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AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM E TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: O

PAPEL DA MULTIMODALIDADE EM INTERAÇÕES DIALÓGICAS

Autora: Silvia Aparecida Canonico


Orientadora: Prof.ª Dra Alessandra Del Ré

RESUMO

O Transtorno do Espectro Autista é um transtorno do neurodesenvolvimento que, em


geral, acarreta comprometimentos no domínio da linguagem e da interação social, além de
alterações no padrão de comportamento. Visto que o atraso ou mesmo a ausência da produção
de fala é uma condição recorrente desse quadro, temos por objetivo mostrar a forma
diferenciada de uma criança autista estar e se desenvolver na e pela linguagem. Para isso,
serão analisados dados de observação e gravação de G., uma criança autista, que, embora não
produza uma fala que seja reconhecida enquanto tal por seus interlocutores, comunica-se, em
situações dialógicas, por meio de recursos multimodais singulares. Pautados por uma
abordagem de natureza qualitativa e longitudinal, os dados têm sido coletados a partir de
relatos familiares e gravações de vídeo bimestrais de uma criança autista dos 5 aos 6,4 anos
em cenas de interação familiar. Com base em nossas observações, partimos da hipótese de
que os recursos multimodais contribuem para o desenvolvimento da linguagem e a inserção
de sujeitos com TEA no processo comunicativo. A fundamentação teórica se ancora na
perspectiva dialógico-discursiva, a partir dos trabalhos de Bakhtin e do Círculo (Del Ré et al,
2014; Del Ré et al, 2021), nos conceitos de multimodalidade propostos por McNeill (1985),
Cavalcante (2008) e Ávila Nóbrega (2010); bem como nos pressupostos sobre atenção
conjunta propostos por Tomasello (2003). Os resultados iniciais das análises demonstram que
as ações comunicativas da criança precisam ser interpretadas a partir de uma mescla de
componentes multimodais – olhar, gestos e produção vocal –, o envelope multimodal (Ávila
Nóbrega, 2010).

1 INTRODUÇÃO

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um transtorno do neurodesenvolvimento


que, em geral, acarreta comprometimentos no domínio da linguagem e da interação social,
além de alterações no padrão de comportamento. Com o crescimento do número de crianças
diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista, muitas pesquisas e trabalhos têm se
voltado para estudar as dificuldades impostas por essa condição, principalmente, em relação
ao comprometimento na manifestação da linguagem.
Nessa perspectiva, vale pontuar que embora haja classificações quanto aos níveis de
severidade do quadro autístico, estas se apresentam de formas particulares em cada criança.
Dessa forma, em relação à linguagem, especialmente, há sujeitos que não possuem desvio
nenhum, enquanto outros têm déficits severos na expressão tanto da linguagem verbal quanto
da não verbal.
À vista das dificuldades decorrentes desse espectro, emergem alguns questionamentos
que precisam ser investigados: De que forma esses indivíduos se comunicam, dados os
problemas cognitivos que muitos apresentam? Se não há fala, ou se esta for ininteligível, é
possível estabelecer uma comunicação por meio da linguagem multimodal, mesmo que a
compreensão dos gestos e mesmo seu emprego não sejam convencionais?
Perante esse quadro, temos por objetivo, investigar a aquisição da linguagem de uma
criança com TEA, tendo como foco a observação dos recursos multimodais empregados em
situações de interação dialógica. Para tanto, a partir de uma abordagem de natureza qualitativa
e longitudinal, analisamos os movimentos linguageiros dessa criança que, diagnosticada com
autismo em grau severo, ainda não se manifesta pela fala. Os dados têm sido coletados a partir
de relatos familiares e de gravações bimestrais entre o período dos 5 ao 6;4 anos em cenas
naturalísticas de interação familiar.

2 JUSTIFICATIVA E RELEVÂNCIA DO TEMA DA PESQUISA

Os trabalhos sobre o Transtorno do Espectro Autista, em boa parte, descrevem as


limitações e falhas que afetam o desenvolvimento das crianças e sujeitos com essa síndrome.
Por outro lado, há um número expressivo de pesquisas que apresentam outros enfoques sobre
a questão, dialogando com aportes teóricos de diversas áreas do conhecimento científico,
trazendo assim novas perspectivas para o enfrentamento e superação de muitas das
dificuldades impostas por essa condição.
De modo semelhante o faz a área de Aquisição da Linguagem, realizando interfaces
com disciplinas como a Linguística, Pedagogia, Psicologia, Fonoaudiologia entre outras. Por
meio dessa interdisciplinaridade e de estudos já fundamentados, aplicados à aquisição da
linguagem infantil, oferece possibilidades de ampliar as investigações sobre a forma como a
criança com TEA se insere na linguagem, já que esse aspecto se apresenta como uma
condição central para indicar a gravidade desse transtorno do neurodesenvolvimento.
Nessa perspectiva, os pressupostos teóricos da abordagem multimodal da linguagem,
que têm se mostrado um caminho promissor para entender como ocorre a comunicação gesto-
fala em crianças típicas, assume essencial importância para analisar a comunicação
estabelecida por aquelas com TEA.
Assim, como fundamentação teórica, a análise dos dados se ampara na abordagem
dialógico-discursiva, a partir dos trabalhos de Bakhtin e do Círculo (Del Ré et al, 2014 a e b,
Del Ré et al, 2021), nos conceitos de multimodalidade propostos por Kendon (1988), McNeill
(1985), Cavalcante (2008) e Ávila Nóbrega (2010); e nos pressupostos sobre atenção conjunta
propostos por Tomasello (2003). Os resultados iniciais demonstram que as ações
comunicativas da criança precisam ser interpretadas a partir de uma mescla de componentes
multimodais (olhar, gestos e produção vocal), o envelope multimodal (Ávila Nóbrega, 2010).

3 SUBSÍDIOS TEÓRICOS: TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA –


CONCEITUAÇÃO E CARACTERÍSTICAS

Desde a primeira descrição do autismo pelo pediatra e psiquiatra Leo Kanner (1943),
as concepções e descrições sintomáticas que englobam esse diagnóstico têm sido um campo
profícuo de controvérsias. São polêmicas que ainda se instauram, especialmente, no que se
refere às revisões do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM –
Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders), cujas alterações quanto aos conceitos,
critérios e enquadramentos, referentes aos transtornos mentais, são objetos de inúmeras
discordâncias.
Esse material, publicado pela American Psychiatric Association (APA), é elaborado
por uma equipe de pesquisadores e especialistas da Divisão de Pesquisa da APA como um
guia de referência, com o objetivo de respaldar os diagnósticos dos profissionais da área.
Atualmente, em sua quinta versão – DSM-5 (APA, 2014), é o referencial a ser adotado em
consonância com a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas
Relacionados à Saúde – CID-11, outro sistema de codificação para diagnósticos, realizado
pela Organização Mundial de Saúde (OMS) (FERNANDES, TOMAZELLI, GIRIANELLI,
2020).
Com essa reformulação, as limitações no domínio da linguagem, que faziam parte de
uma tríade de comprometimentos, passaram a ser um indicador dos níveis de gravidade do
espectro. Dessa forma, mesmo que tenha sido desvinculado dessa tríade, o uso expressivo e
funcional da linguagem ainda é um aspecto primordial para identificar o autismo. Nesse
sentido, a análise é centrada no uso pragmático da linguagem, especialmente, quanto à sua
compreensão e adequação ao contexto (FERNANDES, TOMAZELLI, GIRIANELLI, 2020).
Assim, de acordo com o DSM-5 (APA, 2014, p. 50-51), observa-se uma díade de
sintomas, a partir de alguns critérios que melhor definem a especificidade diagnóstica do
autismo. O primeiro critério predominante relaciona-se às deficiências persistentes na
comunicação e interação social, que acarretam limitações na reciprocidade social e emocional,
nos comportamentos de comunicação verbal e não verbal em interações, e dificuldades em
entender e adaptar o comportamento às situações e convenções sociais. Já o segundo critério
diz respeito aos padrões restritos de comportamento, interesses e atividades. Nesse caso, a
criança ou sujeito autista realiza movimentos repetitivos e estereotipados corporais, apresenta
interesse restrito em objetos ou atividades, apego a rotinas, padrões de comportamentos
ritualísticos, e reações acentuadas ou mínimas a estímulos sensoriais.
Como é possível notar, os sintomas podem se manifestar pela combinação de critérios
muito diversos e com limites difusos, visto que ocorrem em um contínuo. É frequente, por
exemplo, que sujeitos com TEA apresentem deficiência intelectual e/ou transtorno de déficit
de atenção/hiperatividade (TDAH), ou outros (APA, 2014).
Consoante o referencial DSM-5, a avaliação da gravidade do espectro autista é
definida em três níveis que indicam o grau de apoio necessário em cada domínio de sintomas.
De acordo com a gravidade do quadro e a necessidade de apoio, os níveis de severidade
correspondem aos seguintes indicadores: nível 1 “exige apoio”, nível 2 “exige apoio
substancial, e nível 3 “exige apoio muito substancial” (APA, 2014, p. 52).
Essas divisões de severidade demonstram que conforme o estado de comprometimento
em que se encontra a criança, maior ou menor é sua autonomia e necessidade de apoio.
Ademais é importante pontuar que, no referido DSM, esse quadro não é estanque, pois esses
níveis podem variar de acordo com o contexto e com o decorrer do desenvolvimento.

3.1 SUBSÍDIOS TEÓRICOS: AUTISMO E LINGUAGEM

Falar sobre a linguagem e a comunicação do sujeito autista é se adentrar em campo


rico de abordagens e pesquisas instigantes, mesmo que muitas possuam vieses divergentes
quanto à etiologia, características e tratamentos. Dessa forma, embora consideremos
importantes todos esses trabalhos, o norte para as descrições aqui relacionadas, pautam-se
pelas conceituações elaboradas pelo DSM-5 (APA, 2014).
Cabe então ressaltar que, independente do grau de comprometimento do TEA, as
dificuldades no desenvolvimento e uso da linguagem demonstram-se especialmente
preocupantes, porque interferem na comunicação e interação social. Ademais, esse fato
delimita a autonomia, a vida funcional e emocional dos sujeitos autistas, pois além de se
manifestar como prejuízos de compreensão e de uso pragmático da linguagem, pode indicar
outras comorbidades ou problemas associados.
Tão típica se configura essa característica, que as defasagens da linguagem, associadas
à presença ou ausência de comprometimento intelectual, são consideradas um especificador
da gravidade do quadro, segundo o DSM-5. De modo intrínseco, evidencia-se que os déficits
persistentes nos domínios da comunicação e da interação social, estão, necessariamente,
relacionados ao uso da linguagem pragmática em contextos diversos. Esse aspecto se
evidencia, em geral, por duas características recorrentes: inabilidade em agir ou adequar o
comportamento às situações sociais, e dificuldades quanto à compreensão e uso da linguagem
verbal e não verbal na comunicação.
As falhas no âmbito da reciprocidade socioemocional, que interferem na compreensão
das regras sociais, podem se manifestar por comportamentos peculiares e atípicos, que
causam estranhamento em situações de interação. Por não reconhecer socioemocionalmente o
outro, o sujeito autista pode agir de maneira incomum em uma abordagem social, ter
dificuldades em estabelecer uma conversa ou em responder e iniciar diálogos, entre outros
modos de atuação, convencionais à prática comunicativa (SCHMDIT, 2017).
Já os déficits na compreensão e manifestação de elementos verbais e não verbais da
linguagem trazem obstáculos significativos no engajamento comunicativo e dialógico. Nesse
sentido, as inabilidades associadas aos recursos comunicativos extraverbais, como a falta de
atenção à linguagem gestual, ao emprego de aspectos entoacionais, à orientação corporal, à
manutenção de contato visual e às formas de atenção conjunta, são prejudiciais ao uso
funcional da linguagem (CAMPELO et al, 2009; SCHMDIT, 2017).
Além disso, é frequente a ausência e o atraso no desenvolvimento da fala, a
compreensão reduzida dos enunciados, ou a manifestação de comportamento linguístico que
se caracterize pela repetição de palavras e expressões ouvidas anteriormente – ecolalia.
Ademais, ainda que sujeitos com TEA não apresentem comprometimentos na linguagem, é
bem comum que a utilizem de forma primordialmente literal, por meio de um discurso
afetado e pouco natural (APA, 2014).
De modo a sintetizar a gama de déficits de linguagem, então, pode-se atestar que as
limitações linguísticas no autismo envolvem dificuldades de expressão e compreensão. Nesse
sentido, é usual que, na análise clínica, sejam utilizados instrumentos e protocolos para
diagnosticar a proficiência no uso da linguagem expressiva e receptiva (LAMPREIA, 2004;
SILVA; MULICK, 2009; WHITBOURNE; HALGIN, 2015).
Na investigação das falhas referentes à linguagem expressiva, são analisados os
problemas relativos à comunicação não verbal e/ou verbal, aos atrasos na produção de fala, às
dificuldades funcionais de adequação da linguagem ao contexto, às ecolalias (repetições), e às
inversões pronominais entre outros (LAMPREIA, 2004). Segundo Lampreia, essa
característica pode decorrer de dificuldades que antecedem o uso da linguagem, como a
manifestação de balbucio, a imitação, e o uso significativo de objetos e o jogo simbólico.
No domínio da linguagem receptiva, observam-se os desvios no desenvolvimento das
habilidades de compreensão e do processamento de informações. Por esse aspecto,
compreende-se as limitações para assimilar os sentidos da fala, gestos, expressões faciais, e
entonação, ou seja, as dificuldades de interpretação das informações, expressas de modo
verbal e não-verbal (LAMPREIA, 2004; REIS; PEREIRA; ALMEIDA, 2016).
Pelo exposto, é perceptível que o uso pragmático da linguagem exige habilidades de
compreensão (linguagem receptiva) e de expressão (linguagem expressiva), e que essa
condição compreende outras modalidades da linguagem, como a linguagem não verbal,
aspectos entoacionais, e o contexto. É pertinente também considerar que as inadequações de
desenvolvimento das habilidades de linguagem, consequentemente, acarretam déficits
persistentes na comunicação e na interação social, falhas atualizadas como um único critério
no DSM-5.

3.2 SUBSÍDIOS TEÓRICOS: A LINGUAGEM NO AUTISMO - UMA VISÃO


DIALÓGICA-DISCURSIVA

Como descrito anteriormente, percebe-se que a linguagem da criança autista, assim


como sua constituição como sujeito, ocorre de maneira muito diversificada e única, visto a
gama de características e níveis de desenvolvimento particulares a cada um.
Ainda que os prejuízos nesses domínios sejam muito expressivos e influenciem na
tomada de consciência de si mesmo e do outro, partimos da premissa de que o sujeito autista
se constitui na e pela linguagem por meio da interação social. E nesse sentido, é relevante
ressaltar que esse estar na linguagem é singular e se apresenta de acordo com o nível
desenvolvimento de cada criança, único e diferenciado em ritmo e resultados.
Nessa perspectiva, analisar os elementos discursivos de crianças com tais
singularidades e dificuldades, sob a perspectiva dialógico-discursiva, pode parecer
inicialmente uma aproximação paradoxal. No entanto, o olhar mais ampliado pelo qual se
concebe a linguagem por essa abordagem teórica, possibilita variados direcionamentos às
investigações dos movimentos linguageiros da criança.
Essa pertinência decorre, justamente, da relação entre linguagem e atividade, já que se
considera a língua em funcionamento, envolvendo a compreensão de aspectos
sociodiscursivos, que não correspondem exclusivamente à utilização de unidades linguísticas
(DEL RÉ, HILÁRIO, VIEIRA, 2021). De fato, na interação dialógica entre pais, parentes e
demais interlocutores de crianças autistas, entram em ação outras formas de linguagem, que
tomam sentido no contexto familiar.
Deste modo, por tratar da interação, discurso, papel do outro, elementos extraverbais,
contextos situacionais – pressupostos importantes para as análises pretendidas –, ancoramos
nossa abordagem nos estudos de Bakhtin e o Círculo, em associação às concepções sobre a
interação e o outro (Vygotsky, 1985), aos estudos sobre o conceito de formats de interação
(Bruner, 1984, 1997), e a trabalhos já fundamentados na aplicação desses pressupostos à
Aquisição da Linguagem. Nesse sentido, pesquisas que analisaram dados infantis à luz desses
conceitos (DEL Ré, DE PAULA, MENDONÇA, 2014; HILÁRIO, 2011; DEL RÉ,
HILÁRIO, VIEIRA, 2021), ainda que não tenham tratado do autismo, trazem subsídios
importantes para ampliar as investigações sobre o tema.
Destaque-se, então, que a linguagem da criança emerge de trocas estabelecidas com o
outro, inicialmente, o adulto, em situações de interação cotidiana (DEL RÉ, DE PAULA,
MENDONÇA, 2014). A interação com interlocutores (pais, professores, irmãos, avós), que
interpretam enunciados verbais/não verbais, movimentos, olhares, são essenciais para o
desenvolvimento de suas produções dialógicas e para a conscientização de si mesmo como
sujeito, o que, no caso da criança autista, torna-se uma ação muito necessária.
Isso ocorre porque a “interação é realidade fundamental da língua”, em uma relação
dialógica que pode se manifestar de diversas formas, como propõe Volóchinov

“Obviamente, o diálogo, no sentido estrito da palavra, é somente uma das formas da


interação discursiva, apesar de ser a mais importante. No entanto, o diálogo pode ser
compreendido de modo mais amplo, não apenas como a comunicação direta em voz
alta entre as pessoas face a face, mas como qualquer comunicação discursiva,
independente do tipo. (VOLÓCHINOV, 2017, p.219)

É importante, por conseguinte, compreender que muitos sujeitos autistas, ainda que
habitualmente desviem o olhar ou evitem o contato com o outro, buscam a atenção no espaço
da interação e da brincadeira. Nessa interação, a criança pode simplesmente ouvir,
acompanhar uma cantiga com o bater dos pés, com um sorriso, com o olhar, ou com
vocalizações. Esse relacionamento social é singular, pouco comum, mas por meio desse
movimento constante do outro em direção a ela, a criança com TEA compreende melhor a
linguagem e aprende a dinâmica do diálogo.
A consciência que se constrói pelo olhar que recebe do outro constitui-se de forma
dialógica, pois a natureza dialógica é característica da vida humana. Como pondera Bakhtin,
viver é participar de um diálogo constante e inconclusivo, que se completa pelo olhar do
outro. Segundo o autor,

A vida é dialógica por natureza. Viver significa participar do diálogo: interrogar,


ouvir, responder, concordar, etc. Nesse diálogo o homem participa por inteiro e com
toda a vida: com os olhos, os lábios, as mãos, a alma, o espírito, tido o corpo, os
atos. Aplica-se totalmente na palavra, e essa palavra entra no tecido dialógico da
vida humana, no simpósio universal. (BAKHTIN, 2011, p. 348)

Tem-se, então, que o diálogo envolve diversos meios para comunicação de anseios,
objeções e interesses, que não se ancoram exclusivamente no uso da palavra. Assim, o
discurso pode se enunciar pela participação no diálogo, que se dá também pelo próprio corpo
e atividades vividas. O diálogo que se instaura na vida, expõe a dimensão discursiva da
língua, compreendida como “uma atividade de sujeitos inscritos em contextos determinados”
(DEL RÉ, 2006, p.29) aos quais se articulam elementos verbais e extraverbais. Nesse
processo, segundo Del Ré, a aquisição da linguagem se inicia desde o nascimento e continua
ao longo da vida.
Contudo, cabe esclarecer que a dimensão discursiva não exclui a língua de seu lugar.
Bakhtin não nega a materialidade da língua, isto é, o conteúdo verbal elaborado por formas
linguísticas e gramaticais, pois a considera unidade real da comunicação verbal, configurada
em enunciados que se concretizam na relação entre falantes, em uma alternância dialógica que
pressupõe uma compreensão responsiva ativa. (BAKHTIN, 1997). Infere-se, assim, que a
língua – sistema linguístico - ganha sentido entre falantes quando posta em uso, ou seja,
proferida em enunciados concretizados em situações reais.
Sendo assim, como estender o status da língua aos casos tão particulares dos sujeitos
autistas, que muitas vezes apresentam desvios nessa habilidade? É preciso entender,
fundamentando-se por uma visão mais ampliada de linguagem, que a criança autista
desenvolve movimentos discursivos, inserida em um contexto, e que o outro com quem
interage é imprescindível nesse processo, já que se dirige a ela, utilizando uma língua que vai
ser interpretada e que suscita uma resposta.
Tendo em vista o papel exercido por esse interlocutor, é pertinente fazer referência ao
conceito de zona de desenvolvimento proximal (VYGOTSKY, 1994), pressuposto que
explicita a influência do outro mais experiente no desenvolvimento da linguagem e da
cognição da criança durante a interação. Tal pressuposto propõe que, com o auxílio de outro,
a criança possa avançar em suas potencialidades e se tornar independente, consolidando
habilidades latentes.
Sob tal perspectiva, Vygotsky propõe que há dois níveis de desenvolvimento: o nível
de desenvolvimento real, correspondente ao período em que a criança consegue realizar as
tarefas sozinha e o nível desenvolvimento proximal, correspondente ao momento em que ela
consegue realizar tarefas mais avançadas com o auxílio de um adulto ou interactante mais
experiente. A autonomia na realização das tarefas identifica o nível de desenvolvimento real,
etapa em que um ciclo de funções mentais já amadureceu. Já no estágio em que a criança
precisa do auxílio de um adulto ou alguém mais experiente para realizar suas tarefas,
identifica-se o nível de desenvolvimento proximal.
Na aquisição da linguagem é possível evidenciar esse processo, por meio da relação
entre o aprendizado e o desenvolvimento. A linguagem utilizada em situações de
comunicação se converte em fala interior, posteriormente contribuindo para a organização do
pensamento, e tornando-se função mental interna. Reportando-se a Piaget, Vygotsky atesta
que na interação com o outro, as crianças desenvolvem a fala interior e o pensamento
reflexivo, que irá propiciar a autonomia no desenvolvimento de suas ações.
Ainda, ao pensarmos no papel do contexto na aquisição da linguagem, destacamos
Bruner, cujos estudos sobre os formatos e a contribuição do adulto, assistindo a entrada da
criança na linguagem, converge em muitos pontos com o olhar bakhtiniano. Bruner (1997)
discorre que as crianças desde pequenas, e mesmo desde recém-nascidas, adentram-se na
compreensão e produção de significados, e esse processo é decorrente da interação com o
outro – interactante mais experiente – em contextos de uso da língua.
A ênfase dada ao contexto reflete-se na introdução do conceito de formats, termo
cunhado pelo autor para referir-se às situações rotinizadas de interação. Por essa concepção,
entende-se que as situações de interação trazem um formato de atuação em que se insere a
linguagem dos diálogos cotidianos (Bruner, 1984). Com o tempo, os modos de proceder nesse
“microcosmo regulado por regras em que o adulto e a criança fazem coisas com e para o
outro”1 (Bruner, 1984) são internalizados, e a comunicação que primeiramente se faz por
modos gestuais, passa a ser complementada pela linguagem verbal.
Os formatos de interação oferecem regularidades para que a criança compreenda
funções pragmáticas dos contextos de comunicação e uso adequado de formas linguísticas
apropriadas a cada situação. Para o autor, um formato implica em uma interação contingente

1
It is a rule-bound microcosm in which the adult and child do things to and with each other. (BRUNER,
1984, p. 76)
em que cada interactante realiza um ato que depende da ação do outro, que incialmente se faz
pela condução do adulto. Aos poucos, esses atos sequenciais interativos assumem atos de
falas e se tornam implícitos e generalizáveis a outros contextos maiores.
Ademais, o autor destaca que a criança é sensível a esse contexto, mesmo antes de
começar a falar, participando da interação por uma comunicação, considerada pré-verbal, por
meio de gestos, vocalizações e olhares. Esse pressuposto é importante para o estudo da
aquisição da linguagem no autismo, pois o contexto e os elementos extraverbais trazem
significações inerentes. Contudo, os gestos, como comunicação pré-verbal, podem apresentar-
se sob outra ótica nos estudos multimodais, que lhe conferem um estatuto de linguagem.

3.3 SUBSÍDIOS TEÓRICOS: MULTIMODALIDADE

As situações de interação humana requerem uma gama de elementos e condições para


que a comunicação e as semioses se construam entre os falantes. No contexto da dimensão
discursiva e dialógica, a linguagem verbal é vista como a principal forma de estabelecer esse
contato, mas não é a única.
Na interação face a face, o diálogo não depende apenas da enunciação de uma língua
verbal, estruturada em um sistema de regras sintáticas e morfológicas. O contexto, o
movimento corporal e gestual, o direcionamento do olhar, o espaço e o distanciamento entre
os interlocutores denotam posicionamentos de concordância, recusa, aceitação, interesse, isto
é, também constituem significados.
É nessa perspectiva que se observa a semiotização produzida na interação, por meio de
recursos da multimodalidade, campo de estudos que vem se ampliando atualmente,
principalmente em pesquisas referentes à comunicação da criança autista. Alinhado a essa
perspectiva, podemos citar um estudo de Cruz (2018), no qual analisa-se as relações entre
percepção do ambiente físico material e momentos de fala espontânea de crianças com TEA,
tendo como foco a utilização dos recursos multimodais em um contexto interacional.
Nesse trabalho, a autora investiga as formas como sujeitos autistas interagem com o
mundo social e constroem significados por meio da fala, gestos, corpo e do ambiente natural,
em coordenação com seu relacionamento com os outros. Reportando-se a autores que
privilegiam esse tema de estudo, destaca Goodwin (2000 apud CRUZ, 2018), cujas pesquisas
consideram o papel da ação, verbal ou não, na construção de uma série de sistemas
semióticos, orientados pelos recursos multimodais como gestos e o próprio corpo.
É relevante destacar que Goodwin (2000) analisa como a ação, dentro da interação
humana, suscita o envolvimento de todos os participantes no reconhecimento da forma e do
evento que está ocorrendo. Segundo o autor, as ações ocorrem em conjunto com a fala,
associada a diferentes recursos semióticos, como “uma gama de tipos estruturalmente
diferentes de fenômenos de signos tanto do fluxo da fala quanto do corpo, da estrutura gráfica
e socialmente sedimentada no entorno, da organização sequencial, de sistemas de atividades
abrangentes”2 (GOODWIN, 2000, p. 149, tradução nossa). Goodwin se refere a esse conjunto
de significações como campos semióticos (signos da linguagem falada, gestos e corpo,
postura e orientação corporal), que inseridos em um contexto, orientam a interação social.
Sob essa visão, a língua e elementos multimodais atuam em conjunto para os sentidos
da comunicação, sem prevalência de uma modalidade sobre a outra. Assim, tal perspectiva,
tem fundamentado os trabalhos de muitos pesquisadores, como McNeill (1985) e Kendon
(1988), que partilham da concepção de que fala e gestos desenvolvem-se simultaneamente
como partes de uma mesma estrutura psicológica.
No Brasil, muitos são os trabalhos que têm abordado a perspectiva multimodal da
língua como temas de suas pesquisas (CAVALCANTE, 2008; ÁVILA-NÓBREGA, 2010;
VEZALLI, 2012; CRUZ, 2018), partilhando da mesma concepção de que linguagem verbal e
não verbal coatuam e não são dissociáveis.
Na área da aquisição da linguagem, a autora Cavalcante (2008, 2012, 2016, 2018,
2019) tem desenvolvido um panorama fecundo nas pesquisas sobre a concepção multimodal
de língua, por meio de tipologia gestual de Kendon (1988) e dimensões gestuais de McNeill
(1992 apud CAVALCANTE, 2018). Seus trabalhos analisam a prática discursiva multimodal
em situações de interação entre mãe-bebê, tendo como enfoque os gestos, acompanhados de
vocalizações, holófrases e aspectos prosódicos. Ainda que cada trabalho priorize um
determinado aspecto da linguagem (aspectos prosódicos, holófrases, manhês), o gesto é
sempre tomado como elemento constitutivo de uma mesma matriz gesto-fala.
Ávila-Nóbrega (2010), por sua vez, tomando como premissa a mescla de ações gesto-
vocais, proposta por McNeill, acompanha a emergência da língua enquanto instância
multimodal de duas díades mãe-bebê. Em sua pesquisa, ele desenvolve a análise de três
componentes da dialogia – a mescla entre olhar, gestos e produção vocal, compondo um
conjunto que ele denominou como envelope multimodal.

No original “(e.g., a range of structurally different kinds of sign phenomena in both the stream of
2

speech and the body, graphic and socially sedimented structure in the surround, sequential organization,
encompassing activity systems, etc.).”
O envelope multimodal que o autor propõe tem o objetivo de apresentar a língua
enquanto instância multimodal em cenas de atenção conjunta. Para isso ele trabalha com um
plano de composição constituído pelas ações do olhar, gesto e produção vocal, ocorrendo de
forma concomitante. Valendo-se da teoria sobre Atenção Conjunta de Tomasello (2003), o
autor classifica os tipos de atenção, orientados pela direção do olhar; e para análise dos gestos,
ampara-se na tipologia de gestos proposta por Kendon (1982 apud ÁVILA-NÓBREGA,
2010, P.13). O plano vocal é o último componente analisado, tratando-se tanto das produções
da mãe, dirigida à criança, quanto das vocalizações do próprio bebê.
Esse quadro para descrição do envelope multimodal está representado no quadro
abaixo:
ENVELOPE MULTIMODAL DÍADE X - X MESES E X DIAS
PLANO DE COMPOSIÇÃO MÃE CRIANÇA
OLHAR

GESTOS

PRODUÇÃO VOCAL
Ávila-Nóbrega (2010, P.13)

Com a observação desses três aspectos, o autor procurou demonstrar que o envelope
multimodal emerge em contextos de interação face a face entre mãe e bebê, já a partir dos sete
meses. Em decorrência, ele conclui que a criança adquire a língua por meio da interação e do
uso da multimodalidade, tanto por ela como pela mãe ou outro interactante.
Pelos dados já descritos, pode-se observar que os recursos multimodais estão inseridos
na comunicação linguística, coocorrendo simultaneamente com diversos elementos e
configurações. Na análise da interação, o material gestual pode contribuir com a
referenciação, delimitando movimentos corporais e contribuindo para o processo cognitivo
(VEZALI, 2012). Vezali, assim como Cruz (2018), realiza estudos a partir de concepções
semelhantes, ao considerar a relevância do corpo no processo de significação e de
comunicação.
De acordo com Vezali (2012) o corpo também produz semiose, pois como veículo de
percepções sensório e motor, atua no processo de significação por meio dos gestos que o
movimentam. Os gestos de cabeça, braços ou mãos se realizam pelo movimento do corpo,
como um objeto em que se admite o encontro da língua como uma prática sociocognitiva
(MARCUSCHI, 2007; MONDADA e DUBOIS, 2003 apud VEZALI, 2012).
O autor pontua que o corpo pode traduzir significados, mas são os gestos que se
constituem como recursos semióticos, porque podem “articular-se em formas fixas vinculadas
a um sentido, exprimir ideias, apresentar estruturação gramatical em línguas de sinais, realizar
descrições pantomímicas” (VEZALI, 2012, p. 1). Ademais, para construir significados e
referenciações é preciso que haja atenção dos interactantes, visto que há um jogo de
interações múltiplas, “multiparty interaction” (NORRIS, 2016), em que a linguagem, mesmo
que seja considerada a forma mais relevante, pode limitar a atenção, se for o único elemento
observado.
Como visto, recursos não verbais como gestos, corpo e grau de atenção se articulam
aos recursos linguísticos para a construção de sentidos nos contextos interativos. Conforme o
exposto, podemos visualizar que nas observações da aquisição e funcionamento da linguagem
de crianças autistas, ainda que não haja produção de fala, sua expressividade se presentifica
pelos gestos, expressões faciais e movimentos corporais, inseridos em um contexto
interacional.

3.4 SUBSÍDIOS TEÓRICOS: CLASSIFICAÇÃO DOS GESTOS NA


COMUNICAÇÃO

Para apresentação da classificação dos gestos na comunicação, partimos da premissa


de que esses são parte de uma mesma estrutura cognitiva e atuam como formas fixas para
exprimir ideias e sentidos em conjunto com corpo, língua e contexto. Faz-se pertinente, então,
descrever como o gesto passou a se constituir com uma tipologia própria e destacar algumas
das classificações propostas por Kendon (1988), amplamente trabalhadas por Cavalcante
(2008, 2016, 2018, 2019).
Atualmente, os estudos sobre os gestos revelam a atenção dos pesquisadores em
compreender os processos cognitivos que estão por trás da fala. Decorrentes dessas
investigações, concluiu-se que os gestos e os enunciados falados estão integrados e devem ser
considerados como coproduzidos na enunciação. Nesse sentido, Kendon (1996) ressalta que
gestos não são subprodutos da fala, e nem mesmo expressão de uma modalidade anterior ao
surgimento da fala, ou seja, não representam uma pré-linguagem, como concebe Bruner.
A partir de diversos estudos desenvolvidos ao longo do tempo, os gestos passaram a
ser aplicados às pesquisas de diversas áreas e em função de cada campo de atuação. Na
Aquisição da Linguagem, os trabalhos de Cavalcante (2012, 2018), Ávila Nóbrega (2010)
trouxeram adaptações e formulações apropriadas às investigações da linguagem da criança,
com destaque para as classificações dos gestos, elaboradas por Kendon (1988) e McNeill
(1992), e estudadas por Cavalcante (2018).
Kendon (1988) sugere que nas variadas formas de gesticulação, a expressão do
conteúdo pode ocorrer por gestos e palavras, que não se apresentam necessariamente como
partes opostas. Como um contínuo, os dois recursos podem ser utilizados em conjunto para
especificar significados, eliminar ambiguidades ou até mesmo substituir parte de enunciados.
Dessa forma, o autor diferencia os gestos em quatro tipos: gesticulação, pantomima,
emblemas e língua de sinais. A gesticulação é usada em conjunto com a fala, com gestos que
auxiliam na codificação dos significados; a pantomima representa ações cotidianas, sem o uso
de fala; os emblemas são gestos convencionalmente usados por uma comunidade, a exemplo
do gesto de ok; e a língua de sinais consiste nos gestos lexicalizados da comunidade surda.
Para esta classificação, Kendon (1982 apud ÁVILA-NÓBREGA, 2010) elaborou um
continuum com a finalidade de mostrar como funciona a relação de gestos com a fala, como
podemos ver no quadro a seguir:

Continuun 1 Continuun 2 Continuun3 Continuun 4

GESTICULAÇÃO Presença obrigatória de Ausência de Não Global e


fala propriedades convencional sintética
linguísticas.
PANTOMIMA Ausência obrigatória de Ausência de Não Global e
fala propriedades convencional analítica
linguísticas.
EMBLEMAS Presença opcional de fala Presença de Parcialmente Segmentados e
algumas convencionais sintéticos
propriedades
linguísticas.
LÍNGUA DE Obrigatória ausência de presença de Totalmente Segmental e
SINAIS falas são representações propriedades convencional analítica
de ações cotidianas. linguísticas.
Kendon’scontinuuns

Tomando como base trabalhos anteriores, e já consolidados, de Cavalcante (2008) e


Ávila-Nóbrega (2010), trazemos alguns esclarecimentos que auxiliam na interpretação desse
continuum. Conforme observa Cavalcante (2008, p. 157), acompanhando visualmente o
gráfico da esquerda para a direita, nota-se que a presença obrigatória de fala diminui, a
presença de propriedades linguísticas aumenta e os gestos individuais e mais espontâneos se
tornam mais convencionalizados.
Ávila-Nóbrega (2010) atenta para alguns aspectos relevantes de cada contínuo. Assim,
no primeiro contínuo, a fala se apresenta como obrigatória durante a gesticulação a depender
de cada falante. A pantomina representa ações do cotidiano e prescinde de fala. Os emblemas,
como gestos culturais, utilizam o uso de fala ou não, dependendo de cada região. E a língua
de sinais é a linguagem própria da comunidade surda.
No segundo contínuo, as propriedades linguísticas se definem como significações
morfológicas, fonéticas e sintáticas, durante a execução de algum gesto que exija o
acompanhamento de fala. A língua de sinais, por sua vez, como ressalta o autor, já possui
significações linguísticas por sua configuração corporal e espacial.
O terceiro contínuo relaciona-se à constituição convencional ou não-convencional dos
gestos. Assim, a gesticulação individual, por ser particular de cada falante, não apresenta
características convencionais, já na pantomima esse aspecto pode variar de acordo com cada
especificidade sociocultural. Os emblemas são parcialmente convencionais, pois dependem
dos sentidos construídos pelos gestos empregados por cada grupo ou diversidade cultural. Por
fim, a linguagem de sinais – a LIBRAS – é totalmente convencional, porque pertencente à
cultura de falantes específicos.
Por último, no quarto contínuo concebe-se a referência à característica global, quando
a significação para a gesticulação se dá de forma geral, sem uma simbologia específica. Os
gestos sintéticos, ao contrário, carregam significados relacionados ao contexto de produção.
Os analíticos são mais concretos e menos metafóricos, como as pantomimas; e os
segmentados “dependem do suporte de outros elementos, pois possuem configuração, formato
e movimentos próprios” como os gestos emblemáticos (Ávila-Nóbrega, 2018, p. 69).
O detalhamento dos gestos a partir da classificação de Kendon traz aspectos
importantes para a análise dos movimentos gestuais utilizados pela criança autista, ainda que,
em alguns casos, não sejam elaborados de acordo com uma configuração tipicamente social e
convencional. Assim, também é preciso um olhar ampliado sobre o estatuto dos gestos,
adaptados a cada caso, especificamente, em relação aos sujeitos autistas que não se
manifestam pela fala.
Nesse sentido, cabe pontuarmos a concepção de fala, e para isso nos valemos das
formulações de Cavalcante (2008). Em seu trabalho, no qual analisa a linguagem multimodal
de cenas interativas entre mãe e bebê, a autora elucida que fala pode ser considerada toda
produção discursiva para fins comunicativos no plano da oralidade. Citando Marcuschi, a
autora pontua que a fala “caracteriza-se pelo uso da língua na sua forma de sons articulados e
significativos, bem como aspectos prosódicos e uma série de recursos expressivos de outra
ordem: gestualidade, movimentos corporais, mímica” (MARCUSCHI, 2005 apud
CAVALCANTE, 2008).
Por esse posicionamento, compreende-se que fala e gestos são recursos de ordem
diferentes, mas concebidos como um conjunto, pois correspondem à visão multimodal da
língua.

3.5 SUBSÍDIOS TEÓRICOS: ATENÇÃO CONJUNTA

Pelos dados teóricos já apresentados, explicitamos que a linguagem pode ser vista por
um viés mais amplo, considerando os aspectos dialógico-discursivos e as possibilidades
multimodais da língua. Também, expusemos que essas ações comunicativas são
primordialmente interativas, por relações que envolvem um ou mais interactantes que, em um
espaço compartilhado, constroem significações.
Desse modo, trataremos sobre a atenção conjunta, uma condição importante para o
desenvolvimento da cognição humana, especialmente a infantil. Para isso, teremos
embasamento, primordialmente, nos trabalhos de Tomasello (2019), nos quais, investigou-se
a competência cognitiva dos seres humanos no reconhecimento de seus parceiros
coespecíficos, como seres intencionais em cenas de atenção conjunta.
Ao trazer referências teóricas sobre a capacidade de envolvimento na atenção conjunta
pela criança, Tomasello demonstra que, nesses momentos, bebês desenvolvem aos poucos a
compreensão dos objetos do entorno, dos outros como seres intencionais e de si próprio.
Assim, o autor aponta para três competências específicas: a atenção de verificação, a atenção
de acompanhamento e a atenção direta.
A competência relacionada à atenção de verificação consiste na ação de interação
com os objetos e as pessoas do mundo ao redor. Essa atividade pode ser observada quando
bebês, aos três ou quatro meses em média, começam a manipular os primeiros objetos e a
demonstrar certa consciência sobre eles e sobre o mundo físico, orientados pelo olhar do
adulto. Essa percepção dos objetos se estende para a compreensão de que estes existem
independentemente de serem observados, de não estarem em dois lugares ao mesmo tempo e
de não se movimentarem de um para o outro (Baillaigeon, 1995; Spelke, 1992 apud
Tomasello 2019).
A segunda competência da A. C. – a atenção de acompanhamento –, relaciona-se à
compreensão de outras pessoas. Esse processo de reconhecimento do outro pode ocorrer com
os bebês desde a vida intrauterina, ao ouvirem a voz materna, até nos primeiros momentos
após o nascimento, quando podem reconhecer ilustrações de rostos humanos. Dessa forma, o
reconhecimento se estende à diferenciação de seus interactantes como seres animados, ao
contrário dos objetos.
Já a atenção direta refere-se à consciência de si mesmo, que ocorre após a
compreensão dos objetos e dos outros como entidades externas. Por essa competência
concebe-se que, ao se relacionar com o ambiente do entorno, crianças aprendem mais sobre
seus próprios comportamentos, pois precisam ajustar suas ações para alcançar seus objetivos,
reconhecendo o que são capazes de alcançar e manipular, ou recebendo ajuda para tanto.
Essas três competências específicas podem ser notadas em conjunto, aos nove meses,
etapa em que bebês já ampliam a capacidade de reconhecer o outro como seres intencionais,
tomar consciência de si, e a compreender e acompanhar a relação desse outro com elementos
presentes ao redor. A partir desse período, os comportamentos passam a ser triádicos, visto
que nessa fase já se consegue coordenar as próprias ações entre itens externos e pessoas, o que
resulta em um “triangulo referencial composto por criança, adulto e objeto, ou evento ao qual
dão atenção.” (TOMASELLO, 2019, p.85).
Por volta dessa idade, as crianças já utilizam gestos dêiticos, apontando para objetos
externos ou seguram-nos para mostrá-los para alguém, em uma coordenação triádica da
atenção entre mundo e pessoas. Segundo Tomasello assinala, os gestos dêiticos podem ser
imperativos, com o objetivo de levar o adulto a fazer algo para elas, ou declarativos, quando
há apenas o objetivo de mostrar um elemento para compartilhar atenção.
Com a finalidade de investigar a emergência do desenvolvimento cognitivo, expresso
em cenas de atenção conjunta, Tomasello, Carpenter e Nagel (1998 apud Tomasello, 2019)
realizaram um estudo com vinte e quatro crianças, dos nove aos quinze meses, envolvendo
várias medidas de atenção, incluindo a análise dos gestos. Suas observações centraram-se em
nove aspectos: envolvimento conjunto, acompanhamento do olhar, acompanhamento do ato
de apontar, imitação de atos instrumentas, imitação de atos arbitrários, respostas a obstáculo
sociais, uso de gestos imperativos e uso de gestos declarativos.
As atividades foram aplicadas em três etapas e desenvolveram-se da seguinte forma: a
primeira atividade consistia na ação de compartilhar/verificar a atenção do adulto bem
próximo (olhando para o adulto durante envolvimento conjunto); a segunda, envolvia tarefas
que exigiam o acompanhamento da atenção do adulto, dirigida a entidades distais externas
(acompanhar o olhar para esses objetos); a última tarefa exigia o direcionar a atenção do
adulto para entidades externas (apontar para que o adulto olhasse para uma entidade distal).
O quadro abaixo ilustra os três tipos de interação investigado por Tomasello (2019)
nas cenas de atenção conjunta.
Como resultado, concluíram que as capacidades de atenção conjunta progridem de
modo muito semelhante em todas as crianças, ainda que algumas demorem mais para alcançar
o nível mais elaborado. Assim, verificaram que conforme as tarefas exigiam mais produção e
participação, maior era a dificuldade de desenvolvimento.
A partir desses estudos, destacou-se então que a compreensão do outro e de si mesmo
como seres intencionais é um passo fundamental para capacitar as crianças para a
aprendizagem cultural e o reconhecimento das perspectivas de outras pessoas. Com a
internalização dos conhecimentos partilhados em cenas de atenção conjunta, desenvolve-se a
capacidade de operar com materiais simbólicos constituídos historicamente, como a
linguagem humana.
Entende-se pela relevância desses estudos que a compreensão do outro como agentes
intencionais, mediada pela coordenação triádica entre objetos, criança e pessoas, fornece uma
base sociocognitiva para a aquisição da linguagem. Para trilhar esse caminho, no entanto,
como reforça Tomasello, é preciso que haja compreensão dos significados construídos, e,
nesse sentido, as cenas de atenção conjunta fornecem fundamentação para esse processo.

4 OUTROS OLHARES SOBRE A AQUISIÇÃO DE LINGUAGEM NO AUTISMO

O Transtorno do Espectro Autista tem se expandido como campo de estudos, e


especificamente no que concerne à área da Linguística, na qual se insere essa pesquisa, muitos
trabalhos poderiam ser descritos. No entanto, a fim de respeitar a brevidade e o limite do
espaço, selecionou-se três estudos que se aproximam em relação aos objetivos e categorias de
análise.
Primeiramente, cabe mencionar o trabalho de Rêgo Barros (2011), no qual levanta-se
um questionamento sobre a visão patológica dos estudos pioneiros sobre o autismo, que
preceituavam as falhas da linguagem como não linguagem. Contrapondo-se a essa visão e
ancorada na Linguística da Enunciação benvenistiana, a pesquisadora parte da concepção da
linguagem enquanto espaço para constituição do sujeito e de subjetividades, funções que se
alcançam quando um locutor se presentifica como eu no discurso. E, no autismo, mesmo que
esse discurso seja recoberto de falhas, o sujeito emerge se for percebido como tal.
De fato, como a autora reflete, no autismo, o estar na linguagem se faz de modo
particular e pode ocorrer tanto por meio dos enunciados ecolálicos, por aqueles que
apresentam essa característica, como por reações responsivas ou ausência delas, nos casos
daqueles que não falam. Segundo Rêgo Barros, em ambas as ocorrências há uma apropriação
e transformação da língua pelo sujeito autista, no momento em que enuncia algo, ainda que
incompreensível. No entanto, essa tomada de consciência como sujeito só ocorre se assim o
for considerado por seu interlocutor.
A relação intersubjetiva eu/tu se estabelece quando o interlocutor considera as falas
ecolálicas e atribui sentido a elas, construindo uma cadeia dialógica com a criança autista. Ao
se propor como o outro que entende as vocalizações, ecolalias e movimentos linguageiros,
relacionando esses atos discursivos a um contexto ou situação partilhada por ambos, permite-
se o reconhecimento das marcas de um sujeito e seu processo enunciativo. Como pontua Rêgo
Barros “A falha na linguagem do autista encontra-se, sobretudo, na inexistência, vinda do
outro externo ao sujeito” em possibilitar a articulação de um “eu” e um tu”.
Em seguida a essa pesquisa, cabe mencionar outro trabalho dessa mesma linha teórica,
realizado por Ferreira Júnior, Azevedo e Borba (2020). Os pesquisadores revisitaram alguns
dados de dois estudos de caso da autora supramencionada (RÊGO BARROS, 2011 apud
FERREIRA JÚNIOR, AZEVEDO, BORBA, 2020), com o objetivo de analisar a construção
da categoria de pessoa e a participação no discurso pela criança autista. Tomando como base a
perspectiva enunciativa da linguagem de Benveniste (1988; 1989 apud FERREIRA JÚNIOR,
AZEVEDO, BORBA, 2020), destacaram, por meio de uma observação dimensionada, os
modos como essas crianças organizam a categoria de pessoa e instauram sua singularidade na
língua, tendo em vista a incompletude demonstrada pela fala ecolálica.
Os autores descrevem que, segundo a ótica benvenistiana, a categoria de pessoa se
relaciona à referência e à enunciação, duas instâncias que possibilitam a construção dos
sentidos e a subjetividade do sujeito. Eles explicam que a língua dispõe de formas vazias de
referencialidade, das quais o sujeito se apropria, enunciando-se como um “eu” em relação ao
“tu”, de seu interlocutor. A partir de índices de subjetividade – referentes à representação de
pessoas – evocados, no momento único e irrepetível da enunciação, efetiva-se o exercício da
língua e a referencialidade dos sujeitos.
Na base enunciativa da linguagem operam os indicadores de subjetividade,
contemplados pelas categorias que indicam pessoalidade, temporalidade, espacialidade (eu/tu
– aqui – agora). Essa base enunciativa, que se atualiza pelo emprego de índices/indicadores
específicos no discurso, é ampliada pelo agenciamento/organização das formas linguísticas,
isto é, pelos procedimentos acessórios, responsáveis pelas grandes funções sintáticas
(interrogação, intimação, asserção e as modalidades formais).
Ora, uma das questões percebidas pelos autores em relação aos dados, é que a criança
autista marca sua subjetividade de modo muito singular, por meio de procedimentos
acessórios, e não pelo exercício dos indicadores específicos do discurso. E nos enunciados
ecolálicos analisados, esse recurso transparece nos atos enunciativos das duas crianças
observadas. Um caso que ilustra bem essa condição ocorre com a reorganização das unidades
que compõem um sintagma do verso “lá na lagoa”, cantado pela interlocutora, e repetido por
uma das crianças como “a gola que na”.
Essa troca de sílabas mostra um sujeito que enuncia, ou seja, que retorna uma
enunciação em resposta à enunciação a ele dirigida, movimento que só é possível, segundo os
autores, quando há compreensão da enunciação proposta pelo outro. Ademais, ainda pontuam
que outras formas de vocalizações proferidas por sujeitos autistas representam-se como
enunciados, o que se faz, nos casos por eles analisados, por procedimentos de reorganização
das unidades linguísticas, ou seja, por meio de procedimentos acessórios.
Para finalizar a descrição dos estudos a serem expostos nessa seção, é importante
discorrer um pouco mais sobre o trabalho desenvolvido pela pesquisadora Cruz (2018), cujo
enfoque sobre a constituição da linguagem da criança com TEA, centra-se nos aspectos
multimodais e interativos. Em suas pesquisas, o contexto de interação e o envolvimento dos
interactantes que convivem com sujeitos autista têm papel primordial para a construção de
significações e inserção desses sujeitos na linguagem.
Cruz aponta que a linguagem concebida a partir de uma perspectiva multidimensional
abarca um trabalho interacional, em que experiências e ações vivenciadas comportam tanto
“uma dimensão subjetiva, relativa aos processos relacionados à constituição do self, quanto
intersubjetiva, relativas ao outro” (CRUZ, 2018, p. 180). A experiência linguístico-pragmática
do sujeito com TEA ocorre de forma colaborativa, por meio de ajustes aos diversos elementos
e (im)possibilidades comunicativas entre os interactantes.
É relevante destacar que a pesquisadora objetiva analisar os diversos recursos
empregados por crianças autistas e seus interactantes em contextos múltiplos de interação.
Como já mencionado, à perspectiva multidimensional conjuga-se a uma visão corporificada e
multimodal da linguagem, sem a predominância da linguagem verbal sobre os elementos não
verbais e interacionais.
Nesse sentido, no espaço interacional, os participantes buscam a comunicação e
mobilizam diversos recursos multimodais, tanto linguísticos (aspectos gramaticais,
prosódicos, sintáticos, entoacionais etc.) quanto corporais (posturas, gestos, direcionamentos
do olhar, mímicas etc.) e materiais (objetos, sensorialidade com elementos do espaço físico e
outros aspectos do ambiente). A proposta é que por meio de uma junção de aparatos teóricos e
metodológicos, a linguagem da criança autista seja considerada de forma integrada ao
ambiente, aos interactantes, aos gestos, ao corpo e à materialidade do ambiente, assim
operando para além da visão limitadora dos déficits típicos da síndrome.

5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Como procedimento metodológico, o corpus vem se constituindo a partir de gravações


de 30 a 40 minutos e de relatos cotidianos escritos pelos familiares de G., um menino com
TEA e Cromossomo X frágil, que à idade de 6;4 anos, só se comunica por gestos,
vocalizações, olhares e outros movimentos proxêmicos. Os dados até o momento
correspondem ao período de 5 a 6;4 anos.
A abordagem da pesquisa é de natureza qualitativa e longitudinal, pois se trata de uma
análise descritiva e indutiva com o propósito de investigar a entrada da criança na linguagem
pelo processo dialógico-discursivo. Por igual motivo, as análises têm sido direcionadas à
categoria discursiva, uma vez que se considera a relação entre a fala da criança e a do
interlocutor adulto no diálogo (HILÁRIO, 2011).
Para a transcrição e análise do material das gravações, deverá ser utilizado um
software que demonstre os recursos multimodais evidenciados pelos gestos, olhares e
movimentos da criança observada. Dentre os softwares disponíveis para esse trabalho, há
registros do uso do ELAN, um programa bastante utilizado para aplicação em pesquisas
multimodais visto que uma de suas funcionalidades “está na sincronização e coordenação
temporal e espacial de modalidades de naturezas distintas, percebidas auditiva e visualmente.”
(CRUZ, 2018, p. 182).
Como categoria de análise, daremos ênfase ao envelope multimodal (ÁVILA-
NÓBREGA, 2010), com análise dos gestos pelo continuum de Kendon, associados à
observação dos movimentos corporais, quando for o caso, e à atenção conjunta
(TOMASELLO, 2019). Do mesmo modo, tendo em vista o contexto como espaço de
interação, relacionaremos os formats (BRUNER, 1984), desenvolvidos em algumas cenas, e
sua influência para a construção de sentidos. Além disso, por tratarmos dos aspectos
dialógico-discursivos da comunicação, daremos atenção ao papel do outro para o
desenvolvimento da linguagem da criança.

6 RESULTADOS ALCANÇADOS ATÉ ESTE MOMENTO

Para fins deste trabalho (SELIN), foram selecionados três excertos, sendo dois relatos
de familiares e uma transcrição de um recorte de vídeo, correspondente a três minutos. As
descrições abaixo, foram feitas com base no Envelope Multimodal proposto por Ávila-
Nóbrega (2010), assim como em alguns tipos de marcações utilizadas por ele em suas
transcrições.
Para os relatos, optou-se por seguir a ordem das ações e indicar repetidamente os tipos
de composições do Envelope Multimodal a cada ocorrência. As transcrições ainda são
ortográficas, de acordo com a forma como são pronunciadas, o alongamento de sílabas
marcado por dois pontos (:) e a pausas entre sílabas, marcadas pelo sinal “^”. As ações e
contexto das cenas serão indicadas pelo marcador (•), os tipos de atenção e gestos serão
escritos entre parênteses com fonte itálico e negrito, e as falas dos interactantes e balbucios
da criança, entre barras //.

Excerto 1: 18/08/2020

Envelope Multimodal – Tríade Tia, Mãe e G. - 5 anos, 5 meses e 28 dias


Contexto: Na rua, em frente à casa dos avós, ocorrem as despedidas e a tia auxilia G. a se instalar na cadeira
infantil para automóvel.
Mãe Tia G.
• Levando G. até o carro e pega • G. acompanha com o olhar e se
em sua mão, conduzindo-o em dirige ao carro.
direção ao carro. Ajuda-o a subir. • Olha para o carro (atenção de
• Olha para o banco (atenção de acompanhamento) e dirige-se para a
verificação) Simultaneamente entrada do carro.
estende os braços em direção ao
carro – (gesto emblemático),
dizendo: /Sobe aqui!/
• Ao subir no carro pela porta traseira,
onde fica instalada a cadeirinha, G.
passa pelo vão entre o banco de trás e
do passageiro frontal e senta-se ao
lado da cadeirinha.
•G. passa rapidamente pela cadeira de
segurança, sentando-se ao lado dela.
• Olha sorridente para a tia (atenção
de verificação)
• No momento em que ele passa • G. percebe o olhar da tia e a olha de
pela cadeirinha, a tia não fala um modo bem sério (atenção de
nada e só observa (atenção de verificação).
verificação).
•A mãe que também observa • A tia olha (atenção de • G. sorri parecendo alegre por ficar
(atenção de verificação), ri e verificação) para G. e sorri, instalado como queria.
interpreta com a fala: /Parece que dizendo /Ah, seu danado!/
ele quer dizer com o olhar ‘Você
vai querer mesmo que eu sente na
cadeirinha?’/

Conforme é possível observar nessa cena, a interação dialógica ocorre por meio de um
formato já rotinizado da família com a criança, que se compõe pela atividade de despedida até
o portão, o auxílio à criança e os enunciados típicos. Nessa situação, especificamente, os
enunciados dirigidos à criança foram poucos, mas o significativo “Sobe aqui”, associado aos
gestos, trazem uma regularidade que auxilia as significações.
A comunicação utilizada, emprega uma mescla de olhar, gestos, e produção vocal, ou
seja, os planos de composição do envelope multimodal, proposto por Ávila-Nóbrega. Na
cena, nota-se que a produção vocal da tia, em conjunto com o gesto emblemático, direcionado
ao carro, tem uma significação muito clara para a criança. Em outras situações vivenciadas,
que devido ao espaço reduzido não serão descritas, percebe-se que o gesto emblemático de
dar “tchau” também é compreendido pela criança, porque ela foi ensinada sobre a relação
desse gesto com a despedida. No entanto, esse gesto tão emblemático precisa ser sempre
retomado, já que a criança não o executa espontaneamente.
Outro ponto a se ressaltar, ocorre quando a criança segue as orientações da tia para
entrar no carro, mas assume a sua vontade quando escolhe não se sentar na cadeira infantil do
automóvel. O olhar sério que G. dirige à tia, quando essa só observa sua ação, demonstra pela
interpretação da mãe, que ele esperava uma contestação. Pela linguagem gestual, inserida e
compreendida nesse contexto, em que praticamente foram utilizados os recursos multimodais,
vivenciou-se um comportamento linguageiro por parte da criança, que por sua vez também
nos faz perceber uma expressão de sua individualidade.

Excerto 2: Gravação de 15/07/2020


Recorte: 8m40s a 11m08 (2m 26s)
Envelope Multimodal – Tríade Avó, Avô e G. - 5 anos, 4 meses e 25 dias. (Observadora eventualmente)
Contexto: Quarto dos avós. Avô está no celular e ao mesmo tempo dialoga com a avó, com a observadora e com
G.
Avó Observadora Avô G.
• O avô está vendo notícias • G. se dirige à cômoda e tenta pegar
no celular. um objeto. O avô diz: /Tira a mão,
• Percebe que G. tenta pegar gato/, segurando o objeto.
o objeto sobre a cômoda, • G. o solta e senta-se na cadeira.
então coloca a mão sobre o (movimento proxêmico)
objeto, dizendo: /Tira a mão,
gato!/ (gestualidade)
• Fora da cena, a /Ele gosta.../ A lá/ • G. senta-se de lado na cadeira em
avó entende que frente a uma mesinha onde está um
ele pode pegar o aparelho de pressão.
aparelho de /O aparelho de • Depois vira para a frente
pressão e diz: pressão/
/Nã::o!/

/O aparelho de /por enquanto ele • G. ouve a avó e abaixa a cabeça,


pressão lá, vô/ não viu/ distraidamente (?) balançando as
pernas.
• G. ouve a avó falar “Ai, vô:?/ e olha
/Ai, vô:/ para o avô. (atenção de
acompanhamento)
/Tuqui:co/ •G. balança as pernas mais
animado.
• A avó chama •G. Não olha para a avó, mas estende a
sua atenção: /G.!/ mão para pegar o aparelho de pressão
/Cadê o Gabriel, (gesto emblemático)
G.?/

• Ato reflexo, a /Á, lá/ • G. vira de lado, põe os pés sobre a


avó, exclama: • O avô, sem parar de olhar o cadeira com os joelhos dobrados
/Á:, Á:, Á:/ celular, diz, dirigindo-se a próximo ao peito com as mãos nos
G.: /Tuquico:/ ouvidos, enquanto olha para o avô
(atenção de verificação)
• A avó recolhe o • G. continua na mesma posição, mas
aparelho de olha para o avô e para a avó, tudo de
pressão e o relance (olhar de verificação),
guarda em uma enquanto continua a tampar os ouvidos
gaveta. com os dedos.
/Chama a atenção /Ao mesmo tampo, G. faz ruídos com
dele ele tampa o a boca, semelhante a uma sucção de
ouvido/ chupeta/
/Licença, vô/
• O G., vão no • Pega um guardanapo sobre a mesa e
carro da tia/ passa-o pelo pescoço.
/Vão lá no carro • Ouve a avó dizer:/ O G., vão no carro
da tia?/ da tia/
/Vão lá no carro?/ • Responde:/Ã
/Vamu lá no • Ouve a avó repetir o pedido e
carro?/ responde: /Ã?/ (olha para a avó –
/Vamu no carro?/ atenção de verificação).
• E novamente a vó repete a mesma
pergunta, a qual ele responde: /A:/
(olha para a avó – atenção de
verificação).
• O avô comenta algum • G. olha na direção da avó – que está
assunto com a avó e a tia. fora da gravação – (atenção de
verificação) estendendo o braço e
abrindo e fechando os três primeiros
dedos das mãos, pedindo algo a avó.
(gesto emblemático)
G. espirra, a observadora exclama: /Ó
o nariz/
G. espirra de novo e a observadora
exclama: /Ó o nariz/Ele espirra
novamente e levanta da cadeira
• A vó diz para o • O avô retira um lenço de • G. observa o avô retirar um lenço de
avô: /Limpa o papel de uma caixa sobre a papel de uma caixa de cima da
nariz dele, lá/ cômoda. cômoda (atenção de
acompanhamento), e vocaliza:
/Á:Á:/ , balançando as mãos (gesto
emblemático).
• G. balança a mãos animadamente,
olhando para o avô (atenção de
verificação), vocalizando /Á:Á:/,
enquanto o avô assoa seu nariz.
• O avô se aproxima, recolhe • G., tampando os ouvidos, observa o
o guardanapo que G, movimento do avô e olha para ele
deixado cair no chão e também (atenção de
diz: /Cê já jogo minha rôpa acompanhamento e verificação).
aqui no chão, ai:!/
• O avô pega o papel para • G. coloca as mãos sobre a mão do
limpar novamente o nariz de avô, e olha sorridente para ele (atenção
G., enquanto diz: /Cagâncio/ de verificação), enquanto o avô diz:
/Faz bru::/ limpando o nariz /Aê:::, Aê::/
de G. e dizendo ainda: /
Aê:::, Aê::/ / Aê:::, Aê::/
• A observadora • G. ri e balança as pernas
ri. animadamente.
• O avô, novamente • G. olha para o avô e para o que ele
executando algum está fazendo, enquanto ouve o avô:
movimento sobre a cômoda /Aí, cagâncio/ (atenção de verificação
e dizendo, sem olhar para G. e acompanhamento)
/Aí, cagâncio/
/Caganco/
• A avó – fora da • Enquanto avô se locomove • G. observa a avó e o avô quando
gravação – vai para o outro lado do quarto, pergunta: /Cê é um
para o lado o avô interage com G. /Cê é Cagâncio?/Caganço/ (atenção de
oposto do quarto um Cagâncio?/ atenção de verificação)
e G. a observa. verificação)
• A observadora • Ele olha para a observadora (atenção
intervém: /Nã::o, de verificação)
eu sou o G.::!/ Eu
sou G./ / Fala,
G.::!/
• O avô olha para G. e fala • G. olha para ele e sorri. (atenção de
com ele: /Fala, G.!/ /Eu sou verificação).
o G.:!/

• A avó ri e pede • O avô também pede: /Fala, • G. olha para o avô sorrindo,
para G. /Fala assim/ /Eu sou o G.:!/ enquanto ele fala: /Fala, assim/ /Eu
assim, G – Eu sou sou o G.:!/ (atenção de verificação).
o cara!/
• A avó repete o • O avô se abaixa, • G. olha para o avô (atenção de
pedido: . /Fala aproximando-se de G. verificação), vocaliza: /Ã/, esfrega as
assim, G – Eu sou apontando com as duas mãos mãos sorrindo.
o ca:ra!/ em seu peito, (gesto
emblemático), dizendo:
/Fala assim. Eu sou o G.!/
/Gus^ta^vo^!/

• Novamente o avô toca o • G. vocaliza, respondendo /Ã!, / Ã/


peito de G., (gesto
emblemático) dizendo:
/Gustavo, Tuchico!/

Nesse recorte de uma cena cotidiana, em que G. interage com seus familiares, percebe-
se claramente o estímulo dos interlocutores, inserindo-o no diálogo. De modo muito afetivo,
os avós o estimulam a assumir uma atitude responsiva. Essa ação é mais explícita por parte do
avô que o toca por meio de um gesto emblemático, associado ao enunciado “Eu sou o
Gus^ta^vo!” (na última linha da tabela). A entonação empregada, o movimento corporal e o
toque em G., se não provocam uma produção vocal como ação responsiva, ao menos,
influenciam uma resposta corporal, gestual e de atenção.
Sua expressão responsiva se dá, especialmente, por gestos emblemáticos e olhares de
acompanhamento. É interessante observar que, nesse excerto, há vários momentos de atenção
de acompanhamento, se comparado ao primeiro, mesmo que não seja uma situação de
envolvimento mais ativo de G., especialmente quando a atenção se direciona mais
ostensivamente a ele. Essa cena parece demonstrar que até em momentos mais ociosos, de
simples interação, sem nenhum outro objetivo explícito, a criança pode ser inserida no diálogo
por meio de suas respostas gestuais ou pela atenção conjunta menos complexa.
Vale destacar que os interlocutores de G. o tratam como parceiro do diálogo, e ainda
que suas atitudes responsivas sejam tímidas (aqui ressaltamos os problemas cognitivos como
dificultadores dessa ação), ele parece entender muito dos enunciados linguísticos que lhe são
dirigidos, especialmente se forem multimodais. Conclui-se que o papel atento de seu
interlocutor, tratando-o como sujeito desse diálogo e utilizando meios multimodais de
comunicação, é essencial para a inserção de G. na linguagem.

Excerto 3: 15/09/2020
Envelope Multimodal – Tríade Avó, Avô e G. - 5 anos, 6 meses e 24 dias.
Avó Mãe L. G.
• Pede à mãe de G. que de • Mãe responde em tom de • Ouve a resposta da mãe, então se dirige à avó,
um banho nele. brincadeira: / Não, nã:o !/, pega em sua mão e a leva até um armário, sobre
/ L. você quer dar um banho olhando para a mãe (atenção o qual está depositada uma grande bacia, que
nele ?/ de verificação). costuma ser usada para seu banho.
(gesto emblemático + imperativo)
• A avó acompanha G. até o
• G. levanta a mão da avó em direção ao alto e
armário onde está a bacia,
com sua própria mão faz um movimento de abrir
dizendo : /Que que você qué,
e fechar os dedos pedindo a bacia. (gesto
G.?/
emblemático + imperativo).
• Enquanto isso olha para ele
• Olha para a avó e para o alto do armário, onde
e para a bacia (atenção de
está a bacia. (atenção de acompanhamento).
verificação)
• A avó, achando graça, • G. arrasta a bacia até o banheiro. Isso ele faz
atende ao pedido e pega a todo sorridente.
bacia, entregando-a a G.
(gesto emblemático)
/ Pronto! Peguei a bacia! Tó!
Pode toma (r) banho!/

Nesse excerto há outro formato de comunicação bem rotinizado: a cena do banho.


Essa cena sempre envolve enunciados com algumas palavras que despertam a atenção da
criança, como “Vamos tomar banho”, “Vamos pegar a bacia”, “Chuveiro”, “Trocar a fralda”.
Nessa família, esses enunciados sempre vêm relacionados às ações de levar G. até ao
banheiro, de levá-lo para buscar a bacia, e ao olhar direcionado a ele, tratando-o como sujeito
participativo, ainda que suas ações responsivas não sejam tão explícitas.
Além disso, como a hora do banho é uma atividade muito prazerosa para G., nota-se
também uma maior ocorrência e diversificação dos componentes do envelope multimodal e
da atenção conjunta. Ao pedir a bacia, flexionando os dedos e os braços, G. utiliza o gesto
emblemático imperativo e a atenção de acompanhamento, que como já exposto no tópico
relacionado, é entendida como uma ação mais complexa do que simplesmente usar o olhar de
verificação.
Em relação ao episódio acima, nota-se novamente que a compreensão ativa da criança
ocorre conforme o discurso a ela dirigido vem acompanhado de gesticulação, olhar, fala e
movimentos proxêmicos. Mesmo que ela não responda, utilizando de modo efetivo e
convencional, a gama de elementos que a linguagem multimodal proporciona, seu olhar,
ações e expressões faciais significam. Observa-se também a importância do outro na interação
com a criança, contribuindo para a sua tomada de consciência enquanto sujeito, porque, para
atingir seus objetivos mais facilmente, deve-se comunicar e para isso deve utilizar uma
linguagem.

7 ENCAMINHAMENTOS FUTUROS
Neste trabalho apresentamos algumas linhas teóricas que inspiraram nosso estudo,
partindo de pressupostos bakhtinianos que apontam para a constituição do sujeito e sua
entrada na linguagem por meio da alteridade e da interação dialógica. Igualmente, buscamos
ilustrar que a linguagem multimodal é uma importante ferramenta para a participação da
criança nas relações dialógicas com o outro. Nesse sentido, nota-se também que os formatos
rotinizados de algumas situações cotidianas, trazem regularidades que contribuem para a
compreensão de gestos e enunciados linguísticos, convencionalizados socialmente ou não.
Ao analisar a inserção de uma criança com TEA no fluxo comunicativo, percebemos
que ela está na linguagem, ainda que não tenha acesso à fala. A exemplo de análises
realizadas em outros estudos, com enfoque na linguagem da criança com TEA, notamos que é
preciso ampliar essa noção de linguagem, considerando gestos, movimentos proxêmicos e
olhar. Aqui também ressaltamos a possibilidade de olhar esse conjunto de elementos a partir
do plano de composição, concebido como envelope multimodal, além do contexto em que
ocorrem as interações.
Destacamos que o outro tem um papel fundamental nessa comunicação, pois é aquele
que interpreta o querer-dizer da criança, atribuindo sentido às suas ações, movimentos e
olhares. Não é possível prever se sua linguagem verbal vai se desenvolver em completude, no
entanto, já é possível vislumbrar que a comunicação multimodal e o apoio do outro na
interpretação de seus atos linguageiros, são aspectos preponderantes para a tomada de
consciência da criança com TEA e para a constituição de sua linguagem, seja ela verbal ou
não-verbal. Como encaminhamentos futuros, pretendemos analisar mais profundamente os
dados, aprimorando as transcrições por meio do software ELAN.

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