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ESTUDOS DE LINGUAGEM NO
TRANSTORNO DO ESPECTRO DO AUTISMO
Organizadoras
Ana Carina Tamanaha
Camila da Costa Ribeiro
Cintia Salgado Azoni
Juliana Onofre Lira
Departamento de Linguagem
Gestão 2000-2022
Título: Estudos de Linguagem no Transtorno do Espectro do Autismo
Revisão por Pares: Clara Regina Brandão de Ávila, Desiree De Vit Begrow,
Marcela Lima Silagi Siqueira, Maria Cecília de Moura,
Selma Mie Isotani
Catalogação na publicação
Elaborada por Bibliotecária Janaina Ramos – CRB-8/9166
E82
Outra organizadora
Juliana Onofre Lira
Livro em PDF
ISBN 978-65-997481-1-0
CDD 616.855
I. Fonoaudiologia
Apresentação
As organizadoras
Prefácio
Costa Ribeiro, Dr Cíntia Salgado Azoni e Dr Juliana Onofre Lira reuniram um exímio
a. a.
Na atualidade, nos deparamos com crianças, jovens e adultos com TEA que
apresentam diferentes níveis de limitação funcional na sua comunicação, e que
necessitam de diferentes estratégias de suporte para que possam se desenvolver
plenamente. Recentemente, a ASHA (American Speech-Language and Hearing
Association) tem reforçado o papel do fonoaudiólogo na compreensão e promoção da
“self-advocacy” de pessoas (adultos) com TEA. A noção do espectro e, portanto, da
variabilidade, traz em si o reconhecimento de que as pessoas têm habilidades e estilos de
comunicação diferentes e o nosso papel, enquanto fonoaudiólogos, é atuar não somente
em nível individual, mas apoiar a pessoa com TEA e disseminar informações que
modifiquem a mentalidade e as práticas nos diferentes cenários da sociedade civil.
A SBFa está empenhada com essa causa, com um envolvimento muito especial
do Departamento de Linguagem. Certamente, esta obra reflete o nosso mais sincero
desejo de que todas as pessoas com TEA sejam capazes de comunicar suas necessidades
e desejos e tomar decisões sobre as estratégias necessárias para atingir as suas próprias
metas ao longo da vida.
Conhecimentos gerais
Introdução
Percurso histórico
A descrição inicial do TEA nos remete a 1943, quando o psiquiatra, Leo Kanner,
publicou seu artigo científico intitulado “Distúrbio Autístico do Contato Afetivo” para
descrever casos clínicos com características comportamentais bastante peculiares:
perturbação das relações afetivas com o meio, solidão autística extrema, inabilidades para
o uso da linguagem para a comunicação, comportamentos ritualísticos, presença de bom
potencial cognitivo, aspecto físico aparentemente normal, início precoce e incidência
predominante no gênero masculino.
Após duas décadas nas quais a ênfase no tratamento foi de base psicodinâmica, ao
final dos anos sessenta, estudos experimentais passam a ser conduzidos e as falhas em
diversas áreas do desenvolvimento como a percepção, linguagem, cognição começam a
identificar e documentar as bases neurobiológicas do TEA (RIMLAND, 1964;
HERMELIN, O´CONNOR, 1967; RUTTER, 1968, ORNITZ, RITVO, 1976; RUTTER,
1978; RUTTER, SCHOPLER, 1987).
Considerações Finais
Referências
Introdução
diferentes genes de risco convergem para os mesmos mecanismos, como regulação gênica
e conectividade sináptica, que podem sofrer influências de fatores ambientais
(MAHAJAN, MOSTOFSKY 2015; BÖLTE et al., 2019; HAVDAHL et al., 2021). Esses
mecanismos também estão implicados por genes que são desregulados epigeneticamente
e transcricionalmente (MESLEH et al., 2021).
Síndrome do X-Frágil
Ocorre por mutação de gene do cromossomo X, conhecido como MECP2, lócus Xq28.
É uma encefalopatia neurodegenerativa, considerada uma das principais causas de DI em
meninas, com manifestações de sinais de autismo nos estágios iniciais. É raríssima em
meninos. Para o diagnóstico clínico é necessário: período pré e perinatais aparentemente
normais; perímetro cefálico normativo ao nascimento; DNPM normal nos primeiros 6 meses.
Critérios de suporte: hiperventilação, apneia; crises epilépticas; espasticidade, distonias;
escoliose; retardo do crescimento; atrofias de extremidades; distúrbios vasomotores. A
evolução clínica ocorre por estágios e o tempo de duração em cada estágio não têm um padrão
regular. Estágio I (Estagnação Precoce): Primeiros sinais, caracteriza-se por atraso ou não
aquisição de novas etapas do NDPM, diminuição ou perda do interesse por brincadeiras,
interação social pobre, mudança da personalidade e desaceleração do crescimento craniano.
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É uma síndrome muito complexa com um fenótipo amplo que pode envolver quase
todos os órgãos e sistemas sensoriais. A maioria dos indivíduos (80%) com SC tem mutações
na proteína 7 de ligação de cromodomínio-helicase-DNA (gene CHD7). Associa-se a
múltiplas comorbidades e é extremamente variável quanto à gravidade. O acrônimo Charge
foi utilizado para mostrar as afecções, mas não é utilizado na construção do diagnóstico: C:
coloboma; H: defeitos cardíacos (heart defects); A: atresia de coanas nasais; R: retardo de
crescimento/desenvolvimento; G: anormalidades genitais e/ou urinárias (genital and/or
urinary abnormalities; E: anormalidades das orelhas e surdez (Ear abnormalities and
deafness). Outras possíveis malformações e déficits adicionados posteriormente incluem
arinencefalia resultando em hiposmia, anomalias dos canais semicirculares produzindo
disfunção vestibular e disfunção de nervos cranianos e tronco encefálico, que levam a
dificuldades alimentares e respiratórias durante os primeiros anos. Apresentam prejuízos na
percepção sensorial cross-modal (visão prejudicada associada à audição reduzida). O fenótipo
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Síndrome de Cohen
Anomalia genética caracterizada por microcefalia, fenótipo facial típico, hipotonia, DI,
miopia e distrofia da retina, neutropenia e obesidade truncal. É causada por mutação
autossômica recessiva do gene COH1 (VPS13B), no cromossomo 8q222. ADNPM,
microcefalia e deformidades musculoesqueléticas são presentes. Características: fissuras
palpebrais em forma de onda, inclinada para baixo, hipertelorismo, sobrancelhas grossas,
cabelo espesso, cílios longos e grossos, filtro muito curto, incisivos centrais superiores
proeminentes, aparência de boca aberta devido a um lábio superior curto, hipoplasia maxilar,
micrognatia, palato alto e estreito, raiz do nariz proeminente, ponta nasal bulbosa e lóbulos
das orelhas grossos ou pequenos ou ausentes. Há deterioração progressiva da visão ao longo
da vida, com início precoce (miopia progressiva). A leucopenia, especialmente a neutropenia,
é comum. Deformidades musculoesqueléticas (cúbito valgo, geno valgo, cifose, escoliose,
frouxidão ligamentar e hipermobilidade articular). Podem ter pregas palmares transversais
únicas, sindactilia e lordose lombar. Comportamentos autistas estão previstos em cerca de 50%
dos casos.
A literatura tem apresentado como fator ambiental de risco para TEA: idade
avançada dos pais, exposição a poluentes químicos, obesidade ou desnutrição materna,
uso de suplementos alimentares de ácidos graxos sintéticos; redução de ácido fólico e
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2017; MASI et al., 2017; EISSA et al., 2018; HAVDAHL et al., 2021; LAMÔNICA et
al., 2021; MESLEH et al., 2021; MINGINS et al., 2021). Cabe ressaltar que os percentuais
de coocorrência variam em função das variáveis dos estudos, como por exemplo, faixa
etária, sexo, condições sociais, tamanho de amostras, critérios de inclusão, dentre outros.
Os transtornos de linguagem são frequentemente coocorrentes e até foram incluídos nos
critérios do DSM-5 (RYLAARSDAM et al., 2019). Assim, a heterogeneidade clínica do
TEA inclui não apenas a gravidade das principais características autistas, mas também a
presença ou ausência de comorbidades neurocomportamentais. Mahajan e Mostofsky
(2015) informaram que falta elucidar se algumas dessas condições concomitantes
conferem sua própria responsabilidade genética ao TEA ou se a coocorrência comum de
comorbidades significa fenótipos independentes, ou mesmo se esses são realmente
comórbidos no contexto do TEA.
de um viés diagnóstico para TEA sobre TDAH, especialmente quando atrasos motores e
de linguagem adicionais estão presentes (KLIN et al., 2020). A coocorrência de sinais
torna o diagnóstico diferencial precoce entre TEA combinado com TDAH e TDAH em
si um processo não trivial (HUS e SEGAL 2021). Embora a Academia Americana de
Pediatria estabeleça diretrizes para o diagnóstico de TDAH em crianças de 4 anos, é
extremamente difícil obter um diagnóstico preciso em crianças menores de 7 anos
(HYMAN et al., 2020). Mais estudos com foco no diagnóstico diferencial entre TEA e
TDAH na primeira infância são claramente necessários (KLIN et al., 2020; YOUNG et
al., 2020; HYMAN et al., 2020; HAVDAHL et al., 2021 BOUGEARD et al., 2021).
Epilepsias
É a EEI ocorre entre o 3º-7º mês de vida. Caracteriza-se pela tríade: crises
epilépticas de espasmos; atraso do DNPM e padrão de hipsarritmia. A etiologia é
variada envolvendo malformações estruturais e causas genéticas. Destacando-se lesões
cerebrais decorrentes de asfixia perinatal, malformações cerebrais, alterações do
desenvolvimento cortical, AVC neonatal, infecções, encefalopatia hipóxico-
isquêmica. Mutações em diferentes genes foram descritos. Há uma associação entre
espasmos infantis e erros do metabolismo, e entre diversos outros genótipos bem
caracterizados, como microcefalia grave autossômica recessiva com heterotopia
perinodular e encefalomiopatia mitocondrial com ácido metilmalônico elevado. A
regressão do desenvolvimento psicomotor acompanha 70-95% dos casos. Há previsão
de DI em 90% e comportamentos autísticos entre 15-33%. O prognóstico é reservado,
com elevada morbidade neurológica e mortalidade estimada em torno de 5% nos
primeiros dois anos de vida. Crianças com diagnóstico e tratamento precoces têm
melhor evolução.
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Síndrome de Ohtahara
Síndrome de Lennox-Gastaut
Síndrome de Doose
Ansiedade
Depressão
Distúrbios do sono
Considerações Finais
_______________________________________
Nota: Os quadros 1 e 2 foram construídos com as referências apresentadas neste capítulo, bem como
pesquisas nos seguintes endereços eletrônicos:
https://www.orpha.net/consor/cgi-bin/index.php
https://www.omim.org/
https://gene.sfari.org/
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Referências
Introdução
Neste capítulo serão abordados alguns dos sinais de sofrimento psíquico em bebês,
a partir de estudos que integram conhecimentos das neurociências e da psicanálise acerca
da constituição do psiquismo, e que indicam que pode estar em estruturação um futuro
quadro de transtorno do espectro do autismo. Para dar conta da proposta, cabe uma
revisão sobre o que se sabe acerca de como o bebê habita seu corpo, a relação entre
aspectos genéticos e epigenéticos que fundamentam os conceitos de intersubjetividade
primária e secundária, relativa ao que se conhece dos estudos de Freud, Lacan e
psicanalistas que clinicam com bebês, de modo identificar os sinais precoces de que um
bebê está na direção do TEA. Finalmente são abordados os Sinais PREAUT como forma
de detecção precoce de risco e encaminhamento para intervenções oportunas.
Sobre a habitação do corpo, cabe destacar a teoria de Bullinger (2006) que afirma
que o bebê apresenta um domínio progressivo de espaços corporais desde o útero até
poder andar e se movimentar de modo independente. O autor, considerando autores como
Piaget, Freud, Lacan, Lebovici, afirma que a capacidade de conhecer advém da
articulação entre os aspectos genéticos e a troca com o ambiente na construção de
conceitos sobre si próprio e sobre o mundo. Essa construção permite que o bebê possa
automatizar posturas controladas a nível subcortical e deixar livre o processamento
cortical para trocas complexas, sobretudo para comunicação e o funcionamento
heteróclito da linguagem. O autor ressalta que o bebê, ao perder o invólucro do útero, é
submetido à força da gravidade e terá de lidar com informações táteis, proprioceptivas e
vestibulares de um modo intenso a ponto de construir o que Bullinger (2006) chamou de
espaço gravitacional.
Outro espaço que o bebê deve construir, após vencer a gravidade, é o espaço do
busto, que abrange o controle da parte superior do tronco incluindo a cabeça. Este
domínio já começa no ato de aleitamento, pois o bebê já recruta um movimento de cabeça
para se aproximar do seio. Bullinger (2006) já detecta nesse domínio sinais de risco como
a dificuldade de construção da narrativa alimentar da apetência à saciedade e a noção de
continência e de espessura corporais, que abrangem a dimensão ântero-posterior do
tronco. Entre os sinais de risco que o autor aponta estão agarramentos visuais, vistos já
no primeiro ano de vida, e fixações orais (estereotipias) como levar todos os objetos à
boca de modo repetitivo ou movimentos repetitivos de dedos em frente aos olhos
(PURPURA et al., 2017). É importante lembrar que uma criança que se alimenta bem
mostra um sinal de saúde física e também mental. Já uma criança que se deixa alimentar
passivamente (série silenciosa) ou que evita se alimentar (série barulhenta), descartadas
as motivações orgânicas, demonstra sinais de sofrimento psíquico e, no caso das crianças
com TEA, são conhecidos os processos de restrição alimentar (Bandini et al., 2010;
Bellefeuille, 2014) relacionados a questões sensorioais. Além das preocupações
nutricionais, esses bebês claramente não desenvolvem o percurso pulsional oral
(LACAN,1964), pois não se oferecem para serem “saboreados” por sua mãe. A restrição
alimentar possui forte relação com problemas sensoriais. Alguns estudos realizados no
Brasil já evidenciam a alteração no perfil sensorial de crianças em sofrimento psíquico
(BELTRAME, MORAES e SOUZA, 2018) e com TEA (OLIVEIRA e SOUZA, 2022).
bebês que se tornam autistas mais tarde e que podem ser detectados a partir de um olhar
atento na puericultura. Eles abrangem também o engatinhar e o andar, pois o domínio do
espaço corporal, fundamental para a deambulação (BULLINGER, 2006), também
apresenta sinais de assimetria nesses bebês.
Essas observações das dificuldades corporais iniciais dos bebês, que recebem o
diagnóstico de TEA mais tarde, evidenciam a importância do trabalho de Trevarthen e
Delafield-Butt (2013) sobre as dificuldades com a intersubjetividade primária desses
bebês (GOLSE, 2013). A proposição principal dos autores é de que há uma falha pré-
natal no desenvolvimento dos sistemas que programam o timing, a coordenação motora
seriada, o controle prospectivo de movimentos e o controle da regulação afetiva das
experiências nas crianças com TEA.
No entanto, os bebês, que se tornam autistas, parecem ter uma falha inicial na
subjetividade primária que sustenta a intersubjetividade secundária como afirma Golse
(2013). Na origem dessa dificuldade está um erro em sistemas motores da base cerebral
durante a ontogênese cerebral pré-natal. Numerosos trabalhos põem em evidência as
anomalias da conectividade neuronal que poderiam se manifestar de modo difuso entre
as diferentes áreas do circuito neuronal da competência social e dificuldades com
neurônios espelho que levam essas crianças, por exemplo a descrevem nossas ações mas
não conseguirem atribuir uma intenção e utilizarem de maneira errônea elementos do
contexto, todos revisados cuidadosametne por Muratori (2014). Ansermet e Giacobino
(2013) afirmam que os determinantes genéticos no caso do TEA são múltiplos e
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heterogêneos, o que justifica tomar cada caso de modo singular, como a psicanálise o faz,
ou seja, os efeitos epigenéticos que incidem sobre a relação entre genética e plasticidade
cerebral, somados à história de vida de cada bebê e sua família, justificam pensar deste
modo.
Por isso, é importante não tomar a fundação da casa como a casa em seu todo
(CRESPIN, 2012), pois além dessas características corporais que criam obstáculos
iniciais à relação, há a contribuição das interações iniciais que podem compensar tais
dificuldades ou alimentá-las por um efeito epigenético, ou seja, os fatores ambientais
também possuem um papel, sejam eles físicos ou psíquicos. Trevarthen e Delafield-Butt
(2013) afirmam que o sistema motor-emocional do bebê é construído a partir do suporte
materno que é um processo dinâmico que modula mudanças na regulação do ser que serão
necessárias em ações colaborativas com diferentes pessoas com distintos graus de
intimidade. O ritmo expressivo das mãos faz parte desse sistema motor-emocional, que
parece ter raízes no canto e na dança. Essas observações dos autores reforçam os trabalhos
sobre a contribuição dos gestos corporais na aquisição da linguagem (CAVALCANTE et
al., 2016).
Esses tempos pulsionais que abrangem não apenas a pulsão invocante mas a
escópica (o olhar) e a oral (o prazer via boca) inspiraram Laznik a propor os Sinais
41
Isso indica que o bebê com sinais de risco de evolução para autismo pode até olhar
ou reagir auditivamente após solicitação de sua mãe ou familiar, mas não inicia uma troca
prazerosa e jubilatória com ela. Considerando tais sinais, foi elaborada uma grade com
pontuações que representam o grau de força de cada questão do ponto de vista preditivo.
Após a avaliação dos sinais PREAUT aos 4 e 9 meses, período de ida obrigatória aos
programas materno-infantis para vacinação, os bebês ainda foram avaliados no desfecho
aos 24 meses pelo CHAT (Check list for Autism in toddlers) (BARON COHEN, 2000).
Os resultados da validação dos Sinais PREAUT foram publicados em Olliac et al. (2017).
A grade para análise dos Sinais PREAUT é apresentada a seguir nos quadros 1 e
2.
a) Ele olha para sua mãe (ou para seu substituto) Sim 1
Não 0
b) Ele sorri para sua mãe (ou para seu substituto) Sim 2
Não 0
c) O bebê procura suscitar uma troca prazerosa com Sim 4
sua mãe (ou seu substituto), por exemplo, se
oferecendo ou estendendo em sua direção os dedos Não 0
do seu pé ou da sua mão?
4) Depois de ser estimulado por sua mãe (ou pelo
seu substituto)
a) Ele olha para sua mãe (ou para seu substituto) Sim 1
Não 0
b) Sorri para sua mãe (ou para seu substituto) Sim 2
Não 0
c) O bebê procura suscitar a troca jubilatória com Sim 4
sua mãe (ou com seu substituto), por exemplo, se
oferecendo ou estendendo em sua direção os dedos Não 0
do seu pé ou da sua mão?
Fonte: Crespin e Parlato-Oliveira (2015)
Na pesquisa francesa (OLLIAC et al., 2017), evidenciou-se que bebês com três
pontos ou menos aos quatro meses, e cinco pontos ou menos aos nove meses apresentaram
uma evolução para o TEA. Na pesquisa com bebês brasileiros de Roth-Hoogstraten,
Moraes e Souza (2018b), observou-se que os Sinais PREAUT também podem detectar
sofrimento psíquico de outra natureza que não o TEA, quando a pontuação fica entre 5 e
15 pontos, e que é possível detectar a direção da estruturação psíquica por meio de uma
análise complementar entre os Sinais PREAUT e roteiro IRDI (KUPFER et al., 2009)
nesses casos. Verificou-se a concordância estatística entre ambos protocolos na
identificação de risco e, também, na análise qualitativa de casos de risco, que eles, em
conjunto com a história de cada criança e família, evidenciaram a possibilidade de uma
hipótese inicial sobre o funcionamento psíquico capaz de fornecer direções para uma
intervenção oportuna (ROTH, 2016).
Resumindo os principais sinais mencionados até aqui, observa-se uma janela
especial de detecção e intervenção entre seis e doze meses. O esquema a seguir busca
sintetizar esses sinais:
43
queda repentina em
vocalicações e
prevalência de balbucio
não social
Figura 1
Referências
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48
Introdução
Em outras palavras, parece haver um impasse que põe em cena uma dúvida: do
que se trata? Frente a isso, o terapeuta se movimenta, buscando uma compreensão do
caso, tentando nomear o que se dá a ver e responder à dúvida familiar que se impõe.
A maternidade não é uma posição natural, como tão bem esclareceu Margarete
Hilferding apud Berlinck (2014), mas uma construção sustentada por desejos narcísicos
daquela que se oferece a tal empreendimento, manifestos pela idealização do filho. Ou
seja, a idealização significa considerá-lo ser perfeito, que atenda plenamente aos seus
desejos e fantasias (físicas, estéticas, intelectuais), supostas condições para um futuro
exitoso.
Essa paixão vai dar vida ao bebê real, é o substrato psíquico que permite à mãe
enlaçar-se a ele, como supõe Aulagnier (1990), o que abre espaço para um destino
pulsional promissor para a criança (CAMPANÁRIO et. al., 2018). Dá-se, então, um
enlaçamento, cena que, de fato, emoldura dois nascimentos: o da criança e o de uma mãe.
Nascimentos que expõem uma ambiguidade. Freud oferece o termo cesura (FREUD,
1917[1915]/2011) para o que ocorre neste momento ambíguo do nascimento: a separação
dos corpos, pelo parto e a sua junção imediata e necessária, dada a dependência do bebê
em relação à própria sobrevivência (a amamentação ilustra exemplarmente tal condição)
(BERLINCK, 2014).
Esta (re)união é condição fundamental para que a mãe, apaixonando-se pelo bebê,
promova sua posição de sujeito (KOMNISKI e CHATELARD,2018). Ela o acolhe por
meio dos cuidados corporais e pelas palavras, dando-lhe existência e sustentação. O bebê,
em sua vez, responde, mantendo-se causa do desejo da mãe tornando-se, cada vez mais,
um ideal de amor materno.
Contudo, por vezes, este processo pode não se operar porque, entre outras
questões, a criança revela vulnerabilidades biopsíquicas. Nesse contexto, cria-se um
impasse que vai repercutir não só nela, mas também em sua mãe. A criança real vai se
distanciando cada vez mais da idealizada, o que favorece o rompimento de uma história
de enlace. É esse o tema da próxima seção.
Para a mãe, a ruptura de um enlace que para ela seria absolutamente natural, tem
forte impacto e pode gerar defesas expressas por negação, raiva, culpa, depressão;
sentimentos reativos, provocados pela criança real, extensamente relatados na literatura
(HUANG et. al., 2010; FERNAŃDEZ-ALCÁNTARA, 2016; KRISHNAN et. al. 2017).
Pode, também, escorregar para sentimentos fictícios ou mesmo religiosos, na tentativa de
abrandar a “culpa” (da negação), como as mães consideram: “fui agraciada por Deus
para realizar essa tarefa” (de cuidar do filho autista), “Se eu amo meu filho? Mais do
que qualquer palavra possa traduzir!”
Considerações finais
nosso ver, eles marcam o discurso materno, oferecendo pistas fundamentais para a
condução do processo terapêutico.
Referências
Introdução
toques e sons que ocorrem em circunstâncias de troca comunicativa entre ela e o seu
cuidador, que se mostram mais ou menos evidentes no espaço clínico.
Prematuridade
Em busca de visão ampla sobre tema tão complexo, estudos de revisão sobre o
desenvolvimento da criança nascida prematura vem apontando prevalência alta de sinais
de TEA e associações inversas com condições da prematuridade e baixo peso ao nascer.
Dentre outros estudos, HERNADEZ-FABIAN et al., (2018) encontraram prevalências de
TEA variando entre 1,8 a 8% em crianças nascidas com menos de 28 semanas
gestacionais ou 1.000 gramas e de 1 a 5% em crianças nascidas com menos de 2.500
gramas.
JONES, 2018; KLIN et al., 2020) de que a identificação precoce do autismo, seguida de
uma intervenção apropriada, tem o potencial de melhorar os resultados para indivíduos
autistas.
Inúmeros instrumentos de triagem que foram criados com foco em crianças nos
seus anos iniciais (MARTELETO; SCHOEN-FERREIRA; PERISSINOTO, 2015).
BREWER; YOUNG; LUCAS (2020) sintetizaram estas publicações e classificaram os
materiais em tipos subsequentes de sensibilidade e especificidade crescente como
rastreios de nível 1, aqueles usados em larga escala para detectar crianças em risco na
população em geral e, em nível 2, aquele proposto para distinguir crianças com sinais de
autismo daquelas com outros problemas de desenvolvimento.
Comentários Finais
Referências
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pragmatic language development for 18 to 47-months-old children. Journal of Speech,
Language and Hearing Research, Rockville, EUA, p. 214-228, feb. 2007.
ROBINS, D. L. et al. Validation of the modified checklist for autism in toddlers, revised
with follow-up (M-CHAT-R/F). Pediatrics, Americana, v. 133, n. 1, p. 37-45, jan. 2014.
SCATTOLIN, M. A. A.; ROSÁRIO, M. C. Neurobiologia dos transtornos do espectro do
autismo In: TAMANAHA, A. C.; PERISSINOTO, J. Transtornos do espectro do
autismo implementando estratégias para a comunicação. 1. ed. Ribeirão Preto:
Booktoy, 2019 p. 29-58.
SCHOPLER, E.; REICHLER, R.; RENNER, B. R. The childhood autism rating scale
(CARS) for diagnostic screening and classification in autism. New York: Irvington,
1986.
https://www.gov.br/ans/pt-br/assuntos/noticias/beneficiario/ans-alerta-gestantes-para-o-
dia-mundial-daprematuridade
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Introdução
Constructo Teórico
1
Neste capítulo será utilizado Transtorno do espectro do autismo por considerar que Transtorno do
espectro autista está incorreto, foi um erro de tradução.
65
Quadro 6
Quadro 7
Uso de meios de comunicação verbais e não verbais, incluindo gestos naturais, fala,
sinais, imagens e palavras escritas, bem como outros sistemas de comunicação aumentativa e
alternativa (AAC)
Como compreende e interpreta a comunicação verbal e não verbal dos
outros, incluindo gestos e entonação;
Como inicia comunicação espontânea;
Como inicia e mantem conversas;
Como manipula tópicos de conversação e repara falhas de comunicação;
Como revezam-se nas atividades funcionais entre parceiros e
configurações de comunicação;
Como compreende o discurso verbal e não verbal em ambientes sociais,
acadêmicos, vocacionais e comunitários;
Como compreende linguagem figurativa e ambígua e faz inferências
quando a informação não for explicitamente declarada;
Como atribui estados mentais e emocionais (por exemplo, pensamentos,
crenças e sentimentos) a si mesmo e aos outros (Teoria da Mente [ToM]);
Como se comunica para uma gama de funções sociais que são
recíprocas e que promovem o desenvolvimento de amizades e redes sociais; e
Como é o acesso à alfabetização e instrução acadêmica, bem como
atividades curriculares, extracurriculares e vocacionais.
Comentários Finais
Referências
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73
Introdução
Embora estudos anteriores tenham afirmado que, uma vez pareados na idade
mental, o TEA e os controles de desenvolvimento típico (DT) não diferem no
desenvolvimento gramatical, em estudos mais recentes é relatado o déficit
morfossintático e o fato de que o mesmo pode ser independente de habilidades cognitivas
(ZEBIB et al, 2017) e insistem que existem déficits gramaticais específicos no TEA
(PEROVIC et al, 2013). Mais especificamente, os pesquisadores mostraram que alguns
subgrupos do TEA apresentam perfis sintáticos que lembram o Transtorno de
Desenvolvimento de Linguagem (TDL), e que o desempenho em tarefas sintáticas não se
correlaciona com medidas de QI (ZEBIB et al, 2013). Uma possível explicação para essas
diferenças nos estudos pode ser devido ao fato de que os estudos anteriores fizeram uso
de avaliações de sintaxe generalistas, enquanto testes experimentais mais refinados, que
exploram habilidades gramaticais específicas (como perguntas complexas e wh), foram
aplicados nos trabalhos recentes. No entanto, apesar dessas investigações atuais de
sintaxe em TEA, ainda faltam dados sobre várias estruturas importantes que caracterizam
a sintaxe complexa.
Esses estudos refletem uma visão importante no que diz respeito à linguagem no
TEA. Esta também é uma conclusão de vários estudos comparando TEA com TDL:
alguns sujeitos com TEA apresentam graves alterações de linguagem, enquanto outros
têm desempenho de linguagem semelhante ao TDL. Tais estudos indicam que pode ser
impossível fazer uma generalização sobre a linguagem no TEA, dada a considerável
heterogeneidade dentro desse grupo (BROCK et al, 2017).
Esses domínios sintáticos que foram identificados como marcadores clínicos para
comprometimento sintático no TDL são a melhor opção para examinar se o TEA se
assemelha ou não ao TDL. Esses domínios foram testados em TEA, e novamente, os
resultados foram contraditórios. Terzi et al. (2014) testaram estruturas que são
consideradas marcadores clínicos para TDL em grego - sentenças passivas e pronomes -
em crianças de língua grega com TEA com idades entre 5 e 8 anos. As crianças com TEA
tiveram desempenho semelhante às crianças em desenvolvimento típico (DT) em frases
passivas e pronomes, mas pior que as crianças DT na compreensão de pronomes.
Whitehouse et al. (2008) compararam o desempenho do grupo TEA de língua inglesa
com um grupo TDL em tarefas de compreensão gramatical. Eles relataram que os
participantes TEA tiveram desempenho semelhante ao TDL na tarefa de compreensão de
frases, mas melhor que o TDL na repetição de frases. Manolitsi e Botting (2011), que
também compararam compreensão e produção em TEA e TDL, chegaram a uma
conclusão diferente: as crianças com TEA tiveram desempenho inferior ao TDL em
tarefas de linguagem receptiva e semelhante ao TDL em tarefas de produção de frases.
crucialmente em relação aos erros que cometeram: as crianças com TEA produziram
significativamente mais erros pragmáticos que os participantes do TDL. Tais erros
pragmáticos são respostas inadequadas, não relacionadas aos estímulos, refletindo mal-
entendidos da situação nos estímulos ou falhando em entender a intenção do examinador
e o propósito da conversa.
três domínios que também estão prejudicados no TDL: uso de pronomes, uso reduzido de
sentenças e grande índice de sentenças complexas errôneas.
Avaliação
perguntar “Quem são esses?” objetivando o uso do plural. No entanto, habilidades obtidas
de forma altamente estruturada podem aparecer nas crianças com TEA, mas as mesmas
não aparecem tão frequentemente em conversas naturais.
A proposta é que o mesmo seja analisado ao vivo e não por trasncrições que podem
ser demoradas e muitas vezes não são viáveis em ambientes clínicos. O OSEL mostrou
excelente consistência interna para os itens Sintaxe e Pragmático-Semântico, assim como
confiabilidade de moderada a alta para a maioria dos itens. Em estudo recente, o OSEL
foi utilizado para examinar os padrões de habilidades linguísticas expressivas espontâneas
de 87 crianças clinicamente diagnosticadas com TEA de 2 a 12 anos de idade. As mesmas
apresentaram desempenho significativamente abaixo dos seus pares típicos nas
habilidades de sintaxe e discurso narrativo. Notavelmente, tanto as comparações
transversais quanto as análises longitudinais mostraram melhorias na linguagem
expressiva em crianças com TEA ao longo da primeira infância, pré-escola e ensino
fundamental. As habilidades de sintaxe e narrativa medidas pelo OSEL, apresentam
grande melhora especificamente da pré-escola ao ensino fundamental, em análises
transversais. Análises longitudinais com um pequeno subconjunto de crianças também
mostraram mudanças significativas ao longo do tempo nesses indivíduos nos escores de
sintaxe. Os autores ressaltam que não é possível concluir se essa melhora é decorrente de
intervenção ou da própria maturação pois não tinham dados sobre nível de escolaridade
e tratamento fonoaudiológico dos participantes do estudo (KIM, JUNKER e LORD,
2014).
Tager-Flusberg (2000) reconhece que mesmo sabendo que a fonte mais rica de
dados, especialmente no uso de linguagem produtiva, vem de amostras de fala
espontânea; tais amostras, muitas vezes, não oferecem um retrato fiel das capacidades
linguísticas dos sujeitos avaliados. As crianças com TEA costumam buscar o isolamento
e não interagem com outros socialmente ou se comunicam com outros com facilidade.
Por outro lado, a autora aponta o uso de testes validados como uma opção razoável para
a avaliação de fonologia, semântica, sintaxe e morfologia, a despeito das desvantagens
que os testes apresentam, como a dificuldade dos sujeitos com TEA em entenderem a
pragmática da situação de testagem ou a perseveração em respostas a determinado item.
84
A autora sugere uma adaptação dos testes, com simplificações, repetições quando se
fizerem necessárias, assim como alguns intervalos durante a testagem e o fornecimento
de "feedback" constante.
Considerações finais
Referências
Introdução
Diante desse cenário, Correia (2020) lançou uma proposta de explicação sobre a
natureza da fluência verbal, através da Teoria Integrada da Fluência – TIF, teoria
conceitual delineada a partir dos pressupostos da Linguística, Psicolinguística e
Neurociência da Linguagem, cuja proposição fundamental é conceituar a fluência verbal
como uma habilidade linguística. Dessa forma, a fluência é considerada como uma das
habilidades que compõem a língua-I (língua interna) – ou seja, o conjunto de capacidades
e habilidades mentais que fazem com que todo e qualquer indivíduo seja capaz de
produzir e compreender a linguagem (CHOMSKY, 1995). Tal proposição fundamental
confere à fluência um significado, uma explicação sobre o que ela é, o que, por sua vez,
possibilita compreendê-la melhor a partir do conhecimento acerca das suas propriedades
em “ser habilidade” e “ser linguística”.
Um estudo (OLIVÉ et al., 2021) que investigou, pela primeira vez, a integridade
dos tratos centrais da substância branca que definem a rede de conectividade da
linguagem em pessoas com TEA não verbais, observou alterações que apontam para uma
interrupção na via ventral do circuito da linguagem, compatíveis com os déficits
semânticos observados nesse grupo de pessoas. Evidências de conectividade estrutural
alterada também foram previamente detectadas em bebês de 6 meses de idade com alto
risco familiar para desenvolver o TEA (LIU et al., 2018).
É importante destacar que essas alterações nas vias da linguagem em pessoas com
TEA ou com alto risco para o transtorno já as predispõem a evidenciarem dificuldades na
fluência, tendo em vista que gerar sentenças e estabelecer relações semânticas apropriadas
são fundamentais para o desenvolvimento desta habilidade. E quanto às regiões do
encéfalo que estão envolvidas na percepção e produção da prosódia, e o que elas
processam em termos de parâmetros acústicos? Sobre a lateralização, estudos indicam
que ambos os hemisférios concorrem para a realização dessas funções. A produção de
prosódia emocional e linguística ativa os giros frontais inferiores bilaterais, as ínsulas
anteriores e grandes partes do córtex temporal, juntamente com o corpo estriado e o
cerebelo (AZIZ-ZADEH, SHENG, GHEYTANCHI, 2010; PICHON, KELL, 2013).
Interessantemente, a maioria dessas regiões também encontra-se estrutural ou
funcionalmente alteradas em pessoas que gaguejam, pois durante a geração da prosódia
os pares orbitais do giro frontal inferior esquerdo e a ínsula anterior esquerda foram
menos ativados em pessoas com gagueira, em comparação ao grupo controle
(NEUMANN, 2018).
92
A disprosódia, por sua vez, é descrita na literatura como parte de uma variedade
de transtornos neurológicos e psiquiátricos, como autismo, esquizofrenia, danos cerebrais
corticais e subcorticais, doença de Parkinson, ataxia cerebelar, transtorno de estresse pós-
traumático, esclerose múltipla, doença de Alzheimer, abuso de álcool, exposição fetal ao
álcool (AZIZ-ZADEH, SHENG, GHEYTANCHI, 2010; PICHON, KELL, 2013;
NEUMANN, 2018). Consiste em uma disfunção, devido a problemas no controle e/ou na
execução dos sistemas responsáveis pela produção da fala (respiratório, laríngeo e
supralaríngeo), bem como relacionados à percepção da prosódia. Segundo Barbosa
(2019), estudos indicam que esta disfunção pode afetar somente sua produção e não sua
percepção, e vice-versa.
Em suma, nesta seção, pôde-se observar que são múltiplas as bases neurais que
realizam a fluência verbal e a prosódia, e que o circuito da linguagem é o principal nessa
dinâmica neurofisiológica. Observou-se que alterações na fluência podem ser decorrentes
de comprometimentos no sistema da linguagem e/ou em qualquer outro sistema que
suporta a sua propriedade em “ser habilidade” – dadas às suas devidas proporções e
impactos. Por essa razão, a análise do fonoaudiólogo sobre essas alterações na fluência
em pessoas com TEA não precisa necessariamente se restringir à identificação de
93
disfluências, mas pode considerar, por exemplo, a análise das alterações no parâmetro de
continuidade que decorrem de um padrão disfuncional de processamento sintático e/ou
semântico – considerando as vias da linguagem. Sem contar com a relevância da prosódia
para a aquisição, desenvolvimento da linguagem e compreensão do material linguístico,
principalmente em pessoas com TEA, o que também conduz o fonoaudiólogo à
considerá-la em sua intervenção.
As alterações na prosódia de pessoas com TEA são descritas desde sua primeira
citação realizada por Kanner em 1943, essas alterações podem ser observadas em
diferentes aspectos, incluindo a forma de produção e/ou percepção correta das pistas
acústicas (LOVEALL et al., 2021). Na revisão realizada por Mann e Karsten (2021), foi
95
observado discrepância na prosódia entre pessoas com TEA e os seus pares com
desenvolvimento típico. Essas diferenças podem ocorrer, por exemplo, na ênfase
colocada em sílabas diferentes das usuais. A dificuldade de troca de assunto (hiperfoco)
e troca de turno também são dificuldades relacionadas à prosódia (LOVEALL et al.,
2021), ou seja, o envolvimento do outro na continuidade da conversa com seus pares
também são dificuldades na comunicação encontradas mais comumente nas pessoas
dentro do espectro, e pode estar relacionada à prosódia atípica.
É preciso compreender que o modo como uma frase é dita pode dar sinais sobre
como o outro interlocutor está, por exemplo, uma maior velocidade de fala, juntamente
ao aumento de pitch, pode indicar excitação (ROCKWELL, 2000). Um estudo
(LEHNERT-LEHOUILLIER; TERRAZAS; SANDOVAL, 2020), mostrou que crianças
e adolescentes com TEA apresentam diferenças no pitch em relação a seus pares com
desenvolvimento típico, essa característica pode estar relacionada ao desvinculamento de
seus parceiros de conversa ao longo de uma conversa. No entanto, esse mesmo estudo
mostrou que as crianças e adolescentes com melhores habilidades linguísticas vinculam
menos o parceiro na conversa, independentemente do diagnóstico de TEA.
Como dito anteriormente, pessoas com TEA apresentam uma grande variedade de
manifestações, sendo difícil encontrar duas delas que estejam no espectro e que
apresentem as mesmas características. No geral, como mostram Will et al. (2018), o
tratamento desses pacientes apresenta objetivos terapêuticos voltados principalmente nos
déficits de interação ou comunicação social, comportamentos restritos e estereotipados,
questões sensoriais ou comportamentos desafiadores que impactam o desenvolvimento
de habilidades funcionais e independência.
Considerações Finais
Referências
Introdução
Outro modelo para explicar é o dos processadores (Adams, 1991), o qual descreve
que existem quatro processadores interligados: fonológico, ortográfico, semântico e
contextual. O processador ortográfico é responsável pelo reconhecimento visual das
palavras escritas, de modo que, ao ler, o reconhecimento visual é o primeiro a ser ativado.
O processador fonológico recebe informações externas, por meio da fala, e pode ser
ativado através da subvocalização para auxiliar no processo de decodificação das
palavras. Além disso, auxilia promovendo uma expansão da memória durante a leitura, o
que é importante para a compreensão leitora. Por fim, o processador semântico é
responsável por armazenar o significado das palavras, e o contextual, pela interpretação
do texto (Santos; Navas, 2016; Mousinho et al., 2020).
Dessa forma, compreende-se que a leitura ocorre por meio de dois fatores:
decodificação e compreensão. A decodificação consiste no reconhecimento da palavra
102
linguísticas, bem como dificuldades na compreensão verbal e leitora (Nation et al., 2006;
Ratuchne e Barby, 2021).
Estima-se que entre 5 e 10% das pessoas com Transtorno do Espectro Autista
(TEA) apresentam habilidades de decodificação superiores às de compreensão leitora
(Nunes e Walter, 2016). Portanto, novamente o olhar clínico e experiente do
fonoaudiólogo deve direcionar as questões da linguagem escrita, especialmente naquelas
com TEA de nível I que podem ter a capacidade de ler as palavras escritas
semelhantemente à de crianças neurotípicas, porém com dificuldade de integrar as
informações necessárias para haver compreensão do que foi lido (Rotta, 2016).
Ademais, isto pode ser melhor fundamentado por meio da Teoria da Mente, que
consiste em compreender os estados mentais dos outros e em si mesmo. Esta teoria
encontra-se deficitária nos sujeitos com TEA, uma vez que estes possuem dificuldade em
identificar os estados mentais dos personagens e em inferir as suas ações, fazendo-os não
compreender que os seus pensamentos não são iguais aos de outras pessoas (El Zein et
al., 2014). Dessa forma, a utilização de suportes visuais e programas interativos são
facilitadores para a aquisição dessa habilidade de leitura nestes indivíduos (Nunes e
Walter, 2016).
No caso de crianças com TEA que possuam prejuízos mais graves ou com
ausência de uma fala funcional, espera-se que as habilidades preditoras para a linguagem
escrita e que também estão associadas à oralidade, como a consciência fonológica,
estejam prejudicadas, o que acarreta em um prejuízo na leitura (Ratuchne e Barby, 2021).
104
Diante do que vimos discutindo até aqui, o processo interventivo deve respeitar
variáveis importantes ao longo da vida da criança com TEA. As suas necessidades devem
envolver o ambiente estimulador, por meio de práticas no ambiente de literacia familiar,
escola e profissionais.
Estudos apontam que uma das estratégias de intervenção mais utilizadas e com
resultados favoráveis para a aprendizagem de crianças típicas e neurotípicas, como no
caso dos indivíduos com TEA, é a Leitura Compartilhada (LC), na qual um adulto lê em
voz alta para as crianças (Silva et al., 2019). A Leitura Compartilhada apresenta diversas
modalidades, e dentre elas, encontra-se a Leitura Dialógica (LD) que se caracteriza como
a leitura compartilhada por um mediador (Figura 2), na qual o mediador estimula a criança
a contar a história e as ilustrações que compõem a mesma (Rogosky et al., 2015; Walter
e Nunes, 2020; Jackson et al., 2020).
Na prática da LD, o mediador deve oferecer o livro para a criança no mínimo três
vezes, além de, antes de iniciar a leitura, fornecer uma prévia do que será lido pelas
ilustrações. Em seguida, deve apresentar o livro, como autor, capa e título. Flynn (2011)
propõe ainda três fases para a LD: na primeira, após a apresentação do livro, o mediador
deve introduzir palavras novas para auxiliar na aquisição do vocabulário, além de ainda
focar nas ilustrações e não no texto em si; na fase dois, o mediador deve criar
oportunidade para a criança ampliar seu vocabulário e praticá-lo, encorajando-a a dar
respostas mais longas; na terceira fase, a criança deve fazer associações à sua realidade
relacionada ao tema discutido.
Considerações finais
Referências
Introdução
ações, de acordo com o contexto), o planejamento (determinar o que precisa ser feito e
em que ordem), a organização (organizar pensamentos, ações e matérias para uma
determinada tarefa), o auto monitoramento (avaliar e modificar suas próprias atitudes),
a atenção (sustentada e variável – possibilitando focar a atenção ou modificar o foco para
algo mais urgente, quando necessário) e a memória de trabalho (que permite manipular,
sintetizar, analisar e avaliar informações memorizadas, contribuindo para o
funcionamento social). A autora também identificou a correlação entre FE, o
comportamento social adaptativo e a comunicação social. Segundo ela, esses elementos
podem contribuir para o delineamento de um esquema individualizado para a intervenção
nas questões relacionadas à comunicação e linguagem em crianças e adolescentes com
TEA.
Quadro 8
Planejamento e intervenção
Diagnóstico detalhado e abrangente
Diferenças individuais
Núcleos mais comprometidos e áreas mais preservadas
Relações entre habilidades e dificuldades
113
Habilidades/ recursos
Valores/ família
Quadro 9
Parceria comunicativa
Intervenção abrangente
Interações simétricas
diz respeito ao conhecimento mútuo, que possibilita o apoio interativo através de rotinas
e repetições que possibilitam a antecipação dos eventos e das habilidades que serão
necessárias em situações específicas. A parceria comunicativa está associada à obtenção
de muitas informações sobre a criança e seu contexto de forma a possibilitar que cada
elemento da interação seja significativo.
expressão. A criança poderá usar seus recursos de modulação emocional para buscar as
palavras e/ou a melhor forma de expressar seu prazer ou descontentamento. Quando não
atendida, uma criança pode tomar a iniciativa de falar mais alto ou tocar no braço do
interlocutor para chamar sua atenção. Ela pode usar o controle inibitório para não
interromper um colega que esteja contando alguma coisa ou para não reagir
agressivamente a uma frustração. Numa situação em que há um objetivo específico, como
comprar um refrigerante, a criança pode planejar aonde vai, como vai pedir, quanto
dinheiro vai levar e organizar suas ações, entregando o dinheiro, pegando o troco,
despedindo-se, agradecendo. Se alguém interromper, ela vai ter que manter a atenção ou
mudar seu foco, dependendo da razão da interrupção. Se houver alguma dificuldade, suas
habilidades de auto-monitoramento vão permitir que ela avalie o que não deu certo, se
o tom de sua fala estava adequado, se ela foi compreendida, se foi educada, se tinha
dinheiro suficiente. Essa experiência pode permitir que a criança reformule suas ações e
sua linguagem, usando também elementos de memória de trabalho para aperfeiçoar seu
desempenho.
Conclusão
Não existem modelos de intervenção e/ou educação que sejam úteis e aplicáveis
a todas as crianças.
Não existem modelos e propostas que não sirvam para nada nunca…
116
Referências
Introdução
A entrada na vida adulta representa outro desafio para pessoas autistas e suas
famílias de forma geral, tanto em relação às dificuldades impostas pelas novas demandas
sociais e comunicativas, quanto pela carência de políticas públicas e de suportes
ambientais e sociais relacionados às intervenções terapêuticas, apoio educacional após a
conclusão da educação básica, inclusão no mercado de trabalho, sexualidade,
relacionamentos afetivos, independência e interação social em diferentes contextos.
Ainda que haja redução das dificuldades e aprimoramento das habilidades ao longo do
tempo, inclusive em relação à linguagem, persistem dificuldades na independência e na
socialização, ao longo da vida adulta (FLAGGE, 2017). Nos Estados Unidos, estima-se
que cerca de 39% dos jovens autistas não realiza nenhum tipo de atendimento
(fonoaudiologia, serviços de saúde mental e serviços médicos em geral) – com uma
probabilidade três vezes maior de pessoas negras estarem fora desses serviços –
proporção muito superior à de crianças e adolescentes que ainda estão em processo de
escolarização básica (SHATTUCK et al., 2011).
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habilidades comunicativas e orientar o planejamento terapêutico para a intervenção em
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necessidades complexas de comunicação, demonstrando resultados positivos no contexto
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130
Introdução
Estudos sobre a intervenção precoce com uso de CSA em crianças com TEA ainda
são limitados e recentes, o que pode ser decorrente de diagnósticos tardios, bem como de
algumas dúvidas e crenças antigas e porém frequentes, conforme descreveram Cress e
Marvin (2003).
Dentre os programas que vêm construindo evidências científicas para além das
crianças em idades pré-escolares, podemos citar o PECS- Adaptado (WALTER, 2000,
2010), conforme descrito a seguir.
133
Ainda tendo por foco o mesmo contexto encontram-se os estudos de Brito (2016)
e Cândido (2015). Na primeira pesquisa, Brito (2016) avaliou os efeitos do uso de
sistemas de CSA por quatro professores do AEE sobre as habilidades comunicativas de
quatro alunos com TEA. Tomando como base o repertório comunicativo limitado dos
educandos, assim como a baixa frequência no uso dos sistemas de CSA pelas docentes, a
autora desenvolveu, à luz da concepção analítico comportamental, um programa de
capacitação para uso do PECS-Adaptado e pranchas de comunicação com os alunos. O
programa abrangeu treino de manejos comportamentais (contato visual, modelagem,
modelação, verbalizações espontâneas, uso de reforços e controle de estímulos do
ambiente), incluindo o ensino das fases do PECS-Adaptado e a produção de materiais de
CSA. Os resultados da pesquisa revelaram ganhos nos repertórios verbais das crianças
após a capacitação dos professores.
descrição do programa, fica evidente que deve-se proporcionar aos alunos com TEA
condições de solicitar algo desejado ou necessário de uma forma mais clara, onde se possa
criar uma relação de confiança e de afeto com seu interlocutor. Dessa forma, qualquer
pessoa poderá utilizar o programa: professor, pais, fonoaudiólogos, outros profissionais,
pares, enfim, quem se propor a, genuinamente, estabelecer interação e diálogo com a
pessoa desprovida de fala funcional.
Participação da família
situações sociais, etc. Seguindo esta linha de pensamento, muitos pesquisadores têm
engendrado esforços para estudar os efeitos de programas de capacitação de familiares de
pessoas com NCC para uso de CSA.
Neste ínterim, vale por fim, citar o trabalho de Calculator e Black (2009), que
elaborou um inventário de melhores práticas em comunicação alternativa para a atuação
de educadores em salas de aula de ensino regular. Neste inventário aparecem listadas seis
práticas recomendadas para promover o envolvimento familiar no processo de
implementação de sistemas de CSA, quando tal trabalho é liderado pela escola. São elas:
(1) O fonoaudiólogo e outros membros da equipe incorporam as prioridades, ideias e
interesses da família em relação à sua criança, no processo de design e implementação de
programas de comunicação alternativa na escola; (2) A família recebe da escola os
suportes que ela necessita para ter a oportunidade de desempenhar um papel claro e
significativo no apoio à criança para generalizar o uso da CSA para o ambiente da casa;
(3) É oferecido treinamento direto aos familiares (pelo fonoaudiólogo e outros
profissionais capacitados) se eles desejarem aprender como fazer uma utilização mais
efetiva e prática da comunicação alternativa em casa; (4) Há procedimentos para
coordenar o ensino do uso da comunicação alternativa entre a casa e a escola; (5) A
família exerce um importante e ativo papel no processo de avaliação em comunicação
alternativa, incluindo a identificação e a priorização das necessidades de comunicação na
residência; e (6) A equipe estimula e valoriza as contribuições familiares relacionadas à
CSA e a outros objetivos para sua criança, incluindo a seleção de métodos de
comunicação na escola e em casa.
Considerações finais
O trabalho com a CSA junto à população de indivíduos com TEA precisa estar
integrado ao conjunto de práticas fonoaudiológicas em Linguagem. Excluir a CSA desta
área de especialidade fonoaudiológica seria o equivalente a ignorar um corpus robusto de
pesquisas científicas que apontam vantagens muito significativas do uso de seus recursos
ao desenvolvimento da linguagem e da comunicação dessas pessoas. Trata-se, acima de
qualquer ação técnica tomada em sua especificidade, de se fortalecer o olhar voltado para
as competências comunicativas que se estendem além da fala e que podem ser muito
amplificadas por meio da CSA. É um caminho apesar da ausência da oralidade, mas que
se percorre também por ela, porque é o percurso da linguagem, em todas as suas
manifestações.
138
Referências
BONDY, A.; FROST, L. PECS: The Picture Exchange Communication System. Cherry
Hill, NJ: Pyramid Educational Consultants, Inc., 1994.
Sobre os autores
Ana Carina Tamanaha. Fonoaudióloga. Professora Doutora Afiliada do Departamento
de Fonoaudiologia da UNIFESP. Mestrado e Doutorado em Ciências pela UNIFESP.
Pós-doutorado pelo Departamento de Psiquiatria da UNIFESP. Pesquisadora do
NIFLINC-TEA do Departamento de Fonoaudiologia da UNIFESP. Coordenadora do
Comitê de Linguagem Oral e Escrita da Infância e Adolescência do Departamento de
Linguagem da SBFa (Gestão 2000-2022).
Ana Paula Ramos de Souza. Fonoaudióloga. Doutora em Letras pela PUCRS. Pós-
doutorado em Letras pela UFRGS. Docente do Departamento de Saúde da Comunicação
Humana da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e docente voluntária dos
Programas de Pós-graduação em Distúrbios da Comunicação Humana e de Psicologia da
Universidade Federal de Santa Maria. Membro do Grupo Inovação, Pesquisa e Ensino
em Fonoaudiologia da SBFa (IPEF), do Labirinto - Laboratório Interdisciplinar de
Pesquisa em Autismo, do grupo de estudo do PREAUT Brasil-RS e da Associación La
Cause des Bébés. Co-coordenadora do Núcleo Interdisciplinar em Desenvolvimento
Infantil (NIDI) - UFRGS-UFSM