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14 anos
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neuro<ciências
psicologia
Sumário
II JORNADA FLUMINENSE DE COGNIÇÃO IMUNE E NEURAL
Academia Nacional de Medicina
Rio de Janeiro, 11 de agosto de 2011
organização: Cláudio Tadeu Daniel-Ribeiro e José Luiz Martins do Nascimento
EDITORIAIS
As Jornadas sobre Cognição Imune e Neural como plataforma
para a criação de uma nova neuroimunologia,
Cláudio Tadeu Daniel-Ribeiro, José Luiz Martins do Nascimento .......................................... 3
Cognição imune e neural - Encontros e desencontros?
Vivian M. Rumjanek, Marcello André Barcinski ................................................................... 5
OPINIÃO
Immunology and intentionality - Observing immunologists,
Nelson Monteiro Vaz...................................................................................................... 11
ARTIGOS
Psicofármacos para aprimoramento das funções cognitivas,
José Luiz Martins do Nascimento, Gilmara de Nazareth Tavares Bastos ............................ 18
Plasticidade sináptica como substrato da cognição neural,
Ricardo Augusto de Melo Reis, Mário C. N. Bevilaqua, Clarissa S. Schitine ........................ 27
A distinção entre o próprio e o não próprio pelo sistema
immune adaptativo, Maristela O Hernandez, Jorge Kalil ................................................... 42
O mestre dos sonhos à casa torna: revisitando Freud, Sidarta Ribeiro.............................. 49
Reconhecimento do próprio pelo sistema imune inato,
Marcello André Barcinski................................................................................................ 55
A redundante composição antigênica do universo biológico,
o parasitismo e o desafio da tolerância aos auto-antígenos,
Yuri Chaves Martins, Cláudio Tadeu Daniel-Ribeiro ........................................................... 60
Neurociência, a ciência do sistema nervoso: da descoberta
do impulso nervoso ao estudo da consciência e a uma nova
revolução tecnológica, Luiz Carlos de Lima Silveira,
Manoel da Silva Filho, José Luiz Martins do Nascimento................................................... 80
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neuro<ciências
psicologia ISSN 1807-1058
Conselho editorial
Álvaro Machado Dias, UNIFESP (Psicologia experimental)
Aniela Improta França, UFRJ (Neurolingüística)
Bruno Duarte Gomes UFPA (Fisiologia)
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Daniela Uziel, UFRJ (Desenvolvimento)
Dora Fix Ventura, USP (Neuropsicologia)
Eliane Volchan, UFRJ (Cognição)
João Santos Pereira, UERJ (Neurologia)
Koichi Sameshima, USP (Neurociência computacional)
Leonor Scliar-Cabral, UFSC (Lingüística)
Lucia Marques Vianna, UniRio (Nutrição)
Marcelo Fernandes Costa, USP (Psicologia Experimental)
Marco Antônio Guimarães da Silva, UFRRJ/UCB (Fisioterapia e Reabilitação)
Marco Callegaro, Instituto Catarinense de Terapia Cognitiva (Psicoterapia)
Marco Antônio Prado, UFMG (Neuroquímica)
Rafael Linden, UFRJ (Neurogenética)
Rubem C. Araujo Guedes, UFPE (Neurofisiologia)
Stevens Kastrup Rehen, UFRJ (Neurobiologia Celular)
Vera Lemgruber, Santa Casa do Rio de Janeiro (Neuropsiquiatria)
Wilson Savino, FIOCRUZ (Neuroimunologia)
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Editorial
Organizadores da II Jornada Fluminense sobre Cognição Imune e Neural, *Centro de Pesquisa, Diag-
nóstico e Treinamento em Malária, Fiocruz, *Laboratório de Neuroquímica Molecular e Celular, UFPA
claro que os processos moleculares são, em do individuo com seus ambientes. Fica para
última analise, responsáveis pelos resultados trás a idéia de um sistema imune voltado
finais que poderíamos rotular, simplificada- para o mundo externo, funcionando como um
mente, de determinantes de comportamentos exército e com finalidades diagnosticadas (por
do sistema no indivíduo e deste no ambiente. nós) no contexto de metáforas defensivas.
O atributo que talvez mais bem defina Portanto, essa é a segunda coletânea de
os sistemas cognitivos é que eles, além de palestras oriundas de uma Jornada sobre Cog-
complexos e altamente organizados em redes, nição Imune e Neural (as palestras da primeira
envolvem mecanismos de resposta específica Jornada foram publicadas em: Neurociências
e geração de memória nas interações celula- vol 5 número 4 – out/dez de 2009) envolven-
res e moleculares que resultam em fenômenos do imunologistas: Marcello André Barcinski e
como consciência e processos autopoiéticos e Claúdio Tadeu Daniel-Ribeiro (IOC/Fiocruz); Jor-
que, vistos por observadores externos, podem ge Kalil (Inst. Butantan/USP); Nelson Monteiro
ser considerados como “análises” e “interpre- Vaz (ICB/UFMG) e neurocientistas: José Luiz
tações” dos sistemas e estarem na origem da Martins do Nascimento e Luiz Carlos de Lima
definição do indivíduo imune e neural. Silveira (UFPA), Sidarta Ribeiro (IC/UFRN);
O entendimento de que o sistema imune, Ricardo Augusto de Melo Reis (IB/UFRJ) de
como o nervoso, é organizado em redes (idiotí- atuação diferenciada em sua áreas de com-
picas em vez de neurais) produziu impacto em petência. Ela se firma como uma ferramenta
cientistas, que puderam: a) entendê-lo como potencialmente útil para o debate e ponto de
capaz de fazer seu autoreconhecimento e exer- convergência para a identificação de temas,
cer um permanente controle interno de seu conceitos e paradigmas comuns nos (que re-
estado de ativação; e b) pensá-lo como dotado conhecemos como) processos cognitivos dos
de circuitos que criam e trocam informações sistemas imune e neural. Pensamos que tal
com plasticidade, de forma dependente do re- abordagem pode estar na origem da criação
pertório de vivências imunológicas individuais de uma neuroimunologia cognitiva.
e determinante das modalidades de interação Boa leitura !
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Editorial
*Instituto de Bioquímica Médica, Universidade Federal do Rio de Janeiro, **Instituto Oswaldo Cruz,
Fiocruz
que participam do que classificamos como processos sofrem influência de vários fatores
sistema imune, fazem o que podem fazer, e, e hormônios. Entre outros dados, o grupo de
nesta abordagem, as entidades cognitivas na Ricardo Reis demonstrou como as ampacinas,
imunologia seriam os imunologistas. Essa é compostos pró-cognitivos, são capazes de
uma forma de pensar bastante influenciada regular a neurogênese in vitro.
pelos neurobiólogos Humberto Maturana e A possibilidade de melhorar funções
Francisco Varela. Segundo eles, cognição cognitivas foi o tema discutido, em seguida,
pode ser atribuída a todos os seres vivos, por José Luiz Martins do Nascimento [7]. Por
com e sem sistema nervoso e a atividade funções cognitivas ele define “habilidades
neurobiológica é tratada por eles como “não- intelectuais que envolvem pensamento,
-cognitiva”. O sistema nervoso, assim como percepção, atenção, linguagem, memória,
o sistema imune seriam, cada qual, uma aprendizagem, criatividade, raciocínio lógico”
rede fechada, que sofre perturbações em seu e a apresentação discorreu sobre fármacos
contacto com o organismo e modifica a sua nootrópicos e seu uso indiscriminado por
estrutura em compensação a essas perturba- pessoas saudáveis sem déficit cognitivo. Sem
ções. Dentro dessa moldura conceitual, não esquecer de lembrar sua importância em pa-
existe “reconhecimento”, ao se intervir com cientes com Alzheimer, Parkinson, coreia de
uma célula afetam-se todas as demais que se Huntington, demência senil, déficit de atenção
re-organizariam dentro de modificações com- e hiperatividade entre outras doenças neurop-
pensatórias possíveis dentro desse sistema. siquiátricas. O uso de psicofármacos cresceu
Mas voltando ao ponto da reunião, o que com o aumento do nosso conhecimento sobre
seria cognição? Segundo Ricardo Reis [6] “o circuitos neurais, eventos celulares e molecu-
termo cognição pode ser definido como o ato lares, fazendo dos diferentes tipos de sinap-
de adquirir conhecimento, ou a faculdade de ses o alvo biológico de escolha. Dentre esse
conhecer”. Na sua abordagem, ele focalizou grupo discutiu-se o metilfenidato, o modafinil,
a plasticidade sináptica sob o ponto de vista as ampacinas e a memantina. No entanto, ou-
de moléculas e receptores envolvidos, da tros alvos biológicos foram mencionados entre
morfologia celular e de novas redes com a eles fármacos que atuam na vascularização,
geração de novos neurônios. A importância drogas que atuam no metabolismo celular,
biológica do processo cognitivo não foi o pon- e substâncias que atuam na transdução de
to de discussão, mas sim, como o sistema sinal. Um maior conhecimento das funções
nervoso, que é o foco de seu trabalho, pode cognitivas do cérebro está permitindo que se
modificar-se para se adaptar às mudanças interfira e se regule essas funções.
enfrentadas durante todo o desenvolvimento Até em torno dos anos 90 do século XX
do indivíduo. Discutiu-se mudanças morfo- o processo cognitivo era identificado com o
lógicas em estruturas que se transformam estado de consciência, levantando dúvidas
em espinhas dendríticas aumentando a sobre se em um estado inconsciente como o
possibilidade de chegada de informações ex- sono haveria o envolvimento do processo cog-
citatórias e o dinamismo de estruturas pré e nitivo [8]. Sidarta Ribeiro prendeu-se menos
pós-sinapticas. Um outro elemento, trazido à à discussão sobre cognição per se e trouxe a
tona, foi a neurogênese adulta que acontece baila o fato que graças a novas abordagens
em primatas, incluindo o homem. Neste caso de neurociências e psicologia experimental é
observa-se uma circularidade, por exemplo, possível atualmente reexaminar algumas pro-
a neurogênese no hipocampo participa dos posições freudianas [9]. A dicotomia do mundo
processos cognitivos de memória e aprendi- consciente e inconsciente foi levantada. Com
zagem, e, por outro lado o aprendizado leva isso discutiu-se a importância do sono como
a geração de novos neurônios. Todos esses consolidador de memórias e aprendizado,
8 Neurociências99:_b^QTQ6\e]Y^U^cUTU3_W^Y|z_9]e^UU>UebQ\1SQTU]YQ>QSY_^Q\TU=UTYSY^Q
mostrando como a reativação neural durante outra responsável pelo controle homeostático,
o sono leva não só a um processamento ambas em constante interação [12].
neurofisiológico, mas também, a expressão Para grande parte dos imunologistas a
gênica diferenciada. E, nesse caso o processo abordagem conceitual enquadra-se na dicoto-
cognitivo pode ocorrer de forma inconsciente. mia do sistema reconhecer entre o “próprio”
O aspecto abordado se referiu mais ao pro- e o ”não próprio”, e esse ponto foi discutido
cessamento da informação e consolidação em algum momento por todos os palestrantes
da memória, levando consequentemente à da área, mesmo definindo que esse conceito
adaptação da resposta. Esses tipos de estudo não resistiu à prova do tempo. A semelhança
só foram possíveis com o conhecimento atual genômica e proteômica entre vários seres
em neurociências. vivos e o homem, dificultando muito a noção
Esse caminho para conhecer melhor as de “próprio” e “não próprio”, foi discutida por
propriedades e organização do sistema nervo- Claudio Tadeu Daniel-Ribeiro [13]. O conceito
so, foi bastante longo, mas nos últimos anos de mimetismo molecular infere que parasitas
a velocidade de informação adquirida já nos com estruturas homólogas àquelas de seus
permite sistemas de obtenção de imagens hospedeiros garantiriam a sua sobrevivência
do cérebro em funcionamento. Uma história não somente por escaparem a uma respos-
detalhada desse desenvolvimento foi trans- ta imune, mas, também, por reconhecer e
mitida por Luiz Carlos de Lima Silveira [10]. responder a sinais fisiológicos presentes no
Ele também falou sobre “Consciência”, como meio. Devido à grande homologia encontrada
um aspecto fundamental da compreensão da entre microrganismos (patogênicos ou não)
existência, integrando a noção do “eu”, e a e a nossa espécie, existe a possibilidade de
pergunta envolvida é se haveria “alguma ma- autorreatividade e a de indução de patologia
neira de registrar a atividade consciente, ou resultante dela. Está claro que o fenômeno
seja, usar algum tipo de neuroimageamento denominado “tolerância imunológica” está
cuja análise revele exatamente o que um ser envolvendo reatividade, resultando em uma
humano esteja pensando”. Várias questões resposta altamente regulada, no caso aos
foram levantadas e foram discutidas inclu- antígenos parasitários assim como a todos
sive dentro do enquadramento da hipótese os elementos integrantes do organismo. A
do centro dinâmico de Edelman [11] o qual cognição sob o ponto de vista imunológico
propôs uma teoria biológica sobre a Consci- envolveria reconhecimento (um processo per-
ência, a qual procura associar determinados ceptivo) e memória imunológica (envolvendo
tipos de processos neurais às propriedades processamento e mudanças prévias). O siste-
chaves da experiência consciente. Sugere ma imune é um sistema altamente redundan-
que a consciência não é uma propriedade de te, com vários pontos de controle envolvendo
uma localização específica ou tipo de neurô- interações celulares e moleculares e seria seu
nio mas o resultado de interações dinâmicas desequilíbrio que, mais do que a existência
entre neurônios, dependendo da complexidade de antígenos comuns entre microorganismos
dessas interações e do nível de integração e seus hospedeiros vertebrados, poderia de-
entre esses complexos neuronais. O fato de sencadear reatividade patológica e doença.
Edelman ter estado envolvido em um ambien- A complexidade do sistema imune en-
te em que as teorias imunológicas estavam volveria a formação de uma memória imune
sendo formuladas (ele recebeu o Prêmio Nobel adaptativa, não dependente de circuitos
pela estrutura da imunoglobulina) talvez tenha neurais, mas formada por células do sistema
pesado na sua conceituação de interação de imune e moléculas capazes de interagir entre
dois níveis de organização nervosa uma res- si. Exemplos claros do mimetismo molecular
ponsável por categorizar estímulos externos e desencadeando doenças autoimunes foram
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discutidos por Jorge Kalil [14]. A semelhança vivo, uma vez que a regulação enzimática por
entre moléculas do Streptococcus pyogenes alosteria não depende do produto ou subs-
e a miosina cardíaca pode ser determinante trato, podendo ser efetuada por qualquer tipo
para desencadear reações auto-imunes na molecular que atue sobre o sítio regulatório
febre reumática e na doença reumática do da enzima, conferindo uma extrordinária “liber-
coração. Outro exemplo foi o da infecção pelo dade” ao processo evolutivo para criar redes
protozoário Trypanosoma cruzi produzindo uma metabólicas complexas e arbitrarias, através
resposta capaz de reagir com protozoário e de mutações dos sítios regulatórios. Alberto
com miosina cardíaca. Isso ilustra claramente observou como o conceito de Monod sobre a
a reatividade contra nossas próprias estrutu- alosteria molecular se estende naturalmente
ras e a necessidade de vários mecanismos para uma “regulação alostérica generalizada”
de controle central e periféricos para manter entre diferentes tipos celulares que consti-
a tolerância imunológica. Um conhecimento tuem os organismos metazoários, cada cé-
mais aprofundado de como ocorre essa regula- lula considerada agora como uma “unidade
ção permitiria um controle da autoimunidade. alostérica generalizada”, que é regulada por
O conceito original do reconhecimento centenas/milhares de ligantes. Nesse caso, a
imunológico, entre o próprio e o não próprio, complexidade da regulação aumenta de forma
envolvia especificidade e receptores clonais em exponencial quando passamos das unidades
linfócitos. Essa discriminação representaria o moleculares para as unidades celulares, ca-
processo de cognição do sistema imune adapta- pazes de gerar todo um organismo com suas
tivo. No entanto, existe um sistema paralelo, que complexas redes metabólicas e celulares. As
recebeu a denominação de imunidade inata, que redes neurais seriam construídas essencial-
permite a identificação de padrões moleculares mente de modo equivalente às redes alosté-
presentes em microorganismos patogênicos ricas generalizadas, de tal modo que as simu-
(PAMPs) e de padrões moleculares associados lações computacionais de ambas apresentam
a perigo, isto é, moléculas provenientes de cé- um isomorfismo algorítmico. Alberto sugeriu
lulas que sofreram traumas ou injurias (DAMPs). que esta equivalência poderia ser considerada
Neste sistema a dualidade permanece, como como elemento definidor do processo cognitivo
discutido por Marcello Barcinski [15], os PAMPs dos sistemas biológicos, variando conforme o
equivalem aos ligantes exógenos e os DAMPs grau de complexidade das redes regulatórias.
aos endógenos. No entanto, quando se trata No organismo biológico existem subsistemas
de doenças o eixo se desloca. A discriminação incluídos no sistema maior que forma o todo.
passa a ser realizada em uma primeira instân- No caso do sistema imune, Alberto sugeriu que
cia por células consideradas por anos pelos o complexo principal de histocompatibilidade
imunologistas como “células acessórias” como desempenhe o papel de elemento regulador
macrófagos, células dendríticas e neutrófilos, alostérico.
e não pelos linfócitos com seus receptores Afinal, o que entendemos por cognição?
recombinados. O reconhecimento de estruturas O fato de ser uma Jornada, e por definição
como PAMPs e DAMPs induziriam processos restrita a um dia de duração, não permitiu
inflamatórios e/ou imunoprotetores capazes de a reflexão e o debate que o tema propiciava
modular o dano tecidual. de forma exaustiva. No entanto, as Jornadas
Com Alberto Nóbrega, voltamos a uma vêm, desde a sua primeira edição em 2009,
tentativa de integrar sistemas. Ele apresentou chamando a atenção para a necessidade
a visão de Jacques Monod sobre a regulação desse debate e se tornando um fórum para
alostérica, segundo o qual esta constitui o que ele ocorra.
cerne da regulação metabólica de todo ser
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Opinião
Abstract
When we consider the immune system as a cognitive system, as most immunologists do, our questions
and the criteria we use to validate the answers to these questions, will inevitably follow what we understand
as cognition. An alternative is to ascribe cognition to what immunologists do when they operate as human
observers and generate descriptions of immunological activities. In this uncommon way of seeing, which
I prefer, we ascribe the specificity of immunological observations to what we do as humans observers
operating in human language, rather than to what cells and molecules, such as lymphocytes and immuno-
globulins, do as components of the immune system. In this alternative way of seeing, we, immunologists,
are the true cognitive entities in immunology.
Médico, Doutor em Bioquímica e Imunologia, Professor emérito de Imunologia, Instituto de Ciências Bio-
lógicas (ICB), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Position paper to: II Jornada Fluminense
de Cognição Imune e Neural, Academia Nacional de Medicina, Rio de Janeiro, 11 de agosto de 2011
Francisco and I wrote a paper arguing ance”, or the drastic inhibition of immune
that Jerne’s paper, although utterly impor- responsiveness to previously ingested
tant, was incomplete, exactly because it proteins. The analysis of “oral tolerance”
lacked the notion of “closure” (systemic turned out to be a lifelong objective in my
organization), which Francisco deemed own laboratory, but was abandoned by
as essential in the description of any Varela in his future association with im-
system [10]. We sent the paper to Jerne, munological research, in Antonio Coutin-
who praised it. Actually, Jerne himself, ho’s laboratory at the Institute Pasteur,
had formerly claimed that: “...we must in Paris (more on this below).
now accept that the immune system is In retrospect, then, I had stumbled on
essentially “closed” or self-sufficient in a surprising phenomenon that nobody un-
this respect” (in its recognitions and ac- derstands (“oral tolerance”) through which
tivations) [11]. This statement appeared immune responses to foreign proteins is
in Jerne’s internal report as Director of drastically reduced. We could transfer this
the Basel Institute for Immunology but, “tolerance” from “tolerant” mice to normal
to my knowledge, was never published mice with T-lymphocytes [12]. Thus, rather
elsewhere. than being a selective subtraction of im-
Actually, Jerne’s main paper lacked mune responsiveness, oral tolerance add-
this idea of “self-sufficiency”I [9]; he ed to the immune system something we
refers to “a revolutionary new idea that didn’t understand. Concomitantly, through
would change immunology as a whole”, the arguments of Francisco Varela, I was
but fails to describe this idea explicitly. convinced that the immune system oper-
It could not be the idea of (anti-idiotypic) ated as a “closed” network of lymphocyte
anti-antibodies - the links in the immune and antibody interactions. Immunologists
network -, because these connections are mainly concerned with self/nonself
could not be all equal. I believe, as Varela discrimination, but our paper described
also did, that this missing idea was actu- the immune system as a “closed” network
ally the idea of “closure”, or, more simply, of interactions, such that whatever fell
the idea of the inner organization which outside this “closed” domain, was simply
embodies the wholeness of systems. nonsensical. Moreover, the very notion of
Without the idea of an invariant organiza- anti-antibodies (anti-idiotypic antibodies)
tion (of a “closure” onto itself) the idea of [9], that provides an abundant internal con-
anti-antibodies is confusing, rather than nectivity of antibodies and lymphocytes,
clarifying. Thus, we wrote “Self and non- denied in itself the idea of self/nonself
sense: an organism-centered approach discrimination - although Jerne was never
to immunology”. It was rejected by the clear on this point. We also claimed that,
European Journal of Immunology as “too in “oral tolerance”, the immune network
theoretical” - which, of course, it indeed assimilates proteins encountered as food
was - and we published it in Medical Hy- or as products of the gut flora. Thus, in
potheses [10]. addition to the attempt to add the notion
In addition to its network aspect, our of organizational “closure” to Jerne’s
paper was also devoted to “oral toler- (idiotypic) network [9], we proposed that
physiological contacts with potential anti-
I Which is not the idea of organizational “closure”,
but rather a step in a similar direction. gens involved an assimilation, rather than
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a rejection of these materials [10,13]. This can only ascribe the conciliation of these
was a second very important point. opposing views to Varela’s great personal
talent in establishing associations with
Varela, Coutinho & Stewart other scientists.
Here we touch a delicate point be-
In his subsequent association with cause, in his collaboration with Coutinho
immunologists, Varela totally neglected and Stewart, Varela added an important
the relevance of “oral tolerance” [14]. collection of new findings to immune ne-
Curiously enough, he was also able to tworks, but his ideas on organizational
maintain a close collaboration with Couti- closure remained in a low key. What was
nho for many years, in spite of Coutinho’s at stake then? What was behind the titles
explicitly denial of the concept of closure: of Varela’s papers, such as: “What is the
immune network for?” [16]; or, “Immukno-
“I did not agree (and I still do not agree today, wledge: The immune system as a learning
despite many discussions with Nelson Vaz) process of somatic individuation” [17]? A
that their (Vaz-Varela) central claim was right. hint to what might have happened derives
I continue to think that a ‘decision-making from their proposal to divide immune res-
behavior’ naturally emerges from the immune ponsiveness into two immune systems,
system’s development, structure and opera- called CIS and PIS [18]. A central immune
tion, allowing for the differential treatment of system (CIS) would roughly correspond
molecular shapes it identifies either as ‘self’ to Jerne’s idiotypic network, i.e., to a
or ‘nonself.’” [15]. systemic description; and a peripheral
immune system (PIS) was responsible for
However, in our paper we explicitly lymphocyte clonal expansions in specific
claimed that: immune responses, as traditionally stu-
died in immunology - actually, a separation
“... the transformations of the cognitive do- between “local” and “global” events as
main of the immune network in an organism’s is common in connectionist approaches
ontogeny are a combination of its recursivity to cognitive sciences [19].
(its closure) and the fact that it is exposed to In our way of seeing, there is only
random perturbations or fluctuations from the one immune system, but different ways
environment (its openness). In other words, it of seeing and describing its activity. But,
exhibits self-organization, the transformation as it was standard in Varela’s approach
of environmental noise into adaptive functio- to cognition, the human observer, its ope-
nal order, in a manner similar to many other ration in language and its way of seeing
biological systems such as cells, nervous remained hidden. This is in sharp contrast
systems, and animal populations.” [10]. with Maturana’s attitude, who always tries
to make explicit the different phenomenal
Coutinho confounded the idea of “clo- domains which may be described by the
sure” with solipsism and insisted to ‘put observer in his actions in human langua-
the network back into the body’ although ging [20,21].
Varela himself was careful in explaining As almost everybody else, Varela con-
that, although ‘closed’ in its organization, ceived the immune system as a cognitive
the system is ‘open’ for intractions [8]. I system, a self with a defined identity [22].
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In his own words, his main interest was immunologists and has been treated as
the emergence of cognition, which he “degeneracy” [27] or “polyspecificity”
saw emerging everywhere [23]. On the [28]. But, to my knowledge, no one has
other hand, for Maturana, cells, organs, ascribed immunological specificity to what
etc. are totally blind (in cognitive terms) we do, as languaging humans, because
to their respective media; only organis- this may be understood as solipsism and
ms, as wholes, are capable of “effective scientists insist to be dealing with an
actions” that we identify as cognitive objective observer-independent reality.
actions [20]. In Maturana’s publications Maturana advise us about a reality [in
and presentations, the presence of the parentheses] that depends on the history
human observer and the importance of of the human observer, a kind of ‘inter-
human languaging in the construction of -subjectivity” we can build among oursel-
what is experienced as real, are always ves with our actions and beliefs [21].
made explicit. The characterization of
separate domains of description, which Demise and resurrection of immune
are typical of the context established by networks
Maturana in his Biology of Cognition and
Language, which is minimized in Varela’s The prolonged association of Varela
work, is totally absent from current immu- with frontier reasearch in immunology in
nological literature. Coutinho’s laboratory brought forth truly
systemic ideas, mathematical formalism
Enters the immunologist as an and computer modelings to the idiotypic
observer network, which were all lacking in Jerne’s
proposal [9] almost two decades before.
Describing a cognitive immune sys- Coutinho had been an important collabo-
tem is quite different from claiming that rator of Jerne at the Basel Institute and
the immunologist arbitrates which phe- produced an impressive array of experi-
nomena are specific and which are not, mental evidence in favor of the network
tracing a boundary between antibodies model both before, during and after the
and unspecific immunoglobulins, as Jerne association with Varela [29]. The 1980s
[24] and Talmage [25] did in the not so coincided with abundant experimental
distant past. As a consequence, descrip- and theoretical investigations on immune
tions of immunological activities based on networks, leading to the publication of
Varela’s ideas, or based on Maturana’s about five thousand papers. This, howe-
ideas, are significantly different. I have ver, had a negligible impact on the main
recently expanded this discussion and questions of immunology and the interest
argued that the specificity of immuno- in networks gradually waned and disappe-
logical activity resides in immunological ared from sight [30]. Why this happened?
observations, i.e. that the specificity Because only the wrong questions were
derives from what we immunologists do made, i.e. anti-idiotypic antibodies were
as human observers, operating in human seen as subsidiary means to “regula-
languaging [26]. That this specificity is not te” immune responses, when actually
inherent to lymphocytes of antibody mole- the idea of circular networks (systems)
cules is (or should be) consensual among should totally replace ‘cause/effect’ (sti-
16 Neurociências99:_b^QTQ6\e]Y^U^cUTU3_W^Y|z_9]e^UU>UebQ\1SQTU]YQ>QSY_^Q\TU=UTYSY^Q
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Revisão
Resumo
A neurociência moderna tem começado a identificar alguns dos circuitos neurais e os eventos moleculares
e neurotransmissores relacionados à performance cognitiva. Alterações moleculares e celulares são as
bases do entendimento de muitas desordens neurológicas e psiquiátricas. Esse conhecimento é importante
para o desenvolvimento de terapias direcionadas a alvos moleculares. Drogas inteligentes ou também
chamadas de nootrópicas, que incluem modafinil, metilfenidato, propanolol e ampacinas, tornaram-se
populares, porque elas podem aumentar atenção, sociabilidade, habilidade de lembrar eventos e perfor-
mance cognitiva. Essas drogas podem variar em suas ações, propriedades fisiológicas e psicológicas e
outras consequências imprevisíveis.
Abstract
Modern neuroscience has begun to identify neuronal circuits and molecular/ neurotransmitter events
on synapse formation related to cognitive performance. Molecular and cellular changes are the basis to
understanding many neurological and psychiatric disorders. This knowledge is important to development
of molecular therapies. Smart or nootropic drugs which included modafinil, methylphenidate, propanolol
and ampakines, have become popular, because they enhance attention, sociability, ability to remember
events and cognitive performance. These drugs may differ in their pharmacological properties, physiologi-
cal and psychological effects and unpredictable consequences.
Revisão
Resumo
O cérebro humano é formado por quase cem bilhões de neurônios cuja organização em redes permite
a execução de inúmeras funções comportamentais. Estímulos ambientais modificam a estrutura dos
circuitos neurais, refinando e tornando as sinapses mais eficientes. O tamanho e a área de superfície
do cérebro de primatas superiores, portadores de cérebros girencefálicos, são fatores determinantes
nas habilidades intelectuais. Neste ensaio serão discutidos como as mudanças plásticas nas sinapses
ocorrem (os pontos de contato entre as células na ordem de centenas de milhares por neurônio) e como
se dá a transferência de informações no sistema nervoso, que tem um papel essencial nos processos
cognitivos. A plasticidade sináptica é discutida do ponto de vista de moléculas (glutamato e seus recep-
tores), células e suas protuberâncias (espinhas dendríticas) e de redes elaboradas a partir da geração
de novos neurônios nos chamados nichos neurogênicos.
Palavras-chave: plasticidade, Hebb, cálcio, cognição, glutamato, sinapse, memória, neurogênese, epi-
genética
Correspondência: Ricardo Augusto de Melo Reis, Laboratório de Neuroquímica, Instituto de Biofísica Carlos
Chagas Filho, CCS, UFRJ, 21949-900 Rio de Janeiro, Tel: (21) 2562-6594, E-mail: ramreis@biof.ufrj.br
28 Neurociências99:_b^QTQ6\e]Y^U^cUTU3_W^Y|z_9]e^UU>UebQ\1SQTU]YQ>QSY_^Q\TU=UTYSY^Q
Abstract
The human brain is constituted by almost a hundred billion neurons organized in neuronal-glial networks
that allow a great number of behavioral outputs. The interaction of the environment with the genetic con-
tents of neural cells modifies the structure of neural circuits, refining the synapses into a more efficient
structure. Here we discuss how plastic changes at the molecular, cellular and network levels target the
synapses (the space between neuronal-glial cells that might reach up to 104 per neuron) and how infor-
mation is exchanged in the nervous system, an essential role in cognition. Synaptic plasticity might be
related to distinct mechanisms such as the traffic of glutamatergic receptors, spine volume modification,
integration of novel neurons in established networks and potentiation or depression of synaptic pathways.
Key-words: plasticity, Hebb, calcium, cognition, glutamate, synapse, memory, neurogenesis, epigenetics.
200.000 anos atrás na Africa; porém, com nico Charles Sherrington. Num trecho de
o surgimento do Homo sapiens durante sua obra de 1897, Sherrington atribui aos
o Paleolítico superior, houve um salto na espaços observados entre os neurônios
criatividade por volta de 50.000 anos atrás (visualizados na época por Santiago Ra-
[8]. É possível que substituições de ami- mon y Cajal e outros usando a técnica
noácidos em alguns genes, como do fator de impregnação de prata nos neurônios
de transcrição Forkhead box p2 (Foxp2) desenvolvida por Camilo Golgi), uma im-
envolvido na evolução da linguagem, pos- portante função na troca de informações
sam ter acarretado mudanças cognitivas elétricas no sistema nervoso.
substanciais em nossos ancestrais [9]. A resposta da sinapse é modificável,
É no mínimo tentador correlacionar as o que gera uma plasticidade, que é uma
consequências neurológicas com a pos- propriedade essencial do desenvolvimen-
sibilidade de como a fala, a linguagem to e uma das principais funções cerebrais
e a capacidade cognitiva diferenciaram [11]. É sabido que o cérebro é sensível
os humanos dos demais hominídeos no aos fatores ambientais, seguindo inicial-
passado remoto. Nesse sentido, camun- mente um plano genético durante a fase
dongos com um gene Foxp2 de humanos pré-natal, com a elaboração de gradientes
apresentam maior plasticidade sináptica moleculares especificados no eixo dorso-
e comprimentos dendríticos, pelo menos ventral no embrião. A rápida proliferação
nos circuitos entre o córtex e os núcleos da de células progenitoras gera múltiplos
base analisados. A introdução da versão neurônios e células gliais, através de uma
humana de Foxp2 em camundongos levam orquestração de genes pró-neurogênicos
a alterações na vocalização ultrassônica e gliogênicos [4]. Estímulos ambientais
e no comportamento exploratório desses modificam a estrutura dos circuitos neu-
animais, assim como nas concentrações rais, refinando e tornando as sinapses,
de dopamina cerebral [10]. alvo de ação dos neurotransmissores,
Neste ensaio, discutiremos como as mais eficientes por meio de atividade
mudanças plásticas nas sinapses ocorrem elétrica e mensageiros químicos. Essa
(os pontos de contato entre as células na plasticidade resulta na modificação da
ordem de centenas de milhares por neurô- estrutura e da função do sistema ner-
nio) e como se dá a transferência de infor- voso. A questão de quanto e de como o
mações no sistema nervoso, que tem um ambiente influencia no desenvolvimento
papel essencial nos processos cognitivos. do cérebro é de grande interesse geral,
Abordaremos a plasticidade sináptica do com particular atenção nos campos
ponto de vista de moléculas (glutamato e da neurobiologia do desenvolvimento,
seus receptores), células e suas protube- desenvolvimento infantil, educação e
râncias (espinhas dendríticas) e de redes psicopatologia infantil.
com a geração de novos neurônios nos Inúmeros modelos de plasticidade
chamados nichos neurogênicos. sináptica são observados em diversos
circuitos cerebrais [11]. Nesse sentido,
A sinapse podem ser citadas estruturas como o
hipocampo e a amigdala que estão envol-
O termo sinapse surgiu por volta de vidas com processos de consolidação de
110 anos atrás com o fisiologista britâ- memória espacial e emocional, proces-
30 Neurociências99:_b^QTQ6\e]Y^U^cUTU3_W^Y|z_9]e^UU>UebQ\1SQTU]YQ>QSY_^Q\TU=UTYSY^Q
citoplasma) pode ser o primeiro passo nas redes neurais, o que induz uma
para que estas subunidades atinjam a grande interatividade entre as células
região sináptica e aumentem a densidade e consequente aumento do número de
de receptores, e que uma vez ativados, sinapses. Estudos realizados na década
induzam despolarização, fluxo de Ca2+ e de 1970 em cerca de 2600 cérebros
modificações estruturais com base na autopsiados de um banco de órgãos em
polimerização de filamentos de actina. Washington, EUA, mostrou que durante o
Isso leva a transformação de estruturas desenvolvimento, o crescimento cerebral
imaturas (filopódios) presentes durante aumenta rapidamente entre os primeiros
o desenvolvimento a se transformarem meses e os primeiros anos de vida, e que
em protuberâncias compartimentalizadas a curva (no formato de U invertido) e se
(espinhas) volumosas na forma de co- estabiliza na adolescência [19-20]. Essa
gumelo e em cálice, ricas nos estoques análise foi revisitada recentemente com
intracelulares de cálcio, e que uma vez o imageamento de centenas de cérebros
ativadas, se tornam funcionais (e deixam de crianças, adolescentes e adultos (3-27
de ser silenciosas) [18]. Nesse contexto, anos), com o emprego de uma técnica
é sabido que modelos de plasticidade não invasiva (ressonância magnética
como a LTP (potencialização de longo funcional) e que confirmou a curva em U
termo, discutido em seguida) e a LTD invertida para diversos parâmetros. Po-
(depressão de longo termo) podem ser rém, o estudo mostra que diferentes áre-
expressos com a inserção e a remoção de as cerebrais amadurecem em momentos
subunidades de receptores AMPA, respec- distintos, e que os circuitos neurais têm
tivamente [18] e esse modelo pode ser a diferentes trajetórias durante o desenvol-
base para o estudo de funções cognitivas vimento no que concerne ao volume de
e de disfunção sináptica. massa cinzenta (onde estão os corpos
celulares dos neurônios e astrócitos) e a
Crescimento cerebral pós natal e branca (conjunto de fibras que conectam
plasticidade sináptica as regiões) [6].
Os bilhões de células no cérebro es-
Entre os primeiros dias após o nas- tão conectados de forma a permitir um
cimento e a infância (por volta dos 6 grande repertório de respostas compor-
anos de idade), uma criança sadia está tamentais, desde a execução de padrões
em um período em que apresenta a sua básicos de movimento até na elaborada
maior plasticidade e interatividade com o tarefa de improvisar um longo discurso.
meio e o seu cérebro passa de cerca de Para que os circuitos cerebrais controlem
350 para 1200 gramas, e que chega até essa diversidade de respostas, foram
1400 gramas no pico da adolescência necessárias a proliferação e a diferen-
(um pouco maior nos garotos em função ciação de progenitores no embrião em
do peso corporal e influência hormonal) uma diversidade de neurônios, células
[19]. A atividade neural relacionada gliais e outros tipos, e que atingissem os
com a experiência nos mais diversos locais corretos. No pico da embriogênese,
níveis (sensorial, motora, emotiva e estima-se que cerca de 250 mil neurônios
social) é talvez o principal substrato são gerados por minuto [19] – processo
para o grande aumento dos processos controlado por fatores que se difundem
32 Neurociências99:_b^QTQ6\e]Y^U^cUTU3_W^Y|z_9]e^UU>UebQ\1SQTU]YQ>QSY_^Q\TU=UTYSY^Q
ao longo do tubo neural e que ativam ge- psicólogo canadense Donald Hebb. Es-
nes responsáveis por diversas proteínas, sas sinapses hoje são conhecidas como
que regulam a produção da neurogênese. hebbianas, e as regras hebbianas são
Se a produção dos neurônios sofrer uma aplicadas a modelos de aprendizagem no
interferência nessa fase da ação de dro- neocórtex e em estruturas plásticas [22].
gas (canabinóides ou do álcool), de toxi- Estudos recentes mostram que as es-
nas ambientais (como o metil-mercúrio), pinhas dendríticas (em média, com cerca
ou ainda de um particular defeito genéti- de 0,5-2 µm de comprimento, chegando
co, pode ocorrer a formação incorreta da a 6 µm na região CA3 do hipocampo)
estrutura do sistema nervoso. Hoje é acei- são muito dinâmicas, heterogêneas em
ta a ideia que os circuitos cerebrais se forma e estrutura, e modificadas por ex-
transformam através de uma combinação periência e por atividade (alvo de LTP), e
de influências genéticas e ambientais, e que poderia ser o substrato morfológico
que o ambiente e a genética contribuem da plasticidade sináptica. Um neurônio
para a construção cerebral. Os primeiros maduro apresenta de 1–10 espinhas/
eventos no desenvolvimento cerebral (no µm num dendrito, sendo esse o local de
embrião) são grandemente dependentes chegada das informações excitatórias no
dos genes, seus produtos, e do milieu no SNC. Embora o imageamento dessas es-
qual isso ocorre. Em resumo, a interação truturas mostrando a motilidade evidencie
entre a genética e o ambiente conectando o possível impacto funcional no neocórtex
as sinapses mostra-se necessária para a e no hipocampo em neurônios vivos, o
formação dos substratos neurais neces- siginificado da plasticidade das espinhas
sários para a riqueza do comportamento ainda é um assunto polêmico [23].
humano [2].
Plasticidade via novos neurônios no
LTP, Hebb e memória cérebro adulto
por sinalização via ativação de receptores cérebro adulto e as etapas que seguem a
de serotonina, dopamina e acetilcolina. geração desses novos neurônios são bem
Diversas moléculas como hormônio tireoi- conhecidas. Milhares de novos neurônios
diano, prolactina, polipeptídeo de ativa- são diariamente gerados no hipocampo
ção da adenil ciclase pituitária (PACAP), de ratos adultos [58]. No giro denteado,
além de fatores de crescimento como o novos neurônios são originados a partir
fator de crescimento epidérmico (EGF), fa- de progenitores ou precursores locali-
tor de crescimento de fibroblastos (FGF), zados na própria estrutura. As células
fator neurotrófico derivado de gânglio progenitoras hipocampais têm caracte-
ciliar (CNTF) e fator neurotrófico derivado rísticas astrocitárias e são concentradas
de cérebro (BDNF), entre outros, também na chamada “camada de células granu-
atuam modulando a neurogênese na ZSV. lares”. A camada de células granulares
Durante a migração na rota migratória ros- fica localizada entre o hilus e a camada
tral e no bulbo olfatório, a própria migra- molecular, sendo o sítio neurogênico en-
ção e diferenciação celular é regulada via contrado especificamente, na camada de
sinalização GABAérgica e interação com células subgranulares, região adjacente
componentes do microambiente, como ao hilus (Figura 1).
PSA-NCAM, efrinas e neuroregulinas. A No sítio neurogênico, mais especifica-
sobrevivência e a integração dos novos mente na zona subgranular, três tipos de
neurônios no bulbo olfatório podem ser células podem ser identificados: células
afetadas ainda pela ação da acetilcolina, B, células D e células G. As células B são
e de fatores ambientais como atividade astrócitos que são fortemente marcados
sensorial, e a exposição do animal a no- com anticorpos anti-GFAP. Tais astrócitos
vos odores [revisado em 56]. emitem prolongamentos radiais para o
A integração contínua de novos neu- interior da camada de células granulares.
rônios no bulbo olfatório parece ter papel As células B sofrem mitose e podem
importante na plasticidade da discrimi- gerar novas células B ou células D. As
nação de novos odores. Em um estudo células D são amplificadoras e proliferam
realizado com animais com expressão rapidamente, gerando novas células D
deficiente da proteína NCAM (necessária que amadurecem e dão origem a novos
para a migração celular), foi demonstrado neurônios granulares. As células G são
que o número de interneurônios no bulbo neurônios granulares maduros (figura 1)
olfatório foi drasticamente reduzido e que [59].
o animal apresentava dificuldades em Os neurônios imaturos (células D)
discriminar odores semelhantes [57]. estendem um prolongamento apical em
Este estudo sugere que a neurogênese direção a camada molecular, ao mesmo
na ZSV adulta pode ser importante para tempo em que migram para o interior
a função olfativa. da camada de células granulares. Além
disso, estendem axônios em direção aos
Neurogênese no hipocampo adulto neurônios piramidais de CA3 [36]. As cé-
lulas que não são integradas aos circuitos
O giro denteado do hipocampo é são eliminadas por apoptose. A maior
uma das duas regiões cerebrais onde a parte da morte celular parece ocorrer
neurogênese é largamente verificada num quando as células saem do ciclo celular
36 Neurociências99:_b^QTQ6\e]Y^U^cUTU3_W^Y|z_9]e^UU>UebQ\1SQTU]YQ>QSY_^Q\TU=UTYSY^Q
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Perspectiva
Resumo
A distinção entre o próprio e o não próprio é essencial à sobrevivência de todos os organismos. O sistema
imune inato é encontrado em todos os seres vivos. Nos vertebrados também é encontrado um sistema
bem mais complexo, o sistema imune adaptativo. Os linfócitos, as células responsáveis pela imunidade
adaptativa, precisam ser selecionados já que eles irão fazer a distinção entre o próprio e o não próprio.
Neste breve artigo iremos discutir o processo de seleção dos linfócitos e também alguns mecanismos
para a manutenção homeostática deste sistema. Já sabemos que falhas na resposta imune adaptativa
levam às doenças. Precisamos agora identificar maneiras de controlar a resposta imune específica.
Assim poderemos contribuir para melhorar o tratamento de doenças autoimunes, onde ocorre ativação
exacerbada contra autoantígenos. Ao mesmo tempo poderemos favorecer uma melhor resposta imune
em doenças onde o sistema imune é reprimido, como câncer.
Correspondência: Prof. Dr. Jorge Kalil, Av. Dr Eneas de Carvalho Aguiar, 44 bloco II 9 andar São Paulo SP,
Tel: (11) 2661-5900, e-mail: jkalil@usp.br
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Neurociências99:_b^QTQ6\e]Y^U^cUTU3_W^Y|z_9]e^UU>UebQ\1SQTU]YQ>QSY_^Q\TU=UTYSY^Q 49
Perspectiva
Resumo
Sigmund Freud construiu uma influente teoria sobre a arquitetura e funcionamento da mente, mas sua
obra psicanalítica foi rejeitada pela ciência por ser considerada não-testável e portanto metafísica. Não
obstante, os últimos anos vêm testemunhando um intenso recrudescimento do interesse pela produção
freudiana em diversos campos de investigação neurocientífica. Neste breve artigo faço um sumário das
principais linhas de pesquisa desenvolvidas na confluência da neurobiologia e da psicanálise, com ênfase
no estudo da relação entre sonho, memória e o inconsciente.
Abstract
Sigmund Freud built an influential theory regarding the architecture and functioning of the mind, but his
psychoanalytic work was rejected by science because it was considered to be non-testable, and therefore
metaphysical. Nevertheless, the recent years have witnessed an intense resurgence of the interest in
Freudian contributions within various fields of neuroscience research. In this brief article I make a sum-
mary of the main lines of research developed at the confluence of neurobiology and psychoanalysis, with
emphasis on the study of the relationship among dream, memory and the unconscious.
Correspondência: Sidarta Ribeiro, Instituto do Cérebro, Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
Av. Nascimento de Castro 2155, 90560-450 Natal RN, Tel: (84) 3215-2709,
E-mail: sidartaribeiro@neuro.ufrn.br
50 Neurociências99:_b^QTQ6\e]Y^U^cUTU3_W^Y|z_9]e^UU>UebQ\1SQTU]YQ>QSY_^Q\TU=UTYSY^Q
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Neurociências99:_b^QTQ6\e]Y^U^cUTU3_W^Y|z_9]e^UU>UebQ\1SQTU]YQ>QSY_^Q\TU=UTYSY^Q 55
Perspectiva
Reconhecimento do próprio
pelo sistema imune inato
Marcello André Barcinski
Correspondência: Fundação Oswaldo Cruz, Instituto Oswaldo Cruz, Av. Brasil 4365
Manguinhos 21040-360 Rio de Janeiro RJ, Tel: (11) 2562-1368, E-mail: mabarcinski@gmail.com
56 Neurociências99:_b^QTQ6\e]Y^U^cUTU3_W^Y|z_9]e^UU>UebQ\1SQTU]YQ>QSY_^Q\TU=UTYSY^Q
Neste contexto é importante chamar 10. Rosenthal AS, Barcinski MA, Blake JT.
a atenção para a hipótese de que entre Determinant selection is a macrophage
as pressões seletivas responsáveis pelo dependent immune response gene
evolução de um sistema imune adaptativo function. Nature 1977;267(5607):156-
esteja o da necessidade de discrimina- 8.
11. Barcinski MA, Rosenthal AS. Immune
ção entre MAMPs (microbial associated
response gene control of determinant
molecular patterns) e PAMPs (pathogen
selection. I. Intramolecular mapping
associated molecular patterns) presentes of the immunogenic sites on insulin
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Artigo original
Os autores dedicam este trabalho a Raymond Damian, extraordinário cientista que, vislumbrando
as potenciais consequências imunológicas do compartilhamento antigênico entre parasitos e seu
hospedeiros, criou o conceito de “mimetismo molecular”, no início dos anos 60.
Resumo
No presente artigo, discorremos sobre o fenômeno da resposta imune a agentes patogênicos, sob a ótica
do desafio da manutenção da tolerância aos auto-antígenos (auto-Ag), que porventura se assemelhem
a antígenos (Ag) microbianos e parasitários, em caso de infecção. Para tal, usamos uma abordagem
holística utilizando ferramentas de bioinformática aliadas ao crescente corpo de informação disponível
sobre o genoma e proteoma dos diferentes organismos que habitam nosso planeta. Concluímos que,
embora o compartilhamento de Ag entre patógenos e seus hospedeiros seja lugar comum, tal fenômeno
não constitui, via de regra, um risco para a indução de doenças auto-imunes em presença de mecanismos
íntegros de regulação da resposta imune.
Correspondência: Yuri Chaves Martins, Cláudio Tadeu Daniel-Ribeiro, Instituto Oswaldo Cruz – Fiocruz,
Laboratório de Pesquisas em Malária, Av. Brasil 4365, Pavilhão Leônidas Deane, 5º andar 21045-900 Rio
de Janeiro RJ, Tel/Fax: (21) 3865-8145, E-mail: yuri@ioc.fiocruz.br, ribeiro@ioc.fiocruz.br
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Abstract
In the present paper, we consider and discuss the phenomenon of immune response to pathogens,
from the perspective of the challenge of maintaining immune tolerance to self-antigens (self-Ag), that may
resemble microbial and parasitic antigens (Ag), in case of infection. We use a holistic approach using
bioinformatics tools allied to the growing amount of information available about the genome and proteome
of different organisms. We conclude that, although the Ag sharing between pathogens and their hosts is
a common place, the induction of autoimmune pathology as a result of infection, is not an usual risk in
the presence of intact mechanisms of immune response regulation.
Introdução sobre a identidade texto. Pode ser que sua mesa tenha uma
protéica entre os organismos (ou a jarra para água, feita de cerâmica, como
redundância de proteomas) como o ornamento trazido de uma viagem à
decorrência da evolução genética Amazônia, ou de vidro, como aquele que
cobre o tampo da mesa ou o que inte-
Somos todos feitos das mesmas coisas... gra a lente que há em seu porta-lápis,
igualmente feito de madeira... ou de aço.
Para construir os objetos de que Do mesmo modo, os seres vivos
nos servimos, desde as mais primitivas que habitam o planeta são feitos de um
ferramentas manufaturadas no paleo- conjunto finito de estruturas e substân-
lítico superior até os tempos atuais, o cias redundantesI. Quando falamos de
homem se utiliza de um conjunto finito redundância no nível molecular não nos
de materiais. Assim, se o leitor olhar referimos à composição básica de todos
para qualquer objeto ao seu alcance organismos em proteínas, açúcares e
visual perceberá que a matéria de que lipídios, mas sim ao fato de que grande
é feito também compõe a estrutura de parte das diversas estruturas formadas
outros elementos à sua volta. A cadeira por esses componentes básicos também
na qual provavelmente está sentado foram conservadas durante o curso de
pode ser feita de madeira, o mesmo evolução dos diversos seres vivos e al-
material, possivelmente, da mesa na gumas delas podem estar presentes em
qual repousa este artigo. A caneta que todos ou na grande maioria destes.
usa para tomar nota também terá, em
I O objetivo da comparação não é, obviamente,
sua composição, o plástico de que é, induzir o leitor à uma visão criacionista da origem
parcialmente, composto o computador das coisas, não é nossa praia. A proposta é apenas
(no qual se encontra o arquivo PDF des- ilustrar que, assim como o homem faz, devido a
forças econômicas, com os objetos que manufa-
te documento), que igualmente terá em tura, as forças evolutivas também tendem a fazer
sua estrutura o mesmo aço que compõe com que a natureza mantenha e reaproveite os
a pulseira de seu relógio que pode, en- materiais e estruturas que dão certo ao longo do
tretanto, ser feita de couro, como o que tempo. Assim como o homem usa o mesmo metal
para fazer trilhos de trem, chaves de fenda, agulhas
forra o assento da cadeira. Terão, ainda, e estrutura de prédios, porque este é um material
composição similar entre si o carpete durável e disponível em larga escala a preços
que cobre o assoalho antigo e a cortina abordáveis, a natureza também utiliza sequências
de aminoácidos parecidas para formar as partes
que, entreaberta, permite a entrada da
constantes das imunoglobulinas e dos receptores
luz necessária para a leitura de nosso de células T e de tantas outras proteínas.
62 Neurociências99:_b^QTQ6\e]Y^U^cUTU3_W^Y|z_9]e^UU>UebQ\1SQTU]YQ>QSY_^Q\TU=UTYSY^Q
Tal ocorrência está de acordo com danças estruturais por um lado e forças
uma moderna “teoria da evolução”II, que que tendem a preservar o genoma e,
defende que os organismos evolucionam consequentemente, o proteoma dos dife-
através do acúmulo sucessivo de mu- rentes organismos, a pergunta que deriva
tações em seu genoma, que acaba por naturalmente dessas observações é qual
gerar alterações em seus proteomas, seria o grau de homologia estrutural entre
com consequentes mudanças em sua os diversos organismos vivos conhecidos.
capacidade de metabolizar e gerar novos A realização de estudos comparan-
açúcares e lipídios. Estas, caso constitu- do o conjunto de genes (genomas) e de
am uma vantagem evolutiva, são passa- proteínas (proteomas) que compõem
das aos seus descendentes. Contudo, na os organismos de diferentes espécies
maioria das vezes, as mutações ocorrem é possibilitada pelo desenvolvimento
ao acaso e não resultam em nenhuma al- de ferramentas de bioinformática e se-
teração significativa ou geram consequên- quenciamento genético, e nos permite
cias desvantajosas para a evolução do responder a essa pergunta. O grau de
organismo (uma desvantagem evolutiva), homologia entre proteomas diferentes é
que tenderia, então, a se extinguir. Des- uma medida da semelhança estrutural
se modo, os organismos vivos tendem entre dois organismos e a comparação
à manutenção de seu próprio código dos proteomas (e genomas) de orga-
genético, que se terá provado funcional nismos considerados filogeneticamente
ao longo de sua evolução, e desenvolvem próximos possibilita a inferência do grau
mecanismos para evitar que mutações de parentesco entre eles e a obtenção
ocorram em seus respectivos genomas. de indícios da existência de algum an-
Uma descrição detalhada dos diversos cestral comum em suas origens [3]. A
mecanismos que garantem a manutenção quantidade de estudos desse tipo está
do código genético e dos que geram varia- crescendo com o aumento do número de
bilidade de uma maneira controlada está genomas sequenciados disponíveis nos
além do escopo do presente artigo. Po- bancos de dados e com a disponibilida-
demos citar, entretanto, o mecanismo de de das ferramentas de bioinformática
correção de erros na replicação do DNA necessárias para realização desse tipo
existente em algumas formas da enzima de análise [3-6].
DNA polimerase como um mecanismo de Por exemplo, a análise do proteoma
manutenção da integridade genética e o humano após o sequenciamento do nos-
sexo como um mecanismo de geração de so genoma revelou que menos de 1%
variabilidade [1,2]. das nossas proteínas são encontradas
Como há um equilíbrio evolutivo entre exclusivamente na nossa espécie [3],
forças que estimulam variabilidade e mu- ou seja, foi possível encontrar proteínas
com grau de homologia suficiente para
II A moderna teoria da evolução denota a combinação se estabelecer parentesco com outras
da teoria da evolução das espécies por meio de
seleção natural proposta pelo naturalista britânico
espécies conhecidas em mais de 99%
Charles Robert Darwin (1809-1882), a genética dos casos. Isso não quer dizer que po-
como base para a herança biológica descrita pelo demos encontrar proteínas idênticas às
monge agostiniano, botânico e meteorologista
nossas nos outros organismos em 99%
austríaco Gregor Johann Mendel (1822-1884) e a
genética de populações. dos casos, mas que 99% das proteínas
Neurociências99:_b^QTQ6\e]Y^U^cUTU3_W^Y|z_9]e^UU>UebQ\1SQTU]YQ>QSY_^Q\TU=UTYSY^Q 63
codificadas pelo nosso genoma tem evolucionário. Por outro lado, as similari-
um grau de identidade suficientemente dades protéicas (e, portanto, antigênicas)
grande com alguma proteína existente no caso de seus hospedeiros dotados de
em algum outro organismo a ponto de um sistema imune com capacidade de
podermos ter um grau elevado de certeza resposta imune adaptativa específica e mi-
de que elas tiveram um ancestral comum crorganismos infecciosos (os Schistosoma
no passado. O grau de identidade protéica ou a Fasciola hepatica) podem ser úteis
se acentua com a proximidade evolutiva para o estudo e o entendimento do grau
das espécies. Desse modo, quando de sucesso ou insucesso da relação de
comparamos o proteoma do camundongo parasitismo que essas espécies mantém
(Mus musculus) com o humano, 80% das entre elas. Essa questão foi, inicialmente,
proteínas possuem um único ortólogoIII averiguada com o auxílio de ferramentas
no nosso proteoma e vice-versa. Dentre imunológicas que permitem estudar a se-
essas proteínas, o grau de identidade melhança dos constituintes de diferentes
na sequência primária de aminoácidos organismos sob o ponto de vista de sua
é 70,1% (mediana igual a 78,5%), um antigenicidade (falamos, então, de antíge-
grau de identidade bastante alto que nos e determinantes antigênicos, em vez
reflete o fato de serem ambos os orga- de em proteínas e sequências de amino-
nismos mamíferos [4]. Contudo, quando ácidos). Contudo, ela também pode ser
comparamos nosso proteoma com o do estudada com o auxílio das metodologias
chimpanzé (Pan troglodytes), considerado que nos possibilitam a comparação de
nosso parente mais próximo na escala proteomas entre os diferentes seres vivos.
evolutiva, observamos que em torno de Tal abordagem, nova e elegante, nos per-
92% das proteínas possuem um único mite tratar de paradigmas da imunologia,
ortólogo no nosso proteoma [5] e estas como compartilhamento de antígenos (Ag)
são extremamente semelhantes, sendo (antigen sharing) e mimetismo molecular
29% delas idênticas em sua sequência (molecular mimicry) e suas potenciais im-
primária de aminoácidos e a grande maio- plicações para a manutenção da tolerância
ria das demais diferindo em apenas um aos nossos próprios constituintes (próprio
ou dois aminoácidos [6]. ou self) e para a prevenção do desenvolvi-
Se tais metodologias permitem inferir, mento de autoimunidade.
a partir das semelhanças genômicas e
proteômicas, a proximidade filogenética O Mimetismo molecular (molecular
de duas espécies, elas também facultam mimicry) e a hipótese da rainha
a realização de estudos sobre o sucesso vermelha (the red queen hypothesis)
ou insucesso adaptativo da relação de
parasitismo que microorganismos podem
manter com organismos vertebrados. Se- Most people are other people.
melhanças proteicas entre a samambaia, Their thoughts are someone
a bananeira, a vaca, o chimpanzé e o ho- else’s opinions, their lives a mimicry,
mem são informativas sob o ponto de vista their passions a quotation. (Oscar Wilde)
5QRUYHJLXV
80 5QRUYHJLXV
GH+RPRORJLD
7UXEULSHV
0PXVFXOXV 0PXVFXOXV
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5QRUYHJLXV 0PXVFXOXV
0PXVFXOXV 7UXEULSHV
7UXEULSHV 5QRUYHJLXV
40 40
20 20
0 0
1-10 1 1-100 1-10 1 1-100
E-value E-value
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um valor específico que eleve ao máximo mos capazes de, ao entrar em contato
possível a sensibilidade e especificidade com os mais diversos microrganismos e
dessa metodologia para identificar prote- substancias estranhas ao corpo, produzir
ínas que podem exercer mimetismo. Do resposta imune contra Ag externos, evita-
mesmo modo, não há uma ferramenta mos produzir respostas imunes danosas
ou abordagem de bioinformática perfeita contra componentes próprios (self).
para identificar potenciais proteínas mi- Por exemplo, as estruturas de car-
méticas em todos os casos. Na realida- boidratos A, B, H – Lewis, que no homem
de, as diferentes abordagens podem ser correspondem a Ag de grupos sanguíne-
utilizadas de maneira complementar e os, e suas respectivas glicosiltransfera-
os critérios e controles utilizados devem ses, estão presentes em vários (macro
variar de acordo com as características e micro) organismos incluindo diversas
dos proteomas comparados e com os espécies de mamíferos, pássaros, rép-
objetivos da comparação. teis, invertebrados, fungos saprófitas e
patogênicos, helmintos e plantas. Estão
A Comunidade Antigênica (somos presentes também em bactérias de nos-
todos feitos dos mesmos so tubo digestivo. Não é por outra razão
antígenos...) e sua implicação como que os humanos desenvolvem, desde
risco de ruptura da tolerância a auto- a mais tenra idade, o que imunogene-
antígenos ticistas e hemoterapeutas chamam de
“aglutininas (anticorpos aglutinantes)
A good imitation is the most regulares” contra os Ag A e B do sistema
perfect originalityVI AB0 de forma inversa à presença dos Ag
desse sistema que portamos em nossos
Um paradigma da imunologia é a glóbulos vermelhos. Em outras palavras,
noção de que o sistema imune possui esses Ac, ditos regulares (que todos
mecanismos que impedem a formação temos e permitiram a LandsteinerVII a
de respostas imunes contra estruturas descoberta dos grupos sanguíneos AB0
ou Ag do próprio organismo [45]. Esse no início do século passado), são, na
fenômeno, que resulta de um mecanismo verdade, resultado da imunização a que
ativo (e não da ausência de resposta), nos submetemos, ainda bebês, comendo
e é chamado de tolerância imunológica, comida “suja”. A E. coli do sorotipo 86
ocorre tanto em nível central (órgãos lin- tem a mesma especificidade (os mesmos
fóides primários) quanto em nível periféri- determinantes antigênicos da substância
co (órgãos linfóides secundários e todos H, em cima da qual se constroem as
os outros tecidos do corpo) e impediria especificidades A e B do sistema AB0.
nossa autodestruição [46].
Quando os mecanismos de tolerância VII Karl Landsteiner (1868-1943), médico e biologista
estão funcionando a contento, permane- austríaco, distinguiu, em 1900, os grupos san-
guíneos ABO, graças a existência das aglutininas
cemos em um estado de homeostase regulares no soro dos indivíduos, desenvolvendo
no qual, ao mesmo tempo em que so- a classificação moderna de grupos sanguíneos e
possibilitando a transfusão sanguínea. Ele também
VI Maxima de Voltaire. Retirada do artigo de Elde NC & identificou, com Alexander S. Wiener em 1937, o
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70 Neurociências99:_b^QTQ6\e]Y^U^cUTU3_W^Y|z_9]e^UU>UebQ\1SQTU]YQ>QSY_^Q\TU=UTYSY^Q
Quando nascemos, nenhum de nós tem podem envolver tanto a produção de auto-
Ac anti-A ou anti-B. Entretanto, se formos -anticorpos (auto-Ac) quanto a geração de
do grupo sanguíneo A teremos Ac anti-B, células auto-reativas que podem resultar
assim como teremos Ac anti-A, se formos em destruição tecidual e mesmo em do-
B, e anti-A e anti-B se formos do grupo 0. enças auto-imunes [48].
Mas não teremos nenhum desses Ac se Um dos mecanismos propostos
formos do grupo AB, do mesmo jeito que para explicar a quebra da tolerância imu-
não teremos Ac anti-A sendo do grupo A nológica é justamente a exposição do
ou anti-B, sendo do grupo sanguíneo B. organismo a Ag externos (presentes em
Essa recusa do organismo em pro- microrganismos com os quais dividimos o
duzir os Ac correspondentes aos Ag que espaço que ocupamos no planeta) seme-
temos presentes em nossos glóbulos lhantes, sob o ponto de vista estrutural
vermelhos revela a ocorrência de meca- ou conformacional, a Ag do próprio indiví-
nismos de manutenção da tolerância aos duo (e dotados de capacidade de reação
constituintes de nosso próprio organismo cruzada com estes). Assim a lista, que já
(os imunologistas os chamam de auto-Ag) sabemos grande, de Ag comuns a hospe-
cuja descrição foge ao escopo do presen- deiros e parasitos (ou parasitos vestidos
te trabalho. A existência de tais meca- com roupagens de seus hospedeiros)
nismos foi, entretanto, reconhecida por pode representar também um inventário
Ehrlich em 1900 [47]VIII e descrita com o de perigos e riscos contra os quais nosso
sugestivo nome de “Horror autotoxicus”. organismo deve estar permanentemente
Contudo, (embora não saibamos vigilante com o objetivo de zelar para que
exatamente o porquê em todos os ca- nenhuma resposta auto-imune dê origem
sos) algumas vezes esses mecanismos a uma situação de auto-agressão e até,
de tolerância são rompidos e acabamos eventualmente, de doença.
produzindo reações imunes contra Ag Há, de fato, situações em que, ape-
próprios, em um fenômeno denominado sar do “bom senso imunológico” ou, por
de auto-imunidade. Reações auto-imunes alguma razão, justamente por falta dele,
o hospedeiro desenvolve uma resposta
VIII Preocupado (na realidade) com o destino de imune contra Ag compartilhados, mesmo
glóbulos vermelhos em caso de hemorragia intra- sob risco de desenvolvimento de uma
-abdominal, o bacteriologista alemão Paul Ehrlich
resposta auto-imune que pode acabar
(1854-1915) injetou, no peritônio de cabras sa-
dias, hemácias provenientes de outras cabras ou engendrando uma patologia auto-imune.
de animais de outras espécies e constatou que Exemplos concretos são os Ac contra a
tal procedimento dava origem, na cabra “experi- proteína M estreptocócica do tipo 5, pro-
mentada”, ao surgimento de Ac dirigidos contra
duzidos durante a infecção da orofaringe
hemácias do animal doador. Ehrlich surpreendeu-
-se, entretanto, ao descobrir que tais Ac não eram por Streptococcus pyogenes β hemolí-
produzidos quando o animal doador era a própria ticos do grupo A que reagem contra Ag
cabra. Ehrlich concluiu no artigo original em alemão presentes nas válvulas cardíacas (miosi-
que “o organismo tem mecanismos eficazes que
impedem que a reação imunitária, tão facilmente
na cardíaca) [49] e causam a cardite reu-
induzida por toda sorte de célula, de reagir com mática; os produzidos durante a infecção
constituintes do próprio organismo, dando lugar à pelo HTLV-1 contra a proteína viral HTLV-
aparição de auto-toxinas... somente quando esses
1-tax que reagem cruzadamente contra a
mecanismos de regulação interna não estão mais
intactos, pode haver (um) perigo. proteína ribonuclear nuclear heterogênea
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Revisão
Resumo
Este capítulo revê alguns aspectos fundamentais do conhecimento atual sobre como o Sistema Nervoso
está organizado e funciona. A revisão tem como ponto de partida a singularidade do nosso presente con-
hecimento sobre o Universo, a Vida e a Consciência. Em seguida, a organização morfológica e funcional do
Sistema Nervoso é apresentada em grandes pinceladas sobre suas funções, sua macroestrutura e seus
componentes celulares. Como em qualquer sistema, os mecanismos pelo qual a informação é obtida,
trafega entre suas partes e é enviada para o meio exterior ao sistema, constituem uma parte fundamental
da compreensão do seu funcionamento. No Sistema Nervoso a comunicação entre os neurônios e entre
*Núcleo de Medicina Tropical, Universidade Federal do Pará, Belém/PA, Instituto de Ciências Biológi-
cas, Universidade Federal do Pará, Belém, Pará, Brasil, **Instituto de Ciências Biológicas, Universi-
dade Federal do Pará, Belém/PA, Brasil - Este artigo foi escrito a partir das conferências intituladas
“Consciência, visão e sensibilidade ao contraste” e Hipótese do Centro Dinâmico: a Hipótese de
Edelman para o substrato neural da consciência”, ministradas por Luiz Carlos de Lima Silveira, respec-
tivamente, na I e II Jornadas Fluminenses de Cognição Imune e Neural
Correspondência: Dr. Luiz Carlos de Lima Silveira, Universidade Federal do Pará, Núcleo de Medicina
Tropical, Av. Generalíssimo Deodoro 92 Umarizal 66055-240 Belém PA, Tel: (91) 3201-6819, E-mail:
luiz@ufpa.br ou luizcarlos.silveira@pq.cnpq.br
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eles e as células associadas ocorre mais frequentemente através de mensageiros químicos. A informação
neural pode também ser codificada e enviada a longas distâncias através de fibras nervosas utilizando um
processo eletroquímico – o chamado impulso nervoso.
Abstract
This paper reviews some fundamental aspects of what is currently known about the Nervous System, how
it is organized, and how it works. The starting point is the singularity of our current knowledge on three key
issues – the Universe, the Life, and the Consciousness. Then, the morphological and functional organiza-
tion of the Nervous System is presented in a large overview, encompassing its functions, macrostructure,
and cell components. As in any other system, it is crucial for the understanding how the system works, to
study how information from outside is obtained, processed, and then used to act on the external world. In
the Nervous System, communication between neurons and between neurons and associated cells more
often occurs by mediation of chemical messengers. In addition, neural information may be also coded
and sent to long distances by nerve fibers by using an electrochemical process called the nerve impulse.
Figura 1 - Los Angeles, Dezembro, 1999. Lenny Nero (Ralph Fiennes), um ex detetive
policial que se tornou um ambulante, negocia com sonhos, especificamente com regis-
tros “Squid” de experiências feitos diretamente do córtex cerebral e reproduzidos num
aparelho semelhante a um reprodutor de DVD. Esse equipamento permite que o usu-
ário experimente todas as sensações vividas pelo sujeito em que o registro foi feito.”
“Strange Days” é o título dessa película de Ficção Científica, lançada em 1995, dirigi-
da por Kathryn Bigelow e produzida e co-escrita pelo seu ex-marido James Cameron.
Estrelam Ralph Fiennes (A), Angela Bassett, Juliette Lewis (B), Tom Sizemore, Michael
Wincott, Vincent D’Onofrio e Louise LeCavalier [56]. A película é notável pela sua visão
“distópica” do futuro e a moral ambígua da maioria dos seus personagens, levando
muitos críticos a considerarem-na como um exemplo moderno de “film noir”. Os traba-
lhos realizados por alguns grupos de pesquisa no exterior, inclusive o coordenado pelo
neurocientista brasileiro Miguel Ângelo Laporta Nicolelis (1961-) um dia permitirão que
esse tema clássico da Ficção Científica entre para a realidade da Ciência: o registo e
reprodução da experiência cerebral humana [57,58]. Fontes das ilustrações: [59,60].
Todos os direitos reservados.
A B
Figura 2 - A. O sistema nervoso central está bem protegido contra pequenos traumas
por sua localização dentro da caixa craniana e do canal vertebral. As únicas porções do
sistema nervoso central localizadas fora dessa proteção são as retinas, as quais são
partes de uma região do cérebro chamada diencéfalo e que durante o desenvolvimen-
to ocupam localização fora do crânio para formar a túnica interna do globo ocular. B.
Grandes divisões do sistema nervoso central: 1) hemisférios cerebrais, compreendendo
o córtex cerebral e os núcleos cinzentos da base do cérebro; 2) diencéfalo, compre-
endendo tálamo, hipotálamo e outros núcleos menores; 3) mesencéfalo; 4) ponte;
5) cerebelo compreendendo o córtex cerebelar e os núcleos cinzentos profundos do
cerebelo; 6) bulbo raquidiano; 7) medula espinhal. O mesencéfalo, a ponte e o bulbo
raquidiano constituem o tronco cerebral. Fonte da ilustração: [61]. Copyright © 1996,
Appleton & Lange. Todos os direitos reservados.
O Sistema Nervoso pode ser estu- que precisam ser definidos e aplicados
dado do ponto de vista da Análise de à entidade que está sendo estudada,
Sistemas, um ramo da Engenharia, Ma- são sinal e sistema. Um sinal é uma
temática e Teoria da Informação. Nessa quantidade física mensurável que varia
ciência, os elementos fundamentais no espaço, no tempo ou noutro domínio,
88 Neurociências99:_b^QTQ6\e]Y^U^cUTU3_W^Y|z_9]e^UU>UebQ\1SQTU]YQ>QSY_^Q\TU=UTYSY^Q
sendo representado por uma função de do meio externo ou do meio interno chega
uma variável dependente em relação às pelo sistema sensorial; os sistemas sen-
variáveis independentes que representam sorial, intrínseco e cognitivo influenciam
o domínio de interesse [29]. Um sistema o sistema motor; e a saída deste é a
é um conjunto de relações causas-efeitos via final comum para o comportamento
entre dois ou mais sinais – os sinais iden- do indivíduo. O sistema sensorial pode
tificados como causas são chamados de influenciar diretamente o sistema motor
inputs ou excitações enquanto os sinais e gerar respostas reflexas, as influências
identificados como efeitos são chamados exercidas pelo sistema cognitivo sobre o
outputs ou respostas [29]. Uma forma sistema nervoso são importantes para
comum de representar um sistema é um gerar respostas voluntárias enquanto as
diagrama em blocos, um fluxograma que influências exercidas pelo sistema intrín-
sistematiza a maneira como a informação seco atuam como sinais de controle para
trafega e é modificada num determinado regular o estado comportamental. Além
sistema, como os sinais entram num disso, o fluxograma mostra a retroali-
determinado sistema e originam sinais mentação exercida pelo comportamento
de saída nesse sistema [29]. sobre o Sistema Nervoso, através de
O Sistema Nervoso pode ser es- entradas convenientemente acessíveis
quematicamente representado por um do sistema sensorial, de tal forma que
fluxograma onde os seus componentes essa retroalimentação pode ser usada
fisiológicos fundamentais podem ser visu- pelo sistema cognitivo para a percepção
alizados em ação. O fluxograma de Larry e pelo sistema intrínseco para atribuir
W. Swanson (Figura 3) consiste numa afeto (prazer, dor). O fluxograma tam-
síntese baseada nos conceitos neurofi- bém mostra a mútua influência entre
siológicos desenvolvidos pelo neurofisio- os quatro sistemas neurais. A partir de
logista e histologista espanhol Santiago um fluxograma como esse é possível
Ramón y Cajal (1852-1934, laureado desenhar-se um plano coerente para o
com o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Me- estudo da fisiologia do Sistema Nervo-
dicina de 1906) e pelo neurofisiologista, so, descrevendo a função desses seus
histologista, bacteriologista e patologis- quatro componentes principais e de suas
ta inglês Sir Charles Scott Sherrington divisões funcionais, e relacionando, na
(1857-1952, laureado com o Prêmio No- medida do conhecimento atual, forma e
bel de Fisiologia ou Medicina de 1932), função, ou seja, que funções dependem
assim como nos conceitos cibernéticos de que estruturas neurais.
do matemático americano Norbert Wiener Cada um dos sistemas mencionados
(1894-1964) e do matemático húngaro acima está organizado em arquiteturas
János von Neumann (1903-1957) [30]. diferenciadas, entre elas a arquitetura
Esse fluxograma procura captar a essên- paralela de processamento de informação
cia de como a informação chega, trafega e a organização hierárquica dos níveis de
e sai do Sistema Nervoso. Ele também controle.
procura explicitar que existem partes es- O processamento paralelo consiste
senciais, especializadas, para diversos no uso de circuitos de neurônios sintoni-
subconjuntos de funções que ocorrem no zados para diferentes domínios ou para
Sistema Nervoso: a informação provinda diferentes regiões de um mesmo domínio,
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Figura 3 - O Sistema Nervoso pode ser tratado com as ferramentas da Análise de Sis-
temas e representado por fluxogramas. Neles o fluxo de informação pode ser seguido
através de seus principais passos com maior ou menor detalhamento. No fluxograma
abaixo, o comportamento (B) é determinado pelo sistema motor (M), o qual é influen-
ciado pela informação provinda do sistema sensorial (S), pela informação oriunda do
estado comportamental intrínseco do indivíduo (I) e pela informação cognitiva (C). A
informação sensorial leva diretamente às respostas reflexas (r), a informação cognitiva
produz respostas voluntárias (v) e a informação intrínseca atua como sinal de controle
para regular o estado comportamental (c). A saída do sistema motor (1) produz o com-
portamento cujas consequências são monitoradas pelo retroalimentação sensorial (2).
Esta pode ser usada pelo sistema cognitivo para a percepção e pelo sistema intrínseco
para gerar afeto. Fonte da ilustração: [30]. Copyright © 2008, Elsevier Science. Todos
os direitos reservados.
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Figura 4 - Os sistemas sensoriais são portas importantes pelas quais a informação pro-
vinda do meio externo chega ao Sistema Nervoso. No ser humano, o sistema sensorial
somático é um dos mais importantes. Seus receptores estão distribuídos na pele, nos
tecidos profundos e nas vísceras. A informação provinda da pele chega à Consciência
enriquecendo-a com os detalhes de como os vários estímulos estão atuando na superfí-
cie do corpo. A. Mapas de campos receptivos das quatro classes de mecanorreceptores
especializados encontrados na pele glabra humana: corpúsculos de Meissner (RA); cé-
lulas de Merckel (SAI); corpúsculos de Paccini (PC); corpúsculos de Ruffini (SAII). Meis-
sner e Merckel são receptores superficiais, com campos receptivos pequenos, enquanto
Paccini e Ruffini são receptores profundos, com campos receptivos grandes. B. Resposta
de fibras nervosas periféricas a um padrão de pontos da escrita Braille deslocado sobre a
superfície da ponta do dedo humano a uma velocidade de 60 mm/s, na direção indicada
pela seta, com mudança de 200 µm na sua posição a cada passagem. Cada potencial
de ação disparado pela fibra nervosa é representado por um ponto nos gráficos. Somen-
te as fibras nervosas associadas às células de Merckel (SAI) seguem de forma fiel o pa-
drão Braille, uma vez que possuem os menores campos receptivos e sua janela temporal
de amostragem é relativamente grande, permitindo uma resposta sustentada à estimu-
lação. As respostas das fibras nervosas associadas aos corpúsculos de Meissner (RA) e
corpúsculos de Paccini (PC), por não terem essas características, distorcem a informação
presente no estímulo. As fibras nervosas associadas aos corpúsculos de Ruffini (SAII)
pouco respondem a esse tipo estímulo. Fonte da ilustração: [62]. Copyright © 2003,
Elsevier Science. Todos os direitos reservados.
B
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D E F
dois em alguns tipos de canais de K+); oxigênios das moléculas de água pelos
os segmentos S5 e S6 formam o poro do oxigênios de carbonilas situadas ao longo
canal e possuem interposto entre eles, na do filtro de seletividade. Ao longo do filtro
conformação primária da proteína, uma de seletividade, o K+ passa com apenas
sequência de aminoácidos que forma duas das seis moléculas de água da
a região responsável pela seletividade camada mais interna de solvatação e os
iônica (Figura 10). sucessivos oxigênios das carbonilas vão
A permeabilidade e seletividade ocupando a posição das outras quatro
iônica dos vários canais foram durante moléculas de água mais internas. As
muito tempo grandes enigmas da Bio- cargas negativas de ácido aspártico situa-
física Celular. Por exemplo, a alta taxa das estrategicamente na abertura externa
transporte de K+ de dentro para fora da do canal contribuem para dirigir a saída do
célula (fK+ = 108 íons / s), próxima do K+. Em situações onde o fluxo se inverte
limite de difusão, indica que o transporte o K+ é inicialmente atraído por essas car-
ocorre através de um poro aquoso. Por gas. A razão pela qual o Na+, apesar de
outro lado, a alta seletividade, 104 vezes menor que o K+, não poder passar pelos
maior do que a do Na+, não é fácil de ex- canais de K+ é porque os oxigênios das
plicar por um processo difusional em fase carbonilas do filtro de seletividade ficam
aquosa, uma vez que os íons K+ e Na+ são muito longe do íon e não conseguem
esferas sem maiores particularidades, substituir apropriadamente a ação ele-
inclusive tendo o Na+ um raio de Pauling trostática dos oxigênios das moléculas de
menor (rNa+ = 0,95 Å; rK+ = 1,33Å). Esse água; isso impede que o Na+ se desfaça
enigma começou a ser solucionado a das moléculas de água de solvatação e,
partir dos anos noventa, mostrando-se assim, não consiga permear o filtro de
que a permeabilidade e seletividade dos seletividade. Outros estudos desse tipo
canais de K+ dependem essencialmente estão esclarecendo outros aspectos da
de suas propriedades estruturais e que fisiologia dos canais iônicos, tais como
princípios e mecanismos semelhantes a estrutura do sensor de voltagem, as
devem também determinar as proprie- alterações conformacionais que permitem
dades dos canais de Na+ e Ca++ [37-40] a abertura desses canais sob a ação da
(Figura 10). modificação do potencial de membrana,
O K+ é atraído para a abertura interna e o bloqueio que determinados canais so-
do canal por cargas negativas de ácido frem após sua abertura, de tal forma que
glutâmico estrategicamente localizadas. o fluxo iônico é subitamente interrompido
A partir daí ele percorre um estreito per- (chamado de mecanismo de inativação)
tuito até uma cavidade central, onde é [41-45].
estabilizado eletrostaticamente pelas Em resumo, a modificação do po-
moléculas de água de solvatação e pelos tencial de repouso neuronal, quando
dipólos formados pelas hélices do poro. levada além de um determinado valor
A passagem pelo filtro de seletividade – o chamado potencial limiar – dispara o
só é possível pela perda da maioria das impulso nervoso, uma variação de gran-
moléculas de água, a barreira energética de amplitude no potencial de membrana
enorme que se opõe a esse processo que se propaga ao longo de seus pro-
sendo vencida pela substituição dos longamentos [35]. Esse é um fenômeno
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