessi AR, Caterina R, Costa M,
Wygonski J and Boothroyd A. Speech eds. Proceedings of the 9th International
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 183

Conference on Music Perception & of aesthetic experience. Journal of


Cognition (ICMPC9), Bologna, Italy: Consciousness Studies 1999;6:15-51.
ESCOM; 2006, p.472-6. 54. Norton A, Zipse L, Marchina S, Schlaug
42. Phillips-Silver J,Trainor LJ. Feeling the G. Melodic intonation therapy: shared
beat in music: Movement influences insights on how it is done and why it might
rhythm perception in infants. Science help. Ann N Y Acad Sci 2009;1169:431-6.
2005;308:1430. 55. Stahl B, Kotz SA, Henseler I, Turner R,
43. Dissanayake EIE. Antecedents of the Geyer S. Rhythm in disguise: why singing
temporal arts in early mother-infant may not hold the key to recovery from
interactions. In: Wallin N, Merker B, aphasia.Brain 2011;134(Pt 10):3083-
Brown S, eds. The origins of music. 93.
Cambridge, MA: MIT Press; 2000. p.389- 56. Cooke M, Moyle W, Shum D, Harrison
410. S, Murfield J.A randomized controlled
44. Kuhl P. Cracking the speech code: How trial exploring the effect of music on
infants learn language. Acoust Sci & quality of life and depression in older
Tech 2007;28(2):71-83. people with dementia. J Health Psychol
45. Hyde K and Peretz I. Brains that are 2010;15(5):765-76.
out of tune but in time. Psychol Sci 57. Guétin S, Portet F, Picot MC, Pommié
2004;15(5):356-60. C, Messaoudi M, Djabelkir L et al.
46. Khalfa S, Isabelle P, Jean-Pierre B, Effect of music therapy on anxiety and
Manon R. Event-related skin conductance depression in patients with Alzheimer’s
responses to musical emotions in type dementia: randomised, controlled
humans. Neurosci Lett 2002;328:145-9. study. Dement Geriatr Cogn Disord
47. Brown S, Martinez MJ and Parsons LM. 2009;28(1):36-46.
Passive music listening spontaneously 58. Altenmüller E, Marco-Pallares J, Münte
engages limbic and paralimbic systems. TF, Schneider S. Neural reorganization
Neuroreport 2004;15(13):2033-7. underlies improvement in stroke-
48. Gouk P, ed. Musical Healing in Cultural induced motor dysfunction by music-
contexts. Aldershot: Ashgate; 2000. supported therapy. Ann N Y Acad Sci
49. Särkämö T, Tervaniemi M, Laitinen S, 2009;1169:395-405.
Forsblom A, Soinila S, Mikkonen M et al. 59. Rossignol DA. Novel and emerging
Music listening enhances cognitive recovery treatments for autism spectrum
and mood after middle cerebral artery disorders: a systematic review. Ann Clin
stroke. Brain 2008;131(Pt 3):866-76. Psychiatry 2009;21(4):213-36.
50. Sacks O. The power of music. Brain 60. Overy K. Dyslexia and music. From timing
2006;129:2528–32. deficits to musical intervention. Ann NY
51. Tramo MJ, Cariani PA, Delgutte B, Braida Acad Sci 2003;999:497-505.
LD. Neurobiological foundations for 61. Pacchetti C, Mancini F, Aglieri R, Fundarò
the theory of harmony in western tonal C, Martignoni E, Nappi G. Active music
music. Ann N Y Acad Sci 2001;930:92- therapy in Parkinson’s disease: an
116. integrative method for motor and
52. Panksepp J, Bernatzky G. Emotional emotional rehabilitation. Psychosom
sounds and the brain: the neuro-affective Med 2000;62(3):386-93.
foundations of musical appreciation. 62. Roy M, Peretz I, Rainville P. Emotional
Behav Processes 2002;60:133-55. valence contributes to music-induced
53. Ramachandran VS, Hirstein W. The analgesia. Pain 2008;134:140-7.
science of art. A neurological theory
184 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

Revisão

Meu filho é autista e agora?


My son is autist and now?
Sílvia Aparecida Santos de Santana

Resumo
Este estudo analisou como se encontra a noção de percepção da criança autista, e a iteração parental.
Realizado por meio de pesquisa bibliográfica exploratória em livros e artigos científicos e relatos clíni-
cos. Para isso, primeiramente busquemos conhecer o autismo, suas características e as dificuldades
apresentadas pelo autista. Em seguida, fizemos um breve estudo sobre como a relação parental lida
com essa realidade. Baseando-se nos dados coletados percebe-se uma grande dificuldade de aceitação
das limitações apresentadas e reestruturação da dinâmica familiar para a inclusão dessa criança no seu
próprio contexto familiar sem contar a culpa apresentada pelos pais, uma vez que pais acreditam que são
culpados ou que fizeram um filho com defeito. Assim sendo, é possível afirmar é essa lida inadequada
pode ser uma dentre tantas razões que muitas vezes inviabiliza a relação do Autista com o mundo externo.

Palavras-chave: autismo, limitações, inclusão familiar.

Sílvia Aparecida Santos de Santana é Doutoranda em Psicologia pela Universidad de Ciencias Empre-
sariales y Sociales – UCES, Buenos Aires, Argentina, Psicanalista, Psicopedagoga com Licenciatura em
Filosofia, Professora do e Coordenadora geral do Programa de Pós-Graduação em Psicanálise e Psico-
pedadogia do CEAPP - Centro de Estudos e Acompanhamento Psicanalítico e Psicopedagógico, Espe-
cialista em Psicopedagogia, Psicanálise Clínica e Didata, Psicanalista Infantil e Forense, Conferencista
sobre temas ligados à Família e Comportamento da Sociedade.e Presidenta da SOPPHI – Sociedade de
Psicanálise Psicopedagogia e Hipnoterapia

Correspondência: Sílvia Aparecida Santos de Santana, Diretoria Geral do CEAPP - Centro de Estudo e
Acompanhamento Psicanalítico e Psicopedagógico, Av Paulo VI, 1709 Ed Racional Canter, sala 202/207
Pituba 41810-000 Salvador BA, Tel: (71) 3495 5360, E-mail: ceappcomvc@yahoo.com.br, site: www.
ceapponline.net
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 185

Abstract
This study examined the notion of awareness of the autistic child, and parental iteration. This was a litera-
ture review based in books, articles and clinical reports. Firstly it sought to know autism, its characteristics
and the difficulties presented by autism. Then we did a brief study on how the parental relationship deals
with this reality. Based on data collected it was observed a great difficulty to accept the limitations pre-
sented and the restructuration of family dynamics to include that child in their own family context, without
to mentionning the guilt presented by the parents, because parents believe that they are guilty to have a
child with defects. Therefore we can say this fact is one of the inadequate among many reasons that often
undermines the relationship of autistic patient with the outside world.

Key-words: autism, limitations, including family.

A constituição autista com os seguida como os pais lidam com essa


princípios da psicanálise infantil descoberta e no geral como se compor-
tam. Procurei entender qual a importân-
O objetivo principal deste trabalho é cia e/ou interferência do casal parental
refletir e analisar sobre constituição da desenvolvimento de crianças autistas. A
descoberta do ser Autista em uma estru- partir dessa compreensão será possível
tura familiar. Acreditando que a identifica- investigar novas formas de tratamento
ção dos desvios no desenvolvimento da e/ou intervenção para essas crianças.
criança com transtornos pertencentes ao
espectro autista e no acompanhamento Breve história do autismo e relação
e o engajamento da família como passos com a psicanálise infantil
fundamentais na intervenção psicanalis-
ta, este estudo busca avaliar o processo A palavra “autismo” deriva do grego
evolutivo da criança autista em contexto “autos”, que significa “voltar-se para sí
de intervenção direta e indireta, a partir mesmo”. A primeira pessoa a utilizá-la
das respostas da sua relação parental foi o psiquiatra austríaco Bleuler, em
(pais e mães). 1911, para se referir a um dos critérios
Para um melhor entendimento neste adotados em sua época para a realiza-
trabalho farei uma divisão em partes, num ção de um diagnóstico de esquizofrenia.
primeiro momento falarei sobre a história Estes critérios, os quais ficaram conhe-
do Autismo, em seguida sobre o Autismo cidos como “os quatro ‘A’s de Bleuler,
e suas características comportamentais são: alucinações, afeto desorganizado,
tais com distúrbio do relacionamento; incongruência e autismo. A palavra
distúrbio da fala e da linguagem; distúrbio referia-se a tendência do esquizofrênico
do ritmo de desenvolvimento; distúrbio da de “ensimesmar-se”, tornando-se alheio
motilidade e distúrbio da percepção. Em ao mundo social – fechando-se em seu
186 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

mundo, como até hoje se acredita sobre esta ponte e entrar na vida social nor-
o comportamento autista. mal, ficando presa na fase autística do
Kanner [1] estudou com mais aten- desenvolvimento. Em 1960, no entanto,
ção 11 pacientes com diagnóstico de a psicanalista Francis Tustin publica um
esquizofrenia. Observou neles o autismo artigo no qual desfaz a idéia da fase au-
como característica mais marcante; nes- tística do desenvolvimento.
te momento, teve origem a expressão Naquela época a busca pelo trata-
“Distúrbio Autístico do Contato Afetivo” mento psicanalítico era muito intensa.
para se referir a estas crianças. Kanner Muitas vezes as crianças passavam por
chegou a dizer que as crianças autistas sessões diárias, inclusive no domingo. O
já nasciam assim, dado o fato de que o preço pago era muito alto. Muitas famílias
aparecimento da síndrome era muito pre- vendiam seus bens na esperança de que
coce. A medida em que foi tendo contato aquele método as ajudasse a corrigir o
com o universo parental destas crianças erro que haviam cometido na criação de
ele foi mudando de opinião. Começou seus filhos.
a observar que os pais destas crianças Com o advento da década do cérebro,
estabeleciam um contato afetivo muito no entanto, estas idéias começaram a
frio com elas, desenvolvendo então o ser deixadas de lado – além de não es-
termo “mãe geladeira” para referir-se tarem satisfazendo as expectativas dos
as mães de autistas, que com seu jeito pais. A partir de 1980 foram surgindo no-
frio e distante de se relacionar com os vas tecnologias de estudo, as quais per-
filhos promoveu neles uma hostilidade mitiam investigação mais minuciosa do
inconsciente a qual seria direcionada para funcionamento do cérebro da pessoa com
situações de demanda social. exames como tomografia por emissão
Kanner com suas hipóteses penetrou de pósitrons ou ressonância magnética.
com forte influência no referencial psica- Doenças que anteriormente eram estuda-
nalítico da síndrome que pressupunha das apenas a partir de uma perspectiva
uma causa emocional ou psicológica psicodinâmica passaram a ser estudadas
para o fenômeno, a qual teve como seus de maneiras mais cuidadosas, deixando
principais precursores os psicanalistas de lado o cogito cartesiano.
Bruno Bettelheim e Francis Tustin. Ivar Lovaas na década de 60 trouxe
Bettelheim em sua terapêutica, in- seus métodos analítico-comportamentais
citava as crianças a baterem, xingarem que começaram a ganhar espaço no tra-
e morderem em uma estátua que, pelo tamento da síndrome. Seus resultados
menos para ele, simbolizava a mãe de- apresentavam-se de maneira mais efetiva
las. Tustin, por outro lado, acreditava em do que as tradicionais terapias psicodinâ-
uma fase autística do desenvolvimento micas. E já naquela época as psicologias
normal, na qual a criança ainda não ti- comportamentais sofriam forte precon-
nha aprendido comportamentos sociais ceito por parte dos psicólogos de outras
e era chamada por ela de fase do afeto abordagens. Durante as décadas de 60
materno, funcionando como uma ponte e 70 os psicólogos comportamentais
entre este estado e a vida social. Se a eram consultados quase que apenas de-
mãe fosse fria e suprimisse este afeto, pois que todas as outras possibilidades
a criança não conseguiria atravessar haviam se esgotado e o comportamento
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 187

do autista tornava-se insuportável para os Infelizmente não existe ainda um


pais e muito danoso para a família como exame de sangue ou um teste que
um todo inclusive para a própria criança. possa ser feito para se diagnosticar o
autismo durante a gestação ou após o
O autismo na atualidade nascimento. Então, este diagnóstico sim
é comportamental. Seus maiores déficits
Na atualidade o autismo é visto como apresentam-se nas áreas de socialização,
uma desordem na qual uma criança jovem comunicação e imaginação [4], e sabe-
não pode desenvolver relações sociais mos que quanto antes diagnosticado,
normais, se comporta de modo compul- há muito mais chances de progressos. A
sivo e ritualista, e geralmente não desen- doença manifesta-se geralmente durante
volve inteligência normal é característico os três primeiros anos de vida [3].
do autista apresentar alguns déficits e Manuais diagnósticos como o DSM-IV
excessos comportamentais em diversas TR e o CID-10 caracterizam o autismo como
áreas [2], de origem neurobiológica. O um transtorno pervasivo do desenvolvimen-
grau de comprometimento destes déficits to no qual existe comprometimento severo
podem variar de uma criança para outra e em áreas como: diminuição do contato
na mesma criança ao longo do tempo. Por ocular; dificuldade de mostrar, pegar ou
este motivo, a expressão Transtorno do usar objetos; padrões repetitivos e este-
Espectro Autista tem sido mais utilizada riotipados de comportamento; agitação ou
em detrimento da palavra Autista. torção das mãos ou dedos, movimentos
O autismo é uma severa desordem corporais complexos; atraso ou ausência
da personalidade, que se manifesta na total da fala. A National Society for Autistic
infância precoce por um anormal desen- Children o encara como um distúrbio do de-
volvimento de linguagem e relações com senvolvimento que se manifesta de forma
os outros. No Manual Diagnóstico e Esta- incapacitante por toda a vida, aparecendo
tístico de Transtornos Mentais (DSM IV) tipicamente nos três primeiros anos de
da Associação Americana de Psiquiatria vida. Define como critérios para diagnósti-
(AAP) [3], está classificado no subgrupo co do autismo o precoce comprometimento
denominado “Transtornos Invasivos do na esfera social e de comunicação.
Desenvolvimento”. Este subgrupo é ca- Este Transtorno Invasivo do Desen-
racterizado por severas deficiências e volvimento acomete apenas cinco entre
prejuízo invasivo em múltiplas áreas do cada dez mil nascidos, ocorre em famílias
desenvolvimento, incluindo perdas na de todas as configurações raciais, étni-
interação social recíproca e na comuni- cas ou sociais. Gauderer [5] afirma que
cação, apresentando comportamentos, maioria das crianças com diagnóstico
interesses e atividades estereotipadas. do Transtorno de Espectro Autista tem
Ornitz descreve uma evolução para essa fisionomia normal, e sua expressão séria
doença, situando no tempo os sintomas pode passar a idéia, geralmente errada,
dessas crianças. Segundo Leboyer, é de inteligência extremada. Apesar da es-
fundamental ter uma visão dinâmica da trutura facial normal, no entanto, estão
evolução da sintomatologia autística, quase sempre ausentes a expressividade
principalmente em função da idade do das emoções e receptividade presentes
paciente e a relação parental. na criança com desenvolvimento típico.
188 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

Nem sempre o autismo está asso- não tem habilidade de interagir, ele até
ciado à deficiência mental. Às vezes tem vontade, mas não sabe como!
ele ocorre em crianças com inteligência Tem como objetivo apoiar o portador
classificada como normal. O chamado de autismo a chegar à idade adulta com o
“déficit intelectual” é mais intenso nas máximo de autonomia possível. Ajudando-
habilidades verbais e menos evidente -o a adquirir habilidades de comunicação
em habilidades viso-espaciais. É muito para que possam se relacionar com ou-
comum, no entanto, crianças com este tras pessoas e, dentro do possível dar
diagnóstico apresentarem desempenho condições de escolha para a criança [2].
além do normal em tarefas que exigem O Autismo pode acometer qualquer
apenas atividades mecânicas ou me- criança, porém não é qualquer relação
morização, ao contrário das tarefas nas parental que consegue lidar bem com um
quais é exigido algum tipo de abstração, filho autista.
conceituação, sequenciação por cores, O autismo impacta toda a família de
tamanhos ou sentido. muitas formas, afetando tanto à criança
Segundo Baron-Cohen, um dos sub- como toda a família, e principalmente o
componentes mentais imprescindível casal parental que na grande maioria das
para a existência da teoria da mente vezes acabam acreditando que erraram
seria a Atenção Compartilhada, que são em algum ponto. Os pais estão expostos a
comportamentos revestidos de propósito múltiplos desafios que têm uma verdadei-
declarativo. ra cisão na dinâmica familiar envolvendo
Seria a capacidade que a criança tem todos os pontos emocional, econômico
de compartilhar a atenção e o interesse e cultural. Em muitos casais a relação
com outra pessoa, através de gestos, de culpa fica tão evidente que muitos ca-
como apontar e direcionar o olhar do outro sais acabam separando por isso o apoio
para aquilo do seu interesse. Primeiro profissional pode ajudar a lidar tanto com
ponto observado pelo casal parental. uma criança autista quanto para ajudar
No bebê normal, os pais percebem os pais a aprenderem a forma de manejar
esta atitude no segundo semestre de as condutas e superarem as frustrações.
vida, já em crianças portadoras de autis- O cuidado de uma criança com au-
mo, este comportamento é mais tardio. tismo pode ser exaustivo e frustrante.
Sendo assim, Cleonice Bosa [6] conclui, Infelizmente, nem todas as famílias têm
considerando este fator como um im- acesso a esses serviços profissionais.
portante indicador precoce do autismo. Seja por falta de conhecimento ou de
Outra área de grande comprometimento recursos financeiros.
no autismo são as habilidades sociais,
que são determinadas dentro de um Descoberta do autismo na família
contexto cultural. É um conjunto de com-
portamentos emitidos em um contexto, “Diagnosticar uma criança com au-
que expressam sentimentos, opiniões do tismo significa para os pais, a entrada
indivíduo, de modo adequado á situação. violenta de um mundo que está cheio
No autismo, essas habilidades ou tão de angústia. Um mundo que depende da
gravemente debilitadas, ou não existem! suposição de que a criança ignora os sen-
O problema do autismo é que o indivíduo timentos de seus pais, que não entendem
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 189

como eles interagem com ele e que sofre percebe a diferença entre um indivíduo
de uma doença incurável” Kaufmann L. que pensa e tem desejos e um objeto
Os distúrbios na interação social dos inanimado. O portador de autismo enxer-
autistas podem ser observados desde o ga todos os seres vivos como objetos.
início da vida. Com autistas típicos, o contato As crianças autistas não compreen-
‘olho a olho’ já se apresenta anormal antes dem como se estabelecem as relações
do final do primeiro ano de vida. Muitas de amor e amizade.
crianças olham de canto de olho ou muito A indiferença em dividir atividades e
brevemente. Um grande número de crianças interesses com outras pessoas também
não demonstra postura antecipatória ao se- é um sintoma marcante (a habilidade
rem pegos pelos seus pais, podendo resistir em mostrar objetos de interesse para
ao toque ou ao abraço. Essa conduta muitas outras pessoas ocorre no primeiro ano
vezes começam a chamar atenção dos pais de vida, e a ausência desse sinal é um
que nos primeiros meses de vida já pode ser dos sintomas mais precoces do autismo
identificado. Dificuldades em se aconchegar infantil). A partir desse comportamento
moldando-se ao corpo dos pais, quando no a relação parental começa a perceber e
colo, são observadas precocemente. Crian- sofrer com a diferença apresentada pelo
ças que, posteriormente, receberam o diag- seu filho quando comparado aos irmãos,
nóstico de autismo, demonstravam falta de parentes ou outras crianças da mesma
iniciativa, de curiosidade ou comportamento idade de convívio social próximo.
exploratório, quando bebês. Os autistas apresentam dificuldades
Frequentemente, seus pais as descre- em manter um contato social inicial, de-
vem como: “felizes quando deixadas sozi- monstrando problemas para sustentar
nhas”, “como se estivessem dentro de uma esse contato, com frequência interrom-
concha”, “sempre em seu próprio mundo”. pido prematuramente.
Os autistas têm um estilo ‘instrumen- Com o passar dos anos, as anorma-
tal ou objetal’ de se relacionar, utilizando- lidades de relacionamento social tornam-
-se dos pais para conseguirem o que -se menos evidentes, principalmente se a
desejam. Um exemplo de modo instru- criança é vista próxima de seus familiares.
mental de relacionamento ocorre quando A resistência em ser tocado ou abra-
a criança autista pega a mão de sua mãe çado bem como o evitamento no contato
e a utiliza para abrir uma porta em vez de visual tendem também a diminuir quando
abrir a porta com sua própria mão. a relação parental reconhece a patologia
Frith sugere que a falha básica nos e conseguem trabalhar na dinâmica fami-
autistas é a incapacidade de atribuir aos liar sem culpas e sem fugas da realidade.
outros indivíduos sentimentos e pontos Baseando-se na percepção clínica de
de vista diferentes do seu próprio, con- Ornitz e Leboyer, foi possível elaborar um
cluindo que falta a essas crianças uma quadro para pais e educadores poderem
“teoria da mente”. Esse fato faz com que observar as principais características de
a empatia da criança seja falha, afetando crianças autistas de acordo com sua idade.
sentimentos básicos, como medo, raiva O fato de uma criança possuir a maio-
ou alegria. As pessoas, os animais e os ria dos aspectos desta tabela ainda não
objetos acabam sendo tratados de um será suficiente para considerarmos um
mesmo modo, visto que a criança não diagnóstico fechado de Autismo.
190 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

RECÉM NASCIDOS ATÉ O PRIMEIRO ANO DE VIDA


- Parece ter desenvolvimento diferente do outros bebes.
- Parece não precisar de sua.
- Raramente chora (É um bebê muito comportado).
- Costuma torna-se rígido quando pegado no colo.
- Não se molda ou aconchega-se no colo dos pais ou outras pessoas.
- Costuma manifestar uma forma muito retraída fatos considerados irritáveis.
NO PRIMEIRO ANO DE VIDA
- Não costuma pedir nada
- Não nota sua Mãe nem seu Pai
- Sorrisos, Resmungos e Respostas antecipadas são ausentes ou retardadas
- Falta de interesse por jogos e brincadeiras
- Muito reativos a sons e principalmente aos sons mais agudos
- Quando pego no colo apresenta rigidez no corpo
- Ausência de comunicação verbal e não verbal
- Hiper ou hiporeativos aos estímulos
- Aversão a alimentação sólida
- Etapas do desenvolvimento motor irregular ou retardada
SEGUNDO AO TERCEIRO ANO DE VIDA
- Indiferente aos contatos sociais
- Comunica-se mexendo as mãos de um adulto
- Costuma alinhar os brinquedos por cores ou tamanhos
- É sistemático com alguns objetos colocando sempre nos mesmo lugares
- É comum escolher um canto na casa para ficar
- Intolerância a novidades nos jogos
- É distante em relação a outras crianças
- Procura estimulações sensórias como ranger os dentes,esfregar e arranhar superfícies, fitar fixamente
detalhes visuais, olhar mãos em movimento ou bjetos com movimentos circulares.
- Desenvolvem particularidade motora: bater palmas, balançar a cabeça, andar na ponta dos pés, girar
em torno de si mesmo,
- Emite sons sem sentidos de comunicação ou interação
- Pode apresentar auto agressão agredir outras crianças da mesma idade
- Pode apresentar dificuldade para aceitar alguns alimentos pelas cores
- Não teme os perigos
- Insistência com gestos idênticos, resistência a mudar de rotina
- Pode não querer abraços de carinho ou pode aconchegar-se carinhosamente
- Não responde às ordens verbais; atua como se fosse surdo
DO QUARTO AO QUINTO ANO DE VIDA
- Ausência do contato visual
- Ausência de fantasia imaginação de jogos de representação
- Linguagem limitada ou ausente
- Ecolalia (repetição de palavras ou frases)
- Anomalia no ritmos dos discursos do tom e das inflexões
- Resistência a mudanças de ambientes
- Resistência para seguir rotinas
- Dificuldade na interação escolar
- Aparente insensibilidade à dor
- Risos e sorrisos inapropriados
- Pequena resposta aos métodos normais de ensino
- Dificuldade em expressar suas necessidades; emprega gestos ou sinais para os objetos em vez de usar
palavras.
- Apego inapropriado a objetos
- Aparenta angústia sem razão aparente
- Habilidades motoras e atividades motoras finas desiguais
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 191

Muitas vezes mesmo perceben- 2) Autismo ‘clássico’. É o tipo descrito


do todos esses sinais apresentado o pelo médico austríaco erradicado nos
sentimento de impotência deprime aos Estados Unidos Leo Kanner (1894-
pais, muitas famílias não sabem a quem 1981). Kanner foi o primeiro a utilizar
recorrer e nem o que fazer, A escola em a nomenclatura “autismo infantil
nosso país inda não consegue lidar bem precoce”, em um relatório de 1943,
com essa situação, mesmo seguindo a no qual descrevia 11 crianças com
lei da inclusão não é possível para escola comportamentos muito semelhantes.
brasileira ajudar a família e a criança com O médico utilizou expressões como
autismo de forma efetiva por uma série ‘solidão autística’ e ‘insistência na
de fatores e também pela ausência de mesmice’, que hoje são sintomas
informação. ainda tipicamente encontrados em
pessoas autistas. Os portadores des-
As várias faces do autismo se ‘autismo clássico’ têm comprome-
timento das capacidades cognitivas
De maneira geral, as desordens de que varia de moderado a grave, além
espectro autista, que englobam uma da dificuldade de interação social, de
grande variedade de comportamentos e comunicação e do comportamento
problemas sob o ponto de vista clínico, repetitivo.
podem ser divididas em dois ‘tipos’ de
autismo. Obviamente, essa divisão é 3) Autistas do tipo regressivo. Essa varia-
artificial e abarca em si outras muitas ção no espectro de desordens autistas
pequenas variações. inclui aqueles que se desenvolvem
1) Síndrome de Asperger. Descrita pela normalmente até aproximadamente
primeira vez pelo pediatra austríaco 1,5 ano, e em seguida, até os 3 anos,
Hans Asperger (1906–1980), é con- sofrem regressão da linguagem e do
siderada uma forma de autismo mais comportamento tornando-se autistas.
branda. Seus portadores apresentam
os três sintomas básicos (dificuldade A história do acompanhamento
de interação social, de comunicação psicanalítico para o autismo
e comportamentos repetitivos), mas
suas capacidades cognitivas e de Melanie Klein publicou, em 1930, o
linguagem são relativamente preser- caso clínico de uma jovem criança chama-
vadas. Na verdade, alguns até mes- da Dick, encaminhada aos seus cuidados
mo apresentam níveis de QI acima com o diagnóstico de demência precoce.
da média, motivo pelo qual a criança
portadora da síndrome de Asperger é Dick tinha quatro anos, ...era carente de
comumente representada como um afetos e indiferente à presença ou ausência
pequeno gênio que descobre códigos de sua mãe...estavam quase completamen-
e resolve enigmas. Entretanto, a sín- te ausentes a adaptação à realidade e as
drome de Asperger engloba aproxima- relações emocionais com seu ambiente (...)
damente 20-30% dos portadores de não tinha interesse pelos brinquedos (a não
desordens do espectro autista. ser um interesse muito específico pelos trens,
estações, maçanetas e portas) (...) não brin-
192 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

cava e não tinha contato com o seu ambiente. porta e disse: escuro. Klein novamente in-
Na maior parte do tempo, articulava sons terpretou: “está escuro dentro da mamãe,
ininteligíveis, e repetia constantemente certos Dick está entrando na mamãe escura”.
ruídos; quando falava, utilizava erroneamente Outras interpretações foram realizadas
seu escasso vocabulário. Klein M. [7]. nessa primeira sessão. Já na terceira
sessão de tratamento, Klein relatou os
Para Klein, o pequeno garoto era primeiros sinais de angústia e dependên-
diferente de todas as outras crianças cia de Dick. Naquela oportunidade, Dick
que ela já havia tratado (somente muitos demonstrou ansiedade ao deixar a babá
anos depois, Dick foi diagnosticado como e entrar no consultório, e também ao
autista). sair, quando a abraçou de forma afetiva.
Na primeira sessão, Dick acompa- Segundo Klein, justamente quando se
nhou a analista, sem demonstrar ne- deu essa expressão de afetividade, Dick
nhuma angústia ao se separar da babá. passou a se interessar pelas palavras
No consultório, não se interessou pelos tranquilizadoras e pelos brinquedos.A
brinquedos: ficou correndo de um lado partir dos sinais de surgimento de angús-
para outro, sem qualquer propósito. Klein tia, decorrente da relação afetiva com a
assim descreveu o seu sentimento inicial: babá e com a analista, como também do
“... ele correu em volta de mim como se interesse pelos brinquedos, Klein relatou
eu fosse um móvel; a expressão de seus ter ultrapassado o obstáculo fundamen-
olhos e de seu rosto era fixa, ausente e tal da análise de Dick. E, assim, podia
de desinteresse (...) e não tinha relação continuar analisando aquele pequeno por
com nenhum afeto ou angústia” meio da técnica do jogo, como fazia com
O obstáculo fundamental para o co- as demais crianças em sua clínica.
meço da análise de Dick foi, segundo a A técnica do jogo foi descrita por
analista, sua falta de interesse pelo am- Melanie Klein, em 1932, no seu primei-
biente e a ausência de relação simbólica ro livro, The Psychoanalysis of Children
com as coisas. Segundo Klein, como o [8], que marcou, segundo Hanna Segal,
pequeno Dick não brincava e não tinha o apogeu da primeira fase de sua obra.
capacidade para se expressar verbalmen- Klein acreditou ter tornado plenamente
te, o material para análise deveria ser “... viável uma efetiva análise infantil com
extraído do simbolismo revelado por de- o uso da interpretação da relação trans-
talhes do seu comportamento em geral” ferencial, desde o início do tratamento.
Klein criou, inicialmente, um jogo Essa concepção era oposta às idéias de
a ser compartilhado com Dick. Pegou Anna Freud.
dois trens e disse que o maior era o Klein enfatizava o contato com o
“trem-papai”, o outro, o “trem-Dick”. A inconsciente, a ser realizado com as
pequena criança pegou o trem que levava crianças pela via da interpretação da
seu nome, levou-o até a janela e disse: transferência e do conteúdo simbólico do
estação. jogo, desde o início do tratamento psica-
Klein assim interpretou Dick: “a es- nalítico. Segundo ela, um dos primeiros
tação é a mamãe; Dick está entrando na efeitos da interpretação no tratamento se-
mamãe”. Após essa interpretação, Dick ria o alívio da angústia e o aparecimento
largou o trem e se escondeu atrás da das fantasias, que conduzem a novas an-
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 193

gústias a serem interpretadas. Trata-se, que pus a girar. (...) John corouviolentamente,
assim, de um circuito que, considerado inclinou-se todo para frente a olhá-lo, ao mes-
do ponto de vista quantitativo, é reduzido mo tempo em que rodava o pênis por cima da
e permite o conhecimento progressivo da calça e com a outra mão fazia movimentos
realidade pela criança [7-9]. circulares à volta da boca – quase um girar.”
Em resumo, com Dick, Klein realizou
uma transformação da técnica psica- Essa sequência me fez imediatamente
nalítica, tendo em vista a ausência da suspeitar de que era tênue a diferença
linguagem lúdica da criança. Ela propôs, que estabelecia entre os movimentos do
para o início do tratamento, um jogo pião e os de seu próprio corpo, o que,
simbólico (o “carro-pai” e o “carro-Dick com a excitação sensual, apaixonada
“) visando criar uma relação analítica mesmo, que dele se desprendia, me fez
com o pequeno garoto e tornar possível concluir que essa seria importante no
a análise, tal como fazia com as outras trabalho futuro, para que eu tentasse
crianças tratadas por ela. Ou seja, se o manter o clima analítico e interpretasse,
pequeno paciente não trouxe, a princípio, se quisesse vê-lo conseguir gradualmente
o material clínico usual à interpretação (o distinguir-me de suas ilusões primitivas
jogo e a transferência), Klein se incumbiu e ajudá-lo, dessa forma, a chegar a um
de apresentar o jogo simbólico à criança: acordo com os sentimentos provocados
uma inversão de papéis, em que a analis- pela desilusão [10].
ta propôs o jogo simbólico a ser seguido Tustin relatou que utilizava poucas
pelo pequeno paciente. Nesse sentido, o palavras para interpretar o pequeno John
princípio teórico-clínico deixado por Klein, e que repetia várias vezes a mesma
em sua clínica com as crianças autistas, interpretação, às vezes acompanhadas
foi o de criar um jogo simbólico (com base por gestos. Na nona sessão com John,
nos conhecimentos teóricos do analista) Tustin, ao observar que o garoto utilizava
para propiciar as interpretações usuais repetidamente o pião, interpretou: “... ele
e criar a relação transferencial com o pe- estava usando sua mão para fazer girar
queno paciente, no início do tratamento. o pião Tustin, porque queria sentir que
Na década de 1960, Frances Tustin, psi- John seria Tustin e Tustin seria John. En-
canalista inglesa de formação kleiniana, tão poderia sentir que ficaríamos sempre
iniciou sua clínica com crianças autistas juntos” (p.18). Em uma outra situação,
com o garoto John, quando ele tinha três John retirou uma boneca que representava
anos e sete meses. Em seu primeiro livro, a mãe e começou a girar a conta que servia
Autism and Childhood Psychosis, publica- de fecho à carteira na qual ela apoiava
do em 1972, a autora assim descreveu a mão, fazendo um movimento em tudo
o caso de John na primeira sessão de semelhante ao de rodar o pênis. Depois
tratamento [10]: ele a jogou no chão, dizendo: “embora”.
Tustin, então, fez nova interpretação:
“John intrigou-me com sua quase total ausên-
cia e qualquer forma de expressão: passou “John girava a conta da mamã como se fosse
por mim como se eu não existisse e só no o xixi dele, para sentir que podia ir direitinho
consultório deu mostras de algo um pouco di- para dentro da carteira da mamã, mas isso o
ferente, quando me puxou a mão para o pião, fazia sentirque a mamã era ‘embora’” (p.19).
194 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

A partir do caso de John, Tustin maior desafio para o psicanalista. Tustin


criticou a teoria de Melanie Klein: ... os diferenciou a clínica psicanalítica com
enunciados extraídos de minha formação crianças autistas daquela com crianças
kleiniana ortodoxa, que tão bons serviços psicóticas, limítrofes ou neuróticas, da
me haviam prestado no trabalho com seguinte forma: À diferença das crianças
outros pacientes, não constituíam um do tipo esquizofrênico, as autistas não
marco adequado para os fenômenos que se encontram emaranhadas em estados
me eram apresentados no trabalho com de identificação projetiva. Não estão
crianças autistas [11]. “identificadas” com a mãe; se sentem
Tustin se referia à noção de “buraco grudadas a ela e igualadas com ela, o
negro” trazida por John. Essa noção era, que exclui toda sensação de encontrar-se
para a autora, uma sensação dolorosa de separadas. Chamo isto de “identificação
separação entre John e sua mãe. adesiva” como outros autores têm deno-
“É importante perceber isto para minado de “fusão imitativa”. As crianças
entender o autismo, porque aí dominam reelaboram estes sentimentos na rela-
as sensações de separação. Quando eles ção com o terapeuta” [11]. Em suma,
têm a sensação de que estão separados o princípio teórico-clínico que norteou o
da mãe é extremamente doloroso. E é tão trabalho de Tustin, quanto ao tratamento
doloroso que eles podem não ter repre- psicanalítico das crianças autistas, foi
sentação, como você diz, no eu mental”. a noção da “interpretação das figuras e
Tustin não encontrou dentro do referen- objetos autistas”, em oposição à técni-
cial kleiniano uma forma para explicar o ca kleiniana da “interpretação do jogo”.
“buraco negro”. Segundo ela, “a idéia de Apesar das novas idéias, ainda continuou
objeto de Melanie Klein preenche demais prevalecendo, para Tustin, o princípio
o ‘buraco’; o autismo é uma objeção ao psicanalítico de Klein, quanto à necessi-
objeto kleiniano”. dade de se criar a relação transferencial
Em 1990, ao publicar El cascarón a partir da “interpretação”, apenas com
protector em niños y adultos, Frances outra forma: “a interpretação das figuras
Tustin caracterizou o início do tratamento e dos objetos autistas”. Ou seja, a neces-
psicanalítico da criança autista como o do sidade de se conferir sentido aos compor-
uso das interpretações das “figuras de tamentos bizarros das crianças autistas,
sensações”. Essas interpretações têm o desde o início do tratamento, continuou
objetivo de levar a criança a estabelecer presente na obra de Tustin, à semelhança
“... nexos mentais com um terapeuta de Klein. A criança autista, desde o seu
vivenciado pela criança, como uma mãe encontro inaugural com o psicanalista,
nutridora. A isto chamamos transferência está irremediavelmente submetida a uma
infantil” [11]. rede de significados, simbólicos (Klein)
Segundo Tustin, a relação transfe- ou de sensações (Tustin). Mais ainda,
rencial é criada por meio das interpre- as interpretações oriundas do jogo das
tações “dos objetos e figuras autistas”, fantasias ou das sensações são impres-
com dominância sensorial. Na opinião cindíveis para que a clínica psicanalítica
dela, retirar a criança autista do isola- possa operar.
mento sensorial patológico, em que ela Na década de 1990, Marie-Christine
se encontra, constitui o primeiro e o Laznik-Penot, psicanalista lacaniana, ad-
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 195

mitiu que... o trabalho com uma criança Halil e sua mãe, três vezes por semana,
autista se faz ao avesso da cura analítica a autora também tinha a companhia de
clássica: o objetivo do analista não é o uma residente, a Dra Marie-Annick Se-
de interpretar os fantasmas de um sujei- neschal, encarregada por anotar tudo nas
to no inconsciente já constituído, mas o sessões. As anotações dessa senhora,
de permitir o advento do sujeito. Faz-se segundo Laznik-Penot, foram importantes
aqui intérprete, no sentido de tradutor de não apenas para permitir a transcrição
língua estrangeira e, ao mesmo tempo, das sessões, como também para ajudar
tradutor em relação à criança e aos pais a analista a reter os enunciados da mãe
[12]. de Halil, realizados em uma outra língua:
Ao fazer essa proposição, Laznik- “... tinha necessidade de um indício dos
-Penot trouxe uma outra transformação da significantes da mãe e da criança que,
técnica: no lugar da “interpretação do jogo logo, começou a proferir palavras – uma,
de Klein” e da “interpretação das figuras duas, por vezes três, em uma sessão”.
e objetos autistas de Tustin”, apresentou Nos quatro primeiros meses do tra-
a “técnica de tradução”, dirigida à criança tamento de Halil, Laznik-Penot observou
e aos pais, desde o início do tratamento que ele sempre pegava, do armário, um
psicanalítico com as crianças autistas. brinquedo de encaixe com peças de
Já possuindo experiência com criança plástico. Ele também fazia muito barulho
autista estrangeira, Laznik-Penot recebeu com a porta metálica do armário. Quando
para tratamento psicanalítico o pequeno assim procedia, sua mãe ficava com raiva
Halil, um garoto turco com quase dois e dizia: “Anne atta”, o que significa, “ma-
anos de idade. Com ele, pôde vivenciar o mãe vai embora”. Essa cena se repetiu
“quanto este laço exclusivo com a língua várias vezes. Um certo dia, depois de
do analista vinha separá-lo das fontes fazer o barulho costumeiro, Halil escolheu
vivas dos significantes de seu ambiente um brinquedo de encaixe com peças de
familiar” plástico. Ele o sacudiu e as peças se
Halil já apresentava um quadro nítido soltaram. A mãe retirou o brinquedo das
de autismo infantil, apesar de sua pouca mãos dele e os atarraxou com força para
idade, conforme descrição da analista: que as peças não se soltassem mais –
as peças eram presas por um parafuso.
Ele não apenas não emitia nenhum chama- Halil começou a protestar, jogando vários
mento, nem respondia, como também seus objetos no chão. A mãe retirou a caixa de
olhos estavam sempre baixos, e seu olhar, brinquedos de perto dele, quando, então,
muito oblíquo, quase nunca encontrava Halil avançou para bater na analista e na
alguém. Podia ficar por muito tempo deitado mãe. Naquele momento, Laznik-Penot
no chão, em um canto, contemplando seus traduziu os motivos da raiva de Halil
dedos e suas mãos (p.14). para a mãe: “Trata-se de uma tentativa
de representar a separação, uma sepa-
O enquadre do tratamento de Halil ração que não destrói, já que é possível
foi distinto daquele no qual Dick e John reencontrar-se, como as duas peças do
foram inseridos. Laznik-Penot recebia brinquedo que podem se desparafusar e
não apenas a criança, mas também os se parafusar”. A mãe passou a aceitar
pais dela. Em sessões conjuntas com melhor o comportamento de Halil, ao ver
196 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

sentido naquelas ações. Halil ficou muito co de Klein, o de encontrar sentido em


triste depois da intervenção da analista qualquer produção da criança, persistiu
e se escondeu dentro do armário de no caso de Halil, contudo com uma outra
brinquedos, “em um estado de desar- modalidade de interpretação: “... o analis-
voramento autístico muito rápido”. Ali, ta antecipa o sujeito a vir, ao interpretar
deitado, dentro do armário, a analista o qualquer produção como um ato colocado
ouviu dizer: “Dede”, o que a mãe traduziu pela criança para tentar advir a uma or-
por vovô. dem simbólica que lhe preexiste”.
Baseando-se em suas experiências, Conforme se observa, as técnicas
Laznik-Penot concluiu que o trabalho de apresentadas por Melanie Klein, Frances
“tradução dos comportamentos do filho” Tustin e Marie-Christine Laznik-Penot,
para a mãe foi de importância fundamen- para serem usadas na fase inicial do
tal para restituir a ela “a loucura neces- tratamento psicanalítico com crianças
sária das mães” (conceito de Winnicott autistas, partem de um pressuposto
referente à capacidade das mães em básico: deve haver, desde o início, a
conferir significado aos comportamentos interpretação - ferramenta clássica da
iniciais do bebê). Conforme palavras de clínica psicanalítica.
Laznik-Penot: “No trabalho com o ana- Esse procedimento deve ocorrer se-
lista, a maioria das mães reencontra gundo a concepção tradicional, tanto em
rapidamente esta capacidade”. Esse relação às crianças quanto aos adoles-
trabalho de “tradução” permitiu também, centes e adultos, nas diversas patologias.
segundo a analista, que a criança come- Apesar das transformações propostas por
çasse a brincar nos primeiros meses do Tustin e Laznik-Penot às idéias de Klein,
tratamento. Para Laznik-Penot, a ação de a interpretação, seja das “figuras das
Halil, de separar as peças do brinquedo sensações e objetos autistas” seja das
de plástico e falar algumas palavras, “traduções”, continuou a ser utilizada no
caracterizou o jogo em seu sentido mais início do tratamento da criança autista,
radical, de “trabalho do pensamento”. O com o intuito de possibilitar o surgimento
brinquedo de plástico foi utilizado por Ha- do brincar, das fantasias, das associa-
lil como um instrumento adequado para ções livres e da transferência.
pensar a separação, concluiu a analista.
Em síntese, ao descrever o caso do ga- Tratamento medicamentoso e
roto Halil, Laznik-Penot apresentou uma estratégia de tratamento
outra modificação da técnica psicanalítica
para o tratamento de crianças autistas, As estratégias para o tratamento do
a saber: “a técnica da tradução”, dirigi- Autismo Infantil, o mais correto seria di-
da para a criança autista acompanhada zer para o “tratamento dos sintomas do
de sua mãe. Essa técnica, empregada Autismo Infantil”, já que, até o momento,
no início do trabalho psicanalítico, teve não há nenhum tratamento que se possa
o intuito não apenas de criar a relação considerar decididamente eficaz para a
transferencial entre a criança e a analista, doença, mas possuímos tentativas para
mas também permitir à mãe compreender controle sintomático da doença.
suas angústias em relação ao filho e a As pesquisas mais recentes sugerem
si mesma. O princípio básico psicanalíti- que a etiologia do Autismo Infantil seja
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 197

multifatorial. Evidências acumuladas têm tencial da fenfluramina, agonista indireto


sugerido desequilíbrios em vários sis- da serotonina, a qual promove a libera-
temas neuroquímicos, primariamente o ção desse neurotransmissor no espaço
dopaminérgico e o serotoninérgico, como pré-sináptico, ao mesmo tempo em que
sendo relevantes para a fisiopatologia do bloqueia sua recaptação.
Autismo Infantil. Estudos neurobiológicos Embora a fenfluramina aumente
clínicos e de tratamento apontam para abruptamente a neurotransmissão de se-
um papel importante do neurotransmissor rotonina, sua administração em longo pra-
dopamina no desenvolvimento do Autis- zo resulta numa redução da transmissão
mo Infantil. serotonina (5-HT) no SNC e, talvez, seja
Os Fármacos de efeito dopaminérgi- essa redução da transmissão serotonina
cos têm demonstrado algum efeito sobre a responsável pela melhora de alguns
a sintomatologia do Autismo Infantil. Os sintomas do Autismo Infantil.
medicamentos antagonistas dos recepto-
res D2 (dopamina), como, por exemplo, Buspirona
o haloperidol e a pimozida, também têm
mostrado alguma eficácia no controle Outros agentes que influenciam a
de alguns sintomas, principalmente na função da serotonina têm sido estudados
redução de estereotipias, do retraimento em relação à sua utilidade no tratamento
e do comportamento agressivo, assim do Autismo Infantil. A imipramina, anti-
como no aumento da atenção. depressivo que bloqueia a recaptação
Alguns investigadores relatem um de noradrenalina e de serotonina, e a
benefício clínico dos agonistas indiretos metissergida, antagonista não-seletivo
da dopamina, como o metilfenidato ou a da serotonina, não produziram resultados
anfetamina, ambos estimulantes, particu- promissores em experiências clínicas
larmente com respeito à hiperatividade, envolvendo crianças autistas e não foram
mas essa opinião não tem sido consensu- examinadas quanto a seus potenciais
al. A maioria dos investigadores descreve para tratar adultos com Autismo Infantil.
uma exacerbação dos sintomas autistas, A buspirona, agonista parcial de 5HT 1
tais como o aumento das estereotipias A, demonstrou, em estudos pré-clínicos,
e da hiperatividade após a administração aumentar a função serotonina.
desses psicoestimulantes. Novos estu- Várias experiências de rótulo aberto,
dos devem surgir para melhor definir o uma envolvendo crianças e três envol-
papel da dopamina na fisiopatologia do vendo adultos com Autismo Infantil e
Autismo Infantil. transtornos relacionados, sugeriram um
possível papel para a buspirona no trata-
Perfil farmacológico mento de hiperatividade, comportamento
estereotipado e agressividade. Justifi-
Com base em evidências implicando cam-se outros estudos, especialmente
a disfunção da serotonina no Autismo experiências duplo-cegas controladas
Infantil, as drogas com efeitos serotoni- por placebo, para investigar o potencial
nérgicos têm sido investigadas quanto clínico de buspirona no tratamento de
a sua utilidade clínica nesse transtorno. crianças, adolescentes e adultos com
Múltiplos estudos têm examinado o po- Autismo Infantil e investigar o papel dos
198 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

receptores 5-HT1A na fisiopatologia do com Autismo Infantil, têm apoiado um


Autismo Infantil. papel para a clomipramina em abrandar
o comportamento repetitivo e a agres-
Trazodona sividade. Sugeriu-se que o benefício da
clomipramina fosse devido aos seus
Existem algumas evidências sobre efeitos serotoninérgicos. Entretanto,
a eficácia da trazodona no controle da como sempre ocorre nas pesquisas so-
sintomatologia do Autismo Infantil. Trata- bre o Autismo Infantil, existem muitas
-se de uma droga com dupla proprieda- e grandes diferenças nos resultados de
de, ela pode ser antagonista em doses pesquisas usando clomipramina e outros
baixas e agonista em doses altas da antidepressivos tricíclicos no tratamento
serotonina. Alguns autores observaram desse transtorno.
redução em até 75% do comportamento
agressivo e autolesivo do Autismo Infantil Inibidores da Recaptação da Serotonina
com uma dosagem relativamente baixa
de trazodona (Gedye), em torno de 250 Dadas às evidências de disfunção da
mg/dia, agindo então como antagonista serotonina em indivíduos com Autismo
dos receptores 5-HT2. Observações se- Infantil e alguns resultados promissores
melhantes ocorreram em adultos com com a clomipramina, a busca por drogas
retardo mental tratados com doses baixas seguras e eficazes no tratamento de Au-
de trazodona. tismo Infantil têm levado a experiências
clínicas com os inibidores seletivos da
Clomipramina recaptação da serotonina (ISRSs). Pelo
menos os ISRSs têm uma farmacocinéti-
A clomipramina, um tricíclico que ca mais benigna, com respeito a efeitos
antagoniza os transportadores de dopa- adversos, não possuindo potencial para
mina, noradrenalina e, particularmente, cardiotoxicidade e nem por baixar o limiar
serotonina, tem sido estudada quanto a convulsivo, efeitos comuns aos tricíclicos.
seu potencial no tratamento de crianças,
adolescentes e adultos com Autismo Sertralina
Infantil.
McDougle relata melhora nas intera- Tal como em relação à clomiprami-
ções sociais, na agressividade, nos pen- na, pesquisadores (Buck) também têm
samentos e no comportamento repetitivo constatado redução do comportamento
em adultos com Autismo Infantil, após agressivo e autolesivo em pacientes
tratamento com clomipramina. Gordon, portadores de Autismo Infantil. A dose
por sua vez, considerou a clomipramina preconizada para esses casos é de 25 a
superior à desipramina e ao placebo, no 150mg/dia de Sertralina.
controle de sintomas de Autismo Infantil McDougle também constata a eficá-
e agressividade, bem como na melhora cia da sertralina no tratamento de sinto-
dos sintomas de hiperatividade em um mas em adultos com Autismo Infantil. Na
grupo de crianças e adolescentes. dosagem de 50 a 200 mg/dia, 64% dos
Estudos adicionais, inclusive uma pacientes responderam de alguma forma
experiência aberta envolvendo 35 adultos ao tratamento.
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 199

Fluoxetina e Paroxetina no autista. Esses estudos preliminares jus-


tificam outras pesquisas com fluvoxamina
Vários investigadores têm descrito e outros ISRSs em adultos, adolescentes
melhora de crianças, adolescentes e e crianças com Autismo Infantil.
adultos com Autismo Infantil, após trata-
mento com fluoxetina. Em uma paciente Neurolépticos Atípicos
do sexo feminino de 26 anos com Au-
tismo Infantil, Mehlinger notou redução Os neurolépticos típicos, como o ha-
dos comportamentos ritualísticos, bem loperidol e a pimozida, têm sido usados
como a uma elevação do humor depois há várias décadas no tratamento de Autis-
do tratamento com fluoxetina. Hamdan- mo Infantil. Estudos duplo-cegos com pla-
-Allen descreveu melhora dos sintomas cebo têm demonstrado sua maior eficácia
de tricotilomania refratários a imipramina, no tratamento de sintomas do autismo,
após administração de fluoxetina. Todd principalmente crianças e adolescentes.
também verificou diminuição dos com- Entretanto, devido a necessidade de uso
portamentos ritualísticos e repetitivos em contínuo desses neurolépticos típicos e
indivíduos com Autismo Infantil tratados o desenvolvimento de efeitos extrapira-
com fluoxetina. midais adversos indesejáveis, como por
Por outro lado, Ghaziuddin observou exemplo a discinesia tardia, sua indica-
apenas melhora do humor em seus pa- ção tem sido limitada.
cientes tratados com fluoxetina, embora Neuroléptico Atípico foi o nome atri-
muitas características fundamentais do buído a uma categoria de medicamentos
Autismo Infantil permanecessem inalte- com possibilidade de ter eficiente ação
radas. antipsicótica sem produzir, ou produzindo
o mínimo de sintomas extrapiramidais.
Fluvoxamina Outra característica que se pode atribuir
ao neuroléptico atípico, é sua maior efi-
McDougle descreve diminuição dos cácia nos chamados sintomas negativos
pensamentos e comportamentos repe- das psicoses.
titivos e da agressividade, bem como Com efeitos colaterais potencialmen-
melhora do relacionamento social em te favoráveis e perfil farmacológico com
pacientes adultos com Autismo Infantil e afinidades significativas para receptores
TOC, após tratamento com fluvoxamina. dopaminérgicos e serotoninérgicos, o uso
A fluvoxamina mostrou superioridade desses neurolépticos atípicos, como por
significativa ao placebo após 4, 8 e 12 exemplo a clozapina, a risperidona e a
semanas de tratamento. olanzapina, tem sido experimentados em
O tratamento com a fluvoxamina foi pacientes com Autismo Infantil.
também superior ao placebo no seguinte:
pensamentos e comportamentos repeti- Clozapina
tivos, comportamentos mal adaptados,
agressividade e comportamento autista. Existem relativamente poucos estu-
Houve ainda aumento de algumas áreas dos com a clozapina para tratamento de
do relacionamento social, particularmente o Autismo Infantil. Três crianças autistas
uso da linguagem, em adultos com transtor- exibindo hiperatividade e agressividade
200 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

acentuadas receberam clozapina depois na no SNC, somente apóiam um papel


de se mostrarem resistentes aos neuro- central para esse neurotransmissor na
lépticos típicos. Observaram-se melho- expressão característica do Autismo In-
ras com três meses de tratamento em fantil. Isso também sugere uma eventual
dosagens de até 200 mg/dia, e 2 de 3 grande sensibilidade nos indivíduos com
pacientes continuaram a mostrar melhora Autismo Infantil em relação a alterações
clínica durante oito meses seguintes. da disponibilidade da serotonina.
A escassez de trabalhos descrevendo Como costuma acontecer em outros
o uso de clozapina para tratamento de transtornos psiquiátricos, estratégias de
sintomas do Autismo Infantil poderia, tratamento têm sido desenvolvidas para
em parte, refletir preocupação com o uso Autismo Infantil, a despeito da ausência
de uma droga com aumento dos riscos de uma fisiopatologia bem compreendida.
de agranulocitose ou crises convulsivas, Sobre outros inibidores da recap-
especialmente em crianças ou adoles- tação da serotonina (ISRSs), tendo em
centes. Estudos adicionais se justificam vista as substanciais melhoras observa-
para determinar a utilidade da clozapina das em adultos autistas tratados com
no tratamento de crianças, adolescentes fluvoxamina, há necessidade de estudos
e adultos com Autismo Infantil. adicionais, faixas etárias e subtipos de
Autismo Infantil.
Risperidona e olanzapina Os antipsicóticos denominados neu-
rolépticos atípicos, em comparação com
Recentemente surgem cada vez mais neurolépticos típicos, parecem ter perfis
trabalhos atestando o potencial da rispe- mais benignos, relacionados com efeitos
ridona no tratamento de Autismo Infantil. colaterais adversos. São interessantes
Como a clozapina, a risperidona também as descrições de alterações da função
tem alta afinidade pelos receptores 5-HT, da dopamina e da serotonina em indiví-
sendo ela particularmente alta para os duos com Autismo Infantil, bem como a
receptores 5-HT2A e 5-HT2C. Ademais, afinidade significativa por receptores de
a risperidona parece ter incidência bem dopamina D2-símiles e por receptores
mais baixa de efeitos colaterais que os 5-HT2 dos neurolépticos atípicos. Isso
neurolépticos típicos. autoriza tentativas de utilização dessas
Apesar da quantidade significativa de substâncias no tratamento desse trans-
pesquisas básicas e clínicas acerca das torno.
etiologias do Autismo, desde que esse Existem alguns relatos de casos
transtorno foi descrito por Kanner, ainda iniciais referentes à utilidade dos neu-
são muito importantes os achados dos rolépticos atípicos, particularmente da
níveis sanguíneos elevados de serotonina risperidona e a olanzapina, no tratamento
em 30% a 40% dos portadores desse dis- de indivíduos com Autismo Infantil.
túrbio. Isso sugere a regulação do sistema Desde que o autismo foi descrito
serotoninérgico como importante contri- pela primeira vez, em 1943, pelo médico
buinte à fisiopatologia do Autismo Infantil. austríaco Leo Kanner, um sem-número
Os recentes achados relacionados à de estudos já foi feito sobre a desordem,
exacerbação dos sintomas com diminui- mas ela ainda é considerada uma das
ções agudas e significativas da serotoni- mais enigmáticas da ciência. Muitas
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 201

hipóteses e teorias foram levantadas trabalho dos cientistas. “O envolvimento


para explicá-la, e um número igual delas de múltiplos genes pode responder por
já foi derrubado. Chegou-se a dizer, por mais de 90% dos casos de propensão
exemplo, que vacinas poderiam causar para o autismo”, explica de Azevedo.
intoxicação que levaria ao autismo; que Esse mapeamento, embora impreciso,
determinados alimentos causariam o é importante, pois possibilita a elabo-
distúrbio; e até mesmo que a mãe era ração de possíveis tratamentos ou me-
culpada pelo surgimento dos sintomas dicamentos que suprimam as faltas ou
no filho. estabilizem os excessos causados pelas
“Não há comprovação de nenhum mutações genéticas.
fator ambiental no surgimento do autis- Entre os genes-candidatos, estão
mo”, afirma o neurofisiologista Vladimir dois responsáveis pelo metabolismo da
Lazarev, do Instituto Fernandes Figueira serotonina, um neurotransmissor que
(IFF). Juntamente com o médico Adailton tem um papel regulador de determinadas
Pontes, também do IFF, Lazarev tem fases do sono. Outra possibilidade é o
conduzido estudos sobre o perfil neu- gene RELN, codificador de uma proteína
rofisiológico de crianças portadoras de extracelular que coordena a migração de
autismo (ver ‘Em busca do diagnóstico neurônios durante o desenvolvimento
preciso’ em CH 224). do cérebro. Essa proteína, chamada de
Fora do Brasil, a ideia geral é tam- relina, tem papel importante no desenvol-
bém que “além de processos genéticos, vimento do córtex cerebral, do hipocampo
não se conhece outras possíveis causas e do cerebelo – estruturas nas quais já
cientificamente viáveis para o autismo”, foram identificadas anormalidades em
nas palavras do psicólogo Ami Klin, co- pessoas autistas.
ordenador do Programa de Autismo da No Brasil, a pesquisa genética tam-
Universidade de Yale (Estados Unidos). bém tem bons prognósticos. O laboratório
O desconhecimento de influências do coordenado por Vadasz no Hospital das
ambiente, no entanto, não significa que Clínicas de São Paulo tem, além de uma
elas não existam. área de diagnóstico e tratamento para
Os processos genéticos aos quais distúrbios do espectro autista, um projeto
Klin se refere são, na verdade, mutações de pesquisa voltado para a identifica-
genéticas – ou seja, microdeleções, in- ção de genes-candidatos à desordem e
versões ou duplicações de determinados células-tronco.
genes – que se descobriu ter relação
com o autismo. “Os fatores genéticos O impacto da família de indivíduos
respondem por mais de 90% das causas portadores de autismo
para o autismo”, explica o neuropediatra
Leonardo de Azevedo. Os outros possíveis A família apresenta muitas expec-
fatores não são conhecidos, e podem tativas quanto ao futuro desta criança,
ser, por exemplo, resultado de problemas às limitações desta condição, além da
durante a gravidez, como rubéola, toxo- necessidade de adaptar-se à intensa de-
plasmose e acidentes. dicação e prestação de cuidados das ne-
Não há apenas um gene relacionado cessidadesespecíficas do filho [7,13-18].
ao distúrbio, mas vários, o que dificulta o As características clínicas da patologia
202 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

afetam as condições físicas e mentais física e psicológica em mães de crianças


do indivíduo, aumentando a demanda por com autismo, culpa em 66% destas e in-
cuidados e,consequentemente, o nível de certezas quanto a habilidades maternais
dependência de pais e/ou cuidadores. em 33%. Neste estudo, os pais também
Essa situação pode constituir um estres- se mostraram afetados,porém de modo
sor em potencial para familiares. indireto, isto é, reagiram ao sofrimento de
Vários estudos revelaram a existên- suas esposas. A partir de então, iniciam-
cia de estresse agudo em famílias que -se questionamentos a respeito das
possuem um membro com diagnóstico possíveis diferenças quanto ao estresse
de autismo [19-22]. O estudo de Bristol e entre pais e mães de crianças com au-
Schopler [23] complementa estes dados, tismo. Milgram e Atzil [29] estudaram os
demonstrando que os familiares de crian- diferentes papéis desempenhados pela
ças com autismo apresentam padrões de relação parental de crianças com autismo
estresse mais elevados do que famílias em Tel-Aviv. Os resultados apontam que
que possuem um filho com desenvolvi- as mães tendem a apresentar maior risco
mento típico ou com síndrome de Down, de crise e estresse parental que os pais,
sugerindo que o estresse parece ser in- devido à demanda dos cuidados com a
fluenciado por características específicas criança. Conforme estes autores, existe
do autismo e não apenas por um atraso uma expectativa social de que as mães
do desenvolvimento. De fato, conforme tomem para si esses cuidados, assumin-
apontado por estes autores, percebe- do-os mais do que os pais. Contudo, é
-se uma inversão na ênfase histórica de mencionado o sentimento de desamparo
pesquisas dos efeitos psicológicos do destas pela falta de suporte dos maridos,
comportamento dos pais sobre a criança manifestando o desejo de que eles as-
[24,25] para pesquisas dos efeitos psi- sumam uma responsabilidade conjunta
cológicos docomportamento das crianças e espontânea acerca dos cuidados do
sobre os pais. Konstantareas e Homatidis filho. Estes achados são corroborados
[26], realizaram uma breve revisão his- pelo estudo de Konstantareas e Homa-
tórica sobre a questão do estresse em tidis [26], em que foi examinado o nível
familiares de crianças com autismo. Se- de suporte conjugal disponível a mães e
gundo os autores, Holroyd, Brown, Wilker pais de crianças com autismo. Através
e Simmons [apud 26] foram os primeiros de entrevistas semi-estruturadas, foram
a investigar o tema, identificando níveis agrupados hierarquicamente os principais
consideráveis de estresse nas 29 famí- tipos de suporte desejados pelas mães,
lias pesquisadas. Subsequentemente, em relação aos seus cônjuges, sendo
um outro estudo [27] encontrou maiores estes:
níveis de estresse em pais de crianças 1) oportunizar maior alívio materno
com autismo, quando comparados a quanto aos cuidados da criança com
grupos de controle.No final da década de autismo;
1970, DeMyer [28] publicou seu trabalho 2) assumir maior responsabilidade disci-
acerca do estresse dos pais de crianças plinar para com o filho;
com autismo, os quais foram compara- 3) obter ajuda paterna de forma espontâ-
dos a um grupo controle. Os resultados nea, sem a necessidade de contínuos
demonstraram maior presença de tensão pedidos de ajuda.
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 203

Milgram e Atzil [29], também des- entre o grupo da Califórnia (Santa Bárba-
crevem o papel dos pais, que em con- ra e São Diego) e o grupo da Alemanha
traposição às expectativas das mães, foi de 0,931. Para o grupo da Califórnia
consideram justa sua menor participação versus o grupo Apalache (Kentucky, West
nos cuidados gerais da criança, devido ao Virginia e Ohio) a correlação foi de 0,957.
peso de suas responsabilidades financei- Por último, entre o grupo da Alemanha e o
ras e ocupacionais já desempenhadas grupo Apalache a correlação foi de 0,886.
junto à família. Porém, outros estudos Os resultados sugerem a existência de
revelam que estas responsabilidades um perfil característico de estresse para
tendem a acarretar tensão emocional e pais de crianças com autismo, mostrando
financeira significativas, consequente- uma constância relativa entre famílias
mente dificultando a contribuição destes de diferentes localidades geográficas.
para com os cuidados da criança [28-31]. Dentre os itens avaliados, o que mostrou
No início da década de 80, Bristol maior consistência quanto ao estresse
e Schopler [23] relataram os achados em pais e mães foram as preocupações
de uma pesquisa não publicada de Bris- relativas ao bem-estar de seus filhos,
tol, em que reafirmam que o grau de quando os mesmos não puderem mais
dependência, incapacidades cognitivas prover seus cuidados. Estas preocupa-
e as dificuldades nas características de ções subdividem-se em:
comportamento da criança com autismo
resultavam em maior estresse parental. 1) preocupação com o futuro de seu filho;
Conforme Konstantareas e Homatidis 2) dificuldades cognitivas e habilidades
[26], tais dados conduzem mais a tenta- de funcionamento independente da
tivas explicativas do que a informações criança;
conclusivas sobre a questão do estresse 3) aceitação em sua comunidade.
em familiares de sujeitos com autismo.
No início dos anos 1990, levantou-se As relações do casal parental pas-
a hipótese de que pudesse existir um sam por duras provas, alto índice de
padrão particular de áreas que influen- divórcios. Autismo traz às famílias lições
ciasse o estresse em pais de crianças importantes sobre como aprender a
com autismo. Koegel et al. [32] buscaram levar as duras demandas da vida com
explorar melhor este tema. Para avaliar a tolerância e humor. Isso não faz todos
consistência destes padrões de estresse, famílias especiais. O autismo, mais que
50 famílias oriundas de várias regiões ge- um problema que afeta a uma pessoa, é
ográficas dos Estados Unidos e Alemanha um transtorno de incapacidade que afeta
preencheram o QRS - Questionnaire on à toda a família.
Resources and Stress [33], levando em Quando os pais tratam de descrever
conta também o nível de funcionamento o viver com um filho com autismo, usam
(QI) e a idade dos indivíduos (entre 3 e 31 termos bem diferentes como: doloroso, in-
anos). A correlação para mães de crian- cômodo, difícil, normal, complicado, muito
ças com autismo, em cada uma das três satisfatório, faz amadurecer, traumático, e
localidades geográficas, mostrou-se bas- outros muitos. O certo é que cada família,
tante alta e estatisticamente significativa e dentro desta, cada membro da família é
(p < 0,001). O coeficiente de correlação afetado pelo membro autista de maneira
204 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

diferente. O impacto que produz o autis- Embora grande parte da literatura


mo, além de variar nas famílias, e nos mostre evidências de maiores níveis de
indivíduos que as formam, muda segundo estresse em familiares de crianças com
a etapa em que se encontra cada um. O transtornos no desenvolvimento [32],
efeito do autismo é parecido ao que produz outras pesquisas abordam este assunto
qualquer outra incapacidade permanente sob outra ótica.
em um membro da família, pelo que vá- Alguns estudos [34] indicam que
rios aspectos que são tratados aqui são as dificuldades das crianças com algum
comuns a várias deficiências. transtorno do desenvolvimento podem ser
Consistente com os achados de consideradas como um estressor apenas
outros pesquisadores [23,27], estes em potencial, podendo estes a relação
resultados sugerem que o convívio e parental sofrer ou não os efeitos de um
os cuidados continuados prestados a estresse real. Para estes autores, o im-
crianças com autismo se mostra como pacto das dificuldades próprias da síndro-
um poderoso estressor, que age sobre me sobre os pais vai depender de uma
a vida destas famílias demodo muito complexa interação entre a severidade
característico. das características próprias da criança e
A identificação de fontes específicas as de personalidade dos pais, bem como
de estresse em familiares de pessoas a disponibilidade de recursos comunitá-
com Transtornos Globais do Desenvol- rios e sociais. De fato, Gomes e Bosa
vimento também foi foco de interesse (2002), ao investigarem o impacto do
de Perry et al.. Os autores encontraram autismo em irmãos de portadores dessa
níveis de estresse mais elevados em condição, não encontraram evidência de
familiares de crianças portadoras da sín- estresse nesta população. Na verdade,
drome de Rett quando comparados a gru- o nível de estresse estava mais associa-
pos controle. Os resultados mostraram do à qualidade dasrelações familiares
que os pais de meninas com síndrome (Ex: conflito e punição), independentes
de Rett experienciam maior estresse em de ter ou não um irmão com autismo.
relação aos seus sentimentos de apego De acordo com Bristol e Schopler [23],
para com suas filhas, isolamento social na área da sociologia têm-se procurado
e problemas de saúde, do que o grupo desenvolver modelos de avaliação que
controle. A justificativa dos autores é de identifiquem fatores predisponentes a
que os níveis de estresse mais elevados, crises familiares face ao estresse. Hill
nesta população em particular, se devem [35] já havia chamado a atenção para a
a vários fatores: necessidade de um modelo compreensi-
A aparência saudável da criança vo de estresse familiar, que levasse em
quando bebê cria expectativas nos pais, conta a avaliação dos recursos familiares
que são posteriormente destruídas; disponíveis. De forma similar, Konstanta-
reas et al. [34] sugerem uma avaliação
b) Os filhos podem apresentar incapacida- sistemática do estresse percebido, por
des graves, necessitando de cuidados exemplo, enfocando a forma como estes
intensos durante toda a vida; pais encontram-sefrente à necessidade
c) as poucas expectativas quanto a me- de lidar com a alta demanda de cuidados
lhorias de tratamento. solicitados por seus filhos, às reações
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 205

negativas da comunidade, aos limitados sintomáticas pelos pais em comparação


recursos de apoio que podem contar ou à percepção dos clínicos. O estudo tam-
sentimentos diante de possíveis renún- bém identificou alto grau de concordância
cias quanto à carreira profissional. Um interparental quanto à avaliação da seve-
estudo anterior, destas mesmas autoras ridade dos sintomas:
[26], buscou investigar o estresse familiar
percebido, a partir de três aspectos: as 1) pobreza na comunicação;
características da criança, características 2) discrepâncias nas habilidades cogni-
de personalidade dos pais e recursos de tivas;
coping. Os objetivos foram: 3) comprometimento no relacionamento
interpessoal.
1) identificar a forma como pais e mães
avaliam a presença e o grau de expres- No caso do estresse parental devido
são de sintomas-chave de autismo em aos sintomas da criança, a pontuação foi
seu filho; equivalente entre pais e mães, porém en-
2) avaliar o quão sintomático os pais quanto o melhor preditor para o estresse
percebem seu filho,clareando a rela- paterno foi os comportamentos autoa-
ção entre severidade do sintoma e busivos (bater-se, arranhar-se, beliscar-
estresse; -se ou morder-se), para as mães foi a
3) avaliar o estresse em função de cada hiperirritabilidade (grau de inquietude e
sintoma para determinar possíveis di- comportamentos disfuncionais) e a idade
ferenças quanto ao impacto da relação mais avançada da criança (6 a 12 anos).
parental; Estudos têm apresentado dados
4) avaliar como a severidade do sintoma a respeito da natureza dos eventos
e o estresse concomitante se relacio- causadores de estresse e das carac-
nam com algumas características da terísticas próprias da criança com au-
criança; tismo, que exercem um impacto sobre
5) examinar os efeitos de outras caracte- os familiares,considerando como parte
rísticas familiares (nível socioeconômi- integrante deste processo, as formas
co, tamanho da família, suporte social) utilizadas pelos familiares para lidar com
sobre os níveis de estresse. o estresse (coping) [22,34]. As emo-
ções e a excitação fisiológica criada por
Para tanto, 44 famílias, que tinham situações estressantes são altamente
filhos com autismo, participaram do estu- desconfortáveis, motivando o indivíduo a
do, sendo que a faixa de idade dos pais fazer algo para seu alívio [36,37].
variava de 23 a 52 anos. Foram utilizadas Lazarus e Folkman identificaram
uma escala e uma entrevista semies- duas formas principais de coping. A pri-
truturada para avaliar o grau de suporte meira inclui estratégias de definição do
social e dificuldades experiência das ao problema, geração de soluções alterna-
lidar com agentes sociais e comunitários. tivas, comparação em termos de custos
Quanto aos resultados, a percepção dos e benefícios, seleção e implementação
sintomas mostrou-se influenciada pela da alternativa escolhida (focalizada no
idade da criança, sendo as crianças mais problema). Já a segunda, focalizada na
novas (até 6 anos) vistas como menos emoção, objetiva desenvolver ações para
206 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

controlar o estado emocional, bem como um indivíduo portador de autismo lidam


impedir que as emoções “negativas” diariamente com diversos estressores.
afetem o engajamento em ações para Esta condição afeta todos os membros
a solução de seus problemas. Tunali e da família, causando estresse direta (Ex:
Power [38] abordaram a relação entre pobreza na interação social) ou indireta-
estresse e coping em pais de crianças mente (Ex: impacto financeiro).
com transtornos do desenvolvimento. A análise da literatura revisada revela
Conforme sua análise, quando um in- contradições entre as pesquisas quanto
divíduo se encontra em uma situação às características comportamentais da
inevitável em que uma necessidade criança com autismo que mais contri-
humana básica está ameaçada, esta buem para o estresse em familiares. O
exposição ao estresse pode “redefinir estudo de Konstantareas e Homatidis
o preenchimento destas necessidades, [26], por exemplo, comparou dados de
desenvolvendo meios alternativos para famílias de crianças com e sem autismo
alcançá-lo”. Baseado neste modelo, em a fim de mapear as principais fontes do
um estudo posterior, os autores compa- estresse familiar. O melhor preditor para
raram as respostas de mães de crianças o estresse paterno foi os comportamen-
com e sem autismo a respeito de uma tos autoabusivos e para o materno foi a
série de tópicos envolvendo o seu coti- hiperirritabilidade. É interessante notar
diano, em uma entrevista. Os resultados que ambos os comportamentos citados
não revelaram diferenças entre os grupos não são típicos ou exclusivos do autis-
quanto a itens como ajuste psicológico, mo, podendo ser encontrados em outras
satisfação de vida ou satisfação conjugal. condições (Ex: deficiência mental). Logo,
Contudo, os autores encontraram uma o estresse produzido por estes fatores
correlação positiva entre determinadas pode estarpresente em outras famílias
estratégias de coping e satisfação de que não somente a de crianças com autis-
vida, em mães de filhos com autismo. mo. Por outro lado, no estudo de Bebko,
Por exemplo, as mães que apresentaram Konstantareas e Springer [39], a maior
maior satisfação de vida, foram aquelas fonte de estresse parental foram os dé-
que tendiam a depositar maior ênfase na ficits na comunicação (linguagem verbal
importância de “ser uma boa mãe” do expressiva) e cognitivos (discrepância en-
que na carreira profissional; a passar a tre diferentes áreas). Considerando que
maior parte de seu tempo de lazer com as dificuldades na comunicação afetam
familiares; a depositar menor ênfase no o relacionamento interpessoal, e consti-
lazer individual e na opinião ou aprovação tuem critérios-chave para o diagnóstico
alheias a respeito dos comportamentos de autismo, pode-se compreender estes
de seus filhos; maior ênfase nos papéis resultados como sendo mais específicos
e suporte parentais do que na intimidade aos casos de autismo.
conjugal e lazer compartilhado; maior to-
lerância à ambiguidade, tanto em relação O stress e as defesas em pais e
a seus filhos quanto no geral. Essa corre- mães de crianças autistas
lação foi negativa para mães de crianças
sem autismo. Os estudos apresentados As relações do casal passam por
mostram que os pais ou cuidadores de duras provas, alto índice de divórcios. Au-
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 207

tismo traz às famílias lições importantes acolhendo as dúvidas e compreendendo


sobre como aprender a levar as duras de- pedidos, ora, convidando-os para partici-
mandas da vida com tolerância e humor. parem como agentes do processo é tarefa
Isso não faz todos famílias especiais. fundamental no atendimento psicotera-
O certo é que cada família, e dentro pêutico da criança uma vez que as marcas
desta, cada membro da família é afetado deixadas por criança autista, os sinais
pelo membro autista de maneira diferen- clínicos do autismo na subjetividade dos
te. O impacto que produz o autismo, além pais, ligados ao isolamento da criança, e
de variar nas famílias, e nos indivíduos sensação dos pais em não serem capa-
que as formam, muda seguindo a etapa zes de decifrarem suas intenções levam
em que se encontra cada um. os pais a um verdadeiro stress emocional
Os pais das crianças autistas vivem constante.
em um constante stress emocional e Para o Psicanalista Infantil é preciso
apresentam muitas defesas excluindo-se ajudar a relação parental a promover
das representações mentais de consciên- uma atuação efetiva com o filho e não se
cia, ou seja, criam uma outra realidade sentirem excluídos em suas necessida-
defensivamente porque assim são menos des, motivando as relações de empatia
dolorosas. O impacto para muitos pais e portanto, aumentando a interação com
em ter recebido uma explicação de que os a criança e diminuindi seu isolamento
sintomas da criança são uma desordem social inicial.
biológica e não tem chance de cura, O efeito do autismo é parecido ao que
Os quadros resultantes são, em produz qualquer outra incapacidade per-
geral, severos e persistentes, com gran- manente em um membro da família, pelo
des variações individuais. Dessa forma, que vários aspectos que são tratados
seu impacto não é desprezível. aqui são comuns a várias deficiências.
O autismo, mais que um problema Certamente, o ter um filho autista pode
que afeta a uma pessoa, é um transtorno ser uma das experiências mais devasta-
de incapacidade que afeta a toda a famí- doras para os pais em particular, também
lia. Quando os pais tratam de descrever para os outros filhos. Leva a família a
o viver com um filho com autismo, usam graves tensões e por momentos pode
termos bem diferentes como: doloroso, parecer o fim do mundo, mas não é, como
incômodo, difícil, normal, complicado, tão pouco o fim da família.
muito satisfatório, faz amadurecer, trau- Muitos têm conseguido vencer, e
mático, e outros muitos. suas experiências ajudam a outros a
Por outro lado, a intervenção dirigida enfrentar a maior fonte de preocupação,
a crianças autistas precisa ser intensi- que é o medo ao desconhecido. Com
va, abrangente e duradoura. Isso leva à frequência, os pais se sentem mal pela
consideração de que a participação das adversidade, intensidade e a contradição
famílias nesse processo deveria ser um de sentimentos que a respeito do filho au-
foco sistemático dos estudos e propostas tista e à situação em que vivem. Uma aju-
de intervenção envolvendo crianças autis- da eficaz pode levar a reconhecer estes
tas. O cuidado em relação aos pais, ora sentimentos como normais, que outros
proporcionando-lhes informações preci- pais já tiveram e que não é vergonhoso
sas sobre o desenvolvimento da criança, ou ruim ter essas reações, nem se é uma
208 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

má pessoa por tê-las. E assim partir para Invasivos do Desenvolvimento, onde


o grande passo da felicidade quando se se inclui o Autismo Infantil, se carac-
aceita um filho diferente, entendendo terizam por prejuízo severo e invasivo
suas limitações e compreendendo sua em diversas áreas do desenvolvimento,
forma diferente de amor e agradecer. tais como: nas habilidades da interação
social, nas habilidades de comunicação,
Aceitar um filho autista é respeitar que ele nos comportamentos, nos interesses e
vive em um mundo distante. Tal aceitação atividades. Os prejuízos qualitativos que
traz a paz e a felicidade para ambos os lados, definem essas condições representam
pais e filhos. Assim que a relação parental um desvio acentuado em relação ao nível
começa a entender e principalmente aceitar de desenvolvimento ou idade mental do
o seu filho diferente perdem a culpa e param indivíduo. Esta seção do DSM.IV inclui o
de sofrer. Permitindo também que o seu Transtorno Autista, Transtorno de Rett,
filho seja feliz mesmo de uma forma distante Transtorno Desintegrativo da Infância e
e diferente da realidade convencional. (...) o Transtorno de Asperger.
Somente com a aceitação e o respeito às De maneira mais ou menos comum,
diferenças poderão experimentar a felicidade. esses Transtornos se manifestam nos
Santana S, 2011 primeiros anos de vida e, frequentemen-
te, estão associados com algum grau de
Retardo Mental. Os Transtornos Invasivos
Reconhecendo o diagnóstico do do Desenvolvimento são observados,
autismo por vezes, juntamente com um grupo de
várias outras condições médicas gerais,
Para um diagnóstico médico preciso como por exemplo, com outras anorma-
do Transtorno Autista, a criança deve ser lidades cromossômicas, com infecções
muito bem examinada, tanto fisicamente congênitas e com anormalidades estru-
quanto psico-neurologicamente. A avalia- turais do sistema nervoso central.
ção deve incluir entrevistas com os pais Porem, independentemente de cri-
e outros parentes interessados, obser- térios de diagnósticos, é certo que a
vação e exame psico-mental e, algumas síndrome atinge principalmente crianças
vezes, de exames complementares para do sexo masculinos. As taxas para o
doenças genéticas e ou hereditárias. transtorno são quatro a cinco vezes supe-
Hoje em dia pode-se proceder alguns riores para o sexo masculino, entretanto,
estudos bioquímicos, genéticos e cromos- as crianças para o sexo feminino com
sômicos, eletroencefalográficos, de ima- esse transtorno estão mais propensas
gens cerebrais anatômicas e funcionais e a apresentar um Retardo Mental mais
outros que se fizerem necessários para o severo que os meninos.
esclarecimento do quadro. Não obstante, A escola para o meu filho vencendo
o diagnóstico do Autismo continua sendo barreiras
predominantemente clínico e, portanto, Atualmente a legislação vigente, a ní-
não poderá ser feito puramente com vel federal e estadual, ampara e assegura
base em testes e/ou algumas escalas os direitos das pessoas com necessida-
de avaliação. des educacionais especiais. É preciso
Segundo o DSM.IV, os Transtornos ter em mente, contudo que existência de
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 209

uma lei não garante infelizmente que os do Brasil em grandes capitais, as turmas
direitos estejam sendo assegurados na especiais oferecem apenas 50 minutos
prática do dia-a-dia. diários de atividades, com professores
Os preceitos constitucionais deter- especializados em educação inclusiva.
minam que o direito à educação das Já nas escolas privadas esse trabalho
pessoas portadoras de deficiência deverá é quase inexistente e em algumas total-
ser garantido pelo Estado, conforme o Art. mente nulo.
208, que diz que o dever do Estado com Para os pais que buscam uma escola
a Educação será efetivado mediante a ga- privada esbarram em outro grande buraco
rantia de, em seu inciso III, atendimento negro: existem poucos centros de reabili-
educacional especializado aos portadores tação para autistas em nossas grandes
de deficiência, preferencialmente na rede capitais, em contratos os valores sempre
regular de ensino. são muito altos e as famílias passam
Esse direito é ratificado em vários por muitas limitações para conseguirem
outros documentos como a Lei de Diretri- manter a aquele filho em um espaço
zes e Bases da Educação nº. 9395/96, adequado a sua condição.
a Declaração de Salamanca, bem como Além das aulas na escola regular a
o Parecer 17/2001 e Resolução N. 2 do criança precisa de sessões de fonoaudio-
Conselho Nacional de Educação, entre logia, responsáveis pela dicção, de psico-
tantos outros que poderiam ser citados pedagogia, para exercitar as habilidades
aqui, inclusive alguns Documentos de cognitivas e de sessões de psicoterapia
importância Internacional. Consideran- familiar e muitas vezes praticar algum
do não ser nosso objetivo analisar a esporte e como a natação que costuma
legislação e sim, desafiar e pontuar as ser o mais indicado. Para estimular a con-
necessidades que emergem a cada dia centração ainda é importante ter aulas de
da escola no processo da inclusão, reto- música em casa com professor particular
mamos nosso pensar sobre a questão em
nosso país, que infelizmente, foi elabo- Autismo tem cura?
rada e começou a “valer” antes mesmo
do importante processo de estudos das Profissionais do Serviço de Neurolo-
realidades regionais e das democráticas gia do Instituto Fernandes Figueira, uma
discussões em diversas estâncias da unidade da Fundação Oswaldo Cruz, pre-
sociedade. tendem mudar a forma de diagnosticar o
Depois de aceitar o diagnóstico e autismo, que atualmente é feito a partir
reconhecer as limitações da criança os da observação clínica de comportamento.
pais entram em outro stresse que seria O objetivo é desenvolver uma forma de
chamado de inclusão escolar bem di- detectar precocemente a doença.
ferente dos portadores da síndrome de Para isso, entre 2002 e 2003, eles
Down. Os autistas são frequentemente acompanharam 13 crianças autistas e
confundidos com portadores de outros 16 normais, do sexo masculino, entre 6
transtornos, como a esquizofrenia. A e 14 anos. Elas foram submetidas à es-
maioria das escolas, até as particulares, timulação luminosa rítmica, enquanto as
recusa a matrícula, contrariando um direi- respostas eram captadas por eletrodos
to constitucional. Nas escolas públicas aplicados em suas cabeças.
210 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

As respostas observadas e analisa- maneira uniforme, uma forma de diagnós-


das nas populações neuronais, oscilando tico objetivo poderia ajudar a reconhecer
nas frequências dos estímulos aplicados, autistas cada vez mais precocemente,
nos permitiram encontrar anormalidades fato que seria de estrema importância
que não poderiam ser vistas através do para muitas famílias.
eletro-encefalograma de rotina - explica o Em seu estudo, Pontes mediu,
neuropediatra Adailton Pontes. por meio de um eletroencefalograma,a
De acordo com os pesquisadores, foi atividade cerebral dos pacientes sele-
identificada, num resultado preliminar, cionados, entre 6 e 14 anos, mediante
uma menor reatividade do hemisfério um determinado estímulo luminoso. O
cerebral direito, que estaria relacionado resultado preliminar mostra o que pode
com as habilidades sócio-emocionais. ser uma resposta padrão para os porta-
Ainda assim, é preciso ter o resultado dores da síndrome: as crianças autistas
definitivo do estudo. Segundo o neurolo- apresentaram uma ativação menor do
gista Adaílton Pontes, o distúrbio causa hemisfério direito do cérebro.
do pelo autismo tem, provavelmente, cau- As respostas foram comparadas com
sas genéticas combinadas com fatores os resultados de crianças normais da
ambientais e começa a se desenvolver mesma faixa etária submetidas ao exa-
já dentro da barriga da mãe. me, que não têm a mesma reação.
Os resultados preliminares da pes- Os bons resultados, no entanto,
quisa realizada pelo neurologista Adaílton precisam ser confirmados por um estudo
Pontes com 14 crianças autistas pacien- com uma amostra maior.
tes do Instituto Fernandes Figueira (IFF),
da Fiocruz, estão aproximando os médicos “É um achado significativo do ponto de vista
de um diagnóstico objetivo da síndrome. estatístico. Será sim, uma descoberta, se os
Até hoje, o autismo é detectado por meio resultados forem confirmados com a amostra
de uma avaliação clínica que leva em maior, comparando com graus
consideração critérios aplicados à análi- mais graves de deficiência do hemisfério
se do comportamento dos pacientes. No direito e com portadores de outros tipos de
entanto, a necessidade de diagnosticá-lo transtornos mentais”. Pontes A. 2010
precocemente vai de encontro à pouca fa-
miliaridade dos pediatras com o assunto. A novidade da pesquisa é que a lo-
calização da deficiência do cérebro dos
“Falta uma política de saúde em que o pedia- autistas só havia sido demonstrada até
tra tenha conhecimento das etapas do desen- agora com a ajuda de exames de imagem
volvimento e dos fatores de risco do autismo. funcional, de custo muito alto.
Eles poderiam aplicar questionários sobre o Como foi percebido a grande im-
comportamento das crianças que podem a portância do eletroencefalograma e a
cender ou não o sinal vermelho e encaminhar condição acessível em qualquer lugar do
para o tratamento.” Pontes A. 2010 mundo por ter custo baixíssimo, percebe
que o eletro detecta respostas imediatas
Como ainda há grande desconhe- dos neurônios, mas perde em localização.
cimento de muitos pediatras da sinto- O médico do IFF Dr. Adailton Pontes
matologia do autismo, não acontece de resolveu usar o computador para agrupar
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 211

as respostas dos neurônios pela frequên- não falam nada com demora do diagnós-
cia e determinar a área, ainda que não tico para uma atuação terapêutica eficaz,
tão precisa, afetada no cérebro. dificilmente desenvolverão a linguagem.
Segundo Pontes, o autismo não Uma grande forma de constatação é
pode ser encarado como uma raridade. perceber a diferença desse bebê ainda
A prevalência da doença é de um caso a nos primeiros meses de vida. Os autistas
cada mil habitantes, o que a torna relati- apresentam uma disfunção principalmente
vamente frequente. O pesquisador traba- no hemisfério direito do cérebro, respon-
lha com a definição de autismo utilizada sável pelas emoções e o convívio social.
na Academia Americana de Neurologia e
pelo Manual de diagnóstico e estatística “Eles vêem as pessoas fazendo as
das perturbações mentais (DSM IV), que coisas,mas os gestos e a linguagem não fa-
caracteriza a enfermidade por prejuízos zem sentido. A subjetividade da entonação de
nas habilidades de interação social, co- um frase, por exemplo, que para nós parece
municação, comportamentos repetitivos, simples, eles não são capazes de reconhe-
interesses e atividades restritas. cer”. Pontes A. 2010
O espectro de autismo viria das for-
mas mais leves até as gravíssimas. Os Como o cérebro das crianças tem
autistas não têm pragmática, uso social mais facilidade de se recuperar, o diag-
da linguagem. Não dá para manter um nóstico precoce seguido pelo tratamento
diálogo com eles porque lhes falta a pode fazer que elas conquistem elemen-
intersubjetividade de perceber o outro. tos para seguir uma vida próxima do
Esses são aspectos sócio-emocionais normal.
relacionados ao hemisfério direito do cé- Surgem assim, exemplos recorrentes
rebro. Além disso, 75% dos pacientes têm de autistas que são, por sua objetivida-
retardo mental”, explica o pesquisador. de, experts em ciências exatas, como a
Pontes coloca a medicina como uma matemática, e conseguem até chegar à
procura constante de provas definitiva. universidade. Infelizmente, esse é um
Além disso, o diagnóstico tardio é da- grupo muito pequeno. Devido à forma
noso tanto para a criança quanto para a precária de diagnóstico e tratamento no
família, Quanto mais cedo o diagnóstico, país tão grande como o Brasil.
melhor. O que buscamos é detectar logo
no primeiro ano de vida. O ideal é antes Conclusão
dos 3 anos, quando o tratamento produz
resultados melhores. A criança que chega O impacto da criança portadora de au-
depois dos 5anos tem um prognóstico tismo na família tem sido foco de investi-
diferente. Assim é de suma importância gações há quase três décadas, revelando
trabalhar na busca rápida do prognóstico intenso interesse científico pelo tema. As
e adaptar a relação parental o quanto pesquisas que inicialmente enfatizavam
antes para a nova realidade desse grupo os efeitos dos pais sobre a criança, pas-
familiar. saram a estudar os efeitos da criança
De um modo geral, quando mais com Autismo sobre os pais. De acordo
tardio, maiores serão os obstáculos a com esta mudança, estudos atuais têm
serem vencido e para aquelas que ainda considerado aspectos como a natureza
212 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

crônica da síndrome e o consequente que as noções aqui discutidas tornem-se


acometimento dos pais pelo estresse mais conclusivas.
decorrente da prestação de cuidados Uma das maiores dificuldades da
em longo prazo, como fatores importan- família (pai e mãe) é o momento do es-
tes para a compreensão do fenômeno. clarecimento do diagnóstico, os pais não
Apesar dos avanços já obtidos nesta surpontam a demanda de reconhecer na
área, resultados controversos identificam criança sua realidade emocional. Recipro-
diferentes fatores associados ao impac- camente o casal parental (pai e mãe) se
to dos Autistas Estas inconsistências sentem sozinhos.
são, possivelmente, reflexos de falhas Conhecendo as raízes intersubjetiva
metodológicas ou divergências teóricas para autismo os pais podem ajudar mais
entre pesquisadores. Ao mesmo tempo eficientemente seus filhos portadores de
em que essas diferenças nos achados distúrbios na constituição da consciência
dificultam a compreensão do impacto dos original, uma vez que tais crianças pos-
Transtornos Globais do Desenvolvimento suem falhas na qualificação inicial de
na família, mostram a importância em de- afeto, fato comum em crianças autistas.
senvolver novos modelos de investigação Maldavsky coloca a importancia para
do fenômeno, que ampliem a magnitude a formação do original ambiente empático
de fatores envolvidos neste processo. e favorecedor. Se isso não acontecer,
O tratamento é muito importante para introduz o conceito de defesa patógeno
o desenvolvimento da pessoa autista, para explicar certos comportamentos de
mas só acessível a poucos, o que é isolamento autista.
lamentável. As famílias que não têm con- Assim diante da relação estabelecida
dições acabam, muitas vezes, deixando o entre mãe/pai e bebê, quando os pais e
autista preso em casa para poder exercer principalmente a mãe são sensíveis às
suas funções cotidianas. necessidades de conforto e segurança
Quanto mais o tempo passa, mais da criança autista, essas crianças pudem
prejudicado fica o desenvolvimento expressar suas necessidades mais facil-
deles. Desta forma é muito comum mente evitando a maior permanencia no
a frequência pedidos de ações in- isolamento Autista.
dividuais solicitando tratamento e No entanto, quando os pais e princi-
apoio a família do portador de Trans- palmente as mães permanecem ignorado,
tornos Invasivos do Desenvolvimento. rejeitado ou distorcendo as necessidades
É possível trabalhar com uma noção inte- de seus filhos autistas, eles desenvolve-
grada de saúde, ao invés de se separar ram menos recursos funcionais e adaptá-
a “mente” do “corpo”. Particularmente veis para comunicar suas necessidades
importante nesse modelo é a preocu- aos seus pais.
pação quanto à compreensão de como Desta forma a psicoterapia psicanalíti-
diversos fatores operam e interatuam em ca deverá fornecer aos pais uma imagem
condições adversas prolongadas, atingin- da criança. Esclarecendo como uma crian-
do a família em diferentes etapas do seu ça autista se comporta e como lidar com
ciclo vital. Entretanto, cabe salientar que cada situação do cotidiano, como trabalhar
mais evidências empíricas necessitam e evetivar a inclusão social e a inclusão
ser produzidas em favor do modelo para escolar e não apresentar apenas uma
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 213

tabela psicopatologica. experiências psi- In: Contributions to Psychoanalysis.


canalíticas no campo da intersubjetividade Londres: Hogarth Press; 1948.
em crianças com autismo e seus pais. 8. Klein M. La psychanalyse des enfants.
O autismo é um transtorno invasivo Paris: PUF ; 1932.
de desenvolvimento que compromete a 9. K l e i n M . L a t e c h n i q u e d e j e u
psychanalytique: son histoire et as
comunicação verbal e a comunicação não
portée. In : Le transfert et autres écrits.
verbal, dificultando a integração social da
Paris: PUF ; 1995. p. 25-50.
pessoa. O tratamento do autismo não é 10. Tustin F. Autismo e psicose infantil. Rio
feito somente com remédios e sim com de Janeiro: Imago; 1975.
reabilitação multidisciplinar, com fonoau- 11. Tustin F. El cascarón protector en niños y
diólogo, psicanalista Infantil e terapeuta adultos. Buenos Aires: Amorrortu; 1990.
ocupacional, psicopedagogo. 12. Laznik-Penot MC. Rumo à palavra: três
Infelizmente não existe cura total crianças autistas em psicanálise. São
para o autismo, mas a reabilitação o Paulo: Escuta; 1997.
quanto antes pode melhorar considera- 13. Breslau N, Davis GC. Chronic stress and
velmente o prognóstico, fanzendo com major depression. Archives of General
que o portador de autismo e sua família Psychiatry 1986.
possam viver bem com harmonia e felici- 14. Bristol MM, Schopler E. A developmental
perspective on stress and coping in
dade respeitando as diferenças.
families of autistic children. In: Blancher
J, ed. Severely handicapped young
Referências children and their families. Orlando,
Florida:Academic Press; 1984.
1. Kanner L. Early infantile autism. Journal 15. Demyer MK. Parents and children in
of Pediatrics 1944 autism. 1979.
2. Assumpção Jr JFB. Transtornos invasivos 16. Gallagher JJ, Beckman P, Cross AH.
do desenvolvimento infantil. São Paulo: Families of handicapped children:
Lemos; 1997. Sources of stress and its amelioration.
3. APA (American Psychiatric Association). Exceptional Children; 1983.
Manual Diagnóstico e Estatístico de 17. Gath A. The impact of an abnormal child
Transtornos Mentais. DSM-III R. 3 ed.rev. upon the parents. British Journal of
Porto Alegre: Artes Médicas; 1980. Psychiatry 1977.
4. APA (American Psychiatric Association), 18. Harris SL. Families of developmentally
Manual Diagnóstico e Estatístico de disabled children: A guide to behavioral
Transtornos Mentais. DSM-IV TR. 4 intervention. New York: Pergamon; 1983.
ed.rev. Porto Alegre: Artes Médicas; 19. Cutler BC, Kozloff MA. Living with autism:
2002. Effects on families and families needs. In:
5. Gauderer C. Autismo e outros atrasos Cohen DJ, Donnellan AM, eds. Handbook
no desenvolvimento. Rio de Janeiro: of autism and pervasive developmental
Revinter; 1997. disorders; 1987.
6. Bosa C. Atuais interpretações para 20. Factor DC, Perry A, Freeman N. Brief
antigas observações. Em: Baptista C, report: Stress,social support, and respite
C. Bosa C, eds. Autismo e educação: care in families with autistic children.
Reflexões e propostas de intervenção Journal of Autism and Developmental
Porto Alegre: Artmed; 2002. Disorders 1990.
7. Klein M. Les principes psychologiques
de l’analyse des jeunes enfants.
214 Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011

21. Perry A, Sarlo-Mcgarvey N, Factor D. 31. Price-Bonham S, Addisson S. Families


Stress and family functioning in parents and mentally retarded children. Family
of girls with Rett syndrome. Journal of Coordinator 1978.
Autism and Developmental Disorders 32. Koegel RL, Schreibman L, Loos LM,
1992;22:235-48. Dilrich-Wilhelm H, Dunlap G, Robbins R,
22. Schopler E, Mesibov GB, eds. Autism in Plienis AJ. Consistent stress profiles in
adolescents and adults; 1983. mothers of children with autism. Journal
23. Bristol MM, Schopler E. Coping and of Autism and Developmental Disorders
stress in families of autistic adolescents; 1992.
1983. 33. Holroyd J. The questionnaire on resources
24. Bettelheim B. The empty fortress: and stress: Na instrument to measure
Infantile autism and the birth of the self. family response to a handicapped
New York: Free Press; 1967. member. Journal of Community
25. Eisenberg L. The autistic child in Psychology 1974.
adolescence. American Journal of 34. Konstantareas M, Homatidis S, Plowright
Psychiatry 1956. CM. Assessing resources and stress
26. Konstantareas MM, Homatidis S. in parents of severely dysfunctional
Assessing child symptom severity and children trough the Clarke modification
stress in parents of autistic children. of Holroyd’s Questionnaire on Resources
Journal of Psychology and Psychiatry and Stress. Journal of Autism and
1989. Developmental Disorders 1992.
27. Holroyd J, McArthur D. Mental retardation 35. Hill R. Families under stress. New York:
and stress on the parents: A contrast Harper; 1949.
between Down’s syndrome and childhood 36. Atkinsons RC, Smith EE, Bem DJ. (1995).
autism. American Journal of Mental Introdução à psicologia. Porto Alegre:
Deficiency 1976. Artes Médicas; 1995.
28. Demyer MK, Goldberg P. (1983). Family 37. Lazarus S, Folkman S. Stress, appraisal
needs of the autistic adolescent. Em E. and coping. New York: Springer; 1984.
Schopler E, Mesibov GB, eds. Autism in 38. Tunali B, Power T. Creating satisfaction:
adolescents and adults; 1983. A psychological perspective on stress
29. Milgram A, Atzil M. Parenting stress and coping in families of handicapped
in raising autistic children. Journal of children. Journal of Child Psychology and
Autism and Developmental Disorders Psychiatry 1993.
1988:415-24. 39. Bebko JM, Konstantareas MM, Springer
30. Bristol MM, Gallagher JJ. Research on J. Parent and professional evaluations
fathers of young handicapped children: of family stress associated with
Evolution, review and some future characteristics of autism. Journal of
directions. In: J. Gallagher J, & P. M. Autism and Developmental Disorders
Vietze PM, eds. Families of handicapped 1987.
persons: Research, programs and policy
issues. Baltimore, MD: Brookes; 1986.
p.81-100.
Instruções aos autores

A revista Neurociências é uma publicação com periodicidade 3. Revisão


bimestral e está aberta para a publicação e divulgação de artigos São trabalhos que expõem criticamente o estado atual
científicos das várias áreas relacionadas às Neurociências. do conhecimento em alguma das áreas relacionadas às neu-
Os artigos publicados em Neurociências poderão também rociências. Revisões consistem necessariamente em síntese,
ser publicados na versão eletrônica da revista (Internet) assim análise, e avaliação de artigos originais já publicados em
como em outros meios eletrônicos (CD-ROM) ou outros que revistas científicas. Todas as contribuições a esta seção que
surjam no futuro. Ao autorizar a publicação de seus artigos na suscitarem interesse editorial serão submetidas a revisão por
revista, os autores concordam com estas condições. pares anônimos.
A revista Neurociências assume o “estilo Vancouver” (Uni- Formato: Embora tenham cunho histórico, revisões não
forme requirements for manuscripts submitted to biomedical expõem necessariamente toda a história do seu tema, exceto
journals) preconizado pelo Comitê Internacional de Diretores de quando a própria história da área for o objeto do artigo. O texto
Revistas Médicas, com as especificações que são detalhadas deve conter um resumo de até 200 palavras em português e
a seguir. Ver o texto completo em inglês desses Requisitos outro em inglês. O restante do texto tem formato livre, mas
Uniformes no site do International Committee of Medical Journal deve ser subdividido em tópicos, identificados por subtítulos,
Editors (ICMJE), www.icmje.org, na versão atualizada de outubro para facilitar a leitura.
de 2007 (o texto completo dos requisitos está também disponível, Texto: A totalidade do texto, incluindo a literatura citada
em inglês, no site de Atlântica Editora em pdf). e as legendas das figuras, não deve ultrapassar 25.000 car-
Submissões devem ser enviadas por e-mail para o editor acteres, incluindo espaços.
(artigos@atlanticaeditora.com.br). A publicação dos artigos é Figuras e Tabelas: mesmas limitações dos artigos originais.
uma decisão dos editores, baseada em avaliação por revisores Referências: Máximo de 100 referências.
anônimos (Artigos originais, Revisões, Perspectivas e Estudos
de Caso) ou não. 4. Perspectivas
Como os leitores da Neurociências têm formação muito Perspectivas consideram possibilidades futuras nas
variada, recomenda-se que a linguagem de todos os artigos várias áreas das neurociências, inspiradas em acontecimen-
seja acessível ao não-especialista. Para garantir a unifor- tos e descobertas científicas recentes. Contribuições a esta
midade da linguagem dos artigos, as contribuições às várias seção que suscitarem interesse editorial serão submetidas
seções da revista podem sofrer alterações editoriais. Em todos a revisão por pares.
os casos, a publicação da versão final de cada artigo somente Formato: O texto das perspectivas é livre, mas deve iniciar
acontecerá após consentimento dos autores. com um resumo de até 100 palavras em português e outro
em inglês. O restante do texto pode ou não ser subdividido
1. Editorial e Seleção dos Editores em tópicos, identificados por subtítulos.
O Editorial que abre cada número da Neurociências Texto: A totalidade do texto, incluindo a literatura citada
comenta acontecimentos neurocientíficos recentes, política e as legendas das figuras, não deve ultrapassar 10.000 car-
científica, aspectos das neurociências relevantes à sociedade acteres, incluindo espaços.
em geral, e o conteúdo da revista. A Seleção dos Editores traz Figuras e Tabelas: máximo de duas tabelas e duas figuras.
uma coletânea de notas curtas sobre artigos publicados em Referências: Máximo de 20 referências.
outras revistas no bimestre que interessem ao público-alvo
da revista. Essas duas seções são redigidas exclusivamente 5. Estudo de caso
pelos Editores. Sugestões de tema, no entanto, são bem- São artigos que apresentam dados descritivos de um ou
vindas, e ocasionalmente publicaremos notas contribuídas mais casos clínicos ou terapêuticos com características semel-
por leitores na Seleção dos Editores. hantes. Contribuições a esta seção que suscitarem interesse
editorial serão submetidas a revisão por pares.
2. Artigos originais Formato: O texto dos Estudos de caso deve iniciar com um
São trabalhos resultantes de pesquisa científica apre- resumo de até 200 palavras em português e outro em inglês.
sentando dados originais de descobertas com relação a O restante do texto deve ser subdividido em Introdução, Apre-
aspectos experimentais ou observacionais. Todas as contri- sentação do caso, Discussão, Conclusões e Literatura citada.
buições a esta seção que suscitarem interesse editorial serão Texto: A totalidade do texto, incluindo a literatura citada
submetidas a revisão por pares anônimos. e as legendas das figuras, não deve ultrapassar 10.000 car-
Formato: O texto dos artigos originais é dividido em Re- acteres, incluindo espaços.
sumo, Introdução, Material e métodos, Resultados, Discussão, Figuras e Tabelas: máximo de duas tabelas e duas figuras.
Conclusão, Agradecimentos e Referências. Referências: Máximo de 20 referências.
Texto: A totalidade do texto, incluindo a literatura citada
e as legendas das figuras, não deve ultrapassar 25.000 6. Opinião
caracteres (espaços incluídos), e não deve ser superior a 12 Esta seção publicará artigos curtos, de no máximo uma
páginas A4, em espaço simples, fonte Times New Roman página, que expressam a opinião pessoal dos autores sobre
tamanho 12, com todas as formatações de texto, tais como temas pertinentes às várias Neurociências: avanços recentes,
negrito, itálico, sobre-escrito, etc. O resumo deve ser enviado política científica, novas idéias científicas e hipóteses, críticas
em português e em inglês, e cada versão não deve ultrapas- à interpretação de estudos originais e propostas de interpre-
sar 200 palavras. A distribuição do texto nas demais seções tações alternativas, por exemplo. Por ter cunho pessoal, não
é livre, mas recomenda-se que a Discussão não ultrapasse será sujeita a revisão por pares.
1.000 palavras. Formato: O texto de artigos de Opinião tem formato livre,
Tabelas: Recomenda-se usar no máximo seis tabelas, no e não traz um resumo destacado.
formato Excel ou Word. Texto: Não deve ultrapassar 3.000 caracteres, incluindo
Figuras: Máximo de 8 figuras, em formato .tif ou .gif, com espaços.
resolução de 300 dpi. Figuras e Tabelas: Máximo de uma tabela ou figura.
Referências: Máximo de 50 referências. Referências: Máximo de 20 referências.
216 Neurociências • Volume 5 • Nº 4 • outubro/dezembro de 2009

7. Resenhas animais estão de acordo com as normas vigentes na


Publicaremos resenhas de livros relacionados às Neuro- Instituição e/ou Comitê de Ética responsável;
ciências escritas a convite dos editores ou enviadas espon- (7) telefones de contato do autor correspondente.
taneamente pelos leitores. Resenhas terão no máximo uma
página, e devem avaliar linguagem, conteúdo e pertinência do 2. Página de apresentação
livro, e não simplesmente resumi-lo. Resenhas também não A primeira página do artigo traz as seguintes informações:
serão sujeitas a revisão por pares. - Seção da revista à que se destina a contribuição;
Formato: O texto das Resenhas tem formato livre, e não - Nome do membro do Conselho Editorial cuja área de concen-
traz um resumo destacado. tração melhor corresponde ao tema do trabalho;
Texto: Não deve ultrapassar 3.000 caracteres, incluindo - Título do trabalho em português e inglês;
espaços. - Nome completo dos autores;
Figuras e Tabelas: somente uma ilustração da capa do - Local de trabalho dos autores;
livro será publicada. - Autor correspondente, com o respectivo endereço, telefone
Referências: Máximo de 5 referências. e E-mail;
- Título abreviado do artigo, com não mais de 40 toques, para
8. Cartas paginação;
Esta seção publicará correspondência recebida, neces- - Número total de caracteres no texto;
sariamente relacionada aos artigos publicados na Neurociências - Número de palavras nos resumos e na discussão, quando
Brasil ou à linha editorial da revista. Demais contribuições devem aplicável;
ser endereçadas à seção Opinião. Os autores de artigos even- - Número de figuras e tabelas;
tualmente citados em Cartas serão informados e terão direito - Número de referências.
de resposta, que será publicada simultaneamente.
Cartas devem ser breves e, se forem publicadas, poderão 3. Resumo e palavras-chave
ser editadas para atender a limites de espaço. A segunda página de todas as contribuições, exceto Opiniões
e Resenhas, deverá conter resumos do trabalho em português
9. Classificados e em inglês. O resumo deve identificar, em texto corrido (sem
Neurociências Brasil publica gratuitamente uma seção subtítulos), o tema do trabalho, as questões abordadas, a
de pequenos anúncios com o objetivo de facilitar trocas e metodologia empregada (quando aplicável), as descobertas ou
interação entre pesquisadores. Anúncios aceitos para publi- argumentações principais, e as conclusões do trabalho.
cação deverão ser breves, sem fins lucrativos, e por exemplo Abaixo do resumo, os autores deverão indicar quatro
oferecer vagas para estágio, pós-graduação ou pós-doutorado; palavras-chave em português e em inglês para indexação do
buscar colaborações; buscar doações de reagentes; oferecer artigo. Recomenda-se empregar termos utilizados na lista dos
equipamentos etc. Anúncios devem necessariamente trazer DeCS (Descritores em Ciências da Saúde) da Biblioteca Virtual
o nome completo, endereço, e-mail e telefone para contato da Saúde, que se encontra em http://decs.bvs.br.
do interessado.
4. Agradecimentos
Agradecimentos a colaboradores, agências de fomento
PREPARAÇÃO DO ORIGINAL e técnicos devem ser inseridos no final do artigo, antes da
Literatura Citada, em uma seção à parte.
1. Normas gerais 5. Referências
1.1 Os artigos enviados deverão estar digitados em proces- As referências bibliográficas devem seguir o estilo Van-
sador de texto (Word), em página A4, formatados da seguinte couver. As referências bibliográficas devem ser numeradas
maneira: fonte Times New Roman tamanho 12, com todas as com algarismos arábicos, mencionadas no texto pelo número
formatações de texto, tais como negrito, itálico, sobrescrito, entre parênteses, e relacionadas na literatura citada na ordem
etc. em que aparecem no texto, seguindo as seguintes normas:
1.2 Tabelas devem ser numeradas com algarismos romanos, Livros - Sobrenome do autor, letras iniciais de seu nome,
e Figuras com algarismos arábicos. ponto, título do capítulo, ponto, In: autor do livro (se diferente
1.3 Legendas para Tabelas e Figuras devem constar à parte, do capítulo), ponto, título do livro (em grifo - itálico), ponto,
isoladas das ilustrações e do corpo do texto. local da edição, dois pontos, editora, ponto e vírgula, ano da
1.4 As imagens devem estar em preto e branco ou tons de impressão, ponto, páginas inicial e final, ponto.
cinza, e com resolução de qualidade gráfica (300 dpi). Fotos Exemplo:
e desenhos devem estar digitalizados e nos formatos .tif 1. Phillips SJ, Hypertension and Stroke. In: Laragh JH,
ou .gif. Imagens coloridas serão aceitas excepcionalmente, editor. Hypertension: pathophysiology, diagnosis and manage-
quando forem indispensáveis à compreensão dos resultados ment. 2nd ed. New-York: Raven press; 1995. p.465-78.
(histologia, neuroimagem, etc.)
Todas as contribuições devem ser enviadas por e-mail Artigos – Número de ordem, sobrenome do(s) autor(es),
para o editor (artigos@atlanticaeditora.com.br). O corpo do letras iniciais de seus nomes (sem pontos nem espaço), ponto.
e-mail deve ser uma carta do autor correspondente à editora, Título do trabalha, ponto. Título da revista ano de publicação
e deve conter: seguido de ponto e vírgula, número do volume seguido de dois
(1) identificação da seção da revista à qual se destina a pontos, páginas inicial e final, ponto. Não utilizar maiúsculas
contribuição; ou itálicos. Os títulos das revistas são abreviados de acordo
(2) identificação da área principal das Neurociências onde o com o Index Medicus, na publicação List of Journals Indexed in
trabalho se encaixa; Index Medicus ou com a lista das revistas nacionais, disponível
(3) resumo de não mais que duas frases do conteúdo da no site da Biblioteca Virtual de Saúde (www.bireme.br). Devem
contribuição (diferente do resumo de um artigo original, ser citados todos os autores até 6 autores. Quando mais de
por exemplo); 6, colocar a abreviação latina et al.
(4) uma frase garantindo que o conteúdo é original e não foi Exemplo:
publicado em outros meios além de anais de congresso; Yamamoto M, Sawaya R, Mohanam S. Expression and
(5) uma frase em que o autor correspondente assume a localization of urokinase-type plasminogen activator receptor
responsabilidade pelo conteúdo do artigo e garante que in human gliomas. Cancer Res 1994;54:5016-20.
todos os outros autores estão cientes e de acordo com o
envio do trabalho;
(6) uma frase garantindo, quando aplicável, que todos os Todas as contribuições devem ser enviadas por e-mail para:
procedimentos e experimentos com humanos ou outros artigos@atlanticaeditora.com.br
Neurociências • Volume 7 • Nº 3 • julho/setembro de 2011 217

Eventos
2012
Abril www.congressoconvergencia.com
12 a 14 de abril Julho
IX Congresso da Associação Latino-Americana 7 a 9 de julho
de Psicoterapias Cognitivas (ALAPCO) International Symposium on Ion Channels
Rio de Janeiro, RJ Valencia, Espanha
Informações: (21) 2178-2515,
http://migre.me/70GPm 9 a 20 de julho
II Curso de Inverno em Neurologia e Neuroci-
16 a 18 de abril ências FMRP-USP (CIneuro2012)
I Encontro Brasileiro de Psicanálise e Sedução Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - USP
Generalizada “Sofrimento Psíquico” Informações: http://neurorede.com/index.php/
Maringá, PR Eventos/events/viewevent.html?eventid=55
Informações: (44) 3011 4291/3011 3871,
www.ppi.uem.br 14 a 18 de julho
8th FENS Forum Neuroscience - Barcelona
20 e 21 de abril Barcelona, Espanha
IV Congresso Paulista de Psicossomática
São Paulo, SP 25 a 28 de junho
Informações: (11) 3188-4281, X Congresso de Terapia de Família
www.apm.org.br/congressopsicossomatica Curitiba, PR
Informações: (51) 3395-5222,
22 a 28 de abril www.abratef.org.br/congresso2012
LXIV American Neurology Annual Meeting
New Orleans, Louisiana Agosto
Informações: memberservices@aan.com 4 a 8 de agosto
Maio XXV Congresso Brasileiro de Neurologia
Goiânia, GO
2 a 5 de maio Informações: (62) 3086-9217,
VIII Congresso Brasileiro de Cérebro, Compor- www.neurogoiania2012.com.br
tamento e Emoções
São Paulo, SP Setembro
Informações: (51) 3028 3878, 7 a 12 de setembro
www.cbcce.com.br XXXIX Congresso Brasileiro de Neurocirurgia
4 e 5 de maio Rio de Janeiro, RJ
II Jornada de Psicanálise da Criança e do Informações: (11) 3051-6075,
Adolescente www.neurocirurgia2012.com.br
São Paulo, SP 19 a 22 de setembro
Informações: (11) 2125-3701, VI Congresso Latino-Americano de Psicolo-
www.sbpsp.org.br gia Junguiana
23 a 26 de maio Florianópolis, SC
II Jornada de Terapias Cognitivo-Comporta- Informações: (11) 5012-7966,
mentais www.clapj.com.br
Ribeirão Preto, SP Outubro
Informações: (16) 3602 3838, 10 a 13 de outubro
http://sites.ffclrp.usp.br/lapicc/ XXX Congresso Brasileiro de Psiquiatria
28 a 30 de maio Natal, RN
VII Congreso Argentino de Salud Mental “Diag- Informações: (21) 2199-7500,
nostico o estigma? Encrucijadas eticas” www.cbpabp.org.br
Buenos Aires, Argentina 11 a 14 de outubro
Informações: administracion@aasm.org.ar XI Congresso Brasileiro de Psicologia Hos-
Junho pitalar
7 a 10 de junho São Paulo, SP
XIX Congresso do Círculo Brasileiro de Psica- Informações: (11) 4485-0407,
nálise www.psicoexistencial.com.br
Recife, PE Novembro
Informações: (81) 3242-2352, www.cbp.org.br 24 e 25 de novembro
22 a 24 de junho XIX Encontro Brasileiro do Campo Freudiano
V Congresso Internacional de Convergência – Salvador, BA
O Ato Psicanalítico: Suas Incidências Clínicas, Informações: (71) 3235-0080, www.ebp.org.br
Políticas e Sociais
Porto Alegre, RS
Informações: info@congressoconvergencia.com,

Você também pode gostar